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26 Camargo-Borges, C.; Cardoso, C.L. “A Psicologia e a estratégia saúde da família: compndo saberes e fazeres” A PSICOLOGIA E A ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA: COMPONDO SABERES E FAZERES Celiane Camargo-Borges Cármen Lúcia Cardoso USP - Ribeirão Preto RESUMO: Este ensaio traz para o debate possíveis articulações entre a psicologia e a Estratégia Saúde da Família (ESF). O texto inicia com um recorte histórico das transformações ocorridas na área da saúde culminando na implantação do SUS e na inserção de outros profissionais na Saúde Pública. Destaque especial se dá a psicologia, principalmente no campo da Psicologia Social da Saúde, que propõe uma atuação mais social, interativa, coletiva e local. A ESF, política pública instaurada para auxiliar na reorganização do sistema de saúde e na consolidação do SUS, ressalta a inter-relação de profissionais da saúde/usuários enfatizando a produção de vínculos, a criação de laços de compromisso e a co-responsabilidade. Por fim, o esforço é de articular os saberes e fazeres de cada campo, apontando essa composição como fértil no sentido de contribuir com a produção do cuidado em saúde e, ainda, com a reorientação do modelo assistencial. Palavras-chave: Estratégia Saúde da Família; psicologia social da saúde; Modelo assistencial em saúde. PSYCHOLOGY AND THE FAMILY HEALTH CARE STRATEGY: COMBINING KNOWLEDGES AND PRACTICES ABSTRACT:This essay brings to discussion the links between Psychology and the Family Health Care Strategy (ESF). The text begins with a historical view of the transformations occurred in the health field leading to the National Public Health (SUS) and the participation of other professionals in the Public Health field. Special outstanding is given to Psychology, specially health social psychology which proposes an intervention more social, interactive, collective and local contexts. The ESF, a public policy that was established to promote the reorganization of the Health System and the consolidation of the SUS, emphasizes the relationship between health professionals / patients and the production of links, the creation of compromise and co-responsibility among them. Finally, the effort is to articulate the knowledges and practices of each field, pointing to the usefullness of this combination to health care work, and also, to the reorganization of assistance model. Key-words: Family Health Care Strategy; Health social psychology; Health assistance model ... E há que se cuidar do broto para que a vida nos dê flor .... (Milton Nascimento) Para que a vida nos dê flor é preciso cuidado diário, atento e apaixonado e, ainda, que se estabeleça uma relação de responsabilidade e compromisso entre as partes envolvidas nesse processo. Desde a conquista legal de um Sistema Único de Saúde (SUS) para o País que legitimou a saúde como um processo dinâmico e complexo, especial atenção se tem dado a produção do cuidado à saúde, em dois aspectos principais: o processo de trabalho e a integralidade. A produção do cuidado é compreendida como parte integrante da transformação do processo de trabalho em saúde, auxilia a estruturação das ações que abrangem as questões micro-políticas do trabalho, está atenta às necessidades em saúde no que diz respeito a vertentes locais, subjetivas e relacionais. Busca a integralidade da atenção, ou seja, o envolvimento responsável e compromissado de todas as partes implicadas nesse processo do cuidar – profissionais, usuários, organizadores e prestadores de serviços (Merhy, 2002; Merhy, 1997; Merhy, 1998). O Programa de Saúde da Família (PSF) tem sido atualmente compreendido, pelo Governo Federal, como uma política pública de atenção primária à saúde (APS), sendo o primeiro contato da população com o serviço de saúde e uma estratégia para reorientação do sistema de saúde, auxiliando a operacionalização dos princípios e diretrizes do SUS e organizando o sistema numa rede articulada com os outros níveis de atenção (Brasil, 1997). Assim, o Programa tem sido denominado, mais recentemente, de Estratégia, e constitui a ampliação da perspectiva de um programa de ações em saúde, para que fique explicita a proposta de uma forma de reorganizar o modelo de atenção que visa a integralidade. Na fomentação de uma nova política pública

