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Apresentação Este livro nasceu da combinação de minha experiência acadêmica com a vivência no Parlamento brasileiro em um período especial de nossa história. O que já podemos denominar a Era Lula representa um daqueles momentos em que uma nação faz desabrochar suas potencialidades antes apenas latentes. A eleição de 2002 representou o renascer da esperança de construção de um Brasil desenvolvido e justo. Energias sociais antes represadas ou excluídas encontraram espaço para participar na formulação e execução das políticas públicas. Os empresários perceberam que a responsabilidade na condução da política macroeconômica e a ênfase na ampliação do mercado de consumo de massas abriam oportunidades de investimento e crescimento. Os setores populares viram sua renda crescer, com dezenas de milhões de pessoas ingressando na classe média. A sociedade civil encontrou canais de participação nos conselhos e conferências setoriais numa dimensão que não havia conhecido até então. Desde o início do meu primeiro mandato de deputado federal, em 2003, tive a consciência de estar participando de um daqueles momentos especiais que a história posteriormente haverá de registrar em todo o seu alcance. Sabia que a eleição de Lula e as escolhas de seu governo significavam mais que uma rotineira alternância de poder. Percebia que se estava em curso uma ruptura democrática dos antigos padrões excludentes da vida pública brasileira. Minha vida acadêmica sempre fora marcada pela reflexão sobre os caminhos a serem seguidos para que a sociedade seja mais justa. Da mesma forma que o exercício da advocacia, onde busquei combinar a atividade prática com o necessário embasamento teórico. Assim também procurei fazer no exercício do mandato de deputado federal. A ação parlamentar e as difíceis escolhas que temos de fazer em cada voto ou projeto de lei apresentado devem estar guiadas por uma concepção de sociedade. Sem uma boa teoria e um bom projeto de sociedade a ação parlamentar corre o risco de se perder nas inúmeras pressões do dia a dia. Por isto, ao longo desses sete anos, recolhi a experiência do envolvimento nos debates políticos e procurei embasá-la nas concepções que explicito nos ensaios que compõem este livro. Entre uma sessão parlamentar e outra, sobretudo nos recessos, inclusive em períodos como professor visitante em universidades como a de Oxford, ou servindo-me de bibliotecas como a da Gergetown University, pude pesquisar e refletir sobre os dilemas vividos pelo Brasil na nova fase inaugurada em 2002. Alguns dos ensaios ora apresentados foram concebidos em meio ao calor das disputas políticas. Outros surgiram de uma reflexão um pouco mais distanciada proporcionada pelo ambiente acadêmico. Combinam-se, todavia, porque explicitam uma concepção específica sobre desenvolvimento, democracia e cultura política. Buscam imprimir uma direção teórica comum na abordagem de problemas específicos. A Primeira Parte - Democracia e Cultura Política na Era Lula - inicia por uma avaliação sobre as debilidades da democracia e da cultura política na América Latina e no Brasil. Embora registre a consolidação democrática do continente, realço a persistência de conhecidas insuficiências no funcionamento democrático das nossas instituições e em nossa cultura política. A análise da política externa e das escolhas econômicas feitas no início do governo ajudam-nos a avaliar os avanços e limites da contribuição do PT e do Governo Lula ao aprofundamento da nossa democracia. Na Parte 2 - A Reforma das Instituições - começo por apresentar um estudo sobre o estágio das discussões em torno das reformas eleitorais no mundo, focando o dilema brasileiro. Depois de apresentar o debate específico sobre as fracassadas tentativas de reforma política nas duas últimas legislaturas, apresento algumas reflexões sobre as reformas sindical, tributária e judiciária, onde muito ainda há por fazer. Na Parte 3 - Desenvolvimento

