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Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de 2017 - (54) 3220.3232 - www.correioriograndense.com.br CR Correio Riograndense Obrigado leitores, agentes e colaboradores pela centenária parceria 1909 - 2017 ÚLTIMA EDIÇÃO

Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de ... · nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal ... isso em face do santo batismo que nos elevou

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Correio Riograndense Caxias do Sul8 de fevereirode 2017

REINTEGRADO AO SERVIÇO POSTAL EM ___/___/___

___/___/___ _________________

PARA USO DOS CORREIOS

RESPONSÁVEL

■ MUDOU-SE■ DESCONHECIDO■ RECUSADO■ FALECIDO■ AUSENTE■ NÃO PROCURADO■ END. INSUFICIENTE

■ CEP■ NÃO EXISTE Nº

INDICADO■ INFORMAÇÃO

ESCRITA PELO PORTEIRO OU SÍNDICO

Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de 2017 - (54) 3220.3232 - www.correioriograndense.com.br

CR

Correio Riograndense

Obrigado leitores, agentes e colaboradorespela centenária parceria

1909 - 2017

ÚLTIMA EDIÇÃO

Se vederemo sempre. No ve digo adio. Solo rivedersi

Ilustração:Derli Dutra/São José do Ouro/CR

Os mitos não morrem# NANETTO PIPETTA

Páginas 9, 12 e 13●

www.correioriograndense.com.br I facebook.com/jornalcrCR

1909 - 2017

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e tivéssemos, hoje, a máquina do tempo para retroceder até o dia 18 de janeiro de

1896 veríamos naquele entardecer, chegando a Conde D’Eu (atual Garibaldi), dois frades: frei Bruno de Gillonnay e frei Leão de Montsapey. Vinham da França, cansados de uma longa travessia, mas animados, para trabalhar na evangelização e no acompanhamento espiritual dos imigrantes italianos que já habitavam o solo gaúcho.

Logo ao chegar se depararam com a dura realidade em que viviam os imigrantes italianos. Estavam abandonados à própria sorte. As promessas que os atraíram para cá eram, na realidade, só promessas.

A necessidade de evangelizar e de ajudar o povo a ter uma vida digna obrigaram os frades a pensar em alternativas. Eles então se deram conta de que não bastava pregar o evangelho, rezar e falar de Deus. Era necessário também pensar na saúde, na educação, na subsistência e nas condições de vida do povo.

Preocupados com a educação dos filhos dos imigrantes, os frades convidaram as congregações francesas das irmãs de São José e dos irmãos Maristas para virem para cá e abrirem escolas. Para a formação de frades nativos, dois anos após a chegada, em 1898, abriram o primeiro seminário. Pensando no próprio sustento, assumiram a administração de paróquias e iniciaram atividades alternativas. Neste contexto, o sonho de frei Bruno, de ter um novo instrumento de evangelização, foi desabrochando.

Em 1904, frei Bruno relatava ao bispo Dom Giovanni Scalabrini a necessidade da imprensa na evangelização: “Trabalhamos para estabelecer com simplicidade, no centro da colônia italiana, uma pequena impressora, que levará periodicamente no seio da família, em sua língua materna, uma página do santo evangelho,

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Despedida“Sinto muito o fechamento

do CR impresso. Perdemos mais um espaço alternativo para divulgação das ideias de quem utiliza a liberdade de pensamento, como Frei Bet-to. Esta é a tendência da mídia impressa, o que lamento, pois nada como pegar o jornal e le-var para ler em qualquer lugar, no momento que quiser.”

Maria Helena G. PereiraSão Paulo - SP

Nota da redaçãoRecebemos outras centenas

de cartas e e-mails de leito-res dando sua opinião sobre o fim do CR impresso, mas infelizmente não foi possível publicar. Quem ainda desejar se manifestar, ou tiver qual-quer outra demanda relativa ao jornal, pode encaminhar para o e-mail que permanecerá ativo: [email protected]

CR para pesquisaTodas as 5.532 edições do

Correio Riograndense estão digitalizadas e podem ser aces-sadas nos links:

- 13/02/1909 a 25/12/2013: http://liquid.camaracaxias.rs.gov.br/portalliquid/Pasta/SubPastas/15

- 15/01/2014 a 08/02/2017: https://issuu.com/correio.rio-grandense

Objetos e documentos relati-vos à trajetória do jornal estão sob a guarda do Museu dos Capuchinhos (Muscap): rua General Mallet, 33, bairro Rio Branco, Caxias do Sul / RS; te-lefone (54) 3220-9577.

“É com pesar que recebo a notícia do fim da publicação impressa. São muitos anos entregando o jornal aos assi-nantes, cobrando sua assinatu-ra anual, criou-se um vínculo bom. De qualquer forma, sei das dificuldades em mantê-lo, bem como das mudanças na forma de fazer comunicação. Desde já desejo sucesso na nova fórmula digital.”

Ricardo ChesiniCarlos Barbosa - RS

“Vão ficar as saudades do belo e centenário jornal, dos cultos e abnegados articulistas e das mais variadas e sempre atualizadas matérias, e ainda de quem gentilmente conta-tava com os assinantes (Stela Maris). O mundo está mu-dando rápido e certamente ou-tras novidades virão. Veremos como será o CR online.”

Dorvalino UezIjuí - RS

Atuação em defesa do colonoA identidade católica, adverte o

jornal em seu editorial de apresen-tação, não o impede de falar sobre temas não especificamente reli-giosos. Na edição de 15 de janeiro de 1910, o jornal, além de católi-co, se apresenta como “o amigo, o conselheiro, a defesa do colono, para o qual, além de assuntos reli-giosos e leituras úteis, prazerosas e amenas, fornecerá também todos aqueles conhecimentos que a ele puderem ser úteis, como: noções de agricultura, e neste assunto se dará preferência a coisas feitas no Rio Grande do Sul; o modo de confeccionar, melhorar e con-servar o vinho e seus respectivos recipientes; higiene; quando for o caso, um pouco de medicina; também, sob a forma de diálogo entre o colono Pedro e o advogado doutor Pomieri, serão oferecidas algumas informações sobre as leis do belo país que os hospeda, que são indispensáveis a todos.”

Com este objetivo, desde a sua primeira edição, o jornal apresenta a “Sezione dell’Agricultore” em que são dadas informações sobre os cultivos da região e a melhor forma de incrementar a produção. A partir da edição de 11 de março de 1911, a coluna ganha o nome de “Cognizioni utili”. Notícias e estímulos a cooperativas e asso-ciações também são frequentes nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal e estadual em favor da agricultu-ra são noticiadas com destaque a cada edição.

Tanto num período como no ou-tro, podemos dizer, com toda tran-quilidade, que o jornal, em suas diversas nomenclaturas – La Li-bertà, Il Colono Italiano, Stafetta Riograndense e Correio Riogran-dense – e nas muitas mudanças que viveu no decorrer destes lon-gos 108 anos, manteve-se fiel ao propósito de frei Bruno de Gillon-nay que, em 1904, ao gestionar junto aos superiores da França a compra de uma impressora para poder produzir um jornal nas co-lônias italianas, pretendia “estabe-lecer com simplicidade, no centro da colônia italiana, uma pequena impressora, que levará, periodi-camente, no seio das famílias, em sua língua materna, uma página do santo Evangelho, explicada e comentada, uma história edifican-te, alguns conselhos de agricultu-ra, a indicação de algumas bro-churas adaptadas às necessidades dos colonos.”

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Cleonir: “mais que jornal de informação, foi jornal de opinião e formação”

Correio do leitor

Desde o início até os dias atuais, o jornal procurou ser fiel aos seus princípios. Teve seu foco voltado à propagação dos valores fundamentais para a vida humana e cristã.

CR Correio Riograndense

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Editorial 2CR1909 - 2017

explicada e comentada com histórias edificantes e com alguns conselhos sobre agricultura...”. Neste mesmo ano escreveu ao ministro provincial na França, dizendo: “Sem jornal, não se faz nada”.

O sonho de ter uma impressora e um jornal não se concretizou logo. Frei Bruno não tinha recursos para esse empreendimento e, no interior da missão capuchinha, ainda não havia consenso. O padre Carmine Fasulo, pároco de Caxias do Sul, assume o sonho de frei Bruno e em 13 de fevereiro de 1909 funda

o jornal La Libertá. Em 1910, La Liberta é transferido para Garibaldi e assume o nome de Il Colono Italiano. Em 1917, torna-se La Stafetta Riograndense. Em 1941, o nome do jornal é traduzido para Correio Riograndense.

Desde o início até os dias atuais, o jornal procurou ser fiel aos seus princípios. Ele nasceu para ser um jornal diferente. Além de falar de Deus e proclamar a sua Palavra, teve seu foco na educação, na cultura, na saúde, na agricultura, na ecologia, na propagação dos valores

fundamentais para a vida humana e cristã. Mais que um jornal de informação, foi jornal de opinião e formação.

Já correram 108 anos de história. O jornal tornou-se testemunha viva de grandes acontecimentos regionais, estaduais, nacionais e mundiais. Suas páginas guardam o relato de um século de vida. Guardam rostos, fatos, descobertas que marcaram gerações. Guardam histórias dos “Nanetto Pipetta” que vieram ao Brasil para achar a cucagna. Em sua trajetória, o Correio Riograndense se comprometeu com o desenvolvimento e a busca de uma vida mais digna para o povo.

Hoje vivemos um novo momento. Novos e modernos meios de comunicação estão se impondo. Para manter os propósitos originais e dar os passos que o momento exige, o jornal passará para um novo formato: será veiculado exclusivamente pela internet, com conteúdo readaptado, e estará integrado aos demais meios de comunicação administrados pelos freis capuchinhos do Rio Grande do Sul, ou seja, às emissoras de rádio da RedeSul e Rede Maisnova. Se, em sua época, frei Bruno de Gillonnay soube utilizar os meios adequados para chegar até o povo, hoje somos nós os desafiados a encontrar novos caminhos. Depois de 108 anos de jornal impresso, agora o Correio Riograndense continuará sua missão com novo formato. É a forma que encontramos para continuar a evangelização através do jornal.

Aproveitamos essa última edição impressa para agradecer a todos os colaboradores, agentes, leitores, parceiros, anunciantes e apoiadores que fizeram história conosco por mais de um século. Muito obrigado!

Com o mesmo sentimento, os convidamos a fazer parte deste novo momento do Correio Riograndense. O jornal pode ser acessado, gratuitamente, pelo site: www.correioriograndense.com.br

108 anos: missão cumpridaFrei Cleonir Paulo Dalbosco

Provincial dos capuchinhos do RS

FUN DADO EM13 DE FE VE REI RO DE 1909

Fi lia do à ADJORI-RS e ABRA JO RIDi re tor de Re da ção:

frei João Carlos RomaniniEditora-chefe: Andressa Boeira

Editores-assistentes: Ma ria de Fá ti maZa nan drea e Mar ce li no C. De zen

Diagramação: Rafael Dias Oliveira Comercial e Assinaturas: Stela Maris Andelieri

Edi ta do por: ASSOCIAÇÃO LI TE RÁ RIA SÃO BOA VEN TU RA/EDI TO RA SÃO MI GUEL

Di reção-ge ral: frei Álvaro Morés

Re da ção, Ad mi nis tra ção,Co mer cial e As si na tu ras:Av. Ale xan dre Riz zo, 534

CEP: 95110-000 - Ca xias do Sul - RSTelefone: (54) 3220-3232

Im pres são: Jor nal Pio nei ro

Cir cu la ção às quartas-feirasSite:

www.correioriograndense.com.brE-mail:

jor [email protected]:

facebook.com/jornalcr

Igreja 19CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

ais do que as reformas externas em termos esté-ticos e litúrgicos, o Con-

cílio Vaticano II foi uma tentati-va de colocar a Igreja no século XX. Com efeito, em virtude do trauma da Reforma Protestante e das determinações canônicas do Concílio de Trento, a Igreja Católica, durante quatro séculos, permaneceu alheia e inimiga da modernidade.

Para João XXIII, o Papa que convocou o Concílio, o desafio era tanto o de “abrir a janela da Igreja para que possamos ver o que acontece do lado de fora e para que o mundo possa ver o que acontece na nossa casa” como o de manter as portas e ja-nelas da Igreja abertas para que o Espírito Santo pudesse orientar a Igreja no seu processo de “ag-giornamento”.

Acolhendo as decisões do Con-cílio, na edição de 15 de dezem-bro de 1965 – a primeira após a conclusão da Assembleia Conci-liar – o jornal, em editorial, assim se expressa em relação ao evento que consolidou e impulsionou a maior reforma da Igreja Católica nos últimos 500 anos: “O Con-cílio Ecumênico terminou. Ago-ra começa nossa tarefa. A tarefa de cada um de nós, os cristãos”. Numa clara referência à “Lumen Gentiun” que, a partir da noção de Sacerdócio Universal dos Fi-éis propunha uma nova eclesio-logia, o editorial prossegue: “E isso em face do santo batismo que nos elevou à dignidade de fi-lhos de Deus. Ou cada um de nós cuida, deveras, valorizar o seu batismo, ou nada feito do Concí-lio, continuando o mundo como dantes: trôpego, anêmico, ilhado, coxo, mudo, surdo, cego.”

Na mesma edição, o jornal des-taca como manchete principal o Ano Santo proclamado pelo Papa Paulo VI para acolher as decisões conciliares. Na mesma página de capa, fazendo outra matéria, elenca os documentos concilia-

res e, citando o programa de rá-dio “A Voz do Pastor” de Dom Vicente Scherer, afirma que o desafio agora cabe a cada um dos católicos e se resume na palavra “atualização” pois “as resoluções do Concílio permaneceriam es-téreis e infecundas se sacerdotes e leigos não as recebessem com docilidade e amor”.

Na edição seguinte, de 22 de dezembro, a temática do Concí-lio é retomada e, citando nova-mente o Papa Paulo VI, afirma que a renovação proposta pelo Concílio “não é coisa passageira como muitas outras coisas o são, mas algo que prolonga seus efei-tos além do período de celebra-ção atual”.

O desejo de renovação do Con-cílio Vaticano II se concretizou, na América Latina, nas Assem-bleias das Conferências Episco-pais de Medellín (1968), Puebla (1979), Santo Domingo (1992) e Aparecida (2007). Elas mar-caram com a palavra dos bispos

do Continente Latino-americano e do Caribe as mudanças impul-sionadas pelo Concílio. Atento ao caminhar da Igreja, o Cor-reio Riograndense acompanhou os novos processos eclesiais em curso na região. A edição de 6 de março de 1985 é representativa desta nova postura do jornal em sintonia com a vida da Igreja. Com chamada de capa e reporta-gem na página 8, o jornal celebra a diminuição das ditaduras no continente e festeja os novos ven-tos democráticos que se ampliam a cada ano.

Também com foco na realidade social e na perspectiva dos pobres tão cara à Igreja latino-americana e caribenha, na página central, é destacada a realidade de fome que ainda persiste no mundo e a necessidade de um projeto global para a superação de tal situação. A mesma problemática é tratada em nível local quando, com cha-mada na capa e matéria na página 3, é apresentada a dramática situ-ação dos pequenos agricultores e cantinas da região serrana do Rio Grande do Sul ante o baixo preço da uva e do vinho. Ainda na mes-ma edição, com chamada de capa e reportagem na página 18, é feito

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Concílio: mais do que reformas estéticas e litúrgicas, uma tentativa de colocar a Igreja no século XX

O jornal e as mudanças do Concílio Vaticano II

João XXIII: convocou o Concílio

Romaria da Terra: defesa do colono sempre foi uma das bandeiras do CR

*Vanildo Luis Zugnofrei capuchinho, graduado em Filosofia e Teologia, doutor em Teologia

um relato da 8ª Romaria da Terra que acabara de acontecer em Te-nente Portela.

Ao lado das reportagens que focam a realidade social e as ini-ciativas da Igreja para a elas dar resposta, as colunas de autores tornaram-se cada vez mais um espaço privilegiado para a refle-xão da realidade à luz da fé cris-tã. Impossível não lembrar do saudoso frei Wilson Sperandio e sua leve e profunda coluna se-manal “Novo Jeito de Viver”. Ao lado dele, já na década de 1990, estava frei Aldo Colombo e seu “Um Olhar Diferente”. Já no novo milênio, a eles somaram- se a teóloga Maria Clara Binge-mer, Frei Betto, Leonardo Boff, Padre Zezinho e, sempre com o cariz capuchinho, os freis Jaime Bettega com a coluna “Olhar a Vida” e Luiz Turra sempre falan-do “No Coração da Vida”. Cada um deles, com seus temas prefe-ridos e sua abordagem pessoal, ajudavam o leitor a pensar-se como cristão no mundo em que vivemos, em sua dimensão pes-soal, eclesial e social.

Para contribuir no propósi-to do Concílio Vaticano II e do caminhar da Igreja brasileira e latino-americana que deseja o protagonismo dos leigos e leigas no assumir e implementar a fé no âmbito social e eclesial, a partir de 2005, o Correio Riogranden-se, em parceria com a Escola Superior de Teologia e Espiritu-alidade Franciscana (Estef), ofe-receu, anualmente, o Curso de Teologia à Distância. Orientados por módulos semanais produzi-dos pelos professores da Facul-dade de Teologia mantida pelos capuchinhos em Porto Alegre, os leitores e leitoras tiveram a opor-tunidade de aprofundar temáti-cas ligadas à fé cristã, à vivência eclesial e ao compromisso social.

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CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Agentes 3CR1909 - 2017

A circulação ininterrupta de um jornal durante quase 109 anos pressupõe uma

grande reserva de idealismo, amor à causa e persistência. O Correio Riograndense sempre acreditou e confiou nos seus lei-tores e deles também sempre me-receu absoluta confiança.

Mas por trás da grande família dos assinantes, espalhados por quase todos os estados brasileiros e até no exterior, sempre esteve presente um verdadeiro exército de colaboradores, praticamente voluntários – os agentes. Deve- se a eles o êxito obtido pelo Cor-reio Riograndense ao construir uma sólida trajetória de 108 anos como um dos veículos de comu-nicação mais confiáveis do sul do país.

Responsáveis pela distribuição do jornal, pela renovação das as-sinaturas e pela divulgação nas comunidades, os agentes foram,

Os pilares de uma longa trajetória

MuitoObrigado!

Os agentes foram sempre os imprescindíveis canais de comunicação com os assinantes e leitores

# COLABORADORES

desde os primeiros anos do Cor-reio Riograndense, ainda como Il Colono Italiano, uma ponte indispensável entre os editores e os leitores.

Graças à dedicação dos agen-tes, o Correio Riograndense pode chegar aos mais distantes rincões dos estados do sul e de outras regiões do país, acompanhando principalmente as levas de migran-tes que, em alguns períodos da his-tória, tiveram no jornal o único meio de comunicação, o único elo de ligação com suas terras de origem. Muitos foram pioneiros, levando o jornal a comunidades recém-formadas pelas correntes migratórias, desde o sul até o nor-te do país.

Hoje, apesar das facilidades de

transporte e de meios que permi-tem a entrega de impressos em qualquer parte do país, os agentes continuaram sendo imprescindí-veis para que o CR continuasse chegando com regularidade e segurança em centenas de comu-

nidades.E para a maioria dos agentes,

o cargo não se resume apenas a isso. Muitos consideram esse trabalho uma missão; outros, um compromisso com a boa im-prenssa; outros ainda, por her-darem dos antepassados uma função que consideram sagrada.

Juntos, formaram uma equipe permanente de divulgação do jor-nal, uma grande família, ligada por laços afetivos e sentimentais, como elos de uma imensa corren-te. O patrimônio que mais orgu-lha o CR é a consolidação de uma

inigualável cre-dibilidade junto aos seus leitores e assinantes; e os agentes, segura-mente, são parte integrante desse patrimônio.

O Correio Rio-grandense sem-

pre contou com freis capuchi-nhos atuando em tempo integral na divulgação, que percorreram de forma incansável os estados do sul e são lembrados com ca-rinho pelos agentes mais antigos. Merecem destaque freis Roque Costella, Roberto Franciosi, Domingos Collet e, nos últimos

anos, ainda que não de forma permanente, freis Arlindo Battis-tel e Laudino Bertoldo.

Nos últimos tempos, com a au-sência de freis na linha de frente da divulgação, as assinaturas re-duziram bastante, mas a atuação dos agentes foi fundamental para que o número continuasse razoa-velmente bom.

Agora, ao encerrar sua cami-nhada como veículo impresso, o Correio Riograndense sente-se na obrigação de manifestar a imensa gratidão com cada um desses incansáveis parceiros. Através dos agentes Diva Miot-to, de Vila Flores; Avelino Ló, de Garibaldi, por muitos anos responsável pelo maior número de assinaturas do CR; Severino Bianchin, de São José do Ouro; e Primo Galdino Carniel, de Ca-cique Doble, os últimos agentes que visitaram o Correio Rio-grandense, um imenso obrigado.

“O centenário Correio Riograndense foi sacerdote, catequista, técnico agrícola, cozinheiro, professor, biblioteca e... até jornalista. Um jornal de fé; um jornal confiável! E nós, agentes, sempre fomos soldados de linha de frente da ‘boa batalha’”.

Avelino Ló, agente do CR em Garibaldi

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Igreja 18CR1909 - 2017

esde as suas origens, no início do sé-culo XX, até as últimas edições que encaminham o encerramento de sua

vida enquanto jornal impresso, o Correio Riograndense, através de todas as trans-formações, seja de nome como de projeto gráfico ou conteúdo abordado, manteve-se sempre como um meio de comunicação assumidamente eclesial e católico. Dada a impossibilidade material de refazer o per-curso de todo o longo período, nos dete-remos nesta breve análise apenas nos dois momentos de maior crise e reconstrução eclesial que marcaram a vida do jornal e nos quais ele demonstrou seu senso ecle-sial. O primeiro, na primeira década de sua existência, quando a Igreja Católica, recém emancipada da tutela do Estado, buscava reconstruir-se na fidelidade ao modo ro-mano de ser católico. O segundo, já na se-gunda metade do século XX, quando, em consequência do movimento de renovação capitalizado e impulsionado pelo Concílio Ecumênico Vaticano II, a Igreja do Brasil e do continente tomou o rumo da proximi-dade com a realidade do povo sofrido no continente e reconfigurou-se nas culturas latino-americanas e brasileiras e aproxi-mou-se dos movimentos sociais e popula-res que buscaram construir uma sociedade justa e democrática.

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Papa Francisco: primeiro editorial afirmava que jornal seria “papal no mais estrito sentido da palavra”

Empenho: Avelino Ló (3ª à esquerda) com Felipe, Marcelino,

Andressa, Stela e Rafael, do CR

Carinho: Diva Miotto (esq.) com Stela Maris, do CR

Dedicação: Severino Bianchin (2ª à esq.) e Primo Carniel

(último à dir.) com Stela, Andressa, Doniro, Marcelino

e Maria de Fátima

# EVANGELIZAÇÃO

O legado eclesial do jornal CRDesde a fundação, impresso se manteve como meio de comunicação católicoTexto de Vanildo Zugno*

Porto Alegre - RS

Pio X: jornal exaltava suas curas

A Imprensa e a reforma

“La Libertá - Il Colono Italiano” e a reforma romanizante

No curto lapso de tempo en-tre 1880 e 1920 aconteceu a mais radical transformação na história da Igreja Católica no Brasil. Impulsionada pelos bis-pos, no seu conjunto, ela pode ser descrita como a “reforma romanizante” da Igreja Cató-lica no Brasil. “Reforma” por pretender substituir elementos considerados deficientes ou sem vitalidade por novas for-mas que permitissem à fé ca-tólica apresentar-se com nova face. “Romanizante”, pois tra-tava-se de subtrair a Igreja do domínio do Estado e, ao mes-mo tempo, purificá-la dos ele-mentos do catolicismo popular não acordes ao modo romano de ser católico.

É no contexto desta reforma que surge no Brasil uma im-prensa católica. No Rio Gran-de do Sul, na década de 1870, apareceram os jornais “Es-trella do Sul” e “O Thabor”. Na década de 1890, sob a tu-tela dos jesuítas, foi a vez do “Deutsches Volksblatt” levan-tar a bandeira dos interesses da Igreja Católica no Estado. Na Região de Colonização Italia-na (RCI), foram os confrontos entre a maçonaria e o clero que fizeram surgir uma imprensa católica. Na região, o primeiro jornal com identidade católi-ca foi o “Il Colono Italiano” fundado em 1898 pelo padre Piero Nosadini. Pároco de Ca-xias do Sul desde 1896, padre Nosadini procurava fazer con-trapeso, através da imprensa, ao “O Caxiense”, jornal ligado ao governista Partido Republi-cano Riograndense. Depois de vários conflitos com as autori-dades caxienses, o “Il Colono Italiano” deixou de circular em agosto de 1898 e, em dezembro do mesmo ano, padre Nosadini regressou à Itália.

Em 1909, foi a vez do padre Cármine Fasulo fundar um jor-nal católico que levou o nome de “La Libertá”. De circula-ção semanal, o jornal logo teve dificuldades para manter-se. No fim de 1909, padre Fasulo regressou à Itália e a continui-dade do jornal se viu ameaçada. Com o objetivo de mantê-lo em circulação, padre João Fron-chetti, pároco de Garibaldi, com a ajuda de Adolfo Moreau e João Carlotto e o apoio dos freis capuchinhos franceses, adquiriu o jornal e a tipografia e os transladou a Garibaldi. Para esquecer as polêmicas de Ca-xias ou, quem sabe, homenage-ar ao padre Nosadini, o nome foi alterado na edição de 12 de março de 1910 para “Il Colono Italiano”.

Da análise das edições do “Il Colono Italiano” na sua primei-ra década de existência podemos identificar três temáticas que são representativas do espírito da re-forma romanizante: a construção da identidade católica como sub-missão à autoridade eclesiástica; o combate aos inimigos da Igreja Católica e a busca da afirmação da hegemonia cultural da Igre-ja sobre a sociedade através do discurso da submissão da ordem social aos mandamentos divinos transmitidos pela Igreja.

Em seu primeiro número sob a direção do padre Fronchetti, o jornal afirma, em editorial, seu programa originário: “La Liber-tá’ será assumidamente católico; não somente atenderá religiosa-mente os comandos da autori-dade eclesiástica; mas fará todo o esforço para antecipar-se aos seus desejos”.

A identidade católica constru-ída a partir da identificação com a autoridade eclesiástica trans-parece nas reportagens em que são apresentadas as atividades do Papa Pio X, especialmente as caritativas. A exaltação do Papa chega ao ponto de, no editorial da edição de 2 de novembro de 1912, serem noticiadas várias curas realizadas pelo Papa ainda em vida.

A identidade católica também era cultivada na dimensão de en-tretenimento que o jornal levava a seus leitores. Através de peque-nas histórias edificantes, eram apresentados os ideais e valores do bom católico. Em cada edi-ção, nas páginas 3 e 4, havia uma seção dedicada a uma novela edificante. Do número 45 ao 52, por exemplo, foi publicada a no-vela “Dalle spine a la Rosa” em que se narrava a história de uma amizade entre um rapaz e uma moça que era capaz de transcen-der o amor humano e alcançar a oblação da vida a Deus. Imelda e Rômulo, dois jovens apaixona-dos e prometidos em casamento, após a realização de exercícios espirituais e da orientação de um capuchinho, deixaram o mundo, ela para tornar-se freira, e ele para tornar-se frade.

Como toda a identidade, a afir-mação da catolicidade do jornal também foi construída a partir da identificação e desconstrução dos seus inimigos. Dentro do pensa-mento da restauração expresso no “Syllabus Errorum” de Pio IX, o primeiro e maior inimigo da fé católica é aquela forma de pensar que prega a não existên-cia de Deus. No editorial da edi-ção de 4 de maio de 1910, após apresentar as figuras de Diderot,

Voltaire, Rousseau, D’Alembert e Spinoza, o jornal afirmava que as concepções filosóficas por eles apresentadas vão contra os sentimentos do coração humano. Para desqualificar as ideias dos filósofos, o texto não apresen-tava argumentos filosóficos an-tagônicos, mas afirmava que os próprios livres-pensadores não acreditavam naquilo que eles en-sinavam.

A maçonaria aparece como a outra grande inimiga. Ela é apre-sentada como a mais intolerante das instituições na medida em que não admite, em seu interior, qualquer divergência de pensa-

mento. Na seção “Per il mondo” da edição de 15 de janeiro de 1910, o jornal compara as exco-munhões da Igreja Católica com as intolerâncias da maçonaria ita-liana que expulsou de seus qua-dros três deputados que votaram a favor do ensino religioso nas escolas públicas.

O protestantismo, tradicional inimigo da identidade católica, poucas vezes aparece nas pá-ginas do “Il Colono Italiano”. Na edição de 5 de fevereiro de 1910 é anunciada a conversão de um professor da Universida-de de Halle, na Alemanha, e, nos Estados Unidos, a conversão de todos os membros da “Socieda-de da Reconciliação”, da Igreja Anglicana para a Igreja Católica Romana.

O espiritismo também é apre-sentado como inimigo. A partir de abril de 1911, o jornal apresenta uma coluna intitulada “Dialogo tra Virginio e Geronimo” onde se refutam as teses espíritas. O es-piritismo é definido como “uma fraude inventada pelo diabo contra o homem, a religião pela qual os diabos, fingindo-se de anjos bons ou almas de mortos, para obter os seus intentos, dão respostas aos homens que os in-terrogam através de mesas, tripés ou outros objetos materiais.” ►►►

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CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 História 4

O nascimento do Correio Riograndense, idealizado por padre Carmine Fa-

sulo, pároco da paróquia Santa Tereza de Caxias do Sul, e frei Bruno de Gillonnay, coordena-dor da missão dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul, chegado da França em 1896, foi motiva-do pela imigração italiana ao Rio Grande do Sul.

Um ano depois do primeiro so-nho, em 1897, surge O Caxiense, primeiro jornal de Caxias. O ve-ículo defendia a política republi-cana. Logo entrou em atrito com o vigário, padre Pietro Nosadini, que, de imediato, compreendeu que também precisava de um jornal. Um bolletino seria edi-tado com o nome de Il Colono Italiano a partir de 1º de janeiro de 1898.

Na primeira página coloca sua linha editorial: advogar as causas dos católicos italianos e imigra-dos de Caxias e da região. Falará do desenvolvimento das socie-dades católicas, a fim de que sir-vam de exemplo “aos covardes e indiferentes”; e não esquecerá a defesa do Papa: “Santo Padre, os católicos italianos imigrados em Caxias e nas colônias vizinhas vos juram devoção e obediência ilimitada...”

Em 24 de agosto de 1904, pa-dre Carmine Fasulo, ex-palotino, assumiu como pároco de Caxias. Em novembro desse ano a pa-róquia recebeu a visita de dom Giovanni Baptista Scalabrini, bispo de Piacenza, Itália. Sca-labrini conhece a realidade da colonização italiana e inteira-se dos sonhos do frei francês Bru-no de Gillonnay, chefe da missão capuchinha fundada há apenas nove anos. Em 13 de fevereiro de 1909, Fasulo funda o jornal La Libertà. Três meses depois, em 5 de maio, deixa o cargo de pároco e vende o jornal ao substituto, pa-dre Francisco Baldassarre.

Em Caxias, o jornal O Caxien-se, que se intitulava defensor das colônias italianas e órgão repu-blicano, fechou em 28 de abril de 1898 por não interessar ao povo; já o Il Colono Italiano, de Nosa-dini, fechou em 21 de agosto de 1898 por não interessar aos cató-licos.

Gillonnay - Em 1904, frei Bruno relatava ao bispo dom Giovanni Scalabrini a necessi-dade da imprensa para a evan-gelização: “Trabalhamos para estabelecer com simplicidade, no centro das colônias italianas, uma pequena impressora, que le-vará periodicamente no seio das famílias, em sua língua materna,

Evento: inauguração da linotipia, em 1948, na sede do jornal, m Garibaldi

“Sem jornal não se faz nada”A frase de frei Bruno de Gillonnay, chegado da França em 1896, expressa verdade centenária

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uma página do Santo Evangelho, explicada e comentada, uma his-tória edificante, alguns conselhos de agricultura...”, conforme se lê no manuscrito original em fran-cês, datado de 12 de outubro de 1904.

