Apostila 1 Introdução Aos Estudos Tradutológicos

  • Upload
    cah

  • View
    227

  • Download
    0

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Apostila com conteúdo sobre tradução e exercícios

Citation preview

INTRODUO AOS ESTUDOS TRADUTOLGICOS Profa. Nivia Marcello

Traduzindo a gente seentende

Traduzir preciso.Em todos os lugares a traduo est presente: nas mquinas, nos aparelhos eletrnicos, nos livros, nos programas de televiso, no cinema. E o tradutor profissional dispe das ferramentas necessrias para que seu texto se faa entender, dentro do contexto e com o nvel de exatido que lhe caiba.

Traduzir necessrio.Num mundo onde as fronteiras no impedem mais as relaes diretas entre as naes, o profissional da traduo estabelece um contato confivel entre elas, dirimindo dvidas, decidindo grandes negociaes, trazendo conhecimento. Torna o dilogo cultural possvel e proveitoso.

Um profissional capacitadofaz toda a diferenae evita dissabores. Ele entende as necessidades do cliente, identifica os tipos textuais e transpe a mensagem da maneira mais fiel possvel. Da literatura ao maquinrio pesado, a compreenso a chave do trabalho desse profissional.

Para tanto, so necessriosconhecimentos que vo alm dos idiomas:elementos culturais, conhecimentos especficos de cada rea do saber humano e aptides tecnolgicas garantem o melhor resultado.

PetRissattiPRACTICE

COMO ELABORAR RESUMOS

Fonte: http://www.pucrs.br/manualred/resumos.php. Acesso em 11 de janeiro de 2014.

O resumo tem por objetivo apresentar com fidelidade ideias ou fatos essenciais contidos num texto. Sua elaborao bastante complexa, j que envolve habilidades como leitura competente, anlise detalhada das ideias do autor, discriminao e hierarquizao dessas ideias e redao clara e objetiva do texto final. Em contrapartida, dominar a tcnica de fazer resumos de grande utilidade para qualquer atividade intelectual que envolva seleo e apresentao de fatos, processos, ideias, etc.

O resumo pode se apresentar de vrias formas, conforme o objetivo a que se destina. No sentido estrito, padro, deve reproduzir as opinies do autor do texto original, a ordem como essas so apresentadas e as articulaes lgicas do texto, sem emitir comentrios ou juzos de valor. Dito de outro modo, trata-se de reduzir o texto a uma frao da extenso original, mantendo sua estrutura e seus pontos essenciais.

Quando no h a exigncia de um resumo formal, o texto pode igualmente ser sintetizado de forma mais livre, com variantes na estrutura. Uma maneira iniciar com uma frase do tipo: "No texto ....., de ......, publicado em......., o autor apresenta/ discute/ analisa/ critica/ questiona ....... tal tema, posicionando-se .....". Esta forma tem a vantagem de dar ao leitor uma viso prvia e geral, orientando, assim, a compreenso de que segue. Este tipo de sntese pode, se for pertinente, vir acompanhada de comentrios e julgamentos sobre a posio do autor do texto e at sobre o tema desenvolvido.

Em qualquer tipo de resumo, entretanto, dois cuidados so indispensveis: buscar a essncia do texto e manter-se fiel s ideias do autor. Copiar partes do texto e fazer uma "colagem", sob a alegao de buscar fidelidade s ideias do autor no permitido, pois o resumo deve ser o resultado de um processo de "filtragem", uma (re)elaborao de quem resume. Se for conveniente utilizar excertos do original (para reforar algum ponto de vista, por exemplo), esses devem ser breves e estar identificados (autor e pgina).

Uma sequncia de passos eficiente para fazer um bom resumo a seguinte:

a. ler atentamente o texto a ser resumido, assinalando nele as idias que forem parecendo significativas primeira leitura;

b. identificar o gnero a que pertence o texto (uma narrativa, um texto opinativo, uma receita, um discurso poltico, um relato cmico, um dilogo, etc.

c. identificar a idia principal (s vezes, essa identificao demanda selees sucessivas, como nos concursos de beleza...);

d. identificar a organizao - articulaes e movimento - do texto (o modo como as idias secundrias se ligam logicamente principal);

e. identificar as idias secundrias e agrup-las em subconjuntos (por exemplo: segundo sua ligao com a principal, quando houver diferentes nveis de importncia; segundo pontos em comum, quando se perceberem subtemas);

f. identificar os principais recursos utilizados (exemplos, comparaes e outras vozes que ajudam a entender o texto, mas que no devem constar no resumo formal, apenas no livre, quando necessrio);

g. esquematizar o resultado desse processamento;

h. redigir o texto.

Evidentemente, alguns resumos so mais fceis de fazer do que outros, dependendo especialmente da organizao e da extenso do texto original. Assim, um texto no muito longo e cuja estrutura seja perceptvel primeira leitura, apresentar poucas dificuldades a quem resume. De todo modo, quem domina a tcnica - e esse domnio s se adquire na prtica - no encontrar obstculos na tarefa de resumir, qualquer que seja o tipo de texto.

Resumos so, igualmente, ferramentas teis ao estudo e memorizao de textos escritos. Alm disso, textos falados tambm so passveis de resumir. Anotaes de idias significativas ouvidas no decorrer de uma palestra, por exemplo, podem vir a constituir uma verso resumida de um texto oral. THEORY 1O QUE TRADUO

Fonte: CAMPOS, GEIR. O Que Traduo. So Paulo, Editora Brasiliense, 2007.

Os dicionrios costumam definir traduo como ato ou efeito de traduzir. Enquanto ato, leva o tempo que o tradutor emprega no seu trabalho; como efeito, o que resulta desse trabalho. E o que traduzir? O verbo traduzir vem do verbo latino traducere, que significa conduzir ou fazer passar de um lado para o outro, algo como atravessar. Quando, num livro sobre a Guerra das Glias, o autor escreve que Caesar omnem equitatum pontem traduxit, o que ele quer dizer que o imperador conduziu ou fez passar pela ponte toda a sua cavalaria. E traduzir nada mais que isto: fazer passar, de uma lngua para outra, um texto escrito na primeira delas. Quando o texto oral, falado, diz-se que h interpretao, e quem a realiza ento um intrprete.

A lngua em que um texto a traduzir original-mente escrito pode ter os nomes de lngua-fonte ou lngua de origem ou lngua de partida (em ingls source language, em alemo Ausgangsprach, em espanhol lengua de origen, em francs langue de dpart). A lngua para a qual se faz passar um texto originalmente escrito em outra pode chamar se lngua-meta ou lngua-alvo ou lngua-termo ou lngua de chegada (em ingls target language, em alemo Zielsprach, em espanhol lengua trmino, em francs langue darrive).

Cada lngua funciona como um cdigo. O conjunto dos signos de uma lngua constitui o seu lxico, o seu vocabulrio. O conjunto de regras que regem as combinaes dos signos de uma lngua constitui a sua sintaxe; os modos pelos quais podem criar-se novos signos de uma lngua constitui a sua morfologia. A sintaxe e a morfologia de uma lngua compem a sua gramtica. A traduo, enquanto passagem de um texto de uma lngua para outra, tem a ver ora com o lxico, ora com a sintaxe, ora com a morfologia, da lngua da qual se traduz, lngua-fonte, e da lngua para a qual se traduz, lngua-meta. Voltando ao verbo traduzir, o que o tradutor faz apenas isto: levar o leitor de uma lngua para o lado da lngua do autor estrangeiro, ou, inversamente, trazer o autor de uma lngua estrangeira para o lado da lngua do leitor.

Cada um desses caminhos requer procedimentos especiais, decorrentes de uma atitude

preliminar do tradutor: so dois caminhos que no se podem misturar, pois toda e qualquer mistura ou confluncia h de levar a encruzilhadas onde o que se espalha a farofa amarela das maiores confuses. Confuso, por sinal, o que parece no faltar quando se trata de traduo. Pode-se mesmo dizer que, biblicamente ao menos, a traduo nasceu de uma confuso.

Todo mundo conhece a histria bblica da Torre de Babel, uma torre que alguns homens queriam construir altssima com a pretenso de por ela chegarem ao cu; mas o Senhor dos Exrcitos no aprovou o projeto daqueles pretensiosos e resolveu atrapalhar a comunicao na Torre: fez que se confundissem as lnguas, um sem compreender o que outro queria dizer, e a incrvel construo ficou por terminar, a meio caminho do seu to almejado objetivo.

A Antiguidade desse mito bblico, que se l no Antigo Testamento, pode dar uma idia de como velha neste mundo a prtica da traduo; pois de imaginar-se que em pouco tempo comeasse a haver na Torre de Babel pessoas com certa capacidade de entenderem mais de uma lngua ao mesmo tempo, e que essas pessoas entrassem a atuar como elos de comunicao entre as que tinham lnguas diferentes, como intrpretes e tradutoras portanto. E desde a, desde os seus primrdios, a traduo teve sempre quem se pronunciasse a favor dela ou contra ela.

PRACTICE 1Leia o texto em Theory 1 (O que Traduo) e defina os conceitos abaixo utilizando a tcnica de resumos.

1. Traduzir

2. Lngua de partida3. Lngua de chegada4. Lxico

5. Sintaxe

6. Morfologia7. GramticaTHEORY 2UM POUCO DE HISTRIA

Fonte: CAMPOS, GEIR. O Que Traduo. So Paulo, Editora Brasiliense, 2007.

O documento mais famoso que se conhece da atividade tradutria na Antiguidade a Pedra de Rosetta: um fragmento de basalto, encontrado em 1799 nas escavaes que se faziam numa regio banhada pelo brao ocidental do rio Nilo. O lugar tinha o nome de Rosetta, e a pedra ficou com o nome do lugar onde foi encontrada. Na Pedra de Rosetta v-se um mesmo texto grafado de trs maneiras diferentes: em hierglifos da escrita sagrada do antigo Egito, em caracteres da lngua escrita popular egpcia da poca, e em caracteres gregos. Foi a partir do estudo dessa pedra que o francs Jean-Franois Champollion comeou a decifrar os hierglifos do Antigo Egito. A Pedra de Rosetta data do sculo II a.C. Mas sabe-se que o imperador Sharrukin, da Assria, trs sculos antes da era crist, j gostava de ter os seus feitos divulgados por escrito em todas as lnguas que se falavam no seu vasto imprio.

Sabe-se tambm que entre os babilnios e assrios e hititas existiam organizaes de escribas especializados, que escreviam em lnguas diversas; sabe-se tambm que no Antigo Imprio egpcio (2778-2160 a.C.) existiu o cargo pblico de intrprete-chefe; e que na sia Menor circulavam ou existiam glossrios bilngues ou plurilngues em tabuletas de terracota.

A primeira determinao legal de traduo ocorreu no ano 146, em Roma, quando o Senado romano mandou traduzir o tratado de agricultura do cartagins Mago. No sculo I antes da era crist, o romano Ccero refere-se traduo que ele mesmo fez dos Discursos do grego Demstenes, trazendo ento baila a questo da fidelidade s palavras ou ao pensamento do original. Cabe tambm mencionar a famosa Verso dos Setenta, por alguns denominada Septuaginta, que teve o texto do Antigo Testamento traduzido do hebraico para o grego por 72 sbios do Egito, por ordem do seu rei Ptolomeu Filadelfo. Durante a Idade Mdia a traduo esteve a servio da catequese religiosa e no faltou quem dissesse que cristianizar equivale a traduzir, nesse perodo da histria europeia: aonde chegava a Cristandade, logo se impunha o entendimento entre o idioma local e o adventcio.

