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1 SOPHIA EGLER Arte/Educação das Relações Étnico-raciais Possibilidades e limites da lei 10.639/2003 no âmbito da Arte/Educação Brasília, 2013

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SOPHIA EGLER

Arte/Educação das Relações Étnico-raciaisPossibilidades e limites da lei 10.639/2003 no âmbito da Arte/Educação

Brasília, 2013

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Sophia Egler

Arte/Educação das Relações Étnico-raciaisPossibilidades e limites da lei 10.639/2003 no âmbito da Arte/Educação

Trabalho de conclusão de curso de Artes Visuais, habilitação em Licenciatura, do Departamento de Artes Visuais do Instituto de Artes da Universidade de Brasília.

Orientador: Prof. Me. Nelson Fernando Inocêncio Silva

Brasília, 2013

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Sumário

I. Introdução............................................................................................................pág 3

II. Um País erguido pelo açúcar deixa um gosto amargo na boca de muitos.........pág 8

III. Conferência em Durban, Ações Afirmativas, Educação, Relações Étnico-raciais e a Lei 10.639/2003..................................................................................................pág 11

IV. Origens e Significados do Termo Étnico-racial..............................................pág 15

V. Pesquisa e Entrevistas......................................................................................pág 19

VI. Ações do MEC e demais secretarias...............................................................pág 23

VII. Formação Continuada e Material Didático....................................................pág 28

VIII. Considerações Finais....................................................................................pág 35

Anexo....................................................................................................................pág 42

Referências bibliográficas e documentos consultados..........................................pág 43

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Introdução

O tema deste trabalho é fruto de uma pesquisa, realizada no primeiro semestre de

2012, para a realização de um seminário na disciplina de Organização da Educação Brasileira

(OEB). A referida disciplina tem como objetivo analisar os direitos e deveres individuais e

coletivos, e os dispositivos de âmbito educacional, ambos presentes na Constituição Federal

Brasileira 1988, mais especificamente nos capítulos I e III. Analisa-se também, os principais

aspectos que caracterizam e estruturam toda funcionalidade do sistema educacional brasileiro

expressos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)1. É de suma importância, que

professores e profissionais da educação conheçam a fundo os diferentes níveis e modalidades

educacionais, a forma de funcionamento do federalismo no ensino, as responsabilidades

especificas da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios quanto a oferta,

garantia do ensino, administração, gestão e financiamento educacional. Tais conhecimentos,

permitem que futuros professores tomem conhecimento da organização, e de todos os

componentes atualmente expressos no sistema nacional de ensino. Desta forma, aqueles que

decidirem exercer a função de educadores, saberão exercer seus deveres, assim como lutar

pelos direitos garantidos pela lei.

Na disciplina de OEB os alunos se organizaram em grupos para a preparação e

apresentação de seminários sobre diferentes temas afetos à educação. Ao meu grupo coube

desenvolver o tema de relações étnico-raciais na educação brasileira, que é um tema que tem

relevo para mim tanto pelo lado profissional, quanto pelo lado pessoal. Cerca de um ano e

meio atrás, eu já havia identificado e me encantado com o desafio que é a abordagem

educacional que preza pela diversidade étnico-racial nas escolas brasileiras. Com isso, fiquei

bastante interessada em continuar pesquisando sobre propostas e ações que garantiriam sua

implementação no sistema educacional brasileiro público e privado.

No lado pessoal o tema me toca pela experiência que tive de estudar em um colégio

que tem como fundamento educar seus alunos a desenvolverem não só qualidades

acadêmicas, mas qualidades éticas, e ainda adquirirem um claro entendimento de seu papel na

construção de um mundo melhor. Esse colégio envolve uma comunidade de pessoas de

variadas nações, etnias, posições sócio-econômicas e religiões, que se dedicam à paz e à

construção de um mundo sem preconceitos, discriminação e desigualdades entre as pessoas.

1 Deste ponto em diante, irei me referir a essa Lei nº 9.349 de 1996, e ao conjunto de leis que a modificaram posteriormente, por sua abreviatura LDB.

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Assim, desde cedo, os alunos s�o ensinados a conviverem e respeitarem uns aos outros, bem

como todas as etnias, culturas e religi�es. Atualmente sou capaz de perceber como essa forma

de educa��o fez uma enorme diferen�a em minha vida, ao oportunizar uma amplitude de

experi�ncias culturais t�o diversas e ricas.

No segundo semestre de 2010 abordei o tema de rela��es �tnico-raciais pela primeira

vez ao produzir um artigo para a disciplina intitulada Fundamentos da Educa��o Art�stica

(FEA). Durante esse espa�o de tempo, e com a oportunidade de amadurecer conhecimentos

voltados a essa pesquisa, pude perceber que apesar da extrema import�ncia deste tema ser

abordado em sala de aula, muitos professores apresentam dificuldades em cumprir essa

proposta. Barreiras para isso v�o desde falta de preparo e conhecimentos espec�ficos, �

escassez de tempo no ano letivo para abordar o tema em sala de aula com a devida seriedade.

Foi revelado ainda, em um documento publicado em 2005 pelo Minist�rio da

Educa��o/Secretaria de Educa��o Continuada, Alfabetiza��o e Diversidade – MEC/SECADI,

que a grande maioria dos professores brasileiros n�o tiveram acesso a esse conte�do no seu

processo de forma��o. “Ademais, muitos desconhecem, até o momento, da oportunidade de

realizar uma formação adicional2 sobre o tema, voltado para a do papel do professor para

com a construção da cultura e da consciência negra nos espaços educacionais.” (SECAD,

2005 pp. 11-12).

A Lei Federal 10.639 de 9 de janeiro de 2003, tornou obrigat�rio o ensino direcionado

� nossa diversidade �tnico-racial nas escolas. De acordo com o par�grafo 2o do artigo 26-A

desta mesma lei, os conte�dos referentes � Hist�ria e Cultura Afro-Brasileira ser�o

ministrados, em especial nas �reas de Educa��o Art�stica, Literatura e Hist�ria. (Lei No

9.394/1996). N�o obstante, a implementa��o desse dispositivo legal encontra dificuldade,

mesmo nas grandes capitais, como pude verificar nas visitas a institui��es de ensino que fiz

em Bras�lia, por ocasi�o da pesquisa realizada para a elabora��o do semin�rio da disciplina de

OEB.

Como aluna de Licenciatura em Artes Pl�sticas e futura professora, fiquei instigada

em aprofundar-me mais nesse assunto e explorar a aplicabilidade desta lei por professores de

Arte Educa��o em institui��es educacionais p�blicas e particulares do Distrito Federal e do

entorno. Em minha pesquisa, visei investigar o que estava ocorrendo nas escolas quanto ao

ensino direcionado �s quest�es �tnico-raciais.

2 Esta forma��o adicional refere-se �s oportunidades de “forma��o continuada”, oferecidas a professores por diversos f�runs educacionais com vistas a complementar conhecimentos e aperfei�oar pr�ticas de ensino.

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Inicialmente selecionei cinco escolas para realizar entrevistas que tinham como

objetivo principal analisar o nível de conhecimento dos professores da Lei Federal

10.639/2003. Procurei investigar também, as formas e métodos pelos quais estes professores

abordavam temas voltados para afirmação da diversidade cultural, étnico-racial além das

formas de correção de desigualdades no ambiente escolar.

Descrevo neste trabalho, todo o processo de pesquisa e os resultados decorrentes de

cada uma das entrevistas realizadas. Ao invés de entrevistar cinco professores, só foi possível

realizar três entrevistas, uma no Colégio Militar, outra na Escola Park da 308 sul, e por último

no Colégio JK. Para não expor nenhum dos professores, resolvi usar pseudônimos no capítulo

em que descrevo o processo de entrevistas. Mesmo frente a algumas dificuldades como a de

conseguir agendar e realizar o número entrevistas desejadas, creio que as conclusões tiradas

desta pesquisa são relevantes e indicam uma tendência importante a ser notada quanto ao

ensino étnico-racial nas escolas.

Abordo também neste trabalho, as transformações ocorridas a partir da Conferência

Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas,

realizada em Durban, África do Sul no ano de 2001. A conferência impulsionou a discussão e

elaboração de ações afirmativas contra a discriminação e o preconceito racial presentes no

Brasil, principalmente nos espaços educacionais do País.

Uma das principais estratégias realizadas pelo governo foi a implementação da Lei

Federal 10.639, sancionada em 2003, que institui o ensino da História e Cultura Afro-

Brasileiras e Africanas nas escolas. Proposta esta que tem, como objetivo, estimular que os

espaços educacionais incorporem e abordem temas relativos ao ensino da diversidade étnico-

racial em suas práticas pedagógicas. Deve-se citar neste contexto, a Lei Federal 11.645,

sancionada em 2008, que complementa a Lei Federal 10.639/2003 ao incorporar o ensino da

História e Cultura Indígenas. Não pretendo, todavia, me aprofundar nas especificidades desta

lei pois o foco deste trabalho encontra-se nas abordagens e especificidades da Lei Federal

10.639/2003. No entanto, pesquisadores interessados nesta outra lei poderão sem dúvida usar

esta pesquisa como referência para uma interface.

Cito ainda as responsabilidades assumidas pelo Ministério da Educação (MEC),

demais secretarias associadas, e pelos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (NEABs) visando

a implementação desta lei. Aponto também as políticas públicas direcionadas para a formação

continuada de professores, e para produção e publicação de material didático específico

voltado para a aplicação de conteúdos alusivos à das relações étnico-raciais. Considerei

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necessário apresentar os processos históricos, sociais, políticos e culturais que levaram

antropólogos, psicólogos sócias, educadores e o Movimento negro a desconstruírem o

conceito biológico eurocêntrico de raça do século XIX, e o ressignificarem, associando-o com

o conceito de etnia, estabelecendo assim uma completude teórica e conceitual que por sua vez

originou no termo étnico-racial.

Ao final do texto, analiso como a Arte Educação pode trabalhar o multiculturalismo,

na sua vertente critica, no espaço educacional. Levo em consideração que uma sala de aula

pode abrigar alunos pertencentes a diferentes regiões, etnias e culturas. Tendo dito isso,

acredito que seja possível realizar projetos que estimulem esses alunos a conhecerem e

aprenderem sobre as distintas características étnico-raciais existentes entre eles. A partir dessa

troca de experiências, acredito ser possível desencadear novas percepções individuais e

coletivas. Ao perceber o quão importante é a valorização das diferenças étnico-raciais, por via

de reconhecimento da cultura local como a de outras regiões abre-se um espaço para

descobertas e identificações. Ao observar as diversas manifestações e expressões culturais e

tradicionais representadas artisticamente, esse estudo poderia desencadear discussões sobre os

diferentes valores estéticos e sócio-culturais no país. Exemplos destes podem apresentar-se na

escrita, nas artes visuais, na dança e na música. Vejo que tal discussão pode voltar-se também

à abordagem de características e especificidades lingüísticas, hábitos gastronômicos, hábitos

vestuários, religiosidade, crenças, valores e outras tradições.

Acredito que a educação é o melhor caminho para que alunos aprendam a valorizar as

diferenças e riquezas da cultura brasileira e desta forma estimular uma integração mais

respeitosa e compreensiva. O fenômeno do racismo é socialmente construído e logo, uma

educação voltada para o esclarecimento da diversidade é a melhor forma de combater os

efeitos perniciosos do racismo. Assim, vejo quão importante seriam os efeitos resultantes da

implementação dos princípios da Lei Federal 10.639/2003. Ao meu ver, esta lei exerceria um

papel fundamental na construção de um sistema educacional capaz de conscientizar

educandos e educadores sobre as diversas formas de manifestação do racismo, além de

estimular o respeito mútuo entre as diferentes culturas. Tal educação é de crucial importância,

pois o tema do racismo no Brasil é ainda mascarado por um mito de que há neste país uma

democracia racial.

O racismo no Brasil é um tema considerado tabu, pois trata-se de um assunto que afeta

a sensibilidade das pessoas por interferir na conduta ética dos indivíduos. O racismo não é

abertamente admitido, e utiliza-se correntemente o fato de existirem relações inter-raciais

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afetivas na sociedade para reforçar o argumento de que não há desigualdades entre negros e

brancos, e que o racismo no Brasil deixou de existir. Um olhar mais cuidadoso sobre o tema

revela, todavia, que tal situação não se verifica. Várias evidências explicitam um contexto

muito mais complexo, onde práticas discriminatórias e processos de exclusão são, de fato,

comuns em nossa sociedade.

