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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL ESPECIALIZAÇÃO EM TEORIAS DA COMUNICAÇÃO E DA IMAGEM DISCIPLINA: TEORIAS DA COMUNICAÇÃO PROF. RICARDO JORGE DE LUCENA LUCAS APOSTILA (teorias da comunicação) Atualizada em 2010

APOSTILA - DRB | Assessoria e Consultoria Educacional · RICARDO JORGE DE LUCENA LUCAS APOSTILA (teorias da comunicação) Atualizada em 2010 . ANTES DE TUDO: COMO LER E ESTUDAR

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

ESPECIALIZAÇÃO EM TEORIAS DA COMUNICAÇÃO E DA IMAGEM

DISCIPLINA: TEORIAS DA COMUNICAÇÃO

PROF. RICARDO JORGE DE LUCENA LUCAS

APOSTILA

(teorias da comunicação)

Atualizada em 2010

ANTES DE TUDO: COMO LER E ESTUDAR

O quê estudar? Qual seu tema? Qual o problema que seu tema propõe?

1. passo: procurando o tema

- qual o assunto que lhe interessa?

- é um aspecto específico dele? Ou é algo muito geral?

- o quê você tem sobre o assunto? (livros, artigos, trabalhos anteriores

etc.)

- você saberia discorrer sobre esse tema? (se sim, tente fazer um pequeno

texto sobre esse tema)

- você tem alguma(s) dúvida(s) sobre o tema?

2. passo: preparando o tema

- monte (ou tente montar) uma bibliografia que possa ser útil;

- pesquise bibliografias comentadas;

- procure referências e bibliografias comentadas sobre o assunto na

Internet em sites confiáveis (na dúvida, consulte o site www.allwhois.com);

- pesquise em livrarias e bibliotecas, livros e revistas acadêmicas;

- pesquise ementas e bibliografias de disciplinas de cursos de graduação e

pós-graduação da área que lhe interessa (para perceber as obras mais

recorrentes);

- perceba se há ou não obras que se refiram ao seu tema (atenção:

ausência de obras NÃO significa ausência de possibilidade de pesquisa).

3. passo: preparando a futura orientação

- vislumbre um professor com perfil adequado ao seu tema;

- monte (ou tente montar) sua própria bibliografia;

- submeta-a, junto com o texto no qual discorreu sobre seu tema, ao

professor candidato a orientador.

4. passo: preparando o ambiente de estudo

- separe ou dedique um espaço de sua residência para estudar, sem som,

TV, telefone e quaisquer objetos que possam tirar sua concentração;

- defina para si próprio o tempo e o horário que irá separar para estudar;

- tente perceber qual o horário de estudo para você (não se preocupe se

não é o mesmo horário de outras pessoas).

- tente ser rígido consigo próprio nesse quesito

5. passo: definindo o que ler

- não leia tudo, nem leia sem objetivo claro

- defina objetivo + finalidade + itinerário da leitura

- veja se, após a leitura, você consegue:

escrever algo resumidamente OU esquematizar os conceitos

- explore a “periferia” do texto e da obra

capa + contracapa + orelha

prólogo + prefácio + posfácio

introdução + conclusão + bibliografia

título + subtítulo + autor + sumário + índice analítico ou remissivo

- leia parágrafos a esmo e veja se o livro é compreensível;

6. passo: enfim, lendo

- leia o início e o fim dos capítulos pertinentes ao seu objeto;

- veja se os primeiros e últimos períodos de cada parágrafo dão noção

plena das idéias contidas no parágrafo todo;

- veja títulos, subtítulos, tópicos, ilustrações, gráficos e tabelas;

- veja as palavras destacadas ou sublinhadas pelo autor.

- anote tudo o que for útil (idéias, citações, conceitos, autores etc.) de

modo a que você possa recuperar as informações sobre aquele texto num

outro momento (cadernos, agendas, fichas, arquivos eletrônicos etc.).

LEMBRE-SE: a leitura é uma atividade que depende do tipo de texto que

se tem à frente. Não se lêem todos os tipos de texto do mesmo modo.

Texto narrativo = tudo é importante (detalhe pode mudar interpretação)

Texto jornalístico = manchete + início (lide) são o mais importante

Texto científico = idéias e conceitos são o mais importante (texto é

“redundante”, pois pressupõe que leitor possa ser leigo no assunto).

PARA LER MAIS:

BEAUD, Michel. Arte da Tese. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1996.

CHEVALIER, Brigitte. Leitura e Anotações. São Paulo, Martins Fontes,

2005.

TEORIA DA COMUNICAÇÃO; ANTES:

O QUE É TEORIA? O QUE É COMUNICAÇÃO?

Teoria - vem do grego, theoria (significa, dentre várias possibilidades,

contemplação, espetáculo, especulação, concepção mental, reflexão sobre

algo). Para alguns, pela theoria o homem se aproxima de Theous - Deus.

Teoria = conjunto de leis que sistematizam e/ou definem um fenômeno, ou

um conjunto de hipóteses que tentam confirmar/verificar/corrigir um

fenômeno. Teorias tendem ou a convergir ou a entrar em choque.

Ciência = campo do saber que tenta explicar de modo o mais completo

possível um certo campo de fenômenos. Para alguns, a ciência é limitada,

pois se constitui de um “recorte da realidade” acrescida de jargões de uma

dada área.

Paradigma = modelo ou “fórmula” que é a base de uma teoria dominante.

Aquilo que membros de uma comunidade científica partilham (Thomas S.

Kuhn); ao mesmo tempo, uma comunidade científica é formada de

indivíduos que partilham um paradigma (observação: sentido de “partilhar

um paradigma” não é o mesmo de “concordar com um paradigma”).

Paradigma pode tanto facilitar quanto “emburrecer” a ciência.

Verdade científica = limitada no tempo, no espaço e num dado meio

científico-social.

Metanarrativas (grandes narrativas) = saberes que tentam explicar a

realidade a partir de um determinado foco (“significado transcendental”,

diria Jacques Derrida: o capital, no capitalismo; o operariado, no

socialismo; o inconsciente, na psicanálise; Deus, no catolicismo etc.).

Ponto de viragem:

física clássica física quântica

observação direta escolha subjetiva

certezas probabilidades

Se verdade científica é algo limitado, ela pode ser colocada em xeque.

Alguns apontam para uma “crise dos paradigmas” (Jean-François Lyotard,

Michel Serres, Bruno Latour), uma vez que percebe-se que não há saber

que explique o todo ontológico da realidade (marxismo, capitalismo,

comunismo, psicanálise etc.)

Questões envolvendo teoria e comunicação:

1) Comunicação é uma ciência, um campo teórico ou um fenômeno?

(MUNIZ SODRÉ: “uma verdadeira teoria da Comunicação seria uma

colocação em xeque das outras Ciências Humanas”).

2) Comunicação é uma área/campo que historicamente se constituiu a

partir de outros campos do saber (Psicologia, Sociologia, Filosofia,

Lingüística, Antropologia, Informática etc.).

3) por não ser, certamente, uma ciência exata, mesmas causas implicam

em diferentes conseqüências ou efeitos.

Para se trabalhar com pesquisa em Comunicação, é preciso definir o viés

com o qual se pretende trabalhar:

- p sicológico (comportamento das pessoas individualmente)

- sociológico (comportamento do público coletivamente)

- lingüístico-semiológico (análise de textos e/ou mensagens)

- antropológico (relações grupais, aspectos culturais)

- filosófico (ética, verdade)

- estético (gráfico, artístico)

- informático (redes de computadores, mídias digitais)

- histórico (gênese de meios e tecnologias de comunicação,

resgate histórico)

A opção por um desses vieses NÃO EXCLUI necessariamente os outros

aspectos.

ATENÇÃO: PARADIGMA CLÁSSICO DA COMUNICAÇÃO:

Emissor -> mensagem -> Receptor

Ou simplesmente:

E -> R

E (emissor) = quem gera uma mensagem

-> = conteúdo a ser transmitido de E a R

R (receptor) = quem recebe uma mensagem

Crise dos paradigmas irá afetar e/ou problematizar, em alguns aspectos, o

paradigma clássico da Comunicação.

EMISSOR - criador ou fonte de uma mensagem

RECEPTOR - recebedor ou destinatário dessa mesma mensagem

MENSAGEM - ordenação de signos visando a transmissão de uma dada

informação

SINAIS - fenômenos físicos que transformam os signos em uma

mensagem

SIGNOS - elementos de uma mensagem (letra, imagem, som etc.)

CÓDIGO - linguagem ou sistema de signos convencionais e regrados na

qual a mensagem é transmitida

INFORMAÇÃO - o conteúdo de uma mensagem

RETORNO (FEED-BACK) - volta da mensagem à origem (emissor)

CONTEXTO - situação ou ambiente onde o processo comunicacional se dá

CANAL - o “suporte” físico ou material da mensagem

RUÍDO - sinal que atrapalha a transmissão da mensagem

REPERTÓRIO - vocabulário de um dado código

REDUNDÂNCIA - repetição de signos para reforçar uma dada mensagem

PARA LER MAIS:

COELHO NETTO, J. Teixeira. Semiótica, Informação, Comunicação. 3.

ed., São Paulo, Perspectiva, 1990.

PEREIRA, José Haroldo. Curso Básico de Teoria da Comunicação. Rio

de Janeiro, Quartet : UniverCidade, 2001.

EPSTEIN, Isaac. Teoria da Informação. São Paulo, Ática, 1986.

PRINCIPAIS CONCEITOS

DO CAMPO TEÓRICO DA COMUNICAÇÃO

NÍVEIS DE COMUNICAÇÃO:

comunicação intrapessoal - efetuada consigo próprio; emissor e receptor

coincidem.

( E = R)

comunicação interpessoal (ou face-a-face, presencial) - entre diferentes

pessoas, que são simultaneamente emissor e receptor.

(E/R <-> E/R)

comunicação intergrupal - entre diferentes grupos sociais.

comunicação massiva - apoiada nos tradicionais meios de comunicação de

massa (MCM), como rádio, televisão e mídia impressa. Emissor e receptor

são instâncias separadas pelo tempo e/ou espaço.

R

MCM (E) R

R

comunicação mediada pelo computador - efetuada através de

computadores interligados em rede, operando em “tempo real” (Internet,

intranets). Traz aspectos da comunicação interpessoal (onde pessoas são

simultaneamente emissor e receptor) e da comunicação massiva (há um

suporte técnico mediando os agentes sociais envolvidos no processo).

E/R E/R

E/R E/R

E/R E/R

Comunicação ocorre ainda entre:

- seres brutos (matérias) - transmissão, no sentido físico-químico

- seres orgânicos (animais) - informação, no sentido biológico

- seres humanos - interação + interpretação, no sentido cultural-simbólico

PRINCIPAIS CONCEITOS

DO CAMPO TEÓRICO DA COMUNICAÇÃO

COMUNICAÇÃO = conceito que se confunde com outros conceitos

paralelos (informação e transmissão)

Isso ocorre porque, nas sociedades tradicionais (pré-modernas),

comunicação e informação tendencialmente “caminhavam” juntas.

Além disso, uma noção de comunicação vai se desenhar na primeira

metade do século XX (consolidando-se nos anos 40-50), a partir do

momento em que os meios de comunicação de massa (rádio, cinema,

televisão) vão se tornando elementos cotidianos na vida das pessoas.

COMUNICAÇÃO vem do latim COMMUNICATIO, onde:

CO + MUNIS + TIO

SIMULTANEIDADE + ESTAR ENCARREGADO DE + AÇÃO-ATIVIDADE

Ou seja, a idéia de comunicação implica em uma atividade ou ação na

qual se pressupõe um compartilhar de algo.

A partir desses radicais, surgem outras palavras afins, como COMUNGAR.

Dicionários designam geralmente a comunicação como:

- ato de estabelecer relação (coisas, células, animais, seres humanos);

- ato de transmitir sinais através de códigos (animais, seres humanos);

- ato de trocar pensamentos ou sentimentos (seres humanos);

- usar meios tecnológicos (comunicação telefônica, via Internet);

- mensagem ou informação;

- vias que ligam espaços distintos, ou circulação;

- disciplina, saber, ciência ou grupo de ciências.

Vamos precisar o conceito de COMUNICAÇÃO e diferenciá-lo de INFORMAÇÃO

INFORMAÇÃO (Adriano Duarte Rodrigues) = “a esfera da informação é uma realidade relativa que compreende o conjunto dos acontecimentos que ocorrem no mundo e formam o nosso meio ambiente. Os acontecimentos são tanto mais informativos quanto menos previsíveis e portanto mais inesperados. (...) A informação é, por conseguinte, uma realidade que pode ser teoricamente medida pelo cálculo de probabilidades, sendo o valor informativo de um acontecimento inversamente proporcional à sua probabilidade de ocorrência (...) A informação está por isso intimamente associada à natureza relativamente inexplicável de fenômenos, ao fato de a razão humana não os conseguir dominar e de ocorrerem no mundo à nossa volta sem aviso prévio, fora do controle e do domínio da liberdade humana, de intervirem de maneira brutal e inesperada” (RODRIGUES, 1994: pp. 20-1).

COMUNICAÇÃO é um PROCESSO DE TROCA ENTRE DOIS AGENTES

(ANIMAIS, SERES HUMANOS ETC.), uma vez que há algo a ser

compartilhado.

COMUNICAÇÃO (Adriano Duarte Rodrigues) = “processo que ocorre entre

pessoas dotadas de razão e de liberdade, entre si relacionadas pelo fato de

fazerm parte, não do mundo natural, com as suas regras brutais e os seus

mecanismos automáticos, mas pelo fato de pertencerem a um mesmo

mundo cultural.

(...) processo dotado de relativa previsibilidade. Da previsibilidade do

processo comunicacional depende um dos seus princípios fundamentais, o

da intercompreensão.

(...) os processos comunicacionais são dotados de valores que põem em

jogo as preferências, as opções, os desejos, os amores e os ódios, os

projetos, as estratégias dos intervenientes na intercompreensão e na

interação.

(...). A comunicação não é um produto, mas um processo de troca

simbólica generalizada, processo de que se alimenta a sociabilidade, que

gera os laços sociais que estabelecemos com os outros, sobrepondo-se às

relações naturais que mantemos com o meio ambiente” (RODRIGUES,

1994, pp. 21-2).

INFORMAÇÃO. Vem do latim informatio (ação de modelar ou de dar forma). Ou seja, ela formata um aspecto da realidade, por nós desconhecido, de um modo específico.

COMUNICAÇÃO = INFORMAÇÃO

ASPECTO CENTRAL DA COMUNICAÇÃO = TROCA

TROCA => OUTRAS ÁREAS (ECONOMIA E ANTROPOLOGIA)

ECONOMIA = pensamento fisiocrata - FRANÇA, SÉC. XVIII

(François Quesnay)

Premissa = fisiocratas eram anti-mercantilistas (mercantilismo pregava o

centralismo do estado nas decisões). Fisiocratas adotam o lema do

laissez-faire, laissez-passer (“deixar fazer, deixar passar”) e a figura da

“mão invisível do mercado”.

Progresso político-econômico viria com o desenvolvimento dos meios de

comunicação (ou melhor, das vias fluviais, marítimas e terrestres de

comunicação), interligando diferentes pontos, fazendo circular produtos e

renda. Ou seja: há uma visão de interdependência entre as partes,

sistêmica, no qual tudo precisa funcionar bem para que todos estejam

bem. Economia de fluxo, de trocas, era vista como algo “natural”.

ANTROPOLOGIA = estudo sobre dádiva - FRANÇA, SÉC XIX-XX

(Marcel Mauss).

Premissa = troca é um fato social total (conforme definição do tio, Émile

Durkheim, ou seja, quando a totalidade do social está presente, ou ainda,

quando o fato é puramente social, não pode se dar apenas na instância do

estritamente individual).

Mauss = dádiva é um fato social baseado numa tríade: dar, receber e

retribuir (objetos materiais ou simbólicos), criando laços sociais.

DÁDIVA = processo de mão dupla “desigual”, pois:

QUEM DÁ, PODE RECEBER - QUEM RECEBE, DEVE RETRIBUIR

Está em vantagem, portanto, quem dá, criando uma obrigação para quem

deve retribuir. Mesmo que o recebedor não queira “entrar no sistema”, ele

já está nele ao receber, e mesmo que se recuse a receber ou a retribuir.

Ou seja: o que está em jogo aqui são a honra e o prestígio (de dar ou de

retribuir).

DIFERENÇAS

ECONOMIA: TROCA = LUCRO (MERCADO + SOLIDÃO)

ANTROPOLOGIA: TROCA = HONRA (ALIANÇA + SOCIABILIDADE)

ASPECTO CENTRAL DA INFORMAÇÃO = TRANSMISSÃO

(DA MENSAGEM)

INFORMAÇÃO = mensagem referente a acontecimento inesperado,

desconhecido ou novo, do ponto-de-vista de quem NÃO o conhece e que

depende das probabilidades de acontecer ou não.

INFORMAÇÃO = matéria-prima da comunicação e da cultura de massas

(novelas, noticiários, eventos esportivos etc.), uma vez que trabalham com

subentendidos do tipo “saiba que”.

INFORMAÇÃO = transmissão UNILATERAL de um suposto SABER, da

parte de quem sabe (EMISSOR) direcionado para um ou mais destinatários

que supostamente NÃO SABEM DE OU DESCONHECEM ALGO.

Preocupação: que mensagem emitida seja a mesma a ser recebida pelo

destinatário, sem perda de elementos ou falhas de transmissão.

Mensagem enviada (emissor) = Mensagem recebida (receptor)

COMUNICAÇÃO = baseia-se na TROCA

INFORMAÇÃO = baseia-se na TRANSMISSÃO DE ALGO (MENSAGEM)

Antigamente (sociedades pré-modernas), comunicação e informação

caminhavam juntas, ou seja, partilhavam a mesma EXPERIÊNCIA para os

indivíduos envolvidos. Com o desenvolvimento da comunicação de massa,

instâncias da comunicação e da informação se separam.

SODRÉ: “a regra do jogo é fingir que o medium (o intermediário técnico

entre falante e ouvinte) equivale à completa realidade comunicacional dos

sujeitos. E o primeiro grande falseamento operado por essa ficção é

confundir informação com comunicação” (SODRÉ, 1977: 24)

COMUNICAÇÃO DE MASSA (THOMPSON) = “série de fenômenos que

emergiram historicamente através do desenvolvimento de instituições que

procuravam explorar novas oportunidades para reunir e registrar

informações, para produzir e reproduzir formas simbólicas, e para transmitir

informação e conteúdo simbólico para uma pluralidade de destinatários em

troca de algum tipo de remuneração financeira.

Sejamos mais precisos: eu usarei a expressão ‘comunicação de massa’

para me referir à produção institucionalizada e difusão generalizada de

bens simbólicos através da fixação e transmissão de informações ou

conteúdo simbólico” (THOMPSON, 1998: 32. Grifos no original).

Diferenças centrais entre comunicação e informação

COMUNICAÇÃO = processo de troca simbólica

INFORMAÇÃO = mensagem a ser transmitida a alguém

COMUNICAÇÃO = processo dialógico, bilateral

INFORMAÇÃO = transmissão monológica, unilateral

(detalhe: sempre há possibilidade de reversibilidade da informação num

processo comunicacional; a essa reversibilidade da informação, de volta ao

emissor, chamamos feed-back).

COMUNICAÇÃO = potencialmente horizontalizada

INFORMAÇÃO = tendencialmente verticalizada

A COMUNICAÇÃO COMO OBJETO TEÓRICO

Tende-se a pensar a Comunicação como objeto teórico somente a partir do

séc. XX, quando do surgimento e expansão dos MCM.

Primeiros “teóricos” da Comunicação = Platão e Aristóteles

Platão: trata de temas que ainda são recorrentes até os dias de hoje

Fedro (problema da relação escrita x memória; tecnologia)

A República (problema da representação, simulacro e espetáculo)

“Seguidores” de Platão = pensadores pós-modernos (Jean Baudrillard) e

críticos da tecnologia (Neil Postman), por exemplo.

“Polêmica”: Filosofia (Platão), Dialética (Sócrates) e Retórica (Górgias).

FILOSOFIA = busca da verdade (ideal) e do conhecimento

DIALÉTICA = busca do verdadeiro na síntese (tese x antítese)

RETÓRICA = busca do bom resultado (verossímil)

RETÓRICA surge provavelmente na Sicília (467 a.C.) (disputa jurídica).

Córax e Tísias levam-na para a Grécia, considerada berço da Retórica;

depois ela vai se desenvolver em Roma.

RETÓRICA vem de rhetón (dizibilidade / discurso / expressão), significa

“arte de persuadir pela argumentação” (“fazer crer em”, ≠ “levar a fazer algo”).

RETÓRICA = primeira sistematização de conhecimentos e idéias acerca

da Comunicação. Influenciou outros campos do discurso (Jornalismo,

Publicidade, Direito, Pedagogia etc.)

É ampliada por Górgias na Grécia antiga, depois por demais sofistas.

Sofistas = combatidos por Platão, por praticarem, em vez da boa retórica

em busca da Verdade (psicagogia: formação das almas pela palavra), uma

má retórica (logografia: fala-se sobre qualquer coisa em troca de dinheiro e

“exibicionismo”).

Aristóteles sistematiza Retórica para tratar do verossímil (aquilo a que não

cabe uma verdade, pois trata do “que lhe parece” - opinião - e não “do que

é”) e transforma-a, efetivamente, na primeira teoria da Comunicação:

1) Arte Retórica trata de três instâncias:

ORADOR (tomo I) JUÍZES (tomo II) ESTILO (tomo III)

EMISSOR RECEPTOR MENSAGEM

2) retórica baseia-se no kairós ( , senso de oportunidade ou

politropia): adapta-se o discurso para cada situação e cada platéia a ser

convencida (oposto, um mesmo discurso para todos = monotropia).

3) sistema retórico permite seu uso para praticamente todas as produções

textuais (orais, escritas, audiovisuais etc.).

4) Retórica aristotélica é, para alguns, ainda a primeira teoria da Recepção,

uma vez que discurso deve ser adaptado, ou seja: a recepção é pensada

antes e no momento da emissão. Esse aspecto será esquecido por grande

partes das posteriores teorias da comunicação de massa.