Com o fim dos feudos, que se aglutinaram para formarem os reinos de maior extenso e poderio, comearam a afirmar-se as lnguas vernculas de cada nacionalidade. E no difcil imaginar que, entre povos de lnguas diferentes, comeassem logo a aparecer intrpretes e tradutores.

As idias passaram a ter maiores possibilidades de circulao graas inveno do prelo por Guttenberg, em 1440: a imprensa facilitava a reproduo do mesmo texto em muito maior nmero de cpias, naturalmente a preos bem mais acessveis. Em 1550 publicou-se um Dicionrio de Oito Lnguas (grego, latim, flamengo, francs, espanhol, italiano, ingls e alemo). do ano de 1596 a primeira traduo completa da Divina Comdia do italiano Dante Alighieri, pelo abade francs Balthazar Grangier.

Com o Renascimento, rompeu-se a tradio da versio medieval, muito apegada s palavras dos textos originais. So Jernimo chegara a declarar que nas Sagradas Escrituras... a prpria ordem das palavras constitui um mistrio, e as tradues deveriam apresentar um nmero de palavras igual ao dos respectivos originais, sem interpretaes pessoais capazes de deturparem o verbo divino.

O sculo XVII foi na Europa o domnio das tradues apelidadas as belas infiis, que se prendiam ao contedo e pouca ou nenhuma considerao tinham pela forma dos textos originais.

Na Rssia czarista, ao tempo de Pedro o Grande, criou se a primeira associao de tradutores, uma entidade oficial, que teve a sua rplica no-oficial na Sociedade Livre de Tradutores, surgida em 1768 e extinta em 1783.

Com o advento do romantismo literrio e artstico, as belas infiis perderam prestgio: foi j com um declarado respeito pela forma dos textos originais que Franois-Ren de Chateaubriand traduziu para o francs O Paraso Perdido do ingls John Milton, e Lecomte de Lisle traduziu tambm para o francs a Ilada do grego Homero.

No Brasil romntico traduziram-se fartamente os poetas alemes, Heine principalmente; mas eram tradues indiretas, do francs ou do espanhol, e os defeitos dessas tradues intermedirias no poderiam deixar de ter reflexos na qualidade das tradues brasileiras, que s mais tarde comearam a ser revistas ou refeitas a partir dos textos originais alemes. O mesmo aconteceu com obras de

autores russos, a comear com Pschkin e Dostoivski.

Em nosso sculo XX os tericos e prticos da traduo tm continuado a discutir e a divergir, como desde a Antiguidade, sem que se tenha chegado ainda a consenso sobre o assunto. Mas o avano das tecnologias, com irrefrevel tendncia a reduzir cada vez mais as distncias entre os pases, fazendo de todo o planeta aquela aldeia global a que se refere Marshall McLuhan, tem levado a estudos mais minuciosos da tradutologia ou da cincia da traduo, que os alemes dizem numa palavra s: Uebersetzungswissenschaft.

Foi principalmente em meados do sculo, na dcada de 50, que mais se estudaram os problemas da traduo. Essa azfama tradutolgica deveu-se a uma esperana que veio com a tecnologia: a esperana de que afinal se pudessem conseguir, com algum tipo especial de mquina, a rapidez e outros predicados da traduo, com que certamente sonham os usurios de textos traduzidos editores e outros e que os tradutores humanos dificilmente podem proporcionar.

Muito se estudou a traduo a partir da Informtica (processamento automtico da informao) e da Lingustica, mas a concluso a que se chegou foi a de que qualquer mquina s ser capaz de traduzir bem se for manipulada por um bom tradutor; e isso viria aumentar ainda mais, em vez de diminuir, os custos da traduo. A Lingustica, por seu turno, mostrou-se incapaz de prever ou evitar os erros de traduo, muito embora seja capaz de identific-los onde quer que apaream.

Mas no era bem isso o que se esperava descobrir. E as onerosas pesquisas de traduo por mquina foram sendo aos poucos abandonadas, embora aqui e ali prossigam umas quantas linhas de pesquisa, mais voltadas para a computao de repertrios de palavras. Tambm possvel que as pesquisas de traduo por computador voltem baila com as novas conquistas humanas no terreno da chamada inteligncia artificial, j numa quinta gerao de computadores.PRACTICE 2

Leia o texto em Theory 2 (Um Pouco de Histria) e resuma as principais informaes do texto sobre os seguintes tpicos:

1. Incio da histria da traduo2. Jean-Franois Champollion 3. Pedra de Roseta 4. As primeiras tradues de que se tem conhecimento 5. A traduo da Bblia entre 200 a 300 anos A.C. 6. As 72 tradues

7. A inveno da mquina de impresso

THEORY 3O QUE SE DIZ DA TRADUO

Fonte: CAMPOS, GEIR. O Que Traduo. So Paulo, Editora Brasiliense, 2007.

Desde sempre, em todos os tempos e lugares, tericos e praticantes tm dito o que pensam da traduo, do que ela ou do que deveria ser. So opinies que em muitos casos se contradizem, se desdizem, no s no acessrio como no essencial; contradies que enfim no bastam para impedir que os tradutores continuem a fazer o seu trabalho, com a sua prtica muitas vezes desmentindo a teoria.

A definio mais objetiva talvez a do ensasta ingls John Cunnison Catford: traduo a substituio de material textual de uma lngua por material textual equivalente em outra; por material textual entendem-se tanto os elementos de forma quanto os de contedo. E a definio menos objetiva talvez seja a da psicloga norte-americana Keith Bosley: traduo uma lngua fazendo amor com outra. Entre a primeira e a segunda, cabem muitas outras definies, umas a favor e outras contra. Dos que opinam contra a traduo, h quem diga que o principal argumento resume-se em que a traduo no o original.

De fato, se o leitor tiver a esperana de encontrar o texto original em qualquer traduo, por mais fiel que ela seja, ver frustrados os seus propsitos. Mesmo porque nenhuma traduo pode ter a pretenso de substituir o original: apenas uma tentativa de recriao dele. E sempre cabem outras tentativas. Pode-se dizer que, de um mesmo texto, podero existir tantas tradues aceitveis quantos forem os objetivos a que ele puder servir.

De uma pea teatral de William Shakespeare, por exemplo: to vlida uma traduo em linguagem rebuscada, cheia de expresses equivalentes s da lngua inglesa nas formas que apresentava ao tempo do famoso teatrlogo, com inmeras e teis explicaes em notas de p de pgina, para fins de estudo ou pesquisa em gabinete ou em sala de aula, quanto uma traduo na linguagem mais natural e fluente possvel, com as explicaes indispensveis inseridas nas falas dos

personagens, para fins de encenao no palco de um teatro, onde os espectadores no tm como averiguar o significado de certas palavras ou expresses.

De um texto cientfico ou tcnico, por outro lado, so to importantes as tradues feitas em jargo de especialistas, para fins ainda de pesquisa e estudo, quanto as tradues feitas em linguagem comum, para fins de divulgao do assunto entre leigos e curiosos. H quem diga, como o alemo Herder, que o melhor dos tradutores h de ser o melhor dos explicadores; diametralmente oposta a opinio do americano Vzquez- Ayora, para quem traduzir no explicar nem comentar coisa alguma.

O fato que, como dizem, no h povo to isolado que possa dispensar os servios da traduo. E as tradues afinal esto a mesmo, pondo em xeque as afirmaes de quem diz que traduo impossvel, que traduo no existe, coisas assim...

Pode-se comparar a traduo ao voo do besouro. O besouro um animal que tem tudo para no poder voar: o corpo rombudo, as patas no se recolhem, as asas so enfiadas num estojo de cascas duras... mas, apesar de todos os pesares, o besouro voa e muito. Com o tradutor d-se a mesma coisa: cada texto um complexo de obstculos e dificuldades aparentemente intransponveis,

lingusticas e no-lingusticas; entender o que o autor disse e o que ele quis dizer, na lngua dele, difcil; dizer na lngua da gente o que se entendeu na lngua do original, no fcil... mas o tradutor traduz e muito.

E quanto mais difcil parece um texto, maior o nmero de tradutores que se candidatam. Exemplo disso o famoso soneto de Arvers, quatorze linhas rimadas com que o cidado francs Felix dArvers que nem era um dos poetas maiores do seu pas ou do seu tempo, houve por bem cantar a prpria dor de cotovelo por amar uma mulher que j era de outro homem. Pois o tal soneto fez carreira: s no Brasil foi traduzido por mais de duzentos autores, sem contar as pardias e parfrases. A impresso que se tem a de que todo tradutor recebe como um desafio os versos de Arvers, e aceita esse desafio galhardamente, havendo mesmo quem os tenha traduzido mais de uma vez e em mais de uma forma.

Essa variedade de tradues de um mesmo texto elimina a ideia da exatido da traduo: se fossem todas exatas, haveriam de ser iguais todas as tradues de um mesmo texto, e jamais poderia o mesmo tradutor chegar a solues diferentes e todas aceitveis. Traduo completamente exata no existe escreve o norte-americano Werner Winter. Uma traduo deve ser correta, e no exata anui o francs Alfred Malblanc. A fidelidade o ponto mais importante de qualquer traduo diz o brasileiro Brenno Silveira.

A fidelidade outra das falcias da traduo retruca o hngaro Paulo Rnai, naturalizado brasileiro. O tradutor pe toda a sua glria em ser fiel aos mestres de sua escolha, fiel a ponto de anular sua prpria personalidade contrape o francs Valry Larbaud. Globalmente considerado, o problema da traduo consiste essencialmente em elaborar um texto fiel ao contedo do original, mas que d a impresso de ter sido escrito diretamente na lngua-meta tenta resumir o tambm francs Jean Maillot.

S quando arrancamos o leitor dos seus hbitos lingusticos e o obrigamos a mover-se nos do autor, que h propriamente traduo ope-se o espanhol Ortega y Gasset. E por a vo os tericos da traduo, dizendo uns, desdizendo outros. Mas tambm os prticos da traduo se assim se podem chamar aqueles para quem traduzir se aprende traduzindo, assim como nadando que se aprende a nadar emitem vez por outra algumas opinies, no menos discutveis nem menos contraditrias que as dos mais renomados tericos.

PRACTICE 3Leia o texto em Theory 3 (O que se Diz da Traduo) e resuma as principais informaes do texto sobre os seguintes tpicos:1. Material textual 2. O exemplo do besouro

3. As diversas opinies sobre traduo

THEORY 4AS ARMADILHAS DA TRADUOFonte: RONAI, Paulo. A Traduo Vivida. Rio de Janeiro: Editora Jos Olympio, 2012. O trabalho do tradutor passa por um caminho ladeado de armadilhas. At os melhores profissionais guardam a lembrana de algum tremendo contrassenso que cometeram. So diversas as causas de tais erros. Apesar de sua diversidade, a maioria provm, em ltima anlise, da nossa f na existncia autnoma das palavras e na convico inconsciente de que a cada palavra de uma lngua necessariamente corresponde outra noutra lngua qualquer.

Confirma essa iluso o recurso constante aos dicionrios, onde, por motivos de comodidade prtica, os vocbulos se acham em ordem alfabtica, soltos de contexto e seguidos de definio.

A palavra existe apenas dentro da frase, e o seu sentido depende dos demais elementos que entram na composio desta. Ainda que dois vocbulos de duas lnguas sejam definidos de maneira igual, os enunciados de que eles podem fazer parte no so os mesmos, nem as conotaes que evocam sero iguais.

