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A tualmente, os direitos humanos constituem um dos temas que tem despertado maior interesse entre pesquisadores e gestores públicos, em virtude das injustiças que teimam em se fazer presentes nas relações humanas. A afirmação dos direitos humanos em sociedades com índices altos de vulnerabilidade social, passa pelo seu reconhecimento enquanto tema pertinente ao desenvolvimento humano dos indivíduos. Con- jugando direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, os direitos humanos formam um todo indivisível, interdependente e inter-relacionado. Destaca-se que o exercício da alteridade conduz ao reconhecimento da condição do outro em relação à minha própria, sem que a sua existência deva partir da minha e sem que o meu entendimento sobre o mundo do outro deva partir do meu entendimento sobre a minha existência, ou seja, a minha verdade não é a verdade do mundo. A verdade é um campo de lutas, onde cada indivíduo tenta impor o seu entendimento. O reconhecimento do outro, perante o “meu eu”, torna a relação humana mais tolerante, mais respeitosa e por conseqüência, menos violenta. Às exigências inerentes à condição na- tural da pessoa humana reclama-se o reconhecimento, tutela e promoção por parte de todos, contudo, especialmente dos agentes de autoridade. Dessa forma, a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, através da Se- cretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana, por meio da Coordenação de Políticas de Direitos Humanos, publica, a começar por esse exemplar, o Caderno de Direitos Humanos de Porto Alegre. Parte integrante das ações da Secretaria, o Caderno de Direitos Humanos será um veículo de comunicação sobre políticas públicas, direitos humanos e segurança pública da cidade. Porém, não será um veículo qualquer. Ele se formata enquanto o porta-voz dos gestores públicos, pesquisadores, professores e acadêmicos, movimentos sociais e militantes da área. Seu papel será fundamental na construção que estamos realizando da política municipal de direitos humanos e segurança urbana. Demonstrará os desafios vivenciados e os avanços alcançados. Além de divulgar a nova realidade com que as Organizações Públicas Estatais estão lidando com a questão, tem o objetivo de corroborar e fortalecer as ações da Prefeitura Municipal na direção de uma cidade mais justa e igualitária. Dessa forma, convido a todos para leitura dessa publicação, que se guia no Eixo Orientador Educação e Cultura em Direitos Humanos, do Programa Nacional de Direitos Humanos 3. O dia 10 de dezembro, Dia Internacional da Declaração Universal dos Direitos Humanos, encerra a programação da Semana de Direitos Humanos de Porto Alegre, todavia, marca o início de uma nova rodada de discussões sobre a dignidade e o respeito à pessoa humana na cidade e o lançamento desse caderno, traduz de forma coletiva e solidária, o empenho e dedicação da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana nessa direção. Coordenação de Políticas de Direitos Humanos Secretário Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana APRESENTAÇÃO

APRESENTAÇÃO Alproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/smdh/usu_doc/...de vulnerabilidade social, passa pelo seu reconhecimento enquanto tema pertinente ao desenvolvimento humano dos

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Atualmente, os direitos humanos constituem um dos temas que tem despertado maior interesse entre pesquisadores e gestores públicos, em virtude das injustiças que teimam em se fazer presentes nas relações humanas. A afirmação dos direitos humanos em sociedades com índices altos de vulnerabilidade social, passa pelo seu reconhecimento

enquanto tema pertinente ao desenvolvimento humano dos indivíduos. Con-jugando direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, os direitos humanos formam um todo indivisível, interdependente e inter-relacionado.

Destaca-se que o exercício da alteridade conduz ao reconhecimento da condição do outro em relação à minha própria, sem que a sua existência deva partir da minha e sem que o meu entendimento sobre o mundo do outro deva partir do meu entendimento sobre a minha existência, ou seja, a minha verdade não é a verdade do mundo. A verdade é um campo de lutas, onde cada indivíduo tenta impor o seu entendimento. O reconhecimento do outro, perante o “meu eu”, torna a relação humana mais tolerante, mais respeitosa e por conseqüência, menos violenta. Às exigências inerentes à condição na-tural da pessoa humana reclama-se o reconhecimento, tutela e promoção por parte de todos, contudo, especialmente dos agentes de autoridade.

Dessa forma, a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, através da Se-cretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana, por meio da Coordenação de Políticas de Direitos Humanos, publica, a começar por esse exemplar, o Caderno de Direitos Humanos de Porto Alegre. Parte integrante das ações da Secretaria, o Caderno de Direitos Humanos será um veículo de comunicação sobre políticas públicas, direitos humanos e segurança pública da cidade. Porém, não será um veículo qualquer. Ele se formata enquanto o porta-voz dos gestores públicos, pesquisadores, professores e acadêmicos, movimentos sociais e militantes da área.

Seu papel será fundamental na construção que estamos realizando da política municipal de direitos humanos e segurança urbana. Demonstrará os desafios vivenciados e os avanços alcançados. Além de divulgar a nova realidade com que as Organizações Públicas Estatais estão lidando com a questão, tem o objetivo de corroborar e fortalecer as ações da Prefeitura Municipal na direção de uma cidade mais justa e igualitária. Dessa forma, convido a todos para leitura dessa publicação, que se guia no Eixo Orientador Educação e Cultura em Direitos Humanos, do Programa Nacional de Direitos Humanos 3.

O dia 10 de dezembro, Dia Internacional da Declaração Universal dos Direitos Humanos, encerra a programação da Semana de Direitos Humanos de Porto Alegre, todavia, marca o início de uma nova rodada de discussões sobre a dignidade e o respeito à pessoa humana na cidade e o lançamento desse caderno, traduz de forma coletiva e solidária, o empenho e dedicação da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana nessa direção.

Coordenação de Políticas de Direitos HumanosSecretário Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana

A P R E S E N T A Ç Ã O

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I N D I C EPrefeito

José FortunatiSecretário de Direitos Humanos e Segurança UrbanaNereu D’AvilaSecretária AdjuntaGuacyra Lima ÁvilaCoordenação de Direitos HumanosMário Humberto Morocini de Azambuja JúniorNúcleo de Políticas Públicas para os Povos IndígenasLuiz Fernando Caldas FagundesNúcleo de Políticas Públicas para MulheresKatia Santa Catharina da SilveiraNúcleo de Políticas Públicas para Livre Orientação SexualMário Humberto Morocini de Azambuja JúniorCentro de Referência às Vítimas de ViolênciaMaria Helena de CastilhosCoordenação de Assessoria ComunitáriaFábio Evandro Pereira de SouzaCoordenação de Pesquisa e FormaçãoBeatriz Morem da CostaCoordenação dos TelecentrosCarla Gut NassifComando da Guarda MunicipalComandante Roben Roges da Silva MartinsSubcomandante Ricardo MaiaJornalista ResponsávelNereida Ramos Rodrigues – MTB 5256Projeto Gráfico e EditoraçãoAmarílis Barcelos – DRT/RS - MTB 799/800Fotografia da CapaDanilo Christidis (Cultura Material Kaingang)TextosCompilação de relatórios, pareceres, manifesta-ções, instruções, projetos, atas, publicações, en-tre outros documentos administrativos, de autoria de Ana Elisa de Castro Freitas, ex-coordenadora do Núcleo e, Luiz Fernando Caldas Fagundes, atual coordenador, todos produzidos enquanto servidores do Município de Porto Alegre.

Elaboração, distribuição e informações:SECRETARIA MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E SEGURANÇA URBANACoordenação de Direitos HumanosAv. Padre Cacique, 708 – CEP: 90810-240Telefone: (51) 3289.7034 / 7036

Home page: www.portoalegre.rs.gov.br/smdhsu

E X P E D I E N T E

Apresentação 1

Secretaria Municipal de Direitos Humanos e

Segurança Urbana 3

Núcleo de Políticas Públicas para os Povos

Indígenas - NPPPI/CDH/SMDHSU 5

Elaboração e Gestão de Projetos Específicos

Direcionados aos Povos Indígenas 7

Educação em Direitos Humanos 9

Políticas Específicas de

Regularização Fundiária 12

Leis e Decretos Municipais 13

Outra Voz e Outro Ponto de Vista 19

Cosmo-ecologia Mbyá-Guarani 24

Multiculturalismo e

Políticas Públicas: reconhecimento

das formas de organização social

de grupos indígenas 25

Atividades Técnicas do NPPPI/CDH/SMDHSU 31

Um Pouco de Legislação Indigenista 32

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3caderno de direitos humanos

A Câmara de Vereadores de Porto Ale-gre, através da Lei 9.056 de 27 de dezem-bro de 2002, criou a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana. Seu objetivo é coordenar e fiscalizar ações e programas voltados aos direitos civis, po-líticos, econômicos, sociais e culturais de setores historicamente excluídos e discrimi-nados, estabelecendo políticas de prevenção à violência.

A criação da SMDHSU significa um avanço para o trato das políticas de Direitos Humanos. Também coloca o governo mu-nicipal no papel de agente de promoção da igualdade e enquanto esfera governamental, com responsabilidades na questão da segu-rança urbana, dentro das atribuições consti-tucionais.

A constituição de uma secretaria que implemente políticas com diretrizes voltadas à transversalidade, à universalidade, à indi-visibilidade e à interdependência dos Direitos Humanos, demonstra o compromisso da ca-pital gaúcha com a inclusão social. Tudo isso coloca Porto Alegre novamente na vanguarda das cidades do mundo. A Secretaria funciona através das seguintes coordenadorias:

Coordenação de Direitos HumanosA Coordenação de Direitos Humanos é

o resultado do processo de construção, am-pliação e qualificação da cidadania, em es-pecial dos setores discriminados e vítimas de violência na cidade de Porto Alegre. Os preconceitos, discriminações, exclusões e a violência real e simbólica têm historicamente pautado o cotidiano das classes populares.

A situação é ainda mais dramática para pobres, mulheres, negros, homossexuais, povos indígenas, portadores de deficiência, juventude, crianças e adolescentes, idosos, portadores de HIV, profissionais do sexo, tra-vestis, enfim a maioria da população que é discriminada por suas características e for-

mas de inserção social. Setores, portanto, mais vulneráveis às violações de direitos, por não se enquadrarem nos padrões dominantes estabelecidos.

A sociedade transforma as diferenças em desigualdades, onde o acesso aos bens eco-nômicos, sociais, políticos e culturais se dá de forma excludente. Os Direitos Humanos na sociedade brasileira assumem importân-cia estratégica para a consolidação de uma democracia efetiva, que incorpore a justiça social, a liberdade e o respeito às diferenças.

A Coordenação de Direitos Humanos orienta seu trabalho de acordo com os se-guintes eixos: promoção dos Direitos Huma-nos a partir de políticas públicas afirmativas desenvolvidas de forma integrada e articula-das com os diferentes setores da administra-ção municipal; defesa dos Direitos Humanos através do atendimento e encaminhamento de denúncias de violações de direitos.

Coordenação de Segurança UrbanaA Coordenação de Segurança Urbana é o

setor da SMDHSU responsável pelas políticas de segurança e de prevenção à violência. Tem como principais atribuições, estabelecidas na Lei nº 9.056/2002, promover a participa-ção da sociedade para a construção de uma segurança pública comunitária, identificar e diagnosticar causas e conseqüências da vio-lência urbana e intermediar com o poder pú-blico as demandas das comunidades.

Além disso, presta assessoria técnica e suporte administrativo ao Conselho Munici-pal de Justiça e Segurança (CMJS) e aos Fó-runs Regionais de Justiça e Segurança (FRJS) implantados nas dezesseis regiões do Orça-mento Participativo de Porto Alegre.

Coordenação de Pesquisa e FormaçãoA Coordenação de Pesquisa e Formação

tem como atribuição a elaboração de es-tudos, pesquisas e projetos em direitos hu-

SECRETARIA MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E SEGURANÇA URBANA / SMDHSU

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manos e segurança urbana, assessorando tecnicamente as ações empreendidas pela SMDHSU.

A partir de 2008, com a criação do Gabinete de Gestão Integrada Municipal – GGIM e implantação do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania – PRO-NASCI em Porto Alegre, assumiu também atribuições de Secretaria Executiva do GGIM. Entre as suas competências incluem-se: de-senvolver estudos e pesquisas sobre violên-cia urbana e violações dos direitos huma-nos em Porto Alegre; elaborar projetos para convênios com o governo federal na área de direitos humanos e segurança pública; mo-nitorar pactos, convenções, tratados, resolu-ções, conferências e outros instrumentos de promoção e defesa dos direitos humanos; assessorar técnica e administrativamente o Gabinete de Gestão Integrada Municipal; gerenciar, acompanhar e avaliar as ações do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania no âmbito da Prefeitura de Porto Alegre; e articular o Gabinete de Ges-tão Integrada Municipal com os conselhos e fóruns comunitários de Justiça e Segurança.

Coordenação de Assessoria ComunitáriaA Assessoria Comunitária tem o objeti-

vo de colaborar para a melhoria das ações a serem desenvolvidas nas comunidades, na mobilização, na inclusão, na participação co-letiva, no entendimento da problemática da segurança de um modo geral e amplo, ins-tigando as pessoas ao debate, ocupando os espaços e constituindo soluções capazes de atenderem suas necessidades.

Coordenação dos TelecentrosA Coordenação dos Telecentros visa a

promoção da inclusão digital de pessoas sem acesso às novas tecnologias da informação. Os telecentros funcionam em parceria com a comunidade e apoio de empresas privadas. O Plano de Inclusão Digital, com telecentros em diferentes pontos da cidade, promove iniciação à informática e oferece noções de

cidadania, além de orientações sobre o bom uso de ferramentas como a Internet.

Os telecentros estão incluídos no Pro-grama Segurança Cidadã, coordenado pela SMDHSU, que objetiva retirar os jovens das ruas e combater a violência e a criminalidade por meio da inclusão digital.

Centro de Referência às Vítimas de Violência

O CRVV é um serviço do Município, em parceria com o Governo Federal, criado para prestar informações e orientações às vítimas de violações de direitos, abuso de autoridade, exploração sexual e qualquer tipo de discriminação. O CRVV é um servi-ço gratuito aberto à população e em geral, tendo como pressuposto o trabalho desen-volvido quanto a questão da garantia e a não violação dos direitos. Entretanto, como forma de publicizar a importância das ativi-dades prestadas, desenvolve demais ativi-dades, como: organizar e promover ativida-des pedagógicas, psicossociais e palestras com grupos de vítimas, familiares e amigos das vítimas por categorias de violência; ca-pacitar atores sociais para atuarem como multiplicadores de ações educativas volta-das para a prevenção da violência; partici-par de movimentos e lutas contra a impuni-dade, a violência e em defesa da vida e dos Direitos Humanos; estabelecer parcerias com instituições do setor público e privado para o desenvolvimento de atividades volta-das para a prevenção da violência; implan-tar um Banco de Dados sobre violência e vitimização referente às atividades desen-volvidas pelo programa.

O CRVV conta com uma equipe de as-sistentes sociais e psicólogos, que realizam atendimento integrado. Esses profissionais atendem os usuários do serviço pessoal-mente na sede do CRVV, ou por telefone. Seja qual for o tipo de acesso escolhido, será dado o devido acolhimento e encami-nhamento. Qualquer pessoa pode acessar o CRVV, é só discar 0800-5410803 (liga-ção gratuita) de segunda a sexta-feira, das 8h30min às 18h, ou em sua sede na Rua Miguel Teixeira, 86, Bairro Cidade Baixa.

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5caderno de direitos humanos

Inúmeras pesquisas arqueológicas, his tó-ri cas e etnológicas nos informam que os povos indígenas estão nas cidades desde o tempo em que elas se esboçavam como pequenas vilas isoladas. Portanto, são elas, as cidades, que se assentaram sobre territórios pretéritos indígenas, e não o contrário. Considerando a região onde está localizada a cidade de Porto Alegre, sabe-se que nela se situam territórios de pertencimento de distintos povos indígenas há pelo menos 9.000 anos antes do presente.

Nesta paisagem, atualmente vivem pessoas indígenas pertencentes às etnias Kaingang, Guarani e Charrua. Os coletivos guarani moram em áreas na Lomba do Pinheiro, no Cantagalo e no Lami; o coletivo charrua está localizado na zona rural da Lomba do Pinheiro; e os coletivos kaingang vivem em pequenas áreas nos bairros Lomba do Pinheiro, Jarí, Safira, Glória e Tristeza. Embora restritos a diminutas áreas de moradia, os territórios de vida e circulação destes indígenas abrangem a Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba como um todo, incluindo florestas, campos e cidades – ruas, bairros, feiras, parques, rodoviárias. Esta fantástica sócio-diversidade infelizmente é pouco conhecida dos porto-alegrenses, sen do por isso pouco respeitada e valorizada.

Estes coletivos, através de suas lideranças políticas e espirituais, têm incitado o poder público municipal a criar espaços de escuta e participação que considerem suas perspectivas, pautas e demandas, visando assim conhecer e respeitar as suas formas próprias de existir. Em especial, após a participação destas lideranças na Assembleia Nacional Constituinte em 1988, a presença indígena em Porto Ale gre tem produzido importantes mudanças na es trutura administrativa do município.

Visando encaminhar institucionalmente as demandas apresentadas pelas lideranças indígenas junto à municipalidade, em 1997, foi criado no âmbito da Prefeitura Municipal o Grupo de Trabalho para os Povos Indígenas (GTPI/PMPA), vinculado à Coordenadoria de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC). Este GT,

NÚCLEO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA OS POVOS INDÍGENAS

NPPPI/CDH/SMDHSU

coordenado pela Assessoria dos Povos Indígenas/CDHC, foi oficialmente instituído através da Ordem de Serviço nº 11/1998, que tinha por diretriz “articular todas as iniciativas existentes na administração municipal no que se refere à questão indígena”.

Em maio de 1998, realizou-se em Porto Alegre, a Iª Conferência Municipal dos Direitos Humanos. A preparação do evento se deu a partir de três seminários temáticos e cinco encontros setoriais: a questão da mulher; a população negra e o combate ao racismo; sobre os portadores de deficiência; juventude; e livre orientação sexual. Além destes encontros, aconteceram reuniões específicas sobre a situação dos idosos e povos indígenas. Este período institucionalizou as alteridades indígenas na administração municipal e nos fóruns públicos realizados na cidade.

Dois anos após, em junho de 2000, realizou-se a IIª Conferência Municipal de Direitos Humanos, que aprovou como diretriz a criação de uma Secretaria Municipal de Direitos Humanos, como forma de articular e encaminhar as demandas contra as diversas formas de discriminação, violência e exclusão em Porto Alegre. Como etapas preparatórias deste encontro foram realizadas oito Pré-Conferências temáticas. O eixo Povos Indígenas resolveu “Reconstruir identidades e atingir a condição de cidadão em um meio totalmente adverso, excludente e discriminador é o grande desafio para os povos kaingangues e mbyá-guaranís”.

Em dezembro de 2002, como resultado das demandas dos movimentos sociais, debatidas e aprovadas nas Iª e IIª Conferência Municipal de Direitos Humanos – com participação ativa de lideranças indígenas –, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre criou através da Lei nº 9.056, a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana (SMDHSU). Neste contexto, a antiga Coordenadoria de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC) reestruturou-se em Coordenação de Direitos Humanos (CDH). Surge assim, sob a coordenação da CDH, o Núcleo de Políticas Públicas para os Po vos Indígenas (NPPPI/CDH/SMDHSU).