Acredito que a Lei Federal 10.639/2003 aborda o fenômeno do racismo de forma

extremamente esclarecida e consciente. Creio que Conferência Mundial contra o Racismo,

Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, realizada em Durban se tornou a

força motriz que impulsionou a elaboração, da referida lei. Desde então, o racismo passou a

ser percebido pelo Estado como um fenômeno de várias facetas e, portanto, um problema

ainda muito concreto a ser tratado no Brasil. A partir disto, verifica-se a importância da lei ser

implementada de forma eficaz para assim edificar um sistema educacional que promova uma

verdadeira integração entre as diversas culturas e etnias presentes no seio da sociedade

brasileira. Este trabalho dedica-se a explorar a fundo este tema, as ações desenvolvidas para

promover a Lei Federal 10.639/2003 e as dificuldades encontradas quanto à sua

aplicabilidade em âmbito nacional.

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“Um Pa�s erguido pelo a��car, deixa um gosto amargo na boca de muitos”3

Dessa forma, o “corpo negro”, conforme um regime semi�tico racista, � o pr�prio lugar da subordina��o ou da exclus�o. A miscigena��o n�o eliminou a discrimina��o, apenas a pluralizou, matizou, modalizou, conforme a presen�a ou a aus�ncia gradual de caracter�sticas “negras”, mas principalmente pela tonalidade da cor da pele – de um racismo bivalente para um racismo polivalente (ou mesmo ambivalente). A cor da pele apresenta-se como varia��o intensiva do gradiente de cor (mais ou menos escuro), que desestabiliza a vari�vel “ra�a”, no lugar da vari�vel extensiva (parte extra partes) das categorias raciais (branco, negro, n�o-branco...).

A estigmatiza��o racial � o exerc�cio de uma vigil�ncia difusa e ciosa da hierarquia e da domina��o raciais, provocando intensidades de dor nem sempre corp�reas, mas que repercutem no corpo, mutilando-o, esfolando-o, fragmentando-o, codificando-o, semiotizando-o, n�o apenas simbolicamente ou imaginariamente. Afeta o corpo com marcas mais sociais do que corporais, mas que repercutem nele como estigmas. O estigma � uma demarca��o corporal de uma rela��o social de desigualdade, resultante de uma reifica��o dos processos de domina��o/hierarquiza��o

(SALES Jr., 2006, p. 233)

A condi��o hist�rica dos negros no Brasil foi e continua sendo extremamente

desfavor�vel. Os negros africanos escravizados compunham a principal for�a de trabalho no

desenvolvimento da col�nia e do imp�rio. Ap�s a aboli��o da escravid�o em 1888, a situa��o

n�o sofreu mudan�as radicais. Aqueles outrora escravizados e posteriormente alforriados, n�o

possu�am nada, muitos foram exclu�dos do mercado de trabalho vindo a formar os bols�es de

pobreza, nos centros urbanos. O estado brasileiro n�o buscou oferecer condi��es para que os

ex-escravizados fossem integrados � sociedade como cidad�os, exercendo a atividade

produtiva, social e cultural. A prefer�ncia pela m�o-de-obra europ�ia, que aumentou bastante

depois da aboli��o, foi evidente. Com isso, a popula��o negra permaneceu ligada e

dependente economicamente das terras, das minas ou de outras ocupa��es pr�vias4. Os que se

aventuravam por um caminho mais independente encontraram grandes dificuldades para

conseguir empregos e manter uma vida com condi��es minimamente aceit�veis.

Conseq�entemente, essa popula��o exclu�da passou a lotar os corti�os, os quais se

proliferaram em �reas habitacionais que conhecemos hoje como as favelas.

A situa��o entre brancos e negros continua e a hierarquia � a que a sustenta. A

discrimina��o racial � da nossa ordem social encontrando-se presente em diversos ambientes,

sendo evidente desde a distribui��o geogr�fica dos corpos at� a estratifica��o econ�mica das

3 Retirado do vídeo: Brasil uma história inconveniente. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=imYRxumAphE>4 Escravos ao ganho- Realizavam tarefas remuneradas, entregando uma quota diária do pagamento recebido ao senhor. As principais atividades exercidas eram a de carregadores, doceiras, domésticas, pequenos concertos, etc.

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atividades que acontecem no meio rural e urbano, e principalmente em locais de trabalho e

instituições de ensino. O legado da escravidão no Brasil contemporâneo é enorme. Apesar de

o País ter se erguido economicamente, a má distribuição de renda gera enormes disparidades,

uma vez que a maior parte desta renda concentra-se nos pequenos grupos das elites, tornando

as desigualdades sociais ainda muito marcantes. O que existe atualmente no Brasil é uma

combinação perversa entre racismo e pobreza, e nesse contexto há o grupo dos socialmente

incluídos e o dos socialmente excluídos; e dentro dessa lógica, existe uma grande diferença de

oportunidades, de qualidade de vida e de acesso a uma boa educação. Em função desse e de

outros motivos históricos, o Brasil ainda é marcado por diversas manifestações e

desigualdades expressas no âmbito das relações raciais. Por racial queremos dizer categoria

contemporânea socialmente construída a partir de referenciais políticos e ideológicos que se

baseiam no fenótipo. Concepção distinta das teorias racialistas do século XIX, que serão

abordadas detalhadamente e com mais clareza na terceira sessão deste trabalho.

À guisa de exemplificação de como as práticas de racismo adquirem uma dimensão

contemporânea observemos as informações seguintes: segundo dados coletados para a

execução do Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para

Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e

Africana, o Ministério da Educação (MEC), a Secretara de Educação Continuada,

Alfabetização e Diversidade (SECAD)5 e a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da

Igualdade Racial (SEPPIR), afirmam que a população afro-descendente é a que mais enfrenta,

cotidianamente, diferentes manifestações de preconceito racial. (SECAD/MEC, SEPPIR,

2009 p.13a). No dia 15 de Janeiro de 2013, a SEPPIR publicou em site oficial, uma pesquisa

que indica que o racismo é um dos principais crimes presente nas redes sociais. Segundo a

Safenet Brasil, instituição com nível de atuação nacional, formada por cientistas da

computação, professores, pesquisadores e bacharéis em Direito, estima-se que o Facebook

deve se tornar neste ano de 2013 a rede social com maior número de denúncias de crimes e

violações aos Direitos Humanos na Internet brasileira. Só no ano de 2012, a Safenet Brasil

registrou 11.305 endereços, hospedados pelo Facebook, que foram denunciados à Central

Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos (CND). Dentre os links denunciados, a

maioria apontava conteúdo racista, contando 5.021 links. A pesquisa mostra ainda, que entre

5 Atualmente designada por SECADI (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e inclusão). Assim doravante esta secretaria será referida por sua sigla atual (SECADI)5 A secretaria de Promoção da Igualdade Racial foi criada no âmbito da Presidência da República pela Medida Provisória no 111, de 21 de março de 2003, convertida na Lei 10.678 do mesmo ano

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os anos 2011 e 2012 a quantidade de den�ncias no Brasil que relacionam o Facebook a

viola��es dos direitos humanos cresceu em 264,5%. Segundo Carlos Alberto Silva Junior,

Ouvidor da Secretaria de Pol�ticas de Promo��o da Igualdade Racial, o n�mero de den�ncias

formais de ataques semelhantes em ambiente virtual recebidas pela SEPPIR aumentou de 21

para 37 do ano de 2011 para 2012. De acordo com Carlos Alberto Silva Junior:

“Nossa inten��o � colaborar com a mudan�a do anteprojeto do novo C�digo Penal, com a atualiza��o do artigo 20 da Lei 7.716, que trata de crimes de racismo, para que ela possa ser incorporada a partir da inclus�o dos crimes cometidos na Internet e redes sociais.” 6

Dentre os v�rios ambientes onde o preconceito racial � evidenciado, consta o espa�o

educacional. Constata-se a exist�ncia de uma forte correla��o entre pertencimento �tnico

racial e o sucesso escolar dos alunos. (SECAD/MEC, SEPPIR, 2009 p. 13b). Processos

discriminat�rios penalizam crian�as, adolescentes, jovens e adultos negros, levando-os �

evas�o e ao fracasso escolar. Neste �mbito, torna-se evidente o qu�o crucial � a reforma do

ambiente escolar, especialmente na quest�o do combate destas desigualdades. A escola � um

espa�o onde a intera��o de alunos vindos de origens culturais e raciais distintas acontece.

Propostas educacionais deveriam contextualizar e sensibilizar os estudantes, buscando assim

formas diversas de trabalhar o pertencimento, a identidade e o respeito entre os alunos. Tais

propostas, ao integrarem a diversidade cultural e �tnico-racial em pr�ticas escolares

promoveriam uma forma��o que fosse voltada para a conscientiza��o e valoriza��o das

diversidades, assim combatendo mais abertamente manifesta��es de racismo e outras formas

de intoler�ncia que possam surgir n�o apenas no espa�o educacional, mas na Sociedade como

um todo.

6 Dispon�vel em: <http://www.seppir.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2013/01/pesquisa-indica-racismo-entre-principais-crimes-nas-redes-sociais>

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II

Conferência em Durban, Ações Afirmativas, Educação, Relações

Étnico-raciais e a Lei 10.639/2003

Atualmente, no Brasil h� leis que asseguram a obrigatoriedade do ensino da Hist�ria e

Cultura Afro-Brasileiras, Africanas e Ind�genas nas escolas. A Lei Federal 10.639 sancionada

em 2003, instituiu o ensino da Hist�ria e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas, conforme fora

supracitado, e a Lei Federal 11.645/2008 complementa a lei 10.639/2003 ao acrescentar o

ensino da Hist�ria e Cultura Ind�genas. Para nortear o cumprimento da legisla��o, o Conselho

Nacional de Educa��o aprovou em 2004 e o Minist�rio da Educa��o (MEC) homologou as

Diretrizes Curriculares Nacionais Para Educa��o das Rela��es �tnico-raciais (Parecer

CNE/CP no 03 de 10 de mar�o de 2004). Pelas diretrizes, o ensino deve ter tr�s princ�pios:

consci�ncia pol�tica e hist�rica da diversidade; fortalecimento de identidades e de direitos;

a��es educativas de combate ao racismo e �s discrimina��es. Os princ�pios se desdobram em

diversas a��es, orienta��es e posturas a serem tomadas e em conte�dos a serem inclu�dos

pelos estabelecimentos de ensino. Nas diretrizes, tamb�m est�o inclu�das as necess�rias

modifica��es a serem feitas nos curr�culos escolares, em todos os n�veis e modalidades,

reconhecendo ainda o fato de que a educa��o deva primar pela forma��o de cidad�os que

tenham orgulho de seu pertencimento �tnico-racial. (Parecer CNE/CP no 03 de 10 de mar�o de

2004).

Como mencionado anteriormente a Lei Federal 10.639/2003, que altera a Lei de

Diretrizes e Bases da Educa��o (LDB), estabelece a obrigatoriedade do ensino da Historia e

Cultura Afro-Brasileiras e africanas nas escolas p�blicas e privadas da Educa��o B�sica7. H�

muito tempo vem-se discutindo a import�ncia da abordagem de temas que revelem

abertamente que o racismo ainda � um fen�meno muito presente na sociedade brasileira,

mesmo sendo esta composta majoritariamente por uma popula��o preta e parda. O racismo

n�o � admitido como pr�tica recorrente e por muito tempo sua manifesta��o vem sendo

escondida e ignorada. Sua presen�a � forte, assim como a de demais “pr�-conceitos” , dentre

eles a homofobia, a misoginia e a xenofobia que por sua vez, revelam-se presentes em

in�meros discursos ideol�gicos e pr�ticas sociais contempor�neas. Tendo em vista que o

7 Entende-se por educação básica: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.

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ambiente escolar apresenta grande influência no papel formador de uma sociedade, esse

espaço é ideal para que sejam realizadas reflexões sobre como o preconceito gera

comportamentos hostis e muitas vezes violentos. É importante perceber que a intolerância e a

discriminação são práticas que desumanizam determinados grupos sociais e culturais por

desrespeitar suas identidades, suas dignidades, suas histórias, suas escolhas e seus direitos

humanos. Com isso, as novas propostas pedagógicas inserem iniciativas que se pautam pela

superação destes preconceitos de forma a corrigir as desigualdades manifestadas na sociedade

inclusive no espaço escolar.