O SISTEMA RETÓRICO é composto de 3, 4 ou 5 partes (varia conforme

autores):

- inventio (heuresis) = escolha dos argumentos (e não invenção)

- dispositio (taxis) = disposição, ordenamento dos argumentos

- elocutio (lexis) = estilo de expressão dos argumentos; ornamento

- actio (hypocrisis) = estilo corporal/gestual para apresentar argumentos

- memoria (mneme) = capacidade mnemômica de expor argumentos

Inventio - busca dos argumentos para convencer a um auditório, depende:

1) do gênero do discurso:

2) do tipo de argumento:

etos (ethos) - caráter (do orador) - MORAL

patos (pathos, passio) - emoções (do auditório) - PSICOLÓGICO

logos - argumentação dialética (do discurso) - LÓGICO

“Los medios operan, de distintas maneras y con resultados diferentes

según las circunstancias, sobre las tres dimensiones básicas de la

comunicación: la dimension de las reglas (qué se debe hacer o no hacer: el

componente ético); la dimensión de los hechos (cómo se describe un

acontecimiento determinado, cómo se lo narra, cómo se lo contextualiza: el

componente relativo a la veracidad de la información) y los sentimientos

(qué sensaciones, impresiones, afectos, son asociados a tal o cual hecho:

el componente emocional de la información)”. (VERÓN, 1999: 131)

Dispositio - ordenação dos argumentos, constitui-se de:

exórdio - início do discurso - etos

narração - exposição clara, breve e crível dos fatos - logos

confirmação - conjunto de provas - logos

peroração - fim do discurso - logos + patos

Pode haver ainda:

digressão - relaxamento do discurso

recapitulação - resumo da argumentação

Judiciário Juízes Passado Acusar/defender Justo/injusto Entinema Possível/

(dedutivo) impossível

Deliberativo Assembléia Futuro Aconselhar/desaconselhar Útil/nocivo Exemplo Real/ (indutivo) não-real

Epidíctico Espectador Presente Louvar/censurar Nobre/vil Amplificação Mais/

menos

Elocutio - uso de figuras e de estilo adequado à situação

Estilo objetivo prova momento do discurso

nobre comover patos peroração/digressão

simples explicar logos narração/confirmação

ameno agradar etos exórdio/digressão

Actio - diz respeito à capacidade interpretativa do orador: voz, gestos,

acenos de cabeça etc.

Memoria - capacidade de falar em público como se estivesse criando no

momento mesmo da emissão.

Chréia - exercício de invenção e memória (“antecessor” do lide jornalístico):

Quis? Quid? Ubi? Quibus auxiliis? Cur? Quomodo? Quando?

(Quem? O quê? Onde? Por que meios? Por quê? Como? Quando?)

Retórica aristotélica, diferente de boa parte das teorias da Comunicação,

vê receptor como parte ativa do processo comunicacional, livre:

“persuasão implica liberdade. Não faz sentido tentar persuadir alguém que

não pode escolher, que não pode exercitar um mínimo de livre-arbítrio. A

persuasão também implica diferença, pois tampouco há sentido em tentar

influenciar alguém que já pensa como você, a não ser talvez como um tipo

de suplemento ideológico. (...) não existe, portanto, nenhuma contradição

entre retórica ou democracia, ou entre retórica e conhecimento. Pelo

contrário, a retórica pressupõe e requer democracia; e na medida em que

a retórica é tanto prática como crítica ela também a sustenta. A retórica é

essencial tanto para o exercício do poder como para sua oposição”

(SILVERSTONE, 2002: 64-5. Grifos no original)

PARA LER MAIS:

ARISTÓTELES. Arte Retórica, Arte Poética. Rio de Janeiro, Tecnoprint,

s.d.

BARTHES, Roland. “A Retórica Antiga”. In BARTHES, Roland. A Aventura

Semiológica. Lisboa, Ed. 70, 1987, pp. 19-91.

NEIVA JR., Eduardo. Comunicação - teoria e prática social. São Paulo,

Brasiliense, 1991, pp. 169-201.

PLEBE, Armando. Breve História da Retórica Antiga. São Paulo, EPU/

Edusp, 1978.

FUNCIONALISMO NORTE-AMERICANO

A Comunicação volta a ser estudada sistematicamente só no início do

século XX (em particular no período entre as duas Grandes Guerras), com

o advento e expansão dos MCM. Essas retomadas influenciaram boa

parte dos anos 60/70 (70/80 no Brasil). Suas origens:

CONTEXTO = EUA, pós-I Guerra Mundial

INFLUÊNCIAS = behaviorismo (John Watson) + condicionamento clássico

(Ivan Pavlov). Visão psicanalítica (inconsciente, ego) é aqui ignorada.

América do Norte

Teorias matemáticas, pensamento funcionalista norte-americano e ideário de Marshall McLuhan

Europa

a teoria crítica da

Escola de Frankfurt e a

semiologia francesa

Behaviorismo

comportamento humano é

analisável porque observável,

graças aos estímulos que

provocam respostas (atos do

indivíduo); recusam-se conceitos

mentais (não-observáveis)

E > R (estímulo provoca resposta)

Condicionamento pavloviano

tentava mostrar que biologia

natural podia ser influenciada

por estímulos externos.

Padrões comportamentais não

eram herdados ou genéticos,

apenas, mas também alterados

E externo > atividade natural

Cria-se a idéia dos MCM como instâncias criadoras de “estímulos”

(conteúdos), que provocariam “respostas” (efeitos) junto à audiência (vide

notícias sobre a guerra, propaganda, programa de rádio A Guerra dos

Mundos, de Orson Welles etc.). É a base para a Teoria da Agulha

Hipodérmica (ou Teoria da Bala Mágica ou da Correia de Transmissão):

MCM = onipotentes, poderosos X massa = impotente, passiva

(massa = sociedade de indivíduos isolados, conforme pensamento de

Gustave Le Bon e José Ortega y Gasset)

PLEBE, Armando & EMANUELE, Pietro. Manual de Retórica. São Paulo,

Martins Fontes, 1992.

REBOUL, Olivier. Introdução à Retórica. São Paulo, Martins Fontes, 1998.

É no final dos anos 40, dentro desse cenário de paranóia/medo, que

surgem, nos EUA, dois dos paradigmas mais clássicos da Comunicação e

que orientarão grande parte dos estudos posteriores na área: o modelo

teórico de Harold Lasswell e a Teoria Matemática da Informação de

Shannon & Weaver.

Harold Lasswell

1948, “A Estrutura e a

Função da Comunicação

na Sociedade”

quem? diz o quê? em

qual canal? para quem?

com quais efeitos?

Viés funcionalista: vê o

sistema social como um

organismo cujas partes,

de funções específicas,

devem funcionar

bem para o todo

funcionar bem

Meta: funcionalidade do

sistema

Claude Shannon e Warren Weaver

1949, “A Teoria

Matemática

da Comunicação”

Viés matemático-informacional: vê partes

componentes do sistema (e não o processo

comunicacional) comunicativo apenas do

ponto-de-vista técnico, com particular

preocupação de que os sinais da mensagem

transmitida cheguem ao destinatário

do mesmo modo que “saíram” da fonte.

Meta: transmissão otimizada da mensagem,

sem preocupação com o seu conteúdo

fonte destinatário

mensagem mensagem

codificador (E) sinal canal sinal decodificador (R)

sentido da transmissão

(ruído)

Diferenças nas propostas paradigmáticas de Lasswell e de Shannon &

Weaver:

Em ambos os casos, só uma coisa importa: o sistema (social ou técnico)

Shannon & Weaver

preocupação apenas

com o funcionamento

técnico (não

semântico) do

sistema comunicativo.

Lasswell

preocupação com o papel da mídia

na sociedade. Funções:

vigilância + correlação das partes sociais +

transmissão da herança cultural

Paradigma matemático-informacional de Shannon & Weaver, aplicado

apenas às telecomunicações e à engenharia de comunicações, foi

depois adaptado por Wilbur Schramm à comunicação humana, onde:

fonte + codificador = comunicador

decodificador + destinatário = receptor

comunicador e receptor = devem partilhar “campos de

experiências em comum” (em outros termos: repertório).

Schramm percebeu: 1) estudo da Comunicação como dependente de uma

série de outros fatores, como contribuições de outros campos científicos

(Sociologia, Psicologia); 2) Comunicação como “relação interativa” (e não

como apenas algo que se transmite a alguém) e; 3) que estudar a

Comunicação significa estudar as pessoas que interatuam nos processos

comunicacionais.

Outros autores norte-americanos importantes:

Paul Felix Lazarsfeld - avança em relação a demais pesquisadores norte-

americanos. Premissa: todo ser humano é capaz de fazer escolhas,

portanto não sendo tão passivo quanto se imaginava (e sim seletivo).

Para Lazarsfeld, pessoas tomam decisões a partir da influência pessoal do

“líder” de um grupo ao qual pertença. É o two-step flow of communication

(duplo fluxo da comunicação), proposto junto com Elihu Katz:

MCM

A

A

A

A

MCM

A

E

B

D

C

H

G

F

Ação da mídia pela ótica

da Teoria Hipodérmica

Two-step flow of communication

A = indivíduo isolado A, E = formadores de opinião

junto aos demais

{

Lazarsfeld chegou a trabalhar nos anos 50 junto com Adorno (a quem

acusou de não fazer a verificação das hipóteses com as quais trabalhava)

e, apesar de defender a administrative research, percebeu três funções

dos MCM, juntamente com Robert King Merton:

1) o poder de atribuir status a questões públicas, pessoas, organizações e

movimentos sociais (estabilização e coerção à hierarquia da sociedade);

2) a execução de normas sociais (normatização e visibilização dos desvios

possíveis numa sociedade);

3) a capacidade de narcotizar o público (chamado pelos autores de

“disfunção narcotizante”). Ou seja: o indivíduo prefere “saber sobre algo” a

“fazer algo sobre” (informação inibe a ação).

Joseph T. Klapper - ex-aluno de Lazarsfeld e sociólogo, Klapper propõe

modelo teórico no qual os MCM não podem ser tomados como causa única

e suficiente dos efeitos junto ao público. Visão fenomênica de Klapper vê

“os meios de comunicação como uma influência que opera entre outras

influências dentro de uma situação total” (apud MCQUAIL, 1985: 228).

Klapper aprofunda noção da capacidade seletiva do público, pois crê que:

1) pessoas preferem se expor aos MCM condizentes com as suas atitudes

individuais; portanto, na verdade, em vez de serem influenciadas pelos

MCM, as pessoas reforçariam seus sistemas de crenças, pois

2) as pessoas não estão diante dos MCM em estado de “nudez

psicológica”, mas sim com um conjunto de pré-disposições já existentes.

Percebe-se, aqui, que foco dos estudos sobre os MCM vai gradativamente

deixando de lado os conteúdos e os efeitos que eles provocam, e passam

a se dirigir para o lado dos receptores.

PARA LER MAIS:

ARAÚJO, Carlos Alberto. “A Pesquisa Norte-Americana”. In: HOHLFELDT,

Antonio, MARTINO, Luiz C. & FRANÇA, Vera Veiga. Teorias da Comuni-

cação. Petrópolis, Vozes, 2001, pp. 119-30.

POLISTCHUK, Ilana & TRINTA, Aluizio Ramos. Teorias da Comunicação.

Rio de Janeiro, Campus, 2003, pp. 83-108.

WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. Lisboa, Presença, 1987.

ESCOLA CANADENSE DE ESTUDOS EM COMUNICAÇÃO

Outro conjunto de idéias sobre os MCM vem do Canadá (anos 60) na

polêmica obra de Marshall McLuhan, seguidor das idéias de Harold Innis

(começo dos anos 50), geógrafo e economista.

Foco de Innis = determinismo tecnológico; tecnologias da comunicação (e

outras também, como transporte) são base de processos políticos e

econômicos. Traços culturais de cada civilização antiga estão ligados aos

meios por ela usados (meio “predispõe” uma forma social específica).

Comunicação, tecnologia e esfera econômica = favorecem “monopolização

do conhecimento” por parte de um grupo que cria/domina uma nova

tecnologia, criando um “desequilíbrio” na sociedade (experts x “analfabetos

tecnológicos”). Resultado: ou se impede o desenvolvimento ou surgem

novos mecanismos para tentar “corrigir” esse desequilíbrio.

Dimensões fundamentais = tempo e espaço (cada meio se adapta melhor a

uma dimensão do que a outra). Exemplos: papel e papiros (da ordem da

inscrição e leves) e comunicação eletrônica tendem a vencer o espaço, por

se “moverem” mais facilmente; pedra, pergaminho e argila (da ordem da

inscrição mas pesados e resistentes) tendem a vencer o tempo. Esses

aspectos influenciam no desenvolvimento de uma civilização.

Innis troca as considerações sobre os efeitos e os conteúdos (mensagens)

por questionamentos sobre os canais. Seu pensamento terá influências,

diretas ou indiretas, nas obras de McLuhan, Pierre Lévy, Derrick de

Kerchove e Régis Debray.

McLuhan - para alguns, precursor dos estudos midiológicos (“lógica da

mídia”). Foge do formalismo do funcionalismo, mas não do funcionalismo

em si (ao prever a “aldeia global”, espécie de “expansão/conexão mundial”

da mídia até então localizada, por exemplo).

McLuhan privilegia em suas análises o sensorial, nunca o ideológico.

Importava para ele como o canal e a mensagem (“massagem”) atuavam

no receptor, mas não o quê a mensagem significava.

Para McLuhan, um novo meio modifica a percepção sensorial da realidade,

uma vez que ele é uma extensão de algum sentido humano; um novo meio

cria um novo ambiente, com conseqüências psíquicas e sociais. Meios se

influenciam, se alternam, superam um ao outro, mas não se destróem.

McLuhan

1) propõe uma divisão dos meios:

2) propõe uma linha evolutiva para a Humanidade:

tribalização (oral) -> destribalização (escrita) -> retribalização (eletrônica)

3) e define que: “o meio é a mensagem” (pois o conteúdo de um meio é

um outro meio)

Crítica ao pensamento de McLuhan:

1) falta de sistematização;

2) frouxidão dos conceitos (vide meios quentes e frios);

3) desinteresse pelos conteúdos midiáticos;

4) o meio não é a mensagem; o meio faz parte da mensagem.

Virtudes do pensamento de McLuhan:

1) pensar, para além dos conteúdos, os suportes midiáticos e suas

conseqüências sociais e individuais;

2) pensar, ainda que frouxamente, no papel do receptor diante dos meios.

Meios quentes (hot media)

prolongam um único sentido

em alta definição (grande

quantidade de dados)

menos participativo

livro, jornal, rádio,

cinema, fotografia

Meios frios (cool media)

prolongam vários sentidos em

baixa definição (pequena

quantidade de dados)

mais participativo

TV, telefone, HQs,

desenho animado

PARA LER MAIS:

MCLUHAN, Marshall. A Galáxia de Gutenberg. São Paulo, Editora Na-

cional, 1972.

MCLUHAN, Marshall. Os Meios de Comunicação como Extensões do

Homem. São Paulo, Cultrix, 1969.

4.000 a. C.

486 a.C.

1457

Séc. XVIII

1a. metade

do Séc. XX

Anos 40/

Séc. XXI

Escrita

Retórica

Livro impresso

Surgimento da

imprensa

Expansão dos

MCM

Surgimento e

expansão da

informática e

tecnologias digitais

- 1a. técnica de comunicação

(ideográfica e alfabética)

- surgimento de escribas e

lectores

- 1a. teoria da comunicação

- exercício da fala / memória

- memória do texto escrito

- “dissociação” autor x texto

- aceleramento da difusão da

visão eurocêntrica

- texto = não-circulante

- influência de teorias liberais

(Quesnay, Smith) sobre fluxos

e circulação

- influência da Revolução

Francesa (cidadania / opinião /

informação / censura)

- divisão do espaço entre público

e privado

- 1as. primeira teorias da

comunicação de massa

- surgimento de uma nova elite

- surgimento da cultura de massa

- remodelamento das teorias da

comunicação em geral

- influência no processo de

globalização

- digitalização de processos

econômicos, culturais etc.

- surgimento de mídias digitais

PRINCIPAIS FATOS ENVOLVENDO ASPECTOS

DA COMUNICAÇÃO E AS MODIFICAÇÕES

SOCIAIS RESULTANTES

ESCOLA DE FRANKFURT - perspectiva crítica diante dos MCM;

contrapõe-se à visão funcionalista e administrativa norte-americana.

Nomes centrais: Theodor W. Adorno, Max Horkheimer, Herbert

Marcuse, Erich Fromm (mais Walter Benjamin e Siegfried Kracauer).

Base teórica central = marxismo (ideologia) + psicanálise (projeções)

Premissas:

1) MCM impõem a ideologia da classe dominante, através da persuasão ou

manipulação; por isso não teria havido a revolução proletária.

2) sociedade é um todo, não dividida em partes funcionais, mas como

resultado de processos histórico-sociais, portanto não naturais.

3) Dialética do Iluminismo: se a Modernidade previa libertação do homem

através do progresso econômico, racionalidade e tecnologia, o que ocorre

é oposto, ou seja, a barbárie tecnológica (com os MCM inseridos nesse

universo). Indivíduo progressivamente vai perdendo a sua autonomia.

Visão marxista = transposta da análise dos meios de produção de bens

materiais para os meios de produção de bens simbólicos.

Indústria cultural (Kulturindustrie) = termo cunhado por Adorno e

Horkheimer nos anos 40 para substituir a expressão “cultura de massas” e

explicar o processo de serialização / estandartização / divisão do trabalho

que rege a transformação da cultura em mercadoria na esfera capitalista.

Termo se opõe a Kultur, que diz respeito à capacidade de criação do

espírito humano nas diversas áreas e que traz embutido a noção de

progresso e de civilização.

Produtos culturais subordinam-se à racionalidade técnica / organizacional /

de planejamento.

Arte = sacralizada

Produto cultural = dessacralizado

Produtos culturais são ideológicos, em dois sentidos possíveis do termo:

falsa consciência / alienação + ideologia [da classe] dominante

Assim, consumidor (sujeito da indústria cultural) é “objeto” (vítima) dela.

Estudos frankfurtianos centravam-se mais nos aspectos teóricos de suas

análises do que na verificação empírica de suas teses (o que levou, dentre

outros motivos, a antagonismos entre Adorno e Lazarsfeld, quando da

estada do alemão nos EUA nos anos 40).

Radicalidade do pensamento frankfurtiano, para alguns (como Jesús

Martín-Barbero), deve-se ao contexto em que foi produzido: Alemanha

nazista + Estados Unidos da [pretensa] democracia de massas.

Problemas do pensamento frankfurtiano:

1) visão elitista da arte, baseada na Aufklärung (“estado social oposto à

barbárie dos povos selvagens”). A arte não pode “rebaixar-se”, tornar-se

“ligeira”, nem ir ao encontro das massas; deve buscar a comoção, não a

emoção; buscar a experiência estética, não a diversão. Adorno: “a arte

permanece íntegra precisamente quando não participa da comunicação”.

Em suma: arte e massas seriam pólos distantes, opostos; experiência

estética e prazer são termos inconciliáveis.

2) enxergar indústria cultural como “sistema” (conceito esse criticado pelos

próprios frankfurtianos quando se referiam ao modo como os funcionalistas

norte-americanos se referiam à sociedade). Não enxergam indústria

cultural como palco de contradições, conflitos e dilemas, nem como

reprodutora de aspectos culturais da esfera social na qual ela é gerada.

Isso implica em visão totalizante / totalitária da realidade construída pelos

MCM (alguns desses aspectos serão rebatidos tanto por Estudos Culturais

quanto por pensadores pós-modernos). Exemplo: afirmação de Adorno de

que todos os filmes, de Charles Chaplin a Orson Welles, dizem a mesma

coisa, relativa ao triunfo do capitalismo invertido.

3) percebem sujeito receptor como alguém acrítico, não dotado de

capacidade crítica diante da realidade e do que lhe é imposto/sugerido

pelos MCM. Para frankfurtianos, individualidade é na verdade uma pseudo-

individualidade, baseada em estereótipos que balizam tanto o tempo

produtivo quanto o tempo livre (lazer) das pessoas.

Benjamin e Kracauer: frankfurtianos, ma non troppo

Se frankfurtianos enxergavam tecnologia quase que totalmente com

restrições (dentro da visão iluminista que não se concretizou e por causa

do potencial exploratório do capitalismo), Benjamin e Kracauer percebem a

tecnologia como algo que pode (não necessariamente deve) revolucionar a

arte; ou seja, percebem um potencial revolucionário nela.

Cidade + tecnologia = novas possibilidades estéticas e culturais. Privilégio

cultural deixava de ser apenas da burguesia para se “espraiar” para as

massas.

Kracauer: via cinema, por exemplo, como esfera na qual sonhos/desejos/

devaneios reprimidos em outras esferas eram expressos “livremente”.

Benjamin: acreditava que a arte, livre da aura, podia tornar-se objeto

cultural, reprodutível e ao alcance das massas, que dificilmente teriam

acesso à obra de arte de um outro modo. Sensibilidade dava lugar à

aproximação. Essa nova experiência era fundamental para entender as

massas, para entender sua recepção. E isso era possível graças às novas

tecnologias (fotografia, cinema etc.).

Para Benjamin, atividade crítica e prazer artístico podem estar juntos.

Massa que “de retrógrada diante de um Picasso se transforma em progres-

sista diante de um Chaplin” (Benjamin). Pensamento benjaminiano terá

influências nos Estudos Culturais.

Edgar Morin - um frankfurtiano à francesa

Pensamento da Escola de Frankfurt deixou algumas marcas na França,

com Edgar Morin, que introduziu no país o conceito de “indústria cultural”,

a qual, para ele, não é onipotente, mas produtora de mudanças culturais.

Diferente de Adorno, Morin não crê na morte da criação artística, mesmo

com as esferas de planejamento, divisão de trabalho e mediação

existentes dentro da indústria cultural (criação tende a se tornar produção).

“A cultura de massa é uma cultura: ela constitui um corpo de símbolos,

mitos e imagens concernentes à vida prática e à vida imaginária, um

sistema de projeções e de identificações específicas. Ela se acrescenta à

cultura nacional, à cultura humanista, à cultura religiosa, e entra em

concorrência com estas culturas” (MORIN, 1975: 11). A cultura de massas

se torna a “primeira cultura universal da história do homem” (idem: 12).

Análise leva a Morin a dizer que indústria cultural se apóia numa dualidade:

burocracia-invenção x padrão-individualidade

Ou seja, ao mesmo tempo em que se produz/oferta sempre o mesmo

produto, ele deve também ter algo de novo, de diferente, a fim de produzir

um mínimo de originalidade.

O que vai possibilitar tal “paradoxo” é o fato de que existe uma estrutura do

imaginário, que é “esqueletado” conforme determinados arquétipos

(figurinos-modelo). Ambos (indústria cultural e imaginário), por serem

estruturas, podem “dialogar” entre si, ainda que haja tendência para a

transformação dos arquétipos em estereótipos.

Grandes temas do imaginários viram arquétipos e estereótipos constituídos

em padrão da indústria cultural: “fórmula substitui forma” (C. W. Mills).

Aspecto em comum entre Edgar Morin e os frankfurtianos: retomada de

categorias de Freud (psicanalíticas) usadas pelos frankfurtianos, como os

mecanismos de identificação e projeção, para dar conta da demanda de

mitos e heróis.

Paradoxo: cultura de massas contemporânea tende a virar cultura de elite.