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O NPPPI/CDH/SMDHSU, desta forma, é o expoente máximo deste processo histórico de transformação administrativa na Prefeitura Municipal de Porto Alegre, demonstrando assim que não apenas o processo civilizador afetou historicamente as instituições indígenas, mas de que as instituições indígenas também afetaram e afetam historicamente mudanças na sociedade nacional. O desafio desta estrutura administrativa municipal é criar espaços interétnicos e dialógicos que orientem a gestão de ações, projetos, pro-gramas e políticas públicas transversais pautadas pela escuta tecnicamente qualificada e atenta aos interesses indígenas, e pelo respeito à diferença à luz da Legislação Indigenista Brasileira.

Em conformidade com a Lei Orgânica do Município de Porto Alegre, que afirma a competência do poder público municipal na promoção e estabelecimento de projetos especiais com vistas à valorização das tradições socioculturais indígenas como parte da vida cultural do município, o NPPPI/CDH//SMDHSU vem elaborando diretrizes e instrumentos normativos municipais considerando os conceitos de autonomia e sustentabilidade como eixos orientadores; gerindo projetos e políticas públicas específicas e diferenciadas de temática em direitos humanos, saúde, educação, patrimônio material e imaterial, segurança alimentar; mediando e estabelecendo acordos e ajustes de conduta relativos ao acesso à terra e moradia (garantia de espaços para “fazer aldeia e comunidade”), aos ecossistemas (espaços territoriais de florestas e campos da Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba) e a garantia de espaços para comercialização artesanal (acesso às feiras e possibilidade de comercializar nestes espaços), fomento aos sistemas produtivos indígenas tradicionais (do artesanato, da circulação no território, das “visitas de parentes”, do incentivo à família indígena, do reconhecimento da autoridade de seus líderes espirituais e políticos); promovendo, apoiando e participando de diversos eventos sobre a questão indígena (cursos, seminários, conferências, mostras cinematográficas, etc.); e produzindo publicações escritas e audiovisuais com ampla participação indígena, visando divulgar para a todos os segmentos da sociedade os direitos socioculturais destes coletivos, e primordialmente garantir, em Porto Alegre, o

direito a sua autonomia, organização social e a propriedade de seu patrimônio cultural e ambiental.

As ações desenvolvidas pelo NPPPI/CDH/SMDHSU, são pautadas pela visitação continuada aos coletivos e áreas de vida indígenas, visando realização de reuniões com lideranças políticas e espirituais, especialistas, agentes indígenas de saúde, professores bilíngues e comunidades indígenas; o acompanhamento de programas e políticas voltados aos povos indígenas, especialmente no âmbito municipal; e a formulação de políticas públicas visando à promoção, proteção e valorização da qualidade de vida dos povos indígenas, sempre considerando outras esferas governamentais e não-governamentais e suas competências, e principalmente, as formas autônomas de organização indígena que orientam todo este processo.

Nestes termos, deve-se reconhecer aos in dí genas o direito de terem suas instituições tra dicionais ouvidas e respeitadas no enca mi-nhamento de qualquer questão que envolva seus interesses, conforme o artigo 7º do Decreto 5.051/2004. Ver e ouvir o que os coletivos indígenas, suas lideranças e pessoas têm a dizer sobre situações que envolvam suas demandas é mais do que uma medida ética e respeitosa, é uma determinação legal.

* Indicado pelo Observatório Inter-dis ciplinar de Direitos Humanos da Uni-versidade Federal do Rio Grande do Sul, ao Prêmio Direitos Humanos 2010 da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República – Categoria Garantia dos Direitos dos Povos Indígenas.

ContatoAv. Padre Cacique, 708CEP: 90810-240 – Bairro Praia de BelasPorto Alegre/RSFone: (51) 3289.7036E-mail: [email protected] http://www2.portoalegre.rs.gov.br/smdhsu/default.php?p_secao=143

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7caderno de direitos humanos

artesãos kaingang já cursaram os Módulos “Sensibili-zação”, “Aperfeiçoamento” e “Criação”, e atualmente cursam o Módulo “Sustentabilidade”, que visa o aper-feiçoamento de uma linha de bens cerâmicos kaingang para exposição e comercialização de sua arte cerâmica nas Feiras de Artesanato da cidade.

Projeto Acervo da Cul-tura Material dos Co-letivos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba1

Em 2010 a SMDHSU, através do NPPPI, adquire sessenta e duas peças da cultura material guarani (ces-tarias, esculturas zoomorfas em madeira, instrumentos musicais, entre outras) diretamente dos artesãos das comunidades indígenas localizadas no município. Este projeto objetiva a garantia aos povos indígenas de sua autonomia, organização social e a propriedade do seu patrimônio cultural. Além disso, busca subsidiar ações pedagógicas na Rede Municipal de Ensino, através da divulgação dos saberes e práticas tradicionais indígenas, em cumprimento a Lei n° 11.645/2008, que institui a obrigatoriedade da temática história e cultura afro--brasileira e indígena no ensino fundamental e médio de instituições educacionais pú blicas e privadas. Em 2011 serão adquiridas peças da cultura material kaingang, e em 2012, da cultura charrua.

Projeto Valorização e Proteção do Patrimônio Imaterial dos Coletivos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba

Consiste na aquisição de patrimônio intangível in-dígena (CD’s, DVD’s, Filmes, Livros, etc.), produzidos pelas comunidades localizadas em Porto Alegre, e que são distribuídos gratuitamente à Rede Municipal de En-sino, visando subsidiar ações pedagógicas em cumpri-mento a Lei n° 11.645/2008, ao mesmo tempo em que fomenta as iniciativas indígenas e contribui para a pre-servação da diversidade étnica e cultural do município.

Iniciou em 2010, com a aquisição de 100 Livros--CD Yvý Poty, Yva’á – Flores e Frutos da Terra, de Cantos e Danças Tradicionais Mbyá-Guarani da Terra Indígena Cantagalo. Neste Livro-CD figuram principalmente os mboraí, cantos tradicionais sagrados, que remetem a temas da cosmologia guarani, principalmente a comuni-

Projeto Festas Tradicionais Indígenas

O NPPPI/CDH/SMDHSU apóia as iniciativas e práticas tradicionais das cole-tividades indígenas, contribuindo assim para a melhoria das condições de repro-

dução e transmissão de seus sistemas sócio-culturais. São encontros comunitários que acontecem nos meses de abril e dezembro nas áreas de vida kaingang, guarani e charrua. Em conversa com lideranças e especialistas indígenas, o NPPPI/CDH/SMDHSU, intera-se das datas da realização das festas e fomenta-as através da aqui-sição e distribuição de alimentos visando à elaboração de comidas típicas. Estas celebrações possibilitam uma intensa e extensa circulação das pessoas que compõem as redes de parentesco destes coletivos.

Projeto Fazendo Cerâmica Hoje como Nossos Avós

Em andamento desde 2006, concretiza o sonho kaingang de fazer cerâmica em Porto Alegre. Fruto da parceria entre os Kaingang e as Secretarias Municipais de Educação (SMED) e de Direitos Humanos e Segu-rança Urbana (SMDHSU), consiste em oficinas de arte--cerâmica ministradas por professores e jovens artesãos estudantes não indígenas da Escola Porto Alegre/SMED, dirigidas aos indígenas. As oficinas visam à valorização dos saberes, das técnicas e formas da cultura material e imaterial kaingang, em diálogo com os conhecimen-tos e técnicas acadêmicas, contando com a assessoria antropológica do NPPPI/CDH/SMDHSU. Esta política pública objetiva mais uma alternativa de sustentabili-dade indígena a partir do resgate da relação dos Kaingang com os solos cerâmicos das várzeas dos rios, am-biente historicamente privilegiado em ter-mos culturais e rituais para este coletivo. Os

ELABORAÇÃO E GESTÃO DE PROJETOS ESPECÍFICOS DIRECIONADOS

AOS POVOS INDÍGENAS

Festa Kaingang em 2010 Fot

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Projeto Cerâmica na Feira de Artesanato do Brique da Redenção

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EDFoto: Danilo Christidis

1Ver nessa revista o artigo Multiculturalismo e Políticas Públicas: reconhecimento das formas de organização social de grupos indígenas, de autoria de Carlos Rogério Guedes Pires, Assessor Jurídico/SMDHSU

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cação com as divindades. A partir dos ensinamentos dos karaí – lideranças espirituais – acerca da importância da vida comunitária, sublinha-se que os cantos e danças das crianças são uma importante dimensão dos sabe-res tradicionais que devem continuar a ser transmitidos. Este é um documento sonoro que homenageia todos os Guarani que buscam a preservação de suas práticas/saberes e a transmissão cultural inter-geracional.

Em 2011, projeta-se a produção de 1.000 cópias do CD “Kanhgág Ag Vi Ymã Mág Ki (Vozes Kaingang na Aldeia Grande – 1997, esgotado), registro de expressões musicais relacionadas ao universo cultural dos kófa (ve-lhos). Inicia com os cantos do gufã (tempo mitológico), particularmente, os sons dos bichinhos do mato canta-dos pelos adultos às crianças. A seguir, traz os cantos relacionados a diversas fases do ciclo da vida, onde apa-recem as músicas criadas por seus antepassados para momentos do cotidiano ou de rituais. Por fim, registra os cantos de guerra referentes às antigas disputas ocor-ridas nos séculos XVIII e XIX com os índios kanhgág ju, literalmente “índios brabos”, termo associado ao povo Xokleng.

Da mesma forma, pretende-se adquirir 100 DVD’s do filme “Mokoi Tekoá Petei Jeguatá (Duas aldeias, uma caminhada – 63 min., 2008), realizado por jo-vens cineastas mbyá-guarani da Comunidade da Lomba do Pinheiro. Ganhador do prêmio de melhor filme no ForumDoc/BH, em 2008, este documentário acompa-nha através de três jovens guarani o dia-a-dia de duas comunidades unidas pela mesma história, do primeiro contato com os europeus até o intenso convívio com os brancos de hoje. Sem matas para caçar e sem terras para plantar, atualmente os Mbyá-Guarani dependem da venda do seu artesanato para sobreviver

Projeto Encontro de Medicina Tradicional Kaingang: Os Kujà vão à frente

Apoiados pelo NPPPI/CDH/SMDHSU, e em con-junto com a FUNASA, os Kaingang realizaram em 2006 e 2007, grandes celebrações em Porto Alegre, cujo objetivo foi concretizar a vontade de reunir os ho-mens e as mulheres reconhecidos enquanto detentores de saberes e práticas que os legitimam como protago-nistas de instituições associadas a uma ciência mile-nar, o que se têm denominado “medicina tradicional kaingang”. Trata-se de um sistema médico xamânico, nos quais doença e saúde fazem parte de um sistema cosmológico e os fatores físicos, sociais e espirituais interagem no processo saúde/doença e cura, baseado em princípios epistemológicos bastante diferentes da biomedicina.

Em 2006, no I Encontro dos Kujà: o Papel do Kujà na Sociedade Kaingang Contemporânea, os kujà/xamã realizaram rituais, conversaram e orientaram pessoas indígenas, localizaram e identificaram distin-tas espécies de véin katá/remédios-do-mato e deram nomes às crianças. Já em 2007, no II Encontro dos Kujà: Fortalecendo a Medicina Tradicional Kaingang, foi mobilizado junto aos kujà outras classes de espe-cialistas e lideranças kaingang, nominando e posicio-nando todos estas pessoas em conjunto, compondo a teia do xamanismo, seu sistema de medicina tradicio-nal. Trata-se dos pèin/rezadores, pói mbãng/caciques, póì/lideranças político-cerimoniais, wón ten-tàn fág unbrég nïr guèi fón fag-tár/parteiras tradicionais, wón déin fón-fág/cozinheiras indígenas e dos wãnh-wuntàr/dançadores rituais.

O III Encontro de Medicina Tradicional Kaingang: os Kujà vão à frente, promovido por lideranças kain-gang, NPPPI/CDH/SMDHSU, FUNASA, FUNAI/POA, ESP/RS, EMATER, entre outras instituições, realizou--se em Porto Alegre nos dias 25, 26 e 27 de novem-bro de 2010, e deu continuidade ao processo de re-flexão comunitária kaingang, visando à manutenção, atualização e fortalecimento de seu sistema médico xamânico. Esta reunião comunitária emerge como um espaço inspirador e revigorante, fundamental para a promoção das instituições indígenas, revitalizando as redes de sociabilidade e fortalecimento dos sistemas culturais que lhes sustentam. O encontro promove e sublinha o kujà/xamã como eixo semântico de uma teia de praticantes e especialistas que integram o sis-tema xamânico kaingang. Nestes termos, visa possi-bilitar que estes distintos sujeitos indígenas exercitem seus saberes e práticas tradicionais de cuidado com a saúde, compartilhando e mantendo com suas coletivi-dades o bem-estar kaingang.

Pói mbãng/Cacique Valdomiro

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Capacitações em Direitos Sócio-cultu-rais e Cosmologias Indígenas

II Seminário Municipal de Promoção à Igualda-de Étnico-Racial (20/03/2007)

Organizado pelo NPPPI e Núcleo de Políticas Públicas para o Povo Negro/CDH/SMDHSU, dire-cionado aos servidores da administração munici-pal e conselhos setoriais. A temática do encontro foi a transversalidade das políticas públicas muni-cipais como princípio metodológico capaz de criar redes de colaboração entre as diversas secreta-rias, visando a definição de estratégia transver-sal para avançar na elaboração de um plano de políticas de atendimento aos direitos e demandas sociais advindas dos povos indígenas, quilombo-las, comunidades tradicionais e negras existentes no âmbito municipal.

Seminário A Questão Indígena no Rio Grande do Sul (25/04/2007)

Promovido pelo NPPPI/CDH/SMDHSU e Pre-sidência da Câmara Municipal de Porto Alegre, objetivou o conhecimento e o debate da política indigenista no Rio Grande do Sul, visando con-tribuir no enfrentamento da problemática atual e incentivar a continuidade cultural das comunida-des indígenas, garantindo-lhes os direitos asse-gurados na Constituição Federal Brasileira. Além da mediação junto às lideranças indígenas na efetivação da participação destas no seminário, a coordenação do NPPPI/CDH/SMDHSU palestrou no evento abordando “A questão indígena no mu-nicípio do Porto Alegre

IV Conferência Municipal de Direitos Humanos (30/11 e 01/12/2007)

Realizada pelos Núcleos de Políticas Públi-cas para os Povos Indígenas, Povo Negro, Mulher, Livre Orientação Sexual e CRVV da Coordenação de Direitos Humanos/SMDHSU. Temática: Direi-tos Humanos e Segurança Pública – Eixos: Direi-tos Humanos e Segurança Pública; Direitos Hu-manos e Responsabilidade da Família; Educação em Direitos Humanos. Local: Câmara Municipal de Porto Alegre.

EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

Seminário Povos Indígenas em Porto Alegre (29/04/2008)

Promovido pelo NPPPI/CDH/SMDHSU em conjunto com a Comissão de Defesa do Consumi-dor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (CE-DECONDH) da Câmara Municipal, com o objetivo de criar um espaço de debate e proposição de

Diário Oficial de Porto Alegre, 02 de maio de 2008

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ações e políticas articuladas entre o Legislativo e Executivo Municipal de Porto Alegre.

Curso Básico de Multiplicadores em Direitos Hu-manos (11/06 a 03/08/2008)

Realizado pelos Núcleos de Políticas Públi-cas para os Povos Indígenas, Povo Negro, Mulher, Livre Orientação Sexual e CRVV da Coordenação de Direitos Humanos/SMDHSU, em todas as re-giões de Porto Alegre. Nos encontros, os técnicos do NPPPI/CDH/SMDHSU abordaram a temática das territorialidades indígenas no município e re-giões limítrofes, contando com a participação de lideranças/especialistas indígenas.

Seminário Povos Indígenas na Bacia Hidrográfi-ca do Lago Guaíba (31/03 a 03/04/2009)

Promovido pelo NPPPI/CDH/SMDHSU em conjunto com lideranças indígenas, Escola Su-perior do Ministério Público da União (ESMPU), Ministério Público Federal (MPF/PR/RS) e FU-NAI/POA. A programação do seminário incluiu palestras sobre os direitos socioculturais indíge-nas, exibição de filmes e debates com agentes públicos, antropólogos e lideranças indígenas. O evento destinou-se a agentes públicos da Brigada Militar, Guarda Municipal, SMIC, FASC e Conse-lheiros Tutelares.

Jornada de Direitos Humanos (11 e 12/12/2009)Promovida pela Coordenação de Direitos Hu-

manos e o Centro de Referência às Vítimas de Violência/SMDHSU.

Fórum Culturas Indígenas no X Fórum So-cial Mundial: Debates e Problemáticas (25 a 29/01/2010)

Organizado pelo NPPPI/CDH/SMDHSU, FU-NAI/POA e lideranças Kaingang, Guarani, Char-rua e Xokleng do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, refletiu e encaminhou as demandas in-dígenas às instituições competentes. Contou com as participações de representantes do Ministério da Justiça, Presidência da FUNAI e Coordenação da FUNASA no Rio Grande do Sul. Local: Centro Cultural Usina do Gasômetro, sala 502.

Seminário Desafios e Perspectivas da Política de Assistência Social para os Povos Indígenas em Porto Alegre (29 e 30/04/2010)

Promovido pela FASC e NPPPI/CDH/SMDH-SU, destinado aos agentes públicos da FASC e da Rede Assistencial de Porto Alegre, objetivando à capacitação dos trabalhadores da rede de assis-tencial social e conselheiros tutelares do municí-pio. Foram abordadas as temáticas dos direitos socioculturais indígenas e respectivas sócio-cos-mologias.

Mostra Vídeo Índio Brasil 2010 (31/07 a 07/08/2010)

Em Porto Alegre, o festival nacional foi co-ordenado pelo NPPPI/CDH/SMDHSU, SMED, DMAE, SANTANDER CULTURAL, FUNAI/POA, UFRGS (DEDS, LAE, MUSEU e NIT), ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA/RS, CINEBANCÁRIOS e ONG AEPIM. Foram exibidos filmes com temática indígena vencedores de premiações nacionais e internacionais e recente produção audiovisual de realização de indígenas que vivem no Brasil.

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Foram fabricados 1.000 DVD’s, distribuídos gra-tuitamente em escolas do município, universida-des, comunidades indígenas, ONG’s, instituições públicas, etc. Estes vídeos compõem o Projeto Documentários Coletivos Indígenas na Bacia Hi-drográfica do Lago Guaíba, que tem programado as seguintes ações: em 2011, contratação de ofi-cinas de vídeo, edição de imagem/som e gravação de audiovisuais indígenas independentes (1.000 cópias em DVD); em 2012 e 2013, produção de dois documentários tendo como temas, respecti-vamente, as mito-poéticas e as territorialidades dos coletivos indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba (1.000 cópias em DVD).

Publicações

Cartilha Fazendo Cerâmica Hoje como Nossos Avós (2007)

Folheto bilíngue ilustrado Português/Kain-gang que divulga os resultados do projeto de mes-mo nome.

