Apostila Iinterpretação e Redação

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  • 8/15/2019 Apostila Iinterpretação e Redação

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     FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS DE FLORIANÓPOLIS

    CURSO DE DIREITO

    INTERPRETAÇÃO E REDAÇÃO DE TEXTOS

    Profª. Dra. Cláudia A. Rost

    Florianópolis2010/1

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    Disciplina: Interpretação e redação de textosProfª.: Dra. Cláudia A. Rost

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    SUMÁRIO 

    UNIDADE I – A LEITURA ....................................................................................................................... 21 O ATO DE LER .................................................................................................................................... 2

    1.1 A técnica de sublinhar ....................................................................................................................... 22 O TEXTO DE INFORMAÇÃO .............................................................................................................. 33 O TEXTO DE OPINIÃO ........................................................................................................................ 74 INFORMAÇÃO E OPINIÃO .................................................................................................................. 95 LEITURA CRÍTICA ............................................................................................................................. 106 O LUGAR-COMUM ............................................................................................................................ 147 AS INFORMAÇÕES IMPLÍCITAS ...................................................................................................... 168 IDENTIFICAÇÃO DE DIFERENTES TIPOS DE TEXTO TÉCNICO (OFICIAL, COMERCIAL, ACADÊMICO) ........................................................................................................................................ 199 A LEITURA DO TEXTO TÉCNICO-CIENTÍFICO .............................................................................. 1910 FICHAMENTO .................................................................................................................................. 2111 FATORES DE TEXTUALIDADE ...................................................................................................... 2611.1 Coerência ...................................................................................................................................... 26

    11.2.1 A referenciação .......................................................................................................................... 3011.2.2 Progressão referencial ............................................................................................................... 3211.2.3 Articuladores textuais ................................................................................................................. 3311.2.3.1 Operadores argumentativos e suas relações de sentido ........................................................ 3411.3 Intencionalidade ............................................................................................................................ 3911.4 Informatividade .............................................................................................................................. 4011.5 Intertextualidade ............................................................................................................................ 4011.5.1 A palavra dos outros .................................................................................................................. 4011.5.2 Qual a quantidade adequada de citações? ............................................................................... 4111.5.3 Variando as citações .................................................................................................................. 41

    UNIDADE II – A PRODUÇÃO DE TEXTOS ......................................................................................... 4512 AS QUALIDADES DE UM BOM TEXTO: elementos estruturais do texto ....................................... 4512.1 Paralelismo .................................................................................................................................... 4812.2 Repetições..................................................................................................................................... 4912.3 Cacófato ou cacofonia ................................................................................................................... 5013 A ESTRUTURA E O ENCADEAMENTO DOS PARÁGRAFOS ...................................................... 5113.1 Estruturas simples ......................................................................................................................... 5113.2 Estruturas mistas ........................................................................................................................... 5313.3 O parágrafo-chave: 14 formas para você começá-lo .................................................................... 5614 A DISSERTAÇÃO (EXPOSITIVO-ARGUMENTATIVA) .................................................................. 5914.1 Características da dissertação ...................................................................................................... 5914.2 Tipos de argumentos ..................................................................................................................... 5914.3 Conclusão do texto expositivo-argumentativo .............................................................................. 6015 O DISCURSO DISSERTATIVO DE CARÁTER CIENTÍFICO ......................................................... 6116 FORMAS BÁSICAS DE APRESENTAÇÃO DE TEXTOS CIENTÍFICOS ....................................... 6416.1 Resumo ......................................................................................................................................... 6416.1.1 Sumarização: processo essencial para a produção de resumos .............................................. 6516.2 A resenha ...................................................................................................................................... 6717 CUIDADOS NA REDAÇÃO DO TEXTO TÉCNICO-ACADÊMICO .................................................. 71

    UNIDADE III – TÓPICOS ESPECIAIS DE LÍNGUA PADRÃO ESCRITA ........................................... 7318 A nova ortografia da língua portuguesa ........................................................................................... 7319 Vocabulário....................................................................................................................................... 7720 Pontuação ........................................................................................................................................ 8021 Concordância ................................................................................................................................... 8022 Emprego dos pronomes demonstrativos ......................................................................................... 8223 Regência .......................................................................................................................................... 84

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    UNIDADE I – A LEITURA

    1 O ATO DE LER1 

    Embora estejamos no século da informação através da imagem ("uma imagem vale mais quemil palavras"), é inegável a importância e a necessidade da leitura, pois, além de desempenhar suasfunções informativa e recreativa, a transmisssão da História, da Cultura e da Ciência, ainda hoje, faz-se através da linguagem escrita.

    Não basta, porém, ser alfabetizado para fazer da leitura um ato de "crítica”, que envolveconstatação, reflexão e transformação de significados.

     A  leitura não pode ser encarada como simples decodificação de signos, atividade mecânicaque determina uma postura passiva diante do texto. Freire (1985, p.11-12) menciona:

     A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possaprescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendemdinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica napercepção das relações entre o texto e o contexto.

    Uma compreensão crítica do ato de ler leva à "tradução" dos significados das palavras e atéao desenvolvimento do que se oculta "por trás" delas.

     A decodificação da palavra escrita é uma necessidade óbvia, porém constitui a primeira etapado processo da leitura criativa. A decodificação permite a intelecção, ou seja, a percepção doassunto, o significado do que foi lido. Em seguida, faz-se a interpretação, que é a continuidade da"leitura do mundo” realizada pelo leitor. A interpretação, muitas vezes, extrapola a letra do texto, poisse baseia nas relações entre texto e contexto. Na aprendizagem da leitura é muito comum a práticade se oferecer uma interpretação pronta para o aluno; este procedimento habitua à interpretaçãoúnica do texto, que é um obstáculo à leitura criativa.

    Cumpridas as três etapas anteriores, está o leitor apto para empreender todo conteúdo daleitura, de acordo com objetivo que se propôs.

     A técnica de sublinhar é de grande utilidade para a intelecção e interpretação do texto,facilitando o trabalho de resumir, esquematizar ou fichar. Pode-se até afirmar que, sem compreensão

    e interpretação do texto, torna-se impossível empregar com eficiência essas técnicas. A leitura é uma atividade necessária no mundo de hoje e não deve restringir -se às finalidades

    de estudo. É preciso ler para se informar, para participar, para ampliar conhecimentos e alcançar umacompreensão melhor da realidade atual.

    Na opinião de Silva (1983, p.46),optar pela leitura é, então, sair da rotina, é querer participar do mundo criado pela imaginaçãode um determinado escritor. Ler é, basicamente, abrir-se para novos horizontes, é terpossibilidade de experienciar outras alternativas de existência, é concretizar um projeto cons-ciente, fundamentado na vontade individual.

    1.1 A técnica de sublinhar

    Sublinhar é uma técnica empregada com diversos objetivos: assimilar melhor o texto,memorizar, preparar uma revisão rápida do assunto, aplicar em citações e, principalmente, resumir,esquematizar e fichar.

    Para sublinhar é indispensável, antes de tudo, a compreensão do texto, pois este é o únicoprocesso que permite a seleção do que é importante e do que é secundário.

    Identificar, através da compreensão, as idéias centrais do texto é, portanto, condiçãoessencial para sublinhar com eficiência.

    Não existem capítulos ou parágrafos que contenham unicamente idéias mestras. A idéiamestra aparece sempre acompanhada de outras idéias secundárias, expressas por meio deargumentos, exemplos, analogias, que têm a finalidade de esclarecer ou justificar a idéia principal.

    Quando se trata de um texto curto, um capítulo de um livro, um artigo, é recomendávelnumerar os parágrafos antes de sublinhar, para facilitar o trabalho de resumir e fichar.

     A técnica de sublinhar pode ser desenvolvida a partir dos seguintes procedimentos:a) leitura integral do texto, para tomada de contato;b) esclarecimento de dúvidas de vocabulário, termos técnicos e outras:c) releitura do texto, para identificar as idéias principais;

    1 Texto extraído de: ANDRADE, Maria M. de; HENRIQUES, Antonio. Língua Portuguesa: noções básicas para cursossuperiores. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1999.

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    d) sublinhar, em cada parágrafo, as palavras que contêm a idéia-núcleo e os detalhesimportantes;

    e) assinalar com uma linha vertical, à margem do texto, os tópicos mais importantes;f) assinalar, à margem do texto, com um ponto de interrogação, os casos de discordâncias, as

    passagens obscuras, os argumentos discutíveis;

    g) ler o que foi sublinhado para verificar se há sentido;h) reconstruir o texto, tomando as palavras sublinhadas como base.Para se obter   maior funcionalidade das anotações, estas sugestões, evidentemente, podem

    sofrer variações e adaptações pessoais.O indispensável é sublinhar apenas o estritamente necessário, evitando-se anotações que,

    além de causar mau aspecto, em vez de facilitar o trabalho do leitor, dificulta e gera confusão.É muito útil, no final do trabalho, fazer uma leitura comparando-se o texto original com o texto

    sublinhado.

