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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR Engenharia Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga Marcela Gonçalves de Almeida Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Arquitectura (ciclo de estudos integrado) Orientador: Prof. Doutora Ana Maria Tavares Ferreira Martins Covilhã, Outubro de 2014

Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga · A arquitectura popular de qualquer território, e Entre-Douro-e-Vouga não é excepção, resulta da súmula de factores geográficos,

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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR Engenharia

Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

Marcela Gonçalves de Almeida

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Arquitectura (ciclo de estudos integrado)

Orientador: Prof. Doutora Ana Maria Tavares Ferreira Martins

Covilhã, Outubro de 2014

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“Entender é sempre limitado. Mas não

entender pode não ter fronteiras. Sinto que

sou muito mais completa quando não

entendo.” 1

Clarice Lispector

1 http://www.citador.pt/textos/sabedoria-e-nao-entender-clarice-lispector (consultado a 17-09-2014;

às 18:41h)

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Dedicatória

As únicas pessoas a quem eu me sinto na obrigação de dedicar este trabalho:

À minha família, de modo particular os meus pais.

Tudo o que hoje sou, faço e ambiciono a eles lhes devo. Sem o amor de uma família, a

paciência, os conselhos e ensinamentos, não seria o que hoje sou. Foi no núcleo familiar que

nasceu o meu amor pelas artes em geral, crescendo eu entre uma família criativa, repleta de

dotes artísticos.

A arquitectura nem sempre foi uma certeza para mim, sendo eu fascinada por tantos outros

ramos artísticos que gostaria de desenvolver pessoal e profissionalmente. A escolha foi difícil,

mas eles sempre me incentivaram a seguir em frente, em qualquer que fosse a minha

escolha. Tenciono concretizar muitos outros objectivos para além deste, pelo qual lutei

imenso, e tenho a certeza que serão eles a estar do meu lado, mais uma vez, prontos a

lançarem-me nos meus caminhos e aventuras … algures por aí.

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Agradecimentos

Difícil será nomear todos aqueles que, directa ou indirectamente, me ajudaram a percorrer

este longo percurso académico.

Não posso assim deixar passar em branco o agradecimento à minha grande e unida família.

Pai, mãe, irmão, avós, padrinho, madrinha, tias, tios, primos e primas. Não poderia pedir

melhor equipa do que esta.

A todos os amigos e colegas que marcaram positivamente a minha vida académica; cada um

deles sabe o quanto foi importante para mim e que já conquistaram um lugar no meu

coração. Obrigada por tudo!

À malta jovem de Guisande, os meus amigos da terra, cada um na sua maneira simples de ser,

são já a segunda família da minha vida e juventude.

Finalmente um grande obrigada a todos os profissionais que contribuíram para a minha

formação e para a transmissão de valores pessoais e profissionais. À professora Ana Maria,

incansável desde o primeiro momento, capaz de acalmar qualquer nervoso miudinho com a

tranquilidade e simpatia que lhe são características.

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Resumo

O estudo da arquitectura popular de Portugal apenas começou a ganhar relevância quando se

procurou descobrir o verdadeiro estilo da casa portuguesa. A sua formalização reflectiria a

alma e a história de vida do povo português. No entanto, não se trata somente de uma

questão de formato ou imagem, mas sobretudo, a funcionalidade proporcionada pela

autenticidade das formas.

Esta temática pretende abordar a matiz arquitectónica de Entre-Douro-e-Vouga, confinada

entre estes dois rios e acomodada na transição da região do Minho para as Beiras. No

desenrolar de cinco capítulos vive-se uma viagem que, ao partir do esclarecimento do

contexto geográfico deste território, recuará até tempos remotos, esmiuçando a origem dos

primeiros povoados e sua evolução ao longo dos séculos. Nesta terra que herdou da história

povoados castrejos, que assistiu à consequente romanização da traça urbana e da cultura e

que, por se encontrar numa posição estratégica, gerou um castelo como sede de um vasto

território, que tinha por objectivo controlar a grande via militar romana; estão finalmente

lançadas as precedências que o caracteriza actualmente como ele é: um território de forte

índole industrial, mas no qual o progresso não quis esconder o reverso da moeda que atesta

as suas primícias rurais.

A arquitectura popular de qualquer território, e Entre-Douro-e-Vouga não é excepção, resulta

da súmula de factores geográficos, sociais, históricos e económicos. Feita pelo homem, com

pleno consentimento do seu meio nativo, ela pretende tornar-se não somente num

habitáculo, mas também num instrumento agrícola e de subsistência. São os dois últimos

capítulos que ajudarão a descobrir de que características e técnicas se faz prevalecer, o que

a distingue das restantes e quais as influências que absorve. O término do trabalho elucida o

porquê da importância da salvaguarda deste património, deixando uma janela aberta para a

reflexão sobre o valor que se lhe deve a atribuir.

Palavras-chave

Arquitectura; Popular; Entre-Douro-e-Vouga; Habitação; Ruralidade; Vale; Montanha; Minho;

Beiras

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Abstract

The study of Portugal’s popular architecture only began to gain relevance when someone was

trying to figure out the real style of portuguese house. Its formalization would reflect the

soul and the life’s history of the portuguese people. However, it is not only an issue involving

the form or the image, but mostly the functionality provided by the authenticity of its forms.

This theme aims to approach of Entre-Douro-e-Vouga’s architectural hue, confined between

these two rivers and accommodated in the transition from Minho region to Beiras. In the

course of five chapters a trip is lived when, going from the territory geographical context’s

clarification, it goes back to ancient times scrutinizing the origin of the first villages and

their evolution over time. In this land which inherited settlements from history, which

witnessed a consequent romanization of the urban traces and people’s culture and, for being

in a strategic location, it generated a castle as the seat of a large territory, which aimed to

take control over a great roman military road; there are finally released the precedents

which characterize it as it currently is: a territory with a strong industrial character, but in

which progress wouldn’t want to hide the flip side that attests to their rural first fruits.

The popular architecture of any land, and Entre-Douro-e-Vouga is not an exception, results

from the summary of geographical, social, historical and economic factors. Being handmade

by man, with full consent of his native land, it intends to become not only in housing, but

also in a living and agricultural tool. There are the last two chapters that will help us finding

out the features and techniques prevailing, what distinguishes it from the others and what

influences are absorbed. The last part of the work elucidates the why of safeguarding this

heritage as a matter, leaving an open window for reflection on the value that must be given

to it.

Keywords

Architecture; Popular; Entre-Douro-e-Vouga; Housing; Rurality; Valley; Mountain; Minho;

Beiras

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Índice

Capítulo 1. Fundamentação e Objectivos ............................................................... 1

1.1 Introdução ................................................................................................. 2

1.2 Objectivos ................................................................................................. 4

1.3 Metodologia ............................................................................................... 5

1.4 Estado de Arte ............................................................................................ 5

Capítulo 2. Introdução de Entre-Douro-e-Vouga ...................................................... 8

2.1 Enquadramento Geográfico ............................................................................ 9

2.1.1 Território .................................................................................................................. 9

2.1.2 Orografia ................................................................................................................. 10

2.1.3 Geomorfologia e Litologia ...................................................................................... 11

2.1.4 Hidrografia .............................................................................................................. 13

2.1.5 Clima ....................................................................................................................... 14

2.1.6 Vegetação ............................................................................................................... 16

2.2 A História de Entre-Douro-e-Vouga .................................................................. 17

2.2.1 Do Neolítico à Ocupação Castreja............................................................................ 17

2.2.1.1 Neolítico e o Megalitismo .......................................................... 17

2.2.1.2 Fase Proto-Histórica ................................................................ 19

2.2.1.3 Os Castros e a Arquitectura do Granito ......................................... 20

2.2.1.4 Povos Emergentes ................................................................... 22

2.2.2 Romanização ........................................................................................................... 23

2.2.3 A Reconquista Cristã e a Fundação das Terras de Santa Maria................................ 27

2.2.4 Entrada no Condado Portucalense .......................................................................... 30

2.2.5 A Carta Foral e a Emancipação das Terras de Santa Maria ...................................... 30

2.3 A Actualidade de Entre-Douro-e-Vouga ............................................................. 31

2.3.1 Concelhos Integrantes – Síntese ............................................................................. 31

2.3.1.1 Arouca ................................................................................ 31

2.3.1.2 Santa Maria da Feira ............................................................... 33

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2.3.1.3 São João da Madeira ............................................................... 35

2.3.1.4 Oliveira de Azeméis ................................................................ 36

2.3.1.5 Vale de Cambra ..................................................................... 37

2.3.2 Demografia ............................................................................................................. 38

2.3.3 Actividades Económicas .......................................................................................... 40

2.3.4 Agricultura .............................................................................................................. 43

2.3.5 Ocupação Humana do Território ............................................................................. 46

Capítulo 3. A Arquitectura Popular ..................................................................... 51

3.1 A Casa Elementar ....................................................................................... 52

3.2 A Casa Popular e Suas Variantes Regionais ......................................................... 53

3.2.1 Síntese Descritiva dos Tipos de Habitação Popular ................................................. 56

3.2.1.1 Casa Minhota ........................................................................ 56

3.2.1.2 Casa Serrana ........................................................................ 58

3.2.1.3 Casa de Madeira .................................................................... 60

3.2.1.4 Casa Alpendrada .................................................................... 61

3.2.1.5 Casa Saloia ........................................................................... 63

3.2.1.6 Casa Ribatejana .................................................................... 64

3.2.1.7 Monte Alentejano .................................................................. 65

3.2.1.8 Casa de Povoado .................................................................... 66

3.2.1.9 Casa de Pescadores ................................................................ 68

3.2.1.10 Casa Rural .......................................................................... 69

3.3 Integração da Casa Popular em Entre-Douro-e-Vouga ............................................ 71

Capítulo 4. Arquitectura Popular em Entre-Douro-e-Vouga....................................... 72

4.1 Descrição por Localização Montanha / Vale ........................................................ 73

4.1.1 A Casa de Arouca e de Vale de Cambra ................................................................... 73

4.1.1.1 O Povoado ........................................................................... 74

4.1.1.2 Acessibilidades....................................................................... 75

4.1.1.3 Estrutura .............................................................................. 76

4.1.1.4 Paredes e Pavimento .............................................................. 77

4.1.1.5 Portas e Janelas .................................................................... 80

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4.1.1.6 Cobertura ............................................................................ 83

4.1.1.7 Elementos Decorativos ............................................................ 87

4.1.1.8 Interior ............................................................................... 89

4.1.1.9 Espigueiros e Eiras ................................................................. 90

4.1.1.10 Influências ......................................................................... 94

4.1.2 A Casa de Santa Maria da Feira, São João da Madeira e Oliveira de Azeméis ........ 97

4.1.2.1 O Povoado ........................................................................... 98

4.1.2.2 Acessibilidades ...................................................................... 99

4.1.2.3 Estrutura ............................................................................ 101

4.1.2.4 Paredes e Pavimento ............................................................. 102

4.1.2.5 Portas e Janelas ................................................................... 104

4.1.2.6 Cobertura ........................................................................... 107

4.1.2.7 Elementos Decorativos ........................................................... 109

4.1.2.8 Interior .............................................................................. 112

4.1.2.9 Espigueiros e Eiras ................................................................ 113

4.1.2.10 Influências ........................................................................ 115

4.2. Identidade de Entre-Douro-e-Vouga, Cômputo Geral ......................................... 119

4.2.1 Elo Entre as Casas Serranas e as Casas de Vale ...................................................... 119

4.2.2 A Conservação das Formas .................................................................................... 121

Capítulo 5. Conclusão ..................................................................................... 126

Bibliografia ................................................................................................... 130

Referências Electrónicas .................................................................................. 135

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Lista de Figuras

Figura 1 - Sub-região de Entre-Douro-e-Vouga ......................................................... 10

Fonte: (adaptado de) http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/3/31/

LocalNUTS3EntreDouroEVouga.svg/250px-LocalNUTS3EntreDouroEVouga.svg.png (consultado

a 19-03-14, às 11:18h)

Figura 2 - Concelhos de Entre-Douro-e-Vouga ......................................................... 10

Fonte: (adaptado de) http://www.cm-arouca.pt/portal/images/stories/distritoaveirop.jpg

(consultado a 19-03-14, às 12:23h)

Figura 3 - Mapa da orografia, em zona 1 ............................................................... 11

Fonte: (adaptado de) MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial

Estampa; Lisboa; 1995; p.17

Figura 4 - Mapa geológico, em zona 1, segundo o inquérito à Arquitectura Popular em

Portugal ....................................................................................................... 12

Fonte: (adaptado de) AA.VV.; Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato

Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.7

Figura 5 - Mapa geológico, em zona 1, segundo Mário Moutinho .................................... 12

Fonte: (adaptado de) MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial

Estampa; Lisboa; 1995; p.15

Figura 6 - Mapa hidrográfico, em zona 1 ................................................................ 14

Fonte: (adaptado de) http://hyperscola.files.wordpress.com/2012/03/afluentes-e-

subafluentes-rios-portugal-001.jpeg (consultado a 20-03-2014, às 15:36h)

Figura 7 - Mapa de pluviosidade anual, em zona 1 .................................................... 16

Fonte: (adaptado de) MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial

Estampa; Lisboa; 1995; p.19

Figura 8 - Castanheiros em Santa Maria da Feira ...................................................... 17

Fonte: fotografia da autora

Figura 9 - Manto vegetal rasteiro da Serra da Freita, Arouca ........................................ 17

Fonte: fotografia da autora

Figura 10 - Mamoa da Portela da Anta, vista do interior ............................................. 19

Fonte: http://pt.wikiloc.com/wikiloc/imgServer.do?id=251300 (consultado a 09-04-2014; às

17:05h)

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Figura 11 - Mamoa da Portela da Anta, vista de cima ................................................. 19

Fonte: SILVA, António Manuel S.P.; Memórias da Terra. Património Arqueológico do Concelho

de Arouca; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 2004; p.71

Figura 12 - Castro de Romariz ............................................................................. 20

Fonte: http://www.theperfecttourist.com/wp-content/uploads/2014/03/IMG_4770.jpg

(consultado a 12-04-2014; às 10:16h)

Figura 13 - Exemplo de casa castreja .................................................................... 21

Fonte: http://www.osmeustrilhos.pt/2007/09/18/castro-de-santa-trega-galiza-espanha/

(consultado a 12-04-2014; às 15:41h)

Figura 14 - Castro de Romariz, vista aérea.............................................................. 25

Fonte: https://www.cm-feira.pt/portal/site/cm-feira/template.MAXIMIZE/recursos-

turisticos/?javax.portlet.tpst=6e3fbee686baa2a31dd762d990af8a0c_ws_MX&javax.portlet.prp

_6e3fbee686baa2a31dd762d990af8a0c_viewID=detail_view&javax.portlet.prp_6e3fbee686baa

2a31dd762d990af8a0c_thematicContentPath=%2FThematic%20Navigation%2FTurismo%2FRecur

sos%20Tur%C3%ADsticos%2FCastro%20de%20Romariz%2F&javax.portlet.begCacheTok=com.vign

ette.cachetoken&javax.portlet.endCacheTok=com.vignette.cachetoken (consultado a 12-04-

2014; às 16:23h)

Figura 15 - Planta do castro de Romariz ................................................................. 25

Fonte: retirada de panfleto turístico

Figura 16 - Maqueta da Domus do castro de Romariz ................................................. 26

Fonte: fotografia da autora

Figura 17 - Cartibulum do castro de Romariz........................................................... 26

Fonte: fotografia da autora

Figura 18 - Mapa de antigas vias romanas, em zona 1 ................................................ 28

Fonte: (adaptado de) AA.VV.; Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato

Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.9

Figura 19 - Via romana em Santa Maria da Feira ...................................................... 28

Fonte: https://www.cm-feira.pt/portal/binary/com.epicentric.contentmanagement.servlet.

ContentDeliveryServlet/Thematic%2520Navigation/Urbanismo/Atlas/Atlas%2520de%2520Santa

%2520Maria%2520da%2520Feira/ficheiros/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520F

eira%2520-%2520Vers%25C3%25A3o%2520Digital/Parte%25203%2520-%2520Conhecimento%2520

Humano.pdf; p.10 (consultado a 19-04-2014; às 10:21h)

Figura 20 - Castelo de Santa Maria da Feira ............................................................ 29

Fonte: http://www.panoramio.com/photo/4832884 (consultado a 23-04-2014; às 11:58h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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Figura 21 - Vista aérea sobre Arouca ..................................................................... 32

Fonte: http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://aminhaagenda.aroucaonline.com/wp-

content/uploads/2009/09/IMG_3304.JPG&imgrefurl=http://aminhaagenda.aroucaonline.com

/2009/09/04/4-de-setembro-de-2009-arouca-vista-de-cima/&h=683&w=1024&tbnid=rOqggcV

DKkDiaM:&zoom=1&docid=1w173cs25tqAPM&ei=vR4XVNPfKo_oaM3ZgugG&tbm=isch

(consultado a 24-04-2014; às 09:36h)

Figura 22 - Mosteiro de Arouca ............................................................................ 32

Fonte: http://pedestrianismo.blogspot.pt/2009/10/ciclo-de-caminhadas-pelo-caminhos-

do.html (consultado a 24-04-2014; às 11:08h)

Figura 23 - Vista panorâmica sobre Santa Maria da Feira através do castelo ..................... 34

Fonte: http://www.panoramio.com/photo/5661910 (consultado a 24-04-2014; às 16:27h)

Figura 24 - Vista aérea sobre S. João da Madeira ...................................................... 35

Fonte: http://portugalfotografiaaerea.blogspot.pt/2013/06/sao-joao-da-madeira.html

(consultado a 24-04-2014; às 19:32h)

Figura 25 - Marco da milha XII ............................................................................ 37

Fonte: http://www.cm-oaz.pt/oliveira_de_azemeis.1/freguesias.42/oliveira_de_azemeis.

54/marco_miliario_.a3129.html (consultado a 25-04-2014; às 10:45h)

Figura 26 - Paisagem de Vale de Cambra ................................................................ 38

Fonte: http://www.panoramio.com/photo/17588365?source=wapi&referrer=kh.google.com

(consultado a 25-04-2014; às 14:59h)

Figura 27 - Mapa de indivíduos por concelho em Portugal Continental, Censos 2011 ........... 39

Fonte: (adaptado de) http://www.pordata.pt/Municipios/Populacao+residente+segundo+os+

Censos+total+e+por+grandes+grupos+etarios-22 (consultado a 29-04-2014; às 21:05h)

Figura 28 - Monumento ao Sapateiro, em S. João da Madeira ....................................... 42

Fonte: http://www.panoramio.com/photo/40583789?source=wapi&referrer=kh.google.com

(consultado a 24-04-2014; às 20:02h)

Figura 29 - Museu do Papel e antiga fábrica, em Santa Maria da Feira ............................ 42

Fonte: http://www.timetogo.com/index.php?option=com_pti&view=pti&id=435&lang=pt

(consultado a 25-04-2014; às 15:24h)

Figura 30 - Zona industrial de Santa Maria da Feira ................................................... 42

Fonte: https://www.cm-feira.pt/portal/binary/com.epicentric.contentmanagement.servlet.

ContentDeliveryServlet/Thematic%2520Navigation/Urbanismo/Atlas/Atlas%2520de%2520Santa

%2520Maria%2520da%2520Feira/ficheiros/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520F

eira%2520-%2520Vers%25C3%25A3o%2520Digital/Parte%25203%2520-

%2520Conhecimento%2520Humano.pdf; p.10 (consultado a 19-04-2014; às 10:21h)

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Figura 31 - Mapa da utilização dos solos, em zona 1 .................................................. 43

Fonte: (adaptado de) AA.VV.; Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato

Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.22

Figura 32 - Cultivo minifudiário em socalcos, Vale de Cambra ...................................... 44

Fonte: fotografia da autora

Figura 33 - Boi de raça Arouquesa pastando na Serra da Freita ..................................... 46

Fonte: fotografia da autora

Figura 34 - Mapa dos tipos de povoamento, em zona 1 ............................................... 47

Fonte: (adaptado de) AA.VV.; Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato

Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; 1961; p.23

Figura 35 - Povoamento aglomerado, Albergaria-da-Serra (Arouca) ............................... 50

Fonte: Google Earth

Figura 36 - Povoamento disseminado organizado em pequenos núcleos, Cesar (Oliveira de

Azeméis) ...................................................................................................... 50

Fonte: Google Earth

Figura 37 - Casa elementar em Albergaria-da-Serra (Arouca) ...................................... 52

Fonte: fotografia da autora

Figura 38 - Casario de Rio de Frades (Arouca) ......................................................... 53

Fonte: fotografia da autora

Figura 39 - Desenho de uma casa-pátio, elaborado por Ernesto Veiga de Oliveira (2000) ..... 54

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.21

Figura 40 - Desenho de uma casa-bloco, elaborado por Ernesto Veiga de Oliveira (2000) .... 55

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.21

Figura 41 - Mapa dos tipos de arquitectura por região ................................................ 56

Fonte: (adaptado de) MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial

Estampa; Lisboa; 1995; p.39

Figura 42 - Entrada para o pátio de uma casa-bloco minhota ....................................... 58

Fonte: TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de

Arcos de Valdevez; 2013; p.50

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxi

Figura 43 - Casa-bloco minhota com as suas duas varandas.......................................... 58

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

Figura 44 - A simplicidade de uma casa serrana ....................................................... 59

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

Figura 45 - Casa de três pisos, Paúl ...................................................................... 59

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

Figura 46 - Ortogonalidade urbanística de Espinho .................................................... 60

Fonte: http://retratosdeportugal.blogspot.pt/2013/05/espinho-vista-aerea-do-centro-da-

cidade.html (consultado a 15-05-2014; às 10:14h)

Figura 47 - Casas típicas da Costa Nova.................................................................. 61

Fonte: http://ab-imagensincriveis.blogspot.pt/2011_11_01_archive.html (consultado a 15-05-

2014; às 11:05h)

Figura 48 - Palheiro de Esmoriz ........................................................................... 61

Fonte: http://fotos.sapo.pt/damasofaria/fotos/?uid=306lsJLkuUvDzPZBLZhh (consultado a

15-05-2014; às 11:16h)

Figura 49 - Casa alpendrada da Murtosa ................................................................. 63

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

Figura 50 - Casa ribatejana ................................................................................ 64

Fonte: MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa;

1995; p.106

Figura 51 - Casa de monte alentejano ................................................................... 65

Fonte: MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa;

1995; p.119

Figura 52 - Casas em povoado alentejano à face a rua ............................................... 66

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

Figura 53 - Fachada frontal de casa de povoado alentejano ......................................... 67

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxii

Figura 54 - Casas de pescadores do Algarve............................................................. 69

Fonte: MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa;

1995; p.144

Figura 55 - Casa rural do Algarve ......................................................................... 70

Fonte: OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional

Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000

Figura 56 - Localização dos locais em análise .......................................................... 73

Fonte: (adaptado de) http://www.cm-arouca.pt/portal/images/stories/distritoaveirop.jpg

(consultado a 19-03-14, às 12:23h)

Figura 57 - Aldeia da Lomba ............................................................................... 74

Fonte: fotografia da autora

Figura 58 - Casa com um pequeno pátio (Covêlo de Paivô) ......................................... 75

Fonte: fotografia da autora

Figura 59 - Caminho estreito e escadeada entre casas (Lomba) ................................... 75

Fonte: fotografia da autora

Figura 60 - Casa com cobertura de colmo (Cabaços) ................................................. 76

Fonte: fotografia da autora

Figura 61 - Casa com passadiço sobre o caminho (Rio de Frades) .................................. 77

Fonte: fotografia da autora

Figura 62 - Implantação da casa sobre a rocha natural (Lomba) ................................... 77

Fonte: fotografia da autora

Figura 63 - Parede de xisto onde os blocos maiores reforçam os cunhais (Rio de Frades) ..... 79

Fonte: fotografia da autora

Figura 64 - Junção de xisto e granito numa parede (Covêlo de Paivô) ............................ 79

Fonte: fotografia da autora

Figura 65 - Chão de curral em terra batida, revestido a palha e excrementos (Cabaços) ..... 79

Fonte: fotografia da autora

Figura 66 - Estrutura do pavimento em piso sobradado (Rio de Frades) .......................... 79

Fonte: fotografia da autora

Figura 67 - As portas de casa, de acordo com a sua função (Covêlo de Paivô) .................. 81

Fonte: fotografia da autora

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxiii

Figura 68 - Porta emoldurada em madeira (Rio de Frades) ......................................... 81

Fonte: fotografia da autora

Figura 69 - Arco de descarga em porta de curral (Covêlo de Paivô) ............................... 81

Fonte: fotografia da autora

Figura 70 - Janela adjacente ao beiral da cobertura (Covêlo de Paivô) .......................... 82

Fonte: fotografia da autora

Figura 71 - Presença de uma janela centrada na empena da casa (Covêlo de Paivô) .......... 82

Fonte: fotografia da autora

Figura 72 - Janela com portadas de madeira (Cabaços) ............................................. 83

Fonte: fotografia da autora

Figura 73 - Laje do peitoril sob a janela (Rio de Frades) ............................................ 83

Fonte: fotografia da autora

Figura 74 - Cobertura de colmo (Cabaços) ............................................................. 84

Fonte: fotografia da autora

Figura 75 - Cobertura em lajes de lousa (Albergaria-da-Serra) ..................................... 85

Fonte: fotografia da autora

Figura 76 - Sobreposição da telha sobre a lousa (Covêlo de Paivô) ................................ 85

Fonte: fotografia da autora

Figura 77 - Grampos de madeira unindo a lajes de lousa na cumeeira (Lomba) ................ 85

Fonte: fotografia da autora

Figura 78 - Estrutura simples de cobertura em lousa (Cabreiros) .................................. 86

Fonte: fotografia da autora

Figura 79 - Telha vã (Covêlo de Paivô) .................................................................. 87

Fonte: fotografia da autora

Figura 80 - Chaminé rectangular (Covêlo de Paivô) .................................................. 87

Fonte: fotografia da autora

Figura 81 - Inscrição ‘A 1894’ gravada em lintel de granito (Covêlo de Paivô) .................. 87

Fonte: fotografia da autora

Figura 82 - Janela ladeado por mísulas (Covêlo de Paivô) ........................................... 88

Fonte: fotografia da autora

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxiv

Figura 83 - Bancos em casa, junto à porta do curral (Albergaria-da-Serra) ...................... 88

Fonte: fotografia da autora

Figura 84 - Forno embutido na parede no interior de uma cozinha (Espinheiro) ............... 90

Fonte: fotografia da autora

Figura 85 - Parede divisória de tabique com porta para alcova (Espinheiro) .................... 90

Fonte: fotografia da autora

Figura 86 - Espigueiros comunitários com mais de 3,5 m de comprimento (Rio de Frades) ... 92

Fonte: fotografia da autora

Figura 87 - Espigueiros concentrados próximos á capela (Lomba) ................................. 93

Fonte: fotografia da autora

Figura 88 - Alinhamento dos espigueiros em fileiras paralelas (Lomba) .......................... 93

Fonte: fotografia da autora

Figura 89 - Palheira de xisto próxima dos espigueiros (Rio de Frades) ............................ 94

Fonte: fotografia da autora

Figura 90 - Palheiros/Currais agrupados (Lomba) ..................................................... 94

Fonte: fotografia da autora

Figura 91 - Parede arredondada (Covêlo de Paivô) ................................................... 96

Fonte: fotografia da autora

Figura 92 - Mesa/masseira encontrada numa cozinha (Espinheiro) ................................ 96

Fonte: fotografia da autora

Figura 93 - Localização dos locais em análise .......................................................... 97

Fonte: (adaptado de) http://www.cm-arouca.pt/portal/images/stories/distritoaveirop.jpg

(consultado a 19-03-14, às 12:23h)

Figura 94 - Disposição do casario entre campos e incultos (Guisande) ............................ 99

Fonte: fotografia da autora

Figura 95 - Acesso ao quinteiro pela porta carral transpondo um coberto (Fajões) ......... 100

Fonte: fotografia da autora

Figura 96 - Porta carral encimada por telheiro (Carregosa) ....................................... 100

Fonte: fotografia da autora

Figura 97 - Escadas acedidas por quinteiro (Carregosa) ........................................... 100

Fonte: fotografia da autora

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxv

Figura 98 - Escadas na empena do casa (Carregosa) ................................................ 100

Fonte: fotografia da autora

Figura 99 - Dependências da casa em redor do quinteiro (Guisande) ........................... 101

Fonte: fotografia da autora

Figura 100 - Hortas que servem a casa contíguas ao quinteiro (Romariz) ...................... 102

Fonte: fotografia da autora

Figura 101 - Paredes em pedra tosca à vista (Fajões) .............................................. 103

Fonte: fotografia da autora

Figura 102 - Paredes rebocadas com pintura (Romariz) ........................................... 103

Fonte: fotografia da autora

Figura 103 - Pavimento com laje de pedra (Guisande) ............................................. 104

Fonte: fotografia da autora

Figura 104 - Estrutura de pavimento assoalhado, visto de uma adega (Guisande) ............ 104

Fonte: fotografia da autora

Figura 105 - Piso da adega em terra batida (Guisande) ............................................ 104

Fonte: fotografia da autora

Figura 106 - Portas com acesso a lojas na fachada frontal da casa (Carregosa) ............... 105

Fonte: fotografia da autora

Figura 107 - Porta com moldura granítica sobressaindo em parede rebocada (Carregosa) .. 106

Fonte: fotografia da autora

Figura 108 - Moldura em blocos de pedra irregular, encimada por arco (Carregosa) ......... 106

Fonte: fotografia da autora

Figura 109 - Janela com moldura imitando peitoril (Fajões) ...................................... 106

Fonte: fotografia da autora

Figura 110 - Molduras revestidas em cerâmica (Guisande) ........................................ 106

Fonte: fotografia da autora

Figura 111 - Alinhamento regular e simétrico de janelas e postigos (Carregosa) ............. 107

Fonte: fotografia da autora

Figura 112 - Cobertura em telha de canudo (Romariz) ........................................... 108

Fonte: fotografia da autora

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxvi

Figura 113 - Cobertura de telha de marselha com beirais de telha de canudo (Fajões) ..... 108

Fonte: fotografia da autora

Figura 114 - Chaminé afunilada (Fajões) ............................................................. 109

Fonte: fotografia da autora

Figura 115 - Chaminé afunilada (Louredo) ........................................................... 109

Fonte: fotografia da autora

Figura 116 - Casa de rodapé pintado sobre parede caiada (Carregosa) ......................... 110

Fonte: fotografia da autora

Figura 117 - Casa com pinturas padronizadas sobre reboco (Covêlo de Paivô) ................ 110

Fonte: fotografia da autora

Figura 118 - Friso de cornija na esquina de casa (Fajões) ......................................... 110

Fonte: fotografia da autora

Figura 119 - Porta carral com motivos floreados esculpidos em granito (Guisande) .......... 110

Fonte: fotografia da autora

Figura 120 - Pináculos em telhado (Guisande) ....................................................... 111

Fonte: fotografia da autora

Figura 121 - Detalhes pintados nas telhas do beiral (Fajões) ..................................... 111

Fonte: fotografia da autora

Figura 122 - Varanda de sacada em casa de lavoura abastada (Guisande) ..................... 111

Fonte: fotografia da autora

Figura 123 - Cubículo de casa-de-banho no exterior, inserido no quinteiro junto às lojas

(Guisande) .................................................................................................. 113

Fonte: fotografia da autora

Figura 124 - Caixa em madeira que faz de sanita .................................................... 113

Fonte: fotografia da autora

Figura 125 - Espigueiro rectangular sobre caixa de pedra (Fajões) .............................. 114

Fonte: fotografia da autora

Figura 126 - Espigueiro quadrangular sobre pilares de granito (Guisande) ..................... 114

Fonte: fotografia da autora

Figura 127 - Eira particular complementada com espigueiro (Louredo) ........................ 115

Fonte: fotografia da autora

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

xxvii

Figura 128 - Demarcação a negrito sobre Entre-Douro-e-Vouga, denominada por Arouca,

Jornal Expresso .............................................................................................. 116

Fonte: http://expresso.sapo.pt/casas_tradicionais_portuguesas=f501518 (consultado a 24-07-

2014; às 10:19h)

Figura 129 - Grafismo da Casa de lavoura, Jornal Expresso ........................................ 116

Fonte: http://expresso.sapo.pt/casas_tradicionais_portuguesas=f501518 (consultado a 24-07-

2014; às 10:19h)

Figura 130 - Exemplo de Casa de lavoura em Entre-Douro-e-Vouga (Romariz), este caso

bastante similar ao grafismo apresentado pelo Jornal Expresso .................................. 118

Fonte: fotografia da autora

Figura 131 - A simplicidade e rudeza de uma casa serrana (Albergaria-da-Serra) ............ 118

Fonte: fotografia da autora

Figura 132 - Casa erudita actualmente abandonada (Carregosa) ................................ 118

Fonte: fotografia da autora

Figura 133 - Aldeia de Drave (Arouca) ................................................................ 123

Fonte: http://oscoronas.blogspot.pt/2010/11/drave.html (consultado a 28-07-2014; às

15:12h)

Figura 134 - Fachada revestida a ripado de madeira ................................................ 124

Fonte: fotografia da autora

Figura 135 - As portas adoptadas com janela de portadas ......................................... 124

Fonte: fotografia da autora

Figura 136 - Preservação da traça natural dos edifícios ............................................ 124

Fonte: fotografia da autora

Figura 137 - Interior com vista para a janela ......................................................... 124

Fonte: fotografia da autora

Figura 138 - Pormenor das divisórias em tabuado vertical de madeira, imitando tabique ... 125

Fonte: fotografia da autora

Figura 139 - Pormenor de entrada complementada com candeeiro .............................. 125

Fonte: fotografia da autora

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

1

Capítulo 1.

