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1 UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO VEZ DO MESTRE APRENDER BRINCANDO CRISTIANE MARQUES DA SILVA Prof. Ms. ANA CRISTINA GUIMARÃES RIO DE JANEIRO 2005

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1 UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO VEZ DO MESTRE

APRENDER BRINCANDO

CRISTIANE MARQUES DA SILVA

Prof. Ms. ANA CRISTINA GUIMARÃES

RIO DE JANEIRO

2005

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2 UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO VEZ DO MESTRE

APRENDER BRINCANDO

OBJETIVO:

Apresentação da Monografia à Universidade Cândido Mendes como condição prévia para conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Psicopedagogia. Por Cristiane Marques da Silva.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, Por sua presença em minha vida.

Aos meus pais,

Por todo apoio e dedicação.

Aos Meus Familiares e Amigos, Pela paciência e compreensão.

A Prof. Ms. Ana Cristina Guimarães,

Pela orientação e colaboração.

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DEDICATÓRIA

Ao Anderson, Meu Amado Esposo.

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RESUMO

A aprendizagem é um processo complexo que se realiza no interior do

indivíduo e se manifesta em uma mudança de comportamento. A criança que

começa na escola traz consigo invariavelmente as características de seu aspecto

biológico, psicológico e social. Desta forma, as Dificuldades de Aprendizagem

devem ser estudadas considerando as alterações e os distúrbios em qualquer um

destes aspectos.

No Brasil, o contexto educacional traz a marca de um fracasso histórico,

principalmente nas classes sociais menos favorecidas. A Psicopedagogia insere-

se neste contexto como mais um campo de conhecimento na busca da redução

deste quadro de fracasso, já que seu objeto de estudo é o aprender e o não-

aprender.

O objetivo da Psicopedagogia Institucional é a prevenção do fracasso e das

dificuldades escolares. Já a Psicopedagogia Clínica entra em campo quando o

sintoma da dificuldade de aprendizagem já está instalado, sendo necessário o

diagnóstico e a intervenção. As atividades lúdicas são utilizadas nestas duas

etapas que, na prática, são indissossiáveis.

Segundo Freud (1920), a brincadeira das crianças é uma das primeiras

atividades normais do aparelho mental. A substituição de um objeto originário, cuja

perda é temida e lamentada, por outros mais numerosos e substituíveis, a

distribuição de sentimentos em múltiplos objetos e a elaboração de sentimentos de

perda através da experiência e recuperação, constituem as bases da atividade

lúdica e da capacidade de transferir afetos para o mundo externo.

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6 Para Piaget (1990), o jogo é essencial na vida da criança, pois constitui-se

em expressão e condição para o desenvolvimento infantil, já que as crianças

quando jogam assimilam e podem transformar a realidade. A atividade lúdica é o

berço obrigatório das atividades intelectuais da criança sendo, por isso,

indispensável à prática educativa.

É através do brincar que a criança constrói sua aprendizagem acerca do

mundo em que vive, da cultura em que está inserida. Os jogos possibilitam à

criança aprender de forma prazerosa, num contexto desvinculado da situação de

aprendizagem formal.

A criança que tem seus primeiros contatos com a aprendizagem de forma

lúdica, provavelmente vai ter a chance de desenvolver um vínculo mais positivo

com a educação formal, vai estar mais fortalecida para lidar com os medos e

frustrações inerentes ao processo de aprender.

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7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO I 08

AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 08

CAPÍTULO II 20

O BRINCAR 20

CAPÍTULO III 28

AS ATIVIDADES LÚDICAS 28

CONCLUSÃO 40

REFERÊNCIAS 42

ÍNDICE 44

FOLHA DE AVALIAÇÃO 45

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8

INTRODUÇÃO

A utilização de atividades lúdicas para fins terapêuticos apesar de não ser

nenhuma novidade e de tratar-se de um tema atual e bastante explorado na

prática, verifica-se a pouca bibliografia existente sobre o assunto, o que leva à

falta de conhecimento sobre seus objetivos e finalidades, gerando o uso limitado

de tais recursos.

Por este motivo, torna-se necessário um conhecimento mais aprofundado

sobre o tema, com o objetivo de proporcionar ao profissional de Psicopedagogia,

que utiliza tais recursos no trabalho com crianças com dificuldades de

aprendizagem, a compreensão da necessidade de sua utilização para

determinação diagnóstica e posterior intervenção, explorando-o ao máximo e com

plena conscientização de sua utilidade.

Para alcançar tal objetivo, no Primeiro Capítulo busca-se elucidar as

Dificuldades de Aprendizagem. No Segundo Capítulo, verifica-se a visão de Freud

e Piaget sobre o brincar, já que a história da Psicopedagogia tem fundamentação

teórica na Psicanálise e no Construtivismo. Com isso, no Terceiro Capítulo foi

introduzida a utilização das atividades lúdicas nas dificuldades de aprendizagem

com sua devida finalidade no diagnóstico e intervenção.

Espera-se com esta pesquisa trazer maiores contribuições à prática

psicopedagógica, tornando-a mais rica e eficaz e oferecendo aos profissionais um

maior conhecimento científico acerca da utilização plena e consciente de todos os

recursos lúdicos disponíveis.

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9

CAPÍTULO I

AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

“O homem não aprende apenas com

sua inteligência, mas com seu corpo e

suas vísceras, sua sensibilidade e

imaginação”.

(Paulo Freire)

Para se reconhecer em uma criança a dificuldade de aprendizagem se faz

necessário primeiramente entender o que é aprendizagem e quais os fatores que

nela interferem.

Segundo Mazarakins (apud. BALLONE, 2003), pode-se dizer que a

aprendizagem é um processo complexo que se realiza no interior do indivíduo e se

manifesta em uma mudança de comportamento.

Para se estabelecer se houve ou não aprendizagem é preciso que as

mudanças ocorridas sejam relativamente permanentes. Existem pelo menos sete

fatores fundamentais para que tal aprendizagem se efetive, são eles: saúde física

e mental, motivação, prévio domínio, maturação, inteligência, concentração ou

atenção e memória. A falta de um desses fatores pode ser a causa de insucessos

e das dificuldades de aprendizagem que irão surgindo.

Desta forma, pode-se entender que uma criança é dita com Dificuldades de

Aprendizagem, quando apresenta desvios da expectativa de comportamento do

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10 grupo etário a que pertence, ou seja, quando ela não está ajustada aos padrões

da maioria desse grupo e, portanto, seu comportamento é diferente dos demais.

Segundo Ballone (2003), a criança que começa na escola traz consigo

invariavelmente as características de seu aspecto biológico, psicológico e social.

Desta forma, as Dificuldades de Aprendizagem devem ser estudadas

considerando as alterações e os distúrbios em qualquer um destes aspectos.

O autor ressalta que ainda não existe uma definição consensual acerca dos

critérios e nem mesmo do termo Dificuldade de Aprendizagem, mas considera

parcialmente sensata a definição da Lei Pública Americana, P.L. 94 - 142, que

expressa:

"Dificuldade de aprendizagem específica significa uma

perturbação em um ou mais processos psicológicos básicos

envolvidos na compreensão ou utilização da linguagem

falada ou escrita, que pode manifestar-se por uma aptidão

imperfeita de escutar, pensar, ler, escrever, soletrar ou fazer

cálculos matemáticos. O termo inclui condições como

deficiências perceptivas, lesão cerebral, disfunção cerebral

mínima, dislexia e afasia de desenvolvimento. O termo não

engloba as crianças que têm problemas de aprendizagem

resultantes principalmente de deficiência visual, auditiva ou

motora, de deficiência mental, de perturbação emocional ou

de desvantagens ambientais, culturais ou econômicas"

(FEDERAL REGISTER, 1977).