Artigo - A PSICOLOGIA E A ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA

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    Camargo-Borges, C.; Cardoso, C.L. A Psicologia e a estratgia sade da famlia: compndo saberes e fazeres

    A PSICOLOGIA E A ESTRATGIA SADE DA FAMLIA:COMPONDO SABERES E FAZERES

    Celiane Camargo-BorgesCrmen Lcia Cardoso

    USP - Ribeiro Preto

    RESUMO: Este ensaio traz para o debate possveis articulaes entre a psicologia e a Estratgia Sade daFamlia (ESF). O texto inicia com um recorte histrico das transformaes ocorridas na rea da sade culminandona implantao do SUS e na insero de outros profissionais na Sade Pblica. Destaque especial se d apsicologia, principalmente no campo da Psicologia Social da Sade, que prope uma atuao mais social,interativa, coletiva e local. A ESF, poltica pblica instaurada para auxiliar na reorganizao do sistema desade e na consolidao do SUS, ressalta a inter-relao de profissionais da sade/usurios enfatizando aproduo de vnculos, a criao de laos de compromisso e a co-responsabilidade. Por fim, o esforo dearticular os saberes e fazeres de cada campo, apontando essa composio como frtil no sentido de contribuircom a produo do cuidado em sade e, ainda, com a reorientao do modelo assistencial.Palavras-chave: Estratgia Sade da Famlia; psicologia social da sade; Modelo assistencial em sade.

    PSYCHOLOGY AND THE FAMILY HEALTH CARE STRATEGY: COMBINING KNOWLEDGES AND PRACTICES

    ABSTRACT:This essay brings to discussion the links between Psychology and the Family Health Care Strategy(ESF). The text begins with a historical view of the transformations occurred in the health field leading to theNational Public Health (SUS) and the participation of other professionals in the Public Health field. Specialoutstanding is given to Psychology, specially health social psychology which proposes an intervention moresocial, interactive, collective and local contexts. The ESF, a public policy that was established to promote thereorganization of the Health System and the consolidation of the SUS, emphasizes the relationship betweenhealth professionals / patients and the production of links, the creation of compromise and co-responsibilityamong them. Finally, the effort is to articulate the knowledges and practices of each field, pointing to theusefullness of this combination to health care work, and also, to the reorganization of assistance model.Key-words: Family Health Care Strategy; Health social psychology; Health assistance model

    ... E h que se cuidar do broto para que a vida nos d flor.... (Milton Nascimento)

    Para que a vida nos d flor preciso cuidadodirio, atento e apaixonado e, ainda, que se estabeleauma relao de responsabilidade e compromisso entreas partes envolvidas nesse processo.

    Desde a conquista legal de um Sistema nicode Sade (SUS) para o Pas que legitimou a sadecomo um processo dinmico e complexo, especialateno se tem dado a produo do cuidado sade,em dois aspectos principais: o processo de trabalho ea integralidade. A produo do cuidado compreendida como parte integrante datransformao do processo de trabalho em sade,auxilia a estruturao das aes que abrangem asquestes micro-polticas do trabalho, est atenta snecessidades em sade no que diz respeito a vertenteslocais, subjetivas e relacionais. Busca a integralidadeda ateno, ou seja, o envolvimento responsvel ecompromissado de todas as partes implicadas nesse

    processo do cuidar profissionais, usurios,organizadores e prestadores de servios (Merhy, 2002;Merhy, 1997; Merhy, 1998).

    O Programa de Sade da Famlia (PSF) temsido atualmente compreendido, pelo Governo Federal,como uma poltica pblica de ateno primria sade (APS), sendo o primeiro contato da populaocom o servio de sade e uma estratgia parareorientao do sistema de sade, auxiliando aoperacionalizao dos princpios e diretrizes do SUSe organizando o sistema numa rede articulada comos outros nveis de ateno (Brasil, 1997). Assim, oPrograma tem sido denominado, mais recentemente,de Estratgia, e constitui a ampliao da perspectivade um programa de aes em sade, para que fiqueexplicita a proposta de uma forma de reorganizar omodelo de ateno que visa a integralidade.