    Exercício 1

    a) No texto abaixo, sublinhe as idéias principais e, em seguida, elabore um resumo:

    12 anos de prisão para homem que matou por causa de brincadeiras jocosas

    O Tribunal do Júri da Comarca da Capital, em sessão realizada na última quinta-feira (30/7),condenou José Carlos Félix à pena de 12 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado, pelohomicídio praticado contra Felipe Jonata da Conceição. O réu foi condenado ainda a um ano dedetenção e 10 dias-multa por porte ilegal de arma de fogo. Segundo os autos, no dia 11 defevereiro de 2002, na rua Sebastião Santos de Oliveira, no bairro Monte Cristo, na Capital, o réufazendo uso de uma arma de fogo, desferiu um disparo contra a vítima, que morreu no local. Paraa acusação, o crime foi por motivo fútil, uma vez que José Carlos se irritou com brincadeiras jocosas que Felipe e seus colegas teriam feito com uma terceira pessoa. O júri foi presidido pelo juiz Yannick Caubet e contou com a participação do promotor de justiça Alceu Rocha, assistentede acusação Luiz Cláudio Fritzen e do advogado Isaac Mattos Pereira, que atuou na defesa doréu. (Autos n.º 023.02.004392-1)

    Notícia publicada em 31/07/2009 e extraída do site do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, disponível em:.

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    2 O TEXTO DE INFORMAÇÃO2

     

    Trata-se de um texto que, embora tenha presença maciça em quase tudo que lemos eouvimos, poucas vezes aparece como referência nas salas de aula: o texto de informação. Embora adefinição não seja muito precisa – afinal, a informação é uma qualidade presente em todo texto –, porora ela nos serve como um primeiro divisor de águas. Podemos dizer simplesmente que o texto deinformação é aquele que tem como objetivo primeiro informar o leitor. Vamos direto a um exemplo:

    2 Texto extraído de: FARACO, Carlos A.; TEZZA, Cristóvão. Prática de texto para estudantes universitários. 9. ed.Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. p. 128-238. [adaptado]

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    Roteiro de leitura

    1. Eis aí um texto básico de informação: tudo que pretende é dar informações ao leitor. O textoé informativo. Mas existirá informação pura? Em algum momento aparece uma opinião?

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    2. Observe a extensão das frases. No caso, isso é uma qualidade? Por quê? _________________________________________________________________________________

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    3. O texto está bem escrito? Por quê? _________________________________________________________________________________

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    Prática de texto

    1. Escreva um texto de dois ou três parágrafos dando informações ao leitor sobre o mapailustrado a seguir. Não esqueça do título!

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    2. Leia o texto abaixo com atenção.

     ATRÁS DOS MUROSPara prevenir o crime, cidadezinha está sendo inteiramente cercada por alambrados

    Rachel Verano, de Iracemápolis

    Iracemápolis é uma pacata cidade de 15 000 habitantes, a 160 quilômetros de São Paulo,que se gaba de contar nos dedos de uma mão o número de presos que cumprem pena: são apenastrês. A violência é coisa tão rara lá que nem chega a dar trabalho para os dezesseis homens doefetivo da Polícia Militar. Em todo este ano, foram registrados apenas sete roubos. Ainda assim,Iracemápolis deixou-se contaminar pelo mesmo pavor que aflige as metrópoles e tomou umaprovidência inusitada para manter a bandidagem longe de suas ruas. Nos próximos meses, será aprimeira cidade inteiramente cercada de que se tem notícia no país. O prefeito Cláudio Consenzaestá tocando uma obra para isolar todo o perímetro urbano das rodovias que margeiam o município.É um alambrado de 2,5 metros de altura construído ao redor de toda a área habitacional, numpercurso de quase 9 quilômetros. "Quero transformar a cidade num grande condomínio fechado", dizConsenza. "Só assim será possível manter a qualidade de vida que temos aqui e evitar futuros

    problemas de segurança."Quando a obra, orçada em 300.000 reais, estiver concluída, no início do próximo ano,

    ninguém entrará ou sairá despercebido de Iracemápolis. As entradas do município receberão portaiscom guaritas de segurança monitoradas por câmaras de vídeo 24 horas por dia, ligadas a umacentral da Polícia Militar. Por enquanto, a cerca ocupa um trecho de 500 metros e divide um bairro declasse média de uma movimentada rodovia, a SP 151. Foi exatamente ali que aconteceu o último emais violento roubo registrado no município, há dois meses. O aposentado José da Silva saía decasa para uma caminhada quando foi surpreendido por dois assaltantes armados que levaram suacaminhonete zero-quilômetro e o fizeram refém por uma hora sob a mira de um revólver. Hoje, acerca passa bem em frente a sua casa. "Estamos bem mais protegidos agora", diz ele.

     A idéia de viver em condomínio fechado está sendo levada a sério pelos moradores. Eles nãodão a mínima importância ao fato de Iracemápolis mais parecer uma cidade medieval murada, umailha separada do mundo real por um alambrado. Alguns hábitos já começaram a mudar no cotidianodas pessoas que vivem do lado de dentro da cerca. Até bem pouco tempo atrás, raramente se viamcrianças nas ruas nas áreas próximas às rodovias. Hoje, os pais deixam que elas brinquemtranqüilamente por ali.

    Veja, ed. 1662

    Vamos considerar duas qualidades básicas de um texto informativo:

    1. Observe que um bom texto de informação se concentra num assunto específico, e tudo notexto deve dizer respeito a ele (ao contrário da linguagem oral, em que costumamos divagar, mudar orumo da conversa, abrir longas interrupções etc.). Assim, um bom texto informativo permite umresumo claro em poucas palavras.

    Vejamos o assunto do texto, empregando 39 palavras:

     A prefeitura de Iracemápolis, interior de São Paulo, está erguendo um alambrado em torno daárea urbana. Quando ficar pronto, ninguém entrará na cidade despercebido. Em toda parte haverácâmaras conectadas à Polícia Militar. Os moradores aprovam o projeto.

    O assunto pode ser resumido de forma mais direta ainda, em uma única oração e apenas 24palavras:

    O assunto do texto é a iniciativa da prefeitura de Iracemápolis, São Paulo, de cercar a cidade porum alambrado para protegê-la da violência.

    Há milhares de resumos possíveis, mas certamente todos apresentarão mais ou menos asinformações acima. Como exercício de síntese, acrescente ao resumo acima o custo do alambrado e

    o fato de que a iniciativa é aprovada pela população - sem ultrapassar 35 palavras. Para maiorclareza, divida o texto em duas orações. _________________________________________________________________________________

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    Você já deve ter percebido este dado interessante: toda informação é uma escolha, isto é, sóDeus pode dizer tudo, ao mesmo tempo, sem limite de espaço e tempo... Informar é, antes de tudo,selecionar.

    2. O segundo aspecto básico de um bom texto de informação é a ordem das informações, a suaseqüência. Isto é, o texto deve apresentar um conjunto de dados de cada vez, que em geral seorganizam em parágrafos. Observe as informações de cada parágrafo:

    1° parágrafo: descrição da cidade (local, número de habitantes, vida pacata), em contraste com oprojeto da prefeitura. Depoimento do prefeito, justificando.

    2° parágrafo: descrição do projeto de segurança; depoimento de José da Silva, aprovando.3° parágrafo: a visão dos moradores e os novos hábitos.

    Como se vê, há uma ordem na apresentação das informações, que dá clareza ao texto.

    3 O TEXTO DE OPINIÃO3 

    Para começar, leia o seguinte texto.

    A Justiça e a vergonha 

    "Jefferson poderia comprar mais de 130 000 kits de queijo, biscoito e desodorante com o dinheiro

    sujo do PT. Mas Jefferson não é Sueli para dormir no xadrez"  André Petry

    Paulo Maluf e seu filho Flávio estão presos, mas não por muito tempo. Afinal, eles não sãoRosimeire Rosa de Jesus. Ela é negra, tem 33 anos e está presa desde 20 de agosto de 2004. Omotivo: tentou roubar uma ducha elétrica de um supermercado, em São Paulo. A ducha custa 19reais. Rosimeire foi condenada a onze meses e vinte dias de cadeia, com um detalhe inacreditável:sem direito a apelar em liberdade. Num país em que assassino, ladrão e traficante podem apelar emliberdade, uma coitada que tenta furtar uma ducha para dar banho quente no filho pequeno tem deficar presa. A isso dá-se o nome de Justiça brasileira.

    Roberto Jefferson perdeu o mandato mas não perderá a liberdade. Quer apostar? Ele botou amão em 4 milhões de reais em dinheiro clandestino, saído do esgoto do PT. Não furtou um queijobranco, dois pacotes de biscoito e bisnagas de desodorante. Sueli da Silva tem 45 anos, é negra e

    está presa desde o dia 30 de junho do ano passado devido à tentativa de furtar essas ninharias numsupermercado, em São Paulo. Sueli foi condenada a um ano e quatro meses de cadeia. Os produtosque tentou furtar custavam, somados, 30 reais. Jefferson poderia comprar mais de 130.000 kits dequeijo, biscoito e desodorante com o dinheiro sujo do PT. Mas Jefferson não é Sueli para dormir noxadrez, ora essa.

    Os deputados do mensalão vão ser cassados, mas não vão passar nem uma semana noxilindró. Rosana Evangelista Santos, 36 anos, negra, cinco filhos, ficou bem mais que uma semanana cadeia. Seu crime: tentou furtar dois pacotes de fraldas descartáveis  –  o preço: 13,80 reais  – numa loja chamada Bebê Alegria. A Pastoral Carcerária suspeita que Rosana seja portadora do vírusHIV. Ela foi presa em março passado e, numa vitória incomum para pretos e pobres, conseguiu odireito de responder o processo em liberdade. Nossa Justiça não é o máximo da generosidade?