No entanto, ele esclarece que não se pode concordar com a segunda parte

desta definição que exclui situações clínicas atreladas às Dificuldades de

Aprendizagem.

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11 O DSM.IV (www.psiqweb.med.br), por sua vez, define muito mal a situação

das Dificuldades de Aprendizagem. Segundo essa classificação,

"os transtornos da aprendizagem são diagnosticados

quando os resultados do indivíduo em testes padronizados e

individualmente administrados de leitura, matemática ou

expressão escrita estão substancialmente abaixo do

esperado para sua idade, escolarização e nível de

inteligência".

Já o CID.10 (www.psiqweb.med.br) denomina essa situação como:

"transtornos nos quais as modalidades habituais de

aprendizado estão alteradas desde as primeiras etapas do

desenvolvimento. O comprometimento não é somente a

conseqüência da falta de oportunidade de aprendizagem ou

de um retardo mental, e ele não é devido a um traumatismo

ou doença cerebrais".

A avaliação global da criança ou adolescente, considerando as diversas

possibilidades de alterações que resultam nas Dificuldades de Aprendizagem é

muito importante para que o tratamento seja o mais específico e objetivo possível.

Segundo Ballone (ibid.), alguns autores dividem as Dificuldades de

Aprendizagem em Primárias e Secundárias, de acordo com sua origem.

As Dificuldades de Aprendizagem consideradas Primárias, seriam aquelas

cuja causa não pode ainda ser atribuída à elementos psico-neurológicos bem

estabelecidos ou esclarecidos. Esses casos englobam, principalmente, as

chamadas disfunções cerebrais (Transtorno da Leitura, Transtorno da Matemática

e Transtorno da Expressão Escrita), bem como os transtornos da linguagem

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12 falada (Transtorno da Linguagem Expressiva e o Transtorno Misto da Linguagem

Receptivo-Expressiva).

As Dificuldades de Aprendizagem consideradas Secundárias seriam

aquelas conseqüentes à alterações biológicas específicas e bem estabelecidas e

alterações comportamentais e emocionais bem esclarecidas.

Em relação às alterações biológicas (neurológicas) teríamos as Lesões

Cerebrais, Paralisia Cerebral, Epilepsia e Deficiência Mental. Envolvem também

os sistemas sensoriais, através da Deficiência Auditiva, Hipoacusia, Deficiência

Visual e Ambliopia. Haveria, ainda, dentro das causas biológicas, as situações de

Dificuldades de Aprendizagem conseqüentes a outros problemas perceptivos que

afetam a discriminação, síntese, memória, relação espacial e visualização.

Em relação aos problemas de comportamento, um dos fatores mais

marcantes para o desenvolvimento de Dificuldades de Aprendizagem são os

quadros classificados como Comportamento Disruptivo e, dentro deles, o

Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e o Transtorno Desafiador e

Opositivo.

Quanto aos problemas emocionais que favorecem as Dificuldades de

Aprendizagem temos a Depressão Infantil e a Ansiedade (de Separação) na

Infância.

Ballone (ibid.) esclarece, ainda, que segundo a Psiquiatria, as dificuldades

escolares podem ocorrer em 4 situações: quando há severo prejuízo do interesse

da criança; quando a performance global da criança está prejudicada; quando há

prejuízo da atenção e quando há prejuízo na cognição na apreensão ou no

processamento das informações.

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13 · Quando há severo prejuízo do interesse

Afastadas as causas de natureza orgânica, tais como anemia, reumatismo

infeccioso, infecções, diabetes, estados de intoxicação, a Depressão Infantil é a

maior causa de desinteresse e está intimamente relacionada ao humor ou afeto.

A Depressão Infantil pode ser conseqüência de uma reação de ajustamento

a alguma circunstância ambiental ou pode ainda ser de natureza mais grave e

atrelada à constituição do paciente, notadamente quando existem parentes

próximos também portadores de depressão.

O estreitamento do campo vivencial é o sintoma básico da Depressão, onde

o universo de interesses do deprimido torna-se cada vez mais restrito e a

preocupação com suas próprias angústias e seu próprio sofrimento emocional

toma conta de todo seu interesse e seus prazeres.

Há também a inibição psíquica global, que é responsável pelo prejuízo do

interesse. Trata-se de uma espécie de freio ou lentificação dos processos

psíquicos em sua globalidade, como se fosse uma dormência generalizada de

toda a atividade mental. Em graus variáveis, esta inibição geral torna o indivíduo

apático, desinteressado, lento, desmotivado, com dificuldade em suportar tarefas

elementares do cotidiano e com grande perda da capacidade de raciocínio e de

tomar iniciativas.

Os campos da consciência e da motivação estão seriamente

comprometidos nos estados depressivos, daí a dificuldade em manter um bom

nível de memória, de rendimento intelectual, de iniciativas e participações para

levar adiante o dia-a-dia. Percebe-se os reflexos desta inibição global na atividade

motora, que fica bastante diminuída, e até na própria expressão da mímica,

através da aparência de abatimento e de desinteresse.

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14 Outra patologia capaz de prejudicar severamente o interesse de crianças e

adolescentes é a Esquizofrenia da Infância e Adolescência. Nesse quadro, em

termos de comportamento e interação social, a maior parte dos pacientes mantém

contatos sociais limitados. Adolescentes que eram socialmente ativos podem

tornar-se retraídos, perdem o interesse em atividades com as quais anteriormente

sentiam prazer, tornam-se menos falantes e curiosos, e podem passar a maior

parte de seu tempo na cama. Para a família, esses sintomas de apatia e

desinteresse, chamados de sintomas negativos, costumam ser o primeiro sinal de

que algo está errado.

· Quando a performance global da criança está prejudicada

Esses casos de Dificuldades de Aprendizagem são decorrentes de fatores

que comprometem o rendimento mental como um todo. Há uma incapacidade de

trabalhar mentalmente as informações, sendo as Deficiências Mentais as

patologias que mais ocasionam prejuízo do rendimento mental.

Em relação à Deficiência Mental, segundo a classificação da OMS

(Organização Mundial da Saúde), a gravidade do quadro seria classificada em

quatro níveis:

- Profundo: São pessoas com uma incapacidade total de autonomia, inclusive

aquelas que vivem num nível vegetativo.

- Grave: Fundamentalmente necessitam que se trabalhe para instaurar alguns

hábitos de autonomia, já que há probabilidade de adquiri-los. A capacidade de

comunicação é muito primária. Podem aprender de uma forma linear e necessitam

de revisões constantes.

- Moderado: O máximo que podem alcançar é o ponto de assumir um nível pré-

operativo. São pessoas que podem ser capazes de adquirir hábitos de autonomia

e, inclusive, podem realizar certas atitudes bem elaboradas. Quando adultos,

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15 podem freqüentar lugares ocupacionais, mesmo que sempre estejam

necessitando de supervisão.

- Leve: São casos perfeitamente educáveis e mais favoráveis. Podem chegar a

realizar tarefas mais complexas com supervisão.