PARA LER MAIS:

ADORNO, Theodor W. Intervenciones - nueve modelos de critica. Cara-

cas, Monte Avila, 1969.

ADORNO, Theodor W. “A Indústria Cultural”. In: COHN, Gabriel. Comuni-

cação e Indústria Cultural. 5. ed., São Paulo, T. A. Queiroz, 1987, pp. 287-

295.

ADORNO, Theodor W. & HORKHEIMER, Max. “A Indústria Cultural - o

iluminismo como mistificação de massas”. In: LIMA, Luiz Costa (org.).

Teoria da Cultura de Massa. 4. ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1990, pp.

159-204.

BENJAMIN, Walter. “A Obra de Arte na Época de sua Reprodutibilidade

Técnica”. In: LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da Cultura de Massa. 4. ed.,

Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1990, pp. 209-40.

MORIN, Edgar. Cultura de Massas no Século XX - O Espírito do Tempo I

- Neurose. 3. ed., Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1975.

MORIN, Edgar. Cultura de Massas no Século XX - O Espírito do Tempo II

- Necrose. 2. ed., Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1986.

RÜDIGER, Francisco. “A Escola de Frankfurt”. In: HOHLFELDT, Antonio,

MARTINO, Luiz C. & FRANÇA, Vera Veiga. Teorias da Comunicação.

Petrópolis, Vozes, 2001, pp. 131-47.

STRINATI, Dominic. Cultura Popular - uma introdução. São Paulo, Hedra,

1999, pp. 61-91.

ECONOMIA POLÍTICA DA COMUNICAÇÃO Desdobramento natural dos questionamentos envolvendo o papel da

comunicação de massa na sociedade contemporânea e também desdobramento natural da visão marxista-frankfurtiana, onde MCM são vistos como aparato ideológico, seja do Estado (Louis Althusser), seja de grupos econômicos e sociais específicos (Herbert Schiller). A visão, aqui, é de que há uma indústria cultural. Desdobramento também da visão de MCM como aparato imperialista norte-americano (num primeiro momento), depois como aparato mantenedor do capitalismo (pois ajuda a enfrentar as crises cíclicas do capitalismo) e, por fim, analisando o impacto da cultura e da visão de mundo dos EUA nos diferentes países. Nessa visão, os MCM consolidam e ampliam o capitalismo norte-americano; assim, o imperialismo cultural levava ao surgimento de idéias como a “teoria da dependência” (Schiller, Noam Chomsky, Armand Mattelart – vide Para Ler o Pato Donald – e Luiz Beltrão). Visão contemporânea – leva em conta os atuais processos de globalização, fusão de empresas de diferentes áreas (comunicação de massa, informática, entretenimento etc.) como relevantes para a análise da produção e da circulação dos produtos midiáticos. A comunicação é vista como mercadoria e ainda como mantenedora do sistema capitalista. Porém, a dominação norte-americana começa a entrar em “disputa” simbólica com outros mercados produtores de produtos culturais (Índia, Brasil, Japão, Egito). Ou seja: passa-se da noção de “indústria cultural” para o de “indústrias culturais”. Foco das análises: “o lado econômico (quase sempre oculto) da comunicação, a formação dos grandes grupos econômicos transnacionais, os fenômenos de dominação daí resultantes, assim como os aspectos estratégicos dos fluxos transnacionais de informações ou produtos culturais” (MIÈGE, 2000: 58). PARA LER MAIS:

BOLAÑO, César. Indústria cultural, informação e capitalismo. São Paulo, Hucitec/Polis, 2000.

BOLAÑO, César; MASTRINI, Guillermo e SIERRA, Francisco (orgs). Economía Política, Comunicación y conocimiento. Buenos Aires, La Crujía, 2005.

MATTELART, Armand & MATTELART, Michelle. O Carnaval das Imagens. São Paulo, Brasiliense, 1997.

ESTRUTURALISMO E SEMIÓTICA

Estruturalismo e semiótica não são, em sua origem, teorias da

Comunicação (assim como os estudos funcionalistas norte-americanos

também não o são, influenciados pela Sociologia e pela Psicologia).

Porém, seus métodos de análise têm reflexos até hoje, nos estudos sobre

as mensagens que circulam na instância do sistema midiático.

ESTRUTURALISMO = projeto derivado da proposta inicial de Ferdinand

de Saussure (1857-1913), que se propunha a conceber uma ciência que

estudasse a vida dos signos no seio da vida social (a Semiologia). Para

Saussure, a Semiologia incorporava a Lingüística e era incorporado pela

Psicologia Social:

Como Saussure situa a Semiologia no campo das ciências humanas

Psicologia Geral

Psicologia Social Psicologia Individual

... Semiologia

Língüística Escritura Outros sistemas de signos culturais

Aparentemente Saussure parecia desconhecer outros estudos a respeito

da natureza dos signos, desde Platão (Crátilo), Aristóteles, Santo

Agostinho, os estóicos, os epicuristas, William de Ockham, John Locke,

Charles Sanders Peirce, dentre outros.

E o que é signo? Vem de sema -> semeîon, signo. Vamos, genericamente

e por enquanto, dizer que um signo é algo que representa uma outra coisa

ou que se associa a uma outra coisa, sendo que essa “uma outra coisa”

nunca (em tese) é ela própria e essa representação/associação pode servir

a mais de “uma outra coisa” (vide metáforas, metonímias e outras figuras

de Retórica).

Exemplos na literatura: Aventuras de Alice (Lewis Carroll), na seqüência da

floresta das coisas sem nome, ou Viagens de Gulliver (Jonathan Swift),

quando os sábios de Balbinarbi queriam transportar/usar as próprias

coisas, em vez de usarem as palavras que as designam.

Saussure via a linguagem como sistema de signos a serem analisados

sincronicamente (dentro de um recorte de tempo), e não diacronicamente

(seu desenvolvimento através do tempo). O signo é a associação entre um

conceito e uma imagem acústica. O signo que mais interessava aos

estudos de Saussure era o signo lingüístico.

SIGNO SAUSSURIANO:

SIGNIFICADO (sdo)

SIGNO

SIGNIFICANTE (ste)

sdo conceito

ste imagem acústica hexágono

Ou: c-ã-o = ste / animal de quatro patas que late = sdo

Significante pode mudar conforme a língua (cão, dog, perro, chien, hund).

Simplificando: ste “=” nome; sdo “=” coisa/idéia denominada. Relação entre

sdo/ste no signo lingüístico é arbitrária (social, cultural); o significante é linear

(os sinais se desenvolvem linearmente no tempo e no espaço).

Linguagem = língua (langue) + fala (parole); porém, Saussure vai se

interessar apenas pela língua (instituição social e estrutural), deixando de

lado a fala (ato individual, e apenas individual, de apropriação da língua. A

fala como problema da Comunicação será retomada por Mikhail Bakhtin).

Saussure enxerga na língua relações de duas ordens:

- sintagmática = ordenação dos elementos (“eu vi você”, “você eu vi”)

- paradigmática = substituição possível dos elementos

eu / vi / você

minha pessoa / vislumbrou / o senhor

Linguagem e cultura, na visão estruturalista, se assemelham, por serem

sistemas estruturais. Fundamental nas estruturas = aquilo que é só o é por

não ser o que não é, ou seja, em termos de sua diferenciação (a qual é

perceptível numa comparação estrutural):

gato = rato, fato, galo, gago, gota

Paralelismos com o pensamento saussuriano:

Claude Lévi-Strauss: cultura e mito são sistemas estruturáveis, ainda que

“invisíveis”, portanto inconscientes (exemplos: tabus, mitos etc.)

Tabu = relações / combinações proibidas (num sistema de parentesco)

Mito = estrutura que se mantém em diferentes narrativas (Édipo-Rei)

Algirdas Julien Greimas: faz análise actancial das estruturas (sintaxe)

narrativas, ou seja, da estruturação dos personagens numa dada narrativa.

Distingue em seis (6) o número de actantes:

- sujeito - realiza ação (herói)

- objeto - instrumento da ação (princesa raptada, por exemplo)

- destinador - quem “dá” o objeto / propicia a ação (rei, por exemplo)

- destinatário - quem “recebe” o objeto / desfecho da ação (rei)

- oponente - quem tenta atrapalhar a ação do herói (vilão)

- adjuvante - quem é o assistente do sujeito (ajudante)

Proposta mais radical do Estruturalismo: Roland Barthes.

Começo de tudo: O Grau Zero da Escrita (1953), no qual ataca suposta

“neutralidade e naturalidade” do estilo clássico francês de escrita.

Premissa: realidade natural nunca é dada como certa, pois é construída

socialmente. Leitura do mundo depende dos códigos que usamos, ou

melhor, que nos acostumamos a usar e a achar “naturais”. Assim, não há

para Barthes uma escrita politicamente neutra. A escrita não-ideológica

é uma ilusão.

Ápice do pensamento estruturalista barthiano: Mitologias (1957):

mito - transforma história em natureza

mito = sistema de comunicação / mensagem

meta de Barthes = análise do processo de significação (produção de

significados) no mito, onde:

Língua { ste sdo

S / ste sdo

Mito S

{

mito = metalinguagem que esvazia

de sentido S/ste e o associa a um

novo conceito (sdo) para criar um

novo signo (S), ou seja, para criar

um mito; neste, ste = forma;

sdo = conceito; S = significação.

Nas Mitologias, Barthes analisa, dentre outras coisas, a mídia em seu

sentido amplo (jornais, revistas, TV, programas etc.), sendo que a mídia é

“pequeno-burguesa” e, ao mesmo tempo, ela “apaga” a pequena burguesia

nesse universo (o social torna-se natural). Mito = estruturação ideológica

que não esconde nada, nem faz desaparecer nada, apenas “deforma”.

Exemplo de análise de Barthes (página seguinte) = capa da revista

francesa Paris-Match:

“Estou no cabeleireiro, dão-me um exemplar do Paris-Match. Na capa, um

jovem negro vestindo um uniforme francês faz a saudação militar, com os

olhos erguidos, fixos sem dúvida numa prega da bandeira tricolor. Isto é o

sentido da imagem. Mas (...) bem vejo o que ela significa: que a França é

um grande Império, que todos os seus filhos, sem distinção de cor, a

servem fielmente sob a sua bandeira, e que não há melhor resposta para

os detratores de um pretenso colonialismo do que a dedicação deste preto

servindo os seus pretensos opressores. Eis-me, pois (...) perante um

sistema semiológico ampliado: há um significante, formado já ele próprio

por um sistema prévio (um soldado negro faz a saudação militar francesa);

há um significado (aqui uma mistura intencional de ‘francidade’ e de

‘militaridade’); há enfim uma presença do significado através do

significante” (BARTHES, 1975: 138. Grifos no original).

Virada: Elementos de Semiologia (1964). Se para Saussure a Lingüística

fazia parte da Semiologia (as linguagens, ou sistemas de signos, eram

analisáveis segundo critérios distintos, não apenas lingüísticos), para

Barthes ocorria o inverso: a Semiologia estava dentro da Lingüística: todo

sistema de signos é uma linguagem ou um sistema de significação.

Alguns passos para a análise semiológica de Barthes:

1) confrontar ste x sdo (o que se percebe/ouve x o que se traduz por ele)

2) confrontar denotação x conotação (aquilo que é num “primeiro nível” x

aquilo que se conota num “segundo nível”). DETALHE - para Barthes, a

ideologia perpassa a conotação.

ALGUNS PROBLEMAS DO ESTRUTURALISMO / SEMIOLOGIA:

1) não se interessam por contexto de produção/consumo das mensagens;

2) Barthes resume a noção de ideologia à ideologia burguesa, apenas;

3) análises, paradoxalmente, acabam sendo a-históricas;

4) nada garante que leituras de Barthes sejam as únicas e/ou as corretas.

Capa da revista Paris-Match analisada por Roland Barthes em Mitologias

SEMIÓTICA - difícil falar da semiologia saussuriana sem falar,

particularmente, da semiótica peirciana. Motivos:

1) confusão que ambos os termos causam junto aos estudiosos/leitores;

2) o fato de que uma não se refira à outra e vice-versa.

Semiologia de Saussure - signo lingüístico com dois elementos (sdo e ste).

Semiótica de Peirce - signo lógico com três elementos (R, O e I, abaixo).

Elemento clássico da semiótica = signo ou representamen, “algo que

representa uma outra coisa na ausência dessa mesma coisa”.

Premissas importantes:

- tudo é / pode ser signo de algo (outra coisa)

- nada pode ser signo de si próprio

Conceito central = semiose infinita

R (representamen) O (objeto)

I (interpretante) / R O

I / R O

I

Pensamento peirciano:

1) pensar = manipular signos

2) homem = ele próprio é um signo

3) há 3 categorias universais:

Primeiridade (firstness) = sentimento imediato e presente das coisas, sem

relação com mais nada, sem reflexão (exemplo: percepção)

Secundidade (secondness) = quando fenômeno primeiro se relaciona com

um fenômeno segundo, comparação / efeito / relação (exemplo: leitura)

Terceiridade (thirdness) = quando fenômeno segundo se relaciona com um

terceiro, representação, memória, signo (exemplo: interpretação).

onde:

R = objeto perceptível

(signo);

O = referente, coisa;

I = efeito do signo, que

gera um novo signo

ATENÇÃO:

Interpretante não é o

intérprete

ESTUDOS CULTURAIS (cultural studies) - corrente iniciada nos anos 50,

se solidifica em 1964 com a fundação do Centre of Contemporary Cultural

Studies (CCCS) por parte de Richard Hoggart em Birmingham, Inglaterra.

Objetivos:

- contrapor-se às teorias funcionalistas norte-americanas (optam por

análise da classe social, e não da massa);

- recuperar conceitos de “ideologia” e “hegemonia”;

- levar em conta o fator econômico nas relações culturais;

- analisar o papel - central - da cultura dentro da sociedade, levando em

conta as diversas práticas e formas culturais existentes em diferentes

grupos, bem como as mudanças sociais daí possíveis. Cultura =

amálgama da constituição de uma sociedade; cultura é algo que se

constrói, na qual se é ativo; cultura não é consumida passivamente.

Fontes principais:

1) As Utilizações da Cultura (Richard Hoggart, 1957). De caráter também

autobiográfico, obra focaliza modo como as classes operárias se apropriam

de produtos culturais e de MCM. Percebe submissão e resistência, por

parte de operários, a esses produtos culturais. Mesmo assim, vê

industrialização da cultura de modo negativo.

2) Cultura e Sociedade (Raymond Williams, 1958). Vê cultura (literatura)

como processo onde significações são construídas sócio-historicamente.

3) A Formação da Classe Operária Inglesa (Edward P. Thompson, 1963).

Como Williams, entende que cultura e história devem ser percebidas como

espaço de enfrentamento de diferentes modos de vida (conflitos, tensões, lutas)

PARA LER MAIS:

BARTHES, Roland. Mitologias. 2. ed., São Paulo/Rio de Janeiro, Difel,

1975.

EAGLETON, Terry. Teoria da Literatura: uma Introdução. São Paulo,

Martins Fontes, 1994, pp. 97-135.

PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo, Perspectiva, 1995.

SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Lingüística Geral. São Paulo, Cultrix,

1969.

Outras influências: Gramsci (“hegemonia”), Marx e Althusser (“ideologia”),

Escola de Frankfurt e estruturalismo francês (Barthes).

Hegemonia = capacidade de um grupo social para assumir a direção

intelectual e moral sobre a sociedade, formando em torno de seu projeto

um novo sistema de alianças sociais, um novo “bloco histórico”, onde há

negociações / compromissos / mediações. Ou seja: hegemonia é a

construção do poder pela aquiescências dos dominados aos valores da

ordem social. Mesmo assim, classe dominante acaba, por vezes, tendo de

se “reenquadrar” nesse novo contexto.

Ideologia = conjunto de imagens / representações / significações que

circulam no âmbito da mídia, visando o monopólio do poder social.

Assim:

- cultura é um universo no qual o sujeito é produto ativo dela própria.

- cultura NÃO É sabedoria / experiência passiva, mas sim um conjunto de

intervenções ativas que podem mudar a história e transmitir o passado.

Estudos Culturais se propõem a analisar e relacionar produção /

distribuição / recepção culturais a práticas econômicas associadas à

constituição do sentido cultural.

“4 . fonte principal” dos Estudos Culturais: Stuart Hall, segundo diretor do a

CCCS. Texto-chave: “Codificação/Decodificação” (1973). Nele, Hall faz uma

análise do processo comunicativo televisivo.

Produção Circulação

Reprodução Distribuição/consumo

Hall defende que instâncias se articulam entre si, não podem ser

analisadas independentemente. Assim, por exemplo, diz Hall, audiência é

tanto a fonte quanto o receptor da mensagem (aqui, Hall retoma Marx: “o

consumo determina a produção, a produção determina o consumo”).

Funcionamento da mídia não pode ser visto como apenas a transmissão

mecânica de uma mensagem, por parte de uma fonte, pela recepção.

Produção = processo de codificação que

é realizado conforme:

Consumo = processo de decodificação

que se dá de três modos

possíveis, em relação à

ideologia dominante

Assim, diz Hall: codificação = decodificação , pois processos distintos,

ainda que interdependentes

Primeiros estudos culturais abriram espaço para outros tipos de análises

culturais: feministas, culturas populares, grupos profissionais midiáticos,

subculturas jovens, minorias étnicas etc. Sua fácil adaptabilidade a

qualquer ambiente social (contraditório, socialmente falando) fez com que

se desenvolvesse rapidamente em outros países.

Estudos culturais têm realidade diferente da Escola de Frankfurt:

mídia = situada no âmago da sociedade, não estranha a ela;

classe dominante = existe, mas tem de negociar com classes subalternas;

“dominados” = não passivos, negociam sentido conforme sua cultura;

tende-se a falar, atualmente, de comunidades interpretativas (Stanley Fish).

Problema dos estudos culturais: tender a focar demais na recepção, deixando

de lado aspectos e particularidades de quem detém os meios de produção

simbólica e não considerar outras leituras possíveis (feministas, gays etc.)

imagens da audiência

códigos profissionais {

dominante - hegemônica

oposicional - contestária

negociada - mesclada ou

“contraditória”

{

PARA LER MAIS:

ESCOSTEGUY, Ana Carolina. “Os Estudos Culturais”. In: HOHLFELDT,

Antonio, MARTINO, Luiz C. & FRANÇA, Vera Veiga. Teorias da Comuni-

cação. Petrópolis, Vozes, 2001, pp. 151-70.

HALL, Stuart. Da Diáspora - identidades e mediações culturais. Belo Ho-

rizonte, UFMG/UNESCO, 2003.

MATTELART, Armand & NEVEU, Érik. Introdução aos Estudos Culturais.

São Paulo, Parábola Editorial, 2004.

SILVA, Tomaz Tadeu da (org.). O Que é, Afinal, Estudos Culturais? Belo

Horizonte, Autêntica, 2000.

ESTUDO DAS ROTINAS PRODUTIVAS (SOCIOLOGIA DOS EMISSORES)

Se, de um lado, os estudos sobre os fenômenos da Comunicação

começavam a lançar bases para estudos da recepção (vide Estudos

Culturais), por outro houve algumas tentativas de se sistematizar alguns

aspectos que envolvem a produção dos conteúdos midiáticos (em

particular, dos jornalísticos). Parte-se para uma análise das rotinas

produtivas nas redações jornalísticas.

- início de tudo: Kurt Lewin (1947), em estudo sobre decisões envolvendo

a compra de alimentos para uma casa ou restaurante. Lewin comparou

sistema com o processo de produção da informação. A quem decidia sobre

os produtos a serem adquiridos, Lewin chamou de gatekeeper.

David White (1950): análise do caso de “Mr. Gates”, que selecionava,

dentre os despachos de telex que chegavam à redação em que trabalhava,

quais matérias eram importantes e quais não eram. Resultado:

90% das matérias = lixo (falta de espaço/histórias repetidas/má redação);

10% das matérias = publicadas

David White não percebeu critério lógico para a escolha.

Bruce Westley & Malcolm MacLean (1957): percebem prática do

gatekeeping como prática “institucional”, não individual (pressão da

empresa); além disso, para eles, os jornalistas trabalham conforme a

imagem e o gosto dos seus públicos.

John T. McNelly (1959): percebe que há vários gatekeepers na esfera

midiática em geral (jornais, rádios, TVs etc.)

Warren Breed (1955): estudo que analisa as formas pelas quais se dá o

“controle social nas redações”, através de seis características básicas:

1) autoridade institucional e sanções;

2) sentimentos de dever / estima para com seus superiores;

3) aspirações à mobilidade profissional;

4) caráter agradável do trabalho;

5) ausência de grandes conflitos inter-grupais;

6) o fato de a notícia ter um valor.

Breed acrescenta depois uma sétima característica: o grupo de referência.

Para alguns, análise de Breed visibiliza os critérios subjetivos que

interferem na produção de uma notícia; assim, passamos do gatekeeping

para o newsmaking, para a análise dos modos e rotinas de produção em

um jornal, ou seja, o que faz algo ser notícia (newsworthiness).

Mais precisamente: notícia passa a ser aquilo que se adequa à linha

editorial de cada jornal, não algo que seja “particular” do jornalista. Para

Peter Golding e Phillip Elliot (1979), passa-se da noção de “distorção

voluntária” para a “distorção involuntária” (unwitting bias). Denis McQuail

(1985) define quatro tipos de distorção, sendo as duas primeiras mais

facilmente localizáveis e as duas últimas mais “invisíveis”:

- posição partidária (voluntária e explícita)

- propaganda (involuntária e explícita)

- ideologia (voluntária e implícita)

- unwitting bias (involuntária e implícita)

De modo geral, o modus operandi do jornalista diz respeito a dois grupos

de fatores (geralmente desconhecidos do público em geral):

1) a cultura profissional do jornalista (a naturalização das práticas

profissionais);

2) a organização do trabalho e suas e processos produtivos (convenções

que acabam por definir a noticiabilidade de um fato).

Exemplos de naturalização:

1) depoimento (fonte) = texto editado (em tempo, tamanho);

2) opção (atual) pelo relato lógico, não cronológico;

3) texto jornalístico = indexical (só se refere ao referente, raramente ao

modo como ele próprio - texto - é produzido).

4) uso de recursos lingüísticos similar ao dos textos históricos e científicos:

“apagamento” do sujeito enunciador.

Conseqüências:

1) superficialidade e acontextualidade (em relação aos textos históricos e

científicos), pois enfoque é maior no “o quê?”, “como?”, “onde?” etc., e

menor - muitas vezes - no “por quê?”). Paradoxo: quanto (de informação)

em quanto tempo / espaço.

2) Importâncias e hierarquizações se dão conforme certas características:

- critérios de noticiabilidade: grau / nível dos envolvidos no fato + impacto

sobre país / interesse nacional + número de pessoas envolvidas no fato /

capacidade de evolução do assunto.

