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Antibiótico, e não hormônio, é o maior risco em carnes e frangos Especialistas temem efeito de medicamentos usados na criação e propõem regulação POR ELIANE OLIVEIRA / CRISTIANE BONFANTI 10/08/2014 7:00 A comerciante Eugênia Alves Santana: ‘no interior da Bahia, frango demorava três meses para ser abatido’ -Jorge William BRASÍLIA - Você é daquelas pessoas resignadas, que comem frango pensando que estão ingerindo um monte de hormônios? Se é, faz parte da maioria dos brasileiros. Nada menos do que 72% dos consumidores que compram o produto têm essa percepção, segundo pesquisa da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). O que muitos não

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Antibiótico, e não hormônio, é o maior risco em carnes e frangos

Especialistas temem efeito de medicamentos usados na criação e propõem regulação

POR ELIANE OLIVEIRA / CRISTIANE BONFANTI 10/08/2014 7:00

A comerciante Eugênia Alves Santana: ‘no interior da Bahia, frango demorava três meses para ser abatido’ -Jorge William

BRASÍLIA - Você é daquelas pessoas resignadas, que comem frango

pensando que estão ingerindo um monte de hormônios? Se é, faz parte

da maioria dos brasileiros. Nada menos do que 72% dos consumidores

que compram o produto têm essa percepção, segundo pesquisa da

Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). O que muitos não

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sabem é que isso não passa de um mito, garantem governo e

especialistas. Não há hormônios nesses alimentos. Na verdade, a

grande preocupação hoje no consumo de carnes em geral é com o uso

de antibióticos nos animais vivos. Uma avaliação que ganha força é que

esses fármacos podem contribuir para o surgimento de bactérias e

outros microorganismos cada vez mais resistentes a remédios.

As autoridades sanitárias impõem restrições, tanto em relação aos

produtos que podem ser utilizados, quanto ao período de carência

entre a aplicação e o uso de alimentos oriundos desses chamados

animais de fazenda. No entanto, especialistas alertam para a

necessidade de se reduzir o volume de medicamentos, que vem

crescendo em todo o mundo.

“A resistência aos antibióticos está se desenvolvendo e se espalhando a

uma velocidade que não pode ser contida (...) Se não forem tomadas

medidas urgentes para reduzir o consumo global de antibióticos,

podemos enfrentar um regresso a uma era na qual as infecções simples

podem matar", alerta a ONG Consumers International, que congrega

240 organizações de defesa de consumidores, de 120 países.

A comerciante Eugênia Alves Santana, 34, acha que há aditivos nos

alimentos, mas não mudou seus hábitos de consumo por isso. Em casa,

consome frango três vezes por semana, come carne vermelha duas, e

peixe, uma vez.

— Fui criada no interior da Bahia e, lá, víamos um frango demorar três

meses para ser abatido. Agora, acho que eles crescem muito rápido —

observou.

IDEC VÊ FISCALIZAÇÃO INSUFICIENTE

Segundo o coordenador geral de inspeção do Ministério da Agricultura

(Mapa), Luiz Marcelo Martins Araújo, é permanente a fiscalização da

presença de resíduos e contaminantes dos alimentos, por meio da

análise de amostras, para a verificação de substâncias proibidas ou em

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concentrações acima das permitidas. No caso de hormônios, frisou

Araújo, a utilização dos produtos jamais foi permitida no Brasil.

— Embora permitido o seu uso, os antibióticos, quando administrados

aos animais de produção, trazem consigo a obrigatoriedade de que seja

cumprido um período durante o qual a substância é eliminada do

organismo animal, possibilitando que o consumo dos produtos não

carregue consigo essas substâncias — explicou o técnico.

A nutricionista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec),

Ana Paula Borboletto, concorda que a presença de resíduos é quase

inexistente, com base em uma pesquisa feita pela própria instituição

em frangos congelados há alguns anos. Porém, não é essa a

preocupação do instituto.

— A questão não é a presença de resíduos. Apesar de sabermos que há

normas específicas que permitem o uso de antibióticos em animais,

sabemos que a fiscalização é insuficiente e nem sempre é garantido que

o medicamento foi utilizado em quantidade adequada. Mesmo em

quantidades mínimas, os antibióticos podem causar problema no

futuro — disse a nutricionista.

Uma forma de melhorar esse cenário, avalia, seria a consolidação de

um sistema de rastreabilidade dos alimentos. Ana Paula avalia que a

cadeia produtiva não tem esse controle. Outro caminho, disse, seria o

consumidor optar pela carne orgânica, livre de antibióticos. Só que o

produto é mais caro do que o convencional. Levantamento feito pelo

GLOBO em um supermercado mostra que um frango da mesma marca

pode ser até 18% mais caro por ser orgânico.

O zootecnista e especialista em nutrição animal da Universidade de

Brasília (UnB) Sergio Lucio Salomon Cabral Filho reforçou que o risco

não consiste na existência de resíduos de antibiótico nas carnes, mas

no surgimento de bactérias mais resistentes nos animais e no

consequente contato com o ser humano pelo consumo. Segundo ele,

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nos Estados Unidos, onde a maioria dos bovinos é criada em

confinamento, o antibiótico é usado como promotor do crescimento em

cerca de 60% dos casos.