Os três níveis mais sérios de Deficiência Mental não preocupam o

diagnóstico causal das Dificuldades de Aprendizagem, pois esses pacientes

mostram claramente o grau de comprometimento intelectual que apresentam. O

problema está na Deficiência Mental Leve, às vezes, limítrofe entre o normal e o

sub-normal. Nesses casos, o aluno desenvolve-se sofregamente durante um certo

tempo, mas a partir de um determinado nível de exigência mental começa a

apresentar dificuldades.

· Quando há prejuízo da atenção

Evidentemente o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade)

é a principal situação psico-neurológica que compromete a atenção da criança ou

adolescente. Os portadores são freqüentemente rotulados de "problemáticos",

"desmotivados", "avoados", "malcriados", "indisciplinados", "irresponsáveis" ou

"pouco inteligentes".

O TDAH é considerado, atualmente, um dos transtornos psíquicos infantis

mais estudados. A prevalência está entre 3% e 5% em crianças em idade escolar

e costuma ser mais comum em meninos do que em meninas. Em adolescentes de

12 a 14 anos, pode ser encontrada numa prevalência de 5,8%.

A característica essencial do TDAH é um padrão persistente de

desatenção, hiperatividade e impulsividade que causam prejuízo no

funcionamento familiar, social, acadêmico ou ocupacional do paciente. A

desatenção pode tanto se manifestar em situações escolares, quanto sociais.

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16 Os adolescentes e crianças com TDAH com freqüência têm dificuldade para

manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas e consideram difícil persistir

nas mesmas até seu término. Normalmente, essas crianças dão a impressão de

estarem com a mente em outro local, ou de não estarem escutando o que está

sendo dito. Pode haver freqüentes mudanças de uma tarefa para outra antes de

completarem qualquer uma de suas incumbências. Elas freqüentemente não

atendem a solicitações ou instruções e não conseguem completar os trabalhos

escolares, tarefas domésticas ou outros deveres.

A ansiedade patológica na infância e adolescência também interfere

negativamente na atenção. Dentro desse quadro situa-se a chamada Fobia

Escolar, mais adequadamente chamada de Transtorno de Ansiedade de

Separação. A característica essencial desse transtorno é a ansiedade excessiva

envolvendo o afastamento de casa ou de pessoas com forte vínculo afetivo,

normalmente a mãe.

As crianças com este transtorno experimentam um sofrimento excessivo

quando separados de casa ou de pessoas de vinculação afetiva importante, bem

como podem sofrer antecipadamente diante da simples possibilidade de futura

separação. Alguns pacientes com Transtorno de Ansiedade de Separação sentem

saudade extrema e chegam a sentir-se doentes devido ao desconforto por

estarem longe de casa. Desta forma, essas crianças podem apresentar grande

relutância ou recusa a irem à escola e, uma vez lá, ficam tão ansiosas que não

conseguem prestar a atenção necessária.

· Quando há prejuízo na cognição

- Na apreensão da informação: Qualquer alteração neuropsiquiátrica, funcional ou

orgânica, suficiente para comprometer o sistema sensorial, seja a nível periférico

como, por exemplo, a surdez e a cegueira, seja a nível central, como as lesões

cerebrais, interfere sobremaneira na apreensão dos estímulos. Evidentemente, se

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17 a pessoa não consegue ouvir ou ver, sua aprendizagem estará seriamente

comprometida.

- No processamento da informação: A síntese das sensações que vêm do exterior

sob a forma de estímulos, que constituem percepções conscientes do que ocorre

fora da pessoa, dá-se nas zonas corticais do SNC (Sistema Nervoso Central). A

anestesia, surdez ou cegueira podem resultar da lesão de um órgão sensorial

periférico, do nervo que leva essas informações até o cérebro (nervos aferentes)

ou de uma zona cortical do SNC, onde se projetam essas sensações. Em

qualquer das circunstâncias está seriamente prejudicada a apreensão da

informação.

Há casos onde estão conservadas a integridade das vias nervosas

aferentes (periféricas), mas existem lesões cerebrais corticais na vizinhança da

área de projeção, nas chamadas áreas para-sensoriais. Embora se mantenha a

integridade das sensações percebidas, há importante alteração na qualidade

daquilo que é sentido. Nesses casos, fala-se em Agnosia.

Para estudo das Dificuldades de Aprendizagem, as agnosias mais

importantes são a visual e auditiva. A agnosia visual é, entre esses transtornos, a

melhor conhecida em sua origem. Nesses casos, muito importantes para a leitura,

porque a pessoa vê, mas não sabe o que está vendo, as lesões neurológicas

responsáveis são quase sempre bilaterais e afetam as áreas

occipitais 18 e 19, contíguas à área 17 onde terminam as projeções visuais (áreas

para-sensoriais). A agnosia auditiva, por sua vez, é quando o paciente ouve sons

e ruídos, porém não consegue identificá-los, não os compreende.

Outro quadro relacionado à dificuldade no processamento da informação é

a Dislexia, distúrbio específico da linguagem caracterizado pela dificuldade em

decodificar (compreender) palavras. Segundo a definição elaborada pela

Associação Brasileira de Dislexia, trata-se de uma insuficiência do processo

Page 18: APRENDER BRINCANDO - AVM - Pós-Graduação MARQUES DA SILVA.pdf · APRENDER BRINCANDO OBJETIVO: Apresentação da Monografia à Universidade Cândido Mendes como condição prévia

18 fonoaudiológico e inclui-se freqüentemente entre os problemas de leitura e

aquisição da capacidade de escrever e soletrar.

Apesar da criança disléxica ter dificuldade em decodificar certas letras, não

o faz devido a algum problema de déficit cognitivo, como ocorre na Deficiência

Mental, mas sim de uma alteração cognitiva.

Ballone (ibid.) conclui que o diagnóstico dos problemas emocionais que

levam a criança a apresentar um baixo rendimento escolar se justifica, já que

dentre as principais razões para as Dificuldades de Aprendizagem, as emocionais

possuem, atualmente, melhores possibilidades de tratamento. Além disso, é

importantíssimo fazer o diagnóstico diferencial com a Deficiência Mental,

proporcionando um desenvolvimento satisfatório o mais rapidamente possível.

Muito embora as crianças estejam sujeitas à maioria dos transtornos

emocionais encontrados nos adultos, na maioria das vezes seu diagnóstico é

pobremente realizado, já que ainda existe a crença de que criança não fica

"nervosa" porque não tem problemas ou que "criança nervosa" é falta de correção

enérgica. Enfim, a falta de informação sobre psiquiatria infantil é a responsável

pela maioria das dificuldades de relacionamento, escolares e sociais das crianças,

bem como responsável por inúmeras seqüelas emocionais no futuro.

Não é lícito estabelecer uma regra geral e inflexível atribuindo a todos os

casos de Dificuldades de Aprendizagem um mesmo diagnóstico ou um enfoque

generalizador. Nem sempre existem provas clínicas de que suas causas possam

ser identificadas objetivamente.

Muitas vezes, as tentativas de se estabelecer diagnósticos para avaliar

esses problemas servem para encobrir outras incompetências pedagógicas. Um

diagnóstico pouco criterioso serve como atenuante para alguma comodidade ou

incapacidade da escola para lidar com processos e métodos de aprendizagem. A

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19 maioria das escolas está longe de cumprir sua tarefa de instruir e educar,

envolvidas que estão por ditames políticos demagógicos ou técnicos utilitaristas.

Por isso, cada caso deve ser avaliado particularmente, incluindo na

avaliação o entorno familiar e escolar. Se as Dificuldades de Aprendizagem estão

presentes no ambiente escolar e ausentes nos outros lugares, o problema deve

estar no ambiente de aprendizado e não em algum "distúrbio neurológico"

misterioso e não-detectável.