Atualmente, estratégias têm sido elaboradas no sentido de orientar os sistemas de

ensino, e demais instituições dedicadas à educação, para que estas incorporem a diversidade

étnico racial da sociedade brasileira em práticas escolares. Tais medidas têm sido

consideradas cada vez mais importantes para uma melhora significativa na qualidade da

educação brasileira. As propostas e planos de ação orientados para o combate a todas as

formas de preconceito, racismo e discriminação que porventura se manifestam no ambiente

escolar somente ingressaram na agenda mais recentemente, em especial a partir da

Conferência Mundial contra o Racismo8, Discriminação Racial9, Xenofobia10 e Intolerâncias

Correlatas11, realizada em Durban, África do Sul, de 28 de agosto a 8 de setembro no ano de

2001.

O objetivo dessa conferência foi o de despertar a atenção mundial para um

compromisso político de mobilizar ações em escala internacional contra atos de racismo,

discriminação racial, xenofobia e intolerâncias correlatas. A Conferência foi organizada sobre

cinco eixos temáticos, que após dias de discussões, resultaram em deliberação,

recomendações e diretrizes, são eles:

As origens, causas e formas de manifestações contemporâneas de racismo,discriminação racial, xenofobia e intolerâncias correlatas.

As vitimas do racismo, discriminação racial, xenofobia, e intolerâncias correlatas.

8 Racismo- Conjunto de opiniões pré concebidas que atribuem superioridade entre seres humanos de acordo com a matriz racial.9 Discriminação Racial- Quando ocorre uma ação, uma manifestação exteriorizada de um pensamento racista ou preconceituoso.10 Xenofobia- Antipatia em relação aos estrangeiros. Desejo de eliminar a sua presença de forma a assegurar uma suposta pureza11 Intolerâncias Correlatas- A intolerância é uma atitude que falha em reconhecer e a respeitar as diferenças. Pode ser baseada no preconceito, podendo levar a ações discriminatórias de controle social.

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Medidas de preven��o, educa��o e prote��o voltadas � erradica��o do racismo, discrimina��o racial, xenofobia e intoler�ncias correlatas a serem tomadas nos setores nacionais, regionais e internacionais.

Provis�o de rem�dio efetivo, recursos, indeniza��es e outras medidas a serem tomadas a serem tomadas nos setores nacionais, regionais e internacionais

Estrat�gias para se atingir a equidade completa e efetiva incluindo uma coopera��o internacional com realces providos pelas Na��es Unidas e outros mecanismos voltados para o combate ao racismo, discrimina��o racial, xenofobia e intoler�ncias correlatas. 12

(Durban Declaration-Tradu��o Nossa)13

As discuss�es realizadas nos encontros objetivaram identificar com clareza alguns

pontos cruciais na luta contra o racismo, discrimina��o racial, xenofobia e intoler�ncias

correlatas, assim como tra�ar medidas e planos de a��o eficazes para o combate de tais

manifesta��es em escala internacional, nacional e regional, de forma a exercer respeito aos

direitos humanos. Resultou dessa confer�ncia a decis�o de construir uma ordem internacional

baseada na inclus�o, justi�a, igualdade e equidade da dignidade humana, compreens�o m�tua

e promo��o e respeito pela diversidade cultural e dos direitos humanos universais e rejeitar

todas as doutrinas de exclus�o baseadas no racismo, discrimina��o racial, xenofobia e

intoler�ncia correlata. Dentre as v�rias recomenda��es derivadas da confer�ncia de Durban,

destaco �quelas das sess�es “Medidas de educa��o e conscientiza��o” e “Acesso � educa��o

sem discrimina��o”, a seguir:

117. Insta os Estados, onde seja necess�rio trabalhar com outros �rg�os, para destinar recursos financeiros para a educa��o anti-racista e para campanhas na m�dia com intuito de promover os valores da aceita��o, toler�ncia, diversidade e respeito pelas culturas de todos os povos ind�genas que vivem dentro de suas fronteiras nacionais. Em particular, os Estados devem promover a compreens�o exata das hist�rias e culturas dos povos ind�genas;

118. Insta que as Na��es Unidas, outras organiza��es internacionais e regionais e os Estados a corrigir a marginaliza��o da contribui��o da �frica para a hist�ria do mundo e

12 Dispon�vel em: http://www.seppir.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2013/01/pesquisa-indica-racismo-entre-principais-crimes-nas-redes-sociais13 -Sources, causes, forms and compensatory manifestations of racism, racial discrimination, xenophobia and related intolerance.- Victims of racism, racial discrimination, xenophobia and related intolerance.- Measures of prevention, education and protection aimed ate the eradication of racism; racial discrimination, xenophobia and related intolerance ate the national, regional and international levels.- Provision of effective remedies, resources, redress, compensatory and other measures at the national, regional and international levels.- Strategies to achieve full and effective equality, including international cooperation and enhancement of United Nations and other international mechanisms in combating racism, racial discrimination, xenophobia and related intolerance, and follow-up.

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15

da civilização através do desenvolvimento e implementação de um programa de pesquisa específico e compreensivo, educação e comunicação em massa para divulgar amplamente uma apresentação equilibrada e objetiva da contribuição seminal e valiosa da África para a humanidade;

122. Insta que os Estados assegurarem a igualdade de acesso à educação para todos na lei e na prática, e abster-se de quaisquer medidas legais ou qualquer outro que levam à segregação racial imposta sob qualquer forma no acesso à escolarização;

124. Insta os Estados a adotar, onde necessário, medidas adequadas para assegurar que pessoas pertencentes a minorias nacionais ou étnicas, religiosas e lingüísticas tenham acesso à educação, sem discriminação de qualquer tipo e, sempre que possível, ter a oportunidade de aprender a sua própria língua, a fim de protegê-los de qualquer forma de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata que estes possam ser submetidos;14

(Durban Declaration, Tradução Nossa)15

A agenda de trabalho derivada da Conferência de Durban, e as obrigações definidas no

ordenamento jurídico brasileiro, em particular nas leis nº 10. 639/2003 e nº 11.645/2008,

representam um real esforço para institucionalizar propostas compreendidas como

fundamentais para combater as diversas manifestações de discriminação racial existentes no

espaço educacional brasileiro. Garantir a inclusão de todos os cidadãos no ambiente escolar

sem que estes sejam marginalizados ou enfrentem abusos ou manifestações preconceituosas

ou racistas é de fundamental importância. A lei garante que todo cidadão brasileiro tenha o

direito de freqüentar a escola, e mais importante, busca garantir condições adequadas de

ensino para que todos esses cidadãos possam ter acesso a um ensino de qualidade. A busca

por uma educação equânime e voltada para a formação de cidadãos que sintam-se inclusos e

orgulhosos de seu pertencimento étnico-racial é um projeto de enorme relevância para o

Brasil e para os demais países no mundo. A implementação de leis como a 10.639/2003 e a lei

14 Dispon�vel em: http://www.un.org/WCAR/durban.pdf15 117. Urges States, where appropriate working with other relevant bodies, to commit financial resources to anti-racism education and to media campaigns promoting the values of acceptance, tolerance, diversity and respect for all the cultures of all indigenous peoples living within their national borders. In particular, States should promote an accurate understanding of the histories and cultures of indigenous peoples;118. Urges the United Nations, other appropriate international and regional organizations and States to redress the marginalization of Africa’s contribution to world history and civilization by developing and implementing a specific and comprehensive program of research, education and mass communication to disseminate widely a balanced and objective presentation of Africa’s seminal and valuable contribution to humanity;122. Urges States to ensure equal access to education for all in law and in practice, and to refrain from any legal or any other measures leading to imposed racial segregation in any form in access to schooling; 124. Urges States to adopt, where applicable, appropriate measures to ensure that persons belonging to national or ethnic, religious and linguistic minorities have access to education without discrimination of any kind and, where possible, have an opportunity to learn their own language in order to protect them from any form of racism, racial discrimination, xenophobia and related intolerance that they may be subjected to;

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11.645/2008 prop�e formar alunos capazes de garantir e valorizar as diversas identidades,

assim como alunos que respeitem e compreendam as demais manifesta��es culturais que

tornam o Brasil �nico pelo seu aspecto multicultural. � tido como fundamental que a

conscientiza��o das singularidades e o combate as intoler�ncias sejam abordados desde a

tenra idade.

Remetermo-nos ao passado e a aprender os signos e significados das culturas, que uma

vez foram negadas por atitudes preconceituosas e discriminat�rias de gera��es passadas, mas

que nunca foram esquecidas e nunca deixaram de existir, significa fazermos parte de uma

caracter�stica que torna o Brasil especial. Todavia, este atributo incompreendido, � um dos

pontos fundamentais a ser abordado nas escolas. Em termos de m�sica, religi�o, dan�a e arte a

presen�a dos africanos, ind�genas e europeus tornou a cultura brasileira muito mais rica do

que seria sem a presen�a desses povos. Por esse e outros motivos essas diversidades culturais,

tidas como fundamentais, devem ser abordadas em �mbito educacional. Dessa forma os

alunos poder�o compreender a pr�pria identidade do seu pa�s, assim estabelecendo uma

rela��o mais proximal com grupos �tnico-raciais, conseq�entemente propiciando uma efetiva

mudan�a comportamental na busca de uma sociedade democr�tica e plural.

IIIOrigens e Significados do Termo Étnico-racial

Nesta se��o, abordarei contextos que levaram � estrutura��o do termo “Rela��es

�tnico-Raciais“, e o porqu� da jun��o de conceitos que foram constru�dos em processos

hist�ricos, sociais, pol�ticos e culturais bem diferentes um do outro, e que no presente

momento encontram-se articulados e de certa forma complementando um ao outro.

Primeiramente � necess�rio que se entenda que o conceito de ra�a historicamente foi

associado a um sentindo biol�gico16, que por sua vez designava que a humanidade era

dividida em seres superiores e seres inferiores. Tais ideais come�aram a surgir por volta do

s�culo XIX, para justificar uma vis�o euroc�ntrica de supremacia cultural e as rela��es de

domina��o entre colonizadores e conquistados. (QUIJANO, 2000 p. 533). Com isso “pr�-

16 Ver Cesare Lombroso.

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conceitos“17 recebendo status de “ci�ncia“, foram utilizados ao longo da hist�ria para

classificar a diversidade humana, apoiando-se na tese do determinismo biol�gico. A

antropometria18, por exemplo, foi muito utilizada como uma ferramenta para identifica��o de

caracter�sticas humanas puramente baseadas em aspectos f�sicos externos.

Durante o s�culo XX surgiram tr�s grandes correntes te�ricas voltadas para teorias

raciais. Dentre elas est�o: a Etnol�gico-Biol�gica19, que entendia que a inferioridade das ra�as

ind�genas e negras estava diretamente correlacionada com as suas diferen�as f�sicas. A

segunda, a Escola Hist�rica20, via a ra�a branca como a “ra�a suprema ariana“ e via a

mesti�agem entre ra�as como um processo de decad�ncia humana. Acreditava-se tamb�m,

que para que grandes civiliza��es se erguessem, era necess�rio que ra�as inferiores fossem

conquistadas. O Determinismo Biol�gico21, a terceira e �ltima escola, acreditava que aspectos

biol�gicos, como por exemplo, os genes de certos indiv�duos, determinariam por completo

como seriam os comportamentos destes indiv�duo futuramente. (REIS, 2011a). No Brasil, o

antrop�logo Raimundo Nina Rodrigues defendeu ideais do Determinismo Biol�gico,

considerados “cient�ficos“ e “modernos“, publicando em 1899, “Mesti�agem,

Degeneresc�ncia e Crime“, onde procurou provar suas teses de que negros e mesti�os teriam

tend�ncias ao crime. Rodrigues em seus escritos afirma o seguinte:

“A criminalidade dos povos mesti�os ou de popula��o mista como a do Brasil � do tipo violento: � um fato que nos parece suficientemente demonstrado. A impulsividade das ra�as inferiores representa certamente um fator de primeira ordem nesse tipo de sua criminalidade, mas se compreende facilmente que a impulsividade criminal pode ser e ser� em grande parte uma simples manifesta��o da anomalia que faz com que os criminosos sejam seres que n�o podem se adaptar, se acomodar ao seu meio social, refrat�rios que s�o � norma social sob a qual deveriam viver.”