Apostila Formação de Multiplicadores em Direi-tos Humanos (2008)

Organizada pelos Núcleos de Povos Indíge-nas, Povo Negro, Mulher, Livre Orientação Sexual e o Centro de Referência às Vítimas de Violências da Coordenação de Direitos Humanos/SMDHSU, divulga os direitos fundamentais e sociais destas coletividades. O NPPPI/CDH/SMDHSU elaborou o Modulo III: Povos e Territórios Indígenas.

Livro Povos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil (2008)

Este livro pretende contribuir para a promo-ção de uma nova sensibilidade local, para a va-lorização das culturas, das iniciativas e histórias indígenas, para o respeito a suas formas de ocu-pação do espaço, decisão e representação social, objetivando ainda aproximar os educadores, es-tudantes, gestores públicos e os porto-alegrenses em geral das alteridades indígenas que vivem em Porto Alegre. Os artigos e imagens produzidos por antropólogos, historiadores, lingüistas, fotógrafos instigam para o estabelecimento de relações mais simétricas e respeitosas com essas pessoas, seus coletivos e ambientes de vida. Foram produzidos 1.000 exemplares, distribuídos gratuitamente em escolas do município, universidades, comunida-des indígenas, ONG’s, centros culturais, institui-ções públicas, etc;

Vídeo-Documentário Cultura Material dos

Coletivos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba, Porto Alegre, Rio Grande do Sul (2010)

Em conjunto com os Guarani e os Kaingang, o NPPPI/CDH/SMDHSU produziu dois documen-tários sobre a cultura material indígena intitula-dos “A mata que mostra nossa comida” (2010 / 30 min. / Kaingang) e “Os seres da mata e sua vida como pessoas” (2010 / 27 min. / Guarani).

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Área Especial de Interesse Cultural - Assentamento Comunidade Kaingang

Em fevereiro de 2003, a mobilização indíge-na e a articulação do NPPPI/CDH/SMDHSU jun-to ao Gabinete do Prefeito do Município de Porto Alegre, resultaram em decreto municipal de uti-lidade pública de uma área de 5,8ha situada na Estrada João de Oliveira Remião, nº 9105, bairro Lomba do Pinheiro, para fins de assentamento de famílias kaingang.

Esta área foi objeto do Projeto Kaingang de Sustentabilidade, de 2004 a 2006, realizado com recursos públicos municipais e advindos de convênio internacional com ONG do país Basco, Paz y Solidaridad de Euskadi. As ações deste con-vênio, coordenadas pelo NPPPI/CDH/SMDHSU, envolveram diretamente as lideranças indígenas e diferentes setores da administração municipal, resultando em uma expressiva transformação e ordenamento do espaço reservado. No local fo-ram construídas 23 unidades habitacionais, um centro cultural, uma escola bilíngüe, uma uni-dade de saúde e uma unidade de manipulação fitoterápica. Igualmente foram realizadas oficinas de arte-cerâmica, técnicas construtivas, fitoterá-picos, artesanato, manutenção do espaço trans-formado, participando neste processo o DMAE, o DEMHAB, a SMED, o DMLU, a SMAM, a SMS, instituições contratadas pelo convênio, e de modo mais indireto a FUNAI, FUNASA e o Conselho Es-tadual dos Povos Indígenas (CEPI/RS).

Assentamento Comunidade Charrua

Recentemente, em 2008, outra área foi so-licitada pelo NPPPI/CDH/SMDHSU para desapro-priação com fins de utilidade pública em Porto Alegre, desta vez destinada ao assentamento de famílias charrua.

Em junho de 2006, a Prefeitura Municipal de Porto Alegre mobilizou remoção emergencial de cinco famílias charrua (de um total de oito fa-mílias) que se encontravam em área de risco no Morro da Cruz, sendo alojadas em imóvel muni-cipal do DEMHAB, local onde permaneceram até

junho de 2008. Os procedimentos administrati-vos adotados pela municipalidade visando o as-sentamento definitivo das famílias charrua, assim como as medidas de assistência social adotadas no período de transição fundiária foram sistema-tizadas pelo NPPPI/CDH/SMDHSU em três re-latórios amplamente divulgados junto às esferas públicas interessadas, especialmente Ministério Público Federal, Comissões de Direitos Humanos dos Legislativos Municipal e Estadual.

Ao longo deste período, as famílias charrua se encontravam mobilizadas em reivindicação de reconhecimento oficial de sua etnicidade junto à FUNAI, sendo reconhecidas pelo órgão indigenis-ta oficial em setembro de 2007, e que, por este ato, reintegrava este povo aos procedimentos vol-tados à proteção e promoção dos povos indígenas no país. Esta nova situação jurídica autorizou a Prefeitura de Porto Alegre a assentar as famílias charrua nos padrões fundiários demandados pelo grupo, qual seja, terreno em área rural do muni-cípio.

Nestes termos, o NPPPI realizou pesquisas de terras no bairro Lomba do Pinheiro, região onde se encontram outras duas áreas indígenas (Guarani e Kaingang). Em novembro de 2007, foi localizado área de aproximadamente 9ha, situado neste bairro. Foi igualmente empreendida visita com as lideranças charrua ao local, procedimento acompanhado pela Comissão de Direitos Huma-nos e Cidadania da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul e pela presidência da Câmara Mu-nicipal de Vereadores de Porto Alegre, ocasião em que os indígenas manifestaram que a área corres-pondia as suas especificidades sócio-culturais e ambientais.

Visando o seguimento desta situação, a Pre-feitura Municipal de Porto Alegre, através do Decre-to nº 15.883, de 24 de março de 2008, declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, imóveis localizados na parada 38 da Estrada São Caetano, Bairro Lomba do Pinheiro, para o assenta-mento definitivo da comunidade indígena charrua. Em junho de 2008, o NPPPI coordena a condução deste coletivo indígena para a referida área onde atualmente vivem.

POLÍTICAS ESPECÍFICAS DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA

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Loja de Arte Indígena do Mercado do Bom Fim (Decreto Municipal n° 12.874/2000)

A institucionalização da questão indígena no âmbito municipal possibilitou a elaboração do Decreto Municipal n° 12.874/2000, que des-tina a Loja número 22 do Mercado do Bom Fim para a comercialização de artefatos produzidos pelas etnias Kaingang e Mbyá-Guarani. Trata-se de um espaço nobre e central no cenário histó-rico-cultural e turístico de Porto Alegre, cedido pela Secretaria Municipal de Indústria e Comér-cio/PMPA, com gestão compartilhada do NPPPI/CDH/SMDHSU e coletivos guarani e kaingang. No final de 2008, NPPPI/CDH/SMDHSU e indí-genas iniciaram processo de revitalização do lo-cal, reestruturando-a com recursos provenientes da SMDHSU e de patrocínio da PETROBRAS, através do Projeto Artesanato Mbyá-Guarani: um programa de índio, de autoria dos Mbyá-Guarani.

Concomitantemente, o NPPPI/CDH/SMDH-SU encaminhou a FUNAI/POA projeto para am-pliação do auxílio aos indígenas nesta política pública, tornando-a interinstitucional até o mês de setembro do corrente ano, já que esta Fun-

dação disponibilizava uma refeição diária e uma cesta básica mensal ao indígena atendente na loja. Atualmente a FUNAI/POA cessou a ajuda de custo aos indígenas, porém NPPPI /CDH/SMDH-SU e lideranças indígenas voltarão a debater o tema com o órgão indigenista federal. Todas as demais despesas da loja permanecem de respon-sabilidade da SMDHSU (energia elétrica e cessão de passagens, diária e gratuita nos coletivos ur-banos, ao atendente indígena para deslocamento de sua comunidade até a loja). Neste processo de revitalização da loja, os indígenas decidiram por um novo modelo de ocupação, sendo que o primeiro semestre de cada ano será de ocupação Mbyá-Guarani, e o segundo estará à disposição dos Kaingang.

LEIS E DECRETOS MUNICIPAIS

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A cedência da loja aos coletivos indígenas assegura, entre outros modos de produção tradi-cional indígena, a reprodução material e simbóli-ca desses povos, visto que atualmente a principal fonte de sustentabilidade destes coletivos em sua interface com as cidades é o artesanato. Enquan-to meio de sustento familiar, o artesanato é tão marcante que somente 6,1% dos indígenas não se dedicam a esta atividade. O artesanato, pro-dução e comércio, ocupa 90,6% dos Kaingang, 76,9% dos Guarani e 81,8% dos Charrua. No computo geral, o artesanato participa do sustento de 90,6% das famílias indígenas que vivem em Porto Alegre, majoritariamente entre os Kaingang.

O artesanato é uma modalidade tradicional da cultura indígena, pois é através dele que são transmitidas de geração a geração uma série de saberes, práticas, técnicas, tecnologias, grafis-mos que integram a arte das cestarias, colares esculturas e outros artefatos que produzem. Para que um cesto ou uma escultura sejam produzi-dos, é necessária uma cadeia de relações inter-pessoais que reafirmam os modelos tradicionais de organização social indígena, atualizando e mantendo seus vínculos ecológicos com as flo-restas e campos, locais onde localizam as fibras e sementes necessárias à produção dos objetos artesanais. A produção artesanal indígena envol-ve conhecimentos e práticas sociais que exigem a reprodução de importantes instituições indígenas, tais como as redes de parentesco e o xamanismo, permitindo a manutenção, reprodução e atuali-zação dos vínculos societários que distinguem e identificam estas pessoas e seus coletivos como indígenas em Porto Alegre.

Semana Municipal dos Povos Indígenas (Lei nº 8114/1998)

No que se refere às comemorações do “dia do índio” no país, a Lei Municipal nº 8114/1998 instituiu a Semana Municipal dos Povos Indí-genas. Com o apoio e fomento do NPPPI/CDH/SMDHSU, anualmente no mês de abril, os indí-genas promovem seminários, feiras temáticas, palestras em escolas, festas em suas áreas de vida, campanhas solidárias, manifestações pú-blicas. É o momento de visibilidade das cultu-ras e dos povos indígenas em Porto Alegre. Em conjunto com as lideranças indígenas, o NPPPI/CDH/SMDHSU vem organizando esta semana comemorativa, sendo diversas suas atividades:

Trilhas Guarani no centro de Porto Alegre, cami-nhada nos locais reconhecidos como constituin-tes de identidade guarani no centro da cidade; Seminários propostos pelas lideranças indígenas e NPPPI/CDH/SMDHSU, e promovidos em con-junto com diversas instituições, como a Presidên-cia do Legislativo Municipal, Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (CEDECONDH) da Câmara Municipal, Escola Superior do MPF, PR/RS/MPF e FUNAI/POA, entre outras instituições; Mostras de Arte Indígena, realizadas na Câmara Municipal e no Parque Farroupilha, local de grande circulação turística aos domingos.

Grupo de Trabalho Povos Indígenas/PMPA (Decreto Municipal nº 16.127/2008)

Dentre os instrumentos normativos e do-cumentos propositivos elaborados pelo NPPPI/CDH/SMDHSU, destaca-se o Decreto Municipal nº 16.127/2008. Em substituição à Ordem de Serviço nº 11/1998, o decreto propõe a amplia-ção das secretarias/departamentos municipais participantes no GTPI/PMPA e atualização de suas atribuições, conforme seu artigo 4°: “pro-porcionar a instrumentalização do poder público municipal na formulação de políticas públicas es-pecíficas para os povos indígenas, com vistas ao desenvolvimento de uma linha de ação que apon-te as áreas prioritárias que o governo municipal deverá investir; contribuir para que a atuação dos servidores municipais, no que diz respeito aos atos administrativos que envolvam coletivos e pessoas indígenas, esteja balizada pela Legisla-ção Federal, Estadual e Municipal; promover a criação de ações que possam favorecer a elimina-

Mostra de Arte em 2008, Parque Farroupilha

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ção das desigualda-des étnicas, sociais e culturais, das vio-lações aos direitos indígenas e os com-portamentos intole-rantes e preconcei-tuosos, estimulando o desenvolvimento de políticas para os povos indígenas; promover na so-ciedade a reflexão crítica acerca da história, ecologia e cultura dos povos indígenas, para que ela possa compre-ender melhor as de-sigualdades socio-ambientais e culturais e os obstáculos ao acesso aos recursos materiais e imateriais relevantes a sustentabilidade indígena; contribuir para a valo-rização das identidades indígenas no Município”.

O GTPI/PMPA é coordenado pelo NPPPI/CDH/SMDHSU e composto por quinze membros titulares e respectivos suplentes, nomeados pelo Prefeito, representando os órgãos da administra-ção direta, indireta, empresas públicas e de eco-nomia mista municipais: CARRIS, DMAE, DMLU, EPTC, FASC, SMAM, SMC, SMDHSU, SME, SMED, SMIC, SMOV, SMS, SMTUR e SPM. São diversas as ações dos órgãos municipais direcio-nadas aos povos indígenas no município.

COMPANHIA CARRIS PORTO-ALEGRENSECedência de transporte coletivo urbano para

deslocamento das extensas redes de parentelas indígenas durante suas Festas Tradicionais reali-zadas anualmente nos meses de abril e dezem-bro, e demais encontros comunitários que ocor-rem em Porto Alegre, tais como o Encontro de Medicina Tradicional Kaingang.

DEPARTAMENTO MUNICIPAL DE ÁGUA E ESGOTOSPrioridade nos diagnósticos e demais enca-

minhamentos administrativos no que se refere à qualidade da água consumida pelos indígenas nas áreas adquiridas pela Prefeitura Municipal. Por exemplo, em outubro de 2009, o NPP-PI/CDH/SMDHSU solicitou à representação

do DMAE no GTPI/PMPA uma visita a Aldeia Polidoro, com objetivo de diagnosticar a qua-lidade da água consumida pelos indígenas. Constatou-se que a comunidade se abastecia de uma fonte de água de recurso natural, cujo ponto de captação se dava no curso de rio em propriedade vizinha à aldeia. Além disso, foi constatado que as pessoas indígenas se encon-travam em situação de risco de contaminação. Desta forma, foi solicitado ao Setor de Pesqui-sa/DMAE, coleta de amostra para verificação da potabilidade dos locais de abastecimento de água daquela comunidade. Após análise da água coletada, que constatou risco eminente de contaminação, o servidor do DMAE encami-nhou processo administrativo visando tratar de ampliação da rede de abastecimento de água até a Comunidade Charrua. Esta ação admi-nistrativa resultou em convênio do DMAE com a CORSAN e FUNASA, visando o fornecimento de água tratada na referida aldeia.

Da mesma forma, compete ao DMAE a limpeza e manutenção das fossas sépticas da Área Especial de Interesse Cultural Kaingang da Lomba do Pinheiro.

Mostra de Arte em 2009, Câmara Municipal de Porto Alegre

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DEPARTAMENTO MUNICIPAL DE LIMPEZA URBANALimpeza e corte de grama nas áreas indíge-

nas municipais. Nos meses de março e outubro, na Área Especial de Interesse Cultural kaingang da Lomba do Pinheiro, e nos meses de abril e novembro, na Aldeia Polidoro da Comunidade Charrua.

FUNDAÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIAO desafio que se apresenta para a FASC é

romper com as ações pontuais e construir uma política de assistência social pautada pelas di-retrizes previstas na Política Nacional de Assis-tência Social (PNAS), promovendo a integração e inclusão dos coletivos indígenas respeitando suas especificidades étnicas e culturais. Neste senti-do, a FASC, sabedora da complexidade das ações necessárias à inserção social das comunidades indígenas nas políticas públicas, elaborou projeto visando adequações em sua estrutura funcional com o objetivo de atender os indígenas conforme a legislação.

Em Porto alegre, as comunidades indígenas estão referenciadas nos Centros Regionais da As-sistência Social (CRAS) onde se identificam a pre-sença destes grupos nos territórios de abrangên-cia. As comunidades são acompanhadas pela rede através das seguintes ações: definição de um téc-nico de referência no CRAS dos territórios que tenham em suas delimitações comunidades in-dígenas para acompanhamento e execução de atividades correlatas e mediação junto às lide-ranças destas comunidades; concessão de 540 cestas de alimentos ao ano para as comunidades indígenas no município em parceria com a Coor-denação de Segurança Alimentar (COSANS), cuja composição foi adequada às especificidades cul-turais dos coletivos Guarani, Charrua e Kaingang; visitas sistemáticas às comunidades indígenas com vistas ao monitoramento das situações de risco e vulnerabilidade a que estejam expostos; inserção, atualização e monitoramento do cadas-tro das famílias a serem incluídas no Cadastro Único do Ministério do Desenvolvimento Social; identificação, acompanhamento e monitoramen-to das famílias incluídas no Programa Bolsa Fa-

mília e demais ações voltadas a tais populações; identificação da população idosa e pessoas com deficiência com perfil para ingresso no Benefício de Prestação Continuada (BPC) nas comunida-des indígenas do município; apoio social através da concessão de benefícios (cestas básicas, va-les transportes, entre outros); orientação e apoio para a organização de documentos civis (certidão de nascimento, casamento, óbitos, CPF, título de eleitor, carteira de identidade, passe livre do ido-so, etc.).

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃOA SMED tem o compromisso de atender a

Lei 11.645/2008, que se refere à inclusão da temática indígena e afro-brasileira no currículo escolar. Desde 2008, a Secretaria tem participa-do do GTPI/PMPA organizando seminários/cursos visando à capacitação dos professores da Rede Municipal de Ensino (RME) na implementação das determinações dessa lei, e sensibilização dos distintos setores da Secretaria para com esses co-

letivos. Como responsável pela gestão educacional no município, a SMED conti-nuará a realizar atividades com essa temática, visan-do estimular e subsidiar o trabalho pedagógico nas escolas municipais; valori-zar as culturas originárias constantemente negadas

no currículo escolar; e produzir conhecimentos que nos levem a uma sociedade mais justa e soli-dária para com os povos indígenas presentes em nossa cidade.

Curso de Formação em História e Cultura Indígena – 27 a 29/05/2008.

Organizado pela Assessoria das Relações Étnicas/SMED, direcionado aos professores da RME, teve como objetivos aprofundar o conheci-mento acerca da história e das culturas indígenas na RME; promover os vínculos entre os professo-res e escolas da RME com a as coletividades in-dígenas que vivem na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba; e estimular a inclusão da temática da história e culturas indígenas nos Projetos Político--Pedagógicos das escolas municipais. Este curso contou com o apoio e consultoria antropológica do NPPPI/CDH/SMDHSU, através da formulação

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das temáticas abordadas, mediação junto aos es-pecialistas indígenas que foram contratados para palestrar e aulas ministradas pelos técnicos do Núcleo.

Seminário Educação Ambiental da Rede Municipal de Ensino: O Caminho das Águas – 13 a 16/10/2009.

Organizado pela Coordenação da Educação Ambiental do Grupo de Apoio Político-Pedagógi-co/SMED, proporcionou aos professores e alunos municipais a experiência de ouvir as diferentes visões e significados culturais sobre os caminhos das águas em Porto Alegre, exercitando o diálo-go de saberes indispensável na compreensão da complexidade ambiental com vistas à produção de novos saberes. Sua programação contou com a “Mesa de Diálogo: Diferentes Olhares sobre o Lago Guaíba”, com participação do Cacique Mbyá-Guarani José Cirilo Pires Morinico.

