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a Ano XXVIII • Nº 265 • Dezembro 2018 • R$ 15,00 • www.eco21.com.br facebook.com/revista.eco21 ECO 21 Evaristo Eduardo de Miranda • Cláudio Angelo • Karl Mathiesen José Antonio Marengo• Maria Fernanda Ziegler • Alexandre Kossoy ISSN 0104-0030

Ano XXVIII • Nº 265 • Dezembro 2018 • R$ 15,00 • ... 21_265_ FINAL.pdfserá realizada em Katowice, na Polônia, ainda em Dezembro deste ano. Nesta Conferência das Partes,

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Diretora Lúcia Chayb

Editor

René Capriles

Redação Tara Ayuk

Erik von Farfan Rudá Capriles

Colaboradores

André Trigueiro José Mon serrat Filho

Samyra Crespo Evaristo Eduardo de Mi randa

Elisa Homem de Mello

Fotografia Ana Huara

Correspondentes no Brasil

São Paulo: Lídia Chaib Belém: Edson Gillet Brasil

Correspondentes no Exterior

Bolívia: Carlos Capriles Farfán México: Carlos Véjar Pérez-Rubio

Itália: Mario Salomone e Bianca La Placa França: Aurore Capriles

Serviços Infor mativos

Argentina: Ecosistema Brasil: Envolverde, ADITAL, EcoAgência,

EcoTerra, O ECO, Ambiente Brasil França: Valeurs Vertes, La Recherche

Itália: ECO (Educazione Sostenibile) México: Archipiélago

Direção de Arte

ARTE ECO 21

CTP e impressão Tricontinental

Jornalista Responsável

Lúcia Chayb - Mtb: 15342/69/108

Assinaturas Anual: R$ 130,00

[email protected]

Uma publicação mensal de Tricontinental Editora

Av. N. Sra. Copacabana 2 - Gr. 301 22010-122 - Rio de Janeiro

Tel.: (21) 2275-1490 [email protected]

www.eco21.com.br

Facebook www.facebook.com/revista.eco21

A no 28 • Dezembro 2018 • N º 265

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Capa: Michal Kurtyka, Presidente da COP-24 pula no encerramento do encontro Foto: IISD

Gaia viverá! Lúcia Chayb e René Capriles

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ECO 21 agradece a todos os colaboradores, amigos e leitores. Boas Festas! Sustentável 2019!

4 Maria Fernanda Ziegler - IPCC: é urgente a redução das mudanças climáticas 6 Waleska Barbosa - COP-14: Acordo para reverter destruição da natureza 8 Karl Mathiesen - 197 países dão vida ao acordo climático de Paris10 Lucas Tolentino - Brasil destaca legado ambiental na COP-2412 Cláudio Angelo - COP-24 entrega regras claras, mas países devem querer jogar14 Elton Alisson - Biodiversidade é estratégica para o desenvolvimento do Brasil16 Nádia Franco - G20 destaca irrevessibilidade do Acordo de Paris18 Tara Ayuk - Níveis de GEE na atmosfera atingem novo recorde19 Erik Von Farfan - Fundo Amazônia: R$ 45 mi para gestão de TIs e UCs20 Marcos Pivetta - Entrevista com José Antonio Marengo28 Alexandre Kossoy - O que o Brasil faz para lidar com as mudanças climáticas30 Elmano Augusto - Povos indígenas realizam diálogo sobre o clima31 Hozefa Merchant - Mudança do clima aumenta desigualdade social32 Mauro Arbex - Ambientalistas entregam à PGR Manifesto por Ar Limpo34 Elisa Homem de Mello - Ethos: inclusão social, diversidade e combate à corrupção36 Fernanda Farias - Lista Vermelha registra o boto-vermelho quase extinto38 Evaristo Eduardo de Miranda - O Presidente e a Amazônia40 Manuel Alves Filho - Risco de savanização exige providência na Amazônia44 José Monserrat Filho - Proibição de armas nucleares pode virar Lei em 201946 Bruno Taitson - Comissão aprova Política de Redução de Agrotóxicos48 Selma Bellini - Capacidade instalada de energia eólica supera 14 GW50 Rayssa Soares Brito - Aprovado estauto do Instituto Global do MP para o Ambiente

O professor de Ciências Biológicas da Universidade de Stirling, Luc Bussiere, perguntou: “Quais espécies dominariam a Terra se os humanos fossem extintos?”. O ser humano pode entrar na Lista Vermelha da IUCN? A organização responde que por enquanto os humanos não correm perigo, tal como os milhares de espécies que desaparecem diariamente. A democracia pode desaparecer? Centenas de filósofos trabalham para responder essa pergunta. As propostas políticas atuais não são uma opção. A resposta está na nova geração que surge das entranhas do capitalismo. As velhas pregações da esquerda não significam mais nada; não dão uma resposta; as da direita muito menos. A corrupção e o crime instituídos nas últimas décadas em muitos países revoltaram grande parte da sociedade que busca soluções. O evangelismo político que elegeu Donald Trump nos EUA já teve a sua resposta nas recentes eleições parlamentares que optaram por nomes novos como o de Alexandria Ocasio-Cortez, líder do “Movimento do Amanhecer”, um grupo político-climático de jovens que não aceitam a imposição negacionista de Trump e de seu ideólogo Steve Bannon. Mas, a esperança está na nova geração, aqui e no mundo em geral. Greta Thunberg, uma estudante sueca de 15 anos, uma vez por semana se manifesta diante do Parlamento sueco para protestar contra a política do seu país em relação ao clima. Ela disse: “A primeira vez que ouvi sobre o aquecimento global, pensei: isso não pode estar certo, de jeito nenhum, há algo sério o suficiente a ameaçar a nossa própria existência”. Outra jovem lutadora é a filipina Joanna Sustento de 26 anos, sobrevivente do tufão Haiyan, lidera o movimento que responsabiliza os “gigantes do carbono”: Shell, BP, Chevron, ExxonMobil, Suncor, Lukoil, etc. pelos desastres acontecidos na sua região. Joana, que é uma ativista da luta pela justiça climática, disse: “Vejo que há muito poder na gente; o povo tem poder para gerar essa pressão aos nossos governos e corporações, para mudar o sistema atual”. A luta de Greta e Joanna inspirou os jovens poloneses a saírem às ruas em Katowice durante a COP-24. Um exemplo que se espalhou pela Europa e os EUA durante os dias da Conferência da ONU. Clima e democracia hoje são quase sinônimos. Nos Estados Unidos, na Holanda e na Colômbia grupos de jovens estão processando os seus governos por não implementarem políticas climáticas saudáveis nos seus países. “Há que entender que os direitos da Mãe Terra não são abstratos porque a Terra não é abstrata. É o fundamento da nossa existência e somos parte dela”, adiciona a ativista indiana Vandana Shiva. Isso nos leva a refletir sobre o direito principal da nossa existência como seres sociais: a democracia. Há 50 anos, em 13/12/1968 o governo militar instituiu o AI-5 que suspendeu as garantias constitucionais e fechou o Parlamento institucionalizando a tortura e a perseguição política. Uma época de triste memória. Hoje devemos encontrar o caminho perdido para que o povo não sofra. Devemos trilhar a vereda constitucional que respeite os direitos de todos, índios, negros, brancos, etc. Em “Vidas secas” Graciliano Ramos, na visão do sertanejo retirante, Fabiano, diz: “Olhou a catinga amarela, que o poente avermelhava. Se a seca chegasse, não ficaria planta verde. Arrepiou-se. Chegaria, naturalmente. Sempre tinha sido assim, desde que ele se entendera. E antes de se entender, antes de nascer, sucedera o mesmo – anos bons misturados com anos ruins. A desgraça estava em caminho, talvez andasse perto”. E mais adiante reflexiona: “Um dia... Sim, quando as secas desaparecessem e tudo andasse direito. Seria que as secas iriam desaparecer e tudo andar certo? Não sabia”. Tal como na obra de Graciliano, as secas e a democracia devem ser irrigadas, precisam de água e ideias para subsistir. Octavio Paz disse um dia: “O homem é um ser que se criou a si próprio ao criar uma linguagem. Pela palavra, o homem é uma metáfora de si próprio”. O Brasil, nas últimas eleições, também criou uma metáfora de si próprio.

Quais espécies dominariam o planeta se a democracia fosse extinta?

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Limitar o aquecimento global a 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais exige mudanças imediatas e sem precedentes na economia mundial. Essa é a avaliação do novo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas, publicado no último dia 7 de Outubro.

Produzido por 91 cientistas e revisores de 40 países para guiar líderes globais, o relatório detalha – com base em 6 mil estudos científicos – a diferença que o impacto do aumento de 1,5°C ou 2°C nas temperaturas teria para o planeta. Atu-almente, a ação do homem já provocou o aumento médio de 1,1°C na temperatura global.

Diplomatas de vários países do mundo se reuniram no mês de Outubro último em Incheon, na Coreia do Sul, para negociar o relatório preparado por cientistas do Painel Inter-governamental sobre Mudanças Climáticas. De acordo com Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo e membro do IPCC, houve uma forte reação dos Estados Unidos e dos Emirados Árabes em defesa dos combustíveis fósseis, até que finalmente se chegasse a um consenso no dia 6/10.

IPCC: é urgente a redução das mudanças climáticas

Maria Fernanda Ziegler | Jornalista da Agência FAPESP

“O relatório diz com todas as letras que se quisermos limitar o aumento da temperatura em 2°C, não tem jeito, vai ter que ser emissão zero de carbono até 2050 e emissões negativas, ou seja, além de não emitir carbono, também sequestrar [retirar] carbono da atmosfera ao longo dos últimos 50 anos deste século. Essa seria hoje a única maneira de conseguirmos isso, uma tarefa praticamente impossível”, disse Artaxo.

Outro ponto destacado no relatório é que muitos dos efeitos do aquecimento global já são percebidos e serão intensificados antes mesmo de atingir o limite de 1,5°C. Caso o aquecimento continue no mesmo ritmo de hoje, a temperatura global deve aumentar 1,5°C (em comparação aos níveis pré-industriais) até 2040. Isso acarretaria em escassez de alimentos, secas, enchentes, redução da biodiversidade e a mortalidade em massa de recifes de corais. Outros impactos em destaque são o aumento do nível do mar, dos casos de doenças transmitidas por vetores, de ondas de calor e de ciclones tropicais. Porém, a diferença de 0,5°C, além de diminuir o impacto das mudan-ças climáticas, impediria, por exemplo, que os corais fossem completamente erradicados e também aliviaria a pressão sobre o Ártico, reduzindo o aumento do nível do mar.

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De acordo com o relatório, o que acontecer entre 2018 e 2030 será determinante, especialmente para as emissões de dióxido de carbono (CO2). Entre as determinações para limitar o aquecimento global em 1,5°C estão banir os combustíveis fósseis e o desmatamento. “Estamos em uma encruzilhada. Aquilo que for feito nos próximos cinco e 10 anos será determinante para o clima no planeta neste e nos próximos séculos. Se não agirmos agora e conseguirmos obter reduções substanciais nas emissões ao longo da próxima década, será muito difícil manter o aquecimento global em apenas 1,5°C”, disse.

Desmatamento na Amazônia

A necessidade de emissões negativas aumenta automa-ticamente a importância do combate ao desmatamento da Amazônia e a promoção de iniciativas de reflorestamento em larga escala visando aumentar o armazenamento de carbono. As florestas são capazes de armazenar carbono da atmosfera, questão fundamental para as mudanças climáticas.

“Com a necessidade de estocar carbono, aumenta a preocupação com a Amazônia e outras áreas de florestas tropicais que estão em risco. Temos que parar 100% com o desmatamento de áreas tropicais. Parar de destruir floresta é a maneira mais barata e eficiente para reduzir emissões e que só traz benefícios. É mais fácil e barato, por exemplo, que mudar a estrutura energética de um país e, além disso, é o que traz retorno imediato”, disse.

Artaxo ressalta que a necessidade de desmatamento zero deixa o Brasil em posição delicada. “Desmatamento é basi-camente uma questão de legislação e de fazer cumprir essa legislação. Isso deixa o Brasil em situação delicada, já que nos últimos quatro anos o desmatamento aumentou de 5 mil km² para 8 mil km². É um valor absurdamente alto”, disse.

Intensificação do Acordo de Paris

O relatório do IPCC será a peça-chave para a 24ª Con-ferência das Partes (COP-24) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) que será realizada em Katowice, na Polônia, ainda em Dezembro deste ano. Nesta Conferência das Partes, os governos vão revisar o Acordo de Paris (2015) para combater as mudanças climáticas.

“Lá será discutida a intensificação do Acordo de Paris, com metas mais altas de redução das emissões de Gases de Efeito Estufa. Mas a Alemanha, por exemplo, já falou que não vai conseguir atingir as metas voluntárias do Acordo de Paris. Os Estados Unidos não querem que a opinião pública da indústria do carvão se vire contra eles. Países como a Polô-nia, por exemplo, com 70% da energia gerada por carvão, afirmam também que não vão conseguir atingir as metas”, disse Paulo Artaxo.

O Acordo de Paris adotado por 195 nações na 21ª Con-ferência das Partes (COP-21) da UNFCCC, em Dezembro de 2015, incluiu o objetivo de fortalecer a resposta global à ameaça das mudanças climáticas “mantendo o aumento na temperatura média global menor que o aumento de 2°C do nível pré-industrial (1750) e esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C”.

Como parte da decisão de adotar o Acordo de Paris na COP-21, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Cli-máticas foi convidado para produzir, em 2018, o Relatório Especial “Global Warming of 1.5°C”, sobre o aquecimento global de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais e vias de emissão de Gases de Efeito Estufa. O relatório tem como objetivo examinar a questão para o fortalecimento da resposta global às mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável e esforços para erradicar a pobreza.

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A 14ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-14) terminou com um Acordo internacional firmado por 196 países, objetivando reverter a destruição global da natureza e a perda de biodiversidade, além das ameaças para todas as formas de vida na Terra. Os governos concordaram em acelerar as ações para atingir as Metas de Aichi para a Biodiversidade, até 2020, com um trabalho realizado em níveis regional, nacional e subnacio-nal, de forma abrangente e participativa. Com o tema geral “Investindo em biodiversidade para as pessoas e o Planeta”, a Conferência foi realizada em Sharm El Sheikh, no Egito entre 13 e 29 do último mês de Novembro. A reunião inter-nacional teve como objetivo central monitorar os avanços das deliberações da CDB e estabelecer novas medidas de conser-vação, uso sustentável e compartilhamento justo e igualitário dos benefícios associados ao uso do patrimônio genético e o desafio para a integração de políticas de conservação da biodiversidade em setores como infraestrutura; manufatura e processamento; energia e mineração; e saúde.

Os países-membros da CDB discutiram e negociaram diversos itens, numa programação que incluiu reuniões das partes dos Protocolos de Nagoya (NP/MOP3) e de Cartagena (CP/MOP9). O Ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, participou do segmento de alto nível, nos dias 14 e 15/11. Além de participar das negociações sobre temas relevantes para o país, o Brasil vai apresentou ao mundo as recentes conquistas na conservação da sua biodiversidade, incluindo a notável expansão, nos últimos dois anos, do Sistema Nacional de Áreas Protegidas. Hoje, o país tem 18% dos ecossistemas terrestres e 26% dos marinhos, em áreas de proteção.

COP-14: Acordo para reverter destruição da natureza

Waleska Barbosa | Jornalista do MMA

O Ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, destacou que nas regiões com maior biodiversidade do Planeta estão as nações menos ricas em termos econômicos. Estas, têm menos condições para investir na conservação, pesquisa e no desenvolvimento de tecnologias para o uso sustentável da biodiversidade. “Por isso, a responsabilidade e o compromisso são de todos. Afinal, o Planeta Terra é um só”, afirmou. Edson Duarte defende a importância de investimentos em P&D de tecnologias limpas e menor uso de recursos não renováveis em processos produtivos. “Estima-se que o Brasil detém em torno de 20% da biodiversidade mundial conhecida, mantendo mais de 60% de seu território cobertos com vegetação nativa e, hoje, tem um mosaico de áreas protegidas cobrindo cerca de 30% de seu território”, afirmou o Ministro Duarte.

Durante da COP-14, mais de 35 decisões foram tomadas sobre questões técnicas como a biologia sintética, informações de sequência digital e outras medidas de conservação. O Brasil participou do lançamento de iniciativas para fortalecimento das áreas protegidas e Outras Medidas Efetivas de Conserva-ção Baseadas em Área (OMECs), da Parceria Global para o Alcance da Meta 11 de Aichi e da Aliança Latino-americana para o fortalecimento das áreas protegidas.

A importância da proteção dos manguezais brasileiros e o papel das comunidades locais na conservação desses ecos-sistemas foram destacados em um evento organizado pela ONG WWF. O Brasil possui 87% dos seus manguezais em Unidades de Conservação (UCs). Uma medida para proteger o ecossistema foi o reconhecimento, como Sítio Ramsar, do Estuário do Amazonas e seus manguezais, abrangendo os Estados do Amapá, Pará, Maranhão, Ceará e Piauí.

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Também foi aprovada Decisão sobre planejamento espacial, áreas protegidas e “Outras Medidas Efetivas de Conservação Baseadas em Área” (OMEC), incluindo orientações sobre a integração das UCs e OMECs na paisagem; a internalização desses conceitos por outros setores beneficiados e que con-tribuem para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável; modelos de governança para gestão das UCs; o alcance da Meta 11 de Aichi (conservar pelo menos 17% de áreas terrestres e de águas continentais e 10 % de áreas marinhas e costeiras) no ambiente marinho e costeiro; e a definição e critérios para reconhecimento das OMECs.

Onça pintada

O Brasil inspirou a criação do Dia Internacional da Onça Pintada, decisão tomada por organizações não governamen-tais e países de ocorrência da espécie. O governo brasileiro institucionalizou a data em âmbito nacional, por meio da Portaria MMA nº 8, de 16 de Outubro de 2018. Durante a COP-14 também foi apresentado um plano de ação global para a conservação da espécie (Roadmap Jaguar High 2030), com o objetivo de fortalecer o Corredor da Onça-Pintada, do México à Argentina. O Brasil se comprometeu a preservar 30 Unidades de Conservação prioritárias e estabelecer corredores de conectividade entre elas.

Sítios BAZE

O Mapa dos sítios da Aliança Brasileira para Extinção Zero ou Mapa BAZE, estudo inédito realizado pelo Ministério do Meio Ambiente em parceria com a Fundação Biodiversitas (MG), foi apresentado como um exemplo para os países que buscam avançar rumo ao cumprimento da Meta 12 de Aichi. Já a experiência brasileira em Acesso e Repartição de Benefícios (ABS) e as parcerias inovadoras para administrar grandes áreas marinhas protegidas foram temas de eventos paralelos. “A legislação brasileira estabelece regras claras de repartição de benefícios, prevendo que 1% da receita líquida anual obtida a partir da exploração econômica do produto acabado seja repartida por instrumentos monetários ou, dire-tamente, por meio de ações das empresas para a conservação da biodiversidade”, explicou o Ministro Edson Duarte.

O país propôs, ainda, a execução do projeto GEF-Mar 2, com o objetivo de reforçar e expandir os esforços contínuos para proteger e administrar os extensos ambientes costeiros e marinhos do Brasil, além da rica biodiversidade e serviços ecossistêmicos que eles apoiam.

A COP 14

A Conferência das Partes (COP) é o principal órgão da Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD). A cada dois anos, os países signatários se reúnem para firmar pactos e analisar o andamento das metas estabelecidas anteriormente. A COP estabeleceu 7 programas temáticos de trabalho (zona costeira e marinha; águas continentais; agricultura; áreas secas e semiáridas; florestas; montanhas e ilhas), que cor-respondem a alguns dos principais biomas do Planeta. Para cada temática, são associados visão e princípios básicos para orientar o trabalho futuro.