    Severino Cavalcanti perderá o cargo, o mandato, mas para a cadeia não vai. Emília Ferreira,23 anos, branca, três filhos, nunca recebeu mensalinho nem mensalão, mas foi presa em 17 de

     janeiro de 2004. O crime: tentativa de furto de um carrinho de bebê e outros produtos infantis. Emília

    3 Texto extraído de: FARACO; TEZZA. Prática de textos para estudantes universitários. Ed. Vozes: Petrópolis/RJ, 2001.[adaptado]

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    cumpriu toda a pena: 21 meses de prisão. Foi libertada na sexta-feira passada. No Brasil, só quem épreto e pobre cumpre pena integral. Em 1992, o então deputado Osvaldo dos Reis Mutran, de Belémdo Pará, matou um fiscal da Receita e pegou dez anos de cadeia. Cumpriu parte da pena e foi solto.Em 2002, quando ainda deveria estar preso pela sentença original, Mutran, homem de famíliariquíssima, matou um menino de 8 anos com um tiro na cabeça, crime do qual  –  pasme, leitor!  – 

    acaba de ser absolvido. Mutran, o assassino, cumpre parte da pena, é solto, mata de novo e saiabsolvido. Emília, a perigosíssima assaltante de produtos infantis, fica na cadeia até o último dia desua pena. Emília era primária. Não tinha antecedentes criminais.

    Maluf, Jefferson, deputados do mensalão e Severino podem ficar tranqüilos que a Justiça nãoos abandonará. Rosimeire, Sueli, Rosana e Emília só contam com a advogada Sonia Drigo, que asdefende gratuitamente em nome de um sonho: o sonho de fazer com que um dia, quem sabe um dia,a Justiça deixe de nos dar vergonha.

    Texto publicado na Revista Veja, edição 1923, de 21 de setembro de 2005, disponível em:.

    Roteiro de leitura

    Como você pôde observar, esse é um texto que podemos classificar, para fins didáticos,como texto de opinião. É claro que o texto de opinião também transmite informações ao leitor - masas informações transmitidas nele estão a serviço da opinião - podem mesmo servir de  provas, emdefesa da opinião defendida.

     A defesa de uma opinião - e todos nós sabemos disso a partir do simples fato de que falar éestabelecer um ponto de vista sobre o mundo pressupõe argumentos ou  provas. Podemos resumiressa questão com um slogan simples: Afirme e sustente!

    No uso diário da linguagem emitimos e enfrentamos opiniões a todo instante, e normalmentesabemos avaliar com bastante clareza o fundamento, ou não, de um argumento apresentado, pelomenos em situações coloquiais, quando o universo discutido nos é familiar. Vejamos, em tópicos,como esse mecanismo funciona na escrita.

    1. Antes de mais nada: qual a tese central defendida pelo texto? _________________________________________________________________________________

     _________________________________________________________________________________2. Que argumentos foram apresentados em defesa dessa tese? Lembre-se: a classificaçãodo que lemos como texto de opinião tem objetivo didático, mas obviamente não é absoluta (ou umtexto de opinião só teria opinião!). O texto de opinião se fundamenta em informações, ou prévias (nãopreciso repetir o que sei que o meu leitor já sabe) ou de apoio (apresento informações que situam oleitor num mundo concreto e informações que servem como provas da tese que defendo).

    Localize, no texto lido, informações de apoio que situam o leitor e informações quecomprovam - ou buscam comprovar - a opinião emitida. _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    3. Os argumentos não existem em estado "puro", isto é, eles normalmente se dirigem a uminterlocutor concreto, que tem lá suas opiniões. Assim, todo texto de opinião bem-sucedido leva emconsideração as opiniões do interlocutor, seja para omiti-Ias (na medida em que enunciar uma con-

    traprova poderia destruir o que se está dizendo), seja para se antecipar a uma possível resposta. Nafala, o interlocutor está diante de nós, e quem já participou de, por exemplo, uma discussão de bar,sabe como é o vaivém argumentativo, mudando de rumo a cada instante de acordo com esta ouaquela resposta. No texto escrito, entretanto, a ausência física do interlocutor exige uma estratégiaespecífica para maior eficácia da tese. No texto lido, em que momento o autor se antecipa a umapossível resposta do leitor?

    4. A quem se dirige o texto que lemos? Antes de responder, releia esta citação de Bakhtin:

    Não pode haver interlocutor abstrato; não teríamos linguagem comum com tal interlocutor, nemno sentido próprio nem no figurado. Se algumas vezes temos a pretensão de pensar e deexprimir-nos urbi et orbi, na realidade é claro que vemos "a cidade e o mundo" através doprisma do meio social concreto que nos engloba.

    Um texto de jornal dirige-se a quem, especificamente? A ninguém em especial, é claro; dirige-

    se, por princípio, a todos os leitores. A qualquer leitor ou a um grupo delimitado de leitores? Ora, éimpossível se dirigir a todas as pessoas ao mesmo tempo - como diz Bakhtin, não teríamos essalinguagem universal. Na verdade, cada palavra que dizemos ou escrevemos revela quem somos e aquem nos dirigimos, concretamente. Os profissionais da palavra - jornalistas, publicitários, por

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    exemplo - sabem muito bem disso: existem textos para jovens, velhos, mulheres, crianças, e, emcada caso, para interesses específicos (econômicos, culturais, esportivos ... ), nível de escolaridade(superior, fundamental...), classe econômica (salário até 200 reais, de 201 a 500 ... ). Enfim: bastaobservar uma banca de jornal e perceber como é multifacetado o universo da palavra escrita.  A cadaum, a sua linguagem - essa parece a regra prática da escrita...

    Pois bem: faça um  perfil do leitor do texto. Como um detetive, descubra pela linguagem dotexto quem é ele. _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    5. O texto de opinião funciona substancialmente estabelecendo relações lógicas. No textoque lemos, há uma incidência significativa dessas palavras . Localize esses elementos de relaçãológica e observe que relações eles estabelecem.

    Por que tais relatores (mas, no entanto, porém, só que... ) são particularmente importantes notexto de opinião? Observe que um bom texto argumentativo sempre apresenta o outro lado, paramelhor fundamentar o  próprio lado. Do mesmo modo, as conclusões aparecem sempre emdecorrência do que se disse antes (assim, desse modo, como vemos, considerando esses fatos, emconseqüência disso...). _________________________________________________________________________________

     _________________________________________________________________________________6. Confira a paragrafação do texto, assinalando as marcas de costura entre um novo

    parágrafo e o anterior. _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    4 INFORMAÇÃO E OPINIÃO4 

    No texto “A justiça e a vergonha”, as noções eram claras, determinadas e formalizadas,indicando um ponto de vista pessoal sobre a questão levantada. Se não concordamos com a tese,isso é uma questão de outra natureza, que exige resposta de outra natureza; do contrário, seríamosobrigados a dizer que há apenas um texto correto no mundo inteiro, aquele que apresenta a nossa

    opinião.Boa parte da escola, de certa forma, pensa assim; e, a julgar pela redação escolar, com o

    agravante de que o texto "correto" seria aquele que, ao repetir um modelo congelado, não expressaopinião alguma.

     A questão central está no fato de que toda opinião transformadora, isto é, que está realmenteimpregnada da vitalidade cotidiana, que está viva, necessita de informação. Como já se disse aqui,não existe "opinião pura" esse tipo de opinião, completa, fechada e definitiva, são os lugares-comuns,os chavões, os clichês da linguagem, os "dogmas" que existem justamente para suprimir opiniões. Aopinião precisa de informação; é esta que abre caminho, fornece argumentos e provas com os quaisestabelecemos nossos pontos de vista.

    Um exemplo simples: para dar uma opinião sobre um livro, temos de lê-Io (a não ser quefaçamos parte dos que dizem "não li e não gostei"...). Melhor ainda, se temos alguma informaçãoadicional sobre o autor. Ainda melhor, se já lemos algum outro livro dele. E mais: se lemos outros

    livros de temática semelhante, que permitam uma comparação, nossa opinião será mais sólida. Emqualquer área do conhecimento acontece assim: dar uma opinião sobre as crises do Oriente Médio,por exemplo, exige que tenhamos alguma informação concreta a respeito, alguns fatos em mente ousimplesmente repetiremos as vozes já congeladas do preconceito do tipo "não gosto de judeu" ou"detesto árabes". Esse "filme" o século XX já viu de sobra...

    Em síntese, podemos dizer que sem informação não há opinião sustentada. Mas comoseparar "texto de informação" de "texto de opinião"? Aqui é preciso considerar especialmente aintencionalidade do texto: há textos que se articulam basicamente como informação, e dentre elesinúmeros subgêneros (informação publicitária, médica, política, esportiva, profissional, jurídica etc.), eoutros que têm a intenção deliberada de opinar, de manifestar um ponto de vista sobre algum fato,idéia, conceito etc. Também aqui se desdobram os subgêneros, do panfleto político distribuído na ruaem época de eleição, ao mais rigoroso ensaio acadêmico publicado em revista especializada. Decerto modo, podemos dizer que a informação é básica, e a opinião é secundária, ou seja, depende da

    informação para existir.

    4 Texto extraído de: FARACO; TEZZA. Prática de textos para estudantes universitários. Ed. Vozes: Petrópolis/RJ, 2001.[adaptado]

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    É preciso resistir, entretanto, ao desejo de engavetar a linguagem em divisões estanques. Navida real, as linguagens e as intenções costumam se alimentar umas às outras.