Fundamentação e Objectivos

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

2

1.1 Introdução

Falar de arquitectura popular vai muito mais além do que um mero relato construtivo, onde

se apresentam as várias características que distinguem as construções dos diversos povoados

entre si. Falar de arquitectura popular é, primordialmente, partir à descoberta da génese de

um povo. Abre-se um processo de investigação onde o Homem, e a sua relação com o meio, é

o epicentro de todos os acontecimentos. Comprometer-se-ia um estudo isento caso não se

considerassem diversas condicionantes nesta relação: geográficos, económicos, sociais,

históricos e culturais.2 Já o diria Almeida Garrett, no seu livro Romanceiro:

“Nenhuma coisa pode ser nacional se não é popular.”3

A arquitectura popular vai-se desenvolvendo de diferentes formas, conformada a cada região

do país em aliança com o meio natural; existe portanto uma humanização da paisagem.4

Desde os tempos primitivos, o homem extraía da natureza os materiais locais para modelar o

seu habitáculo. Iniciou com barro e materiais vegetais, posteriormente, incluiu a pedra no seu

quadro construtivo, quando surgiu a necessidade de edificar construções mais duradouras e

perenes, aquando da sedentarização do homem. Trabalhados ou simplesmente usados no seu

estado natural, estes materiais e as suas potencialidades atendiam à necessidade de conforto

e protecção do homem.5 No entanto, com a inclusão do trabalho da terra na vida dos povos

“para certos autores, a casa popular, e sobretudo a casa rural, é mesmo concebida não

apenas como um abrigo, mas sobretudo como um verdadeiro instrumento agrícola que é

preciso adaptar às necessidades de exploração da terra.”6 Pode-se então pensar que conhecer

essas necessidades é um passo vital para a compreensão da teoria do habitar do homem do

campo. Na verdade, é um grande progresso, contudo não se devem desvalorizar as restantes

condicionantes acima citadas.

O povo, uma classe de poucos privilégios e ainda assim bastante numerosa, que subsiste do

trabalho da terra e também do mar, foi criando a sua própria linha arquitectónica. Com o

avanço do tempo, as várias gerações foram adquirindo conhecimento e aperfeiçoando as suas

práticas, no entanto, a casa rural queria-se funcional, prática e económica, o que se traduziu

numa permanência das formas ao longo do tempo.7 A arquitectura popular, portanto, “é uma

2 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.13 3 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez;

2013 4 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.13 5 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez;

2013; p.28 6 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; 2000; Lisboa; p.13 7 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez;

2003; p.118

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

3

arquitectura do senso comum, em que prevalece a austeridade, a harmonia e a adaptação ao

meio.”8

A arquitectura popular pode desdobrar-se ainda numa arquitectura erudita9, onde se

encontram os solares rurais, contudo estes não serão objecto de estudo, visto que as

habitações de lavradores e/ou pescadores de poucas posses são as mais elementares e delas

deriva a constituição de uma habitação solarenga.

De norte a sul denota-se uma diversidade de expressões nos povoados que pintam o país,

passando pelas tradições, pela psicologia, pela cultura e economia das populações que neles

habitam. Essa expressão recai inclusive sobre a casa popular, que também entra neste leque

de multiplicidade, como resultante de tudo o resto.10 O livro do inquérito à Arquitectura

Popular em Portugal11, realiza uma divisão do país em seis zonas, caracterizadas

unitariamente por uma certa homogeneidade ou conformidade da expressão popular em

termos construtivos, sociais, geográficos, culturais e económicos.12 As diferentes zonas

consolidam toda a diversidade que Portugal encerra nas suas fronteiras. Já segundo Mário

Moutinho13, estas unidades podem dividir-se em cinco, sendo que este dá preferência à

coerência do factor habitação.

A arquitectura popular transporta padrões advindos de estruturas ancestrais, identificados nos

abrigos primitivos e nas vilas castrejas. A partir destes elementos, o habitáculo vai-se

moldando em conformidade com o meio e sua população.14 Com esse tipo de padrões, e num

país de pequena dimensão como Portugal, é frequente que várias regiões se influenciem entre

si, optando por soluções similares. Nota-se que é sempre complicado definir limites concretos

entre as zonas.15

Os motivos que impulsionaram esta investigação, advêm da vontade de desmistificar esta

incerteza, promovendo uma observação mais detalhada na sub-região de Entre-Douro-e-

Vouga. O desejo de confirmar, ou não, a existência de um modelo habitacional que se tivesse

adequado à identidade e natureza do local, é reforçado pela escassez de estudos cingidos

àquela zona em concreto. A sub-região de Entre-Douro-e-Vouga, está compreendida entre os

rios Douro, a norte, e o Vouga, a sul, e envolve cinco concelhos que estabelecem uma forte

ligação com os seus contíguos: são eles Santa Maria da Feira, S. João da Madeira, Oliveira de

8 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2003; p.9 9 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.106 10 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.17-18 11 AA.VV.; Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p. XXIV 12 AA.VV.; Op. cit.; p. XXIII 13 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.37 14 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2003; pp.36-37 15

AA.VV.; Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p. XXIV

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

4

Azeméis, Arouca e Vale de Cambra. Apesar desta demarcação, de acordo com alguns autores,

parte da sub-região enquadra-se no domínio do Douro Litoral

16, enquanto a restante pertence à Beira Litoral.17 Ainda em Arquitectura Popular em

Portugal, mencionando Zona 118, onde se situa a sub-região alvo de estudo, o autor repara

que destacou mais as casas a norte do Douro, em detrimento das casas a sul do rio. Para

Mário Moutinho, a sub-região Entre-Douro-e-Vouga encerra-se numa só região: Norte, dividida

entre Litoral e Interior e que é estendida quer a norte, quer a sul do Douro19. Nota-se,

portanto, que este local carece de uma identidade concreta dentro dos limites regionais do

nosso país. Além do mais, torna-se uma aliciante para este estudo a própria dicotomia que a

sub-região oferece entre o forte contraste dos concelhos serranos e os concelhos próximos do

litoral. Num primeiro olhar, toda ela, consta de uma diversidade de acepções, fica agora no

ar saber como se manifesta a forma de povoamento que ela abarca.

1.2 Objectivos

Muito mais do que expor os materiais de construção, os estilos e as formas que proporcionam

ao habitar, trata-se acima de tudo de conhecer o processo evolutivo de uma população e as

razões que orientam os seus movimentos, a fim de catalisarem na sua casa, tudo aquilo que

são e possuem. Para chegar à conclusão da existência de um fio condutor arquitectónico para

a sub-região de Entre-Douro-e-Vouga deverão ser tidos em conta uma série de objectivos

sumários para uma correcta execução:

- Definir o enquadramento histórico e geográfico da região.

- Entender o motivo da fixação de populações no local.

- Entender as potencialidades do mesmo e de que modo estas eram aproveitadas.

- Descrever como as diferentes povoações se foram influenciando ao longo do tempo.

- Compreender as funcionalidades construtivas pelas quais essas povoações optavam.

- Eleger o modo mais adequado delas serem exploradas.

- Saber discernir desde a arquitectura de uma pequena habitação, até uma habitação

solarenga de latifúndio, ou quinta.

- Conhecer os elementos construtivos destas arquitecturas.

- Saber a importância de outros elementos intrínsecos ao núcleo habitacional.

- Definir a ligação entre espaço interior e exterior.

- Promover a preservação do património arquitectónico tradicional.

16

HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid;

1997; p.36 17 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.40 18 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.3 19 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.39

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

5

1.3 Metodologia

A metodologia de trabalho proposta para alcançar os objectivos passa por algumas etapas,

tais como a pesquisa bibliográfica extensível que conduz à contextualização histórica, social e

cultural da região em estudo, tal como a estudos de outros autores acerca da arquitectura

tradicional portuguesa de diferentes zonas do país.

A referenciação de algumas aldeias com casario típico da região é fundamental para a

concretização do levantamento fotográfico, in situ, em cada concelho. Estes visa registar os

edifícios de maior relevo tradicional de modo a proceder a uma avaliação do género

arquitectónico. Para melhor compreender o estudo manteve-se o contacto com os municípios

envolvidos, a fim destes facultarem material de apoio e informação útil para a elaboração da

dissertação.

O contacto com o local é a base para um trabalho produtivo e muitas vezes descobrem-se

particularidades que de outro modo seria impossível. Recorrendo à entrevista de moradores

locais, esclarece-se até que ponto a arquitectura tradicional conseguia envolver as suas

rotinas laborais e sociais.

Por último, e não menos importante, interessa denotar edifícios tradicionais que se

encontram reabilitados, como prova de sucesso da sua conservação e como modelo a seguir

no futuro da arquitectura rural.

1.4 Estado de Arte

Nem sempre a arquitectura popular foi compreendida como um tema que merecesse aval e

preocupação por parte dos arquitectos. No entanto, dos finais do século XIX até à metade do

século XX, gerou-se o movimento da Casa Portuguesa, encabeçado por Raúl Lino. Este

movimento, que contava com outras personalidades

20, aludia à procura e à afirmação do tipo português de habitação. Aqui catalisavam-se uma

série de características pitorescas e regionais num só conceito, a chamada Casa Portuguesa

que deveria caracterizar o país e proliferar em todo o território.21 Este movimento não

arrancou boas reacções da parte de todos aqueles que reconheciam e defendiam a

diversidade da arquitectura popular nacional.

20 Além de Raúl Lino, também integravam o movimento da Casa Portuguesa, Henrique das Neves

(militar), Rocha Peixoto (antropólogo), Joaquim Vasconcelos e João Barreira (historiadores), Abel Botelho (ensaísta), Guilherme Gomes, José Teixeira Lopes, Jorge Segurado, Vasco Regaleira, Carlos Ramos e Crsitino da Silva (arquitectos). 21http://fims.up.pt/ficheiros/LivroFinalConferencias.pdf; pp.5-6 (consultado a 13-09-2014; às 11:15h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

6

Em 1945, Fernando Távora escreve O Problema da Casa Portuguesa,22 um manifesto cujo

objectivo seria combater a tentativa de institucionalização de um protótipo de Casa

Portuguesa, explicando a multiplicidade de regionalismos existentes no país e a importância

da sua salvaguarda. Em 1947, Keil do Amaral redige Uma Iniciativa Necessária,23 apoiando a

linha de pensamento de Távora.

Neste tempo cronológico distinguem-se, de um lado, um grupo de arquitectos conservadores,

fechados à introdução do modernismo em Portugal, e do outro lado, uma nova geração de

arquitectos que lutavam pela afirmação do modernismo no nosso país, tendo em conta que

Portugal não acompanhava a evolução da restante Europa.24

Para toda a nova geração de arquitectos, da qual Fernando Távora e Keil do Amaral faziam

parte, a arquitectura popular era em muito semelhante à arquitectura moderna, pois ambas

detinham princípios de funcionalidade simples, prontos a servir o homem de acordo com as

suas necessidades, e de fusão com o meio envolvente.25 Estava assim lançado o mote para um

daqueles que, até agora, é um dos livros senão o mais representativo da arquitectura popular

em Portugal. O Sindicato Nacional dos Arquitectos, dos anos 50 para os 60, promoveu a

realização do Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal,26 colocando Távora, Keil do

Amaral e outros da sua geração na senda de um exaustivo levantamento da arquitectura

popular. Com isto a diversidade do país seria sublinhada e explicada em dois volumes, que até

então têm vindo a ser constantemente reeditados. Este livro foi contra a Casa Portuguesa e o

seu sucesso tem vindo a ser enorme. Estes foram dois momentos preponderantes na elevação

da temática da arquitectura popular. Desde então alguns estudos vêm sendo elaborados com

forte base no Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal.

Já na década de 30, o Instituto Superior de Agronomia havia realizado o Inquérito à Habitação

Rural,27 este porém, com um teor mais inquisitivo, onde a principal preocupação era saber as

condições de vivência das famílias nas habitações rurais, expondo problemas e possíveis

soluções de 80 casos minuciosamente estudados. Junto com o Inquérito à Arquitectura

Popular em Portugal, pode-se dizer que o Inquérito à Habitação Rural seria um complemento.

Entre as décadas de 50 e 70 alguns antropólogos também se mostram interessados na

temática e, mais tarde, Ernesto Veiga de Oliveira e Fernando Galhano lançam um manual da

22https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/24401/1/FERNANDO%20T%C3%81VORA%20De%20O%20Problema%20da%20Casa%20Portuguesa%20ao%20Da%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20do%20Espa%C3%A7o..p

df; p.35 (consultado a 13-09-2014; às 10:46h) 23 http://fims.up.pt/ficheiros/LivroFinalConferencias.pdf; pp.5-6 (consultado a 13-09-2014; às 11:15h) 24 https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/24401/1/FERNANDO%20T%C3%81VORA%20De%20º %20Problema%20da%20Casa%20Portuguesa%20ao%20Da%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20do%20Espa%C3%A

7o..pdf; p.15 (consultado a 13 -09-2014; às 10:46h) 25 Idem; p.25 26 https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/2084/1/Surveys_VR_JA_MRC_portug.pdf; pp.2-3 (consultado em 13-09-2014; às 11:28h) 27 http://fims.up.pt/ficheiros/LivroFinalConferencias.pdf; pp.9-10 (consultado a 13-09-2014; às 11:15h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

7

Arquitectura Tradicional Portuguesa,28 em 1992, compilando a descrição da arquitectura

popular existente como fundamento de um estudo etnográfico e antropológico. Muitas outras

obras que compilam exemplos de arquitectura popular, abordando o cariz etnográfico,

geográfico, antropológico ou meramente descritivo, têm sido realizadas, tal como Mário

Moutinho e a Arquitectura Popular Portuguesa; Portugal, Arquitectura e Sociedade de Carlos

de Almeida, entre outras. A maioria das obras debruçam-se no país como um todo, não indo

detalhadamente às regiões e abordando as suas cambiantes entre fronteiras.29

O tema escolhido para esta dissertação, expondo a Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-

Vouga, não teve ainda qualquer tipo de tratamento em específico. Mesmo falando de uma

pequena sub-região do país, o que diminui as chances de incidência de um estudo particular,

nota-se que as abordagens ao território do Douro Litoral e da Beira Litoral são muito parcas.

Recentemente, no ano de 2013, foi realizado o Colóquio Internacional de Arquitectura

Popular, em Arcos de Valdevez. Neste colóquio, apenas uma sessão dirigida por José

Francisco Ferreira Queiroz, abordou de leve modo alguma da arquitectura que podemos

encontrar nas proximidades de Entre-Douro-e-Vouga. O tema era “Villas”, Quintãs e Casais;

Aldeias, Lavouras e Montados: Diacronia e Sincronia na Organização Territorial do Douro

Litoral.30 Embora se pudessem recolher alguns dados de referência, por intermédio desta

informação, o colóquio não expôs nenhum tratamento sobre a arquitectura deste local em

concreto.

Sendo este um tema novo, no sentido literal, continua não sendo uma novidade, pois bebe de

diversas fontes da arquitectura popular portuguesa. Como a informação sobre arquitectura

popular não abunda, apesar de já ser notória a relevância do assunto para a

contemporaneidade, as recolhas de informação advêm dos casos que já foram anteriormente

mencionados e que, tal como o frisado, continuam a ser imensamente respeitados e seguidos

por todos os estudiosos. Quiçá, ‘Bíblias’ da arquitectura popular de Portugal.

28 http://fims.up.pt/ficheiros/LivroFinalConferencias.pdf; pp.9-10 (consultado a 13-09-2014; às 11:15h); pp.11-12 29 http://www.arquitecturadouro.blogspot.pt/2007/12 (consultado a 14-09-2014; às 13:33h) 30 https://www.sites.google.com/site/coloquioarquitecturapopular/ (consultado a 14-09-2014; às

13:41h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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Capítulo 2.

Introdução de Entre-Douro-e-Vouga

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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2.1 Enquadramento Geográfico

2.1.1 Território

A sub-região Entre-Douro-e-Vouga situa-se no noroeste de Portugal, pertencente às NUTS III

(figura 1), ou seja, Nomenclaturas de Unidades Territoriais – para fins estatísticos.31 Desde os

tempos do Rei D. Afonso III de Leão esta área era conhecida como Terras de Santa Maria32,

ainda hoje assim denominada por alguns.

Fazem parte do seu núcleo cinco concelhos.33 São eles: Santa Maria da Feira, Arouca

(integrantes na região do Douro Litoral)34, São João da Madeira, Oliveira de Azeméis, e Vale

de Cambra (integrantes na região da Beira Litoral)35. Contudo, as Terras de Santa Maria

podem ter um domínio bem mais abrangente:

“Além de Santa Maria da Feira, as Terras de Santa Maria integram também os

concelhos de Albergaria-a-Velha, Arouca, Castelo de Paiva, Espinho, Estarreja,

Gondomar, Murtosa, Oliveira de Azeméis, Ovar, Ovar, S. João da Madeira, Sever

do Vouga, Vale de Cambra e Vila Nova de Gaia.” 36

Todos os cinco concelhos que integram Entre Douro-e-Vouga (figura 2), incluem-se no norte

do distrito de Aveiro. A sub-região é abraçada a oeste pelos concelhos costeiros de Espinho e

Ovar; a Norte por Vila Nova de Gaia, Gondomar e Castelo de Paiva; a leste confinam-lhe os

maciços serranos da Gralheira, já pertencentes ao distrito de Viseu e, finalmente a Sul, está

comarcada pelos concelhos da sub-região do Baixo Vouga: Estarreja, Albergaria-a-Velha e

Sever de Vouga.

A sede de Entre-Douro-e-Vouga é desde longos anos atribuída a Santa Maria da Feira37, a qual

dista de cerca 34 Km38 do Porto e 48 Km39 de Aveiro. Esta é uma sub-região com uma

31 http://terrasdeportugal.wikidot.com/geo:nuts (consultado a 18-03-2014, às 10:33h) 32 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.26 33 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga;

2011; p.134 34 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; pp.190-198 35 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; pp.229-237 36 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.7 37 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; p.7 38 http://pt.distanciacidades.com/calcular?from=Santa+Maria+Da+Feira%2C+Portugal&to=porto

(consultado a 19-03-14, às 11:14h) 39http://pt.distanciacidades.com/calcular?from=Santa+Maria+Da+Feira%2C+Portugal&to=aveiro (consultado a 19-03-14, às 11:18h) 4 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.7

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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localização privilegiada, pois contém a confluência dos eixos norte-sul e litoral-beira

interior.40

Dentro dos seus limites analisa-se uma dualidade que contrapõe os concelhos da faixa

ocidental (Santa Maria da Feira, São João da Madeira e Oliveira de Azeméis), mais

desenvolvidos e povoados e também com uma componente industrial mais forte, aos

restantes concelhos que ainda conservam uma subsistência maioritariamente advinda do

sector primário, ou seja, a agricultura. Neste caso, alude-se aos concelhos das serranias,

Arouca e Vale de Cambra.41

Fig.1 – Sub-região de Entre-

Douro-e-Vouga

Fig. 2 – Concelhos de Entre-Douro-e-Vouga

2.1.2 Orografia

Esta região cambia em diferentes patamares de altitudes, que se desenvolvem a partir da orla

mais ocidental dos concelhos de Santa Maria da Feira e Oliveira de Azeméis, a partir dos 100

metros, e vão alteando a sua cota até atingirem o leste da região, já mais acidentada. (figura

3) A sub-região de Entre-Douro-e-Vouga é envolvida a nascente pelo maciço da Gralheira,

constituído pelas serras da Freita, Arestal e Arada. Arouca e Vale de Cambra ostentam boa

parte do maciço da Gralheira na sua paisagem natural.42 Este facto confirma a subida de

altitude para um expoente compreendido entre os 800 e os 1100 metros.43 Mais

1 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.26

41 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga; 2011; p.135 42 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Edição do Governo Civil de Aveiro; Aveiro; 2002; p.132 43 SILVA, António Manuel S. P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e

Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; p.2

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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concretamente 1085 metros é a altitude do ponto mais alto da serra da Freita, na freguesia

de Albergaria da Serra, pertencente a Arouca.44

No geral, trata-se de uma região definida por uma plataforma de altitudes médias, entre os

200 e os 300 metros45, obtida da transição entre um território muito próximo da costa

marítima e que se alonga para leste, subindo progressivamente, até confrontar uma espécie

de anfiteatro formado pelo surgimento das serras.

Fig. 3 – Mapa da orografia, em zona 1

2.1.3 Geomorfologia e Litologia

De acordo com a informação que é fornecida pelo inquérito à Arquitectura Popular em

Portugal, a Zona 1, denominada por Minho46, onde se situa a área de estudo, geologicamente

é dominada por duas faixas de granito e de xisto, que se desenrolam obliquamente à costa

numa linha que segue de noroeste para sudeste. (figura 4) Incidindo com mais precisão na

área de Entre-Douro-e-Vouga verifica-se que, basicamente a sua constituição se resume a

uma faixa no sector leste, de complexo xisto-grauváquico, e no sector litoral a chamada orla

meso-cenozóica, composta de sedimentos recentes.47 Na região predominam as gnaisses,

micaxistos e xistos. Existem ainda areias e arenitos, mais próximos da costa. Mário Moutinho

também apresenta características similares no seu estudo48. (figura 5) Mostra-nos uma região

marcada pela presença de xistos pouco ou nada cristalinos, areias e grés e vestígios de rochas

cristalinas. No entanto, no caso de Mário Moutinho, a presença da areia estende-se mais para

44 http://geoserradafreita.blogspot.pt/ (consultado a 20-03-2014; às 16:07h) 45 Plano Regional de Ordenamento Florestal da Área Metropolitana do Porto e Entre Douro e Vouga; Fase 2 – Proposta de Plano; Lisboa; 2006; p.29 46 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.7 47 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.11 48 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.17

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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o interior da região. Em diversas circunstâncias, ao fazer um deslocamento para a costa

começam a evidenciar-se terrenos baixos de constituição arenosa, começando geralmente em

Espinho e prolongando-se na costa pelo sul. Estes solos arenosos recordam a retirada do

Atlântico destas terras, há longos anos.49 De tal modo, e de acordo com o livro Feira. Terras

de Santa Maria, é consistente afirmar que “o território, é na sua maioria, constituído por um

complexo xisto-grauváquico ante-ordovícico e por séries metamórficas que delas derivam.

Este complexo atesta a existência de um antigo mar onde se depositaram sedimentos que,

por acção das forças tectónicas se foram deslocando e dobrando.”50

Os diferentes tipos de rocha também influenciam o relevo em que se inserem, além de

determinarem tipos de arquitectura distintos. Por exemplo, os solos graníticos, por se

arenizarem com mais facilidade dão origem a uma topografia mais acentuada e rectilínea. Já

os xistos, como é caso, originam formas menos definidas, com maior concentração de vales e

cimos arredondados.51

A composição geológica de um território é por norma, bastante complexa e além destes

elementos aqui presentes, encontram-se também trilhas de granitos porfiróides de grão

grosseiro e médio e granitos não porfiróides de grão médio de duas micas, conhecidos como

os granitos do Porto.52 Recorrendo novamente ao inquérito à Arquitectura Popular em

49 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.7 50

SILVA, Dr. João Belmiro Pinto da, e Dra. Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia

Editores; 2000; p.11 51

MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.13 52 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.11

Fig. 4 – Mapa geológico, em zona 1, segundo o inquérito à Arquitectura Popular em Portugal

Fig. 5 – Mapa geológico, em zona 1, segundo Mário Moutinho

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

13

Portugal confere-se que existe uma formação de granito vinda do Porto53, acima do Douro,

que se vai desvanecendo até atingir os domínios de Santa Maria da Feira. Porém, atentando

na imagem da carta geológica, a presença de granitos puros só começa a destacar-se com

maior evidência para lá do oriente de Entre-Douro-e-Vouga, ao chegar ao distrito de Viseu, e

estendendo-se pelas beiras alta e baixa. O maciço da Gralheira, ainda dentro do limite

regional, é também composto essencialmente por xistos e arenitos. Pelos casos acima

mencionados, crê-se que entre o litoral e a montanha, conforme descrito acima, sendo uma

zona intermédia de médios declives, os xistos e as areias coabitam preponderantemente. É

frequente encontrar ao longo de diversos cursos de água, depósitos de praias antigas e

terraços fluviais. Com efeito a presença de granito ainda não se assume em plena força. 54

2.1.4 Hidrografia

O inquérito à Arquitectura Popular em Portugal, mostra que a Zona 1 é fortemente irrigada

por vários cursos de água naturais. Eles dispõem-se em intervalos curtos e regulares,

perpendicularmente à linha da costa.55 Este cenário justifica-se pelos seguintes factores:

“A permeabilidade do solo granítico, o denso revestimento vegetal e a

alimentação regular das grandes precipitações atmosféricas são as causas desse

fenómeno.”56

Entre-Douro-e-Vouga, inserida nessa zona povoada por tantos rios e seus afluentes, conta

também com a presença de alguns cursos de água notáveis, dentro dos seus limites e na sua

proximidade. (figura 6) A norte destaca-se o rio Douro, com um grande caudal de água, “que

tem constituído desde sempre, uma das principais fontes de riqueza da região, e contribuiu,

em grande medida, para a fixação de populações e para o desenvolvimento das terras que o

ladeiam.”57 A sul corre o rio Vouga, mais manso, e que desagua na ria de Aveiro. As terras

desta região são ricas em água, mas nem sempre muito férteis.58 Douro e Vouga são os

principais catalisadores de outros cursos afluentes de menor dimensão, tais como os rios

Paiva, Arda, Uíma, Caima, Antuã, entre outros.59 O rio Paiva possui um comprimento de 111

Km, cruza a serra da Freita, em Arouca, e desemboca no concelho de Castelo de Paiva. Já foi

considerado o rio mais limpo da Europa. O Arda também percorre os mesmos concelhos, no

53 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.7 54 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.11 55 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.6 56 AA.VV.; Op. cit., p.6 57 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.11 58 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; pp.15-16 59 SILVA, António Manuel S. P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e

Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; p.2

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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entanto possui uma extensão mais reduzida de 30 Km de comprimento. O rio Uíma atravessa

Santa Maria da Feira até Vila Nova de Gaia. Estes três rios desaguam para o Douro. O rio

Caima, tem nascente em Arouca, corre por Vale de Cambra, Oliveira de Azeméis, até chegar

a Albergaria-a-Velha, onde se espraia no rio Vouga. O Antuã nasce em Santa Maria da Feira,

atravessa Oliveira de Azeméis e Estarreja, afluindo por conseguinte num dos braços da ria de

Aveiro.60 Além destes rios, podem ser encontrados muitos mais de menor dimensão, mas como

tal, é possível constatar a riqueza de cursos que alimentam estas terras.

2.1.5 Clima

Portugal situa-se no cruzamento de dois mares, o Atlântico e o Mediterrâneo. O Atlântico

domina sobretudo o noroeste português, enquanto a acção do Mediterrâneo faz-se notar

sobretudo no sul do país.61 O Atlântico é um oceano que é o regulador da atmosfera, através

da acção dos seus ventos, existe uma oscilação moderada entre a temperatura média dos

meses mais frios e dos mais quentes. O céu tende a estar frequentemente nublado, com uma

forte quantidade de humidade na atmosfera e, consequentemente, queda de chuvas

regulares. Do Atlântico deslocam-se massas de ar húmido que, por vezes atingem o país,

causando um tempo instável, húmido e ao mesmo tempo morno. Quando estas massas se

deparam, de inverno, com as regiões montanhosas, originam uma precipitação prolongada

sobre a forma de neve. O clima do Mediterrâneo é contrastante com o Atlântico. Os verões

são secos e quentes, os invernos temperados, as chuvas escasseiam e o céu possui uma forte

luminosidade.62

60 http://www.campoaberto.pt/wp-content/uploads/2010/12/Retrato_da_biodiversidade_na_AMP.pdf;

pp.13-15 (consultado a 20-03-2014, às 16:37h) 61 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.16 62 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993;

p.121

Fig.6 – Mapa hidrográfico, em zona 1

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

15

O noroeste é a zona do país mais influenciada pelo clima Atlântico. O nordeste, devido ao seu

relevo acentuado, encontra-se mais protegido das suas influências. Acaba por adoptar o clima

da Meseta Ibérica que se traduz em verões muito quentes e secos e invernos muito

rigorosos.63

Portanto, Entre-Douro-e-Vouga situa-se numa área ainda bastante Atlântica. O seu clima é

húmido e regular. As suas serras orientadas para o oceano, têm um grande índice de

pluviosidade.64 (figura 7) Segundo Mário de Araújo Ribeiro:

“O clima do Maciço é condicionado pela altitude e pelo facto de esta ser a

primeira cadeia montanhosa que os ventos marítimos dominantes encontram,

provocando uma pluviosidade relativamente intensa.”65

Os seus invernos são rigorosos e húmidos. O verão é quente, mas moderado, comparado com

outras cadeias montanhosas do país.66 Descendo o maciço em direcção à costa de Aveiro, a

pluviosidade decresce para uns 800 mm anuais e a temperatura média ronda entre os 10º e os

12ºC.67 Já para o Douro Litoral, a precipitação aumenta substancialmente para um valor de

1750 mm68 e a sua temperatura média ronda os 10,8ºC69. Visto que Entre-Douro-e-Vouga se

encaixa entre estes dois pólos, estima-se uma temperatura média similar e uma pluviosidade

à volta dos 1000 mm70, já que esta é medida média estimada de pluviosidade para as regiões

litorais, sobretudo no noroeste português. É importante mencionar que a região do Douro

Litoral, estendendo-se ainda a Entre-Douro-e-Vouga, possui bastantes similitudes com o

Minho, quer em termos de clima, como mesmo de orografia.71 O autor António Manuel Silva

descreve esta região como:

“Uma zona litoral e intermédia de altitudes médias, mais a Norte, corredor

tradicional de circulação, pontuada por colinas e vales húmidos e férteis

propícios tanto à agricultura como à criação de gado, no que constitui porventura

o facies mais minhoto desta região.”72

63 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.16 64 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.7 65 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.21 66 RIBEIRO, Mário de Araújo; Op. cit.; p.21 67 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.18 68 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.12 69 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.121 70 RIBEIRO, Orlando; Op. cit.; p.121 71 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.12 72 SILVA, António Manuel S. P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e

Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; pp.2-3

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

16

Talvez por esses motivos, tenha a Zona 1, do inquérito à Arquitectura Popular em Portugal,

denominada ‘Minho’, toda uma extensão que interliga a região minhota até meados da Beira

Litoral.

2.1.6 Vegetação

Em outras épocas a arborização aqui encontrada era mais densa73, agora não tão densa,

exceptuando os concelhos de Sever de Vouga, Arouca e Castelo de Paiva, que, por se situarem

nas montanhas, ainda conservam grande área de floresta.74 Apesar de tudo, actualmente

ainda dominam algumas espécies como o pinheiro bravo, o carvalho e o castanheiro.75 (figura

8) Salientando o distrito de Aveiro, a fim de obter uma flora mais específica, o pinheiro

bravo, ou também designado por pinheiro marítimo, e o carvalho roble, ou carvalho-comum,

dominam o rol de espécies que se pode aqui encontrar76. O carvalho roble está praticamente

confinado ao noroeste português, não passando abaixo do Mondego. O pinheiro bravo tem um

grande poder de difusão ao longo de todo o território e é bastante apreciado, pois tem um

rápido crescimento e é capaz de fornecer lenha, carvão e madeira para a construção.77 Com a

introdução do eucalipto nas florestas, pode-se constatar que a percentagem de eucaliptos,

40%, está próxima da de pinheiros, 60%, visto que também o eucalipto é uma árvore de célere

crescimento e facilmente apropriável a vários tipos de terrenos.78 Ao entrar na serra da

Freita, e claro, no restante maciço da Gralheira, a flora é bem mais diversificada, não

73 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.7 74 CASTRO, D. José de; Estudos Etnográficos. Aveiro. III tômo. Lavradores; Instituto para a Alta Cultura, Centro de Estudos de Arte e Museologia; Porto; 1944 75 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; 1961; p.7 76 CASTRO, D. José de; Estudos Etnográficos. Aveiro. III tômo. Lavradores; Instituto para a Alta Cultura, Centro de Estudos de Arte e Museologia; Porto; 1944 77 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; 1993; p.122 78 Plano Regional de Ordenamento Florestal da Área Metropolitana do Porto e Entre Douro e Vouga;

Fase 2 – Proposta de Plano; Lisboa; 2006; p.33

Fig. 7 – Mapa de pluviosidade anual, em zona 1

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diferindo muito de outros maciços do Litoral Norte e Centro do país.79 Cerca de 53% encontra-

se arborizado.80 A restante, não arborizada, cobre-se de uma camada vegetal onde se

destacam a carqueja, a urze, os fetos, o tojo, as giestas e o azevinho. (figura 9) Estas plantas

pintam a paisagem da serra de tons violetas, amarelos e verdes, que despontam alegremente

na primavera.81

2.2 A História de Entre-Douro-e-Vouga

2.2.1 Do Neolítico à Ocupação Castreja

2.2.1.1 Neolítico e o Megalitismo

Ao longo dos tempos, várias civilizações de diversas etnias foram chegando à Península Ibérica

e, sendo travadas pelo oceano, acabavam por fixar-se ao longo do território; um facto

recorrente desde o período do Paleolítico até à Idade do Bronze.82

A ocupação desta região durante o período Neolítico supõe-se que tenha ocorrido a partir de

250.000 a.C.83. O Neolítico, também chamado de ‘idade da pedra nova’, foi uma época em

que o trabalho da pedra se aperfeiçoou e deste modo, foram sendo criados, ou melhorados,

79 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas

crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.76 80 Plano Regional de Ordenamento Florestal da Área Metropolitana do Porto e Entre Douro e Vouga; Fase 2 – Proposta de Plano; Lisboa; 2006; pp.38-39 81 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas

crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; pp.76-81 82 SARAIVA, José Hermano; História de Portugal. A Formação do Território – Da Lusitânia ao Alargamento do País; volume 1; Quidnovi; Matosinhos; 2004; p.10 83 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.13

Fig.8 – Castanheiros em Santa

Maria da Feira

Fig.9 – Manto vegetal rasteiro da Serra da Freita, Arouca

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alguns instrumentos que ajudaram a aperfeiçoar as técnicas agrícolas e de caça. Entre eles

encontravam-se mós manuais, machados, enxós de pedra polida, pontas de seta de sílex,

entre outros. O Neolítico incitava uma tentativa de sedentarização do homem.84 Em Feira.