CDB

Adotada no Brasil em 1992, durante a RIO-92, e em vigor desde 29 de Dezembro de 1993, a CDB tem como objetivo estabelecer as normas e princípios que devem reger o uso e a proteção da diversidade biológica em cada país signatário. A partir dela, são criadas as regras para assegurar a conservação da biodiversidade, o seu uso sustentável e a justa repartição dos benefícios provenientes do uso econômico dos recursos genéticos, respeitada a soberania de cada nação sobre o patri-mônio existente em seu território. A CDB já foi assinada por 194 países e ratificada por 168.

Os Protocolos

O Protocolo de Cartagena e o de Nagoya são acordos inter-nacionais suplementares à CDB. O de Cartagena visa assegurar um nível adequado de proteção no campo da transferência, manipulação e do uso seguros dos organismos geneticamente modificados (OGMs) resultantes da biotecnologia moderna que possam ter efeitos adversos na conservação e no uso sus-tentável da biodiversidade, levando em conta os riscos para a saúde humana, decorrentes do movimento transfronteiriço. O Protocolo entrou em vigor em 11 de Setembro de 2003, mesmo ano em que o Brasil ratificou o documento.

O Protocolo de Nagoya tem por objetivo viabilizar a realização do terceiro objetivo da CDB: a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais a eles associados. Entrou em vigor em 2014. O Brasil assinou o Protocolo em 2011, mas o Congresso Nacional ainda não ratificou o documento, o que limita a participação brasileira nas discussões relativas ao Protocolo, onde participa apenas como ouvinte, e que ocorrem em paralelo às negociações da CDB. Apesar disso, o Brasil participou ativamente das discussões sobre ABS realizadas no âmbito da COP-14.

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Na cúpula em Katowice, na Polônia, quase 200 governos concordaram com as regras para colocar o pacto histórico em ação, mas não conseguiram fazer um forte empurrão para cortes mais rápidos nas emissões.

Num momento de profunda divisão global, os governos fizeram um acordo sobre as regras do clima que foi imediata-mente saudado como uma vitória do multilateralismo.

As regras definirão as responsabilidades das nações para lidar com as mudanças climáticas, relatando seu progresso e aumentando seus esforços nas próximas décadas. Eles colocarão o Acordo de Paris 2015 em ação.

Considerando que as negociações climáticas da ONU foram dominadas por pesos pesados globais - principalmente EUA e China - este atingiu um equilíbrio delicado entre as preo-cupações dos países menores, mais pobres e mais vulneráveis, os países desenvolvidos mais responsáveis pelo aquecimento global e as economias emergentes de ser sobrecarregado com um fardo maior para agir.

“Sucesso aqui também significa sucesso para a ordem global baseada em regras, em um momento em que o multilateralismo é tão ferozmente desafiado. A mudança climática tem um impacto global, por isso requer uma resposta global”, disse ao Home Climate News o comissário de energia climática e energia da UE, Miguel Arias Cañete.

Karl Mathiesen | Editor do Climate Home News. Com a colaboração de Megan Darby e Sara Stefanini

197 países dão vida ao acordo climático de Paris

“Katowice mostrou mais uma vez a resiliência do Acordo de Paris, o nosso sólido roteiro para a ação climática”, disse, exultante, o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, Antonio Guterres, em um comunicado lido no plenário onde o acordo foi adotado. “De agora em diante, minhas cinco prioridades serão ambição, ambição, ambição, ambição e ambição”.

Negociadores experientes disseram ao Climate Home News que esperavam que o resultado desse encontro fosse muito, muito mais fraco: apenas algumas dezenas de páginas de regras e muitas questões deixadas para serem resolvidas posteriormente.

Laurence Tubiana, Ex-Embaixadora Especial da França na COP-21, CEO da European Climate Foundation e professora no Sciences Po de Paris, que ajudou a elaborar o Acordo de Paris, disse que as 133 páginas de regras aprovadas por todos os países eram “realmente impressionantes”. “Provavelmente hoje esse processo, esse acordo, é certamente mais completo, ambicioso e envolvente do que qualquer outro”, disse Tubiana.

“Esta é uma conquista muito importante que mostra uma forte disposição da comunidade internacional, mesmo em um contexto no qual se encontram líderes que desafiam o multilateralismo”, disse Teresa Ribera, Ministra da Energia e Meio Ambiente da Espanha.

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A preparação para a conferência foi dominada por uma grande preocupação pública, depois que um relatório científico da ONU descobriu que o aquecimento, mesmo 0,5ºC acima da temperatura global de hoje, causaria danos generalizados e sofrimento humano.

A primeira semana da reunião viu uma luta amarga pela linguagem usada para adotar o relatório. Eventualmente, congratulou-se com a sua conclusão atempada, mas não as conclusões. Os EUA, os sauditas, os kuwaitianos e os russos resistiram a uma aclamação plena da ciência.

Diplomatas acreditam que o livro de regras é uma ferra-menta suficientemente forte que, se estiver associada à liderança política, pode evitar os piores impactos. Essa liderança está faltando, disse Amjad Abdulla, Presidente da Aliança dos Pequenos Estados Insulares. Ele disse que o grupo não era “totalmente feliz”, mas o acordo era algo com que eles podem trabalhar. “Não é uma bíblia que estamos elaborando, é algo que podemos rever”, disse Gebru Jember Endalew, Presidente do grupo de países menos desenvolvidos. As promessas climá-ticas nacionais até hoje colocam o mundo no caminho certo para 3-4°C de aquecimento, o dobro da meta acordada em Paris. Muitos esperavam uma declaração política em Katowice pedindo aos governos que se comprometessem a aumentar a ambição antes de 2020, o que não se materializou.

A próxima parada no roadshow climático é uma cúpula em Nova York em Setembro, realizada por Guterres. Ele voou para a conferência de Katowice três vezes para obter um compromisso das partes para chegar a essa conferência com novas e mais duras promessas climáticas. Sua resposta, em geral, foi não comprometedora. Enquanto os países mais vulneráveisestavam insatisfeitos com o nível de ambição em exposição, eles ganharam algumas concessões, incluindo mais previsibilidade da ajuda financeira e um apoio para reconhecer os danos causados pelas mudanças climáticas no processo.

Os países não puderam concordar em tudo, no entanto. Um pacote de regras para negociar créditos de carbono através das fronteiras foi adiado para 2019, após um impasse entre o Brasil e uma coalizão de países europeus e vulneráveis ao clima. O Brasil estava fazendo lobby para que as regras mais frouxas beneficiassem sua indústria de compensação de carbono, que o segundo grupo disse minar a integridade ambiental do Acordo de Paris. Esse desentendimento levou o fim da reunião a atrasar em mais de 24 horas, com a presidência polonesa tentando negociar um acordo sobre como levar adiante a negociação.

“Todos nós trabalhamos muito duro para encontrar compromissos, mas a decisão sábia é adiar”, disse um nego-ciador brasileiro aos jornalistas do Climate Home News. Os observadores não veem muita perspectiva de que as tensões diminuam no próximo ano. Jair Bolsonaro, novo Presidente do Brasil, tende a favorecer os interesses comerciais em detri-mento da proteção ambiental.

Preocupações que a indiferença dos EUA poderia se transformar em hostilidade provaram ser infundadas. Várias fontes disseram que o departamento de estado foi uma força construtiva nas negociações.

O consultor da Casa Branca, Wells Griffith, supervisio-nou um evento de combustível pró-fóssil, que foi apoiado pela delegação australiana. Mas isso aconteceu à margem da conferência. Dentro das conversas, a Casa Branca escolheu colaboração sobre o confronto. Ao lado da China, os EUA supervisionaram a elaboração das regras que regem a trans-parência, um aspecto central do livro de regras.

Um compromisso alcançado por meio da diplomacia entre as duas grandes potências viu o enfraquecimento de um sistema de dois níveis que governou a política climática desde o início dos anos 90. A divisão entre países desenvolvidos e em desenvolvimento foi transferida para um conjunto comum de regras que pode ser flexionado para aqueles que precisam.

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O Brasil apresentou na segunda-feira 10 deste mês (Dezem-bro) às Nações Unidas a contribuição do país para o combate ao aquecimento global. Os resultados das políticas brasileiras voltadas para o desenvolvimento sustentável foram destacados pelo Ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, em eventos paralelos e em reunião de alto nível na Conferência do Clima (COP-24), que reúne representantes de 195 países na Polônia. Ao lado de parceiros como Alemanha e Noruega, o Ministro Edson Duarte listou avanços que incluem o aumento das Unidades de Conservação brasileiras e o fortalecimento da fiscalização e das ações de proteção da Amazônia. “O Brasil iniciou a implementação de políticas públicas inovadoras”, declarou o Ministro. “Estamos controlado de maneira contínua as nossas emissões”, acrescentou.

Os avanços da política ambiental brasileira, segundo Edson Duarte, demonstram a importância da promoção do desenvolvimento sustentável. “Esses resultados vindos de um país em desenvolvimento com grandes desafios sociais e econômicos ainda a serem superados é fruto de um grande esforço nacional”, afirmou o Ministro.

Montado pelo Governo Federal dentro da Conferência, o Espaço Brasil na COP-24 dedicou sua programação a eventos sobre o legado brasileiro na agenda climática. Houve debates promovidos por parlamentares, pelo Serviço Florestal Brasileiro, outros órgãos do Governo e por instituições que representam diversos segmentos do setor produtivo e da sociedade civil.

Brasil destaca legado ambiental na COP-24

Lucas Tolentino | Jornalista do MMA, enviado especial a Katowice

No local, o Ministro do Meio Ambiente informou questões relacionadas ao andamento das negociações diplomáticas da 24ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. “O Brasil participa da Conferência das Partes para colaborar com os avanços da regulamentação do Acordo de Paris”, explicou. “É preciso que os países desenvolvidos cumpram o compromisso de transferir os recursos necessários para os países em desenvolvimento”, defendeu Edson Duarte.

A COP 24

Os países signatários da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima estão reunidos na 24ª Conferência das Partes (COP-24), em Katowice, para chegar a um consenso sobre o Livro de Regras para a implementação do Acordo de Paris, pacto mundial para manter o aumento da temperatura média do Planeta abaixo de 2°C, com esforços para limitar esse aumento a 1.5°C.

Nesse contexto, cada país apresentou metas específicas. A meta do Brasil é reduzir 37% das emissões de Gases de Efeito Estufa até 2025, com indicativo de cortar 43% até 2030, ambos em comparação aos níveis registrados em 2005. Para atingir seu objetivo, o Brasil propôs ações para todo o conjunto da economia, com medidas para setores como energias renováveis e recuperação florestal.

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Relatório aponta que futuro depende de biocombustíveis

Uma coalizão formada pelo Brasil e outros países lançou na segunda-feira 10 deste mês (Dezembro), na COP-24, o relatório “Criando o Biofuturo”. O documento revela que as metas mundiais de redução de Gases do Efeito Estufa não serão atingidas sem maior uso de biocombustíveis e biopro-dutos. O assunto foi tema de evento paralelo realizado na Conferência. O relatório mapeia caminhos para o progresso e mostra como a expansão de uma bioeconomia sustentável de baixo carbono pode promover crescimento, com segurança energética, e a luta contra as mudanças climáticas. Além disso, o estudo revela as quatro maiores barreiras que impedem novos avanços.

O Ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, presente no lançamento, ressaltou a importância do relatório. “O principal ensinamento do relatório é que uma variedade de políticas bem formuladas, combinadas com apoio ao mercado e à inovação, é essencial para a produção sustentável dos biocombustíveis, bioenergia e bioprodutos, na escala necessária”.

Edson Duarte afirma que o Brasil é um dos países que estão à frente dessa nova forma de produ-ção. “Junto com o Canadá, esta-mos liderando o caminho para os programas de descarbonização de combustível, por meio dos Padrões de Combustíveis Limpos e as polí-ticas da RenovaBio”, afirma.

O Ministro do Meio Ambiente brasileiro reconhece também os esforços de outros países, como a Argentina e o Reino Unido, que estão aumentando as metas de biocombustíveis e a União Europeia colocou em prática a nova diretiva de energia renová-vel, com metas fortalecidas para biocombustíveis mais avançados, levando em consideração a sinergia com a produção atual.

Barreiras

O relatório “Criando o Biofuturo” afirma, em consonância com modelos e cenários da Agência Internacional de Ener-gia (IEA), da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA) e do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que os biocombustíveis e bioprodutos devem desempenhar um papel integral na transição energética global, em conjunto com outros esforços complementares de mitigação em todos os setores.

O estudo identifica as principais barreiras: a falta de dinheiro para a produção em escala comercial, impedindo a pesquisa, o desenvolvimento e a implantação necessários; a baixa competitividade para biocombustíveis e outros bioprodu-tos em relação a alternativas baseadas em combustíveis fósseis; as políticas desfavoráveis que não coordenam efetivamente os interesses da economia agrícola com o sistema alimentar; e o suprimento insuficiente de fonte sustentável para uso na produção de biocombustíveis e outros bioprodutos.

O relatório mostra a escala do desafio e contribui para um consenso internacional sobre a importância da bioenergia. “Sua participação no consumo total de energia renovável no mundo é de cerca de 50%. Tanto quanto a energia hídrica, eólica, solar e todas as outras fontes renováveis combinadas”, disse Fatih Birol, Diretor Executivo da IEA.

“A bioenergia é uma ótima maneira de equilibrar a produção variável de eletricidade, principalmente eólica e solar. No entanto, seu papel nos setores de aquecimento e transporte é ainda mais importante e crucial”, comentou Kimmo Tiilikainen, Ministro do Meio Ambiente, Energia da Finlândia, um dos países participantes.

Além de delinear as quatro barreiras, o relatório fornece perfis individuais de países em todos os mercados existentes para a bioeconomia e recomenda intervenções-chave de apoio. Cerca de 131 bilhões de litros de biocombustível são produzidos anualmente, num mercado avaliado em aproximadamente US$ 170 bilhões por ano. Esse é o resultado das vendas de etanol de primeira geração e biodiesel. A produção global de

biocombustível deve subir para 222 bilhões de litros por ano, até 2025, para estar de acordo com os cenários desenvolvidos pela IEA e pela Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA).

Renovabio

De acordo com o Balanço Energético Nacional 2017, na indústria brasileira, a energia renovável representou 58% do consumo total, ante 7,6% na média mundial. Nos transportes, a participação da energia renovável foi de 20%, contra 3% no resto do mundo. A Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) prevê, até 2028, elevar para 28,6% a participação de renováveis na matriz de combustíveis. “Serão 36

bilhões de litros de etanol e 11,1 bilhões de litros de biodiesel produzidos anualmente. Esse esforço reduzirá em 10,1%, até 2028, a intensidade de carbono da matriz de combustíveis nacional, alinhada com a contribuição nacionalmente deter-minada brasileira no âmbito do Acordo de Paris”, informou Duarte. A RenovaBio estabelece como meta uma redução nas emissões da matriz de combustíveis no período 2019-2028. Dessa forma, com o impacto da nova política, as emissões em 2028 deverão cair de estimados 425 milhões de toneladas de CO2 para 345 milhões.

De acordo com o relatório, a colaboração internacional sólida e o envolvimento das partes interessadas são funda-mentais para ajudar os países a alcançar esses objetivos. A Plataforma Biofuturo tem vinte países membros: Argentina, Brasil, Canadá, China, Dinamarca, Egito, Finlândia, França, Índia, Indonésia, Itália, Marrocos, Moçambique, Holanda, Paraguai, Filipinas, Suécia, Reino Unido, Estados Unidos e Uruguai, além da Comissão Europeia. Como uma iniciativa de participação múltipla, várias organizações internacionais, universidades e associações do setor privado também estão envolvidas e engajadas como parceiras oficiais.

Ministro Edson Duarte

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COP-24 entrega regras claras,mas países devem querer jogar

Cláudio Angelo | Jornalista e especialista do Observatório do Clima

A COP-24 adotou na noite de 15/12 uma de suas prin-cipais encomendas: um manual de instruções para os países botarem em prática o Acordo de Paris. Do ponto de vista do clima, Katowice fracassou. Seu resultado deixou de capturar de forma adequada o senso de urgência comunicado claramente pela ciência sobre a ação contra o caos climático. Além disso, deixou nas mãos dos países qualquer decisão sobre o que fazer com essa informação. Regras claras, afinal, só funcionam se houver gente disposta a entrar em campo para jogar.

Com poucas exceções relevantes, os principais pontos da operacionalização do Tratado do clima foram detalhados num conjunto de regulamentações. Katowice entregou o chamado Mecanismo de Transparência, que detalha como medir de forma comum os esforços nacionais, e regras sobre como atualizar as metas de cada país em ciclos de cinco anos. Também ficou marcada para 2020 a definição sobre a nova meta de financiamento climático – num reconhecimento de que os US$ 100 bilhões anuais prometidos para o período entre 2020 e 2025, para custear as ações nos países em desen-volvimento, são bem menos do que precisam as nações mais pobres e mais vulneráveis.

Mas o tratamento dado pela COP-24 a um dos elementos mais críticos do Acordo, a ambição, foi altamente frustrante. Katowice teve seu início com a apresentação aos delegados do chocante SR15, o relatório do IPCC segundo o qual a huma-nidade tem apenas mais 12 anos para cortar emissões em 45% se quiser cumprir a meta de Paris de limitar o esquentamento da Terra a 1,5ºC neste século, e evitar consequências muito mais graves para pessoas, ecossistemas e a economia global.

O relatório fora encomendado pela própria COP em Paris, em 2015, mas nem todo mundo gostou da mensagem, especialmente os EUA e a Arábia Saudita. O texto final de Katowice, em vez de incorporar o SR15 como guia para o aumento da ambição, limita-se a “convidar” os países a fazer o que bem entenderem o recado do IPCC. O texto de Katowice também faz um aceno tímido aos resultados do chamado Diálogo Talanoa – a primeira rodada global, aberta, de conversas sobre soluções para a crise climática – ao também convidar os países a refletir sobre os subsídios de mais de 400 diálogos realizados ao redor do mundo.

Com esse resultado, caberá unicamente aos países deci-dir quando e se aumentarão sua ambição coletiva na janela estreita de oportunidade que existe entre agora e 2030 para não perder a meta de 1,5°C. Isso cria um risco para a meta. “Paris definiu um pacto para limitar o aquecimento global e para lidarmos com suas consequências. Katowice forneceu as balizas e os insumos para tirar o Acordo do papel. Mas só a vontade política pode imprimir velocidade à ação climática no grau necessário”, diz Carlos Rittl, Secretário-Executivo do Observatório do Clima.

“O problema é que vontade política para fazer mais do que o que os países definiram em 2015 vem se mostrando um recurso escasso, só encontrado entre países pequenos e muito vulneráveis, e não entre aqueles que precisam liderar o processo, aqueles que emitiram e emitem a maior parte dos Gases de Efeito Estufa”, continua.

Os negociadores brasileiros na Polônia, talvez a última delegação do país ainda comprometida com o processo mul-tilateral da Convenção do Clima em muito tempo, agiram no geral de forma construtiva. Mas causaram o adiamento do final da COP por 24 horas ao tentar garantir, por motivos que não convenceram a ninguém, regras mais frouxas para a compra e venda de créditos de carbono. Caso prevalecesse a posição brasileira, havia o risco de, em determinados casos, tanto o comprador quanto o vendedor dos créditos poderem abater aquelas emissões da própria meta. O assunto, complexo e altamente polêmico, acabou tendo sua solução adiada para o ano que vem. Enquanto isso, as regras de Katowice proibiram explicitamente essa dupla contagem.