Essa dificuldade “seletiva” para o ambiente escolar, é detectada quando a

criança aprende bem em outros cursos, aprende manipular aparelhos eletro-

eletrônicos com facilidade, tem boa performance em atividades lúdicas, enfim,

quando ela mostra fora da escola que pode aprender como as demais.

Muitas vezes, as Dificuldades de Aprendizagem são reações

compreensíveis de crianças neurologicamente normais, porém obrigadas a

adequar-se às condições adversas das salas de aula.

Normalmente, as crianças que apresentam dificuldades específicas no

início da escolarização, embora não tenham nenhum problema neuropsiquiátrico,

provavelmente são aquelas que precisarão de maior atenção. São crianças que

terão de desenvolver suas habilidades de apreensão daquilo que é ensinado.

Portanto, cada uma delas precisa ser investigada e compreendida particularmente

em suas dificuldades.

Para ele, dois extremos podem comprometer a escola em relação às

Dificuldades de Aprendizagem: ou a escola superestima a questão, acreditando

comodamente que a criança é um problema, logo deve ter algum

comprometimento neuropsiquiátrico quando, de fato, o problema é de

relacionamento ou de adequação difícil às normas da escola ou, ao contrário,

subestima um verdadeiro comprometimento neuropsiquiátrico levando às

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20 Dificuldades de Aprendizagem, pensando tratar-se de algum problema disciplinar,

de método de ensino, de má vontade, etc.

Portanto, primeiramente deve ser questionado se, de fato, a criança

apresenta Dificuldades de Aprendizagem ou se seu rendimento não satisfaz as

expectativas do professor ou da escola.

Enfim, não se deve tratar as Dificuldades de Aprendizagem como se

fossem problemas insolúveis, mas como desafios que fazem parte do próprio

processo da Aprendizagem, a qual pode ser normal ou não-normal. Também

parece ser consensual a necessidade imperiosa de identifica-las e preveni-las o

mais precocemente possível.

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21

CAPÍTULO II

O BRINCAR

"É no brincar, e somente no brincar, que

o indivíduo, criança ou adulto, pode ser

criativo e utilizar sua personalidade

integral; e somente sendo criativo ele

descobre seu verdadeiro eu".

(Donald Winnicott)

1 - FREUD

Sigmund Freud, pai da Psicanálise, que nasceu em 1856 vivendo até 1939,

foi o primeiro pesquisador a entender o sentido psicodinâmico de uma atividade

específica das crianças: o brincar. Com isso, proporcionou as bases da técnica do

brinquedo que permite o trabalho terapêutico com crianças, já que elas possuem

poucos recursos verbais, permitindo-lhes ampliar seus recursos de personalidade,

facilitando a retomada do desenvolvimento normal.

Freud (1920) refere-se à brincadeira das crianças como uma das primeiras

atividades normais do aparelho mental. Ele esclarece que, até então, as diferentes

teorias sobre a brincadeira das crianças limitaram-se a descobrir os motivos que

as levam a brincar, deixando de lado a consideração da produção de prazer

envolvida.

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22 Com o objetivo de esclarecer este assunto, Freud (ibid.) utilizou-se da

observação da primeira brincadeira de um menino de dezoito meses que dizia

apenas algumas palavras compreensíveis, utilizando-se também de sons que

expressavam significado inteligível para os que o rodeavam.

Freud (ibid.) explica que este menino tinha o hábito de apanhar objetos e

atirá-los longe para um canto, sob a cama, de maneira que procurar seus

brinquedos e apanhá-los, quase sempre dava bom trabalho. Enquanto procedia

assim, emitia um longo e arrastado ‘o-o-o-ó’, que representava a palavra alemã

‘fort’ (‘ir, partir’). Tratava-se, pois, de um jogo que consistia em fazer os brinquedos

‘irem embora’.

Este ponto de vista foi confirmado quando o menino brincava com um

carretel de madeira que tinha um pedaço de cordão amarrado em volta dele. Ele

segurava o carretel pelo cordão e com muita perícia o arremessava por sobre a

borda de sua cama encortinada, de maneira que aquele desaparecia por entre as

cortinas, ao mesmo tempo que o menino proferia seu expressivo ‘o-o-o-ó’.

Puxava, então, o carretel para fora da cama novamente, por meio do cordão, e

saudava o seu reaparecimento com um alegre ‘da’ (‘ali’). Essa era a brincadeira

completa: desaparecimento e retorno. Geralmente, assistia-se apenas a seu

primeiro ato, que era incansavelmente repetido como um jogo em si mesmo,

embora não houvesse dúvida de que o prazer maior se ligava ao segundo ato.

A partir daí, Freud (ibid.) interpretou que através do jogo o menino

compensava, com a encenação do desaparecimento e volta dos objetos, a

renúncia à satisfação instintual que efetuava ao deixar a mãe ir embora por

algumas horas, sem chorar, apesar de ser muito ligado à ela, já que não poderia

ter sentido a partida dela como algo agradável ou mesmo indiferente.

Segundo Freud (ibid.), nenhuma decisão certa pode ser alcançada pela

análise de um caso isolado como este, no entanto, fica-se com a impressão de

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23 que a criança transformou sua experiência em jogo porque, “no início, achava-se

numa situação passiva, era dominado pela experiência; repetindo-a, porém, por

mais desagradável que fosse, como jogo, assumia papel ativo” (FREUD, 1920,

p.27). Outra interpretação seria a de que “jogar longe o objeto, de maneira a que

fosse ‘embora’, poderia satisfazer um impulso da criança, suprimido na vida real,

de vingar-se da mãe por afastar-se dela” (ibid.).

Um ano depois, este mesmo menino costumava agarrar um brinquedo, se

estava zangado com este, e jogá-lo ao chão, exclamando: ‘Vá para frente!’. Ele

escutara que o pai ausente encontrava-se ‘na frente (de batalha)’, e o menino

estava longe de lamentar sua ausência, pelo contrário, deixava bastante claro que

não tinha desejo de ser perturbado em sua posse exclusiva da mãe.

A partir desta observação, Freud conclui que, na brincadeira,

“as crianças repetem tudo que lhes causou uma grande

impressão na vida real, e assim procedendo ab-reagem a

intensidade da impressão, tornando-se, por assim dizer,

senhoras da situação. Por outro lado porém, é óbvio que

todas as suas brincadeiras são influenciadas por um desejo

que as domina o tempo todo: o desejo de crescer e poder

fazer o que as pessoas crescidas fazem. Pode-se também

observar que a natureza desagradável de uma experiência

nem sempre a torna inapropriada para a brincadeira (...).

Quando a criança passa da passividade da experiência para

a atividade do jogo, transfere a experiência desagradável

para um de seus companheiros de brincadeira, dessa

maneira, vinga-se num substituto”. (FREUD, op. cit., p.28)

O exemplo deste caso utilizado por Freud (ibid.) mostra que a substituição do

objeto originário, cuja perda é temida e lamentada, por outros mais numerosos e

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24 substituíveis, a distribuição de sentimentos em múltiplos objetos e a elaboração de

sentimentos de perda através da experiência e recuperação, constituem as bases

da atividade lúdica e da capacidade de transferir afetos para o mundo externo.

2 - PIAGET

Jean Piaget (1896 – 1980), pioneiro nos estudos sobre a Teoria

Construtivista, acredita que o jogo é essencial na vida da criança, pois constitui-se

em expressão e condição para o desenvolvimento infantil, já que as crianças

quando jogam assimilam e podem transformar a realidade. Para ele, a atividade

lúdica é o berço obrigatório das atividades intelectuais da criança sendo, por isso,

indispensável à prática educativa.