(RODRIGUES, 1899 p. 27)

Com as evolu��es ocorridas no campo das ci�ncias, o conceito biol�gico de ra�a foi

plenamente desconstru�do, por�m as marcas deixadas pela antropometria e a ideologia do

17 Neste caso o termo � separado como forma de indicar conceitos pejorativos previamente concebidos antes de um aprofundamento de conhecimento. 18 Antropometria, palavra de origem grega onde anthropos significa “homem” e metron significa “medida“. � entendido como um conjunto de t�cnicas que s�o utilizadas para medir partes do corpo humano. Um dos seus usos preliminares foi para destacar as diferen�as entre ra�as humanas, e foi empregado freq�entemente para se tentar mostrar maneiras em que certas as ra�as eram “inferior“ a outras. Foi muito utilizada na segunda guerra pelos nazistas para distinguir arianos dos judeus.19 Ver Louise Agassiz.20 Ver Joseph Arthur Comte de Gobineau.21 Ver Nina Rodrigues.

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“sangue puro“ e pela classifica��o da esp�cie humana atrav�s da cor da pele e por

caracter�sticas f�sicas, ainda s�o encontrados em manifesta��es discriminat�rias ocorridas nos

dias atuais. Conseq�entemente, ainda nos dias de hoje, h� muitas pessoas que ainda acreditam

fortemente que a ra�a negra e parda continua sendo inferior a dos brancos. (REIS, 2011b).

Atualmente, soci�logos, antrop�logos, psic�logos sociais educadores e o Movimento negro,

tem buscado ressignificar o conceito de ra�a, rejeitando o sentindo biol�gico sedimentado

pela hist�ria. Segundo a docente e pesquisadora Nilma Lino Gomes, atual coordenadora-geral

do Programa A��es Afirmativas na UFMG e do N�cleo de Estudos e Pesquisas sobre

Rela��es Raciais e A��es Afirmativas (NEARA), e membro do Conselho Federal de

Educa��o, o novo conceito de ra�a se baseia na dimens�o social e pol�tica dele. Ela diz:

“O conceito de ra�a � adotado, nessa perspectiva, com um significado pol�tico e identit�rio constru�do com base na an�lise do tipo de racismo que existe no contexto brasileiro, as suas formas de supera��o e considerando as dimens�es hist�rica e cultural a que esse processo complexo nos remete.”(GOMES, 2011a)

Considerando que no Brasil o conceito de ra�a carrega fortes significados e

operacionalidades em �mbitos culturais e na vida social, Nilma Lino Gomes explica que o

fato de que particularidades e caracter�sticas f�sicas serem ainda muito presentes como forma

classificat�ria de quem � negro e de quem � branco no Brasil, demonstra que ainda hoje existe

uma cristaliza��o conceitual arcaica com bases hist�ricas que nos faz enxergar as ra�as. Isso

significa que, aprendemos na cultura e na sociedade a perceber as diferen�as, a comparar, a

classificar. O problema � que tais compara��es n�o levam em considera��o processos

hist�ricos, sociol�gicos e culturais. A quest�o maior, � que dentro desse contexto de

diferencia��o, aprende-se a hierarquizar as classifica��es sociais, raciais, de g�nero, entre

outras. Assim, por conseguinte, aprende-se a tratar as diferen�as n�o como algo positivo, que

nos torna �nicos e pertencentes a diversos n�cleos culturais, mas ao contr�rio, passa-se a

perceber e tratar as diferen�as de forma desigual e preconceituosa.

Mesmo com o conceito de ra�a sendo ressignificado, acabamos presos a caracter�sticas

do determinismo biol�gico, ainda que este j� tenha sido abolido pela biologia e pelos estudos

da gen�tica. Tendo isso em vista, ao agregar o conceito �tnico � express�o rela��es raciais, a

inten��o foi a de enfatizar o conhecimento de que grupos humanos n�o s�o e n�o podem ser

classificados apenas por caracter�sticas f�sicas e biol�gicas. Com base nesses pensamentos

que o conceito de etnia ao se agregar ao novo conceito ressignificado de ra�a, vem com o

objetivo principal de esclarecer que as diferen�as humanas podem ser percebidas por an�lises

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que tamb�m incluem o ato de compreender as tradi��es, a l�ngua, as experi�ncias, as

manifesta��es art�sticas e as origens hist�ricas e culturais que por sua vez, sejam

compartilhadas por determinado grupo social. (GOMES, 2011b). Como se pode observar, o

conceito de etnia traz elementos bastante importantes para an�lises voltadas para o

entendimento da diversifica��o humana, por�m, acredita-se que se tal conceito, caso fosse

desvinculado do conceito ressignificado de ra�a, acabaria sendo insuficiente para um

entendimento amplo e pleno das quest�es concernentes � popula��o negra brasileira,

sobretudo, na educa��o. Segundo Nilma Lino Gomes:

“Para se compreender a realidade do negro brasileiro, n�o somente as caracter�sticas f�sicas e a classifica��o racial devem ser consideradas, mas tamb�m a dimens�o simb�lica, cultural territorial, m�tica, pol�tica e identit�ria. Nesse aspecto, � bom lembrar que nem sempre a forma como a sociedade classifica racialmente uma pessoa corresponde, necessariamente, � forma como ela se v�. O que isso significa? Significa que, para compreendermos as rela��es �tnico-raciais de maneira aprofundada, temos de considerar os processos identit�rios vividos pelos sujeitos, os quais interferem no modo como esses se v�em, identificam-se e falam de si mesmos e do seu pertencimento �tnico-racial.” (GOMES, 2011c)

Para superar o costume de ver as diferen�as e as semelhan�as de forma hierarquizada,

percebendo o mundo de maneira comparativa e dicot�mica, (perfei��es e imperfei��es, aquilo

que � o belo e o que � feio, os inferiores e os superiores, o preto e o branco), um melhor

entendimento das caracter�sticas humanas necessita ser trabalhada e contextualizada

pedagogicamente. A escola tem um papel importante a cumprir, pois uma educa��o que

busque estimular a compreens�o dos alunos em rela��o � hist�ria dos discriminados, por tras

da constru��o e estrutura��o social e cultural brasileira, poder� auxiliar na supera��o de

opini�es racistas e a romper o mito da democracia racial.

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20

IV

Pesquisa e Entrevistas

“Ningu�m nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religi�o. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente ao cora��o humano do seu oposto” 22

-Nelson Mandela

No segundo semestre de 2012 busquei agendar visitas em cinco escolas do Distrito Federal e

cidades do entorno. O objetivo da pesquisa foi investigar a aplicabilidade da educa��o �tnico-racial nas

escolas. A minha vontade inicial foi de realizar entrevistas em escolas pertencentes a diferentes

localidades. Ao iniciar a busca por poss�veis institui��es educacionais que estariam dispostas a

participar da pesquisa, resolvi optar tanto por escolas p�blicas como particulares, assim, a meu ver, os

resultados poderiam ser mais variados, j� que escolas p�blicas e privadas de localidades distintas, teriam

provavelmente alunos de diversas origens, assim como abordagens pedag�gicas diferentes umas das

outras. No inicio da pesquisa entrei em contato com treze escolas, procurei tamb�m diversificar as

entrevistas com professores que atuam em diferentes n�veis da educa��o, como na Educa��o Infantil,

Ensino Fundamental e Ensino M�dio. As institui��es de ensino, por�m, encontravam-se em per�odo de

provas e encerramento das atividades, e por conta deste fator, foi dif�cil encontrar professores que

dispusessem de tempo entre corre��o de provas, trabalhos e planejamentos para o pr�ximo ano letivo.

Devido a essas dificuldades s� foi poss�vel realizar a pesquisa com tr�s professores, cada um pertencente

a uma institui��o educacional com propostas bastante diferentes. Das escolas que participaram da

entrevista pode-se citar: o Col�gio Militar de Bras�lia, a Escola Parque da 307/308 Sul e o Col�gio

Juscelino Kubitschek. Para guiar as entrevistas, resolvi preparar um question�rio contendo quatro

perguntas consideradas por mim fundamentais para arrecadar os dados necess�rios. Esse question�rio

pode ser encontrado nos anexos deste texto. Descrevo a seguir todo o processo realizado durante as

entrevistas:

Entrevista no Col�gio Militar de Bras�lia

22 “No one is born hating another person because of the color of his skin, or his background, or his religion. People must learn to hate, and IF they can learn to hate, they can be taught to love, for love comes more naturally to the human heart than its opposite” – Nelson Mandela, Long Walk to Freedom.

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A primeira institui��o de ensino que visitei foi o Col�gio Militar de Bras�lia.

Chegando l� fui muito bem recebida pela professora de Educa��o Art�stica do ensino

fundamental a professora Adriana, que leciona para as turmas se 6o e 7o ano. Segundo ela, as

aulas de artes para cada turma � resumida em um per�odo por semana de 45 minutos de

dura��o. Quando perguntei se ela tinha conhecimento da exist�ncia da Lei Federal

10.639/2003 ela afirmou que sim. Complementou ainda dizendo que o Col�gio Militar h�

algum tempo tamb�m aborda quest�es envolvidas com a implementa��o da Lei Federal

11.645/2008 voltada ao ensino da cultura e hist�ria ind�genas. Ela me explicou que decidiu

dividir as abordagens dreferentes a cada contexto entre turmas distintas. Com o 6o ano �

abordado o ensino sobre a cultura ind�gena e com o 7o ano � abordado o ensino sobre a cultura

afro-brasileira. Complementou dizendo ainda que realiza muitas atividades integradas com os

cursos de Hist�ria e Geografia. Quando a primeira parte da entrevista foi encerrada, a

professora Adriana me levou at� o espa�o onde s�o realizadas as aulas de artes. Na entrada j�

me deparei com uma placa que informava que o acervo do col�gio havia sido doado pelo Dr.

Octavio Ferreira Lima, ex-presidente da FUNAI em homenagem ao Marechal Rondon23

motivo pelo qual o espa�o cultural do col�gio chama-se Espa�o Cultural Marechal Rondon.

Ao entrar me deparei com muitos artefatos ind�genas. Entre eles estavam: cer�micas, cocares,

cestas, lan�as, vasos, redes, chocalhos, pentes, esteiras e muitos outros objetos. Professora

Adriana me explicou que todos esses objetos ficam a disposi��o dos alunos. Segundo ela, os

alunos estudam os artefatos, podendo ver as diferentes origens de cada objeto e perceber as

distintas caracter�sticas de tra�os, t�cnicas e desenhos que cada tribo imprime na manufatura

desses artefatos. Perguntei qual era o material did�tico utilizado nas aulas de artes e a

professora Adriana me respondeu que a maior parte desse material � produzido por ela e

transformado em apostilas. Quanto ao estudo da Hist�ria da Arte o livro utilizado para

consultas � “Descobrindo a Hist�ria da Arte” de autoria de Gra�a Proen�a. A professora

Adriana completou a pergunta dizendo que em fun��o das aulas de arte serem somente uma

vez por semana, “fica muito difícil seguir o conteúdo de um livro didático”, por isso quando

ela n�o usa a apostila, ela prepara de antem�o o assunto a ser abordado e procura reservar

mais tempo para a produ��o art�stica. Muitos dos trabalhos dos alunos s�o postos em

exposi��o pelo col�gio.