Isto verdade mesmo no caso de palavras da mesma origem e de forma suficientemente prxima para revelar o parentesco primeira vista. Assim o nosso vocbulo "cpia" existe em francs, italiano e ingls sob forma quase igual, no sentido de "imitao", "reproduo". Mas copie em francs designa, alm disto, trabalho escrito de aluno, assim como manuscrito entregue tipografia de um jornal, acepes que faltam a copia em italiano e a copy em ingls; em compensao estas duas palavras possuem o sentido de exemplar, que falta em francs e portugus.

Uma das principais culpadas das cincadas de traduo a etimologia. O instinto etimologizador, que existe em todos ns, se um auxiliar precioso, pode tambm produzir enganos. Sem dvida, tinha razo de sobra Valery Larbaud ao escrever que a etimologia era o sal das lnguas literrias, pois s ela dava sabor e durao ao material verbal, acrescentando que tinha pena das pessoas que, no sabendo latim, ignoravam as etimologias. Para elas todas as palavras devem dar a impresso de no repousarem sobre nada, de puros e absurdos conglomerados convencionais de slabas, palavrasno ar; e a ortografia, com suas anomalias demasiadamente reais, deve parecer-lhes um quebra-cabea infernal. Efetivamente, no esprito de quem sabe do parentesco entre pre e paternel, mre e maternel, main e manceuure, estas palavrasesto motivadas e, portanto, de um emprego mais fcil. Essa mesma conscincia etimolgica permite, no raro, adivinhar a significao da palavra estrangeira vista pela primeira vez; mas como em duas lnguas da mesma famlia palavras da mesma origem tm quase sempre evoluo diferente, ela deve ser submetida a permanente controle. Uma pessoa francfona de instruo razovel facilmente descobrir o parentesco dos verbos prter e "prestar"; mas s o estudo e o exerccio do portugus lhe ensinaro que prter de l'argent no "prestar" e sim "emprestar dinheiro".

Em face da diferenciao nas noes, uma mesma palavra ganha vrios sentidos novos no decorrer de sua evoluo. "Respeito" guarda em portugus o mesmo sentido primordial que o francs respect; mas a acepo "ponto de vista" (na expresso "a esse respeito") -lhe peculiar.

Essa diversificao do sentido, a que se d o nome de polissemia, faz com que a uma palavra possam corresponder diversos equivalentes segundo o contexto. Ora, palavras cognatas de duas lnguas quase nunca apresentam polissemia no mesmo grau. O nosso vocbulo "mo" na maioria dos casos se traduz em francs por main; mas quando se refere direo de trnsito, deve ser vertido por senso Office em

francs e o nosso "ofcio" possuem ambos as acepes de "funo", "tarefa", "cargo". Mas o sentido de "escritrio" exclusivo do francs e do ingls e o de "repartio pblica", do portugus. Para "miservel" o ingls tem duas palavras da mesma origem: miserable, sinnimo de "digno de compaixo" ou "desprezvel", e miser, sinnimo de "sovina", "unha de fome".

claro que a polissemia no constitui perigo apenas quando se trata de termos cognatos. Abro ao acaso o Dicionrio ingls-portugus de Leonel e Lino Vallandro, e no verbete slip encontro, entre muitas outras, as acepes "escorregadela", "erro", "tropeo", "fuga", "fronha de travesseiro","angua", "calo de banho", "corredia", "plano inclinado", "rampa de lanamento", "tira de papel", "bilhete", "banco de igreja", "enxerto". E isto apenas como equivalentes do substantivo, pois h tambm o verbo to slip e o adjetivo slip. Quantos alapes para um s tradutor!

Naturalmente, os bons dicionrios como esse registram em separado as diversas acepes de um vocbulo; mas para tirar deles o proveito possvel cumpre ter boa dose de desconfiana, que s se adquire no decorrer de longa prtica.

H, alis, diferenas sutis no consignadas nos dicionrios. O francs vagabond traduz-se em portugus por "vagabundo"; mas este tem uma conotao pejorativa que falta variante francesa, e, portanto, se verteria para o francs, em muitos casos, por uma palavra totalmente diversa.

A polissemia faz com que a uma palavra do idioma A corresponda duas palavras no idioma B. nossa palavra "relao" podem corresponder duas palavras em francs, relation e rapport, nem sempre substituveis. Por outro lado, ao adjetivo francs simple correspondem em portugus "simples"

e "singelo". O tradutor, inclinado a usar a forma que mais parecida, ameaado de nunca usar a mais rara, que representa uma riqueza da prpria lngua.

Perigo maior representam os cognatos aparentes ou falsos amigos, palavras semelhantes em duas lnguas, mas de sentidos totalmente diversos. Basta um momento de distrao para o tradutor verter a expresso par hasard por "por azar" em vez de por "por acaso" e leveur, "criador de animais",

por "elevador".

Os falsos amigos muitas vezes so palavras de origem comum cujo sentido se distanciou por efeito da evoluo semntica diferente. Um par de falsos amigos constitudo pelo latim casa e o portugus "casa". O primeiro na verdade significava "cabana", "choupana". Para designar uma residncia, os romanos usavam a palavra domus. Com a devastao e a decadncia causadas pelas invases brbaras,

as residncias ficavam cada vez mais parecidas com choupanas e a palavra domus (em portugus "domo") passou a ser reservada a construes importantes, como por exemplo uma catedral.

Fizeram-se vrias colees dos falsos amigos do tradutor de ingls." Dessas armadilhas citemos algumas das mais conhecidas: actually no "atualmente", mas "realmente"; to apologize no "apologizar", mas" desculpar-se"; casualty pode ser "casualidade", mas no plural casualties "baixas",

"perdas"; dog days no so "dias de cachorro", mas "cancula"; idiom pode ser "idioma", mas tambm "idiomatismo"; luxury no "luxria", mas "luxo"; physician no "fsico", mas "mdico" etc. etc.

Particularmente perigosos so os falsos amigos do tradutor de espanhol. A interlegibilidade do espanhol para lusfonos, isto , a excessiva proximidade das duas lnguas, no raro ilude o tradutor a respeito da possvel facilidade da sua tarefa; da encontrarmos indevidamente traduzidos cola por "cola" em vez de "cauda"; crianea por "criana" em vez de "educao"; direccin por "direo" em vez de "endereo"; nudo por "nu" em vez de "n"; oso por "osso" em vez de "urso"; polvo por "polvo" em vez de "p"; rato

pelo homnimo "rato" em vez de "momento"; zurdo por "surdo" em vez de "canhoto". Muito menor a probabilidade de o tradutor de outras lnguas, no aparentadas com a nossa, encontrar desses falsos cognatos: poucos haver entre o alemo e o portugus, ou o portugus e o russo.

Entre as palavras evocadoras tm de se incluir uma categoria de vocbulos sem sentido verdadeiro, apenas de utilidade designativa. Estou-me referindo aos nomes prprios. Essas palavras destitudas de significao possuem, entretanto, valor conotativo dos mais fortes. Se um personagem de fico brasileira aparece com o nome de Joo da Silva," torna-se evidente a inteno do autor de fazer dele o smbolo do homem mdio, do John Smith, mas o nome, se mantido numa traduo francesa ou alem, despertaria apenas associaesde exotismo. Certos nomes, frequentes em determinado lugar e, por isso, de conotao plebeia, so raros noutros e tm, portanto, conotao aristocrtica.

Como fazer? difcil adotar uma norma.

Outra categoria aparentemente neutra e na verdade carregada de significados explosivos a dos topnimos. Rio de Janeiro significa uma coisa para o carioca que nele vive e trabalha, outra para o paulista que a vem passar as suas frias, outra para o europeu que condensa nesse nome o seu sonho extico. Mesmo os logradouros de uma cidade - Copacabana, Lapa, Wall Street, Avenue des Champs Elyses,Piccadily Circus, Quartier Latin, - acabaram condensando, no decorrer dos tempos, um complexo de conotaes que reclamaria dezenas de pginas para ser analisado. E quando h logradouros do mesmo nome em duas cidades a coisa piora, pois eles tm to pouca coisa em comum como a Lapa do Rio e a de So Paulo. Nisto reside um dos mais insolveis problemas da traduo, embora raramente haja sido mencionado.

PRACTICE 4Leia o texto em Theory 4 (Armadilhas da Traduo) e resuma as principais informaes do texto sobre os seguintes tpicos:

1) Etimologia

2) Polissemia

3) Falsos Amigos

4) Nomes prprios

THEORY 5 OS LIMITES DA TRADUO

Fonte: RONAI, Paulo. A Traduo Vivida. Rio de Janeiro: Editora Jos Olympio, 2012. Para transmitir uma mensagem, a pessoa falante no se serve exclusivamente de palavras; a comunicao completada pela entoao, por gestos e por jogos fisionmicos. Cada lngua faz uso diverso desses meios complementares da linguagem.

A entoao, por exemplo, desempenha papel capital na lngua monossilbica que o chins, no qual trs, quatro ou cinco homnimos se distinguem apenas pela altura do tom. A gesticulao excessiva tpica de italianos e judeus: quase impossvel falar italiano ou idiche com as mos nos bolsos. Em compensao, o japons falado parece abrir mo quase completamente dos gestos, assim como do jogo fisionmico; em Tquio, assisti a um banquete em que todos os oradores falavam sem sequer uma contrao dos msculos da face.

A observao ou no de certos ritos, hbitos e convenes sociais tambm um complemento da linguagem falada. Entrar num quarto de chapu na cabea e charuto na boca exprime menosprezo, pouco caso ou at hostilidade. No oferecer cadeira a um visitante significa que o dono da casa no faz questo de prolongar-lhe a permanncia. Essas prticas, embora generalizadas, nem sempre so as mesmas. Cada comunidade, cada povo tem algumas que lhe so particulares. Elas j foram capituladas sob denominao de "linguagem silenciosa", ttulo de um livro norte-americano.

Pois a lngua escrita tambm possui recursos acessrios alm das palavras. So, em primeiro lugar, os sinais de pontuao. Ocorrem de imediato, como exemplos de expressividade manifesta, os pontos de exclamao, da mesma forma que os de interrogao, destinados a ajudar o falante a ajustar a entonao (e nisto o requinte espanhol de us-los dobrados, antes e depois da frase, constitui aperfeioamento engenhoso), mas tambm o ledor a melhor perceber o significado de uma sentena. Mas, assim como os elementos da linguagem silenciosa, os sinais tipogrficos podem mudar de sentido conforme o

pas. Sabe-se que a cor do luto em certos povos o branco; e que o abanar da cabea de cima para baixo, que entre ns quer dizer sim, na Turquia quer dizer no.

Da mesma forma, numerosos sinais grficos sem contedo conceptual tm emprego diferente nas diversas lnguas. Em livros brasileiros, por exemplo, o travesso usado com grande frequncia para marcar o incio e o fim de uma fala. Nos livros franceses, ele abre a fala sem fech-la, o que s vezes pode causar uma pequena confuso. Nos livros ingleses, ele no indica nem o comeo nem o fim da fala (marcados ambos por aspas), ficando seu uso restrito a marcar uma pausa (de suspenso, surpresa ou espanto) ou a introduzir uma proposio incidente.

Interessante observar como numerosos tradutores e editores ainda no perceberam essa divergncia, a tal ponto que em seus trabalhos reproduzem servilmente a praxe inglesa. Quando pouco, a sua falta de ateno dificulta a padronizao de nossa produo impressa.