Menos de dois meses antes da manifestação a Scalabrini, em 20 de agosto, frei Bruno escrevia ao provincial da Saboia, submeten-do-lhe à apreciação o projeto da “fundação em Conde d’Eu de uma pequena impressora”. Ini-cialmente pensava numa revista mensal para a formação religiosa nas escolas. Também o preocu-pava a ignorância dos colonos. E concluía: “Mas, sem jornal não se faz nada.” Pretendia comprar uma impressora dos franciscanos sediados em Lages ou uma dis-ponível em Porto Alegre. A au-torização veio da França no final de 1904 ou início de 1905.

Na capa das edições nº. 50, 51 e 52, de fevereiro e março de 1910, há uma chamada anunciando que Il Colono Italiano será o títu-lo que o La Libertà assumirá na edição de 12 de março de 1910, quando entrar no segundo ano editorial. La Libertà tinha surgido como “Giornale settimanale del popolo”. Sendo o colono italiano a maioria da população da região, nada mais acertado que o jornal tenha o nome de Il Colono Italia-no.

O ápice das dificuldades do diretor austríaco do jornal (Fron-chetti), em Garibaldi, acontece a partir de 17 de abril de 1917, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com a Alemanha e a Áustria. Os quatro proprietários – Fronchetti, Capuchinhos, Moreau e Carlotto – reúnem-se às pressas para tomar medidas. A direção fica com o capitalista e constru-tor Agostinho Mazzini. Logo o chamam de ‘testa de ferro’ que aceitava dirigir um jornal anti-ita-liano. Mazzini só aguentou até 21 de junho, quando pediu demissão, exigindo o fechamento do jornal.

Os cotistas se reuniram nova-mente, não admitindo a morte assim tão estúpida do jornal que tinham. Foi quando o capuchinho frei Caetano Angheben (1885-1967), há anos colaborador de Fronchetti, propôs que o jornal saísse sem o nome do editor-res-ponsável e com novo título. A ideia foi aceita e a edição de 5 de julho de 1917 levava o nome La Staffetta Riograndense. A partir dessa data, a administração e a redação ficam a cargo dos capu-chinhos, embora Fronchetti ainda fosse sócio.

Em 23 de setembro de 1918, Fronchetti registra em cartório declaração dizendo que o valor do capital do já Staffetta Riogran-dense (ex-Il Colono Italiano) é de 15 contos de réis. Também decla-ra que a Sociedade Literária São Boaventura (capuchinhos) entrou no capital inicial com quatro con-tos de réis e que “por conseguin-te a dita Sociedade Literária São Boaventura (Reverendos Padres Capuchinhos) é coproprietária da tipografia do Staffetta Rio-Gran-dense, pertencentes, acessórios e tudo o mais em proporção ao capital com que entrou e que na mesma proporção tem direito a todos os lucros”.

De 1918 a 1921, os capuchi-nhos adquiriram as cotas que ain-da não lhes pertenciam. Dia 12 de janeiro de 1921 é a data da oficia-lização da compra do jornal pelos capuchinhos, em proposta escrita de cessão de sua parte na tipogra-fia aos mesmos capuchinhos.

Os contatos de Carmine Fasu-lo com frei Bruno e as incursões eventuais dos capuchinhos fran-ceses no município, especial-mente no atual território de Nova Roma do Sul, motivaram o páro-co de Caxias a criar um periódico dirigido aos católicos, coisa que o capuchinho, como estrangeiro, não podia concretizar. Assim, La Libertà “scende per la prima volta nell’arena giornalistica” em 13 de fevereiro de 1909, com boa aceitação.

Em 5 de maio de 1909, quando La Libertà estava no nº. 15, toma posse como pároco outro ex-pa-lotino, padre Francisco Baldas-sarre, cuja gestão durou quatro meses, com grandes desenten-dimentos com os fabriqueiros e o povo. O jornal, agora sob a direção de Baldassarre (Fratelli Baldassarre), “tornou-se inútil e escandaloso, insultando sacerdo-

tes, fabriqueiros e fiéis.”

Il Colono Italiano - Entre o nº. 44 e o nº. 45 do jornal transcorre um mês. O nº. 45 do La Libertà circula com a data de 15 de ja-neiro de 1910, editado em Gari-baldi e tendo como diretor padre Giovanni Fronchetti. Na capa é estampada a aprovação episco-pal, onde Fronchetti acrescenta ter recebido aprovação verbal de dom Claudio José para assumir a direção do La Libertà, em 27 de dezembro de1909.

Na mesma edição, o novo di-retor acha justo que se retome o mesmo “Programma” do La Li-bertà, que havia enfrentado tantas dificuldades. Reafirma que o jor-nal será católico, mas não se ocu-pará exclusivamente de assuntos religiosos. “Anzi, La Libertà sara per eccellenza l’amico, il consi-liere, la difesa del colono”.

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Agricultura 17CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

modernização agrícola só seria viável se os solos fossem recuperados. Em

artigo publicado pelo padre Ben-jamim Busato na coluna “Polí-tica e Colônia”, afirma que é “... pouco atraente a vida do colono, carece de conforto”. Para mudar essa realidade, diz que “... é pre-ciso começar por corrigir a terra” (9.04.52). O cuidado demandado por um solo esgotado e improdu-tivo das colônias era, portanto, o ponto de partida para a introdu-ção de novas raças e variedades de vegetais. Quem irá encarregar--se dessa tarefa será o agrônomo, botânico e extensionista Dr. José Zugno, cujos textos foram publi-cados na Coluna “Vida Agrícola” a partir de 29 de abril de 1953 até sua morte no dia 9 de março de 2008, aos 83 anos. Sua colabora-ção durou 55 anos ininterruptos. Podemos, então, considerar José Zugno como a referência do novo modelo de agricultura, fundado na diversificação da produção, no cuidado permanente do solo e na busca de formas coletivas e orga-nizadas dos produtores para terem acesso aos consumidores através de cooperativas, associações, fei-ras urbanas com vistas a uma pro-dução quantitativa, qualitativa e diversificada.

O tema do solo estará sempre presente em seus textos com es-clarecimentos sobre seus com-ponentes, as causas que o torna-ram improdutivo, em particular a erosão e a queima da matéria orgânica. Os meios de recuperá--lo estão ao alcance do colono: curvas de nível, terraços, preser-vação das restevas, adubação ver-de, compostagem, uso racional de resíduos animais adequadamente processados em estrumeiras, jun-tamente com a adoção de semen-tes e plantas melhoradas disponí-veis nas estações experimentais, assim como aves, suínos e vacas leiteiras de novas raças. Reco-mendava especial cuidado com os mananciais de água da proprie-dade; com o conhecimento cada vez mais preciso dos micro-or-ganismos existentes no solo, com os vegetais e sua importância no melhoramento do solo.

Esse é o quadro por onde se mo-via José Zugno na sequência de artigos iniciada no dia 6 de maio de 1953. É importante salientar a metodologia por ele adotada, a partir do terceiro artigo por ele publicado, quando introduz um espaço para as “consultas” dirigi-das a ele pelos leitores do jornal. Esse método, justifica Zugno, traz à tona os problemas que afetam não apenas o autor da consulta, mas a maioria dos colonos, além de reforçar seu papel estratégico no processo de modernização do sistema vigente de produção. É o colono o protagonista do processo que deverá revolucionar suas prá-ticas de produção.

Se, por um lado, o avanço da modernização caminhava de for-ma sustentada e criava condições para a sobrevivência dos agri-cultores, a conjuntura política, marcada por uma intensa guerra contra o comunismo, um refle-xo da guerra fria, travava qual-quer possibilidade de resolver o problema de acesso à terra que afetava a maioria dos filhos dos agricultores. A reforma agrária era inadmissível porque “... é coi-sa de comunista e, por expropriar a terra de seus proprietários viola o direito sagrado da proprieda-de”, afirmavam os bispos Geral-do Sigaud e Castro Mayer, tese adotada pelo clero do Rio Grande do Sul, que intensificou sua ação junto aos colonos mediante con-gressos, encontros e conferências para tratar da questão agrária e fazer frente à ação das esquerdas. Essas iniciativas culminaram, em 18 de outubro de 1961, com a criação da Frente Agrária Gaú-cha, cujo objetivo consistia em reforçar a organização sindical dos colonos sob a orientação di-reta da Igreja. Admitia-se a refor-ma agrária, primeiro em terras do governo, depois em terras que se-riam vendidas aos agricultores do mesmo modo como se procedera até então com todos projetos de colonização. Essa tese, entretanto, não levava em consideração que a fronteira agrícola estava esgotada e que as novas terras possíveis de

colonização estavam sendo rapi-damente apropriadas por grandes empresários e agricultores, forte-mente capitalizados, nas antigas áreas de campo do Planalto do Rio Grande do Sul e nas vastas terras do Mato Grosso, Goiás e Amazônia. O padre Benjamim Busato, que vivia em Passo Fun-do, centro difusor da segunda modernização da agricultura sob o comando do grande capital industrial e financeiro, advertia que “as terras vermelhas ficam cada vez mais preciosas e que os agricultores que as arrendam dos fazendeiros, antigos criadores de gado, rapidamente são por eles compradas” (16.2.55). Nasceu, assim, a segunda modernização da agricultura.

Os debates sobre a questão agrária, a busca de alternativas para os colonos sem terra e a guerra contra as ameaças do comunismo, silenciaram com o golpe militar de 1964, amplamente apoiado pela Igreja. O regime militar adotou uma estratégia para resolver o problema da terra, que consistiu na erradicação do minifúndio e do latifúndio improdutivo e sua transformação em propriedades produtivas de grande porte, tanto para a produção de grãos quanto de gado. Os projetos de colonização que o governo implementou na Amazônia para os pequenos agricultores pereceram pelos obstáculos

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Santa Rosa: John Murdock (e), autor da Operação Tatu, que revitalizou o solo gaúcho, e Arni Heimerdinger

impostos pela natureza e pela imensa dificuldade de integrar a produção no mercado nacional. Esses agricultores converteram-se em mão de obra disponível para as grandes propriedades, que devastavam o meio ambiente a uma velocidade jamais vista ou regressaram para seus estados de origem. Aos poucos, a Igreja começou a entender que o modelo imposto pelo capital não atendia os interesses da maioria dos trabalhadores do campo. O Correio Riograndense, agora sob a direção dos jornalistas freis Aldo Colombo e Moacir P. Molon, abriu o jornal para um amplo debate sobre a questão da terra, da reforma agrária, dos emergentes movimentos sociais do campo, assim como uma crescente crítica ao modelo da segunda modernização, imposto pelo grande capital, cujos resultados refletem-se na ampliação do desastre ambiental, na concentração da terra num diminuto número de proprietários e reduzindo o mundo agrário a um mero negócio, melhor, a um agronegócio. A manchete da edição de 11 de janeiro de 2017 marca essa realidade: “Desigualdade marca o Brasil rural. Menos de 1% das propriedades agrícolas detém quase metade da área produtiva do país”.

Voltemos um pouco no tempo. A luta dos movimentos sociais e ecológicos pela terra, por um novo projeto de desenvolvimento agrário fundado na preservação da natureza e por um projeto de reforma agrária renascem com vigor à medida que se debilita e extingue a ditadura militar, ga-nhando crescente apoio da Igre-ja. O modelo de agricultura que emergia dos movimentos sociais do campo rejeitava o domínio ab-soluto do capital que controlava todas as instâncias dos meios de produção e do mercado e propu-nha um novo protagonismo para

os trabalhadores. Esse modelo consistia em voltar à terra não simplesmente como um lugar de exploração e negócio, ou agrone-gócio, mas o lugar onde todos os seres vivos encontram sua casa e que é preciso preservar sob pena de ameaça de extinção da vida.

Nasce, gradativamente, a agri-cultura ecológica, que vai buscar subsídios nos avanços da ciência e nas experiências acumuladas da primeira modernização, vol-tada para a conservação do solo, com suas curvas de nível, adu-bação verde, uso racional dos dejetos animais, recuperação de sementes e de animais ameaça-dos de extinção. Os ensinamentos de José Zugno ganharam novo sentido e passaram a fazer parte daquilo que podemos denomi-nar a terceira modernização da agricultura, que o Correio Rio-grandense, sob a direção dos já citados editores capuchinhos freis Aldo Colombo e Moacir Molon, reservou espaços cada vez mais amplos destinados a tematizar os múltiplos aspectos da agricultura, seus problemas; da educação para uma visão ecológica do mundo, da emergência das mulheres tra-balhadoras reivindicando e con-quistando o reconhecimento de sua cidadania, sobretudo, de uma alta politização da questão agrária e agrícola e do destino da huma-nidade profundamente ligado ao modo como cuidaremos do nosso planeta Terra, nossa casa e de to-dos os seres vivos que nela habi-tam. Os debates ganharam novos impulsos com a colaboração de pessoas altamente comprometi-das com a nova visão de mundo: Leonardo Boff, um dos autores da Carta da Terra, frei Betto e Maria Clara Luchetti Bingemer, diri-gindo um olhar político e crítico sobre a questão ecológica, sobre a desigual sociedade brasileira, assim como uma dimensão teo-lógica sobre os emergentes novos modos de viver. O Correio Rio-grandense converteu-se, assim, no único jornal em circulação que divulgou uma visão de mundo com profunda e ampla visão eco-lógica e humanista.

É por isso que o Correio Rio-grandense, com sua consagrada capacidade de auscultar tendên-cias e de produzir e distribuir con-teúdos qualificados, atualizados e até proféticos, merece continu-ar sua missão de disponibilizar pensamento inovador e análises significativas, daqui para frente – conforme prometido –, numa moderna e ágil plataforma digital.

Vida Agrícola, referência do novo modelo de agropecuária

* Dinarte Belato

Graduado em

Filosofia, mestre

em História e

autor de livros.

Paraná: jornal acompanhou atividade agropecuária rumo a SC e ao PR

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História 5CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017

m 1912, alguns sacerdotes se prontificaram a fundar um jornal genuinamen-

te católico e italiano. A ocasião surgiu no mesmo ano, quando o jornal Bento Gonçalves, de Jú-lio Lorenzoni, parou de circular. Em seu lugar surgiu o Corriere d’Italia, tendo como redator- chefe o padre Estevão Minetti. Com a saída de Minetti, vieram as dificuldades, obrigando o pa-dre Poggi a bater às portas do pa-dre Enrique Preti, dos missioná-rios scalabrinianos, que colocou dinheiro e designou o padre João Constanzo para dirigir o jornal. Ficou no cargo até 1917, sendo substituído por padre Carlos Por-rini, até 1921, e pelo padre José Foscallo. Esses dois últimos, des-de o início dos anos 1920, tenta-ram uma fusão com o Staffetta Riograndense, dos capuchinhos, editado em Garibaldi.

Em 8 de abril de 1925, frei José formalizou uma proposta de fusão ao padre Enrico Pre-ti, superior dos scalabrinianos. Algumas cláusulas: os capuchi-nhos manteriam somente o Sta-ffetta, nenhum outro jornal; não aceitariam a direção de um novo jornal; caso o Staffetta fosse fun-dido com o Il Corriere, o novo jornal deveria ter um novo nome; se houvesse fusão, o maquiná-rio deveria ser comprado meio a meio; caso os carlistas quisessem comprar o Staffetta - “che và a gonfie vele” (de vento em popa) -, o preço seria de 42 contos de réis pelo maquinário e materiais e 25 pelos assinantes.

De Guaporé, em agosto de 1925, padre Preti escreve mar-cando um encontro para nego-ciar. Como não houve enten-dimento para a fusão dos dois jornais, freis José, Exupério e Candido assinam nova proposta, em 12 de agosto de1925, dizen-do que estavam dispostos tanto a vender o Staffetta quanto a com-prar o Il Corriere.

Na documentação, segue uma “declaração” conjunta de frei Candido Bampi e padre Aneto Bagni, scalabriniano, assinada em Bento Gonçalves, com data de 7 de junho de 1927, estabele-cendo as condições da fusão. O novo jornal sairá na data da pri-meira edição de julho de 1927, conservará o título Staffetta Rio-grandense, mas manterá como subtítulo Il Corriere d’Italia.

Nas edições de 22 e 29 de junho de 1927 comunica-se a fusão dos dois jornais a partir da primeira edição do mês de julho. O jornal, com sede em Garibaldi, “será o porta-voz dos sentimentos católi-cos dos nossos bravos colonos”. Já na edição de 6 de julho de 1927 se comunica que a redação do Il Corriere em Bento Gon-çalves não existe mais e que, em Garibaldi, a direção conta com o apoio dos agentes do Il Corriere,

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Trem: embarque de malotes com exemplares do jornal, em 1959, saindo de Caxias do Sul para a região Sul

Caxias do Sul: equipe prepara envio da edição dos 100 anos

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Gene da longevidade se deve à linha editorial

todos mantidos e considerados a mão direita do jornal. As edições com dois títulos circularam de 6 de julho a 31 de agosto de 1927. Na edição de 7 de setembro de 1927 já não há dois títulos e o Staffetta estreia.

Transferência - Por questões de logística, o diretor frei Síl-vio Armiliato obtém, em 12 de dezembro de 1950, autorização para a transferência do jornal para Caxias do Sul. Graças a um empréstimo de Cr$ 100.000,00 junto à Previdência do Sul e “a ofertas de Caxias e alhures”, em pouco mais de um ano as insta-lações junto ao convento dos ca-puchinhos, no bairro Rio Branco, já permitiam receber a máquina impressora e toda a tipografia vindas de Garibaldi. A primei-ra edição do jornal, após o seu retorno à cidade de origem, foi em 4 de junho de 1952. O jornal permaneceu no bairro até o final de 1998, quando foi para as atu-ais instalações no bairro Desvio Rizzo.

Ainda em 23 de abril de 1952, a tipografia do Correio Riogran-dense foi registrada com a deno-minação de Editora São Miguel, propriedade da então Sociedade Literária São Boaventura. Hoje, 8 de fevereiro de 2017, fica a Editora e o CR sai de cena.

Difícil isenção - A edição nº. 1, de 13 de fevereiro de 1909, já deixava claro que o jornal devia ficar longe da política partidária. Il nostro programma, o histórico projeto editorial, foi constante-mente assumido ao longo dos 100 anos do Correio Riogran-dense. Os capuchinhos, em 1917, sentiram de perto o que signifi-

cava o jornal ter opção política (o editor-proprietário, padre Gio-vanni Fronchetti, tirolês, apoiava a Áustria quando a I Guerra eclo-diu).

O jornal foi salvo ao manter-se longe das opções políticas e nacionalistas. Na gestão de frei Cândido Maria Bampi, em 10 de maio de 1928, foram baixadas normas objetivas para a redação do Staffetta. Uma delas era: “Evi-tare qualunque política di partito o de nazionalità”.

As normas eram uma coisa, a prática, porém, outra. Em dife-rentes contextos políticos o jor-nal tomou partido, como quando abraçou o fascismo de Mussoli-ni. Para o jornal, a Itália passou a ser a nação modelo. O jornal defendeu ardorosamente os to-talitarismos, desqualificando a democracia. Mas, 1941, também foi o ano da virada nas posições do jornal. Assim mesmo, quan-do o Papa condenou o fascismo, o jornal demorou a publicar os seus pronunciamentos, isto é, ba-lançou entre duas preferências.

No contexto regional, o Cor-reio Riograndense representava grande força. De 1945 a 1955, tempo de vários embates eleito-rais, caravanas iam visitar o jor-nal com o objetivo de mendigar uma recomendação ou um elo-gio. Foram movimentadas, por exemplo, as visitas de Juarez Távora, Milton Campos e Jânio Quadros. Foram eventos do gê-nero que fizeram dom José Baréa exclamar: “Agora conheço a for-ça do Correio Riograndense!”.

Programa - Ao lado das lutas que fortaleceram o Correio Rio-grandense, também estão os fa-tores que sustentaram a sua lon-gevidade. Dois se sobressaem: as características do conteúdo e da linha editorial – expressas na edi-ção nº. 1, de 13 de fevereiro de 1909 – e a aquisição do jornal pe-los Capuchinhos do Rio Grande do Sul e sua inserção no projeto de evangelização desenvolvido desde o início do século XX.

A definição da linha editorial vem de Carmine Fasulo, no La

s missionários e os párocos das regiões de colonização italiana entendiam que se-

ria imprescindível para sua ação missionária e paroquial dispor de um jornal para dar aos colonos assistência religiosa, transmitir os ensinamentos da Igreja, con-selhos e orientação agrícola e co-mercial. Era preciso defender os colonos dos inimigos da Igreja e dos especuladores e exploradores comerciais.

Em 1909, mediante um acordo entre os capuchinhos e o vigário da paróquia de Garibaldi, Gio-vanni Fronchetti, que adquirira o jornal caxiense La Libertá, surgia o jornal Il Colono Italiano, que manteve essa denominação até 1917, quando passou a denomi-nar-se Staffetta Riograndense e, em 1941, Correio Riograndense. Em março de 1910, o padre Fron-chetti, diretor do jornal, afirmou que “o escopo do jornal deve ser o colono italiano e sua função atender suas necessidades... A di-reção de Il Colono Italiano esfor-çar-se-á para que o jornal seja o amigo, o conselheiro e o defensor dos Filhos da Bela Pátria”.

O jornal, sempre atento às con-junturas religiosas, sociais, eco-nômicas e especificamente agrí-colas, por três vezes mudou seu foco e o modo de tratar as ques-tões que mais afetavam os colo-nos. A primeira, que vai de 1910 ao término da década de 50, tem como preocupação o contínuo movimento migratório dos colo-nos para as frentes de coloniza-ção, em busca de “terras novas” para os numerosos filhos que cada família possuía. Repetia-se, portanto, o que ocorrera nas co-lônias velhas, em particular, dar--lhe assistência em relação aos produtos mais demandados pela população urbana, que crescia continuamente. O Rio Grande do Sul, que fora um mero exportador de charque para o mercado con-sumidor do Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, com a che-gada dos imigrantes, já tinha con-solidado, em 1917, a produção e a exportação para os centros consumidores do Brasil de uma ampla lista de alimentos: banha, trigo, arroz, feijão, milho, batata, farinha de mandioca, erva-mate, vinho, aguardente e matérias-pri-mas industriais: casulos do bicho da seda, linho e madeira de lei exportada em barcaças pelo rio

Uruguai até Buenos Aires e, de lá, para os mercados dos Estados Unidos e Europa.

Para melhor entendermos como o jornal organizava o “aconselha-mento” dos colonos, tomamos como exemplo a produção de uvas e vinhos, cultura importante para um grande número de colo-nos nas colônias velhas e novas. Os “conselhos” diziam respeito ao solo adequado para o cultivo da parreira, que deveria ser seco, pe-dregoso e com inclinação de coli-na, jamais na planície (7.1.1911); os parreirais devem ser implanta-dos com orientação solar norte-leste, jamais sul (4.2.11); ao uso dos insumos químicos (sulfato de rame e cal) para o tratamento das doenças das parreiras (po-ronospora) e também das bata-teiras e tomateiros (7.1.1911). A coluna “Conhecimentos Úteis” indicava aos colonos como de-veriam acondicionar o vinho em recipientes adequados e devida-mente higienizados. Orientava-os também nos procedimentos para fazer “i secondi vini ou vineto” e controlar a doença chamada “la fioretta” (11.03.1911). Na co-luna “Interessi dei Coloni”, de 2.02.11, o jornal denuncia a prá-tica de falsificação do vinho: “... dentro (das cantinas), ao longo do ano, se manipula e se fabrica por inteiro (sem uvas) o vinho” e isto prejudica profundamente os viticultores e os consumidores. O jornal apela ao governo para que puna severamente os falsifi-cadores (25.02.11). Esse tipo de denúncia repetir-se-á, periodi-camente, até a década de 1970,

quando os mecanismos de con-trole tornaram-se mais eficazes.

Em Garibaldi, de 23 a 25 de março de 1913, foi promovida a primeira exposição de uva do mu-nicípio. O que chama a atenção é que foram expostas 34 varieda-des de uvas então cultivadas em Garibaldi. Além da isabel e qua-tro variedades de moscatel (mos-catello bianco, moscatellone, moscatello piccolo, moscatello di Gesù), projetavam-se a tre-biana, corvina, barbera piccolo, riesling reno, nebiolo e malvasia. Manuelle Peterlongo expôs 20 variedades de uva e foi premiado com medalha de ouro. Seu vinho também foi premiado com meda-lha de ouro (1.3.1913). Em 1949, na tabela do preço mínimo das uvas, apareceram novos varietais na já longa lista existente desde o início do século: hebermont, merlot, cabernet e peverella. De 1910 até inícios da década de 50, todos os temas, questões e pro-blemas do cultivo das uvas, sua industrialização, mercado, até a mesa do consumidor, no jornal, eram objeto de investigação, análise, aconselhamento e deba-te. O mesmo ocorre, em menor

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Paraná: novo ciclo da agricultura é a produção orgânica, aproveitando recursos da própria propriedade

# COLONIZAÇÃO

Correio Riograndense conduztrajetória da agricultura familiar

Centenário, o jornal, como meio de comunicação, ligou entre si as velhas e as novas colônias

Libertà, em 1909, e é assumida por Giovanni Fronchetti, a partir de 1910, e vem sendo mantida pelos capuchinhos há mais de 100 anos. O programa editorial na capa da primeira edição é muito claro: “Nosso jornal será semanal e de índole clara e es-sencialmente católica...; será papal no mais estrito sentido da palavra” (Il Nostro Programma, ed. nº. 1, 13.02.1909, p. 1).

A confissão católica e papal não fez do La Libertà um jornal só de conteúdos da fé cristã ca-tólica e de suas expressões reli-giosas. Manteve-se aberto aos temas da agricultura, indústria, saúde e medicina prática, “coisas que consideramos não só úteis, mas também necessárias ao de-senvolvimento da vida social”. “La Libertà sarà anche ricca de notizie mondiali, e più specifica-mente d’Italia e di questo Stato di Rio Grande del Sud (...) e de-cisamente aliena della politica partidaria”, diz o editorial.

Tais linhas editoriais somadas à capacidade de sempre atualizá- las, dando-lhes expressões con-temporâneas, são as verdadeiras bases da longevidade do Correio Riograndense. Nas últimas déca-das, o tema da responsabilidade e ética ambiental, por exemplo, está entre os que mereceram mais destaque na pauta editorial.

O segredo da longevidade do jornal estava também na capa-cidade de construir e manter a fidelidade de seus leitores e na logística de distribuição. O jor-nal sempre valorizou a figura dos agentes, fator que lhe garantiu uma penetração inigualável e di-ferenciada. O agente foi valori-zado desde os primeiros anos de circulação.

CR1909 - 2017

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Agricultura 16CR1909 - 2017

Texto de Dinarte Belato*Ijuí - RS

medida, com as demais culturas e criação de animais praticadas pelos colonos. A partir de 1917 até o fim da década de 50, o jor-nal dedicou especial atenção aos ataques e devastações causadas por ataques de “nuvens de gafa-nhotos” (6.9.17). Essa praga, de conotações bíblicas, só foi ex-tinta quando o pó de gafanhoto (BHC), distribuído pelo governo, passou a ser utilizado em ampla escala pelos colonos.

O jornal nos dá também um claro quadro sobre a evolução e o aperfeiçoamento gradativo dos meios de produção e insumos utilizados pelos colonos, seu sis-tema de fabricação, em particular das ferramentas, do transporte de carga e das trilhadeiras.

O Correio Riograndense acom-panhou os colonos em sua con-tínua expansão em direção ao noroeste, norte e leste do estado e, depois, ao oeste de Santa Ca-tarina e sudoeste do Paraná, repe-tindo os mesmos problemas en-frentados por seus antepassados quando chegaram em Caxias do Sul, Garibaldi e Bento Gonçal-ves. O Correio Riograndense era, por isso, um meio de comunica-

ção que ligava entre si as velhas e novas colônias, levava aos colo-nos os dados básicos da conjuntu-ra agrícola: produção, demandas e preços, assim como das políti-cas públicas relacionadas com a agricultura. Para os colonos, que não dispunham de outro meio de comunicação, o jornal era seu mensageiro e fonte de informa-ção indispensável.

Na década de 50, ficou claro para o jornal que o modelo de agricultura e pecuária praticado pelos colonos não mais poderia ser sustentado, pois se fundava historicamente na exploração in-tensiva da fertilidade natural dos solos, acarretando uma contínua queda da produtividade e um crescente empobrecimento dos colonos, fenômeno visto pelo clero como um grave problema social, com sérios efeitos sobre a cultura e a vida das comunidades rurais, base social da Igreja. Era preciso, portanto, apostar num novo modelo, que já emergia nas políticas públicas do estado e em muitas propriedades e contava com a atuação de um corpo téc-nico de agrônomos e veterinários.

A essa tendência em curso, de-nominaremos de primeira moder-nização da agricultura. Os artigos do novo sistema de produção eram publicados, a partir de 1950, numa coluna intitulada “Vade-mecum dos Agricultores” com textos copiados da revista Chá-caras e Quintais (12.02.1950). É interessante observar que o tema dos solos, cuja conservação e melhoramento passaram a ter um tratamento sistemático, veio acompanhado do incentivo à di-versificação da produção median-te a introdução de novas culturas, como as do tungue (29.03.50), das oliveiras, das novas variedades de trigo desenvolvidas nos centros de pesquisa do estado, denomi-nadas Frontana, Cincasa, Lajea-dinho e Montanhêz (22.03.50). A produção pecuária moderni-zava-se para atender à crescente demanda de carne suína e seus derivados. Foi viabilizada com o surgimento dos frigoríficos de su-ínos, a introdução de novas raças importadas dos Estados Unidos e da Europa: Doroc, Landrace, Large White; o mesmo aconteceu com a produção de leite através da importação de vacas leiteiras Holandesa e Jersey e de galinhas das raças Plimouth Rock Barra-da, Orpington, Leghorne e Rhode Island Red.

►►►Sertão Santana: junta de bois ara solo em propriedade familiar

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CRCorreio Riograndense sempre se preocupou em promover a multiplicida-

de de pensamento. O primeiro nome do Correio Riograndense, La Libertà, já definia o estilo jor-nalístico. Seria jornal de opinião. A liberdade proclamada não seria em relação à Igreja, uma vez que se definia como papal. A liberda-de, de pensar e escrever, visava alguns grupos específicos da re-gião, considerados anticlericais, com influência da maçonaria.

Nos primeiros 20 anos qua-se não apareceram artigos assi-nados. Seu conteúdo refletia a opinião da Igreja. Era a verdade oficial, que dispensava nomes e assinaturas. Questões mais can-dentes eram abordadas pela dire-ção do jornal, especialmente no tempo de dom Carmine Fasulo.

O polêmico monsenhor Ascâ-nio Brandão pode ser conside-rado o primeiro colunista. Foi chamado de apóstolo da Boa Im-prensa. Por quase 20 anos com-pareceu regularmente nas pági-nas do jornal, num estilo bastante agressivo. Também neste tempo foram publicados artigos do es-critor gaúcho Ernani Fiori.

Na edição de 1° de maio de 1949 aparece a primeira contri-buição do padre José Busatto. Ele abordava assuntos gerais. Outros artigos eram assinados por pseu-dônimos ou pelas letras iniciais do nome. Regularmente apare-ciam Cartas Circulares de dom João Becker (Porto Alegre), An-tônio Reis (Santa Maria) e José Barea (Caxias do Sul). O jornal mantinha espaço para o papa Pio XII, dando importância às rádio-mensagens, dirigidas - Urbi et orbi - a Roma e ao mundo.

Com o passar do tempo cres-ceu o número de artigos assina-dos. É o caso do frei Mariano de Alfredo Chaves e do frei Luiz Ferronatto. O primeiro num esti-lo mais literário, enquanto o frei Luiz era cáustico e polêmico.

Paraná - Em abril de 1951 fazia sua estreia no jornal o pro-fessor Vicente Barroso. Paulista, conheceu o norte do Paraná e a incipiente colonização. Numa longa série de artigos, Vicente Barroso fala das possibilidades do “famoso norte do Paraná”. Foi um incentivador das migra-ções gaúchas para aquele estado. Barroso escreveu artigos e repor-tagens até o começo da década de 70. Na edição de 2 de maio de 1951 aparece o primeiro arti-go assinado pelo frei Bernardino de Vilas Boas. Outras vezes assi-nava apenas frei Bernardino ou

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Espaço permanente à reflexãoA credibilidade dos textos publicados se apresenta como o grande trunfo do jornal

# COLUNISTAS

frei Bernardino Vian. Escrevia de Portugal, para onde fora em mis-são. Destaque ainda para frei Fi-delis Dalcin Barbosa e frei Odo-rico Dalmolin, que trabalhava na Cúria Geral, em Roma. Eram janelas desde a Europa. Frei Ber-nardino comandou uma equipe de missionários que varreu o país com a imagem de Nª Srª de Fá-tima. Seus retumbantes sucessos apareciam nas páginas do Correio Riograndense em artigos.