23 Cândido Mariano da Silva Rondon foi norteador da política indigenista do Brasil. Fundou e dirigiu o Serviço de Proteção aos Índios (SPI), hoje, Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

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22

Ao final da entrevista perguntei se eles celebravam o dia da Consci�ncia Negra, tendo em

vista que segundo o artigo 79-B da LDB, o calend�rio escolar deve incluir o dia 20 de

Novembro como o Dia Nacional da Consci�ncia Negra. Adriana me informou que o Col�gio

Militar destina uma semana de atividades voltadas � celebra��o deste dia, e que no ano letivo

de 2012 o Ensino M�dio realizou uma exposi��o abordando quest�es contempor�neas como o

racismo, temas que tamb�m foram tratados nas aulas de Sociologia e Filosofia. Minha �ltima

pergunta foi se ela j� havia presenciado algum ato racista no col�gio, e ela respondeu

negativamente alegando que bom comportamento, cordialidade e respeito � muito cobrado

aos alunos do Col�gio Militar. Ao final da entrevista a professora me indagou sobre cursos

para forma��o continuada para professores, j� que ela nunca tinha feito um, e percebeu a

import�ncia de se manter atualizada.

Entrevista na Escola Parque da 307/308 Sul

A segunda escola que visitei foi a Escola Parque da 307/308 Sul. Chegando l� vi que

muitos professores encontravam-se ocupados com o encerramento do semestre. Depois de

muitas tentativas, por fim consegui conversar com uma das professoras de artes da Educa��o

Infantil, a professora Ver�nica. Enquanto a professora colocava os trabalhos dos alunos em

pastas eu ia lhe fazendo perguntas para a entrevista. A primeira pergunta que fiz � professora

foi se ela gostava de trabalhar na Escola Parque. Ela respondeu que sim, que � uma escola

diferente de todas as outras que ela havia trabalhado, justamente por ter o ensino das artes

como uma de suas prioridades pedag�gicas. Ela complementou dizendo que l� as crian�as s�o

diferentes por serem estimuladas a serem criativas e incentivadas a valorizar as diferen�as.

Em seguida, aproveitando o que ela havia acabado de me dizer, perguntei se ela

conhecia a Lei Federal 10.639/2003. Ela respondeu que “já tinha ouvido falar”, mas que n�o

conhecia suas especifica��es. Neste momento eu delineei quais eram as principais atribui��es

e objetivos a serem alcan�ados com a implementa��o da Lei. Ver�nica concluiu que mesmo

que o col�gio n�o abordasse especificamente a implementa��o da Lei Federal 10.639/2003, a

Escola Parque j� trabalhava com temas voltados a compreens�o da diversidade e combate ao

racismo. Ela afirmou que o col�gio era um espa�o onde o bullying acontecia ocasionalmente,

principalmente com as crian�as mais novas, e que um dos princ�pios da Escola Parque era

combater qualquer tipo de injusti�a que acontecesse no espa�o escolar. Perguntei se ela j�

havia presenciado algum epis�dio de discrimina��o racial, e ela respondeu afirmativamente.

Disse ainda que as crian�as que apresentavam esse tipo de atitude, geralmente refletiam os

comportamentos aprendidos em casa. Em seguida perguntei qual era o material did�tico

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23

utilizado em sala de aula, e ela me respondeu que a escola possui muitos livros did�ticos que

podem ser usados por todos os professores, mas que a maioria deles prefere preparar o pr�prio

material em casa. Ao final da entrevista, perguntei se eles haviam celebrado o Dia Nacional

da Consci�ncia Negra. A professora Ver�nica me informou, que em sua aula n�o foi abordado

nenhum tema quanto � celebra��o dessa data, mas que uma das professoras de teatro havia

realizado uma pe�a que abordava as origens hist�ricas desse dia. Por fim, perguntei se a

professora Ver�nica j� havia feito algum curso para forma��o continuada e ela respondeu

negativamente, e que nem conhecia espa�os que ofereciam tais cursos.

Entrevista no Col�gio Juscelino Kubitschek

A terceira e �ltima escola que visitei foi o col�gio JK. Para minha surpresa o professor

de artes do Ensino M�dio com quem realizei a pesquisa foi um colega de faculdade que

acabara de se formar no curso de Licenciatura em Artes Pl�sticas, o professor Wilson.

Perguntei quanto tempo ele estava trabalhando no col�gio JK e ele me respondeu que

lecionava Artes para o Ensino M�dio havia um ano. Em seguida perguntei se ele conhecia a

Lei Federal 10.639/2003, e, para minha surpresa, ele respondeu que “nunca nem tinha ouvido

falar nela”. Reservei um tempo e expliquei para ele quais eram as propostas e objetivos a

serem alcan�ados com a implementa��o da Lei Federal 10.639/2003, e como era importante

que ele dedicasse algum tempo para conhecer melhor as a��es que est�o sendo tomadas para

se combater o preconceito e a discrimina��o racial no ambiente escolar, em particular no

tocante aos conte�dos de Hist�ria e Cultura Afro-Brasileira que devem ser ministrados em

especial nas �reas de Educa��o Art�stica, Literatura e Hist�ria.

No decorrer da entrevista eu indaguei se a escola teria em seu Projeto Pol�tico

Pedag�gico (PPP) algum projeto que trabalhasse no �mbito das rela��es �tnico-raciais no

�mbito do espa�o escolar, e se ele tinha espa�o para abordar tais temas em sala de aula. Ent�o

ele me respondeu o seguinte:

“Para que eu aborde temas �tnico-raciais ou voltados para Cultura afro-brasileira em sala de aula, tais temas teriam que estar sendo cobrados no PAS ou no vestibular. Principalmente quando se trata do Ensino M�dio. Os pais dos alunos s� querem que osprofessores ensinem aos seus filhos como passar nas provas. E tudo que o col�gio quer, � agradar aos pais para garantir a perman�ncia dos alunos na escola”.

Ao final da entrevista perguntei ao professor Wilson, qual material era usado em sala

de aula. Ele respondeu que o col�gio n�o adotava nenhum livro did�tico para as artes, e que o

material era todo preparado por ele. Em seguida ele completou dizendo que diariamente

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24

depois da aula ele entregava um di�rio preenchido, onde todo conte�do ensinado em sala de

aula era anotado. A observa��o do professor ao preenchimento do di�rio se baseava no fato de

este ser o instrumento que a escola utilizava para verificar se os planos de aula pr�-

estabelecidos estavam sendo seguidos e se o professor estaria aplicando os conte�dos

“corretos“ para as turma de Ensino M�dio.

Considera��es sobre as entrevistas

Para uma lei sancionada no ano de 2003, o processo de inclus�o das diretrizes

estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educa��o voltadas ao ensino �tnico-racial, ocorre a

passos lentos. Ap�s encontrar-se em vigor h� uma d�cada, muitos professores ainda n�o tem

conhecimento da exist�ncia da Lei Federal 10.639/2003 e muito menos da Lei Federal

11.645/2008. Embora o n�mero de entrevistas realizadas tenha sido inferior ao desej�vel, essa

pequena amostra nos d� ind�cios para afirmar que a implementa��o dos dispositivos da Lei

Federal n� 10.639/2003 est� longe de ser considerada satisfat�ria. Se considerarmos que todas

as tr�s escolas entrevistadas est�o localizadas no plano piloto, ou seja, no centro da capital do

Pa�s, e que destas somente uma demonstrou familiaridade com a educa��o das rela��es

�tnico-raciais e estava minimamente estruturada para abordar a tem�tica, � de se supor que o

n�vel de informa��o e preparo das escolas mais distantes do centro pol�tico do pa�s seja ainda

menor. Assim, verifica-se que a realidade do ensino �tnico-racial no Brasil est� insipiente e

que sua institucionaliza��o necessita de a��es decisivas de governo.

V

Ações do MEC e demais secretarias

Tendo em vista os temas citados anteriormente, podemos concluir que historicamente

existe uma enorme disparidade entre a disponibilidade de oportunidades entre brancos e

negros, principalmente quando se trata de educa��o e mercado de trabalho. Diante desses

fatos, muitos professores, pesquisadores e integrantes do movimento negro, v�m buscando

maneiras de desmistificar o mito da democracia racial e procuram formas diversificadas de

atender aos anseios da popula��o afro-brasileira. Ao se analisar os indicadores educacionais

evidencia-se como a situa��o da popula��o negra se distancia muito da popula��o branca.

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Segundo relatório apresentado em 2005 pelo Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD), o percentual de negros formados nas universidades no ano de

2000 é igual ao percentual de brancos formados em 1960. O relatório cita que em 1960,

somente 1,8% das pessoas brancas acima de 30 anos havia conseguido obter o diploma de

nível superior. Quarenta anos depois, em 2000, o percentual de brancos com diploma de nível

superior havia avançado para 11,8% e para 2,9% entre os negros. Vê-se que existe uma

defasagem de 40 anos entre negros e brancos que concluíram o ensino superior (LOPES, 2010

p. 200). Considerando que o sistema educacional superior brasileiro teve um considerável

crescimento, tendo dobrado o número de alunos matriculados em cursos superiores entre os

anos de 1991 e 2000, fica claro como há um problema de inclusão da população negra no

ensino universitário brasileiro.

Ainda sobre o acesso a educação pode-se citar que, segundo dados arrecadados pelo

IBGE em 2006, constata-se que a população negra constitui a maioria das que estão fora da

escola em todas as faixas etárias. Pode-se destacar a disparidade na faixa etária dos 7 aos 14

anos de idade onde 2,39% das crianças negras está fora da escola, e para crianças brancas de

mesma faixa etária o percentual é de 1%. Entre alunos de 15 e 17 anos, o percentual de

pessoas negras fora da escola é de 6,02%, o dobro de brancos que representam 3,7%. Já na

faixa etária dos 18 aos 24 anos, os negros representam 46% e os brancos 39%. (IBGE/PNAD,

2006 apud Ipea/ Disoc/ Ninsoc ).

Tendo esses e demais outros problemas históricos da educação brasileira em vista, o

Ministério da Educação (MEC) cria em 2004 a Secretaria de Educação Continuada,

Alfabetização e Diversidade (SECAD), atualmente SECADI. Secretaria esta que tem como

objetivo principal trabalhar propostas voltadas a reverter os altos níveis de o analfabetismo e

suprir as limitadas oportunidades de educação para jovens e adultos que não tiveram acesso à

escola. Além deste objetivo o MEC busca, por intermédio da SECADI, formas de articular

práticas sociais que visam à promoção de cidadania e também a valorização da diversidade.

Neste sentido procura-se oferecer apoio às populações que vivem em situações sócias

vulneráveis, entre elas, a população negra.

Neste contexto o MEC através da SECADI tem desenvolvido diversas ações voltadas

para assegurar a implementação da Lei Federal 10.639/03, assim como apoiar o pleno

desenvolvimento das Diretrizes Curriculares Nacionais voltadas para Educação das Relações

Étnico-raciais. Desenvolve e produz-se em parceria com os Núcleos de Estudos Afro-

Brasileiros (NEABs) materiais didáticos distribuídos através de diversos formatos e mídias

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26

(livros, revistas, v�deos, CDs, etc.) voltados a tratar de temas �tnico-raciais, e dispoe para isso

de apoio inclusive financeiro direcionado � execu��o de tais a��es.

Dentre as demais a��es assumidas pelo MEC pode-se citar a realiza��o de F�runs

Estaduais com o objetivo de articular secretarias estaduais e municipais de educa��o com

n�cleos de estudos afro-brasileiros (NEAB’s) e organiza��es do movimento negro. Visa-se

por meio de tal medida possibilitar uma maior troca de conhecimentos e experi�ncias entre

esses n�cleos e atores do campo da educa��o. Estes f�runs tem como meta difundir

informa��es mais objetivas e claras sobre como abordar a educa��o �tnico-racial nas escolas,

e assim incentivar a��es que combatam o preconceito o racial.

Uma a��o muito distinta e inovadora tomada pelo MEC ser� concretizada na cria��o

do Programa Brasil Quilombola, em conjunto com a Secretaria de Pol�ticas de Promo��o da

Igualdade Racial (SEPPIR-PR)24. Pretende-se por meio deste programa prestar apoio t�cnico

e financeiro para prefeituras que administram �reas nas quais se situam comunidades

remanescentes de quilombos. Tal apoio ser� destinado a promover a elabora��o de curr�culos

e m�todos educacionais que atendam as necessidades espec�ficas dessas comunidades. Neste

sentido, visa-se construir uma educa��o continuada nessas �reas que seja destitu�da das

estritas obriga��es curriculares institucionalizadas no �mbito nacional. Desta forma dota-se

estes institutos educacionais de autonomia para construir uma educa��o mais compreensiva e

adequada ao ambiente no qual estes alunos est�o inseridos. Alunos dessas �reas ser�o

educados em temas referentes � sua pr�pria cultura. Neste sentido busca-se ampliar a estrutura

f�sica escolar, formar professores qualificados e possibilitar a aquisi��o de material did�tico

espec�fico para essas �reas.