Formação Regional para os Professores da Rede Mu-nicipal de Ensino – 26 a 28/04/2010

Organizado pela Coordenação da Educação Ambiental do Grupo de Apoio Político-Pedagógi-co/SMED, proporcionou aos professores munici-pais a experiência de contato e diálogo com as culturas indígenas presentes em nossa cidade, demonstrando a possibilidade concreta de ar-ticulação do trabalho pedagógico em educa-ção ambiental, relações étnicas, línguas, música e outras artes performáticas, in-tegrando as diversas áreas do conhe-cimento. Foram distribuídos às esco-las exemplares do Livro-CD “Flores e Frutos da Terra”, de cantos e dan-ças mbyá-guarani. A programação consistiu da apresentação do Grupo de Cantos e Danças Nhanderú Papá Temondé (Comunidade Mbyá-Guarani Cantagalo); debate abordando o tema da “Cosmosônica Mbyá-Guarani”, com a pes-quisadora de etnomusicologia, Dra. Marília Stein (UFPEL), e Vherá Poty, maestro mbyá--guarani, contando com a mediação do NPP-PI/CDH/SMDHSU.

Seminário Educação Ambiental da Rede Municipal de Ensino: Educação Ambiental e Territórios Urbanos – 21 a 23/10/2010

Organizado pela Coordenação da Educa-ção Ambiental do Grupo de Apoio Político-Pe-dagógico/SMED, proporcionou aos professores do município o contato com conhecimentos que emanam dos distintos territórios urbanos, com enfoque na diversidade cultural, demonstran-do a possibilidade do diálogo interétnico como forma de efetivar a produção de saberes para a constituição de espaços sustentáveis no meio urbano. Sua programação contou com a “Mesa de Diálogo: A Perspectiva Ameríndia às Margens do Lago Guaíba”, na qual fomos contemplados com “as boas e belas palavras” de Vherá Poty, protagonista do vídeo “Os seres da mata e sua vida como pessoas”, com mediação do NPPPI/

Iracema Nascimento, ARTESÃ KAINGANG NA Feira do Brique da Redenção

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CDH/SMDHSU. Foi distribuído às bibliotecas das escolas exemplares do DVD de salvaguarda da Cultura Material dos Coletivos Indígenas da Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba.

SECRETARIA MUNICIPAL DA PRODUÇÃO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO

Desde 2003, a SMIC destina espaços pú-blicos para os coletivos indígenas visando à ex-posição e comercialização de seu artesanato em Porto Alegre: Feira da Praça da Alfândega (Rua dos Andradas, segunda à sexta-feira); Feira Eco-lógica (Rua José Bonifácio, sábado); Brique da Redenção (domingo); Loja nº 22 do Mercado do Bom Fim (todos os dias); e Feira de Artesanato do Gasômetro (sábados e domingos). No ano de 2010, lideranças indígenas e SMIC realizaram encontros com objetivo de readequação dos es-paços públicos, porém, até o momento não se chegou ao consenso.

SECRETARIA MUNICIPAL DE OBRAS E VIAÇÃOConsertos dos equipamentos comunitários

(Unidade de Saúde, Unidade Fitoterápica e Esco-la) construídas no âmbito do Convênio entre Pre-feitura Municipal de Porto Alegre e Fundação Paz y Solidaridad de Euskadi, Área Especial de Inte-resse Cultural Kaingang da Lomba do Pinheiro.

SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDEEm 1999, a Lei 9.836, de 23 de setembro,

estabeleceu o Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas no âmbito do Sistema Único de Saúde. Em 2002, a Portaria nº254/MS, de 31 de janeiro, instituiu a Política Nacional de Aten-ção à Saúde dos Povos Indígenas. A Política Na-cional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas dividiu o país em 34 Distritos Especiais de Saúde

Indígena (DSEI), com subordinação técnica ao Departamento de Saúde Indígena da FUNASA. O município de Porto Alegre está situado no DSEI Litoral Sul.

Em 19 de agosto de 2010, foi criada a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), dentro da estrutura do Ministério da Saúde, uma reivindicação antiga dos povos indígenas. O pra-zo para a estruturação da nova secretaria é de 180 dias, ou seja, final de janeiro de 2011. Após esta reestruturação da Atenção à Saúde dos Po-vos Indígenas será retomado o processo de re-pactuação da atenção à saúde com os estados e municípios que possuam povos indígenas.

A atenção primária à saúde é prestada nas terras indígenas ou nos pólos-base pelas Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena, compostas por médico, enfermeiro, cirurgião-dentista, técni-co de enfermagem, agente indígena de saúde e agente indígena de saneamento. Os pólos-base localizam-se nas terras indígenas ou nos muni-cípios. O município de Porto Alegre não possui Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena, sen-do assim a atenção primária à saúde dos povos indígenas é executada por Equipes de Saúde da Família ou Unidades Básicas de Saúde próximos ao local de moradia destes coletivos. A atenção especializada (consultas e exames) e internações seguem a mesma lógica de referência e contra--referência do Sistema Único de Saúde utilizado para toda a população de Porto Alegre.

O município de Viamão possui uma Equipe Multidisciplinar de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas que atende a etnia Mbyá-Guarani do DSEI Litoral Sul ao qual Porto Alegre também pertence. Em contrapartida a Prefeitura Munici-pal de Porto Alegre fornece o Agente Indígena de Saúde (AIS) para atuar junto a esta equipe, bem como a contratação dos AIS das Comunidades Kaingang da Lomba do Pinheiro e Morro do Osso, e ainda a atenção especializada (consultas e exa-mes) e as internações.

Ademais, desde janeiro de 2010, a SMS contrata dois estagiários indígenas que sejam es-tudantes universitários dos cursos de enfermagem e odontologia, pelo período de um ano, podendo o estágio ser renovado por mais um ano, contan-do com bolsa-auxílio no valor de R$ 384,86 para 88 horas/mês. As atividades dos estudantes esta-giários são desenvolvidas na Política de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas da SMS visando a implantação de projetos específicos junto às co-munidades indígenas no município.

Cacica Charrua Maria do Carmo Acuab, Feira do Brique da Redenção

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Em março de 2009, no Seminário “Povos In-dígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba”, Vherá Poty, Cacique da Terra Indígena Cantagalo expressou o seguinte: “Às vezes quando ouço os brancos falarem certas coisas sobre nós dou risa-da sozinho; é muito engraçado. Quando eles di-zem que os Mbyá-Guarani não podem estar hoje nas cidades, que aqui não é o nosso lugar, me pergunto: se os Mbyá-Guarani não podem viver nas cidades, quem disse que os brancos pode-riam entrar nas matas quando eles não foram convidados?”.

OUTRA VOZ E OUTRO PONTO DE VISTA

A fala deste homem jovem sintetiza a mito--poética que lhes é narrada desde quando pequeni-nos. No chão batido dos amplos pátios próximos às suas casas, sentam-se ao redor do fogo que nunca se apaga – há sempre alguém alentando as chamas com sopros e pequenos galhos –, e realçados pelas labaredas, ouvem junto com o cocoricar dos galos, o guinchar dos bugios, o crepitar dos gravetos... as falas inspiradas dos velhos sobre as belas matas, a criação de Nhanderú Tenonde, “Nosso Pai Primor-dial”. Ouçamos uma que aborda a divisão, mata para os Mbyá, e campo para os brancos:

Escutem, pois contarei a verdade! [...] Ñanderu Tenondegua criou esta terra. Juntos viviam, en-tão, os brancos e os Mbyá. Como estávamos juntos, para nós e para nossos filhos foi destinada toda a terra criada. Mas logo que o branco se ergueu (foi criado), exigiu que a terra fosse dividida. A terra ficou desde então dividida. [...]. E para o conhecimento de todos, dos Mbyá e dos brancos, tudo foi equanimemente repartido. Pois, efetivamente, já não foi mais possível ambos ocuparem a mesma terra. Entre nós já não existe nada em comum: enquanto nós vivíamos de forma simples sobre a terra criada, o primeiro branco [...] já quis se tornar sábio como Ñanderu. [...], mas Ele [Ñanderu] fica ob-servando a sua conduta. Por isso, somente devido à conduta do branco que a obra de Ñanderu não foi perfeita. [...] Então disse: “deste lado colocarei o branco; naquele nossos antepassados, nossos paren-tes”. Dessa forma ficou estabelecido! [...]. De um lado não há nada: somente mata; no outro existiam os campos. Então Ñanderu explicou: “escutem brancos”, disse, “isto é vossa propriedade: este campo vos pertence. Enquanto que aqui onde há somente mata é para os meus filhos”. [...] No [campo] há vaca, cavalo, galinha, pato, peru: no campo há abundância, pois tudo nele foi colocado. Isto é proprie-dade dos brancos. Enquanto que na mata há nambu, jacu, anta, porco-do-mato, veado, todo o tipo de animais. Em virtude disso, na mata ouve-se o ruído de muitos pássaros. E o branco ouviu isto. Sendo assim, conta-se que um dia, depois de ponderar, o branco levantou-se e, empunhando sua arma, foi contornando a mata e entrou nela para caçar jacu. Portanto, o antepassado dos brancos desrespeitou o primeiro acordo, e roubou aos Mbyá. Desde então, invadem a mata apropriando-se de seus animais. E dessa forma prosseguem até hoje, roubando inclusive a mata. Enquanto que o Mbyá nunca entrou no campo para apropnar-se de vacas alheias, ou sequer de uma galinha alheia: portanto nada roubou. O Mbya não rouba. Enquanto que o branco sempre foi muito ladrão. Assim, agora até as terras roubam. Para falar a verdade, eles até vendem os nossos animais das selvas como se fossem seus legítimos donos. [...]. Nós não buscamos riqueza, assim dizemos: nós não nos empenhamos para sermos ricos Não estamos procurando terras para vender. Os brancos não são assim: vão muito longe em busca de coisas de valor: em qualquer parte, no Paraguai e na Argentina, procuram tornar-se patrões. [...]. Repetimos que procuramos por teko’a que ofereçam recursos como animais silvestres, peixe, pássaros, frutas para comermos, que tenham taquarais onde possamos roçar nossas chácaras. [...]” (GARLET, Ivori José. Mobilidade Mbya: História e Significação. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul: Porto Alegre, 1997: Anexo I, Texto 02: Discurso de Perumi: Por que não paramos? Fevereiro de 1996).

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Assim como as flores que atraem os pássaros e os insetos tornando-os agentes polinizadores e possibilitando a formação de frutos e sementes que germinarão novas plantas, as belas palavras dos Mbyá seduzem pelos seus atrativos: cores vistosas, aromas agradáveis e néctar inebriante. Vão falando, o NPPPI está escutando, divulgan-do, polinizando o nosso mundo de cores, aromas e delícias mbyá, para que os agentes institucio-nais que elaboram e promovem políticas públicas direcionadas aos coletivos indígenas ouçam as enunciações desses sujeitos. Ouvir a voz do Ou-tro, a matéria-prima para o entendimento.

Escutemos um pouco mais. Nesse momen-to, as palavras que foram ditas ao NPPPI/CDH/SMDHSU pela liderança política e religiosa, José Cirilo Pires Morinico, que nos recebeu na Tekoá Anhetenguá, Comunidade Mbyá-Guarani da Lom-ba do Pinheiro, em Porto Alegre.

NPPPI/CDH/SMDHSU: “Os brancos estão matando os índios com a caneta!”. Esta afirma-ção o senhor repete nos diversos fóruns que par-ticipa cujo objetivo são debater a temática dos di-reitos coletivos indígenas. O senhor poderia falar para nós sobre esta assertiva?

Cacique José Cirilo Pires Morinico: Para nós, Mbyá-Guarani, a gente sabe muito bem que primeiro os brancos mataram com arma de fogo e também com distribuição de roupa com doença. Agora, a gente sabe que é com a ponta da caneta que estão matando os índios, por causa da lei. Muitas vezes, o povo indígena tem o direito, mas não é aplicado, na prática não acontece o cum-primento dos diretos indígenas. Nós temos direito aos espaços em que vivemos, os nossos territó-rios. É muito importante que a lei que proteja os índios seja bem aplicada. Então, é nesse sentido que a gente fala da lei, da caneta, porque é a ponta da caneta que faz a lei, e que mata a gen-te mesmo. Hoje, somente oralmente a sociedade

respeita os índios, mas tem que estar registrado no papel, tem que ser colocado em leis. Isso é muito difícil para o povo indígena, mas não so-mente para os indígenas, para muitos que sofrem na sociedade dos não indígenas também. Então, não é somente para os índios, sempre defende-mos o ser humano. Nós temos que saber aplicar a lei, pensar como podemos aplicar a lei do direito indígena para que seja cumprida, para que sejam felizes os povos indígenas. É nesse sentido que a gente fala, mas a lei é muito complicada, não é? A regulamentação, o Estatuto do Índio, o direito internacional, tudo isso a gente ouve e vê, conhe-ce, sabe que existe, mas é muito difícil a sua apli-cação, não é? A gente hoje busca que isso tudo seja feito, que a sociedade não indígena entenda. Eu acho que é isso que a gente está procurando, chegar a um acordo, dialogar. Esse é um direito também, sentar, dialogar e respeitar as lideranças indígenas para poder chegar nesse acordo com as autoridades, é isso que a gente sempre fala, nós, os Mbyá-Guarani.

NPPPI/CDH/SMDHSU: O Artigo 231 da Constituição Federal Brasileira reconhece aos ín-dios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, compe-tindo à União demarcá-las, proteger e fazer res-peitar todos os seus bens. Ademais, são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utili-zadas para suas atividades produtivas, as impres-cindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. O senhor poderia, em termos Mbyá-Guarani, falar desses princípios constitucionais?

Cacique José Cirilo Pires Morinico: A gen-te luta com a questão do direito. A cultura está nas matas, na terra que a gente convive, com os animais. Se tiver uma fruta, a gente come. Anti-gamente nós comíamos frutas, caçávamos, pes-cávamos. É isso que a gente está buscando, o que a gente quer, um lugar adequado que deve-ria ser respeitado, com água boa, saudável para o povo mbyá-guarani. Nosso espaço também é importante por causa dos pequeninos, eles pre-cisam receber um nome, tem que ter um nome Mbyá-Guarani. Por isso que são importantes as

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matas, com fruta, com água, com as ervas para a medicina tradicional. Os morros também são im-portantes, lugar dos Deuses, espaço dos Deuses, lugar do sagrado que a gente sempre respeita. É desse lugar que vem a água boa, que sai uma água iluminada, a água vem abençoada. É por isso que é importante o espaço dos Mbyá-Guara-ni. Quando a gente fala do espaço, a gente está falando da nossa vida, do nosso conviver, o nosso modo de ser, tudo isso. Nesse lugar vai ter muita fruta, a criança vai viver a nossa cultura, o nosso sistema, é por isso que a gente fala da tekoá. O que é a tekoá? É o lugar que se forma quando nós vivemos. Tekoá é a vida. Se não tem aldeia, uma mata adequada, um morro adequado, não tem tekoá, não tem vida. É por isso que a gente fala de tekoá, tem que ter a casa de reza, a me-dicina, ter karaí [liderança espiritual/cerimonial], parteira. Têm muitas coisas ali, nossas roças que plantamos para viver cotidianamente com as crianças, com o karaí. Assim se forma uma tekoá. Ali não tem doença, dentro da tekoá não tem do-ença, tem plantio, tem batata doce, milho. É por isso que a gente fala de tekoá, se nós não temos esse espaço, não temos tekoá, não temos vida, não é? A gente está sempre buscando isso, a nos-sa forma de vida. Por isso quando a gente fala em territorialidade é a mesma coisa, um território dos índios, sem fronteiras, essa coisa de sepa-rar o nosso território, separar um lugar do outro. Para nós é só uma terra, Yvy Rupá [“a terra em que pisamos” – ver nesta revista o artigo “Cosmo--Ecologia Mbyá Guarani”], quando a gente fala de território, a gente está falando de Yvy Rupá, uma só terra, muito longe e comprida, quando a gente fala Yvy Rupá alcança Pará Miri até Pará Guaçú e até Yvy Mbité. Isso tudo é uma forma de viver, uma caminhada. Caminhar faz parte do nosso modo, porque é o livre, não é? Queremos viver livres e tranqüilos. A gente também fala em Yvy Guatá [Yvy=Terra; Guatá=andar/caminhar], que é uma forma de vida, uma forma de circulação, assim como a água que não para, não é? É tudo água que cai no mar, sempre circulando a mesma água, não é outra água, é o mesmo mar que vai voltando, então é a mesma coisa os Mbyá-Guara-ni, vai e volta, circula bastante, como o sol, como a lua, como a água. Esta é a nossa forma de vida e a gente busca que a sociedade respeite essa forma de vida, a diferença de cultura, respeite. Quando a gente reclama um pedacinho de ter-

ra para fazer aldeia é porque é muito importante para nós. Vamos ficar feliz porque escolhemos o lugar. Por exemplo, o morro São Pedro é muito im-portante para nós, porque faz muitos anos que os Mbyá-Guarani circulam por aqui. Nós caçamos, colhemos taquara, kurupika’y [árvore: leiteiro – Sapium longifolium], os nossos remédios, é por isso que é importante. Tem um cipó que a gente coloca na água do chimarrão, que a gente colhe no morro São Pedro, é só aqui que tem. Tem tam-bém pindó [palmeira – Syagrus romanzoffiana] que é importante por causa de Nhanderú Papá Tenondé [Nosso Pai Primordial]. Ele transformou uma menina mbyá-guarani em pindó, então o pin-dó é remédio para nós, essa menina salva tudo. Por exemplo, nós utilizamos a madeira do pindó para fazer a parede da casa tradicional e as folhas para cobrir a casa; também utilizamos para fazer remédio, para não ter mais filhos e ainda quan-do a mulher dá a luz nós colocamos a criança sentadinha nas folhas para que cresça saudável. Então, é filho de Nhanderú, é por isso que a gente não pode sair cortando, não é? A fruta nós faze-mos um suco, comemos o palmito, tudo no pindó a gente aproveita, tudo. É por isso que a gente gosta muito. Tem época que não podemos cortar, tem época de cortar também, depois nasce de novo, então tem que se rezar para a fruta nascer de novo. A gente sabe isso, por isso que a gente respeita muito o pindó. A gente vê muitas rique-zas no morro, talvez para a sociedade que não vê essa parte não seja importante, mas isso tem que ser respeitado. Acho que esse é o direito indígena, o direito ao espaço adequado, com água boa que não precise colocar mangueira em torneira, não é? Pode fazer um buraquinho no chão e as crian-ças vão sozinhas pegar, tomar água, vão viver o nosso sistema, o modo de ser mbyá-guarani. Então, é isso que estamos buscando, essa é a idéia que a gente tem. No morro São Pedro tem tudo para a construção das nossas casas tradi-cionais, então é importante, mas tem que cuidar para não terminar também. Nós sabemos cuidar, tem a época de cortar, a época que não pode cor-tar. Com a taquara é a mesma coisa, nós não só cortamos, nós não vamos cortando e destruindo. A gente sabe o respeito que precisa ter com as ár-vores, qual o momento que podemos cortar, qual o momento de não cortar. Por exemplo, na lua nova não podemos cortar, se cortar morre, tem que ser na lua crescente, nesse momento a gen-

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te corta. A mesma coisa para caçar o tatuzinho, tem o acasalamento que a gente respeita, o bicho tem que se criar também, não podemos terminar. No morro ainda tem tatu porque esse bichinho só tem em buraco, aí os brancos não conseguem pegar, não é? Tudo isso a gente respeita, assim como os Mbyá-Guarani tem que ser respeitados. A gente convive com os animais, e é esse um respeito que a gente quer da sociedade, não é muita coisa que a gente quer. A gente não quer tomar um território, tomar um país, não é isso, nós queremos que se respeite o nosso espaço. Por exemplo, o morro São Pedro que não é uma terra imensa, não é? A gente quer um lugarzinho para poder conviver. Nós respeitamos as autoridades, nós respeitamos os governos, não queremos brigar mais, nós queremos o nosso direito. Nós queremos diálogo, sentar e conversar, mas nesse momento é importante colocar no papel também, colocar com a caneta para que nosso direito seja respeitado.