Piaget (1990, p. 41 ) esclarece que

“o jogo constitui a forma de atividade inicial de quase toda

tendência, ou pelo menos um exercício funcional desta

tendência que o ativa ao lado da aprendizagem

propriamente dita, e que, agindo sobre este, o reforça”.

Segundo Piaget (1978), existem quatro categorias principais de jogo:

· Jogos Sensório-Motores – de 0 a 2 anos - é a forma primitiva do jogo, a única

representada no nível sensório-motor, mas que se conserva em parte com o

passar do tempo. É o “jogo de exercício”, que não comporta nenhum simbolismo

nem técnica lúdica, mas que consiste em a criança repetir uma determinada

situação por puro prazer, por ter apreciado seus efeitos, com a finalidade de

adaptação.

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25 · Jogos Simbólicos – de 2 a 7 anos - satisfazem a necessidade da criança de não

somente relembrar o mentalmente acontecido, mas de executar a representação.

· Jogos de Regras – a partir dos 7 anos - são transmitidos socialmente de criança

para criança e por conseqüência vão aumentando de importância de acordo com o

progresso de seu desenvolvimento social.

· Jogos de Construção – se desenvolvem a partir do jogo simbólico, impregnados

de simbolismo lúdico, mas que tendem, com o passar do tempo, a constituir

verdadeiras adaptações ou soluções de problemas e criações inteligentes,

fazendo a transição entre o jogo simbólico e as atividades não lúdicas ou

adaptações ‘sérias’.

O jogo simbólico assinala o apogeu do jogo infantil e corresponde à função

essencial que o jogo exerce na vida da criança: ajudá-la a adaptar-se a um mundo

cujos interesses e regras lhe permanecem exteriores e que ela mal compreende.

A criança não consegue satisfazer as necessidades afetivas e até intelectuais do

seu eu nessas adaptações, que permanecem para ela tanto mais inacabadas

quanto mais jovem for. É, portanto, indispensável ao seu equilíbrio afetivo e

intelectual que possa dispor de um setor de atividade cuja motivação não seja a

adaptação ao real, mas a assimilação do real ao eu, sem coações nem sanções:

“tal é o jogo, que transforma o real por assimilação mais ou

menos pura às necessidades do eu, ao passo que a

imitação (quando constitui fim em si mesma) é acomodação

mais ou menos pura aos modelos exteriores e a inteligência

é equilíbrio entre a assimilação e a acomodação”. (PIAGET,

1978, p. 52)

Além disso, a linguagem é o instrumento essencial da adaptação social,

mas também ela é transmitida à criança de maneira já pronta, sendo imprópria

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26 para exprimir as necessidades ou as experiências vividas do eu. Assim, é

indispensável que a criança disponha de um meio de expressão própria, isto é, de

um sistema de significantes construídos por ela e dóceis às suas vontades:

“tal é o sistemas dos símbolos próprios do jogo simbólico,

tomados de empréstimo à imitação não procurada por si

mesma e simplesmente utilizada como meio evocador a

serviço da assimilação lúdica: tal é o jogo simbólico, que não

é apenas assimilação do real ao eu, como o jogo em geral,

mas assimilação assegurada (o que a reforça) por uma

linguagem simbólica construída pelo eu e modificável à

medida das necessidades” (ibid.).

Esta função de assimilação ao eu que o Jogo Simbólico exerce manifesta-

se nas mais diversas formas particulares, geralmente afetivas ou a serviço de

interesses cognitivos. O simbolismo lúdico pode chegar a exercer a função de

repensar um acontecimento interessante ou impressionante mas, além disso, a

criança tem necessidade de reviver o acontecimento em lugar de se contentar

com uma evocação mental. Os conflitos afetivos são o que frequentemente

reaparecem no jogo simbólico, que pode servir ainda para liquidação deles, a

compensação de necessidades não satisfeitas, a inversão de papéis (obediência e

autoridade), a liberação e extensão do eu, além de apoiar-se em conflitos

inconscientes.

Piaget (1990) esclarece que os jogos simbólicos caracterizam-se por certas

obrigações comuns e sofrem intervenção do pensamento, mas um pensamento

individual com um mínimo de elementos coletivos. Estes jogos constituem uma

atividade real do pensamento, embora essencialmente egocêntrica, ou melhor,

duplamente egocêntrica. Sua função consiste em satisfazer o eu por meio de uma

transformação do real em função dos desejos, ou seja, não é um esforço de

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27 submissão do sujeito ao real, mas, ao contrário, uma assimilação deformada da

realidade ao eu.

De outro lado, a linguagem intervém nesta espécie de pensamento

imaginativo, tendo como instrumento a imagem, o símbolo, que é um signo

individual elaborado sem o recurso dos outros e muitas vezes compreendido pelo

indivíduo, já que a imagem se refere a lembranças e estados íntimos e pessoais.

É, portanto, neste duplo sentido que o jogo simbólico constitui o pólo egocêntrico

do pensamento. Pode-se dizer, mesmo, que ele é o pensamento egocêntrico em

estado quase puro, só ultrapassado pela fantasia e pelo sonho.

Nos Jogos de Regras, constata-se notável mudança nas atitudes sociais

das crianças que mesmo sem conhecerem ainda de cor todas as regras do jogo

asseguram-se, ao menos, da unidade das regras admitidas durante uma mesma

partida e se controlam uns aos outros, de modo a garantir a igualdade frente a

uma lei única. O termo ‘ganhar’ assume sentido coletivo: é ser bem sucedido

depois de uma competição com regras. É claro que o reconhecimento da vitória de

um jogador sobre os outros, assim como o direito de receber uma recompensa,

supõem discussões bem orientadas e definidas.

Piaget (1978) referindo-se ao desenho ou imagem gráfica, explica ainda

que inicialmente trata-se de uma forma de função semiótica que se inscreve entre

o Jogo Simbólico, cujo mesmo prazer funcional e mesma autotela apresenta, e a

imagem mental, com a qual partilha o esforço de imitação do real. Como explica, a

evolução do desenho é solidária com toda a estruturação do espaço, conforme os

diferentes estádios do desenvolvimento.

Segundo Luquet (apud. PIAGET, 1978), o desenho da criança até 8-9 anos

é essencialmente realista na intenção, pois ela começa desenhando o que sabe

de um personagem ou de um objeto, muito antes de exprimir graficamente o que

nele vê. Para ele, o realismo do desenho passa por diferentes fases:

Page 28: APRENDER BRINCANDO - AVM - Pós-Graduação MARQUES DA SILVA.pdf · APRENDER BRINCANDO OBJETIVO: Apresentação da Monografia à Universidade Cândido Mendes como condição prévia

28 · Realismo Fortuito - fase da garatuja com significação descoberta em seu

desenrolar.

· Realismo Gorado - ou fase de incapacidade sintética, em que os elementos da

cópia estão justapostos em vez de estarem coordenados num todo.

· Realismo Intelectual - em que o desenho sobrepujou as dificuldades primitivas e

apresenta, essencialmente, os atributos conceptuais do modelo, sem preocupação

de perspectiva visual.

· Realismo Visual – o desenho já não representa o que é visível de um ponto de

vista perspectivo particular e os objetos de segundo plano são gradualmente

apequenados em relação aos do primeiro plano. Por outro lado, o desenho toma

em consideração a disposição dos objetos segundo um plano de conjunto (eixos

de coordenadas) e de suas proporções métricas.