Diferentemente da delegação na COP, o governo eleito do Brasil fez papelões em série em Katowice. Ameaças ao meio ambiente e a quem cuida do meio ambiente já preocupavam a todos, uma vez que o Brasil provou ao mundo que era pos-sível crescer economicamente e reduzir as emissões e a taxa de destruição florestal, servindo de modelo para vários outros países em desenvolvimento. Quando a COP começou, alguns dos assuntos mais comentados nos corredores da conferência eram a desistência do Brasil em sediar a COP-25, em 2019, as ameaças do futuro presidente de tirar o país do pacto global pelo clima, usando argumentos completamente inconsistentes, e o convite a dois negacionistas para compor o seu gabinete, os futuros Ministros de Meio Ambiente e das Relações Exteriores. A imagem do Brasil junto a parceiros climáticos e comerciais saiu mais suja que a fumaça das termelétricas a carvão de Katowice.

“O novo governo terá diante de si uma responsabilidade na agenda de clima. Retrocesso na agenda global ou doméstica de mudanças climáticas só contribui para piorar a situação dos brasileiros, que já pagam um preço altíssimo por um clima cada vez mais hostil. Nos últimos 4 anos, quase metade de nossas cidades sofreram secas severas, mais de 30% tiveram graves alagamentos; além disso, o agronegócio que patrocinou sua campanha e que fez os Ministros de Agricultura e Meio Ambiente, corre um sério risco de perder mercados se no rastro de suas commodities houver mais desmatamento, emissões ou desrespeito a direitos de povos indígenas”, concluiu Rittl

Na abertura da COP-24, o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, afirmou que os países que não entrarem na economia verde terão um futuro cinzento. O Presidente Jair Bolsonaro faria bem em escutar a mensagem.

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Apesar dos esforços finais nos bastidores da COP-24 da Convenção sobre Mudanças Climáticas, em busca de apoio ao “Livro de Regras” do Acordo de Paris, os representantes presentes não conseguiram elaborar um conjunto de diretrizes fortes o suficiente para acelerar a implementação do tratado. O “Livro de Regras” foi adotado ao final, mas pontos cruciais foram deixados para futuras negociações. Também foram por água abaixo as esperanças de que as provas apresentadas em Outubro pelo último relatório do IPCC gerassem iniciativas imediatas para ampliar as ações climáticas até 2020.

“O resultado final é novamente desanimador. Os com-promissos financeiros ou políticos ainda não estão à altura, e nem mesmo o recado claro e assertivo do IPCC sobre a necessidade de se manter o aquecimento global no limite de 1,5°C foi suficiente para fazer com que alguns dos maiores poluidores do planeta mudassem suas posições. Ao dificultar a chancela oficial do relatório, Estados Unidos, Rússia e Arábia Saudita evidenciam a falta de respeito de seus governos com relação à ciência e ao multilateralismo. Ao ignorar o que precisa ser feito antes que seja tarde demais, eles conferem um caráter irrelevante à Conferência”, afirmou May Boeve, Diretora-Executiva da 350.org.

Após um ano de diálogos nos níveis nacional e local, com o objetivo de incentivar a elaboração de planos nacio-nais mais robustos para o clima, análises recentes estimam um planeta 3,3°C mais quente, se os países se limitarem aos planos atuais.

“É desalentador ver como o lobby da indústria fóssil ganhou carta branca nas negociações climáticas, enquanto ativistas da sociedade civil foram impedidos de entrar na Polônia”, disse Boeve. Para ela, a esperança agora reside em todos aqueles que se mobilizaram: “os jovens que fizeram uma paralisação escolar sem precedentes em apoio a um futuro livre de combustíveis fósseis; as mais de mil instituições que se comprometeram a retirar seus investimentos, algo em torno de US$ 8 trilhões, de projetos com carvão, petróleo e gás; e as diversas comunidades do mundo todo que ainda resistem a essa indústria, exigindo uma transição justa e imediata rumo a fontes de energia 100% renováveis, socialmente justas, ambientalmente sustentáveis e acessíveis para todos.”

“Uma coisa é certa: nós continuaremos ampliando nossos esforços para fazer com que nossas sociedades abandonem o vício tóxico dos combustíveis fósseis e contribuindo para o desenvolvimento de soluções que nos permitam evitar mudan-ças climáticas catastróficas e desenfreadas. Temos poucos anos para fazer isso acontecer. Não vamos parar até que o planeta esteja livre da dependência dos fósseis e tenhamos um mundo mais igualitário e seguro para viver”, completou.

Parcela Brasil de responsabilidade

O Brasil chegou à COP-24 com um recado extremamente negativo: além da ameaça de deixar o Acordo de Paris, também negou-se a ser anfitrião da COP-25, compromisso assumido pelo governo anterior. Apesar de, por ora, a saída do Acordo não ter acontecido, na prática, as indicações políticas do governo eleito já demonstram o que muitos especialistas temiam.

Ao indicar para o futuro Ministério do Meio Ambiente um advogado alinhado com o setor do agronegócio e inclinado a flexibilizar a legislação ambiental de modo a “fortalecer o setor”, o governo que toma posse em Janeiro já deu mostras de que o compromisso com a redução das emissões tanto pelo combate ao desmatamento quanto pela adoção de práticas agrícolas de baixo carbono não está nos planos. Em 2018 a taxa de desmatamento na Amazônia voltou a subir, atingindo seu maior patamar numa década, e a tendência é de nova alta em 2019.

“São extremamente preocupantes os sinais de que o Brasil, berço da Convenção sobre o Clima, poderia abandonar o Acordo de País, além da perda já ocorrida de credibilidade e liderança do país no cenário global. O novo governo está fazendo exatamente o oposto do que precisamos, que é uma indicação de políticas de desenvolvimento sustentável, que priorizem empregos verdes, proteção e recuperação de áreas florestais e a expansão de energias renováveis como solar e eólica”, cobrou Rubens Born, Diretor Interino da 350.org Brasil e América Latina.

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A biodiversidade e os serviços ecossistêmicos, como o for-necimento de água, ar puro e de alimentos, são fundamentais para a construção de um futuro próspero e sustentável para a população brasileira, com maior geração de emprego, renda e redução das desigualdades sociais e econômicas.

Essas metas apenas serão possíveis de serem alcançadas, entretanto, se a contribuição da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos para alavancar o desenvolvimento econômico e social do Brasil for reconhecida e incentivada e se forem feitos investimentos indispensáveis objetivando sua conser-vação e restauração.

As conclusões são de um grupo de pesquisadores autores do “Sumário para Tomadores de Decisão do 1º Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade & Serviços Ecossistêmicos”. O documento, elaborado pela Plataforma Brasileira de Biodi-versidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES, na sigla em inglês), apoiada pelo Programa BIOTA-FAPESP, foi lançado no dia 8 de Novembro passado em um evento no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.

“Avaliamos que o Brasil só tem a ganhar do ponto de vista econômico se sair do atual sistema de substituição de vegeta-ção nativa por áreas agrícolas. É muito mais vantajoso para o país ter paisagens multifuncionais, com áreas agrícolas e de conservação, que permitem que os ecossistemas funcionem de forma muito melhor, mantendo serviços ecossistêmicos essenciais, como o de recarga de aquíferos e de retirada de carbono da atmosfera”, disse Carlos Joly, professor da Uni-versidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da coordenação da BPBES e do Programa BIOTA-FAPESP, à Agência FAPESP.

Biodiversidade é estratégica para o desenvolvimento do Brasil

Elton Alisson | Jornalista da Agência FAPESP

Os pesquisadores avaliam que no Brasil a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos são percebidos como obstáculos para o desenvolvimento econômico. Na realidade eles são os elementos fundamentais para o enfrentamento de crises socioeconômicas e ambientais, nacionais e globais, pois trazem novas oportunidades de desenvolvimento. Por isso, precisam estar incorporados às políticas de desenvolvimento do país.

A biodiversidade conservada gera oportunidades de negó-cios para indústrias como a de turismo, cosméticos, fármacos e a alimentícia. Já a concentração de pobreza em municípios com grande cobertura vegetal nativa remanescente pode se tornar uma boa oportunidade de conciliar conservação da natureza com desenvolvimento humano, indicam.

Cerca de 40% da cobertura vegetal do Brasil está contida em 400 municípios, que representam 7% do total do país e onde vivem 13% da população economicamente mais carente. Em outros municípios similares a remoção da cobertura vegetal e a transformação dessas áreas em plantações agrícolas ou pastagens não se traduzem na melhora das condições de vida da população dessas regiões. Estudos mostraram que, histori-camente, a substituição da floresta por atividades agropastoris no Brasil nas últimas décadas não resultou em um aumento significativo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos moradores previamente instalados nessas regiões.

“Isso ocorre porque essas pessoas não são beneficiadas pela implantação da atividade agropecuária nessas áreas onde havia cobertura vegetal. Elas acabam engrossando o êxodo rural, ao serem empurradas para a periferia das grandes cidades, onde vão viver em condições muito piores do que as que tinham no campo”, disse Joly.

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Por meio da ampliação significativa de políticas de geração de renda a partir da natureza conservada – como a Política de Garantia de Preços Mínimos para os Produtos da Sociobiodiversidade, aplicada a produtos florestais não madeireiros extraídos, em sua maioria, por populações tradicionais e agricultores familiares – seria possível manter essas pessoas assentadas nessas regiões de floresta e melhorar suas condições de vida, estimam os pesquisadores. “É preciso possibilitar a exploração de forma sustentável de produtos florestais pelas comunidades locais de modo que a floresta possibilite melhorar suas condições de vida, e não substituir a floresta por um sistema de produção que não irá beneficiar a população local”, disse Joly.

Na opinião dos pesquisadores, o aproveitamento das opor-tunidades de uso sustentável da biodiversidade brasileira para promover o desenvolvimento econômico e social do país tem janela de tempo limitada e enfrenta obstáculos críticos. Alguns deles são assegurar o cumprimento de leis existentes por meio de mecanismos regulatórios e de incentivo em consonância com os compromissos globais de sustentabilidade assumidos pelo país. Entre os acordos internacionais assumidos pelo Brasil estão os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), as Metas de Aichi – voltadas à redução da perda da biodiversidade do planeta no período de 2011-2020 – e o Acordo Climático de Paris, aprovado em 2015.

“O cumprimento das metas apresentadas pelo Brasil no Acordo de Paris, por exemplo, permitiria ao Brasil diminuir ou zerar o desmatamento, que é de suma importância para o país. A floresta vale muito mais em pé no médio e longo prazo do que ser transformada em um campo de soja, que será produtivo por algum tempo e só beneficiará o proprietário ou um grupo de pessoas, sem dar retorno para a sociedade, como um todo, ou para a população que vivia ali”, disse Joly.

Internamente, o Brasil dispõe de uma ampla variedade de instrumentos de política e opções de governança socio-ambiental. A ineficiência no controle, na gestão ou o baixo incentivo ao cumprimento das regras implicam riscos à consolidação de um futuro sustentável do país, apontam os pesquisadores.

Apesar da redução nas taxas anuais de perda de hábitats por desmatamento em biomas brasileiros na última década, especialmente na Amazônia, a conversão dos ecossistemas naturais continua elevada, em especial no Cerrado (236 mil km² entre 2000 e 2015) e na Caatinga (conversão de 45% da cobertura original). Mesmo na Mata Atlântica, a área desmatada – cerca de 29 mil hectares de 2015 a 2016 – supera substancialmente a área restaurada no bioma no mesmo intervalo de tempo. Nos últimos anos a perda florestal no país excedeu em pelo menos três vezes todas as promessas de restauração feitas no período, compararam os autores do sumário. Nos biomas mais degradados, o cumprimento da Lei de Proteção à Vegetação Nativa (o Novo Código Florestal) deve propiciar a recomposição da vegetação nativa – pela implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e do Programa de Regularização Ambiental (PRA) – com benefícios para a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos, incluindo produção e conservação de água e sequestro de carbono.

A estimativa é a de que o cumprimento da Lei gere cerca de 20 milhões de hectares de área restaurada, possibilitando outros ganhos aos proprietários de terra, como maior pro-dutividade e geração de novos negócios e empregos verdes, estimam os pesquisadores.

“Há uma série de gargalos que fizeram com que a implan-tação do novo Código Florestal não avançasse da maneira como gostaríamos e foram perdidos aspectos importantes durante sua discussão, como a largura das áreas de proteção permanente”, disse Joly. “Mas se conseguirmos implementar o que foi aprovado, de fato, o país ainda terá condições de atingir o que estamos propondo nesse diagnóstico e cumprir seus compromissos internacionais”, disse.

O “Sumário para Tomadores de Decisão do 1º Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade & Serviços Ecossistêmicos” foi lançado pouco antes da realização da 14ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP 14), que ocorreu no Egito de 17 a 29 de Novembro. Como o Brasil não ratificou o Protocolo de Nagoya – que entrou em vigor há 4 anos e tem o objetivo de promover a repartição justa e equitativa de benefícios advindos da utilização de recursos genéticos, contribuindo para a conservação e uso sustentável da biodiversidade –, o país não pode opinar nas decisões tomadas a esse respeito na COP-14. “A não adesão do Brasil ao Protocolo de Nagoya é irracional porque, quando o país resolver eventualmente ratificá-lo, questões importantes para o Brasil, como a repartição de benefícios de áreas transfron-teiriças, já terão sido decididas de forma que podem não ser as mais interessantes para nós”, avaliou Joly.

“O Brasil é o país com a maior biodiversidade mun-dial e o que tem mais a ganhar em relação à repartição de benefícios. Não ratificar o Protocolo de Nagoya por achar que pode perder alguma coisa em áreas transfronteiriças ou na questão de recursos genéticos que são economicamente importantes, e cuja maioria está fora do Protocolo, é de uma miopia extrema”, avaliou.

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Reunidos em Buenos Aires, os líderes do G20, grupo que engloba as maiores economias mundiais, aprovaram a Decla-ração Final na qual destacam a irreversibilidade do Acordo de Paris, firmado por várias nações com o compromisso de adoção de medidas para atenuar os impactos do aquecimento global. Os termos desse Acordo enfrentam resistência de líderes de países como EUA, China e Índia. A Declaração Final traz ainda um apelo pela ajuda internacional aos países em situação de endividamento, ao cumprimento das regras fixadas inter-nacionalmente nas negociações comerciais e detalham como prioridades o combate à fome e a implementação de medidas de igualdade de gênero. O texto sugere ainda mudanças no sistema da Organização Mundial do Comércio (OMC).

O documento tem oito páginas e menciona os temas de forma ampla, evitando questões polêmicas na busca pelo consenso. Os pilares são o futuro do trabalho, a infraestrutura para o desenvolvimento, o futuro sustentável dos alimentos e uma estratégia de integração de gênero na agenda do G20. Uma parte dos 25 pontos elencados no texto relaciona ques-tões referentes à segurança financeira global. Nos parágrafos finais, os líderes destacam o apoio a um Fundo Monetário Internacional (FMI) “forte, baseado em cotas e com recursos adequados”. Para eles, é importante concluir a 15ª Revisão Geral de Cotas, incluindo mais uma. As cotas são um com-ponente central dos recursos financeiros do FMI. A cada país-membro é atribuída uma cota, de acordo com sua posição na economia mundial. Quanto mais forte o país, maior sua cota e seu poder de influência no fundo.

G20 destaca irreversibilidade do Acordo de Paris

Nádia Franco | Jornalista da Agência Brasil

“Apelamos ao FMI e do Banco Mundial para trabalhar com os mutuários e credores para melhorar o registro, monito-rização e relatórios transparentes das dívidas pública e privada. Aguardamos com expectativa a revisão da condicionalidade do programa pelo FMI e a revisão de sua política de limites de dívida.” Na Declaração, os líderes comprometem-se a tomar medidas para lidar com as vulnerabilidades da dívida em países de baixa renda, apoiando o fortalecimento da capaci-dade da dívida pública e da gestão financeira e fortalecendo as estruturas de políticas domésticas.

“Trabalharemos no sentido de aumentar a transparência e a sustentabilidade da dívida e melhorar as práticas de finan-ciamento sustentável por mutuários e credores, tanto oficiais como privados, incluindo o financiamento de infraestrutura”. Porém, o alerta é para as questões comerciais e as negociações entre os líderes dos países presentes na cúpula. O texto indica a preocupação com a instabilidade e a ausência de autonomia dos bancos centrais. Indiretamente, o documento defende a atuação da OMC, do respeito às regras e normas internacionais. “Reafirmamos nossa promessa de usar todas as ferramentas de políticas para alcançar um crescimento forte, sustentável, equilibrado e inclusivo e salvaguardar os riscos negativos, intensificando nosso diálogo e nossas ações para aumentar a confiança”. O texto apoia o multilateralismo e a globalização, respeitando os limites de cada nação, pois de acordo com o texto, as respostas políticas e de cooperação internacional “ajudarão a garantir que os benefícios da transformação tec-nológica sejam amplamente compartilhados” por todos.

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O documento final defende ainda a inclusão no mercado de forma justa e sustentável, promovendo o “trabalho digno, a formação profissional e o desenvolvimento de competências, incluindo a requalificação profissional e a melhoria das condi-ções laborais em todas as formas de emprego”. Segundo o texto, os líderes se comprometem a melhorar a situação dos jovens, adotando as metas do Objetivo Jovem G20 Antalya, buscando erradicar o trabalho infantil, o trabalho forçado, o tráfico de pessoas e a escravidão moderna. O apelo para investimentos em educação principalmente para as meninas.

“O acesso à educação é um direito humano e uma área de política pública estratégica para o desenvolvimento de sociedades mais inclusivas, prósperas e pacíficas. Sublinhamos a importância da educação das meninas”.

A Declaração inclui ainda a preocupação com a segu-rança digital, de tal maneira que o fluxo de informações e a privacidade não sejam atingidos. “Apoiamos o livre fluxo de informações, ideias e conhecimento, respeitando as estruturas legais aplicáveis e trabalhando para construir a confiança do consumidor, a privacidade, a proteção de dados e a proteção dos direitos de propriedade intelectual”.

Para os líderes presentes, os desafios comuns se concentram no enfrentamento à segurança alimentar. Daí a determinação de incentivar mais áreas rurais, manejo sustentável dos solos, das águas e dos rios com o apoio dos pequenos agricultores. “É crucial para alcançar um mundo livre da fome e de todas as formas de desnutrição”. Porém, o texto é claro ao considerar fundamental a colaboração dos entes públicos e privados. As autoridades comprometeram-se a aumentar os esforços para envolver o setor privado e a comunidade científica.

A Declaração informa que será lançado, no âmbito do G20, um documento definindo ações para o desenvolvimento da primeira infância com as meninas. O texto também menciona os esforços para buscar a igualdade de gênero como elemento fundamental para o crescimento econômico e desenvolvimento justo e sustentável. Também cita que a diferença de gênero nas taxas de participação da força de trabalho deve ficar em 25% até 2025.

“Continuaremos a promover iniciativas destinadas a pôr fim a todas as formas de discriminação contra mulheres e meninas e à violência baseada em gênero. Comprometemo-nos à promoção do empoderamento econômico das mulheres.” A Declaração destaca a necessidade de apoiar a Organização Mundial da Saúde no desenvolvimento de medidas para atingir as metas fixadas para 2030, como sistemas de saúde mais fortes com segurança, qualidade e eficácia dos serviços. As metas incluem melhoria do saneamento, o fim da contaminação por HIV/AIDS e de doenças, como tuberculose e malária.