NPPPI/CDH/SMDHSU: Nesse momento gostaria que o senhor falasse um pouco sobre a presença mbyá-guarani no centro de Porto Alegre que constantemente é questionada pelos não--indígenas, tanto pela sociedade em geral como nossas instituições, e explicasse o que é o poraró [estender a mão], pois este tema também está re-lacionado aos princípios constitucionais do reco-nhecimento aos índios de sua organização social.

Cacique José Cirilo Pires Morinico: Eu acho que muitas pessoas não entendem porque que os Mbyá-Guarani estão no centro de Porto Ale-gre. Antigamente era tudo mata, não é? Os Mbyá--Guarani procuram seus alimentos na mata, fru-tas, caça, pesca. Hoje em dia não se consegue mais entrar nas matas, nem pescar, nem caçar, porque hoje em dia é tudo propriedade. Então o que a gente faz? Nós temos que sair na cidade, a

mulher tem que sair na cidade, tipo pescar, tipo caçar, não é? Agora não estamos mais caçando javali, no lugar da caça está o prédio, então os índios vão ao prédio, no lugar da árvore tem uma casa, aí os índios ficam perdidos, ficam ali sen-tados, esperando. O que se vai fazer? Quando a gente espera, passa um branco, que vê o índio ali sentado, e aí alguém vai dar algumas coisi-nhas, não é? Então isso também é um sistema cultural, só que agora não convivemos mais nas matas. Então, os brancos vêem que o índio está na cidade, e tem que entender que é lugar dos índios. Foram os brancos que construíram a casa, o prédio no nosso território, no nosso lugar, na tekoá, não é mesmo? Então, os Mbyá-Guarani vão procurar seu alimento, na aldeia já não tem mais mata, a área é muito pequena, então é uma busca de vida mesmo. O poraró é uma forma de cultura. Antigamente nós fazíamos poraró nas al-deias dos outros, íamos caminhando, levávamos batata-doce e trocávamos por carne de javali, en-tão esse é o po, que é mão, raró, é sentado frente a frente, ao redor de um foguinho, e aí fica lado a lado passando batata-doce e o outro passan-do carne de javali, então isso é o poraró. Então, hoje os Mbyá-Guarani ainda vivem nesse siste-ma, não é de agora, só que agora infelizmente não se tem mais as matas, aí parece que estamos vivendo sem cultura, sem sistema, não é? Aí o branco pensa que os Mbyá-Guarani estão viven-do na cidade, mas não é isso, a sociedade tem que entender que não tem mais mata, não tem mais lugar, tem que reconhecer e ajudar, não é? Fazer poraró também é próprio dos brancos, eles também fizeram poraró. O branco tomou nosso território, não é? Então fizeram poraró, a troca, não é? Só que deu para nós a beira da estrada, isso também é uma troca, o branco também fez o poraró, só que fizeram ruim, não é? Então tem que entender, sentar e conversar, e que esse lugar [o centro da cidade], esse lugar seja reconheci-do, o lugar é público, então não podem tirar os índios dali, porque ali é o Guaíba, o lugar do tape [caminho] mesmo, não é? O Guarani circulava por ali, pescando ali, porque o Guaíba tem muito peixe, tem muita fruta, não é? Então, o centro é um lugar que os Guarani moravam antigamente, tinham suas famílias. Não é que a gente queira viver desse jeito, mas a sociedade tem que enten-der que essa forma é para sobreviver, para levar e vender o artesanato. No centro também é lugar

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do artesanato. Tudo que a gente faz é poraró, o artesanato também é poraró, a gente leva balaio e o branco traz dinheiro. Quando se vai ao mer-cado também é poraró, não é? Traz carne, então tudo é poraró, então essa é uma forma de cultura, do ser humano, não é?

NPPPI/CDH/SMDHSU: “Os pequeninos mbyá-guarani estão onde suas mães estão!”. Esta é outra afirmação que o senhor repete nos fóruns que participa. O senhor poderia falar para nós sobre esta assertiva, pois para a grande maioria da sociedade não indígena as crianças quando estão nas ruas das cidades são consideradas em situação de alta vulnerabilidade, excluídas das escolas e categorizadas como em situação de tra-balho infantil.

Cacique José Cirilo Pires Morinico: Acho que isso é importante. O Guarani vive diferente, as famílias sempre têm quatro, cinco crianças. Os pequeninos têm que estarem juntos, tem que crescer junto com as mães, para ficarem bem educados na cultura indígena. Se a gente largar para outra família, ele cresce com outra forma, com outro jeito, então ele pode aprender coisas ruins, não tem sistema porque o pai e a mãe não estão juntos, é por isso que ficam mais agressi-vos. Para não acontecer isso tem que estar junto com os pais, com as raízes, tipo uma planta que a gente vê crescer. Os Guarani tiram exemplo de tudo, com os animais, com as plantas que tem raiz, que tem galho, que tem fruta e flor. É o mes-mo sentido que a família indígena, não podemos largar sozinho, tem que estar junto com o pai e a mãe, principalmente com a mãe que tem que ali-mentar com o peito. A criança também se alimen-ta espiritualmente. O espírito da mãe e o espírito da criança têm que estarem juntos, é uma forma

de proteção também, para não ficar problema no caminho, pra não acontecer acidente, tudo isso. É uma proteção para nós. Muitas vezes a sociedade vê, se preocupa porque talvez a criança esteja so-frendo com a mãe, aí já chama o Conselho Tute-lar, e aí que cria o problema, aí que a criança so-fre, a criança não estando junto com a mãe. Essa é uma forma de poraró também. Para a sociedade dos brancos também fica muito ruim colocar seus filhos na escola, na creche, longe dos pais. Para o nosso pensamento, colocar os pequeninos na cre-che é sofrimento, a criança vai morrendo porque não está junto, está com pessoas estranhas, aí vai sofrer, vai chorar muito e ninguém vai gostar por-que não é filho dele, porque a criança é estranha, não é? A criança chora, a criança tem seu próprio jeito, só o pai e a mãe é que podem entender, porque está chorando, porque está triste, os pais vão saber, mas o outro não. Para nós, escola, cre-che, são lugares fechados, a criança sofre aí. Os indígenas têm que ficar livres, soltos, tranqüilos, aí as crianças crescem sem doenças, sem preocu-pação, sem pressão, não é? Quando está fechada na creche, na escola, a criança sofre, eu já tive esta experiência. Quando fui na escola do branco, a professora me castigou, tive que ficar de joe-lho, porque eu brincava muito. Tive que ficar de joelho na hora do recreio, de castigo, e as outras crianças que estavam ali saíram brincando. Eu ficava sempre na sala de aula, trancado, porque me castigavam. Aprendi porque já sofri. Essa é a diferença que vejo na sociedade dos brancos, são muitos limites, a vida é mais limitada, muitos limites, e a criança indígena não, ela tem que es-tar solta, desde pequenina vai aprender sozinha. Junto com o pai, vai ver como o pai vive, como é que o pai dorme. Se o pai é agressivo, a acriança vai ser agressiva também, então por isso que nós temos que viver junto com o pai, bem educado, e o pai também. Então, na creche as crianças sofrem, é por isso que a gente vive só com o pai e a mãe, para proteger os pequeninos.

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As fábulas míticas dos Mbyá apresentam conhecimento filosófico sobre a existência hu-mana, e demonstram um saber detalhado sobre os elementos da paisagem, sobre os ciclos da astronomia, climáticos e metereológicos típicos do ambiente subtropical em que habitam. O qua-drante sul é a direção predominante dos ventos frios de inverno (o Minuano). O norte, a direção dos ventos quentes de verão e para onde se des-loca a órbita do sol numa parte do ano. A bruma e seu frescor são vividos como índices de um novo ciclo de vida, experimentados pelos Mbyá no ambiente da floresta, logo que cada nova pri-mavera desponta. O leste referencia a aurora e o nascimento de cada novo dia de sol. O oeste representa o equilíbrio trazido pelas chuvas de verão, das águas que aplacam o calor, tranqüili-zam os ânimos e irrigam a terra, as plantas e os animais.

A mitologia Mbyá reverencia os astros celes-tes, as plantas e suas flores, os pequenos animais como o colibri, a coruja, a cigarra, o gafanhoto, o girino, o tatu e o lagarto. Todos são pensados enquanto reflexos terrenos das forças criativas do cosmos, tendo uma participação importante na composição do sentido integral, cosmológico e existencial do Saber Mbyá.

O conhecimento Mbyá é preciso no mape-amento e designação das diversas regiões que constituem parte de sua territorialidade conti-nental. A toponímia fixada pela geografia histó-rica e atual o demonstra em todos os países em que habitam, pois abundam palavras com reco-nhecida origem Guarani para designar acidentes geográficos, rios e lugares.

A cosmo-ecologia Mbyá-Guarani classifica a Região Platina em quatro grande unidades geo-gráficas, distribuídas numa seqüência que vai do interior do continente até o litoral atlântico. No atual Paraguai se localiza Yvy Mbité, o centro do mundo, ressurgido depois do dilúvio primordial, região outrora recoberta com densas e exuberan-tes florestas, no estilo que os Mbyá acreditam que fosse todo o disco terrestre, no momento da criação. O substrato aquático não se apartou por completo na terra nova, inundando a região a leste do centro do mundo e constituindo Pará Miri (me-sopotâmia Paraná-Uruguai, atualmente Provincia de Misiones, Argentina). Na banda oriental do rio Uruguai, adentra-se a região do Tape (caminho tradicional), zona de circulação e acesso à borda do estrato aquático, a grande água (Pará Guaçu) que a geografia denomina Oceano Atlântico.

Essas unidades cosmo-ecológicas sobrevi-vem apesar das intensas lutas de fronteira que culminaram na divisão do território Guarani entre os países do atual Mercosul, depois que muitos deles morreram. Os Mbyá foram espremidos pe-las sociedades nacionais, entocados nas últimas florestas que ainda existem, depois da devastação madeireira. Eles se afastaram cada vez mais do eixo fluvial de sua antiga vida tribal, vivendo tão à margem da legalidade entre os países quanto o contrabando que se faz pelos rios. Na Repúbli-ca do Paraguai, os Mbyá são tratados, até hoje, como sel-vagens primitivos.

Para Miri res-guarda a dimensão pluvial do antigo modo de ser Gua-rani, na época em que os rios Paraguai, Paraná e Uruguai es-coavam no centro de seu mundo, como suas antigas canoas e casas co-letivas, a ornamentar a paisagem. Atualmente, a re-gião de Misiones concentra a maior porção de mata preservada entre as unidades geográficas Mbyá.

COSMO-ECOLOGIA MBYÁ-GUARANI

Cacique José Cirilo Morinico eAntropólogo José Otávio Catafesto

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José Otávio Catafesto de Souza é professor no Departamento de Antropologia da UFRGS e coordenador do Laboratório de Arqueologia e Etnologia do IFCH/UFRGS.

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25caderno de direitos humanos

O Núcleo de Políticas Públicas para os Povos Indígenas da Coordenação de Direitos Humanos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana apresentou à análise jurídica projeto de formação de acervo da cultura material dos coletivos indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba, Município de Porto Alegre. Propôs a aquisição das peças de artesanato indígena, sendo que “a seleção das peças artesanais para aquisição e composição do acervo de cultura ma-terial indígena ficará a cargo da equipe técnica do NPPPI/SMDHSU, com auxílio dos representantes da SMC, SMED, e SMTUR do Grupo de Traba-lho Povos Indígenas/PMPA; somente poderão ser adquiridas peças artesanais da cultura material guarani nas comunidades indígenas localizadas no Município de porto Alegre; as peças artesanais adquiridas, obrigatoriamente, serão acompanha-das de ficha descritiva, recibo de compra formula-do pelo NPPPI/SMDHSU, devidamente assinado pelo cacique da comunidade favorecida, e certi-ficação da Fundação Nacional do Índio/FUNAI”. Os contornos do projeto deixavam entrever, de plano, a inviabilidade de competição, porquanto se tratava de objetos que só guardam valor de patrimônio cultural se decorrem de labor original dos coletivos indígenas em tela. Ainda que outras pessoas ou grupos fossem capazes de prestá-lo seu valor intrínseco decorre, justamente, do fato de representarem aspecto infungível dos saberes, práticas, tradições e modos de vida desses grupos específicos. Daí, portanto, a ausência de alterna-tivas de contratação, um único coletivo capaz de realizar a prestação do objeto a ser contratado, não existindo diversidade de opções a serem co-tejadas. Indiscutível a possibilidade de contrata-ção direta, por inexigibilidade de licitação, nos termos do art. 25, caput, da Lei 8666/93 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

Para efetivar a contratação, todavia, surgiu prima facie a questão relativa à capacidade da parte contratada, haja vista tratar-se de comuni-dade indígena, com formas de organização social estranhas às regras de representação comumente aceitas pelo ordenamento jurídico. Como é ce-diço, os pressupostos de validade dos contratos em geral implicam, entre outros aspectos, que os sujeitos contratantes sejam agentes com capaci-dade para os atos da vida civil. Note-se que, além

da questão da capacidade civil dos indígenas, ob-jeto da Lei 6001/73 (Estatuto do Índio), sobres-sai o fato de que o coletivo em questão não possui personalidade jurídica e o objeto da avença não é atribuível à atuação de nenhum indivíduo do grupo, mas materialização de um modo de vida e concepção de mundo de toda a comunidade. O tema, portanto, diz respeito à especificidade cul-tural dos povos indígenas e suas demandas por reconhecimento2 de seu modo de vida e formas de organização. As reivindicações desses grupos em relação ao Estado não se limitam a uma de-manda por redistribuição de meios de subsistên-cia, direitos e oportunidades. Referem-se direta-mente ao pertencimento a uma comunidade de cultura, valores, tradições etc. A questão que se propunha era sobre a possibilidade de conceder tratamento diferenciado a fim de viabilizar a con-tratação pretendida.

A discussão passa pela questão da universa-lidade dos direitos humanos e nesse sentido por uma concepção de igualdade que prescreve o tra-tamento igual independente de raça, credo, gêne-ro e outros aspectos que conformam a identidade das pessoas. Essa concepção de igualdade foi aos poucos alargada para compreender que o tra-tamento igual impõe ao Estado, especialmente, tarefas de redistribuição a fim de garantir o efeti-vo exercício desses direitos a grupos minoritários que por diversas circunstâncias encontra-se em situação de desvantagem. Entre essas circuns-tâncias destaca-se atualmente a pertença a uma cultura minoritária que se vê ameaçada pelas de-cisões políticas e econômicas de uma sociedade abrangente com superioridade de recursos mate-riais e simbólicos. O debate envolve, pois, o tema do multiculturalismo e dos direitos de minorias, especialmente minorias que convivem em um Es-tado pluriétnico e plurinacional.

Convém, por essa razão, ao menos sumariar esta discussão aqui. A meu ver o ponto de parti-da adequado é aquele do debate entre liberais e comunitaristas em torno da prioridade da justiça sobre as várias concepções particulares sobre a vida boa ou realizada. Antes convém ressaltar de que liberalismo se trata. Melhor seria dizer libera-lismo-igualitário para que se distinga de versões como a sustentada, por exemplo, por Nozick que defende um Estado mínimo destinado apenas a

MULTICULTURALISMO E POLÍTICAS PÚBLICAS: RECONHECIMENTO DAS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO

SOCIAL DE GRUPOS INDÍGENAS1

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impor a lei contra a fraude, o roubo e a violência e o cumprimento dos contatos, aceitando como justa qualquer distribuição de riqueza decorrente do normal funcionamento de uma economia de mercado eficiente, opondo-se a qualquer forma de redistribuição3.

Refiro-me a uma concepção do liberalismo como a sustentada por Rawls4, para quem a so-ciedade é um sistema de cooperação social cuja justiça depende de uma distribuição equitativa das vantagens e ônus desta cooperação. Nesse modelo, o objeto da justiça é a estrutura básica da sociedade “a maneira pela qual as instituições sociais mais importantes distribuem direitos e deveres fundamentais e determinam a divisão de vantagens provenientes da cooperação social”. Assim, “a justiça de um esquema social depende essencialmente de como se atribuem direitos e deveres fundamentais e das oportunidades eco-nômicas e sociais que existem nos vários seto-res da sociedade”. Da mesma forma, conforme Rawls, a justiça das instituições sociais para ser alcançada depende de um esquema de liberda-des iguais para todos e uma justa distribuição dos bens primários (primary goods) cujo acesso deve estar vinculado a cargos e posições abertos a todos de modo equitativo e as desigualdades sociais restam restringidas por um princípio da diferença segundo o qual as desigualdades so-ciais só são permitidas se, e somente se, vem em benefício dos membros menos afortunados da sociedade. Este esquema não prejulga que planos de vida seus cidadãos irão cumprir, ou seja, não abriga uma concepção de vida boa. Os princípios da justiça social garantem apenas os bens e di-reitos necessários para que elejam por si próprios seus respectivos planos de vida, deixando a sua livre escolha sua concepção individual ou coletiva de realização, enfim de seu modo de vida.

Essa neutralidade em relação às diversas concepções do bem é prenhe de significado e suscitou a crítica de autores vinculados a uma postura comunitarista que desconfiam que os princípios assim defendidos implicam num viés seletivo. Segundo esses autores, a situação de escolha invocada por Rawls (original position) pressupõe um indivíduo desapegado (unencum-bered self). Como sustenta Sandel5, o eu liberal é incapaz de reconhecer a realidade do contexto de escolha. Segundo Sandel, antes de escolher o que eu quero a questão que se põe é a de quem eu sou, quais são as obrigações que me vinculam com anterioridade em relação aos meus amigos, à minha família, à minha comunidade6. Daí a defesa do liberaslismo da prioridade do justo em

relação ao bem. Uma vez que o eu liberal é apre-sentado como independente de toda a afiliação, a justiça deve prevalecer em relação a concepções de vida boa que só podem ser formadas em con-textos de pertencimento cultural.