    Na fomentao de uma nova poltica pblica

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    de sade, abrem-se espaos de trabalho para apsicologia, que passa a problematizar a aplicao dasprticas tradicionais em novo cenrio de atuao.Outras ferramentas de interveno - mais apropriadaspara a efetiva insero na rea - devem ser construdaspara o trabalho na Sade Pblica, para que possamcontribuir para as transformaes propostas pelo SUS.A Psicologia Social da Sade, que compreende, emseus pressupostos, uma interveno mais local ecoletiva, tem sido um importante campo deconhecimento e prtica para construir formasdiferenciadas de interveno na sade.

    O presente trabalho pretende contribuir para areflexo sobre esses acontecimentos na sade e comoa psicologia se insere em tal sistema. proposto aqui,uma composio de saberes e fazeres, com aarticulao da Psicologia Social da Sade e a ESF,apostando na potncia dessa composio para atransformao da produo do cuidado em sade. Esteestudo visa, ainda, contribuir para a perspectiva damudana que vem acontecendo na rea, na busca deuma assistncia menos tecnicista, mais humanizada,e parafraseando Milton, que juntos consigamospromover essas transformaes e produzir o cuidadonecessrio para que vida nos d sade.

    DA RECONFIGURAO DO SISTEMA DE SADE ESTRATGIA DE SADE DA FAMLIA (ESF)

    Nas dcadas de 70/80, acontecimentos nosmbitos: social, poltico e econmico acarretaramprofundas transformaes na sociedade brasileira. Umprocesso crescente de endividamento externo, seguidode um intenso questionamento do regime polticoautoritrio que governava o pas, comeou aenfraquecer o governo e a incentivar movimentossociais de diversas ordens que buscavam melhorescondies de vida.

    Nesse contexto, na rea da sade, o fracassodo modelo prestador de servios, a privatizao daassistncia mdica, a crise financeira da previdnciasocial, os altos ndices de desemprego, um perfilepidemiolgico marcado por altas taxas demortalidade materna e infantil, o aumento das doenasinfecto-contagiosas e os altos ndices de acidentes detrabalho geraram uma grande mobilizao social queficou conhecida como movimento sanitrio(Dimenstein, 1998).

    Esse movimento trouxe propostas de novas con-cepes do pensar e fazer sade - mais humana e uni-versal - que s poderia ser alcanada atravs de umaampla reforma sanitria. Seu carter ideolgico ini-cial foi se convertendo em outro mais pragmtico,construiu alternativas concretas para reformulao dosistema de sade e contribuiu para o processo de de-mocratizao do Pas (Teixeira & Mendona, 1989).

    A VIII Conferncia Nacional de Sade, em 1986,foi o espao da problematizao do conceito de sadevisto como ausncia de doenas e questionou o foconos aspectos biolgicos, num esforo de redefiniopara uma concepo mais ampliada e dinmica - asade como produto social resultante da ao dediversos determinantes: acesso a lazer, escola,saneamento bsico, trabalho, servios de sade, entreoutros. (Conferncia Nacional de Sade, 1986;Mendes, 1996).

    A partir das propostas da VIII Conferncia, asade foi includa na Constituio do Brasil de 1988,no captulo da Seguridade Social, como um direitode todos e dever do Estado, o que representou umavano em relao Constituio anterior.

    Em setembro de 1990, foi regulamentada areforma sanitria com a proposio do Sistema nicode Sade (SUS), atravs da homologao da LeiOrgnica da Sade que vigora no pas atualmente(Cordeiro, 1991).

    Os princpios do SUS so: universalidade noatendimento; eqidade; integralidade nas aes emsade; regionalizao e hierarquizao das unidadesprestadoras de servios; fortalecimento dos municpios;descentralizao da gesto administrativa;resolutividade e participao popular.