Outras unidades do MEC tamb�m promovem a��es que por sua vez trabalham �reas

mais especificas, mas que tem ainda como principal objetivo assegurar a implementa��o das

Diretrizes Curriculares Nacionais voltadas para a Educa��o das Rela��es �tnico-raciais. Entre

estas distintas unidades distribuem-se responsabilidades que cada centro deve desenvolver

independentemente. Cada n�cleo ent�o trabalha propostas e a��es distintas que aplicadas em

conjunto, constituem o plano de a��o integrado de promo��o da educa��o �tnico-racial no

Brasil. Isto significa que, apesar de cada n�cleo ter suas responsabilidades independentes, o

conjunto de a��es tomadas por estes trabalham para um �nico objetivo. Desta maneira cada

uma dessas inst�ncias forma centros que articulam-se com o Minist�rio da Educa��o e a

24 A Secretaria de Promoção da Igualdade Racial foi criada no âmbito da Presidência da República pela Medida Provisória no 111, de 21 de março de 2003, convertida na Lei 10.678 do mesmo ano.

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27

Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, para constituir um

plano de ação mais eficaz.

A primeira, instancia, a Secretaria de Educação Básica (SEB), zela pela Educação

Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Essa secretaria desenvolveu alguns programas

que visam pela orientação e inclusão de crianças e jovens no espaço escolar. O Programa

Ética25 por exemplo, tem como objetivo construir valores na escola, de forma a consolidar

práticas que conduzem à solidariedade humana, à convivência social além de difundir os

princípios da vida cidadã. Fóruns Escolares de Ética e de Cidadania são criados e elaborados

conforme a realidade de cada escola e sua comunidade. Para que o programa funcione de

forma eficaz, é importante não só a participação de professores e alunos, mas de pais e de

toda a comunidade. Porém para que o programa se inicie em cada espaço escolar, cabe às

escolas e aos seus profissionais assumir a responsabilidade e o interesse de protagonizar tais

medidas.

A segunda secretaria a desenvolver política pública com foco na diversidade humana é

a Secretaria de Educação Superior (SeSu). Esta por sua vez desenvolve em parceria com a

SECADI dois programas: O primeiro chama-se Programa Universidade Para Todos

(ProUni)26, institucionalizado pela Lei no 11.096 em 13 de janeiro de 2005. Esse programa

tem como finalidade oferecer bolsas de estudo para cursos do ensino superior a estudantes

afro-brasileiros e alunos egressos de escolas da rede pública. Os candidatos são selecionados a

partir das notas obtidas no Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), sendo a inclusão de

cada aluno advindo de seu próprio mérito e de seus desempenhos acadêmicos. Segundo

informações retiradas do site do ProUni, o programa já atendeu desde sua criação, mais de 1

milhão de estudantes.

O segundo programa desenvolvido pela SeSu chama-se Uniafro27, Programa de Ações

Afirmativas da população afro-brasileira. Através da Resolução CD/FNDE no14, de 28 de

abril de 2008, o MEC instituiu critérios para auxiliar financeiramente instituições de educação

superior para que estas executem ações voltadas para a formação inicial e continuada de

professores da educação básica. Outro objetivo do programa é fortalecer e apoiar propostas

que visam a produção e difusão de conhecimentos sobre a temática étnico-racial nos diversos

núcleos de estudos afro-brasileiros das universidades públicas estaduais e federais. Este

25 Disponível em: <http://portal.mec.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13607>26 Disponível em: <http://prouniportal.mec.gov.br/ >27 Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=86&id=12260&option=com_content&view=article>

Page 28: Arte/Educação das Relações Étnico-raciaisbdm.unb.br/bitstream/10483/6594/1/2013_SophiaEgler.pdf · o conceito de etnia, estabelecendo assim uma completude teórica e conceitual

28

programa visa ainda pelo acesso e permanência da população afro-brasileira no ensino

superior.

Por último, gostaria de citar a Secretaria de Educação a Distância (Seed)28, que por sua

vez oferece cursos e programas de formação a distancia por via de desenvolvimento e

distribuição de mídias educacionais tecnológicas. O programa TV/DVD Escola, por exemplo,

distribui caixas com mídias a escolas públicas da educação básica. Cada caixa contém

aproximadamente 150 horas de programação produzida pela TV Escola29. Segundo dados

mostrados no texto Contribuições para implementação da Lei 10.639/2003 (p.21), esse

programa distribuiu em Julho de 2007, cinco títulos sobre história e cultura afro-brasileira à

75 mil escolas.

Neste capitulo, foram apresentadas as principais políticas públicas adotadas em

relação à questão étnico-racial que o Governo Federal vem adotando por intermédio do

MEC/SECADI e da SEPPIR-PR. Muitos profissionais da educação alegam desconhecer os

parâmetros da Lei 10.639/2003, segundo estes, falta de divulgação. A partir das pesquisas

apresentadas vê-se, todavia, que tal argumento não se sustenta inteiramente. Além de

estimular a organização de fóruns, publicar e distribuir materiais didáticos e investir em

iniciativas de formação continuada de professores, o MEC tem publicado e distribuído livros

e artigos sobre as questões envolvidas na aplicação da Lei 10.639/2003. Talvez o que falte

para que tais ações sejam mais bem disseminadas em escala nacional é serem assumidas de

forma sistêmica pelo conjunto das secretarias do MEC. Porém, cabe também aos professores

e profissionais da educação a responsabilidade de buscarem formas de se manterem

atualizados quanto aos novos caminhos tomados pela educação nacional. Um bom professor

deve sempre buscar novos cursos de formação continuada, de forma a sempre se manter em

dia com novas abordagens e práticas educacionais.

É de fundamental importância, todavia, que o Estado assuma responsabilidades para

assegurar que escolas estejam cumprindo com o que é demandado por lei. É também de dever

do Estado certificar-se que o material didático específico para ensino das relações étnico-

raciais seja produzido, renovado e distribuído. Ademais, é também responsabilidade deste

garantir que a capacitação de professores continue sendo realizada em escala nacional. É de

conhecimento público as dificuldades e as diversas responsabilidades que são assumidas por

28 A Seed foi criada por decreto presidencial (Decreto nº 1.917/1996) e seus programas e ações vieram a ficar vinculados à SECADI a partir de sua extinção.29 A TV Escola por sua vez, é um canal produzido pelo Ministério da Educação que pode ser utilizado como uma ferramenta pedagógica podendo assim auxiliar o professor, seja para complementar sua própria formação ou para ser utilizada dentro da sala de aula para apoiar suas práticas de ensino.

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29

professores e, por mais que estes procurem se especializar e introduzir temas �tnico-raciais

em sala de aula, � necess�rio que haja um auxilio por parte do Estado para que as medidas da

Lei Federal 10.639/2003 sejam implementadas. Implementar grandes mudan�as � tarefa

�rdua, j� que projetos como esse dependem muito de uma boa gest�o, participa��o e

colabora��o de muitos.

VI

Formação Continuada e Material Didático

Nesta sess�o do trabalho, abordam-se as a��es tomadas pelo MEC, SECADI,

UNESCO, Uniafro e NEAB’S, para promover a forma��o continuada presencial, a forma��o

continuada a dist�ncia e a produ��o e publica��o de material did�tico voltado para a

promo��o da educa��o das rela��es �tnico-raciais. O projeto de forma��o continuada para

professores foi desenvolvido com o objetivo de promover uma educa��o especializada e

voltada para uma melhor compreens�o de como abordar o ensino das rela��es �tnico-raciais.

A forma��o continuada presencial de professores e educadores foi desenvolvida pelo

Programa Uniafro e coordenado pelos NEAB’S. Segundo dados publicados pelo Plano

Nacional de Implementa��o das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educa��o das

Rela��es �tnico-raciais e para o Ensino de Hist�ria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, em

2007 e 2008 o programa da Uniafro promoveu 1.245 Especializa��es e 1.470

Aperfei�oamentos e Extens�es. O N�cleo de Estudos Afro-Brasileiros da UnB, vinculado ao

Centro de Estudos Avan�ados Multidisciplinares foi um dos contemplados. Entre os anos

2005 a 2008, o programa recebeu um investimento financeiro do MEC de mais de R$ 5

milh�es, e al�m de promover a educa��o continuada, tamb�m desenvolveu a��es de pesquisa,

semin�rios e publica��es acad�micas. Nos anos de 2006 e 2007 a forma��o continuada de

professores a dist�ncia foi realizada no curso Educa��o-Africanidades-Brasil, desenvolvido

pela UnB, e Hist�ria da Cultura Afro-Brasileira e Africana, desenvolvido pela �gere30. Esse

projeto segundo dados publicados pelo Plano Nacional de Implementa��o das Diretrizes

Curriculares Nacionais para Educa��o das Rela��es �tnico-raciais e para o Ensino de Hist�ria

e Cultura Afro-Brasileira e Africana, beneficiou mais de 10.000 professores da rede p�blica.

30 A Ágere, é uma organização sem fins lucrativos que, através de parcerias com diferentes organizações, auxilia ações para implementação de políticas públicas e para justiça social.

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30

No ano de 2006, outro plano ofertou oficinas de Cartografia sobre Geografia Afro-

Brasileira e Africana31. Uma promo��o de Centro de Cartografia Aplicada de Informa��o

Geogr�fica, vinculado ao Departamento de Geografia da UnB. Esse projeto tem como

objetivo ampliar o conhecimento de alunos, professores e educadores para que estes

compreendam melhor as estruturas espaciais existentes na forma��o do Brasil e de sua

popula��o. Tomando por base aspectos geogr�ficos da heran�a africana no territ�rio

brasileiro, a a��o tamb�m visa introduzir e resgatar o conhecimento sobre o continente

africano e suas influ�ncias para a forma��o da cultura brasileira. Tal projeto, at� o ano de

2006, beneficiou 4.000 educadores em 7 estados da federa��o, assim como 214 alunos de

universidades estaduais e federais e 10.647 professores.

Imagem I. Exposi��o Itinerante: O Brasil Africano: Di�spora – Quilombos – Territ�rio - Popula��o

31 Dispon�vel em: < http://www.ciga.unb.br/>

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31

Segue abaixo uma tabela que mostra projetos, programas e oficinas executados para a

formação continuada de professores. A tabela também mostra o período em que esses projetos

ocorreram, a carga horária, as metas de formação e os resultados alcançados:

Tabela I. Projetos e programas

Com o propósito de divulgar e melhor implementar abordagens pedagógicas que

visam pelo ensino étnico-racial nas escolas, concentram-se esforços que buscam investir em

iniciativas de formação continuada para professores e educadores. Em 2005, um milhão de

exemplares da cartilha das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação das Relações

Étnico-raciais foram publicadas e distribuídas pelo MEC a todos os sistemas de ensino no

território nacional. Entre os anos de 2005 a 2007, a SECADI em conjunto com a UNESCO,

produziu e distribuiu 29 títulos da Coleção Educação para Todos, dos quais 6 desses títulos

tratam diretamente da implementação da Lei Federal 10.639/2003.

Em 2007, o MEC e a SECADI traduziram a coleção História Geral da África,

material produzido pela UNESCO, composto por oito volumes, que abordam a história da

África a partir de uma visão interna do continente. A narrativa atravessa diversos períodos

históricos marcantes como a pré-história, a colonização européia, o trafico de escravos, a

independência de diversos países, entre outros. Ao destacar-se a África como o berço da

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32

humanidade, o material também aborda todas as contribuições africanas que originaram e

proporcionaram interações sociais e culturais com demais países. A coleção completa pode

ser obtida por download nas páginas da UNESCO e do MEC, na internet32.

Imagem II. Coleção História Geral da África

No ano de 2008, o MEC em parceria com a SECADI, publicou e produziu dois

materiais didáticos específicos, propostos para serem utilizados nas escolas, com o objetivo de

auxiliar professores na implementação da Lei Federal 10.639/2003. Foram produzidos e

distribuídos os seguintes materiais: o livro Estórias Quilombolas e o jogo de tabuleiro de

origem africana Yoté33.