Daí a questão: Pode o Estado fomentar, pro-teger e manter determinada concepção do bem e em consequência impô-la aos seus cidadãos? Uma política que pretende garantir direitos dife-renciados a determinados indivíduos ou a deter-minados grupos parece confrontar as concepções arraigadas do liberalismo político e ceder a con-cepções políticas que preconizam a atuação do Estado na promoção de determinados modos de vida, em suma, a adoção de uma concepção de vida boa que deve ser incentivada. Essa perspec-tiva corre o risco de incorrer em políticas opres-sivas que ao cabo podem limitar as liberdades individuais substituindo-se ao cidadão na escolha de seu próprio plano de vida. Conforme Weinsto-ck, a resposta liberal sustenta que não é possível aceitar as consequências políticas dos argumen-tos comunitários, uma vez que:

As sociedades modernas são constituídas por uma pluralidade de concepções razoáveis do bem. O problema da justificação dos princípios de justiça converte-se no de saber como reconciliar os adeptos de diferentes concepções de bem em torno de uma teoria da justiça social apesar das suas diferenças axiológicas. E mesmo se devemos aceitar que os seres humanos procuram atingir metas intrinseca-mente sociais como as da proteção cultural, é for-çoso constatar que a maior parte das sociedades modernas contêm uma multiplicidade de culturas minoritárias cujos membros procuram assegurar a sobrevivência de sua cultura particular. Portanto, não é possível, se pretendemos respeitar uma nor-ma de equidade fundamental do liberalismo, privi-legiar uma das culturas, por exemplo autorizando o Estado a promovê-la ao mesmo tempo que confia a sobrevivência das outras aos caprichos do ‘mercado cultural’7 Charles Taylor, por sua vez, em um artigo

intitulado “A Política de Reconhecimento”, ao abordar as formas de injustiça que derivam do reconhecimento incorreto ou negado de grupos minoritários com base em suas identidades cul-turais8 , sustenta que o que é hoje definido como políticas de diferença ou políticas de reconheci-mento surge de duas mudanças que decorrem da modernidade. A primeira se refere à passagem da noção de honra para a noção de dignidade, que dá ênfase à dignidade igual de todos os cidadãos. A segunda se refere ao desenvolvimento da noção

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de moderna de identidade que postula políticas de diferença. Assim, ainda segundo Taylor:

A crítica que a primeira faz à segunda consiste na violação que esta comete do princípio de não--discriminação. Inversamente, a primeira é critica-da pelo facto de negar a identidade, forçando as pessoas a ajustarem-se a um molde que não lhes é verdadeiro. [As pessoas] queixam-se do facto de o conjunto, supostamente neutro, de princípios que ignoram a diferença e que regem a política de igual dignidade ser, na verdade, um reflexo de uma cul-tura hegemônica (...) um particularismo disfarçado de universalismo9.

Para liberais como Vita as questões relacio-nadas a uma política da diferença estariam satis-fatoriamente resolvidas pelas garantias individu-ais de livre pensamento, associação e expressão, tal como inscritas nas cartas de direitos das de-mocracias contemporâneas. Para esse autor,

O empenho em realizar ou praticar qualquer uma dessas coisas não pode se fazer à custa de prin-cípios de justiça, mas também não se exige que esses diferentes fins tenham credenciais tipicamen-te liberais. Sob uma estrutura institucional justa de acordo com a perspectiva normativa que estou des-crevendo deve haver lugar, por exemplo, tanto para o caráter individual que John Stuart Mill descreveu de forma tão eloqüente em Sobre a liberdade, que rejeita a conformidade social e preza a escolha au-tônoma dos próprios fins, quanto para aqueles que rejeitam esse ideal de autonomia individual e crê-em dever conduzir suas vidas de acordo com os ditames da verdade revelada ou da cultura de seus ancestrais. O que nem uns nem outros podem que-rer é que o poder coercitivo estatal seja empregado para promover a forma de vida que julgam ser a mais valiosa. Isso deve ficar por conta de direitos e oportunidades iguais – da liberdade de associação, em particular10.

Penso, todavia, que algo deve ser preserva-do da crítica comunitarista. A subjetividade que elege sua própria concepção do bem está neces-sariamente vinculada a uma história de vida, um conjunto de valores e objetivos que compartilha com sua família, amigos e comunidade de cultu-ra. Suas escolhas, portanto, só são significativas porque esse contexto as torna significativas para ele, fazendo da pertença cultural um elemen-to possibilitador da autonomia preconizada pelo liberalismo11. Ademais, desde que essa cultura implica na existência uma ampla gama de insti-tuições que abrangem todos os aspectos da vida

dessas comunidades, com Kymlicka, podemos falar de uma cultura societal (societal culture)12.

Will Kymlicka busca conciliar os pressupos-tos de uma política liberal igualitária com as de-mandas de reconhecimento e por direitos diferen-ciais em relação a grupos (group differenciated rights) em sociedades pluriétnicas e plurinacio-nais. Entende, nesse seentido, que a diversida-de cultural provem tanto da incorporação de um grupo em uma sociedade abrangente em decor-rência da colonização, da guerra ou de arranjos federalistas, como da imigração de indivíduos ou famílias, dando lugar a formas distintas de reivin-dicação em relação ao Estado. No primeiro caso (minorias nacionais), onde claramente se inserem as comunidades indígenas, essas reivindicações visam formas de autonomia e autogoverno a fim de manter sua condição de sociedades distintas em relação aos grupos majoritários dentro de um estado prlurinacional, enquanto no segundo caso (minorias étnicas), as reivindicações visam à inte-gração na sociedade majoritária a fim de garantir maior reconhecimento de suas identidades étni-cas sem pretender se tornar uma nação separada e autogovernada, mas, ao contrário, pretendem a modificação de leis e instituições para melhor acomodar suas diferenças culturais dentro da sociedade abrangente13. Para Kymlicka, o pos-tulado da defesa de direitos coletivos fundados na identidade tradicional de minorias étnicas ou nacionais justifica-se pelo papel que essa cultu-ra compartilhada desempenha na formação dos indivíduos que a compõem, nas suas práticas e valores compartilhados, no seu modo de vida, formas de solidariedade e instituições que, em conjunto, servem de contexto para que o exer-cício da liberdade de escolha seja significativo para os membros dessa comunidade14. Kymlicka sustenta que a atribuição de direitos diferenciais a determinados grupos sociais não implica neces-sariamente na revogação da neutralidade liberal em relação às concepções conflitantes de vida boa. Em verdade, a pertença a um determinado contexto cultural pode ser assimilada a um bem primário (primary goods), “um desses recursos dos quais podemos dizer que todos necessitam, qualquer que seja a sua concepção particular do bem”15. Para o autor não se pode tratar a ques-tão cultural nos mesmos termos que a questão da liberdade religiosa, e sustentar a neutralidade do Estado em relação a cultura tal como em relação às religiões. Essa perspectiva peca por desconhe-cer justamente esse vínculo de dependência entre liberdade e cultura. Somente o pertencimento a determinada cultura permite aos seus membros

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realizar sua autonomia através de escolhas in-formadas, inclusive para revisar e, se for o caso, abandonar sua comunidade de cultura16.

Assim, os direitos que podem ser reivindi-cados por minorias étnicas ou nacionais, para conformar-se às concepções arraigadas do libe-ralismo político estão justificadas se não invocam essa diferença cultural para impedir seus próprios membros de escolher sobre o valor que atribuem a essa comunidade e revisar, manter ou abando-nar os valores que compartilha com ela. Assim, Kymlicka distingue entre reivindicações que im-plicam na imposição de restrições aos membros a fim de garantir estabilidade interna (internal res-trictions) e reivindicações que se referem à rela-ção entre esses grupos e a sociedade abrangente com vistas a proteger esses grupos minoritários das decisões políticas e econômicas da maioria (external protection)17. Ambas formas de reivin-dicação podem ser concebidas sem violação dos direitos individuais. Como refere Kymlicka, mes-mo as democracias ocidentais impõem a seus membros certas restrições com vistas a garantir a estabilidade social, mas como nota o autor, cer-tas demandas provenientes de minorias étnicas ou nacionais pelo reconhecimento de suas práti-cas tradicionais impõem restrições incompatíveis com os direitos e liberdades consagrados nas car-tas constitucionais das democracias ocidentais. Basta citar o exemplo da transfusão de sangue vedada por algumas seitas cristãs. Uma política igualitária, por outro lado, é perfeitamente con-sentânea com as reivindicações de proteção ex-terna reclamada por determinados grupos (por exemplo, os povos indígenas), pois representam formas de promoção da igualdade de oportuni-dades, como forma de compensação de desvan-tagens naturais ou adquiridas, a fim de permitir a esses grupos minoritários uma participação igua-litária nos benefícios e responsabilidades decor-rentes da cooperação social. Entretanto, pondera Kymlicka,

é igualmente importante ressaltar os limites nesses direitos. Em particular, eu tenho argumentado que eles devem respeitar dois impedimentos: os direitos da minoria não devem permitir que um grupo do-mine outros; e não devem autorizar que um grupo oprima os seus próprios membros. Em outras pala-vras, os liberais devem buscar assegurar que haja igualdade entre os grupos, e liberdade e igualdade dentro dos grupos18.

O debate até aqui sumariado resta incon-cluso, como costuma acontecer com as disputas

filosóficas em geral e da filosofia política em par-ticular. A justificação de princípios de justiça ca-pazes de conciliar as diversas concepções de bem presentes na sociedade moderna (o fato do plura-lismo) esbarra nas acusações de parcialidade19 e incomensurabilidade20 dessas divergentes visões de mundo. Para não mencionar as concepções de bem francamente fundamentalistas, para as quais a própria tolerância religiosa é inaceitável. Embora a visão aqui esboçada seja claramente favorável a uma teoria da justiça como a apre-sentada pelo liberalismo-igualitário, temperada pela tentativa de reconciliação apresentada por Kymlicka é impossível desconhecer os problemas não resolvidos. Duas tentativas de solução, que não posso senão mencionar aqui, são aquelas representadas pela democracia deliberativa de Habermas e a noção de consenso entrecruzado ou por sobreposição de Rawls. A primeira postu-la que a impregnação ética (leia-se concepções substantivas do bem) dos ordenamentos jurídicos concretos é inevitável, mas as soluções devem ser encontradas pela via do direito positivo, alcança-do através de processos democráticos, também regulados juridicamente, e que garantam formas de comunicação abertas a todos os interessados e sem limitação de temas e que produzam acordos fundados apenas no melhor argumento, com ex-clusão do recurso a ameaça de violência ou pro-messa de recompensa21 . Para Habermas a auto-nomia privada (direitos humanos) e a autonomia pública (soberania popular) se pressupõem mutu-amente, estado de direito e democracia estão in-dissoluvelmente associados à produção de direito legítimo:

Um ordenamento jurídico é legítimo se assegura de modo equitativo a autonomia de todos os cidadãos. Estes são autônomos se os destinatários do direito podem entender-se simultaneamente como seus autores. E os autores só são livres enquanto partici-pam de processos legislativos que estão regulados e sejam conduzidos com tais formas de comunicação que todos possam supor que as regulamentações acordadas dessa maneira sejam merecedoras de aprovação geral e motivadas racionalmente22.

A segunda se refere à reformulação feita por Rawls a sua teoria da justiça em vista do impacto das críti cas comunitaristas e o que o autor re-feriu como o fato do pluralismo. Rawls entende que o conceito de “consenso por sobreposição” (overlapping consensus) responde adequadamen-te à questão de como garantir estabilidade a um modus vivendi entre concepções divergentes, ou

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seja, a possibilidade de que todas as concepções de bem razoáveis (excluídas de antemão as con-cepções fundamentalistas) possam encontrar nas suas doutrinas compreensivas (religiosas, filosó-ficas ou morais) sobre o bem humano as razões adequadas para adotar os princípios de justiça propostos pelo liberalismo político. Diz Rawls:

O liberalismo político visa uma concepção política da justiça que esperamos possa obter o suporte de um consenso por sobreposição de doutrinas religio-sas, filosóficas e morais razoáveis em uma socie-dade por ele regulada (...) Nesse caso, os próprios cidadãos, no exercício de sua liberdade de pensa-mento e consciência e a vista das doutrinas com-preensivas que professam, podem ver a concepção política como derivada de, ou congruente com, ou ao menos não estando em conflito com seus demais valores23.

As duas soluções apresentam dificuldades que não vem ao caso discutir aqui. Para o nosso assunto importa apenas assentar que a solução de Rawls, ao menos em princípio remete as ques-tões culturais a esfera privada e, nesse sentido, lhes nega proteção estatal diferenciada, enquan-to Habermas admite que o processo democrático elabore as regras para tratamento diferenciado em casos típicos, inclusive levando em conside-ração as concepções particulares de bem susten-tadas pelos cidadãos, contanto que seja mantida a prioridade dos direitos fundamentais em relação ao bem coletivo24.

A discussão precedente sobre direitos cultu-rais tem se refletido em organismos internacio-nais e estados nacionais e conduzido uma intensa produção normativa onde se destacam reformas constitucionais e documentos de organismos in-ternacionais que refletem essa entrada da cultura na formação de direitos. Nesse sentido, o Estado brasileiro reconheceu em diversos documentos a especificidade de diversos grupos minoritários e lhes dispensou tratamento diferenciado. Sobres-sai, especialmente, o tratamento dispensado aos indígenas na Constituição Federal. Não é neces-sário encarecer aqui as injustiças a que foram e são submetidas as diversas nações indígenas25 que vivem no território do Estado brasileiro. En-tretanto, segundo Verdum,

não obstante ter passado mais de vinte anos desde quando foi aprovado a atual Constituição da Re-pública Federativa do Brasil (1988), que incluiu um capítulo específico relativo aos direitos dos po-vos indígenas (Capítulo VIII – Dos Índios), o que se percebe hoje é que nenhum dos governos que

se sucederam, ao longo desses anos, implementou mudanças significativas nas práticas e estruturas político-administrativas do aparato de Estado, em particular na direção da transformação do Estado brasileiro num Estado Plurinacional26.

Apesar disso, no plano normativo a Cons-tituição Federal de 1988 reconheceu aos índios brasileiros direitos diferenciados em função de sua pertença cultural, notadamente em relação a questão das terras indígenas. Mas foi além, reco-nhecendo “sua organização social, costumes, lín-guas, crenças e tradições” (art. 231), assim como o direito de ser parte em juízo para a defesa dos seus direitos e interesses (art. 232). Do mesmo modo, a Lei Orgânica do Município, em seu art. 200, prescreve: “O Município promoverá e incen-tivará formas de valorização e proteção da cultura indígena, de suas tradições, dos usos, dos costu-mes e da religiosidade, assegurando-lhes o direito a sua autonomia e organização social” (grifei) e que “§ 2º - Cabe ao Poder Público e à coletivida-de apoiar as sociedades indígenas na organiza-ção de programas e estudos e pesquisas de suas formas de expressão cultural, de acordo com os interesses dessas sociedades e garantindo-lhes a propriedade do seu patrimônio cultural” (grifei). E o Brasil é signatário da Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre povos indígenas e tribais, ratificada e incorpo-rada à ordem interna pelo Decreto 5051/2004. Segundo esse documento, “os governos deverão assumir a responsabilidade de desenvolver, com a participação dos povos interessados, uma ação coordenada e sistemática com vistas a proteger os direitos desses povos e a garantir o respeito pela sua integridade. Essa ação deverá incluir medidas: (...) que promovam a plena efetividade dos direitos sociais, econômicos e culturais des-ses povos, respeitando a sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições, e as suas instituições” (art. 2º, 1 e 2, b). Esses avanços na relação entre estados nacionais e povos indígenas culminaram, em 2007, na aprovação pela As-sembléia Geral das Nações Unidas da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que reafirma o direito desses grupos a autonomia e ao direito de manterem-se como sociedade distinta dentro dos estados onde vivem e não serem discriminadas em razão de suas dife-renças de organização social, tradições, língua e práticas, assim como de participarem plenamen-te da vida política e econômica dos Estados se assim o desejarem. As concepções sustentadas nessas normativas atendem às reivindicações dos

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grupos indígenas pelo reconhecimento de sua autonomia como nações distintas e o direito de manterem-se assim, ainda que em permanente contato, interação e troca com sociedade abran-gente.

Esses avanços no plano normativo devem ser seguidos, em todo caso, pela adequação do aparato administrativo do Estado a fim de dar efetividade aos direitos consagrados naqueles do-cumentos. Avançar nesse ponto, para além dos avanços conquistados no plano normativo, parece ser o mais difícil, como nos recordou Verdum.

No âmbito local, através da ação de fomento apresentada ao início buscamos concretizar esses princípios, ainda que de forma bastante modesta, conferindo tratamento diferenciado, em reconhe-cimento de suas formas de organização e costu-mes, aos grupos indígenas guaranis da Bacia Hi-drográfica do Lago Guaíba. Propusemos, assim, a dispensa de requisitos formais de representação legal ao adquirir peças de artesanato para cons-tituir acervo da cultura material destes grupos. Isso porque a comunidade em questão se trata de comunidade indígena, nos termos estabelecidos pela Convenção 169 da OIT, que em seu art. 1º, define como povos indígenas aqueles “que des-cendem de povos que pré-existem aos Estados atuais (feito histórico), conservam totalmente ou parcialmente as suas instituições sociais, políti-cas, culturais, ou modos de vida (vigência atual), e que têm autoconsciência da sua própria iden-tidade (critério subjetivo)”27, e como tal merece tratamento diferenciado por parte do aparato po-lítico administrativo do Estado. Foi assim, que en-caminhamos a contratação direta reconhecendo a legitimidade do Cacique Guarani para representar sua comunidade segundo seus usos e costumes.

1 Carlos Rogério Guedes Pires, Assessor Jurídico da Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana/PMPA.2 TAYLOR, Charles. A Política de Reconhecimento. In Mul-ticulturalismo. Tradução de Marta Machado. Piaget. Lisboa, 1998. HONNETH, Axel. Luta por Reconhecimento: a gramá-tica moral dos conflitos sociais. Tradução de Luiz Repa. Ed. 34. São Paulo, 2003.3 NOZICK, Robert. Anarchy, State and Utopia. Blackwell. Oxford, 1974.4 RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. Tradução de Almiro Pisetta e Lenita Maria Rímoli Esteves. Martins Fontes. São Paulo, 2002.5 SANDEL, Michael J. Liberalism and the Limits of Justi-ce, Second Edition. Cambridge University Press. Cambridge, 1998.6 Ibidem.