    Veja esse breve exemplo jornalístico:

    BOLSA-PASSADEIRA

    Sandra Brasil

     Até a semana passada, imaginava-se que o bem-sucedido programa Bolsa-Escola, deBrasília, fosse uma unanimidade. Copiado por dezenas de municípios brasileiros, premiado peloFundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef, e aprovado com elogios pela Organização dasNações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, Unesco, que está levando o projeto para paísesde três continentes, o Bolsa-Escola encontrou seu primeiro adversário em cinco anos de existência: ogovernador Joaquim Roriz, do PMDB. Ele jogou no lixo sua promessa de campanha de ampliar eduplicar o programa social mais aplaudido do país e maior bandeira política de seu antecessor, opetista Cristovam Buarque. O curioso é que Roriz, ao anunciar o enterro do Bolsa-Escola, lançou oseu substituto. Atende pelo nome de Sucesso no Aprender e, em vez de um salário mínimo paraestimular as famílias muito pobres a manter seus filhos na escola, o programa vai distribuir cestabásica, uniforme, mochila, sapato e até meia. "Os programas de garantia de renda mínima são muito

    mais eficientes do que os assistencialistas tradicionais de distribuição de cestas básicas", critica osociólogo argentino Julio Jacobo Waiselfisz, da Unesco.

    "Muitos pais utilizavam o dinheiro para tomar cachaça", justifica Roriz. Ele entregou à suasecretária de Educação, Eurides Brito, a missão de explicar o fim do Bolsa-Escola. Eurides diz tergasto 580.000 reais em pesquisas para avaliar o programa. Não precisava. No Brasília Black Tie, daTV Brasília, exibido no dia 19 de dezembro do ano passado, Eurides Brito já tinha suas conclusõessobre o Bolsa-Escola. Ela disse que no bairro onde mora, o Lago Sul, a área mais nobre de Brasília,pelo menos cinco amigas dela tinham perdido suas passadeiras quando seus filhos começaram areceber o Bolsa-Escola. "Ganhou o peixe, não precisa mais pescar", disse Eurides. Quem sabe,agora, as passadeiras voltem a trabalhar nas casas das amigas de Eurides. O problema é o futuro deseus filhos.

    Para avaliar na prática o limite entre informação e opinião, assinale o que é uma coisa e oque é outra no texto acima. Tudo considerado, trata-se de um texto de opinião ou de informação? E,independentemente dessa distinção, o texto é bom? Por quê? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    5 LEITURA CRÍTICA5 

    Vamos agora ler alguns textos que combinam informação e opinião. Observe que cada umdos textos tem o seu enfoque próprio, a sua própria unidade temática. Alguns são diretamenteopinativos, outros são reportagens que passam ao leitor a opinião de especialistas.

     Assim, qualquer avaliação dos textos deve levar em consideração a sua intencionalidade; porexemplo, não podemos condenar um texto porque ele não fala da influência sobre os adultos, se asua intenção era apenas falar das crianças; ou condenar uma matéria jornalística com intenção sim-plesmente informativa pela falta de uma opinião direta do autor.

    Considere os seguintes aspectos:1. Unidade temática: qual o assunto central do texto?2. Unidade estrutural: o texto tem boa seqüência?3. Destinatário: qual o leitor do texto?4. Informações apresentadas: são confiáveis? O texto apresenta a fonte? A fonte é pertinente

    ou relevante?5.  Opiniões apresentadas, ou teses defendidas (se o texto for diretamente opinativo): são

    convincentes?6. Como recurso argumentativo, o autor se antecipa ao leitor, apresentando pontos de vista

    contrários para rebatê-Ios em seguida? Isso é bom ou mau para a eficiência do texto?7. Às vezes os textos de opinião recorrem ao "argumento da autoridade" para justificar seu

    5 Texto extraído de: FARACO; TEZZA. Prática de textos para estudantes universitários. Ed. Vozes: Petrópolis/RJ, 2001.[adaptado]

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    ponto de vista - por exemplo, citar uma declaração de Pelé num artigo sobre futebol, ou umespecialista famoso na área que se discute. Isso ocorreu em alguns dos textos lidos? A autoridade éconvincente?

    8. Você leu um bom conjunto de textos sobre o mesmo tema. Por eles, dá para dizer qual é aopinião dominante sobre esse assunto, na imprensa? Confira se há uma opinião ou um conceito

    recorrente em todos os textos ou na maioria deles.9. Finalmente: tudo considerado, os textos estão bem escritos? Algum deles chamou

    especialmente a sua atenção por algum aspecto? 

    Texto 1EM ESTADO DE CHOQUE

    Carlos Alberto Di Franco

     A seqüência de crimes brutais praticados por crianças e adolescentes tem deixado apopulação norte-americana em estado de choque. O último capítulo da nova patologia social, o maisassustador de todos, apresentou um impressionante balanço final: 15 mortos e 28 feridos. Enquantoa pequena comunidade de Littleton, um subúrbio da capital do Estado, Denver, tentava compreendero que se passara, em Washington o presidente norte-americano, Bill Clinton, se declarava perplexo

    com o massacre na Columbine High School. Apesar dos esforços das autoridades e dos meios decomunicação para encontrar explicações para o horror, o real motivo do crime era apresentado comoum mistério. Será? O mal existe e, sem dúvida, tem algo de insondável. Mas a crueldade não é frutodo acaso. É o corolário de um silogismo com premissas bem concretas. Violência transmitida, famíliadilacerada e educação acovardada são, estou certo, o combustível que alimenta a paranóia.

    "A chamada Era da Informação", afirma Mark Stein, colaborador da revista britânica TheSpectator, "é, na verdade, uma Era do Entretenimento, em que a violência passou a ser a diversãomais rotineira de todas: na queda acelerada rumo a uma infância virtual, a violência não exige causa,motivação, enredo nem personagens." E conclui: 'Todos os meninos assassinos têm o olhar vago deuma tela vazia de computador."

     Alguns setores do negócio do entretenimento, apoiados na manipulação do conceito deliberdade de expressão, crescem à sombra da exploração das paixões humanas. Ao subestimar ainfluência perniciosa da violência ficcional, omitem uma realidade bem conhecida da psicologia: a

    promoção do sadismo como instrumento de diversão não produz a sublimação da agressividade,antes representa um perigoso incitamento a comportamentos anti-sociais.

     A onipresença de uma televisão pouco responsável e a transformação da Internet numdescontrolado espaço para a manifestação de atividades criminosas Ia pedofilia, o racismo e a ofertade drogas, freqüentemente presentes na clandestinidade de alguns sites, desconhecem fronteiras,ironizam legislações e chegam a ameaçar o Estado de Direito democrático) estão na origem deinúmeros comportamentos patológicos. Barry Krinberg, presidente do Conselho Nacional de Crime eDelinqüência em São Francisco, ao comentar o anterior massacre de estudantes numa escola de Arkansas, foi incisivo ao estabelecer uma relação direta entre violência presenciada na mídia e adelinqüência juvenil subseqüente. "A violência na mídia está provocando a morte de inocentes",afirmou.

    O esgarçamento da família e a desestruturação da educação estão na outra ponta doproblema. "As crianças americanas", salienta Stein no artigo citado, "passam seus primeiros e críticosanos em locais que são pouco mais que miniaturas de campos de refugiados. Se a crescente falangede adolescentes assassinos deste ano deixa algo claro para nós, é o fato de que cada vez mais paisnão conhecem os próprios filhos." Não é difícil imaginar em que ambiente afetivo terão crescido osintegrantes da "máfia da capa preta". Na falta do carinho e da orientação familiar, elementos in-dispensáveis ao bom desenvolvimento da personalidade, as crianças crescem sem referenciaismorais e ficam à mercê da babá eletrônica.

     A crise de autoridade, na família e na escola, está produzindo uma geração perdida eviolenta. A formação do caráter, compatível com um clima de verdadeira liberdade, foi sendosubstituída pela acovardada tolerância que se traduz na crescente incapacidade de dizer não. Oresultado final da pedagogia da concessão está apresentando conseqüências dramáticas. Chegoupara todos a hora de falar claro. É preciso pôr o dedo na chaga e identificar o nexo de causalidadeentre a crise moral e os seus efeitos anti-sociais. "O papa expressa sua esperança de que asociedade americana reagirá a este último ato de violência, comprometendo-se a promover etransmitir a visão moral que pode assegurar o respeito à dignidade inviolável da vida humana." Otelegrama enviado por João Paulo II revela o câncer que ameaça a opulenta sociedade norte-americana: a crise dos valores.

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    Texto 2INFLUÊNCIA DOS JOGOS PERDE PARA A VIOLÊNCIA DA TV

    Omissão familiar, cenas agressivas e o isolamento criado pela Internet ditam comportamento jovem

    Fábio Madrigal Barreto

    Jovens assassinos em escolas norte-americanas, mortes sem motivo, pais apavorados eapenas um suposto culpado: o computador. Jogos como Doom e Quake foram diretamenterelacionados ao recente massacre de Littleton por causa de seu excesso de violência, mas essaacusação não convence especialistas e jogadores. Para os psicólogos, todo esse alarde não é justificado, pela falta de provas, e o grande vilão que influencia o comportamento dos adolescentescontinua sendo a televisão.