O documento menciona a preocupação comum com os “grandes movimentos de refugiados” e a necessidade de implementar “ações compartilhadas” para abordar as causas profundas do deslocamento e responder às crescentes neces-sidades humanitárias. O texto, porém, não detalha medidas, nem alerta sobre abusos.

A Declaração vem à tona no momento em que os EUA enri-jecem as leis anti-imigratórias e a Europa se fecha ao ingresso de imigrantes que tentam escapar da fome e da perseguição política e étnica. No Brasil e na América do Sul, as atenções estão voltadas para os venezuelanos e centro-americanos que buscam refúgio nos países vizinhos.

Às vésperas da Conferência do Clima (COP-24), na Polônia, os líderes advertiram sobre os impactos do aque-cimento global de 1,5 graus centígrados e a necessidade de apoio ao Acordo de Paris. “Os signatários do Acordo de Paris, que aderiram ao Plano de Ação de Hamburgo, reafirmam que o Acordo de Paris é irreversível e comprometem-se a implementá-lo integralmente, refletindo responsabilidades comuns, mas diferenciadas, e respectivas capacidades, à luz de diferentes circunstâncias nacionais. Continuaremos a enfren-tar as mudanças climáticas, promovendo o desenvolvimento sustentável e o crescimento econômico.”

O documento destaca também o “papel crucial da energia” para ajudar a moldar o futuro compartilhado. No entanto, a Declaração apela para que a busca por novas alternativas de energia seja baseadas em “segurança, sustentabilidade, resiliência, eficiência, acessibilidade e estabilidade”.

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Buenos Aires com o Congresso Nacional ao fundo

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Page 18: Ano XXVIII • Nº 265 • Dezembro 2018 • R$ 15,00 • ... 21_265_ FINAL.pdfserá realizada em Katowice, na Polônia, ainda em Dezembro deste ano. Nesta Conferência das Partes,

Níveis de gases causadores do Efeito Estufa (GEE) que aprisionam calor na atmosfera chegaram a um novo recorde, de acordo com um relatório publicado no último dia 22/11 pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), que revela não haver sinais de retrocesso desta tendência, responsável pelas mudanças climáticas, aumento do nível do mar, acidificação dos oceanos e condições meteorológicas extremas. “A ciência é clara. Sem cortes rápidos em dióxido de carbono (CO2) e outros gases causadores do efeito estufa, mudanças climáticas terão impactos cada vez mais destrutivos e irreversíveis na vida na Terra. A janela de oportunidade para ação está quase fechada”, disse o Secretário-geral da OMM, Petteri Taalas.

O relatório “Greenhouse Gas Bulletin”, da OMM, indica que concentrações globais de CO2, metano e óxido nitroso têm aumentado continuamente durante os últimos anos. Além disso, o relatório destaca um ressurgimento de um potente gás causador do efeito estufa e da substância depredadora do ozônio chamada CFC-11, que é regulada sob um acordo internacional para proteger a Camada de Ozônio.

Níveis de GEE na atmosfera atingem novo recorde

Tara Ayuk | Jornalista

O relatório informa especificamente sobre concentrações atmosféricas de gases causadores do efeito estufa, que são os que permanecem na atmosfera após um complexo processo de emissões e absorções.

Desde 1990, houve um aumento de 41 por cento no efeito de aquecimento pelos diversos gases causadores do Efeito Estufa sobre o clima – conhecido como “forçamento radioativo”. O dióxido de carbono representa cerca de 80 por cento do aumento no forçamento radioativo durante a última década, de acordo com dados do relatório da Organização Meteorológica Mundial.

“A última vez que a Terra teve uma concentração compa-rável de CO2 foi de três a cinco milhões de anos atrás, quando a temperatura era 2 a 3°C mais quente e o nível o mar era 10 a 20 metros mais alto que agora”, disse Taalas.

O relatório da OMM foi divulgado após evidências apre-sentadas em relatório especial do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) sobre aquecimento global, emitido em outubro e que soava o alarme sobre a necessidade de alcançar zero emissão de CO2 até metade do século para manter aumentos de temperatura abaixo de 1,5°C.

O relatório mostrou como manter aumentos de tempera-tura abaixo de 2°C pode reduzir os riscos para o bem-estar do planeta e dos povos.

“O dióxido de carbono permanece na atmosfera por centenas de anos e nos oceanos por até mais tempo. Não há atualmente uma varinha mágica para remover todos os excessos de CO2 da atmosfera”, alertou a vice-secretária-geral da Organização Meteorológica Mundial, Elena Manaenkova. “Cada fração de um grau de aquecimento global importa, assim como cada parte de milhão de gases causadores do Efeito Estufa”.

Este novo relatório acrescenta mais informações às evidências científicas para informar os tomadores de deci-são na próxima 24ª Conferência das Partes (COP-24) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) – que acontece entre os dias 2 e 14 deste mês, em Katowice, na Polônia. O objetivo principal do encontro é adotar um plano de implementação para o Acordo de Paris de 2015.

As médias globais apresentadas no boletim da OMM são baseadas em um monitoramento rigoroso dos níveis de alteração de gases causadores do Efeito Estufa como resul-tado da industrialização, do uso de combustíveis fósseis, de práticas agrícolas insustentáveis e do aumento em uso de terras e desmatamento.

A Organização das Nações Unidas pede ações urgentes para reduzir emissões de gases causadores do Efeito Estufa em níveis nacional e subnacional.

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Page 19: Ano XXVIII • Nº 265 • Dezembro 2018 • R$ 15,00 • ... 21_265_ FINAL.pdfserá realizada em Katowice, na Polônia, ainda em Dezembro deste ano. Nesta Conferência das Partes,

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou apoio financeiro de R$ 45 milhões do Fundo Amazônia para a realização de uma chamada pública de projetos e de ações complementares que promo-vam o fortalecimento e a consolidação da gestão de 83 áreas protegidas da Amazônia Legal, bem como que desenvolvam alternativas sustentáveis de produção para as populações desses territórios.

Os recursos do BNDES serão destinados à gestão da ini-ciativa e à chamada pública, seu eixo central, que selecionará até 12 projetos em uma área com cerca de 80 milhões de hectares e que compreende 41 Terras Indígenas e 42 Unida-des de Conservação. Essa área será dividida em seis blocos regionais (Xingu, Calha Norte, Alto Rio Negro, Baixo Rio Negro, Madeira e Rondônia/Purus), e até dois projetos de cada um desses blocos receberá entre R$ 1,5 milhão e R$ 6 milhões para implementar ações que ajudem a consolidar suas áreas protegidas.

LIRA – Denominada LIRA – Legado Integrado da Região Amazônica, a iniciativa foi idealizada pelo IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, organização brasileira com mais de 26 anos de atuação pela conservação da biodiversidade no país por meio de ciência, educação e negócios sustentáveis com comunidades. O projeto contará também com apoio de R$ 16,35 milhões da Fundação Gordon e Betty Moore, totalizando R$ 61,35 milhões.

Os projetos apoiados deverão contemplar as seguintes linhas de ação: (i) planos de gestão territorial e ambiental (PGTA) ou de manejo; (ii) mecanismos de governança; (iii) uso sustentado dos recursos naturais; (iv) sistemas de moni-toramento e proteção; (v) integração com desenvolvimento regional; e (vi) sustentabilidade financeira.

A chamada pública prevê que as instituições proponentes (associações civis, fundações de direito privado, cooperativas, entre outras) coordenem subprojetos com outras entidades que de forma integrada contribuam para o objetivo da ini-ciativa.

Ações complementares – O projeto LIRA também prevê apoio de até R$ 6 milhões (até R$ 150 mil para cada ação) para ações complementares aos projetos selecionados na chamada pública que promovam a participação social na gestão do território. Com isso, espera-se ampliar a geração de emprego, melhorar a qualidade de vida da população local e o promover o desenvolvimento territorial aliado à conservação do meio ambiente.

A iniciativa contará ainda com ações de capacitação (cursos, visitas técnicas e intercâmbios), de integração e de difusão de conhecimento e a elaboração de um “Plano de Promoção Socioambiental” (PPS) para cada um dos seis blocos.

Erik Von Farfan | Jornalista (Com informações da Agência BNDES de Notícias)

Fundo Amazônia: R$ 45 mi para gestão de TIs e UCs

Esses planos irão identificar as principais oportunidades e gargalos para inserção econômica das populações locais na economia regional. Por fim, serão apoiadas adaptações de soluções tecnológicas existentes para uso em ações de moni-toramento de biodiversidade e de proteção territorial.

Fundo Amazônia

Gerido pelo BNDES, em coordenação com o MMA, o Fundo Amazônia é considerado o principal mecanismo inter-nacional de pagamentos por resultados de REDD+ (redução de emissões de Gases de Efeito Estufa provenientes do des-matamento e da degradação florestal). Em Junho deste ano, o Fundo completou 10 anos. Em Outubro, atingiu a marca de R$ 1 bilhão em desembolsos para mais de 100 projetos com órgãos públicos estaduais e federais, universidades, corpos de bombeiros florestais militares e instituições da sociedade civil, contribuindo assim para a melhoria de vida da população da Amazônia e para conservação de seus recursos naturais.

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Nascido em Lima, o climatologista José Antonio Marengo graduou-se no curso de física e meteorologia no Peru e permaneceu por oito anos nos Estados Unidos, onde fez doutorado e dois estágios de pós-doutorado, antes de se fixar, há mais de duas décadas, na parte paulista do Vale do Paraíba. Trabalhou por 15 anos no Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (Cptec) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em Cachoeira Paulista, onde chegou a ser o coordenador científico da previsão climática. Em 2011, tornou-se coordenador-geral do Centro de Ciên-cia do Sistema Terrestre (CCST), também ligado ao Inpe. Especialista em modelagem climática e mudanças climáti-cas, Marengo contribui com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) desde meados dos anos 1990, quando a entidade divulgou o segundo dos seus cinco famosos relatórios.

A grande familiaridade com esses temas levou-o a ser escolhido em 2014 para chefiar o setor de pesquisa e desen-volvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN), órgão do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), sediado em São José dos Campos. Entre outras atividades, o CEMADEN vigia 24 horas por dia áreas de risco de 957 municípios brasileiros classificados como vulneráveis a desastres naturais. Em paralelo à atuação no centro, Marengo dá aulas de meteorologia e de ciência do sistema terrestre na pós-graduação do INPE, participa de grupos de pesquisa nacionais e inter-nacionais e produz trabalhos e relatórios científicos. Nesta entrevista, o climatologista de fala bem-humorada, pontuada pelo sotaque e por palavras em espanhol, diz como, a seu ver, populações e governos percebem as mudanças climáticas e suas possíveis consequências.

Por que você veio trabalhar no Brasil?

Sou formado pela Universidade Nacional Agrária, de Lima, que tem um programa de bacharelado de cinco anos em meteorologia e física. Escolhi essa área porque meu pai era técnico de meteorologia e trabalhava para o Ministério da Agricultura. No Peru, depois dos cinco anos de bachare-lado, é preciso escrever uma tese para se tornar engenheiro meteorológico. Fiz a tese sobre a Amazônia. Foi assim que começou meu interesse pela região. A escolha do tema da tese ocorre no último ano da graduação.

Marcos Pivetta | Editor de Ciência da Pesquisa FAPESP

A natureza está dando sinais aqui e no mundo todo

Naquela época, início dos anos 1980, chegou às minhas mãos um trabalho do Eneas Salati, então professor do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP, em Piracicaba, sobre reciclagem na Amazônia, publicado no final da década de 1970. Isso me chamou a atenção, pois o Peru também é um país amazônico. Fiz mestrado em recursos hídricos na mesma universidade, onde fui professor por quase 7 anos.

Depois você foi para os Estado Unidos fazer doutorado.

Consegui uma bolsa na National Science Foundation, dos Estados Unidos, e fui para a Universidade de Wisconsin-Madison. Fiquei quatro anos lá e escrevi uma tese sobre Ama-zônia e modelagem climática. Depois, fiz um pós-doutorado de dois anos na Universidade Columbia e no Instituto Goddard da NASA em Nova York, no qual trabalhei ainda mais com modelagem climática. Em seguida, fiz outro pós-doutorado de dois anos na Universidade Estadual da Flórida sobre clima tropical. Meu foco nesse período foi o clima do Sahel, a parte semiárida da África entre o deserto do Saara, ao norte, e a savana, ao sul. Depois de oito anos nos Estados Unidos, queria voltar para a América do Sul. Mas, naquela época, meados dos anos 1990, o Peru estava no meio da crise do terrorismo. A Argentina não era uma boa opção para mim, pois não desenvolvia a minha área de pesquisa em modelagem de clima.

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Entrevista com José Antonio MarengoClimatologista especialista em mudanças climáticas

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O Carlos Nobre [climatologista do INPE] me convidou para vir ao Brasil como bolsista do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico]. Era solteiro, vim e acabei ficando. Casei e tenho um filho brasileiro. Daqui não saio mais.

Você tinha uma conexão específica com o Brasil?

Eu não, quem tinha era o Carlos. Em Wisconsin estudei de 1987 a 1991. Em 1988, meu orientador convidou o Carlos para fazer uma palestra lá. Conhecia os artigos dele e ele os meus. Ele me perguntou para onde iria quando terminasse o doutorado e me incentivou a vir para o Brasil. Mas eu não sabia exatamente o que iria fazer. Pensava em ficar nos Estados Unidos, mas sabia que seria complicado arrumar uma posi-ção estável em uma universidade de lá. Mais tarde, quando terminei o pós-doutorado, falei com o Carlos novamente e perguntei se ele lembrava da nossa conversa. Ele me convidou a vir para o Brasil. Vim trabalhar no CPTEC, onde fiquei muitos anos.

O que fazia no CPTEC?

Começamos a desenvolver a parte de estudos climáticos, a pesquisar mais o El Niño [aquecimento das águas do oceano Pacífico que provoca alterações climáticas] e trabalhar com modelagem para previsão sazonal de clima. Com o tempo, o governo federal se empolgou com esses temas e percebeu a necessidade de se falar mais dos impactos das mudanças globais. Além disso, o IPCC recebeu em 2007 o Prêmio Nobel da Paz e isso gerou muito interesse pelo tema de mudanças de clima e os seus impactos no Brasil.

Fiz parte da equipe de autores do Brasil que elaborou o relatório do IPCC de 2007. Então o INPE criou o Centro de Ciências do Sistema Terrestre em 2008. Chefiei o centro de 2011 a 2014 e começamos a trabalhar, entre outros temas, com a questão da vulnerabilidade da população a eventos extremos e das possibilidades de adaptação a essas mudan-ças. Gosto muito dessa temática. Nessa época, começaram a surgir vários estudos sobre os desastres naturais. Em seguida, depois da tragédia na serra fluminense em janeiro de 2011 [chuvas seguidas de deslizamentos de terra que mataram mais de 900 pessoas], o governo federal criou às pressas o Cemaden. Tínhamos supercomputadores no país e algo deveria ser feito para tentar evitar desastres desse tipo. Como havia trabalhado muito com eventos climáticos extremos, poderia ajudar no monitoramento e gerenciamento de riscos de desastres naturais.

É correto dizer que os desastres naturais estão sempre asso-ciados a eventos climáticos extremos?

Um extremo meteorológico, como uma chuva intensa, não é um desastre. Nesse caso, o desastre são os impactos causados pela chuva sobre uma população vulnerável a esse fenômeno extremo. Não há população no meio da Amazônia. Pode cair uma chuva forte nesse lugar que não vai produzir nenhum desastre, pois ali não há pessoas vivendo, ou há pouquíssimas. No Brasil, os desastres de grande impacto, como enchentes, enxurradas e deslizamentos de terra ou secas, ocorrem nas regiões Sudeste, Sul e Nordeste, onde está a maior concentração de pessoas.

Precisamos desenvolver mais estudos sobre o risco de desastres em possíveis cenários futuros do clima. Será que a vulnerabilidade a esse tipo de evento daqui a algumas décadas será a mesma ou a situação vai piorar ou melhorar? Temos de trabalhar com cenários de adaptação às mudanças do clima e de diminuição de risco. Essa é nossa agenda com o Minis-tério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e o Ministério do Meio Ambiente.

A sociedade brasileira está convencida da ocorrência das mudanças climáticas e de seus riscos?

A natureza está dando sinais aqui e no mundo todo. Os extremos climáticos estão cada vez piores. Basta lembrar da grande seca do Nordeste que começou há seis ou sete anos, das secas e enchentes na Amazônia. As pessoas percebem que o clima está mudando, fazem até piada sobre isso.

Tentamos sempre explicar que as mudanças climáticas são um processo natural, mas que está sendo acelerado pela ação humana. Não é o homem que muda o clima. Mas, com o aumento dos Gases de Efeito Estufa e do desmatamento, o papel do homem nesse processo está cada vez maior. Isso as pessoas ainda não entendem direito. Talvez elas não entendam a base teórica por trás das mudanças, a atribuição de causas dessas mudanças que nós, cientistas, adotamos.

A mensagem principal, a de que o clima está mudando, é entendida agora. Não é necessário esperar até 2050 para isso ficar claro. Os invernos e os verões estão mais intensos. Os idosos podem morrer em consequência de ondas de calor. Isso já ocorre na Europa onde a população está mais adaptada ao frio.

Quais são as grandes vulnerabilidades do Brasil?

Apenas recentemente esses aspectos começaram a ser avaliados. Durante algum tempo, o Brasil lutou pela ban-deira da mitigação das mudanças climáticas, da redução de emissões de gases de efeito estufa, acreditando que essas medidas gerariam mecanismos de créditos de carbono que trariam mais dinheiro para a pesquisa. Isso não ocorreu. As vulnerabilidades no Brasil dependem de cada região. O Nordeste tem secas recorrentes e a população ainda não está adaptada a essa situação.

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Já Israel tem o mesmo clima do Nordeste, mas está adaptado a passar por períodos sem chuva e tem tecnologia avançada de irrigação que lhe permite se adaptar a situações de estiagem. A vulnerabilidade tem base física, mas também social: a população pode ou não estar adaptada e morar em áreas expostas e altamente vulneráveis a deslizamentos de terra ou a enchentes urbanas ou rurais. Ou seja, pode ou não ser vulnerável a desastres naturais.

Na Região Metropolitana de São Paulo, por exemplo, uma potência econômica com seus 20 milhões de habitantes, houve falta de água entre 2014 e 2016 e começou um racio-namento. Nesse caso, os modelos climáticos indicaram que essa seca em São Paulo foi um fenômeno natural, mas que pode se repetir no futuro.

Não dá para atribuir a crise hídrica de São Paulo, ainda que parcialmente, a ações humanas?

Estudos de atribuição de causas em eventos extremos estão começando a aparecer agora. Eles são muito complicados em termos estatísticos e de modelagem. No Sudeste, tivemos 47 dias sem chuva entre janeiro e fevereiro de 2014. Normalmente essa sequência de dias secos dura entre 11 e 15 dias. Esse é um fenômeno meteorológico que chamamos de bloqueio atmosférico. Ocorre a formação de uma bolha de ar quente e a umidade que vem da Amazônia não consegue entrar na região. Ela se vira e volta para o Acre ou Rondônia.

Em janeiro de 2014, houve recorde de chuva lá e recorde de seca em São Paulo. Além disso, nessa ocasião, as frentes frias vindas do Sul, que trazem chuvas, também não conseguiram chegar ao Sudeste e ficaram por lá mesmo.

Há estudos que tentam enxergar se esse fenômeno mete-orológico foi consequência de atividade humana ou não. Até agora não há nada conclusivo. Mas se pode afirmar que a crise hídrica na Região Metropolitana de São Paulo, parti-cularmente em 2014, foi devido à estiagem, agravada por um aumento populacional e do consumo de água em um verão excessivamente mais quente.