7 WEINSTOCK, Daniel. A Problemática Multiculturalista. In As Filosofias Políticas Contemporâneas [Org. Alain Renaut]. Tradução de Elisa Pereira e Felipe Duarte. Piaget. Lisboa, 2002.8 TAYLOR, Charles. A Política de Reconhecimento. In Mul-ticulturalismo. Tradução de Marta Machado. Ed. Instituto Piaget. Lisboa, 1998.9 Ibidem. No mesmo sentido, YOUNG, Iris Marion. Struc-tural Injustice and the Politics of Difference In: Justice, Go-vernance, Cosmopolitanism, and the Politics of Difference – Reconfigurations in a Transnational World.10 Ibidem.11 KYMLICKA, Will. Multicultural Citzenship:a liberal theory of minority rights. Clarendon press. Oxford, 1995.12 Ibidem.13 Ibidem. 14 Ver STAVENHAGEN, Rodolfo. Building Intercultural Ci-tizenship: a Challenge for our Times. IN World forum on human rights: Round table “Cultural Rights, propicious fra-mework to cultural diversity”. UNESCO, Nantes, 10-13 July 2006.15 WEINSTOCK, Daniel. A Problemática Multiculturalista. In As Filosofias Políticas Contemporâneas [Org. Alain Re-naut]. Tradução de Elisa Pereira e Felipe Duarte. Piaget. Lis-boa, 2002.16 KYMLICKA, Will. Multicultural Citzenship:a liberal the-ory of minority rights. Clarendon press. Oxford, 1995. 17 Ibidem. 18 Ibidem.19 YOUNG, Iris M. Justice and the Politics of Difference. Princeton University Press. Princeton, 1990.20 MACINTYRE, Alasdair. Justiça de Quem? Qual Raciona-lidade? Tradução de Marcelo Pimenta Marques. 2ª ed. Loyo-la. São Paulo, 2001.21 HABERMAS. Jürgen. Direito e Democracia: entre facti-cidade e validade. Volumes I e II. Tradução de Flávio Beno Siebneichler. Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro, 1997.22 HABERMAS, Jürgen. La Inclusión del Otro: estudios de teoría política. Tradução de Juan Carlos Velasco Arroyo e Ge-rard Vilar Roca. Paidós. Barcelona, 2002.23 RAWLS, John. Political Liberalism. Columbia University Press. Nova Iorque, 2005.24 HABERMAS, Jürgen. La Inclusión del Otro: estudios de teoría política. Tradução de Juan Carlos Velasco Arroyo e Ge-rard Vilar Roca. Paidós. Barcelona, 2002.25 VERDUM, Ricardo. Povos Indígenas no Brasil: o desafio da autonomia. In Povos Indígenas: Constituições e reformas Políticas na América Latina / [organizador Ricardo Verdum]. - Brasília: Instituto de Estudos socioeconômicos, 2009. “Es-tima-se existir no Brasil um total de 220 povos indígenas, vários deles submetidos à jurisdição de mais de um Esta-do-nação, como é o caso dos Guarani (Argentina, Bolívia, Brasil e Paraguai), Yanomami (Brasil e Venezuela), Tukano (Brasil e Colômbia) e Tikuna (Brasil, Colômbia e Peru)”.26 Ibidem.27 FAJARDO, Raquel Z. Yrigoyen. Aos 20 anos do Convê-nio 169 da OIT: Balanço e desafios da implementação dos direitos dos Povos Indígenas na América Latina. IN Povos Indígenas: Constituições e reformas Políticas na América La-tina / [organizador Ricardo Verdum]. - Brasília: Instituto de Estudos socioeconômicos, 2009.

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to/PMPA e Departamento Municipal de Limpeza Urbana/PMPA, facilitando a relação entre os de-partamentos municipais e as pessoas indígenas;

- Participação junto à Secretaria Municipal da Saúde/PMPA na elaboração de políticas pú-blicas de saúde voltadas aos povos indígenas em Porto Alegre, sempre que solicitado por esta se-cretaria;

- Gestão e acompanhamento compartilhado com a Escola Porto Alegre/SMED do Projeto “Fa-zendo Cerâmica Hoje como Nossos Avós”;

- Participação em reuniões e audiências pú-blicas convocadas pela Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Ur-bana (CEDECONDH) da Câmara Municipal de Porto Alegre, bem como da Comissão de Cidada-nia e Direitos Humanos (CCDH) da Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, refe-rentes aos temas de saúde, educação, segurança alimentar, regularização fundiária, sustentabilida-de, entre outros, direcionados às comunidades ou pessoas indígenas em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul;

- Participação nos diversos fóruns e presta-ção de informações junto aos órgãos da adminis-tração direta e indireta municipais, instituições estaduais (CEPI/RS) e federais (FUNAI e FUNA-SA) sobre assuntos relacionados aos povos indí-genas;

- Coordenação do Grupo de Trabalho de Po-líticas Públicas para os Povos Indígenas no âmbi-to da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, com-posto por quinze órgãos da administração direta, indireta, empresas públicas e de economia mista municipais;

- Gestão compartilhada com a comissão de representantes Kaingang e Mbyá-Guarani da Loja de Arte Indígena do Mercado do Bom Fim, espa-ço cedido pela Prefeitura Municipal para comer-cialização de artesanato indígena;

- Participação em reuniões convocadas pela Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, Ministério Público Federal, nos contextos de In-quérito Civil Público e Procedimentos Adminis-trativos, que versam sobre prestação de serviços de saúde, segurança alimentar, regularização fundiária, sustentabilidade, entre outros, no âm-bito municipal. Sempre que solicitado por esta Procuradoria, são respondidos ofícios e prestadas informações;

- Capacitação das Equipes de Saúde da Fa-mília da Prefeitura Municipal/SMS/PMPA, no que se refere aos direitos específicos e diferenciados dos povos indígenas.

ATIVIDADES TÉCNICAS DO NPPPI/CDH/SDHSU

Atividades de rotina que competem ao NPP-PI/CDH/SMDHSU como instituição promotora e fiscalizadora de ações, políticas e programas vol-tados aos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais dos povos indígenas no muni-cípio de Porto Alegre.

- Visitação sistemática aos espaços de vida indígenas e avaliação continuada dos impactos de entorno e vizinhança sobre estas terras e co-munidades. Sempre que solicitados por parte das comunidades indígenas ou de moradores do entorno das áreas indígenas, há o empreendi-mento de diagnósticos, mediações e elaboração de pareceres;

- Vistoria sistemática dos equipamentos comunitários (Unidade de Saúde, Unidade Fi-toterápica, Escola, Centro Cultural e Praça das Crianças) e unidades habitacionais construídas no âmbito do Convênio entre Prefeitura Munici-pal de Porto Alegre e Fundação Paz y Solidaridad de Euskadi, Projeto “Kaingang de Sustentabili-dade”, Área de Interesse Cultural Kaingang da Lomba do Pinheiro. Esta atividade visa à solicita-ção de providências aos departamentos e secre-tarias municipais, sempre que necessário à con-servação dos bens imóveis construídos por este Projeto e o bem estar da comunidade indígena;

- Acompanhamento e orientação aos servi-dores da Fundação de Assistência Social e Ci-dadania/PMPA nos procedimentos de cadastra-mento das pessoas indígenas para o Programa Bolsa Família do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, sempre que solicita-do por esta Fundação ou indígenas participantes neste processo;

- Participação junto a Fundação de Assis-tência Social e Cidadania/PMPA na elaboração de políticas públicas de Segurança Alimentar voltadas às especificidades culturais dos povos indígenas em Porto Alegre, sempre que solicita-do por esta Fundação;

- Acompanhamento e orientação à Secreta-ria Municipal da Produção, Indústria e Comércio/PMPA no ordenamento e fiscalização dos espa-ços de exposição e comercialização do artesana-to indígena em Porto Alegre, sempre que estes procedimentos envolverem pessoas ou coletivi-dades indígenas, e sempre que solicitados pela secretaria ou indígenas participantes nestes pro-cessos;

- Acompanhamento dos serviços prestados nas comunidades indígenas em Porto Alegre, pelo Departamento Municipal de Água e Esgo-

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A Constituição Brasileira de 1988 trou-xe uma série de inovações ao tratamento da questão indígena no país alterando pro-fundamente as normas legais de relação do Estado e da sociedade brasileira com estes coletivos. O texto constitucional garante aos povos indígenas direitos permanentes e cole-tivos: reconhecimento de sua organização so-cial, costumes, línguas, crenças e tradições; direitos originários e imprescritíveis sobre as terras que tradicionalmente ocupam conside-radas inalienáveis e indisponíveis; proteção e valorização das manifestações culturais in-dígenas, que passam a integrar o patrimônio cultural brasileiro.

No plano internacional, o Estado brasi-leiro é signatário dos principais instrumentos de direitos humanos, dentre os quais a Con-venção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho. Este tratado internacional é um instrumento vinculante para os Estados que os ratificam, que estabelece no Brasil as dire-trizes internacionais de garantia dos direitos dos povos indígenas ao uso de seus territó-rios, a não discriminação e a viverem e a se desenvolverem de maneira diferenciada, se-gundo seus costumes. O Brasil, ao ratificar a Convenção aderiu ao instrumento de direito internacional mais abrangente na matéria, que trata de garantir aos povos indígenas e tribais os direitos mínimos de, se assim o desejarem, salvaguardar suas culturas e sua identidade no contexto das sociedades que integram.

Sendo parte desse tratado de direitos humanos, o Estado brasileiro reconhece os princípios humanitários e compromete-se a implementar e proteger o rol de direitos fun-damentais ali dispostos: o Estado tem o de-ver de desencadear medidas especiais para

UM POUCO DE LEGISLAÇÃO INDIGENISTA

salvaguardar as pessoas, instituições, bens, o trabalho, as culturas e o meio ambiente des-tes povos. Ademais, esta Convenção define como um dever do Estado à consulta prévia aos povos interessados sempre que se preve-jam medidas legislativas ou administrativas capazes de afetá-los diretamente e afirma o direito dos povos interessados de decidir suas próprias prioridades em relação ao processo de desenvolvimento, na medida em que este afete suas vidas.

Na esfera do município de Porto Alegre, em termos de direitos socioculturais específi-cos, diferenciados e de direitos humanos di-recionados aos povos indígenas, estamos em total acordo com os instrumentos normativos nacionais e internacionais acima. Estes prin-cípios estão descritos no Artigo 200 da Lei Orgânica.

Neste sentido, estes instrumentos nor-mativos rompem explicitamente com o inte-gracionismo/assimilacionismo e estabelece as bases de um modelo pluralista, baseado no controle indígena de suas próprias insti-tuições e modelo de desenvolvimento, e na sua participação nas políticas estatais, que reconhece a igual dignidade de todos os povos e o direito dos povos indígenas a de-finir livremente sua condição política e seu modelo de desenvolvimento, assim como a participar da tomada de decisões com o Estado, se assim desejarem. O desafio atu-al é a implementação do marco de direitos existente e o desenvolvimento de políticas públicas, coordenadas, sistemáticas e par-ticipativas, baseadas em tais direitos, que permitam aos povos retomar as rédeas do seu destino e participar com os outros po-vos na construção de estados democráticos e pluralistas.

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Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.....Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:.....II - prevalência dos direitos humanos;III - autodeterminação dos povos;.....VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;.....Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo--se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:.....XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades funda-mentais;XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;.....Art. 20 São bens da União:.....X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos;XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios......Art. 22 Compete privativamente à União legislar sobre:.....XIV - populações indígenas;.....Art. 49 É da competência exclusiva do Congresso Nacional:.....XVI - autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hí-dricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais;.....Art. 109 Aos juizes federais compete processar e julgar:.....XI - a disputa sobre direitos indígenas......Art. 129 São funções institucionais do Ministério Público:.....V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;.....Art. 215 O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.§ 1º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro--brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.§ 2º A lei disporá sobre a fixação de datas comemorativas de alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais......

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Art. 231 São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, compe-tindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preserva-ção dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodu-ção física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse perma-nente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pes-quisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes asse-gurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua popu-lação, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé......Art. 232 Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo......Brasília, 05 de outubro de 1988

Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição,Considerando que o Congresso Nacional aprovou, por meio do Decreto Legislativo nº 143, de 20 de junho de 2002, o texto da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e Tribais, adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989;Considerando que o Governo brasileiro depositou o instrumento de ratificação junto ao Diretor Executivo da OIT em 25 de julho de 2002; Considerando que a Convenção entrou em vigor internacional, em 5 de setembro de 1991, e, para o Brasil, em 25 de julho de 2003, nos termos de seu art. 38;DECRETA:Art. 1º A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e Tribais, adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989, apensa por cópia ao presente Decreto, será executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém......Brasília, 19 de abril de 2004.Luiz Inácio Lula da Silva

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CONVENÇÃO N° 169 DA OIT SOBRE OS POVOS INDÍGENAS E TRIBAIS.....Artigo 1°1. A presente convenção aplica-se:a) aos povos tribais em países independentes, cujas condições sociais, culturais e eco-nômicas os distingam de outros setores da coletividade nacional, e que estejam regidos, total ou parcialmente, por seus próprios costumes ou tradições ou por legislação especial;b) aos povos em países independentes, considerados indígenas pelo fato de descenderem de populações que habitavam o país ou uma região geográfica pertencente ao país na época da conquista ou da colonização ou do estabelecimento das atuais fronteiras estatais e que, seja qual for sua situação jurídica, conservam todas as suas próprias instituições sociais, econômicas, culturais e políticas, ou parte delas.2. A consciência de sua identidade indígena ou tribal deverá ser considerada como critério fundamental para determinar os grupos aos que se aplicam as disposições da presente Convenção.3. A utilização do termo “povos” na presente Convenção não deverá ser interpretada no sentido de ter implicação alguma no que se refere aos direitos que possam ser conferidos a esse termo no direito internacional.Artigo 2º1. Os governos deverão assumir a responsabilidade de desenvolver, com a participação dos povos interessados, uma ação coordenada e sistemática com vistas a proteger os direitos desses povos e a garantir o respeito pela sua integridade.2. Essa ação deverá incluir medidas:a) que assegurem aos membros desses povos o gozo, em condições de igualdade, dos direitos e oportunidades que a legislação nacional outorga aos demais membros da po-pulação;b) que promovam a plena efetividade dos direitos sociais, econômicos e culturais desses povos, respeitando a sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições, e as suas instituições;c) que ajudem os membros dos povos interessados a eliminar as diferenças sócio-econô-micas que possam existir entre os membros indígenas e os demais membros da comuni-dade nacional, de maneira compatível com suas aspirações e formas de vida.Artigo 3°1. Os povos indígenas e tribais deverão gozar plenamente dos direitos humanos e liberda-des fundamentais, sem obstáculos nem discriminação. As disposições desta Convenção serão aplicadas sem discriminação aos homens e mulheres desses povos.2. Não deverá ser empregada nenhuma forma de força ou de coerção que viole os direi-tos humanos e as liberdades fundamentais dos povos interessados, inclusive os direitos contidos na presente Convenção.Artigo 4°1. Deverão ser adotadas as medidas especiais que sejam necessárias para salvaguardar as pessoas, as instituições, os bens, as culturas e o meio ambiente dos povos interessa-dos.2. Tais medidas especiais não deverão ser contrárias aos desejos expressos livremente pelos povos interessados.3. O gozo sem discriminação dos direitos gerais da cidadania não deverá sofrer nenhuma deterioração como conseqüência dessas medidas especiais.Artigo 5ºAo se aplicar as disposições da presente Convenção:a) deverão ser reconhecidos e protegidos os valores e práticas sociais, culturais religiosos e espirituais próprios dos povos mencionados e dever-se-á levar na devida consideração

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a natureza dos problemas que lhes sejam apresentados, tanto coletiva como individual-mente;b) deverá ser respeitada a integridade dos valores, práticas e instituições desses povos;c) deverão ser adotadas, com a participação e cooperação dos povos interessados, me-didas voltadas a aliviar as dificuldades que esses povos experimentam ao enfrentarem novas condições de vida e de trabalho.Artigo 6º1. Ao aplicar as disposições da presente Convenção, os governos deverão:a) consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particular-mente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medi-das legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente;b) estabelecer os meios através dos quais os povos interessados possam participar livre-mente, pelo menos na mesma medida que outros setores da população e em todos os níveis, na adoção de decisões em instituições efetivas ou organismos administrativos e de outra natureza responsáveis pelas políticas e programas que lhes sejam concernentes;c) estabelecer os meios para o pleno desenvolvimento das instituições e iniciativas dos povos e, nos casos apropriados, fornecer os recursos necessários para esse fim.2. As consultas realizadas na aplicação desta Convenção deverão ser efetuadas com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas.Artigo 7º1. Os povos interessados deverão ter o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu próprio desen-volvimento econômico, social e cultural. Além disso, esses povos deverão participar da formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de afetá-los diretamente.2. A melhoria das condições de vida e de trabalho e do nível de saúde e educação dos po-vos interessados, com a sua participação e cooperação, deverá ser prioritária nos planos de desenvolvimento econômico global das regiões onde eles moram. Os projetos especiais de desenvolvimento para essas regiões também deverão ser elaborados de forma a pro-moverem essa melhoria.3. Os governos deverão zelar para que, sempre que for possível, sejam efetuados estudos junto aos povos interessados com o objetivo de se avaliar a incidência social, espiritual e cultural e sobre o meio ambiente que as atividades de desenvolvimento, previstas, pos-sam ter sobre esses povos. Os resultados desses estudos deverão ser considerados como critérios fundamentais para a execução das atividades mencionadas.4. Os governos deverão adotar medidas em cooperação com os povos interessados para proteger e preservar o meio ambiente dos territórios que eles habitam.Artigo 8°1. Ao aplicar a legislação nacional aos povos interessados deverão ser levados na devida consideração seus costumes ou seu direito consuetudinário.2. Esses povos deverão ter o direito de conservar seus costumes e instituições próprias, desde que eles não sejam incompatíveis com os direitos fundamentais definidos pelo sis-tema jurídico nacional nem com os direitos humanos internacionalmente reconhecidos. Sempre que for necessário, deverão ser estabelecidos procedimentos para se solucionar os conflitos que possam surgir na aplicação deste principio.3. A aplicação dos parágrafos 1 e 2 deste Artigo não deverá impedir que os membros desses povos exerçam os direitos reconhecidos para todos os cidadãos do país e assumam as obrigações correspondentes.

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Artigo 9°1. Na medida em que isso for compatível com o sistema jurídico nacional e com os di-reitos humanos internacionalmente reconhecidos, deverão ser respeitados os métodos aos quais os povos interessados recorrem tradicionalmente para a repressão dos delitos cometidos pelos seus membros.2. As autoridades e os tribunais solicitados para se pronunciarem sobre questões penais deverão levar em conta os costumes dos povos mencionados a respeito do assunto......Artigo 12Os povos interessados deverão ter proteção contra a violação de seus direitos, e poder iniciar procedimentos legais, seja pessoalmente, seja mediante os seus organismos re-presentativos, para assegurar o respeito efetivo desses direitos. Deverão ser adotadas medidas para garantir que os membros desses povos possam compreender e se fazer compreender em procedimentos legais, facilitando para eles, se for necessário, intérpretes ou outros meios eficazes.Artigo 131. Ao aplicarem as disposições desta parte da Convenção, os governos deverão respeitar a importância especial que para as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui a sua relação com as terras ou territórios, ou com ambos, segundo os casos, que eles ocupam ou utilizam de alguma maneira e, particularmente, os aspectos coletivos dessa relação.2. A utilização do termo “terras” nos Artigos 15 e 16 deverá incluir o conceito de territó-rios, o que abrange a totalidade do habitat das regiões que os povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma.Artigo 141. Dever-se-á reconhecer aos povos interessados os direitos de propriedade e de posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Além disso, nos casos apropriados, deverão ser adotadas medidas para salvaguardar o direito dos povos interessados de utilizar ter-ras que não estejam exclusivamente ocupadas por eles, mas às quais, tradicionalmente, tenham tido acesso para suas atividades tradicionais e de subsistência. Nesse particular, deverá ser dada especial atenção à situação dos povos nômades e dos agricultores itine-rantes.2. Os governos deverão adotar as medidas que sejam necessárias para determinar as ter-ras que os povos interessados ocupam tradicionalmente e garantir a proteção efetiva dos seus direitos de propriedade e posse.3. Deverão ser instituídos procedimentos adequados no âmbito do sistema jurídico na-cional para solucionar as reivindicações de terras formuladas pelos povos interessados.Artigo 151. Os direitos dos povos interessados aos recursos naturais existentes nas suas terras deverão ser especialmente protegidos. Esses direitos abrangem o direito desses povos a participarem da utilização, administração e conservação dos recursos mencionados.2. Em caso de pertencer ao Estado a propriedade dos minérios ou dos recursos do sub-solo, ou de ter direitos sobre outros recursos, existentes nas terras, os governos deverão estabelecer ou manter procedimentos com vistas a consultar os povos interessados, a fim de se determinar se os interesses desses povos seriam prejudicados, e em que medida, antes de se empreender ou autorizar qualquer programa de prospecção ou exploração dos recursos existentes nas suas terras. Os povos interessados deverão participar sempre que for possível dos benefícios que essas atividades produzam, e receber indenização eqüita-tiva por qualquer dano que possam sofrer como resultado dessas atividades.