    Nesse contexto de mudanas oficializou-se, em1994, o Programa de Sade da Famlia (PSF). As aesdo PSF foram, inicialmente, implantadas em regiesde escassa assistncia populao, com os objetivosde atender s minorias sem acesso a servios de sadee de responder a uma tendncia mundial de reduode custos, de desmedicalizao da medicina ehumanizao dos servios (Vasconcellos, 1998). Poresse programa inicial ser considerado potente para auniversalizao do atendimento a sade e paraimplementar os preceitos da reforma sanitriabrasileira, passou-se a haver um esforo e um incentivopara que se transformasse em Estratgia (ESF) de umprojeto nico do sistema da sade e responsvel pelaAPS.

    A ESF visa estruturar o modelo de atenovoltado para a integralidade e a qualidade daassistncia prestada e contribuir para consolidaodos princpios e diretrizes do SUS (Chagas e Seclen,2003).

    A ESF incorpora e reafirma os princpios doSUS, com as especificidades de um trabalho de APS.Com a proposta de ser a porta de entrada do usuriono sistema, a ESF se localiza num territrio especfi-co, composto de 600 a 1000 famlias a serem acom-panhadas por uma equipe mnima, integrada por pro-fissionais mdicos, enfermeiros, auxiliares de enfer-magem e agentes comunitrios de sade. A equipe desade bucal foi recentemente integrada ESF e com-

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    posta por um cirurgio dentista, um atendente de con-sultrio dentrio e um tcnico em higiene dental (Bra-sil, 2002).

    A idia de porta de entrada visa ser no somenteo primeiro acesso da populao ao servio, mastambm um dispositivo de responsabilizaoinstitucional e sanitria no processo do cuidado coma sade articulado a toda a rede de servios (Brasil,2003). Segundo Ciampone e Peduzzi (2000), um dospontos centrais do trabalho da ESF seria oestabelecimento de vnculos e a criao de laos decompromisso e de co-responsabilidade entre osprofissionais da sade e a populao (p.143), numatentativa de romper com a perspectiva tecnicista emsade e fortalecer o envolvimento dos atores sociaisno processo sade-doena-cuidado.

    Os fundamentos da ESF - insero numterritrio especfico, alm do espao geofsico, mastambm espao da cultura, das relaes, trabalho localcom a populao, com estabelecimento de vnculos,produo de acolhimento e responsabilizao -aproximam o profissional e suas ferramentas de aoao mbito da micro-poltica dos processos de trabalho,nos seus fazeres cotidianos, nas suas relaes, sejacom outros profissionais seja com a comunidade.Portanto, trabalhar em consonncia com a propostada ESF requer uma inverso da lgica do cuidado -menos tcnico e mais relacional - tanto entre equipe-usurio como entre equipe-equipe (Camargo-Borges,2002).

    De um enfoque biomdico e disciplinartradicional, a mudana na sade trouxe alguns rudossobre outras formas de atuao no sistema,principalmente na ESF, que tem seu objeto de trabalhodiferenciado pela atuao direta com a comunidade,em seu cotidiano. A conduta profissional, nessa formade trabalho, passa a ser mais coletiva. Enfoca a famliae suas relaes e no mais somente o indivduo comseus problemas e resgata as mltiplas dimenses dasade, o que exige o reformular da postura deinterveno do profissional, assim como aincorporao de outros saberes para compor aproduo do cuidado com a sade.

    Nesse contexto, a psicologia dispe deferramentas que podero ser teis para a construode um modelo mais integrado e holstico de ateno sade.

    A PSICOLOGIA NO CAMPO DA SADE PBLICAAt a dcada de 70, a participao da psico-

    logia no mbito da sade pblica ainda era incipiente.A psicologia, enquanto profisso tem uma

    histria recente no Brasil. Apoiada na regulamentaode 1962, atravs da Lei Federal 4.119, tradicionalmenteforam constitudas quatro reas de atuao do

    psiclogo: a clnica, a escolar, a industrial e omagistrio. A psicologia, desde a sua criao, reconhecida como profisso liberal - parecer 403/68(Lei 4.119). A nfase das atividades deste profissionalse centrou nas dcadas seguintes, no trabalhoautnomo, clnico, individual, curativo e voltado parauma clientela financeiramente privilegiada no acesso.(Silva, 1992; Dimenstein, 1998).