Terras de Santa Maria, vislumbra-se um cenário sedentário quando esta é descrita como uma

terra “ocupada por pequenas unidades sociais sedentarizadas e organizadas com base numa

economia em que as formas iniciais de agricultura eram complementadas com a recolecção

de frutos, com a caça e a pesca, (…).”85

Os monumentos megalíticos de cariz funerário e associados ao culto do sol, foram uma

inovação do Neolítico. Antas, menires, cromeleques e mamoas, traduziam o domínio do

homem sobre a natureza. Em Portugal os dólmenes tiveram o seu epicentro no Alto Alentejo,

a partir daí foram-se difundindo pelo restante território. Estima-se que a origem destes

monumentos provém da Ásia Menor.86

A informação não abunda e a herança mais notável que foi deixada, reparte-se por diversos

monumentos megalíticos, espalhados um pouco por todo o território nacional. No Entre-

Douro-e-Vouga regista-se também a existência de vestígios neolíticos. No concelho de Arouca

podem ser observadas várias mamoas, entre outros vestígios, embora a maioria encontre-se

aluída. A mamoa da Portela da Anta, situada em plena serra da Freita, é um dos monumentos

mais expressivos que subsistiu desde essa era até aos dias de hoje. (figuras 10 e 11) Esta

mamoa é caracterizada da seguinte forma:

“(…)de planta sub-elíptica, com cerca de 35 metros de diâmetro e uma potente

carapaça de blocos graníticos que a impõem na paisagem, envolve os restos ainda

monumentais de um dólmen de corredor de planta poligonal, com cerca de 8

metros de comprimento, de que se vêm ainda cerca de duas dezenas de esteios,

(…)”87

84 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.13 85 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; p.13 86 SARAIVA, José Hermano; História Concisa de Portugal; Publicações Europa-América; Mem-Martins; 1986; p.19 87 SILVA, António Manuel S.P.; Memórias da Terra. Património Arqueológico do Concelho de Arouca;

Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 2004; p.72

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19

2.2.1.2 Fase Proto-Histórica

Do Neolítico começamos a entrar na Idade do Bronze, a partir dos 10.000 anos a.C.,

conhecida como fase Proto-Histórica. Aqui vemos a introdução de metal na substituição de

alguma pedra.88 As primeiras civilizações urbanas calcorrearam o Mediterrâneo em busca de

minérios, e por ser a Península Ibérica uma região muito rica nesse aspecto, logo atraiu os

povos.89 Nos últimos anos tem sido possível encontrar cada vez mais vestígios da ocupação

populacional da Idade do Bronze, tais como objectos metálicos e peças de ourivesaria90. Os

povos proto-históricos, um pouco à semelhança dos seus antecedentes, sobreviviam da

agricultura, caça, pesca, mas também integravam-se na exploração de metais como o cobre e

o estanho.91 Em Portugal, o cobre exuberava a sul do Tejo e o estanho a norte.92

Estes povos organizavam-se em núcleos populacionais e implantavam o seu aglomerado

populacional em locais estratégicos. Tendiam a situar-se perto de bacias hidrográficas, ou

cursos fluviais e em pontos elevados de médias altitudes. O ponto de implantação deveria

trazer benefícios para a agricultura, através da fertilidade dos solos, e também para a

actividade da exploração mineira, ao contactar com zonas propícias ao seu exercício. Tudo

isto eram requisitos importantes à fixação dos povoados, mas não deve ser descorado outro

aspecto fundamental: a proximidade às vias de comércio. As populações comercializavam

88 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.13 89 SARAIVA, José Hermano; História Concisa de Portugal; Publicações Europa-América; Mem-Martins; 1986; p.19 90 SILVA, António Manuel S. P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e

Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; pp.6-7 91 SILVA, Dr. João Belmiro Pinto da, e Dra. Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.14 92 CENTENO, Rui M. S., e Ana José Oliveira; Roteiro do Museu Convento dos Lóios. Catálogo Geral;

Câmara Municipal de Santa Maria da Feira; 2008; p.19

Fig.10 – Mamoa da Portela da Anta,

vista do interior

Fig.11 – Mamoa da Portela da Anta, vista de cima

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activamente entre si, tanto bens alimentares como ferramentas e objectos de adorno.93 As

comunidades interligavam-se por uma rede cujos pontos distavam entre 25 a 30 Km uns dos

outros.94 Aos aglomerados destas populações chamavam-se ‘castros’, também conhecidos por

cividades ou citânias. O autor Manuel C. Teixeira explica que “os castros eram povoados pré-

e proto-históricos situados normalmente em cabeços ou colinas isoladas, de altitudes médias,

de difícil acesso e de fácil defesa.”95 No entanto, que fique esclarecido que esta designação

para os povoamentos dos nativos, apenas surge aquando do período da romanização.96

2.2.1.3 Os Castros e a Arquitectura do Granito

Actualmente, a região de Entre-Douro-e-Vouga, e sua envolvente, contabiliza inventariados

37 povoamentos castrejos. 64% destes castros encontram-se a uma cota inferior a 400 metros.

Dois castros excedem os 600m e apenas um ultrapassa os 800m, no concelho de Vale de

Cambra. De todos estes 37, é de notar que mais de metade deles se situam realmente

próximos de cursos fluviais, que se afirmam como pontos estratégicos de defesa, de alimento

e de trocas comerciais.97

Como os estudos arqueológicos nesta região são bastante escassos, importa referir que apenas

dois castros, o de Romariz, em Santa Maria da Feira (figura 12) e Ovil, em Espinho, denotam

plantas gerais que tornam perceptível parte da sua estrutura.98

93 SILVA, Armando Coelho Ferreira da; A Cultura Castreja no Norte de Portugal; Universidade do Minho;

1999; p.5 94 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.32 95 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.31 96 SARAIVA, José Hermano; História de Portugal. A Formação do Território – Da Lusitânia ao Alargamento do País; volume 1; Quidnovi; Matosinhos; 2004; p.10 97 SILVA, António Manuel S. P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; p.5 98 SILVA, António Manuel S. P.; Op. cit.; p.4

Fig.12 – Castro de Romariz

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Os castros, por normais questões defensivas, eram envolvidos em muros pétreos de duas ou

três cortinas concêntricas que formavam uma muralha, esta podia ser também acompanhada

de um fosso. No seu interior distribuíam-se as unidades familiares, casas de planta redonda ou

quadrangular.99 Os casos citados anteriormente, de Romariz e Ovil, “revelam um modelo

organizativo do espaço doméstico aparentemente similar, sugerindo a existência de conjuntos

familiares ocupando vários edifícios, geralmente de planta circular, não raro com átrio,

abrindo para pátios lajeados comuns, segundo a disposição bem conhecida em muitos castros

do Noroeste.”100

As casas de planta circular antecedem as quadrangulares, tinham cobertura em colmo e já

possuíam alicerces de pedra.101 Supõe-se que o formato circular derive de origens

indígenas.102 Estas casas (figura 13) com um diâmetro de 3 a 5 metros, eram precedidas de um

pequeno átrio ou alpendre, conforme foi dito anteriormente, e este era circundado por dois

muros de pedra em forma de garras de caranguejo. As paredes da casa tinham dois

paramentos feitos de pedras médias ou pequenas, irregularmente aparelhadas com o auxílio

de cascalho.103 A parede, no total, compreendia entre os 40 a 60 cm de espessura. Em raros

casos denota-se a utilização de juntoiras (grandes pedras rectangulares que unem os

paramentos) a fim de reforçar as paredes. O paramento interior era feito a partir de pedras

mais pequenas, enquanto as pedras maiores destinavam-se ao paramento exterior.104

99 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; pp.36-37 100 SILVA, António Manuel S. P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e

Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; p.8 101 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.16 102 SILVA, Armando Coelho Ferreira da; A Cultura Castreja no Norte de Portugal; Universidade do Minho;

1999; p.6 103 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.16 104 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; pp.36-37

Fig.13 – Exemplo de casa castreja

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

22

No interior da casa destacava-se uma lareira e ao centro erguia-se um poste de madeira,

encastrado num pilar rectangular de pedra, onde assentava uma estrutura, também de

madeira, que suportava a cobertura feita de colmo e de formato cónico.105 A lareira baseava-

se numa plataforma de argila encostada a uma parede onde se cozinhava.106

Além das casas verificava-se também a existência de pequenos anexos, com uma construção

menos elaborada. Estes possivelmente serviriam para o resguardo do gado. A envolvente da

casa era cuidadosamente tratada com o empedramento do chão.107

Como as paredes das casas castrejas já não se encontram inteiramente erguidas, apenas se

levanta do chão aquilo que delas resta, cerca de 70 cm. Com esta altura não é possível

determinar se teriam janelas, mas julga-se que o único vão existente seria uma porta, para

além de uma pequena abertura na cobertura destinada ao escoamento de fumos.108

As técnicas construtivas da época eram ainda pouco aprimoradas. Mais tarde, as casas

circulares foram procedidas pelas plantas quadrangulares e, mesmo nestas situações em que

se exigia um método de execução mais apurado, os problemas eram resolvidos de uma forma

ainda incipiente. As paredes encostavam-se umas às outras em ângulo e as esquinas eram

muitas vezes arredondadas.109

2.2.1.4 Povos Emergentes

A origem destes castros deu-se entre os séculos V e IV a.C.. Esta era uma época em que o país

era frequentemente invadido por povos vindos de outras regiões, através da costa. Entrando

pelo sul da península, um grupo de Túrdulos e Turdetanos avançaram ao longo da nossa costa

até chegarem a terras de Entre-Douro-e-Vouga. Pensa-se portanto, que o povo Turduli Vetere

conseguiu tomar posse de parte desta área. Entre-Douro-e-Minho dominavam os Calaeci e os

Bracari. Os Turduli Vetere habitavam sobretudo até ao rio Antuã, no concelho de Oliveira de

Azeméis. A sul do Antuã até ao Vouga, residia o povo Talabrigense.110

Os dados arqueológicos identificados in situ revelam a presença do povo Túrdulo no castro de

Monte Murado, em Vila Nova de Gaia, onde se supunha ser o seu centro, também no castro de

Romariz e no castro de Ul, em Oliveira de Azeméis. O castro de Fiães, em Santa Maria da

105 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; pp.36-37 106 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.17 107 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; pp.36-37 108 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.37 109 Idem; p.37 110 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.15

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Feira, foi apontado como o local de Lancobriga e mais a sul, no castro de Cabeço do Vouga,

assinalava-se a população de Talabriga. Lancobriga poderia ter ser habitada pelos Túrdulos,

mas não Talabriga. Não se sabe ao certo se existiria qualquer tipo de unidade entre estes

povoados, todavia são Lancobriga e Talabriga as populações mais características de Entre-

Douro-e-Vouga, os primeiros dominando sobretudo a franja litoral da região e os últimos

dominando o sul, junto ao Vouga.111

2.2.2 Romanização

“Falar de dominação romana é distinto, como se compreende, de focar a

romanização. A primeira é convencional e data-se com alguma precisão,

atendendo aos sucessos militares e aos factos politico-administrativos

documentados historicamente. A romanização, pelo contrário, é um processo de

interacção cultural com diferentes ritmos e graus de progressão, atingindo mais

umas comunidades que outras (…)”112

A romanização portanto, crê-se ser um processo mais tardio e moroso, que só pode suceder

após um domínio romano. Começa a ocorrer uma adopção de todo um conjunto de padrões

romanos e em pouco tempo, a comunidade dominada deixa-se diluir, sem grande resistência,

no seu dominante, neste caso o império Romano.

Os romanos iniciam o processo de reconquista da Península Ibérica a partir de 218 a.C.

Durante o século II a.C. travaram várias lutas com os lusitanos, começando no sul e ao longo

da faixa litoral, chegando até ao norte. Os romanos foram-se instalando em algumas cidades

dessa faixa, nomeadamente Lisboa, Santarém, Tomar, Coimbra e Porto, e daí tentavam

cercar os povos existentes, obrigando-os a recuar. Talabriga, o castro de Cabeço do Vouga,

acima referido, crê-se ter sido cercado no decurso desta campanha. Os Talabrigenses

submeteram-se e acabaram por ser romanizados. Mais tarde, vem a suceder o mesmo com o

castro de Romariz.113

Os romanos efectuaram grandes mudanças no país, passando por vários sistemas. Mas um dos

que mais importa referir, é uma reorganização das redes comerciais e consequente criação de

centros urbanos. Para uma maior eficiência comercial e económica, eles trouxeram até nós

uma rede viária eficaz e de qualidade.114 O rio Douro passou a ser uma linha fluvial cujas

111 SILVA, António Manuel S.P.; Aspectos Territoriais na Ocupação Castreja na Região do Entre Douro e Vouga; Centro de Estudos do Património; Universidade do Minho; 1999; pp.11-12 112 SILVA, António Manuel S.P.; Op. cit.; p.221 113 SILVA, António Manuel S.P.; Memórias da Terra. Património Arqueológico do Concelho de Arouca; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 2004; pp.221-222 114 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.18

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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margens enalteciam-se com um porto fluvial (Portus), na área de Cale.115 De acordo com o

Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal:

“Portus Cale seria o porto costeiro, remate para as comunicações marítimas. Daí

partiam ou para aí convergiam as principais artérias.”116

A principal via romana ligava Braga a Lisboa.117 Em Santa Maria da Feira, junto ao castro de

Fiães, existia o cruzamento desta via com outra que ligava Viseu ao litoral.118 É possível

encontrar características que determinam uma via romana, mesmo secundária:

“(…)a preferência pelos traçados rectilíneos, uma largura relativamente uniforme

entre os três e os quatro metros e mesmo a existência de bons troços capeados a

granito (…).”119

Havia ainda outras particularidades típicas destas vias, como a presença de marcos miliários a

identificar as distâncias, toponímia relativa aos imperadores que a mandaram construir, a

existência de alojamentos ao longo do percurso para os viajantes, as suas pendentes pouco

acentuadas.120 Os locais mais afastados destas vias e também de cursos fluviais navegáveis,

eram por norma, ocupados mais tardiamente.

A romanização reflectiu-se não só no ordenamento e estruturamento viário, mas também na

construção. Muitos dos castros proto-históricos, mantiveram-se habitados após a conquista

romana, contudo são notáveis algumas inovações trazidas pelos novos ocupantes. Os castros,

consoante descrito acima, eram definidos pela sua irregularidade formal e contornos

curvilíneos. Com a presença dos romanos eles começam a revelar uma aposta na

ortogonalidade, e os recurvos são precedidos da rectilinearidade.121

As plantas circulares progridem para as plantas quadrangulares, que, devido aos seus cantos

perpendiculares e alinhamentos de paredes, exigem maior habilidade construtiva. Com este

novo protótipo de planta, naturalmente as coberturas redondas e cónicas inviabilizaram-se e

115 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.19 116 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.9 117 SILVA, Dr. João Belmiro Pinto da, e Dra. Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.19 118 SILVA, António Manuel S.P.; Memórias da Terra. Património Arqueológico do Concelho de Arouca;

Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 2004; p.233 119 SILVA, António Manuel S.P.; Op. cit.; p.233 120 Idem; p.274 121 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; pp.32-33

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tiveram que dar lugar a coberturas quadrangulares de duas águas. A armação requeria assim

um sistema de tesouras, e com o passar do tempo introduz-se a telha nestas coberturas.122

O castro de Romariz é um dos castros de Entre-Douro-e-Vouga que sofreu as influências da

romanização. Nas malhas dos seus quarteirões de traçado irregular, encontra-se a coabitação

de compartimentos circulares e quadrangulares, onde um pátio central lajeado limita o local

comum aos compartimentos circunjacentes. (figuras 14 e 15)

Cada dependência detinha uma função particular, como dormitório, cozinha, armazém, ou

resguardo do gado. Entre as várias unidades destacava-se uma casa de maiores dimensões, a

chamada domus. Esta casa também foi reformulada, crê-se que no reinado de Augusto.

(figura 16) De acordo com o Catálogo Geral do Roteiro do Museu Convento dos Lóios:

“(…) esta reformulação revela particularidades arquitectónicas próprias da

técnica e gosto romanos, ao nível das técnicas construtivas, com a utilização de

blocos esquadriados, sobretudo nos cunhais, e esquinas bem marcadas já pelo

interior, o revestimento das paredes, interna e externamente, com reboco

pintado e, exceptuando os dois edifícios circulares, a adopção de coberturas com

tegula e imbrex nos restantes aposentos; os limites da casa, totalmente fechada

por um muro e pelas paredes de alguns dos compartimentos, eram definidos por

arruamentos, a N, E e S, e pela muralha, a poente, separada da domus por um

estreito caminho de circulação.”123

122 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; pp.36-37 123 CENTENO, Rui M. S., e Ana José Oliveira; Roteiro do Museu Convento dos Lóios. Catálogo Geral;

Câmara Municipal de Santa Maria da Feira; 2008; p.45

Fig.14 – Castro de Romariz, vista aérea Fig.15 – Planta do castro de Romariz

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Além destes factos, existem outros elementos arqueológicos romanos que foram sendo

descobertos pelos investigadores, mas um dos que mais destaque ganhou foi uma mesa de

granito (figura 17), encontrada no pátio da domus, alinhada com uma das portas de entrada,

encostada à parede. Denominavam-na de cartibulum, e caracteriza-se por um tampo

rectangular em granito assente sobre um pé ou colunelo arredondado. A sua função era

simplesmente doméstica.124

Alguns castros mantiveram-se activos, todavia grande parte deles foram abandonados por

volta do século III. Quando a península passou a estar inteiramente sob o domínio romano, os

habitantes castrejos, que sempre preferiram a segurança e a supremacia dos pontos altos,

foram compelidos a descer e assim tiveram que povoar vales e planícies. Os povoamentos

outrora aglutinados, tornavam-se assim mais dispersos, pois as propriedades passam a ser

individuais ao invés de comunitárias.125 Em consequência, implantaram-se em Portugal as

vilas. Baseavam-se num núcleo de terras pertencentes a um proprietário, e que eram

cultivadas por escravos e colonos semilivres. Esses colonos ficavam com uma parte da

produção e a restante deveriam entregar ao proprietário.126

A romanização considera-se, portanto, como uma evolução positiva da cultura e da vida social

e doméstica dos povos autóctones. Além de vários progressos já mencionados, em termos

económicos, políticos e construtivos, também os próprios costumes e padrões de vida

tornaram-se mais refinados e os hábitos mais civilizados. As técnicas e formas construtivas

mediterrânicas, trazidas das villas italianas, foram percorrendo a Europa e dilataram-se por

124 CENTENO, Rui M. S., e Ana José Oliveira; Roteiro do Museu Convento dos Lóios. Catálogo Geral;

Câmara Municipal de Santa Maria da Feira; 2008; p.45 125 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; pp.36-37 126 SARAIVA, José Hermano; História de Portugal. A Formação do Território – Da Lusitânia ao

Alargamento do País; volume 1; Quidnovi; Matosinhos; 2004; p.23

Fig.16 – Maqueta da Domus do castro de Romariz Fig.17 – Cartibulum do castro de Romariz

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todo o nosso país, chegando também ao norte. Por sua vez, as casas tornaram-se mais

complexas, mas também mais adequadas às necessidades da vida doméstica e agrícola, até

porque a agricultura ganhou maior relevo com as novas técnicas de lavoura introduzidas pelos

romanos.127

2.2.3 A Reconquista Cristã e a Fundação das Terras de Santa Maria

Após o domínio romano, as populações peninsulares foram açambarcadas pelos povos

Visigodos. Durante o seu regime, estes criam dioceses e paróquias, através da presença de

vilas. Sucedeu que em 711, chega a vez da península ser invadida pelos muçulmanos, que

conseguem destronar a monarquia visigótica. Os árabes impuseram as suas regras na

sociedade dando, simultaneamente, uma opção de escolha ao povo tomado. Ou se convertiam

à religião do Islão, ou então poderiam manter a sua fé católica, pactuando o pagamento de

tributos. Estes últimos denominavam-se de moçárabes.128

Aconteceu que os proprietários das vilas, vencidos em batalhas contra os mouros, desertaram

de modo que as vilas ficaram entregues somente aos seus servos, que deviam zelá-las. Para

uma melhor gestão dos recursos e como forma de se organizarem socialmente, os servos

criaram os concelhos. As novas técnicas agrícolas dos árabes promovem a proliferação das

propriedades individuais, visto que a agricultura tornou-se muito mais eficaz.129

Os proprietários visigodos evadidos, recolheram-se nas montanhas do norte da península, as

Astúrias, e aos poucos propagaram um movimento de reconquista das terras, a chamada

Reconquista Cristã. As Astúrias eram montanhas inexpugnáveis que davam vantagem àqueles

que as conheciam. Neste caso, os exércitos de homens cristãos foram ganhando território aos

mouros, a começar pelo noroeste peninsular. Instaurou-se uma monarquia cristã cujo primeiro

rei foi Pelágio. No ano de 910, o território cristão está limitado a norte da linha do Douro, por

obra de outro rei, Afonso III.130

Já sob o poder cristão, as terras retornam ao sistema de liderança por senhorios. O Entre-

Douro-e-Minho torna-se uma região de senhores e mosteiros e o Entre-Douro-e-Tejo, uma

terra de concelhos e do rei.131

No tempo de D. Afonso III de Leão, segunda metade do século IX e inícios do século X, Santa

Maria da Feira é cunhada como Terra. Embora a sua situação geográfica se circunscreva em

127 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.10 128 SARAIVA, José Hermano; História de Portugal. A Formação do Território – Da Lusitânia ao Alargamento do País; volume 1; Quidnovi; Matosinhos; 2004; p.39 129 SARAIVA, José Hermano; Op. cit.; p.40 130 Idem; pp.38-39 131 Ibidem; p.41

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Entre-Douro-e-Tejo, o sistema de governação era o mesmo de Entre-Douro-e-Minho. Esta

Terra estava, portanto, sob o domínio de um Senhor que residia no castelo.132

Nesta fase inicial do repovoamento, existiam outras Terras, tal como Viseu, Lamego, Anégia

(Entre-os-Rios), e Coimbra, por exemplo. Além de Terra, a documentação medieval dava-lhes

o cunho de ‘Civitates’. A função de Santa Maria da Feira era controlar a via romana que

comunicava Braga, Porto, Coimbra e Lisboa.133 (figuras 18 e 19) O livro Feira. Terras de Santa

Maria descreve a via do seguinte modo:

“Essa estrada foi um dos principais eixos da romanização. (…) Era igualmente

uma via quase paralela ao mar e que servia directa ou indirectamente os

principais núcleos urbanos como Olisipo (Lisboa), Scalabia (Santarém), Sellium

(Tomar), onde havia uma bifurcação para Collipo (Leiria), Conimbriga,

Aemínium, Talábriga (na região do Vouga), e para o actual território do concelho

da Feira. Daqui seguia para Gaia e para o Porto e daí até Braga. A via era bem

conhecida e tradicional. Nela convergiam, outros itinerários secundários,

regionais e locais.”134

Terra de Santa Maria é uma designação que despontou no século V. Em 1117, num documento

da rainha D. Teresa, é pela primeira vez enunciada como Feira: “Terra de Santa Maria onde

chamam Feira.”135

132 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.27 133 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; p.27 134 Idem; p.9 135 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.10

Fig.18 – Mapa de antigas vias romanas, em zona 1

Fig.19 – Via romana em Santa Maria da Feira

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A partir de meados do século XI, as Terras sofrem um processo de subdivisão, por questões de

maior facilidade de governação, embora não fosse o caso da Terra de Santa Maria, que

acabou por se manter intacta por ser um território “quase plano, uniforme e principalmente

centrado na confluência de duas importantes vias romanas.”136 Os limites naturais desta

Terra, eram o rio Arda a leste, o Douro a norte e o Vouga a sul, até ao concelho de

Albergaria-a-Velha. A Civitas de Santa Maria encabeçava Vila Nova de Gaia, Espinho, Ovar,

Santa Maria da Feira, São João da Madeira, Castelo de Paiva, Arouca, Oliveira de Azeméis,

Murtosa, Estarreja, Vale de Cambra, Albergaria-a-Velha e Sever do Vouga. No século XII, a

fronteira da Terra de Santa Maria recua do Vouga para o Antuã, contudo, mesmo com o recuo

e um menor domínio, continua a existir uma grande familiaridade com esses territórios

vizinhos.137

A região de Entre-Douro-e-Vouga é por tudo isto associada à designação de Terras de Santa

Maria, que como se pode constatar, remanesce de tempos antigos. Uma área abrangente, e

importante ponto geográfico do reino, cujo potencial assenta no seu castelo do século XI

(figura 20), que se supõe ter sido erigido sobre um castro lá existente,138 e na ligação de

importantes eixos viários, que a tornavam um ponto importante de passagem e de grande

fulgor económico, com trocas comerciais na grande feira que se realizava.139

136 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; p.27 137 MATTOSO, José; A Terra de Santa Maria na Idade Média. Limites Geográficos e Identidade Peculiar; Castelo de Santa Maria da Feira Comissão de Vigilância; 1993; pp.32-34 4 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.10 139 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; pp.7-8

Fig.20 – Castelo de Santa Maria da Feira

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2.2.4 Entrada no Condado Portucalense

A Terra de Santa Maria, entre 1064 e 1128, estava sob o poder da Coimbra.140 “Era uma

imensa propriedade que confinava a norte com o rio Douro, abrangia para o interior até à foz

do rio Arda e pelo seu curso acima até ao monte Codal já na nascente do Antuã e saí, para

norte, ao longo do rio Antuã até ao mar.”141 Estes limites estavam estabelecidos como parte

do domínio da diocese de Coimbra. Sucede que em 1091 morre o conde responsável por

Coimbra, o moçárabe Sisnando David, e, seguidamente, o rei Afonso IV concede o condado da

Galiza e de Portucale ao cuidado do seu genro D. Raimundo de Borgonha, que pouco tempo

depois veio a ser destituído e comutado por D. Henrique de Borgonha. O então chamado

‘Território Portucalense’ dominava da Galiza até Coimbra, e tinha a sua sede em

Guimarães.142

A Terra de Santa Maria, situada entre dois pontos de grande vulto, Porto e Coimbra, acaba

por ganhar reconhecimento régio, tal como os dois núcleos acima citados que, por serem tão

distintos, afirmam a sua autonomia e preponderância. Por questões estratégicas, a sede do

condado acaba por ser transferida para o Porto. No decorrer de todos estes acontecimentos, a

diocese do Porto sofre uma reestruturação, e é aí que o seu bispo acha por bem anexar Santa

Maria aos seus domínios. As autoridades da terra gostaram da ideia, ao contrário de Coimbra

que ainda tentou reclamar o seu território, mas em vão.143

Dentro do Condado Portucalense, os cavaleiros das terras, ainda podiam escolher de que lado

lutariam: a favor de D. Afonso Henriques, ou de sua mãe, D. Teresa. Para os habitantes de

Santa Maria, interessava-lhes muito mais associarem-se a D. Afonso Henriques que promovia

um projecto de expansão territorial que acabasse com o domínio dos mouros a sul. A Terra de

Santa Maria era uma espécie de “tampão entre o norte cristão e o sul islamizado”144, e estaria

sempre sujeita a uma invasão repentina. Lutar ao lado de D. Afonso Henriques dava-lhes

maiores garantias de segurança e ambos beneficiariam desta co ajuda.145

2.2.5 A Carta Foral e a Emancipação das Terras de Santa Maria

Quando um rei concedia forais estava a garantir privilégios de carácter fiscal e administrativo

a um determinado território, e assim seria fundado um concelho medieval.146 Em 1514, D.

Manuel redige o foral para a Terra de Santa Maria.147

140 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.33 141 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; p.34 142 Idem; p.34 143 Ibidem; p.33 144 Ibidem; p.33 145 Ibidem; p.35 146 Ibidem; p.50

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Nesse tempo é sabido que “a Feira teria já uma relativa unidade administrativa, centrada no

seu castelo e era já sede dum Julgado desde o reinado de D. Dinis, embora ainda fosse

considerada Terra de Santa Maria, portanto incluindo povoações e vilas, algumas delas a

receberem carta de Foral na mesma data da Feira, como é o caso das terras de Ovar e de

Cambra.”148

Inseridos nessa carta de foral estavam grande parte dos actuais concelhos de Santa Maria da

Feira, de Espinho, de Oliveira de Azeméis, Ovar, duas freguesias de Gaia (Lever e Sandim) e a

freguesia de Mansores, do concelho de Arouca.149

A carta foral veio estabelecer acima de tudo normas sobre o pagamento de foros e outros

tributos pelos moradores destas terras.150 Mas antes de qualquer pretensão, é uma forma de

enaltecer as instituições administrativas de uma terra e de lhes conferir alguma

independência, impulsionando a afirmação do seu próprio carácter popular. Desde esse

momento, a terra deverá gerir-se de acordo com as suas contingências económicas e socias, e

através disso, tentar extrair o máximo de autonomia e eficiência político-administrativa.

Em 1985, quando elevada a cidade, a Vila da Feira e Terra de Santa Maria, como D. Manuel a

nomeou, passa a designar-se como a chamam agora, Santa Maria da Feira.151

2.3 A Actualidade de Entre-Douro-e-Vouga

2.3.1 Concelhos Integrantes – Síntese

2.3.1.1 Arouca

Arouca é uma vila dotada de uma vasta e “deslumbrante paisagem rural”152, o seu centro

situado num vale verdejante entre montanhas (figura 21), no nordeste de Entre-Douro-e-

Vouga, a 80 Km da cidade do Porto.153 Insere-se na área do Douro Litoral e cobre a maior

parte da extensão da Serra da Freita.154

147 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.52 148 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Op. cit.; p.52 149 Idem; p.54 150 Ibidem; p.33 151 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid;

1997; p.190 152 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Op. cit.; p.198 153 Idem; p.198-199 154 SILVA, António Manuel S.P.; Memórias da Terra. Património Arqueológico do Concelho de Arouca;

Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 2004; p.25

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Começou a ser ocupada ainda antes da era cristã, conforme o historiado nos capítulos

anteriores, e por ocasião do domínio romano, o imperador César Augusto fundou ali uma

cidade com o nome de ‘Araducta’, que em 716 finda após ser assolada pelos árabes. A vila,

posteriormente, recebe os forais de D. Afonso Henriques e D. Manuel.155

Arouca caracteriza-se como uma terra onde o seu mosteiro construído no século X156 (figura

22) é o coração que, ainda hoje, regula a vila e lhe confere a sua identidade. Esta foi a terra

que D. Mafalda, a Rainha Santa, escolheu para viver, estabelecendo-se no mosteiro, onde veio

a instituir, aquando da sua reforma, uma comunidade de cistercienses.157

155 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.190 156 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Op. cit.; p.198 157 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p. 139

Fig.21 – Vista aérea sobre Arouca

Fig.22 – Mosteiro de Arouca

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Arouca é uma terra fértil de grandes culturas e colheitas, e embora seja uma vila pacata, vive

num frenesim por alturas de Setembro, quando se realiza a sua Festa das Colheitas.158

De acordo com a Carta Regional de Competitividade de Entre-Douro-e-Vouga, Arouca

enquadra um cenário de ´mundo rural´, onde o território sofre com a desertificação e a

paisagem é maioritariamente marcada pela ocupação agro-natural.159 Ainda assim, trata-se de

um cenário de uma agricultura condicionada onde os solos agráveis ocupam apenas 10% da

totalidade do terreno, além do facto de estarem restringidos ao cultivo em socalcos, devido à

pendente do piso.160

2.3.1.2 Santa Maria da Feira

Quando o condado da Feira se desarticulou, por volta de 1708161, deu origem a uma

quantidade de concelhos vizinhos, dos quais Santa Maria da Feira continua a ser a cabeça.