    "Não há dados com os quais se possa relacionar essas manifestações violentas com oconteúdo dos jogos de computador ou videogame", diz o psicoterapeuta Haim Grunspüm, queacompanha os efeitos da influência eletrônica nos jovens desde 84. "Os jogos são utilizados comoforma de relaxamento e descarga emocional e não têm tanta força assim." A criação de jogos comoDoom e Quake é dividida entre dois países: Estados Unidos e Japão.

    Segundo Grunspüm, se a influência dos games violentos está diretamente relacionada a

    atitudes descontroladas, deveríamos estar enfrentando uma epidemia deproporções mundiais. "Mas oque estamos vendo é uma série de acontecimentos isolados em pequenas cidades norte-americanas", argumenta.

    "Os jogos são como filmes em que você não pode distrair-se senão perde algo importante",diz o estudante Michel Vale Ferreira, que passou muito tempo matando monstros e alienígenas nastelas de Doam. "É necessário matar o inimigo para chegar ao fim da fase e não por alguma causaracista ou ideológica." Para o jogador Marcus Penna, a matança é divertida pelo entretenimento, masquando fica maçante ele prefere partidas de T etris, por exemplo; Doam é só mais um jogo e não temcondições de deixar alguém acostumado à morte, pois é tudo fictício.

     Aliada à força da televisão, a exposição constante a cenas violentas e a mortes cria umproblema social muito mais grave: a banalização da violência, ou seja, o adolescente passa a encararesse assunto com naturalidade. "Essa é uma das conseqüências mais perigosas da exposiçãofreqüente ao conteúdo indevido tanto da TV quanto da Internet", comenta o psicólogo. Dados de uma

    pesquisa recente de Grunspüm indicam que até os 18 anos um jovem brasileiro assiste a nadamenos do que 200 mil cenas reais violentas na televisão e outras 40 mil fictícias.

    Os computadores têm uma parcela de culpa não em relação ao comportamento violento, masna mudança da estrutura familiar e no processo educacional. "Esta é a primeira geração na históriada humanidade em que os filhos têm vantagens sobre os pais, pois o conhecimento possibilitado pelaInternet supera o dos mais velhos", destaca Grunspüm. A presença do personal computer (PC) emcasa já é responsável por muitas mudanças. "Há menos de uma década, o programa familiarobrigatório era a reunião de todos os membros para assistir a TV num único lugar. Agora, os PCsacabaram com isso, pois estão colocados nos quartos das crianças, o que cria um isolamentoinevitável."

    Para Grunspüm, houve uma renúncia dos pais por motivos que vão desde a falta de tempoaté a dedicação ao trabalho. "O pior problema é que essa omissão ocorre em fases importantes daformação da criança e, quando ela mais precisa, a mãe e o pai não estão presentes para produzir oque chamamos de fidelidade familiar", comenta o especialista. "A ausência da autoridade familiarprovoca outro fenômeno: o aumento da vontade de desafiar os pais."

    "Um dos meios de se evitar essa derrota declarada dos pais é o acompanhamento dos jovensem suas atividades tanto no computador e na Internet quanto na escola", sugere Grunspüm."Enquanto as crianças continuarem a ter seus mundos isolados na tela do computador, os paisestarão perdendo a guerra, pois cabe aos mais velhos questionar as atividades e atitudes dagarotada." O Estado de S. Paulo, 6/6/1999

    Prática de texto

    Você deve ter percebido na análise dos textos anteriores que há uma diferença sutil entre um"bom ponto de vista" e um "bom texto"... Não basta estar com a razão - a boa intenção, por si só, não

    convence! Dominar bem a linguagem escrita é, em grande parte, dominar os recursos argumen-tativos, tanto quando se escreve quanto quando se lê.Um passo importante neste processo é superar a fase das "verdades certas" - da escola, do

    professor... - e perceber que as verdades são construções dinamicamente articuladas, das quais

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    somos parte integrante e ativa. Se elas já estão prontas, então só nos resta, como diz Alcir Pécora,"abandonar qualquer projeto de posicionamento pessoal diante de um tema particular".

    Você acabou de ler vários textos de informação e de opinião sobre a influência que atelevisão exerce sobre os telespectadores. Agora, você deve escrever um texto manifestando a suaopinião sobre o seguinte assunto:

    Justiça proíbe menores de ir a LAN Houses em cidade de SP

    Os jovens de Ilha Solteira, cidade a 650 quilômetros de São Paulo, estão proibidos por decisão judicial de freqüentar LAN Houses no município, mesmo que acompanhado dos pais.

     A decisão foi tomada pelo juiz Fernando Antônio de Lima, da Vara da Infância e Juventude, e impõetambém um toque de recolher na cidade para menores de 18 anos. Quem não é maior de idade, nãopode ficar na rua após as 23 horas sem a companhia de um responsável mais velho.

     A ordem determina ainda que jovens com menos de 16 anos completos não podem frequentar LANhouses em nenhum horário, nem mesmo durante o dia, nem mesmo acompanhado dos pais.

    Em todo o Estado, já existe uma lei que regula o uso de LANs e, entre outras regras, diz que menores

    podem ir a LANs durante o dia, porém com uma autorização por escrito dos pais.Em Ilha Solteira, no entanto, a lei estadual é considerada branda demais. O prefeito do município,Edson Gomes (PP), manifestou apoio público à decisão da Justiça e disse que a Prefeitura tomarámedidas para acolher os jovens com opções de lazer e entretenimento.

     A decisão afetou duramente as LANs da cidade, que ameaçam fechar após ver seu faturamentodesabar.

     A prefeitura local diz que já oferece uma rede Wi-Fi gratuita, o que em tese permite que os jovenscom computador façam suas pesquisas escolares e naveguem na web a partir de casa, sem precisarir a uma LAN.

    Quem não possui um PC, no entanto, ficará com poucas opções para explorar a internet.

     A prefeitura, no entanto, diz que a cidade conta com um telecentro do programa Acessa São Paulo,pago pelo governo do Estado, além de PCs em bibliotecas municipais.

    Nestes locais, o acesso aos computadores é controlado e não é permitido seu uso para jogosviolentos ou visitar a sites eróticos, supostamente nocivos aos jovens.

     A cidade possui 25 mil habitantes e fica na divisa de São Paulo com o Mato Grosso do Sul.

    Esta nota foi publicada por  Augusto Campos em 29/04/2009, no site info.abril.com.br  

    Observe os detalhes que auxiliarão na redação do seu texto:

    1. Você deve pesquisar um conjunto de artigos sobre o assunto. Se quiser, use-os no seutexto, citando opiniões alheias, dados estatísticos, informações concretas. Não esqueça de citar a

    fonte: Segundo notícia no jornal tal ... ou Na opinião de Fulano ... Você pode também escrever umaresposta a algum dos textos lidos acima.

    2.É sempre bom fazer um esquema prévio delimitando o seu ponto de vista e sua seqüênciaargumentativa. Observe a divisão do texto em parágrafos. Não esqueça do título.

    3.Detalhe (muito!) importante: pense no seu leitor. O seu texto pode se destinar ao professordo curso de Direito ou uma seção de opinião de um jornal. Independentemente da opção, pense naunidade temática e estrutural do texto, qualquer que seja o tom da linguagem.

    http://br-linux.org/2009/justica-proibe-menores-de-ir-a-lan-houses-em-cidade-de-sp/http://augustocampos.net/http://info.abril.com.br/noticias/tecnologia-pessoal/justica-proibe-menor-de-ir-a-lan-house-em-sp-27042009-39.shlhttp://info.abril.com.br/noticias/tecnologia-pessoal/justica-proibe-menor-de-ir-a-lan-house-em-sp-27042009-39.shlhttp://info.abril.com.br/noticias/tecnologia-pessoal/justica-proibe-menor-de-ir-a-lan-house-em-sp-27042009-39.shlhttp://info.abril.com.br/noticias/tecnologia-pessoal/justica-proibe-menor-de-ir-a-lan-house-em-sp-27042009-39.shlhttp://augustocampos.net/http://br-linux.org/2009/justica-proibe-menores-de-ir-a-lan-houses-em-cidade-de-sp/

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    6 O LUGAR-COMUM6 

    Devagar se vai ao longe, porque a pressa é inimiga da perfeição e a esperança é a última quemorre. É fato que o brasileiro é preguiçoso por natureza, mas graças a Deus aqui não hápreconceito racial - somos um povo que tem horror à violência; nossa índole pacífica éproverbial no mundo inteiro. Se o Homem tomasse consciência do valor da Paz, não haveria

    mais guerras no mundo - bastava que cada um parasse para pensar na beleza do sorriso deuma criança e descobrisse que mais vale um pássaro na mão do que dois voando. A paciênciaé a mãe das virtudes, mas só com determinação e coragem haveremos de resolver nossosproblemas. O que estraga o Brasil são os políticos; sem eles estaríamos bem melhor, cada umfazendo a sua parte. Hoje em dia, felizmente, as mulheres estão entrando no mercado detrabalho porque, segundo pesquisadores americanos, elas são muito mais caprichosas do queos homens. Já os homens, conforme uma conclusão do conceituado Instituto de Psicologia daFiladélfia, são muito mais desconfiados e estão sempre querendo mais. As pesquisas eleitoraisnunca acertam porque são todas compradas. Mas a verdade é que o amor, quando autêntico,resolve tudo. O que não se pode esquecer jamais é que a esperança existe - e sempre existirá!