    Na reconfigurao do sistema de sade, opsiclogo passa a integrar equipes. Entretanto, nodispunha de um arcabouo terico e prtico para atu-ao nesse mbito, o que, muitas vezes, contribuiupara a manuteno do modelo mdico hegemnico,do trabalho com enfoque no tratamento de fenme-nos da esfera psquica ou mental sem necessidade decompreend-los a partir de suas multideterminaes,ou seja, sem considerar o contexto social, econmicoe poltico no qual o indivduo est imerso (Spink, 1992;Silva, 1992; Dimenstein, 1998).

    A psicologia, num processo de reviso dessasprticas e busca por melhores formas de responder snecessidades dos diferentes locais de atuao, foigerando novos campos de saber e ampliou sua inserona sade.

    A Psicologia Social da Sade configura-se comoum campo de conhecimento e prtica que trata dasquestes psicolgicas com enfoque mais social, coletivoe comunitrio voltado para a sade. Segundo Marn(1995), caracteriza-se pela interlocuo da psicologiaSocial - com seus conhecimentos e tcnicas com ombito da sade e destaca a interao como pontofundamental do processo sade-doena. A interaorefere-se tanto ao homem e seu ambiente quanto aosdiversos atores sociais presentes no cuidado sade.O autor ainda salienta que todas as atividades daPsicologia Social da Sade centram-se mais na buscade uma sade integral e no somente na sade mental.

    Spink (2003) trata da Psicologia Social daSade como um campo ampliado de atuao dopsiclogo nas instituies de sade. Essa ampliaoocorreria principalmente, em relao ao referencialde trabalho utilizado e exercido, e abrangeria duasprincipais questes que a autora destaca comofundamentais. Primeiramente, a questo contextualda interveno, isto , a importncia de secompreender toda a histria e o contexto da instituiona qual ser implementada uma ao, assim como aspessoas que compem essa instituio. Faz-senecessrio compreender que cada organizao temsua realidade local, sua cultura de relaes e ashistrias especficas das pessoas que recorrem a essesservios. A segunda enfatiza a questo do outro, daalteridade. As intervenes nessa abordagem levamem conta a interface da cultura e do social no processode construo da identidade e da insero da pessoa

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    na vida. a percepo da construo dessa identidade,to multiforme, que possibilita reconhecer a alteridadee lidar com o diverso. A alteridade entendida comoo relacionar-se com o outro, diferente de mim, masreconhecido por mim como uma pessoa com direitosiguais aos meus e valorizada enquanto sujeito.

    A Psicologia Social da Sade, segundo Spink(2003), tem como caractersticas principais atuaocentrada em uma perspectiva coletiva e ocomprometimento com os direitos sociais e com acidadania. Rompe, portanto, enfoques maistradicionais centrados no indivduo. A atuao se dprincipalmente nos servios de ateno primria sade, focaliza a preveno da doena e a promooda sade e incentiva os atores sociais envolvidos paraa gerao de propostas de transformao do ambienteem que vivem. Trata-se, portanto de um processo detransformao crtica e democrtica que potencializae fortalece a qualidade de vida.

    Como proposio geral, a Psicologia Social daSade, ao contribuir para a superao do modelobiomdico, objetiva trabalhar dentro de um modelomais integrado, reconhece a sade como um fenmenomultidimensional em que interagem aspectosbiolgicos, psicolgicos e sociais e caminha para umacompreenso mais holstica do processo sade-doena-cuidado.

    Dessa maneira sua insero na ESF pode sertil para contribuir para a transformao das prticasem sade rumo integralidade.

    A ESTRATGIA SADE DA FAMLIA E A PSICOLOGIASOCIAL DA SADE: CONSTRUINDO PONTES

    Pensar a psicologia como parceira da ESF um convite a pr em pauta os processos de trabalhoem sade que acontecem no territrio da ESF e asrelaes que nele transcorrem. Um convite reflexoe a problematizao das possveis formas de interven-o local, numa postura criativa para a composiode novos trabalhos, mais consoantes com cada reali-dade local.