Bom exemplo da expressividade dos sinais tipogrficos o caso das aspas. Alm de encerrar uma citao e delimitar ttulos, elas tm tambm um uso ideolgico quando denunciam apropriao indbita, falsa qualidade. O enunciado "A casa do sr. Joo" muda de sentido segundo coloco as aspas nas duas extremidades (indicando provavelmente o ttulo de um livro, artigo, filme) ou encerro entre elas apenas a palavra "casa" (querendo dizer que no casa, mas algo muito mais insignificante, digamos uma choupana, ou algo bem mais importante, como seria um palcio e ao mesmo tempo nos informando do carter exibicionista ou modesto do proprietrio), a palavra "do" (pondo em dvida os seus direitos de propriedade), a palavra "senhor" (deixando entender que ele no passa de um p-rapado) ou a palavra "Joo" (quando ento exprimiria dvida sobre e este o verdadeiro nome do indivduo ou informaria tratar-se de um pseudnimo). Talvez devido a essa complexidade, muita gente de pouca instruo usa as aspas toa, atribuindo-lhes funo honorfica ou decorativa. No raro pessoas colocarem entre aspas a prpria assinatura.

No sendo o uso expressivo das aspas privilgio do portugus (a no ser nesta ltima redundncia), ainda assim ele exige a ateno do tradutor, que deve descobrir o motivo do seu emprego. O maior problema consiste, na verdade, em perceb-las onde o autor no as ps por no julg-las necessrias, por exemplo em citaes que ele justificadamente supe serem de conhecimento geral.

Cada obra literria o ltimo elo de uma longa evoluo e, de certa maneira, baseada em todas as obras anteriores da mesma literatura. Eis por que, em lnguas cujo uso culto possui longa e forte tradio, como, por exemplo, o ingls e o francs, mesmo textos no literrios, desprovidos de nfase, e at textos de carter tcnico, cientfico ou comercial, so entremeados de reminiscncias literrias, no distinguidas por nenhum sinal especial dentro da pgina impressa. Por fazerem parte da memria nacional, tais sentenas e versos tm forte carga afetiva, que desaparece se o tradutor os servir a seus leitores sem qualquer advertncia, nem um par de aspas sequer. Alguns desses excertos so universalmente conhecidos, outros apenas dentro dos limites de uma comunidade lingustica. Cabe ao tradutor descobrir a citao, verificar a qual desses dois tipos ela pertence e achar meio de a destacar se pertencer ao segundo tipo. Mas para isso preciso que ele, graas sua cultura, esteja em condies de dar com ela. Ditos de Goethe e Schiller so os que mais frequentemente se encontram em obras de lngua alem; frases de Molire e La Fontaine, as que mais facilmente ocorrem a um autor francs; Shakespeare o tesouro inesgotvel de todo escritor ingls; Dante o autor mais lembrado pelos italianos, Cervantes, pelos espanhis.

Outra caracterstica formal da pgina impressa, que pode revelar intenes aos olhos do leitor atento, a escolha da letra tipogrfica. Entre ns o grifo serve sobretudo para destacar palavras ou frases em lngua estrangeira ou ttulos em portugus, e menos geralmente para pr em relevo um elemento importante. Mas no temos o hbito, observvel no ingls e noutras lnguas germnicas, de marcar com letra inclinada a entoao da palavra, como se v nestes exemplos do David Copperfield, de Dickens:

I am a determined character, said Mr. Creakle; that's what I am.

I do my duty; that's what I do (cap. VII).

Os pronomes, antes elementos estruturais que nocionais, primeira vista no deveriam apresentar problemas. Na verdade, eles constituem um cipoal, onde s se pode avanar com o maior cuidado. Os pronomes pessoais em particular esto envolvidos numa rede de convenes e complicaes de hierarquia social que impossvel desenredar sem conhecimento ntimo da lngua de partida. Precisamente por seu sentido ser bvio, eles se prestam mais ao erro que os substantivos menos familiares, pois esses, pelo menos, so abordados com desconfiana. Os pronomes pessoais ingleses exibem variedade menor. Na lngua comum you a nica forma de tratamento. Subsiste, porm, na lngua literria a forma thou e suas flexes thee, thy, thine, arcaica, potica e retrica. So usadas tambm pelos que se dirigem a Deus. PRACTICE 5Leia o texto em Theory 5 (Os Limites da Traduo) e explique quais recursos acessrios alm das palavras um tradutor deve observar?

THEORY 6 MODOS DE TRADUZIR

Fonte: CAMPOS, GEIR. O Que Traduo. So Paulo, Editora Brasiliense, 2007.

Profissional ou diletante, o tradutor h de conhecer bem a lngua da qual traduz, chamada lngua-fonte, e a lngua para a qual traduz, chamada lngua-meta e que em geral a lngua materna do tradutor.

Haver uma razo para que a traduo se faa em geral de uma lngua estrangeira para a lngua materna? A principal razo a de que, em sua prpria lngua, qualquer pessoa capaz de ter um desempenho muito superior ao que teria em qualquer lngua aprendida. Isto no quer dizer que a lngua materna no seja tambm aprendida: apenas, para estabelecer alguma diferena, a lngua materna aprendida ao mesmo tempo em que se aprendem as demais noes preliminares da prpria vida. E h quem defenda a tese de que a lngua materna tambm condiciona a prpria viso

de mundo que a criana, e depois o adulto, venha a ter; h quem diga, tambm, que a aquisio dessa viso de mundo, paralela aquisio da lngua materna, acaba sendo um empecilho a que a pessoa possa ver o mundo e a vida de um modo diferente por exemplo, do modo como essa viso adquirida pelos naturais de outras terras e falantes de outras lnguas... Por exemplo: o modo pelo qual um esquim v e denomina a neve difere muito do modo pelo qual a neve vista e denominada pelo

homem da cidade.

Mas justamente porque os povos falam lnguas diferentes, e tm vises de mundo diferentes, que a traduo s vezes to difcil, relativamente, embora jamais absolutamente impossvel. Essa existncia de textos relativamente difceis de traduzir, ainda que no de todo intraduzveis, determina uma primeira diviso da traduo em dois tipos: a traduo integral, na qual se traduzem todos os itens, todas as palavras e expresses, do original; e a traduo parcial, na qual deixam de ser traduzidas algumas partes do texto de origem, por uma srie de razes que interessam s vezes

ao editor, s vezes ao prprio tradutor, s vezes a outras pessoas fsicas ou jurdicas.

Encontram-se muitas obras clssicas que so publicadas com cortes, em edies abreviadas (em ingls, abridged), que se destinam leitura de pessoas com pouca disponibilidade de tempo para a leitura...

Uma traduo pode ser feita diretamente do texto original, e diz-se ento que uma traduo direta: uma traduo de Kafka, por exemplo, feita a partir da lngua alem, em que ele originalmente escrevia. Mas tambm pode dar-se o caso de uma obra do mesmo Kafka, digamos, ser traduzida de outra lngua, do ingls por exemplo; tem-se ento uma traduo indireta, por no ter sido feita diretamente do texto original; e traduo em outra lngua, que serviu de base traduo final, d-se

o nome de traduo intermediria. A validade de uma traduo indireta depende, obviamente, da qualidade da traduo intermediria.

Grandes autores alemes e russos do sculo passado foram amplamente traduzidos na Espanha e na Frana; e muitas obras desses autores foram traduzidas, indiretamente, do espanhol ou do francs para o portugus, em Portugal e no Brasil. Na maioria dos casos, as respectivas tradues intermedirias no eram muito boas; da a m qualidade das mais antigas tradues brasileiras de autores russos e alemes, de Dostoivski e Pschkin, entre os russos, de Heine e de outros autores

romnticos alemes, por exemplo.

Quando as duas lnguas envolvidas numa traduo, a lngua-fonte e a lngua meta, so prximas uma da outra, pelo fato de pertencerem mesma famlia lingustica, por assim dizer, como o espanhol e o portugus, ou o alemo e o ingls, a traduo pode ser feita quase que palavra por palavra: tem-se ento a traduo dita literal, paralela ao texto original e formalmente assemelhada a ele.

Quando as duas lnguas so de troncos lingusticos diferentes, como o portugus, que uma lngua neo-latina, e o ingls, que uma anglo-germnica, a traduo costuma distanciar-se bastante da forma do original, tornando-se assim menos literal, menos palavra por palavra, e mais oblqua, como se diz. Mas tambm a diferena de culturas, entre a dos falantes naturais de uma lngua e a dos falantes naturais da outra, contribui para a obliquidade de uma traduo.

A traduo dita oblqua a que no segue paralelamente a forma do texto original vale-se de alguns procedimentos tcnicos, como so denominados.

PRACTICE 6Leia o texto em Theory 6 (Modos de Traduzir) e explique os seguintes termos:

Traduo integral

Traduo parcial

Traduo direta

Traduo indireta

Traduo oblquaTHEORY 7NORMAS GERAIS DE TRADUO

Fonte: CAMPOS, GEIR. O Que Traduo. So Paulo, Editora Brasiliense, 2007.

Dos processos empregados e aperfeioados, ao longo do tempo, pelos mais acatados tradutores, em seu trabalho individual ou de grupo, tm resultado umas quantas normas de ordem geral para o exerccio da atividade tradutria: so normas que certamente variam no acessrio e coincidem no essencial, e delas devem tomar conhecimento tambm os novos tradutores e candidatos profisso de tradutor no para segui-las por uma espcie de obrigao, mas para talvez adot-las de acordo com as convenincias e maneiras de trabalhar de cada um. Uma espcie de norma recomenda que o tradutor leia todo o texto a traduzir, antes de iniciar a traduo propriamente dita. Essa leitura preliminar tem por fim dar ao tradutor uma viso global da obra, dos seus traos de estilo mais marcantes, da inteno ou propsito do autor, e assim por diante. Quando se trata de um poema ou de um pequeno conto, essa leitura prvia quase instintiva; mas quando se tem a traduzir um livro de muitas pginas, o tradutor sente-se s vezes tentado a comear a traduo sem antes haver lido todo o texto. Conheo tradutores de romances famosos, que jamais lem seus textos antes de traduzi-los: vo tomando conhecimento da obra na medida mesma em que a vo traduzindo. Isso pode dar certo, mas tambm pode trazer para o tradutor alguns prejuzos: o tradutor pode vir a descobrir, no fim do livro, o verdadeiro sentido de uma expresso que o autor vinha utilizando desde o comeo da obra, e o jeito ento voltar atrs e apagar ou emendar todas as partes onde a primeira traduo no foi correta.

A leitura preparatria tambm serve para trazer tona da memria do tradutor os elementos teis do seu acervo cultural, reativando conhecimentos gerais e especficos adquiridos em leituras e trabalhos anteriores. Eu, pessoalmente, nem sempre me dou ao trabalho dessa leitura preliminar;

mas devo confessar que a falta dela me tem custado, em alguns casos, no poucos aborrecimentos e prejuzos.

Outra norma a que recomenda pesquisar o contexto e a situao do autor e da obra. Essa pesquisa tem por objetivo equipar o tradutor com um mximo de informaes sobre as condies em que o texto foi produzido, primeiro na mente do autor e por fim na sua forma escrita. H muitos casos em que essa pesquisa decorre naturalmente da prpria leitura preliminar, justificando-a mais uma vez.