Porém deve ter-se em atenção, de acordo com o livro À Descoberta de Portugal:

“Mas as separações administrativas são uma coisa, as tradições culturais e as

comunidades são outras. Por isso salientamos que este itinerário constitui o

prolongamento natural e harmónico de paisagens, usos, costumes, hábitos, e

lugares do anterior. É difícil encontrarmos uma fronteira física e etnográfica para

esta região do Sul do Douro, que já não é Minho, mas ainda não é Beira.”162

Actualmente, se o concelho de Arouca se destaca pelo seu mosteiro, Santa Maria da Feira

continua a ostentar o seu castelo medieval do século XI como ex-libris.163 Este castelo é um

espelho da pujança económica e social que esta terra revelou desde tempos antigos. (figura

23) Ao redor deste marco, a grande feira agrícola que se realizava e que ajudou a dar nome à

terra, catapultou o crescimento de população envolvente.164

158 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p. 138 159 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga; 2011; p.134 160 SILVA, António Manuel S.P.; Memórias da Terra. Património Arqueológico do Concelho de Arouca; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 2004; p.29 161 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.53 162 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p. 134 163 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.10 164 https://www.cm-

feira.pt/portal/binary/com.epicentric.contentmanagement.servlet.ContentDeliveryServlet/Thematic%2520Navigation/Urbanismo/Atlas/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520Feira/ficheiros/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520Feira%2520-%2520Vers%25C3%25A3o%2520Digital/Parte%25203%2520-%2520Conhecimento%2520Humano.pdf; p.110;

(consultado a 17-04-2014; às 17:05h)

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Santa Maria da Feira continua a ser um importante pólo económico para o país. A ruralidade

do passado foi desvanecendo à medida que o território se foi encobrindo de uma malha

urbana e industrial mais densa.165 Já desde o século XIII166 a cidade revelou potencial na

expansão da sua vertente económica. Hoje ainda continua a facturar, sobretudo com a

indústria da cortiça, do calçado e da metalurgia.167 A forte dinâmica no sector terciário tem

atraído população para o concelho ao longo dos anos e o crescimento populacional é outro

notório causador de desenvolvimento.168

Apesar de todo este progresso constante e crescente, Santa Maria da Feira, uma terra de

solos férteis e boa agricultura, ainda consegue conservar alguma ruralidade e vai mantendo as

suas tradições locais activas, preocupando-se em salvaguardar a sua herança histórica.169

Remata o livro Feira. Terras de Santa Maria, alegando sobre Santa Maria da Feira:

“Apresenta-se mesmo como uma realidade nuclear e central para toda a região a

sul do Douro. Afinal de contas, há mais de um milénio que assim é.”170

165 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga; 2011; p.134 166 https://www.cm-feira.pt/portal/binary/com.epicentric.contentmanagement.servlet.ContentDeliveryServlet/Thematic%2520Navigation/Urbanismo/Atlas/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520Feira/ficheiros/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520Feira%2520-

%2520Vers%25C3%25A3o%2520Digital/Parte%25203%2520-%2520Conhecimento%2520Humano.pdf; p.111; (consultado a 17-04-2014; às 17:05h) 167 HENRIQUES, Ana Mendes, Nuno Xavier Casimiro; Descubra Portugal. Douro Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.190 168 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores; 2000; p.10 169 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Edição do Governo Civil de Aveiro; Aveiro; 2002; p.126 170 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.12

Fig.23 – Vista panorâmica sobre Santa Maria da Feira através do castelo

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2.3.1.3 São João da Madeira

Localizado no centro de Entre-Douro-e-Vouga, a cerca de 20 Km da costa marítima e a 30 Km

do Porto, está o concelho mais pequeno de Portugal em termos de área geográfica, com

apenas 8,1 Km2 e uma freguesia.171 São João da Madeira embora seja um município pequeno,

é, juntamente com Santa Maria da Feira, um dos municípios mais densamente povoados de

Entre-Douro-e-Vouga, camuflado numa imensidão industrial e urbana.172 (figura 24) E mais

uma vez, tal como a Feira, pode-se afirmar que o factor localização, com a passagem da

grande via militar romana, foi determinante para fazer florescer toda a sua evolução.173

S. João da Madeira outrora integrava o concelho de Oliveira de Azeméis, mas em 1926 tornou-

se um município independente, sendo elevado a cidade em 1984.174 Desde 1802, quando S.

João da Madeira recebeu a sua primeira fábrica de chapéus, a vila não parou de crescer e a

chapelaria tornou-se a actividade mais tradicional lá exercida.175 Os habitantes sanjoanenses

eram alcunhados de ‘unhas negras’ por trabalharem neste ramo, considerado um trabalho

sujo. Além dos chapéus, S. João da Madeira também viu a proliferação de fábricas de calçado

que aos poucos foram dominando sobre a chapelaria.176 Pelo grande protagonismo que tem

adquirido nesta área, é considerada a capital do calçado em Portugal.177

171 FERNANDES, M. Antonino; São João da Madeira. Cidade do Trabalho; Câmara Municipal de São João

da Madeira; São João da Madeira; 1996; pp.17-21 172 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga; 2011; pp.134-135 173 FERNANDES, M. Antonino; São João da Madeira. Cidade do Trabalho; Câmara Municipal de São João

da Madeira; São João da Madeira; 1996; p.35 174 http://terrasdeportugal.wikidot.com/sao-joao-da-madeira ; (consultado a 17-04-2014, às 17:32) 175 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; p.232 176 NOGUEIRA, José Couto; Op. cit.; p.237 177 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p. 197

Fig.24 – Vista aérea sobre S. João da Madeira

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A cidade possui um vasto leque industrial passando também pela metalurgia, os artefactos de

borracha, os tapetes, as vassouras, entre outros, tornando a cidade num dos centros mais

prósperos do distrito de Aveiro.178 Esta terra deve o seu enriquecimento e progresso a isso

mesmo, ao seu fervor produtivo, aliás, no brasão da cidade podemos encontrar a letras

douradas o lema que faz jus àquilo que a cidade revela: ‘Labor’.179

Entre os vários feitos industriais que tem alcançado, acabou por ganhar o epíteto de ‘Cidade

do Trabalho’ e assim reconhecida até hoje.

2.3.1.4 Oliveira de Azeméis

Oliveira de Azeméis situa-se no sudoeste de Entre-Douro-e-Vouga. Juntamente com Santa

Maria da Feira e São João da Madeira, os três concelhos da sub-região, mais próximos da linha

costeira, Oliveira de Azeméis é também um forte pólo industrial, embora dos três seja o

menos citadino.180 Ainda contém um vasto cobrimento florestal e agrícola ao longo do seu

território, sendo a batata e a vinha as culturas mais relevantes.181

A cidade de Oliveira de Azeméis destaca-se por ter sido o primeiro fabricante de vidro do

país. A sua indústria mais tradicional, para além do centro vidreiro actualmente extinto,

orienta-se, como não podia deixar de ser, para o calçado, para o tratamento de arroz e para

os lacticínios.182

A história deste concelho já se prolonga desde povoamentos pré e proto-históricos.183 Durante

o século XVIII a urbe começa a crescer o que leva a que em 1799 seja reconhecido como vila e

sede de concelho e apenas em 1984 é elevado a cidade.184

A grande via militar romana que fazia a travessia de Santa Maria da Feira e São João da

Madeira, como já vem sido anteriormente apontado, ligando Olisipo e Bracara, deixou em

Oliveira de Azeméis vestígios, um marco da milha XII (figura 25), actualmente bem

preservado e exposto como um monumento.185 Como se tem vindo a constatar ao longo destes

capítulos anteriores, a passagem desta grande via romana resulta fundamental para a

florescência dos povoados e fixação das populações nestas terras. E no caso de Oliveira de

Azeméis, ao recuar às suas origens toponímicas, surge a prova da influência que a via teve no

178 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p. 197 179 FERNANDES, M. Antonino; São João da Madeira. Cidade do Trabalho; Câmara Municipal de São João

da Madeira; São João da Madeira; 1996; pp.13-14 180ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga; 2011; p.134 181 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; pp.137-138 182 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Edição do Governo Civil de Aveiro; Aveiro; 2002; p.117 183 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Op. cit.; p.116 184 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p. 197 185 CRUZ, Márcia (Dra.), Ricardo Freitas pinheiro, J. Costa; “Terras” Actualidades Regionais. Oliveira de

Azeméis; Publimagem, Publicações e Imagem Empresarial; Santa Maria da Feira; p.5

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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incremento da população. Julga-se que o nome Oliveira advenha da ocupação romana. Os

romanos tinham o costume de denominar as terras com nomes de plantas ou vegetação nativa

que nela encontrassem em quantidade, e que considerassem relevante. Certamente, este

seria um local onde as oliveiras despontavam com alguma significância.186

A designação ‘Azeméis’, atribuída posteriormente, deriva do nome pelo qual eram chamados

os transportadores das azémolas, designação dada aos animais de carga. Na época medieval,

quando chegava a altura de pagar o foro, pessoas e animais percorriam longas distâncias, e

assim aproveitavam as oliveiras para amarrarem as suas azémolas enquanto recuperavam

energias para continuar a viagem.187 Eis que uma terra de passagem e pousada começa a

despontar maiores ambições, pelas gentes que a cruzavam e acabavam por reconhecer os

benefícios do território, ocupando-o continuadamente.

2.3.1.5 Vale de Cambra

Vale de Cambra, juntamente com Arouca, perfazem a faixa interior de Entre-Douro-e-Vouga.

Se Arouca é um município que ainda conserva grande ruralidade, Vale de Cambra caminha no

mesmo plano, ainda assim em menor escala.188 A sua paisagem desenha-se de montanhas e

campos trabalhados. (figura 26) O facto de esta terra se acomodar num vale onde três rios

(Caima, Vigues e Muscoso) confluem, confere-lhe um solo fértil e de fácil amanho.

186 CRUZ, Márcia (Dra.), Ricardo Freitas pinheiro, J. Costa; “Terras” Actualidades Regionais. Oliveira de Azeméis; Publimagem, Publicações e Imagem Empresarial; Santa Maria da Feira; p.5 187 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; pp. 196-197 188 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga;

2011; pp.134-135

Fig.25 – Marco da milha XII

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Inserida na Região Demarcada dos Vinhos Verdes, Vale de Cambra, é uma zona propícia à

plantação da vinha.189 A existência da barragem Duarte Pacheco serve para suster o rio Caima

e distribuir melhor a água para as populações.190 Por curiosidade, Vale de Cambra é conhecida

como ‘a Suíça Portuguesa’191, certamente um epíteto inspirado nas montanhas verdejantes e

jorros de água por todo o solo.

Apesar de toda esta fecundidade agrícola, a maior especialidade da terra sempre foi os

lacticínios e a produção de derivados de leite, que actualmente continuam a destacar-se na

economia da cidade. A aposta na indústria em Vale de Cambra veio serenar o êxodo das

populações decorrido nos anos 60 e trazer um novo ânimo a esta terra, que apenas em 1993

foi elevada a cidade.192

2.3.2 Demografia

Ao longo do território nacional a distribuição das populações (figura 27) difere atendendo a

certos factores e condicionantes que já têm vindo a ser falados em anteriores capítulos e

também por influências de antigas ocupações civilizacionais. Uma das diferenças mais

notáveis trata-se da dicotomia entre ocupação populacional de litoral e de interior. A banda

litoral, mais precisamente entre Minho e Tejo, assinala uma densidade populacional bem

superior ao restante país.193

189 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Edição do Governo Civil de Aveiro; Aveiro; 2002; p.128 190 NOGUEIRA, José Couto; Descubra Portugal. Beira Litoral; Ediclube; Madrid; 1997; pp.229-232 191 À Descoberta de Portugal; Selecções do Reader’s Digest; Lisboa; 1982; p.197 192 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Edição do Governo Civil de Aveiro; Aveiro; 2002; p.128 193 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.22

Fig.26 – Paisagem de Vale de Cambra

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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A sub-região alvo de estudo insere-se no domínio dessa banda próxima da cidade do Porto e,

por via de uma localização geográfica privilegiada, pode-se dizer que logra de uma vasta

camada populacional, significante para os quadros demográficos de Portugal. No ano de 2009,

Entre-Douro-e-Vouga contava com aproximadamente 289.000 habitantes no seu todo. Este

número representa 7,7% da população do Norte e 2,7% da população do país. 194

Em 2011 registou-se uma quebra com aproximadamente 275.000 habitantes. O aumento da

emigração e a baixa da natalidade contribuíram para esse declínio, acompanhando assim a

tendência do restante país. Dos cinco concelhos da sub-região, Santa Maria da Feira contribui

com mais de metade dos habitantes que perfazem esse número; tem sido até à data o

concelho mais populoso, contando com 139.312 habitantes. É até à data o 17º concelho a

nível nacional com mais habitantes, logo abaixo de Coimbra.195

São João da Madeira, embora seja o menos populoso com 21.713 habitantes, é o mais

densamente povoado com 2.749 hab./Km2, quase o triplo da média nacional. Arouca, sendo o

de maior área geográfica da sub-região, tem pouco mais habitantes que S. João da Madeira,

apenas 22.359. É de facto um caso bastante contrastante e que acaba por espelhar a situação

de desertificação vivida na faixa interior do país, comparada com o sobrepovoamento do

litoral. Vale de Cambra aproxima-se também de Arouca, com 22.864 habitantes. Por se

encontrarem numa faixa interior, menos industrializada e ainda bastante cingida ao sector

194 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga;

2011; p.136 195 https://www.mapas.ine.pt/map.phtml (consultado a 08-08-2014; às 20:13h)

Fig.27 – Mapa de indivíduos por concelho em

Portugal Continental, Censos 2011

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primário, não conseguem cativar tanta população para os seus domínios. Já em Oliveira de

Azeméis a população aumenta substancialmente para os 68.611 habitantes, cerca de metade

da população de Santa Maria da Feira.196 De acordo com informações fornecidas pelo livro

Feira. Terras de Santa Maria, observa-se que a população apenas se viu crescer

consideradamente a partir da década de 40. Mas em 1974, ano da revolução, é que se dá uma

explosão urbana, com a construção civil em alta em prejuízo das práticas agrícolas.197

O autor Carlos Alberto Medeiros198, transmite uma explicação mais detalhada para a

explicação do fenómeno demográfico a nível nacional. A retracção e aumento da população

eram, e são, afectadas por quatro pontos: a taxa de variação natural (diferença entre as

taxas de natalidade e mortalidade); a emigração; o regresso dos habitantes das antigas

colónias e a presença de estrangeiros. Não alongando no esclarecimento destes parâmetros,

deixa-se a informação, segundo o mesmo autor, que nas décadas de 10, 50 e 60, Portugal viu

o seu crescimento populacional encolher, por culpa da grande vaga de emigração e das

consequências da guerra. Segundo Carlos Alberto Medeiros:

“Os grandes aumentos da população coincidem com períodos em que a emigração

se tornou diminuta, como o de 1931-1949 e o que se segue a 1973.”199

Na década de 80, depois do surto populacional, a taxa de variação natural diminui, visto que

houve uma quebra na taxa de natalidade. Cruzando esta súmula de dados nacionais

apresentados pelo autor referido, com a informação anterior, é de notar que Santa Maria da

Feira e as cercanias acompanharam a tendência do país, portanto nem esta região escapou à

situação político-económica do país.

2.3.3 Actividades Económicas

Entre-Douro-e-Vouga sustenta uma vasta gama industrial, imprescindível à economia do país,

que visa a exportação.200 Conferindo a subsecção anterior, 2.3.1, a descrição de cada

município já deixou antever a sua situação económica. Globalmente, extraindo as

particularidades de cada um, verifica-se actualmente um forte impacto da indústria do

calçado (figura 28), da cortiça, dos plásticos e da madeira, sendo todas elas pautadas pela

196 https://www.mapas.ine.pt/map.phtml (consultado a 08-08-2014; às 20:13h) 197 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.12 198 MEDEIROS, Carlos Alberto; Geografia de Portugal. Ambiente Natural e Ocupação Humana. Uma Introdução; Editorial Estampa; Lisboa; 1996; pp.132-144 199 MEDEIROS, Carlos Alberto; Op. cit.; pp.132-133 200 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga;

2011; p.140

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sua especialização, com destaque em Santa Maria da Feira para o Centro Tecnológico da

Cortiça e em S. João da Madeira o Centro Tecnológico do Calçado.201

Existem muitas outras fontes de rendimento na sub-região, passando pelos lacticínios e a

metalúrgica. Mas nem sempre a sub-região esteve voltada para estes sectores económicos,

visto que a indústria sofre vários processos de mutação ao longo dos tempos. Muito antes

destas actividades se afirmarem, as terras laboravam através das suas aptidões com o

objectivo de se autoproclamar, sustentar e desenvolverem.

Em tempos medievais, a urbe que prosperava em torno do castelo da Feira, podia equiparar-

se a uma cidade de grande dimensão devido à economia nela efectuada. As Terras de Santa

Maria, de férteis culturas, apoiavam-se primeiramente, tal como grande parte das terras

daquela época, na agricultura como maior fonte de ganho e sustento, numa altura em que o

mercado funcionava em sistema de trocas. Ainda assim a evolução continuou e, pelo século

XIII, surgiram na região novos suplementos comerciais, como taberneiros, carniceiros e

sapateiros, e eram estas actividades que conferiam à terra a dinâmica de um grande pólo

urbano e comercial.202

Verificam-se vestígios na actualidade de uma região que desde cedo revelou perícia para

auferir de uma base económica sólida. Trata-se de uma evolução paulatina, mas rentável no

seu tempo. Pelos finais do século XX, princípios do século XIX, Santa Maria da Feira enceta o

negócio corticeiro, contudo o seu grande motor económico era o fabrico do papel (figura 29)

desde o século XVIII.203 Não esquecendo ainda as preciosas indústrias chapeleiras, que

impulsionaram o crescimento de S. João da Madeira, e a vidreira em Oliveira de Azeméis, na

altura única no país.

Actualmente as indústrias do papel e dos chapéus permanecem representadas em museus,

enquanto a vidreira se desvaneceu no tempo para dar lugar a apostas mais compensadoras. É

bom nunca menosprezar tais origens, outrora preciosas e fulcrais no impulsionamento e

reconhecimento destas cidades.

201 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga;

2011; p.140 202 https://www.cm-feira.pt/portal/binary/com.epicentric.contentmanagement.servlet.ContentDeliveryServlet/Thematic%2520Navigation/Urbanismo/Atlas/Atlas%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520Feira/ficheiros/Atlas

%2520de%2520Santa%2520Maria%2520da%2520Feira%2520-%2520Vers%25C3%25A3o%2520Digital/Parte%25203%2520-%2520Conhecimento%2520Humano.pdf; p.110; (consultado a 19-04-2014; às 10:21h) 203 SILVA, João Belmiro Pinto da, e Catarina Sofia Gomes; Feira. Terras de Santa Maria; Anégia Editores;

2000; p.10

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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Durante o Estado Novo, a indústria portuguesa vê um crescimento decisivo. Portugal não

podia continuar a manter-se isolado da restante Europa, e assim investiu algum capital no

reforço da indústria.204

Apesar da economia da região se alimentar por uma densa malha industrial (figura 30), o

sector primário ainda exerce a sua actividade, embora mais discreta. Avança-se deste modo

para o próximo tópico e lá será explicado com mais exactidão o perfil da agricultura destas

terras.

204 MEDEIROS, Carlos Alberto; Geografia de Portugal. Ambiente Natural e Ocupação Humana. Uma

Introdução; Editorial Estampa; Lisboa; 1996; pp.117-118

Fig.28 – Monumento ao Sapateiro, em S. João da Madeira

Fig.29 – Museu do Papel e antiga fábrica, em Santa Maria da Feira

Fig.30 – Zona industrial de Santa Maria da Feira

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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2.3.4 Agricultura

Grande parte da paisagem portuguesa é delineada de traços rurais, oscilantes por entre

montanhas, planaltos, vales e planícies, exibindo vários elementos naturais que caracterizam

a agricultura praticada. O autor Orlando Ribeiro, mencionado no livro Portugal Rural. Da

Tradição ao Moderno, remete para uma agricultura jovem que se veio a expandir ao longo dos

tempos, confrontando o remoto manto selvático que cobria o país, e transformando-o

progressivamente em terrenos de cultura e pastorícia. Esta reforma do solo começou a

verificar-se primeiramente na faixa atlântica a norte do Mondego.205 Sincronicamente com o

mesmo local onde grande parte das povoações castrejas escolheram para se fixarem,

consoante já foi exposto em capítulos anteriores.206

O inquérito à Arquitectura Popular em Portugal apresenta as várias utilizações dos solos na

zona Minhota (figura 31), que circunscreve Entre-Douro-e-Vouga.

Nesta sub-região que interessa apurar há preeminência do chamado campo-prado. Em menor

extensão, a leste da área, reside culturas de centeio, havendo também lugar a sudoeste para

205 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.22 206 Ver subsecção 2.2.1 – “Do Neolítico à Ocupação Castreja”; p.16

Fig.31 – Mapa da utilização dos solos, em

zona 1

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culturas de montanha com gado grosso.207 Se houver uma deslocação mais para o interior do

país, a cultura do milho esvanece-se para ser substituída pelo trigo e o centeio.208 O campo-

prado ocupa em grande escala o noroeste do país, como o esquema revela, e chega a

estender-se, já mais timidamente, até ao vale do Vouga, mas o suficiente para deixar claro,

mais uma vez, que esta é uma zona de grandes similitudes minhotas.209 Aliás, constatar-se-ão

no desenvolvimento deste capítulo outras referências que aludem uma identidade minhota

nesta sub-região.

No cômputo geral dos tipos de solo do país, sobressaem dois contrapostos: o campo-prado do

noroeste e o campo aberto, limpo ou arborizado do interior e sul do país. O campo aberto não

possui aparentes divisões, o campo-prado é parcelado e abriga sobretudo a cultura do milho

em regadio.210 (figura 32)

No Minho, as várzeas, as meias encostas e os cimos dos montes, são minuciosamente

aproveitados através de socalcos que sustentam as parcelas de campo-prado, preenchidas de

milho no Verão e deixadas como lameiros no Inverno, onde se prepara a pastagem do gado.211

O milho veio substituir o trigo, a partir do momento em que foi introduzido com sucesso em

Portugal. No século XVI, proveniente da América, chegou até nós como uma aquisição da vaga

dos descobrimentos. Começou por ser cultivado na Espanha como experimento e, logo que

207 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.22 208 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.29 209 Ver subsecção 2.1.5 – “Clima”. Nele mencionam-se semelhanças de Entre-Douro-e-Vouga com o Minho, através da orografia e clima naturais. 210 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e

Agricultura; Lisboa; 1992; p.23 211 CAVACO, Carminda; Op. cit.; pp.52-53

Fig.32 – Cultivo minifudiário em socalcos, Vale de Cambra

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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deu fruto abundante, passou para Portugal.212 Orlando Ribeiro explica do seguinte modo o

método de cultura preferencialmente empregue no noroeste português:

“Entre o milho semeia-se o feijão, que se enrola aos caules dele e cujas raízes

fasciculadas abrigam bactérias nitrificantes, que restituem a fertilidade ao solo,

e as abóboras, plantas rasteiras que protegem da erosão; nas extremas plantam-

se hortaliças, regadas pela mesma água; é exactamente este sistema que

praticam os índios americanos; na orla dos campos, dispõem-se alinhadas as

árvores de fruto ou as uveiras por onde trepa a vinha.” 213

Os campos-prados são, portanto, solos de policultura intensiva sazonal destinada ao consumo

próprio. Não só o milho é cultivado como, juntamente com ele se plantam o feijão, a abóbora

e a vinha e também cebolas, couves e batatas.214 O sistema de regadio é feito através de

canais abertos na terra, onde correm águas provenientes de poças naturais de lugares altos.215

Em Entre-Douro-e-Vouga designam-se essas poças por ‘presas’ de água.

Um constituinte de Entre-Douro-e-Vouga, o Maciço da Gralheira, é remetido pelo autor de

Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno, para o capítulo ‘Beiras’, nomeadamente ‘Beira

Alta’. Sobre o Maciço da Gralheira o autor, no entanto, esclarece:

“As montanhas, elevadas e relativamente próximas do mar, são o prolongamento

das do Minho, e tal como lá, acentuam a pluviosidade e proporcionam abundância

de água.”216

A identidade minhota é visível por estas andanças, junto às aldeias é possível observar os

campos socalcados onde prevalece o milho cercado de vinha que produz também o vinho

verde. Mais para o cimo das montanhas situam-se os incultos, ou matos, para onde o gado das

aldeias vai pastar. Esta zona mais agreste baseia a sua economia na transumância, que tem

vindo a diminuir com o êxodo rural.217 A pastagem é uma modalidade da agricultura, e se nos

campos-prados o espaço de lameiro é mais restringido, tendo os animais que estar atados

para não terem tanta margem de manobra, nas montanhas o cenário é de maior liberdade

para o gado bovino.218 É frequente, quem se deslocar até ao Maciço da Gralheira, encontrar

212 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.135 213 RIBEIRO, Orlando; Op. Cit.; p.138 214 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.54 215 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.138 216 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.74 217 CAVACO, Carminda; Op. Cit.; pp.74-74 218 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993;

p.138

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bois arouqueses a deambular despreocupadamente pelas estradas numa coexistência pacífica

com pessoas e veículos. (figura 33)

A paisagem formada pelos diversos elementos rurais tem vindo a perder alguma força, devido

ao progressivo crescimento urbano e industrial a que se vai assistindo, mas ainda assim, não

deve ser desprezada pois ela é a moldura que vangloria a pictórica singular das regiões.219

2.3.5 Ocupação Humana do Território

No seguimento do capítulo anterior, atribui-se à agricultura, nomeadamente ao tipo de

utilização de solo que ela implica, uma clara acção no modelamento da ocupação do

território pelo homem. Não omitindo, no entanto, que a agricultura requere influências

orográficas, hidrográficas e climáticas para se afirmar dentro de determinado perfil.

Conhecer esta relação de posse que o homem toma do território, e a afinidade que cria com

as condições que este lhe proporciona, envolve muito mais do que simplesmente questões

naturais. Tudo o que vem sendo abordado, desde a história civilizacional até às questões

demográficas, compactua com o modo de ser e estar das povoações dos tempos vetustos até

ao presente. Por razões desta ordem assiste-se a um território adaptado pelos povos às suas

necessidades, e como nem todos dispõem dos mesmos requisitos, sucede que o panorama de

ocupação territorial desenvolve diferentes conjecturas ao longo do país.

A população reparte-se de modo desigual. Não existe uma regra geral que reúna todos os

casos de apropriação do território num só modelo. A maior dissonância de concentração dos

pólos demográficos é, sem deixar de ser óbvio, entre o litoral e o interior do país, e é

219 MEDEIROS, Carlos Alberto; Geografia de Portugal. Ambiente Natural e Ocupação Humana. Uma

Introdução; Editorial Estampa; Lisboa; 1996; p.181

Fig.33 – Boi de raça Arouquesa pastando na Serra da Freita

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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precisamente no litoral que se regista a maior densidade de práticas agrícolas, e

especialmente a norte do Tejo, num país onde 1/5 da população activa vive da agricultura.220

Segundo a anterior subsecção, alusivo à agricultura, foi possível confirmar a prática de dois

tipos de agricultura: a cultura intensiva dos campos-prados, oposta à cultura extensiva dos

campos abertos.221 Observa-se que estas diferentes formas de economia agrária são também

responsáveis por diferentes tipos de ocupação das populações do território. A agricultura

intensiva, registada sobretudo no noroeste do país, só consegue ser realizada nos campos-

prados que oferecem condições para a sua prática. Estas propriedades rústicas, parceladas

cuidadosamente no pendor dos solos do noroeste, alastram-se por entre um casario

disseminado, pois cada família possui uma porção de terreno própria e o seu trabalho acaba

por se individualizar e dar origem a um arredamento da vizinhança.222 O mesmo se pode

corroborar pelo esquema apresentado (figura 34), onde Entre-Douro-e-Vouga apresenta uma

dispersão em pequenos núcleos a oeste. No Minho a disseminação é mais abrangente. Pode-se

assim reforçar que Entre-Douro-e-Vouga estrutura-se na intermediação da disseminação

quase completa e da dispersão orientada, atingida sobretudo nas cidades costeiras a sul do

rio Douro. Contrapondo com a faixa da dispersão, existe ainda a mancha da aglomeração em

povoados de montanha a oeste, já abarcando o Maciço da Gralheira, onde “as populações

aglomeram-se em aldeias de grandes dimensões, procurando colectivamente vencer as

dificuldades impostas pela natureza.”223

220 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e

Agricultura; Lisboa; 1992; pp.18-19 221 CAVACO, Carminda; Op. cit.; p.19 222 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.140 223 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.26

Fig.34 – Mapa dos tipos de povoamento, em zona 1

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As parcelas de campo-prado combinadas com bouças, pequenos matos, e contíguas a uma

casa (certamente do proprietário), são, no norte, designadas por casal. Nos casais, há maior

ligação entre a casa e o campo. Cada família tem a sua porção de terreno e a ela dedicam

grande parte do seu tempo laboral, sobretudo no Verão. Por ser uma agricultura intensiva,

minuciosa, em pequenos retalhos de terreno, todo o espaço é aproveitado para o cultivo.224

Ainda assim, isto verifica-se nas zonas mais baixas de planalto, pois quando se sobe à

montanha do noroeste, o povoamento condensa-se mais, de modo a facilitar a ajuda

comunitária,225 tal como descreve Orlando Ribeiro:

“Acima de 400 metros a fisionomia da paisagem modifica-se. Os habitantes

concentram-se em povoações pequenas de 20, 30, 50, 100 almas, não muito

distantes umas das outras, mas com exclusão o casal avulso ou do lugar de casas

dispersas. A aglomeração é a forma de povoamento da Montanha, a dispersão a

da Ribeira.”226

A par das condições geográficas que perfazem o modo de assentamento do povoado, existe

também a herança histórica. Remontando à ocupação proto-histórica, os aglomerados

populacionais compactavam-se em castros e era notória uma dinâmica de entreajuda nos

povos. Todos trabalhavam como um colectivo, em comunidade. Com a conquista romana, a

população viu-se obrigada a descer do topo dos montes para as terras baixas, e assim acabou

por se dispersar. A propriedade colectiva dos castros foi substituída pela propriedade

individual das villas rusticas.227 Orlando Ribeiro explica o que são:

“Uma villa era um prédio de extensão média, com terras bravias e cultivadas, a

habitação do senhor, dos trabalhadores, estábulos e celeiros; mas, desde cedo,

apareceu a tendência para fraccioná-la dentro dos terminos antiquos que, esses,

chegarão até às freguesias rurais da alta Idade Média.”228

Aqui, as villas assemelham-se, na sua constituição, ao casal do norte. Existe um legado

deixado pelos romanos no tipo de povoamento disperso, definido exactamente pelas

qualidades climáticas e geológicas do território. Nos dias de hoje o legado ainda prevalece.

Sintetizando o conteúdo exposto, dividimos então a organização social dos povoamentos em

duas formas: o disperso e o aglomerado, intrínsecos ao tipo de agricultura praticada e ao

224 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.140 225 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.20 226 RIBEIRO, Orlando; Aldeia: Significação e Tipos. Opúsculos Geográficos. IV Volume: O Mundo Rural; Fundação Calouste Gulbenkian; Lisboa; 1991; p.252 227 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.130 228 RIBEIRO, Orlando; Op. cit.; p.130

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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local de implantação. Nas montanhas, de clima mais rude e de solos pouco fecundos, com

mais zonas incultas, a população adensa a conjunção das suas habitações e cria um estilo de

vida comunitário. Fora da montanha, maior fertilidade do solo corresponde a uma cultura

intensiva que autonomiza as famílias e as dissemina.229

Entre-Douro-e-Vouga, com traços de agricultura marcadamente minhota, explora a cultura de

campo-prado. Segundo as observações do autor de A Arquitectura Popular em Portugal230,

Entre-Douro-e-Vouga cobre-se maioritariamente de uma mancha que corresponde à dispersão

em pequenos núcleos. Para o seu interior, junto ao Maciço da Gralheira, começam a pintar-se

os lugares aglomerados (tipo montanha), enquanto a norte do Douro, já fora da sub-região em

análise, a disseminação é mais evidente, embora ordenada.

Em suma, pelo que se conhece e pelo que a informação dispõe, trata-se de uma sub-região

composta por povoamentos dispersos em grande parte do seu território, embora este seja

bastante diverso na sua composição geográfica, dando também lugar aos povoamentos

aglomerados residentes numa faixa mais interior, demarcada pelo Maciço da Gralheira,

abrangendo Arouca (figura 35) e parte de Vale de Cambra. Contudo, este último concelho

também apresenta um semblante oposto, a elucidar a dispersão populacional, cujo escritor

Ferreira de Castro traça do seguinte modo:

“A terra é verde e o céu azul; é tudo verde e azul com raras pintas brancas do

casario, que mais do que moradias de homens, parecem janelas da própria

paisagem.”231

Contudo, estes géneros ocupacionais não devem ser extremados em demasiada, pois há lugar

também para um género intermédio, que a Beira Litoral e o Minho tão bem conhecem. Este é

um povoamento mais organizado, junto às vias de comunicação, com destaque em locais mais

urbanizados, onde as acessibilidades têm primazia e a vida rural é mais domesticada.232 Pela

lógica, os concelhos mais desenvolvidos, como Santa Maria da Feira, São João da Madeira e

Oliveira de Azeméis (figura 36), estão maioritariamente revestidos desta intermediação

ocupacional, visto que não abandonaram traços de ruralidade que pontuaram o seu passado,

mas ao mesmo tempo, não se encontram no seu estado mais puro, tendo em conta que já

sofreram diversas mutações causadas pela industrialização e consequente modernização.233

229 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.40 230 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; 1961; p.23 231 MASSADA, Jorge; Ao Encontro de Aveiro; Edição do Governo Civil de Aveiro; Aveiro; 2002; p.127 232 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; 1995; p.26 233 ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA; Carta Regional de Competitividade: Entre Douro e Vouga;

2011; p.134

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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O que diz Ernesto Veiga de Oliveira acerca dos assentamentos no território abrangente á zona

de estudo, esclarece e confirma o que vem sendo explicado, deixando antever a disseminação

intermédia e ordenada ao longo dos caminhos:

“(…) nesta área, e mormente no Minho, não há verdadeiras aldeias, aglomerados

em bloco; há casas espalhadas no meio das terras de cultura, ligeiros

adensamentos em certos lugares esparsos, ou junto das estradas e caminhos, por

vezes um pequeno núcleo que nunca chega a ser compacto; com frequência, só a

torre branca da igreja (…) marca a sede da freguesia, (…)”234

234 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.26

Fig.35 – Povoamento aglomerado, Albergaria-da-Serra (Arouca)

Fig.36 – Povoamento disseminado em pequenos núcleos, Cesar (Oliveira de Azeméis)

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Capítulo 3.

A Arquitectura Popular

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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3.1 A Casa Elementar

Segundo Ernesto Veiga de Oliveira, existe um tipo de casa que serve como unidade básica e

forma basilar à arquitectura popular. Ele chama-a de ‘casa elementar’.235 A casa elementar é

como uma antecessora de todas as formas arquitectónicas rurais. O autor condensa a casa

como “a célula de base da organização social, o centro da estrutura de exploração da terra e

o seu primeiro instrumento.”236

A casa elementar (figura 37) patenteia precisamente o primeiro desígnio do homem perante o

meio. Ainda sem grandes recursos e técnicas para extrair proveito de um local, o homem

limita-se a criar uma unidade habitacional simples, capaz de se implantar em qualquer

território. Trata-se de uma casa de piso térreo, de planta quadrangular e cobertura de duas

águas. Envolve uma só divisão, que muitas vezes está separada por um tabique de tábuas de

madeira, numa tentativa de separar as funções de dormitório e de cozinha.