    O parágrafo, ou melhor, o conjunto de frases acima - que você deve ter passado os olhoscom a sensação de já tê-Io lido antes algumas centenas de vezes - é uma pálida amostragem damais terrível praga dos textos argumentativos: o lugar-comum, também conhecido como chavão ouclichê. O mal do lugar-comum não está propriamente no fato de ser uma expressão muitas vezes

    usada. Na verdade, todos nós dispomos de frases e expressões que se repetem muitas vezes emcontextos semelhantes - e dentro do jargão profissional (advogados, médicos, publicitários... ) as"frases feitas" podem até ser um instrumental de trabalho, em usos específicos, e não causammaiores danos, mesmo porque a procura da originalidade permanente poderia nos transformar eminsuportáveis pedantes ... Do mesmo modo, quem de nós não usa num momento ou outro um ditopopular para ilustrar ou demonstrar um fato qualquer?

    O que merece reflexão e cuidado é o lugar-comum que aparece justamente para substituir areflexão! No texto escrito, ele normalmente cumpre a função de, ao resolver tudo numa frase feita desabedoria universal e indiscutível, eliminar qualquer necessidade argumentativa. Ora, onde háfumaça há fogo! O lugar-comum, pela sua natureza indiscutível, acomoda todo o processo deconhecimento numa sabedoria que não nos pertence; ela já está pronta, passa de geração ageração, de professor a aluno, de vizinho a vizinho, de texto a texto...

    Esse lugar comum ideológico não é inocente, não é apenas "um erro a mais": se de um ladoserve para preencher as linhas da redação escolar garantindo uma nota razoável, de outro ele acabacorroendo o reconhecimento pessoal das coisas do mundo, que, de chavão em chavão, se reduz auma repetição mecânica das vozes que falam mais alto em nossa volta. O lugar-comum estápresente tanto nas piadas que reforçam preconceitos (contra raça, religião, etnia...), quanto nasafirmações absolutas, completas e "sensatas" sobre os fatos que nos rodeiam. O lugar-comum nãocontesta, não transforma e não cria nada - apenas repete.

    Reconhecendo o lugar-comum

    Saber reconhecer o lugar-comum é a primeira tarefa de quem quer se livrar deles. Não é tãofácil assim, porque o chavão permeia todos os pontos de vista e pode fossilizar mesmo a opiniãomais honesta, sincera e bem intencionada. Não é só de provérbios inofensivos que ele vive; muitasvezes, a argumentação inteira se sustenta sobre conceitos tão genéricos e vagos que se reduzem anada. A face mais evidente deste tipo de generalidade vazia é o uso de entidades como "o Homem","o Mundo", "os Políticos", "o Jovem"... , como se as sociedades fossem todas constituídas de blocosabsolutamente homogêneos. No lugar-comum, esses blocos imaginários em geral se definem porafirmações igualmente absolutas e incontestáveis - e tão confortáveis que acabam sendo repetidas àexaustão...

    Vamos ler um texto que ataca justamente o conforto do lugar-comum, procurando desmontarseus pressupostos. Confira.

    6 Texto extraído de: FARACO; TEZZA. Prática de textos para estudantes universitários. Ed. Vozes: Petrópolis/RJ, 2001.[adaptado]

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    O CONTO DA CRISE MORALElio Gaspari

    Rouba-se de tudo, do dinheiro do contribuinte ao tênis da garotada, mas a sociedadebrasileira deve tomar cuidado: estão lhe roubando a auto-estima.

    Três exemplos:1 - O Brasil passa por uma crise moral e por um processo de corrupção generalizada.2 - Brasileiro não gosta de pagar imposto. 3 - O Brasil não tem jeito.Tudo mentira.Ponha-se o responsável por uma afirmação desse tipo na saída dos ônibus que transportam

    a cada manhã milhões de trabalhadores e procure um degenerado moral. Procure nas plataformasdos trens um só brasileiro que tenha acordado às 5 da manhã para ir roubar. Os espertalhões que sófalam em corrupção olhando para baixo que percorram as fábricas e os escritórios. Digam se neleshá ladrões. Digam mesmo se há neles pessoas moralmente inconfiáveis.

    Escarafunche-se o orçamento dos trabalhadores e resultará que eles pagam 100% dosimpostos que devem ao Erário. Pagam o ICM do feijão antes mesmo de comê-Io. Pagam assobretaxas de luz, água e telefone com pontualidade de condenado.

    O Brasil não passa por crise moral alguma. O trabalhador não é ladrão, muito menos

    dissoluto. A crise moral está localizada num setor estrito da sociedade, localizado na parte de cima dapirâmide. Entendido isso, talvez o tubaronato nacional perceba o tamanho da encrenca em que sevem metendo.

    O Brasil não é um país maldito, acometido de defeito genético ou fatalidade geopolítica que ocondene ao atraso. Só no Brasil além dos Estados Unidos), um cidadão pode viajar 5.000quilômetros, comprar um jornal, procurar emprego e casa, tudo isso sem dar satisfação a ninguém. Acada dez anos a população de uma cidade do tamanho de Budapeste muda-se para a capital de SãoPaulo, e essa migração é absorvida como parte do processo histórico nacional. Nada a ver com oracismo das leis inglesas, as quadrilhas de delinqüentes xenófobos alemãs ou os bufões da políticafrancesa. Tente-se semelhante generosidade na Europa e terá começado mais uma vez aquilo queos romanos chamaram invasão dos bárbaros. O chanceler alemão Helmut Kohl estranhou quehouvesse tanta gente na praia do Rio de Janeiro num dia de trabalho. Havia gente matando o serviço,mas não havia em Copacabana ninguém batendo em turcos ou apedrejando ciganos. Os brasileiros

    vão à praia e os alemães sonham em conquistar a Europa. Se Macunaíma tivesse levado o kaiserGuilherme II e o chanceler Adolf Hitler para Búzios, haveria estátuas a esse herói sem caráter emtodas as cidades da Alemanha.

     A auto-estima dos brasileiros está sendo roubada através de uma mistificação pela qual setransferem à sociedade culpas do Estado e do governo, seu preposto. Circula, por exemplo, umaobsessão segundo a qual é preciso combater a corrupção. A corrupção, como o mau hálito, nãoacabará nunca. O que se precisa fazer é encarcerar os corruptos. A moralidade de um governomede-se pelo total do dinheiro que nele se rouba dividido pelo número de anos de cadeia impostosaos gatunos. Se o denominador dessa fração é praticamente nulo - por culpa do poder público, nãoda sociedade -, a corrupção ganhou. Quem incomoda não é o dinheiro roubado, é o ladrão solto. Acassação do deputado Jabes Rabelo mostra que não faltam ao Estado os mecanismos de defesa demoralidade. O que falta é usá-Ios. Afinal, quem precisa de uma sociedade convencida de que o povonão presta e de que o país não tem jeito são aqueles que pretendem saqueá-Ia.

    Veja, ed. 1208, p. 21.

    1. Antes de mais nada: com que objetivo foi escrito esse texto? _________________________________________________________________________________

    2.Observe a paragrafação do início do texto. Ela parece contrariar as "boas regras" da divisãoem parágrafos. Por que o autor usa frases avulsas como parágrafos independentes? O recurso éeficiente para o objetivo que ele quer atingir? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    3. O texto procura desmontar o raciocínio de três generalizações muito comuns no Brasil dehoje. Qual o argumento central que ele usa? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    4. "Havia gente matando o serviço, mas não havia em Copacabana ninguém batendo emturcos ou apedrejando ciganos." O chanceler alemão poderia contra-argumentar dizendo quecertamente havia algum esquadrão da morte matando crianças pobres na Baixada Fluminense, como

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    ocorre quase que diariamente. O argumento do autor é uma "patriotada" ou essa questão não vinhaao caso? Pense a respeito. (Lembrete: todo bom texto delimita a sua temática; caso contrário,teríamos de desenvolver tratados sobre tudo cada vez que escrevêssemos! O que cabe pensar é seo assunto esquadrão da morte tem a ver com o conjunto do texto.) _________________________________________________________________________________

     _________________________________________________________________________________5. Você deve ter observado que o texto lido emprega uma linguagem agressiva - em outras

    palavras, não faz "média". Vai direto ao assunto, até com um certo toque de indignação. O recurso foieficiente ou o autor exagerou na dose? (Mais um lembrete: o perigo do texto mais agressivo é alinguagem simplesmente "panfletária", cheia de fúria mas com pouca consistência argumentativa.Dizemos "perigo" pelo simples fato de que muitas vezes textos assim não convencem - o exagerocrítico, sem amparo de argumentos, parece só servir àqueles que já pensam como o autor. .. ) _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    6. Você concorda com a tese do autor? (Último lembrete: não somos obrigados a concordarcom tudo ou discordar de tudo!) _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    Vamos agora exercitar nosso reconhecimento do lugar-comum. Escolha um dos chavões queaparecem no primeiro parágrafo deste capítulo e o associe a algum tema de argumentação. Algunsexemplos:

    devagar se vai ao longe X combate da inflação; ouíndole pacífica do povo brasileiro X índices de criminalidade; ouo que estraga o Brasil são os políticos X ditadura militar etc.

    Há milhares de possibilidades! É até possível que o seu texto confirme um lugar-comum,desde que ele apareça dentro de uma situação concreta... A opinião é sua!

    Procure delimitar o assunto do seu texto. E escolha o tom da linguagem: ironia, humorescrachado, indignação ou mesmo a argumentação mais fria. O importante é manter a unidade detema e de linguagem.