Outra norma: comparar as tradues existentes do mesmo texto, na lngua para a qual se vai traduzi-lo ou em outras. Essa comparao no deve servir para calcar a prpria traduo em trabalhos alheios, numa espcie de cola colegial: o objetivo em mira prevenir equvocos em que outros tradutores possam ter incorrido. Trata-se de um procedimento bastante til, pois muitas vezes mais fcil captar o verdadeiro sentido de um texto original em confronto com as vrias interpretaes que lhe deram outros leitores e o tradutor nada mais que um leitor especial.

Fazer um levantamento preliminar de trechos do original que se devam traduzir em bloco, em vez de palavra-por-palavra ou frase-por-frase; em muitos casos a traduo se far por etapas, ou por degraus, por assim dizer, considerando pequenos perodos ou pargrafos. Isso tambm h quem recomende.

Mais uma norma: rever a primeira forma da traduo, depois de passado algum tempo. A idia a de, uma vez completado o trabalho de traduzir, numa espcie de rascunho, deixar esse rascunho descansando (como se faz com a massa de um bolo), antes de passar a limpo a primeira traduo.

Ento o tradutor far uma reviso de toda a sua traduo; mas recomendvel que, para evitar, entre outras coisas, uma possvel interferncia do vocabulrio ou da sintaxe da lngua-fonte sobre a lngua-meta, seja passado algum tempo. Por outro lado, esse breve tempo transcorrido entre a traduo e tal espcie de reviso, dar ao tradutor um certo distanciamento, que lhe tornar mais fcil trabalhar no prprio texto sem maior envolvimento pessoal.

Todos os pontos onde a traduo parecer obscura, ou confusa, devem ser marcados para novo confronto com o original: em muitos casos, a confuso ou obscuridade fruto de uma interpretao no muito correta do texto a traduzir, e ser tempo de clarificar o que ficou obscuro ou deslindar o que ficou confuso.

Tambm se recomenda ler em voz alta o texto da traduo, observando os elementos de estilo e ritmo da linguagem. A leitura em voz alta pode e deve ser ouvida por outras pessoas, ainda que leigas no assunto, e o tradutor far bem em aceitar quaisquer sugestes de quem o escute ler: pequeninas dificuldades so s vezes contornadas ou resolvidas mediante simples trocas de palavras ou de construes.

O tradutor deve tambm levar em conta as reaes de outras pessoas diante da sua traduo: quando outras pessoas, que ouvem ou lem, encontram alguma dificuldade, que as leva a hesitaes e dvidas, o tradutor pode perguntar a essas pessoas o que foi que elas entenderam do texto que acabam de ouvir ou ler.

H quem tenha seus melindres, mas sempre de bom aviso (e h quem faa disso uma norma) submeter a prpria traduo apreciao de colegas competentes. Nem sempre fcil contar com a disponibilidade de outros bons tradutores para lerem a traduo da gente e darem opinio a respeito. Existe tambm o perigo de algum colega consultado assumir ares de superioridade fora de lugar. Mas quando essa apreciao se faz em termos amigveis e solidrios, o tradutor pode ter nela uma ajuda muito valiosa. Por fim, deve o prprio tradutor rever ou revisar o texto da sua traduo antes de o enviar para publicao. Nessa reviso final sero especialmente observados os detalhes de ortografia, alguns talvez j reparados em leituras precedentes. As editoras costumam ter seus prprios revisores; mas podem surgir dvidas do revisor da editora quanto a algum detalhe da traduo, e sempre bom o tradutor estar bem a par do resultado do seu trabalho; pode haver casos em que o revisor da editora

apresente alguma sugesto que o tradutor aceitar ou no, de acordo com sua prpria viso do texto.

PRACTICE 7

Leia o texto em Theory 7 (Normas Gerais da Traduo) e responde s questes:

1.Com que esprito as normas propostas por Geir Campos devem ser colocadas em prtica?2. Quais as normas gerais de traduo propostas pelo autor?

3.Qual o objetivo das normas gerais de traduo?4. Por que o tradutor um leitor especial na opinio do autor?

THEORY 8LIMITES DA TRADUZIBILIDADE

Fonte: CAMPOS, GEIR. O Que Traduo. So Paulo, Editora Brasiliense, 2007.

H quem diga que tudo se traduz: tudo quanto se deixa expressar em uma lngua pode ser expresso em qualquer outra. E h quem diga que nada se traduz, e que umas tantas coisas no podem ser ditas nem na prpria lngua da gente, quanto mais passadas de uma lngua para outra.

Entre essas duas opinies, to extremadas e radicais, cabe a ponderao, muitas e muitas vezes confirmada pela prtica, de que h textos mais traduzveis e textos menos traduzveis, relativamente, em vez de textos traduzveis ou intraduzveis, absolutamente.

Expondo prova da prtica a teoria, o que se v, em primeiro lugar, que a traduzibilidade de qualquer texto depende das semelhanas ou diferenas de estrutura entre a lngua-fonte e a lngua-meta; em segundo lugar, a traduzibilidade de qualquer texto depende do seu grau de inteligibilidade impossvel traduzir-se o que no se consegue entender bem.

Por outro lado, ainda que muitssimo bem entendido um texto, o fato que em alguns casos a traduo desse texto fica na dependncia de fatores que fogem competncia e ao desempenho lingustico do tradutor. John Cunnison Catford, ensasta ingls j citado, diz que a intraduzibilidade

pode ser lingustica ou no-lingustica. A intraduzibilidade lingustica acontece toda vez que se trata de uma ambiguidade peculiar lngua-fonte e que no texto assume importncia principal, como no caso dos trocadilhos, por exemplo. De outras vezes a intraduzibilidade resulta de no existirem situaes idnticas na cultura de uma lngua e na da outra. Exemplo de intraduzibilidade lingustica ocorre em nossa lngua com a palavra saudade, que j se escreveu soidade e que vem do latim solitate (soledade, solido). Mas a palavra luso-brasileira saudade quer dizer realmente muito mais do que soledade ou solido: um tipo de solido que consiste na falta ou na ausncia de algum ou de algo. H na lngua alem a palavra Sehnsucht, que se poderia traduzir como busca de ver algum ou alguma coisa, ou gana de ver essa pessoa ou essa coisa; mas Sehnsucht no saudade. H as palavras inglesas missing ou longing, falta ou querncia talvez, e que talvez as duas combinadas pudessem dizer o que a gente diz com saudade. H a palavra espanhola nostalgia, mas nostalgia em nossa lngua outra coisa. H em francs a palavra besoin, que necessidade e no saudade.

Citei, num dos captulos anteriores, quantos nomes um esquim pode dar neve, de acordo com circunstncias que para ele so importantes e cuja importncia reflete-se no vocabulrio. H uma palavra da lngua dos ndios Navarros (em espanhol, Navajos; em ingls, Navahos) que designa ao mesmo tempo as cores azul, verde e rosa. Essa palavra dutliz. Os antroplogos norte-americanos, toda vez que deparam com essa palavra num texto indgena a traduzir para o ingls, usam, no lugar dela, uma sigla (bogop) escrita com as iniciais dos nomes dessas trs cores na lngua inglesa: blue

(azul) or (ou) green (verde) or (ou) pink (cor de rosa). Assim, pelo fato de no haver, para os Navarros (Navajos, Navahos) diferena entre as cores azul e verde e rosa, a palavra dutliz, da lngua deles, praticamente intraduzvel em qualquer outra lngua. A est um caso de intraduzibilidade lingustica: no se encontram, na lngua fonte e na lngua-meta, palavras ou expresses que digam a mesma coisa.

E os exemplos poderiam ser aqui apresentados em grande nmero, ao qual certamente o leitor seria capaz de acrescentar exemplos que so do seu conhecimento e no do nosso.

Resta ainda a questo da intraduzibilidade no-lingustica, quando certas palavras ou expresses no podem ser traduzidas por no se encontrarem, na cultura da lngua-fonte e na cultura da lngua-meta, situaes que se correspondam ou equivalham. Existe o caso de baby-sitter, que se poderia decalcar como sentadora de beb numa expresso gaiata que nada tem a ver com a seriedade do servio prestado por esse elemento da cultura urbana norte-americana. Ainda Catford cita o caso de sauna, palavra finlandesa, que, embora tomada de emprstimo pela nossa lngua, tem um significado muito peculiar: a palavra finlandesa sauna pode ser at certo ponto traduzida como banho de vapor ou banho turco mais ou menos pblico no bem isso o que se quer dizer entre ns, no Brasil, onde sauna algo mais ou menos privado.

Diz-se que a intraduzibilidade pode ser ento lingustica, num caso como o de saudade, em que certamente o sentimento saudoso encontra-se tanto nos falantes da lngua portuguesa quanto em falantes de outras lnguas, nas quais todavia no existe uma palavra como a nossa para defini-lo; ou pode ainda a intraduzibilidade ser cultural, em casos como os de baby-sitter ou sauna, quando no se encontra, na cultura do povo que fala uma lngua, situao igual ou semelhante vida cultural normal do povo que fala a lngua para a qual se pretende traduzir a palavra do original: evidentemente, no havendo o objeto ou o fato, no h necessidade de palavra ou grupo de palavras para design-lo.

Paulo Rnai, exmio tradutor e professor de lnguas, diz, entre outras coisas, que at os sinais de pontuao podem ter significados diferentes, em vrias lnguas, e que no podem ser passados de uma lngua para outra, de um texto para outro, tal e qual se encontram na primeira delas, ou no primeiro deles.

E Rnai cita ainda o caso da linguagem gestual, eventualmente descrita em algum texto jornalstico ou literrio: impossvel, ou pelo menos incorreto, dizer sempre que algum respondeu pergunta de outrem balanando a cabea para a frente e para trs, quando na Turquia, por exemplo, esse movimento de cabea quer dizer no, e no Brasil quer dizer sim como em Portugal. E cabe aqui mais uma vez a velha srie de perguntas que se fazem, ao longo dos tempos, os tericos da traduo:

Deve uma traduo ler-se como uma obra original, ou ostensivamente como uma obra traduzida?

Deve uma traduo apresentar-se com o estilo do seu autor, ou com o estilo do seu tradutor?

Deve uma traduo dar a impresso de ser uma obra da poca do seu autor, ou da poca do seu tradutor?

A ficam as perguntas, mais de uma vez respondidas, por mais de um tradutor prtico ou terico, cada qual com a sua opinio, abrindo-se a questo para que tambm o leitor d a sua, a qual por certo refletir alguns dos seus pontos de partida para avaliar as qualidades de uma traduo.PRACTICE 8Leia o texto em Theory 8 (Limites da Traduzibilidade) e responde s questes: 1. Do que depende a traduzilibildade do texto?

2. O que intraduzibilidade lingustica e no-lingustica? 3. Quais so as trs perguntas feitas pelos tericos da traduo?

NUTS AND BOLTS 1ENTREVISTA COM ISA MARALANDO

IsaMaraLando professora, tradutora do ingls e francs, formada pela PUC So Paulo em Lngua e Literatura Inglesa. Com quase 100 livros traduzidos, sua estreia foi em 1986 com Instinto Assassino, de W. R. Stevens. Desde ento j traduziu autores como George Orwell, SalmanRushdie, AmsOz, Bernard Malamud, Susan Sontag, John Fante, Edgar AllanPoe, EmilyDickinson. Tambm autora adaptadora de livros infantis e infanto-juvenis. Participa regularmente de eventos e palestras para tradutores.