Outro material didático que tem como objetivo auxiliar professores foi produzido em

parceria com a Fundação Roberto Marinho. Segundo estatísticas apresentadas pelo MEC, kits

do material A Cor da Cultura já capacitaram 3.000 educadores. Hoje, o programa A Cor da

Cultura disponibiliza diversos materiais gratuitamente pelo seu sitio na internet34. No

endereço eletrônico é possível encontrar diversos artigos que abordam questões e pesquisas a

respeito da implementação, da história e da aplicabilidade da Lei Federal 10.639/2003, entre

32 Disponível em: <http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/about-this-office/single-view/news/general_history_of_africa_collection_in_portuguese-1/>33 Yoté é um jogo de tabuleiro de origem africana. O objetivo é capturar ou bloquear todas as peças do adversário. Vence aquele que capturar todas as peças do adversário ou as bloquear de forma que não haja mais possibilidade de movimento. Este jogo ajuda a desenvolver o raciocínio, a observação e a criatividade.34 Disponível em: <http://www.acordacultura.org.br/pagina/Kit%20a%20Cor%20da%20Cultura>

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33

outros assuntos correlacionados. Pode-se encontrar na seção Kit A Cor da Cultura, 6 cadernos

que abordam diversos temas que, por sua vez, podem ser trabalhados dentro da sala de aula

com os alunos. Dentre os 6 cadernos, 3 são de texto, 2 são cadernos de atividades e

brincadeiras e o último é composto por material que trabalha os significados de palavras de

origem indígenas e africanas.

Imagem III. Kit A Cor da Cultura

Além desse material, pode-se encontrar o CD Congê, que contém faixas musicais e

exemplos sonoros de diversos instrumentos como o atabaque, o reco reco de mola, o xequrê, a

alfaia e o caxixi. Todo esse material está disponível para download. No sítio também pode-se

encontrar links de cinco outros programas que direcionam o internauta até outros sítios com

projetos e propostas diferentes, mas focalizados ainda nos conteúdos da educação das relações

étnico-raciais. Dentre eles estão:

Livros Animados: Este programa é voltado para crianças e trabalha em parceria com a TV

Futura, que produz historinhas animadas que abordam temas como a igualdade e a

diversidade. No site do programa pode-se encontrar também jogos como o Tocando Junto,

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34

onde as crian�as tem a oportunidade de conhecer os diferentes instrumentos de origem

africana e o jogo Fui à África e vi..., jogo de mem�ria com animais do continente africano.

Heróis de Todo Mundo: Este programa trabalha com a identifica��o de her�is nacionais

negros. No sítio encontram-se as hist�rias e v�deos, que por sua vez podem ser trabalhados e

passados em sala de aula. Alguns dos personagens que podem ser encontrados no site s�o:

Ant�nio Francisco Lisboa, O Aleijadinho (1730-1814), Cruz e Sousa (1861-1898), Elizeth

Cardoso (1920-1990), Chiquinha Gonzaga (1847-1935), M�e Aninha, Yalorix� (1869-1938),

Paulo da Portela (1901- 1949), entre v�rios outros.

Nota 10: No site do Nota 10, pode-se encontrar 11 sess�es, cada uma contendo textos que

abordam os temas de seus t�tulos. Esses textos podem auxiliar professores com conte�dos

pedag�gicos. Os t�tulos presentes no sítio s�o: África no currículo escolar, Material Didático,

Igualdade de tratamento e oportunidades, Corpo, Religiosidade e Cultura, Educação Infantil,

Religiosidade, Educação Quilombola, Identidade, Multidisciplinaridade e, por �ltimo, Arte.

Ação: Este programa Ação/ A Cor da Cultura, mostra iniciativas de pessoas e diferentes

organiza��es que buscaram fazer a diferen�a, doando seu tempo, disseminando seu

conhecimento, suas experi�ncias e prestando ajuda, muitas vezes volunt�ria. No sítio �

poss�vel ler e conhecer essas hist�rias, al�m de conhecer institui��es e pessoas que realizam

esses trabalhos para um bem comum.

Mojubá: Este projeto, assim como o nota 10, apresenta 12 sess�es. Cada uma contem textos

que podem auxiliar professores assim como disponibilizar material did�tico pedag�gico e

temas para serem discutidos em sala de aula. Dentre os t�tulos presentes no sítio est�o:

Origens, Fé, Meio Ambiente e Saúde, Influências, Literatura e Oralidade, Quilombos,

Comunidades e Festas, História e Geografia, Beleza, Ciência e Tecnologia, Tradição Oral e

por �ltimo, Famílias.

Desde que a Lei Federal 10.639/2003 foi sancionada, muitos f�runs, projetos e

programas foram elaborados para garantir o sucesso da implementa��o desta lei. Como

descrito anteriormente, existem cursos especializados para a forma��o continuada de

professores, assim como uma grande variedade de publica��es de materiais did�ticos de

qualidade e de f�cil acesso, que podem auxiliar professores com o ensino �tnico-racial nas

escolas. Percebe-se, que o MEC, a SECADI, a SEPPIR-PR, os NEAB’s, a UNESCO, assim

como demais profissionais da educa��o e participantes do movimento negro, tem realizado

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ações de grande importância, empenhando práticas afirmativas a fim de garantir a

reestruturação da educação brasileira voltada para um ensino mais justo. É de extrema

importância propor caminhos que fortaleçam a solidariedade, o respeito e a compreensão dos

estudantes para com a história e a organização cultural africana, e suas contribuições para a

formação histórica, social e cultural brasileira.

Na Universidade de Brasília, por exemplo, o currículo do curso de Educação em Artes

Visuais atualmente passa por transformações. Professores do Instituto de Artes perceberam

que atualizações necessitavam ser realizadas, já que cada vez mais é exigido maior

completude dos profissionais da educação. Hoje, ser professor é estar sobretudo

comprometido com as transformações da sociedade, e como a sociedade muda cada vez mais

rápido, é o dever do educador constantemente se especializar e se atualizar constantemente.

Tendo isso em vista, professores do Instituto de Artes resolveram incluir disciplinas que

abrangem temas étnico-raciais ao currículo. Estes temas foram distribuídos em um grupo

denominado de Estudo das Visualidades, que se subdivide em duas disciplinas intituladas

Visualidades Afro-Brasileiras e Visualidades Indígenas.(FPP/LAV, 2011) O objetivo de

incluir essas disciplinas é justamente especializar futuros professores para assim proporcionar

um melhor conhecimento para abordarem temas da cultura afro-brasileira e indígena no

campo da Arte/Educação.

Por mais que essas ações procurem atingir um esclarecimento em aplicabilidade em

âmbito nacional, percebe-se que ainda há necessidades de ampliar o diálogo para que a

implementação de uma educação étnico-racial no Brasil aconteça. Estabelecer a

obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena em todos os

estabelecimentos de ensino é um grande desafio, já que essa ação depende de uma série de

outras: domínio conceitual de professores, reestruturação e ampliação de Fóruns de Educação

e Diversidade, constante produção e atualização de material didático, controle estadual da

aplicação correta do ensino étnico-racial nas escolas, e participação social da gestão escolar.

Estes são exemplos de fatores cruciais para o sucesso deste objetivo.

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36

Considerações Finais

Desde que a Educa��o Art�stica foi introduzida no curr�culo escolar pela Lei

5.692/1971, houve diversas tentativas e propostas para melhor desenvolver o ensino das Arte

nas escolas brasileiras. A Arte/Educa��o apresenta um movimento significativo que busca

novas pr�ticas docentes e metodologias de ensino e aprendizagem de arte nas escolas.

Procura-se com isso constituir um m�todo eficiente, duradouro e eficaz onde o aluno seja

capaz de desenvolver-se pessoalmente, socialmente e culturalmente, por meio de experi�ncias

e aquisi��o do conhecimento art�stico.

Outro fator relevante a ser considerado � a diferen�a cultural e social existente entre os

grupos de alunos que comp�em, tanto institui��es p�blicas, como privadas. Assim, considera-

se indispens�vel abordar em sala de aula diferentes temas art�sticos e explorar em conjunto o

multiculturalismo35, na sua vertente critica, para que assim se introduza aos educandos a o

conhecimento que lhes d� a oportunidade de respeitar e apreciar as diversas formas de

express�o das culturas africanas e afro-brasileiras. Levando em considera��o o 2� Par�grafo

da Lei Federal 10.639/2003, pode-se deduzir como a Arte/Educa��o deve servir para

aprofundar a rela��o entre o aluno e os v�rios elementos culturais agora obrigat�rios por lei.

A Arte/Educa��o cada vez mais vem abrindo caminhos e firmando-se no espa�o

educacional como curso essencial para um melhor desenvolvimento do imagin�rio, da

criatividade, da expressividade pessoal, al�m de proporcionar o contato com culturas

diversificadas. “A Educa��o poderia ser o mais eficiente caminho para se estimular a

consci�ncia cultural do indiv�duo, come�ando pelo reconhecimento e aprecia��o da cultura

local”. (Barbosa, 1998, p. 13). As produ��es art�sticas (m�sica, dan�a, literatura, arte,

artesanato, etc.), de qualquer sociedade humana constituem-se em elementos importantes para

a valoriza��o da cultura.

Considerando que uma sala de aula pode ser composta por alunos pertencentes a

diferentes regi�es poder-se-ia abrir uma discuss�o em grupo sobre as caracter�sticas distintas

de cada uma de suas culturas. Desta forma poderiam ser discutidos valores sociais e est�ticos

assim como religiosidades e cren�as. Um ponto fundamental em um mundo cada vez mais

integrado, onde as fronteiras nacionais n�o mais significam barreiras intranspon�veis das

35 Multiculturalismo- Existência de muitas culturas numa localidade, cidade ou país.

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rela��es humanas, � a capacidade de conseguir integrar-se com diferentes culturas. A

capacidade do aluno de conseguir interagir com esses distintos pontos de vista, respeitando-

os, mas mesmo assim conseguindo adaptar seus costumes a elas � um meio de se atingir um

est�gio de flu�da transmiss�o de conhecimento. As tentativas de estabelecer arenas p�blicas

de discuss�o podem ser favorecidas em um mundo onde cada vez mais, a empatia, o respeito

e o conhecimento do outro s�o essenciais na forma��o do indiv�duo.

A import�ncia do tema “multiculturalismo” foi recentemente demonstrado no esfor�o

do Minist�rio da Educa��o que aprovou a obrigatoriedade do ensino da Hist�ria e Culturas

Afro-Brasileiras, Africanas e Ind�genas no curr�culo escolar. Tal medida do Governo Federal

� um grande avan�o para o antiquado curr�culo escolar brasileiro. As culturas ind�gena e

africana s�o, afinal, estruturantes da atual composi��o social brasileira e muito vivas no

mundo contempor�neo. A culin�ria, a dan�a, a m�sica, as express�es art�sticas, entre outros,

carregam elementos marcantes de ambas as culturas, sendo comum o esquecimento da real

origem dessas manifesta��es. Fundamentar o ensino escolar brasileiro em uma vis�o �nica de

portugueses colonizadores e africanos e ind�genas oprimidos significa uma limitada

compreens�o da esfera social do pa�s. A identifica��o desses elementos culturais espec�ficos

dentro do atual contexto social brasileiro orienta a uma melhor compreens�o e,

concomitantemente, respeito pelos povos e suas tradi��es.

Essa reforma educacional pode apresentar bons resultados quando introduzida no

ensino de mat�rias como Hist�ria, Geografia, Filosofia, entre outras. Ambos os cursos foram

por demasiado tempo focalizados em vis�es euroc�ntricas do Brasil. Temas ainda

predominantes nas aulas, como o conceito de “Descobrimento” do Brasil, n�o mostram os

fatos e conduzem para concep��es err�neas sobre a hist�ria de nosso Pa�s. As distintas vis�es

devem ser mostradas provendo de maior conhecimento dos alunos sobre os fatos e per�odos

hist�ricos. Neste processo, o ensino da arte pode em muito auxiliar na constru��o desses

diferentes conceitos sobre Hist�ria.

O aluno entra em contato com as diferentes vis�es de um mesmo fato hist�rico

utilizaria como instrumento de an�lise os meios mais sens�veis como as express�es art�sticas.