A modelagem climática consegue separar o que é natural e o que é influenciado pelo homem?

Com um modelo é possível fazer qualquer coisa. Alguns incluem apenas a variabilidade natural do clima e outros abrangem também a variabilidade antrópica ou uma com-binação das duas. Se rodamos um modelo apenas com a variabilidade natural e percebemos que ele não explica o que está sendo observado na natureza, partimos então para a outra abordagem.

Usamos um modelo no qual colocamos os efeitos que atri-buímos ao aumento dos gases de efeito estufa e comparamos para ver se o resultado é similar ao efetivamente observado. Se esse modelo consegue explicar a situação, passamos a adotar a visão de que a ação do homem tem algum efeito sobre o evento climático analisado.

Claro que fazemos um tratamento estatístico para ver se essa influência humana é significativa. No caso específico da seca do Sudeste, ainda não vi um paper que diga se ela foi natural ou antrópica. Nada mostra que os 47 dias sem chuva gerados pelo bloqueio atmosférico tenha tido uma causa antrópica. Talvez a crise hídrica em si teve causas antrópicas, mas não a falta de chuvas.

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Page 23: Ano XXVIII • Nº 265 • Dezembro 2018 • R$ 15,00 • ... 21_265_ FINAL.pdfserá realizada em Katowice, na Polônia, ainda em Dezembro deste ano. Nesta Conferência das Partes,

Em que sentido?

A temperatura média do verão de 2014 foi quase 2 graus acima do normal. Os reservatórios se esvaziaram rapidamente e a população de São Paulo não para de aumentar. Num quadro assim, mesmo que tivesse chovido um pouco não teria sido suficiente para acabar com a crise hídrica.

Alguns centros de pesquisa dos EUA e do Reino Unido dizem que as intensas ondas de calor e os verões extremos na Europa, que se repetem nos últimos anos, teriam uma causa humana clara, ligada ao aquecimento global. É muito difícil atribuir um evento particular a uma tendência de longo prazo. Em todo mundo, aparecem estudos de atribuição de causas, uma linha nova de pesquisa. Eles são importantes porque podem convencer os tomadores de decisão de que o que está ocorrendo tem uma contribuição significativa das atividades humanas. Como disse, o processo é natural, mas as atividades humanas o agravam.

Qual o grau de confiabilidade dos modelos climáticos? Até que ponto é possível extrapolar o clima futuro?

Usamos os modelos desenvolvidos pelos centros climá-ticos de todo o mundo, inclusive do Brasil, que contribuem para os relatórios do IPCC. O modelo é uma representação matemática da realidade. Todo o processo é representado por sistemas de equações que são resolvidas com ajuda de um supercomputador. Mas os diferentes centros de modelagem – da Europa, Ásia, América Latina, Austrália, África do Sul e dos Estados Unidos – têm cada um seu próprio modelo, desenvolvido pelos seus pesquisadores.

Todos esses modelos são utilizados para projetar o clima futuro até 2050 e 2100. Sobre algumas áreas, e para algumas variáveis do clima, os modelos convergem. Todos os modelos apontam redução de chuvas para o leste da Amazônia e o Nordeste e aumento de chuvas para o Sul do Brasil e o norte da Argentina e a costa norte do Peru e do Equador. A tendência dos modelos é a mesma, só os valores obtidos são um pouco diferentes. Em áreas como o Centro-Oeste e o Sudeste alguns modelos mostram mais chuvas e outros menos.

Nesses casos, surgem incertezas. Se me perguntarem se vai chover mais ou menos em Brasília nas próximas décadas, tenho que responder que depende do modelo adotado. Alguns apontam aumento de chuvas, outros, diminuição. Na questão da temperatura todos os modelos indicam aquecimento global e regional. Todos. Há consenso. Temos um grau maior de certeza sobre temperatura do que sobre chuvas. Por isso, se fala tanto em aquecimento global.

Você mencionou o Leste da Amazônia. O que os modelos indicam sobre o clima futuro no oeste dessa região?

Nos modelos usados no quinto relatório do IPCC, projetou-se um aumento das chuvas extremas no oeste da Amazônia. A representação da floresta está melhor nos atuais modelos do que nos do passado. Isso nos leva a pensar que talvez os modelos estejam melhorando, que eles estariam mais próximos da realidade.

É preciso ter cuidado para projetar o clima futuro, pois há incertezas que não podemos eliminar. Temos de lembrar que não existe modelo no mundo que possa representar 100% a realidade. Não existe modelo perfeito.

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Page 24: Ano XXVIII • Nº 265 • Dezembro 2018 • R$ 15,00 • ... 21_265_ FINAL.pdfserá realizada em Katowice, na Polônia, ainda em Dezembro deste ano. Nesta Conferência das Partes,

É um erro ver a Amazônia como uma região única do ponto vista climático?

Poderíamos falar em três situações diferentes. Temos o leste da região, que está perto da foz do rio Amazonas; o oeste, perto da Colômbia e do Peru, que é mais chuvoso; e o sul da Amazônia, onde está Mato Grosso e o chamado arco do desmatamento. Sobre o sul da Amazônia, o consenso entre os modelos climáticos é menor. Há estudos dizendo que o desmatamento nessa região vai produzir menos chuvas e outros dizendo que vai produzir mais.

Por que poderia haver mais chuvas? Quando uma área é desmatada, surgem setores sem floresta ao lado de outros com a mata preservada. O contraste gera um tipo de brisa, que produziria chuva nas bordas. Esse é um detalhe regional que os modelos de grande escala não captam. É por isso que também usamos modelos regionais, que dão mais detalhes.

Qual é a resolução do modelo regional do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais?

Para toda América do Sul e Central ele consegue prever o clima para área equivalente a um quadrado de 40 por 40 quilômetros. Mas, para algumas regiões do Brasil, como a Sudeste, essa resolução pode chegar a um quadrado de 5 por 5 quilômetros.

Fizemos um estudo com esse nível de detalhe em Santos, no litoral paulista. Vimos que o porto pode não ser afetado pelas mudanças climáticas no futuro, mas a cidade será atingida por mais ressacas, que são consequência de mais ventos, que derivam de tempestades próximas à costa. Nossos estudos indicaram a intensificação das tempestades no local.

Não estamos dizendo que o nível do mar vai engolir a cidade, como aparece nos filmes de desastres ambientais. Um pequeno aumento no nível do mar faz com que as ondas entrem mais na cidade. Já vemos imagens da água de ressaca alcançando as calçadas da cidade e penetrando nos estacionamentos subterrâneos dos prédios em Santos. É uma situação que tem impactos graves, ainda mais se virar praxe no futuro. Por isso, as autoridades de Santos estão prestando atenção nos estudos.

Esses estudos em Santos são os mais detalhados de possíveis impactos em um lugar do Brasil?

Diria que sim. Conseguimos fazer uma projeção para a cidade com e sem a adoção de medidas de adaptação a mudan-ças no clima. Definimos essas medidas com a população local. Manejar ecossistemas, como revitalizar o mangue da cidade, é muito mais barato do que investir em infraestrutura, como construir um dique de concreto na praia. O mangue atua com um filtro, uma esponja, e reduz o risco de enchentes decorrentes da elevação do nível do mar. Na Ponta da Praia, um bairro da cidade, a opção de mitigação discutida era construir um dique, mas os moradores não gostaram de ter uma parede na praia. No entanto, os estudos indicam que ou se faz um dique ali ou se convive com as enchentes.

Ainda é possível evitar que a temperatura média do planeta suba pelo menos 2 graus até o fim do século?

Se, nesse momento, todos os países zerassem suas emissões de dióxido de carbono, o CO2, o mundo ainda continuaria aquecendo, pois há muito desse gás armazenado na atmosfera. Em um mundo utópico, as florestas e os oceanos poderiam dar conta de absorver esse CO2 e limpar a atmosfera. Mas isso, infelizmente, não está ocorrendo. Estudos indicam que em algumas áreas o oceano está saturado de CO2 e não con-segue absorver mais o gás. Além disso, sabemos que as áreas de floresta estão diminuindo. As pessoas cortam árvores de 50 ou 100 anos e dizem que vão compensar fazendo reflores-tamento. O efeito dessa compensação é pequeno. As árvores vão demorar a crescer. O ideal é parar de desmatar e aumentar a área de floresta. Se houver medidas de mitigação intensa, talvez seja possível frear o aquecimento global em 1,5 grau ou, no máximo, 2 graus. Com o aquecimento correndo solto, se a temperatura global aumentar mais de 4 graus, entraremos no que chamamos de mudanças climáticas perigosas. Nesse caso, adaptar-se não será mais possível.

Em algumas partes do mundo?

Diria que em geral. As pessoas dizem que, se esquentar muito, elas ligam o ar-condicionado. Ocorre que o aparelho precisa de energia elétrica, que depende da hidrelétrica, que depende da chuva. Mas, se ficar muito quente, a água evapora e não fica nas usinas. As pessoas ainda não entenderam a questão da adaptação. Usar caminhão-pipa no Nordeste apenas na época de seca não é adaptação. É paliativo. Adaptação é algo preparado e permanente. Nesse sentido, o que pode ajudar o mundo é um aumento de grande escala na área de floresta, que absorve gases de efeito estufa. Há quem vislumbre que injetar CO2 em buracos no solo seria uma alternativa de mitigação para combater o aquecimento global.

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Santos, São Paulo

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Isso poderia resolver o problema atmosférico e criar um geológico. Há pesquisa séria nessa área, denominada geoen-genharia, mas não há resultados concretos de estudos que mostrem que a intervenção funciona. É uma área nova. Nos anos 1970, quando a modelagem climática começou, também ninguém acreditava nela. Hoje todo mundo usa modelagem. Talvez isso venha a ocorrer no futuro com a geoengenharia, mas ainda é cedo para se apostar nela.

Alguma parte do Brasil está adaptada a eventos extremos?

Em certa medida, parece que agora a Região Metropolitana de São Paulo está adaptada à crise hídrica. As autoridades dizem que melhoraram a rede de distribuição de água, que era muito antiga, e passaram a captar também água do rio Paraíba do Sul. Essa medida pode ser considerada um tipo de adaptação. Mas quais setores podem se adaptar a eventos climáticos extremos? Quando chove muito na cidade de São Paulo as pessoas não conseguem se locomover. Carros são perdidos, os caminhões não conseguem transportar ali-mentos para os supermercados, os ônibus param, as pessoas não conseguem trabalhar. Isso ocorre todos os verões. Faz 20 anos que estou no Brasil e sempre vi isso. A cidade não está adaptada a chuvas intensas, que estão aumentando. No pior dos casos, quando a adaptação não é possível, as pessoas podem tentar migrar, como ainda ocorre no Nordeste.

Que bons casos de adaptação a mudanças climáticas destacaria no mundo?

Veneza é um deles, com a cidade convivendo há tempos com a laguna. Talvez o melhor exemplo seja o da Holanda.

A cidade de Amsterdã está abaixo do nível do mar. Sem o dique para segurar a água, a população morre. O país cresceu avançando sobre o mar. Hoje, esse processo seria descrito como uma adaptação. Existem projeções que indicam que tempestades mais intensas vindas do mar do Norte podem chegar à Holanda. E se elas ultrapassarem os diques? Nos Estados Unidos, houve o caso do furacão Katrina em 2005. Seus ventos empurraram o rio Mississipi sobre as paredes dos diques que protegiam Nova Orleans. Eles resistiam a furacões da categoria 3, mas o Katrina chegou à categoria 5. A cidade ficou alagada e morreram 1.500 pessoas. Isso ocorreu em um país do chamado Primeiro Mundo.

Os países pobres serão os mais afetados pelas mudanças climáticas?

As mudanças no clima são democráticas. Afetam pobres e ricos. A agenda ambiental é maravilhosa. Mas, com a crise econômica que houve recentemente na Europa e nos Estados Unidos, ela ficou em segundo plano. A economia baseada no carbono gera muitos empregos e os governos preferem combater a crise recorrendo ao estímulo de atividades que são poluidoras. Foi por isso que os Estados Unidos não rati-ficaram o Protocolo de Kyoto e deixaram o acordo do clima de Paris. No Brasil, não é muito diferente, embora o país continue como signatário dos acordos internacionais sobre clima. O Brasil se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal. Mas, para mim, o mais correto seria simplesmente zerar o desmatamento, qualquer desmatamento, legal ou ilegal. Para o clima, não há diferença alguma se uma árvore foi cortada legal ou ilegalmente. Se ela foi cortada, deixa de ser um agente contrário ao aumento do Efeito Estufa.

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À primeira vista, para aqueles que sabem pouco sobre a mudança climática, o termo “Contribuição Nacionalmente Determinada” e sua sigla “NDC” podem parecer misteriosos. Mas eles não são! Para entendê-los, devemos começar com o princípio de que cada país deve fazer sua parte e contribuir para reduzir as emissões de carbono e reduzir o aquecimento global e a probabilidade de eventos extremos tais como secas, inundações e furacões. Este compromisso foi assinado em Dezembro de 2015, na COP-21 da Convenção sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC). Na ocasião foi firmado o Acordo de Paris com o objetivo de manter o aumento da temperatura global bem abaixo de 2°C (em comparação aos níveis Pré-Industriais). O Acordo entrou em vigor em 4 de Novembro de 2016 e, até o momento, dos 197 países que fazem parte da Convenção, 180 ratificaram o documento. Nos termos do Acordo, cada país estabeleceu sua própria Contribuição Nacionalmente Determinada; a NDC prometida pelo Brasil é considerada uma das mais ambiciosas.

O país se comprometeu a implementar ações para reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) em 43% até 2030, em comparação com os níveis de 2005. Para atingir essa meta, o Brasil pretende adotar medidas que incluam, entre outras ações:

O que o Brasil faz para lidar com as mudanças climáticas

Alexandre Kossoy | Especialista financeiro do Grupo de Mudanças Climáticas do Banco Mundial

1 - Aumentar a participação de fontes renováveis (eólica e solar) no mix de energia do país para 45%. Para isso, o país planeja aumentar a participação de fontes renováveis e não-hidráulicas na sua geração energética de 28 para 33%, incrementar a participação da bioenergia sustentável (biocombustíveis e biomassa) para 18% e expandir o uso de combustíveis não-fósseis, fontes de energia renováveis (excluindo a energia hídrica) para pelo menos 23% do mix energético do país;

2 - Aumentar a eficiência energética no setor elétrico em 10% e promover tecnologia limpa e eficiência energética nos setores industrial e de transporte;

3 - Conseguir, na Amazônia brasileira, zero desmatamento ilegal até 2030 e compensar as emissões de GEE da supressão legal da vegetação até 2030;

4 - Restaurar e reflorestar pelo menos 12 milhões de hectares de florestas;

5 - Restauração de mais 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2030 e melhoria de 5 milhões de hectares de sistemas integrados de cultivo-pecuária-floresta (ICLFS) até 2030.

E como os projetos do Banco Mundial contribuem para - e apoiam - a implementação do Brasil das NDCs?

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Apoiando itens prioritários na Contribuição Nacionalmente Determinada do país, como energia limpa, agricultura de baixo carbono e redução do desmatamento. Esses projetos têm impacto direto na capacidade do Brasil de atingir as reduções consagradas na NDC.

Os projetos

- FIP CAR: Financiado pelo Banco Mundial através do Programa de Investimento Florestal (FIP) do Fundo de Inves-timento Climático (CIF), esse projeto de US$ 32,48 milhões faz parte do Plano de Investimentos do Brasil, realizado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) sob o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e em parceria com órgãos ambientais estaduais. O projeto visa implementar o Registro Ambiental Rural (CAR) em cidades selecionadas na região do Cerrado como uma estratégia para promover a redução do desmata-mento e da degradação florestal e melhorar o manejo florestal sustentável. Ao fazê-lo, o projeto reduz as emissões de GEE e protege os estoques de carbono florestal, componentes-chave do NDC brasileiro.

- FIP ABC Cerrado: Também financiado pelo Banco Mundial por meio do FIP/CIF, esse projeto de US$ 10,62 milhões é executado pelo Ministério da Agricultura, Pecu-ária e Abastecimento (MAPA) em parceria com a Embrapa e o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR). Com assistência técnica e gerencial, o projeto incentiva os agricultores a adotarem e investirem em práticas sustentáveis para reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa de suas propriedades; também visa aumentar a produtividade de forma sustentável. Goiás, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Maranhão, Bahia, Piauí, Minas Gerais e Distrito Federal serão beneficiados pelo projeto.

- FinBRAZEEC: Financiado por um empréstimo de US$ 200 milhões, este projeto oferece um instrumento financeiro inovador para ajudar a superar alguns dos principais obstáculos no financiamento de projetos de infraestrutura energética no Brasil, particularmente em eficiência energética (que é fundamental para as NDCs). Além de US$ 180 milhões em financiamento da Caixa Econômica Federal e US$ 20 milhões do Fundo de Tecnologia Limpa (CTF/CIF), outros US$ 195 milhões foram aprovados pelo Green Climate Fund (GCF) para o projeto. O objetivo é levantar mais de US$ 1,1 bilhão para criar novos mercados em áreas como iluminação pública modernizada e eficiência energética em ambientes industriais.

- Paisagens Sustentáveis da Amazônia: com uma doação de US$ 60 milhões do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) e US$ 370 milhões em cofinanciamento, o projeto ajudará a aumentar a área florestal sob proteção e garantirá o manejo e a restauração sustentável na Amazônia brasileira nos próximos seis anos, criando novas áreas protegidas – e consolidando as já existentes no âmbito do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA) – e mecanismos para apoiar a sustentabilidade financeira de longo prazo do sistema de áreas protegidas na Amazônia brasileira. Ao todo, 63 milhões de hectares serão preservados no âmbito do programa ARPA; a maior iniciativa individual de conservação de florestas tropi-cais da história. Protegendo significativamente e globalmente a biodiversidade na região, além de implementar políticas para promover o uso sustentável da terra e a restauração da cobertura vegetal nativa,

Nem todos os países estabeleceram objetivos tão ousados como o Brasil, e especialistas no assunto estão preocupados. De acordo com algumas estimativas internacionais, todas as NDCs que formam a base do Acordo de Paris, juntas, cobrem apenas cerca de um terço das reduções de emissões necessárias para alcançar as metas globais de contenção de temperatura. O Diálogo Talanoa está sendo realizado para inspirar e elevar o nível de ambição nas ações realizadas pelas partes sob o Acordo. Introduzido na COP-23, sob a presidência de Fiji, o Diálogo tem como objetivo coletar contribuições, histórias e ideias das partes e atores envolvidos no processo sobre os esforços coletivos e desafios para alcançar objetivos de longo prazo, bem como para informar a preparação das NDCs. Essas contribuições serão apresentadas na COP-24 em Katowice (Polônia) neste mês, Dezembro de 2018.

O Diálogo de Talanoa é baseado em três questões rela-cionadas a ações climáticas: Onde estamos? Onde queremos ir? Como chegamos lá? Além de apoiar uma série de projetos que fortalecem as NDCs brasileiras, o Banco Mundial recen-temente facilitou o Talanoa Dialogue Brazil, com recursos do NDC Support Facility. No evento, representantes dos setores público e privado e líderes da sociedade civil foram convidados a um diálogo participativo, inclusivo e transpa-rente sobre o que deve ser considerado na implementação das contribuições do Brasil. Planos para diálogos adicionais e mais amplos com a sociedade civil, o setor privado e as ONGs estão em andamento.