Manuel C. Teixeira explica que “a arquitectura da casa rural evoluiu lentamente a partir de

formas e de estruturas ancestrais, das quais ainda mantém alguns elementos, cuja origem

remota se encontra nos abrigos primitivos, na casa castreja e nas vilas romanas que se

construíram pelos vales após a conquista.”237 Foi, portanto, a arquitectura castreja238 que

estimulou o aparecimento da casa elementar, próxima do traçado básico das habitações

proto-históricas. Por ser uma casa que não experimentou maiores transformações, acaba por

não se ajustar às exigências da agricultura. Esta unidade inseria as necessidades primárias de

protecção e conforto (que baste). A casa elementar é, por isso, associada à pobreza das

235 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.23 236 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.23 237 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.44 238 Ver sub-secção 2.2.1 – Do Neolítico à Ocupação Castreja - 2.2.1.3

Fig.37 – Casa elementar em Albergaria-da-Serra (Arouca)

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famílias. Estabelecem-se tanto em serras, como nas cidades, ao longo de todo o país, mas os

seus habitantes são, em regra, desprovidos de terras e de gado próprios. 239

O débil avanço de uma habitação elementar pode suprimi-la na satisfação de necessidades

laborais. O homem pode dar a entender alguma despreocupação quanto à conexão da casa

com o meio em que se instala, devido à modéstia nata deste lar, no entanto está assente que

ele, não sendo proprietário de terrenos de cultivo, não precisa de se preocupar com um

ajuste melhorado. Porém, este desprendimento não implica que qualquer local seja propício

à implantação de uma habitação. Seja ela elementar ou mais evoluída, existem factores em

que o homem deve manobrar com o intuito de melhorar o seu conforto. Na escolha do local

de implantação, preferem-se os solos rochosos, por serem mais impermeáveis, e também por

questões de aproveitamento da rocha pré-existente na construção da casa. A exposição ao sol

também é controlada, tal como a exposição aos ventos dominantes. A fachada mais exposta

ao vento costuma ser praticamente cega, ou então, possui menos aberturas. E existe também

o cuidado em situar a casa na proximidade de vias de acesso, de preferência em locais

abastecidos de água potável, e junto a solo férteis, potenciais terrenos agrícolas.240 Estas são

premissas básicas, que mostram que a terra e a casa não se podem desvincular,

independentemente das intenções do homem. A casa é um prolongamento do meio. (figura

38)

3.2 A Casa Popular e Suas Variantes Regionais

O país oferece uma diversidade regional explícita na sua fauna, flora, clima, orografia, e não

só. Em qualquer local que o homem se instala, com o intuito de se sustentar das mercês que o

território oferece, ele sabe que, primeiramente, deve ter o conhecimento de como tirar

239 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.23 240 BARROS, Fernando Cerqueira; Construção do Território e Arquitectura na Serra da Peneda, Padrão

(Sistelo) e suas “brandas” – um caso de estudo; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.117

Fig.38 – Casario de Rio de Frades (Arouca)

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proveito das suas características e assim saberá a melhor maneira de se introduzir nele. A

casa é o espelho dessa ciência.

Vistas as coisas, a heterogeneidade do território conduz a soluções arquitectónicas

diversificadas. A arquitectura popular dentro de certa área, adopta uma fisionomia base, mas

vai-se mimetizando de região para região. Construída com técnicas rudimentares, a casa

popular ganhou um carácter de permanência ao longo dos tempos, pois a sua concepção era

funcional, acessível e útil ao homem dos meios rurais, e assim tornaram-se legados que

perduraram de geração em geração.241 Ernesto Veiga de Oliveira diz que “em Portugal

ocorrem, em inúmeras versões e variantes regionais, os géneros básicos conhecidos da casa

popular: casas térreas e casas de andar, ou casas-torres; casas-blocos e casas de pátio, aberto

ou fechado; casas de pedra, granito, xisto ou calcário, conforme a natureza dos solos e o

costume local, e casas de materiais leves, de taipa, adobo ou tijolo (…).”242 Existe uma

diferenciação de casas, relativamente à disposição das suas dependências, sugerida por

Demangeon: a casa-bloco e a casa-pátio.243 A casa-bloco emparelha todas as dependências

num bloco compacto, fazendo jus ao nome. Podem incluir outras estruturas independentes no

mesmo terreno, anexos para arrumos, instrumentos agrícolas, produtos ou animais e até

mesmo espigueiros e eiras. As independências delimitavam um espaço chamado de quinteiro,

que servia para executar trabalhos a céu-aberto, complementares da lavoura. As casas-bloco

são casas de andar, com um piso térreo e um piso sobrado. Em regra geral, o piso térreo

destinava-se a guardar o gado e o sobrado acolhia as vivências da família.

A casa-pátio, de piso térreo ou de andar, constitui-se por um alinhamento das dependências

em torno de um pátio, que pode ser aberto ou fechado. (figura 39) Os anexos também se

alinhavam ao redor do pátio, imitando as divisórias de habitação.

241 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.44 242 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.17-18 243 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; pp.18-19

Fig.39 – Desenho de uma casa-pátio, elaborado por Ernesto Veiga de Oliveira (2000)

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55

As casas-bloco, associadas ao Norte, (figura 40) podem ser vistas nas regiões do Minho, Trás-

os-Montes, Beiras Alta e Baixa, e distribuídas pela zona da Beira Litoral - de Coimbra até às

terras saloias dos arredores de Lisboa. As casas térreas244, estão um pouco por todo o país,

pois são associadas a famílias mais modestas, porém a sua tradição vigora no Sul do país. Na

Estremadura, Ribatejo, Alentejo e Algarve, as casas de piso térreo são características tanto

nos montes como nas terras baixas.

Fig.40 – Desenho de uma casa-bloco, elaborado por Ernesto Veiga de Oliveira (2000)

A casa térrea é também a casa dominante nas zonas costeiras. A Beira Litoral, por exemplo, é

ocupada por casas-blocos nas suas terras altas; descendo para a proximidade da faixa

atlântica, precisamente nas comunidades piscatórias, a casa térrea é o modelo adoptado. O

mesmo se verifica no Minho Litoral, descendo até Aveiro.

De acordo com esta classificação estrutural da casa, já é possível discernir um dos

antagonismos mais básicos na arquitectura popular entre norte e sul, tendo em conta que a

linha que os separa cruza o país entre Leiria e Castelo Branco.245 Apesar de esta ser uma das

dicotomias mais evidentes, existem outras igualmente importantes, que se complementam.

Refira-se igualmente o material construtivo, granítico e cinzento no norte, contrastando com

a brancura da argila caiada do sul. A plasticidade que estes materiais oferecem transpõe-se

para a construção. O granito, mais duro, não permite aos nortenhos notáveis motivos

decorativos, já a argila, sendo mais maleável, é usada para ornar fachadas e chaminés.246

Constata-se que as casas do sul são formalmente mais cuidadas, com os seus traços delicados.

Em contrapartida, a rudeza e cinzentismo das casas do norte são também sinónimos de maior

244 Não se confunda aqui a casa térrea com a casa-pátio. Fala-se simplesmente da estrutura da casa e

não da sua organização espacial, até porque o facto de ser térrea, não implica que seja obrigatoriamente organizada em torno de um pátio. 245 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.21 246 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; pp.151-153

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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robustez e resistência. São como que uma espécie de casas ‘todo-o-terreno’, algo que não se

pode exigir no sul, devido à escassez de relevo que facilita a inclusão da casa no terreno.

Estas são as diferenças mais notórias, também por serem as mais primárias; muito mais existe

por contar. O esquema apresentado (figura 41), do autor Mário Moutinho, ajuda a explicar a

diversidade arquitectónica que existe no país, divide-o em 5 regiões com uma arquitectura

popular comum. São elas o Norte, dividido entre Norte Litoral e Norte Interior, o Centro

Litoral, o Alentejo e o Algarve.

Dentro de cada uma delas figura uma casa-tipo. Sinteticamente será explicado cada tipo de

casa, para que se crie uma visão abrangente desta heterogeneidade nacional e assim se

lancem as primeiras bases para o posterior reconhecimento da arquitectura popular de sub-

região em particular de Entre-Douro-e-Vouga.

3.2.1 Síntese Descritiva dos Tipos de Habitação Popular

Inicia-se no Norte, abrangendo a região do Minho, onde se distinguem a casa minhota,

consolidada em zonas de vale e a casa serrana no interior minhoto.247

3.2.1.1 Casa Minhota

As características desta casa nortenha, tal como todas as outras, registam influências locais

da geologia, orografia e clima. O solo granítico e xistoso do norte fornece o material

247 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.41

Fig.41 – Mapa dos tipos de arquitectura por região

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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empregue na sua construção, são assim casas erguidas em granito ou xisto, geralmente bem

aparelhado, unido por argamassa.248 Além da facilidade de extracção e recolhimento do

material, existe também a sua adequada apropriação às especificidades climatéricas da

região. O granito e o xisto são indicados para climas húmidos devido à sua impermeabilidade.

Em termos estruturais, outra característica da casa minhota, é que se trata de uma casa-

bloco, com piso sobradado, onde o rés-do-chão resguarda os animais. “(…) é legítimo

relacionar-se a estrutura desta casa, de rés-do-chão e andar, com as qualidades de

resistência e força do material de que ela é feita.”249

A casa minhota retrata a casa-bloco, mas no povoamento disseminado dos vales por onde se

estende, é também reconhecida uma casa-pátio. (figura 42) O Inquérito à Arquitectura

Popular em Portugal vê o pátio como um núcleo distribuidor:

“O pátio ou eido, vedado à volta pelo conjunto de que se compõem estes

organismos, é uma autêntica sala ao ar livre. Por ela se tem acesso a tudo e para

ela dão todas as portas.”250

Sendo uma casa sobradada com um quinteiro, consoante o referido, o acesso ao piso superior

é efectuado por uma escadaria externa em pedra, paralela ou perpendicular à fachada, que

dá acesso a uma varanda, ou alpendre. (figura 43) Ela é coberta pelo prolongamento da

cobertura e apoiada, a partir do chão, por pilares de madeira ou granito.251O telhado da casa

minhota é na maioria executado com quatro águas, mas também é provável encontrar de

apenas duas. No norte do país, estes telhados não eram providos de chaminé, pois o fumo

escoava de telhas-vãs. Os casos onde a chaminé aparece são mais recentes.252

O interior destas casas era composto, no piso superior, por sala, quartos e cozinha. A cozinha

era o compartimento principal e mais utilizado, em contrapartida a sala destinava-se apenas

a ocasiões solenes. No piso inferior, já acima foi descrito que se destinava a acolher os

animais e outros compartimentos para fins agrícolas.253

248 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.31 249 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.30 250 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.38 251 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.35-37 252 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.119 253 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.47

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3.2.1.2 Casa Serrana

Segundo o esquema de Mário Moutinho acima exposto, a demarcação que contém o tipo de

casa serrana, envolve não só o Minho, como também Trás-os-Montes e Beiras Alta e Baixa. A

maior diferença entre as casas do noroeste e as do nordeste, prende-se ao facto da

pulverização da população. No noroeste, os casais disseminados ao longo das várias aldeias,

permitem que a casa possua um quinteiro, ou pátio, ao redor do qual se vão enquadrando os

seus anexos. No nordeste, entrando nas serras, o povoamento aglomera-se e as casas perdem

a liberdade de usufruir de um quinteiro, visto que a sua área de implantação diminui. O

Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal confirma-o:

“Nas zonas altas de sequeiro, onde o gado é um dos sustentáculos principais da

vida do serrano, a construção limita-se praticamente à casa e ao curral; onde o

milho aparece, aparecem também os espigueiros e as eiras (…).”254

Esta casa serrana, é em muito similar à minhota, porém com uma execução mais tosca.

(figura 44) O granito ou o xisto empilham-se para formar as paredes, sem qualquer tipo de

aparelho ou de argamassa entre eles A construção da casa parte directamente da rocha

natural do solo, e ela acaba por se envolver nos declives naturais do terreno, aproveitando-os

para a criação de acessibilidades em diferentes pisos.255 O sistema de cobertura é executado,

254 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.29 255 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.42

Fig.42 – Entrada para o pátio de uma casa-bloco minhota

Fig.43 – Casa-bloco minhota com as suas duas varandas

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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geralmente, em lâminas de xisto ou lousa.256 O mais arcaico, em colmo, também pode ser

encontrado pelo norte, sobretudo nas montanhas, menos evoluídas.257

Algumas das casas do norte, mesmo as serranas, podem também ser dotadas de uma varanda

que percorre a fachada mais comprida. Esta varanda é utilizada como sequeiro ou para

arrumações. A estrutura da varanda varia consoante a região.258

Na Cova da Beira, algumas casas serranas possuem um terceiro piso chamado balcão (figura

45), que se trata de uma varanda coberta com um balaústre de madeira, cuja finalidade é

também servir de sequeiro para fruta e milho.259

Em suma, as semelhanças formais que a casa serrana pode revelar em relação à casa minhota

de vale, apresentam maior diversidade de solucionamento, passando por algumas adaptações

mais contextualizadas na pobreza e rudeza do local, como é o caso da substituição da telha

pelas lâminas de lousa ou até mesmo o colmo. No fundo, estas casas imbuíram-se do conceito

das casas de vale, e há que ter em conta que, mesmo na montanha, ainda é possível

encontrar casas características da zona de vale, embora seja raro, e normalmente, quando

esta situação sobrevém, associa-se a casa a uma família mais abastada que as demais famílias

serranas.260

256 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.42 257 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; 1961; p.31 258 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.35 259 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.42 260 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.51

Fig.44 – A simplicidade de uma casa serrana Fig.45 – Casa de três pisos, Paúl

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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Passando para o Centro Litoral, afigura-se o tipo de povoamento organizado ao longo das vias

de comunicação. Aqui pressupõe-se um maior planeamento territorial, reflectido também nas

aldeias. As cidades costeiras e piscatórias, são as mais estruturadas, sendo dotadas de um

ordenamento cuidado, com a frequente aparição de traçados ortogonais. Sobre elas o

Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal cita:

“Fundadas por esta ou aquela razão, acidente geográfico que facilite a indústria,

vizinhança de estabelecimento humano aglutinante, circunscritas primeiro por

defesa ao espaço fechado das suas muralhas, transbordando depois em torno pelo

exterior, e mais tarde radialmente ao longo das estradas que as atravessam ou

passam ao seu alcance, e que são outros tantos factores de sobrevivência e

crescimento.”261

Vizinha de Entre-Douro-e-Vouga, a cidade de Espinho é um exemplar desse modelo

urbanístico, com a sua característica malha quadriculada (figura 46), onde as ruas são

conhecidas pela sua numeração e as vias principais são perpendiculares à linha da costa.

Dentro desta região do Centro Litoral, Mário Moutinho evidencia mais quatro géneros de casa.

3.2.1.3 Casa de Madeira

A casa de madeira é precisamente o tipo de habitação edificado nas zonas costeiras. A casa

de madeira associa-se ao norte do Douro, a “barracos de abrigo e habitação temporária262 de

pescadores”263 e a sul do Douro a casa de madeira aparece em maior número e passa a

261 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.33 262 O carácter temporário diferia a norte e a sul do Douro. A norte do Douro conjugava-se a actividade agrícola com a marítima, visto que os povoados agrícolas ficavam próximos dos marítimos. Neste caso,

os barracos eram usados para dormidas de curta duração e, também como arrecadações de barcos e outros materiais. A sul do Douro, a actividade era exclusivamente marítima, e os pescadores apenas permaneciam durante a época da apanha da sardinha, estando afastados durante o Inverno. 263 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.256-257

Fig.46 – Ortogonalidade urbanística de Espinho

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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designar-se por ‘palheiro’.264 Estas casas de madeira começaram a estabelecer-se, agrupadas

em pequenos núcleos, em locais que outrora eram desocupados. Só mais tarde as habitações

se foram organizando ao longo das vias. O seu uso era sazonal, os povoados de barracos ou

palheiros apenas ganhavam vida durante a época da faina. Estruturalmente, este tipo de casa

dos pescadores construída em tabuado vertical ou horizontal, possui um só piso elevado sobre

estacas em madeira, ou pilares de pedra. Quando a estacaria não é evidente, pode estar

encerrada em madeira, ou pedra, o que cria um compartimento vazio para arrumos. É

cumeada por um telhado de duas águas, com a empena voltada para a rua. O acesso à casa é

feito por uma varanda corrida na sua fachada frontal, ao nível do andar, que por sua vez faz a

ligação à rua por uma escadaria.265

Também no distrito de Aveiro, existe o exemplo das típicas casas da Costa Nova, em Ílhavo.

(figura 47) São casas de madeira, famosas pelo seu tabuado colorido. Mais perto ainda de

Entre-Douro-e-Vouga, existem alguns exemplos dessas casas de madeira coloridas no concelho

circunjacente de Ovar, em Esmoriz. Os palheiros de Esmoriz podem ter mais de dois andares

acima da estacaria.266 (figura 48)

3.2.1.4 Casa Alpendrada

O segundo tipo de casa é a casa alpendrada. Dentro da zona Centro Litoral, de acordo com

Ernesto Veiga de Oliveira, encontramos com grande força a casa alpendrada na região

gandaresa. Sobre esta região ele refere:

264 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.256-257 265 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.89 266 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.257

Fig.47 – Casas típicas da Costa Nova Fig.48 – Palheiro de Esmoriz

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“Gândara é um topónimo que se aplica a muitos lugares do Noroeste Peninsular;

neste estudo, porém, referimo-nos em especial à zona do nosso país

compreendida entre as bacias do Vouga e do Mondego, que se distingue, no

conjunto provincial da Beira Litoral, por um certo número de características

muito peculiares.”267

Nesta região da Gândara destacam-se algumas casas alpendradas, tais como as casas de Mira

e as de Murtosa.268 De modo geral, Mário Moutinho traça as casas alpendradas com a

frequente planta rectangular, térreas, com um telhado de duas águas. São construídas em

adobe de barro e caiadas de branco. Costumam possuir contrafortes, também em adobe, no

exterior a reforçar as suas paredes, atributos que em muito as identificam com as demais

casas térreas espalhadas ao longo do país, exceptuando a maior distinção, e neste caso a sua

particularidade, que se trata do característico alpendre.269

Existem mais algumas terras pontuais no mapa nacional com casas caracteristicamente

alpendradas, embora a sua situação seja fora dos limites do Centro Litoral; pode-se

mencionar as casas da Maia, Matosinhos e Vila do Conde, nos arredores do Porto.270

Voltando aos casos das casas de Mira e Murtosa, se o alpendre é a maior particularidade que

as une, a disparidade mais manifesta reside no seu formato. A casa de Mira “é pois uma

construção em L, com pátio fechado à retaguarda, que não se nota da rua.”271 O seu alpendre

confronta-se na retaguarda, orientado para o pátio interior. Formata-se num prolongamento

da cobertura que se apoia em colunas de adobe ou de madeira, consoante os casos.272 Em

Murtosa (figura 49), a planta passa a ser simplesmente rectangular, e quanto ao alpendre é a

principal entrada na habitação, mesmo que orientado para a eira, na retaguarda.273 Ainda

assim, segundo a descrição de Ernesto de Oliveira, deduz-se que os alpendres da casa de

Murtosa são algo mais elaborados que os de Mira. Entre outros pontos, eles são dotados de um

poal, um pequeno murete, sobre o qual assentam as colunas que sustentam a cobertura. Este

poal deixa espaço para uma ou duas aberturas que permitem aceder ao alpendre, sempre

numa das extremidades, nunca no meio.274

267 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.182-183 268 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; pp.192-205 269 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; pp.89-90 270 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.86-89 271 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.194 272 Idem; p.198 273 Ibidem; pp.205-207 274 Ibidem; p.209

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Estas poderão ser as casas alpendradas que merecem maior destaque, naturalmente existem

muitas outras variantes, que não estão restritas apenas a Mira e a Murtosa. De facto, a zona

litoral central do país possui várias referências neste parâmetro, todas elas com suas

afinidades. Desde Leiria, com fachadas pouco gandaresas, mas alpendres aparentados de

Murtosa, a outros concelhos com casas mais influenciadas pela arquitectura da Gândara.275

3.2.1.5 Casa Saloia

A casa saloia aproxima-se da região da Estremadura, e por isso ela evidencia certos

delineamentos pombalinos.276 Este género define-se pelo agrupamento de dois blocos

distintos277, erguidos em taipa.278 De um lado, um bloco térreo, do outro um bloco de dois

pisos, ambos adjacentes. No bloco de dois pisos o telhado detém duas águas, enquanto no

térreo destacam-se quatro águas.279 Pode-se constatar que a casa saloia possui um certo

charme, com certos pormenores decorativos e traçados aprimorados não granjeados por

outras casas. Distinguem-se os seus telhados arqueados com motivos de andorinhas, ou os

cachorros de pedra ladeando na parte superior das janelas, como alguns dos apontamentos

responsáveis pela fina atmosfera estremenha desta casa.280

275 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.218 276 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.178 277 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.90 278 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.178 279 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.90 280 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.178

Fig.49 – Casa alpendrada da Murtosa

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3.2.1.6 Casa Ribatejana

Aproximando-se mais do sul da região Centro, eis o Ribatejo com a sua casa típica. (figura 50)

Trata-se de uma edificação térrea, erigida em adobe ou tijolo e de acabamento caiado, com

um telhado de duas águas coroado de uma chaminé rectangular. É algo semelhante à casa

alpendrada, porém sem o alpendre e com caiações policromadas.281 Esta casa pode ser

julgada uma variante da casa alentejana, visto que aproxima das suas feições e só em

determinados casos pode ter uma certa especialidade local.282

Nesta zona do mapa (a sul do Centro) deparam-se as portas que abrem para o Alentejo. Vasta

planície de exíguos relevos e paisagem homogénea, de tonalidades quentes, enfrenta extremo

calor nos longos meses de verão (ultrapassando os 40ºC) e ao longo do ano a pluviosidade é

baixa. Pode ser o Alentejo apelidado de deserto português, pela sua baixa ocupação e

demográfica e densidade populacional e pela sua planura quente e seca.283 Onde as

propriedades agrícolas passam a latifúndios de cultura extensiva284, neste território a

população agrupa-se em pequenos aglomerados nos centros urbanos e dispersa-se nos

montes.285 Ernesto Veiga de Oliveira aponta que “o Alentejo rural se partilha

fundamentalmente entre os dois extremos: o proprietário – senhor de vastos domínios, que

em muitos casos explora a sua propriedade por sistemas racionalizados, mas que com muita

frequência a aluga a um rendeiro – e o trabalhador amarrado à terra, mas que nada

possui.”286

281 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.90 282 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.177 283 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e

Agricultura; Lisboa; 1992; pp.104-105 284 CAVACO, Carminda; Op. cit.; pp.107-108 285 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.168 286 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; pp.159-164

Fig.50 – Casa ribatejana

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3.2.1.7 Monte Alentejano

As casas do monte alentejano situam-se em vastas propriedades de agricultura extensiva.

(figura 51) Por serem elementos de um povoamento disperso, devem ser abrangentes às

necessidades dos senhores e trabalhadores locais. De tal modo, estes edifícios, que cumprem

as premissas básicas da arquitectura popular meridional, são grandes complexos térreos, de

planta rectangular, construídos de adobe de taipa ou tijolo, caiados, com telhado de duas

águas que contém várias chaminés, e reúnem ao longo do seu comprimento, o espaço de

habitação juntamente com outras dependências essenciais ao trabalho rural. As paredes são

reforçadas com contrafortes no seu exterior, o pavimento quer interior como exterior é de

terra batida, na maioria dos casos, ou em habitações mais abonadas, em laje ou ladrilhos.287

Em relação à organização do espaço interior, a entrada principal é feita pela cozinha ou pela

sala de fora, um espaço contíguo à cozinha.288 Uma das particularidades destas casas trata-se

de uma parede que surge a meio da largura do edifício e eleva-se até formar o cume do

telhado. Esta parede acaba por funcionar como divisória de funções: do lado maior

geralmente habita o senhor, e do lado menor o seu caseiro.289

Ernesto Veiga de Oliveira, mostra que existem casas de monte pequeno, pertencentes ao

simples lavrador, e de monte grande, as residências solarengas, onde habitam o senhorio da

terra e alguns caseiros.290 As casas de monte pequeno, como o previsto, são de menores

dimensões e possui menos dependências, geralmente, apenas as essenciais ao

armazenamento de produtos agrícolas e resguardo de gado de um homem de poucos recursos:

despensas ou arrecadações, a amassaria, um forno exterior cilíndrico, celeiro, palheiro e

cavalariça.

287 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.117 288 MOUTINHO, Mário; Op. cit.; p.117 289 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.169 290 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.169

Fig.51 – Casa de monte alentejano

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Os montes grandes, por vezes deixam de ser casas térreas e passam a ter até três pisos. Estes

são de dimensões bem maiores e possuem uma dinâmica que Ernesto de Oliveira compara a

uma “aldeia do Norte”291, condensada num só complexo que abriga vários cómodos, capaz de

hospedar e zelar por vários trabalhadores e criados dentro das suas paredes, inclusive abrigar

forasteiros ou mendigos. Além das dependências de um monte pequeno, contém também uma

casa de entrada, onde estão as loiças, uma despensa maior, uma queijaria ou rouparia, entre

outras necessidades.292

As casas do monte, basicamente, são um acomodar de diversas funções, lado a lado umas com

as outras, em torno de um “vasto recinto de limites pouco determinados”293, logo apreende-

se que se trata de uma organização em modelo de pátio aberto.

3.2.1.8 Casa de Povoado

Este é o tipo de casa que perfila os aglomerados populacionais, as aldeias alentejanas. As

casas do povoado dispõem-se de forma continuada, adjacentes umas às outras, ao longo da

rua e frente a frente com outras fileiras de casas. (figura 52) Um aspecto típico de um

povoamento aglomerado.

Ao contrário do monte, estas aldeias “(…) são habitadas por operários rurais que não possuem

terras nem alfaias (…). As suas casas, por isso, são unicamente de habitação e não de lavoura;

a própria ferramenta agrícola fica na herdade.”294 Quer isto dizer que os trabalhadores que

trabalham permanentemente, alojam-se no monte alentejano, e os outros ficam nas aldeias

291 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.169 292 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.169 293 Idem; p.169 294 Ibidem; p.164

Fig.52 – Casas em povoado alentejano à face a rua

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mais próximas.295 Por estes motivos, a casa de povoado é bem mais reduzida que o monte,

além de não desempenhar todas aquelas funções. Mário Moutinho, sucintamente a descreve

como uma casa térrea, ou de dois pisos, planta rectangular e cobertura em telha de uma ou

duas águas; em suma, diversas características comuns ao monte, tal como o pavimento, o

material construtivo, entre outras, mas maior modéstia. Talvez o elemento mais proeminente

seja a sua lareira de grandes dimensões, que ressalta à vista, não só de quem entra na

cozinha, como também no exterior, a quem passa na rua e consegue discernir a sua

volumetria que se sobressai na fachada frontal. Mais uma vez, intrínseco à lareira, o

apontamento da grande chaminé. As casas alentejanas (monte e povoado) usufruem sempre

de imensas chaminés rectangulares. (figura 53)

No seu interior, entra-se directamente na cozinha e, ao fundo, as portas que dão acesso aos

quartos e ao ‘quintalão’, um pequeno quintal nas traseiras da casa, onde pode existir um

galinheiro ou curral. No caso das casas de dois pisos, os quartos reservam-se para o piso

superior, com acesso feito pela cozinha.296 Outro traço das casas alentejanas, é a ausência de

aberturas nas suas fachadas. Comparativamente às casas nortenhas, as casas alentejanas

possuem poucas janelas, precisamente por uma questão de evitar a entrada dos quentes raios

solares e assim conservar a frescura no interior. Da brancura da fachada, muitas vezes

destaca-se apenas a porta, e também pode suceder que em vez de janelas surjam postigos a

pontuar a fachada.297

Saindo do território alentejano, culmina-se no extremo sul no Algarve uma região de clima

mediterrânico de grande secura, que respira os quentes ares africanos. Protegido pelas serras

295 RIBEIRO, Orlando; Portugal. O Mediterrâneo e o Atlântico; Edições João Sá da Costa; Lisboa; 1993; p.102 296 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.118 297 MOUTINHO, Mário; Op. cit.; p.141

Fig.53 – Fachada frontal de casa de povoado alentejano

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de Monchique e do Caldeirão, o Algarve é resguardado dos ventos do Norte.298 Existe uma

subdivisão da região entre Serra e Algarve, sendo que o Algarve se resume à orla costeira.299 O

contraste entre estas duas faces é notório, sendo a serra mais pobre, menos povoada, menos

desenvolvida:

“A serra pobre e triste, onde apenas no fundo dos vales sinuosos se junta um

pouco de terra e há água para regar umas «hortas», é, com efeito, um mundo

áspero, estranho à alacridade do casario disperso entre pomares com hortas

viçosas onde não falta a água, onde tudo é límpido e claro, e onde do chão

ressequido e vermelho crescem alfarrobeiras sempre verdes.”300

Porém, o confronto dá-se para além da serra e orla, ele também se evidencia de ocidente

para oriente. “O desenvolvimento da região no sentido oeste-leste traduz-se numa

diferenciação climática, o Barlavento mais chuvoso, mais fresco e mais ventoso e com maior

humidade atmosférica, e o Sotavento mais quente e seco, mais exposto ao levante, (…).”301

3.2.1.9 Casa de Pescadores

A casa de pescadores algarvia conhece duas vertentes, uma mais tosca que a outra. Ao longo

de toda a sua costa, banhada pelo Atlântico e Mediterrâneo, as edificações a ocidente são

mais modestas, semelhantes às serranas algarvias, as orientais ostentam um aspecto mais

cuidado.302 A característica mais diferenciadora das casas algarvias, em relação ao restante

país, é o aparecimento das açoteias – “um terraço situado no alto da casa, em lugar do

telhado, e que serve de local de secagem de certos produtos alimentares, e sobretudo como

logradouro (…)”303 - e platibandas, mormente nas casas de pescador. (figura 54) Para além do

traçado natural de casas do sul – a estrutura de piso térreo, as brancas paredes caiadas com

rodapés coloridos – a casa algarvia já se abstém do uso do adobe de barro e da taipa, usados

nas casas do Alentejo e em algumas do Centro Litoral, e passa a erguer-se em pedra ou tijolo.

Seguidamente, eis que surgem as típicas chaminés decoradas, de inspiração muçulmana,

juntamente com a açoteia e a platibanda que a contorna.

298 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.122 299 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.125 300 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.170 301 CAVACO, Carminda; Portugal Rural. Da Tradição ao Moderno; Direcção Geral de Planeamento e Agricultura; Lisboa; 1992; p.123 302 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.171 303 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.173

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Estas casas possuem diversas singularidades que só se encontram nesta região do país, com

efeito, o seu género é de rápida identificação. No seu interior acomoda-se um pátio fechado

onde está centrado um poço de roldana.304 As suas divisões são abobadadas, tais como as

alentejanas, e a entrada principal acede directamente à sala ou a um corredor, sendo que a

cozinha volta-se para a retaguarda.305 Sobre as suas singularidades atesta Ernesto Veiga de

Oliveira:

“Estas casas, cuja fachada é profundamente decorada com cunhais e guarnições,

molduras, platibandas trabalhadas e coloridas, etc., difundem-se profusamente

pelo triângulo Loulé-Alportel-Faro, (…).”306

3.2.1.10 Casa Rural

A casa da serra de tratamento mais tosco, já não apresenta alguns elementos peculiares da

casa de pescadores. No meio do monte, entre dez a vinte casas, os edifícios reflectem uma

tez pobre. Define-se então esta casa como uma estrutura térrea de planta quadrangular,

erigida em alvenaria de taipa, pedra ou tijolo rebocado e caiada.307 (figura 55) Todavia, é

também muito frequente encontrar a pedra nua, sem o caiado. A cobertura de uma ou duas

águas pode preservar o forro a colmo, em certos locais da serra, e sem a presença de

chaminés.308

304 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.141 305 MOUTINHO, Mário; Op. cit.; p.141 306 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.173 307 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.142 308 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.171

Fig.54 – Casas de pescadores do Algarve

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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Se percorrer até ao litoral ocidental, vestígios de platibandas e açoteias despontam dos

telhados, consolidadas com a cobertura em telha, embora seja uma característica “rara no

barlavento”309. Quando elas existem, acedem-se a partir da cozinha, por uma escada

interior.310 Também por estas bandas “são raras e recentes as chaminés decoradas

características do resto do Algarve”311. Facto com o qual parece não concordar Mário

Moutinho, afirmando que “é neste tipo de habitação que aparecem os exemplos mais

decorativos das chaminés algarvias.”312 Apenas neste aspecto, os autores não concordam, os

restantes são sincrónicos. As divisões interiores organizam-se de modo semelhante à dos

pescadores, com a sala voltada para a dianteira e a cozinha nas traseiras. Estes edifícios são

também dotados de dependências como forno, estábulo e galinheiro.313

Quando voltadas para sul, as casas algarvias parecem querer ganhar de novo traços mais

cotejados à casa de pescador, descrita anteriormente. Aliás, nota-se que, à medida que se

aproxima o oriente, os elementos característicos algarvios vão ganhando maior evidência e

aprimoramento.

Posto o término nesta sucinta descrição, que visa esclarecer a pluralidade popular das casas

nacionais, importa reter as suas características comuns, pois se a arquitectura popular é

definida pela parelha homem-meio, deve haver um claro entendimento da inconstância do

meio em Portugal, daqui derivam diferentes respostas aos problemas que a natureza coloca

ao homem. Mesmo havendo esta mutabilidade e identidade regional, existe algo que é comum

a todo o território português: a herança dos ensinamentos dos nossos antepassados. Com

309 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.173 310 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.141 311 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.171 312 MOUTINHO, Mário; A Arquitectura Popular Portuguesa; Editorial Estampa; Lisboa; 1995; p.142 313 MOUTINHO, Mário; Op. cit.; p.141

Fig.55 – Casa rural do Algarve

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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estruturas rudimentares, do mais básico que poderia existir, são os seus legados

universalizados, em tempos históricos, que expõem as regras gerais a respeitar, seja a norte

ou a sul.