- critérios do produto: disponibilidade / acessibilidade ao material +

brevidade + ideologia da notícia (desvio é melhor do que rotina) +

atualidade + qualidade + equilíbrio (balanceamento dos fatos).

- critérios dos MCM: existência de apoio visual (imagens, fotos) +

freqüência do fato (aparecerá uma vez ou várias?) + formato (duração /

tamanho / formato da matéria).

- critérios do público (imaginado)

- critérios de concorrência: fragmentação exagerada / exacerbada (boxes : rubricas etc.) + expectativas recíprocas (um pensa no que o outro vai escrever / publicar) + expectativas recíprocas que desencorajam inovações + modelos de referência (“se FSP vai dar...” ou “se O Globo não der...”).

Em suma: fato de atender potencialmente boa parte desses critérios para se tornar um “acontecimento jornalístico”. Por isso, diz Adriano Duarte Rodrigues, “o fato cria a notícia, a notícia cria o fato”.

Rotinas produtivas: dizem respeito ao cotidiano das redações.

- recolha de informações (fontes, agências, press-kits, releases, agendamento de datas e fatos etc.);

- seleção de informações (conhecimento prévio + qualidade visual + visibilidade / existência nos MCM);

- apresentação das informações (edição, diagramação, “recontextualização”, hierarquização dos fatos e “apagamento do público”).

Problemas do newsmaking:

1) o going native (assemelhamento do estrangeiro ao pesquisado);

2) o “não estranhamento” (como jornalista se “afasta” de colegas / realidade?);

3) após conhecer rotinas, difícil não pensar na mesma lógica do jornalista.

CULTURA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

Regras peculiares ao universo midiático:

temporalidade + narrativa + critérios para visibilização de fontes

- temporalidade própria: fatos devem ser “diários” ou “diarizáveis”

(suitáveis), mas também devem acabar coincidindo com o horário do

fechamento dos MCM. Acaba levando a imprensa a tentar antecipar certos

fatos (“jornalismo antecipatório”).

- narrativa própria: edição + hierarquização + seleção e/ou omissão de

fatos + apagamento do sujeito.

- acesso aos MCM (por parte das fontes) - para Pierre Bourdieu, há três

mecanismos de acessibilidade aos meios, que são a obediência e a

adaptação a:

- tempo (poder de síntese);

- tema sugerido (imposto por veículo);

- linguajar cotidiano (proibição ao uso de jargões).

Para Dominique Wolton, essa relação é mais profunda, uma vez que TV

“aproxima” as realidades (culturas de elite e de massa). Relações entre

mídia e fontes (intelectuais) se dão de cinco modos:

- intelectuais midiáticos (fazem uso racional, sistemático e “natural” da TV;

geralmente não pertencem à Academia);

- intelectuais estrategistas (usam mídia visando aumento da própria

influência pessoal; atacam TV mas querem estar nela);

- intelectuais usuários (usam mídia quando necessário, dado seu poder de

transmissão de informações úteis / importantes);

- intelectuais anônimos (maioria, à margem da mídia);

- tecnocratas midiáticos (aqueles que aliam inteligência + poder + idéias

em seu discurso seguro e seco).

Mídia: paradoxalmente, cria seus próprios intelectuais, “à margem” da

Academia e, ao mesmo tempo, “descobre” velhos intelectuais por ela

própria muitas vezes esquecidos.

Interesse midiático recai sobre:

- filósofos (puros / pessimistas / sintéticos / antevêem o futuro);

- historiadores (“úteis” para falar sobre o hoje / se nutrem do passado);

- médicos (interesse humano sobre vida / morte / doença / saúde);

- sábios.

Desinteresse midiático recai sobre:

- cientistas (herméticos / sérios / tecnicistas / sem charme);

- cientistas sociais (não generalizam conceitos / não são tão claros /

parecem “inúteis” aos olhos da mídia / parecem semiconcorrentes

da imprensa).

Exceções tendenciais: economistas e cientistas políticos (trabalham com

números e estatísticas, que parecem mais “objetivos”).

Demais intelectuais: exceções, são solicitados em questões pontuais /

emergenciais / extremas.

Em suma: mídia tem conjunto de regras próprias para seu funcionamento;

isso levará a críticas de autores pós-modernos / pessimistas (Jean

Baudrillard, Lucien Sfez, Paul Virilio)

PARA LER MAIS:

BOURDIEU, Pierre. Sobre a Televisão. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Edi-

tor, 1997.

BREED, Warren. “Controlo Social na Redacção: uma análise funcional”.

In: TRAQUINA, Nelson (org.). Jornalismo: questões, teorias e “estórias”.

Lisboa, Vega, 1993, pp. 152-66.

TRAVANCAS, Isabel. O Mundo dos Jornalistas. São Paulo, Summus, 1993.

WHITE, David. “O Gatekeeper: uma análise de caso na selecção de no-

tícias”. In: TRAQUINA, Nelson (org.). Jornalismo: questões, teorias e “es-

tórias”. Lisboa, Vega, 1993, pp. 142-51.

WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. 4. ed., Lisboa, Presença, 1995,

pp. 159-227.

WOLTON, Dominique. Elogio do Grande Público - uma teoria crítica da

televisão. São Paulo, Ática, 1996.

OS EFEITOS A LONGO PRAZO (AGENDA-SETTING, ESPIRAL DO

SILÊNCIO)

Para entender o que se quer dizer com “efeitos a longo prazo”, é preciso

entender antes como podem ser classificados os efeitos da mídia em geral.

Denis McQuail propõe uma tipologia desses efeitos, a partir de estudos de

Peter Golding (1980).

Tipologia dos Efeitos dos Meios de Comunicação de Massa

Intencionalidade

voluntária

- resposta individual - difusão (planejada) de

- campanhas educativas / desenvolvimento

informativas - distribuição de conhecimento

(notícias, informações etc.)

Tempo

curto prazo longo prazo

- reações individuais coletivizadas - controle social (manutenção de

- reações individuais não previstas ordem e autoridade)

(imitação, agressividade, excitação,

transtornos, medos etc.) - socialização (adoção informal de

normas, valores, comportamentos)

- definição de realidade (tendência

dos MCM a apresentar visão

incompleta / particular da realidade

- troca institucional (efeitos sobre

outras instituições sociais)

involuntária

Para McQuail, podemos classificar os quatro modos nos seguintes termos:

- intencionais a curto prazo = tendenciosos

- não intencionais a curto prazo = tendenciosos inconscientes

- intencionais a longo prazo = políticos

- não intencionais a longo prazo = ideológicos

Agenda-setting

Premissa: mídia é capaz de

influenciar a pauta da agenda

pública (ou seja, mídia sugere

sobre o que falar e pensar).

Se um fato ou personagem não

estiver na superfície midiática, é

como se ele não existisse (um fato

não mediatizado é um fato

inexistente). Ou seja: um fato pode

deixar de existir (socialmente).

Agenda-setting diz respeito à

existência de uma informação

(construção da realidade).

Espiral do silêncio

Premissa: mídia é capaz de

influenciar a opinião pública e as

pessoas (ou seja, mídia aponta para

o que falar e pensar sobre algo).

Se há uma opinião majoritária (na

sociedade e/ou na mídia), a pessoa

discordante tende a se calar,

temendo o isolamento social.

Ou seja: uma opinião discordante

pode deixar de existir.

Espiral do silêncio diz respeito à

extinção de uma opinião minoritária

(construção da opinião pública).

As hipóteses do agenda-setting e da espiral do silêncio fazem parte do

conjunto dos efeitos midiáticos de longo prazo involuntários (por serem

definidores da realidade). Nesse caso:

- efeitos dos MCM deixam de ser psicológicos e passam a ser cognitivos

(podem modificar a percepção individual da realidade);

- efeitos são acumulativos, segmentados no tempo, não imediatos;

- de algum modo, a mídia constrói a realidade.

“Esses dois efeitos só são possíveis graças a duas características próprias

ao conjunto da produção informativa. De um lado, a coincidência

tendencial de temas selecionados (...) e, de outro, a relativa

homogeneidade na abordagem desses temas (consonância temática)” São

(...) duas características da objetividade aparente do conteúdo informativo.

Sem essas características, invariavelmente presentes em maior ou menor

grau, os meios produziriam outros efeitos” (BARROS FILHO, 1995: 167).

Ambas as hipóteses (agenda-setting e espiral do silêncio) surgem no

começo dos anos 70, respectivamente, pelos norte-americanos Maxwell E.

McCombs & Donald L. Shaw e pela alemã Elisabeth Noelle-Neumann.

Ambas são hipóteses, e não teorias, porque devem ser comprovadas no

curso de uma dada investigação sobre os MCM.

Diferenças entre o agenda-setting e a espiral do silêncio

AGENDA-SETTING

Tipos de agendas possíveis numa sociedade de massas:

- agenda individual (intrapessoal);

- agenda interpessoal manifestada;

- agenda da mídia;

- agenda pública (da sociedade como um todo);

- agenda institucional (prioridades temáticas eleitas por uma instituição).

Fatores condicionantes:

1) origem da mensagem (mesmas agências, mesmas fontes);

2) veículo da mensagem (TV = tempo menor de agendamento, jornal =

tempo maior de agendamento);

3) conteúdo da mensagem (se é temático ou acontecimento, se é próximo

ou afastado do cotidiano dos leitores etc.).

Críticas ao agenda-setting:

1) falta de critérios precisos para a determinação de um time-lag (intervalo

de tempo do agendamento) adequado para análise;

2) falta de critérios precisos para a determinação de uma amostragem de

indivíduos condizente com determinados universos sociais estudados;

3) dúvida sobre foco da análise: conhecimento do receptor, hierarquização

temática ou abordagem específica de um fato;

4) dificuldade de localizar nível da análise: tematização do assunto

(editoria); conhecimento; ou argumentação sobre o assunto;

5) predominância de temas políticos na análise, em detrimentos de outros

assuntos;

6) falta de homogeneidade metodológica nos estudos da área.

ESPIRAL DO SILÊNCIO

- Silêncio - indivíduo tem medo do isolamento social, assim ele prefere

omitir sua opinião (minoritária).

- Espiral - opinião minoritária tende a ser “abafada” pelo silêncio, que

cresce de modo espiralado.

silêncio tendencial

Receptor “acuado” tende a:

mudança de opinião tendencial

Outro fator inibidor: medo de opinar por falta de competência específica

sobre um assunto (quanto mais conhecedor de algo, mais à vontade se

sente a pessoa e vice-versa) = hipótese do knowledge gap (intervalo, hiato

ou diferença de conhecimento), proposta por Philip. J. Tichenor, George

A. Donohue & Clarice N. Olien (1970).

entrevistado bem-preparado

AI

knowledge gap

entrevistado malpreparado ____________________ 0

(zero) AI = absorção de informação

Hipótese do knowledge gap: MCM servem como instrumento de

reprodução de desigualdades sociais (quem sabe mais tem mais chances

de saber mais, principalmente temas complexos). Há autores que

discordam dessa hipótese, dizendo que diferenças podem diminuir quando

há interesse das camadas menos favorecidas (do ponto de vista do acesso

à informação, e que pode ser também, mas não apenas, econômico) em

relação a um determinado assunto. De qualquer modo, a diferença de

conhecimento pode influenciar no silêncio de alguns em relação a certos

temas (política, economia, arte, assuntos internacionais etc.).

Problema: como aferir de fato a opinião pública? Algumas premissas falsas

na noção de “opinião pública” (Bourdieu e Patrick Champagne):

1) de que todos têm uma opinião, algo a dizer, sobre tema pesquisado;

2) de que todas as opiniões têm o mesmo peso, que se equivalem;

3) de que as mesmas perguntas sejam relevantes para todos;

4) entrevistado sempre diz a verdade.

Outros pontos complicadores (como indivíduo percebe opiniões alheias):

- falsa impressão da inexistência do efeito “terceira pessoa” (“alguém”

substitui “eu” quando entrevistado fala);

- falsa impressão (por parte do entrevistado) de que sua própria opinião

é igual à opinião da maioria;

- fato de que indivíduo “mente” quando interrogado sobre questões

polêmicas (caso sua opinião seja “politicamente incorreta”, dissonante) e

“diz a própria opinião” quando perguntado sobre opinião dominante.

A ESCOLA LATINO-AMERICANA

Adaptação, à realidade latino-americana, de algumas das principais

premissas dos Estudos Culturais nos anos 80, como a recuperação do

conceito de hegemonia. Com o passar do tempo (anos 90), amplia o foco

para as categorias das mediações e das hibridações.

Principais influências da Escola Latino-Americana: Luiz Beltrão, Armand

Mattelart, Antonio Pasquali, Eliseo Verón e Paulo Freire.

Pontos-chave: debate sobre modernidade + marxismo + globalização

Há embates entre:

tradição x inovação

grande arte x cultura popular

alta cultura x baixa cultura

cultura de elite x cultura de massas

o que implica em:

revisão de cânones estéticos;

revisão dos conceitos de identidade (regional e nacional)

Análises latino-americanas perpassam esferas da política / cultura / MCM,

através dos conceitos de hegemonia, ideologia e outros.

PARA LER MAIS:

BARROS FILHO, Clóvis. Ética na Comunicação - da informação ao re-

ceptor. São Paulo, Moderna, 1995, pp. 169-227.

HOHLFELDT, Antonio. “Hipóteses Contemporâneas de Pesquisa em Co-

municação”. In: HOHLFELDT, Antonio, MARTINO, Luiz C. & FRANÇA, Vera

Veiga. Teorias da Comunicação. Petrópolis, Vozes, 2001, pp. 187-240.

SOUZA, Jorge Pedro. Teorias da Notícia e do Jornalismo. Chapecó, Argos,

2002, pp. 157-97.

TRAQUINA, Nelson (org.). O Poder do Jornalismo - análise e textos da

teoria do agendamento. Coimbra, Minerva, 2000.

WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. 4. ed., Lisboa, Presença, 1995,

pp. 125-158.

Os brasileiros no âmbito da América Latina: Luiz Beltrão e Paulo Freire.

Luiz Beltrão – considerado pioneiro latino-americano dos estudos comunicacionais no continente, criador da folkcomunicação: “conjunto de procedimentos de intercâmbio de informações, idéias, opiniões, atitudes dos públicos marginalizados urbanos e rurais, através de agentes e de meios direta ou indiretamente ligados ao folclore” (BELTRÃO, 1980: 24). Para Beltrão, há dois sistemas de comunicação no Brasil, ligados a dois grupos sociais distintos: um deles é o urbano/rural industrializado e alfabetizado tecnologicamente; o outro é o grupo dos analfabetos funcionais. Neste grupo, os indivíduos trocam informações através de processos atravessados pela cultura popular (ou folclore). É o que permite a Beltrão fazer uma releitura da teoria do duplo fluxo da comunicação, à luz da cultura brasileira, onde “desaparecem” os líderes de opinião e surgem os “agentes coletivos”. Assim, a comunicação entre esses indivíduos tem 3 características: - horizontalidade (E = R) - dialogia (E e R = opções do indivíduo) - participatividade (E e R = agentes em total interatividade). Paulo Freire – para Jesús Martín-Barbero, a pedagogia de Paulo Freire é “a primeira teoria latino-americana da comunicação” (MARTÍN-BARBERO, 2003: 20) e que não está voltada apenas para os países subdesenvolvidos. Premissa de Paulo Freire = inter-relação entre palavra e ação, onde ambas são nulas se uma não está de algum modo ligada à outra. O aprendizado da língua deve equivaler à liberação da palavra própria (do outro). Assim, o verdadeiro processo pedagógico é aquele que “quebra” aquilo que Freire chama de cultura do silêncio, a qual foi imposta pelos colonizadores aos moradores originais da América Latina. Para Freire, o analfabeto é “o homem impedido de dizer sua palavra”, pois o analfabetismo não é uma simples “falta de instrução”. O processo pedagógico tem a ver com tomada de consciência, por parte do oprimido, de sua própria condição de opressão. Crítica da linguagem = investiga a presença da linguagem na conformação da sociedade como sistema, o papel da linguagem na gestação das estruturas mentais, coletivas e sociais. A linguagem, como fato social, permite (ou não) a entrada do indivíduo nas diferentes esferas sociais. Como diz Martín-Barbero: “falar não é só servir-se de uma língua, mas por um mundo em comum, fazer dela lugar de encontro” ((MARTÍN-BARBERO, 2003: 31).

Atuais nomes da Escola Latino-Americana: Jesús Martín-Barbero,

Néstor García Canclini, Guillermo Gómez Orozco, Valerio Fuenzalida,

Jorge González.

Outros nomes relevantes no pensamento comunicacional latino-americano:

Maria Elena Hermosilla, Beatriz Sarlo, Anibal Ford, Renato Ortiz.

Esses autores levam os estudos latino-americanos de comunicação para o

campo da recepção (depois da mediação), tentando não perder de vista o

todo do processo comunicacional.

CONSUMO CULTURAL - Néstor García Canclini - estuda o consumo como

prática cultural (“o consumo serve para pensar”).

Canclini propõe uma teoria sócio-cultural do consumo para abordar os

processos de comunicação e recepção dos bens simbólicos.

Consumo = algo mais complexo do que relação entre meios manipuladores

e dóceis audiências; é o conjunto de processos sócio-culturais em que se

realizam a apropriação e o uso de produtos e bens simbólicos.

Hegemonia cultural - não se exerce verticalmente, pois entre “dominados e

dominantes” há os mediadores (família, bairro, colegas de trabalho etc.).

Comunicação = relação de dominação

Comunicação = eficaz se apresentar relações de colaboração / transação

entre emissor e receptor.

Ato de consumo NÃO É exercício de gostos, caprichos e compras

impensadas segundo julgamentos moralistas / atitudes individuais, mas

pode ser um exercício refletido de cidadania (consumidor pode virar

cidadão).

Pesquisa de consumo tradicional = preocupa-se com quem tem e quem

não tem; deveria se preocupar com pesquisar entre quem tem e quem não

tem mas reconhece / compartilha o significado sócio-cultural do objeto.

Objeto = bem potencialmente “múltiplo”, cuja “biografia” é irregular (vide os

objetos de artesanato, canções, filmes, peças etc., que podem mudar

constantemente de valor de uso, de valor estético etc. à medida em que

mudam de contexto).

García Canclini propõe, para sua análise, a articulação interdisciplinar de

seis campos de análise do consumo e da recepção:

1) Consumo = lugar de reprodução da força de trabalho +

expansão do capital

(racionalidade econômica + visão marxista)

Ponto de vista: sistema econômico

2) Consumo = lugar onde grupos competem por apropriação do produto

(consumo = conseqüência de demandas mais básicas do lucro [aumento

de consumo + poder de compra])

Ponto de vista: sistema sócio-político

3) Consumo = lugar de diferenciação sócio-cultural entre grupos

(consumo = lugar de distinção social, conforme aponta também Bourdieu

[racionalidade consumidora. Há coerência de consumo entre membros da

mesma “casta]”)

Ponto de vista: socioantropológico

4) Consumo = sistema de integração e comunicação

(consumo = fator integrador, através de produtos transculturais [no Brasil,

exemplo, futebol, novela, samba], mas com apropriações diferenciadas)

Ponto de vista: sócio-cultural

5) Consumo = processo ritual / coletivo, no qual são selecionados

significados sociais específicos

Ponto de vista: antropológico

6) Consumo = cenário de objetivação de desejos

(consumo = irracional, pois a fonte de desejos, em si, não é “saciável” por

nenhuma instituição)

Ponto de vista: psicanalítico

Consumo pode transformar consumidor em cidadão se houver:

1) vasta oferta de bens, objetos e mensagens que representem variedade

internacional de mercados, de acesso fácil / equitativo para a maioria;

2) informações multidirecionais e confiáveis sobre a qualidade dos

produtos, com controle exercido por parte dos consumidor;

3) participação democrática de setores da sociedade em decisões de

ordem material, jurídica, política e simbólica.

Problemas do pensamento de García Canclini:

1) é possível conciliar cinco visões sócio-econômicas com uma

visão psicanalítica? Se sim, como?

2) proposta de Canclini, de transformação do consumidor em cidadão, é

viável na prática?

USO SOCIAL DOS MEIOS - Jesús Martín-Barbero. Propõe:

1) a troca do conceito de recepção pelo de mediação;

2) um estudo dos processos de comunicação a partir da cultura;

3) a articulação entre práticas de comunicação e os movimentos sociais.

Barbero se opõe a:

1) o modelo lasswelliano + semiologia estruturalista (ideologista, de

“denúncia política”, com interesse exclusivo “nos passos do dominador,

nunca do dominado ou do conflito entre eles”);

2) modelo informacional (Teoria da informação) (cientificista, que deixa de

lado a questão do poder e do sentido [das interpretações], em prol de uma

visão racional do processo comunicativo).

3) conceito clássico de recepção (que remete à passividade). Barbero quer

“conceito dinâmico” (receptor ativo, leitura crítica da comunicação) que

inclua a problemática da ideologia “interferindo” na recepção e traga à tona

a noção de “classe social”.

Foco - deve passar dos MCM para as mediações.

Mediação - conjunto de influências que estrutura, organiza e reorganiza a

percepção da realidade na qual está inserida o receptor, tendo poder

também para valorizar implícita ou explicitamente esta realidade. Mediação

produz/reproduz os significados sociais, sendo ela o “espaço” que

possibilita compreender as interações entre produção e recepção.

Parâmetros para análise:

- cotidianidade (estudo do espaço doméstico e do cotidiano) [Certeau];

- consumo (lugar de interiorização muda da diferenciação social) [Canclini];

- leitura - abordagem de leituras sociais possíveis de um texto [Iser, Jauss];

- usos (do corpo, espaço, tempo, habitat etc.);

- lugares de mediação

Para Barbero, os lugares de mediações oferecidos pela TV (que é o

contraponto do medo na América Latina) são:

1) cotidianidade familiar = um dos poucos espaços no qual o indivíduo

pode se confrontar com os outros e expor suas ânsias e frustrações

(na medida em que a TV tem, na América Latina, a família como

“unidade básica de audiência”). É, muitas vezes, o espaço de leitura e

codificação da TV. Para isso, a TV se utiliza da simulação do contato e

da retórica do direto.

Simulação do contato = função fática (Jakobson) para chamar a

atenção do núcleo familiar, através a) do apresentador (interlocutor) e

b) do tom do programa (diálogo coloquial).

Retórica do direto = proximidade à imagem + magia do “ver ao vivo” +

imediatez, que também garante sensação de cotidianidade (por

oposição ao distanciamento existente no cinema, gravado e editado).

Ou seja: TV aproxima e familiariza tudo e todos; é a “familiarização

da realidade”.

2) temporalidade social = tempo social é diferente do tempo produtivo

(valorizado e que pode ser medido).