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29

CAPÍTULO III

AS ATIVIDADES LÚDICAS

“O homem só é completo quando

brinca.”

(Schiller)

1 - O JOGO

A infância se caracteriza pelo brincar. É através do brincar que a criança

constrói sua aprendizagem acerca do mundo em que vive, da cultura em que está

inserida. Os jogos são uma pequena parte desta atividade.

Teixeira (2004) esclarece que não existe uma teoria completa do jogo, nem

idéias admitidas universalmente, sendo estes os principais enfoques projetados

sobre o jogo infantil:

· Sociológico - influência do contexto social no qual os diferentes grupos de

crianças brincam.

· Educacional - contribuição do jogo para a educação, desenvolvimento e/ou

aprendizagem da criança.

· Psicológico - jogo como meio para compreender melhor o funcionamento da

psique, das emoções e da personalidade dos indivíduos.

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30 · Antropológico - a maneira como o jogo reflete, em cada sociedade, os costumes

e a história da diferenças culturais.

· Folclórico - analisando o jogo como expressão da cultura infantil através das

diversas gerações, bem como as tradições e costumes através dos tempos nele

refletidos. O jogo é uma atividade típica do homem, que inventa jogos e se diverte

com eles desde que se tem conhecimento de sua existência.

Segundo Bertoldi (2002), os jogos possibilitam à criança aprender de forma

prazerosa, num contexto desvinculado da situação de aprendizagem formal.

Através da aprendizagem do próprio jogo, do domínio das habilidades e

raciocínios utilizados, a criança tem a possibilidade de redimensionar sua relação

com as situações de aprendizagem, com seu desejo de buscar novos

conhecimentos. Possui também a oportunidade de lidar com a frustração do não

saber, com a alternância entre vitórias e derrotas. Estas mudanças na percepção

de si mesmo e do objeto de conhecimento podem ser estendidas às situações de

aprendizagem formal, na medida em que se restabelecem o desejo e a confiança

da criança na sua capacidade de aprender.

Pela sua estrutura, os jogos representam situações em que a criança tem

de enfrentar limites, não somente os das regras a serem respeitadas, mas

também os seus próprios que devem ser superados para que possa obter êxito.

Permitem ainda que a criança crie ou modifique as regras, de comum acordo com

seus parceiros, propiciando o desenvolvimento de sua autonomia moral.

Há uma variedade inesgotável de jogos, que abrange tanto os individuais

quanto os cooperativos ou competitivos. Podem ser jogos de mesa, de

computador ou os mais tradicionais. Cada um tem suas possibilidades educativas,

o que invalida a classificação entre jogos educativos ou não. Os ditos “jogos

educativos” são, na verdade, os menos adequados para o trabalho

psicopedagógico por tratarem-se de materiais didáticos um pouco mais atraentes

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31 e não possuírem normalmente as características que possibilitam o uso

terapêutico, que está ligado à construção de um cenário lúdico, de desafio,

distante da realidade escolar tão impregnada de sentimentos negativos para a

criança com dificuldades.

A escolha dos jogos será definida pelas dificuldades específicas de cada

criança e é neste momento que é possível lidar com as mesmas. Existem jogos

que trabalham a linguagem, outros trabalham com números, outros trazem

informações sobre temas diversos. Existe ainda jogos que exigem estratégia,

domínio espacial, verificação de hipóteses, tomadas de decisões. Os jogos de

computador também possuem diversidade de temas, variando de jogos de

linguagem, raciocínio e simulações de realidade.

Não existe uma área de dificuldade de aprendizagem para a qual não se

possa utilizar o recurso dos jogos, que devem ser escolhidos de acordo com as

habilidades das crianças, tendo a preocupação de selecionar os melhores

recursos existentes, adaptando regras e formas de utilização.

Nem sempre as regras sugeridas pelos jogos servem ao psicopedagogo,

que deverá ter o conhecimento prévio do que se irá aplicar estabelecendo regras

próprias que sustentem sua singular ação.

Jogos com a mesma estrutura podem servir para várias idades se sua

complexidade for manejada, aumentando ou diminuindo o número de informações.

A criança que tem seus primeiros contatos com a aprendizagem de forma

lúdica, provavelmente vai ter a chance de desenvolver um vínculo mais positivo

com a educação formal, vai estar mais fortalecida para lidar com os medos e

frustrações inerentes ao processo de aprender.

Campos (2003) explica que o uso dos jogos em Psicopedagogia é um

recurso tanto para avaliação como para intervenção em processos de

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32 aprendizagem. Por tratar-se de uma abordagem que evita atacar o sintoma de

frente, o lúdico é o recurso ideal, pois promove a ativação dos recursos da criança

sem ameaçá-la.

Dependendo de como é conduzido, o jogo ativa e desenvolve os esquemas

de conhecimento que irão colaborar na aprendizagem de qualquer novo

conhecimento, como observar e identificar, comparar e classificar, conceituar,

relacionar e inferir. Também são esquemas de conhecimento os procedimentos

utilizados no jogo como o planejamento, a previsão, a antecipação, o método de

registro e contagem e outros.

No entanto, o jogo deve ser visto como divertimento, distração, passa-

tempo, pois se vira obrigação ou é usado com finalidade de instrução apenas,

perde seu caráter de espontaneidade e deixa de ser jogo porque se esvazia no

seu potencial de exploração e invenção. Brincar é fundamental!

2 - A ARTE

Segundo Nobre (1998), a Arte diz respeito à auto-expressão e resgata o

potencial criativo do homem, buscando a mente saudável e estimulando a

autonomia e transformação interna para reestruturação do ser.

Através da Arte, o indivíduo entra em contato com conteúdos internos,

muitas vezes inconscientes expressando, assim, sentimentos e atitudes até então

desconhecidos. Com a análise dos conflitos pessoais que são projetados obtém-

se uma melhor compreensão de si e uma libertação emocional.

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33 Na intimidade psíquica ocorre um mundo de constantes percepções e

sensações, pensamentos, fantasias, sonhos e visões, sem a ordenação moral da

comunicação verbal do cotidiano. Propõe-se, então, a estruturação da ordenação

lógica e temporal da linguagem verbal de indivíduos que preferem ou que só

conseguem expressões simbólicas.

A utilização de recursos artísticos tem como finalidade a expressão do ser,

não havendo preocupação com a estética e sim com o conteúdo pessoal implícito

em cada criação e explícito como resultado final.

Nobre (ibid.) explica que cada material utilizado tem propriedades que

mobilizam emoções e sentimentos de maneiras diversificadas a cada indivíduo. É

necessário analisar o valor terapêutico do material para cada um pois, desta

forma, torna-se possível penetrar de maneira mais rápida e em particular nos

conflitos internos e inconscientes.

· Desenho

Podem ser utilizados o giz de cera, pastel a óleo, pastel seco, lápis de cor,

lápis de cor aquarelado, hidrocor, carvão e lápis grafite. Todos têm significados

terapêuticos semelhantes. No desenho, a coordenação motora fina é bastante

trabalhada, portanto o controle é essencial, não só o motor, mas principalmente o

intelectual. A atenção, a concentração e o contato com a realidade são

explorados.