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Apresentação

Este livro nasceu da combinação de minha experiência acadêmica com a vivência no Parlamento brasileiro em um período especial de nossa história. O que já podemos denominar a Era Lula representa um daqueles momentos em que uma nação faz desabrochar suas potencialidades antes apenas latentes. A eleição de 2002 representou o renascer da esperança de construção de um Brasil desenvolvido e justo. Energias sociais antes represadas ou excluídas encontraram espaço para participar na formulação e execução das políticas públicas. Os empresários perceberam que a responsabilidade na condução da política macroeconômica e a ênfase na ampliação do mercado de consumo de massas abriam oportunidades de investimento e crescimento. Os setores populares viram sua renda crescer, com dezenas de milhões de pessoas ingressando na classe média. A sociedade civil encontrou canais de participação nos conselhos e conferências setoriais numa dimensão que não havia conhecido até então. Desde o início do meu primeiro mandato de deputado federal, em 2003, tive a consciência de estar participando de um daqueles momentos especiais que a história posteriormente haverá de registrar em todo o seu alcance. Sabia que a eleição de Lula e as escolhas de seu governo significavam mais que uma rotineira alternância de poder. Percebia que se estava em curso uma ruptura democrática dos antigos padrões excludentes da vida pública brasileira. Minha vida acadêmica sempre fora marcada pela reflexão sobre os caminhos a serem seguidos para que a sociedade seja mais justa. Da mesma forma que o exercício da advocacia, onde busquei combinar a atividade prática com o necessário embasamento teórico. Assim também procurei fazer no exercício do mandato de deputado federal. A ação parlamentar e as difíceis escolhas que temos de fazer em cada voto ou projeto de lei apresentado devem estar guiadas por uma concepção de sociedade. Sem uma boa teoria e um bom projeto de sociedade a ação parlamentar corre o risco de se perder nas inúmeras pressões do dia a dia. Por isto, ao longo desses sete anos, recolhi a experiência do envolvimento nos debates políticos e procurei embasá-la nas concepções que explicito nos ensaios que compõem este livro. Entre uma sessão parlamentar e outra, sobretudo nos recessos, inclusive em períodos como professor visitante em universidades como a de Oxford, ou servindo-me de bibliotecas como a da Gergetown University, pude pesquisar e refletir sobre os dilemas vividos pelo Brasil na nova fase inaugurada em 2002. Alguns dos ensaios ora apresentados foram concebidos em meio ao calor das disputas políticas. Outros surgiram de uma reflexão um pouco mais distanciada proporcionada pelo ambiente acadêmico. Combinam-se, todavia, porque explicitam uma concepção específica sobre desenvolvimento, democracia e cultura política. Buscam imprimir uma direção teórica comum na abordagem de problemas específicos. A Primeira Parte - Democracia e Cultura Política na Era Lula - inicia por uma avaliação sobre as debilidades da democracia e da cultura política na América Latina e no Brasil. Embora registre a consolidação democrática do continente, realço a persistência de conhecidas insuficiências no funcionamento democrático das nossas instituições e em nossa cultura política. A análise da política externa e das escolhas econômicas feitas no início do governo ajudam-nos a avaliar os avanços e limites da contribuição do PT e do Governo Lula ao aprofundamento da nossa democracia. Na Parte 2 - A Reforma das Instituições - começo por apresentar um estudo sobre o estágio das discussões em torno das reformas eleitorais no mundo, focando o dilema brasileiro. Depois de apresentar o debate específico sobre as fracassadas tentativas de reforma política nas duas últimas legislaturas, apresento algumas reflexões sobre as reformas sindical, tributária e judiciária, onde muito ainda há por fazer. Na Parte 3 - Desenvolvimento

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Sustentável e Mudança Cultural, faço uma crítica ao modelo concentrador de desenvolvimento até então experimentado no Brasil, sinalizando com novos vetores, como o ambiental e as lutas emancipatórias, a serem incorporados ao projeto de desenvolvimento sustentável e inclusionário inaugurado com a Era Lula. Na conclusão, procuro fazer um balanço dos avanços econômicos e sociais do período, realçando algumas mudanças no como fazer e na cultura política subjacente às acões do Governo Lula. Neste balanço, termino por refletir sobre os desafios ainda por enfrentar, registrando a urgência do enfrentamento da questão tributária, do sistema eleitoral e da reforma tanto estrutural quanto cultural do estado brasileiro.