Tempo social / cotidiano = repetitivo, feito de fragmentos, e serve de

base para a TV, que se utiliza disso através da serialização dos

produtos e de suas transformações em palimpsestos fragmentados

(gêneros se remetem uns aos outros [intertextualidade], ao mesmo

tempo em que o tempo é trabalhado de modo rentável). Baseia-se na:

- estética da repetição (descontinuidade do tempo da narrativa +

continuidade do tempo narrado);

- sentimento de duração (típico do folhetim).

3) competência cultural = envolvimento do público com os gêneros

(“gramáticas”) e não com os textos em si. Enquanto críticos falam da

qualidade do texto (“âmbito da estética”), pessoas se interessam por

gêneros (policial, suspense, romance, erótico, ficção etc.) na condição

de formas que geram expectativas prévias (“âmbito da textualização”).

Esses três níveis implicam nos usos possíveis, por parte dos receptores,

para os processos de decodificação e ressignificação.

Usos - dizem respeito a três aspectos

1) habitus de classe:

- onde ver TV?

- onde fica o aparelho de TV?

- como a TV é usada?

- quando e quanto tempo a TV fica ligada? Onde?

2) competência cultural:

- memória + imaginários + narrativas

3) gêneros (estratégias de comunicabilidade):

- público “desconhece gramática da produção da TV”, mas fala seu idioma. A TEORIA DOS DISCURSOS SOCIAIS – Eliseo Verón Autor parte da premissa de que discursos são produtos sociais e tenta mostrar isso de modo sistematizado e teórico, para evitar o senso comum. Articula seu pensamento com idéias de Gottlob Frege e de Peirce para propor teoria dos discursos sociais que evite o binarismo funcionalista e de Saussure. Discursos sociais = textos compostos de vários códigos (palavras, imagens, sons, linguagens sincréticas etc.) e que se relacionam sempre com outros textos (discursos). São “pacotes” onde operações de investimento de sentido nas diferentes matérias significantes se co-determinam (VERÓN, 1980: 78-9), o que impede, por exemplo, uma “análise (geral) da imagem”. Realidade = construção discursiva (ex.: acidente nuclear de Three Mile Island, onde busca verificar como mídia construiu a realidade – o “sentido” – a partir de algo passado, não reconstituível. Aqui, a realidade foi construída (1981). Discursos (textos) – são construídos através de dois processos: a) processos de produção (intertextual), onde se deve considerar 3 níveis de intertextualidade: - dentro de um mesmo universo discursivo (filmes entre si, livros entre si) - entre universos discursivos distintos (cinema → TV, charge → jornal) - discursos que não aparecem na superfície textual (manuais de redação, roteiros cinematográficos, croquis arquitetônicos etc.)

Verón chama a essa instância de operações de investimento do sentido ou operações produtivas de significação em matérias significantes, as quais geram textos (objetos textuais). Só que essas operações são (também) práticas sociais específicas (pois Verón pensa a linguagem como uma forma de ação).

Detalhe (polêmico): para Verón, sujeito é “apenas” um suporte dessas operações, nas quais não se considera a sua “intencionalidade” em transmitir uma mensagem, pois ele é considerado apenas em termos de sua posição social. Esse aspecto vai determinar o segundo processo: b) condições de produção (extratextuais e sociais), que determinam o lugar social dos produtores (suportes). Importante: processos de produção e condições de produção são processos complementares e inseparáveis. A soma de ambos gera um modo de produção discursiva a ser analisado. Sistema produtivo = articulação entre produção + circulação + consumo Análise semiológica se dá por diferenças (um texto não tem propriedades em si mesmo, mas só em comparações com outro textos ou outros textos). Assim, análise nunca é de um texto, mas de vários, e suas diferenças ocorrem por conta da posição social dos produtores. Verón reconhece que textos não admitem uma leitura única, o que o leva a considerar a existência do que ele chama de gramáticas, as quais raramente são idênticas entre elas mesmas: a) gramática de produção (modos como o texto é produzido), e b) gramática de reconhecimento (modos como o texto é lido).

Há ainda a instância da circulação, “processo pelo qual o sistema de relações entre condições e produção e condições de recepção é socialmente produzido” (VERÓN, 1980: 108). Exemplos: comunicação de massa = instantânea ou diária; arte = prorrogável; ciência = indefinida. Para Verón, discursos tendem a ser marcados pela luta de classes, como o científico, porque são em essência ideológicos. Ideológico, aqui, significa: a) dimensão de todos os discursos no interior de uma formação social; b) nome do sistema de relações entre discurso e condições de produção; c) aquilo que é tornado “natural”, espontâneo (conforme mito em Barthes).

Falar do ideológico é falar da natureza produtiva de qualquer fenômeno de sentido.

Os discursos sociais, para Verón, fazem parte daquilo que ele chama de semiose social, e aqui seu pensamento se volta para as idéias ternárias de Frege e Peirce. Ambos não consideram a relação entre objetos e nomes, como até certo ponto faz Saussure (que fala em “conceitos”), como algo binário, mas sim como um sistema ternário.

Frege Peirce Verón Análise de produção discursiva

Zeichen (expressão)

sign (signo) operações produção (texto)

sinn (sentido) Interpretant (interpretante)

discurso traços (discurso)

bedeutung (denotação)

object (objeto) representações reconhecimento (leituras)

Em Frege, bedeutung equivale a um invariante associado a vários sentidos (ou seja, um mesmo objeto pode ter vários nomes, o que Frege chama de modos de dizer). Em Peirce, o signo faz parte de uma cadeia semiósica, relacionando-se com um objeto e gerando um certo efeito (o interpretante). Para Verón, o “mesmo” ocorreria com os discursos sociais. O que importa para Verón não é a relação (primeira) signo/objeto, mas a representação da relação entre representação de primeira ordem e o objeto (ou Argumento, nos termos de Peirce). Exemplo: democracia. Não interessa o que seja a democracia em si (como objeto), mas sim como é representada uma já dada representação dessa noção de democracia (“ditadura”, “liberdade dos povos”. “liberdade de mercado”, “neoliberalismo” etc.) em diferentes discursos. Assim, a representação é construída, reforçada ou alterada por uma comunidade (social, donde o “esvaziamento” do sujeito). Seria o “peso do social” aquilo que esvazia o poder do sujeito diante da sociedade. Assim, por exemplo, ser jornalista implica em ocupar um papel social (do qual se espera o adequado desempenho desse mesmo papel social) e Dominar os processos de produção jornalística. Ou seja: o jornalista não fala “por si próprio”, ele é um suporte das operações que permitem a construção do sentido jornalístico (ou seja: o jornalista “só é jornalista” quando é jornalista). Por isso Verón, ao abordar a estrutura da semiose social, que é ternária, afirma que os sujeitos são vetores de atualização dessa tecedura: - objeto (representado) = ator social - signo = mediação - interpretante = suporte/ponto de passagem de operações de produção do sentido

A semiose social, então, se transforma numa rede textual, histórica, onde ler é produzir e produzir é ler algo anterior (conforme dizia Barthes em S/Z):

Mas Verón procura saber depois outra coisa: como se dão as escolhas do receptor diante da oferta de sentido midiática, uma vez que dois jornais, A e B, tendem a oferecer os mesmos conteúdos? Diz ele que a igualdade existe, em tese, apenas no âmbito dos enunciados (conteúdos), mas que existem também diferenças no âmbito da enunciação. Exemplos de igualdade de conteúdo do enunciado e de diferença na enunciação:

“Pedro chegou” x “Acho que Pedro chegou”

O primeiro enunciado é mais objetivo, sem presença marcada do enunciador; o segundo é modalizado, deixa entrever a presença do enunciador. A partir daí, Verón diferencia os vários tipos de relação existente entre enunciador e enunciatário, instituídos, por exemplo, nas manchetes de capas de revistas: objetivo (asserções, questões, qualificações): “Gestão para os novos tempos” (Exame); “27 vestidos de festa a partir de R$ 59,90” (Capricho); “Aborto, o difícil consenso” (Sociologia). pedagógico (conselhos, presença do enunciador e do enunciatário): “13 maneiras de usar os vestidos que vão pegar nesta estação” (Capricho); “Crime virtual (saiba como se proteger)” (Galileu); “Loops: aprenda a criar seqüências de bateria” (Digital Áudio Vídeo). cúmplice (diálogos, uso de “nós” inclusivo, conselho impessoal): “Você tem coragem?” (Vida Simples); “Na corte do Rei Roberto Carlos – os bastidores da turnê (Billboard Brasil); “Alanis Morissette na ilha de Caras: ‘estar fisicamente tão bem me mantém longe da depressão” (Caras).

A partir desse modelo, podemos constatar a presença de variações de enunciação. cúmplice engraçado: “Pantera: ‘cor-de-rosa é a mãe!’”; “Mariette: o pintinho quer dançar”; “Pantanal: Juma e suas amigas do peito” (Flashback). Ou constatar mistura de imagens de enunciadores: objetivo cúmplice: “56 atitudes infalíveis para fortalecer sua carreira (quando está tudo de pernas para o ar) (Você S/A) Segundo Verón, isso se aplica aos demais códigos usados pelo sistema midiático (diagramação de primeira página, chamadas, fotos etc.). Por exemplo: revistas ditas “sofisticadas” (como as de decoração) tendem a ter poucas chamadas de capa, em oposição clara às revistas ditas “populares” (como as de novelas e receitas culinárias). Porém, contrato de leitura deve ser verificado conforme sua regularidade (pelo menos dois anos), diferenciação (para verificar o que é específico de cada suporte) e sistematicidade das propriedades exibidas por cada veículo, detectando também incoerências ocasionais. Crítica ao pensamento veroniano: logocentrismo semiótico (tudo se reduz ao semiótico, ao sentido).

PARA LER MAIS: BERGER, Christa. “A Pesquisa em Comunicação na América Latina”. In: HOHLFELDT, Antonio, MARTINO, Luiz C. & FRANÇA, Vera Veiga. Teorias da Comunicação. Petrópolis, Vozes, 2001, pp. 241-77. ESCOSTEGUY, Ana Carolina D. Cartografias dos Estudos Culturais – uma versão latino-americana. Belo Horizonte, Autêntica, 2001. ESCOSTEGUY, Ana Carolina & JACKS, Nilda. Comunicação e Recepção. São Paulo, Hacker Editores, 2005. FUENZALIDA, Valerio. Televisión Abierta y Audiência en América Latina. Buenos Aires, Editorial Norma, 2002. GARCÍA CANCLINI, Néstor. Consumidores e Cidadãos - conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 1995.

GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas Híbridas – estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo, EDUSP, 1998. GARCÍA CANCLINI, Néstor. Diferentes, Desiguais e Desconectados. Rio de Janeiro, UFRJ, 2005. GÓMEZ, Guillermo Orozco (org.). Recepción y Mediaciones – casos de investigación en América Latina. Buenos Aires, Editorial Norma, 2006. GÓMEZ DE LA TORRE, Alberto Efendy Maldonado. Teorias da Comunicação na América Latina – enfoques, encontros e apropriações da obra de Verón. São Leopoldo, Unisinos, 2001. MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos Meios às Mediações - comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 1997. MARTÍN-BARBERO, Jesús & REY, Gérman. Os Exercícios do Ver - hegemonia audiovisual e ficção televisiva. São Paulo, Ed. Senac, 2001. MARTÍN-BARBERO, Jesús. La Educación desde la Comunicación. Buenos Aires, Norma Editorial, 2003. PASQUALI, Antonio. Comprender la Comunicación. Ed. revis. y actual. Barcelona, Gedisa, 2007. SARLO, Beatriz. Cenas da Vida Pós-Moderna – intelectuais, arte e videocultura na Argentina. Rio de Janeiro, UFRJ, 2000. VERÓN, Eliseo. A Produção de Sentido. São Paulo, Cultrix, 1980. VERÓN, Eliseo. Construire l’Événement. Paris, Seuil, 1981. VERÓN, Eliseo. Fragmentos de um Tecido. São Leopoldo, Unisinos, 2005. TEORIAS PÓS-MODERNAS - conjunto de tentativas de explicação do fenômeno da Comunicação no âmbito contemporâneo, tendo em vista: 1) o papel internacional/transnacional dos MCM; 2) a noção de uma sociedade da comunicação generalizada; 3) a idéia de nossas experiências com a realidade mediatizadas pelos MCM.

Alguns autores centrais ou com aspectos em comum: Jean Baudrillard,

Gianni Vattimo. Outros nomes: Paul Virilio, Fredric Jameson.

Ponto de partida: a crise das metanarrativas (Jean François-Lyotard, O

Pós-Moderno, 1980), onde:

metanarrativas = “aquelas que marcaram a modernidade: emancipação

progressiva da razão e da liberdade, emancipação progressiva ou

catástrófica do trabalho (fonte do valor alienado no capitalismo),

enriquecimento da humanidade inteira através dos progressos da

tecnociência capitalista, e até, considerando-se o próprio cristianismo na

modernidade (...), salvação das criaturas através da conversão das almas

à narrativa crística do amor mártir. É certo que [essas narrativas] têm o fim

de legitimar instituições e práticas sociais e políticas, legislações, éticas,

maneiras de pensar. Mas [as metanarrativas] não procuram essa

legitimidade num acto original fundador, mas num futuro que deverá

efectuar-se, ou seja, numa Ideia a realizar. Essa Ideia tem um valor

legitimante porque é universal. Orienta todas as realidades humanas. Dá à

modernidade o seu modo característico: o projecto, esse projecto de que

Habermas diz que permaneceu inacabado, e que deve ser retomado,

renovado” (LYOTARD, 1993: 31-2. Grifo no original).

Jürgen Habermas - busca desenvolver um modelo de “ação comunicativa”

baseado na razão / justiça / democracia / ética (Consciência Moral e Agir

Comunicativo, 1981).

Lyotard analisa o papel da linguagem e da narrativa no discurso e no

conhecimento científico, tentando mostrar que há uma legitimação desses

campos através da linguagem (ou seja, da representação da realidade), e

não através da ciência em si (ou seja, da realidade em si). Para alguns,

obra de Lyotard é, na verdade, obra contra Habermas (modernidade

liquidada x modernidade a ser retomada).

Crise de metanarrativas é derivada de questionamentos lingüísticos da

ciência, mas também de uma certa crise dos paradigmas científicos (diante

de paradoxos e questões irrespondíveis). Exemplo “tradicional”: física

quântica x física clássica. Conseqüências:

1) fim da noção [eurocêntrica e unitária] de História (retomam-se aqui

idéias de Walter Benjamin, Karl Marx e Friedrich Nietszche sobre história

como uma representação do passado criada por uma classe dominante);

2) fim da noção de progresso.

Gianni Vattimo: defende pós-modernidade como aspecto de sociedades

centradas na noção dos MCM como “multiplicadores” de pontos de vista

(étnicos, culturais, sexuais etc.).

Mídia = gera “caos”, pois sociedade não se vê/crê mais “iluminada” (no

sentido moderno do termo), mas diante de cadeia de diferenças múltiplas.

Tudo tem de se tornar comunicação + minorias viram “público” midiático.

Para Vattimo, há passagem da noção de “apenas eu/minha cultura” para

“apenas um/uma cultura dentre outras no mundo” marca uma mudança

central: a perda do “princípio de realidade” ou o desenraizamento em

relação à realidade (que ele chamará de emancipação).

Jean Baudrillard: diferente de Vattimo, crê na lógica da hiper-realidade.

Hiperdimensiona o pensamento platônico que diz:

representação = duplicação da realidade, apresentação de novo de algo;

simulacro = disputa ontológica da representação com a realidade;

espetáculo = contemplação das representações e simulacros.

Vivemos, segundo Baudrillard, a era das simulações e simulacros, onde:

simular = fingir ter aquilo que não se tem (“confusão sígnica”)

dissimular = fingir não ter o que se tem (“confissão sígnica”).

Não se distingue mais entre o que é e o que finge ser. Para Baudrillard,

porém, isso deixa de ser problema (vide crítica dele a Matrix).

Diferente ainda de Vattimo, Baudrillard vê (em “Requiém para os Media”)

que MCM não possuem potencial democrático, libertador ou similar, uma

vez que fabricam a “não-comunicação” ou a “simulação da comunicação”.

Em Simulacros e Simulações, autor diz que MCM criam signos que já não

têm aderência com a realidade, que independem da realidade. Signos se

desenvolveram segundo quatro estágios, para Baudrillard:

1 - refletem a realidade;

2 - mascaram e pervertem a realidade;

3 - mascaram a ausência de uma realidade básica;

4 - não têm mais relação alguma com a realidade

(signo se torna seu próprio simulacro puro).

Exemplos de Baudrillard: caso dos índios Tasaday e assassinato de

Kennedy X quase assassinatos de Johnson, Nixon, Ford e Reagan.

Críticas ao pensamento pós-moderno:

1) ele próprio é uma metanarrativa (totalizante, generalizante): paradoxo

em relação às demais metanarrativas, pois se utiliza da mesma lógica

generalizante;

2) transforma “a posição do sujeito” no mundo em apenas um “efeito de

sentido” (lingüístico, cultural etc.). Ou seja: sujeito é resultado de sua

posição discursiva no mundo, e “nada mais do que isso”. A noção de si

como um “efeito de sentido” gera algo entre confusão e mal-estar.

3) (conseqüência de 2): é possível sujeito ser a-ideológico ou a-qualquer

outra coisa no mundo? É possível não se ancorar em idéias, preceitos e

restrições culturais?

4) estaria deslocado no mundo o indivíduo não-plural, não-heterogêneo,

que crê numa identidade?

Críticas ao pensamento pós-modernos são feitas por Terry Eagleton

(Depois da Teoria) e por Peter Berger e Thomas Luckmann (Modernidade,

Pluralidade e Crise de Sentido).

PARA LER MAIS:

BAUDRILLARD, Jean. “Requiem pelos Media”. In BAUDRILLARD, Jean.

Para uma Crítica da Economia Política do Signo. São Paulo, Martins Fon-

tes, s.d., pp. 207-35.

BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e Simulação. Lisboa, Relógio D’Água,

1991.

BERGER, Peter L. & LUCKMANN, Thomas. Modernidade, Pluralidade e

Crise de Sentido - a orientação do homem moderno. Petrópolis, Vozes,

2004.

CONNOR, Steven. Cultura Pós-Moderna - introdução às teorias do con-

temporâneo. São Paulo, Loyola, 1992.

EAGLETON, Terry. Depois da Teoria - um olhar sobre os Estudos Cultu-

rais e o Pós- Modernismo. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2005.

LYOTARD, Jean-François. O Pós-Moderno. 4. ed., Rio de Janeiro, José

Olympio, 1993.

LYOTARD, Jean-François. O Pós-Moderno Explicado às Crianças. 2. ed.,

Lisboa, Dom Quixote, 1993.

VATTIMO, Gianni. A Sociedade Transparente. Lisboa, Ed. 70,1991.

A NOVA COMUNICAÇÃO - termo que se refere a um grupo de

pesquisadores surgido nos anos 50 e que gravitam em torno de mesmos

aspectos envolvendo a comunicação como processo interacional.

Nomes centrais: Gregory Bateson, Paul Watzlawick, Ray Birdwhistell,

Edward Hall, Erving Goffman.

- atacam a linearidade/simplicidade do paradigma de Shannon & Weaver;

- adotam a idéia de que comportamento e comunicação estão interligados;

- comunicação não é linear, mas circular, pois acatam a idéia (herdada da

Cibernética) da retroalimentação (feed-back);

Norbert Wiener - “pai” da Cibernética (ciência da pilotagem; kybernetes =

grego, significa “piloto”, “leme” ou ainda “governador”). Ciência surge em

fins dos anos 40 e defende a idéia de que uma ação precisa de

informações de volta para que ela possa seguir seu curso normalmente.

entradas saídas

dados resultados

input SISTEMAS output

tempo

antes retroação depois

SISTEMAS

Axiomas principais:

1) não se pode não comunicar; portanto, tudo comunica;

2) existe metacomunicação (comunicação sobre a comunicação);

3) comunicação é um todo integrado (verbal + não-verbal); 4) modelo de comunicação é o orquestral (não o telegráfico da TI); 5) contexto é fundamental para entender o processo comunicacional; 6) mensagem paradoxal “trava” respostas humanas (até as espontâneas).

Gregory Bateson - antropólogo norte-americano, casado com antropóloga

Margaret Mead, estuda várias culturas distintas e cria os seguintes

conceitos:

1) cismogênese = gênese de um cisma (divisão) no interior de um sistema

social. Segundo Bateson, essas diferenciações podem ser de duas ordens:

- diferenciação simétrica: “podem se inscrever nessa categoria todos os

casos nos quais os indivíduos de dois grupos A e B têm as mesmas

aspirações e os mesmos modelos de comportamento, mas se diferenciam

pela orientação desses modelos” (BATESON, 1977: 98)

Ou seja:

grupo A abc grupo B abc

x x x x

abc abc xyz abc abc

< >

x x

onde:

x = indivíduos

abc = relações que indivíduos de um grupo mantêm entre si

xyz = modelos de comportamento com os quais indivíduos de um grupo se

relacionam com o outro (nesse caso, simétrico, e vice-versa).

- diferenciação complementar: “nessa categoria estarão inscritos todos os

casos onde o comportamento e a aspirações dos membros dos dois

grupos são fundamentalmente diferentes” (BATESON, 1977: 99)

Ou seja:

grupo A lmn grupo B rst

x x x x

lmn lmn opq (-> uvw) rst rst

>

onde: x uvw (-> opq) x

<

x = indivíduos (de A e B)

lmn = relações entre indivíduos do grupo A

rst = relações entre indivíduos do grupo B

opq = resposta de A à mensagem uvw de B

uvw = resposta de B à mensagem opq de A

Em suma:

relação simétrica: A = B

relação complementar A > B ou A < B

Ambas as relações podem progredir rumo a uma escalada de descontrole

e violência, se não houver regras limitantes.

Ex A = B: corrida armamentista; competições esportivas (que são

regradas).

Ex A > B: voyeurismo/exibicionismo; relação patrão x empregado (regrada).

Observação: não há comportamento simétrico ou complementar em si

mesmo; são as relações do indivíduo perante os outros que constróem

esse “aspecto”. Ou seja: o indivíduo não é, o indivíduo “está”.

Verón lembra: um dado campo pode estar previamente colocado como

simétrico (exemplo: um debate político na TV, que propõe as mesmas

regras para os candidatos), mas um dos participantes pode tentar

desenvolver uma estratégia complementar, “desqualificando” oponente.

2) conceito do duplo vínculo (double bind) - se dá quando ocorre uma

situação paradoxal na qual a pessoa “envolvida” num contexto desigual

(complementar) com uma outra pessoa não sabe como se portar.

Conceito surge de estudo de Bateson e Mead em Bali (1942):

1 2 3

No caso acima, mãe solicita atenção do filho (1); quando este responde,

ela se “desliga” dele (2). Troca comunicativa não se “fecha” de modo

afetivo. Ambos parecem “aborrecidos” ao final (3).