Clima e pobreza

Como partes diretamente responsáveis pelo aquecimento global, temos a responsabilidade de reduzir as emissões para evitar desastres climáticos que representam riscos iminentes para a manutenção do ecossistema e para as gerações futuras. Atualmente, existem 7,6 bilhões de pessoas na Terra e somos responsáveis por apenas 0,01% de todas as formas de vida do Planeta. No entanto, já causamos a extinção de 83% de todos os mamíferos e 50% de todas as plantas do Planeta, especialmente nos últimos 50 anos, que muitos cientistas definem como a Sexta Extinção em Massa da vida na história de 4 bilhões de anos da Terra.

A temperatura global hoje é de 1,2°C acima dos níveis pré-industriais; sem ações urgentes para reduzir a vulnerabi-lidade, as mudanças climáticas podem levar 100 milhões de pessoas à pobreza até 2030. De fato, os impactos climáticos sobre a pobreza são muito maiores do que pensávamos até poucos anos atrás. Um novo relatório do Banco Mundial mostra que o impacto anual de desastres naturais extremos agora equivale a US$ 520 bilhões em perda de capacidade de consumo. Como tal, todas as ações destinadas a reduzir as alterações climáticas, incluindo as NDCs, estão intrinse-camente ligadas à missão do Banco Mundial de erradicar a pobreza extrema. “Os severos choques climáticos ameaçam retroceder décadas de progresso contra a pobreza. Tempestades, inundações e secas têm consequências humanas e econômicas terríveis, com os pobres pagando o mais alto preço. Construir resiliência a desastres não só faz sentido econômico, é uma questão moral imperativa”, disse Jim Yong Kim, Presidente do Grupo do Banco Mundial.

Agora que as NDCs não são mais um mistério, é mais fácil saber o que o Brasil está fazendo para lidar com a mudança climática e contribuir para um futuro mais sustentável.

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A importância dos povos indígenas para a conservação ambiental e para conter o aquecimento do Planeta foi debatida no Memorial dos Povos Indígenas, em Brasília, no dia 6 do mês passado (Novembro) em nova rodada do Diálogo Tala-noa, processo criado no âmbito internacional para estimular a ação climática. Os resultados foram levados pelo Governo brasileiro para a etapa global do Diálogo, que ocorre na Conferência do Clima, a COP-24, neste mês de Dezembro, em Katowice, na Polônia.

A rodada com os povos indígenas se soma a um ciclo de outras edições realizadas anteriormente com segmentos como sociedade civil, empresariado, comunidade científica e governos subnacionais. “Levaremos as nossas histórias para motivar a nossa sociedade e a sociedade de outros países a fazer mais e mais rápido”, explicou o Secretário de Mudança do Clima e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Thiago Mendes.

No diálogo com os indígenas, as experiências abordadas incluíram os esforços e os resultados já alcançados pelos povos indígenas em ações para manter a floresta em pé. “Nossas áreas são preservadas porque conseguimos viver em harmonia com a natureza”, sintetizou Alberto Terena, um dos representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) no evento.

Os participantes alertaram que já começaram a sentir os impactos da mudança do clima. Representante do Conselho Indígena de Roraima, Sineia do Vale contou que, na região, os verões ficaram mais secos e os invernos, mais rigorosos. “Hoje, a questão climática afeta diretamente a vida dos povos indígenas”, afirmou. “Esse diálogo é muito importante para que a gente possa trazer nossas histórias”, completou.

Povos indígenas realizam diálogo sobre o clima

Elmano Augusto e Lucas Tolentino | Jornalistas do MMA

A rodada do Diálogo Talanoa com os indígenas incluiu representantes dos povos Arara, Baré, Bororó, Guajajara, Ikpeng, Kayabi, Macuxi, Manchineri, Manoki, Pankará, Rikbaktsa, Tariana, Tembé, Terena, Tuxá, Wajãpi, Wapichana, Xerente e Xokleng. Também participaram representantes do Ministério do Meio Ambiente (MMA), do Ministério das Relações Exteriores (MRE), da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e de organizações não-governamentais.

O evento seguiu o formato inspirado na tradição ancestral de compartilhamento de histórias dos povos de Fiji, o pequeno país insular que presidiu a última Conferência do Clima, a COP-23, em Novembro do ano passado. Foi na COP-23 que o governo de Fiji introduziu o Diálogo Talanoa, conceito da região do Pacífico, que se traduz como um diálogo inclusivo, participativo e transparente.

A ideia era que cada país fizesse uma rodada de discussões sobre o assunto em seus próprios territórios até a realização da COP-24, agora em Dezembro, quando ocorrer a edição global de Alto Nível do Diálogo Talanoa, com a participa-ção de representantes dos mais de 190 países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC).

O Secretário de Mudança do Clima e Florestas do Ministério do Meio Ambiente destacou a importância da contribuição brasileira para o processo. “Como tivemos vários debates, ficou claro que o Brasil tem experiências muito posi-tivas que podem mostrar e confirmar essa liderança”, avaliou Thiago Mendes.

COPs

Todos os anos, os membros da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas se reúnem na Conferência das Partes (COP), também conhecida como Conferência sobre o Clima. Agora, neste Dezembro, a 24ª edição da reunião (COP-24) ocorre na cidade polonesa de Katowice. Além do Diálogo Talanoa, a COP-24 tem o objetivo de negociar a conclusão do “Livro de Regras” para a implementação do Acordo de Paris, um pacto mundial para frear o aquecimento global.

Em vigor desde 2016, esse Acordo representa um esforço mundial para “manter o aumento da temperatura média global bem abaixo dos 2°C acima dos níveis pré-industriais e buscar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C”. Para isso, cada país apresentou sua meta de corte de emissões, conhecida como Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC). A meta brasileira é reduzir 37% das emissões de Gases de Efeito Estufa até 2025, com indicativo de cortar 43% até 2030, ambos em comparação a 2005.

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Relatório divulgado pela Climate Trends, empresa de pesquisa climática de Delhi, na Índia, conclui que pessoas expostas a riscos naturais em regiões de baixa renda têm 7 vezes mais probabilidade de morrer, serem feridas ou de terem que migrar, em comparação a populações em regiões de alta renda. O estudo analisou dados da Índia e mostrou que a mudança climática ameaça criar um ciclo vicioso à medida que um clima mais quente leva mais pessoas à pobreza, aumentando sua vulnerabilidade aos impactos climáticos.

“No momento em que os países se preparam para nego-ciar em outra COP sobre o clima, desta vez na Polônia, não é admissível deixar de prestar atenção à ciência”, alerta Aarti Khosla, Diretora da Climate Trends. “Um aumento adicional nas temperaturas globais afetará mais as pessoas desfavorecidas e vulneráveis por meio da insegurança alimentar, preços mais altos dos alimentos, perda de renda e de oportunidades de subsistência, impactos adversos à saúde e deslocamentos da população. No caso específico da Índia, isso é extremamente preocupante porque o país tem uma grande população vulne-rável que pode ser particularmente atingida”, completa.

Em Agosto de 2017, as fortes chuvas de monção causaram inundações generalizadas em toda a Índia, Bangladesh e Nepal, levando a, pelo menos, 1.200 mortes. Quatro Estados do Norte da Índia foram extensivamente afetados pelas inundações, que danificaram mais de 805.183 casas e afetaram 18 milhões de pessoas. Um ano depois, em Julho e Agosto de 2018, Kerala foi varrida por fortes chuvas de monção, levando às piores inundações neste estado do sul do subcontinente indiano desde 1924. Foram registrados 2.378 mm (2.4 m) de chuva durante 88 dias, 4 vezes mais que o normal. Grandes partes de Kerala foram devastadas.

Hozefa Merchant | Jornalista do Global Strategic Communications Council

Mudança do clima aumenta desigualdade social

Segundo as autoridades nacionais, só a partir do dia 6 do mês passado, o número de mortos já atingiu 504, com 3,4 milhões de pessoas deslocadas para 12.300 campos de socorro e 23 milhões de pessoas afetadas.

Nas enchentes de 2018, em Kerala, uma avaliação dos impactos econômicos no Estado constatou que, para os 4,13 milhões de trabalhadores nos cinco distritos mais afetados, cerca de 3,3 milhões de trabalhadores tiveram seus empregos postos em risco.

A projeção econômica do setor de turismo de 2019 foi redu-zida como resultado da devastação generalizada. Trabalhadores do setor de turismo são suscetíveis a danos indiretos, pois os pontos de atração turística são destruídos pelas enchentes e os turistas evitam visitar as áreas impactadas.

A Índia é fortemente dependente das monções de verão, que responde por cerca de 70% da precipitação anual. Como a mudança climática altera os padrões climáticos, o acesso à água na Índia enfrenta um futuro incerto. Mais de meio bilhão de pessoas na Índia já enfrentam escassez aguda de água, de acordo com o Governo daquele país. Segundo a Niti Aayog (National Institution for Transforming India - grupo estabelecido com o objetivo de alcançar os ODS), com 54% dos poços de água subterrânea da Índia em declínio, e 21 grandes cidades devem ficar sem água subterrânea até 2020, afetando 100 milhões de pessoas.

A mudança climática já fez com que as temperaturas globais subissem ao redor de 1°C acima dos níveis pré-industriais. A menos que as emissões sejam rapidamente reduzidas, espera-se que as temperaturas subam 1,5°C até 2040, 2°C até 2065 e 4°C até 2100, levando a uma mudança climática descontrolada já a partir dos próximos 10/12 anos.

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O Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM) entregou recentemente à Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, um “Manifesto por Ar Limpo”, assinado por dezenas de entidades ambientalistas, pedindo uma revisão eficaz da Resolução Conama 03/1990, que está defasada em relação às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a proteção da qualidade do ar no Brasil. O documento é assinado também pela Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (ABRAMPA), que congrega os promotores e procuradores do setor no país.

Segundo o PROAM, a minuta de revisão da Resolução 03/90 que tramita no Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e poderá ser votada proximamente sugere valores de poluição do ar com o dobro da recomendação da OMS, permite agregar mais poluição por meio de licenciamento ambiental em áreas já saturadas, não prevê níveis de alerta adequados e não tem mecanismos para informar adequada-mente a população sobre os riscos que corre.

Carlos Bocuhy, Presidente do PROAM, lembra que, conforme dados da OMS, morrem no Brasil mais de 50 mil pessoas por ano em função da poluição atmosférica. “Estudos da Faculdade de Saúde Pública da USP apontam um custo anual estimado de US$ 1,7 bilhão nas 29 maiores cidades do país devido à péssima qualidade do ar”, afirma o ambientalista, que também é Conselheiro do Conama.

Os grupos mais vulneráveis são as populações de baixa renda, que se encontram em áreas menos preservadas, as crianças e os idosos, mais suscetíveis à poluição devido a uma saúde mais frágil. “Estas mortes poderiam ser evitadas com uma corajosa política por ar limpo, especialmente com o controle das fontes de emissão de poluentes, como o material particulado e os precursores de ozônio”, diz Bocuhy.

Ambientalistas entregam à PGR Manifesto por Ar Limpo

Mauro Arbex | Jornalista

O “Manifesto por Ar Limpo” destaca que, no processo de revisão da resolução Conama, a defesa da saúde pública vem sendo obstruída pelo setor produtivo e governos esta-duais, que se omitem da responsabilidade legal de cumprir os dispositivos constitucionais.

Em 1990, saiu a primeira resolução do Conama, com valores de referência para qualidade do ar da OMS. Em 2005, a OMS revisou os valores e publicou os padrões atuais, mais restritivos e protetivos. Em 2007, o PROAM solicitou a revisão dos padrões ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (CON-SEMA) de São Paulo. Em 2012, o Estado adotou as novas referências, mas sem prazo para atingimento das metas.

Entre 2012 e 2017, a discussão proposta pelo PROAM se ampliou em nível nacional, até que neste ano houve a aprovação da minuta, sem adoção das recomendações da OMS, que agora vem sendo contestada por ambientalistas e Ministério Público Federal. A votação final da minuta está prevista para o final deste mês. Segundo Bocuhy, se aprovada, “a minuta levará o Brasil a um atraso de décadas no combate à poluição do ar”.

O Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM) é uma ONG que estimula ações e políticas públicas com a finalidade de tornar o ambiente saudável, principalmente em grandes áreas urbanas. Fundada em Abril de 2003, a ONG é presidida pelo ambientalista Carlos Bocuhy. Desde sua fun-dação, o PROAM trabalha em defesa da boa normatização e indicadores ambientais para a elaboração de políticas públicas, realizando diagnósticos ambientais, vistorias, denúncias e cobrança de soluções e da eficácia na atuação dos órgãos competentes. Além disso, a ONG desenvolveu a campanha ambiental “Billings, Eu te quero Viva!” e o programa Metró-poles Saudáveis. Este programa, atualmente em andamento, é coordenado pelo PROAM e apoiado pela OMS.

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Considerando que, segundo dados atuais da Organização Mundial da Saúde – OMS, morrem mais de 50 mil brasileiros por ano em função da poluição atmosférica; que estudos da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo - USP, apontam um custo estimado para a saúde pública, nas 29 maiores cidades brasileiras, da ordem de 1,7 bilhão de dólares ao ano;

Considerando que os grupos mais vulneráveis são as populações de baixa renda, as crianças e os idosos; que estas mortes poderiam ser evitadas com uma corajosa política por ar limpo, especialmente com o controle das fontes de emissão de poluentes como o material particulado e os precursores de ozônio;

Considerando que as políticas públicas para o controle da poluição não podem prescindir da efi-ciente revisão da resolução 03/90 do Conama, que estabelece valores de referência para a qualidade do ar, protetivos ao meio ambiente e à saúde pública e baseados nos estudos científicos da OMS, o que vem sendo defendido pela representação ambientalista e pelo Ministério Público Federal no Conama;

Considerando que no processo de revisão da reso-lução 03/90 no Conama, a defesa da saúde pública vem sendo obstacularizada pelo setor produtivo e governos estaduais, que se omitem reiteradamente da responsabilidade e obrigação legal de cumprir os dispositivos constitucionais que garantem a saudável qualidade de vida ao povo brasileiro;

Considerando ainda as distorções que vem perme-ando as discussões no Conama, apontadas durante a Audiência Pública sobre a revisão da resolução 03/90, promovida pelo Ministério Público Federal e organi-zações não governamentais, conforme Relatório Con-clusivo disponível no endereço eletrônico: http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr4/dados-da-atuacao/eventos/audiencia-publica/avaliacao-da-proposta-de-minuta-do-conama-sobre-padroes-de-qualidade-do-ar-para-o-brasil-e-suas-consequencias-para-o-meio-ambiente-e-a-saude-revisao-da-resolucao-03-90/RelatorioConclusivoAudienciaPublica.pdf

Finalmente, considerando que, conforme afirma o Relatório Conclusivo da Audiência Pública, “qualquer regramento que não garanta a extensiva e eficaz prote-ção a esses direitos (meio ambiente e saúde) não estará sob a guarda de nossa ordem constitucional”;

As instituições e cidadãos abaixo-assinados vêm, por meio deste manifesto, exigir respeito aos princípios constitucionais para proteção do meio ambiente e da saúde pública, exortando os Ministérios do Meio Ambiente, da Saúde, dos Transportes, ao Governo Federal, governos estaduais e municipais, setor pro-dutivo e demais setoriais representados no Conama que assumam sua responsabilidade no sentido de dotar a revisão da resolução Conama 03/1990 com padrões, prazos e metas eficientes e eficazes para promover a proteção do meio ambiente e da saúde pública no Brasil.

Manifesto por Ar LimpoNão às mortes por poluição do ar no Brasil

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O primeiro dia da 20ª edição da Conferência Ethos, realizada dia 25 de Setembro, em São Paulo, e organizada pelo Instituto Ethos, destacou as duas décadas de atuação da entidade em busca de uma sociedade mais justa e sustentável. Além disso, trouxe debates a respeito dos principais temas defendidos pela entidade, entre eles: combate à corrupção, inclusão social, direitos humanos, integridade corporativa, ges-tão sustentável, compliance e combate ao trabalho escravo.

Um dos destaques do evento foi o painel de abertura “A agenda econômica e as eleições 2018 – o que esperar para o desenvolvimento sustentável?”, que trouxe um diálogo sobre a agenda econômica nas campanhas presidenciais e as implicações para a recuperação da economia brasileira. Para Caio Magri, diretor-presidente do Ethos, trata-se de um momento determinante e o poder de mudar está nas mãos de cada cidadão. “É nesse ano, especialmente esse ano, que todos temos que defender os nossos valores para um futuro melhor”, disse o executivo.

O encontro promoveu também o diálogo sobre os desafios e oportunidades do Movimento Empresarial pela Integridade e Transparência. Lançada em julho pelo Ethos, a iniciativa já conta com 50 signatárias e espera fechar 2018 com a adesão total de 80 empresas. O movimento produz, entre outras ações, estudos para ajudar na elaboração de políticas públicas.

Além disso, a conferência trouxe discussões sobre os temas civilizatórios e incontornáveis da agenda social brasileira como a equidade racial e a diversidade. Durante o painel, a historiadora, antropóloga e professora titular da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Lilia Schwarcz, afirmou que conviver com a diversidade nos faz ser muito melhores seres humanos. “Infelizmente nossos índices atuais tornam nítidas a invisibilidade dessas questões. Falta muito para podermos celebrar equidade racial e de gênero no Brasil”, ponderou a acadêmica.

Na oportunidade, foram apresentados também os resul-tados da iniciativa “Por contratações limpas nas eleições” que propõe a candidatos e partidos políticos compromisso no uso dos recursos públicos oriundos do Fundo Partidário e do Fundo Público Eleitoral.

Conferência Ethos: inclusão social, diversidade e combate à corrupção

Elisa Homem de Mello | Jornalista

Para completar, com o objetivo de influenciar as empresas na criação de um ambiente aberto às diferenças, o evento apresentou debates sobre o ponto de convergência de todos os aspectos da diversidade: a interseccionalidade.

O papel das organizações em reconhecer e interpretar a pluralidade de forma mais justa, além de transformar esse reco-nhecimento em combustível de mudança social foi discutido durante o painel “Diálogo sobre a interseccionalidade”, onde o Secretário adjunto do Fórum LGBT, JP Polo, afirmou que entender a intersecção é respeitar as características de cada de um, para que as pessoas se articulem e compreendam suas particularidades e quebrem barreiras.

“Os debates desta edição foram enriquecedores para os participantes. Promover sustentabilidade e conduta ética nas empresas e na sociedade é, antes de tudo, uma forma de criar e manter as transformações que queremos conquistar daqui para frente. Precisamos nos desafiar diariamente para que possamos continuar em movimento. Se o futuro é a gente quem escolhe, é fundamental estarmos dispostos a mobili-zar, sensibilizar, apoiar, articular e a construir”, afirmou o diretor-presidente do Ethos.

Este ano, a Conferência reuniu um time de líderes e profissionais com novos olhares acerca dos desafios da economia nacional como um todo. A próxima edição da Conferência Ethos será realizada na cidade de Belém, no Pará, em Novembro.

Palco 20 anos do Instituto Ethos

Há duas décadas, o Instituto Ethos faz parte da vida das empresas e marca presença nos momentos e projetos mais importantes do país. Conferências, publicações, ferramentas para negócios sustentáveis, construção de políticas públicas e tantas outras iniciativas.

Uma trajetória inteira voltada para o desenvolvimento sustentável. Não é à toa que, em todo o país, mais de 500 empresas são associadas ao Instituto Ethos, mais de 1.300 compactuam compromissos e mais de 3.900 já utilizaram os Indicadores Ethos.

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Um dos animais mais importantes do folclore amazônico, o Boto-vermelho, entra para Lista Vermelha de animais em perigo de extinção da IUCN. O principal ‘vilão’ continua sendo a caça ilegal para a pesca da piracatinga e a captura acidental em redes de pesca.