Neste mesmo ano começaram a aparecer artigos do frei Teodoro Ferronatto. Em outubro de 1951, surge pela primeira vez um arti-go do padre Benjamim Busatto. A coluna permanente se intitu-lava “Política e Colônia”. Padre Benjamim, com o pseudônimo de Chico Tasso, visava a partici-pação política dos agricultores. Missionário no Brasil Central, frei Luiz Maria de Tomás Flores, também conhecido por Ricardo Liberali, enviava matérias abor-dando rios desconhecidos, tribos semicivilizadas, cobras e árvores gigantescas do Mato Grosso.

Caipira - Na edição de 8 de outubro de 1945, os leitores do Correio Riograndense encon-tram uma novidade: Correspon-dência Caipira, coluna assinada por um tal de Zé Fernandes. Era o pseudônimo do frei Dionísio de Antônio Prado, que teria papel destacado no jornal por 25 anos. Também usava o pseudônimo de Pimentinha. O jornal, que come-çara em italiano e passou depois para o português, abria-se agora para o linguajar gaúcho e caipira. O primeiro artigo tinha como tí-tulo: Vortô tosquiado.

Aos poucos foram aparecendo mais artigos assinados: frei Ar-canjo Bisotto, que seria, mais tar-de, editor do jornal, frei Alberto Stavinski e outros. No fim da dé-cada de 60, os padres Pedro Luiz e Benjamim Miotto começaram a escrever com regularidade. Em 29 de abril de 1953 José Zugno assina a primeira coluna Vida Agrícola, que escreveria por qua-se 55 anos.

Em 1964 aparece a primeira contribuição do jovem jornalis-

ta Victor Faccioni. São também significativas as participações do padre Antônio Galiotto, destacan-do a importância da Frente Agrária Gaúcha e dos Sindicatos Rurais. Neste sentido também destaca-se o nome do deputado Adolfo Pugina. Em 1967, Hélvio Remussi e Décio Dutra, dois jovens capuchinhos, mudaram o conteúdo e diagra-mação. Na edição de 13 de maio aparece uma coluna sobre um as-sunto até então proibido: futebol. Era a Bola na Rede, de frei Aldo Colombo.

Mudança - A edição de 28 de abril de 1970 marca profunda mu-dança. O jornal, até então standart, passou a ser tabloide e a cores. Fora adquirida uma impressora Goss Community, a primeira em offset no interior gaúcho. Mudou também o conteúdo do jornal, dan-do ênfase maior à notícia, sobretu-do visando os municípios da região colonial italiana. Por oito anos as-sumiu a direção um jornalista lei-go, Décio Osmar Bombassaro.

A página 4 do jornal foi definida como opinião. Além do editorial eram publicados mais dois artigos de opinião, com rotatividade dos autores: Mário Gardelin, Aldo Co-lombo, Ovídio Deitos, Jimmy Ro-drigues, Leonel Santin, Floriano Molon, Rovílio Costa, Luiz Alber-to de Boni e Geraldo Moser, entre outros. Os dois últimos enviavam contribuições da Alemanha. No corpo do jornal também aparece-ram contribuições, entre outras, de frei Jaime Biazus e Tasso de Lima Neto (Luiz Alberto de Boni). Eram temas distribuídos em dezenas de capítulos. Frei Evaristo Parisotto manteve, durante algum tempo,

uma coluna sobre a Ordem Franciscana Secular.

As colunas começaram a ter espaço maior. Artigos sobre vida matrimonial, assinados por Leonel (frei Leonel Santin), fo-ram publicados ao longo de 10 anos. Na edição de 16 de janei-ro de 1974 estreava novo colu-nista: Wilson João, capuchinho. “Wilson João dá o recado” era o título. O primeiro artigo: Doen-ça da Solidão. Em 25 de maio, padre Zezinho volta a compa-recer com “Um Minuto para Cristo”. No dia 10 de outubro de 1979 estreia Olhar Diferente, de Aldo Colombo.

Contraponto - Com o ob-jetivo de evitar o pensamento único, a direção do CR passou a publicar a coluna do Frei Bet-to, dominicano, que tem livre acesso aos principais jornais do Brasil. Frei Betto representa a corrente centro-esquerda da Igreja, afinada com a Teologia da Libertação. Sua primeira contribuição foi editada a 12 de janeiro do ano 2000. Em de-zembro do mesmo ano estreou o ex-frade franciscano Leonar-do Boff.

Por fim, no começo de 2004, começou a colaborar a teólo-ga leiga Maria Clara Luchetti Bingemer. Mais recentemente, entraram na história frei Jaime Bettega, com a coluna Olhar à Vida, e frei Luiz Turra, com a coluna No Coração da Vida.

O CR fez da opinião sua linha principal. O jornal ensina a ma-neira de entender as notícias. A credibilidade se apresenta como o grande trunfo do jornal. Doutor José Zugno: assinou coluna Vida Agrícola por 55 anos

Frei Wilson João: colunista deixou seu recado durante 39 anosFrei Aldo: da inovação, falando do futebol, até a coluna atual

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Opinião 6CR1909 - 2017

Cultura 15CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

ão há nada mais triste do que um necrológio. É como jogar uma pá

de terra sobre o caixão de um ente querido, um gesto que marca o fim de uma vida. O encerramento do Correio Rio-grandense em sua versão em papel é precisamente isto: o fim de uma época. O Correio Riograndense é um dos mais antigos e respeitados jornais em circulação no Rio Grande do Sul e no Brasil. Foi o segun-do jornal a circular em Caxias do Sul, tendo completado seu centenário em 2009. Com 108 anos de fundação, sua história é tão longa quanto sua impor-tância regional.

Ele foi fundado com o nome de La Libertá, em 13 de feve-reiro de 1909, no município, por Dom Carmine Fasulo. Transferido para Garibaldi, to-mou o nome de Il Colono Ita-liano, alterado depois para Sta-fetta Riograndense. Em 1921, passou à direção dos padres capuchinhos. Com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os jornais foram obrigados a se adaptar à exigência gover-namental de que circulassem em língua portuguesa. Em 10 de setembro de 1941 seu nome foi traduzido para Correio Rio-grandense. Durante a guerra, o jornal não teve cortada sua cota de papel, o que aconteceu com outros jornais brasileiros, já que o papel destinado à sua publicação era importado. No período da guerra, o jornal che-gou até a aumentar sua circu-lação. Em 1952, sua redação e gráfica foram transferidas para Caxias do Sul, onde funciona até hoje.

Desde o início, o Correio Riograndense destinava-se aos agricultores de origem italiana que viviam na zona rural dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul. Seu conteúdo e distribuição de seções se man-tiveram inalterados nos últimos 50 anos, sendo fundamental-mente ligados à cultura dos imigrantes italianos que povo-aram esses estados. De minha infância, guardo a lembrança da presença do Correio Rio-grandense nas casas de meus avós e de meus tios.

Segundo a Associação Na-cional de Jornais (ANJ) e o Mí-dia Dados, no Brasil circulam cerca de 4.000 jornais. Destes, apenas 27 têm 100 anos de ati-vidades ininterruptas. O Cor-reio Riograndense é o 26º mais antigo do Brasil e o quinto do estado do Rio Grande do Sul. Sempre foi um semanário. Nos últimos anos, contou com uma

tiragem de 12 mil exemplares.Sua linha editorial tem sido a

mesma no decorrer do tempo, apenas modernizando sua for-ma. Ela se se baseia nos seguin-tes termos: “[...] seu compro-misso de manter-se irredutível na defesa dos valores éticos e morais; de seguir estimulando a construção de relações comu-nitárias; de continuar apoiando quem produz na luta por uma recompensa justa e por uma merecida qualidade de vida; de contribuir para sedimentar com a generosidade, a tolerância, a fraternidade, a fé e o amor ao próximo as bases da família cristã e de uma sociedade sa-dia”.

O semanário, ao longo de sua história, tem servido como fonte de pesquisa. Uma dessas

pesquisas revelou que pelo tipo de reportagem apresentado seu interesse estava voltado à po-pulação rural, já que grande parte de suas informações re-feriam-se às condições climá-ticas, organização e orientação das atividades da agricultura e pecuária. Desde sua criação, mantém seções como infor-mações, abordando de forma cosmopolita temas mundiais, nacionais e regionais; artigos de opinião, voltados a assuntos mundiais, nacionais e regio-nais; saúde, com dicas de trata-mentos naturais; agronegócio e agroeconomia; imigração; ca-tolicismo, Igreja e a visão fran-ciscana do mundo e da fé.

O CR trazia informações úteis, como cuidar da horta e como garantir uma alimentação

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Laços: as mãos que fizeram o jornal e aquelas que o seguraram para lê-lo estabelecem profunda convivência

saudável e variada para a famí-lia. Também indicava remédios caseiros para doenças comuns. Até a década de 1960, manteve sua impressão em quatro pági-nas. Nas ocasiões festivas, era excepcionalmente publicado com páginas adicionais. Ape-sar da constante mudança no layout, observada a cada cinco anos, manteve até a década de 1960 uma página inteira para assuntos mundiais e outra para assuntos religiosos.

Minha tese de doutorado, que resultou na obra "As som-bras do Littorio - o fascismo no RS", baseou-se entre outras fontes nas edições da Stafetta Riograndense e do Correio Riograndense no período com-preendido entre 1922 e 1942, fontes que estão preservadas

no riquíssimo e bem organi-zado arquivo do semanário. Sem o auxílio do jornal, não teria sido possível reconstruir aqueles tempos e eventos que marcaram toda uma época. Na-queles tempos, o jornal era pe-queno e seu papel, seco e que-bradiço. Até hoje me lembro do ruído quando virava as páginas dos jornais muito bem encader-nados quando realizei minhas pesquisas.

O fato de deixar de circular em papel significa uma mu-dança mais profunda do que se pode supor. A internet pode ga-rantir a redução de custos e até um aumento de leitores, mas quebra o laço que liga o leitor com o objeto que é o jornal. Nenhum pesquisador do futuro poderá saber a cor dos jornais, o cheiro da tinta de impressão e a certeza que ele havia pas-sado por outras mãos. Esta co-munhão deixa de existir com os jornais virtuais. As mãos que fizeram o jornal e aque-las que o seguraram para lê-lo estabelecem laços profundos de convivência. Laços que se estabelecem entre os jornalis-tas e leitores, entre os leitores e os futuros leitores. Ora, isso nenhum jornal virtual poderá proporcionar.

Num tempo em que a gran-de imprensa tem-se vendido abertamente aos interesses do grande capital, como observou o pensador americano Noam Chomsky, ela “pode causar mais danos que a bomba atô-mica. E deixar cicatrizes no cérebro.” Foi essa situação incômoda que os leitores vi-venciaram na grande imprensa durante o annus horribilis de 2016 – que marca a história da imprensa brasileira com o adeus ao papel do Correio Riograndense. É pena que per-maneça viva e circulando em papel “uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e cor-rupta que forma um público tão vil como ela mesma”, no dizer do jornalista americano Joseph Pulitzer. E que deixe de circular de mão em mão, de lar em lar, um jornal como o Correio Rio-grandense, que traz análises, informações verificadas e úteis. Com ele, morre um tempo e um modo de vida. Resta a esperan-ça de que seus valores, sua re-putação e seu jornalismo de alta qualidade migrem intactos para o mundo digital.

Fim da saga do Correio Riograndense em papel

* Loraine Slomp Giron

Professora,

historiadora,

pesquisadora e

escritora

Expedição: com o fim da edição impressa do Correio Riograndense morre também um tempo e um modo de vida

Texto de Loraine Slomp*Caxias do Sul - RS

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Cultura 14CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

fenômeno da língua ta-liana o conheci quando vivi no Brasil, chegando

da Itália, cerca de 10 anos para estudar e fazer pesquisas, que tiveram como resultado o pro-jeto Cantando em Talian, uma pesquisa realizada na Itália e no Brasil, em relação ao fenômeno da imigração do Norte da Itália e do patrimônio cultural do povo oriundo em novas terras brasi-leiras. Meus livros Cantando in Talian e Descobrindo o Talian relatam a tradição, os usos, os costumes, a música, as canções e especialmente a língua, que ainda constituem o fio condutor entre as migrações do século XIX e as novas gerações de des-cendentes.

Esta pesquisa propõe-se a va-lorizar e promover a cultura e a história talianas, que nunca ti-veram espaço nas escolas e nos livros didáticos. Senti a necessi-dade de recolher os testemunhos e as experiências das pessoas que tive a sorte de conhecer na Itália e no Brasil, com o objeti-vo de criar uma ponte entre os dois mundos. É incrível ver ain-da hoje, após todos esses anos, o amor que bate nas comunidades ítalo-brasileiras pela terra natal dos antepassados. As palavras, as músicas, as canções e as emis-sões radiofônicas são veículos extraordinários para a transmis-são de valores, riquezas culturais que construíram o sul do Brasil.

Cucagna - Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e até Es-pírito Santo e Minas Gerais são os lugares que propiciaram um futuro e a esperança a muitos que acreditaram ter encontrado a Mèrica e a cucagna em terras acidentadas e desconhecidas. Saíam do porto de Gênova, com destino à Mèrica. Em poucas semanas as pessoas pisavam no novo mundo e eram destinadas a terras virgens e desconhecidas e, então, sozinhas e receosas, mui-tas vezes perdiam as palavras e a esperança. Neste contexto, o Correio Riograndense adquiria um valor único e inestimável, es-crevendo crônicas da Itália, his-tórias e informações úteis para aqueles que tinham chegado ao Brasil. Muitas vezes, publicava a lista de casamentos, os batizados e os funerais, informações que não havia como fazer chegar às pessoas a não ser pelo jornal, de-vido às grandes distâncias. Essas eram lidas e compartilhadas em torno de um fogon, em alguma remota linha ou colônia.

Eram informações lentas e so-fridas, que carregavam o peso de cada passo, nos caminhos da flo-resta ou das corridas feitas para relatar à família que aquele pa-

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Preservação: jornal ajudou a manter a história viva e forte, depois de 140 anos da imigração italiana ao RS

Gastronomia: Giorgia fazendo polenta, num evento em Concórdia

Carteado: descendentes de italianos herdaram o gosto pelo jogo

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Leitores do CR perdem uma janela para o mundo

rente distante, do qual ninguém sabia nada, estava ainda vivo. Palavras que enchiam o coração e a alma, linhas que alegravam aos sortudos que dominavam a leitura, letras que as pessoas tentavam capturar dos lábios de quem as liam, com o desejo de saber e poder, por um momento, sair da roça, do vale, dos locais de duro trabalho e cotidiano es-forço.

O Correio Riograndense sem-pre uniu as comunidades ita-lianas distantes, integrando-as

num território muito amplo e oferecendo-lhes uma identidade comum, unindo-as, amarrando-as às suas raízes. A linguagem utilizada era frequentemente o Talian, idioma formado graças à herança que os imigrantes trou-xeram com suas bagagens, te-souro único e profundo.

Em casa - Um jornal que descobri com alegria, surpresa e íntima emoção nos anos em que estava hospedada na casa de uma senhora que me mostrava

com orgulho as páginas dedica-das ao Talian. Um fenômeno que não conhecia ainda plenamente, mas que capturou meu coração e me fez sentir em casa, depois de vários meses ouvindo e falando unicamente o português.

Adorava ler as histórias conta-das no jornal, tanto que toda se-mana recortava as páginas para preservá-las e trazê-las para a Itália e torná-las conhecidas às pessoas mais queridas; mostrá--las aos meus conterrâneos e informá-los de uma realidade conhecida só nas famílias que tinham enfrentado diretamente o fenômeno da emigração. O CR apresentava notícias sobre a comunidade, a religião, os cos-tumes e as tradições, escritas de forma clara e, muitas vezes, com termos já esquecidos ou em de-suso na Itália.

Essas palavras tocavam minha alma, porque me lembravam dos dias passados no colo de minha avó, a ouvir histórias e rimas que abriam os olhos ao mundo de uma criança curiosa. Acompa-nhavam-me as músicas de Mam-ma Mia e Vecchio Scarpone que minha avó cantarolava continu-amente e enchiam os silêncios da vida cotidiana e de meu co-ração terno. Encantavam-me os refrões daquelas músicas popu-lares, que ecoavam na sala onde ela costurava todos os dias e me apaixonava daquele mundo doce e sincero, que depois encontrei nas famílias no Brasil.

História viva - O Correio Riograndense fala de famílias e comunidades, dando voz ao emigrante, a sua história e à ba-gagem cultural e imaterial que trouxe com ele durante as via-gens e a estabilização no Brasil. Para o imigrante que só ouvia a língua local, ler o CR significava viver um momento de grande li-berdade, e por um tempo se sen-tia perto da terra natal. O jornal, além de um belo trabalho sobre a identidade e a cultura da imigra-

ção, conseguiu comover muitos italianos do velho continente, mostrando-lhes como nossa his-tória consegue permanecer ainda viva e forte depois de 140 anos e 12 mil quilômetros de distância, derrubando o muro do tempo e do espaço com a força do amor pelas raízes e origens.

Um jornal local pioneiro no acompanhar muitas pessoas dis-persas, revolucionário em ofe-recer informações na língua de quem chegava de fora, engraça-do em aliviar os espíritos (e aqui se insere a figura do Nanetto Pi-petta, ícone da imigração) e se necessário capaz de tomar suas defesas, ao informá-los sobre os direitos e, no período da guerra, conclamar muitos imigrantes para ajudar sua terra natal. De-monstrou grande sensibilidade pelo leitor, que muitas vezes era também um escritor e protago-nista de sua história, tornando--se hábil em expressar seu pen-samento através das ciàcole da vida cotidiana. Representou li-berdade de expressão, contando ao nosso povo a vida, a história, a força e a fragilidade da epopeia das grandes migrações.

Voz que cala - Hoje o Correio Riograndense deixa de emocio-nar nosso coração e os leitores perdem uma janela para o mun-do, sua voz apaga-se para sempre e, por conseguinte, encerra tam-bém o contato com a sua comu-nidade. É um momento doloroso e é difícil aceitar o seu encerra-mento. Abandonar o que se ama profundamente e ao que muitos dedicaram uma vida inteira, abre uma ferida profunda difícil de curar, consciente de perder uma voz sincera e um grande presen-te que acompanhou a identidade, a dignidade, o sofrimento e as alegrias de uma imensa comuni-dade imigrante.

Fica a esperança de que todos os talianos, conscientes do valor deste jornal, possam evitar o va-zio que ameaça deixar um silên-cio ensurdecedor e remover uma voz tão significativa.

Texto de Giorgia Miazzo*Carmignano di Brenta, Pádua, Itália

Opinião 7CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

* Giorgia Miazzo

Nasceu em Pádua, Itália, é professora, intérprete, escritora e jornalista. Além de vários artigos em jornais e revistas na Itália e no exterior, escreveu

os seguintes livros: Cantando in talian. Imparar el talian co la mùsica, 2014; Descobrindo o talian. Viagem só de ida para Mèrica (em italiano e português), 2014, 2015; I miei occhi hanno visto. Storie di sguardi ed emozioni di viaggiatori e migranti, 2015; Le grandi migrazioni. Dal nord Italia al Brasile, 2016. Contatos com a pesquisadora italiana pelo e-mail: [email protected]; site: www.gior-giamiazzo.com; facebook: Giorgia Miazzo Cavinato; whatsapp: +39 3936511212

az parte da vida estar em cons-tante ritmo de mudança. Desde as realidades mais importantes

até as mais simples e insignificantes, em tudo e sempre há um clamor de mudança. Nosso nascimento é uma mudança! Passamos da proteção global do ventre de nossa mãe e mu-damos para um mundo desconheci-do e imensamente mais amplo, mas também inseguro. Nosso crescimen-to necessita e está todo envolvido em mudanças. Nossa partida deste mun-do é também uma mudança defini-tiva. Porque somos também história e fazemos história, estamos sempre em mudança.

O ritmo cotidiano da vida e da his-tória vai exigindo de nós mudanças rotineiras e simples, outras imprevis-tas e extraordinárias. Para podermos viver e conviver, seja com as pesso-as, seja com a atualidade dos avan-ços que a criatividade humana nos oferece, não há como nos fechar às mudanças. Mudamos de mentalidade; mudamos de comportamento; mu-damos modos de vestir, de nos alimentar, de nos relacionar conosco mesmos, com os outros, com o mundo e até mesmo com Deus.

Existem mudanças forçadas que demoram, mais ou menos, para serem assimiladas e in-tegradas em nossa mente, em nosso coração e até nos motivar em nossas ações. Existem mu-danças condicionadas à normalidade dos fatos, diante das quais podemos resistir, mas não temos como fugir. Existem mudanças que desafiam

nossa acomodação e se tornam provocadoras de avanços, tanto pessoais como sociais. Existem mudanças passageiras e outras profundas, como as de nosso tempo, que estão operando uma mu-dança de civilização.

Para nós, são melhores as mudanças que vão acontecendo e nos motivam a tomar decisões conscientes, livres e responsáveis. Estas também têm o seu preço, pois toda a decisão exige uma cisão, que não nos isenta de certa intensidade de dor. Falo assim acenando a mudança que, a par-tir deste número, o Correio Riograndense come-ça a concretizar.

Um jornal, mais que centenário, cujas mensagens foram elaboradas por tantas mentes e tantos afetos e passou por tantas mãos para ser lido e aprecia-do, passa agora para o formato online, mudando o modo de comunicar-se, mas mantendo e aperfeiçoando seus conteúdos formativos e informativos. O mundo da comunicação, e seus meios, acelera sempre mais seu ritmo de mudança.

Com certeza, o público de leitores mais antigo será o que mais sentirá esta mudança, mas também é bom pensar que uma multidão que não conhecia este jornal poderá, a partir desta mo-dalidade, ter contato e se apoderar dos conteúdos do Correio Riograndense.

Falando com Dom Itamar Vian, ar-cebispo emérito de Feira de Santana na Bahia, confirmou-me que o jornal mais antigo do estado, senão do Brasil, “Folha do Norte”, a partir de 2016 dei-

xou de circular na forma tradicional e passou a estar disponível de modo online. Quando Dom Itamar chegou a Feira de Santana recebia sete jornais. Hoje circulam apenas um diário e um semanário.

Correio Riograndense não vai parar, mas vai mudar seu caminho e seu modo de chegar. Cor-reio Riograndense não vai morrer, sua herança de ontem se manterá viva e sua presença dife-renciada de hoje facilitará o acesso ao mundo. Registro meu obrigado ao passado deste meio de comunicação e convido a confiar, na esperança, em seu futuro!

oram dias e dias pensando em como dar forma e conteúdo à crônica da última edi-ção impressa do Correio Riograndense.

Devo ter sido o último cronista a integrar a equipe que, semanalmente, brinda os leitores com temas e pontos de vista que convidam à reflexão. Foi necessário voltar, por uns instan-tes, às lembranças da infância para encontrar o ‘enredo’, a fim de agrupar harmoniosamente as palavras para encerrar o atual formato do nosso centenário jornal. Os sentimentos são muitos e diversos. A realidade, por vezes, impõe decisões que não dependem unicamente da vontade. Na verdade, não é um término, mas uma passagem, uma mudança. Não vivemos mais apenas num mundo físico e material. A tecnologia virtual in-filtrou o cotidiano e moldou outras maneiras de relacionamento e comunicação. O Correio Rio-grandense está no compasso desse novo tempo.

Nasci no interior de Caxias. Cresci em con-tato com o ‘pacote de jornal’ chegando sema-nalmente. O ônibus dava um sinal e deixava o Correio Riograndense à beira da estrada. Como éramos em vários irmãos e primos, alguém saía correndo para pegar o pacote. O nono, imigran-te italiano, era o agente. Depois da sua partida, o tio que ficou na casa paterna assumiu a mis-são. Por fim, meu irmão mais velho tornou-se o responsável, mas quem se encarregava da

distribuição era a minha saudosa mãe. Não deixa-va de ser um verdadeiro ritual semanal: o jornal era aguardado com expectati-va e emoção.

A continuidade dos es-tudos obrigou minha saída do interior. Como precisa-va trabalhar para garantir o sustento, fui acolhido como empacotador sema-nal do jornal. Até então, não havia pensado na vo-cação capuchinha. Foi o testemunho dos freis que despertou o chamado à vida religiosa e sacerdo-tal. Minha história fami-liar e vocacional sempre contou com a presença do Correio Riograndense. Seriam necessárias muitas edições e muitas páginas para registrar outras histórias de milhares de leitores. Com certeza, a missão foi cumprida. Gratidão aos que fizeram, distribuíram e leram o nosso centenário jornal, que trocou de nome, algumas vezes, mas nun-ca abandonou sua essência. Agora ele muda de

formato: deixa de ser impresso para ocupar um lugar no mundo virtual. Não estou me despe-dindo, pois iremos nos encontrar nesse novo es-paço. O ônibus já não entregará mais o pacote com os jornais. Mas ele estará na tela virtual, continuando sua importante missão.

F

F

Para podermos viver e

conviver, seja com as pessoas,

seja com a atualidade dos

avanços que a criatividade humana nos

oferece, não há como nos fechar

às mudanças

A missão foi cumprida.

Gratidão aos que fizeram,

distribuíram e leram o nosso

centenário jornal, que

trocou de nome, algumas vezes,

mas nunca abandonou sua

essência

Frei capuchinho, formado em Filosofia e Teologia. Pároco na Paróquia Santo Antônio, em Porto Alegre, RS. É também compositor e músico

Frei capuchinho, formado em Filosofia, Teologia e Administração. Pós-graduado em Gestão de Pessoas e Administração, mestre em Ética Organizacional

LUIZ TURRA

JAIME BETTEGA

As constantes experiências de mudança

Necessárias transformações para continuar a missão

No coração da vida

Luiz Turra: começou a escrever crônicas para o jornal em 28 de julho de 2010

Jaime Bettega: estreou como articulista do CR em 26 de junho de 2013

Olhar à vida

Page 8: Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de ... · nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal ... isso em face do santo batismo que nos elevou

Aldo Colombo: no dia 10 de outubro de 1979 estreou a coluna Olhar Diferente

Opinião 8CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

Cultura 13CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

elho Staffetta - centenário Staffetta - carre-gado de anos e de glórias, nos encontramos pela última vez. Em seguida, tu vais partir.

Para mim, será como perder um amigo, mais que amigo, um confidente, um familiar. Foi decidido, tu deves partir. Não há mais lugar para ti. Causa mortis: anemia, não tua, mas de muitos. Talvez você pudesse viver mais, mas aí entram em jogo algumas moedas...

Vou sentir muito tua falta. Tua visita semanal era uma festa, um raio de luz. Você me colocava a par de tudo, inclusive de notícias que a mídia sensacionalista despejava sobre nós. Você nos contava de novo os fatos, mas de maneira dife-rente.

Você me colocava a par dos preços agrícolas, dos que haviam morrido aqui no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina ou no Paraná. Você me falava de festas, de enchentes, da praga dos gafa-nhotos... Você dava uma importância toda espe-cial às notícias da Igreja.

Você me informou da eleição e da morte de uma dezena de papas. O primeiro foi Bento XV, em meio a uma Europa em chamas; depois, Pio XI, Pio XII. Com surpresa surgiu o desconhecido Papa bom, João XXIII, o Papa do Concílio. Cou-be ao seu sucessor - Paulo VI, um papa que não sorria - realizar uma obra monumental ordenando as imensas intuições conciliares. Depois houve a eleição do Papa João Paulo I e - apenas 33 dias depois - sua morte. Após 700 anos, um papa não italiano, o polonês João Paulo II, é eleito, vindo da Cortina de Ferro. A história caminha e o car-deal Ratzinger, um professor, é eleito, assumindo o nome de Bento XVI. Surpresa, espanto, o Papa renuncia e em seu lugar o Conclave busca, “no fim do mundo”, o Papa Francisco, com a doçura de seu protetor e uma coragem profética.

Também tu - velho Staffetta - me informavas de política. O Brasil tem um novo presidente, contava em junho de 1909: Nilo Peçanha. E de-pois, mais 33 presidentes, entre os eleitos, os im-postos, depostos, legítimos ou não.

Também revelavas as reviravoltas da Segunda Guerra Mundial, com 50 milhões de mortos, 28 milhões de mutilados e prejuízos materiais calcu-lados em um trilhão e 500 bilhões de dólares. De-pois, os sinos anunciando a paz, uma paz cheia de crises, com a Terceira Guerra Mundial apavorando a humanidade. Estados Unidos e União Soviética ameaçavam com seu arsenal de bombas, capazes de destruir o planeta Terra sessenta vezes. Em Berlim foi erguido o Muro - símbolo de uma época - que acabou derrubado pelos ventos da liberdade.

Muitos custaram a crer, mas o homem che-gou à Lua, um coração humano foi transplanta-do e nasceu um bebê de proveta. Há 100 anos, o Staffetta tinha apenas oito anos e Maria apareceu em Fátima. Mais tarde, a sua imagem peregrinou pelo Brasil, nos ombros dos missionários coorde-nados por frei Bernardino Vian, que contava aos assinantes as maravilhas de Fátima e suas pom-binhas. E o Concílio? Quantas notícias, falsas e verdadeiras. A Igreja caminha para trás, a Igreja caminha para frente... É primavera, é inverno... É o Espírito Santo, é o maligno. Aí veio a mis-sa em português e os padres deixando de lado as tradicionais batinas.

Houve um dia especial, em janeiro de 1924, que você me apresentou um novo amigo: Nanet-to Pipetta, nascido na Itália e vindo para a Amé-

rica “par catar la cucagna”. Ingênuo e esperto, ele imortalizou a saga da imigração italiana. Já naquele tempo, a miopia estava a postos e, num belo dia, um superior determinou: “L’è ora de fi-nirla con sto Nanetto”. E o pobre morreu - sem extrema-unção - nas águas do rio das Antas. De-pois, voltou por obra de Pedro Parenti, mas não era mais o Nanetto original.

Ao longo de todo este tempo, Staffetta, quanto bem você semeou! Muitos dos teus textos cor-riam pelo Brasil, eram copiados, “xerocados”, multiplicados. Artigos viraram livros e muitos universitários utilizaram teus temas e tuas pági-nas para trabalho de conclusão do curso. Quantos fatos pitorescos em tua história. Numa capela do interior, no domingo à tarde, um menino de dez

anos lia para os adultos, muitos deles analfabe-tos, as últimas notícias. Um assinante, depois de um dia de trabalho, ao clarão da lua folheava tuas páginas. Outro “sócio” - assim se chamavam os assinantes - guardava os exemplares sobre uma mesa, por ordem de chegada e, nos dias de chu-va, lia os primeiros, isto é, os mais antigos. Nada como o jornal de ontem!

Você foi cartilha, catecismo, Bíblia, igreja e es-cola para muitas gerações. Algumas vezes você

também se enganou. Isto faz parte da finitude humana. Mas como dizia o primeiro Editorial: “se um dia tiver de morrer, morrerá católico”.

Você parte, Staffetta, mas não será esquecido. Em tuas páginas, um dia, eu contei a história do sino. Numa aldeia de pescadores, numa rocha, bem perto do mar, existia uma pequena igreja, com seu tradicional sino. Ele anunciava os acon-tecimentos importantes: naufrágios, nascimen-tos, guerras etc. Numa noite de tempestade, uma onda descomunal levou a igreja e o sino para o fundo do mar. A aldeia ficou órfã e silenciosa. Um dia, um homem, desiludido, resolveu se afo-gar. Quando as ondas geladas estavam prestes a levá-lo para a morte, ele ouviu o sino tocar. E isto o fez mudar a decisão. Depois, de tempos em tempos, sobretudo nas horas de crise, algu-mas pessoas escutavam a voz do sino. Ouçam, o sino está tocando.

Você parte, Staffetta, mas de vez em quando voltará a falar. Quando os Capuchinhos feste-

jam 120 anos de presença no Rio Grande do Sul - com Gratidão, Paixão e Esperança

- você silencia. Frei Bruno pensou no jornal como uma página semanal do

evangelho às famílias. Esta página - lamentavelmente - rasgada.

Guimarães Rosa afirmou: “Os bons não morrem, se en-

cantam”. Você ficará como lem-brança, encantamento, de um tempo

que não volta mais. E todos nós ficamos mais pobres e silenciosos.