O desenho de cópia enfoca a atenção na realidade exterior, e é indicado à

pessoas que fantasiam, sonham, obrigando-as a perceberem e reproduzirem a

realidade tal como ela é. A imensa dificuldade que encontram em reproduzir, não

é só o medo de errar, é a própria dificuldade de dar direcionamento em sua vida. É

indicado para pessoas dispersas, sonhadoras, confusas e adolescentes.

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34 No desenho livre, as pessoas entram em contato com sua realidade interna,

deixando fluir conteúdos que estejam prontos para emergir.

Nos desenhos dirigidos, aqueles feitos a partir de um tema previamente

escolhido, os indivíduos entram em contato com sua realidade, mobilizando

emoções bloqueadas que precisam vir à tona. Indicados para pessoas deprimidas,

com tônus vital rebaixado.

Os desenhos monocromáticos trabalham com emoções superficiais, a nível

periférico, já os desenhos coloridos lidam com emoções profundas.

Ressalta-se não ser necessária a análise do desenho, e sim a análise da

interpretação do indivíduo com relação ao feito.

· Pintura

Quando a pintura flui, fluem também as emoções e os sentimentos. A

esfera afetivo-emocional torna-se mais abrangente, pois as pinceladas lembram o

fluxo respiratório, a vida. As tintas geralmente utilizadas são: guache, aquarela,

anilina, óleo, acrílica e nanquim.

A tinta guache exige maior controle de movimentos, libera emoções e

incentiva a imaginação.

A aquarela, devido a sua leveza, e o uso obrigatório da água, mobiliza

ainda mais o lado afetivo, sendo indicada para pessoas muito racionais e com

dificuldade afetiva e contra indicada para deprimidos.

Devido a dificuldade de fazer figuras por ser muito aguada, a anilina é ótima

para pessoas que têm medo de perder o controle das coisas.

A tinta óleo, é recomendada para pessoas com depressão, pois possibilita

maior equilíbrio da situação.

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35 O nanquim, quando puro, é de fácil controle, mas exige agilidade e

sensibilidade. Quando usado com água, é mais fluído, exigindo muito mais

habilidade, atenção e concentração.

Quanto mais expressão, mais auto-conhecimento e mais auto-confiança. A

pintura, assim como o desenho, pode ser livre, de cópia ou dirigida.

Com a pintura, trabalha-se a estruturação e a área afetiva-emocional, chegando

ao equilíbrio das emoções. E quanto mais diluída for a tinta, mais emocional é o

resultado.

· Modelagem

A modelagem pode ser feita com massa caseira, argila, cera de abelha,

plasticina, papel machê e massa de modelar.

O efeito da modelagem atua nas sensações físicas e viscerais, como

também no sentimento e cognição. A técnica exige uma canalização de energia

adequada, por partir do nada para a criação de algo, podendo ser livre ou dirigida.

A sensação de estar em contato com o barro, pode ser muito gratificante ou

não. A argila age como transformadora de um estado de desencontro para um

estado de equilíbrio, podendo trazer à tona conflitos internos indesejáveis. Por ser

moldável, integra o ser com o mundo exterior, mostrando-o que pode adaptar-se

às situações. Sendo fluida, recebe projeções e é dominada, favorecendo ao

manipulador a libertação das tensões, fadigas e depressões, pois é um material

vivo e de ação calmante.

No físico, trabalha questões ligadas à estruturação e coordenação motora.

No emocional, mobiliza sentimentos e emoções primitivas, para que possam ser

conhecidas e trabalhadas.

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36 Nos casos de negação e resistência à argila, oferta-se o papel machê ou a

massa de farinha de trigo, pois de início não devemos forçar, e com a adaptação a

estes recursos, aos poucos inclui-se o barro.

O papel machê é um material frio e viscoso, mas que também nos oferece

retornos, pois podemos moldá-lo e criar, não chegando aos efeitos da argila, por

não ser um produto natural primitivo.

A massa de farinha de trigo é utilizada ainda morna, para melhor manuseio,

podendo levar a recordações maternas ou da infância. Proporciona também a

capacidade criadora, auto-estima, catarse emocional e auto-confiança.

· Sucata

O trabalho com a sucata estimula a reconstrução, a criatividade, as

percepções, a atenção, a construção, a transformação, o concreto e a mudança.

É um material transformador, pois dá-se uma nova utilidade ao que antes

era lixo. É a mudança através do concreto, é a busca de possibilidades de

transformação e do reaproveitamento.

Por poder aliá-lo a pintura, a colagem e a modelagem, é uma atividade rica

e complexa, que mobiliza o conteúdo interno e transforma-o, reaproveitando-o de

forma benéfica. Deve-se ficar atento, para que nenhum detalhe escape, pois é um

trabalho de muita sutileza.

Materiais diversos devem ser utilizados de forma livre ou dirigida: plásticos,

vidros, papéis, madeira e tecidos.

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37 · Colagem

É uma atividade estruturante que pode ser realizada com materiais

diversos: recortes de revistas, jornais, pedaços de papéis coloridos, grãos,

serragem, cortiça, purpurina, tecidos...

Nesta atividade, busca-se nos materiais idéias que possam expressar e

comunicar sentimentos, emoções e idéias em relação ao tema. O planejamento, o

direcionamento e a atenção do paciente ajudam na estruturação de sua vida.

É um recurso rico, pois o indivíduo planeja, analisa, fica atento,

concentrado, organizado e paciente.

3 - A MÚSICA

Música, segundo Costa (1989, p. 20), "é a organização de relações entre

sonoridades, simultâneas ou não, no decorrer do tempo. Sons e silêncio são

combinados e encadeados entre si, formando ritmos, melodias e harmonias".

No entanto, como explica Miyashita ( www.vivernatural.com.br), a Música

não se resume somente a grandes composições, mas é todo e qualquer tipo de

som existente (ruídos, choro, grito). Sendo a música um meio de comunicação, é

através de seu uso como linguagem, tocando instrumentos, batendo células

rítmicas, cantando, fazendo letras de música, compondo, fazendo ruídos, que os

problemas serão expressos. Por tratar-se de uma comunicação não-verbal, ela

possui a qualidade de externar conteúdos vindos diretamente do inconsciente,

superando bloqueios.

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38 Para entender a importância da música é necessário primeiro compreender

sua ação no organismo. Gasparini (www.netmusicos.com.br) diz que ao chegarem

aos ouvidos, os sons são convertidos em impulsos que percorrem os nervos

auditivos até o tálamo, região do cérebro que é considerada a estação central das

emoções, das sensações e dos sentimentos. Os impulsos provocados pela música

no cérebro repercutem em todo o corpo. O ritmo musical influencia os padrões de

sono e vigília, a respiração, os batimentos cardíacos, a circulação sanguínea e as

secreções de diversas glândulas.

De acordo com a definição oficial da Federação Mundial de Musicoterapia

(www.virtual.epm.br), a música e/ou seus elementos (som, ritmo, melodia e

harmonia) facilita e promove comunicação, relacionamento, aprendizado,

mobilização, expressão, organização entre outros objetivos, a fim de atender às

necessidades físicas, mentais, sociais e cognitivas.

Através da música é possível desenvolver potenciais e/ou restaurar funções

do indivíduo para que alcance uma melhor organização intra e/ou interpessoal e,

conseqüentemente, uma melhor qualidade de vida, através da prevenção,

reabilitação ou tratamento.

A música pode ajudar qualquer pessoa, sendo mais indicada aos que não

possuem conhecimentos musicais, pois isto facilita a introdução no contexto não-

verbal. Permite a modificação dos problemas emocionais, atitudes, energia

dinâmica psíquica, que será o esforço para modificar qualquer patologia física ou

psíquica. Pode ser também coadjuvante de outras técnicas abrindo canais de

comunicação para que estas possam atuar eficazmente.