Conceito pode ser levado para outras esferas do relacionamento humano.

Exemplo: mãe acha que filho não gosta dela e pede a ele para que a ame.

Se filho se esforça para amar a mãe (“obedece-a”), quanto mais tenta

fazê-lo, mais pode odiá-la (pois amar é espontâneo), e se sentirá mal. Se

filho não se esforçar para amar a mãe, “desobedecerá” e poderá continuar

a ser cobrado; ao mesmo tempo, se sentirá mal por não amar sua mãe.

Em suma: não haveria solução para tal situação.

Duplo vínculo = situação paradoxal que ocorre no âmbito de uma relação

entre indivíduos da qual a pessoa não sabe como sair (problema será

retomado posteriormente por Watzlawick et alii). Conceito será aceito de

início, depois rejeitado e, num terceiro momento, reavaliado pelo próprio

Bateson, que o “ajusta” (alguns chamam conceito de duplo

constrangimento, pois ambos os agentes sociais ficam sujeitos a uma

situação constrangedora, por ela não ter uma saída lógica, exceto se se

sair do contexto criado pela situação). Conceito do duplo vínculo será

retomado posteriormente por Paul Watzlawick e trazido para o campo da

psiquiatria.

Em Communication: the social matryx of psychiatry (1951), Bateson, com

Jurgen Ruesch, diz: “a Comunicação é a matriz social da vida moderna”.

3) metacomunicação - comunicação sobre a comunicação. Bateson

verificou que lontras, macacos e outros animais “metacomunicam”, ou seja,

comunicam algo sobre suas mensagens. Ele percebeu isso ao jogar um

pedaço de papel numa ponta de linha para duas lontras num tanque, que

começaram a “brigar” pelo papel (na verdade, brincaram com o papel).

Assim: metacomunicação implica a existência de 2 mensagens numa só.

Nível do conteúdo = aquilo que se diz

Nível da relação = o modo como se considera a mensagem

(ordem, brincadeira, interpretação teatral etc.)

Bateson buscava achar a unidade na diversidade, ou seja: como a

Comunicação constrói o mundo do sujeito e, ao mesmo tempo, como o

sujeito se comporta nesse mesmo mundo.

4) informação - “qualquer diferença que faz diferença” (1979, Mente e

Natureza)

Paul Watzlawick - psiquiatra, filósofo e professor austríaco. Trabalhou em

Palo Alto e conheceu Bateson. Publicou trabalhos em conjunto com outros

pesquisadores (Don Jackson, Janet Helmick Beavin, Richard Fisch,

John Weakland) e individualmente.

Obra central: Pragmática da Comunicação Humana (1967), com Jackson e

Beavin, diretamente influenciada por Bateson e que estabelecerá e

ampliará os principais axiomas da pragmática humana.

Watzlawick tem preocupações na esfera da psiquiatria e da esquizofrenia e

adota com ponto-de-partida a Teoria dos Tipos Lógicos de Alfred

Whitehead e Bertrand Russell (Principia Mathematica) e os estudos

sobre linguagem de Ludwig Wittgenstein.

Whitehead, Russell e Wittgenstein estudaram os paradoxos (exemplo: um

cretense diz que “todos os cretenses são mentirosos”. Afirmação seria

paradoxal: se os cretenses são mentirosos, então esse cretense está

mentindo; mas se o que ele diz é uma mentira - ou seja, “é mentira que os

cretenses mentem” -, então os cretenses não mentem; porém, se os

cretenses não mentem e o cretense diz “os cretenses são mentirosos”,

então é verdade que os cretenses mentem; porém... - chega! Exemplo é

similar ao enunciado “estou mentindo”.

Solução do paradoxo: não incluir o próprio enunciado no conjunto dos

elementos ao qual ele (enunciado) diga respeito. Se trocarmos o enunciado

“estou mentindo” por algo como “as coisas que digo são mentirosas”,

podemos não incluir no conjunto das coisas mentirosas que alguém diz a

própria frase. Em termos lógicos: um membro de uma dada classe não

pode ser membro de uma classe de nível diferente:

“as coisas que digo

são mentirosas”

minhas minhas

frases frases

mentirosas mentirosas

Ou seja: A e B, conjuntos diferentes, não devem ser confundidos entre si.

“Minhas frases

mentirosas” =

conjunto A

“Minhas frases

mentirosas” + enunciado acerca delas =

conjunto B

É essa confusão entre níveis (inclusive os de linguagem) que cria situação

de comunicação paradoxal (que terá conseqüências na esquizofrenia, nas

relações familiares etc.), ou seja, terá influência no comportamento das

pessoas em uma dada interação.

Premissas de Watzlawick:

1) análise não pode ser feita desconsiderando o contexto;

2) análise deve considerar a situação diádica (duas pessoas, no mínimo,

nunca o comportamento estritamente individual - monádico).

Watzlawick baseia-se na classificação de Charles Morris e Rudolf

Carnap:

comunicação se dá em 3 níveis:

- sintático (códigos, sinais)

- semântico (significado dos sinais)

- pragmático (alteração do comportamento a partir da “interpretação”

desses sinais). É esse nível que interessa a Watzlawick.

Estudo passa a ser mais “matemático” (estuda a relação entre os “termos”

- as pessoas) e menos psicológico (o indivíduo). Relação pode ser

“analisada” em termos matemáticos.

Relações humanas são suscetíveis de feed-back (retroalimentação) que

influencia no comportamento humano (comunicação é processo circular).

Outra premissa watzlawickiana:

conhecer uma linguagem = saber algo sobre essa linguagem

comunicar = comunicar sobre comunicação

Ex.: podemos aprender um jogo sem saber de antemão suas regras,

através da redundância de certos movimentos e ações.

Tudo isso implica num conceito: METACOMUNICAÇÃO (já proposto por

Bateson, ou seja, a capacidade do indivíduo de comunicar algo sobre a

comunicação (suas mensagens), assim como ocorre abaixo:

Matemática = conjunto de números, símbolos

Metamatemática = comunicação sobre a matemática

Assim, a metacomunicação comporta dois níveis de comunicação:

1) o nível do conteúdo = aquilo que se diz (mensagem de A para B)

2) o nível da relação = como se diz (visão de A em relação a B)

Problema (paradoxo) se estabelece quanto conteúdo e relação “apontam”

para significados completamente distintos: é o paradoxo comunicacional.

Axiomas propostos por Watzlawick, Jackson e Beavin (ampliados a partir

de Bateson):

1) é impossível não comunicar (pois comportamento não tem oposto);

2) é impossível não se comportar;

3) interação = série de mensagens trocadas de modo circular;

Exemplos ajudam a compreender idéias de Watzlawick:

1) confusão e/ou percepção entre níveis: como fazer com que, sem tirar o

lápis do papel, quatro retas possam ligar todos os nove pontos abaixo? . . . . . . . . .

2) nível meta: é possível inserir apenas números como dados num

computador ou calculadora para fazê-lo funcionar plenamente?

3) análise de relação humana em termos “matemáticos” (ou pontuação de

uma seqüência comunicacional): esposa se irrita com marido distante;

marido diz que se torna cada vez mais distante para não irritar a esposa.

comportamento de esposa = + a

comportamento de marido = - a

temos relação = a - a + a - a + a - a + a... (tendendo ao “infinito” - crise - se

soma / relação não tiver fim)

4) comunicação como processo circular: Scooby-Doo/Salsicha e biscoitos.

5) paradoxo comunicacional (é impossível realizar logicamente a ação

solicitada): “seja espontâneo!”.

6) outro tipo de comunicação paradoxal: quando há divergência entre a

mensagem analógica (que tende a expressar o nível da relação) e a

mensagem digital (que tende a expressar o nível do conteúdo).

- “Eu amo você!” dito com raiva;

- “Abrace-me”, virando o rosto para o lado quando a pessoa se aproxima;

ATENÇÃO: paradoxo é diferente de contradição

contradição = escolher entre duas alternativas potencialmente similares

(morrer queimado ou se atirar de um prédio em chamas)

paradoxo = não é possível escolher logicamente uma alternativa

(“ignore este aviso”)

7) equívoco de interpretação da intenção do outro (lembremos: regras -

comunicacionais, inclusive - são aprendidas por redundância).

Exemplo: namorado que nunca reclama de atraso de namorada e um dia

reclama disso e ela reclama da reclamação dele.

Relação entre indivíduos B e A se pauta em três possibilidades, tendo

como parâmetro o modo como B vê a si próprio e como acha que A o

percebe (o que pode ser definido como um nível metacomunicativo de A

para B):

1) confirmação (A aceita B)

2) rejeição (A não aceita B)

3) desconfirmação (A desconsidera a existência de B).

Ou seja: qualquer uma das três mensagens de A para B traz uma

metacomunicação de A sobre B (A sempre comunica algo sobre B).

Como sair de um paradoxo: apelar para um observador “fora da relação”.

A<-[]->B

Imaginemos A e B puxando para si a vela de um barco que já estaria em

equilíbrio sem o esforço de ambos. Ou A e B que empurram uma porta

para abrir (A->[]<-B), ao mesmo tempo e usando a mesma força, sem um

saber do esforço (inútil) do outro. Ou seja: é preciso um terceiro agente

(dentro da visão de Watzlawick, um psiquiatra) para tentar fazer os

indivíduos “ajustarem o foco” de suas relações.

“Ajuste de foco” da realidade seria o que Watzlawick chama de “mudança”

(que pode ser de nível 1 para uma de nível 2). Em suma: para Watzlawick

e seus colegas de pesquisa psiquiátrica, a realidade é “inventada” pelo

indivíduo, pois depende da percepção da sua realidade.

Pensamento de Bateson influenciou na obra de Massimo Canevacci

(Antropologia da Comunicação Visual)

Questão: esfera da comunicação visual reprodutível (VCR) - televisão,

cinema, publicidade - é propícia ao double bind; relação é transferida do

âmbito dos pais para o âmbito da mídia.

Exemplo 1: torcedores de futebol (hoje transmitido regularmente pela TV)

xingam-se uns aos outros, odeiam-se uns aos outros (em particular, em

cidades onde há forte polarização esportiva). Duplo vínculo: eles precisam

do outro (o torcedor do time adversário) para constituir a sua própria

identidade.

Exemplo 2: aculturação. Duplo vínculo (visual) se impõe na medida em que

povos aculturados se vêem “obrigados” a assumir uma nova identidade

(em nome do mundo moderno) ao mesmo tempo em que pretendem

manter sua própria identidade histórica. Ou seja: oscilam entre assumir a

nova identidade e temem perder a antiga, e querem manter a antiga

identidade ao mesmo tempo em que assumem a nova.

Pensamento de Bateson e Watzlawick influenciou a obra de Daniel

Bougnoux, que vê aproximação em algumas instâncias da publicidade e

de sua problemática relação com a negação psicanalítica.

Problema psicanalítico: como negar sem trazer na negação aquilo que se

pretende negar?

Exemplo 1: “É proibido fumar aqui” traz embutido a noção de “fumar” (tanto

textualmente quanto visualmente).

Exemplo 2: comercial anti-AIDS que mostra casal transando. Paradoxo

comunicacional entre texto (mensagem digital) e imagem (mensagem

analógica).

Ray Birdwhistell - pesquisador norte-americano na área de Comunicação e

Psiquiatria. Seu foco central de análise é o estudo da cinésica (kinesics),

ou seja, o estudo dos gestos e de seu poder comunicativo.

Birdwhistell descarta os modos clássicos de estudo dos gestos humanos, a

saber:

1) os “dicionários do corpo”, obras que se propõem a estudar o gesto e o

corpo como algo mais “natural” do que a fala; conseqüentemente, os

significados transmitidos por gestos e corpo seriam naturais e universais.

2) os “inventários de signos corporais”, obras que classificam os gestos

conforme seus usos, contextos e grupos sociais (comunidades, artes); os

gestos dessa natureza são convencionais, portanto podem ser “traduzidos”

para a linguagem escrita.

Nenhuma dessas duas visões satisfaz Birdwhistell, que propõe os gestos

como algo “amarrados”/ancorados a um contexto social específico. Para

ele, o corpo significa conforme a situação.

Exemplo: índios norte-americanos kutenai, que têm um gestual quando

conversam entre si, na sua língua, e adotam outra postura gestual quando

usam outra língua (o inglês) para falar com o homem branco.

Birdwhistell propõe que o gesto é “artificial”, por ser dependente da cultura,

e diz que se confunde a gesticulação (capacidade de gesticular, que é

universal) com os gestos (que têm significados próprios em cada situação).

Gesticulação e gestos fazem, portanto, parte de um sistema maior, a

gestualidade, que é como uma linguagem composta de:

cinemas (“fonemas”) - unidades mínimas

cinemorfemas (“morfemas”) - combinação de cinemas

construções cinemórficas (“proposições”) - combinações de cinemorfemas

A análise cinésica proposta por Birdwhistell parte da premissa de que

“nunca não ocorre nada” (outro modo de dizer que “é impossível não

comunicar”). Isso torna essa análise extremamente detalhada.

Primeiro estudo “estranho” de Birdwhistell: “rituais nada amorosos” entre

marinheiros norte-americanos e garotas inglesas, situação na qual se

construíam as seguintes imagens:

soldados => garotas atrevidas/fáceis X garotas => soldados cafajestes

“Problema”: a significação cultural dada ao ato “beijo na boca”.

EUA - um dos primeiros gestos, muito anterior ao sexo

Inglaterra - um dos últimos gestos, preliminar ao sexo.

Ouro estudo de Birdwhistell: estudo da troca de fraldas, que gera duplo

vínculo entre mãe (que tem um filho mais velho esquizofrênico) e seu

terceiro filho, ainda de colo (o segundo, em tese, era normal).

Birdwhistell percebe o duplo vínculo no qual a mãe encerra a criança,

“pedindo-lhe” que se aproxime (para melhor trocar a fralda nos braços dela,

mãe) e, ao mesmo tempo, “pedindo-lhe” que se afaste (para não se furar

no alfinete).

Trabalho mais famoso de Birdwhistell = cena do cigarro (1956), junto com

Gregory Bateson e outros pesquisadores. É filmada uma seqüência

envolvendo Bateson e uma jovem, na qual ela pede que ele acenda-lhe um

cigarro. Birdwhistell se deterá minuciosamente em 9 segundos desse filme.

Principais conclusões de Birdwhistell:

1) é impossível um estudo isolado da linguagem ou da gestualidade.

Ambos fazem parte de um amplo sistema que inclui tato, olfato, espaço e

tempo. Além disso, o gesto tem um forte aspecto integrador no processo

comunicacional. Ou seja: no processo comunicacional estão embutidos

aspectos informativos e integradores, sendo que estes últimos

1. mantêm o sistema em funcionamento

2. regulam o processo interativo

3. fazem referências cruzadas a uma mensagem dada a fim de ampliar sua

inteligibilidade num dado contexto

4. relacionam o contexto concreto com contextos mais amplos dos quais a

interação é apenas uma situação particular.

Assim, não há sentido em se estudar um gesto isolado, mas os gestos no

âmbito de uma situação interacional. Tradução lingüística geral e possível

para os gestos se restringe a duas possibilidades.

- “Está tudo bem, continuemos”.

- “Ops, há algo errado”.

2) Comunicação é um sistema na qual os homens se empenham. Para ele,

o homem não comunica, participa da comunicação ou é elemento dela.

Dessa visão particular de comunicação, Birdwhistell percebe dois aspectos:

1) existe no processo comunicacional uma sincronia interacional (ou seja,

os agentes participam da situação como se estivessem em um balé)

2) é sempre preciso uma análise do contexto, ou seja, do sistema que

torna possível uma troca, e não uma análise dos conteúdos trocados pelos

agentes interacionais. Esse sistema, para Birdwhistell, é a comunicação da

qual os homens participam.

Problemas não superados por Birdwhistell:

1) linguagem oral e gestualidade são paralelas, mas não são coincidentes

no tempo, o que dificulta uma análise simultânea de suas partes (palavras

e gestos).

2) ele reconhece não ter conseguido encontrar a gramática da

gestualidade.

Edward T. Hall - antropólogo norte-americano, irá estudar a comunicação a

partir dos “choques culturais” que ocorrem entre representantes de duas

culturas distintas (comunicação intercultural).

Objetos de análise de Hall: os diferentes usos do espaço (proxêmica) e do

tempo (cronêmica) nas culturas humanas.

A Linguagem Silenciosa (1957) - trata do tempo que, para alguns povos, é

linear e material (se desenvolve à medida em que avança e pode ser

ganho, perdido, economizado ou gasto) e para outros povos não.

Variáveis do tempo:

1. a noção de passado (quanto menor o passado, menor a percepção de

futuro e vice-versa. No Ocidente a noção de futuro é superficial; no Oriente,

ele é “duradouro”).

2. a velocidade com a qual ele é “usado”.

Tempo tende a ser:

1. formal (conhecido, reconhecido e vivido por cada um de nós)

2. informal (situacional e impreciso)

3. técnico (científico)

Exemplos de tempos diferentes (diferentes significados para segundos):

1. formal - “o minuto dura sessenta segundos”

2. informal - “isso vai levar só um segundinho”

3. técnico - “o tempo do atleta foi de 3 segundos e 8 décimos”

Com base no pensamento do lingüista George Trager, Hall propõe uma

análise da cultura conforme três aspectos:

1. séries (“fonemas”) - o que se percebe

2. notas (“morfemas”) - o que constitui uma série

3. esquemas (“proposições sintáticas”) - o modo de tornar coerente uma

série, a fim de lhe dar sentido.

As séries seriam as unidades de tempo (“10 segundos”, “um minutinho”);

as notas, o modo como usamos e percebemos essas unidades de tempo

(com urgência, valorizando-as, ordenando-as); e os esquemas, o modo

como o tempo é usado/percebido numa cultura, de modo mais amplo (e

que demanda uma pesquisa maior).

Posteriormente, em A Dimensão Oculta (1966), Hall definirá dois grandes

esquemas temporais:

- monocronia: temporalidade na qual o indivíduo faz uma coisa de cada

vez; tende-se a dividir o tempo e organizá-lo. É o tempo do

norte-americano e do alemão, por exemplo.

- policronia: temporalidade na qual o indivíduo faz várias coisas ao mesmo

tempo; tende a otimizar o espaço e ao compromisso com a pessoa. É o

tempo dos latinos e do japonês.

Algumas culturas conseguem passar de um esquema para outros, como os

japoneses, policrônicos entre si e monocrônicos com os estrangeiros.

Esses aspectos serão aprofundados por Hall em Além da Cultura (1976) e

A Dança da Vida (1983) e, num segundo momento, em obras específicas

para públicos segmentados (homens de negócios, empresários), como

Understanding the Japanese (1987) e Understanding Cultural Differences -

germans, french and americans (1990), junto com Mildred Reed Hall.

Ainda em A Linguagem Silenciosa, Hall começa a tratar da questão do

espaço (“territorialidade”, a posse de um espaço para um dado organismo,

que passa a defendê-lo de outros, inimigos ou não). A Dimensão Oculta

ampliará a discussão sobre as relações do homem com o espaço.

Estudo de Hall se inicia com a lembrança de que os animais dispõem:

1. de dois espaços no relacionamento com outros animais:

- distância de fuga (a partir da qual animais - e também esquizofrênicos -

se sentem seguros)

- distância crítica (zona espacial possibilita tanto a fuga ou o ataque)

2. de dois espaços no relacionamento com animais da mesma espécie:

- distância pessoal (que compreende a “bolha de ar” que cerca cada um de

nós e que é “individual”)

- distância social (distância de afastamento entre indivíduos numa dada

situação e que é “social”)

Além disso, Hall procura analisar como diferentes culturas se relacionam

com o espaço além da visão. Exemplo: como esquimós Aiviliks andam

quilômetros em uma paisagem de neve sem se perder? Apelando para

outros sentidos (audição e olfato).

Hall percebe que culturas organizam espaço conforme três possibilidades:

1) organização fixa (prédios, paredes, espaços da casa. Divisão pode ser

visível ou invisível).

2) organização semi-fixa, dividida em duas categorias:

- espaços sociófugos, levam ao isolamento do indivíduo (certas

disposições de salas de espera, ambientes, móveis afastados).

- espaços sociópetos, levam ao contato entre indivíduos (cadeiras

próximas lateralmente ou em cantos, ônibus, metrôs).

3) organização informal, subdividida em quatro categorias de distância:

- íntima (próxima ou afastado): ato sexual, luta, proteção, conforto;

- pessoal (“bolha de ar”): pessoa ao alcance do outro, assuntos pessoais;

- social (conversas impessoais): festas, eventos sociais;

- pública (grandes espaços): eventos públicos e políticos, palestras.

Para Hall, “cultura é comunicação, e comunicação é cultura”.

Erving Goffman - sociólogo canadense, influenciado pela corrente

interacionista (G.H. Mead, W.I. Thomas). Parte da seguinte premissa:

- sociedade é um processo no qual indivíduo e sociedade estão

interrelacionados;

Indivíduo tem 3 instâncias: “eu”, “mim” e “si” (“I”, “me” e “self”).

“Eu” = tendência impulsiva do indivíduo (espontânea e desorganizada);

“Mim” = “outro” incorporado ao indivíduo (que compreende os papéis que

os outros desempenham e pode “imitá-los”)

“Si” = processo social no interior do indivíduo no qual ele toma

consciência de si próprio a partir dos pontos de vista dos outros (há tantos

“sis” quantos forem os grupos sociais que o indivíduo freqüenta,

conseqüentemente).

Obs.: o indivíduo pode ainda assumir o papel do outro (role taking).

Goffman cria modelo de dramatização para analisar a ação social do

indivíduo, como faz em A Representação Social do Eu na Vida Cotidiana

(1959). Obs.: tradução brasileira é equivocada, pois título original refere-se

à “presentação de si” (“the presentation of self”), mantida em francês (“la

présentation de soi”), e não a “representação do eu” (onde “presentação”

significa “tornar presente algo”, diferente de representação, “tornar a tornar

presente algo”). Assim, para melhor compreensão, seria melhor traduzir por

“presentificação de si” ou ainda “apresentação de si”.

Nessa obra, Goffman tenta mostrar como as aparências são relevantes no

comportamento dos outros. A pessoa se “faz passar” por outrem (cria uma

fachada ou face). Ou seja: a pessoa não faz, ela finge fazer (encena), ao

mesmo tempo em que espera que os outros vejam o empenho de sua

“presentificação de si”.

Exemplo 1: Goffman lembra Sartre que vê um garçom rodopiando num bar.

Ele “finge” ser garçom (vale também para vendedores de loja quando não

há ninguém para atender e, de repente, alguém entra).

Exemplo 2: ex-casal se encontra casualmente numa festa. Demais

participantes tendem a agir “naturalmente” (“civilizadamente”) se:

- separação não foi civilizada

- eles tentam (fingem) agir civilizadamente

- demais pessoas fazem o mesmo.