A dois passos da classificação de ‘Extinto’ o boto-vermelho está classificado como “em perigo de extinção” na Lista Ver-melha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN) publicada no mês passado. O Tucuxi, outro golfinho da Amazônia encontra-se como ‘dados insuficientes’ na Lista.

Para conseguir classificar os golfinhos da Amazônia na Lista Vermelha, a IUCN contou com os dados de pesquisas do Laboratório de Mamíferos Aquáticos do Instituto Nacio-nal de Pesquisas da Amazônia (INPA/MCTIC) coordenado pela pesquisadora Vera da Silva, dentre outros institutos de pesquisas do Brasil e do Mundo.

A pesquisadora, que também é responsável pelo projeto Mamíferos Aquáticos da Amazônia patrocinado pela Petrobras, explica que o Projeto Boto do INPA há 25 anos desenvolve pesquisas com esta espécie na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Mamirauá.

“Desde 2000 as pesquisas nos mostram que a população de botos naquela região vem reduzindo drasticamente a cada década. A preocupação maior é a velocidade que esta espécie está sendo retirada da natureza, se isso acontece no entorno de uma reserva protegida, modelo na Amazônia, imagine em uma área sem proteção”, indaga a pesquisadora.

Tucuxi pode ir para a Lista Vermelha na categoria “Em Perigo”

A pesquisadora explica que as ameaças que atingem o boto-vermelho são as mesmas que atingem o tucuxi que está na Lista da IUCN como “Dados Insuficientes”. Segundo Vera da Silva “Ambas as espécies sofrem com a captura direta, a captura acidental, tem as represas que fragmentam as popu-lações, e também a poluição dos rios, sabemos que nossos rios possuem poluentes como o mercúrio, entre outros, então tudo isso levou a está classificação na Lista Vermelha”.

Da Silva comenta que o tucuxi deverá entrar à Lista em uma categoria de ameaça até Março do ano que vem, após revisão. “O tucuxi é muito capturado acidentalmente em redes de pesca”, explica acrescentando que isso acontece cada vez com mais frequência por conta da demanda por peixes que está crescendo cada vez mais.

O Projeto Mamíferos Aquáticos da Amazônia engloba o Projeto Boto e o Projeto Peixe-boi que é executado pela Associação Amigos do Peixe-boi (AMPA), em parceria com o INPA, e recebe apoio financeiro da Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental.

Lista Vermelha registra o boto-vermelho quase extinto

Fernanda Farias | Associação dos Amigos do Peixe-boi – AMPA

Moratória que proíbe pesca da piracatinga acaba em 2019

Ainda segundo a bióloga que é Doutora em Ecologia e Reprodução de Mamíferos pela Universidade de Cambridge, a classificação de “Em Perigo de Extinção” é um alerta para as autoridades brasileiras no que diz respeito às ações para conservação das espécies.

Uma dessas ações para evitar as populações do boto-vermelho da extinção foi a moratória assinada, em 2014, mediante um acordo entre o Ministério de Meio Ambiente e o Ministério de Pesca e Aquicultura, recomendado pelo Ministério Público Federal pelo período de cinco anos.

Para Silva, cinco anos não é o suficiente para essas espécies se recuperarem. “Para a moratória não ser renovada os órgãos responsáveis pela pesca na região terão que provar que a pesca a piracatinga não envolve os golfinhos da Amazônia nessa atividade e que encontraram uma solução para que o boto-vermelho não seja utilizado com isca”, enfatiza a bióloga.

A Campanha Alerta Vermelho é realizada pela AMPA e tem a parceria do INPA, MPF, ICMBio, Ibama, IPAAM, IUCN e o Instituto Anahata.

Lista vermelha

A Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN classifica as espécies em nove grupos definidos por critérios rigorosos que incluem taxa de declínio da população; tamanho e distribuição da população; área de distribuição geográfica e grau de fragmentação.

“Em Perigo” é a categoria que evidência que a espécie provavelmente será extinta em um futuro próximo. Segundo a IUCN, este é o segundo estado de conservação mais grave para as espécies na natureza.

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As eleições presidenciais também trouxeram debates e polêmicas sobre ocupação e preservação da Amazônia. Visões alarmistas denunciaram a iminente devastação florestal, o abandono das políticas de conservação e a agropecuária como vetor de devastação. Até o The Economist vaticinou sobre o tema. Mas qual a situação efetiva da proteção e da preservação da vegetação nativa no Bioma Amazônia? Qual o papel das políticas públicas na manutenção das florestas? Qual a parte do mundo rural na preservação? Como dar uso e destino sustentável ao que alguns consideram intocável? Pesquisa recente da Embrapa traz respostas objetivas a essas indagações e aponta o real desafio amazônico do novo Presidente da República.

A proteção da vegetação nativa. No Brasil, o Bioma Amazônia ocupa cerca de 4,2 milhões de km2, praticamente a metade do país (49,4%). Ele engloba Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima, além de parte do Mato Grosso, Maranhão e Tocantins. As Unidades de Conservação (UCs) de Proteção Integral, como Estações Ecológicas e Parques Nacionais, são 204 na Amazônia e totalizam uma área superior a 76 milhões de ha. Elas recobrem 18% do bioma, excluem a presença humana e não admitem qualquer atividade produtiva. Reser-vas Extrativistas (RESEX) e de Desenvolvimento Sustentável (RDS) não fazem parte dessa categoria de UC.

Evaristo Eduardo de Miranda | Doutor em ecologia, escritor e pesquisador da Embrapa

O Presidente e a AmazôniaTambém há 330 Terras Indígenas legalmente atribuídas

no Bioma Amazônia, sob a gestão da FUNAI. Elas totalizam quase 107 milhões de ha e recobrem 25,4% do bioma. Existem sobreposições entre as 534 áreas atribuídas a meio ambiente e povos indígenas. Descontadas as sobreposições, elas totalizam 171,5 milhões de ha de áreas protegidas e 40,8% do bioma. As áreas militares, cadastradas com florestas nacionais, totalizam cerca de 2,7 milhões de ha e 0,6% do Bioma Amazônia. No total, Unidades de Conservação Integral, Terras Indígenas e áreas militares protegem hoje 174,2 milhões de ha ou 41,4 por cento do bioma.

A preservação da vegetação nativa. Até o advento do Cadastro Ambiental Rural (CAR), a contribuição dos agri-cultores, pecuaristas e extrativistas à preservação ambiental na Amazônia era subestimada e pouco conhecida. Criado e exigido pelo Código Florestal (Lei 12.651/12), esse registro eletrônico obrigatório tornou-se um relevante instrumento de planejamento agrícola e socioambiental.

Até Agosto de 2018, no Bioma Amazônia, registraram-se no CAR mais de 468.000 imóveis rurais, incluindo RESEX e RDS. A Embrapa Territorial analisou esse bigdata geoco-dificado. E mapeou com 10 m de detalhe a área dedicada à preservação da vegetação nativa em terras extrativistas e de agropecuária, em cada imóvel rural, município, microrregião, estado e no bioma (www.embrapa.br/car). Uma área total de 103,1 milhões de ha está dedicada à preservação da vegetação nativa pelo mundo rural. Isso corresponde a 24,6% do Bioma Amazônia e a 64% da área dos imóveis. Ou seja, o mundo rural preserva, em meio às suas atividades produtivas, um quarto do Bioma Amazônia e dois terços de seus imóveis.

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Um bioma protegido e preservado. Em resumo: as 534 áreas de proteção mais estrita (UCs Integrais e Terras Indígenas) totalizam 171,5 milhões de ha e alcançam 40,8% do Bioma Amazônia. Com as áreas militares essa porcentagem chega a 41,4%. Em mais de 468.000 imóveis rurais, pelos dados do CAR, as áreas dedicadas à preservação da vegetação nativa totalizam 103,1 milhões de ha ou 24,6% do bioma.

O total de áreas legalmente protegidas e preservadas, devida e detalhadamente mapeadas, é de 277,3 milhões de ha, 66,1% ou dois terços da Amazônia. Para o mundo rural e para os órgãos governamentais, isso implica num grande custo operacional e patrimonial, ainda por calcular.

Sem descontar áreas urbanas e de mineração, cuja dimen-são é muito pequena em relação ao total da região, existem ainda cerca de 83,8 milhões de ha passíveis de ocupação no Bioma Amazônia. Em sua maioria, são áreas inundáveis, superfícies hídricas do Rio Amazonas e terras pouco propícias ao extrativismo e à agropecuária, sem acesso logístico. Em boa parte, trata-se de terras devolutas.

O real desafio. Mesmo diante da hipótese muito pouco provável de uma futura ocupação integral dessas áreas pelo mundo rural, o Código Florestal já impõe o limite de 20% para uso e exploração (desmatamento legal). A área de reserva legal prevista para a vegetação nativa é de 80%. Assim, cerca de adicionais 67 milhões de ha, ou 16% da região, já estão previa e legalmente destinados à preservação, por Lei.

O Brasil já abriu mão de explorar e usar 82% do Bioma Amazônia, com todas essas áreas legalmente destinadas à proteção e à preservação da vegetação nativa. Uma área maior do que a Índia! Esse fato precisa ser melhor conhecido e reconhecido.

Qual país do mundo dedica 3,5 milhões de quilômetros quadrados à preservação? Tente alguém propor essa área em preservação aos Estados Unidos, Canadá, Rússia ou China. A proteção ambiental da Amazônia é um exemplo sem equi-valente no Planeta, em valores absolutos e relativos, como atestam documentos internacionais (IUCN, 2016. Protected Planet Reports).

O desafio do Presidente Jair Bolsonaro não é criar mais áreas de conservação, mas, sim, fazer cumprir o Código Florestal e garantir a gestão e a valorização das áreas já atri-buídas, públicas e privadas, alinhadas com as políticas mais modernas que existem no mundo: Parques Nacionais com visitação efetiva e concessões à iniciativa privada; promoção de usos não extrativos da biodiversidade e não o extrativismo predatório; ajuda e incentivos a manutenção do patrimônio e da biodiversidade preservada pelos produtores rurais. E encontrar meios de cobrar dos beneficiários, urbe et orbi, pelos serviços ambientais da preservação da nossa Amazônia.

Manter a integridade desse imenso patrimônio natural, sobretudo face a atividades ilegais, exige mais recursos e menos alarme.

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Pesquisas desenvolvidas no Brasil e no exterior apontam para a possibilidade de mudanças climáticas extremas sub-meterem a Floresta Amazônica a um processo de savanização. Nesse cenário, o ecossistema como é conhecido atualmente daria lugar a campos ralos e árvores esparsas, paisagem seme-lhante à encontrada nas savanas africanas ou no Cerrado. Tal hipótese, formulada há 20 anos e que indica para a perda da maior floresta tropical do mundo, deveria estar deixando os governos dos 9 países amazônicos “de cabelo em pé”.

Ocorre que os cientistas ainda têm várias incertezas acerca dessa projeção. Diante dessas dúvidas, o que é mais indicado fazer: aguardar, adotar medidas mitigadoras ou estabelecer ações de adaptação da população da região (30 milhões de pessoas) que seriam benéficas ambiental e socialmente, mesmo que a previsão não venha a se concretizar? A resposta a estas questões estão num artigo que acaba de ser publicado pelo PNAS, da Academia Nacional de Ciências dos EUA.

O primeiro autor é o ecólogo David Montenegro Lapola, pesquisador do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Cli-máticas Aplicadas à Agricultura (CEPAGRI) da Unicamp. Além dele, 11 cientistas brasileiros e estrangeiros assinam o artigo, que revisa os estudos publicados em torno da hipótese de savanização da Floresta Amazônica. “Como existem muitas incertezas acerca dessa possibilidade, nós procuramos responder a uma pergunta objetiva: o que fazer frente a esse risco? Ana-lisamos 3 alternativas e estimamos os custos socioeconômicos relacionados a cada uma delas”, explica Lapola.

De acordo com o pesquisador, a alternativa mais exequível é a adoção de ações adaptativas que possam trazer benefícios ambientais e sociais à região amazônica, mesmo que não ocorra o processo de savanização da floresta. “Nós aponta-mos 20 medidas que seriam importantes nesse sentido, a um custo estimado de US$ 122 bilhões. Entre elas estão o uso de cultivares mais resistentes à situação de seca, o incentivo à produção doméstica de energia por meio do uso de painéis solares e a ampliação da arborização nas áreas urbanas. Tam-bém indicamos a necessidade da eliminação do esgoto a céu aberto, como forma de reduzir a proliferação de doenças, e a criação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Amazonas, que teria a atribuição de gerenciar os recursos hídricos da região”, elenca Lapola.

Todas essas providências, pontua o pesquisador do CEPAGRI-Unicamp, trariam ganhos imediatos e continuariam a ser importantes no caso de o processo de savanização da Amazônia se confirmar. Uma opção à estratégia de adaptação, conforme o ecólogo, seria a adoção de medidas mitigadoras. Dentre elas está a reversão da mudança climática global em curso no planeta – causa da possível savanização da Amazônia -, que seria um processo muito mais complexo e exigiria um esforço global, e não somente dos nove países amazônicos.

Risco de savanização exige providência na Amazônia

Manuel Alves Filho | Jornalista da Unicamp

“Pelas nossas projeções, o custo de um projeto dessa enver-gadura seria da ordem de US$ 64,2 bilhões. Isso implicaria acabar com o desmatamento e recuperar os 17% ou 18% da floresta que já foram degradados”, afirma. Ocorre, continua o cientista, que isso não seria suficiente para assegurar a resi-liência da floresta frente às mudanças do clima. “Não basta parar de desmatar e recuperar o que já foi degradado. Se os demais países, principalmente as grandes potências mundiais, continuarem emitindo GEE nos patamares atuais, a floresta continuará exposta ao risco de colapso”, pondera. A pior das alternativas, conforme o estudo publicado pela PNAS, seria não fazer nada e esperar para ver o que acontece. Nesse caso, 30 anos depois de configurada a savanização, os prejuízos alcançariam a cifra de US$ 957 bilhões a US$ 3,5 trilhões.

Ficar impassível diante de tais projeções, reforça Lapola, é a pior das decisões. “Vale lembrar que esses cenários foram delineados com base em episódios de secas ocorridos na Amazônia ao longo dos últimos anos, situação que se tornará frequente em caso de savanização. Ou seja, nossas análises estão sustentadas por evidências fartamente documentadas, como as secas de 2005, 2010 e 2016”. Lapola observa, ainda, que o fato de o artigo sobre o estudo ter sido publicado neste momento de transição política no Brasil não foi proposital.

Ele considera, entretanto, que o resultado do trabalho for-nece dados importantes para que a sociedade e o futuro governo em âmbito federal reflitam sobre as questões ambientais, que trazem impactos tanto sociais quanto econômicos para o país. “O Brasil precisa decidir que caminho quer adotar em relação a esse problema. A Amazônia é o maior tesouro biológico do mundo e nós estamos correndo sério risco de perdê-la – por causa das mudanças do clima ou pelo corte raso – antes que tenhamos aprendido a usar esse tesouro de maneira sustentável a nosso favor. O estudo fornece bases sólidas para ajudar a orientar a tomada de decisão”, analisa Lapola.

Boa parte dos dados que subsidiaram o estudo foi pro-duzida pelo AmazonFace, programa financiado pelo Minis-tério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). O pesquisador do CEPAGRI-Unicamp é o presidente do Comitê Científico do programa, que investiga os impactos das mudanças climáticas no futuro da Floresta Amazônica.

Entre as missões dos cientistas está predizer se, a despeito da tendência do aumento da concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera e do possível agravamento das mudanças climáticas, a floresta será capaz de se mostrar ou não resiliente, ou seja, de resistir a essas situações adversas, mantendo-se produtiva e sem perda significativa de biomassa e biodiversidade.A

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* José Monserrat Filho também é Vice-presidente da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial, ex-Chefe da Assessoria de Cooperação Internacional do Ministério da Ciência e Tecnologia (2007/11) e da Agência Espacial Brasileira (2011/15), Diretor Honorário do Instituto Internacional de Direito Espacial e Membro Pleno da Academia Internacional de Astronáutica. Ex-diretor da revista Ciência Hoje e ex-editor do Jornal da Ciência, da SBPC, autor de “Política e Direito na Era Espacial – Podemos ser mais justos no Espaço do que na Terra?”.

José Monserrat Filho | Jornalista e Mestre em Direito Internacional*

“Nós, os Povos das Nações Unidas, resolvidos... a praticar a tolerância e viver em paz, uns com outros e viver em paz, como bons vizinhos e unir nossas forças para manter a paz e a segurança internacionais e garantir, pela aceitação de princípios e a ins-tituição de métodos, que a força armada não será usada, a não ser no interesse comum, e promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla.”

Carta das Nações Unidas, de 19451

Há boas chances para que entre em vigor, já em 2019, o Tratado para a Proibição de Armas Nucleares (TPNW – Treaty on the Prohibition of Nuclear Weapons), aprovado em 7 de Julho de 2017 por 122 Estados em Conferência diplomática da Organização das Nações Unidas (ONU), com o propósito de promover a visão de um mundo livre de armas nucleares.

Foram 122 votos a favor, um contra, dos Países Baixos (Holanda), país que guarda as armas nucleares dos EUA/OTAN – Organização do Atlântico Norte –, e uma abstenção de Singapura, um dos pequenos países mais ricos da Ásia, aliado dos EUA.

O anúncio da agência Reuters, em Genebra, sobre este fato baseia-se em notícia divulgada pelo Monitor de Proibição de Armas Nucleares, publicado pela Norwegian People’s Aid (Ajuda Popular Norueguesa), organização social que acompanha o avanço do processo de assinatura, ratificação e entrada em vigor do novo Tratado.

Já ratificado por 19 países, o Tratado precisa de 50 rati-ficações para ser considerado obrigatório entre seus Estados signatários e, assim, ganhar o prestígio de documento válido (ainda que parcialmente) no Direito Internacional Público.

Beatrice Fihn, diretora executiva da Campanha Interna-cional para Abolir Armas Nucleares, que ganhou o Prêmio Nobel da Paz de 2017, informou à Reuters que há cerca de 25 a 30 países prontos para ratificar o Tratado ao longo de 2019, o que permitiria, já no ano que vem, ultrapassar a marca indispensável de 50 países ratificantes.

Proibição de armas nucleares pode virar Lei em 2019

O Tratado para a Proibição de Armas Nucleares (TPNW) considera as armas nucleares na mesma categoria de ‘foras da lei’ (outlaw), onde estão as armas biológicas, o gás venenoso, as minas terrestres e as munições proibidas por tratados. O Monitor adverte que o TPNW vai estigmatizar ainda mais as armas nucleares e os países que ignoram o tratado.

O TPNW também proíbe o desenvolvimento, teste, posse, hospedagem, uso e ameaça de uso de armas nucleares. Veda ainda assistir, encorajar ou induzir esses atos proibidos. Ademais, “codifica normas e ações necessárias para criar e manter um mundo sem armas nucleares”, explica o Monitor, que pode ser consultado em www.banmonitor.org.

As armas nucleares são tão terríveis que, não raro, pro-vocam a mudança de posição de seus antigos e conhecidos defensores. Um dos casos mais famosos é o de Paul Nitze (1907-2004), ex-assessor estrategista de Presidente Ronald Reagan (1911-2004), que governou os Estados Unidos de 1981 a 1989. Secretário da Marinha e depois Vice-Secretário de Defesa, Nitze elaborou e implementou planos de guerra nuclear. Foi o responsável pela criação das primeiras bombas de hidrogênio do mundo e pelo aumento em grande escala dos arsenais nucleares.