As características comuns das casas populares de todo o país residem na “grande singeleza de

linhas e de estilo”314 que o homem emprega na sua obra. Muitas vezes encontram-se variados

exemplos de casas elementares, por elas aludirem precisamente a essa singeleza. E

finalmente, outro traço que todas as casas respeitam, é a planta quadrangular simples.315

3.3 Integração da Casa Popular em Entre-Douro-e-Vouga

Conhecendo a gama de casas que modelam o país, coloca-se uma questão:

- Qual o perfil de casa popular é afecto à sub-região de Entre-Douro-e-Vouga?

Esta é a temática primordial para a qual toda a pesquisa, até agora exposta, apontará.

É interessante verificar que o esquema apresentado por Mário Moutinho (ver figura 41),

inscreve a sub-região numa área onde vigora a casa minhota, mas também se sobrepõe num

pujado limite branco. Este limite, embora careça de explicação, supõe tratar-se de uma área

transitória, onde a arquitectura absorve influências de outras regiões circunjacentes. Em

Arquitectura Popular em Portugal, já foi referido que Entre-Douro-e-Vouga está patente na

zona 1, denominada Minho. Algumas observações anteriormente expostas já deram a prova

que Entre-Douro-e-Vouga, quer na sua configuração geológica, climática, social e agrícola,

assemelha-se ao carácter minhoto. Em suma, seria bastante fácil declarar que a arquitectura

desta sub-região é obviamente minhota. No entanto, não deve ser descurado o cariz

heterogéneo do local, com concelhos inseridos na pobreza da serra e outros afectados pelo

desenvolvimento regional e industrial, mais próximos da costa.

314 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.21 315 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.21

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

72

Capítulo 4.

Arquitectura Popular em Entre-Douro-e-

Vouga

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

73

4.1. Descrição por Localização – Montanha / Vale

4.1.1 A Casa de Arouca e de Vale de Cambra

Em Arouca, um concelho espraiado em território serrano, foram investigados os casos

particulares das freguesias de Cabreiros – lugares de Rio de Frades e Covêlo de Paivô e

Albergaria-da-Serra e Cabaços.

Vale de Cambra também se estende sobre parte da encosta do Maciço da Gralheira, e é

precisamente esse o ponto onde se encontram os locais de estudo escolhidos: a freguesia de

Arões – lugares de Cabrum e Lomba. Por esta via, Arouca e Vale de Cambra complementam-se

no contexto de terras serranas do norte da Beira.316 (figura 56)

Os vários locais confrontados inserem-se em diferentes contextos e conforme a sua situação

concebem uma arquitectura, que embora semelhante, revela certas particularidades

provocadas pela disparidade de condicionantes dos locais. Albergaria-da-Serra e Cabaços,

situam-se na parte alta da serra, o Alto da Freita317 , gozando da contiguidade ao rio Caima318,

onde as principais actividades económicas são a agricultura e a criação de gado.319 As

restantes povoações são mais baixas que as anteriores, sendo que Rio de Frades e Covêlo de

Paivô também podem ser considerados lugares ribeirinhos, pela sua proximidade aos rios

Frades e Paivô, respectivamente.320 Sobre as várias possibilidades de assentamentos Filomena

Silva clarifica:

316 https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/.../mrc_aeaulp2012_atas.pdf ;p. 1 (consultado a 16-07-2014; às 16:13h) 317 Idem; p. 2 (consultado a 16-07-2014; às 16:13h) 318 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.23 319 RIBEIRO, Mário de Araújo; Op. cit.; p.90 320 Idem; pp.23-25

Fig.56 – Localização dos locais em análise

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

74

“O homem sempre procurou fixar-se nos locais que lhe pareciam mais favoráveis

à sua sobrevivência, conforme a tipografia do solo, abundância de água,

exposição solar, possibilidades de circulação e, sobretudo, devido ao seu instinto

gregário.”321

4.1.1.1 O Povoado

Nas terras altas e baixas do Maciço da Gralheira os povoamentos definem-se de forma muito

idêntica, por um conjunto de casas compactadas em lugarejos, assentes em locais onde a

topografia se torna mais cómoda, evitando acentuados declives. Mesmo assim, o sobe e desce

é inevitável e o povo percorre-o por entre caminhos e ruelas esguias por entre as casas, em

caminhos calçados por largas pedras graníticas ou xistosas. Os locais de cultivo não

flanqueiam com esses arruamentos, situando-se nas traseiras das casas. ”Por vezes as terras

encontram-se longe do povoado, nos locais onde a produtividade justifique o trabalho

despendido.”322

No caso da Lomba, situada no alto de uma colina (figura 57), os terrenos de cultivo

permanecem no sopé. Os habitantes acedem aos seus campos através de esguios carreiros em

terra, não calçados, que despontam dos caminhos principais, geralmente afunilados entre

duas casas, e que muitas vezes vencem o declive do terreno com o auxílio de escadas feitas

de grandes blocos de pedra. Os campos de cultivo, minifúndios, espelham a cultura intensiva

que se vive nestas terras. Todos os lugares mencionados sobrevivem da criação de animais e

da agricultura da batata e do milho.323

321 SILVA, Filomena; Rio Paiva; Campo das Letras; Arouca; 1999; p.59 322 SILVA, Filomena; Op. cit.; p.48 323 Idem; p.50

Fig.57 – Aldeia da Lomba

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75

4.1.1.2 Acessibilidades

Casas de cariz serrano, arrumadas em povoamentos condensados que formam pequenos

lugares, foram erigidas com grande proximidade umas das outras, não sobrando área para

pátios ou quinteiros privativos, o que significa que o acesso ao espaço público é directo.

Contudo, situações pontuais, em Covêlo de Paivô, demonstram alguns pequenos pátios na

dianteira da casa, circundados por um muro granítico mal aparelhado (figuras 58), ao qual se

acede por um portal de madeira. Não possui as grandes dimensões de um pátio de uma casa

de vale, no entanto esta situação verifica-se em casas de maior relevo que as restantes.

Vagueando por estas terras percepciona-se automaticamente a pobreza do povoado, a

modéstia da habitação compatível com a sua reduzida área e a sua tosca estruturação.

Percorrendo os caminhos do lugarejo serrano, curto é o passo que permite contactar a

habitação. Muitas vezes a porta de entrada está logo ali a um braço de distância, escancarada

para a rua, com um ou dois degraus que a separam da cota térrea. (figura 59) Quando tal

situação ocorre, verifica-se que a casa implantou-se no terreno de modo a tirar proveito do

seu declive natural. Ernesto Veiga de Oliveira confirma:

“Quando o declive permite entradas para os dois pisos, vêem-se duas portas,

cada uma no seu nível. Se a escada é necessária, ela é então exterior, de pedra,

e fica encostada à parede, na fachada frontal, a partir da rua, mostrando um

patim no alto.”324

324 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.132

Fig.58 – Casa com um pequeno pátio (Covêlo de Paivô) Fig.59 – Caminho estreito e escadeada entre casas (Lomba)

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76

São menos frequentes as escadas, precisamente pelo motivo de que são muitas as habitações

que exploram a pendente do solo para garantir acesso aos dois pisos, sem necessidade de

recorrer a elas.

4.1.1.3 Estrutura

As casas serranas são, na esmagadora maioria, sobradadas, rareando por estas bandas a casa

térrea. No século passado, as zonas altas da serra eram ocupadas pelas ditas ‘casas terreiras

de montanha’, pequenas casas, de génese elementar, com uma cobertura de colmo.325 (figura

60) Em Albergaria-da-Serra e Cabaços ainda se podem encontrar estes exemplares.

Seguindo a regra geral, das casas sobradadas, o seu piso inferior está reservado para o

resguardo das cortes de gado e palheiro, no entanto, como nem todas as famílias sustentam

gado, aquelas que não o têm utilizam o rés-do-chão para arrumos das ferramentas agrícolas e

dos produtos colhidos do campo. Consoante a sua função é denominado de curral, caso

abrigue gado, ou de loja, para efeitos de armazenamento de utensílios e alfaias.326

As habitações possuem uma planta quadrangular, no entanto, existem vários casos de casas

com esquinas arredondadas que se adaptam aos limites do arruamento, gerindo da melhor

forma a largura da rua. Outra técnica de gestão do espaço é o uso de passadiços (figura 61),

ou corredores, que ligam as casas de cada lado do caminho uma à outra, por intermédio do

piso sobradado.

325 https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/1822/1/mrc_aeaulp2012_atas.pdf ;p. 2 (consultado a 16-07-2014; às 16:13h) 326 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas

crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.112

Fig.60 – Casa com cobertura de colmo (Cabaços)

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77

No que toca aos alicerces, em edifícios de pedra, eles apenas existem caso a construção

cresça em altura. André Leroi Gourhan explica o facto:

“As habitações privadas não exigem normalmente uma base tão sólida, pelo que,

na maior parte dos casos, as pedras, após o nivelamento do solo, são colocadas

directamente sobre este, ou, como por vezes também sucede, numa vala pouco

funda; encontram-se edifícios deste tipo em toda a parte onde abunde a pedra,

mas sobretudo quando a madeira e argila não existem.”327

A rocha do terreno é usada como parte da fundação, e quando um andar está parcialmente

enterrado no solo, aproveita a rocha para formar a parede. (figura 62)

4.1.1.4 Paredes e Pavimento

As paredes do casario são compostas pelo aparelho de granito e/ou xisto, sem ligação de

argamassa. Justificado pelo facto de que “o maciço da Gralheira é marcado pela alternância

de faixas de xistos e de granitos, com estes últimos a dominarem na Freita e os primeiros a

marcarem as encostas de aproximação ao Paiva.”328

A pedra fica à vista, tanto no exterior como no interior da habitação. Em Arouca, cada lugar

possui um modo muito particular de consolidar as paredes de suas casas. Os casos estudados

testemunham essa variedade nas paredes. Em Rio de Frades, Covêlo de Paivô e Lomba, o

327 GOURHAN, André Leroi; Evolução e Técnicas. II-O Meio e as Técnicas; Edições 70; 1984; p.188 328 https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/1822/1/mrc_aeaulp2012_atas.pdf ;p.2 (consultado a

16-07-2014, às 16:13h)

Fig.61 – Casa com passadiço sobre o caminho (Rio de Frades)

Fig.62 – Implantação da casa sobre a rocha natural (Lomba)

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principal material empregue é o xisto-grauváquico329, com uma tonalidade acastanhada.

Blocos de xisto, por vezes faceados, de tamanhos diversos, são aparelhados uns nos outros,

conjugando-se como peças de um puzzle de modo a colmatar vazios. As esquinas são

reforçadas com os blocos de xisto maiores, precisamente para conferir maior resistência e

solidez. (figura 63)

Algumas casas conjugam blocos de granito com o xisto, desta feita com um aparelho mais

aprimorado. (figura 64) Este cenário é mais frequente em Covêlo de Paivô, sendo que em

imensos casos, os cunhais compõem-se de blocos de granito, enquanto a restante parede é

xistosa. Isto trata-se de um indício da composição geológica dos dois lugares330, mostrando

que o xisto abunda em contraponto com o granito, contudo, em Rio de Frades e Lomba a

quase ausência de granito é bem mais evidente, sendo que nestes lugares a construção é

xistosa na sua totalidade. O caso oposto acontece quando se passa para as terras altas da

serra como Albergaria-da-Serra, Cabaços, entre outros. Aqui predomina o granito enquanto o

xisto escasseia. Acerca do uso do granito, Mário de Araújo Ribeiro escreve:

“O granito é usado de modo diverso, mas o mais apelativo e assaz frequente é

aquele em que os grandes blocos regulares constituem percentagem substancial

das paredes. Este modo de construção é particularmente visível em Cabreiros,

tanto na sede como em Tebilhão, mas é vulgar em todas as povoações das zonas

graníticas.”331

O aparelho do granito, dentro de um lugar, tanto pode conhecer aparelhamentos de pedra

mais escorreitos como mais descuidados. Tudo depende do proprietário e do cuidado, meios e

técnicas que este pretende empenhar na habitação, por exemplo, os edifícios dependentes

das habitações, como currais ou lojas, são visivelmente mais primários, devido à função que

desempenham.

329http://www.patrimoniocultural.pt/media/uploads/trabalhosdearqueologia/36/4.pdf; p.18 (consultado a 19-06-2014, às 15:25h) 330 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.109 331 RIBEIRO, Mário de Araújo; Op. cit.; pp.110-111

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O pavimento das casas é de madeira ou de pedra, no piso sobradado. Quando as casas são

térreas, assentam-se pedras grandes no chão, ou em situações mais pobres, o pavimento

resume-se apenas a terra batida, apenas com uma laje de pedra no local da lareira. No caso

da casa ser sobradada, no curral permanece o solo de terra batida (figura 65), ou então

aproveita-se a rocha na qual a casa se implanta. De qualquer modo as irregularidades não são

sentidas pelos animais, pois ao chão acrescenta-se uma camada de palha ou saibro.332 Para o

piso sobradado recorre-se ao soalho, apoiando-se este em vigas de madeira encastradas nas

paredes. (figura 66) “Os soalhos, como é natural, prendem-se com a habitação acima do nível

do solo (a qual é normalmente de madeira), visto que as pranchas colocadas directamente

sobre o solo não só acabariam por apodrecer, como serviriam de refúgio a animais

parasitas.”333

332 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.74 333 GOURHAN, André Leroi; Evolução e Técnicas. II-O Meio e as Técnicas; Edições 70; 1984; p.202

Fig.63 – Parede de xisto onde os blocos maiores reforçam os cunhais (Rio de Frades)

Fig.64 – Junção de xisto e granito numa parede (Covêlo de Paivô)

Fig.65 – Chão de curral em terra

batida, revestido a palha e excrementos (Cabaços)

Fig.66 – Estrutura do pavimento em piso sobradado (Rio de

Frades)

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4.1.1.5 Portas e Janelas

Praticamente todas as casas dispõem apenas de uma porta de entrada para o seu piso

sobradado e outra porta mais larga para o andar térreo. Em alguns casos, a porta dos currais,

embora larga, era mais baixa que o habitual. A primeira é uma porta de tabuado de madeira

vertical, com um batente, a segunda, de arranjo mais rude, costuma ser executada em

madeira chapeada e por ser mais larga chega a ter dois batentes. (figura 67) Ainda é possível

encontrar trancas de madeira em algumas portas, visto que estas eram usadas inicialmente,

só mais tarde se propagou o uso de fechos metálicos.334

A moldura das portas é composta por ombreiras e lintel, ou padieira. As ombreiras são pedras

tão grandes como os cunhais ou maiores até, dependendo das situações. De modo geral elas

erigem-se em granito, mas no caso de Rio de Frades e Lomba, onde o granito rareia, as

ombreiras formam-se com blocos de xisto: dois maiores na base, um de cada lado, conjugados

com outros de tamanho médio na horizontal. Como explica Manuel C. Teixeira:

“As ombreiras das portas são formadas, de cada lado, por várias pedras: as

pedras tranqueiras, verticais, e as agulhas, horizontais, que ligam a moldura à

parede.”335

Em edifícios mais pobres, onde não existem grandes blocos para formar as ombreiras com

solidez suficiente, utilizam-se tábuas de madeira como reforço, assemelhando-se a uma

moldura em torno da porta. (figura 68) Já os lintéis ou padieiras tratam-se de um só bloco

disposto na transversal sobre as ombreiras, em granito ou xisto (Rio de Frades e Lomba), e

menos frequente, mas também possível, em barrotes de madeira:

“Como o xisto é muitas vezes excessivamente miúdo e quebradiço, as padieiras

de portas e janelas são quase sempre grossas tábuas ou barrotes de madeira, que

se inserem nas paredes, e sobre as quais a construção segue com maior

segurança; (…)”336

334 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.78 335 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.78 336 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.33

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Fig.67 – As portas de casa, de acordo com a sua função (Covêlo de Paivô)

Fig.68 – Porta emoldurada em madeira (Rio de Frades)

Existem ainda os lintéis que funcionam com arcos de descarga, utilizados nas portas dos

currais ou lojas. (figura 69) Por estas serem de maior dimensão, consequentemente aumenta

a pressão exercida pela parede sobre o lintel, assim o arco de descarga mitiga esse efeito.337

Um dado curioso acerca das ombreiras e dos lintéis das portas é a sua tonalidade. Os

moradores procuravam um material geralmente de cor mais clara que as paredes, ou então,

raros os casos caiavam-nos. Julga-se que seria para contrastar durante a noite, assim quando

voltassem a casa seria mais fácil encontrar a porta de entrada.338

Fig.69 – Arco de descarga em porta de curral (Covêlo de Paivô)

337 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.78 338 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas

crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.111

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A quantidade de janelas por cada destas casas serranas não é muito numerosa339, mas as que

existem encontram-se sobretudo voltadas para sul/oeste, para o aproveitamento máximo da

luz solar e também próximas do beiral do telhado, defendendo-se mais facilmente das

inclemências do clima. (figura 70) Apenas o piso sobradado de habitação contém janelas. No

piso do curral ou da loja as paredes são cegas, por vezes as únicas aberturas são uns pequenos

postigos, um ou dois, cujo objectivo se prende à circulação de ar no interior.

O alinhamento das janelas numa casa não é muito rigoroso, mas ainda assim é possível

encontrar uma tentativa de simetrização em alguns edifícios. É normal uma janela alinhar-se

com a cumeeira do telhado, em casos onde só existe uma janela na empena do edifício.

(figura 71) Com duas janelas numa fachada, é costume o construtor utilizar uma porta, seja

do rés-do-chão ou do sobradado, como eixo divisor, arrumando então uma janela para cada

lado da porta. Este tipo de organização das aberturas numa fachada acabam por sugerir um

animismo, fazendo lembrar a quem passa uma cara com os seus dois olhos (janelas) e a boca

(porta).

As janelas possuem uma estrutura pobre com uma caixilharia quadriculada de madeira. O seu

sistema de abertura é sobretudo deslizante vertical, também chamado de guilhotina.

Inicialmente, quando as janelas não tinham vidro, eram protegidas por portadas de

madeira.340 (figura 72) À semelhança das portas, as janelas inserem-se na fachada com o

auxílio de ombreiras e lintéis, apesar de serem algumas as casas que dispensam o uso de

ombreiras nas janelas e optam pelo sistema da moldura de madeira. Há ainda um detalhe

interessante, avistado por estas bandas, o qual Mário de Araújo Ribeiro ressalta:

339 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.78 340 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.78

Fig.70 – Janela adjacente ao beiral da cobertura (Covêlo de Paivô)

Fig.71 – Presença de uma janela centrada na empena da casa (Covêlo de Paivô)

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“Mais interessante é o facto de, por debaixo das janelas, que são sempre de

pequena dimensão e com o topo muito perto do tecto, se usar uma enorme pedra

que não só serve de parapeito como forma a própria parede, mais estreita que a

restante, como é de regra em todos os edifícios com paredes de pedra.”341

Estas janelas com a laje do parapeito, chamadas de janela de peitoril, (figura 73) no seu

interior costumam ter bancos de pedra embutidos na própria parede, chamados as

namoradeiras.342

4.1.1.6 Cobertura

Coberturas de duas águas, com pouca inclinação acumeiam grande parte destas casas. As

coberturas de quatro águas são menos incidentes. As mais primitivas são as coberturas de

colmo, que ainda podem ser avistadas em Cabaços, porém em estado avançado de

degradação. A palha de colmo, para não levantar com o vento, é calcada com varas de

madeira em paralelo. (figura 74)

341 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.111 342 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.78

Fig.72 – Janela com portadas de madeira (Cabaços) Fig.73 – Laje do peitoril sob a janela (Rio de Frades)

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As vantagens deste material detinham-se em “dar mais aconchego à casa, não permitindo a

formação de humidade, como actualmente acontece, já que as geadas ou neves se conservam

melhor na telha.”343

Aos poucos estas coberturas vieram a ser substituídas e ao longo da serra o material mais

usado para o seu capeamento é a lousa preta, ou ardósia. Finas lajes irregulares de lousa

agregam-se umas sobre as outras, formando um revestimento semelhante a uma superfície

escamada. (figura 75) As coberturas de telha também se podem encontrar em algumas

localidades, embora sejam mais recentes. Ainda assim, há quem diga que “(…)os telhados de

laje são muito melhor isolante do que a telha, mais quentes de inverno e mais frescos de

verão.”344

Muitas das coberturas são tão básicas que não possuem alguns dos elementos que podem

surgir na arquitectura popular, tais como cumes de telhões, contrafeitos (tábuas que

suavizam a inclinação, junto ao beiral) e guarda-ventos.345 Avistam-se muitas casas onde as

lajes de lousa apenas se encostam entre si, existem também situações em que se usam telhas

para reforçar e revestir os cumes. Vê-se comummente a telha sobrepondo-se à ardósia,

mantendo-a apenas nos seus beirais. (figura 76) Este é um sistema de raízes antigas, como

comprova Mário de Araújo Ribeiro:

“Os cumes dos telhados de lajes eram outrora vedados com torrões ou, em zonas

de granito, com caleiras invertidas dessa pedra, chamadas telhões. Nas

343 SILVA, Filomena; Rio Paiva; Campo das Letras; Arouca; 1999; p.53 344 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.110 345 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.70

Fig.74 – Cobertura de colmo (Cabaços)

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coberturas de ardósia mais recentes, vêem-se com frequência cumes feitos com

telha, que não destoam muito da lousa tradicional.”346

Os contrafeitos e os guarda-ventos não são usados nestes povoados, encontram-se mais na

arquitectura minhota serrana, em que as coberturas são algo mais complexas que estas.347

Existe também uma solução interessante adoptada para reforçar os cumes, e que passa por

ligar as duas águas, no seu topo, com um arame perfurando as lajes, ou no caso da aldeia da

Lomba, são usados grampos de madeira que furam as lajes de um lado ao outro. (figura 77)

346 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.110 347 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.132

Fig.75 – Cobertura em lajes de lousa (Albergaria-da-Serra) Fig.76 – Sobreposição da telha sobre a lousa (Covêlo de Paivô)

Fig.77 - Grampos de madeira unindo a lajes de lousa na cumeeira (Lomba)

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As coberturas são “em todo o lado a parte mais delicada da construção”348 e compõem-se de

estruturas de madeira subjacentes que sustentem os revestimentos. A estrutura consiste

numa cumeeira, uma grossa trave que assenta no eixo da casa, no topo das paredes extremas,

indo de um lado ao outro. Os caibros apoiam-se sobre a cumeeira, pousando nas fachadas

principais, sobre as terças, vigas paralelas à cumeeira encaixadas nas paredes das empenas ao

longo da sua inclinação, e sobre os frechais, vigas colocadas sobre as fachadas principais.

(figura 78) Através deste sistema simples o revestimento apoia-se com segurança. Existe

ainda outras estruturas mais complexas com asnas, formando um sistema de tesouras

triangulares que se vão repetindo ao longo do comprimento da habitação. Este método

permite “repartir a pressão exercida sobre as paredes e combater o efeito de achatamento

que tenderia a derrubá-las”349, porém o primeiro método é o mais encontrado, pela sua

simplicidade de execução.

Fig.78 – Estrutura simples de cobertura em lousa (Cabreiros)

No interior a telha é vã e o fumo escoa por uma abertura ou pelas suas fendas, acentuando a

negrura do interior, por isso as chaminés nestes locais eram desnecessárias. Os sistemas

usados para a abertura das fendas podem ir desde telhas levantadas, ou duas telhas erguidas

e encostadas uma à outra. (figura 79) Nos telhados de colmo as fendas são mais raras.350 No

entanto, Covêlo de Paivô e Cabreiros fogem ligeiramente à regra, pois ao longo dos povoados

vão-se descobrindo grandes chaminés rectangulares, que apesar de ser um tipo de chaminé

associado a casas mais abastadas, destaca a sua posição em casas pobres. (figura 80) A

chaminé é vista como um motivo de vaidade, quanto mais elaborada for. Estas acompanham o

comprimento da empena da casa e à medida que vão subindo, afunilam. A boca da chaminé é

protegida com conjuntos de telhas erguidas e encostadas. Trata-se do mesmo sistema

348 GOURHAN, André Leroi; Evolução e Técnicas. II-O Meio e as Técnicas; Edições 70; 1984; p.191 349 GOURHAN, André Leroi ; Op. cit.; p.192 350 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.120

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utilizado nas fendas dos telhados, anteriormente descrito, mas adaptado a uma utilização

mais laborada. As restantes chaminés que se percebem não serem executadas com mesmo

material da casa, são na realidade mais recentes, tanto como as caleiras e cumes de alumínio

que se vão avistando, às quais os moradores recorrem para melhorar as suas condições de

conforto.

4.1.1.7 Elementos Decorativos

“Nesta arquitectura racional e necessariamente austera, a decoração é contida na maior

parte dos casos”,351 além disso, o granito e o xisto não permitem grandes possibilidades de

motivos decorativos nas casas. Nem todas os possuem, na verdade são poucas as que possuem

algo de relevante. O mais comum são inscrições das datas de construção das casas, por cima

das portas, esculpidas no lintel. É interessante notar que esta situação sobrevém nos locais

onde o granito predomina. De modo especial, em Covêlo de Paivô, a inscrição devia ser uma

prática habitual, e as que se distinguiam pertenciam ao século XIX. (figura 81)

351 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.84

Fig.79 – Telha vã (Covêlo de Paivô) Fig.80 – Chaminé rectangular (Covêlo de Paivô)

Fig.81 – Inscrição ‘A 1894’ gravada em lintel de granito (Covêlo de Paivô)

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Outro elemento decorativo a destacar são umas saliências de pedra, chamadas mísulas,

encastradas na própria parede, ladeando as janelas, encontradas em algumas casas. (figura

82) Conta Filomena Silva que “era sobre estas que se colocavam vasos com sardinheiras e com

uma planta conhecida por «erva de Santa Bárbara» destinada a afugentar as trovoadas.”352

Em Albergaria-da-Serra avistam-se bancos de pedra no exterior da casa, encostados à sua

fachada frontal. (figura 83) Podem ser reconhecidos como componentes decorativos, um de

cada lado da porta, geralmente uma porta de dois batentes em piso térreo. Os bancos de

pedra vêm preencher a lacuna da varanda, usados como uma componente que convida ao

descanso fora de portas.353

352 SILVA, Filomena; Rio Paiva; Campo das Letras; Arouca; 1999; p.55 353 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.246

Fig.82 – Janela ladeado por mísulas (Covêlo de Paivô)

Fig.83 – Bancos em casa, junto à porta do curral (Albergaria-da-Serra)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

89

Aproveitando para esclarecer que a presença de varandas, como elemento decorativo nas

serras confinantes a Entre-Douro-e-Vouga é praticamente nula. As poucas varandas existentes

destacam-se da natureza do edifício, como se de um acréscimo recente se tratassem, até

porque ocorrem em casas que sofreram uma reabilitação. As casas que mantêm o seu estado

natural não fazem uso de varanda. O autor Manuel C. Teixeira refere que “a varanda é

simultaneamente local de comunicação entre todos os compartimentos, zona de estar e de

trabalho, dependência que partilha do espaço interior e simultaneamente aberta ao exterior,

participando da vida da casa e do quinteiro.”354 Certamente por estes motivos não

detectados na arquitectura destes povoamentos, a varanda não encontra razões para existir,

especialmente em casas pobres de pequenas dimensões, o mais económicas possível.

4.1.1.8 Interior

O interior destas casas apresenta alguma precariedade, pois absorve a mesma austeridade e

rudeza do exterior. Relativamente às suas divisórias Mário de Araújo Ribeiro refere o de maior

destaque, a sala-cozinha:

“Dentro da casa, o aposento principal era a sala-cozinha, com certo relevo para a

lareira e espaço circundante e quase sempre sem chaminé ou só com uma

abertura no telhado, adequadamente disposta para a saída (parcial) do fumo.”355

Nestas casas não existem salas independentes, a cozinha é o espaço de excelência da casa. O

elemento que ressalta à vista quando nela se entra é a sua lareira, encostada à parede a meio

desta, com o forno ao lado. (figura 84) A lareira baseia-se numa simples laje de pedra onde a

fogueira é ateada. Algumas lareiras, quando a casa possui chaminé, são compostas também

por uma “saia”356 de pedra, ou tabique, por onde o fumo entra até desembocar na chaminé.

Essa saia assenta em pilares de pedra e pode ter uma prateleira na fronte onde se colocam

utensílios de cozinha. Ainda “por trás da lareira, cavada na parede, fica uma espécie de caixa

alta ou pequeno armário aberto – a borralheira ou cinzeiro – onde se deita a cinza.”357 Esta

borralheira não passa de um vazio quadrangular escavado na própria parede. O forno

geralmente situa-se ao pé da lareira, num canto da casa, e em certas ocasiões, à semelhança

da borralheira também se destaca por uma abertura embutida na própria parede.

Além da cozinha existem os quartos ou alcovas e a casa de banho, ambos compartimentos de

dimensões mais reduzidas e separados da cozinha por um tabique. (figura 85) Nestes últimos a

354 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.84 355 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.112 356 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.43 357 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.42

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

90

telha vã é ocultada por tectos de esteira (tábuas entre 10 a 20 cm de largura encostadas

umas às outras).358

O mobiliário das casas é muito parco, constituído essencialmente por uma mesa, uma

masseira, um comprido banco de madeira esculpido rudemente de um tronco, chamado de

escano, situado junto à lareira. Pode-se encontrar também uma ou outra prateleira de

madeira onde se pousavam as louças.359

4.1.1.9 Espigueiros e Eiras

Após a introdução da cultura do milho no país, por volta do século XVIII, começam a surgir os

espigueiros na arquitectura popular, que se tratam de estruturas apropriadas para armazenar

e secar as espigas de milho.360

Nos povoados serranos, os espigueiros encontrados situam-se próximos uns dos outros,

podendo aglomerar-se ao redor de uma eira. (figura 86) Quando assim o é, uma eira comum a

vários espigueiros, trata-se de um local comunitário. Quando a eira apenas possui um

espigueiro adjacente, logo próximos de uma habitação, é porque se trata de uma eira

privada. A eira é o local usado para malhar o trigo ou o centeio.361 As eiras nos locais

visitados, ao contrário dos espigueiros, escasseiam, pois nem todos os espigueiros são

assistidos de eiras. As que se encontram nestas terras são do mais simples em que uma eira

358 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.74 359 SILVA, Filomena; Rio Paiva; Campo das Letras; Arouca; 1999; p.54 360 SILVA, Filomena; Op. cit.; p.57 361 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.91

Fig.84 - Forno embutido na parede no interior de uma cozinha (Espinheiro)

Fig.85 – Parede divisória de tabique com porta para alcova (Espinheiro)

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pode consistir, simplesmente distinguidas por um pavimento nu em terra batida, por lajes de

pedra ou assentando directamente na rocha virgem do solo. O formato das eiras pode ser

quadrado ou circular.

Os espigueiros, nesta região, são preferencialmente designados de canastros. “No entanto, o

termo também não é exclusivo desta zona: usa-se em toda a região de Terras de Santa Maria

e até mais para sul ou para poente. Penso que é o termo generalizado na zona de Entre-

Douro-e-Vouga e mesmo mais para sul; segundo Orlando Ribeiro, até ao Buçaco.”362

O termo ‘canastro’ deriva do processo de construção da caixa com que a estrutura é

erigida.363 Esta caixa rectangular estreita alonga-se consoante a capacidade de milho que

cada canastro pretende suportar. Avaliando a olho, um canastro pode ir dos 3,5 metros de

comprimento até atingir as dezenas de metros e a sua largura varia entre os 1,30 e 1,50

metros.364 Observa-se que, em eiras comunitárias, o seu comprimento aumenta

consideravelmente, dividindo-se em corpos ou secções.365 Estas divisões interiores podem ser

removíveis.366

A caixa do canastro é, na maioria das situações, acedida por uma porta presente num dos

topos. É coberta com um telhado de duas águas, em placas de xisto ou telha, semelhante ao

das habitações. O material empregue na construção da caixa são ripas de madeira, dispostas

na vertical ou horizontal, que vão sendo espaçadas de alguns centímetros entre si, devido à

necessidade de ventilação. A estrutura costuma ser reforçada com uma moldura granítica,

apesar de nas zonas mais pobres, se optar pela caixa integral de madeira. Consoante o

comprimento do canastro, vão sendo adicionando colunas nas laterais, para reforço

estrutural.

Segundo Manuel C. Teixeira, os canastros para serem funcionais e eficazes obedecem sempre

a duas regras: “(…) assegurar a ventilação para secar o grão e impedir a entrada dos ratos.

Por essa razão, procuram-se para a sua implantação locais privilegiados relativamente à sua

exposição solar e aos ventos.”367

362 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; pp.113-114 363 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.58 364 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.90 365 RIBEIRO, Mário de Araújo; O Maciço da Gralheira. Da Freita ao S. Macário. Um guia com algumas

crónicas; Câmara Municipal de Arouca; Arouca; 1999; p.114 366 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.58 367 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.90

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Fig.86 – Espigueiros comunitários com mais de 3,5 m de comprimento (Rio de Frades)

Na Lomba, em Vale de Cambra, os espigueiros agrupam-se alinhados em duas filas, situados

no ponto alto e ermo da aldeia, junto à capela. (figuras 87 e 88) A localização destes é

privilegiada pelas boas condições de exposição solar e ventilação a que estão sujeitos. Em Rio

de Frades, os espigueiros comunitários situam-se na parte mais alta da localidade. Do mesmo

modo, procura-se elevar a caixa do canastro da superfície do solo, para evitar a humidade do

solo e prevenir a chegada de roedores ao seu interior. Para o efeito, eles dispõem de suportes

que combinam pés - blocos graníticos ou em xisto assentes verticalmente numa soleira – nos

quais se apoia uma mesa ou mó - uma laje vertical do mesmo material.368 É esta a base

responsável pelo suporte da caixa de madeira. Em Rio de Frades observam-se mesas vazias,

sem os seus respectivos canastros, algumas delas apoiadas em muros ladeando o caminho.