Essas express�es s�o ferramentas cruciais para iluminar os diferentes elementos sociais

predominantes no per�odo hist�rico estudado. Uma pintura, por exemplo, n�o se resume a

uma simples estrutura est�tica. Essa mesma pintura reproduz, geralmente de forma n�o

escrita, valores, ideologias, sentimentos, simbologias, cren�as, entre outras caracter�sticas

sociais e culturais do per�odo correspondente. O mesmo acontece com a dan�a, com o teatro

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com a m�sica e demais express�es art�sticas. Por meio do ensino das artes nas escolas o aluno

pode, pelo contato com representa��es simb�licas art�sticas, captar e fundamentar conceitos

abstratos ensinados em outras mat�rias.

Como j� foi citado, a diversidade de origens dos alunos dentro de uma mesma sala de

aula e consequentemente as diferen�as culturais entre eles, podem ser melhor compreendidas

por meio do ensino escolar. A introdu��o de abordagens “multiculturais” no curr�culo escolar

permitiria uma maior aproxima��o entre os pr�prios alunos. Ao localizar-se no mundo social

com maior clareza, compreendendo as origens e particularidades das din�micas sociais, o

aluno pode n�o apenas estruturar concretamente sua pr�pria imagem, mas tamb�m a do

pr�ximo. N�o creio que o maior entendimento obrigatoriamente venha a eliminar qualquer

forma de preconceito ou exclus�o social, mas age como uma forma de apaziguamento dos

efeitos dessas intoler�ncias. Esse efeito converge para os interesses de uma escola que se

prop�e a formar indiv�duos capazes de interagir com maior fluidez, toler�ncia e respeito

perante os outros. Enfim, uma institui��o interessada em formar indiv�duos multiculturais.

Neste trabalho abordou-se, de um ponto de vista espec�fico, a concreta situa��o de

desigualdade sofrida pela popula��o negra no Brasil nos tempos de Col�nia, de Imp�rio e

continuadamente durante todo o per�odo de vig�ncia da Rep�blica. Essas desigualdades

expressas e manifestadas em diversos espa�os h� muito tempo foram negadas e ignoradas.

Como mencionado anteriormente, esse tema considerado tabu n�o era abordado abertamente

nem pelo Estado nem pela maioria da sociedade civil, que justificava a igualdade entre negros

e brancos apoiada nas rela��es afetivas inter-raciais existentes neste contexto. Outro

argumento corriqueiro justificava a aus�ncia do racismo com base no alto percentual de pretos

e pardos na composi��o do contingente nacional. O Brasil h� muito tempo canta em verso e

prosa para o resto do mundo que � um pa�s mesti�o, composto por diversas cores e culturas.

Todavia, um olhar mais cuidadoso verifica que o Brasil de fato ainda � muito r�gido quanto �s

rela��es �tnico-raciais e, ao contr�rio do que � exibido, ainda manifesta o racismo e o

preconceito racial. Estes fen�menos atualmente tem sido alvo de muitos debates acerca de

seus significados e consequ�ncias sociais e pol�ticas para o pa�s.

Por esses e outros motivos as Lei Federais 10.639/2003 e 11.645/2008 exercem um

papel fundamental no combate ao preconceito e atos de racismo manifestados no espa�o

educacional brasileiro. Contudo, como demonstrado pela pesquisa por mim realizada, a

implementa��o destas leis ainda n�o atingiu uma escala nacional como era previsto. Os

principais motivos incluem a falta de capacita��o de professores, falta de investimento das

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institui��es de ensino, falta de interesse p�blico e a falta de aux�lio e cobran�a do Estado.

Como discutido anteriormente, quanto � capacita��o de professores, acredito que as

institui��es de ensino superior deveriam fazer uso de sua autonomia para responderem a tais

demandas e empregarem em seus curr�culos, disciplinas que abordem tais temas e esclare�am

e instruam aos futuros professores, disponibilizando-lhes formas de abordar as rela��es

�tnico-raciais em suas �reas de especialidade.

No caso da Arte/Educa��o, o que pude perceber � que as barreiras que impedem que

professores tratem de temas �tnico-raciais nas escolas expressam-se pela falta de capacita��o

e conhecimento espec�fico, e espa�o para que tais temas sejam abordados. Pude observar

durante a minha pesquisa pessoal, em especial a partir da entrevista realizada com o professor

Wilson, que escolas particulares, em geral, preocupem-se em abordar assuntos que ser�o

cobrados em provas avaliativas como o Enem e o vestibular. Consequentemente, n�o sobra

tempo e nem espa�o para que temas �tnico-raciais sejam abordados dentro de sala de aula.

Ser� ent�o que para que haja mais mobiliza��o e esfor�os das institui��es

educacionais para que sejam abordados temas referentes ao ensino da Hist�ria e Cultura Afro-

Brasileira e Ind�gena, esses temas ter�o de ser cobrados como conte�do especifico para tais

avalia��es? � fundamental pensarmos exatamente no tipo de “cidad�os“ que estamos

formando. Acredito na import�ncia de formar educandos mais respeitosos, cr�ticos e

contestadores. Desta forma, educa-se alunos de modo que estes venham a compreender e

valorizar as diferen�as �tnico-raciais brasileiras n�o como um mero conte�do para uma prova

avaliativa, mas para futuramente garantir esses direitos, entendendo a sua relev�ncia deste

assunto para seu pr�prio crescimento pessoal e para o desenvolvimento social do pa�s.

A meu ver, uma das a��es que pode trazer resultados bastante significativos, seria a

inclus�o de disciplinas obrigat�rias voltadas para o ensino da educa��o das rela��es �tnico-

raciais em todos os cursos de licenciatura na educa��o superior, procedimento j� abordado

pela Universidade Federal Rural de Pernambuco- UFRPE. Com isso, garante-se a forma��o

de professores preparados e qualificados para abordar os temas conceitualmente definidos

pelos DCN’s da Educa��o para as Rela��es �tnico-raciais. A��es como esta, a meu ver,

deveriam ser implementadas por institui��es educacionais de ensino superior. Desta maneira

os formandos ter�o que se defrontar com o desafio existente quanto ao dom�nio conceitual

sobre o tema de diversidade �tnico-racial. Uma vez qualificados, estes indiv�duos abordar�o

com mais seguran�a, mais lucidez e sensibilidade o ensino destes temas. A educa��o � o

principal caminho para a forma��o de estudantes mais respeitosos, compreensivos, e que

saibam valorizar as diversidades. Os desafios da qualidade e da equidade na educa��o s�

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ser�o superados se o ambiente escolar passar a ser um espa�o mais acolhedor. Para que isso

ocorra, muitas responsabilidades e demandas devem ser assumidas tanto pelas institui��es de

ensino, pelos professores e profissionais da educa��o, assim como pelo Estado e pelo

conjunto da sociedade civil brasileira.

A Arte/Educa��o, como mencionado anteriormente, pode abordar o multiculturalismo

e o ensino das rela��es �tnico-raciais explorando as diversas express�es e representa��es

art�sticas, que por sua vez podem desencadear em in�meras discuss�es relevantes sobre a

Hist�ria e Cultura Afro-Brasileira e Ind�gena. Cito a seguir tr�s trabalhos pertencentes a dois

artistas distintos como forma de exemplificar tipos de representa��es art�sticas que podem ser

apresentadas e analisadas em sala de aula.

O primeiro refere-se � pintura A redenção de Cam de 1895, realizada pelo espanhol

Modesto Brocos. Esta pintura � um importante referencial que nos impele a um exerc�cio para

se abordar a ideologia do “embranquecimento” do s�culo XIX. Na obra, Modesto Brocos

retrata tr�s gera��es de uma mesma fam�lia. A av�, negra a m�e ‘mulata’, e a crian�a,

fenotipicamente branca. A matriarca encontra-se com as m�os erguidas aos c�us, em gesto de

agradecimento pela “reden��o“. Reden��o esta expressa pelo nascimento do neto branco, que

consequentemente ser� poupado das amarguras e mem�rias do passado escravocrata.

Imagem IV. Modesto Brocos ,A Reden��o de Cam, 1895

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O segundo e terceiro referem-se aos trabalhos do artista pl�stico Tiago Gualberto,

onde ambos refletem a quest�o racial no Brasil. Em sua obra Navio Negreiro, de 2007, Tiago

Gualberto cola 2700 caixas de f�sforos lado a lado. Em cada caixa h� palitos queimados e um

retrato 3x4 de documentos de identidade encontrados em bares e em lugares popularmente

denominados de “achados e perdidos“. Sem titulo, obra produzida em 2005, � uma instala��o

que cont�m 100 xilogravuras impressas em filtros de caf� de diversos retratos de homens e

mulheres negros. Cada xilogravura encontra-se inserida dentro de outro filtro carimbado com

express�es brasileiras que carregam significados racistas. Alguns exemplos s�o: a coisa est�

preta, dia de branco e ovelha negra.

Imagem V. Tiago Gualberto, Navio Negreiro, 2007

Imagem VI. Tiago Gualberto, Sem Titulo, 2005

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Há diversos outros trabalhos que poderiam aqui ser mencionados, principalmente os

pertencentes a artistas brasileiros afrodescendentes como por exemplo Antônio Francisco

Lisboa, o Aleijadinho, Edival Ramosa, José Barbosa, José da Paixão Silva, Walter Firmo,

Jorge dos Anjos, Maria Lídia Magliani, Juarez Paraíso, entre vários outros. Não é possível

pensar no Brasil sem reconhecer a forte influência das culturas africana e indígena

manifestadas também na arte brasileira, diversificando-a e enriquecendo-a de várias formas.

Essa visão racista, preconceituosa e eurocêntrica expressa de diversas formas e em

diferentes espaços, prejudicou imensamente a população negra e indígena. Nos dias de hoje,

frutos desses pensamentos preconceituosos continuam prejudicando populações pertencentes

a tais segmentos étnico-raciais. É por este, e demais motivos mencionados neste trabalho que

considero de fundamental importância que tais pensamentos e manifestações sejam

combatidos. Só haverá um verdadeiro avanço para a justiça quando os valores

afrodescendentes e indígenas forem resgatados e passarem a ser apreciados fundamentalmente

pela própria população brasileira. Acredito, plenamente, que o caminho para um país livre de

preconceitos passa obrigatoriamente pela formação de uma nova consciência e principalmente

por uma educação que valorize os segmentos étnico-raciais que por sua vez fazem do Brasil

um país culturalmente rico.

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Lista de Tabelas e Imagens

Imagem I. Exposi��o Itinerante: O Brasil Africano: Di�spora– Quilombos– Territ�rio–Popula��o............................................................................................p�g 29Dispon�vel em: <http://www.ciga.unb.br/index.php?option=com_expose&Itemid=43>

Tabela I. Projetos e programa..............................................................................p�g 30Dispon�vel em: <http://portal.mec.gov.br/cne>

Imagem II. Cole��o Hist�ria Geral da �frica......................................................p�g 31Dispon�vel em: <http://www.educafro.org.br/site/colecao_historia_africa.html>

Imagem III. Kit A Cor da Cultura.........................................................................p�g 32Dispon�vel em: <http://www.acordacultura.org.br/pagina/Kit%20a%20Cor%20da%20Cultura

Imagem IV. Modesto Brocos ,A Reden��o de Cam, 1895...................................p�g 39Dispon�vel em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Reden%C3%A7%C3%A3o.jpg>

Imagem V. Tiago Gualberto, Navio Negreiro, 2007...........................................p�g 40Dispon�vel em: <http://www.flickr.com/photos/tiagogualberto/413897337/in/photostream/>

Imagem VI. Tiago Gualberto, Sem Titulo, 2005.................................................p�g 40Dispon�vel em: <http://www.flickr.com/photos/tiagogualberto/413908757/in/photostream/>

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Anexo

Perguntas para as Entrevistas:

1) Qual material didático em sala de aula? Algum deles aborda o ensino das relações étnico-raciais?

2) A escola em que você trabalha celebra o Dia Nacional da Consciência Negra?

Como?

3) Você professor, conhece a Lei Federal 10.639/2003?

Você já presenciou algum ato de racismo na escola em que você trabalha?

4) Você já presenciou algum ato de racismo na escola em que você trabalha?

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Refer�ncias bibliogr�ficas e documentos consultados

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