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Artigo 161. Com reserva do disposto nos parágrafos a seguir do presente Artigo, os povos interes-sados não deverão ser transladados das terras que ocupam.2. Quando, excepcionalmente, o translado e o reassentamento desses povos sejam con-siderados necessários, só poderão ser efetuados com o consentimento dos mesmos, con-cedido livremente e com pleno conhecimento de causa. Quando não for possível obter o seu consentimento, o translado e o reassentamento só poderão ser realizados após a conclusão de procedimentos adequados estabelecidos pela legislação nacional, inclusive enquetes públicas, quando for apropriado, nas quais os povos interessados tenham a possibilidade de estar efetivamente representados.3. Sempre que for possível, esses povos deverão ter o direito de voltar a suas terras tra-dicionais assim que deixarem de existir as causas que motivaram seu translado e reas-sentamento.4. Quando o retorno não for possível, conforme for determinado por acordo ou, na ausên-cia de tais acordos, mediante procedimento adequado, esses povos deverão receber, em todos os casos em que for possível, terras cuja qualidade e cujo estatuto jurídico sejam pelo menos iguais aqueles das terras que ocupavam anteriormente, e que lhes permitam cobrir suas necessidades e garantir seu desenvolvimento futuro. Quando os povos interes-sados prefiram receber indenização em dinheiro ou em bens, essa indenização deverá ser concedida com as garantias apropriadas.5. Deverão ser indenizadas plenamente as pessoas transladadas e reassentadas por qual-quer perda ou dano que tenham sofrido como conseqüência do seu deslocamento.Artigo 171. Deverão ser respeitadas as modalidades de transmissão dos direitos sobre a terra entre os membros dos povos interessados estabelecidas por esses povos.2. Os povos interessados deverão ser consultados sempre que for considerada sua capa-cidade para alienarem suas terras ou transmitirem de outra forma os seus direitos sobre essas terras para fora de sua comunidade.3. Dever-se-á impedir que pessoas alheias a esses povos possam se aproveitar dos cos-tumes dos mesmos ou do desconhecimento das leis por parte dos seus membros para se arrogarem a propriedade, a posse ou o uso das terras a eles pertencentes.Artigo 18A lei deverá prever sanções apropriadas contra toda intrusão não autorizada nas terras dos povos interessados ou contra todo uso não autorizado das mesmas por pessoas alheias a eles, e os governos deverão adotar medidas para impedirem tais infrações......Artigo 231. O artesanato, as indústrias rurais e comunitárias e as atividades tradicionais e rela-cionadas com a economia de subsistência dos povos interessados, tais como a caça, a pesca com armadilhas e a colheita, deverão ser reconhecidas como fatores importantes da manutenção de sua cultura e da sua auto-suficiência e desenvolvimento econômico. Com a participação desses povos, e sempre que for adequado, os governos deverão zelar para que sejam fortalecidas e fomentadas essas atividades.2. A pedido dos povos interessados, deverá facilitar-se aos mesmos, quando for possível, assistência técnica e financeira apropriada que leve em conta as técnicas tradicionais e as características culturais desses povos e a importância do desenvolvimento sustentado e eqüitativo......Artigo 251. Os governos deverão zelar para que sejam colocados à disposição dos povos interes-sados serviços de saúde adequados ou proporcionar a esses povos os meios que lhes

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permitam organizar e prestar tais serviços sob a sua própria responsabilidade e controle, a fim de que possam gozar do nível máximo possível de saúde física e mental.2. Os serviços de saúde deverão ser organizados, na medida do possível, em nível co-munitário. Esses serviços deverão ser planejados e administrados em cooperação com os povos interessados e levar em conta as suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como os seus métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais.3. O sistema de assistência sanitária deverá dar preferência à formação e ao emprego de pessoal sanitário da comunidade local e se centrar no atendimento primário à saúde, mantendo ao mesmo tempo estreitos vínculos com os demais níveis de assistência sani-tária.4. A prestação desses serviços de saúde deverá ser coordenada com as demais medidas econômicas e culturais que sejam adotadas no país......Artigo 301. Os governos deverão adotar medidas de acordo com as tradições e culturas dos povos interessados, a fim de lhes dar a conhecer seus direitos e obrigações especialmente no referente ao trabalho e às possibilidades econômicas, às questões de educação e saúde, aos serviços sociais e aos direitos derivados da presente Convenção.2. Para esse fim, dever-se-á recorrer, se for necessário, a traduções escritas e à utilização dos meios de comunicação de massa nas línguas desses povos.Artigo 31Deverão ser adotadas medidas de caráter educativo em todos os setores da comunidade nacional, e especialmente naqueles que estejam em contato mais direto com os povos interessados, com o objetivo de se eliminar os preconceitos que poderiam ter com relação a esses povos. Para esse fim, deverão ser realizados esforços para assegurar que os livros de História e demais materiais didáticos ofereçam uma descrição eqüitativa, exata e ins-trutiva das sociedades e culturas dos povos interessados......Artigo 331. A autoridade governamental responsável pelas questões que a presente Convenção abrange deverá se assegurar de que existem instituições ou outros mecanismos apro-priados para administrar os programas que afetam os povos interessados, e de que tais instituições ou mecanismos dispõem dos meios necessários para o pleno desempenho de suas funções.2. Tais programas deverão incluir:a) o planejamento, coordenação, execução e avaliação, em cooperação com os povos interessados, das medidas previstas na presente Convenção;b) a proposta de medidas legislativas e de outra natureza às autoridades competentes e o controle da aplicação das medidas adotadas em cooperação com os povos interessados......Artigo 35A aplicação das disposições da presente Convenção não deverá prejudicar os direitos e as vantagens garantidos aos povos interessados em virtude de outras convenções e reco-mendações, instrumentos internacionais, tratados, ou leis, laudos, costumes ou acordos nacionais......

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Lei nº 11.645/2008

Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”O PRESIDENTE DA REPÚBLICAFaço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:Art. 1º O art. 26-A da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.§ 1º O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.§ 2º Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.”Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.Brasília, 10 de março de 2008; 187º da Independência e 120º da República.LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Constituição do Estado do Rio Grande do Sul.....Art. 157 Na organização de sua economia, em cumprimento ao que estabelece a Consti-tuição Federal, o Estado zelará pelos seguintes princípios:.....X - resguardo das áreas de usufruto perpétuo dos índios e das que lhes pertencem a justo título;.....Art. 264 O Estado promoverá e incentivará a autopreservação das comunidades indíge-nas, assegurando-lhes o direito a sua cultura e organização social.§ 1º O Poder Público estabelecerá projetos especiais com vista a integrar a cultura indí-gena ao patrimônio cultural do Estado.§ 2º Cabe ao Poder Público auxiliar as comunidades indígenas na organização, para suas populações nativas e ocorrentes, de programas de estudos e pesquisas de seu idioma, arte e cultura, a fim de transmitir seu conhecimento às gerações futuras.§ 3º É vedada qualquer forma de deturpação externa da cultura indígena, violência às comunidades ou a seus membros, bem como a utilização para fins de exploração.§ 4º São asseguradas às comunidades indígenas proteção e assistência social e de saúde prestadas pelo Poder Público estadual e municipal......

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Lei Orgânica do Município de Porto Alegre.....Art. 200 O Município promoverá e incentivará formas de valorização e proteção da cultura indígena, de suas tradições, dos usos, dos costumes e da religiosidade, assegurando-lhes o direito a sua autonomia e organização social.§ 1º O Poder Público estabelecerá projetos especiais com vistas a valorizar a cultura indí-gena como parte da vida cultural do Município.§ 2º Cabe ao Poder Público e à coletividade apoiar as sociedades indígenas na organiza-ção de programas de estudos e pesquisas de suas formas de expressão cultural, de acordo com os interesses dessas sociedades e garantindo-lhes a propriedade do seu patrimônio cultural.§ 3º Fica vedada, no Município de Porto Alegre, qualquer forma de deturpação externa da cultura indígena, violência às comunidades ou a seus membros, bem como sua utilização para fins de exploração.§ 4º Ficam asseguradas às comunidades indígenas, proteção e assistência social, sócio--econômica e de saúde prestadas pelo Poder Público Municipal, através de políticas pú-blicas adequadas às suas especificidades culturais.§ 5º O Município garantirá às comunidades indígenas o ensino regular, ministrado de forma intercultural e bilíngüe, no dialeto indígena da comunidade e em português, respei-tando, valorizando e resgatando seus métodos próprios de aprendizagem de sua língua e tradição cultural.§ 6º O Município promoverá e valorizará as sociedades indígenas no sistema público de ensino municipal......

Lei Municipal nº 7879/1996

Institui a “Semana do Índio” no Município de Porto AlegreO PREFEITO MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE.Faço saber que a Câmara Municipal aprovou e eu sanciono a seguinte Lei:Art. 1º Fica instituída a “Semana do Índio” no Município de Porto Alegre.Art. 2º O evento terá seu desenrolar de 19 a 25 de abril de cada ano.Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário.Porto Alegre, 23 de outubro de 1996.Tarso Genro

Lei Municipal nº 8114/1998

Altera a Lei Municipal n° 7879, de 23 de outubro de 1996, que institui a “Semana do Índio” no Município de Porto Alegre, e dá outras providênciasO PREFEITO MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE.Faço saber que a Câmara Municipal aprovou e eu sanciono a seguinte Lei:Art. 1º Ficam alterados a Ementa e o art. 1º da Lei Municipal nº 7879, de 23 de outubro de 1996, onde se lê “Semana do Índio”, leia-se “Semana Municipal dos povos Indígenas”.Art. 2º Ficam acrescentados artigos 3º e 4º à Lei Municipal nº 7879/96, renumerando--se os demais, com a seguinte redação: “Art. 3º A organização da ‘Semana Municipal dos Povos Indígenas’ ficará a cargo das entidades representativas da comunidade indígena e organizações não-governamentais vinculadas à causa indígena, com apoio da Secretaria Municipal da Cultura e da Coordenadoria Municipal de Direitos Humanos. Art. 4º A pro-gramação da ‘Semana Municipal dos Povos Indígenas’ será definida em conjunto pelas

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entidades e organizações não-governamentais (ONGs) referidas no artigo anterior, Se-cretaria Municipal da Cultura, Coordenadoria Municipal de Direitos Humanos, Conselho Municipal de Direitos da Cidadania e Contra Discriminações e Violência, consultados os órgãos federais e estaduais vinculados à questão indígena e às Universidades. Parágrafo único. A programação deverá contemplar a produção artística e cultural da comunidade indígena local, bem como a produção e divulgação da cultura indígena junto à comuni-dade porto-alegrense.”Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário.Porto Alegre, 02 de janeiro de 1998.Raul Pont

Decreto nº 12.874/2000

Destina o uso da loja n° 22 do Mercado do Bom Fim para a comercialização de artefatos indígenas produzidos pelas etnias pelas etnias Kaingangue e Mbyá-guaraniO PREFEITO MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, no uso das atribuições que lhe confere o art. 94, inc. II, da Lei Orgânica do Município,DECRETA:Art. 1º Fica destinada a loja nº 22 do Mercado do Bom Fim, com área de 15,93m² para a comercialização de artefatos produzidos pelas etnias Kaingangue e M’byá-guarani.Parágrafo único. O acompanhamento das atividades da loja será feito pelo Gabinete do Prefeito.Art. 2º O funcionamento das atividades da loja será supervisionado por uma Comissão composta por:I - um representante da comunidade Kaingangue;II - um representante da comunidade Mbyá-guarani;III - um representante do Gabinete do Prefeito;IV - um representante da Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio.Art. 3º A loja funcionará durante todo o horário de funcionamento do Mercado, conforme definido no Regulamento do Mercado do Bom Fim.Art. 4º Somente poderão ser expostos e comercializados artefatos produzidos pelas etnias Kaingangue e Mbyá-guarani constantes de:I - cestas;II - esculturas;III - arcos, flechas e lanças;IV - colares, anéis e adereços em geral;V - esculturas instrumentos musicais;VI - cerâmicas;VII - outros objetos representativos da cultura dos grupos étnicos referidos no “caput” deste artigo.§ 1º Cada peça comercializada na loja será acompanhada de uma etiqueta indicando o nome de seu produtor e o grupo étnico que representa, além de uma indicação da proce-dência e composição.§ 2º Serão disponibilizados aos visitantes um folder explicativo sobre a loja, escrito em três idiomas (kaingangue, Mbyá-guarani e português), contendo um breve histórico dos respectivos povos indígenas, assim como dos artefatos comercializados.Art. 5º As demais condições de utilização do próprio municipal objeto deste Decreto serão fixadas no Regulamento de Funcionamento da Loja.Art. 6º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.Porto Alegre, 08 de agosto de 2000.Raul Pont

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Lei nº 9.056/2002

Cria a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança UrbanaO PREFEITO MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE.Faço saber que a Câmara Municipal aprovou e eu sanciono a seguinte Lei:Art. 1º Fica criada, na Administração Centralizada do Município de Porto Alegre, a Secre-taria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana (SMDHSU).Art. 2º A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana, vinculada dire-tamente ao Prefeito Municipal, é o órgão central de coordenação e controle de políticas de Direitos Humanos e Cidadania e tem como finalidades:I – coordenar e controlar as políticas públicas de gênero, do povo negro, da livre orienta-ção sexual, da juventude e das pessoas portadoras de deficiência;II – articular-se com os diversos órgãos da Prefeitura Municipal de Porto Alegre - PMPA - com referência da aplicação das políticas de direitos humanos;III – desenvolver políticas transversais que garantam os direitos das pessoas com HIV--AIDS, com sofrimento psíquico, idosos, crianças e adolescentes, moradores de rua, po-pulação indígena, egressos do sistema prisional, profissionais do sexo e populações em situação de vulnerabilidade social;IV – promoção de oficinas, cursos, seminários e encontros com vistas à formação e capa-citação de pessoas para serem agentes promotores e divulgadores de direitos humanos;V – oferecer atendimento, encaminhamento e acompanhamento de denúncias de viola-ções de direitos humanos, políticas afirmativas de promoção da igualdade e serviços de apoio às vítimas de violências;VI – desenvolver projetos de resgate de memória dos diversos grupos sociais e sua in-terseção com as memórias coletivas, projetos de geração de renda, saúde, previdência, educação e outros;VII – desenvolver rede de controle social de políticas de direitos humanos e resgatar vín-culos de solidariedade e auto-orga-nização das sociedades, bem como fiscalização dos meios de comunicação social contra a difusão e a reprodução de preconceitos e discrimi-nações de qualquer espécie;.....Art. 14. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, 27 de dezembro de 2002.João Verle, Prefeito.

Decreto nº 16.127/2008

Cria no âmbito da Administração Municipal o Grupo de Trabalho Povos IndígenasO PREFEITO MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, no uso das atribuições que lhe confere o art. 94, inc. II, da Lei Orgânica do Município,DECRETA:Art. 1º Fica criado no âmbito da administração municipal o Grupo de Trabalho Povos Indígenas – GTPI, que ficará diretamente subordinado à Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana.Art. 2º O Grupo de Trabalho Povos Indígenas será composto por 15 (quinze) membros titulares e respectivos suplentes, nomeados pelo Prefeito, representantes dos seguintes órgãos da administração direta, indireta, empresas públicas e de economia mista muni-cipais:I – Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana – SMDHSU;II – Companhia Carris Porto Alegrense – CARRIS;III – Departamento Municipal de Água e Esgotos – DMAE;

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IV – Departamento Municipal de Limpeza Urbana – DMLU;V – Empresa Pública de Transporte e Circulação – EPTC;VI – Secretaria Municipal de Turismo – SMTUR;VII – Fundação de Assistência Social e Cidadania – FASC;VIII – Secretaria Municipal do Meio Ambiente – SMAM;IX – Secretaria Municipal da Cultura – SMC;X – Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer – SME;XI – Secretaria Municipal de Educação – SMED;XII – Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio – SMIC;XIII – Secretaria Municipal de Obras e Viação – SMOV;XIV – Secretaria Municipal da Saúde – SMS; eXV – Secretaria do Planejamento Municipal – SPM.Art. 3º A coordenação do Grupo de Trabalho Povos Indígenas – GTPI caberá à Coordenação de Direitos Humanos, através do seu Núcleo de Políticas Públicas para os Povos Indígenas, da Secre-taria Municipal de Diretos Humanos e Segurança Urbana.Art. 4º Constituem atribuições do Grupo de Trabalho Povos Indígenas:I – proporcionar a instrumentalização do poder público municipal na formulação de políticas públi-cas específicas para os povos indígenas, com vistas ao desenvolvimento de uma linha de ação que aponte as áreas prioritárias que o governo municipal deverá investir;II – contribuir para que a atuação dos servidores municipais, no que diz respeito aos atos admi-nistrativos que envolvam coletivos e pessoas indígenas, esteja balizada pela Legislação Federal, Estadual e Municipal;III – promover a informação e a sensibilização dos servidores municipais que trabalham com registros cadastrais dos usuários dos serviços públicos municipais acerca das culturas, etnias e direitos indígenas, proporcionando uma visão ampla destes e uma reflexão acerca da questão da diversidade cultural;IV – promover a criação de ações que possam favorecer a eliminação das desigualdades étnicas, sociais e culturais, das violações aos direitos indígenas e os comportamentos intolerantes e precon-ceituosos, estimulando o desenvolvimento de políticas para os povos indígenas;V – promover na sociedade a reflexão crítica acerca da história, ecologia e cultura dos povos indí-genas, para que ela possa compreender melhor as desigualdades socioambientais e culturais e os obstáculos ao acesso aos recursos materiais e imateriais relevantes a sustentabilidade indígena;VI – contribuir para a valorização das identidades indígenas no Município;VII – promover e elaborar ações e políticas públicas, para proteção e acesso diferenciado dos povos indígenas aos seus ambientes/territórios tradicionais;VIII – promover a criação de um banco de informações disponível ao conjunto da Prefeitura Muni-cipal de Porto Alegre, sobre a situação dos povos indígenas no Município, com dados quali-quan-titativos, que permitam a elaboração de políticas públicas e estudos sobre temas previamente detectados;IX – promover nas instâncias ordinárias do GTPI espaços de participação indígena; eX – promover fóruns interinstitucionais ampliados, direcionados à abordagem de questões espe-cíficas, cuja competência abranja a atuação de outras instituições e/ou esferas do poder público estadual e/ou federal.Art. 5º O Grupo de Trabalho Povos Indígenas poderá propor ao Executivo a celebração de Termos de Cooperação Técnica com entidades nacionais e internacionais, governamentais e não-governa-mentais, para fins de intercâmbio, convênios, parcerias e projetos na área de sua atuação.Art. 6º O Grupo de Trabalho Povos Indígenas poderá solicitar a colaboração de servidores de uni-dades da Prefeitura, quando necessário à consecução do seu objeto.Art. 7º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, 20 de novembro de 2008.José Fogaça, Prefeito