No Brasil, observou, o índice de utilização dessas substâncias com o

objetivo de promover o crescimento deve ficar perto de 15%. Mas há os

casos de sua administração para prevenir e combater doenças. No caso

dos frangos, o antibiótico é utilizado em quase toda a produção, tanto

com objetivo terapêutico quanto de promover o crescimento, ao

diminuir a população de patógenos no intestino das aves e melhorar a

absorção de nutrientes. De acordo com o zootecnista, países como a

Dinamarca proibiram o uso de antibióticos em animais com a

finalidade de promover o crescimento.

— Hoje, os produtores trabalham com doses aceitáveis de antibióticos e

os resíduos que ficam são em proporção aceitável para o consumo

humano. Mas o problema é o surgimento de bactérias mais resistentes

— disse Cabral Filho, que defendeu o desenvolvimento de políticas

públicas no Brasil para o controle do uso dessas substâncias.

O empresário Paulo Cesar Thibes, sócio-diretor da Frangos Pioneiro,

garante que os antibióticos são de uso profilático, para prevenir ou

atenuar doenças, "uma realidade em vários países produtores de carne

de frango":

— Mercados exigentes, como União Europeia e Japão, estão entre os

importadores de carne de frango do Brasil. Tudo isso mostra que o

produto ofertado ao consumidor brasileiro é da mais alta qualidade,

sem qualquer risco para o seu consumo. Não é por acaso que a carne de

frango é a mais consumida no Brasil e na maior parte do mundo.

SEM HORMÔNIOS, AVES ABATIDAS COM 45 DIAS

Os dados da ABPA mostram que, de fato, embora 72% das pessoas

acredite que há hormônios de crescimento nos frangos, continuam

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consumindo aves por considerar que são mais saudáveis que a carne

vermelha, perdendo apenas para os peixes.

O militar Nicomedes Cardoso Menezes Neto, 57, come peixe pelo

menos três vezes por semana, e frango, a cada 15 dias. E apesar dos

dados, não acredita que os produtores não usem hormônios:

— Com certeza, aplicam hormônios. É só olhar a cor da carne —

afirmou.

A dona de casa Helenita Alves Coelho, 76, e seu filho Romerito Coelho,

50, também acreditam que há hormônios. Em sua casa, consomem

frango quase todos os dias, mas optam pelo caipira:

— Prefiro, inclusive plantar porque considero mais saudável. Acredito

que há hormônios na ração dos frangos, pois eles crescem muito

rápido.

A ABPA tem promovido eventos com médicos e nutrólogos, para

desfazer o mito sobre os hormônios e informar os profissionais de

saúde. De acordo com o diretor de produção da associação, Ariel

Antônio Mendes, existe melhoramento genético, na nutrição e no meio

ambiente dos galpões, o que permite que as aves sejam abatidas com

45 dias.

O diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias

Exportadoras de Carne (Abiec), Fernando Sampaio, disse que, no caso

dos bovinos, o fato de o Brasil produzir com foco na exportação

contribui para a preocupação com a qualidade.

— No Brasil, é proibido usar hormônio. Além disso, não temos

interesse nenhum em usá-los. Isso pode ameaçar o mercado de

exportação — disse.

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consumidor/antibiotico-nao-hormonio-o-maior-risco-em-carnes-frangos-

13551827#ixzz3A2mAV4P0

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ONG internacional defende marco regulatório para antibióticos em animais

Estudos mostram que maioria dos medicamentos tem o objetivo de estimular crescimento rápido

POR ELIANE OLIVEIRA 10/08/2014 7:00

BRASÍLIA - O uso de antibióticos é uma realidade em todo o planeta.

Dados da ONG Consumers International (CI) mostram que cerca de

metade desses medicamentos que são produzidos no mundo é usada na

agricultura. A maioria deles tem o objetivo de estimular o crescimento

mais rápido e prevenir — em vez de tratar — enfermidades.

Estudos que comparam as bactérias dos animais de granja que

consomem antibióticos e as de criações orgânicas, em que não são

usados esses produtos, comprovam que as primeiras são bem mais

resistentes aos medicamento do que as do segundo caso. Esses micro-

organismos podem ser transmitidos aos seres humanos através do

consumo de comida contaminada, do contato direto com os animais ou

por meio de uma transmissão ambiental, por exemplo, da água ou do

solo.

A resistência bacteriana aos antibióticos está em alta em todos os

países. Estão incluídos micro-organismos patogênicos, ou seja, que

causam doenças, ao serem ingeridos junto com alimentos

contaminados, como as bactérias E. coli, Salmonella e Campylobacter.

Com esses causadores de doenças mais resistentes, aumentam as

enfermidades graves.

A CI alerta que poucos países contam com sistemas para controlar o

uso de antibióticos em animais. O estabelecimento de um marco

regulatório para a autorização e controle de qualidade dos

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medicamentos é uma proposta defendida pela organização. Outra é a

eliminação dos incentivos financeiros para os veterinários que receitam

esses remédios.

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internacional-defende-marco-regulatorio-para-antibioticos-em-animais-

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