    Tal parceria pode contribuir para o esforo quetem sido feito para romper com o modelo biomdicoque, at h muito pouco tempo, conduzia as aesem sade e se desdobravam em formas especialistas etcnicas de trabalho, dificultando a integralidade des-sas aes. Um exemplo dessas mudanas a crescen-te demanda por trabalhos em equipes multiprofis-sionais.

    Apesar de a Sade Pblica j pressupor um tra-balho de equipe, resqucios dessa forma de interven-o ainda dificultam um trabalho mais integrado.Segundo Peduzzi (2001), a equipe de sade muitasvezes se organiza sem um agir comunicativo, quemarca as relaes hierrquicas de subordinao

    estabelecidas, valor comum atribudo ao modelobiomdico tradicional de sade. A equipemultidisciplinar que tem como proposta constituir-secomo um espao para a dialogia e para a troca desaberes, muitas vezes tem sido utilizada para o esta-belecimento de diviso de trabalho, de papis, forta-lecendo a individualizao dos profissionais em de-trimento de relaes mais horizontais e coletivas. Dessemodo, a possibilidade de uma interveno diferencia-da, de um trabalho integrado, intersetorial, voltadopara a coletividade, muitas vezes se torna difciloperacionalizar. Prevalece, assim, a dicotomia entrea competncia tcnica e a sensibilidade social.

    Constata-se que a psicologia cada vez mais temadentrado o terreno da sade, incrementando a com-preenso do processo sade-doena-cuidado, princi-palmente na rea da sade mental, tendo crescido,quantitativamente, em hospitais e postos de sade.Na ESF, a psicologia tem despontado atravs da pro-posio de algumas intervenes, j consagradas, nombito da sade, como o trabalho com grupos (Sou-za & Carvalho, 2003; Cardoso, 2002) e o das equipesde sade mental (Lancetti, 2003). A interveno atra-vs de grupos na ESF acontece, principalmente, comos chamados grupos programticos para o cuidadode questes prevalentes na sade, tais como os gruposde hipertenso e diabetes e os de gestantes. Esses gru-pos tm, geralmente, carter informativo e nmerodeterminado de encontros. J o trabalho da sademental, na ESF, tem sido constitudo por profissionaisdessa rea (psiclogos e psiquiatras) que assessorama equipe mnima atravs de estudo de casos,interconsultas, superviso continuada, orientao ecapacitao no cuidado e acolhimento dos casos desade mental (Lancetti, 2003).

    Porm, o que est se problematizando nessareflexo a conformao de um novo saber que sejasensvel a mltiplos contextos; busca-se a produode diferentes conhecimentos para ampliao do focode trabalho, para constituir laos diferenciados deinterao entre as diversas reas da sade.

    A Psicologia Social da Sade traz conceitospotentes e propostas de ao que muito se aproxi-mam dos pressupostos de trabalho da ESF. Vemos queos dois discursos se organizam em torno de eixos queapostam na construo do fazer conjunto, coletivo evalorizam a localidade e as interaes dela decorren-tes.

    A forma como a ESF est organizada, locali-zada num territrio, trabalhando em equipe, focali-zando o sistema familiar, a cultura local e lidandodiretamente com o cotidiano das pessoas, a faz depa-rar com questes que demandam acolhimento, vncu-lo, interao e so da ordem da imprevisibilidade,pois, a cada encontro, a cada situao, gera-se uma

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    forma diferente de interveno. Segundo Sousa (2003)o territrio na ESF caracterizado como sinnimode lugar, espao de interao, solidariedade (p. 34).Algumas diretrizes so postas para tentaroperacionalizar esse tipo de organizao, como alongitudinalidade e o planejamento ascendente.

    A longitudinalidade definida como o segmentodo usurio e de sua famlia no tempo, com a forma-o de vnculo, independente da presena de patolo-gia.

    O planejamento ascendente definido como odelineamento de estratgias de interveno nas fam-lias, de acordo com as necessidades da comunidadeque reside no territrio.