Este pormenor deve-se ao facto de alguns canastros se situarem atravessados sobre os

caminhos dos povoamentos. Neste caso em particular, o canastro já tinha desparecido.

Constata-se, à semelhança do apresentado pelo Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal,

sobre estes elementos:

“Assumem assim posições inesperadas, ombreando com as árvores vizinhas e,

enquanto todas as outras construções se aconchegam à terra, estas estreitas e

compridas urnas sobressaem do conjunto.”369

368 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.90 369 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.60

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93

Fig.87 – Espigueiros concentrados próximos á capela (Lomba) Fig.88 – Alinhamento dos espigueiros em fileiras paralelas (Lomba)

Sendo que os canastros são também avistados com imensa frequência na região do Minho,

pode-se dizer que existe uma grande diferença para os espigueiros minhotos e estes canastros

serranos de Entre-Douro-e-Vouga. Essa diferença reside na carência de motivos decorativos e

na rudeza destes últimos. Os minhotos cuidam mais a estética dos seus espigueiros, criando

frontões de granito nas empenas, coroando os seus topos com cruzes, gravando detalhes na

pedra e optando por um aparelho mais cuidado do granito, visto que no Minho todos os

espigueiros combinam o granito com a madeira. Segundo Manuel C. Teixeira:

“É nos espigueiros que a arte do granito alcança maior detalhe e alguma

exuberância.”370

Contrariamente, pelas terras em estudo, não existe tanta preocupação no tratamento, devido

à maior pobreza de recursos. Os frontões de granito não se usam, apenas a madeira que sobe

até atingir a cobertura, e as cruzes também não aparecem.

Neste conjunto de eira-canastro, avistam-se por vezes edifícios de arquitectura elementar,

chamados de casas de eira ou palheiras. (figura 89) As palheiras avistadas são erigidas com o

mesmo material das habitações. Filomena Silva relata-os como “edifícios simples, por vezes

amplos, e com grande arejamento, na medida em que podiam ser utilizados como locais de

seca de alguns produtos, caso das cebolas, dos alhos, ou outros, antes de serem

enrestiados.”371

370 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.90 371 SILVA, Filomena; Rio Paiva; Campo das Letras; Arouca; 1999; p.59

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

94

Na Lomba é interessante observar que na colina destinada aos espigueiros existem, para além

deles e da capela, um conjunto de edifícios térreos, elementares, que se tratam de lojas,

palheiros e até currais. (figura 90) À semelhança dos espigueiros alinham-se lado a lado,

formando no seu conjunto uma espécie de abertura de alas que culmina com a capela no seu

extremo. Sem uma eira presente, esta colina é especialmente reservada ao armazenamento e

tratamento de alfaias agrícolas e animais, mantendo simultaneamente a essência do local de

culto. Por uma questão de crenças, assemelhadas aos minhotos, os frutos do trabalho são

depostos aos cuidados divinos.

Fig.90 – Palheiros/Currais agrupados (Lomba)

4.1.1.10 Influências

Embora o livro Arquitectura Popular em Portugal, introduza a sub-região de Entre-Douro-e-

Vouga na região intitulada ‘Minho’, esta apresenta traços que, apesar de familiares, são bem

Fig.89 – Palheira de xisto próxima dos espigueiros (Rio de Frades)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

95

mais assingelados que a arquitectura minhota serrana, examinando-se pela ausência de

varandas, pela simplificação das coberturas, a modéstia dos canastros e a redução dos

detalhes decorativos.

Segundo a autora Filomena Silva, as habitações tradicionais da bacia do Paiva, enquadram-se

no estilo da arquitectura beirã.372 Por uma verosímil semelhança de conceito entre as

habitações serranas de toda esta sub-região, afectas ao conjunto do Maciço da Gralheira,

poderiam ser todas elas associadas à arquitectura beirã, e não exclusivamente as da bacia do

Paiva.

As características da arquitectura beirã não discordam muito “dos caracteres gerais da casa

nortenha”373. Para Mário Moutinho, a zona beirã interior do país, povoa-se pelo tipo da casa

serrana374, logo é viável admitir que a arquitectura beirã e a arquitectura minhota

desassociam-se numa linha muito ténue, sendo que no seu todo patenteia-se um grande

vínculo entre ambas. Adindo ainda o ponto exposto pelo inquérito à Arquitectura Popular em

Portugal, em que imputa à Zona 3, chamada Beiras, a falta de unidade arquitectónica,375 é

compreensível que existe dificuldade em demarcar fronteiras que apartam a casa minhota da

beirã:

“E a expressão geral dos edifícios é sóbria, rude, máscula, sem subtilezas, nem

grandes grandes voos de imaginação-“376

Na via das particularidades, pode-se distinguir na arquitectura beirã a construção de um

palheiro independente ao lado da casa, de modo mais precário, em alguns casos, um terceiro

piso para armazenamento de produtos agrícolas e também o caiado das molduras das

portas.377 A presença do palheiro como construção contígua é confirmada em certas terras,

com destaque para Albergaria-da-Serra, Cabaços e Lomba, no entanto, ainda não

suficientemente consolidada para se afirmar como um traço predominante da arquitectura de

montanha da sub-região. A utilização de bancos de pedra no exterior junto à porta é também

uma característica repercutida nas Beiras, onde as varandas escasseiam.378 Outro factor

característico de uma região mais restrita das Beiras são as casas térreas de telhados de

colmo. Esta é uma particularidade evidenciada na serra de Montemuro, contígua ao Maciço da

372 SILVA, Filomena; Rio Paiva; Campo das Letras; Arouca; 1999; p.53 373 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.145 374 Ver secção 3.2 – “Arquitectura Popular” 375 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.241 376 AA.VV.; Op. cit.; p.241 377 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.145-146 378 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.246

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

96

Gralheira, e fruto dessa imediação distendeu a sua influência a alguns territórios cercanos,

como é o caso de Cabaços.379

Constata-se que a vertente serrana de Entre-Douro-e-Vouga poderá carecer de algumas

técnicas construtivas, aliadas ao isolamento e pobreza do loca, porém, do outro lado da

moeda, poderá habitar um povo não tão preocupado com certas questões formais,

conformando-se somente com a resposta às necessidades básicas, que confrontam a

agricultura e o repouso. Esta é a mesma premissa pela qual se regiam os povos proto-

históricos, sendo que algumas marcas castrejas ainda são notórias nos povoados serranos. As

paredes arredondadas (figura 91), as coberturas vegetais, em colmo e o aparelho rudimentar

da pedra, no exterior. No interior mantem-se a importância e centralização da lareira,

sempre com a sua base lajeada. Ao redor, no povoado, o chão revestido de lajes de pedra, é

uma herança das vias romanas. Outro motivo que denota influências castrejas do período da

romanização, é a mesa/masseira (figura 92), encontrada em algumas casas. O seu aspecto

assemelha-se muito à mesa romana encontrada no castro de Romariz380, no entanto, talhado

de modo mais grosseiro e com dois pés na vez do colunelo central.

Nem por isso se deve subentender que a modéstia arquitectónica desta zona pressuponha uma

menor evolução. A evolução existe de facto, verificada como a adaptação das características

proto-históricas e romanas às exigências das vivências destes povoamentos de montanha.

Fig.91 – Parede arredondada (Covêlo de Paivô) Fig.92 – Mesa/masseira encontrada numa cozinha (Espinheiro)

379 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos

Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.245 380 Ver subsecção 2.2.2 - Romanização

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

97

4.1.2 A Casa de Santa Maria da Feira, São João da Madeira e Oliveira de

Azeméis

Descendo da faixa interior serrana de Entre-Douro-e-Vouga para o território de vale a poente,

deparam-se estes três concelhos que, como acima já se pode concluir, por vários factores,

inserem-se no mesmo padrão de áreas urbanizadas consolidadas com o meio rural.

Em Santa Maria da Feira observam-se os casos particulares das freguesias de Guisande,

Romariz e Louredo, três freguesias da nascente do concelho, que ainda não foram afectadas

pelo acrescido desenvolvimento urbanístico vivido a poente.

Em Oliveira de Azeméis analisam-se as freguesias de Fajões (lugares de S. Mamede e S.

Martinho) e Carregosa (lugares de Azagães e Marvila). (Figura 93) Estas terras contêm

pequenos lugares irradiados pela malha verde dos campos e incultos, onde ainda é possível

avistarem-se casas antigas de lavoura por entre o casario adulterado.

O concelho de S. João da Madeira, o de menor em extensão geográfica do país381, trata-se

actualmente de um centro urbano, homogéneo e sólido. O crescente progresso cobriu

qualquer vestígio de uma precedente ruralidade. Porém, considerando que S. João da Madeira

foi parte de Oliveira de Azeméis até princípios do século XX382, este último concelho contém a

informação necessária para deslindar a arquitectura sanjoanense mais obsoleta.

Fig.93 – Localização dos locais em análise

381 Ver subsecção 2.3.1 – “Concelhos Integrantes – Síntese” - ponto 2.3.1.3 – “São João da Madeira” 382 Ver subsecção 2.3.1 - “Concelhos Integrantes – Síntese” - ponto 2.3.1.3 - “São João da Madeira”

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4.1.2.1 O Povoado

São estas terras de planalto, já fora do domínio das montanhas, povoamentos assinalados pela

disseminação do casario, com algumas semelhanças aos povoados de vale minhotos, contudo,

numa sub-região como Entre-Douro-e-Vouga, que admite a transição da região minhota para a

beirã, a dispersão descortinada a norte evidencia-se a uma escala menor, para dar lugar à

organização beirã litoral, onde o casario se alinha ao longo das vias de comunicação. Nada

que não tenha sido anteriormente esclarecido.383

As terras dispostas como casos de estudo são locais algo pobres, analogamente à sede do seus

concelhos, que ainda se esforçam para manter o seu elo com a agricultura e outras tradições

populares. Estas populações também sofrem com o êxodo rural, todavia em menor escala que

os povos serranos. Os seus familiares tendem a aproximar-se dos centros urbanos, optando

por fixar lá residência. Desta forma, a nova construção civil é parca por estes lugares, ainda

assim o difícil é encontrar a pureza das raízes tradicionais e não propriamente os frutos da

modernidade. E se por um lado estas terras vão sofrendo de uma paulatina incúria e

indiferença, por outro, as directrizes populares que as definem não se vêem derrubadas pelo

preço da evolução, apenas abandonadas, degenerando com o passar dos anos.

À semelhança dos povoamentos de montanha destacados anteriormente, avistam-se inúmeros

minifúndios, cultivados de batatas e milho, espalhados por toda a parte. A paisagem é

verdejante, alternando a horizontalidade das terras, com a verticalidade das árvores do

mato, sobretudo o pinheiro bravo.

Um contraponto com os povoados serranos é a heterogeneidade do casario. (figura 94) Por

aqui não existe um estilo único, repetido de casa em casa. Não se podem definir

simplesmente como aldeias de xisto ou aldeias de granito. Há uma profusão de soluções

arquitectónicas que, embora aparentadas, dificultam a tarefa de formalizar uma definição

abrangente. As edificações que surgem vão desde casas de lavoura do século XIX, até às mais

contemporâneas, contudo, a grande maioria tratam-se de casas datadas de meados do século

XX.

383 Ver subsecção 3.1.2 - “Síntese Descritiva dos Tipos de Habitação Popular”.- ponto 3.1.2.2 – “Casa

serrana”

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4.1.2.2 Acessibilidades

As ruas são de fácil acesso, com largura suficiente para a circulação automóvel. Ao contrário

da montanha, por aqui não existem os caminhos de terra, que outrora eram numerosos. Todas

as vias estão alcatroadas, raros os casos revestem-se de calçada. Este é outro dos principais

contrapontos com a serra, onde a presença de asfalto é uma raridade, e seria talvez uma

preciosidade para as populações isoladas.

As habitações de interesse, as mais antigas, não possuem um núcleo de inserção, pois tal

como os povoamentos disseminados do Minho fazem ver, elas surgem em pontos aleatórios da

freguesia, ou lugar, numa penetrante afinidade com os terrenos de cultivo. Por disporem de

mais espaço na sua envolvente, ao contrário das casas serranas, estas não costumam

comunicar directamente com a rua. Têm a oportunidade de proverem de um quinteiro, no

qual se entra por uma larga porta de dois batentes, a chamada porta carral.384 “Por vezes,

este portal abria-se na fachada da casa construída à face da rua, acedendo-se ao quinteiro

situado nas traseiras através de uma passagem por baixo do piso sobradado.”385 (figura 95) Ou

como alternativa, a porta carral rasga altos muros, encimada por um pequeno telheiro de

duas águas (figura 96) e sem passar sob o piso sobradado alcançava directamente o quinteiro.

384 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.46 385 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.46

Fig.94 – Disposição do casario entre campos e incultos (Guisande)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

100

Uma vez dentro do quinteiro poderá aceder-se ao interior da casa pelas escadarias que

conectam ao andar da habitação. Encostadas ou perpendiculares à fachada, elas culminam

num patamar simples, quadrangular, protegido, ou não, por uma guarda de pedra ou por

grades de ferro. (figura 97) Em algumas situações encontram-se escadarias na empena ou na

fachada frontal, encostadas à parede. (figura 98)

Esta situação não implica que não exista um quinteiro, mas pode significar que o acesso ao

quinteiro não é feito directamente por uma porta carral, antes contornando a casa, visto que

algumas vezes as portas carrais abrem directas para a loja, não comunicando com o quinteiro.

Quando sucedem estes casos, os quinteiros, por norma, não se encontram cercados de

independências, sendo que podem ser meramente utilizados como simples hortas.

Fig.95 – Acesso ao quinteiro pela porta carral transpondo um coberto (Fajões)

Fig.96 – Porta carral encimada por telheiro (Carregosa)

Fig.97 – Escadas acedidas por quinteiro (Carregosa) Fig.98 – Escadas na empena do casa (Carregosa)

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101

A regra do quinteiro não é geral, nem obrigatória, mas nas casas de maiores dimensões tem

sempre um ponto de destaque.

4.1.2.3 Estrutura

As casas de vale seguem igualmente a regra do modelo arquitectónico das casas de andar e de

planta rectangular alongada.386 Novamente o piso de rés-do-chão destinado a currais e o

andar sobradado para habitação. As casas serranas obedecem encontram-se nesta matriz,

logicamente, porém mais modestas e básicas. A casa das terras baixas, ou casa de vale, é

guarnecida de um quinteiro e a existência deste vazio, complementar da propriedade

privada, propícia a criação de mais espaços anexos. Assim o quinteiro sustenta ao seu redor

outros compartimentos dependentes da habitação que se distinguem pelas diferentes

finalidades propostas. (figura 99) Partilham da mesma utilidade do piso de rés-do-chão,

podendo conter outros currais, nesta zona designados de aidos, palheiros, adegas, lojas de

arrumos das alfaias e instrumentos agrícolas, entre outros. Nestas situações, com a existência

destes anexos, o rés-do-chão nem sempre é utilizado como cortes de gado. Esta solução era

preferencialmente adoptada para o aproveitamento do calor emanado pelos animais, para o

aquecimento do piso superior.387

A casa térrea erigida nesta zona, quando não possui dependências anexas, assimila-se à casa

térrea serrana, ou seja, assinala a pobreza maior das famílias que não detêm propriedades.

Embora muitas famílias destas terras sejam consideradas economicamente carecidas,

sobrevivem à custa dos produtos que cultivam e dos animais que criam. Além dos campos,

ainda trabalham pequenas ou médias hortas dentro dos limites das suas casas (figura 100),

pois os campos nem sempre eram contíguos à habitação. As famílias serranas não usufruem de

386 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.42 387 TEIXEIRA, Manuel C.; Op. cit.; p.46

Fig.99 – Dependências da casa em redor do quinteiro (Guisande)

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102

hortas em terreno privado, nem têm a mesma proximidade dos centros urbanos que uma

povoação de vale. A pobreza vivida em povoados solitários das serranias agrava-se,

analogamente às terras baixas. Como reflexo dessa evidência, a casa de uma família de

poucas posses, nas terras de povoamento disperso, possui maiores dimensões e melhores

condições que um pobre lar de montanha. Não são famílias ricas, mas com um nível de vida

satisfatório para contraporem nitidamente as dimensões e condições das suas casas com as

famílias serranas. Nas terras baixas encontra-se “sem meio termo: ou estes discretos abrigos

ou as arquitecturas monumentais.”388

Por fim os habitáculos das famílias mais abastadas, proprietárias de abundantes terrenos,

entendem-se como arquitectura erudita. Na visão de Manuel C. Teixeira:

“(…) podemos caracterizar a arquitectura erudita como sendo aquela que

resultou de um maior investimento de material, em que havia a possibilidade de

recorrer a especialistas ou a pedreiros mais hábeis (…).”389

4.1.2.4 Paredes e Pavimento

As soluções apresentadas para resolver a elevação das paredes diversificam-se nestes

povoados. Em todas as freguesias vários modelos ganham vida com a aplicação de técnicas

mais elaboradas do que nas serras. Por lá, um lugarejo assente num afloramento xistoso,

usufruía exclusivamente do xisto, por exemplo. Nestas terras baixas o xisto desaparece,

restrito apenas para a serra. A alvenaria de pedras toscas, de dimensões irregulares é

388 AA.VV.;Arquitectura Popular em Portugal; volume 1; Edição Sindicato Nacional dos Arquitectos/Ordem dos Arquitectos Portugueses; Lisboa; 1961; p.72 389 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.106

Fig.100 – Hortas que servem a casa contíguas ao quinteiro (Romariz)

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103

mormente empregue até ao século XX, neste tipo de construções.390 (figura 101) Em oposição

às casas serranas, de pedra seca391 (sem ligação de argamassa), a junção dos blocos é

reforçada por uma argamassa de cal e areia.392 A parede possui duas fiadas de alvenaria,

preenchidas no seu interstício por material granuloso de pequenas dimensões. Para garantir a

firmeza da parede, utilizam-se perpianhos, ligadores de pedra ou madeira, que cumprem toda

a espessura da parede.393 Devido a este sistema construtivo as paredes ficam com uma

espessura entre os 0,30 e os 0,40 metros. Frequentemente revestidas de reboco, elaborado

em saibro e cal, as casas de vale optam por não deixar a pedra a descoberto. Nas habitações

mais abastadas alguma pintura cobria o reboco. (figura 102) Actualmente encontram-se

parcos vestígios da sua presença, pois a demão de tinta veio-se deteriorando com o passar dos

anos.

Fig.101 – Paredes em pedra tosca à vista (Fajões)

Fig.102 – Paredes rebocadas com pintura (Romariz)

O pavimento destas habitações utiliza a regra serrana. O piso sobradado é assoalhado

frequentemente em solho ripado. Nas cozinhas, o soalho dá a vez à pedra, em blocos ou laje,

no local destinado à lareira, similar à casa serrana. (figuras 103 e 104) Este soalho apoia-se

em vigas de madeira que se inserem em cavidades aprofundadas na própria parede. Em

algumas situações também podem suportar-se em frechais, vigas maiores de madeira

encostadas à parede e encastradas nestes, circundando todo o perímetro.

390 http://www.civil.ist.utl.pt/~joaof/ad/05%20-%20Alvenaria%20de%20pedra-patologia%20e%20Inspec%C3%A7%C3%A3o%20-%20PB.pdf ;p.18 (consultado a 19-07-2014, às 20:40h) 391 Idem; p.19 (consultado a 19-07-2014, às 20:40h) 392 Ibidem; p.17 (consultado a 19-07-2014, às 20:40h) 393 Ibidem; p.17 (consultado a 19-07-2014, às 20:40h)

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104

Fig.103 – Pavimento com laje de pedra (Guisande) Fig.104 – Estrutura de pavimento assoalhado, visto de uma adega

(Guisande)

Os compartimentos inferiores, onde residem as lojas e os aidos, mantêm-se em terra batida,

do mesmo modo que o quinteiro.394 (figura 105)

4.1.2.5 Portas e Janelas

As aberturas de janelas nas fachadas das casas das terras baixas são mais numerosas que as da

serra. Na serra elas procuram localizar-se nas fachadas principais, voltadas para a rua, e

também nas mais beneficiadas pela exposição solar, caso estas não sejam as principais. É

normal encontrar paredes sem qualquer tipo de abertura, usualmente as empenas do edifício.

Em terras baixas todas as fachadas são aproveitadas. Existe maior afastamento entre

394 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.74

Fig. 105 – Piso da adega em terra batida (Guisande)

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105

edifícios, para além de que o terreno não apresenta fortes declives, havendo mais planura, e

estes são motivos que reforçam a probabilidade da incidência solar se verificar com mais

homogeneidade nas diversas orientações das casas.

A porta principal da habitação, e frequentemente a única, continua a ser a porta de madeira

que acede à cozinha. Além desta existem os largos portais de madeira chapeada, de dois

batentes, comunicando com as lojas e currais. (figura 106) As casas possuem algumas

dependências, os compartimentos anexos não se resumem apenas ao rés-do-chão, logo é

natural que cada dependência possua a sua própria porta, algumas de um só batente,

conforme a função que desempenhe.

Fig.106 - Portas com acesso a lojas na fachada frontal da casa

(Carregosa)

O sistema construtivo de portas e janelas é exactamente o mesmo empregue nos povoados de

montanha. Porém, sendo estes últimos mais escassos de recursos, nomeadamente a pedra,

recorriam inúmeras vezes ao uso de barrotes de madeira, ou tábuas, para a contenção e

reforço das ombreiras e lintéis. Nos povoados de vale a madeira é muito pouco avistada a

desempenhar esta função, sendo que a estrutura, na íntegra, é preferencialmente de pedra.

Em várias casas, as ombreiras e os lintéis que abrem o vão das aberturas (portas e janelas),

concretizam-se em blocos de pedra bem aparelhada. A moldura do vão, quando tem este

tratamento cuidado, destaca-se do reboco. (figura 107) Quando se tratam das portas

principais da habitação, o cuidado na imagem é maior, visto que as portas dos edifícios

anexos não detêm a mesma importância, sendo que as ombreiras e lintéis usam as pedras

mais toscas, rebocadas ou não. As habitações mais pobres, com a pedra à vista, utilizam

vários blocos de dimensões irregulares, à semelhança das serranas, tentando compor soluções

delicadas como o exemplo abaixo exposto, onde um arco em pequenos blocos de pedra coroa

o vão de entrada da porta carral. (figura 108)

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106

Outra diferença em relação às casas serranas, aponta para a localização da janela, com maior

intervalo da cobertura e de maiores dimensões e ainda para a ausência do grande singular

bloco granítico empenhado como peitoril. Contudo este pormenor é relembrado numa ou

outra situação em que o edifício, passando por um processo de reabilitação no qual a

dimensão ou o posicionamento da janela são alterados, acaba por evocar o peitoril da janela,

delineado numa esquadria de pedra cuidadosamente executada. (figura 109) No âmago da

questão, o modo de operação na abertura dos vãos partilha, ainda assim, das normas

construtivas genéricas das singelas casas da serrania. As habitações mais abastadas tendem a

esmerar o entalhamento da moldura das suas janelas, rebuscando detalhes no granito, ou em

alguns casos, revestindo-a de azulejos cerâmicos. (figura 110) O estilo de abertura da janela

continua em guilhotina ou em dois batentes, com caixilharia e portadas de madeira. Os

postigos abrem-se nos pisos inferiores para permitirem a entrada de ar nos aidos e lojas.

FIg.107 – Porta com moldura granítica sobressaindo em parede rebocada (Carregosa)

Fig.108 – Moldura em blocos de pedra irregular, encimada por arco (Carregosa)

Fig.109 – Janela com moldura imitando peitoril (Fajões)

Fig.110 – Molduras revestidas em cerâmica (Guisande)

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107

Observa-se um enquadramento mais regulado das aberturas na fachada. (figura 111) As

janelas alinham-se de modo mais organizado e sem muita variação nos seus tamanhos,

característica poucas vezes avistada nos povoamentos serranos, onde a desmesura era bem

comum.

4.1.2.6 Cobertura

As coberturas repartem o protagonismo entre duas e quatro águas. As coberturas de duas

águas revelam-se sobretudo em casas mais pequenas, quase elementares, sendo que todas as

outras casas optam pela cobertura de quatro águas, com uma inclinação ligeiramente mais

acentuada, comparativamente às serranas. As lâminas de xisto e as coberturas de colmo não

se empregam em terras baixas e apenas a telha de canudo ou a telha de marselha, posterior à

de canudo, são responsáveis pelo revestimento do telhado. (figura 112) A utilização de

materiais cerâmicos em coberturas é um costume que remonta ao tempo dos romanos395, já

observado na domus do castro de Romariz. A telha de canudo sempre foi a preferida para

soluções tradicionais devido à facilidade em ser produzida manualmente e sem grandes

exigências de qualidade do barro.396 “São montadas em filas de canais longitudinais com

juntas simplesmente sobrepostas, sem que haja um travamento lateral eficaz, o que origina

uma má estanquicidade em coberturas pouco inclinadas.”397

Actualmente, com as reformas constantes às coberturas, a telha de aba e canudo, conhecida

por telha lusa, é a solução mais optada.398 A cobertura de telha, quer em canudo ou em telha

marselha, permitia soluções mais eficazes do que as propostas nos povoados da serra. Lá,

395 http://home.fa.utl.pt/~lcaldas/Telha1.pdf; p.1 (consultado a 20-07-2014, às 20:27h) 396 Idem; p.7 (consultado a 20-07-2014, às 20:27h) 397 Ibidem; p.7 (consultado a 20-07-2014, às 20:27h) 398 Ibidem; p.8 (consultado a 20-07-2014, às 20:27h)

Fig.111 – Alinhamento regular e simétrico de janelas e postigos (Carregosa)

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108

onde as cumeeiras e os beirais eram suprimidos pela simplicidade extrema da ardósia, apenas

em casos de serventia da telha eram preenchidas estas lacunas. Nos telhados em canudo ou

executam-se os beirais com telhas em menor inclinação, podendo ser usada também a técnica

da aplicação da telha no sentido oposto às restantes. Alguns telhados em telha de marselha

optam pela telha de canudo para a execução dos beirais. Encontram-se beirais das empenas e

cumeeiras delineadas com a sobreposição de canudos ligados com argamassa (figura 113),

visto que “a aplicação de argamassas nas telhas aumenta a sua estanquicidade mas também

aumenta o peso total do telhado e dificulta a sua substituição.”399

A estrutura de madeira subjacente ao telhado segue os mesmos preceitos das casas serranas,

elegendo o método simples dos caibros, terças e vigas, apoiados na cumeeira e encastrados

nas paredes, ou o método das asnas, chamado sistema de tesouras.400

As chaminés existem nas coberturas das terras baixas, delgadas e quadrangulares ou

rectangulares, da largura da casa e afunilando até ao topo (figura 114 e 115), sendo estas

últimas as mais antigas. Estas iniciam no interior da cozinha, sobre o espaço destinado à

lareira, com um largo saial que se prolonga pelas paredes até atingir o cume. Sobre a

chaminé Ernesto Veiga de Oliveira revela:

“A chaminé pequena, estreita e alta parece, por toda a parte, ser de introdução

recente (…).”401

A boca da chaminé, nas serranias, protegida com conjuntos de telhas erguidas e encostadas,

passa a funcionar por intermédio de aberturas laterais no topo da chaminé. Quando assim não

399 http://home.fa.utl.pt/~lcaldas/Telha1.pdf; p.1 (consultado a 20-07-2014, às 20:27h) 400 Ver subsecção 4.1.1 – “A Casa de Arouca e de Vale de Cambra” - ponto 4.1.1.6 – “Cobertura” 401 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.35

Fig.112 – Cobertura em telha de canudo (Romariz) Fig.113 – Cobertura de telha de marselha

com beirais de telha de canudo (Fajões)

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109

se verifica, é normalmente protegida com o mesmo processo da cobertura, um pequeno

tejadilho de duas águas. A telha vã rareia e praticamente já não se avista.

4.1.2.7 Elementos Decorativos

Em casas como estas os elementos decorativos não têm visível destaque. Prendem-se a

pequenas detalhes que não vemos na serra, enquanto outros são repetidos ou adaptados,

como mísulas aprimoradas e até bancos e canteiros adunados à fachada.

Nas paredes, fachadas lisas rebocadas, a pintura é um primor que quando empregue,

geralmente em branco, colore os rodapés da casa e as molduras dos vãos de uma cor

diferente. (figura 116) Ernesto Veiga de Oliveira acrescenta a este facto, alegando que “é

frequente mostrarem um rodapé de cor, geralmente cinzento, e cunhais, e beirais e

guarnições de portas e janelas de cantaria, perpianho ou alvenaria.”402

Este hábito de caiar molduras já é visto nos povoados serranos, quando a moldura das portas

é caiada para contrastar do material da casa. Eis a prova que nas terras baixas, este ensejo

decorativo é levado mais avante, por famílias com mais meios de subsistência. Ainda assim,

considera-se aqui a pintura como uma opção decorativa, pois nem todas as casas escolhem

colorir o seu reboco. Curiosamente, voltando às cercanias da serra, a única casa rebocada e

ornada com motivos pintados de azul, formando um padrão que imitava azulejaria na fachada

frontal, era precisamente a residência mais abonada do local, certamente pertencente a uma

família bem influente. (figura 117)

402 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.31

Fig.114 – Chaminé afunilada (Fajões) Fig.115 – Chaminé afunilada (Louredo)

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110

Fig.116 – Casa de rodapé pintado sobre parede caiada (Carregosa)

Fig.117 – Casa com pinturas padronizadas sobre reboco (Covêlo de Paivô)

Os frisos de cornijas, os beirais e cunhais abrilhantam a fachada (figura 118), ainda que de

modo discreto, transportando reminiscências neoclássicas para o rústico das aldeias, ainda

que não seja um fausto para todas as famílias, somente para as mais influentes. É uma arte

que implica um fino lavramento da pedra de granito e aplica-se em outros motivos

decorativos que embelezam as molduras das portas, com guarnições floreadas, inscrições e

símbolos. (figura 119)

Fig.118 – Friso de cornija na esquina de casa (Fajões) FIg.119 – Porta carral com motivos

floreados esculpidos em granito (Guisande)

Os telhados também podem ser motivo de decoro com o acréscimo de pináculos nos seus

cumes, tal como nas chaminés e até mesmo pequenos detalhes pintados nos seus beirais.

(figura 120 e 121)

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111

As varandas mais uma vez não são usuais, a não ser nas casas de arquitectura erudita. Em

habitações de lavradores abonados, abriam-se pequenos varandins em sacada, protegidos por

grades de ferro. (figura 122) Estas grades quer em varandas, quer em escadarias, são um luxo

repletas de motivos.

O adorno do edifício também pode ser concretizado por intermédio de vegetação.

Usualmente encontram-se plantas trepadeiras, por exemplo as heras, revestindo parte da

fachada. Porém a sua utilização não se baseia somente a fins estéticos, mas também

contribui para amenizar a temperatura do edifício.

Fig.120 – Pináculos em telhado (Guisande)

Fig.121 – Detalhes pintados nas telhas do beiral (Fajões)

Fig.122 – Varanda de sacada em casa de lavoura abastada (Guisande)

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112

4.1.2.8 Interior

A simplicidade reflectida no aspecto exterior do edifício é um eco do que as suas quatro

paredes encerram. Observa-se que o interior da casa serrana canaliza o núcleo do habitar

para a cozinha, o maior e mais importante cómodo da casa. Em terras de vale, a importância

da cozinha permanece activa, embora deixe de ser o compartimento de excelência da casa

legando o seu desempenho à sala, que surge assim com o objectivo de reunir a família em

ocasiões cerimoniais. Possui dimensões menores que a cozinha, pois não se mantém

constantemente ocupada. Mesmo sendo de uso esporádico, foi criada e mantida, até aos dias

actuais, como o cartão-de-visita da casa, destacando-se então como um local arrojado, onde

o melhor mobiliário é exposto. Em alguns casos, especialmente quando a casa é térrea, a sala

costuma possuir uma porta que a conecta ao exterior.403

As cozinhas pouco variam do exemplo da serra. Adoptam o mesmo negrume interior e

conferem a mesma primazia à lareira. Mais uma vez é um elemento central, onde a sua base

revestida em laje de pedra deixa facilmente a função. No perímetro da laje levanta-se uma

saia, ou campana, edificada em tabique ou pedra, que se abre na largura total da chaminé,

suportada por um barrote de madeira de percorria todo o comprimento da cozinha, acabando

normalmente encastrado na parede, ou apoiado em pilares. Nas casas de montanha, a saia

não tem uma utilização costumeira, devido à quase inexistência de chaminé. Pelo contrário,

nas terras baixas elas sempre têm evidência. O forno mantém as premissas da casa serrana,

tal como o restante mobiliário.“Os fornos mais antigos eram feitos de pedra, revestidos a

barro, sendo mais recentemente construídos inteiramente de barro ou de tijolo.”404

Estas habitações controlam a organização dos vários cómodos com a mediação de um espaço

nulo ou corredor, nas casas mais antigas em formato quadrangular. Assim utilizam-se portas

interiores, algo que na serra era evitado, precisamente pela ligação directa da cozinha às

alcovas. Sucede que as casas mais simples, próximas da elementaridade, permanecem nas

normas encontradas nas casas de montanha. Quanto mais abonada a habitação, mais aumenta

o número de cómodos. As divisórias mantêm-se em tabique, revestidas de gesso e cal.

Existe uma repartição da habitação que em alguns casos era deslocada para fora do núcleo

habitacional, passando a ter lugar num pequeno cubículo nas traseiras, ou quinteiro, da casa.

Refere-se à casa de banho (figura 123 e 124), que mais não era do que uma escura cabina

com uma caixa de madeira a um canto, onde se abria um orifício que ligava directamente ao

depósito de águas residuais, a chamada fossa. Nas figuras abaixo observadas, denota-se que o

403 De relembrar que as habitações com varanda não são muito usuais. A varanda, servindo também

como conexão entre alguns compartimentos, por exemplo, sala e cozinha, o que implica que cozinha e sala possuam porta. Com a ausência de varanda, o acesso à sala passa a ser feito por intermédio da cozinha. 404 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de

Valdevez; 2013; p.47

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113

cubículo foi executado em tijolo de barro, mas apenas neste caso, visto tratar-se de um

acréscimo feito pelo proprietário numa ocasião em que o antigo cubículo tinha sido demolido.