Meu abraço comovido à equipe que, em cli-ma de velório, levou o jornal até o fim. Com dig-nidade. Meu abraço aos assinantes que resistiram até o fim. Choramos juntos. Foi uma herança que passou de pai para filho. Era orgulho da famí-lia ser “sócio” do jornal. Valeu a pena a luta de tantos durante tanto tempo? Quem responde é Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena!”

Obrigado, velho Staffetta, tua luta não foi em vão. Muitas sementes foram lançadas na terra. Certamente, muitas delas germinaram. Outras irão germinar.

V

Você foi cartilha,

catecismo, Bíblia, igreja

e escola para muitas

gerações

Obrigado, velho Staffetta, tua

luta não foi em vão. Muitas

sementes foram lançadas

na terra. Certamente, muitas delas germinaram.

Outras irão germinar

Frei capuchinho, formado em Filosofia, Teologia e Jornalismo. Reside em Garibaldi, onde é vigário paroquial e superior da fraternidade

Velho Staffetta Riograndense, adeus!

Olhar diferenteALDO COLOMBO

pois, mais 33 presidentes, entre os eleitos, os im-

Também revelavas as reviravoltas da Segunda Guerra Mundial, com 50 milhões de mortos, 28 milhões de mutilados e prejuízos materiais calcu-lados em um trilhão e 500 bilhões de dólares. De-pois, os sinos anunciando a paz, uma paz cheia de crises, com a Terceira Guerra Mundial apavorando a humanidade. Estados Unidos e União Soviética ameaçavam com seu arsenal de bombas, capazes de destruir o planeta Terra sessenta vezes. Em Berlim foi erguido o Muro - símbolo de uma época - que acabou derrubado pelos

Muitos custaram a crer, mas o homem che-gou à Lua, um coração humano foi transplanta-do e nasceu um bebê de proveta. Há 100 anos, o

tinha apenas oito anos e Maria apareceu em Fátima. Mais tarde, a sua imagem peregrinou pelo Brasil, nos ombros dos missionários coorde-nados por frei Bernardino Vian, que contava aos assinantes as maravilhas de Fátima e suas pom-

fatos pitorescos em tua história. Numa capela do interior, no domingo à tarde, um menino de dez

anos lia para os adultos, muitos deles analfabe-

levá-lo para a morte, ele ouviu o sino tocar. E isto o fez mudar a decisão. Depois, de tempos em tempos, sobretudo nas horas de crise, algu-mas pessoas escutavam a voz do sino. Ouçam, o sino está tocando.

Você parte, Staffettavoltará a falar. Quando os Capuchinhos feste-

jam 120 anos de presença no Rio Grande do Sul - com Gratidão, Paixão e Esperança

- você silencia. Frei Bruno pensou no jornal como uma página semanal do

evangelho às famílias. Esta página - lamentavelmente - rasgada.

Guimarães Rosa afirmou: “Os bons não morrem, se en-

cantam”. Você ficará como lem-brança, encantamento, de um tempo

que não volta mais. E todos nós ficamos mais pobres e silenciosos.

Meu abraço comovido à equipe que, em cli-ma de velório, levou o jornal até o fim. Com dig-nidade. Meu abraço aos assinantes que resistiram até o fim. Choramos juntos. Foi uma herança que

Tributo: Cleodes Piazza e Nanetto Pipetta, homenageados no desfile da Festa da Uva de 2016

Nanetto Pipetta, ícone que encarna a história de um povoTexto de Cleodes Piazza*

Caxias do Sul - RS

Historiadora,

antropóloga,

professora,

escritora e

pesquisadora

* Cleodes Maria Piazza Julio Ribeiro

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o dia 23 de janeiro de 1924, na Tipografia Sta-ffeta Riograndense de Ga-

ribaldi, tem início a publicação da saga VITA E STÓRIA DE NA-NETTO PIPETTA, nassuo in Ita-lia e vegnudo in Mèrica per ca-tare la cuccagna (Vida e história de Nanetto Pipetta que nasceu na Itália e veio para a América em busca da cocanha).

Na primeira página daque-la publicação, o autor, Aquiles Bernardi, informa: “Duas pala-vras pra gente se entender”. Faz, então, uma espécie de conversa com o leitor onde, além de afian-çar que a história é genuína, o narrador ainda diz que os que a lerem ficarão contentes e os ou-tros nada saberão de tudo o que será dito. Diz mais, que a ele, narrador, não lhe desagrada que alguém ache graça e, se alguém se comover, que fique à vontade.

Está definido, pois, o tom que deverá predominar em toda a narrativa: um permanente estado de humor que justifica uma das suas principais funções: o entre-tenimento. Na base de cada epi-sódio está um elemento que pro-voca o riso. A popularidade de Nanetto se deu, em grande parte, pela presença desse elemento de comédia que serviu para satisfa-zer a vontade de rir do povo.

Em que pese a primitiva for-ma impressa, a oralidade é que incorporou a persona em Nanet-to Pipetta à tradição das stórie dell’Amèrica e della cucagna. Com isso podemos dizer que o ciclo da Vita e Stória de Nanetto Pipetta foi cumprido num pro-cesso inverso ao que se dá com a literatura de inspiração popular que, recolhida da tradição oral, ganha foro de obra impressa.

É, pois, oportuno considerar que se a presença do jornal cria as condições materiais para a di-vulgação das histórias, os ouvin-tes oferecem as condições neces-sárias para que ele se torne um texto oral. Aliás, o próprio narra-dor, desde logo, anuncia aos seus leitores que a história será conta-da numa sucessão de quadros: la storia la spartimo in tocchi che ciamaremo Capítoli, e quando un Capítolo ze finio ghin cápita nantro, e sempre cosi (partimos a história em pedaços, que va-mos chamar de capítulos e, quando um capítulo termina, começa outro, e assim por diante).

Além do que foi dito, é importante conhecermos também os dados essenciais da própria história e do nosso personagem.

Nanetto Pipetta é um jovem camponês, um contadino. Vive numa comunidade rural do Vê-

N

neto onde a imagem da América já atrai levas de italianos. Pelas suas traquinagens é ameaçado de ser enviado para a América na esperança que fassi un poco de giudíssio (crie um pouco de juí-zo). A imagem da América passa

então a inquietá-lo: La Mèrica, cossa sarala sta Mèrica, che la sípia na gran cuccagna... Mi digo de sí ... La Mèrica, mi digo, che la gà da essere un brolo pien de grassie del Signore (a Amé-

rica que coisa será essa Amé-rica… Talvez seja uma grande cocanha… Eu acho que sim!... A América eu acho que deve ser

um pomar cheio das graças do Senhor).

E decide partir. Faz a cami-nhada até Veneza de onde saem os trens que transportam os imi-grantes até o porto de Gênova. Gênova — e o cômico da situa-

ção é logo paradigmático — já lhe parece ser a América: os

genoveses falam a língua italia-na, ao contrário de Nanetto que só se expressa no dialeto de sua aldeia. Eles não o entendem, nem ele entende os genoveses: “Se sti mericani dell´osteria i me capisse almanco!... Ma che speransa!... I parla ne la lengua, che no li capisso gnanca mi, no li capisso” (Se esses americanos da hospedaria ao menos me en-tendessem!... Mas, que esperan-

ça, não os entendo eles).Após alguns percalços cômicos

entra clandestinamente no navio que o transportará para a Améri-ca. Aqui chegando, continuará in-cansavelmente à procura da cuc-cagna. Será sempre um itinerante à procura do eldorado.

Essa busca contínua, no des-dobrar das caminhadas do per-sonagem, forma uma correlação com o próprio texto: o tema-base é a procura da cuccagna, procura essa que não se encerra jamais.

Os episódios narrando as aven-turas de Nanetto Pipetta, escritos numa mescla de dialetos do tipo vêneto, com arremedos do cre-monês, lombardo e, ainda, de expressões aportuguesadas, se converteram em stórie, ou seja, se transformaram em fábulas que foram transmitidas oralmente ao universo das antigas colônias e alcançado, hoje, por apreciadas expressões da cultura popular.

Um patrimônio cultural

No dia 23 de janeiro de 2017, o Correio Riograndense e seus leitores celebraram os 93 anos da primeira edição do então Staffeta Riograndense, no qual foi publi-cado o primeiro capítulo de “Vita e Stória de Nanetto Pipetta nas-suo in Itália e vegnudo in Mèrica per catare la cuccagna” (Vida e história de Nanetto Pipetta que nasceu na Itália e veio para a América em busca da cocanha).

A seu modo, as histórias de Nanetto Pipetta contaram quem somos, descobriram nossas raí-zes, nossos usos e costumes, nos divertiram e nos emocionaram.

Em síntese, nos fizeram com-panhia ao longo dos anos atu-alizando histórias com novas versões - na série El Ritorno de Nanetto Pippetta, já no capítulo de número 903 - e ocupando seu espaço, como sempre, na página

que lhe coube no Correio Riograndense, que com

esta edição de número (5.532) encerra sua

trajetória e deixa de circular como jornal

impresso após 108 anos.

Continuaremos lei-tores e logo, logo, faremos a

grande festa do centenário de “Vita e Stória de Nanetto Pipetta que nasceu na Itália e veio para a América em busca da cocanha!”

Até breve.

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personagem que virou íco-ne da imigração italiana no Sul do país completou, na

segunda-feira 23 de janeiro, 93 anos. Nanetto Pipetta nasceu no dia 23 de janeiro de 1924, pelas mãos do frei capuchinho Aquiles Bernardi, o frei Paulino de Ca-xias. O seriado foi lançado no Correio Riograndense às véspe-ras da comemoração dos 50 anos da chegada dos primeiros imi-grantes italianos no Rio Grande do Sul, em 1875.

Nanetto, um jovem que saiu da Itália em busca da cucagna na América, personifica os sonhos de todos os imigrantes que dei-xaram sua terra natal em busca de uma vida melhor. As histórias do Nanetto, contadas por frei Aquiles, retratavam com fideli-dade a adaptação dos imigrantes à nova terra, uma região desco-nhecida, selvagem, mas que foi desbravada pela coragem e von-tade dos colonizadores de iniciar, longe de sua pátria, uma nova vida, uma nova epopeia, uma nova história, livre, indepen-dente e mais promissora do que aquela que a Itália lhes oferecia. Ou como dizia o bem-aventura-do João Batista Scalabrini (1839-1905), o apóstolo dos milhões de italianos forçados a deixar sua terra natal para não morrerem de fome, “para o migrante, a pátria é a terra que lhe dá o pão”.

Contadas com simplicidade e humor, as histórias, aventuras e infortúnios do Nanetto logo con-quistaram os leitores, que se iden-tificavam nos sonhos e esperan-ças daquele ingênuo anti-herói. Publicadas semanalmente no CR, sempre em Talian, as histó-rias de Nanetto Pipetta duraram apenas um ano. Frei Bernardo de Puygros, capuchinho francês então diretor do jornal, apesar do sucesso do personagem, preferia publicar, em italiano, as aventu-ras de Robinson Crusoé no lugar do Nanetto.

Simpatia - Desgostoso com a decisão, frei Aquiles encerrou o seriado na edição de 18 de feve-reiro de 1925, com o Nanetto se afogando no rio das Antas. Mas apesar da curta vida do perso-nagem, ele havia conquistado tamanha simpatia que os leitores não o esqueceram e pediam para que o jornal continuasse sua his-tória. A solução encontrada foi agrupar os textos no livro “Vita e stòria de Nanetto Pipetta – nas-suo in Itàlia e vegnudo in Mèri-ca per catare la cucagna”. Em 1937 saiu a primeira edição, com

O

# ÍCONE DA IMIGRAÇÃO

Nanetto Pipetta, cidadão do mundoPersonagem nascido nas páginas do Correio Riograndense em 23 de janeiro de 1924 torna-se imortal

uma expressiva tiragem – ao que consta, 15 mil exemplares. A procura foi intensa. Os textos agora vinham acompanhados de ilustrações, feitas a canivete sobre chumbo por frei Gentil de Caravaggio (Fortunato Giaco-mel, 1885-1953).

Nas edições posteriores, fo-ram acrescentados desenhos de frei Osvaldo de Passo Fundo (Paulo Jacques). Foram exatas dez edições, a última delas his-tórica, em seis línguas (italiano, talian, português, espanhol, fran-cês e hunrück-alemão), lançada em 2009, comemorativa aos 100 anos do Correio Riograndense.

El ritorno – Na edição come-morativa, de 2009, no prefácio, frei Aldo Colombo destaca que, por ter nascido duas vezes (uma na Itália e outra nas páginas do CR em 1924), Nanetto ganhou o privilégio da imortalidade. Isso não apenas é verdade como,

para garantir sua eternidade no panteão da história, Nanetto nasceu uma terceira vez. Foi no dia 19 de fevereiro de 1999, 74 anos depois de sua “morte provi-sória”, quando o jornal iniciou a publicação do seriado El Ritorno de Nanetto Pipetta.

A coluna foi uma feliz inicia-tiva do ator, escritor e advogado Pedro Parenti (1951-2000) que, inconformado com o final do seriado, “ressuscitou” o persona-gem trazendo-o de volta às pági-nas do Correio Riograndense.

Frei Moacir Molon, então di-retor do jornal e artífice do re-torno do Nanetto ao CR, conta como tudo começou. “Durante um coquetel com o grupo Mìse-ri Coloni, que retornara da Itália onde realizara diversas apresen-tações da peça Nanetto Pipetta, Pedro Parenti, que encarnava o personagem, me falou que num programa da Rádio Diplomata, de São Marcos, ele contava his-

tórias do Nanetto, mantendo suas características, mas vivendo ce-nas novas. “E pò, lo go fato viver ncora’, me disse o ator”.

Vislumbrando o potencial para uma grande retomada no CR, Molon propôs a Parenti: “Então, vamos ressuscitá-lo!”, e pediu que escrevesse alguns capítulos e os enviasse. Frei Moacir ficou impressionado com a qualidade dos textos, das tramas e da veros-similidade das histórias que logo criou o seriado El Ritorno de Na-netto Pipetta.

Por quase dois anos, Nanetto continuou em busca da cucagna, com histórias inéditas, no mesmo formato e linguagem iniciais – em capítulos semanais e no dia-leto vêneto. E o mais importante: com o personagem sem perder sua espontaneidade, sua simpli-cidade, sua franqueza e sua ho-nesta ignorância, protagonizando situações próprias do final do século XX e com as ilustrações sempre irreverentes de Carlos Henrique Iotti, criador do perso-nagem Radicci e outros tantos.

Porém, depois de 90 capítulos, Pedro Parenti faleceu prematura-mente no dia 3 de novembro de 2000, aos 49 anos, interrompen-do mais uma vez a saga do sim-pático anti-herói.

Rovílio Costa - Desta vez, po-rém, Nanetto não permaneceria tanto tempo longe de seus admi-radores. Em 14 de fevereiro de 2001, para marcar os 92 anos do CR, a coluna El ritorno voltou às páginas do jornal, desta vez aber-ta à participação de voluntários, convidados por frei Rovílio Cos-ta a escrever novas histórias para o personagem.

A coluna passou a ser susten-tada pela contribuição de diver-sos autores, iniciando por Silvino Santin, de Santa Maria; depois Antônio Martelini (Porto Ale-gre), Valter Baggio (Vila Maria), Eduardo Grígolo (Jundiaí-SP), Rafael Baldissera (Curitiba-PR), Antônio Baggio (Porto Alegre), Sérgio Ângelo Grando (Porto Alegre), Ivo Dal Moro (Foz do Iguaçu-PR), Mário Gardelin (Caxias do Sul), Luiz Bavaresco (Nova Prata) e Marcelino Carlos Dezen (Caxias do Sul). E contou até com uma contribuição de um italiano de Rovereto, Trento, Itá-lia – Maurízio Perottoni.

Desta forma, pelas mãos de di-versos escritores, o personagem se manteve vivo no Correio Rio-grandense até o dia de hoje (atra-vés de Eduardo Grígolo e Mar-celino Dezen), com a publicação

de uma série de cinco capítulos cada autor e com ilustrações, desde 2005, de Derli Dutra, de São José do Ouro.

Imortal - No dia 19 deste mês a coluna completaria 17 anos de publicações, praticamente ininterruptas. Quiçá, a ambição de chegar à história de número 1.000 da coluna El ritorno de Nanetto Pipetta no Correio Rio-grandense jamais se concretize, mas chegou muito perto – foram 903. Alguns dos autores agrupa-ram os textos em livros, como ocorreu com os de Pedro Parenti, Eduardo Grígolo, Rafael Baldis-sera, Antônio Baggio e Mário Gardelin. E outros o farão.

E agora, com o fim do Cor-reio Riograndense, Nanetto Pi-petta volta a morrer, não mais

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Cultura 12CR1909 - 2017

provisoriamente, mas em de-finitivo? Certamente, não! Por uma simples razão – Nanetto já é IMORTAL, ou como afirma a historiadora e pesquisadora Cleodes Piazza, é o “eterno” anti-herói. Ele estará sempre presente nas comunidades do interior, nas empresas, nas asso-ciações italianas e entidades que valorizam o Talian, nos diversos livros publicados; nos trabalha-dos acadêmicos sobre o CR que, necessariamente, farão menção a este personagem que já é marca do jornal; nas peças teatrais, no linguajar coloquial dos descen-dentes de italianos que utilizam cotidianamente a expressão “te si pròpio un Nanetto” (Tu és mesmo um Nanetto), mas princi-palmente porque, como dizia frei Rovílio Costa “in ogniuno de noantri ghe ze sconto un Nanet-to” (Dentro de cada um de nós há escondido um Nanetto).

Terra estranha: Nanetto junto a uma “planta de salames” (bananeira)

Redenção: Pedro Parenti, responsável pelo “ritorno” e Henrique Iotti

Nanetto: ícone da imigração

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CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Talian 9CR1909 - 2017

El ritorno de Nanetto Pipetta (903)

Maledeta curiosità Capirse

araria tanto fàssile poder capir-se fra gente comune, fra òmi-ni e done normale. Sì, pararia,

ma invesse se fa na fadiga granda par inténdarse uno con l´altro e no digo con chi parla na léngoa diversa dela nostra, ndove le létare del alfabeto le ghe ze tute e anca de più dele nostre, ma messe in modo diverso, che par noantri de léngoa latina ze tuto un in-dovinare.

Passiensa! Ghe ze i vocabulari fati aposta par sbroiarli. Ma el difìssile ze quando parlemo fra da noantri, spes-sialmente se parlemo de polìtica, de schei, de malatie, de religion, insuma, de argomenti che deventa difìssile par la poca disposission che gavemo de ndar d’acordo, de scoltare i altri, de volere e avere sempre rason a costo de lassarghe anca la pel. El difìssile ze quando se parla fra ómini che i fa finta de èssere sordi!

Nela Bìblia se parla dela famosa Tore de Babele, che tuti parlava al medèsimo tempo e nessun se capi-va; cominsiava la era dele léngoe nove che dopo se gavaria imparà a scola dai pòpoli moderni. Parlar tuti la stessa léngoa no bastaria: no se ca-piréssimo lo stesso par le tante teste difarente.

Ghe saria un linguagio comune a tuti, quel del amore, ma anca quelo ze ndà in disuso; quelo dela com-prension, dela pietà umana, dela ca-rità, ma ghenè tanto poca in sti tempi moderni. Adesso se capimo solo col euro, el sporco soldo che verse tute le porte e ne rende mìseri e schiavi del più bel sentimento che dovarìssimo avere: lealtà, sincerità, amore in sen-so largo, sensa rumore o crìtiche, ne egoismi.

Tornando al discorso de no capirse, me desmentegavo de nominare le bès-tie che sicuramente le ze manco sorde de noantri umani! Vardemo i can de tute le rasse, spessialmente quei che ga sempre in brasso le signore e che li porta a spasso come se fussi i so fiole-ti, i barbonsini, i bastardini o le tante rasse esistente che no cognosso, ma anca el caro can domèstico che fa la guardia ai paroni e ala casa: quando more uno dei paroni, dele volte more anca el cagneto dal dolore. Co sti can, i umani ga un diàlogo contìnuo, i se sente capìi, ascoltai, amai, protegesti mèio che dai pròpi amighi e quando fa tanta teneressa e se dise: “Pecà che a sto can ghe manca sol la parola”.

Mi, son sicuro che al mondo de là, ghe ze el reparto par ste creature, cre-ade anca lore dal Paron del universo par la felissità dei òmini, sordi al ben e al dolor. Parlemo, dialoghemo tra noantri umani, spessialmente quando restemo soli nela tardia età, non pen-semo ai s-chei, ma a tuto quelo che ne ispira la natura che dele volte la ze tanto bela. E femo de tuto par... ca-pirse.

Vita, stòria e fròtoleIlustração Derli Dutra, São José do Ouro (RS)

Cláudio ChiaradiaPasso Fundo - RS N

P

La mission de Nanetto ze continoar fando le so braùre fora pal mondoCo sta stòria, Nanetto Pipetta finisse la

so caminada ntel Correio Riograndense, dopo tanti ani che’l se ga fato presente nte-la pàgina del Ritorno. Ga mancà poco che se rivasse ale mila stòrie. Quante de bone, de bele, de fantàstiche; de far rìder e anca piander; de gaver passion, amirassion e anca pecà de sto toso dele volte metesto in imbroiade e vérghene fato arquante a sto mondo.

A sto punto dele mila stòrie, me ricordo de Eduardo Grigolo, maestro là a Jundiaí (SP), uno dei scritori del Nanetto, che’l ga dito nte na intrevista fata ntel Correio Rio-grandense de 20 de genaio del ano passà, che’l ga deciso no leser le stòrie dei altri autori del Ritorno par no far “plàgio” de qualcheduna, ma che le ga meteste via tute par lèserle quando se rivava al nùmero

a roba bela de veder ze el rispeto che tante persone ga per i animai. I ze fioi de Dio anca lori e se i ze a sto mondo

ze perché i fa parte del piano del Signor. Tén-derghe con passion, no farli tribular, darghe el conforto e el giusto magnar ze robe che no podemo desmentegarse mai se volemo man-tegner sia qual sia la bèstia o l’osel.

Tuto ntela giusta mesura! Perché ghe ze de quei che ghe tende mèio a na bèstia che a na persona. Anca così no dà! Me vien fastidi quando sento serte persone, più che sia done, che ghe ciama a can e gati “mio fiol”, “mio putel”, “vien qua cola mama...”. Per altra ban-da, vien su la ràbia quan-do se vede gente ghe fa le creature de Dio patir tuta la sorte de malegràs-sie. Le trata con crudeltà. Par mi, i ze pedo che le bèstie!.

E no adianta dir che i ze “irassionai”. I sente, i patisse, i ga paùra, i se stressa; e anca i ga pas-sion, i ringràssia, i di-fente (i can), i obedisse, i manifesta contentessa...

Nanetto ze d’acordo co mi. Lu ga tante bèstie e le tende con rispeto. Ghe manca mai de mag-nar, da bever, de un pos-to par risgoardarse del fredo, dela piova, dela note...

E quando se parla de bèstie, Nanetto ghe piase contarla de na volta che’l

1.000. Eduardo, caro, adesso te si liberà e te podi lèserle sensa paùra.

E adesso? Nanetto morto nantra volta? Nanetto che dise adio par sempre? No se sà! Ma credo che gnanca una dele due op-sion, par un sémplice detàlio – Nanetto ze imortal! Un ícone del mondo.

Sto personàgio nassesto ntele pàgine del Correio Riograndense a più de novanta ani, se ghe toca morir, sarà sempre provi-soriamente, perché el suo destino sarà ndar par el mondo fando le so braùre. “Par Na-netto, cosa saria la vita se no la fusse per far braùre? Risponder, lu no savaria, perché el ga portà vanti tuta la so vita fando braùre. E se pol dir che la pi grande braùra ze far dela vita na braùra”, me ga scrito el saudoso fra-te Rovìlio Costa quando mi go scominsià a scriver par el Ritorno a diese ani indrio.

Eco la mission de Nanetto: continoar fando le so braùre fora pal mondo e piantar radise nela memòria de tuti quei che ghe piase de sto personàgio, fin perché, come disea frate Rovìlio, ghe ze un Nanetto ren-to de cada un de noantri.

Eco, alora! Mi, Marcelino Dezen, come el autore dela ùltima stòria de Nanetto del Correio Riograndense e editore dele 903 stòrie, vui far un omàgio a tuti quei che se ga fato presenti te questo spàssio, tanto prestigià e privilegià. No mensono tuti, ma no posso assar fora Pedro Parenti, che ga tacà questa longa saga; frate Moacir Mo-lon, el visionàrio insentivador; e el Derli Dutra, el omo dele sempre bele ilustrassion (lesi ala pàgina 12).

Gràssie a tuti! Riverdersi!

Marcelino DezenCaxias do Sul - RS

ghe responde: “Securo che parlo!”. “No stà inrabiarme”, ghe dise el osel. “E cossa sucede se te inràbio?”, ghe domanda Na-netto. “Proa!”, retruca el papagal.

Corioso par saver come quela stòria fe-nia, Nanetto cava el capel e ghe bate su par la gàbia na volta, due, trè... El papagal indrissa su le pene, el da na cifolada e el osa forte: “Pega, pega, Serife!”.

Cari da Dio! Nanetto ga savesto suito el perché del “Tento col papagal”. No’l sa de ndove ze vegnesto fora quel cagnasso che parea un vedel, de grando. El ghe ga mos-trà na boca piena de denti che parea fin un segot de tanti chel ghinavea.

Piampianeto, indrio cul verso la saìda e parlando cola serenità che a quela ora zera possìbile mantegner “calma, Serife, cal-ma”, Nanetto ze rivà arente el portel ma quando’l se ga voltà par vèrserlo el can lo brinca pal tafanàrio e ghe cava un toco dele braghe e anca dele mudande. Sorte che le zera folgade perché senò ndea via anca un bel toco de culata.

Nanetto se ga fermà banda de fora a mostrarghe i pugni a quela strània dópia.

- Papagal del inferno! Se te ciapo, te cavo le pene e te l’impianto ntel... e te fao de spassadora!”.

El papagal ghe fea gnanca caso. “Brao, Serife”, el seitava dirghe al can che, parà via l’intruso, ze ndà butarse zo a l’ombria. A Nanetto ghe ga sobrà ragionar che quei due i zera stati trenai polito par difender la casa e i lo fea ben. Stùpido lu che no ga resistio ala curiosità.

La conclusion de Nanetto: “I dise sem-pre de ténderse dela boca dei can, dei cor-ni del toro e dele peade del mul... e nte sto caso, anca del bec del papagal”.

ze ndato te na casa che no’l cognossea, el bate ntel portel, ma nissun lo atende. Alo-ra el verse e portel e el se fa avanti, piam-pianeto. Co’l riva ntela varanda, el vede un papagal nte na gàbia picada ntela pare-de e, pena sora, el scrito: “Tento col papa-gal”. Òspia, ga pensà Nanetto, “gavaralo cossa de spessial che toca ténderse?”. El va pi arente, i se varda e dopo de un tem-po, el papagal ghe domanda: “Pàrlitu?”. Nanetto se spaventa cola domanda e el

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1904: frei Bruno de Gillonay, chefe da missão capuchinha no RS, foi o

idealizador do jornal

21/06/50 a 18/03/53: Herminio Tondello

(Frei Ambrósio)27/10/04 a 14/03/12:

Aldo Colombo

02/04/80 a 20/10/2004:

Moacir Pedro Molon 21/03/12 a 08/02/17: João Carlos Romanini

- 13/02/1909: padre Carmine Fasulo, então

pároco de Caxias do Sul, fundou o La Libertá

- 05/05 a 30/11/09: pa-dre Francisco Baldassarre

- 04/12/09: padre Carmine Fasulo

- 27/12/09 a 12/04/17: padre Giovanni Fronchetti

- 20/04 a 21/06/17: Agostinho Mazzini

- 05/07/17 a 21/09/21: capuchinhos assumem

oficialmente o jornal, que circula sem o nome de um

diretor

- 28/09/21 a 24/04/29: José Lorenzi 01/05/29 a 04/01/33:

Julio Bampi (Dom Cândido)

- 11/01/33 a 05/07/33: José Lorenzi

- 12/07/33 a 09/01/35: João Batista Francio

- 16/01/35 a 01/06/38: Julio Bampi

- 08/06/38 a 11/02/42: Humberto Cherubini

- 18/02/42 a 30/12/42: João Batista Francio

- 13/01/43 a 26/12/45: Antonio Francisco

Bianchi

- 02/01/46 a 09/01/46: Luís Marin

- 16/01/46 a 27/03/46: Antonio Francisco

Bianchi

- 03/04/46 a 14/06/50: Luís Marin

- 25/03/53 a 19/06/57: Adelar Santos Vicenzi

- 26/06/57 a 19/02/64: Gaudêncio Veronese

- 26/02/64 a 29/07/64: Hélvio Remussi

- 05/08/64 a 20/01/65: Décio Dutra

(redator-chefe)

- 27/01/65 a 07/02/68: Luiz A. Lucchese

- 14/02/68 a 19/03/69: Raymundo Simoneto

- 26/03/69 a 20/05/70: Olimpio Santin

- 30/05/70 a 06/02/80: Décio Osmar Bombassaro - 13/02/80 a 26/03/80:

Aldo Colombo

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017

Retrospectiva 1110

1904 1909 - 1917 1917 - 1929 1929 - 1933 1933 - 1942 1943 - 1950 1953 - 1965 1950 - 1953 1965 - 1980 1980 - 2004 2012 - 20172004 - 2012

# 108 ANOS

E m 108 anos, o Correio Riograndense experimentou de tudo: conflitos e calmaria, rivalidades políticas e clericais, aceitação e rejeição, troca de proprietários e de sedes,

carência e pujança tecnológica, adaptação de conteúdos. Enfrentou todas as grandes crises do século XX e adentrou neste tentando encontrar seu

lugar e definir seu perfil no ambiente das novas mídias digitais, diante das quais agora o impresso sai de cena.

Na longa trajetória, o jornal jamais perdeu o sentido da caminhada, traçado em seu primeiro editorial. Para gerações inteiras foi cartilha e evangelho, concretizando, por mais de um século, o sonho de frei Bruno de Gillonnay.