Não existem "receitas de músicas", pois cada pessoa tem uma vivência

sonora diferente. Desta forma, a música que pode fazer muito bem para um, pode

irritar profundamente a outro. Por isso, é necessário fazer uma investigação do

que o indivíduo escutou durante sua vida, desde sua fase intra-uterina.

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39 Segundo Machado (2001), a música, dentre suas inúmeras funções, pode

tratar stress, depressão, distúrbios do sono, da fala e pacientes psicóticos. Pode

ser utilizada com os objetivos de melhora de vida, reabilitação, restabelecimento

do equilíbrio mental, físico e psicológico.

Toda e qualquer manifestação sonora deve ser valorizada. O fazer musical

compreende a escuta, o canto, a execução de instrumentos, a movimentação

corporal, entre diversas outras atividades, que envolvem o som e o movimento.

A resposta à música é praticamente imediata por tratar-se de uma arte que

não necessita passar pelo mundo das idéias para buscar uma expressão. Com

isso, os resultados obtidos são surpreendentes.

· Instrumentos Musicais

Instrumentos de sopro - têm relação com o pensar. São tocados com a

boca, ficando os instrumentos próximos à cabeça, parte central do sistema neuro-

sensorial. Desta forma, estimulam o pensar, interagindo com o sistema

respiratório. Possuem ligação com o elemento musical 'melodia'.

Instrumentos de cordas - são tocados abraçados e mantidos próximos ao

centro do corpo. Têm relação com o sentir e com o sistema rítmico, porque no

centro do corpo estão as atividades rítmicas do pulsar do coração e da atividade

respiratória rítmica pulmonar. Ligam-se ao elemento musical 'harmonia'.

Instrumentos de percussão - têm relação com os membros do corpo

humano que, com o sistema metabólico, correspondem ao pólo da vontade

(querer / agir). É através dos membros humanos (pernas e braços) que se

concretizam as ações e pode-se agir em relação ao social. Sua maneira de tocar -

a batida - é uma manifestação de pura vontade.

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40 · Canto:

Como explica Rennó (1998, p. 12), “o canto atua sobre o ser humano,

impulsionando a melhoria de seu estado físico e psicológico",

Segundo Joppert ( www.cantoterapia.com.br), cantar favorece o

desenvolvimento da auto-estima, auto-confiança e auto-valorização; a

compreensão e eliminação dos jogos da vida ( jogos de poder, de salvação, de

perseguição, de manipulação e de competição); trabalha sucesso e fracasso;

confrontos sem medo; assertividade e objetividade; a influência da área emocional

nas situações de evidência, conflito ou crise, e como lidar com esses desafios; o

desabrochar da criança livre (o lúdico) - a importância do prazer e da alegria para

a melhora do sistema imunológico; adrenalina x endorfina e desenvolve a

criatividade.

· Dança:

Segundo Mota e Almeida ( www.xenicare.com.br), a dança favorece o

reconhecimento do corpo por meio da expressão livre e desperta no ser

humano a consciência de potencialidade, atenção, reflexos e habilidades,

estabelecendo ou restabelecendo sua capacidade de expressão, descobrindo e

experimentando o equilíbrio entre corpo e mente.

Através da dança podem ser obtidos os seguintes resultados: regulação da

freqüência respiratória; redução da fadiga; aumento dos estímulos sensoriais

melhorando a atenção e a concentração; desenvolvimento da criatividade;

melhora da capacidade de comunicação; fortalecimento da identidade

pessoal e da auto-estima; aumento da resistência ao estresse e à ansiedade;

facilitação da integração e do desenvolvimento das pessoas; liberação de

adrenalina.

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41

CONCLUSÃO

Uma das interseções entre o aprender e o brincar encontra-se no fato de

que o saber se constrói fazendo próprio o conhecimento do outro, e esta operação

só pode ser realizada através do jogo.

O outro possui o conhecimento, que só pode ser adquirido de maneira

indireta. Ao contrário, o saber, que é uma construção pessoal e outorga

possibilidade de uso, está relacionado com o fazer, com o encarnar o

conhecimento de acordo com as características pessoais.

Não pode haver construção do saber, se não se joga com o conhecimento.

Para construir um saber, para apropriar-se de um conhecimento, deve-se jogar

com a informação como se fosse certa e como se não fosse certa. E é no seio

deste processo que irá se construindo a criação, a possibilidade de transformar o

objeto, de acordo com a experiência de cada um, e por sua vez deixar-se

transformar pela inclusão desse objeto.

O jogo é inerente ao homem e revela sua personalidade integral de forma

espontânea, sendo possível obter dados específicos e diferenciados em relação à

aprendizagem. Assim, aspectos do conhecimento que já possui, do funcionamento

cognitivo e das relações vinculares e significações existentes no aprender, o

caminho usado para aprender ou não aprender, o que pode revelar, o que precisa

esconder e como o faz podem ser claramente observados através do jogo.

O brinquedo possui muitas das características dos objetos reais, mas pelo

seu tamanho, pelo fato de que a criança exerce domínio sobre ele, pois o adulto

outorga-lhe a qualidade de algo próprio e permitido, transforma-se no instrumento

para domínio de situações penosas, difíceis, traumáticas, que se engendram na

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42 relação com os objetos reais. Também o brinquedo é substituível e permite que a

criança repita, à vontade, situações prazerosas e dolorosas que, entretanto, ela

por si mesma não pode reproduzir no mundo real.

Enquanto se diverte, a criança vive momentos de reencontro com seu

próprio eu, com suas necessidades, com seus desejos e fantasias que são

canalizados por meio do brinquedo.

Com a observação da criança brincando é possível descobrir em que nível

de desenvolvimento cognitivo ela se encontra e verificar se existe algum atraso ou

problema no seu crescimento. Há aprendizagem a respeito da língua e do meio

social mediante a observação e a execução desses padrões nos jogos e nas

brincadeiras.

Num processo de aprendizagem o ideal é vivenciar para depois

compreender e, jogando, é possível simular diversas situações. Quando o

participante se envolve no jogo, ele o analisa criticamente e extrai algum tipo de

"insight", aplicando seus resultados na vida prática.

Pode-se concluir, citando Huizinga (1999, p. 75):

“...o jogo permite, pois, ao homem, reencontrar sua

liberdade, através não só de respostas, mas também na

procura de formas novas para os desafios da vida, liberando

sua espontaniedade criativa. O jogo nos devolve, na sua

intensidade, uma fascinante energia que nos possibilita ir e

vir, trocar e transformar, promovendo a descoberta, o

encontro do homem consigo mesmo, com os outros e com o

ambiente em que convive”.

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43

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45

ÍNDICE

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO I 08

AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 08

CAPÍTULO II 20

O BRINCAR 20

1 - FREUD 20

2 – PIAGET 23

CAPÍTULO III 28

AS ATIVIDADES LÚDICAS 28

1 - O JOGO 28

2 - A ARTE 31

3 - A MÚSICA 36

CONCLUSÃO 40

REFERÊNCIAS 42

ÍNDICE 44

FOLHA DE AVALIAÇÃO 45

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46

FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PROJETO A VEZ DO MESTRE

PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

APRENDER BRINCANDO

23 / 07 / 2005

AVALIAÇÃO:

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AVALIADO POR: ______________________________ GRAU: _______________

____________________, _____ de _______________ de _____.