A maioria dos tradutores usa seu dicionrio de dificuldades de traduo do ingls, o VocabuLando Vocabulrio prtico ingls-portugus. Seus lanamentos mais recentes da srie so o VocabuLandoWorkbook Exerccios de traduo e verso e o Mini-VocabuLando 500 palavras teis para leitura e traduo em ingls (todos pela DISAL Editora).

Leiam a entrevista com ela a seguir:

Pet Rissati: Todos conhecem a IsaMaraLando do dicionrio VocabuLando, mas no sei se os tradutores em geral sabem que voc foi e antes professora. Como foi atransio, ou melhor dizendo, o acrscimo da profisso tradutora em sua carreira?

Isa:Sempre gostei de aprender lnguas e de dar aulas. Lecionei ingls na Cultura Inglesa durante dez anos. Depois disso fui programadora de computadores, assistente editorial na ticae, finalmente, tradutora freelance. Acho que professora + tradutora foi uma feliz combinao, pois o que me permitiu escrever o VocabuLando um dicionrio especial para tradutores que louvado por ser muito claro e didtico.Unindo as duas vocaes, nos ltimos anos tenho me dedicado tambm s aulas de traduo, que costumo ministrar aqui no Rio nos cursos Flashe Brasillis, alm de dar oficinas de traduo em vrias outras cidades.PR: Como voc v nossa profisso de tradutor quanto ao conhecimento do grande pblico e o respeito ao profissional de traduo?

Isa:Na rea de livros, a Companhia das Letras tem se destacado, desde a sua fundao, por seus excelentes tradutores. Alguns sitesde notcias, como a BBC-Brasil, tambm so bem traduzidos. Mas a traduo alcana o grande pblico sobretudo pela televiso, e so poucos os programas bem traduzidos e que mencionam o nome do tradutor. Poucos, mas existem gostaria de destacar o canal GNTe alguns programas como OprahWinfrey, ProjectRunway, Extreme Makeover. Infelizmente os programas de cincia, que eu aprecio muito, como os dos canais Discoverye NationalGeographic, com frequncia tm tradues muito ruins. No h nenhum controle de qualidade, nenhuma preocupao com a exatido e muito menos com a naturalidade do portugus. Por exemplo, h pouco vi um programa sobre Marte que citava a distncia da Terra a Marte como de 480 km. (pouco mais do que Rio-So Paulo). E to simples fazer a converso das medidas basta usar o Google.Seria preciso haver muita presso do pblico para que algo melhorasse nesse aspecto. Eu j reclamei com a distribuidora desses programas, j dei sugestes para melhorar e at j me ofereci dubladora que faz essas pssimas tradues para ministrar gratuitamente uma oficina para os tradutores, mas nem assim houve interesse. Qualidade custa dinheiro, e as empresas s investem em qualidade quando tm algum forte motivo para isso. Do contrrio elas procuram reduzir o custo dos servios ao mnimo, e sempre encontram pessoas dispostas a ganhar muito pouco em troca de uma traduo medocre e feita s pressas.PR: Na sua mesa de trabalho, o que no pode faltar?

Isa:Fisicamente na minha mesa de trabalho ficam sempre o dicionrio Houaissingls-portugus (todo arrebentado por dcadas de uso intenso) e meu baby VocabuLando, onde estou sempre anotando novas palavras. Tambm gosto muito do Houaiss portugus-portugus, que tenho em CD. Os demais dicionrios consulto on-line, sobretudo em www.thefreedictionary.com e www.onelook.com.PR: Nas horas vagas, quais so suas leituras preferidas?

Isa: Varia muito. O que eu mais leioso jornais online,principalmente NewYork Times e HuffingtonPost. Me interesso muito por poltica americana e assuntos internacionais do momento. Tambm gosto de cincia popular, de ler sobre a evoluo, o incio da vida na Terra, a gentica, a vida dos grandes cientistas.Ultimamente tenho lido bastante sobre EmilyDickinson, para embasar melhor o livro que estou finalizando com tradues de 55 poemas e uma breve biografia dessa poeta excepcional. Sempre gostei muito de poesia brasileira Vincius, Drummond, Manuel Bandeira, Ceclia Meireles, AdliaPrado, Paulo Leminski. Outra vertente importante a judaica, sobretudo Isaac BashevisSinger, um grande contista que saboreiomuito. Outros contistas que me do muito prazer so Tchcove KatherineMansfield. Mas minha autora favorita, a quem volto sempre, como quem bebe gua pura da fonte sem nunca se cansar, ClariceLispector.PR: Gostaria de deixar um recado para quem admira ou deseja iniciar na profisso de tradutor?

Isa: preciso praticar bastante, como em qualquer outra profisso. Ler, escrever e pesquisar, ampliar o vocabulrio em ingls. Ler os bons autores e bons jornalistas nas duas lnguas, ingls e portugus. Hoje em dia tudo to fcil o NewYork Times est ao alcance de qualquer um, basta ter internet. Nos sitesonelooke thefreedictionarytemos acesso imediato e gratuito aos melhores dicionrios, como Oxford, Cambridge, AmericanHeritage, dicionrios etimolgicos etc.Acho importantssimo morar algum tempo em pas de lngua inglesa, fazer um intercmbio ou pelo menos uma viagem longa por l.Tambm sugiro aproveitar todas as chances para traduzir, mesmo sem remunerao. s vezes os alunos se queixam de falta de trabalho e de oportunidades, mas no se pode querer entrar no mercado e ganhar dinheiro logo de sada, sem experincia. preciso primeiro ter algo de slido para oferecer viajar, ler, estudar, adquirir conhecimentos, ter uma cultura geral ampla e variada. Especializar-se em alguma rea muito importante. Aprender outro idioma. Aperfeioar-se ao mximo no ingls, preparando-se para o Cambridge Proficiencye outros exames difceis que realmente atestam o domnio da lngua, fazer uma segunda faculdade que ensine a ler e escrever melhor, como, por exemplo, Histria, Jornalismo ou Marketing. Destacar-se, enfim ter algo a mais para oferecer, e no apenas o que a mdia dos formados em Letras oferece.E, sobretudo, gostar de lnguas e gostar traduzir. Fazer o que nos d prazer. Do what youlike the restwillfollow.NUTS AND BOLTS 2ENTREVISTA COM JOO AZENHAJNIOR

O Prof. Dr. Joo Azenha Jnior uma referncia na rea de traduo, tanto pela sua atuao como tradutor de fato por muitos anos como pela orientao nas reas de lingustica contrastiva e traduo no mestrado e doutorado da USP. Sua contribuio para a compreenso dos condicionantes culturais em todos os nveis da traduo (inclusive na traduo tcnica) das mais importantes. Alm disso, assinou a traduo a do best-seller O mundo de Sofia, de Jostein Gaarder. Sempre atencioso e generoso, Joo concedeu uma entrevista ao Conversa entre Tradutores.

Pet Rissati: Joo, voc tem uma trajetria bastante diversa de outros acadmicos, pois trouxe a viso do profissional da traduo para o seu trabalho na Universidade. Conte um pouco sobre essa experincia.

Joo:De fato, eu comecei a trabalhar com traduo editorial ainda durante o curso de especializao em traduo da USP. Foram sete anos consecutivos de muito trabalho, que me renderam autonomia e alguns prmios. Na transio para o governo do ento presidente Fernando Collor de Mello, fiquei desempregado e procurei escritrios de traduo de So Paulo. Comecei, ento, a trabalhar na rea tcnica. Em maro de 1990, ingressei na USP. E o que eu tinha de mais concreto para levar aos estudantes e reflexo nos trabalhos acadmicos era a minha experincia. A passagem pelas editoras eu a aproveitei como tema para a minha dissertao de mestrado. J a experincia com a traduo tcnica foi transformada na minha tese de doutorado. Tudo isso me propiciou uma forma privilegiada de conciliar teoria e prtica. E, claro, acho que isso foi e de proveito tambm para os estudantes.

PR: Como voc comeou a traduzir? E como chegou ao idioma alemo?

Joo: De certa forma, a lida com as lnguas estrangeiras sempre esteve presente na minha vida: da ida aos Estados Unidos como exchange student, ainda na adolescncia, ao meu trabalho numa companhia area. Do gosto pelas lnguas para a questo da traduo foi um passo. E, de novo, minha viso da atividade esteve sempre ligada a pressupostos funcionais, pragmticos e culturais. Quanto ao alemo, eu sou bisneto de uma alem. Mas nunca cheguei a conhecer minha bisav. Ao entrar na faculdade, consultei uma orientadora profissional para saber qual, das lnguas possveis, teria um efeito mais garantido em termos de retorno profissional. Depois de analisar a questo, ela me disse que com o alemo eu teria mais chances. Parece que ela estava certa.

PR: Como voc v a profisso de tradutor hoje? E como as pessoas veem a traduo na sua opinio?

Joo:Penso que as pessoas, de um modo geral, continuam vendo a traduo como uma atividade secundria. Um mal necessrio, por assim dizer, em vista da impossibilidade de algum dominar muitas lnguas. Alm dessa viso de atividade de segunda mo, o senso comum tambm considera a traduo, a meu ver, uma atividade mecnica, uma substituio automtica de itens lexicais de uma lngua para a outra com o auxlio de alguma ferramenta de busca e de pesquisa. Tudo isso ainda se reflete seriamente na profisso: descaso, desprestgio, abusos. Da a necessidade de um curso de traduo solidamente estruturado, que tenha como pilares a derrubada dessa viso ingnua de linguagem e de traduo, de um lado, e a construo de um profissional ciente de seu papel social na mudana desse estado de coisas, ainda desfavorvel.

PR: Aliar a teoria prtica, a meu ver, uma tarefa difcil, mas no impossvel. H uma real aproximao dessas duas reas?

Joo:Todo tradutor, se estudante de traduo ou no, traz na bagagem uma teoria de traduo interiorizada. Em geral ela aquela que associa a traduo a uma atividade mecnica, como eu disse na resposta anterior, qual todos os que conhecem duas lnguas teriam acesso. O que muitas vezes no se sabe que essa teoria, que guia essa prtica, tem por base uma viso correlata de linguagem: a noo de que a cada palavra, ou grupo delas, vincula-se um sentido. Este, por sua vez, estaria como que fixado de forma perene naquela palavra, independentemente de quem a lesse ou interpretasse. Bem, sabemos que no assim: o mundo dos sentidos e a sua construo esto a para serem experimentados por cada um sua maneira. O que a gente faz quando l projetar nossa vivncia, fazer inferncias pessoais, estabelecer redes associativas que no so as mesmas para todos. Ler, enfim, uma atividade singular. Assim como toda operao de traduo. Aliar teoria prtica significa, ento, colocar os ps no cho e entender que tudo muda ao longo do tempo. aproximar da vida a atividade de traduzir.

PR: O que no pode faltar na sua mesa de trabalho?

Joo: Eu uso as ferramentas de busca e de pesquisa disponveis online atualmente, mas no dispenso os bons e velhos dicionrios impressos que venho acumulando ao longo da carreira. Muitas vezes so eles que do a direo confivel da busca na internet. Uma boa gramtica (do alemo e do portugus) tambm est sempre presente. Mas o que no pode faltar mesmo a tranquilidade, o bom senso, a pacincia. Quem traduz profissionalmente precisa ter bons olhos, boa coluna e no pode se assustar com a solido.

PR: O que voc l alm dos livros que traduz? Qual o livro do momento para voc?