Trajetória marcada por mudanças e adaptações

- 13/02/1909: fundação do jornal, batizado de La Libertá. Impresso em uma impressora do tipo Marioni, utilizada até 1934

- 12/03/10: periódico passa a ser chamado de Il Colono Italiano

- 05/07/17: o nome do jornal muda novamente, Staffetta Rio-Grandense

- 19/07/17: o nome do jornal passa a ser impresso todo em letras maiúsculas

- 07/04/21: muda a grafia do nome do jor-nal, Stafetta Riogran-dense

- 07/09/27: novo lo-gotipo do agora La Sta-ffetta Riograndense

- 10/09/41: jornal as-sume o nome Correio Riograndense. Impres-so em uma Planeta, des-de meados de 1934 até 1946

- 24/07/46: muda a gra-fia de Correio Rio-Gran-dense

- 30/05/70: primeira edi-ção em formato tabloide e impressa numa Rotativa Off-set Goss Community. Nova tecnologia oferece diagrama-ção mais elaborada e possibi-lidade de uso de uma segun-da cor em algumas páginas. Muda novamente o logotipo, que ganha formato “box”. A nova impressora foi usada até 14 de dezembro de 1994, quando a impressão do jornal foi terceirizada

- 26/02/64: mais uma vez, muda o logotipo e a grafia do nome do jornal. Nesta época, era impresso em uma Rotoplana (1946 a 1970)

- 10/02/65: jornal alte-ra novamente o logotipo, assemelhando-se ao das décadas de 40 e 50

- 20/04/94: aos 85 anos, reformulação gráfica apoia-da pela atualização da pauta editorial e pela editoração eletrônica. Logotipo volta a ter formato horizontal

- 22/02/95: jornal passou a usar policromia (fotos coloridas)

- 25/04/84: edição come-morativa dos 75 anos do jor-nal

- 29/10/2008: antecipando a celebração pelos 100 anos de circulação, o Correio Rio-grandense muda seu projeto gráfico, o que inclui novo logotipo e mais páginas co-loridas

- 24/06/09: edição comemo-rativa ao centenário do jornal, com 100 páginas

- 12/02/14: ao completar 105 anos, o jornal muda o lo-gotipo, acrescentando a abre-viação CR

- 11/02/15: edição número 5.432 apresenta novo projeto gráfico e atualização editorial

- 25/11/15: jornal passa a ser impresso totalmente em cores

- 08/02/17: última edição do Correio Riograndense

GARIBALDI CAXIAS DO SUL: Bairro Rio Branco CAXIAS DO SUL: Desvio Rizzo

DIRE

TORE

S

SEDE

S

CAXIASDO SUL

13/02/09 - 14/01/10 15/01/1910 a 28/05/1952 04/06/1952 a 12/1998 12/1998 a 08/02/2017

1909

1910

1917

1921 1927

1946

1970

1941

1964

1965

19951994 2014 2015

2008

1984 20092015

2017

1917

CR1909 - 2017

CR1909 - 2017

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1904: frei Bruno de Gillonay, chefe da missão capuchinha no RS, foi o

idealizador do jornal

21/06/50 a 18/03/53: Herminio Tondello

(Frei Ambrósio)27/10/04 a 14/03/12:

Aldo Colombo

02/04/80 a 20/10/2004:

Moacir Pedro Molon 21/03/12 a 08/02/17: João Carlos Romanini

- 13/02/1909: padre Carmine Fasulo, então

pároco de Caxias do Sul, fundou o La Libertá

- 05/05 a 30/11/09: pa-dre Francisco Baldassarre

- 04/12/09: padre Carmine Fasulo

- 27/12/09 a 12/04/17: padre Giovanni Fronchetti

- 20/04 a 21/06/17: Agostinho Mazzini

- 05/07/17 a 21/09/21: capuchinhos assumem

oficialmente o jornal, que circula sem o nome de um

diretor

- 28/09/21 a 24/04/29: José Lorenzi 01/05/29 a 04/01/33:

Julio Bampi (Dom Cândido)

- 11/01/33 a 05/07/33: José Lorenzi

- 12/07/33 a 09/01/35: João Batista Francio

- 16/01/35 a 01/06/38: Julio Bampi

- 08/06/38 a 11/02/42: Humberto Cherubini

- 18/02/42 a 30/12/42: João Batista Francio

- 13/01/43 a 26/12/45: Antonio Francisco

Bianchi

- 02/01/46 a 09/01/46: Luís Marin

- 16/01/46 a 27/03/46: Antonio Francisco

Bianchi

- 03/04/46 a 14/06/50: Luís Marin

- 25/03/53 a 19/06/57: Adelar Santos Vicenzi

- 26/06/57 a 19/02/64: Gaudêncio Veronese

- 26/02/64 a 29/07/64: Hélvio Remussi

- 05/08/64 a 20/01/65: Décio Dutra

(redator-chefe)

- 27/01/65 a 07/02/68: Luiz A. Lucchese

- 14/02/68 a 19/03/69: Raymundo Simoneto

- 26/03/69 a 20/05/70: Olimpio Santin

- 30/05/70 a 06/02/80: Décio Osmar Bombassaro - 13/02/80 a 26/03/80:

Aldo Colombo

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017

Retrospectiva 1110

1904 1909 - 1917 1917 - 1929 1929 - 1933 1933 - 1942 1943 - 1950 1953 - 1965 1950 - 1953 1965 - 1980 1980 - 2004 2012 - 20172004 - 2012

# 108 ANOS

E m 108 anos, o Correio Riograndense experimentou de tudo: conflitos e calmaria, rivalidades políticas e clericais, aceitação e rejeição, troca de proprietários e de sedes,

carência e pujança tecnológica, adaptação de conteúdos. Enfrentou todas as grandes crises do século XX e adentrou neste tentando encontrar seu

lugar e definir seu perfil no ambiente das novas mídias digitais, diante das quais agora o impresso sai de cena.

Na longa trajetória, o jornal jamais perdeu o sentido da caminhada, traçado em seu primeiro editorial. Para gerações inteiras foi cartilha e evangelho, concretizando, por mais de um século, o sonho de frei Bruno de Gillonnay.

Trajetória marcada por mudanças e adaptações

- 13/02/1909: fundação do jornal, batizado de La Libertá. Impresso em uma impressora do tipo Marioni, utilizada até 1934

- 12/03/10: periódico passa a ser chamado de Il Colono Italiano

- 05/07/17: o nome do jornal muda novamente, Staffetta Rio-Grandense

- 19/07/17: o nome do jornal passa a ser impresso todo em letras maiúsculas

- 07/04/21: muda a grafia do nome do jor-nal, Stafetta Riogran-dense

- 07/09/27: novo lo-gotipo do agora La Sta-ffetta Riograndense

- 10/09/41: jornal as-sume o nome Correio Riograndense. Impres-so em uma Planeta, des-de meados de 1934 até 1946

- 24/07/46: muda a gra-fia de Correio Rio-Gran-dense

- 30/05/70: primeira edi-ção em formato tabloide e impressa numa Rotativa Off-set Goss Community. Nova tecnologia oferece diagrama-ção mais elaborada e possibi-lidade de uso de uma segun-da cor em algumas páginas. Muda novamente o logotipo, que ganha formato “box”. A nova impressora foi usada até 14 de dezembro de 1994, quando a impressão do jornal foi terceirizada

- 26/02/64: mais uma vez, muda o logotipo e a grafia do nome do jornal. Nesta época, era impresso em uma Rotoplana (1946 a 1970)

- 10/02/65: jornal alte-ra novamente o logotipo, assemelhando-se ao das décadas de 40 e 50

- 20/04/94: aos 85 anos, reformulação gráfica apoia-da pela atualização da pauta editorial e pela editoração eletrônica. Logotipo volta a ter formato horizontal

- 22/02/95: jornal passou a usar policromia (fotos coloridas)

- 25/04/84: edição come-morativa dos 75 anos do jor-nal

- 29/10/2008: antecipando a celebração pelos 100 anos de circulação, o Correio Rio-grandense muda seu projeto gráfico, o que inclui novo logotipo e mais páginas co-loridas

- 24/06/09: edição comemo-rativa ao centenário do jornal, com 100 páginas

- 12/02/14: ao completar 105 anos, o jornal muda o lo-gotipo, acrescentando a abre-viação CR

- 11/02/15: edição número 5.432 apresenta novo projeto gráfico e atualização editorial

- 25/11/15: jornal passa a ser impresso totalmente em cores

- 08/02/17: última edição do Correio Riograndense

GARIBALDI CAXIAS DO SUL: Bairro Rio Branco CAXIAS DO SUL: Desvio Rizzo

DIRE

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SEDE

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CAXIASDO SUL

13/02/09 - 14/01/10 15/01/1910 a 28/05/1952 04/06/1952 a 12/1998 12/1998 a 08/02/2017

1909

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1946

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19951994 2014 2015

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CR1909 - 2017

CR1909 - 2017

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personagem que virou íco-ne da imigração italiana no Sul do país completou, na

segunda-feira 23 de janeiro, 93 anos. Nanetto Pipetta nasceu no dia 23 de janeiro de 1924, pelas mãos do frei capuchinho Aquiles Bernardi, o frei Paulino de Ca-xias. O seriado foi lançado no Correio Riograndense às véspe-ras da comemoração dos 50 anos da chegada dos primeiros imi-grantes italianos no Rio Grande do Sul, em 1875.

Nanetto, um jovem que saiu da Itália em busca da cucagna na América, personifica os sonhos de todos os imigrantes que dei-xaram sua terra natal em busca de uma vida melhor. As histórias do Nanetto, contadas por frei Aquiles, retratavam com fideli-dade a adaptação dos imigrantes à nova terra, uma região desco-nhecida, selvagem, mas que foi desbravada pela coragem e von-tade dos colonizadores de iniciar, longe de sua pátria, uma nova vida, uma nova epopeia, uma nova história, livre, indepen-dente e mais promissora do que aquela que a Itália lhes oferecia. Ou como dizia o bem-aventura-do João Batista Scalabrini (1839-1905), o apóstolo dos milhões de italianos forçados a deixar sua terra natal para não morrerem de fome, “para o migrante, a pátria é a terra que lhe dá o pão”.

Contadas com simplicidade e humor, as histórias, aventuras e infortúnios do Nanetto logo con-quistaram os leitores, que se iden-tificavam nos sonhos e esperan-ças daquele ingênuo anti-herói. Publicadas semanalmente no CR, sempre em Talian, as histó-rias de Nanetto Pipetta duraram apenas um ano. Frei Bernardo de Puygros, capuchinho francês então diretor do jornal, apesar do sucesso do personagem, preferia publicar, em italiano, as aventu-ras de Robinson Crusoé no lugar do Nanetto.

Simpatia - Desgostoso com a decisão, frei Aquiles encerrou o seriado na edição de 18 de feve-reiro de 1925, com o Nanetto se afogando no rio das Antas. Mas apesar da curta vida do perso-nagem, ele havia conquistado tamanha simpatia que os leitores não o esqueceram e pediam para que o jornal continuasse sua his-tória. A solução encontrada foi agrupar os textos no livro “Vita e stòria de Nanetto Pipetta – nas-suo in Itàlia e vegnudo in Mèri-ca per catare la cucagna”. Em 1937 saiu a primeira edição, com

O

# ÍCONE DA IMIGRAÇÃO

Nanetto Pipetta, cidadão do mundoPersonagem nascido nas páginas do Correio Riograndense em 23 de janeiro de 1924 torna-se imortal

uma expressiva tiragem – ao que consta, 15 mil exemplares. A procura foi intensa. Os textos agora vinham acompanhados de ilustrações, feitas a canivete sobre chumbo por frei Gentil de Caravaggio (Fortunato Giaco-mel, 1885-1953).

Nas edições posteriores, fo-ram acrescentados desenhos de frei Osvaldo de Passo Fundo (Paulo Jacques). Foram exatas dez edições, a última delas his-tórica, em seis línguas (italiano, talian, português, espanhol, fran-cês e hunrück-alemão), lançada em 2009, comemorativa aos 100 anos do Correio Riograndense.

El ritorno – Na edição come-morativa, de 2009, no prefácio, frei Aldo Colombo destaca que, por ter nascido duas vezes (uma na Itália e outra nas páginas do CR em 1924), Nanetto ganhou o privilégio da imortalidade. Isso não apenas é verdade como,

para garantir sua eternidade no panteão da história, Nanetto nasceu uma terceira vez. Foi no dia 19 de fevereiro de 1999, 74 anos depois de sua “morte provi-sória”, quando o jornal iniciou a publicação do seriado El Ritorno de Nanetto Pipetta.

A coluna foi uma feliz inicia-tiva do ator, escritor e advogado Pedro Parenti (1951-2000) que, inconformado com o final do seriado, “ressuscitou” o persona-gem trazendo-o de volta às pági-nas do Correio Riograndense.

Frei Moacir Molon, então di-retor do jornal e artífice do re-torno do Nanetto ao CR, conta como tudo começou. “Durante um coquetel com o grupo Mìse-ri Coloni, que retornara da Itália onde realizara diversas apresen-tações da peça Nanetto Pipetta, Pedro Parenti, que encarnava o personagem, me falou que num programa da Rádio Diplomata, de São Marcos, ele contava his-

tórias do Nanetto, mantendo suas características, mas vivendo ce-nas novas. “E pò, lo go fato viver ncora’, me disse o ator”.

Vislumbrando o potencial para uma grande retomada no CR, Molon propôs a Parenti: “Então, vamos ressuscitá-lo!”, e pediu que escrevesse alguns capítulos e os enviasse. Frei Moacir ficou impressionado com a qualidade dos textos, das tramas e da veros-similidade das histórias que logo criou o seriado El Ritorno de Na-netto Pipetta.

Por quase dois anos, Nanetto continuou em busca da cucagna, com histórias inéditas, no mesmo formato e linguagem iniciais – em capítulos semanais e no dia-leto vêneto. E o mais importante: com o personagem sem perder sua espontaneidade, sua simpli-cidade, sua franqueza e sua ho-nesta ignorância, protagonizando situações próprias do final do século XX e com as ilustrações sempre irreverentes de Carlos Henrique Iotti, criador do perso-nagem Radicci e outros tantos.

Porém, depois de 90 capítulos, Pedro Parenti faleceu prematura-mente no dia 3 de novembro de 2000, aos 49 anos, interrompen-do mais uma vez a saga do sim-pático anti-herói.

Rovílio Costa - Desta vez, po-rém, Nanetto não permaneceria tanto tempo longe de seus admi-radores. Em 14 de fevereiro de 2001, para marcar os 92 anos do CR, a coluna El ritorno voltou às páginas do jornal, desta vez aber-ta à participação de voluntários, convidados por frei Rovílio Cos-ta a escrever novas histórias para o personagem.

A coluna passou a ser susten-tada pela contribuição de diver-sos autores, iniciando por Silvino Santin, de Santa Maria; depois Antônio Martelini (Porto Ale-gre), Valter Baggio (Vila Maria), Eduardo Grígolo (Jundiaí-SP), Rafael Baldissera (Curitiba-PR), Antônio Baggio (Porto Alegre), Sérgio Ângelo Grando (Porto Alegre), Ivo Dal Moro (Foz do Iguaçu-PR), Mário Gardelin (Caxias do Sul), Luiz Bavaresco (Nova Prata) e Marcelino Carlos Dezen (Caxias do Sul). E contou até com uma contribuição de um italiano de Rovereto, Trento, Itá-lia – Maurízio Perottoni.

Desta forma, pelas mãos de di-versos escritores, o personagem se manteve vivo no Correio Rio-grandense até o dia de hoje (atra-vés de Eduardo Grígolo e Mar-celino Dezen), com a publicação

de uma série de cinco capítulos cada autor e com ilustrações, desde 2005, de Derli Dutra, de São José do Ouro.

Imortal - No dia 19 deste mês a coluna completaria 17 anos de publicações, praticamente ininterruptas. Quiçá, a ambição de chegar à história de número 1.000 da coluna El ritorno de Nanetto Pipetta no Correio Rio-grandense jamais se concretize, mas chegou muito perto – foram 903. Alguns dos autores agrupa-ram os textos em livros, como ocorreu com os de Pedro Parenti, Eduardo Grígolo, Rafael Baldis-sera, Antônio Baggio e Mário Gardelin. E outros o farão.

E agora, com o fim do Cor-reio Riograndense, Nanetto Pi-petta volta a morrer, não mais

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Cultura 12CR1909 - 2017

provisoriamente, mas em de-finitivo? Certamente, não! Por uma simples razão – Nanetto já é IMORTAL, ou como afirma a historiadora e pesquisadora Cleodes Piazza, é o “eterno” anti-herói. Ele estará sempre presente nas comunidades do interior, nas empresas, nas asso-ciações italianas e entidades que valorizam o Talian, nos diversos livros publicados; nos trabalha-dos acadêmicos sobre o CR que, necessariamente, farão menção a este personagem que já é marca do jornal; nas peças teatrais, no linguajar coloquial dos descen-dentes de italianos que utilizam cotidianamente a expressão “te si pròpio un Nanetto” (Tu és mesmo um Nanetto), mas princi-palmente porque, como dizia frei Rovílio Costa “in ogniuno de noantri ghe ze sconto un Nanet-to” (Dentro de cada um de nós há escondido um Nanetto).

Terra estranha: Nanetto junto a uma “planta de salames” (bananeira)

Redenção: Pedro Parenti, responsável pelo “ritorno” e Henrique Iotti

Nanetto: ícone da imigração

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CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Talian 9CR1909 - 2017

El ritorno de Nanetto Pipetta (903)

Maledeta curiosità Capirse

araria tanto fàssile poder capir-se fra gente comune, fra òmi-ni e done normale. Sì, pararia,

ma invesse se fa na fadiga granda par inténdarse uno con l´altro e no digo con chi parla na léngoa diversa dela nostra, ndove le létare del alfabeto le ghe ze tute e anca de più dele nostre, ma messe in modo diverso, che par noantri de léngoa latina ze tuto un in-dovinare.

Passiensa! Ghe ze i vocabulari fati aposta par sbroiarli. Ma el difìssile ze quando parlemo fra da noantri, spes-sialmente se parlemo de polìtica, de schei, de malatie, de religion, insuma, de argomenti che deventa difìssile par la poca disposission che gavemo de ndar d’acordo, de scoltare i altri, de volere e avere sempre rason a costo de lassarghe anca la pel. El difìssile ze quando se parla fra ómini che i fa finta de èssere sordi!

Nela Bìblia se parla dela famosa Tore de Babele, che tuti parlava al medèsimo tempo e nessun se capi-va; cominsiava la era dele léngoe nove che dopo se gavaria imparà a scola dai pòpoli moderni. Parlar tuti la stessa léngoa no bastaria: no se ca-piréssimo lo stesso par le tante teste difarente.

Ghe saria un linguagio comune a tuti, quel del amore, ma anca quelo ze ndà in disuso; quelo dela com-prension, dela pietà umana, dela ca-rità, ma ghenè tanto poca in sti tempi moderni. Adesso se capimo solo col euro, el sporco soldo che verse tute le porte e ne rende mìseri e schiavi del più bel sentimento che dovarìssimo avere: lealtà, sincerità, amore in sen-so largo, sensa rumore o crìtiche, ne egoismi.

Tornando al discorso de no capirse, me desmentegavo de nominare le bès-tie che sicuramente le ze manco sorde de noantri umani! Vardemo i can de tute le rasse, spessialmente quei che ga sempre in brasso le signore e che li porta a spasso come se fussi i so fiole-ti, i barbonsini, i bastardini o le tante rasse esistente che no cognosso, ma anca el caro can domèstico che fa la guardia ai paroni e ala casa: quando more uno dei paroni, dele volte more anca el cagneto dal dolore. Co sti can, i umani ga un diàlogo contìnuo, i se sente capìi, ascoltai, amai, protegesti mèio che dai pròpi amighi e quando fa tanta teneressa e se dise: “Pecà che a sto can ghe manca sol la parola”.

Mi, son sicuro che al mondo de là, ghe ze el reparto par ste creature, cre-ade anca lore dal Paron del universo par la felissità dei òmini, sordi al ben e al dolor. Parlemo, dialoghemo tra noantri umani, spessialmente quando restemo soli nela tardia età, non pen-semo ai s-chei, ma a tuto quelo che ne ispira la natura che dele volte la ze tanto bela. E femo de tuto par... ca-pirse.

Vita, stòria e fròtoleIlustração Derli Dutra, São José do Ouro (RS)

Cláudio ChiaradiaPasso Fundo - RS N

P

La mission de Nanetto ze continoar fando le so braùre fora pal mondoCo sta stòria, Nanetto Pipetta finisse la

so caminada ntel Correio Riograndense, dopo tanti ani che’l se ga fato presente nte-la pàgina del Ritorno. Ga mancà poco che se rivasse ale mila stòrie. Quante de bone, de bele, de fantàstiche; de far rìder e anca piander; de gaver passion, amirassion e anca pecà de sto toso dele volte metesto in imbroiade e vérghene fato arquante a sto mondo.

A sto punto dele mila stòrie, me ricordo de Eduardo Grigolo, maestro là a Jundiaí (SP), uno dei scritori del Nanetto, che’l ga dito nte na intrevista fata ntel Correio Rio-grandense de 20 de genaio del ano passà, che’l ga deciso no leser le stòrie dei altri autori del Ritorno par no far “plàgio” de qualcheduna, ma che le ga meteste via tute par lèserle quando se rivava al nùmero

a roba bela de veder ze el rispeto che tante persone ga per i animai. I ze fioi de Dio anca lori e se i ze a sto mondo

ze perché i fa parte del piano del Signor. Tén-derghe con passion, no farli tribular, darghe el conforto e el giusto magnar ze robe che no podemo desmentegarse mai se volemo man-tegner sia qual sia la bèstia o l’osel.

Tuto ntela giusta mesura! Perché ghe ze de quei che ghe tende mèio a na bèstia che a na persona. Anca così no dà! Me vien fastidi quando sento serte persone, più che sia done, che ghe ciama a can e gati “mio fiol”, “mio putel”, “vien qua cola mama...”. Per altra ban-da, vien su la ràbia quan-do se vede gente ghe fa le creature de Dio patir tuta la sorte de malegràs-sie. Le trata con crudeltà. Par mi, i ze pedo che le bèstie!.

E no adianta dir che i ze “irassionai”. I sente, i patisse, i ga paùra, i se stressa; e anca i ga pas-sion, i ringràssia, i di-fente (i can), i obedisse, i manifesta contentessa...

Nanetto ze d’acordo co mi. Lu ga tante bèstie e le tende con rispeto. Ghe manca mai de mag-nar, da bever, de un pos-to par risgoardarse del fredo, dela piova, dela note...

E quando se parla de bèstie, Nanetto ghe piase contarla de na volta che’l

1.000. Eduardo, caro, adesso te si liberà e te podi lèserle sensa paùra.

E adesso? Nanetto morto nantra volta? Nanetto che dise adio par sempre? No se sà! Ma credo che gnanca una dele due op-sion, par un sémplice detàlio – Nanetto ze imortal! Un ícone del mondo.

Sto personàgio nassesto ntele pàgine del Correio Riograndense a più de novanta ani, se ghe toca morir, sarà sempre provi-soriamente, perché el suo destino sarà ndar par el mondo fando le so braùre. “Par Na-netto, cosa saria la vita se no la fusse per far braùre? Risponder, lu no savaria, perché el ga portà vanti tuta la so vita fando braùre. E se pol dir che la pi grande braùra ze far dela vita na braùra”, me ga scrito el saudoso fra-te Rovìlio Costa quando mi go scominsià a scriver par el Ritorno a diese ani indrio.

Eco la mission de Nanetto: continoar fando le so braùre fora pal mondo e piantar radise nela memòria de tuti quei che ghe piase de sto personàgio, fin perché, come disea frate Rovìlio, ghe ze un Nanetto ren-to de cada un de noantri.

Eco, alora! Mi, Marcelino Dezen, come el autore dela ùltima stòria de Nanetto del Correio Riograndense e editore dele 903 stòrie, vui far un omàgio a tuti quei che se ga fato presenti te questo spàssio, tanto prestigià e privilegià. No mensono tuti, ma no posso assar fora Pedro Parenti, che ga tacà questa longa saga; frate Moacir Mo-lon, el visionàrio insentivador; e el Derli Dutra, el omo dele sempre bele ilustrassion (lesi ala pàgina 12).

Gràssie a tuti! Riverdersi!

Marcelino DezenCaxias do Sul - RS

ghe responde: “Securo che parlo!”. “No stà inrabiarme”, ghe dise el osel. “E cossa sucede se te inràbio?”, ghe domanda Na-netto. “Proa!”, retruca el papagal.

Corioso par saver come quela stòria fe-nia, Nanetto cava el capel e ghe bate su par la gàbia na volta, due, trè... El papagal indrissa su le pene, el da na cifolada e el osa forte: “Pega, pega, Serife!”.

Cari da Dio! Nanetto ga savesto suito el perché del “Tento col papagal”. No’l sa de ndove ze vegnesto fora quel cagnasso che parea un vedel, de grando. El ghe ga mos-trà na boca piena de denti che parea fin un segot de tanti chel ghinavea.

Piampianeto, indrio cul verso la saìda e parlando cola serenità che a quela ora zera possìbile mantegner “calma, Serife, cal-ma”, Nanetto ze rivà arente el portel ma quando’l se ga voltà par vèrserlo el can lo brinca pal tafanàrio e ghe cava un toco dele braghe e anca dele mudande. Sorte che le zera folgade perché senò ndea via anca un bel toco de culata.

Nanetto se ga fermà banda de fora a mostrarghe i pugni a quela strània dópia.

- Papagal del inferno! Se te ciapo, te cavo le pene e te l’impianto ntel... e te fao de spassadora!”.

El papagal ghe fea gnanca caso. “Brao, Serife”, el seitava dirghe al can che, parà via l’intruso, ze ndà butarse zo a l’ombria. A Nanetto ghe ga sobrà ragionar che quei due i zera stati trenai polito par difender la casa e i lo fea ben. Stùpido lu che no ga resistio ala curiosità.

La conclusion de Nanetto: “I dise sem-pre de ténderse dela boca dei can, dei cor-ni del toro e dele peade del mul... e nte sto caso, anca del bec del papagal”.

ze ndato te na casa che no’l cognossea, el bate ntel portel, ma nissun lo atende. Alo-ra el verse e portel e el se fa avanti, piam-pianeto. Co’l riva ntela varanda, el vede un papagal nte na gàbia picada ntela pare-de e, pena sora, el scrito: “Tento col papa-gal”. Òspia, ga pensà Nanetto, “gavaralo cossa de spessial che toca ténderse?”. El va pi arente, i se varda e dopo de un tem-po, el papagal ghe domanda: “Pàrlitu?”. Nanetto se spaventa cola domanda e el

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Aldo Colombo: no dia 10 de outubro de 1979 estreou a coluna Olhar Diferente

Opinião 8CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

Cultura 13CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

elho Staffetta - centenário Staffetta - carre-gado de anos e de glórias, nos encontramos pela última vez. Em seguida, tu vais partir.

Para mim, será como perder um amigo, mais que amigo, um confidente, um familiar. Foi decidido, tu deves partir. Não há mais lugar para ti. Causa mortis: anemia, não tua, mas de muitos. Talvez você pudesse viver mais, mas aí entram em jogo algumas moedas...

Vou sentir muito tua falta. Tua visita semanal era uma festa, um raio de luz. Você me colocava a par de tudo, inclusive de notícias que a mídia sensacionalista despejava sobre nós. Você nos contava de novo os fatos, mas de maneira dife-rente.

Você me colocava a par dos preços agrícolas, dos que haviam morrido aqui no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina ou no Paraná. Você me falava de festas, de enchentes, da praga dos gafa-nhotos... Você dava uma importância toda espe-cial às notícias da Igreja.

Você me informou da eleição e da morte de uma dezena de papas. O primeiro foi Bento XV, em meio a uma Europa em chamas; depois, Pio XI, Pio XII. Com surpresa surgiu o desconhecido Papa bom, João XXIII, o Papa do Concílio. Cou-be ao seu sucessor - Paulo VI, um papa que não sorria - realizar uma obra monumental ordenando as imensas intuições conciliares. Depois houve a eleição do Papa João Paulo I e - apenas 33 dias depois - sua morte. Após 700 anos, um papa não italiano, o polonês João Paulo II, é eleito, vindo da Cortina de Ferro. A história caminha e o car-deal Ratzinger, um professor, é eleito, assumindo o nome de Bento XVI. Surpresa, espanto, o Papa renuncia e em seu lugar o Conclave busca, “no fim do mundo”, o Papa Francisco, com a doçura de seu protetor e uma coragem profética.

Também tu - velho Staffetta - me informavas de política. O Brasil tem um novo presidente, contava em junho de 1909: Nilo Peçanha. E de-pois, mais 33 presidentes, entre os eleitos, os im-postos, depostos, legítimos ou não.

Também revelavas as reviravoltas da Segunda Guerra Mundial, com 50 milhões de mortos, 28 milhões de mutilados e prejuízos materiais calcu-lados em um trilhão e 500 bilhões de dólares. De-pois, os sinos anunciando a paz, uma paz cheia de crises, com a Terceira Guerra Mundial apavorando a humanidade. Estados Unidos e União Soviética ameaçavam com seu arsenal de bombas, capazes de destruir o planeta Terra sessenta vezes. Em Berlim foi erguido o Muro - símbolo de uma época - que acabou derrubado pelos ventos da liberdade.

Muitos custaram a crer, mas o homem che-gou à Lua, um coração humano foi transplanta-do e nasceu um bebê de proveta. Há 100 anos, o Staffetta tinha apenas oito anos e Maria apareceu em Fátima. Mais tarde, a sua imagem peregrinou pelo Brasil, nos ombros dos missionários coorde-nados por frei Bernardino Vian, que contava aos assinantes as maravilhas de Fátima e suas pom-binhas. E o Concílio? Quantas notícias, falsas e verdadeiras. A Igreja caminha para trás, a Igreja caminha para frente... É primavera, é inverno... É o Espírito Santo, é o maligno. Aí veio a mis-sa em português e os padres deixando de lado as tradicionais batinas.

Houve um dia especial, em janeiro de 1924, que você me apresentou um novo amigo: Nanet-to Pipetta, nascido na Itália e vindo para a Amé-

rica “par catar la cucagna”. Ingênuo e esperto, ele imortalizou a saga da imigração italiana. Já naquele tempo, a miopia estava a postos e, num belo dia, um superior determinou: “L’è ora de fi-nirla con sto Nanetto”. E o pobre morreu - sem extrema-unção - nas águas do rio das Antas. De-pois, voltou por obra de Pedro Parenti, mas não era mais o Nanetto original.

Ao longo de todo este tempo, Staffetta, quanto bem você semeou! Muitos dos teus textos cor-riam pelo Brasil, eram copiados, “xerocados”, multiplicados. Artigos viraram livros e muitos universitários utilizaram teus temas e tuas pági-nas para trabalho de conclusão do curso. Quantos fatos pitorescos em tua história. Numa capela do interior, no domingo à tarde, um menino de dez

anos lia para os adultos, muitos deles analfabe-tos, as últimas notícias. Um assinante, depois de um dia de trabalho, ao clarão da lua folheava tuas páginas. Outro “sócio” - assim se chamavam os assinantes - guardava os exemplares sobre uma mesa, por ordem de chegada e, nos dias de chu-va, lia os primeiros, isto é, os mais antigos. Nada como o jornal de ontem!

Você foi cartilha, catecismo, Bíblia, igreja e es-cola para muitas gerações. Algumas vezes você

também se enganou. Isto faz parte da finitude humana. Mas como dizia o primeiro Editorial: “se um dia tiver de morrer, morrerá católico”.

Você parte, Staffetta, mas não será esquecido. Em tuas páginas, um dia, eu contei a história do sino. Numa aldeia de pescadores, numa rocha, bem perto do mar, existia uma pequena igreja, com seu tradicional sino. Ele anunciava os acon-tecimentos importantes: naufrágios, nascimen-tos, guerras etc. Numa noite de tempestade, uma onda descomunal levou a igreja e o sino para o fundo do mar. A aldeia ficou órfã e silenciosa. Um dia, um homem, desiludido, resolveu se afo-gar. Quando as ondas geladas estavam prestes a levá-lo para a morte, ele ouviu o sino tocar. E isto o fez mudar a decisão. Depois, de tempos em tempos, sobretudo nas horas de crise, algu-mas pessoas escutavam a voz do sino. Ouçam, o sino está tocando.

Você parte, Staffetta, mas de vez em quando voltará a falar. Quando os Capuchinhos feste-

jam 120 anos de presença no Rio Grande do Sul - com Gratidão, Paixão e Esperança

- você silencia. Frei Bruno pensou no jornal como uma página semanal do

evangelho às famílias. Esta página - lamentavelmente - rasgada.

Guimarães Rosa afirmou: “Os bons não morrem, se en-

cantam”. Você ficará como lem-brança, encantamento, de um tempo

que não volta mais. E todos nós ficamos mais pobres e silenciosos.

Meu abraço comovido à equipe que, em cli-ma de velório, levou o jornal até o fim. Com dig-nidade. Meu abraço aos assinantes que resistiram até o fim. Choramos juntos. Foi uma herança que passou de pai para filho. Era orgulho da famí-lia ser “sócio” do jornal. Valeu a pena a luta de tantos durante tanto tempo? Quem responde é Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena!”

Obrigado, velho Staffetta, tua luta não foi em vão. Muitas sementes foram lançadas na terra. Certamente, muitas delas germinaram. Outras irão germinar.

V

Você foi cartilha,

catecismo, Bíblia, igreja

e escola para muitas

gerações

Obrigado, velho Staffetta, tua

luta não foi em vão. Muitas

sementes foram lançadas

na terra. Certamente, muitas delas germinaram.

Outras irão germinar

Frei capuchinho, formado em Filosofia, Teologia e Jornalismo. Reside em Garibaldi, onde é vigário paroquial e superior da fraternidade

Velho Staffetta Riograndense, adeus!