Mas, alguns anos antes de morrer, ele mudou de opinião e escreveu: “Não vejo nenhuma razão convincente para não nos livrarmos unilateralmente de nossas armas nucleares. Mantê-los é caro e não acrescenta nada à nossa segurança”. Em 29 de outubro de 1999, Nitze declarou ao jornal The New York Times: “Não consigo pensar em nenhuma circuns-tância em que seria sensato os Estados Unidos usarem armas nucleares”, mesmo em retaliação a seu uso anterior contra nós. As já agora antigas palavras de Paul Nitze serviram de resposta à declaração da Embaixadora dos Estados Unidos na Organização das Nações Unidas Nikki Haley, feita no dia 27 de Março de 2017.

Ela disse: “Não podemos dizer honestamente que prote-gemos o nosso povo permitindo a maus atores disporem de armas nucleares, e não permitindo o mesmo aos bons, que apenas tentam manter a paz e a segurança”. Nitze consideraria as palavras de Nikki Haley arcaicas e risíveis em vista da ação devastadora das armas não-nucleares disponíveis no Pentá-gono. Ele repetiria uma frase dita antes, quando já pensava diferente: “Em vista de que podemos alcançar nossos objetivos com armas convencionais, não há razão para atingi-los com o uso de nosso arsenal nuclear”.

Daí que os países hoje detentores de armas nucleares poderiam adotar o novo tratado de proibição aproveitando um argumento de Nitze: “A destruição das armas não se mostrou viável [em 1982], mas não há uma boa razão para que isso não seja feito agora”.2

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A Força Espacial de Trump pode ser engavetada

O plano de criar uma Força Espacial, para proteger os interesses espaciais estratégicos dos Estados Unidos, está ameaçado de sucumbir, apesar de ter sido anunciado com pompa e circunstância em junho passado (há apenas seis meses) pelo Presidente Trump. A Força Espacial seria o sexto ramo das Forças Armadas norte-americanas e gozaria de plena autonomia.

Segundo o prestigiado jornal online Defense One, edi-ção de 28 de Novembro, quinta-feira, citando fontes “bem informadas” do Pentágono (Departamento de Defesa dos Estados Unidos), não há condições para tornar realidade o projeto do atual inquilino da Casa Branca, embora muitos o vejam como poderoso e implacável. Técnicos do Pentágono encarregados de elaborar a arquitetura do plano têm traba-lhado com afinco. Agora, porém, sob a orientação do Salão Oval, eles se empenham em considerar diferentes modos de reorganizar as ações espaciais dos militares.

São quatro as alternativas de soluções imaginadas pelo pessoal especializado do Pentágono:

1) Corpo espacial da Força Aérea que incluiria apenas ativos da própria Força Aérea;

2) Corpo espacial da Força Aérea que também agregaria tropas e bens do Exército e da Marinha relacionados ao espaço;

3) Serviço independente formado pela Força Aérea, Exército e Marinha; ou

4) Serviço independente formado pela Força Aérea, Exército e Marinha, que contaria com mais elementos das suas comunidades de inteligência.

A Força Aérea, como se vê, é muito forte. Ainda neste mês de Dezembro, todas essas alternativas serão debatidas pelo Vice-Presidente dos EUA, Michael Pence, e pelo Primeiro Vice-Secretário de Defesa, Patrick Shanahan, informou o Defense One. O assunto é tão importante e controverso que autoridades do Departamento de Defesa e a Casa Branca tiraram o corpo fora quando a imprensa lhes solicitou um comentário a respeito das novas opções para a Força Espacial. Ninguém dos altos escalões se sentiu à vontade para opinar ou fazer um simples comentário.

Em 18 de Junho deste ano, o Presidente Trump, com grande ímpeto, comunicou a quem interessar pudesse que instruíra o Pentágono a lançar as bases de um sexto ramo das Forças Armadas, dedicado exclusivamente “a proteger os interesses norte-americanos no espaço exterior”.

Ele declarou, então: “Quando se trata de defender os EUA, não basta apenas a presença norte-americana no espaço. Pre-cisamos ter também o domínio norte-americano do espaço.” Ele discursava no importante Conselho Nacional do Espaço da Casa Branca. E anunciou: “Estou orientando o Departamento de Defesa e o Pentágono a iniciarem de imediato o processo de estabelecimento de uma Força Espacial como sexto ramo das Forças Armadas dos EUA”.

Pelo visto, a reação, pelo menos de alguns setores militares, não foi das melhores. A Secretária da Força Aérea, Heather Wilson, por exemplo, emitiu um memorando aos aviadores, alertando que a criação do novo ramo militar, ou seja, a missão de tornar realidade a Força Espacial, seria demorada e poderia custar no mínimo 13 bilhões de dólares. Foi talvez o primeiro sinal de oposição ao projeto. De lá para cá, pelo visto, a onda e a força de seus adversários só se ampliaram.

“A comunidade internacional já baniu as outras armas de destruição em massa, químicas e biológicas. Não há motivo para não buscar proibir, igualmente, as armas com maior poder destrutivo, capazes de exterminar a vida na Terra“, disse o Itamaraty, em nota emitida em 7 de Julho de 2017.3

Será que o Governo Bolsonaro seguirá por este caminho? Há sérias dúvidas a respeito. Basta ler o que tem se comen-tado sobre recentes declarações do futuro Chanceler Ernesto Araújo, escolhido pelo presidente eleito. O professor e Chefe do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Maurício Santoro, por exemplo, anotou: “As opiniões do novo Ministro são um ponto fora da curva, fora do debate civilizado mesmo entre governos bastante conservadores. O Embaixador Araújo nega pilares da agenda internacional contemporânea, como mudança climática e globalização. Sua afinidade ideológica é com as teorias da conspiração do submundo da Internet, não com as negociações nos fóruns multilaterais e nas chancelarias interlocutoras do Brasil.”4

1- Direito e Relações Internacionais, Vicente Marota Rangel (Editor), São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1993, pp. 28-56.2- John Laforge, co-diretor do Nukewatch, grupo de paz e justiça ambiental em Wisconsin, EUA, edita seu boletim informativo, Counterpuch. 07 11 20183- Nota do Itamaraty, de 07 de julho de 2017.4- “Itamaraty de terceira”, Johanns Eller, Jornal do Brasil, 18/11/2018, p. 15.

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Comissão aprova Política de Redução de Agrotóxicos

Bruno Taitson | Jornalista do WWF

A sociedade brasileira obteve uma importante vitória no último dia 4 de Dezembro deste ano. O PL 6670/2016, que institui a Política Nacional de Redução dos Agrotóxicos (PNARA), foi aprovado em Comissão Especial na Câmara dos Deputados.

O Projeto agora está em condições de ser votado no Plenário da Casa e, se trans-formado em Lei, garantirá incentivos à produção sus-tentável.

Maurício Voivodic, Dire-tor-Executivo do WWF-Bra-sil, reconheceu a importância da aprovação da PNARA na Comissão Especial. “Este avanço aconteceu em um contexto político complexo, o que nos traz a convicção de que políticas socioambientais podem avançar em nosso país. Trata-se de um projeto construído com ampla participação da sociedade civil, uma agenda positiva e extremamente relevante do ponto de vista da conservação do meio ambiente e do cuidado com a saúde pública”, analisou.

De acordo com o Deputado Federal Alessandro Molon, Presidente da Comissão, a aprovação da PNARA trata-se de uma vitória histórica. “É um projeto contra o veneno no prato de milhões de brasileiras e brasileiros. Estudos provam que boa parte dos casos de câncer decorrem do uso indiscriminado de agrotóxicos. É preciso agora que o Plenário aprove a Política Nacional de Redução dos Agrotóxicos, promovendo a saúde e a vida”, declarou o Deputado.

Ainda segundo Molon, a aprovação de um Projeto de iniciativa popular é importantíssimo e fortalece a demo-cracia brasileira. “A participação da sociedade melhora o parlamento”, concluiu.

Para o Deputado Nilto Tatto, relator do Projeto de Lei, a PNARA estabelece mecanismos para que a sociedade bra-sileira possa rediscutir o modelo agrícola atual, baseado na monocultura e no uso intensivo de agrotóxicos. “A PNARA vai abrir caminho para fomentar pesquisas de bioinseticidas, diminuir subsídios para o modelo atual, que tem base na apli-cação do veneno em larga escala, e estimular a perspectiva da agroecologia. Vai contribuir para que a agricultura orgânica ganhe escala”, avaliou.

Segundo Michel Santos, Coordenador do Programa de Políticas Públicas do WWF-Brasil, a sociedade deve, agora, cobrar dos parlamentares que a matéria seja aprovada também pelo Plenário da Casa. “Hoje é um dia para ser comemorado e para recu-perarmos a fé na democracia brasileira. Os deputados da Comissão Especial, de fato, agiram como representantes dos interesses da sociedade”, opinou Michel Santos.

A proposição é de ini-ciativa popular e teve, em sua elaboração, inúmeras contribuições da sociedade civil. O PL prevê o moni-toramento de resíduos de pesticidas em alimentos e na água, medidas econômicas e

financeiras para estimular a produção de insumos limpos, agroecológicos, orgânicos e de controle biológico, a pesquisa para o desenvolvimento de técnicas de produção sustentável e a assistência técnica adequada para quem queira produzir de forma sustentável, dentre outros dispositivos.

Votaram favoravelmente à PNARA os parlamentares:

Alessandro Molon (PSB-RJ) - Presidente da Comissão Nilto Tatto (PT-SP) - Relator do textoAliel Machado (PSB-PR)Arnaldo Jordy (PPS-PA)Augusto Carvalho (SD-DF)Bohn Gass (PT-RS)Carlos Gomes (PRB-RS)Celso Pansera (PT-RJ)Chico Alencar (PSOL-RJ)Heitor Schuch (PSB-RS)Ivan Valente (PSOL-SP)João Daniel (PT-SE)Marcon (PT-RS)Padre João (PT-MG)Professora Marcivânia (PCdoB-RS)Ricardo Izar (PP-SP)Subtenente Gonzaga (PDT-MG)Zenaide Maia (PHS-RS)

Alessandro Molon

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Capacidade instalada de energia eólica supera 14 GW

O Brasil acaba de ultrapassar a expressiva marca de 14 Gigawatts de capacidade instalada de energia eólica. Já são 14,34 GW de capacidade instalada em 568 parques eólicos e mais de 7.000 aerogeradores em 12 Estados.

Na “safra dos ventos”, período que vai dos meses de Junho a Novembro, a geração eólica já atende quase 14 por cento do Brasil e mais de 70 por cento do Nordeste em alguns dias. Para comparação, podemos, por exemplo, citar que esta é a mesma capacidade instalada de Itaipu, a maior usina hidre-létrica do Brasil.

A fonte eólica tem mostrado um crescimento consistente, passando de menos de 1 GW no ano 2011 para os 14 GW de agora, completamente conectados à rede de transmissão. Em média, a energia gerada por estas eólicas equivale atualmente ao consumo residencial médio de cerca de 26 milhões de habitações (80 milhões de pessoas).

“Gosto sempre de lembrar que o Brasil passou do 15º lugar no Ranking de Capacidade Instalada de energia eólica em 2012 para a 8ª posição no ano passado, segundo o Global Wind Energy Council. Também é importante mencionar que, no ano passado, a Bloomberg New Energy Finance estimou o investimento do setor eólico no Brasil em US$ 3,57 bilhões (R$ 11,4 bilhões), representando 58% dos investimentos realizados em renováveis no País (eólica, solar, biomassa, biocombustíveis e resíduos, PCH e outros). Considerando o período de 2010 a 2017, o investimento já passa dos US$ 30 bilhões. Estes são alguns dos dados que mostram a importância do setor eólico, nossa capacidade de crescer, fazer investimentos e trazer benefícios para o Brasil”, explica Elbia Gannoum, Presidente Executiva da ABEEólica.

A energia eólica já está chegando a atender quase 14% do Sistema Interligado Nacional – SIN (o SIN atende pratica-mente todo o País e é constituído por quatro subsistemas: Sul, Sudeste/Centro-Oeste, Nordeste e a maior parte da região Norte). O dado está no último Boletim Mensal de Dados do ONS, referente ao mês de setembro e que mostra que, no dia 19 de Setembro, uma quarta-feira, a energia eólica chegou ao percentual de 13,98% de atendimento recorde do SIN.

No caso específico do Nordeste, os recordes de atendi-mentos a carga já ultrapassam 70%. O dado mais recente de recorde da região é do dia 13 de Setembro, uma quinta-feira, quando 74,12% da demanda foi atendida pela energia eólica, com geração média diária de 7.839,65 MWmed e fator de capacidade de 76,58%. Nesta data, houve uma máxima às 8h, com 82,34% de atendimento da demanda e 85,98% de fator de capacidade. Vale mencionar também que, nesse mesmo dia, o Nordeste foi exportador de energia durante todo dia, uma realidade totalmente oposta ao histórico do submercado que é por natureza importador de energia.

Selma Bellini | Jornalista da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica)

Nos primeiros oito meses do ano de 2018, as eólicas geraram uma quantidade de energia 19% superior ao gerado no mesmo período do ano passado, de acordo com dados consolidados do boletim InfoMercado mensal da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica. A CCEE também informou que durante o mês de agosto, as usinas eólicas regis-traram a maior produção de energia da história ao alcançar 7.017 MW médios. A produção elevou a representatividade da fonte, em relação a toda energia gerada no período pelas usinas do Sistema, para 11,5% em 2018.

Até 2024, serão instalados mais 4,46 GW em 186 novos parques eólicos, levando o setor à marca de 18,80 GW, con-siderando apenas leilões já realizados e contratos firmados no mercado livre. Com novos leilões, estes montantes se elevarão. “Sobre novas contratações e sobre o futuro da energia eólica, acho sempre importante explicar que nossa matriz tem a admirável qualidade de ser diversificada e assim deve conti-nuar. Cada fonte tem seus méritos e precisamos de todas. É preciso que isso fique claro. Do lado da energia eólica, o que podemos dizer é que a escolha de sua contratação faz sentido do ponto de vista técnico, social, ambiental e econômico, já que tem sido a mais competitiva nos últimos leilões. Além disso, acreditamos ser uma escolha lúcida quando se tem ideais de uma sociedade mais justa e de um futuro mais sustentável e de respeito à natureza”, explica Elbia Gannoum.

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Para produzir energia eólica, são necessários bons ventos: estáveis, com a intensidade certa e sem mudanças bruscas de velocidade ou de direção. O Brasil tem a sorte de ter uma quantidade enorme deste tipo de vento, o que explica em grande medida o sucesso da eólica nos últimos anos. Podemos citar que a média mundial do fator de capacidade (medida de produtividade do setor) está em torno de 25%. No Brasil, nos últimos 12 meses (de 9/2017 a 8/2018), o fator de capacidade médio foi de 42,5%, atingindo picos de superiores a 60% num mês e passando dos 80% no caso dos recordes registrados pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) no Nordeste em um dia.

O sucesso da energia eólica no Brasil

Um outro ponto favorável do desenvolvimento da fonte eólica no Brasil é o fato de a cadeia produtiva ser 80% nacionalizada gerando empregos aqui e produzindo com alta tecnologia e investimento.

“Todos estes números positivos mostram não apenas um setor consolidado, mas também que a energia eólica tem um futuro promissor no Brasil. A energia produzida pelos ventos é renovável; não polui; possui baixíssimo impacto ambiental; contribui para que o Brasil cumpra o Acordo do Clima; não emite dióxido de carbono (CO2)em sua operação; tem um dos melhores custos benefícios na tarifa de energia; permite que os proprietários de terras onde estão os aerogeradores tenham outras atividades na mesma terra; gera renda por meio do pagamento de arrendamentos; promove a fixação do homem no campo com desenvolvimento sustentável; gera empregos que vão desde a fábrica até as regiões mais remotas onde estão os parques e incentivam o turismo ao promover desenvolvimento regional”, explica Elbia Gannoum, resumindo o pensamento da ABEEólica.

A ABEEólica congrega mais de 100 empresas de toda a cadeia produtiva do setor eólico e tem como principal objetivo trabalhar pelo crescimento, consolidação e sustentabilidade dessa indústria no Brasil.

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Procuradores-gerais de 16 países aprovaram, no dia 25/11, em Brasília, o estatuto do Instituto Global do Ministério Público para o Ambiente. Foram cerca de cinco horas de debates para concluir o texto final que define a natureza, o âmbito, a sede, os objetivos, os membros participantes, entre outros aspectos.

Idealizadora do Instituto, a Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, afirmou que a questão ambiental está interconectada e, por isso, sua proteção deve ser inter-continental. “Trabalhar pelo ambiente não é uma escolha ideológica, mas um dever humanitário, previsto, inclusive, no Artigo 225 da Constituição brasileira, que estabelece o direito do cidadão ao ambiente ecologicamente equilibrado”, pontuou. O documento foi aprovado menos de um ano após o anúncio da criação pela Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge.

Convidado para a reunião, o Ministro do Superior Tri-bunal de Justiça (STJ) Herman Benjamin, que faz parte do Instituto Judicial Global do Ambiente, falou sobre a agilidade da aprovação do estatuto. “O Judiciário demorou quatro anos para criar sua entidade. Raquel Dodge conseguiu, em menos de um ano, transformar a ideia em realidade no âmbito do Ministério Público. A criação do Instituto, que desempenhará grandes funções, mostra o compromisso dos MPs com a sociedade”, enfatizou o Ministro. O momento é histórico, segundo Nívio de Freitas Filho, coordenador da Câmara de Coordenação e Revisão (6CCR) do MPF, que trata da temática ambiental e do Patrimônio Cultural. “O Instituto permitirá atuação conjunta dos MPs contra crimes ambientais. Nesta área, o crime também não tem fronteiras, por isso, é importante que o combatamos por meio da coo-peração entre os países”, enfatizou.

Aprovado estatuto do Instituto Global do MP para o Ambiente

Rayssa Soares Brito | Jornalista do Ministério Público

De acordo com estatuto aprovado, o Instituto tem como missão apoiar o papel do MP – nas esferas civil e criminal – no desenvolvimento, implantação, aplicação e execução da legisla-ção ambiental, e ainda, na promoção da norma jurídica sobre o ambiente e da distribuição equitativa dos ônus e benefícios ambientais. Serve também ao interesse público, sendo uma associação sem fins lucrativos e de caráter beneficente.

Para o Procurador-Geral da Bolívia, Fausto Juan Lan-chipa Ponce, o Instituto Global do Ministério Público para o Ambiente representa benefício para toda a humanidade. “Por isso, devemos, como representantes do MP, colocar todos os esforços e nossa capacidade em favor do meio ambiente, visando sua proteção”, disse durante os debates. Já o Procurador-Geral de Guiné-Bissau, Bacar Biai, destacou que a iniciativa de se criar o Instituto é de suma importância porque é um dever do Estado proteger o ambiente e reconhecer o MP como o órgão competente em sua defesa. “Entendo que a prevenção e a proteção ao meio ambiente tem de ser uma batalha para além dos limites das fronteiras. Por isso, esse esforço de diferentes MPs nos encoraja a lutar contra os danos ambientais e pela proteção ao ambiente”.

Também participaram: Andressa de Oliveira Lanchottio, representante da Comissão Permanente do Meio Ambiente, Habitação, Urbanismo e Patrimônio Cultural; Luís Fernando Barreto e José Eduardo Ismael Lutt, Presidente e Vice da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente. “Com a interdisciplinaridade e a globalização, ter uma construção coletiva do Instituto Global do MP para o Ambiente, com a participação de vários países enriquece o nosso trabalho. Esse tipo de ação é essencial para se garantir o direito das pessoas, às vezes, anônimas, que não são visíveis para a Justiça nem para a sociedade”, ressaltou Barreto.

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