Joo: Um efeito colateral indesejvel da vida acadmica no poder escolher o que ler. Conforme os compromissos vo surgindo, a gente vai se adaptando a eles. No momento, estou trabalhando na traduo dos escritos crticos do compositor alemo Robert Schumann. Foi este o tema da minha livre-docncia defendida em 2009. Ler Schumann, ento, suas cartas, seus aforismos, trechos dos seus dirios tem sido uma coisa que me ajuda a associar dever e prazer.

PR: Deixe um recado para quem admira ou quer comear na profisso.

Joo:Muito do meu recado est embutido nas respostas at aqui: o refletir sobre a traduo de um local prximo da vida de todo dia, a sabedoria de lidar com a instabilidade, com as mudanas, exageros e paradoxos, o prazer de escrever, de ler, mas sobretudo de compartilhar. Traduzir estabelecer pontes, como diz o ttulo do livro do Jos Paulo Paes. Ser um tradutor bem sucedido quem tiver vocao para a paz, para o entendimento. Quem, sem nunca ter estudado diplomacia, for capaz de evitar uma guerra. E aceitar quem nem todo mundo vai reconhecer esse trabalho de bastidores.

NUTS AND BOLTS 3ENTREVISTA COM CAROLINAALFARO

Hoje o Conversas entre Tradutores temos Carolina Alfaro. Vivendo em Toronto, Carolina tradutora de ingls e espanhol e tambm professora de traduo de legendagem, uma de seus especialidades. scia da empresa Scriba Tradues e tirou um tempinho, entre as muitas tradues e partidas de tnis, para nos dar uma entrevista. Vamos l.

Pet Rissati: Como voc se tornou tradutora?

Carolina:Decidi que queria ser tradutora aos 15 anos. Fiz vestibular para apenas uma universidade, a PUC-Rio, entrei em 1992 e cursei Letras com bacharelado em Traduo. Fiz tudo o que pude l dentro, todas as disciplinas e atividades opcionais, fui superaplicada e os prprios professores comearam a me indicar oportunidades de trabalho j bem antes de me formar. Assim que me formei, fui contratada por um laboratrio de informtica da prpria PUC-Rio como tradutora e revisora, em meio expediente, e fiz o curso de especializao em traduo tambm na PUC-Rio foi onde aprendi os rudimentos da legendagem. Em suma, desde 1996 praticamente no passei um dia sem traduzir profissionalmente.

PR: Quais os grandes desafios da traduo hoje em dia, ao seu ver? E como est o cenrio da traduo de legendagem hoje?

Carolina:Eu diria que o grande desafio para todo tradutor demonstrar, permanentemente, que ele um profissional indispensvel, que seu trabalho fundamental e que o valor investido em contrat-lo mais do que compensado pelos resultados obtidos com aquela traduo. Isto , demonstrar que h um abismo entre ele e qualquer software grtis ou barato de traduo ou outra pessoa que apenas conhea a lngua estrangeira e quebre um galho fazendo uma traduo.

O mercado de legendagem em todo o mundo, e sobretudo no Brasil, est aquecidssimo. H uma imensa procura por profissionais capacitados do tipo que mencionei acima em todas as reas. E, para os tradutores experientes e capazes de realizar tradues tcnicas (ou com uma boa rede de parcerias) que investirem em tcnicas e software de edio de vdeo, o mercado de vdeos institucionais e tcnicos um prato cheio. Cada vez mais presto servios diretamente para os clientes as prprias companhias de diversos ramos, no as produtoras de vdeo intermedirias e realizo a traduo, legendagem e edio dos filmes ou DVDs, cobrando valores na faixa mais alta praticada no mercado.

PR: Na sua opinio, como as pessoas veem a profisso de tradutor e intrprete hoje?

Carolina:J faz um bom tempo que deixei de ver os tradicionais olhares de pena dirigidos a quem diz ser tradutor. Em conversas informais, muita gente demonstra um interesse genuno pela especialidade do que eu fao e pelo meu estilo de vida como profissional independente. Como professora de traduo h alguns anos, tenho gostado de ver o entusiasmo da maioria dos alunos com relao perspectiva de se tornar tradutor profissional.

s vezes meio inevitvel ouvirmos, seja em tom de sarcasmo ou de preocupao, que daqui a 5 anos nossa profisso no vai existir mais porque os programas de traduo automtica vo ocupar nosso lugar. Por outro lado, tenho a impresso de que essa mesma ideia muitas vezes gera at mais admirao quando mostramos que somos profissionais bem-sucedidos, que nosso mercado no para de crescer e que vivemos e vamos continuar vivendo do nosso trabalho. Acho que a traduo automtica s empolga a quem no leva a traduo muito a srio e s ameaa a quem no encara a traduo como profisso especializada.

PR: Muitas pessoas criticam a traduo de legendagem, muitas com pouco conhecimento de causa, ou seja, das dificuldades desse tipo de traduo. Como voc v essa postura das pessoas? E qual sua opinio sobre a qualidade da legendagem no Brasil hoje?

Carolina:A legendagem fcil de criticar (digo criticar no sentido neutro, no necessariamente negativo) pois o cotejo com o original inevitvel. Cotejar qualquer outra forma de traduo difcil e trabalhoso, mas no caso da legendagem o nosso crebro tenta comparar o que ouve com o que l de forma quase inconsciente. Por isso, muita gente que nem seria capaz de entender o original sem legendas e muito menos seria capaz de traduzi-lo se sente no direito de apontar falhas na traduo, sejam elas procedentes ou no.

As crticas totalmente infundadas so irrelevantes. Mas claro que muitas vezes so identificados erros reais na legendagem. Em casos assim, o consumidor do produto final pode e deve reclamar. Mas importante que a reclamao seja dirigida ao responsvel por aquela traduo, que a distribuidora, ou o canal, ou a produtora que encomendou aquela traduo. Nenhum tradutor escolhe o que traduzir por conta prpria e joga as legendas diretamente na tela do cinema sem seu cliente perceber. Ele contratado, remunerado, e seu trabalho revisado, aprovado e geralmente editado pelo cliente antes de chegar ao pblico. Portanto, preciso tomar nota de quando e onde o erro foi detectado e procurar nos crditos finais a empresa responsvel pela traduo, para reclamar aos responsveis. Existem tradutores ruins, sim, mas quem os contrata, remunera e acha que aquele servio est bom to ruim quanto eles.

A qualidade da legendagem no Brasil excelente. Os padres de qualidade esto cada vez mais rigorosos e os clientes so cada vez mais exigentes ao selecionarem seus profissionais. O que no muito bvio, sobretudo no caso de DVDs e de canais de TV a cabo, saber quais tradues so feitas no Brasil e quais vm do exterior. Os canais Sony, Warner e parte da programao da Fox, por exemplo, so traduzidos fora do Brasil e apresentam graves problemas lingusticos e tcnicos. Basta compar-los a canais como Multishow, GNT ou os Telecines para notar a diferena.

PR: Na sua mesa de trabalho no pode faltar?

Carolina:Em volta do computador cheio de programas, dicionrios, recursos mil e banda largussima, o VocabuLando, meu Caderno de Servios (para saber mais sobre ele, clique no link), blocos de Post-It, meia dzia de canetas e lapiseiras diferentes, minha garrafa de gua e uma caixa de chicletes. A estante com os dicionrios e gramticas em papel fica logo atrs de mim.

PR: O que voc tem lido ultimamente? Qual o livro do momento para voc?

Carolina: O ltimo que terminei foi um romance histrico argentino. Abertos e parcialmente lidos, na mesa de cabeceira (minha mesa de cabeceira enorme), tenho trs livros tericos sobre traduo ou legendagem, um livro de contos ingleses traduzido em portugus, um de contos de uma autora canadense jovem, um livrinho humorstico sobre gatos, a edio recentemente relanada de Emlia no Pas da Gramtica, uma coleo de quadrinhos de estilo jornalstico e uma pilha imensa de revistas Lngua Portuguesa e ATA Chronicle. Os prximos da fila so um romance do Salman Rushdie e um livro sobre neurolingustica. Estou to sobrecarregada de trabalho que no estou lendo nada sistematicamente; pego o que sinto vontade no momento.

PR: Deixe um recado para quem admira ou quer comear na profisso.

Carolina:Traduo exige MUITA ralao. Muito estudo, muita pesquisa, muita luta com cada palavra, cada vrgula e caractere. Isso deve comear quando se pisa na sala de aula ou se redige o primeiro e-mail de natureza profissional. Se voc do tipo que repara e ajusta a largura exata do travesso, que fica nervoso quando v que algum ps um espao antes de uma vrgula, que por via das dvidas contrasta um mesmo verbete em dicionrios diferentes, se voc j se deliciou navegando em um dicionrio de sinnimos ou j gritou de alegria ao encontrar o nome exato daquela pecinha de um motor a jato, e se voc curtiria fazer isso pelo resto da vida, voc est no caminho certo para se tornar um daqueles profissionais indispensveis.NUTS AND BOLTS 4ENTREVISTA COM CAROLINA CAIRESCOELHO

O Conversa com Tradutores comea com uma amiga ainda virtual, mas que j tem minha admirao: Carolina Caires Coelho, a Carol, que tradutora literria e tem em seu currculo desde tradues de livros de administrao, filosofia, auto-ajuda, literatura at livros infantis e outros. Veja nosso bate-papo por e-mail abaixo:

Pet Rissati: Carol, como foi o incio da carreira?Carol:Desde que decidi ser tradutora, antes da faculdade, eu sabia que queria traduzir livros. Nunca fiz tradues tcnicas, nunca entrei em contato com agncias. Assim, escrevia para todas as editoras que encontrava na Internet e nas feiras de livros. Foi um trabalho exaustivo, mas valeu muito para que eu soubesse o que as editoras buscavam e como trabalhavam.PR: Como voc comeou com a traduo literria?

Carol: Comecei a procurar oportunidades de trabalho com editoras ainda na faculdade. Para as tradues, todas perguntavam se eu tinha algum livro traduzido e publicado. Percebi que no seria to fcil entrar no mercado! Mas insisti e comecei revisando textos, primeira e segunda provas, e um ano depois recebi a primeira proposta para traduzir um livro de auto-ajuda. Nunca mais parei.PR: Sempre digo que a traduo uma profisso encantadora: quanto mais voc traduz, mais voc aprende e quanto mais aprende, mais traduz. Como voc v nossa profisso hoje? E como as pessoas veem a traduo, na sua opinio?

Carol:Amo a traduo. um ofcio lindo, ainda que pouco compreendido. Lembro que, ainda menina, eu pegava os livros de minha irm mais velha e ficava curiosa para saber como um autor de nome estrangeiro tinha escrito um texto em portugus. Desse interesse veio a percepo do que era traduzir. Acredito que muitos jovens descobrem a traduo dessa maneira. A meu ver, a srie Harry Potter e agora, mais recentemente, a Crepsculo, entre outras, fizeram com que as pessoas de modo geral, no s as crianas e adolescentes, descobrissem que existe um profissional intermediando o contato do autor estrangeiro com os leitores brasileiros. E comearam a valorizar isso. Hoje, os tradutores mais famosos tm at comunidades em redes sociais! Isso timo! Ns no queremos fama, mas gostoso ver colegas tendo seu trabalho reconhecido.PR: Voc utiliza alguma ferramenta de auxlio traduo?