Olhar diferenteALDO COLOMBO

pois, mais 33 presidentes, entre os eleitos, os im-

Também revelavas as reviravoltas da Segunda Guerra Mundial, com 50 milhões de mortos, 28 milhões de mutilados e prejuízos materiais calcu-lados em um trilhão e 500 bilhões de dólares. De-pois, os sinos anunciando a paz, uma paz cheia de crises, com a Terceira Guerra Mundial apavorando a humanidade. Estados Unidos e União Soviética ameaçavam com seu arsenal de bombas, capazes de destruir o planeta Terra sessenta vezes. Em Berlim foi erguido o Muro - símbolo de uma época - que acabou derrubado pelos

Muitos custaram a crer, mas o homem che-gou à Lua, um coração humano foi transplanta-do e nasceu um bebê de proveta. Há 100 anos, o

tinha apenas oito anos e Maria apareceu em Fátima. Mais tarde, a sua imagem peregrinou pelo Brasil, nos ombros dos missionários coorde-nados por frei Bernardino Vian, que contava aos assinantes as maravilhas de Fátima e suas pom-

fatos pitorescos em tua história. Numa capela do interior, no domingo à tarde, um menino de dez

anos lia para os adultos, muitos deles analfabe-

levá-lo para a morte, ele ouviu o sino tocar. E isto o fez mudar a decisão. Depois, de tempos em tempos, sobretudo nas horas de crise, algu-mas pessoas escutavam a voz do sino. Ouçam, o sino está tocando.

Você parte, Staffettavoltará a falar. Quando os Capuchinhos feste-

jam 120 anos de presença no Rio Grande do Sul - com Gratidão, Paixão e Esperança

- você silencia. Frei Bruno pensou no jornal como uma página semanal do

evangelho às famílias. Esta página - lamentavelmente - rasgada.

Guimarães Rosa afirmou: “Os bons não morrem, se en-

cantam”. Você ficará como lem-brança, encantamento, de um tempo

que não volta mais. E todos nós ficamos mais pobres e silenciosos.

Meu abraço comovido à equipe que, em cli-ma de velório, levou o jornal até o fim. Com dig-nidade. Meu abraço aos assinantes que resistiram até o fim. Choramos juntos. Foi uma herança que

Tributo: Cleodes Piazza e Nanetto Pipetta, homenageados no desfile da Festa da Uva de 2016

Nanetto Pipetta, ícone que encarna a história de um povoTexto de Cleodes Piazza*

Caxias do Sul - RS

Historiadora,

antropóloga,

professora,

escritora e

pesquisadora

* Cleodes Maria Piazza Julio Ribeiro

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o dia 23 de janeiro de 1924, na Tipografia Sta-ffeta Riograndense de Ga-

ribaldi, tem início a publicação da saga VITA E STÓRIA DE NA-NETTO PIPETTA, nassuo in Ita-lia e vegnudo in Mèrica per ca-tare la cuccagna (Vida e história de Nanetto Pipetta que nasceu na Itália e veio para a América em busca da cocanha).

Na primeira página daque-la publicação, o autor, Aquiles Bernardi, informa: “Duas pala-vras pra gente se entender”. Faz, então, uma espécie de conversa com o leitor onde, além de afian-çar que a história é genuína, o narrador ainda diz que os que a lerem ficarão contentes e os ou-tros nada saberão de tudo o que será dito. Diz mais, que a ele, narrador, não lhe desagrada que alguém ache graça e, se alguém se comover, que fique à vontade.

Está definido, pois, o tom que deverá predominar em toda a narrativa: um permanente estado de humor que justifica uma das suas principais funções: o entre-tenimento. Na base de cada epi-sódio está um elemento que pro-voca o riso. A popularidade de Nanetto se deu, em grande parte, pela presença desse elemento de comédia que serviu para satisfa-zer a vontade de rir do povo.

Em que pese a primitiva for-ma impressa, a oralidade é que incorporou a persona em Nanet-to Pipetta à tradição das stórie dell’Amèrica e della cucagna. Com isso podemos dizer que o ciclo da Vita e Stória de Nanetto Pipetta foi cumprido num pro-cesso inverso ao que se dá com a literatura de inspiração popular que, recolhida da tradição oral, ganha foro de obra impressa.

É, pois, oportuno considerar que se a presença do jornal cria as condições materiais para a di-vulgação das histórias, os ouvin-tes oferecem as condições neces-sárias para que ele se torne um texto oral. Aliás, o próprio narra-dor, desde logo, anuncia aos seus leitores que a história será conta-da numa sucessão de quadros: la storia la spartimo in tocchi che ciamaremo Capítoli, e quando un Capítolo ze finio ghin cápita nantro, e sempre cosi (partimos a história em pedaços, que va-mos chamar de capítulos e, quando um capítulo termina, começa outro, e assim por diante).

Além do que foi dito, é importante conhecermos também os dados essenciais da própria história e do nosso personagem.

Nanetto Pipetta é um jovem camponês, um contadino. Vive numa comunidade rural do Vê-

N

neto onde a imagem da América já atrai levas de italianos. Pelas suas traquinagens é ameaçado de ser enviado para a América na esperança que fassi un poco de giudíssio (crie um pouco de juí-zo). A imagem da América passa

então a inquietá-lo: La Mèrica, cossa sarala sta Mèrica, che la sípia na gran cuccagna... Mi digo de sí ... La Mèrica, mi digo, che la gà da essere un brolo pien de grassie del Signore (a Amé-

rica que coisa será essa Amé-rica… Talvez seja uma grande cocanha… Eu acho que sim!... A América eu acho que deve ser

um pomar cheio das graças do Senhor).

E decide partir. Faz a cami-nhada até Veneza de onde saem os trens que transportam os imi-grantes até o porto de Gênova. Gênova — e o cômico da situa-

ção é logo paradigmático — já lhe parece ser a América: os

genoveses falam a língua italia-na, ao contrário de Nanetto que só se expressa no dialeto de sua aldeia. Eles não o entendem, nem ele entende os genoveses: “Se sti mericani dell´osteria i me capisse almanco!... Ma che speransa!... I parla ne la lengua, che no li capisso gnanca mi, no li capisso” (Se esses americanos da hospedaria ao menos me en-tendessem!... Mas, que esperan-

ça, não os entendo eles).Após alguns percalços cômicos

entra clandestinamente no navio que o transportará para a Améri-ca. Aqui chegando, continuará in-cansavelmente à procura da cuc-cagna. Será sempre um itinerante à procura do eldorado.

Essa busca contínua, no des-dobrar das caminhadas do per-sonagem, forma uma correlação com o próprio texto: o tema-base é a procura da cuccagna, procura essa que não se encerra jamais.

Os episódios narrando as aven-turas de Nanetto Pipetta, escritos numa mescla de dialetos do tipo vêneto, com arremedos do cre-monês, lombardo e, ainda, de expressões aportuguesadas, se converteram em stórie, ou seja, se transformaram em fábulas que foram transmitidas oralmente ao universo das antigas colônias e alcançado, hoje, por apreciadas expressões da cultura popular.

Um patrimônio cultural

No dia 23 de janeiro de 2017, o Correio Riograndense e seus leitores celebraram os 93 anos da primeira edição do então Staffeta Riograndense, no qual foi publi-cado o primeiro capítulo de “Vita e Stória de Nanetto Pipetta nas-suo in Itália e vegnudo in Mèrica per catare la cuccagna” (Vida e história de Nanetto Pipetta que nasceu na Itália e veio para a América em busca da cocanha).

A seu modo, as histórias de Nanetto Pipetta contaram quem somos, descobriram nossas raí-zes, nossos usos e costumes, nos divertiram e nos emocionaram.

Em síntese, nos fizeram com-panhia ao longo dos anos atu-alizando histórias com novas versões - na série El Ritorno de Nanetto Pippetta, já no capítulo de número 903 - e ocupando seu espaço, como sempre, na página

que lhe coube no Correio Riograndense, que com

esta edição de número (5.532) encerra sua

trajetória e deixa de circular como jornal

impresso após 108 anos.

Continuaremos lei-tores e logo, logo, faremos a

grande festa do centenário de “Vita e Stória de Nanetto Pipetta que nasceu na Itália e veio para a América em busca da cocanha!”

Até breve.

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Cultura 14CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

fenômeno da língua ta-liana o conheci quando vivi no Brasil, chegando

da Itália, cerca de 10 anos para estudar e fazer pesquisas, que tiveram como resultado o pro-jeto Cantando em Talian, uma pesquisa realizada na Itália e no Brasil, em relação ao fenômeno da imigração do Norte da Itália e do patrimônio cultural do povo oriundo em novas terras brasi-leiras. Meus livros Cantando in Talian e Descobrindo o Talian relatam a tradição, os usos, os costumes, a música, as canções e especialmente a língua, que ainda constituem o fio condutor entre as migrações do século XIX e as novas gerações de des-cendentes.

Esta pesquisa propõe-se a va-lorizar e promover a cultura e a história talianas, que nunca ti-veram espaço nas escolas e nos livros didáticos. Senti a necessi-dade de recolher os testemunhos e as experiências das pessoas que tive a sorte de conhecer na Itália e no Brasil, com o objeti-vo de criar uma ponte entre os dois mundos. É incrível ver ain-da hoje, após todos esses anos, o amor que bate nas comunidades ítalo-brasileiras pela terra natal dos antepassados. As palavras, as músicas, as canções e as emis-sões radiofônicas são veículos extraordinários para a transmis-são de valores, riquezas culturais que construíram o sul do Brasil.

Cucagna - Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e até Es-pírito Santo e Minas Gerais são os lugares que propiciaram um futuro e a esperança a muitos que acreditaram ter encontrado a Mèrica e a cucagna em terras acidentadas e desconhecidas. Saíam do porto de Gênova, com destino à Mèrica. Em poucas semanas as pessoas pisavam no novo mundo e eram destinadas a terras virgens e desconhecidas e, então, sozinhas e receosas, mui-tas vezes perdiam as palavras e a esperança. Neste contexto, o Correio Riograndense adquiria um valor único e inestimável, es-crevendo crônicas da Itália, his-tórias e informações úteis para aqueles que tinham chegado ao Brasil. Muitas vezes, publicava a lista de casamentos, os batizados e os funerais, informações que não havia como fazer chegar às pessoas a não ser pelo jornal, de-vido às grandes distâncias. Essas eram lidas e compartilhadas em torno de um fogon, em alguma remota linha ou colônia.

Eram informações lentas e so-fridas, que carregavam o peso de cada passo, nos caminhos da flo-resta ou das corridas feitas para relatar à família que aquele pa-

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Preservação: jornal ajudou a manter a história viva e forte, depois de 140 anos da imigração italiana ao RS

Gastronomia: Giorgia fazendo polenta, num evento em Concórdia

Carteado: descendentes de italianos herdaram o gosto pelo jogo

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Leitores do CR perdem uma janela para o mundo

rente distante, do qual ninguém sabia nada, estava ainda vivo. Palavras que enchiam o coração e a alma, linhas que alegravam aos sortudos que dominavam a leitura, letras que as pessoas tentavam capturar dos lábios de quem as liam, com o desejo de saber e poder, por um momento, sair da roça, do vale, dos locais de duro trabalho e cotidiano es-forço.

O Correio Riograndense sem-pre uniu as comunidades ita-lianas distantes, integrando-as

num território muito amplo e oferecendo-lhes uma identidade comum, unindo-as, amarrando-as às suas raízes. A linguagem utilizada era frequentemente o Talian, idioma formado graças à herança que os imigrantes trou-xeram com suas bagagens, te-souro único e profundo.

Em casa - Um jornal que descobri com alegria, surpresa e íntima emoção nos anos em que estava hospedada na casa de uma senhora que me mostrava

com orgulho as páginas dedica-das ao Talian. Um fenômeno que não conhecia ainda plenamente, mas que capturou meu coração e me fez sentir em casa, depois de vários meses ouvindo e falando unicamente o português.

Adorava ler as histórias conta-das no jornal, tanto que toda se-mana recortava as páginas para preservá-las e trazê-las para a Itália e torná-las conhecidas às pessoas mais queridas; mostrá--las aos meus conterrâneos e informá-los de uma realidade conhecida só nas famílias que tinham enfrentado diretamente o fenômeno da emigração. O CR apresentava notícias sobre a comunidade, a religião, os cos-tumes e as tradições, escritas de forma clara e, muitas vezes, com termos já esquecidos ou em de-suso na Itália.

Essas palavras tocavam minha alma, porque me lembravam dos dias passados no colo de minha avó, a ouvir histórias e rimas que abriam os olhos ao mundo de uma criança curiosa. Acompa-nhavam-me as músicas de Mam-ma Mia e Vecchio Scarpone que minha avó cantarolava continu-amente e enchiam os silêncios da vida cotidiana e de meu co-ração terno. Encantavam-me os refrões daquelas músicas popu-lares, que ecoavam na sala onde ela costurava todos os dias e me apaixonava daquele mundo doce e sincero, que depois encontrei nas famílias no Brasil.

História viva - O Correio Riograndense fala de famílias e comunidades, dando voz ao emigrante, a sua história e à ba-gagem cultural e imaterial que trouxe com ele durante as via-gens e a estabilização no Brasil. Para o imigrante que só ouvia a língua local, ler o CR significava viver um momento de grande li-berdade, e por um tempo se sen-tia perto da terra natal. O jornal, além de um belo trabalho sobre a identidade e a cultura da imigra-

ção, conseguiu comover muitos italianos do velho continente, mostrando-lhes como nossa his-tória consegue permanecer ainda viva e forte depois de 140 anos e 12 mil quilômetros de distância, derrubando o muro do tempo e do espaço com a força do amor pelas raízes e origens.

Um jornal local pioneiro no acompanhar muitas pessoas dis-persas, revolucionário em ofe-recer informações na língua de quem chegava de fora, engraça-do em aliviar os espíritos (e aqui se insere a figura do Nanetto Pi-petta, ícone da imigração) e se necessário capaz de tomar suas defesas, ao informá-los sobre os direitos e, no período da guerra, conclamar muitos imigrantes para ajudar sua terra natal. De-monstrou grande sensibilidade pelo leitor, que muitas vezes era também um escritor e protago-nista de sua história, tornando--se hábil em expressar seu pen-samento através das ciàcole da vida cotidiana. Representou li-berdade de expressão, contando ao nosso povo a vida, a história, a força e a fragilidade da epopeia das grandes migrações.

Voz que cala - Hoje o Correio Riograndense deixa de emocio-nar nosso coração e os leitores perdem uma janela para o mun-do, sua voz apaga-se para sempre e, por conseguinte, encerra tam-bém o contato com a sua comu-nidade. É um momento doloroso e é difícil aceitar o seu encerra-mento. Abandonar o que se ama profundamente e ao que muitos dedicaram uma vida inteira, abre uma ferida profunda difícil de curar, consciente de perder uma voz sincera e um grande presen-te que acompanhou a identidade, a dignidade, o sofrimento e as alegrias de uma imensa comuni-dade imigrante.

Fica a esperança de que todos os talianos, conscientes do valor deste jornal, possam evitar o va-zio que ameaça deixar um silên-cio ensurdecedor e remover uma voz tão significativa.

Texto de Giorgia Miazzo*Carmignano di Brenta, Pádua, Itália

Opinião 7CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

* Giorgia Miazzo

Nasceu em Pádua, Itália, é professora, intérprete, escritora e jornalista. Além de vários artigos em jornais e revistas na Itália e no exterior, escreveu

os seguintes livros: Cantando in talian. Imparar el talian co la mùsica, 2014; Descobrindo o talian. Viagem só de ida para Mèrica (em italiano e português), 2014, 2015; I miei occhi hanno visto. Storie di sguardi ed emozioni di viaggiatori e migranti, 2015; Le grandi migrazioni. Dal nord Italia al Brasile, 2016. Contatos com a pesquisadora italiana pelo e-mail: [email protected]; site: www.gior-giamiazzo.com; facebook: Giorgia Miazzo Cavinato; whatsapp: +39 3936511212

az parte da vida estar em cons-tante ritmo de mudança. Desde as realidades mais importantes

até as mais simples e insignificantes, em tudo e sempre há um clamor de mudança. Nosso nascimento é uma mudança! Passamos da proteção global do ventre de nossa mãe e mu-damos para um mundo desconheci-do e imensamente mais amplo, mas também inseguro. Nosso crescimen-to necessita e está todo envolvido em mudanças. Nossa partida deste mun-do é também uma mudança defini-tiva. Porque somos também história e fazemos história, estamos sempre em mudança.

O ritmo cotidiano da vida e da his-tória vai exigindo de nós mudanças rotineiras e simples, outras imprevis-tas e extraordinárias. Para podermos viver e conviver, seja com as pesso-as, seja com a atualidade dos avan-ços que a criatividade humana nos oferece, não há como nos fechar às mudanças. Mudamos de mentalidade; mudamos de comportamento; mu-damos modos de vestir, de nos alimentar, de nos relacionar conosco mesmos, com os outros, com o mundo e até mesmo com Deus.

Existem mudanças forçadas que demoram, mais ou menos, para serem assimiladas e in-tegradas em nossa mente, em nosso coração e até nos motivar em nossas ações. Existem mu-danças condicionadas à normalidade dos fatos, diante das quais podemos resistir, mas não temos como fugir. Existem mudanças que desafiam

nossa acomodação e se tornam provocadoras de avanços, tanto pessoais como sociais. Existem mudanças passageiras e outras profundas, como as de nosso tempo, que estão operando uma mu-dança de civilização.

Para nós, são melhores as mudanças que vão acontecendo e nos motivam a tomar decisões conscientes, livres e responsáveis. Estas também têm o seu preço, pois toda a decisão exige uma cisão, que não nos isenta de certa intensidade de dor. Falo assim acenando a mudança que, a par-tir deste número, o Correio Riograndense come-ça a concretizar.

Um jornal, mais que centenário, cujas mensagens foram elaboradas por tantas mentes e tantos afetos e passou por tantas mãos para ser lido e aprecia-do, passa agora para o formato online, mudando o modo de comunicar-se, mas mantendo e aperfeiçoando seus conteúdos formativos e informativos. O mundo da comunicação, e seus meios, acelera sempre mais seu ritmo de mudança.

Com certeza, o público de leitores mais antigo será o que mais sentirá esta mudança, mas também é bom pensar que uma multidão que não conhecia este jornal poderá, a partir desta mo-dalidade, ter contato e se apoderar dos conteúdos do Correio Riograndense.

Falando com Dom Itamar Vian, ar-cebispo emérito de Feira de Santana na Bahia, confirmou-me que o jornal mais antigo do estado, senão do Brasil, “Folha do Norte”, a partir de 2016 dei-

xou de circular na forma tradicional e passou a estar disponível de modo online. Quando Dom Itamar chegou a Feira de Santana recebia sete jornais. Hoje circulam apenas um diário e um semanário.

Correio Riograndense não vai parar, mas vai mudar seu caminho e seu modo de chegar. Cor-reio Riograndense não vai morrer, sua herança de ontem se manterá viva e sua presença dife-renciada de hoje facilitará o acesso ao mundo. Registro meu obrigado ao passado deste meio de comunicação e convido a confiar, na esperança, em seu futuro!

oram dias e dias pensando em como dar forma e conteúdo à crônica da última edi-ção impressa do Correio Riograndense.

Devo ter sido o último cronista a integrar a equipe que, semanalmente, brinda os leitores com temas e pontos de vista que convidam à reflexão. Foi necessário voltar, por uns instan-tes, às lembranças da infância para encontrar o ‘enredo’, a fim de agrupar harmoniosamente as palavras para encerrar o atual formato do nosso centenário jornal. Os sentimentos são muitos e diversos. A realidade, por vezes, impõe decisões que não dependem unicamente da vontade. Na verdade, não é um término, mas uma passagem, uma mudança. Não vivemos mais apenas num mundo físico e material. A tecnologia virtual in-filtrou o cotidiano e moldou outras maneiras de relacionamento e comunicação. O Correio Rio-grandense está no compasso desse novo tempo.

Nasci no interior de Caxias. Cresci em con-tato com o ‘pacote de jornal’ chegando sema-nalmente. O ônibus dava um sinal e deixava o Correio Riograndense à beira da estrada. Como éramos em vários irmãos e primos, alguém saía correndo para pegar o pacote. O nono, imigran-te italiano, era o agente. Depois da sua partida, o tio que ficou na casa paterna assumiu a mis-são. Por fim, meu irmão mais velho tornou-se o responsável, mas quem se encarregava da

distribuição era a minha saudosa mãe. Não deixa-va de ser um verdadeiro ritual semanal: o jornal era aguardado com expectati-va e emoção.

A continuidade dos es-tudos obrigou minha saída do interior. Como precisa-va trabalhar para garantir o sustento, fui acolhido como empacotador sema-nal do jornal. Até então, não havia pensado na vo-cação capuchinha. Foi o testemunho dos freis que despertou o chamado à vida religiosa e sacerdo-tal. Minha história fami-liar e vocacional sempre contou com a presença do Correio Riograndense. Seriam necessárias muitas edições e muitas páginas para registrar outras histórias de milhares de leitores. Com certeza, a missão foi cumprida. Gratidão aos que fizeram, distribuíram e leram o nosso centenário jornal, que trocou de nome, algumas vezes, mas nun-ca abandonou sua essência. Agora ele muda de

formato: deixa de ser impresso para ocupar um lugar no mundo virtual. Não estou me despe-dindo, pois iremos nos encontrar nesse novo es-paço. O ônibus já não entregará mais o pacote com os jornais. Mas ele estará na tela virtual, continuando sua importante missão.

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Para podermos viver e

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avanços que a criatividade humana nos

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A missão foi cumprida.

Gratidão aos que fizeram,

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centenário jornal, que

trocou de nome, algumas vezes,

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Frei capuchinho, formado em Filosofia e Teologia. Pároco na Paróquia Santo Antônio, em Porto Alegre, RS. É também compositor e músico

Frei capuchinho, formado em Filosofia, Teologia e Administração. Pós-graduado em Gestão de Pessoas e Administração, mestre em Ética Organizacional

LUIZ TURRA

JAIME BETTEGA

As constantes experiências de mudança

Necessárias transformações para continuar a missão

No coração da vida

Luiz Turra: começou a escrever crônicas para o jornal em 28 de julho de 2010

Jaime Bettega: estreou como articulista do CR em 26 de junho de 2013

Olhar à vida

Page 15: Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de ... · nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal ... isso em face do santo batismo que nos elevou

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CRCorreio Riograndense sempre se preocupou em promover a multiplicida-

de de pensamento. O primeiro nome do Correio Riograndense, La Libertà, já definia o estilo jor-nalístico. Seria jornal de opinião. A liberdade proclamada não seria em relação à Igreja, uma vez que se definia como papal. A liberda-de, de pensar e escrever, visava alguns grupos específicos da re-gião, considerados anticlericais, com influência da maçonaria.

Nos primeiros 20 anos qua-se não apareceram artigos assi-nados. Seu conteúdo refletia a opinião da Igreja. Era a verdade oficial, que dispensava nomes e assinaturas. Questões mais can-dentes eram abordadas pela dire-ção do jornal, especialmente no tempo de dom Carmine Fasulo.

O polêmico monsenhor Ascâ-nio Brandão pode ser conside-rado o primeiro colunista. Foi chamado de apóstolo da Boa Im-prensa. Por quase 20 anos com-pareceu regularmente nas pági-nas do jornal, num estilo bastante agressivo. Também neste tempo foram publicados artigos do es-critor gaúcho Ernani Fiori.

Na edição de 1° de maio de 1949 aparece a primeira contri-buição do padre José Busatto. Ele abordava assuntos gerais. Outros artigos eram assinados por pseu-dônimos ou pelas letras iniciais do nome. Regularmente apare-ciam Cartas Circulares de dom João Becker (Porto Alegre), An-tônio Reis (Santa Maria) e José Barea (Caxias do Sul). O jornal mantinha espaço para o papa Pio XII, dando importância às rádio-mensagens, dirigidas - Urbi et orbi - a Roma e ao mundo.

Com o passar do tempo cres-ceu o número de artigos assina-dos. É o caso do frei Mariano de Alfredo Chaves e do frei Luiz Ferronatto. O primeiro num esti-lo mais literário, enquanto o frei Luiz era cáustico e polêmico.

Paraná - Em abril de 1951 fazia sua estreia no jornal o pro-fessor Vicente Barroso. Paulista, conheceu o norte do Paraná e a incipiente colonização. Numa longa série de artigos, Vicente Barroso fala das possibilidades do “famoso norte do Paraná”. Foi um incentivador das migra-ções gaúchas para aquele estado. Barroso escreveu artigos e repor-tagens até o começo da década de 70. Na edição de 2 de maio de 1951 aparece o primeiro arti-go assinado pelo frei Bernardino de Vilas Boas. Outras vezes assi-nava apenas frei Bernardino ou

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Espaço permanente à reflexãoA credibilidade dos textos publicados se apresenta como o grande trunfo do jornal

# COLUNISTAS

frei Bernardino Vian. Escrevia de Portugal, para onde fora em mis-são. Destaque ainda para frei Fi-delis Dalcin Barbosa e frei Odo-rico Dalmolin, que trabalhava na Cúria Geral, em Roma. Eram janelas desde a Europa. Frei Ber-nardino comandou uma equipe de missionários que varreu o país com a imagem de Nª Srª de Fá-tima. Seus retumbantes sucessos apareciam nas páginas do Correio Riograndense em artigos.

Neste mesmo ano começaram a aparecer artigos do frei Teodoro Ferronatto. Em outubro de 1951, surge pela primeira vez um arti-go do padre Benjamim Busatto. A coluna permanente se intitu-lava “Política e Colônia”. Padre Benjamim, com o pseudônimo de Chico Tasso, visava a partici-pação política dos agricultores. Missionário no Brasil Central, frei Luiz Maria de Tomás Flores, também conhecido por Ricardo Liberali, enviava matérias abor-dando rios desconhecidos, tribos semicivilizadas, cobras e árvores gigantescas do Mato Grosso.

Caipira - Na edição de 8 de outubro de 1945, os leitores do Correio Riograndense encon-tram uma novidade: Correspon-dência Caipira, coluna assinada por um tal de Zé Fernandes. Era o pseudônimo do frei Dionísio de Antônio Prado, que teria papel destacado no jornal por 25 anos. Também usava o pseudônimo de Pimentinha. O jornal, que come-çara em italiano e passou depois para o português, abria-se agora para o linguajar gaúcho e caipira. O primeiro artigo tinha como tí-tulo: Vortô tosquiado.

Aos poucos foram aparecendo mais artigos assinados: frei Ar-canjo Bisotto, que seria, mais tar-de, editor do jornal, frei Alberto Stavinski e outros. No fim da dé-cada de 60, os padres Pedro Luiz e Benjamim Miotto começaram a escrever com regularidade. Em 29 de abril de 1953 José Zugno assina a primeira coluna Vida Agrícola, que escreveria por qua-se 55 anos.

Em 1964 aparece a primeira contribuição do jovem jornalis-

ta Victor Faccioni. São também significativas as participações do padre Antônio Galiotto, destacan-do a importância da Frente Agrária Gaúcha e dos Sindicatos Rurais. Neste sentido também destaca-se o nome do deputado Adolfo Pugina. Em 1967, Hélvio Remussi e Décio Dutra, dois jovens capuchinhos, mudaram o conteúdo e diagra-mação. Na edição de 13 de maio aparece uma coluna sobre um as-sunto até então proibido: futebol. Era a Bola na Rede, de frei Aldo Colombo.

Mudança - A edição de 28 de abril de 1970 marca profunda mu-dança. O jornal, até então standart, passou a ser tabloide e a cores. Fora adquirida uma impressora Goss Community, a primeira em offset no interior gaúcho. Mudou também o conteúdo do jornal, dan-do ênfase maior à notícia, sobretu-do visando os municípios da região colonial italiana. Por oito anos as-sumiu a direção um jornalista lei-go, Décio Osmar Bombassaro.

A página 4 do jornal foi definida como opinião. Além do editorial eram publicados mais dois artigos de opinião, com rotatividade dos autores: Mário Gardelin, Aldo Co-lombo, Ovídio Deitos, Jimmy Ro-drigues, Leonel Santin, Floriano Molon, Rovílio Costa, Luiz Alber-to de Boni e Geraldo Moser, entre outros. Os dois últimos enviavam contribuições da Alemanha. No corpo do jornal também aparece-ram contribuições, entre outras, de frei Jaime Biazus e Tasso de Lima Neto (Luiz Alberto de Boni). Eram temas distribuídos em dezenas de capítulos. Frei Evaristo Parisotto manteve, durante algum tempo,

uma coluna sobre a Ordem Franciscana Secular.

As colunas começaram a ter espaço maior. Artigos sobre vida matrimonial, assinados por Leonel (frei Leonel Santin), fo-ram publicados ao longo de 10 anos. Na edição de 16 de janei-ro de 1974 estreava novo colu-nista: Wilson João, capuchinho. “Wilson João dá o recado” era o título. O primeiro artigo: Doen-ça da Solidão. Em 25 de maio, padre Zezinho volta a compa-recer com “Um Minuto para Cristo”. No dia 10 de outubro de 1979 estreia Olhar Diferente, de Aldo Colombo.

Contraponto - Com o ob-jetivo de evitar o pensamento único, a direção do CR passou a publicar a coluna do Frei Bet-to, dominicano, que tem livre acesso aos principais jornais do Brasil. Frei Betto representa a corrente centro-esquerda da Igreja, afinada com a Teologia da Libertação. Sua primeira contribuição foi editada a 12 de janeiro do ano 2000. Em de-zembro do mesmo ano estreou o ex-frade franciscano Leonar-do Boff.

Por fim, no começo de 2004, começou a colaborar a teólo-ga leiga Maria Clara Luchetti Bingemer. Mais recentemente, entraram na história frei Jaime Bettega, com a coluna Olhar à Vida, e frei Luiz Turra, com a coluna No Coração da Vida.

O CR fez da opinião sua linha principal. O jornal ensina a ma-neira de entender as notícias. A credibilidade se apresenta como o grande trunfo do jornal. Doutor José Zugno: assinou coluna Vida Agrícola por 55 anos

Frei Wilson João: colunista deixou seu recado durante 39 anosFrei Aldo: da inovação, falando do futebol, até a coluna atual

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Opinião 6CR1909 - 2017

Cultura 15CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

ão há nada mais triste do que um necrológio. É como jogar uma pá

de terra sobre o caixão de um ente querido, um gesto que marca o fim de uma vida. O encerramento do Correio Rio-grandense em sua versão em papel é precisamente isto: o fim de uma época. O Correio Riograndense é um dos mais antigos e respeitados jornais em circulação no Rio Grande do Sul e no Brasil. Foi o segun-do jornal a circular em Caxias do Sul, tendo completado seu centenário em 2009. Com 108 anos de fundação, sua história é tão longa quanto sua impor-tância regional.

Ele foi fundado com o nome de La Libertá, em 13 de feve-reiro de 1909, no município, por Dom Carmine Fasulo. Transferido para Garibaldi, to-mou o nome de Il Colono Ita-liano, alterado depois para Sta-fetta Riograndense. Em 1921, passou à direção dos padres capuchinhos. Com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os jornais foram obrigados a se adaptar à exigência gover-namental de que circulassem em língua portuguesa. Em 10 de setembro de 1941 seu nome foi traduzido para Correio Rio-grandense. Durante a guerra, o jornal não teve cortada sua cota de papel, o que aconteceu com outros jornais brasileiros, já que o papel destinado à sua publicação era importado. No período da guerra, o jornal che-gou até a aumentar sua circu-lação. Em 1952, sua redação e gráfica foram transferidas para Caxias do Sul, onde funciona até hoje.

Desde o início, o Correio Riograndense destinava-se aos agricultores de origem italiana que viviam na zona rural dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul. Seu conteúdo e distribuição de seções se man-tiveram inalterados nos últimos 50 anos, sendo fundamental-mente ligados à cultura dos imigrantes italianos que povo-aram esses estados. De minha infância, guardo a lembrança da presença do Correio Rio-grandense nas casas de meus avós e de meus tios.

Segundo a Associação Na-cional de Jornais (ANJ) e o Mí-dia Dados, no Brasil circulam cerca de 4.000 jornais. Destes, apenas 27 têm 100 anos de ati-vidades ininterruptas. O Cor-reio Riograndense é o 26º mais antigo do Brasil e o quinto do estado do Rio Grande do Sul. Sempre foi um semanário. Nos últimos anos, contou com uma

tiragem de 12 mil exemplares.Sua linha editorial tem sido a

mesma no decorrer do tempo, apenas modernizando sua for-ma. Ela se se baseia nos seguin-tes termos: “[...] seu compro-misso de manter-se irredutível na defesa dos valores éticos e morais; de seguir estimulando a construção de relações comu-nitárias; de continuar apoiando quem produz na luta por uma recompensa justa e por uma merecida qualidade de vida; de contribuir para sedimentar com a generosidade, a tolerância, a fraternidade, a fé e o amor ao próximo as bases da família cristã e de uma sociedade sa-dia”.