Para tentar manter o que Goffman chama de “face”, as pessoas apelam

para outros “recursos dramatúrgicos”, como:

- aparência (indícios que representam o status do indivíduo);

-maneira (papel que indivíduo irá desempenhar - equivale à relação em

Watzlawick: raivoso, educado, humilde etc.)

- dramatização da própria ação (ato de encenar aquilo que se está fazendo,

aparentemente - exemplo de Sartre lembrado por Goffman: aluno que se

empenha tanto em dar sinais de que presta atenção na aula que corre o

risco de não prestar atenção na aula; é o dilema “expressão x ação”).

Pensemos, por exemplo, na mobilidade social (mudança de status,

situação financeira etc.) ou no encontro entre indivíduos de diferentes

competências lingüísticas (o menos alfabetizado tentando falar de modo

equivalente ao do seu “superior”).

Goffman irá aplicar seu referencial ‘teórico-teatral” em outras esferas, como

nas instituições totais: “[locais] de residência e trabalho onde um grande

número de indivíduos com situação semelhante, separados da sociedade

mais ampla por considerável período de tempo, levam uma vida fechada e

formalmente administrada” (Goffman, 1996: 11). Geralmente há alguém

que “pensa” pelos indivíduos. Exemplos: asilos, orfanatos, cadeias,

internatos, navios de guerra, mosteiros etc. São locais nos quais:

1) há uma autoridade central;

2) todos os aspectos da vida se dão no mesmo local;

3) cada coisa é feita coletivamente, por todos também;

4) as atividades são fortemente regradas por horários;

5) planejamento das atividades é racional e planejado.

Nesses espaços, há a tendência à mudança e/ou perda da identidade (self)

do indivíduo. Em suma: como instituição total passa a ser o “mundo” dentro

de outro mundo, rótulos e etiquetas internos passam a ter valor simbólico

elevado sobre indivíduo (pessoa só se torna homossexual, ladrão ou louco

se é “etiquetado” pelos outros como tal).

Análises de Goffman seguem por outras obras, como Ritos de Interação

(1974), nos quais lembra que o indivíduo é constantemente chamado a

interagir socialmente, e que cabe a ele se esquivar ou enfrentar cada uma

das situações que se apresentam a ele. Vai-se desde o esquivamento de

uma situação social até os modos como se evadir de um grupo numa festa

ou situações similares, por exemplo.

Estudos de Palo Alto servem de referência para estudos na área da comunicação intercultural, ou seja, para as situações em que dois ou mais membros de diferentes estarão frente a frente. Segundo Rodrigo Alsina (1999), isso se tornará cada vez mais comum devido a fatores como: a) aumento dos movimento migratórios; b) facilidades do transporte entre países; c) globalização da economia e da comunicação que aumentam a consciência

de uma mundialização; d) globalização provoca necessidade de intervenções em conflitos regionais ou

nacionais por parte de organismos internacionais; e) esvaziamento do Estado-nação como referência política; f) multiplicação de conflitos interculturais.

Rodrigo Alsina vê nos axiomas da Escola de Palo Alto, combinados com os de outros autores, um referencial teórico para construir a “Terceira Cultura”: “uma terceira cultura é uma subcultura que se produz em uma situação determinada onde temporalmente podem ser produzidas mudanças na conduta pela interação de pessoas que buscam obter acordos mútuos sobre determinado objetivo. Em seus esforços para ajustar-se, um e outro constroem uma experiência comum que pode, posteriormente, servir como ponto de partida para reiniciar suas relações” (CASMIR & ASUNCION-LANDE apud ALSINA, 1999: 202).

Abordagem da Nova Comunicação estabelece as seguintes bases:

1) oferece instrumental teórico para a análise das interações humanas, em

particular no âmbito lingüístico;

2) promove uma renovação no modelo/paradigma comunicacional;

Para outros autores, porém, há limites:

1) seria difícil uma verificação empírica ou mesmo uma análise detalhada

(vide dramaturgia de Goffman), uma vez que muitos dos estudos são

decorrentes da observação do comportamento do indivíduo (o que pode

levar a crer num neo-behaviorismo de Watson).

2) nem todas as aplicações teriam efeitos possíveis e/ou desejáveis (como

as mudanças psiquiátricas propostas por Watzlawick et alii).

3) análises podem se estender no tempo a partir de pequenos fragmentos

de “ação social” (como estudos de Bateson e Birdwhistell).

PARA LER MAIS

BATESON, Gregory. Vers une Écologie de l’Esprit. Paris, Seuil, 1977 (tome 1), 1980 (tome 2).

BATESON, Gregory & RUESCH, Jurgen. Communication et Société. Paris, Seuil, 1988.

BATESON, Gregory. Mente e Natureza - uma unidade necessária. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1986.

BIRDWHISTELL, Ray. El Lenguaje de la Expresión Corporal. Barcelona, Gustavo Gili, 1979 (original: Kinesics and Context, Philadelphia University of Pennsylvania Press, 1970)

GOFFMAN, Erving. A Representação do Eu na Vida Cotidiana. 8. ed.,

Petrópolis, Vozes, 1999. GOFFMAN, Erving. Manicômios, Prisões e Conventos. 5. ed. São Paulo, Perspectiva, 1996. GOFFMAN, Erving. Estigma – notas sobre a manipulação da identidade deteriorada 4. ed., Rio de Janeiro, LTC, 1988. GOFFMAN, Erving. Les Rites d’Interaction. Paris, Minuit, 2005. GOFFMAN, Erving. Os Momentos e Seus Homens. Lisboa, Relógio D’Água, 1999. HALL, Edward T. Le Langage Silencieux. Paris, Seuil, 1984. HALL, Edward T. A Dimensão Oculta. Lisboa, Relógio D’Água, 1986. HALL, Edward T. Más Allá de la Cultura. Barcelona, Gustavo Gili, 1978. HALL, Edward T. A Dança da Vida - a outra dimensão do tempo. Lisboa, Relógio D’Água, 1996. HALL, Edward T. Understanding Cultural Differences - germans, french and americans. Maine, Intercultural Press, 1990. HALL, Edward T. Comprendre les Japonais. Paris, Seuil, 1994.

RODRIGO ALSINA, Miquel. Comunicación Intercultural. Barcelona, Anthropos Editorial, 1999. WATZLAWICK, Paul, BEAVIN, Janet Helmick & JACKSON, Don D. Pragmática da Comunicação Humana. 15. ed., São Paulo, Cultrix, 2002.

WATZLAWICK, Paul, WEAKLAND, John & FISCH, Richard. Mudança – princípios de formação e resolução de problemas. São Paulo, Cultrix, 1977. WATZLAWICK, Paul. A Realidade é Real? Lisboa, Relógio D’Água, 1991. WINKIN, Yves (org.). La Nouvelle Communication. Paris, Seuil, 1984 (tradução parcial: WINKIN, Yves (org.). A Nova Comunicação. Campinas, Papirus, 1996)

OS PARADIGMAS TECNOLÓGICOS DA COMUNICAÇÃO Surgem no final do século XX, apesar de suas raízes estarem localizadas historicamente nos anos 1940 (cibernética, desenvolvimento gradativo da informártica) e ajudam (também) a introduzir novas problematizações no campo da Comunicação, ao lado de outras questões: - influência no processo de globalização - digitalização de processos econômicos, culturais etc. - surgimento de mídias digitais Tudo isso faz parte daquilo que Lorenzo Vilches chama de “migração digital” ou seja, a “migração de uma nova economia dos meios na sociedade da informação, que poderemos ver nos próximos anos. Nesse sentido, somos todos emigrantes de uma nova economia criada pelas tecnologias do conhecimento, que supõe o deslocamento para um planeta altamente tecnificado” (VILCHES, 2003: 10). Os paradigmas tecnológicos da comunicação podem ser divididos em duas linhas:

otimismo (Lévy) x pessimismo (Sfez)

Premissa em vigência: paradigma clássico da Comunicação (E -> R) é insuficiente na sociedade contemporânea mediada por computadores e/ou outros suportes/tecnologias digitais conectados em rede. A Internet, por exemplo, é um ambiente que possibilita várias modalidades de comunicação: - um para um (one-to-one) - e-mail - um para muitos (one-to-many) - informativos eletrônicos, portais - muitos para muitos (many-to-many) - comunidades virtuais, ambientes de bate-papo Tudo isso implica em uma mudança de olhar para a sociedade: estamos caminhando de uma sociedade dos meios de comunicação de massa para uma sociedade midiatizada, na qual o indivíduo também produz sentido/significação, só que de alcance supostamente “planetário”.

Diferenças entre MCM tradicionais e mídias digitais interativas.

MCM tradicionais

- verticalizados

- produção centralizada

- dissociação entre E e R

- potencial ligação textual

Mídias digitais interativas

- horizontalizadas

- produção descentralizada

- associação entre E e R (onde E = R)

- potencial ligação hipertextual

Teórico central otimista: Pierre Lévy. Pensa as redes interativas de modo

rizomático (influência de Gilles Deleuze e Felix Guatarri em relação aos

sistemas de pensamento).

Deleuze e Guatarri

- conexão

- heterogeneidade

- multiplicidade

- ruptura a-significante

- cartografia

- decalcomania

Lévy

- metamorfose

- heterogeneidade

- multiplicidade + encaixe de fractais

- exterioridade

- topologia

- mobilidade dos centros

Vamos passando progressivamente para o âmbito da virtualidade, onde:

virtual -> atualizável

possível -> real

e onde oposição real x virtual é falsa / falseada pelo senso comum e pelos

discursos midiáticos.

Lévy enxerga (de certo modo, influenciado por McLuhan) três grandes mo-

mentos na história da Humanidade (ou “os três tempos do espírito”):

1) sociedades orais (oralidade + grandes narrativas + memória)

2) sociedades da escrita (registro das ações + metanarrativas +

perspectiva histórica)

3) sociedades da informática (virtualização + experiência de realidades

virtuais + conhecimento através da simulação).

Críticas ao pensamento de Lévy:

1) mais “integrado” (por oposição a “apocalíptico”) / promissor / mistificador

do que realidade pressupõe;

2) parece desconsiderar infloexclusão, realidades terceiro-mundistas e

outras situações que estão longe de terem atingido a pós-modernidade em

seus vários aspectos.

Teórico central pessimista: Lucien Sfez (Crítica da Comunicação, 1988,

livro-resposta para Jean Baudrillard).

Premissa: há excesso do domínio da comunicação na sociedade

contemporânea (falar de comunicação = comunicar-se). Para Sfez, onde

falham as metanarrativas (Lyotard), nasce a Comunicação. Sfez trabalha

com 3 metáforas:

1) A Máquina (representação) - o homem se realiza “com” a técnica,

“através” da técnica (a qual é um meio).

2) O Organismo (expressão) - a técnica está “no” mundo junto com o

homem (homem e técnica pertencem à mesma “realidade” orgânica).

3) Frankenstein (confusão) - o homem existe “pela” técnica (técnica ajuda a

ensinar o homem). Máquina criada pelo homem torna-se sua própria

criadora (lembrando de Frankenstein: criatura “adota” nome do criador).

Primeiro tipo de comunicação = representativa (linear e representacional).

Imagem = bola de bilhar.

1) Movimento é linear (paradigma clássico) e movimento deve ser conser-

vado na sua íntegra (mensagem = energia da física clássica: não deve “se

perder”).

2) análise seqüencial e estrutural da ação comunicativa (A e B representam

momentos distintos no processo).

3) exteriorização e atomização dos elementos (E, mensagem e R são

distintos e “distantes” entre si).

4) processo cartesiano (emissor envia mensagem para receptor).

Comunicação representacional apóia-se no paradigma clássico da

comunicação e nas teorias que o representam (funcionalismo

norte-americano, por exemplo).

Segundo tipo de comunicação = expressiva (criatura orgânica).

Imagem = orquestra (Nova Comunicação, Palo Alto)

1) Dualismo platônico (corpo/espírito, substância/forma) desaparece para

dar lugar ao monismo (unidade).

2) Circularidade (realidade não é uma só, mas pode ser duas, três,

dependendo das possibilidades do(s) movimento(s) circular(es) no

processo comunicacional).

3) Interação (intercâmbio entre sistemas, produzindo mudanças futuras).

Sujeito Meio ambiente

Comunicação expressiva apóia-se na Nova Comunicação e na cibernética.

Terceiro tipo de comunicação: “confusionante” (Frankenstein)

1) tautismo (autismo + tautologia + totalidade) = confusão da representação

com a expressão e vice-versa.

- autismo (doença do auto-fechamento - sujeito não se comunica, nem se

conforma com pensamento de outrem). Ex. hacker.

- t autologia = proposição em que sujeito e predicado são um e o mesmo

conceito (A é A)

JOHNSON, Steven. Cultura da Interface - como o computador transforma a nossa maneira de criar e comunicar. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2001. LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência - o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro, Ed. 34, 1993. LÉVY, Pierre. O Que é o Virtual? São Paulo, Ed. 34, 1996. LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, Ed. 34, 1999. SFEZ, Lucien. Critique de la Communication. Paris, Seuil, 1988 (tradução brasileira: Crítica da Comunicação. 2. ed., São Paulo, Loyola, 2000). SFEZ, Lucien. A Comunicação. Lisboa, Instituto Piaget, 1991. VILCHES, Lorenzo. A Migração Digital. São Paulo, Loyola, 2003.

PARA LER MAIS:

- totalidade = grande todo que nos engloba/envolve, de caráter não

fragmentário.

Imagem possível = cérebro/computador (simulacro), que possibilita um

conhecimento que se expressa e ao mesmo tempo é representado.

Exemplo tautista dado por Sfez: publicidade

1 o . momento = publicidade representacional (“eis um objeto a ser

vendido”). Publicidade = instrumento para representar um dado produto.

2 o . momento = expressão publicitária (publicidade como sistema). Anúncio

“vende” todos os objetos que aparecem nele, não apenas o produto.

3 o . momento = publicidade tautística (publicidade vende a si própria como

processo totalizante comunicativo).

Saída possível = interpretação (ou seja, se questionar sobre os

significados das coisas ditas, e se essas coisas significam mesmo aquilo

que achamos que elas significam). Interpretação se opõe à confusão, uma

vez que o tautismo (cuja nação é o mundo e a língua, a eletrônica) é uma

ideologia que escamoteia o fim do sujeito (e exibe isso) e esconde o fim da

comunicação e do Estado (Sfez, 2000: 309).

Críticas a Sfez: pessimismo latente + crença num bom uso da mídia.

BÔNUS TRACK

(outras questões para o campo da comunicação)

Interpretação, interação e comunicação - quais as relações entre esses

três campos? O que significa falar contemporaneamente em interação e

em interpretação? Isso nos leva a dois caminhos possíveis:

1) o Pós-Estruturalismo (interpretação).

2) os estudos de enunciação lingüística (interpretação e interação).

Ambos apontarão para aspectos relevantes da Análise do Discurso (a ver

em futura disciplina).

O PÓS-ESTRUTURALISMO

Movimento surgido no começo dos anos 70, destrói a idéia estruturalista

que diz respeito à existência de estruturas a serem percebidas nos

diversos âmbitos e aspectos da sociedade (Literatura, Antropologia etc.).

Nomes centrais: Jacques Derrida, o segundo Roland Barthes, Michel

Foucault.

Jacques Derrida - principal destruidor do estruturalismo e da filosofia (que

também opera por estruturas, binárias, no caso).

Derrida lembra que filosofia é construída a partir de 3 leis:

- lei da identidade: “o que é é”

- lei da contradição (lógica): “nada pode ser e não ser”

- lei do terceiro (ou do meio) excluído (verdade): “tudo deve ser ou não

ser”.

Essas leis implicam uma coerência lógica no pensamento ocidental: há

uma origem à qual essas leis se referem, e que devem ser simples (não

contraditórias), homogêneas (de mesma substância/ordem) etc.

Ao mesmo tempo, Derrida questiona experiência como a base do

conhecimento científico/filosófico (no que recupera diretamente Martin

Heidegger e indiretamente David Hume). Intuição é diferente de razão.

Conseqüentemente, pensamento ocidental (“metafísico”, diz Derrida):

1) acredita que a linguagem representa a realidade (pois a linguagem é um

sistema de diferenças entre si [as palavras], ao mesmo tempo em que não

é idêntica à realidade que representa);

2) baseia-se na noção binária de lógica, onde algo é verdadeiro ou falso,

onde algo é ou não é (dentro/fora, bem/mal, positivo/negativo, mente/

corpo, natureza/cultura etc. Dualidade masculino/feminino fica à parte, pois

decorre - também - de diferenciações lógicas e biológicas).

Oposições binárias, conseqüentemente, são culturais, e não naturais (aqui,

Derrida segue - conscientemente ou não - o caminho do primeiro Barthes,

o mitólogo)

Por isso haveria significados transcendentais (Deus, eu, substância,

matéria, capital etc.), assim como a filosofia espera um significante

transcendental, signo que daria sentido a tudo.

Questionamento de Derrida: como pode isso acontecer (oposições

binárias), se algo, para ser algo, deve também não ser outra coisa? Ou

seja: algo sempre está, de algum modo, “ligado” ao que não é (vide poesia,

publicidade, duplo sentido, gírias etc.).

Chave estaria no pensamento de Peirce. Diz Derrida: “o próprio do

representamen é ser si e um outro, de se produzir como uma estrutura de

remessa, de se distrair de si. O próprio do representamen é não ser

próprio, isto é, absolutamente próximo de si” (Derrida, 1973: 60). Ou seja:

signo de Peirce é aberto, contrário ao de Saussure, que é fechado.

Assim, Derrida propõe a desconstrução como método de análise textual e

filosófica. Para ele, escritor escreve com uma das mãos; porém, o que ele

faz com a outra? Ou seja: todo texto (consciente) é “formado” por um outro

“texto”, obscuro, que pode distorcer a base de tudo aquilo que o autor quis

dizer. Método de Derrida tem como ponto de partida prefácios, pequenas

notas de rodapé, fragmentos de texto e outras matérias textuais em tese

insignificantes, mas que possam contradizer o texto produzido, por

apresentarem impasses de significado.

Estrutura lógico-binária deve ser desconstruída, ainda que pensamento do

próprio Derrida esteja “contaminado” por esse mesma lógica.

Derrida propõe conceitos que têm uma dupla estrutura: pharmakon (que

tanto significa “veneno” quanto “remédio”), hímen (tanto “dentro” quanto

“fora”) e suplemento (que é excesso e adição necessária). Esses conceitos

se inscrevem naquilo que ele chama de différance, aquilo que é diferido

(traduz-se no Brasil por diferança ou diferência). Segundo Derrida,

différance tem um elemento gráfico que não pode ser representado pela

voz (ou seja, palavra não pode ser 100% representada vocalmente).

Posteriormente, Derrida falará em “disseminação” (que se refere a “sema” -

sentido - e também a “sêmen”, ejaculação de sentido), ou seja, as relações

possíveis entre os signos, de modo a que não haja mais uma significação

fixa junto ao signo, mas uma série de possíveis oscilações de sentido.

Em tempo: há que se lembrar da “rigidez lingüística” do francês, que não

permite “criação” em cima de nomes, tal como no inglês e no português.

Proposta maior de Derrida: aproximar significante e significado, eliminar

fronteira entre “literário / não literário” e tornar a filosofia um campo criativo

(crítica + criação).

Derrida acaba mostrando, ao longo de sua (difícil) obra, que:

1) signo tem significação modificada, conforme muda seu contexto (para

isso, signo deve ser reprodutível);

2) a escrita não pode ser vista como uma simples “transcrição da fala”;

3) a escrita, por sua vez, não é puramente gráfica (depende, por exemplo,

da tipia usada e que modifica o sentido de um significante);

4) enfim, fala e escrita são sistemas de significação distintos e não 100%

relacionáveis entre si.

Segundo Roland Barthes: pós-estruturalista. Passa da busca (semiológica

e ideológica) do significado para a abertura significante. Obra central: S/Z

(1970), uma análise dos significantes do conto “Sarrasine”, de Honoré de

Balzac.

Barthes deixa de lado o significado da obra (o que ela pretende dizer) para

se deter nas possíveis interpretações dos significantes do texto. Divide os

textos (literários) em duas categorias:

legíveis (lisibles) = aqueles que se “lê”

escrevíveis (scriptibles) = aqueles que se pode “redigir” (leitor passa de

consumidor a produtor do texto; Barthes proclama também a “morte do

autor” - aquele que detém o sentido único de um texto).

Texto escrevível não tem significação fixa, é difuso, permite entradas não

previstas, é “aberto” e intertextual (feito de pedaços de outras obras ou

textos).

Método de Barthes:

1) divide um texto em pedaços aos quais Barthes chama de lexias (título,

palavras, frases, parágrafos, passagens etc. Escolha pode ser aleatória,

conforme “visão” do analista);

2) aplica a essas lexias 5 categorias possíveis (“códigos” ou “vozes”), a

saber:

- proairético (narrativo, refere-se a determinadas ações e como as

“mentalizamos”);

- hermenêutico (refere-se ao não mostrado, aos enigmas e problemas a

serem respondidos - ou não - ao longo do texto);

- cultural (citação tirada de ou baseada em um estoque de saberes,

cotidianos, científicos ou de outra natureza);

- sêmico (conotações possíveis a um personagem ou local);

- simbólico (lugar de mudança de foco da leitura do texto - leitura

psicanalítica, política, sexual etc.)

A aplicação desses códigos possibilita trazer à tona o caráter plural de um

texto.

Exemplo: título da obra, “Sarrasine”.

- código hermenêutico: quem ou o quê é Sarrasine? Título é um enigma a

ser respondido pelo texto;

- código sêmico: “Sarrasine” conota “feminilidade” (e a nós, brasileiros,

“francesidade”). Efeito tende a se espalhar pelo texto.

Em suma: texto não é uma estrutura (vide Greimas, por exemplo, e suas

estruturas actanciais), mas um processo aberto de estruturação, o qual

permite diferentes interpretações pelo leitor. Posteriormente, em outro

quadro teórico, Pierre Bourdieu falará em estruturas estruturantes.

PARA LER MAIS:

BARTHES, Roland. S/Z. Lisboa, Ed. 70, 1980.

DERRIDA, Jacques. Gramatologia. São Paulo, Perspectiva, 1973.

DERRIDA, Jacques. La Dissémination. 1a. republic., Paris, Seuil, 1993.

EAGLETON, Terry. Teoria da Literatura - uma introdução. São Paulo,

Martins Fontes, 1994.

ESTUDOS DE ENUNCIAÇÃO

Articulam aspectos da interação humana (influência do pensamento de

Palo Alto) e da lingüística da fala (Mikhail Bakhtin)

Premissa: homem não é uno da linguagem (“eu” só existe em função do

“outro”).

Saussure dividiu linguagem em langue e parole e optou pela análise

exclusiva da primeira. O russo Bakhtin fará o oposto.