    7 AS INFORMAÇÕES IMPLÍCITAS7 

    Observe a seguinte frase:

    Fiz faculdade, mas aprendi algumas coisas.

    Nela o falante transmite duas informações de maneira explícita:a) que ele freqüentou um curso superior;b) que ele aprendeu algumas coisas.

     Ao ligar essas duas informações com um “mas” comunica também de modo implícito suacrítica ao sistema de ensino superior, pois a frase passa a transmitir a idéia de que nas faculdadesnão se aprende nada.

    Um dos aspectos mais intrigantes da leitura de um texto é a verificação de que ele pode dizercoisas que parece não estar dizendo: além das informações explicitamente enunciadas, existemoutras que ficam subentendidas ou pressupostas. Para realizar uma leitura eficiente, o leitor devecaptar tanto os dados explícitos quanto os implícitos.

    Leitor perspicaz é aquele que consegue ler nas entrelinhas. Caso contrário, ele pode passarpor cima de significados importantes e decisivos ou  – o que é pior – pode concordar com coisas querejeitaria se as percebesse.

    Não é preciso dizer que alguns tipos de texto exploram, com malícia e com intençõesfalaciosas, esses aspectos subentendidos e pressupostos.

    Que são pressupostos? São aquelas idéias não expressas de maneira explícita, mas que o

    leitor pode perceber a partir de certas palavras ou expressões contidas na frase.

    7 Texto extraído de: FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. São Paulo: Ática, 1997. p.241-249.

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     Assim, quando se diz “O tempo continua chuvoso”, comunica-se de maneira explícita que nomomento da fala o tempo é de chuva, mas, ao mesmo tempo, o verbo “continuar” deixa perceber ainformação implícita de que antes o tempo já estava chuvoso.

    Na frase “Pedro deixou de fumar” diz-se explicitamente que, no momento da fala, Pedro nãofuma. O verbo “deixar”, todavia, transmite a informação implícita de que Pedro fumava antes. 

     A informação explícita pode ser questionada pelo ouvinte, que pode ou não concordar comela. Os pressupostos, no entanto, têm que ser verdadeiros ou pelo menos admitidos comoverdadeiros, porque é a partir deles que se constroem as informações explícitas. Se o pressuposto éfalso, a informação não tem cabimento. No exemplo acima, se Pedro não fumava antes, não temcabimento afirmar que ele deixou de fumar.

    Na leitura e interpretação de um texto, é muito importante detectar os pressupostos, pois seuuso é um dos recursos argumentativos utilizados com vistas a levar o ouvinte ou o leitor a aceitar oque está sendo comunicado. Ao introduzir uma idéia sob a forma de pressuposto, o falantetransforma o ouvinte em cúmplice, uma vez que essa idéia não é posta em discussão e todos osargumentos subseqüentes só contribuem para confirmá-la.

    Por isso pode-se dizer que o pressuposto aprisiona o ouvinte ao sistema de pensamentomontado pelo falante.

     A demonstração disso pode ser encontrada em muitas dessas “verdades” incontestáveis

    postas como base de muitas alegações do discurso político.Tomemos como exemplo a seguinte frase:

    É preciso construir mísseis nucleares para defender o Ocidente de um ataque soviético.

    O conteúdo explícito afirma:- a necessidade de construção de mísseis;- com a finalidade de defesa contra o ataque soviético.

    O  pressuposto, isto é, o dado que não se põe em discussão é: os soviéticos pretendematacar o Ocidente.

    Os argumentos contra o que foi informado explicitamente nessa frase podem ser:- os mísseis não são eficientes para conter o ataque soviético;

    - uma guerra de mísseis vai destruir o mundo inteiro e não apenas os soviéticos;- a negociação com os soviéticos é o único meio de dissuadi-los de um ataque ao Ocidente.

    Como se pode notar, os argumentos são contrários ao que está dito explicitamente, mastodos eles confirmam o  pressuposto, isto é, todos os argumentos aceitam que os soviéticos pretendem atacar o Ocidente.

     A aceitação do pressuposto é o que permite levar à frente o debate. Se o ouvinte disser queos soviéticos não têm intenção nenhuma de atacar o Ocidente, estará negando o pressupostolançado pelo falante e então a possibilidade de diálogo fica comprometida irreparavelmente. Qualquerargumento entre os citados não teria nenhuma razão de ser. Isso quer dizer que, com pressupostosdistintos, não é possível o diálogo ou não tem ele sentido algum. Pode-se contornar esse problematornando os pressupostos afirmações explícitas, que então podem ser discutidas.

    Os pressupostos são marcados, nas frases, por meio de vários indicadores lingüísticos,

    como, por exemplo:

    a) certos advérbios Os resultados da pesquisa ainda não chegaram até nós.Pressuposto: Os resultados já deviam ter chegado.

    ouOs resultados vão chegar mais tarde.

    b) certos verbosO caso do contrabando tornou-se público.Pressuposto: O caso não era público antes.

    c) as orações adjetivasOs candidatos a prefeito, que só querem defender seus interesses, não pensam no povo.Pressuposto: Todos os candidatos a prefeito têm interesses individuais.Mas a mesma frase poderia ser redigida assim:

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    Os candidatos a prefeito que só querem defender seus interesses não pensam no povo.No caso, o pressuposto seria outro: Nem todos os candidatos a prefeito têm interesses individuais.

    No primeiro caso, a oração é explicativa; no segundo, é restritiva. As explicativas pressupõemque o que elas expressam refere-se a todos os elementos de um dado conjunto; as restritivas, que oque elas dizem concerne a parte dos elementos de um dado conjunto.

    d) os adjetivosOs partidos radicais acabarão com a democracia no Brasil.Pressuposto: Existem partidos radicais no Brasil.

    Exercícios

    1. Identifique os pressupostos no conjunto de sentenças abaixo e diga qual é o elemento lingüísticoque o introduz.a. “O acusado lamentou ter bebido muito.” 

     _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    b. “João conseguiu abrir a porta.”  _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    c. “Maria desmaiou depois de encontrar o assassino.”  _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    d. O Ministro da Justiça apareceu de novo em Santa Catarina. _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    2. Observe as duas passagens que seguem:

    a) Os brasileiros, que são otimistas, creem na Justiça.

    b) Os brasileiros que são otimistas creem na Justiça. A oração adjetiva (que são otimistas) implica os mesmos pressupostos em ambas as

    passagens? Explique por quê. _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    3. Responda qual é o pressuposto que está por trás do diálogo abaixo: A: Estou procurando alguém para consertar meu carro.B: Meu irmão está em casa. A: Mas ele está sempre tão ocupado!

     _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________

    4. Para construir o humor, Jô Soares faz, no texto abaixo, uso do vocabulário médico em sentido

    conotativo. Leia com atenção:

    SALARIOSE ESPONTÂNEA  –  s.f. Micróbio insidioso que aparece de tempo emtempo, contamina uma parte dos parlamentares e faz com que eles aumentem, porsua própria iniciativa, os seus salários. O que mais impressiona neste micróbio é queele faz com que os deputados atingidos percam completamente a perspectiva evotem o assunto nos momentos mais inoportunos. Como na maioria dos casos dasmoléstias médico-políticas, o micróbio é incontrolável.

    a) Identifique os termos que, em seu sentido denotativo, fazem parte da medicina. _________________________________________________________________________________b) Qual a intenção do humorista ao utilizá-los em seu sentido conotativo? _________________________________________________________________________________

    5. Dê exemplos de pressupostos que ocorrem no dia a dia do profissional da área do Direito. _________________________________________________________________________________ 

     _________________________________________________________________________________

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    8 IDENTIFICAÇÃO DE DIFERENTES TIPOS DE TEXTO TÉCNICO (OFICIAL, COMERCIAL,ACADÊMICO)8 

     A necessidade de comunicação de diferentes conteúdos culturais leva a formas diversas

    de expressão escrita. Podem-se distinguir três grandes grupos de textos escritos, produzidospor diferentes técnicas de redação: literários; oficiais e comerciais; científicos.

     As formas literárias têm objetivo artístico. Não são apenas transmissão depensamentos, mas o exercício da arte da palavra. Mais do que expressar a realidade, o objetivodo texto literário é a recriação, a interpretação da realidade pelo artista. São formas literáriasaquelas simples como a anedota, a fábula, a saga ou lenda, ou, aquelas mais complexas comoo conto, a crônica, a novela, o romance, o poema.

     As formas oficiais e comerciais são textos produzidos com o objetivo de estabelecercomunicação formal e documentada em ambientes de trabalho. São tipos comuns de textooficial e comercial o memorando, o ofício, o aviso, o requerimento, o parecer, o memorial, aordem de serviço, a carta comercial.

     As formas de textos científicos têm preocupação central com a correção, a exatidão e aautenticidade dos dados e dos raciocínios desenvolvidos. Escrever textos científicos é, antes

    de tudo, "comunicar corretamente dados corretos". Daí a importância do rigor na utilização detécnicas e métodos de pesquisa e produção de textos científicos.

     A natureza do fato/fenômeno estudado, os procedimentos utilizados, as fontes, aintenção do pesquisador ou a exigência de uma instituição ou disciplina, determinam formasdiferentes de apresentação escrita dos resultados oriundos da investigação científica. Osformatos e denominações variam de acordo com as intenções mesmas ou exigênciasacadêmicas. São mais ou menos complexas e expressam a autonomia intelectual de quem osescreve.