O semanário, ao longo de sua história, tem servido como fonte de pesquisa. Uma dessas

pesquisas revelou que pelo tipo de reportagem apresentado seu interesse estava voltado à po-pulação rural, já que grande parte de suas informações re-feriam-se às condições climá-ticas, organização e orientação das atividades da agricultura e pecuária. Desde sua criação, mantém seções como infor-mações, abordando de forma cosmopolita temas mundiais, nacionais e regionais; artigos de opinião, voltados a assuntos mundiais, nacionais e regio-nais; saúde, com dicas de trata-mentos naturais; agronegócio e agroeconomia; imigração; ca-tolicismo, Igreja e a visão fran-ciscana do mundo e da fé.

O CR trazia informações úteis, como cuidar da horta e como garantir uma alimentação

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Laços: as mãos que fizeram o jornal e aquelas que o seguraram para lê-lo estabelecem profunda convivência

saudável e variada para a famí-lia. Também indicava remédios caseiros para doenças comuns. Até a década de 1960, manteve sua impressão em quatro pági-nas. Nas ocasiões festivas, era excepcionalmente publicado com páginas adicionais. Ape-sar da constante mudança no layout, observada a cada cinco anos, manteve até a década de 1960 uma página inteira para assuntos mundiais e outra para assuntos religiosos.

Minha tese de doutorado, que resultou na obra "As som-bras do Littorio - o fascismo no RS", baseou-se entre outras fontes nas edições da Stafetta Riograndense e do Correio Riograndense no período com-preendido entre 1922 e 1942, fontes que estão preservadas

no riquíssimo e bem organi-zado arquivo do semanário. Sem o auxílio do jornal, não teria sido possível reconstruir aqueles tempos e eventos que marcaram toda uma época. Na-queles tempos, o jornal era pe-queno e seu papel, seco e que-bradiço. Até hoje me lembro do ruído quando virava as páginas dos jornais muito bem encader-nados quando realizei minhas pesquisas.

O fato de deixar de circular em papel significa uma mu-dança mais profunda do que se pode supor. A internet pode ga-rantir a redução de custos e até um aumento de leitores, mas quebra o laço que liga o leitor com o objeto que é o jornal. Nenhum pesquisador do futuro poderá saber a cor dos jornais, o cheiro da tinta de impressão e a certeza que ele havia pas-sado por outras mãos. Esta co-munhão deixa de existir com os jornais virtuais. As mãos que fizeram o jornal e aque-las que o seguraram para lê-lo estabelecem laços profundos de convivência. Laços que se estabelecem entre os jornalis-tas e leitores, entre os leitores e os futuros leitores. Ora, isso nenhum jornal virtual poderá proporcionar.

Num tempo em que a gran-de imprensa tem-se vendido abertamente aos interesses do grande capital, como observou o pensador americano Noam Chomsky, ela “pode causar mais danos que a bomba atô-mica. E deixar cicatrizes no cérebro.” Foi essa situação incômoda que os leitores vi-venciaram na grande imprensa durante o annus horribilis de 2016 – que marca a história da imprensa brasileira com o adeus ao papel do Correio Riograndense. É pena que per-maneça viva e circulando em papel “uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e cor-rupta que forma um público tão vil como ela mesma”, no dizer do jornalista americano Joseph Pulitzer. E que deixe de circular de mão em mão, de lar em lar, um jornal como o Correio Rio-grandense, que traz análises, informações verificadas e úteis. Com ele, morre um tempo e um modo de vida. Resta a esperan-ça de que seus valores, sua re-putação e seu jornalismo de alta qualidade migrem intactos para o mundo digital.

Fim da saga do Correio Riograndense em papel

* Loraine Slomp Giron

Professora,

historiadora,

pesquisadora e

escritora

Expedição: com o fim da edição impressa do Correio Riograndense morre também um tempo e um modo de vida

Texto de Loraine Slomp*Caxias do Sul - RS

Page 16: Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de ... · nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal ... isso em face do santo batismo que nos elevou

História 5CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017

m 1912, alguns sacerdotes se prontificaram a fundar um jornal genuinamen-

te católico e italiano. A ocasião surgiu no mesmo ano, quando o jornal Bento Gonçalves, de Jú-lio Lorenzoni, parou de circular. Em seu lugar surgiu o Corriere d’Italia, tendo como redator- chefe o padre Estevão Minetti. Com a saída de Minetti, vieram as dificuldades, obrigando o pa-dre Poggi a bater às portas do pa-dre Enrique Preti, dos missioná-rios scalabrinianos, que colocou dinheiro e designou o padre João Constanzo para dirigir o jornal. Ficou no cargo até 1917, sendo substituído por padre Carlos Por-rini, até 1921, e pelo padre José Foscallo. Esses dois últimos, des-de o início dos anos 1920, tenta-ram uma fusão com o Staffetta Riograndense, dos capuchinhos, editado em Garibaldi.

Em 8 de abril de 1925, frei José formalizou uma proposta de fusão ao padre Enrico Pre-ti, superior dos scalabrinianos. Algumas cláusulas: os capuchi-nhos manteriam somente o Sta-ffetta, nenhum outro jornal; não aceitariam a direção de um novo jornal; caso o Staffetta fosse fun-dido com o Il Corriere, o novo jornal deveria ter um novo nome; se houvesse fusão, o maquiná-rio deveria ser comprado meio a meio; caso os carlistas quisessem comprar o Staffetta - “che và a gonfie vele” (de vento em popa) -, o preço seria de 42 contos de réis pelo maquinário e materiais e 25 pelos assinantes.

De Guaporé, em agosto de 1925, padre Preti escreve mar-cando um encontro para nego-ciar. Como não houve enten-dimento para a fusão dos dois jornais, freis José, Exupério e Candido assinam nova proposta, em 12 de agosto de1925, dizen-do que estavam dispostos tanto a vender o Staffetta quanto a com-prar o Il Corriere.

Na documentação, segue uma “declaração” conjunta de frei Candido Bampi e padre Aneto Bagni, scalabriniano, assinada em Bento Gonçalves, com data de 7 de junho de 1927, estabele-cendo as condições da fusão. O novo jornal sairá na data da pri-meira edição de julho de 1927, conservará o título Staffetta Rio-grandense, mas manterá como subtítulo Il Corriere d’Italia.

Nas edições de 22 e 29 de junho de 1927 comunica-se a fusão dos dois jornais a partir da primeira edição do mês de julho. O jornal, com sede em Garibaldi, “será o porta-voz dos sentimentos católi-cos dos nossos bravos colonos”. Já na edição de 6 de julho de 1927 se comunica que a redação do Il Corriere em Bento Gon-çalves não existe mais e que, em Garibaldi, a direção conta com o apoio dos agentes do Il Corriere,

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Trem: embarque de malotes com exemplares do jornal, em 1959, saindo de Caxias do Sul para a região Sul

Caxias do Sul: equipe prepara envio da edição dos 100 anos

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Gene da longevidade se deve à linha editorial

todos mantidos e considerados a mão direita do jornal. As edições com dois títulos circularam de 6 de julho a 31 de agosto de 1927. Na edição de 7 de setembro de 1927 já não há dois títulos e o Staffetta estreia.

Transferência - Por questões de logística, o diretor frei Síl-vio Armiliato obtém, em 12 de dezembro de 1950, autorização para a transferência do jornal para Caxias do Sul. Graças a um empréstimo de Cr$ 100.000,00 junto à Previdência do Sul e “a ofertas de Caxias e alhures”, em pouco mais de um ano as insta-lações junto ao convento dos ca-puchinhos, no bairro Rio Branco, já permitiam receber a máquina impressora e toda a tipografia vindas de Garibaldi. A primei-ra edição do jornal, após o seu retorno à cidade de origem, foi em 4 de junho de 1952. O jornal permaneceu no bairro até o final de 1998, quando foi para as atu-ais instalações no bairro Desvio Rizzo.

Ainda em 23 de abril de 1952, a tipografia do Correio Riogran-dense foi registrada com a deno-minação de Editora São Miguel, propriedade da então Sociedade Literária São Boaventura. Hoje, 8 de fevereiro de 2017, fica a Editora e o CR sai de cena.

Difícil isenção - A edição nº. 1, de 13 de fevereiro de 1909, já deixava claro que o jornal devia ficar longe da política partidária. Il nostro programma, o histórico projeto editorial, foi constante-mente assumido ao longo dos 100 anos do Correio Riogran-dense. Os capuchinhos, em 1917, sentiram de perto o que signifi-

cava o jornal ter opção política (o editor-proprietário, padre Gio-vanni Fronchetti, tirolês, apoiava a Áustria quando a I Guerra eclo-diu).

O jornal foi salvo ao manter-se longe das opções políticas e nacionalistas. Na gestão de frei Cândido Maria Bampi, em 10 de maio de 1928, foram baixadas normas objetivas para a redação do Staffetta. Uma delas era: “Evi-tare qualunque política di partito o de nazionalità”.

As normas eram uma coisa, a prática, porém, outra. Em dife-rentes contextos políticos o jor-nal tomou partido, como quando abraçou o fascismo de Mussoli-ni. Para o jornal, a Itália passou a ser a nação modelo. O jornal defendeu ardorosamente os to-talitarismos, desqualificando a democracia. Mas, 1941, também foi o ano da virada nas posições do jornal. Assim mesmo, quan-do o Papa condenou o fascismo, o jornal demorou a publicar os seus pronunciamentos, isto é, ba-lançou entre duas preferências.

No contexto regional, o Cor-reio Riograndense representava grande força. De 1945 a 1955, tempo de vários embates eleito-rais, caravanas iam visitar o jor-nal com o objetivo de mendigar uma recomendação ou um elo-gio. Foram movimentadas, por exemplo, as visitas de Juarez Távora, Milton Campos e Jânio Quadros. Foram eventos do gê-nero que fizeram dom José Baréa exclamar: “Agora conheço a for-ça do Correio Riograndense!”.

Programa - Ao lado das lutas que fortaleceram o Correio Rio-grandense, também estão os fa-tores que sustentaram a sua lon-gevidade. Dois se sobressaem: as características do conteúdo e da linha editorial – expressas na edi-ção nº. 1, de 13 de fevereiro de 1909 – e a aquisição do jornal pe-los Capuchinhos do Rio Grande do Sul e sua inserção no projeto de evangelização desenvolvido desde o início do século XX.

A definição da linha editorial vem de Carmine Fasulo, no La

s missionários e os párocos das regiões de colonização italiana entendiam que se-

ria imprescindível para sua ação missionária e paroquial dispor de um jornal para dar aos colonos assistência religiosa, transmitir os ensinamentos da Igreja, con-selhos e orientação agrícola e co-mercial. Era preciso defender os colonos dos inimigos da Igreja e dos especuladores e exploradores comerciais.

Em 1909, mediante um acordo entre os capuchinhos e o vigário da paróquia de Garibaldi, Gio-vanni Fronchetti, que adquirira o jornal caxiense La Libertá, surgia o jornal Il Colono Italiano, que manteve essa denominação até 1917, quando passou a denomi-nar-se Staffetta Riograndense e, em 1941, Correio Riograndense. Em março de 1910, o padre Fron-chetti, diretor do jornal, afirmou que “o escopo do jornal deve ser o colono italiano e sua função atender suas necessidades... A di-reção de Il Colono Italiano esfor-çar-se-á para que o jornal seja o amigo, o conselheiro e o defensor dos Filhos da Bela Pátria”.

O jornal, sempre atento às con-junturas religiosas, sociais, eco-nômicas e especificamente agrí-colas, por três vezes mudou seu foco e o modo de tratar as ques-tões que mais afetavam os colo-nos. A primeira, que vai de 1910 ao término da década de 50, tem como preocupação o contínuo movimento migratório dos colo-nos para as frentes de coloniza-ção, em busca de “terras novas” para os numerosos filhos que cada família possuía. Repetia-se, portanto, o que ocorrera nas co-lônias velhas, em particular, dar--lhe assistência em relação aos produtos mais demandados pela população urbana, que crescia continuamente. O Rio Grande do Sul, que fora um mero exportador de charque para o mercado con-sumidor do Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, com a che-gada dos imigrantes, já tinha con-solidado, em 1917, a produção e a exportação para os centros consumidores do Brasil de uma ampla lista de alimentos: banha, trigo, arroz, feijão, milho, batata, farinha de mandioca, erva-mate, vinho, aguardente e matérias-pri-mas industriais: casulos do bicho da seda, linho e madeira de lei exportada em barcaças pelo rio

Uruguai até Buenos Aires e, de lá, para os mercados dos Estados Unidos e Europa.

Para melhor entendermos como o jornal organizava o “aconselha-mento” dos colonos, tomamos como exemplo a produção de uvas e vinhos, cultura importante para um grande número de colo-nos nas colônias velhas e novas. Os “conselhos” diziam respeito ao solo adequado para o cultivo da parreira, que deveria ser seco, pe-dregoso e com inclinação de coli-na, jamais na planície (7.1.1911); os parreirais devem ser implanta-dos com orientação solar norte-leste, jamais sul (4.2.11); ao uso dos insumos químicos (sulfato de rame e cal) para o tratamento das doenças das parreiras (po-ronospora) e também das bata-teiras e tomateiros (7.1.1911). A coluna “Conhecimentos Úteis” indicava aos colonos como de-veriam acondicionar o vinho em recipientes adequados e devida-mente higienizados. Orientava-os também nos procedimentos para fazer “i secondi vini ou vineto” e controlar a doença chamada “la fioretta” (11.03.1911). Na co-luna “Interessi dei Coloni”, de 2.02.11, o jornal denuncia a prá-tica de falsificação do vinho: “... dentro (das cantinas), ao longo do ano, se manipula e se fabrica por inteiro (sem uvas) o vinho” e isto prejudica profundamente os viticultores e os consumidores. O jornal apela ao governo para que puna severamente os falsifi-cadores (25.02.11). Esse tipo de denúncia repetir-se-á, periodi-camente, até a década de 1970,

quando os mecanismos de con-trole tornaram-se mais eficazes.

Em Garibaldi, de 23 a 25 de março de 1913, foi promovida a primeira exposição de uva do mu-nicípio. O que chama a atenção é que foram expostas 34 varieda-des de uvas então cultivadas em Garibaldi. Além da isabel e qua-tro variedades de moscatel (mos-catello bianco, moscatellone, moscatello piccolo, moscatello di Gesù), projetavam-se a tre-biana, corvina, barbera piccolo, riesling reno, nebiolo e malvasia. Manuelle Peterlongo expôs 20 variedades de uva e foi premiado com medalha de ouro. Seu vinho também foi premiado com meda-lha de ouro (1.3.1913). Em 1949, na tabela do preço mínimo das uvas, apareceram novos varietais na já longa lista existente desde o início do século: hebermont, merlot, cabernet e peverella. De 1910 até inícios da década de 50, todos os temas, questões e pro-blemas do cultivo das uvas, sua industrialização, mercado, até a mesa do consumidor, no jornal, eram objeto de investigação, análise, aconselhamento e deba-te. O mesmo ocorre, em menor

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Paraná: novo ciclo da agricultura é a produção orgânica, aproveitando recursos da própria propriedade

# COLONIZAÇÃO

Correio Riograndense conduztrajetória da agricultura familiar

Centenário, o jornal, como meio de comunicação, ligou entre si as velhas e as novas colônias

Libertà, em 1909, e é assumida por Giovanni Fronchetti, a partir de 1910, e vem sendo mantida pelos capuchinhos há mais de 100 anos. O programa editorial na capa da primeira edição é muito claro: “Nosso jornal será semanal e de índole clara e es-sencialmente católica...; será papal no mais estrito sentido da palavra” (Il Nostro Programma, ed. nº. 1, 13.02.1909, p. 1).

A confissão católica e papal não fez do La Libertà um jornal só de conteúdos da fé cristã ca-tólica e de suas expressões reli-giosas. Manteve-se aberto aos temas da agricultura, indústria, saúde e medicina prática, “coisas que consideramos não só úteis, mas também necessárias ao de-senvolvimento da vida social”. “La Libertà sarà anche ricca de notizie mondiali, e più specifica-mente d’Italia e di questo Stato di Rio Grande del Sud (...) e de-cisamente aliena della politica partidaria”, diz o editorial.

Tais linhas editoriais somadas à capacidade de sempre atualizá- las, dando-lhes expressões con-temporâneas, são as verdadeiras bases da longevidade do Correio Riograndense. Nas últimas déca-das, o tema da responsabilidade e ética ambiental, por exemplo, está entre os que mereceram mais destaque na pauta editorial.

O segredo da longevidade do jornal estava também na capa-cidade de construir e manter a fidelidade de seus leitores e na logística de distribuição. O jor-nal sempre valorizou a figura dos agentes, fator que lhe garantiu uma penetração inigualável e di-ferenciada. O agente foi valori-zado desde os primeiros anos de circulação.

CR1909 - 2017

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Agricultura 16CR1909 - 2017

Texto de Dinarte Belato*Ijuí - RS

medida, com as demais culturas e criação de animais praticadas pelos colonos. A partir de 1917 até o fim da década de 50, o jor-nal dedicou especial atenção aos ataques e devastações causadas por ataques de “nuvens de gafa-nhotos” (6.9.17). Essa praga, de conotações bíblicas, só foi ex-tinta quando o pó de gafanhoto (BHC), distribuído pelo governo, passou a ser utilizado em ampla escala pelos colonos.

O jornal nos dá também um claro quadro sobre a evolução e o aperfeiçoamento gradativo dos meios de produção e insumos utilizados pelos colonos, seu sis-tema de fabricação, em particular das ferramentas, do transporte de carga e das trilhadeiras.

O Correio Riograndense acom-panhou os colonos em sua con-tínua expansão em direção ao noroeste, norte e leste do estado e, depois, ao oeste de Santa Ca-tarina e sudoeste do Paraná, repe-tindo os mesmos problemas en-frentados por seus antepassados quando chegaram em Caxias do Sul, Garibaldi e Bento Gonçal-ves. O Correio Riograndense era, por isso, um meio de comunica-

ção que ligava entre si as velhas e novas colônias, levava aos colo-nos os dados básicos da conjuntu-ra agrícola: produção, demandas e preços, assim como das políti-cas públicas relacionadas com a agricultura. Para os colonos, que não dispunham de outro meio de comunicação, o jornal era seu mensageiro e fonte de informa-ção indispensável.

Na década de 50, ficou claro para o jornal que o modelo de agricultura e pecuária praticado pelos colonos não mais poderia ser sustentado, pois se fundava historicamente na exploração in-tensiva da fertilidade natural dos solos, acarretando uma contínua queda da produtividade e um crescente empobrecimento dos colonos, fenômeno visto pelo clero como um grave problema social, com sérios efeitos sobre a cultura e a vida das comunidades rurais, base social da Igreja. Era preciso, portanto, apostar num novo modelo, que já emergia nas políticas públicas do estado e em muitas propriedades e contava com a atuação de um corpo téc-nico de agrônomos e veterinários.

A essa tendência em curso, de-nominaremos de primeira moder-nização da agricultura. Os artigos do novo sistema de produção eram publicados, a partir de 1950, numa coluna intitulada “Vade-mecum dos Agricultores” com textos copiados da revista Chá-caras e Quintais (12.02.1950). É interessante observar que o tema dos solos, cuja conservação e melhoramento passaram a ter um tratamento sistemático, veio acompanhado do incentivo à di-versificação da produção median-te a introdução de novas culturas, como as do tungue (29.03.50), das oliveiras, das novas variedades de trigo desenvolvidas nos centros de pesquisa do estado, denomi-nadas Frontana, Cincasa, Lajea-dinho e Montanhêz (22.03.50). A produção pecuária moderni-zava-se para atender à crescente demanda de carne suína e seus derivados. Foi viabilizada com o surgimento dos frigoríficos de su-ínos, a introdução de novas raças importadas dos Estados Unidos e da Europa: Doroc, Landrace, Large White; o mesmo aconteceu com a produção de leite através da importação de vacas leiteiras Holandesa e Jersey e de galinhas das raças Plimouth Rock Barra-da, Orpington, Leghorne e Rhode Island Red.

►►►Sertão Santana: junta de bois ara solo em propriedade familiar

Page 17: Ano 108 - Nº 5.532 - Caxias do Sul - 8 de fevereiro de ... · nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal ... isso em face do santo batismo que nos elevou

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 História 4

O nascimento do Correio Riograndense, idealizado por padre Carmine Fa-

sulo, pároco da paróquia Santa Tereza de Caxias do Sul, e frei Bruno de Gillonnay, coordena-dor da missão dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul, chegado da França em 1896, foi motiva-do pela imigração italiana ao Rio Grande do Sul.

Um ano depois do primeiro so-nho, em 1897, surge O Caxiense, primeiro jornal de Caxias. O ve-ículo defendia a política republi-cana. Logo entrou em atrito com o vigário, padre Pietro Nosadini, que, de imediato, compreendeu que também precisava de um jornal. Um bolletino seria edi-tado com o nome de Il Colono Italiano a partir de 1º de janeiro de 1898.

Na primeira página coloca sua linha editorial: advogar as causas dos católicos italianos e imigra-dos de Caxias e da região. Falará do desenvolvimento das socie-dades católicas, a fim de que sir-vam de exemplo “aos covardes e indiferentes”; e não esquecerá a defesa do Papa: “Santo Padre, os católicos italianos imigrados em Caxias e nas colônias vizinhas vos juram devoção e obediência ilimitada...”

Em 24 de agosto de 1904, pa-dre Carmine Fasulo, ex-palotino, assumiu como pároco de Caxias. Em novembro desse ano a pa-róquia recebeu a visita de dom Giovanni Baptista Scalabrini, bispo de Piacenza, Itália. Sca-labrini conhece a realidade da colonização italiana e inteira-se dos sonhos do frei francês Bru-no de Gillonnay, chefe da missão capuchinha fundada há apenas nove anos. Em 13 de fevereiro de 1909, Fasulo funda o jornal La Libertà. Três meses depois, em 5 de maio, deixa o cargo de pároco e vende o jornal ao substituto, pa-dre Francisco Baldassarre.

Em Caxias, o jornal O Caxien-se, que se intitulava defensor das colônias italianas e órgão repu-blicano, fechou em 28 de abril de 1898 por não interessar ao povo; já o Il Colono Italiano, de Nosa-dini, fechou em 21 de agosto de 1898 por não interessar aos cató-licos.

Gillonnay - Em 1904, frei Bruno relatava ao bispo dom Giovanni Scalabrini a necessi-dade da imprensa para a evan-gelização: “Trabalhamos para estabelecer com simplicidade, no centro das colônias italianas, uma pequena impressora, que le-vará periodicamente no seio das famílias, em sua língua materna,

Evento: inauguração da linotipia, em 1948, na sede do jornal, m Garibaldi

“Sem jornal não se faz nada”A frase de frei Bruno de Gillonnay, chegado da França em 1896, expressa verdade centenária

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uma página do Santo Evangelho, explicada e comentada, uma his-tória edificante, alguns conselhos de agricultura...”, conforme se lê no manuscrito original em fran-cês, datado de 12 de outubro de 1904.

Menos de dois meses antes da manifestação a Scalabrini, em 20 de agosto, frei Bruno escrevia ao provincial da Saboia, submeten-do-lhe à apreciação o projeto da “fundação em Conde d’Eu de uma pequena impressora”. Ini-cialmente pensava numa revista mensal para a formação religiosa nas escolas. Também o preocu-pava a ignorância dos colonos. E concluía: “Mas, sem jornal não se faz nada.” Pretendia comprar uma impressora dos franciscanos sediados em Lages ou uma dis-ponível em Porto Alegre. A au-torização veio da França no final de 1904 ou início de 1905.

Na capa das edições nº. 50, 51 e 52, de fevereiro e março de 1910, há uma chamada anunciando que Il Colono Italiano será o títu-lo que o La Libertà assumirá na edição de 12 de março de 1910, quando entrar no segundo ano editorial. La Libertà tinha surgido como “Giornale settimanale del popolo”. Sendo o colono italiano a maioria da população da região, nada mais acertado que o jornal tenha o nome de Il Colono Italia-no.

O ápice das dificuldades do diretor austríaco do jornal (Fron-chetti), em Garibaldi, acontece a partir de 17 de abril de 1917, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com a Alemanha e a Áustria. Os quatro proprietários – Fronchetti, Capuchinhos, Moreau e Carlotto – reúnem-se às pressas para tomar medidas. A direção fica com o capitalista e constru-tor Agostinho Mazzini. Logo o chamam de ‘testa de ferro’ que aceitava dirigir um jornal anti-ita-liano. Mazzini só aguentou até 21 de junho, quando pediu demissão, exigindo o fechamento do jornal.

Os cotistas se reuniram nova-mente, não admitindo a morte assim tão estúpida do jornal que tinham. Foi quando o capuchinho frei Caetano Angheben (1885-1967), há anos colaborador de Fronchetti, propôs que o jornal saísse sem o nome do editor-res-ponsável e com novo título. A ideia foi aceita e a edição de 5 de julho de 1917 levava o nome La Staffetta Riograndense. A partir dessa data, a administração e a redação ficam a cargo dos capu-chinhos, embora Fronchetti ainda fosse sócio.

Em 23 de setembro de 1918, Fronchetti registra em cartório declaração dizendo que o valor do capital do já Staffetta Riogran-dense (ex-Il Colono Italiano) é de 15 contos de réis. Também decla-ra que a Sociedade Literária São Boaventura (capuchinhos) entrou no capital inicial com quatro con-tos de réis e que “por conseguin-te a dita Sociedade Literária São Boaventura (Reverendos Padres Capuchinhos) é coproprietária da tipografia do Staffetta Rio-Gran-dense, pertencentes, acessórios e tudo o mais em proporção ao capital com que entrou e que na mesma proporção tem direito a todos os lucros”.

De 1918 a 1921, os capuchi-nhos adquiriram as cotas que ain-da não lhes pertenciam. Dia 12 de janeiro de 1921 é a data da oficia-lização da compra do jornal pelos capuchinhos, em proposta escrita de cessão de sua parte na tipogra-fia aos mesmos capuchinhos.

Os contatos de Carmine Fasu-lo com frei Bruno e as incursões eventuais dos capuchinhos fran-ceses no município, especial-mente no atual território de Nova Roma do Sul, motivaram o páro-co de Caxias a criar um periódico dirigido aos católicos, coisa que o capuchinho, como estrangeiro, não podia concretizar. Assim, La Libertà “scende per la prima volta nell’arena giornalistica” em 13 de fevereiro de 1909, com boa aceitação.

Em 5 de maio de 1909, quando La Libertà estava no nº. 15, toma posse como pároco outro ex-pa-lotino, padre Francisco Baldas-sarre, cuja gestão durou quatro meses, com grandes desenten-dimentos com os fabriqueiros e o povo. O jornal, agora sob a direção de Baldassarre (Fratelli Baldassarre), “tornou-se inútil e escandaloso, insultando sacerdo-

tes, fabriqueiros e fiéis.”

Il Colono Italiano - Entre o nº. 44 e o nº. 45 do jornal transcorre um mês. O nº. 45 do La Libertà circula com a data de 15 de ja-neiro de 1910, editado em Gari-baldi e tendo como diretor padre Giovanni Fronchetti. Na capa é estampada a aprovação episco-pal, onde Fronchetti acrescenta ter recebido aprovação verbal de dom Claudio José para assumir a direção do La Libertà, em 27 de dezembro de1909.

Na mesma edição, o novo di-retor acha justo que se retome o mesmo “Programma” do La Li-bertà, que havia enfrentado tantas dificuldades. Reafirma que o jor-nal será católico, mas não se ocu-pará exclusivamente de assuntos religiosos. “Anzi, La Libertà sara per eccellenza l’amico, il consi-liere, la difesa del colono”.

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Agricultura 17CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

modernização agrícola só seria viável se os solos fossem recuperados. Em

artigo publicado pelo padre Ben-jamim Busato na coluna “Polí-tica e Colônia”, afirma que é “... pouco atraente a vida do colono, carece de conforto”. Para mudar essa realidade, diz que “... é pre-ciso começar por corrigir a terra” (9.04.52). O cuidado demandado por um solo esgotado e improdu-tivo das colônias era, portanto, o ponto de partida para a introdu-ção de novas raças e variedades de vegetais. Quem irá encarregar--se dessa tarefa será o agrônomo, botânico e extensionista Dr. José Zugno, cujos textos foram publi-cados na Coluna “Vida Agrícola” a partir de 29 de abril de 1953 até sua morte no dia 9 de março de 2008, aos 83 anos. Sua colabora-ção durou 55 anos ininterruptos. Podemos, então, considerar José Zugno como a referência do novo modelo de agricultura, fundado na diversificação da produção, no cuidado permanente do solo e na busca de formas coletivas e orga-nizadas dos produtores para terem acesso aos consumidores através de cooperativas, associações, fei-ras urbanas com vistas a uma pro-dução quantitativa, qualitativa e diversificada.

O tema do solo estará sempre presente em seus textos com es-clarecimentos sobre seus com-ponentes, as causas que o torna-ram improdutivo, em particular a erosão e a queima da matéria orgânica. Os meios de recuperá--lo estão ao alcance do colono: curvas de nível, terraços, preser-vação das restevas, adubação ver-de, compostagem, uso racional de resíduos animais adequadamente processados em estrumeiras, jun-tamente com a adoção de semen-tes e plantas melhoradas disponí-veis nas estações experimentais, assim como aves, suínos e vacas leiteiras de novas raças. Reco-mendava especial cuidado com os mananciais de água da proprie-dade; com o conhecimento cada vez mais preciso dos micro-or-ganismos existentes no solo, com os vegetais e sua importância no melhoramento do solo.

Esse é o quadro por onde se mo-via José Zugno na sequência de artigos iniciada no dia 6 de maio de 1953. É importante salientar a metodologia por ele adotada, a partir do terceiro artigo por ele publicado, quando introduz um espaço para as “consultas” dirigi-das a ele pelos leitores do jornal. Esse método, justifica Zugno, traz à tona os problemas que afetam não apenas o autor da consulta, mas a maioria dos colonos, além de reforçar seu papel estratégico no processo de modernização do sistema vigente de produção. É o colono o protagonista do processo que deverá revolucionar suas prá-ticas de produção.

Se, por um lado, o avanço da modernização caminhava de for-ma sustentada e criava condições para a sobrevivência dos agri-cultores, a conjuntura política, marcada por uma intensa guerra contra o comunismo, um refle-xo da guerra fria, travava qual-quer possibilidade de resolver o problema de acesso à terra que afetava a maioria dos filhos dos agricultores. A reforma agrária era inadmissível porque “... é coi-sa de comunista e, por expropriar a terra de seus proprietários viola o direito sagrado da proprieda-de”, afirmavam os bispos Geral-do Sigaud e Castro Mayer, tese adotada pelo clero do Rio Grande do Sul, que intensificou sua ação junto aos colonos mediante con-gressos, encontros e conferências para tratar da questão agrária e fazer frente à ação das esquerdas. Essas iniciativas culminaram, em 18 de outubro de 1961, com a criação da Frente Agrária Gaú-cha, cujo objetivo consistia em reforçar a organização sindical dos colonos sob a orientação di-reta da Igreja. Admitia-se a refor-ma agrária, primeiro em terras do governo, depois em terras que se-riam vendidas aos agricultores do mesmo modo como se procedera até então com todos projetos de colonização. Essa tese, entretanto, não levava em consideração que a fronteira agrícola estava esgotada e que as novas terras possíveis de

colonização estavam sendo rapi-damente apropriadas por grandes empresários e agricultores, forte-mente capitalizados, nas antigas áreas de campo do Planalto do Rio Grande do Sul e nas vastas terras do Mato Grosso, Goiás e Amazônia. O padre Benjamim Busato, que vivia em Passo Fun-do, centro difusor da segunda modernização da agricultura sob o comando do grande capital industrial e financeiro, advertia que “as terras vermelhas ficam cada vez mais preciosas e que os agricultores que as arrendam dos fazendeiros, antigos criadores de gado, rapidamente são por eles compradas” (16.2.55). Nasceu, assim, a segunda modernização da agricultura.