Carol:Tenho o Wordfaste estou aprendendo a mexer no MemoQ (memrias de traduo), mas no os utilizo com frequncia.PR: Na sua mesa de trabalho no pode faltar:

Carol:Alguns livros, como dicionrios, o VocabuLando(da IsaMaraLando), o livro que estiver sendo traduzido, um caderno, no qual anoto dvidas, pendncias e produo diria, e uma jarra de gua. Tenho tambm meu rdio para escutar msica nos intervalos. O resto e muito importante est dentro do computador: meus dicionrios online, o arquivo eletrnico do livro que eu estiver traduzindo, e as redes sociais (o Twitter, principalmente), por meio das quais mantenho contato com colegas tradutores de vrias partes do mundo. Esse contato essencial para mim, j que, trabalhando sozinha, no tenho um colega na mesa ao lado ou algum com quem papear na hora do almoo.PR: O que voc l alm dos livros que traduz? Qual o livro do momento para voc?

Carol: Adoro romances bem escritos, como os da JodiPicoult. Tive o prazer de traduzir um dos livros dela para a Editora Planeta e estou me dedicando traduo do segundo. J li quase todos os outros que ela escreveu. No momento, estou lendo Precisamos Falar Sobre o Kevin, excelente traduo de Vera Ribeiro e Beth Vieira, da Intrnseca.PR: Deixe um recado para quem admira ou quer comear na profisso.

Carol:Vou tentar repassar o conselho sbio do Danilo Nogueira: para cada hora de estudo do idioma de partida, gaste duas estudando o idioma de chegada. Leia muito sobre tudo. Duvide sempre de si mesmo; consulte dicionrios, gramticas, todos os recursos possveis. No tem muita experincia? Ningum nasce experiente em nada. Voc vai cometer erros; todos ns passamos por eles, em qualquer profisso e em qualquer nvel de desenvolvimento. Mas compense a falta de traquejo com outros predicados: pontualidade, profissionalismo e fora de vontade so um bom ponto de partida.NUTS AND BOLTS 5ENTREVISTA COM BEATRIZROSE

Conheo Beatriz Rose h uns bons anos, tradutora excelente dos idiomas alemo e ingls, professora de alemo e ingls e com um parentesco muito interessante: filha de uma das mais antigas tradutoras pblicas do Brasil, a queridssimaWaldtraut Rose, que atuou por muito tempo na ATPIESP (Associao Profissional dos Tradutores Pblicos e Intrpretes Comerciais do Estado de So Paulo). Alm de tradutora tcnica de mo cheia, Beatriz est comeando a entrar na rea de traduo editorial. Vamos comear?

Pet Rissati: Beatriz, conte um pouco sobre como a profisso de sua me influenciou na sua escolha profissional. E como voc chegou de fato traduo?

Beatriz: Estudei Letras na USP, mas por muitos anos estive determinada a NUNCAtrabalhar como tradutora, justamente por considerar territrio da minha me. Eu buscava minha prpria identidade. Atuei em outros campos, onde pudesse utilizar meus idiomas. Trabalhei como secretria, em importao e exportao, em hotis e restaurantes, dei aula E certo dia, eu me vi (isto ainda no Canad) desempregada e decidi trabalhar por conta prpria. Na poca, a Internet estava apenas comeando, eu nem sabia direito do que se tratava. Na casa de uma conhecida, ela me mostrou como utilizar um mecanismo de busca e a primeira ocorrncia minha entrada tosca tradutora portugus brasileiro- Montreal (ou algo semelhante) foi uma agncia procurando um(a) tradutor(a) com portugus brasileiro que morasse em Montreal. Coincidncia? No acredito em coincidncias. Trabalhei vrios anos com elesat voltar para o Brasil. Aprendi muito! Quando cheguei aqui, j no era mais novata e j havia descoberto meus pontos fortes (e fracos). Minha me e eu partilhamos da mesma profisso, mas ela se mostra de forma muito distinta para as duas. Ela tradutora pblica e eu no, mas alm disto temos nossas preferncias quanto s reas com as quais mais nos identificamos, modos diferentes de trabalhar com o texto Vou sempre ser filha da Waldtraut (e claro que no s em termos profissionais), mas conquistei meu espao. Meus clientes reconhecem meu trabalho e acredito que os colegas tambm me vejam como profissional e no simplesmente como filha dela; isto me deixa muito feliz. PR: Quais as reas que voc mais traduz? E sua rea preferida?

Beatriz: J traduzi/verti muitos textos sobre treinamento de RH, fichas tcnicas, normas de segurana, balanos, Biotecnologia (gosto muito!). Mas o que realmente me deixa contente quando aparece um texto de Medicina. O entusiasmo tal que tenho que me policiar para no me perder na pesquisa. Como tradutora autnoma no posso recusar um tema simplesmente por no fazer meu corao dar pulinhos de alegria. Exceo feita aos textos jurdicos que evito por no me sentir qualificada (ainda!).PR: Como voc v a profisso de tradutor hoje? E como as pessoas veem a traduo na sua opinio?

Beatriz: Embora a globalizao coloque em contato culturas/povos que antes no se comunicavam ou no se comunicavam tanto o que implicaria em uma necessidade maior de traduzir e verter textos para que eles se entendam esta mesma globalizao em grande parte tambm adotou o ingls como passaporte. Textos que antes vinham em alemo, por exemplo, agora so redigidos em ingls para que a empresa inteira tenha acesso. E como se espera que os funcionrios dominem o ingls, a traduo se tornou desnecessria ou ento o cliente acha que qualquer um que fale um pouco pode faz-lo. O que ele no sabe que este trabalho requer muito mais do que somente saber como se diz X em ingls, francs, alemo (e vice-versa) Trata-se de acertar o tom, saber em que contexto aquele enunciado est inserido E isto pressupe um conhecimento profundo do idioma, alis dos idiomas envolvidos. Infelizmente, os nossos consumidores no se do conta disto, tampouco de que o trabalho para ser bem feito demanda pesquisa e tempo. A presso de prazos (sempre apertados) necessariamente compromete a qualidade do resultado.PR: Tenho comentado no blogue sobre qualidade em traduo. Como voc percebe a qualidade das tradues das obras alems traduzidas hoje, diretamente do original?

Beatriz: Vou ficar lhe devendo esta resposta, porque tento ler as obras no original, principalmente as alems. Estou lendo um livro traduzido do ingls, que s confirma minha resistncia. Ao l-lo, acabo vertendo de volta para o ingls, o que no difcil, j que o(a) tradutor(a) manteve a estrutura frasaldo ingls, expresses idiomticas foram traduzidas ao p da letra Uma lstima! S insisto na leitura, porque a trama interessante. Mas uma pena, no acha? Como avaliar se o autor bom quando a traduo deixa tanto a desejar? No caso de obras literrias, o tradutor tem uma responsabilidade adicional de re-criar o texto, de preferncia sem trair o original.PR: O que no pode faltar na sua mesa de trabalho?

Beatriz:Apesar da facilidade de pesquisa via Internet, na maioria dos casos, um dicionrio fsico. E uma garrafa dgua, mas este outro assuntoPR: O que voc l alm dos textos que traduz? Qual o livro do momento para a voc?

Beatriz: Estou em falta comigo mesma em termos de leitura. Mas ultimamente tenho me dedicado mais a livros de teor religioso, um assunto que me interessa muito. PR: Deixe um recado para quem admira ou quer comear na profisso.

Beatriz: uma excelente opo para algum que, alm de dominar os idiomas, seja detalhista e goste (ou pelo menos no se importe) de trabalhar sozinho. E uma coisa certa: No h monotonia em termos de assuntos!

NUTS AND BOLTS 6ENTREVISTA COM ADRIANAMACHADO

Alegre e comunicativa, Adriana Machadodesempenha aquele ato que a ponte direta entre culturas: a interpretao. Pelas palavras dela, pessoas que dificilmente conseguiriam se comunicar conseguem se entender. Alm do ingls, tambm trabalha com o raro dinamarqus, que levou Adriana h pouco a servir de intrprete para Sua Alteza Real Prncipe Joachim da Dinamarca. Vamos ver o que ela tem a nos dizer.

Pet Rissati: Adriana, conte um pouco como voc chegou traduo simultnea.

Adriana: Primeiramente quero agradecer por estar entre os notveis entrevistados do Conversa entre Tradutores. Uma honra mesmo, porque nem chego perto de ter toda a experincia do pessoal que j li por aqui.Bem, eu no virei intrprete por acaso ou no susto. Mas tambm no foi nada planejado. Eu comecei o curso de preparao de tradutores e intrpretes da Associao Alumniem So Paulo num momento da vida em que queria mudar de rumo e iniciar uma nova carreira. No sabia nada mesmo sobre a profisso. Desde o incio do curso h exerccios direcionados preparao para a interpretao e achei aquilo bem interessante. Quando entrei na cabine pela primeira vez, a professora colocou uma fita pra tocar e eu tinha que traduzir ao mesmo tempo, achei aquilo o mximo e estava decidida! Estava bem claro que no seria nada fcil, mas o desafio tambm foi o estmulo. preciso mais do que vontade para conseguir um lugar nesse mercado, no como a traduo escrita, na qual a gente manda currculo, faz teste e assim vai conquistando seu lugar. No fcil conseguir aquele primeiro evento. Quem tem coragem de dar uma chance a um novato sem conhecer a qualidade do seu trabalho?Depois que me formei, comecei um curso de coachingem interpretao e fiquei mais um ano s praticando e, mais importante, conhecendo pessoas. Esse curso oferecia interpretao para um importante evento de ONGs a ttulo de patrocnio e mandava os bons alunos para fazer a simultnea. Conheci vrios colegas, alguns inexperientes como eu e outros j experientes e consagrados. No precisou muito mais do que isso, desde ento no parei mais. Contato gera contato, disponibilidade gera receptividade, esforo gera admirao, simpatia gera amizade, e isso tudo gera muito trabalho!PR: E como o dia a dia do intrprete?

Adriana: Se pensarmos em dia a dia como rotina, isso no existe! Um dia nunca igual ao outro. Um dia voc passa o dia em casa e sai noite para interpretar uma palestra, no outro acorda s 5 da manh para pegar a estrada e ir para a inaugurao de uma fbrica no interior. Um dia voc est interpretando um prncipe ou estadista numa recepo chiqurrimae no outro voc est sentado num sof numa casa na favela traduzindo uma entrevista de pesquisa de mercado. Um dia voc est traduzindo sobre meditao transcendental, no outro acompanhando uma visita a uma fbrica de explosivos e no outro procedimento para implante de desfibriladores. E por a vai. De tdio a gente no morre.PR: Os intrpretes enfrentam diversas saias justas e precisam utilizar toda a perspiccia para sair delas, sem deixar a tica da profisso de lado. Voc poderia nos contar uma saia justa e como saiu dela?

Adriana: Eu costumo dizer que intrprete no precisa ter nenhum dom especial, um crebro fora do comum ou todas as coisas que pensam por a. Importante uma boa dose de cara de pau e muito jogo de cintura. Voc tem poucos segundos para lembrar um termo e s vezes no lembra! Eu recentemente traduzi num evento no qual vrios palestranteseram indianos, daqueles que moram na ndia e falam aquele ingls que s elesentendem. Basicamente no dava pra entender o que estavam falando, no sabiam falar em pblico, tinham decorado a apresentao e falavam rapidssimo. As pessoas do pblico que entendiam ingls comearam a sair pra ir buscar o receptor para ouvir a traduo. Pensei: No adianta no, pessoal! A gente tambm no est entendendo nada. Mas como dizia uma professora: So