Ponto de partida: estudos de Émile Benveniste sobre a subjetividade na

linguagem. Autor irá diferenciar:

enunciado (frase) x enunciação (ato de fala)

Enunciação é processo que envolve 3 instâncias:

- sujeito do enunciado (“sujeito da frase”)

- sujeito da enunciação (aquele que fala)

- sujeito falado (destinatário, imagem daquele para quem se fala)

Mikhail Bakhtin (Marxismo e Filosofia da Linguagem, Voloshinov, 1929) irá

se opor ao pensamento de Saussure, pois para ele:

1) todo signo é ideológico (“domínio da ideologia coincide com o domínio

dos signos”);

2) não há signo neutro;

3) linguagem = campo de batalha social, principalmente em locais ou

circunstâncias de forte assimetria social (colonizados x colonizadores,

patrões x empregados etc.);

4) consciência não é algo individual, pois ela resulta de fatores que são

sócio-ideológicos e translingüísticos;

5) fala (e sua análise) depende do contexto, da enunciação e dos agentes

sociais que se utilizam dela (palavra nunca é a mesma em todas as

situações sociais, depende de quem a “usa”);

6) linguagem nunca está pronta e acabada, está em constante mutação;

como está vinculada às interações sociais, linguagem é dialógica.

Bakhtin desenvolve também em sua obra o conceito de polifonia, ou seja, a

“presença” de outros na minha fala. Esses “outros” são as “vozes” que se

fazem presentes no meu texto (percebe-se, aqui, a influência de Bakhtin no

Barthes pós-estruturalista de S/Z).

Atenção: noção de polifonia será retomada nos anos 70/80 por Osvald

Ducrot em quadro teórico parecido, mas não igual. Vozes bakhtinianas dão

lugar a “personagens”.

- Autor/enunciador = “eu” (pessoa física)

- Locutor = “personagem que assumo” para falar

- Narrador = ponto de vista que assumo ao falar (primeira pessoa, oculto

etc.)

Percebe-se aproximação de conceitos caros à Nova Comunicação

(interação, personagem, representação) nos estudos da enunciação.

PARA LER MAIS:

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. 6. ed., São Pau-

lo, Hucitec, 1992.

BENVENISTE, Émile. Problemas de Lingüística Geral I. 4. ed., Campi-

nas, Pontes, 1995.

BENVENISTE, Émile. Problemas de Lingüística Geral II. Campinas, Pon-

tes, 1989.

DUCROT, Osvald. O Dizer e o Dito. Campinas, Pontes, 1987.

STAM, Robert. Bakhtin - da teoria literária à cultura de massa. São Paulo,

Ática, 1992.

LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO

O que é linguagem? E por que ela é importante para o estudo da

Comunicação?

Depende da perspectiva na qual consideramos o que seja linguagem, se:

1) representação do mundo e do pensamento (“espelho” ou “reflexo”);

2) instrumento de comunicação (“ferramenta” ou código);

3) forma de ação ou interação (“lugar”, processo interativo).

Conseqüentemente, conforme a noção de linguagem que adotemos, irão

variar também as noções de sujeito e de texto.

1) sujeito = senhor absoluto de atos e falas;

2) sujeito = pré-determinado pelo sistema que articula a linguagem;

3) sujeito = agente interativo; ator/construtor social.

1) texto = produto lógico do pensamento;

2) texto = simples produto da codificação de A e decodificação de B;

3) texto = lugar dialógico de construção/produção de sentidos.

Discussão similar ocorre no âmbito da imagem fotográfica (em sua fase

pré-digital) e sua capacidade de representação “realista” da realidade (por

oposição à pintura). Lembra Philippe Dubois que a fotografia pode ser:

- espelho da realidade (discurso da mimesis, da imitação);

- transformação do real (discurso do código e da desconstrução; realidade

é um “efeito” ideológico, culturalmente codificado);

- prova da realidade (discurso do indício e da referência).

Essas três visões da fotografia se assemelham às categorias propostas

por Peirce nas relações possíveis entre representamen e objeto (a divisão

“mais importante dos signos”, segundo o próprio Peirce):

- ícone (signo que guarda semelhança com aquilo que representa);

- símbolo (signo que substitui algo por força de convenção social/cultural);

- índice (signo que atesta a existência física de algo).

Na verdade, a linguagem é espaço de criação/produção de sentidos, em

suas várias esferas (escrita, oral, visual etc.), porque, de algum modo, ela

é sempre dotada de uma certa incompletude. Para entender isso,

precisamos antes entender as diferenças existentes entre as linguagens,

ou seja,os códigos que usam e as suas particularidades.

As linguagens costumam ser dividadas em duas grandes categorias:

verbais x não verbais

Porém, essa ampla distinção acaba sendo imprecisa, pois 1) coloca as

linguagens não verbais (visuais, sonoras) num mesmo conceito, e 2) não

prevê linguagens que apresentem ambos os aspectos (verbais e não

verbais): cinema, teatro, mídia impressa, infografias, HQs etc.

Um conjunto conceitual que aproxima a problemática das linguagens do

âmbito específico da Comunicação é o seguinte:

linguagens analógicas / linguagens digitais / linguagens analógico-digitais

Linguagens analógicas (de analogon, “semelhante”): aquelas que usam

códigos que fazem a mensagem construída se assemelhar, em alguns

aspectos, àquilo que pretende representar (imagens, sons etc). São

icônicas (no sentido dado por Peirce) ou motivadas (no sentido dado por

Saussure).

Linguagens digitais (de digitus, “dedo”): são aquelas que usam códigos

simbólicos (culturais, apreendidos) para transmitir uma mensagem que, em

tese, não se assemelha àquilo que pretende representar (palavras, escritas

ou orais). São simbólicas (no sentido dado por Peirce) ou se constituem de

signos arbitrários (no sentido dado por Saussure).

Linguagens analógico-digitais: são aquelas que usam ao mesmo tempo

tanto códigos analógicos (imagens, sons) quanto digitais (palavras) para

representar algo mais complexo do que a simples representação por

imagem, som ou palavra, apenas (cinema, infografia, HQ, teatro etc.).

Eliseo Verón propõe uma classificação que vá além dessas duas

categorias - analógicas e digitais (1977: 114-37).

Linguagem é entendida aqui como algo do âmbito da representação, ou

seja, serve (em tese) para designar as coisas do mundo. Qualquer signo

pode significar uma outra coisa, mas não necessariamente qualquer coisa

(salvo se houver uma nova simbolização). É preciso ter em mente que

nenhuma linguagem consegue representar tudo; o receptor sempre é parte

ativa diante de uma mensagem, qualquer que seja o código utilizado.

As potencialidades e os limites de cada linguagem.

- p alavra: pode ser oral ou escrita

- imagem: pode ser visual ou acústica

Supõe-se que tudo começou com escrita ideográfica (desenhos figurativos

que buscavam representar um objeto ou ser) por volta de 4000 a. C.

Posteriormente (3000 a.C.), surgem desenhos que não mais

necessariamente se remetem a um objeto concreto (ou seja, não têm mais

função figurativa; são os desenhos determinativos).

Enfim, num terceiro momento, surge a escrita alfabética, a qual pode

representar tanto objetos concretos quanto abstratos.

Isso introduz uma primeira e importante distinção entre palavra e imagem:

- a imagem se presta a representar objetos concretos;

- a palavra se presta a representar objetos concretos e abstratos.

Vimos que Saussure e Peirce (diferenças à parte e assim como outros

autores), reconhecem dois tipos básicos de signo: os motivados / icônicos

e os arbitrários / simbólicos.

Icônicos/motivados - são levados a se assemelhar (“em alguns aspectos”,

diz Peirce) ao objeto que representam. Esse objeto só pode ser concreto.

Arbitrários/simbólicos - são levados a representar algo (concreto ou

abstrato) através da força da convenção de uma cultura ou sociedade.

Distinção fica mais clara com exemplos diferentes:

gato x inflação

O primeiro exemplo diz respeito a um ser felino, de quatro patas, bigodes e

(em tese) conhecido em praticamente todo o planeta.

O segundo exemplo diz respeito a uma convenção social, adotada em

países de sistema capitalista, e que diz respeito a um contínuo aumento de

preços numa dada sociedade, com conseqüente perda do valor da moeda

em uso nesse referido país.

O gato (gaticidade) pode ser representado facilmente através de palavras

ou imagens. Já a inflação só pode ser representada através de símbolos

(textos) ou de articulações entre texto e imagem (infografias, gráficos,

tabelas) que tentem visualizar o conceito ou ainda através de um

deslocamento retórico (uma metáfora visual, como a do “dragão da

inflação”, na verdade uma outra convenção social, uma vez que a figura

de um dragão deveria representar, em tese, a idéia de dragão -

dragonicidade - e não uma outra coisa).

Um objeto concreto (fisicamente falando) pode ser representado por uma

imagem ou por palavras.

Um objeto abstrato só pode ser representado por palavras (a não ser que

haja uma convenção social que possibilite tal fato).

Palavra = poder de denominar algo (que pode existir ou não)

Imagem = poder de representar algo (que pode existir ou não)

Palavra - função indutiva (desencadeia uma conceitualização)

Imagem - função ostensiva (exibe / mostra um objeto)

Assim, uma das potencialidades da palavras é sua capacidade de

expressão do mundo abstrato e de designação e expressão do mundo

concreto. Já uma das potencialidades da imagem é sua designação visual

do mundo concreto.

Capacidade da imagem já foi analisada por Freud (A Interpretação dos

Sonhos, 1900) em seus estudos sobre os sonhos (imagens mentais) e as

possíveis relações lógicas entre os elementos que neles aparecem.

Freud vai constatar a existência de apenas uma relação lógica

“bem-sucedida” no sonho: a relação de semelhança, o “assim como” (na

verdade, um aspecto descritivo em relação a algo).

Freud vai dizer que a negação aparece nos sonhos; alguns autores vão

concordar com a idéia, outros discordar, comentando que a negação não

faz parte do âmbito das imagens.

Aqui, há diferença fundamental entre imagem fixa (foto, desenho) e

imagem seqüencial (cinema, TV etc.).

Imagem fixa = congelamento de um momento (não há antes ou após).

Imagem seqüencial = narração visual de um espaço temporal (um

momento específico tem antes e depois).

Imagem fixa = não pode mostrar um “não-ato”

Imagem seqüencial = pode mostrar alguém não fazendo algo

Texto = pode dizer “alguém não faz algo”

Guy Gauthier vai levar essa discussão para o âmbito da Filosofia da

Linguagem, particularmente para as análises de J. L. Austin sobre os atos

de fala e dizer que as fotografias podem ser consideradas enunciados

constatativos.

Austin reconhece a existência de dois tipos de enunciados: performativos e

constatativos. Os performativos são promessas, apostas e declarações

tidas pelo autor como atos de fala (o que se fala é a própria ação, como em

“eu prometo...” ou “aposto que...”). Podem ser explicitos (“eu o autorizo a

sair”) ou primários (“saia!”). Os constatativos são aqueles que descrevem o

estado das coisas.

Argumento de Gauthier mostra, assim, por exemplo, que imagens não são

imperativas/performativas, o que desmonta a idéia de que as imagens

publicitárias por si sós seriam imperativas, da esfera do “fazer consumir”.

Contexto no qual imagem aparece, veículo e texto (escrito ou oral) ajudam

a contribuir para essa finalidade.

Outros aspectos deixados de lado pela imagem fotográfica:

- ausência do agente enunciador (o “eu” fotógrafo, exceto pelo estilo);

- ausência de alternativas (“ou...ou...”)

- ausência de explicações (“porque...”)

- ausência de possibilidades (“se...)

- impossibilidade de mostrar, através exclusivamente de imagens,

convenções sociais/simbólicas (nomes, datas de nascimento, locais).

“Exceção”: informações podem “surgir” quando conhecemos o referente

mostrado. Isso leva a uma conclusão radical: a imagem pura e simples,

isolada de qualquer apoio textual de outra natureza, não leva ao

conhecimento. Por outro lado, só o reconhecimento nos permite

“completar” o sentido incompleto de uma imagem (fotográfica ou não).

Isso leva a dois aspectos cruciais no âmbito da Semiótica:

1) ícones e índices nada afirmam;

2) o índice apenas testemunha, designa algo que ocorreu, mas não explica

o porquê do fato (lembrando: em alguns países, índice = pista).

Ludwig Wittgenstein: “os limites de minha linguagem

significam os limites do meu mundo”

Relações primordiais da imagem fotográfica: “e” e “como”.

- “e”: permite justaposição de elementos (opostos ou não);

- “como”: permite descrição visual dos elementos mostrados.

Assim, quaisquer objetos/seres/situações podem ser bem descritos pela

imagem, mas não necessariamente pelo texto.

André Gaudreault e François Jost, baseados em estudo de Christian

Metz, propõem outro modo de se perceber a questão da descrição visual

de um objeto (em termos narratológicos) através da imagem

(cinematográfica, mas com validade também para as HQs e outras

linguagens baseadas em imagens seqüenciais):

- plano fixo e isolado = mostração;

- planos parciais sucessivos, sem tempo, só espaço = descrição;

- planos sucessivos, com inscrição de tempo = narração.

(Vale lembrar aqui, à parte, o enquadramento, que cria extracampo a ser

também complementado pelo espectador).

Incompletude da imagem se dá em outros níveis. Scott McCloud, em

estudos sobre HQs, fala de “conclusão” (aquilo que o leitor completa na

narrativa, entre um quadro e outro). Haveria seis transições entre quadros:

- momento-a-momento (pouca ação, tempo estendido = pouca conclusão);

- ação-pra-ação (ação num mesmo tema/ato, tempo mais curto);

- tema-pra-tema (cenários/locais se intervalam = mais conclusão);

- cena-a-cena (cenários/locais/tempo/espaço mudam = mais conclusão);

- aspecto-pra-aspecto (cenários mais diferenciados = mais conclusão);

- non-sequitur (ausência de seqüência lógica entre quadros = abstração.

Tipo de transição comum em boa parte dos videoclipes contemporâneos).

Em ambos os casos (Gaudreault + Jost, McCloud), a palavra fica em

segundo plano. Mas palavra e imagem têm outras propriedades distintas:

- a palavra /gato/, isolada, se refere a todo e qualquer gato existente,

passado, presente e/ou futuro (refere-se ao type, o gênero, diz Peirce).

- a imagem desenhada de um gato pode remeter ao conceito (abstrato) de

gatos em geral, mas também a uma determinada categoria de gato (a que

foi desenhada), ou seja, oscila entre o type e o token, o particular);

- a imagem fotográfica de um gato remete particularmente a um gato

(particular, singular, aquele que foi fotografado, o token de Peirce).

desenho de um gato fotografia desse gato

Isso cria um novo problema: a imagem (em particular, a fotográfica) remete

a um objeto em particular (“este gato”, e não um outro, de outra raça); a

imagem desenhada pode remeter a uma categoria (abstração), ao passo

que a palavra remete ao universal como um todo (ao conceito de “gato”).

Por outro lado, é preciso lembrar Barthes e Jean-Marie Schaeffer: a

fotografia é uma mensagem sem código.

Essa diferenciação (entre desenho ou fotografia) é fundamental, por

exemplo, na confecção de infografias, ao se decidir se o uso visual recairá

numa foto ou num desenho (escolha dependerá da necessidade de se

representar um ser/objeto em particular ou a sua categoria). O mesmo vale

para o uso de fotos jornalísticas ou ilustrações para acompanhar

determinadas matérias.

Além da capacidade icônica da imagem, é preciso lembrar ainda dos

estudos de Iconologia de Erwin Panofsky, ao se referir aos elementos

iconográficos, ou seja, aqueles elementos visuais de sentido simbólico e

cultural que “predicam” o referente da imagem e alteram o estatuto da

imagem de cultura para cultura.

Exemplo: a aureóla numa pessoa comum para predicar “santidade” ou

cara-de-pau.

Ou seja: é preciso determinar qual o uso que se quer de uma dada

linguagem (código): se para ter um grau maior de comunicabilidade

(matérias textuais informativas, de menor entropia) ou se para “fisgar” o

receptor (matérias textuais estéticas, de maior entropia), bem como ter

noção de qual combinação de códigos funciona melhor em determinadas

situações.

Leitura e textualidade.

Porém, não basta dominar um código; é preciso também ter em mente

aquilo que um código trabalhado e transformado em texto mantém um

complexo campo de vínculos, seja entre os agentes sociais, seja entre

outras matérias textuais.

Diz Barthes pós-estruturalista que ler é escrever, e escrever é ler. Diz

Derrida que signos se disseminam, mudam seus significados. Diz Bakhtin

que todo texto é uma citação de outras vozes. Se todos estão certos, como

ocorrem esses processos? E como analisá-los?

Se todo texto produzido é derivado de textos anteriores, então autor teve

de “ler” para escrever algo. Ou seja: os textos mantêm relações entre si.

Julia Kristeva recupera idéias de Bakhtin para propor a intertextualidade, a

presença de um texto em outro. Porém, será Gérard Genette quem irá

propor uma classificação mais ampla dessas relações chamadas por ele

de transtextuais:

- intertexto (pedaço de um texto no outro, com citações, alusões, plágios);

- p aratexto (periferia de um texto principal: título, nome do autor, prefácio);

- hipertexto (texto que deriva de um hipotexto: sátira, paródia, adaptação);

- metatexto (texto que comenta outro texto, explicitamente ou não);

- arquitexto (arquitetura de um texto, seu gênero).

Isso já implica em potenciais diferentes leituras, uma vez que é exigida

uma competência do leitor para articular essas instâncias textuais. Isso

altera substancialmente o estatuto da recepção de uma obra. Hans Robert

Jauss irá falar, noutro quadro teórico, do horizonte de expectativas, ou

seja, da “angulação” pela qual o leitor irá se deter previamente numa obra,

o modo prévio como ele espera que a obra transcorra.

Eliseo Verón dirá que entender/analisar um texto é compreender as suas

condições de produção, ou seja, o contexto, as regras, o habitus que

determinam como um texto será feito pelo autor, para melhor entendê-lo.

Assim como os códigos, os textos deles derivados também são sempre

tomados de uma incompletude. Umberto Eco lembra que os textos

solicitam do leitor uma competência discursiva (capacidade de antecipar e

simplificar fatos, de completar os não ditos e “espaços em branco” do texto,

cumprir o “papel” que lhe é proposto pelo autor, articular texto com outras

referências - textuais e/ou culturais - etc.). É o que Eco irá chamar de

“leitor-modelo”.

Vincent Jouve diz que se deve compreender a leitura como um processo:

- neurofisiológico (mente)

- cognitivo (compreensão)

- afetivo (emoção)

- argumentativo (lógica)

- simbólico (cultura)

Em suma: leitura é jogo que envolve aspectos individuais, culturais,

textuais e históricos (se um desses fatores se altera, muda a leitura).

Roman Jakobson: as funções da linguagem.

Mas não basta analisar as potencialidades de cada código e texto. É preciso

também levar em conta outros aspectos da linguagem. O russo Roman

Jakobson (1969) diz que todo processo comunicativo engloba seis aspectos,

sendo que a cada um desses aspectos corresponde uma diferente função da

linguagem:

Para Jakobson, no processo comunicativo, há sempre ênfase em um

desses aspectos, mesmo que eles se alternem ao longo do tempo e do

enunciado. Alguns autores criticam a visão de Jakobson do processo

comunicativo, ainda fortemente influenciada pelo paradigma de Lasswell.

Outros autores, porém, concordam que o esquema jakobsoniano é

aplicável à análise de diversos produtos e mensagens comunicativos.

função emotiva

função conativa

função referencial

função poética

função fática

função metalingüística

emissor

receptor

referente (ou contexto)

mensagem

canal (ou contato)

código

Voltando à discussão inicial do tópico, percebe-se que:

1) análise das linguagens, até aqui, foca-se em suas capacidades de

significação (semióticas), mas atreladas ao código (texto, imagem);

conseqüentemente, por sua incompletude, todas são passíveis de uma

ambigüidade interpretativa (a polissemia), ou seja: um signo pode ser

interpretado de mais de um modo ou significar algo diferente do esperado

(ver Semiótica e Pós-Estruturalismo, por exemplo);

2) várias teorias da comunicação buscaram o “verdadeiro” [ideológico]

sentido das mensagens (estruturalismo, Escola de Frankfurt, por exemplo).

3) de ambas as hipóteses acima, percebe-se uma outra coisa: que seria

(é) preciso se alfabetizar (textualmente, visualmente, sonoramente) diante

de um código/linguagem para tentar interpretá-lo de modo “correto” (seja

em termos de sentido, de ideologia ou de ambos);

4) comprender um texto é compreender as diferentes matérias (códigos,

sinais, textos) de que ele é feito;

5) se linguagem é incompleta/inadequada, textos dela derivados também

têm potencialmente essas mesmas características.

:

PARA LER MAIS

AGUIAR, Vera Teixeira de. O Verbal e o Não Verbal. São Paulo, Unesp,

2004.

BARTHES, Roland. “A Mensagem Fotográfica”. In: BARTHES, Roland. O

Óbvio e o Obtuso. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1990.

CHAPPÉ, Jean-Marie. L’Infographie de Presse. 2. ed., Paris, Victoires

Éditions, 2005.

DUBOIS, Philippe. El Acto Fotográfico - de la representación a la recepción.

Barcelona, Paidós,1986.

ECO, Umberto. Lector in Fabula - a cooperação interpretativa nos textos

narrativos. São Paulo, Perspectiva, 1986.

GAUDREAULT, André & JOST, François. Le Récit Cinématographique.

Paris, Éditions Nathan, 1990.

GAUTHIER, Guy. Veinte Lecciones Sobre la Imagen y el Sentido. 3. ed.,

Madri, Cátedra, 1996.

GENETTE, Gérard. Palimpsestes - la littérature au second degré. Paris,

Seuil, 1992.

GENETTE, Gérard. Paratexts - thresholds of interpretation. Cambridge,

Cambridge University Press, 1997.

JAKOBSON, Roman. Lingüística e Comunicação. São Paulo, Cultrix, 1969.

JOUVE, Vincent. La Lecture. Paris, Hachette, 1993.

KRISTEVA, Julia. Introdução à Semanálise. São Paulo, Perspectiva, 1974.

McCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. São Paulo, M.Books, 2005.

PANOFSKY, Erwin. Estudos de Iconologia - temas humanísticos na arte

do renascimento. Lisboa, Editorial Estampa, 1986.

PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo, Perspectiva, 1995.

PELTZER, Gonzalo. Jornalismo Iconográfico. Lisboa, Planeta Editora, 1992.

SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Lingüística Geral. São Paulo, Cultrix,

1969.

SCHAEFFER, Jean-Marie. A Imagem Precária. Campinas, Papirus, 1996.

VERÓN, Eliseo. Ideologia, Estrutura e Comunicação. 2. ed., São Paulo,

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