Os debates sobre a questão agrária, a busca de alternativas para os colonos sem terra e a guerra contra as ameaças do comunismo, silenciaram com o golpe militar de 1964, amplamente apoiado pela Igreja. O regime militar adotou uma estratégia para resolver o problema da terra, que consistiu na erradicação do minifúndio e do latifúndio improdutivo e sua transformação em propriedades produtivas de grande porte, tanto para a produção de grãos quanto de gado. Os projetos de colonização que o governo implementou na Amazônia para os pequenos agricultores pereceram pelos obstáculos

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Santa Rosa: John Murdock (e), autor da Operação Tatu, que revitalizou o solo gaúcho, e Arni Heimerdinger

impostos pela natureza e pela imensa dificuldade de integrar a produção no mercado nacional. Esses agricultores converteram-se em mão de obra disponível para as grandes propriedades, que devastavam o meio ambiente a uma velocidade jamais vista ou regressaram para seus estados de origem. Aos poucos, a Igreja começou a entender que o modelo imposto pelo capital não atendia os interesses da maioria dos trabalhadores do campo. O Correio Riograndense, agora sob a direção dos jornalistas freis Aldo Colombo e Moacir P. Molon, abriu o jornal para um amplo debate sobre a questão da terra, da reforma agrária, dos emergentes movimentos sociais do campo, assim como uma crescente crítica ao modelo da segunda modernização, imposto pelo grande capital, cujos resultados refletem-se na ampliação do desastre ambiental, na concentração da terra num diminuto número de proprietários e reduzindo o mundo agrário a um mero negócio, melhor, a um agronegócio. A manchete da edição de 11 de janeiro de 2017 marca essa realidade: “Desigualdade marca o Brasil rural. Menos de 1% das propriedades agrícolas detém quase metade da área produtiva do país”.

Voltemos um pouco no tempo. A luta dos movimentos sociais e ecológicos pela terra, por um novo projeto de desenvolvimento agrário fundado na preservação da natureza e por um projeto de reforma agrária renascem com vigor à medida que se debilita e extingue a ditadura militar, ga-nhando crescente apoio da Igre-ja. O modelo de agricultura que emergia dos movimentos sociais do campo rejeitava o domínio ab-soluto do capital que controlava todas as instâncias dos meios de produção e do mercado e propu-nha um novo protagonismo para

os trabalhadores. Esse modelo consistia em voltar à terra não simplesmente como um lugar de exploração e negócio, ou agrone-gócio, mas o lugar onde todos os seres vivos encontram sua casa e que é preciso preservar sob pena de ameaça de extinção da vida.

Nasce, gradativamente, a agri-cultura ecológica, que vai buscar subsídios nos avanços da ciência e nas experiências acumuladas da primeira modernização, vol-tada para a conservação do solo, com suas curvas de nível, adu-bação verde, uso racional dos dejetos animais, recuperação de sementes e de animais ameaça-dos de extinção. Os ensinamentos de José Zugno ganharam novo sentido e passaram a fazer parte daquilo que podemos denomi-nar a terceira modernização da agricultura, que o Correio Rio-grandense, sob a direção dos já citados editores capuchinhos freis Aldo Colombo e Moacir Molon, reservou espaços cada vez mais amplos destinados a tematizar os múltiplos aspectos da agricultura, seus problemas; da educação para uma visão ecológica do mundo, da emergência das mulheres tra-balhadoras reivindicando e con-quistando o reconhecimento de sua cidadania, sobretudo, de uma alta politização da questão agrária e agrícola e do destino da huma-nidade profundamente ligado ao modo como cuidaremos do nosso planeta Terra, nossa casa e de to-dos os seres vivos que nela habi-tam. Os debates ganharam novos impulsos com a colaboração de pessoas altamente comprometi-das com a nova visão de mundo: Leonardo Boff, um dos autores da Carta da Terra, frei Betto e Maria Clara Luchetti Bingemer, diri-gindo um olhar político e crítico sobre a questão ecológica, sobre a desigual sociedade brasileira, assim como uma dimensão teo-lógica sobre os emergentes novos modos de viver. O Correio Rio-grandense converteu-se, assim, no único jornal em circulação que divulgou uma visão de mundo com profunda e ampla visão eco-lógica e humanista.

É por isso que o Correio Rio-grandense, com sua consagrada capacidade de auscultar tendên-cias e de produzir e distribuir con-teúdos qualificados, atualizados e até proféticos, merece continu-ar sua missão de disponibilizar pensamento inovador e análises significativas, daqui para frente – conforme prometido –, numa moderna e ágil plataforma digital.

Vida Agrícola, referência do novo modelo de agropecuária

* Dinarte Belato

Graduado em

Filosofia, mestre

em História e

autor de livros.

Paraná: jornal acompanhou atividade agropecuária rumo a SC e ao PR

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CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Agentes 3CR1909 - 2017

A circulação ininterrupta de um jornal durante quase 109 anos pressupõe uma

grande reserva de idealismo, amor à causa e persistência. O Correio Riograndense sempre acreditou e confiou nos seus lei-tores e deles também sempre me-receu absoluta confiança.

Mas por trás da grande família dos assinantes, espalhados por quase todos os estados brasileiros e até no exterior, sempre esteve presente um verdadeiro exército de colaboradores, praticamente voluntários – os agentes. Deve- se a eles o êxito obtido pelo Cor-reio Riograndense ao construir uma sólida trajetória de 108 anos como um dos veículos de comu-nicação mais confiáveis do sul do país.

Responsáveis pela distribuição do jornal, pela renovação das as-sinaturas e pela divulgação nas comunidades, os agentes foram,

Os pilares de uma longa trajetória

MuitoObrigado!

Os agentes foram sempre os imprescindíveis canais de comunicação com os assinantes e leitores

# COLABORADORES

desde os primeiros anos do Cor-reio Riograndense, ainda como Il Colono Italiano, uma ponte indispensável entre os editores e os leitores.

Graças à dedicação dos agen-tes, o Correio Riograndense pode chegar aos mais distantes rincões dos estados do sul e de outras regiões do país, acompanhando principalmente as levas de migran-tes que, em alguns períodos da his-tória, tiveram no jornal o único meio de comunicação, o único elo de ligação com suas terras de origem. Muitos foram pioneiros, levando o jornal a comunidades recém-formadas pelas correntes migratórias, desde o sul até o nor-te do país.

Hoje, apesar das facilidades de

transporte e de meios que permi-tem a entrega de impressos em qualquer parte do país, os agentes continuaram sendo imprescindí-veis para que o CR continuasse chegando com regularidade e segurança em centenas de comu-

nidades.E para a maioria dos agentes,

o cargo não se resume apenas a isso. Muitos consideram esse trabalho uma missão; outros, um compromisso com a boa im-prenssa; outros ainda, por her-darem dos antepassados uma função que consideram sagrada.

Juntos, formaram uma equipe permanente de divulgação do jor-nal, uma grande família, ligada por laços afetivos e sentimentais, como elos de uma imensa corren-te. O patrimônio que mais orgu-lha o CR é a consolidação de uma

inigualável cre-dibilidade junto aos seus leitores e assinantes; e os agentes, segura-mente, são parte integrante desse patrimônio.

O Correio Rio-grandense sem-

pre contou com freis capuchi-nhos atuando em tempo integral na divulgação, que percorreram de forma incansável os estados do sul e são lembrados com ca-rinho pelos agentes mais antigos. Merecem destaque freis Roque Costella, Roberto Franciosi, Domingos Collet e, nos últimos

anos, ainda que não de forma permanente, freis Arlindo Battis-tel e Laudino Bertoldo.

Nos últimos tempos, com a au-sência de freis na linha de frente da divulgação, as assinaturas re-duziram bastante, mas a atuação dos agentes foi fundamental para que o número continuasse razoa-velmente bom.

Agora, ao encerrar sua cami-nhada como veículo impresso, o Correio Riograndense sente-se na obrigação de manifestar a imensa gratidão com cada um desses incansáveis parceiros. Através dos agentes Diva Miot-to, de Vila Flores; Avelino Ló, de Garibaldi, por muitos anos responsável pelo maior número de assinaturas do CR; Severino Bianchin, de São José do Ouro; e Primo Galdino Carniel, de Ca-cique Doble, os últimos agentes que visitaram o Correio Rio-grandense, um imenso obrigado.

“O centenário Correio Riograndense foi sacerdote, catequista, técnico agrícola, cozinheiro, professor, biblioteca e... até jornalista. Um jornal de fé; um jornal confiável! E nós, agentes, sempre fomos soldados de linha de frente da ‘boa batalha’”.

Avelino Ló, agente do CR em Garibaldi

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Igreja 18CR1909 - 2017

esde as suas origens, no início do sé-culo XX, até as últimas edições que encaminham o encerramento de sua

vida enquanto jornal impresso, o Correio Riograndense, através de todas as trans-formações, seja de nome como de projeto gráfico ou conteúdo abordado, manteve-se sempre como um meio de comunicação assumidamente eclesial e católico. Dada a impossibilidade material de refazer o per-curso de todo o longo período, nos dete-remos nesta breve análise apenas nos dois momentos de maior crise e reconstrução eclesial que marcaram a vida do jornal e nos quais ele demonstrou seu senso ecle-sial. O primeiro, na primeira década de sua existência, quando a Igreja Católica, recém emancipada da tutela do Estado, buscava reconstruir-se na fidelidade ao modo ro-mano de ser católico. O segundo, já na se-gunda metade do século XX, quando, em consequência do movimento de renovação capitalizado e impulsionado pelo Concílio Ecumênico Vaticano II, a Igreja do Brasil e do continente tomou o rumo da proximi-dade com a realidade do povo sofrido no continente e reconfigurou-se nas culturas latino-americanas e brasileiras e aproxi-mou-se dos movimentos sociais e popula-res que buscaram construir uma sociedade justa e democrática.

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Papa Francisco: primeiro editorial afirmava que jornal seria “papal no mais estrito sentido da palavra”

Empenho: Avelino Ló (3ª à esquerda) com Felipe, Marcelino,

Andressa, Stela e Rafael, do CR

Carinho: Diva Miotto (esq.) com Stela Maris, do CR

Dedicação: Severino Bianchin (2ª à esq.) e Primo Carniel

(último à dir.) com Stela, Andressa, Doniro, Marcelino

e Maria de Fátima

# EVANGELIZAÇÃO

O legado eclesial do jornal CRDesde a fundação, impresso se manteve como meio de comunicação católicoTexto de Vanildo Zugno*

Porto Alegre - RS

Pio X: jornal exaltava suas curas

A Imprensa e a reforma

“La Libertá - Il Colono Italiano” e a reforma romanizante

No curto lapso de tempo en-tre 1880 e 1920 aconteceu a mais radical transformação na história da Igreja Católica no Brasil. Impulsionada pelos bis-pos, no seu conjunto, ela pode ser descrita como a “reforma romanizante” da Igreja Cató-lica no Brasil. “Reforma” por pretender substituir elementos considerados deficientes ou sem vitalidade por novas for-mas que permitissem à fé ca-tólica apresentar-se com nova face. “Romanizante”, pois tra-tava-se de subtrair a Igreja do domínio do Estado e, ao mes-mo tempo, purificá-la dos ele-mentos do catolicismo popular não acordes ao modo romano de ser católico.

É no contexto desta reforma que surge no Brasil uma im-prensa católica. No Rio Gran-de do Sul, na década de 1870, apareceram os jornais “Es-trella do Sul” e “O Thabor”. Na década de 1890, sob a tu-tela dos jesuítas, foi a vez do “Deutsches Volksblatt” levan-tar a bandeira dos interesses da Igreja Católica no Estado. Na Região de Colonização Italia-na (RCI), foram os confrontos entre a maçonaria e o clero que fizeram surgir uma imprensa católica. Na região, o primeiro jornal com identidade católi-ca foi o “Il Colono Italiano” fundado em 1898 pelo padre Piero Nosadini. Pároco de Ca-xias do Sul desde 1896, padre Nosadini procurava fazer con-trapeso, através da imprensa, ao “O Caxiense”, jornal ligado ao governista Partido Republi-cano Riograndense. Depois de vários conflitos com as autori-dades caxienses, o “Il Colono Italiano” deixou de circular em agosto de 1898 e, em dezembro do mesmo ano, padre Nosadini regressou à Itália.

Em 1909, foi a vez do padre Cármine Fasulo fundar um jor-nal católico que levou o nome de “La Libertá”. De circula-ção semanal, o jornal logo teve dificuldades para manter-se. No fim de 1909, padre Fasulo regressou à Itália e a continui-dade do jornal se viu ameaçada. Com o objetivo de mantê-lo em circulação, padre João Fron-chetti, pároco de Garibaldi, com a ajuda de Adolfo Moreau e João Carlotto e o apoio dos freis capuchinhos franceses, adquiriu o jornal e a tipografia e os transladou a Garibaldi. Para esquecer as polêmicas de Ca-xias ou, quem sabe, homenage-ar ao padre Nosadini, o nome foi alterado na edição de 12 de março de 1910 para “Il Colono Italiano”.

Da análise das edições do “Il Colono Italiano” na sua primei-ra década de existência podemos identificar três temáticas que são representativas do espírito da re-forma romanizante: a construção da identidade católica como sub-missão à autoridade eclesiástica; o combate aos inimigos da Igreja Católica e a busca da afirmação da hegemonia cultural da Igre-ja sobre a sociedade através do discurso da submissão da ordem social aos mandamentos divinos transmitidos pela Igreja.

Em seu primeiro número sob a direção do padre Fronchetti, o jornal afirma, em editorial, seu programa originário: “La Liber-tá’ será assumidamente católico; não somente atenderá religiosa-mente os comandos da autori-dade eclesiástica; mas fará todo o esforço para antecipar-se aos seus desejos”.

A identidade católica constru-ída a partir da identificação com a autoridade eclesiástica trans-parece nas reportagens em que são apresentadas as atividades do Papa Pio X, especialmente as caritativas. A exaltação do Papa chega ao ponto de, no editorial da edição de 2 de novembro de 1912, serem noticiadas várias curas realizadas pelo Papa ainda em vida.

A identidade católica também era cultivada na dimensão de en-tretenimento que o jornal levava a seus leitores. Através de peque-nas histórias edificantes, eram apresentados os ideais e valores do bom católico. Em cada edi-ção, nas páginas 3 e 4, havia uma seção dedicada a uma novela edificante. Do número 45 ao 52, por exemplo, foi publicada a no-vela “Dalle spine a la Rosa” em que se narrava a história de uma amizade entre um rapaz e uma moça que era capaz de transcen-der o amor humano e alcançar a oblação da vida a Deus. Imelda e Rômulo, dois jovens apaixona-dos e prometidos em casamento, após a realização de exercícios espirituais e da orientação de um capuchinho, deixaram o mundo, ela para tornar-se freira, e ele para tornar-se frade.

Como toda a identidade, a afir-mação da catolicidade do jornal também foi construída a partir da identificação e desconstrução dos seus inimigos. Dentro do pensa-mento da restauração expresso no “Syllabus Errorum” de Pio IX, o primeiro e maior inimigo da fé católica é aquela forma de pensar que prega a não existên-cia de Deus. No editorial da edi-ção de 4 de maio de 1910, após apresentar as figuras de Diderot,

Voltaire, Rousseau, D’Alembert e Spinoza, o jornal afirmava que as concepções filosóficas por eles apresentadas vão contra os sentimentos do coração humano. Para desqualificar as ideias dos filósofos, o texto não apresen-tava argumentos filosóficos an-tagônicos, mas afirmava que os próprios livres-pensadores não acreditavam naquilo que eles en-sinavam.

A maçonaria aparece como a outra grande inimiga. Ela é apre-sentada como a mais intolerante das instituições na medida em que não admite, em seu interior, qualquer divergência de pensa-

mento. Na seção “Per il mondo” da edição de 15 de janeiro de 1910, o jornal compara as exco-munhões da Igreja Católica com as intolerâncias da maçonaria ita-liana que expulsou de seus qua-dros três deputados que votaram a favor do ensino religioso nas escolas públicas.

O protestantismo, tradicional inimigo da identidade católica, poucas vezes aparece nas pá-ginas do “Il Colono Italiano”. Na edição de 5 de fevereiro de 1910 é anunciada a conversão de um professor da Universida-de de Halle, na Alemanha, e, nos Estados Unidos, a conversão de todos os membros da “Socieda-de da Reconciliação”, da Igreja Anglicana para a Igreja Católica Romana.

O espiritismo também é apre-sentado como inimigo. A partir de abril de 1911, o jornal apresenta uma coluna intitulada “Dialogo tra Virginio e Geronimo” onde se refutam as teses espíritas. O es-piritismo é definido como “uma fraude inventada pelo diabo contra o homem, a religião pela qual os diabos, fingindo-se de anjos bons ou almas de mortos, para obter os seus intentos, dão respostas aos homens que os in-terrogam através de mesas, tripés ou outros objetos materiais.” ►►►

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e tivéssemos, hoje, a máquina do tempo para retroceder até o dia 18 de janeiro de

1896 veríamos naquele entardecer, chegando a Conde D’Eu (atual Garibaldi), dois frades: frei Bruno de Gillonnay e frei Leão de Montsapey. Vinham da França, cansados de uma longa travessia, mas animados, para trabalhar na evangelização e no acompanhamento espiritual dos imigrantes italianos que já habitavam o solo gaúcho.

Logo ao chegar se depararam com a dura realidade em que viviam os imigrantes italianos. Estavam abandonados à própria sorte. As promessas que os atraíram para cá eram, na realidade, só promessas.

A necessidade de evangelizar e de ajudar o povo a ter uma vida digna obrigaram os frades a pensar em alternativas. Eles então se deram conta de que não bastava pregar o evangelho, rezar e falar de Deus. Era necessário também pensar na saúde, na educação, na subsistência e nas condições de vida do povo.

Preocupados com a educação dos filhos dos imigrantes, os frades convidaram as congregações francesas das irmãs de São José e dos irmãos Maristas para virem para cá e abrirem escolas. Para a formação de frades nativos, dois anos após a chegada, em 1898, abriram o primeiro seminário. Pensando no próprio sustento, assumiram a administração de paróquias e iniciaram atividades alternativas. Neste contexto, o sonho de frei Bruno, de ter um novo instrumento de evangelização, foi desabrochando.

Em 1904, frei Bruno relatava ao bispo Dom Giovanni Scalabrini a necessidade da imprensa na evangelização: “Trabalhamos para estabelecer com simplicidade, no centro da colônia italiana, uma pequena impressora, que levará periodicamente no seio da família, em sua língua materna, uma página do santo evangelho,

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Despedida“Sinto muito o fechamento

do CR impresso. Perdemos mais um espaço alternativo para divulgação das ideias de quem utiliza a liberdade de pensamento, como Frei Bet-to. Esta é a tendência da mídia impressa, o que lamento, pois nada como pegar o jornal e le-var para ler em qualquer lugar, no momento que quiser.”

Maria Helena G. PereiraSão Paulo - SP

Nota da redaçãoRecebemos outras centenas

de cartas e e-mails de leito-res dando sua opinião sobre o fim do CR impresso, mas infelizmente não foi possível publicar. Quem ainda desejar se manifestar, ou tiver qual-quer outra demanda relativa ao jornal, pode encaminhar para o e-mail que permanecerá ativo: [email protected]

CR para pesquisaTodas as 5.532 edições do

Correio Riograndense estão digitalizadas e podem ser aces-sadas nos links:

- 13/02/1909 a 25/12/2013: http://liquid.camaracaxias.rs.gov.br/portalliquid/Pasta/SubPastas/15

- 15/01/2014 a 08/02/2017: https://issuu.com/correio.rio-grandense

Objetos e documentos relati-vos à trajetória do jornal estão sob a guarda do Museu dos Capuchinhos (Muscap): rua General Mallet, 33, bairro Rio Branco, Caxias do Sul / RS; te-lefone (54) 3220-9577.

“É com pesar que recebo a notícia do fim da publicação impressa. São muitos anos entregando o jornal aos assi-nantes, cobrando sua assinatu-ra anual, criou-se um vínculo bom. De qualquer forma, sei das dificuldades em mantê-lo, bem como das mudanças na forma de fazer comunicação. Desde já desejo sucesso na nova fórmula digital.”

Ricardo ChesiniCarlos Barbosa - RS

“Vão ficar as saudades do belo e centenário jornal, dos cultos e abnegados articulistas e das mais variadas e sempre atualizadas matérias, e ainda de quem gentilmente conta-tava com os assinantes (Stela Maris). O mundo está mu-dando rápido e certamente ou-tras novidades virão. Veremos como será o CR online.”

Dorvalino UezIjuí - RS

Atuação em defesa do colonoA identidade católica, adverte o

jornal em seu editorial de apresen-tação, não o impede de falar sobre temas não especificamente reli-giosos. Na edição de 15 de janeiro de 1910, o jornal, além de católi-co, se apresenta como “o amigo, o conselheiro, a defesa do colono, para o qual, além de assuntos reli-giosos e leituras úteis, prazerosas e amenas, fornecerá também todos aqueles conhecimentos que a ele puderem ser úteis, como: noções de agricultura, e neste assunto se dará preferência a coisas feitas no Rio Grande do Sul; o modo de confeccionar, melhorar e con-servar o vinho e seus respectivos recipientes; higiene; quando for o caso, um pouco de medicina; também, sob a forma de diálogo entre o colono Pedro e o advogado doutor Pomieri, serão oferecidas algumas informações sobre as leis do belo país que os hospeda, que são indispensáveis a todos.”

Com este objetivo, desde a sua primeira edição, o jornal apresenta a “Sezione dell’Agricultore” em que são dadas informações sobre os cultivos da região e a melhor forma de incrementar a produção. A partir da edição de 11 de março de 1911, a coluna ganha o nome de “Cognizioni utili”. Notícias e estímulos a cooperativas e asso-ciações também são frequentes nas páginas do jornal. As princi-pais iniciativas do governo federal e estadual em favor da agricultu-ra são noticiadas com destaque a cada edição.

Tanto num período como no ou-tro, podemos dizer, com toda tran-quilidade, que o jornal, em suas diversas nomenclaturas – La Li-bertà, Il Colono Italiano, Stafetta Riograndense e Correio Riogran-dense – e nas muitas mudanças que viveu no decorrer destes lon-gos 108 anos, manteve-se fiel ao propósito de frei Bruno de Gillon-nay que, em 1904, ao gestionar junto aos superiores da França a compra de uma impressora para poder produzir um jornal nas co-lônias italianas, pretendia “estabe-lecer com simplicidade, no centro da colônia italiana, uma pequena impressora, que levará, periodi-camente, no seio das famílias, em sua língua materna, uma página do santo Evangelho, explicada e comentada, uma história edifican-te, alguns conselhos de agricultu-ra, a indicação de algumas bro-churas adaptadas às necessidades dos colonos.”

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Cleonir: “mais que jornal de informação, foi jornal de opinião e formação”

Correio do leitor

Desde o início até os dias atuais, o jornal procurou ser fiel aos seus princípios. Teve seu foco voltado à propagação dos valores fundamentais para a vida humana e cristã.

CR Correio Riograndense

CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 Editorial 2CR1909 - 2017

explicada e comentada com histórias edificantes e com alguns conselhos sobre agricultura...”. Neste mesmo ano escreveu ao ministro provincial na França, dizendo: “Sem jornal, não se faz nada”.

O sonho de ter uma impressora e um jornal não se concretizou logo. Frei Bruno não tinha recursos para esse empreendimento e, no interior da missão capuchinha, ainda não havia consenso. O padre Carmine Fasulo, pároco de Caxias do Sul, assume o sonho de frei Bruno e em 13 de fevereiro de 1909 funda

o jornal La Libertá. Em 1910, La Liberta é transferido para Garibaldi e assume o nome de Il Colono Italiano. Em 1917, torna-se La Stafetta Riograndense. Em 1941, o nome do jornal é traduzido para Correio Riograndense.

Desde o início até os dias atuais, o jornal procurou ser fiel aos seus princípios. Ele nasceu para ser um jornal diferente. Além de falar de Deus e proclamar a sua Palavra, teve seu foco na educação, na cultura, na saúde, na agricultura, na ecologia, na propagação dos valores

fundamentais para a vida humana e cristã. Mais que um jornal de informação, foi jornal de opinião e formação.

Já correram 108 anos de história. O jornal tornou-se testemunha viva de grandes acontecimentos regionais, estaduais, nacionais e mundiais. Suas páginas guardam o relato de um século de vida. Guardam rostos, fatos, descobertas que marcaram gerações. Guardam histórias dos “Nanetto Pipetta” que vieram ao Brasil para achar a cucagna. Em sua trajetória, o Correio Riograndense se comprometeu com o desenvolvimento e a busca de uma vida mais digna para o povo.

Hoje vivemos um novo momento. Novos e modernos meios de comunicação estão se impondo. Para manter os propósitos originais e dar os passos que o momento exige, o jornal passará para um novo formato: será veiculado exclusivamente pela internet, com conteúdo readaptado, e estará integrado aos demais meios de comunicação administrados pelos freis capuchinhos do Rio Grande do Sul, ou seja, às emissoras de rádio da RedeSul e Rede Maisnova. Se, em sua época, frei Bruno de Gillonnay soube utilizar os meios adequados para chegar até o povo, hoje somos nós os desafiados a encontrar novos caminhos. Depois de 108 anos de jornal impresso, agora o Correio Riograndense continuará sua missão com novo formato. É a forma que encontramos para continuar a evangelização através do jornal.

Aproveitamos essa última edição impressa para agradecer a todos os colaboradores, agentes, leitores, parceiros, anunciantes e apoiadores que fizeram história conosco por mais de um século. Muito obrigado!

Com o mesmo sentimento, os convidamos a fazer parte deste novo momento do Correio Riograndense. O jornal pode ser acessado, gratuitamente, pelo site: www.correioriograndense.com.br

108 anos: missão cumpridaFrei Cleonir Paulo Dalbosco

Provincial dos capuchinhos do RS

FUN DADO EM13 DE FE VE REI RO DE 1909

Fi lia do à ADJORI-RS e ABRA JO RIDi re tor de Re da ção:

frei João Carlos RomaniniEditora-chefe: Andressa Boeira

Editores-assistentes: Ma ria de Fá ti maZa nan drea e Mar ce li no C. De zen

Diagramação: Rafael Dias Oliveira Comercial e Assinaturas: Stela Maris Andelieri

Edi ta do por: ASSOCIAÇÃO LI TE RÁ RIA SÃO BOA VEN TU RA/EDI TO RA SÃO MI GUEL

Di reção-ge ral: frei Álvaro Morés

Re da ção, Ad mi nis tra ção,Co mer cial e As si na tu ras:Av. Ale xan dre Riz zo, 534

CEP: 95110-000 - Ca xias do Sul - RSTelefone: (54) 3220-3232

Im pres são: Jor nal Pio nei ro

Cir cu la ção às quartas-feirasSite:

www.correioriograndense.com.brE-mail:

jor [email protected]:

facebook.com/jornalcr

Igreja 19CORREIO RIOGRANDENSE • Caxias do Sul, 8 de fevereiro de 2017 CR1909 - 2017

ais do que as reformas externas em termos esté-ticos e litúrgicos, o Con-

cílio Vaticano II foi uma tentati-va de colocar a Igreja no século XX. Com efeito, em virtude do trauma da Reforma Protestante e das determinações canônicas do Concílio de Trento, a Igreja Católica, durante quatro séculos, permaneceu alheia e inimiga da modernidade.

Para João XXIII, o Papa que convocou o Concílio, o desafio era tanto o de “abrir a janela da Igreja para que possamos ver o que acontece do lado de fora e para que o mundo possa ver o que acontece na nossa casa” como o de manter as portas e ja-nelas da Igreja abertas para que o Espírito Santo pudesse orientar a Igreja no seu processo de “ag-giornamento”.

Acolhendo as decisões do Con-cílio, na edição de 15 de dezem-bro de 1965 – a primeira após a conclusão da Assembleia Conci-liar – o jornal, em editorial, assim se expressa em relação ao evento que consolidou e impulsionou a maior reforma da Igreja Católica nos últimos 500 anos: “O Con-cílio Ecumênico terminou. Ago-ra começa nossa tarefa. A tarefa de cada um de nós, os cristãos”. Numa clara referência à “Lumen Gentiun” que, a partir da noção de Sacerdócio Universal dos Fi-éis propunha uma nova eclesio-logia, o editorial prossegue: “E isso em face do santo batismo que nos elevou à dignidade de fi-lhos de Deus. Ou cada um de nós cuida, deveras, valorizar o seu batismo, ou nada feito do Concí-lio, continuando o mundo como dantes: trôpego, anêmico, ilhado, coxo, mudo, surdo, cego.”

Na mesma edição, o jornal des-taca como manchete principal o Ano Santo proclamado pelo Papa Paulo VI para acolher as decisões conciliares. Na mesma página de capa, fazendo outra matéria, elenca os documentos concilia-

res e, citando o programa de rá-dio “A Voz do Pastor” de Dom Vicente Scherer, afirma que o desafio agora cabe a cada um dos católicos e se resume na palavra “atualização” pois “as resoluções do Concílio permaneceriam es-téreis e infecundas se sacerdotes e leigos não as recebessem com docilidade e amor”.

Na edição seguinte, de 22 de dezembro, a temática do Concí-lio é retomada e, citando nova-mente o Papa Paulo VI, afirma que a renovação proposta pelo Concílio “não é coisa passageira como muitas outras coisas o são, mas algo que prolonga seus efei-tos além do período de celebra-ção atual”.

O desejo de renovação do Con-cílio Vaticano II se concretizou, na América Latina, nas Assem-bleias das Conferências Episco-pais de Medellín (1968), Puebla (1979), Santo Domingo (1992) e Aparecida (2007). Elas mar-caram com a palavra dos bispos

do Continente Latino-americano e do Caribe as mudanças impul-sionadas pelo Concílio. Atento ao caminhar da Igreja, o Cor-reio Riograndense acompanhou os novos processos eclesiais em curso na região. A edição de 6 de março de 1985 é representativa desta nova postura do jornal em sintonia com a vida da Igreja. Com chamada de capa e reporta-gem na página 8, o jornal celebra a diminuição das ditaduras no continente e festeja os novos ven-tos democráticos que se ampliam a cada ano.

Também com foco na realidade social e na perspectiva dos pobres tão cara à Igreja latino-americana e caribenha, na página central, é destacada a realidade de fome que ainda persiste no mundo e a necessidade de um projeto global para a superação de tal situação. A mesma problemática é tratada em nível local quando, com cha-mada na capa e matéria na página 3, é apresentada a dramática situ-ação dos pequenos agricultores e cantinas da região serrana do Rio Grande do Sul ante o baixo preço da uva e do vinho. Ainda na mes-ma edição, com chamada de capa e reportagem na página 18, é feito

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Concílio: mais do que reformas estéticas e litúrgicas, uma tentativa de colocar a Igreja no século XX

O jornal e as mudanças do Concílio Vaticano II

João XXIII: convocou o Concílio

Romaria da Terra: defesa do colono sempre foi uma das bandeiras do CR

*Vanildo Luis Zugnofrei capuchinho, graduado em Filosofia e Teologia, doutor em Teologia

um relato da 8ª Romaria da Terra que acabara de acontecer em Te-nente Portela.

Ao lado das reportagens que focam a realidade social e as ini-ciativas da Igreja para a elas dar resposta, as colunas de autores tornaram-se cada vez mais um espaço privilegiado para a refle-xão da realidade à luz da fé cris-tã. Impossível não lembrar do saudoso frei Wilson Sperandio e sua leve e profunda coluna se-manal “Novo Jeito de Viver”. Ao lado dele, já na década de 1990, estava frei Aldo Colombo e seu “Um Olhar Diferente”. Já no novo milênio, a eles somaram- se a teóloga Maria Clara Binge-mer, Frei Betto, Leonardo Boff, Padre Zezinho e, sempre com o cariz capuchinho, os freis Jaime Bettega com a coluna “Olhar a Vida” e Luiz Turra sempre falan-do “No Coração da Vida”. Cada um deles, com seus temas prefe-ridos e sua abordagem pessoal, ajudavam o leitor a pensar-se como cristão no mundo em que vivemos, em sua dimensão pes-soal, eclesial e social.

Para contribuir no propósi-to do Concílio Vaticano II e do caminhar da Igreja brasileira e latino-americana que deseja o protagonismo dos leigos e leigas no assumir e implementar a fé no âmbito social e eclesial, a partir de 2005, o Correio Riogranden-se, em parceria com a Escola Superior de Teologia e Espiritu-alidade Franciscana (Estef), ofe-receu, anualmente, o Curso de Teologia à Distância. Orientados por módulos semanais produzi-dos pelos professores da Facul-dade de Teologia mantida pelos capuchinhos em Porto Alegre, os leitores e leitoras tiveram a opor-tunidade de aprofundar temáti-cas ligadas à fé cristã, à vivência eclesial e ao compromisso social.

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