    9 A LEITURA DO TEXTO TÉCNICO-CIENTÍFICO9 

     A leitura do texto técnico é, pois, diferente da leitura do texto de literatura geral.Primeiramente, nos textos técnicos, nunca se devem dispensar informações gerais a respeito daquiloque se vai ler. Examine-se sempre parte do material pré-textual (capa, folha de rosto) e pós-textual(orelhas, contracapa), para uma noção a respeito de autoria e data da publicação das informações. Aquilo que está escrito, afinal, não vale por si só. Há que se ver, ao menos, por quem e quando.

    Divisão: O próximo passo é tomar conhecimento da divisão lógica do texto, resultante dasistematização dos dados. A divisão lógica é normalmente pré-organizada, e aparece na divisãográfica. As partes do assunto tratado são indicadas graficamente por títulos e subtítulos. Se o material já possui um sumário (que é o esquema lógico do texto), este é o primeiro item a ser estudado. Se,porém, o material não apresentar sumário pronto (um artigo, um capítulo isolado de livro etc.), o leitordeve fazê-Io. Folheia-se a texto, reconhecendo as diversas partes indicadas pelos títulos e subtítulos,criando/complementando, ao mesmo tempo, a identificação alfa-numérica. Cria-se, então, o sumário,utilizando-se das porções alfa-numeradas do texto.

    O que se pretende descobrir neste exame é a estrutura lógica do texto, isto é, as partes quecompõem o texto; quais são as partes que se complementam; quais partes se seqüenciam.Normalmente, e não necessariamente, os textos contêm indicações alfanuméricas que indicam aseqüência e a pertença (quais conjuntos menores "pertencem" a conjuntos maiores de idéias) dossegmentos de texto. Na ausência de alfa-numeração, atente-se para os tipos gráficos dos títulos esubtítulos. Títulos "irmãos" (seqüência) têm o mesmo tipo gráfico. Cuide-se também da utilização dasseqüências de números e de letras em sistema único. Por exemplo, se um subtítulo for marcadocomo I, o subtítulo seqüente deverá ser 11 (nunca B, b etc.).

    O estudo atento dos índices produz dois efeitos benéficos. Primeiro, a sensação defamiliaridade com o assunto, mesmo sem tê-Io, de fato, lido. Segundo, a facilitação da escolha daunidade de leitura que interessa trabalhar, já que todos os segmentos estarão diante do leitor,designados por um título indicativo de conteúdo.

    Análise textual: Escolhida uma unidade de leitura, a próxima etapa é a superação debarreiras lingüístico-culturais que o texto possa apresentar. Como se sabe, os fatos/dados são

    8 Texto extraído de: SANTOS, Antonio R. Metodologia científica: a construção do conhecimento. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.p.33-34.9 Texto extraído de: SANTOS, Antonio R. Metodologia científica: a construção do conhecimento. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.p.82-89.

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    representados por signos. No texto técnico escrito há fatos não corriqueiros, representados porpalavras cujas significações nem sempre são familiares.

    Esta é a função da análise textual: a descoberta e o aprendizado dos termos que apontam osfatos da ciência com que se está lidando, aliás condição essencial para a construção/entendimentode argumentos/idéias. Quando se faz necessária, é uma atividade essencial.

    Na prática, é a primeira leitura que se faz da unidade escolhida. É uma leitura rápida, na qualo único objetivo é anotar as palavras desconhecidas que o texto apresentar. Não se deve grifar oudestacar nada, ainda. Sugere-se a anotação no próprio texto (se tal for permitido, é claro), no inícioou no final da linha onde se encontre o termo desconhecido. Ao final desta coleta, procure-se resolveros termos desconhecidos, utilizando-se de dicionários, enciclopédias, professores, colegas ouqualquer outro meio disponível.

     A análise textual pretende ser uma etapa provisória da leitura. Considere-se que os termosque indicam os fatos particulares contemplados por certa ciência são de número bastante limitado,isto é, constituem um percentual bastante reduzido do conjunto de palavras em uso em uma língua.Se gradualmente resolvida, a leitura de textos relativos a certa ciência apresentará um volume cadavez menor de barreiras lingüístico-culturais. Além disso, aumenta consideravelmente o domínio doleitor em relação a essa ciência...

    Análise temática: Quando não há mais barreiras lingüístico-culturais no texto, procura-se

    entender as idéias apresentadas pelo autor, expressas nas frases que compõem o texto: é a análisetemática. Pode-se dizer que cada frase encerra uma idéia completa.

     As idéias que compõem um texto agrupam-se em parágrafos. O parágrafo é a menor porçãoautônoma de um texto e, portanto, a menor unidade de leitura. Nos parágrafos de um textoencontram-se dois tipos de idéias: idéia principal e idéia(s) secundária(s). Ler e entender um textoconsiste, a princípio, em entender o conjunto de suas idéias principais.

    Idéias principais são encontradas uma em cada parágrafo. São as "idéias importantes" que oautor resolveu transmitir. As idéias principais visam alargar o conhecimento do assunto anunciadopelo título. Foram previamente escolhidas e seqüenciadas pelo autor, em função de um objetivo(expresso pelos títulos/ subtítulos), de forma que o conjunto de parágrafos, derivado dessas idéias,forma uma seqüência lógica, uma unidade. O entendimento do texto resolve-se, portanto, no estudode cada um de seus parágrafos.

    Reconhecer a idéia principal de um parágrafo é tarefa relativamente fácil.

    No parágrafo, a idéia principal é expressa pela frase em função da qual estão escritas asoutras frases que o compõem. Ou seja, as idéias secundárias são escritas "ao redor" de uma idéiaprincipal. A função das idéias secundárias é melhorar o entendimento da idéia principal. Elasexplicam, exemplificam, esclarecem, a idéia principal. Pense-se num sistema planetário, com um solno centro e planetas "em função" do sol... Sugere-se, além disso, na procura pela idéia principal,especial atenção à primeira frase dos parágrafos: quase sempre já expressa a idéia principal. Se nãoestiver ali, observe-se a última frase do parágrafo. Em outros termos, preste-se especial atenção àsextremidades dos parágrafos.

    De início, é a idéia principal de cada parágrafo, a frase inteira, que se deve destacar, grifar.Com certa prática, é possível destacar também informações-chave de idéias secundárias. Ainformação-chave é o conjunto sintático de maior peso em uma frase, isto é, a informação maisimportante de certa frase. Por exemplo, ao dizer "Pedro foi a Curitiba de carro ontem", nota-se que oconjunto de sete palavras (morfologia) transmite cinco informações (sintaxe):

    Pedro/ foi/ a Curitiba/ de carro/ ontem. O mesmo conjunto de palavras pode ter comoinformação-chave qualquer dos cinco conjuntos sintáticos. No texto falado, alterações na velocidadee/ou intensidade da voz indicarão para o ouvinte a informação-chave. O texto escrito, depende-se docontexto. Ou seja, idéias secundárias recebem contexto da idéia principal. Idéias principais, por seuturno, recebem contexto dos títulos identificadores do conteúdo dos parágrafos.

     A leitura do texto técnico se faz, portanto: Considerando a seqüência lógica do texto (divisão); Resolvendo os elementos desconhecidos, as barreiras lingüístico-culturais (análise textual); Entendendo as idéias principais do autor (análise temática). Anotar é recolher por escrito os elementos de interesse resultantes do desenvolvimento de

    um dos procedimentos.No caso do procedimento bibliográfico, anotar pode ser apenas recolher as idéias importantes

    do autor. O resumo é uma boa forma de anotação para armazenagem. Resumir é redigir, como textoúnico, as idéias principais de um autor, guardando a seqüência original das idéias. Redigir apenas asinformações-chave das idéias principais e das idéias secundárias, dando-Ihes formato gráfico hierar-quizado, é montar um esquema.

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     Além destes formatos simples, resumos e esquemas podem ser interpretativos ou críticos.Interpretativos são os esquemas e resumos que recebem a adição de elementos complementares,correlatos ao texto, já conhecidos do leitor. Críticos são os resumos e esquemas que, além da adiçãode outros elementos, recebem avaliações do leitor. Isto é, o leitor tece comentários a respeito daclareza, propriedade e validade das idéias apresentadas pelo autor, confrontando o autor com idéias

    próprias. A anotação com finalidade de redação posterior de um texto próprio, como é o caso da

    anotação que se faz em pesquisas, deve ser feita em função dos objetivos específicos dainvestigação.

    No caso da coleta bibliográfica, a preocupação não é mais entender o texto (idéias principais).Supõe-se o texto já entendido. Anotam-se todas as idéias principais/ secundárias que, de qualquerforma, poderão ajudar o desenvolvimento (e posterior redação) dos raciocínios previstos nosobjetivos específicos. A presença clara do objetivo específico para o qual se estão anotandoinformações é o que dirige e limita a coleta, mantendo-a apenas em torno de informaçõesnecessárias. Embora muitos elementos de um texto possam ser interessantes, registra-se apenas onecessário, segundo o objetivo.

    Para anotar com vistas à posterior redação, sugerem-se alguns cuidados básicos: Ter sempre o objetivo específico em questão escrito no alto da folha de anotações; Identificar a fonte de forma a facilitar o retorno a ela, se necessário; Identificar a(s) página(s) de onde se extraiu o texto;  Anotar como resumo, esque