Quando existia a desvinculação da casa de banho em relação à habitação, devia-se

principalmente à rápida conexão com a fossa e assim também uma forma de afastar um local

considerado menos decoroso da restante residência.

Fig.123 – Cubículo de casa-de-banho no exterior, inserido no quinteiro junto às lojas (Guisande)

Fig.124 – Caixa em madeira que faz de sanita

4.1.2.9 Espigueiros e Eiras

Tomando como influência os espigueiros minhotos, as terras baixas são algo mais arrojadas na

construção destes celeiros e, embora não chegue a reproduzir na íntegra a mestria minhota, o

certo é que se destaca pela diversidade formal dos seus canastros.

Na serra, tal como o povoado aglomerado, também os canastros comunitários se aglomeravam

num local específico e alto. No povoamento disperso, casa habitação tem o seu próprio

canastro, sendo este de uso privado, e com efeito, o comprimento da caixa diminui face aos

serranos. Cada lar constrói o canastro a seu próprio gosto, adaptando-o ao espaço e

conferindo-lhe a forma e o material preferentes, ou convenientes.

Relativamente à forma, existem canastros rectangulares, de duas águas, como existem

também os canastros quadrangulares de quatro águas. (figuras 125) Os seus apoios podem ser

em pilares, mas também é frequente o apoio numa caixa de pedra maciça. Esta última é a

mais comum por terras de Entre-Douro-e-Vouga. A caixa de pedra pode englobar mais

material, mas a construção e os acabamentos são bem mais práticos do que o sistema de

pilares. O objectivo de afastar o canastro da humidade do solo e da invasão dos roedores,

continua bem-sucedido. Em canastros mais ricos, abrem-se na base de pedra orifícios

quadrangulares, cuja função é permitir a saída das espigas directamente para a eira, aquando

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114

da época da malha do milho. Outros canastros que se anexam a alguma loja ou palheiro,

estão providas de uma porta ao centro da base de pedra, que faz o acesso a esse espaço.

A construção da estrutura dos canastros coaduna madeira e granito. Os casos cuja caixa se

concretiza na totalidade em madeira, são encontrados apenas nos pobres povoados serranos.

Nas terras baixas, os esteios de granito sustentam as esquinas e o restante revestimento pode

ser, quer em ripado de madeira, quer em tijolo de burro, alinhado de modo a permitir frestas

para a circulação do ar.

Fig.125 – Espigueiro rectangular sobre caixa de pedra (Fajões)

Fig.126 – Espigueiro quadrangular sobre pilares de granito (Guisande)

E se os canastros serranos revelam uma rara ornamentação, estes das terras baixas

aproximam-se mais do ideal espigueiro minhoto, que neste caso, “para além dos elementos

arquitectónicos que caracterizam o espigueiro, este é frequentemente encimado por algum

elemento de adorno, na maioria das vezes uma cruz, pretendendo-se assim abençoar o milho

que se irá transformar (…).”405

A cruz não tem tanta visibilidade nestas terras, mas na sua substituição adornam-se os

telhados dos canastros com pináculos e também andorinhas de barro cozido.

As eiras são na sua maioria em terra batida ou de lajes de pedra, de formato quadrangular,

ladeadas por pequenos muretes de pedra. Todavia, o desenvolvimento das técnicas

construtivas, deu azo a que muitas delas se revestissem de cimento, permitindo uma

superfície mais regular e sadia. As eiras emparelham com o canastro, integrando-se no

complexo do quinteiro, ou então retiradas deste, noutro ponto do edifício, consoante as

condições que a sua situação deve proporcionar: boa ventilação e exposição solar. (figura

127)

405 http://www.folclore-online.com/textos/carlos_gomes/espigueiros2.html (consultado a 19-08-2014;

às 14:55h)

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115

Fig.127 – Eira particular complementada com espigueiro (Louredo)

4.1.2.10 Influências

Já desde os tempos proto-históricos, estas terras eram escolhidas para a implantação de

povoados castrejos e deles provém grande herança construtiva, passando pelos resquícios

romanos, transportados para os telhados, para a os pavimentos lajeados e para os rebocos e

caiados. Várias são as influências repescadas na história, mas também na arquitectura

produzida ao longo do país surgiam técnicas e costumes que se poderiam adaptar a diferentes

locais, desde que e os recursos assim o permitissem.

De acordo com uma animação criada pelo jornal Expresso no ano 2009406, relativa à Casa

Tradicional Portuguesa, um gráfico é exposto no qual, enveredando pela opção ‘Norte’, se

distinguem três regiões: Minho, Trás-os-Montes e Beiras. Clicando na opção Beiras, o

interessado depara-se com um pequeno grafismo que demonstra a súmula da casa beirã. Do

que se sabe até ao momento, uma casa de dois pisos, o inferior para as cortes de gado e o

superior para habitação do homem; uma cobertura de duas águas em telha vã; paredes

graníticas; escadaria na frontaria, entre outros atributos. Nada de novo, apenas um consolidar

dos apanágios mais testemunhados na região das Beiras, visto que existem variantes deste

modelo espalhadas por todo o território. Ciente desta certeza, o gráfico progride e exibe

quatro sub-regiões específicas inteiradas na região. Delimitadas dentro de um perímetro

encarnado, existe a sub-região de Entre-Douro-e-Vouga, alargando-se além dos seus limites

naturais, porém inserida na circunscrição, que, note-se, demarca como ponto geográfico de

selecção Arouca. (figura 128) O modelo de casa instantaneamente exposto é a ‘Casa de

406 http://expresso.sapo.pt/casas_tradicionais_portuguesas=f501518 (consultado a 24-07-2014; às

10:19h)

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lavoura’ (figura 129), a qual contém a seguinte inscrição: “Construção em granito e telhado

de quatro águas. Arrumações no piso térreo.”407

Fig.129 – Grafismo da Casa de lavoura, Jornal Expresso

Embora se trate de uma singela síntese generalista, não deixa de ser oportuna a sugestão ao

telhado de quatro águas, de claro predomínio minhoto408, que acaba por contrariar as duas

águas da arquitectura beirã. Outro atributo desenhado na imagem, e que não parecendo

despropositado, vem confirmar a pesquisa concretizada no terreno de estudo, é uma

chaminé. Este elemento não consta na típica arquitectura do norte do país, mesmo assim é

avistada regularmente pelas paragens de Entre-Douro-e-Vouga. As chaminés são elementos

transmitidos pelas terras a norte do Douro, onde elas adquirem grande vulto devido à

presença de casas rurais enriquecidas. Não tendo uma origem ancestral, no norte a chaminé

407 http://expresso.sapo.pt/casas_tradicionais_portuguesas=f501518 (consultado a 24-07-2014; às 10:19h) 408 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações

Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.33

Fig.128 – Demarcação a negrito sobre Entre-Douro-e-Vouga, denominada por Arouca, Jornal Expresso

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117

era sinónimo de fortuna.409 Ernesto Veiga de Oliveira menciona casas de características

peculiares, cujas chaminés fazem parte do rol:

“Tal é o caso da zona situada da Maia para o interior, por exemplo, onde a

chaminé ora estreitece para o alto, acima do cume do telhado (Paços de

Ferreira, Penafiel, etc.), ora se mantém sempre da mesma largura, ocupando

toda ou grande parte daquela parede, (…). Estas chaminés grandes são

especialmente notáveis na zona litoral minhota, nos concelhos de Esposende,

Barcelos e Viana do Castelo (…).”410

Daqui chega a inspiração para as chaminés, que cruza o Douro, chegando à sua margem sul e

alastrando-se por Entre-Douro-e-Vouga. Todavia, constatou-se anteriormente que a chaminé é

marcante no sul do país, desde as ostensivas chaminés esguias algarvias, até às largas e

rectangulares alentejanas, estas últimas mais próximas do modelo em estudo:411

“A chaminé alentejana primitiva parece ter sido em tronco de pirâmide

quadrangular, semelhante à forma minhota (…).”412

Uma das funções da chaminé alentejana era a entrada de ar para refrescar o interior, daí a

sua extensa largura.413 No norte, esse desígnio não é o principal, vem antes a vontade de

escoar o fumo, permitindo maior limpeza na cozinha e, um nítido desejo exibicionista, arcado

apenas por habitações capazes de financia-los.

A casa de lavoura é, no final de contas, aquela que, ainda influenciada pelas Beiras, pisa o

limiar dos modelos minhotos, mesmo que estes últimos sejam mais arrojados e mais

propensos a aprimores ornamentais, exibindo belas varandas guarnecidas de colunas414 que

Entre-Douro-e-Vouga não apresenta. A própria designação de ‘casa de lavoura’ é entendida

pelos populares da terra quando estes pretendem assinalar as grandes casas dos agricultores

que possuem melhores propriedades. (figura 130) Podem subtilmente ser confundíveis com

residências de arquitectura erudita, mas não é esse o caso. A verdade é que estas apelidadas

casas de lavoura que despontam um pouco por todas as freguesias do território, encontram-se

a meio caminho entre a pobre casa serrana (figura 131) e a faustosa casa erudita, que na

região de Entre-Douro-e-Vouga assuma de forma preponderante uma planta em ‘U’ (figura

132), e são assim, as casas de lavoura, um arquétipo que elucida o confortável modo de vida,

409 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; p.34 410 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Op. cit.; p.34 411 Idem; pp.154-155 412 Ibidem; p.155 413 http://www.restapia.es/files/14811 ;p.4 (consultado a 25-06-2014; às 22:30h) 414 Ver subsecção 3.2.1 - “Síntese Descritiva dos Tipos de Habitação Popular” - ponto 3.2.1.1 – “Casa

Minhota”

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

118

proporcionado pela fertilidade das terras baixas, sua vasteza de recursos e proximidade dos

grandes centros.

Fig.130 – Exemplo de Casa de lavoura em Entre-Douro-e-Vouga (Romariz), este caso bastante similar ao grafismo apresentado pelo Jornal Expresso

Fig.131 – A simplicidade e rudeza de uma casa serrana (Albergaria-da-Serra)

Fig.132 – Casa erudita actualmente abandonada (Carregosa)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

119

É válido referir que a grande maioria das populações das terras baixas de Entre-Douro-e-

Vouga não conheceram a extrema pobreza. Este facto ajuda a entender o represamento de

algumas características oriundas de outras regiões do país, sendo que algumas das que mais

chamam à atenção são as grandes e é o caiado da habitação com pintura de rodapés e

também de molduras. Trata-se de uma particularidade das casas rurais do sul, que caiavam as

suas paredes por motivos de controlo de temperatura no interior.415 O branco ajuda a atenuar

o aquecimento da fachada, pois retrai a luz. Os embasamentos e as molduras das portas

pintavam-se de cores vivas para afugentar mosquitos (contrapondo o facto do branco os

atrair) e ainda maus-espíritos, segundo crendices populares.416 Consoante o observado,

algumas casas do norte controlavam a temperatura recorrendo à vegetação trepadeira, uma

técnica empregue quer na serra, quer nas terras baixas. Contudo, esta vegetação não chega a

cobrir a totalidade da casa, sendo que o caiado é uma solução bem mais eficaz. De qualquer

modo, Entre-Douro-e-Vouga o bom viver das famílias e as suas posses, permitem-lhes estes

usos que, mesmo não se justificando, tendo em conta que não é uma zona tão quente quanto

o sul, é aproveitada para dar o ar de sua graça. Os rodapés das casas não possuem as mesmas

cores vivas do sul, porventura a sua aplicação seja meramente estética sem outro tipo de fim.

Num território onde existe uma transição regional, é vulgar acharem-se tantos apêndices

arquitectónicos inter-regionais. Permanece a ideia que existe uma busca de uma identidade

própria que recorre a particularidades já existentes.

4.2. Identidade de Entre-Douro-e-Vouga, Cômputo Geral

4.2.1 Elo Entre as Casas Serranas e as Casas de Vale

No decorrer da descrição da arquitectura vigente em cada concelho que constitui a sub-

região, por diversas vezes se recorre a comparações de técnicas construtivas entre as casas

de vale, ou terras baixas, e as casas serranas. A diferença entre os géneros é visível

detectando-se numa primeira linha, ao nível do tratamento e cuidado dos materiais, a

oposição da simplicidade tosca da serra à simplicidade cuidada do vale. Seguindo no correr

dos contrastes, muitas outras linhas de combate se erguem. No ar paira a questão, afinal,

entre várias divergências o que relaciona a arquitectura dos povoados serranos com a dos

povoados baixos?

415 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, e Fernando Galhano; Arquitectura Tradicional Portuguesa; Publicações Dom Quixote; Lisboa; 2000; pp.151-152 416 http://www.restapia.es/files/14811 ; p.4 (consultado a 25-06-2014; às 22:30h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

120

Na verdade é mais aquilo que as une, do que o que as separa. Ambas bebem da mesma fonte

da arquitectura proto-histórica.417 É natural, porém, que se considere as casas serranas como

as mais fiéis aos modelos primários. A escassez de recursos e o isolamento social e cultural do

homem levam-no a limitar-se aos ensinamentos ancestrais, sem influxos que interfiram,

provenientes do meio urbano, um meio aberto e captativo das propensões que surgiam de

todo o mundo e, por isso, um meio mutável.

“As diferenças, muitas vezes de cariz regional ou mesmo local, prendem-se com

a disponibilidade dos materiais; a redução do tempo e custos do transporte,

questão hoje muitas vezes minimizada, mas que se assumia até ao início do

séc.XX como factor condicionante.”418

De facto, quando se começa a percorrer as terras pertencentes aos NUTS litorais419 como é o

caso de Entre-Douro-e-Vouga, depara-se com uma diferença abissal das terras do interior do

país.“Este contraste deve-se, essencialmente, à expansão do processo de urbanização do

litoral, que contribuiu para uma transformação das freguesias rurais e consequente

diminuição destas a favor das freguesias medianamente urbanas e urbanas.”420

Até aqui não existe nenhuma novidade que não venha sendo consecutivamente abordada,

acontece que submergindo na recôndita serra avista-se uma arquitectura ainda incauta, que,

consoante já foi referido, incrementa-se de estilismos beirãos. As casas das terras baixas, não

possuindo a pureza incólume das habitações serranas, deixaram-se paulatinamente

metamorfosear por diversos protótipos arquitectónicos. É condescendente, portanto, afirmar

que as terras baixas recolhem ensinamentos das casas dos povoamentos aglomerados, o que

não implica que estas últimas sejam necessariamente mais antigas. Ambas provêm de épocas

semelhantes, somente as técnicas variam, aprimorando-se à medida que os recursos

aumentam.

Indissociáveis de um mesmo padrão, elas assumem-se pela estrutura de casa de andar,

imposta para fins agrícolas intensivos. Ambas recorrem aos materiais oriundos de suas terras

mais facilmente extraíveis, e isso deve-se à riqueza granítica e xistosa da sub-região. O

emprego da madeira é parco e os materiais preferentemente à vista, ou rebocados, mantendo

a matiz natural, conferem um aspecto robusto e agreste às habitações, como se

417 Ver subsecção 2.2.1 – “Do Neolítico à Ocupação Castreja” - ponto 2.2.1.3 – “Os Castros e a Arquitectura do Granito” 418https://www.google.pt/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CCAQFjAA&url=http%3A%2F%2Frepositorio-aberto.up.pt%2Fbitstream%2F10216%2F64313%2F1%2F113225_T-6-4-9-1_TM_01_C.pdf&ei=LpvrU_a3Fcag0QWArYCgDQ&usg=AFQjCNHwJ-QN8EU2sZhvrcEtk4YsXFFm1g ; p.62 (consultado a 26-07-2014; às 18:02h) 419 Por NUTS entendam-se os NUTS 3, que fraccionam Portugal em 30 sub-regiões. A menção aos litorais pretende abordar as sub-regiões mais próximas da orla marítima, a norte do Mondego, como é o caso das sub-regiões do Minho e Lima; Cávado; Ave; Grande Porto; Tâmega; Entre-Douro-e-Vouga e Baixo Vouga. 420 http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/314.pdf ; p.201 (consultado a 26-07-2014; às 18:08h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

121

desabrochassem da rudeza do solo. Minadas por tímidas janelas no piso sobradado,

assemelham-se a muralhas defensivas, rasgadas por escassas portas de madeira, ora estreitas,

ora largas, destinadas aos animais e alfaias. No piso inferior, à falta de janelas, espreitam

postigos. O acesso à habitação efectua-se por um sólido lanço de escadas, normalmente

encostado à parede, executado com o mesmo material do restante edifício. As varandas que

povoam o universo da arquitectura popular, dotando-o de riqueza decorativa e graciosidade,

são evitadas. Ignoradas nos povoados aglomerados, ignoradas nos povoados disseminados. Se

estes últimos encontram na montanha as directrizes construtivas que os valem, apesar de

possuírem mais condições e justificativas para a aplicação de varandas, optam por não

complicar e do mesmo modo cumpliciam-se da agrestia dos povoados mais pobres.

Crê-se que facilmente se podem identificar estes protótipos construtivos dentro de um

padrão. Distinguem-se dos demais pela sua sobriedade de linhas, e pela singularidade que

dispensa varandas e apenas salienta uma escadaria que liga somente à porta de acesso à

habitação através de um patim, na grande maioria das vezes sem guarda. No rés-do-chão,

uma porta carral demarca o acesso ao quinteiro nas traseiras da casa, ou simplesmente a um

curral ou loja.

Outra característica típica, destacada nas habitações serranas, os seus sólidos blocos que

preenchem o peitoril da janela até ao solo. Particularidade também destas casas, as suas

esquinas arredondadas, frequentemente apenas uma esquina em cada casa junto a

cruzamento de caminhos. São estas as marcas que ajudam a distinguir uma arquitectura

tenuemente diferenciada dos arquétipos421 que figuram por todo o país.

4.2.2 A Conservação das Formas

“Durante milhares de anos, desde o aparecimento dos primeiros aglomerados

populacionais no Neolítico, a arquitectura vernacular evoluiu parcimoniosamente

em função das necessidades das populações. As competências inerentes a esta

foram sendo transmitidas pelas comunidades de geração em geração, até ao

momento em que a Revolução Industrial e as grandes alterações consequentes

quebraram esta linha evolutiva do conhecimento vernacular.”422

Na segunda metade do século XVIII as populações urgem deslocar-se para as cidades em busca

de postos de trabalho na grande indústria, o que inicia aos poucos e poucos o abandona dos

povoamentos rurais. A industrialização não só cria uma ruptura entre cidade e campo, como

421 Os arquétipos tratam-se da Casa Minhota, Casa Serrana; Casa de Madeira, Casa Alpendrada, Casa Saloia, Casa Ribatejana, Casa de Monte, Casa de Povoado, Casa de Pescadores e Casa Rural. Ver subsecção 3.2.1 – “Síntese Descritiva dos Tipos de Habitação Popular”. 422 http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/15423/1/arquitectura%20vernacular.pdf;

p.207 (consultado a 27-07-2014, às 10:16h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

122

desenvolve novos materiais construtivos como o aço, o cimento e o vidro.423 Também os

municípios de Entre-Douro-e-Vouga conhecerem este novo modo de vida, veja-se Oliveira de

Azeméis com destaque na época para a produção do vidro.424

Este progresso chega a todo o lado, sobrepondo-se aos recursos presenteados pela natureza,

como a pedra e a madeira. Deste modo, a construção torna-se mais comodamente exequível,

independentemente do meio em que se introduza. Os obstáculos impostos pelo meio natural

são bem mais fáceis de solucionar com as novas ofertas engenhadas pela produção em série.

A construção evolui de modo mais homogéneo e as particularidades envolvidas na

arquitectura popular, dissipam-se gradativamente em detrimento das novas soluções.

Com o surgimento do regime do Estado Novo na década de 30 do último século, houve um

desejo de valorizar aquele, que até à época, era considerado património nacional. Com a

adopção de um conjunto de medidas específicas que salvaguardavam a sua permanência,

criou-se uma campanha de inventariação, classificação e intervenção nas edificações que

carregavam a herança histórica e cultural do país, conferindo-lhe a sua própria imagem

arquitectónica. A obra Arquitectura Popular em Portugal, elaborada pelo Sindicato Nacional

dos Arquitectos entre 1955 e 1960 é fruto dessa campanha, comportando um vasto

levantamento dos exemplares de arquitectura popular ao longo do país.425 Na altura a

degradação dos edifícios já era notável. Outro exemplo de valorização do património rural

popular é observado num concurso ocorrido nos anos 40, onde se elegeria ‘A aldeia mais

portuguesa de Portugal’. Ganha-o a aldeia de Monsanto.426

Com o êxodo rural e a emigração assistida a partir dos anos 60, devido à crise nacional, as

aldeias são cada vez mais deixadas no esquecimento.427 É nas décadas de 70 e 80 que se inicia

o fenómeno da chegada das casas dos emigrantes. Até as aldeias serranas, mais isoladas e

menos propensas a alterações deste cariz, começaram a sentir aos poucos a introdução destes

novos elementos.428 A aldeia de Albergaria-da-Serra em Arouca é um exemplar da convivência

da casa do emigrante com a casa popular. A casa do emigrante intervém fazendo face à casa

popular, entendida como representação de um país pobre. Por isso ela exibe-se com técnicas

inovadoras e um desenho diferenciado bem mais arrojado. Quando a casa do emigrante

assimila-se como uma ameaça à preservação do estilo popular deve-se ter em atenção que ela

não se consegue desligar completamente de práticas ancestrais. Voltando a Albergaria-da-

423 http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/15423/1/arquitectura%20vernacular.pdf; p.207 (consultado a 27-07-2014, às 10:16h) 424 Ver subsecção 2.3.1 – “Concelhos Integrantes – Síntese” - ponto 2.3.1.4 – “Oliveira de Azeméis” 425https://www.google.pt/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CCAQFjAA&url=http%3A%2F%2Frepositorio-aberto.up.pt%2Fbitstream%2F10216%2F64313%2F1%2F113225_T-6-4-9-1_TM_01_C.pdf&ei=LpvrU_a3Fcag0QWArYCgDQ&usg=AFQjCNHwJ-QN8EU2sZhvrcEtk4YsXFFm1g ; p.19

(consultado a 26-072014; às 18:02h) 426 Idem; p.18 (consultado a 26-07-2014; às 18:02h) 427 Ver subsecção 2.3.2 – “Demografia” 428 https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/.../mrc_aeaulp2012_atas.pdf ;p. 4 (consultado a 26-07-

2014; às 19:13h)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

123

Serra, é curioso observar que muitas dessas casas novas adoptam as tradicionais coberturas de

xisto. Verifica-se portanto uma “permanência de formas que não têm outra justificação que

não seja a existência de tradições e de memórias ancestrais a exigir a sua continuidade.”429

Entre-Douro-e-Vouga é o espelho da transformação da arquitectura, consolidando tradição

com modernidade e numa terra onde o progresso aflora continuamente, é frequentemente

observarem-se alguns atentados à preservação do panorama tradicional. Na aldeia da Lomba,

em Vale de Cambra, chama à atenção, pelos piores motivos, uma casa de emigrante

encimada por painéis solares nada encobertos. Esta habitação, como se de um postal de boas-

vindas se tratasse, pontua a entrada na zona nobre, diga-se, da aldeia, onde se encontra a

capela rodeada de espigueiros e palheiros. Destoando completamente do conjunto, é mácula

num local tão pitoresco e genuíno como a aldeia da Lomba.

Nas terras baixas, onde a arquitectura popular vai rareando, assolada pelo rápido progresso

vindo das cidades, estes cenários assomam-se de modo incontrolável. Resta agora o respeito

pelo pouco que existe, e a insistência numa decente reabilitação, que aos poucos vai

espreitando aqui e acolá. Em plena serra, as aldeias de xisto na sua encosta poente são as

mais conservadas e a sua grande maioria permanece intacta. Albergaria-da-Serra é

provavelmente uma das que mais conhece o custo da evolução. A aldeia de xisto de Drave

(figura 133), situada em Covêlo de Paivô, Arouca, é um exemplo de sucesso na preservação e

recuperação dos valores do património. Sendo uma terra desabitada, encontra-se

actualmente sob a protecção dos escuteiros servindo como a Base Nacional IV do CNE (Corpo

Nacional de Escutas).430

E enquanto algumas servem fins institucionais, pela riqueza e peculiaridade do seu legado,

existem ainda as que lentamente se vão fundindo em conceitos turísticos, discretamente

429 TEIXEIRA, Manuel C.; Arquitecturas do Granito, Arquitectura Popular; Município de Arcos de Valdevez; 2013; p.118 430 http://drave.cne-escutismo.pt/pt/main.php?action=drave#historia (consultado a 28-07-2014; às

15:12h)

Fig.133 – Aldeia de Drave (Arouca)

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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afastadas dos olhares e das atenções dos curiosos. A aldeia do Trebilhadouro é outra boa

surpresa para quem procura a permanência da tradição assente em causas contemporâneas.

De momento espera-se a finalização deste espaço que servirá o turismo rural no concelho de

Vale de Cambra, freguesia de Rôge.431 Cada casa está a ser cuidadosamente reabilitada, de

acordo com uma linguagem conjunta que conjuga a pedra natural dos edifícios com ripados

de madeira encarnada. A traça natural é preservada, melhorando-se apenas alguns aspectos.

(figuras 134, 135, 136, 137, 138 e 139)

431 http://www.atra.pt/noticia/tracos-de-outrora-aldeia-trebilhadouro-serra-da-freita-alojamento-ferias (consultado a 26-07-2014, às 19:23h)

Fig.134 – Fachada revestida a ripado de madeira Fig.135 – As portas adoptadas com janela de

portadas

Fig.136 – Preservação da traça natural dos edifícios Fig.137 – Interior com vista para a janela

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

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No universo das aldeias serranas ainda existe esta preocupação de garantir a preservação do

património rural e é bom que assim continua, para que nunca se percam as raízes ancestrais.

Afinal de contas, a história é o esqueleto de um povo, aquilo que o move em direcção ao

futuro. É bom que todas as articulações que arquitectam sejam mantidas com salubridade.

Para isso é necessário readaptar de forma eficiente os ensinamentos e as materialidades

tradicionais, o que traz benefícios à construção, tendo em conta que os materiais tradicionais

oferecem níveis de conforto superiores aos industrializados. Além disso, em muitas situações

a reabilitação de um edifício pode ficar mais em conta que a construção de origem.

"Mais do que mimetizar formas de outras épocas e outras vivências, importa

saber se é possível preservar algumas delas com novas funcionalidades, mas

mantendo a coerência de conjuntos que são verdadeiras lições da arte de

construir, com economia de meios e estreita relação com o sítio." 432

432 ROSETA, Helena; Prefácio da 4° edição; Arquitectura Popular em Portugal, 4 " edição; Ordem dos

Arquitectos; Lisboa; 2004; p.VI

Fig.138 – Pormenor das divisórias em tabuado vertical de madeira, imitando tabique

Fig.139 – Pormenor de entrada complementada com candeeiro

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

126

Capítulo 5.

Conclusão

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Arquitectura Popular de Entre-Douro-e-Vouga

127

Quando se pensa que a arquitectura poderá nascer da necessidade do homem se refugiar, é

pouco provável que o avanço da casa, como se conhece até agora, tenha sido despoletado

por tal recolhimento. Já escreveu Alexandre Alves da Costa433 que, foi o facto do homem

ousar encarar as circunstâncias que o rodeavam como desafios a serem superados, que

contribui para o repensamento de um modo de habitação. As características próprias

desenvolvidas deflectem do que o meio oferece ao homem e do modo como o homem se

procura integrar nele. Portugal, embora seja um país de reduzida dimensão, à escala dos

outros países, como se tem esclarecido é um território com uma variedade de

condicionantes, quer climatéricas, como geológicas, orográficas, sociais e culturais, entre

outras. O norte português encabeça uma heterogeneidade e aspereza geomorfológica aliada

a um clima pouco clemente, com tendências frias e chuvosas. Em contrapartida as terras são

de uma fertilidade invejável e, devido a tal caso, a agricultura é parte da família nortenha

que convive de muito perto com a realidade rotineira do campo. As suas casas ergueram-se

também para abraçarem esta realidade de exploração agrícola intensiva que a natureza lhes

proporciona. Por todos estes factores, em regiões nortenhas as técnicas construtivas

assemelham-se bastante e as influências captadas entre territórios vizinhos é empregue não

pelo ‘querer’ mas pelo ‘dever’.

Não existem diferenças abissais entre arquitectura beirã, entre arquitectura minhota e entre

arquitectura transmontana, mas as que existem justificam-se naquilo que o meio envolvente

dispõe e permite, sem esquecer também as necessidades de cada povoado face ao seu modo

de vida. Se o clima é agreste, combate-se com a robustez dos materiais; se os assentamentos

são ardilosos, estreitam-se caminhos, acotovelam-se as casas; se os declives assustam,

vencem-se os medos, socalcam-se os terrenos e descobrem-se seus potenciais. Ora Entre-

Douro-Vouga, sendo uma sub-região de contrastes, abrange um pouco de tudo aquilo que

caracteriza o norte português, passando da montanha para o vale. É demarcada por três

diferentes faixas geológicas, do litoral para o interior começa com uma faixa arenosa,

passando pela granítica e a xistosa. Todos estes factores no seu conjunto exigem um modelo

arquitectónico característico. Na montanha repescam-se premissas da Beira Interior, também

ela dominada pela montanha e pela alternância entre faixas xistosas e graníticas. Descendo

para o vale, a arquitectura dos NUTS do Cávado, do Tâmega, do Grande Porto434, inseridos

grande parte na região minhota, é ela a mais revisada. À medida que vão escoando para sul

do rio Douro, os géneros abrangidos pela malha de vale incorporam-se, até confluírem no

Entre-Douro-e-Vouga. A sul, na sub-região do Baixo Vouga, o efeito é semelhante, contudo

começam a ser maioritariamente observados os influxos chegados de sul, provenientes da

arquitectura da Beira Litoral, como as casas alpendradas e térreas caiadas e outros vindos do

433 ALVES COSTA, Alexandre; A arquitectura escreve a sua própria paisagem; Jornal Arquitectos; 217

(Outubro, Novembro, Dezembro); Ordem dos Arquitectos; Lisboa; 2004; p.8 434 São notadas influências na arquitectura de Entre-Douro-e-Vouga provenientes de certas terras referidas por Ernesto Veiga de Oliveira como a Maia, Paços de Ferreira, Penafiel, Esposende, Barcelos e Viana do Castelo. Ver subsecção 4.1.2 – “A Casa de Santa Maria da Feira, São João da Madeira e Oliveira

de Azeméis" – ponto - 4.1.2.10 “Influências”

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interior das Beiras. Na súmula deste facto, também as influições causadas no Baixo Vouga

perpassam timidamente para uma pequena fracção de Entre-Douro-e-Vouga. O seu domínio

porém é escasso, ficando-se apenas pelo poente e sudoeste da sub-região, que são os pontos

onde a faixa arenosa se começa a manifestar. Embora existam estas remanescências que

parecem fugir ao estilo da vigorosa casa de andar, a quase totalidade da arquitectura

encontrada em Entre-Douro-e-Vouga destrona esta última. Na verdade, os solos arenosos

representam um abandono das práticas agrícolas comuns, visto serem muito pouco férteis.

Compreensivelmente é avistado este novo modelo adaptado a diferentes condições. Não se

trata aqui de uma tentativa de diferenciamento ou da busca de uma identidade exclusiva,

mas sim daquilo que vem sendo exposto ao longo do texto, como a adopção das estratégias de

arquétipos externos que melhor se adequam à situação do meio envolvente.

Em tempos remotos a humanidade não era muito numerosa e os povos isolavam-se em grupos,

sendo natural que cada qual acaba-se por definir o seu próprio modo construtivo, não como

finalidade em si, mas apenas como resultado das condicionantes do meio.435O homem foi

compreendendo a natureza, aprendendo a extrair dela o melhor para si. Agora, somam-se

todas as experiências e conhecimentos adquiridos para respirar fundo e contemplar

pacificamente este meio natural que nunca faltou com nada ao homem. Na mesma medida

em que tira, sabe dar. Diante dos nossos olhos dispôs tudo o que seria necessário, e cabe ao

homem reconhecer a bondade da mãe-natureza para consigo. O desenvolvimento tecnológico

fortalece as bases da humanidade, revestindo-a de uma multiplicidade de soluções

construtivas que em tempos eram impensáveis. Atingem-se fasquias cada vez mais elevadas e

é sabido que continuarão subindo sem um fim previsível à vista. No entanto, tanto poder é

perigoso nas mãos de quem o desregra e é conveniente ao ser humano que este se

consciencialize, a fim de não desprezar o conhecimento primário que o lançou nesta viagem,

aquele sem o qual nada seria exequível.

Quer-se com este discurso apologista, infundir o respeito pelo património antigo e a sua

preservação, pois é este que define e identifica gerações e culturas. É este que sela a aliança

do homem e o seu meio. É este património que não quer evidenciar-se, apenas harmonizar-

se. Nada como terminar, embuído no espírito, recordando uma pequena história contada por

Fernando Távora436, onde o arquitecto fazia uma projecção de slides exibindo algumas

fotografias de casas populares portuguesas. Salazar estava presente e, ao ver a foto de uma

casa tradicional alentejana, disse algo que marcou Távora. Encantado pela traça simples da

casa e pela força das suas robustas chaminés, Salazar apelidou-a de ‘arquitectura moderna’.

Bem ao gosto de Távora, que sempre olhou dessa forma arrojada a arquitectura popular, nada

de mais inusitado e inspirador poderia ter dito o ministro.

435 LÉVI-STRAUSS, Claude; Mito e Significado; Edições 70; Lisboa; 2007; p.31 436 http://fims.up.pt/ficheiros/LivroFinalConferencias.pdf; p.16 (consultado a 13-09-2004; às 11:15h)

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