    Os pressupostos da Psicologia Social da Sadeecoam, nesse modo de organizao do trabalho, medida que tm como ponto fundamental tambm acontextualidade e a interao com aes construdascoletivamente a partir das imprevisibilidades do coti-diano. Assim, tanto a ESF como esse campo da psico-logia privilegiam o processo de produo de conheci-mento e a construo das intervenes a partir dasprticas sociais, dos processos interativos e da cultu-ra. A proposta, portanto, a de que qualquer entendi-mento do processo sade-doena-cuidado possa seranalisado e referido a partir de seu contexto, ou seja,a partir da compreenso de uma pessoa, pertencentea determinada famlia, inserida numa comunidadeespecfica, e assim por diante.

    A Organizao Panamericana de Sade enfatizaque a ESF deva ser constituda a partir do seu contnuofazer e refazer. Este fazer-fazendo tambm compartilhado pela Psicologia Social da Sade, j quesuas intervenes caracterizam-se por um construir ereconstruir coletivos, com pessoas imersas nessa redede sentidos (re) negociando-os o tempo todo.

    A produo do vnculo nas relaes de trabalhotambm foco tanto da ESF quanto da PsicologiaSocial da Sade. Na ESF, o acolhimento realadocomo pea fundamental. O acolhimento uma formade interveno que prope apoio contnuo pessoaem todo o seu processo de atendimento na sade eno somente no que diz respeito ao acesso do usurioao servio. Abrange o encontro do profissional comesse usurio, num processo de negociao dasnecessidades deste, promovendo acesso, buscando aproduo do vnculo (Matumoto, 1998). A PsicologiaSocial da Sade se interessa pela criao de prticasconversacionais que possam construir caminhospossveis para que as pessoas sigam juntas mesmo nadiversidade, ou seja, com vnculos entre elas. Interessa-se pela utilizao de um discurso que possa sercompartilhado, para que se criem mais possibilidadesde ao. Tais prticas esto dizendo que o acolhimentoe o vnculo so potenciais na criao de um espao

    coletivo de atuao. O estabelecimento do vnculo narelao, segundo Campos (1997), promove melhoreficcia das aes em sade e facilita a participaodo usurio nestas aes.

    Por fim, como j visto, as propostas do SUS dedemocratizao da sade e de inverso da lgicahierrquica e autoritria que tradicionalmente vinhafuncionando no sistema tm como ponto fundamentala ESF, objetivando a criao de uma rede integradade cuidados progressivos. A interlocuo com aPsicologia Social da Sade ocorre no suporte para aconstruo de espaos mais democrticos deconvivncia, no trato alteridade, propiciandoconversas mais igualitrias, promovendo integraoentre profissionais usurios e, com isso, contribuindopara a eficcia do sistema de sade idealizado peloSUS universal, eqitativo, integral.

    Assim, a Psicologia Social da Sade viria aoencontro desse desafio da ESF em construir um modelode ateno sade pertinente realidade local egerador de interlocues entre equipe de sade ecomunidade. Nesse sentido, a parceria pode ser tilpara pensar discursos, na sade, que propiciem aconstruo de espaos viabilizadores de acolhimentoe a construo do vnculo, contribuindo para a reflexoe a problematizao dessas prticas que se propemcoletivas.

    Tal parceria investiria no fortalecimento dasrelaes locais, propondo-se a reconhecer e legitimara diversidade nesses espaos de encontro e resgatan-do a cidadania dos atores sociais envolvidos.

    A articulao da Psicologia Social da Sadecom a ESF apresenta-se como proposta que tem mui-to a contribuir para aes junto s comunidades, como objetivo de compor e no substituir. Compor umtrabalho em que a equipe interaja e funcione comopotncia para o territrio da interveno, com a cria-o de sistemas conversacionais na equipe que semultipliquem em dilogo para toda a comunidade,como estratgia permanente de ao. Construir umprojeto institucional abraado pela equipe como umtodo, numa abertura para a diversidade, com alter-nativas que possam traduzir-se em co-responsabilida-de, to almejada no sistema de sade.

    A proposta do presente trabalho no , de ma-neira alguma, a de levantar a bandeira de uma lutacorporativa de modo a garantir incluso de mais umespecialista na equipe da ESF. No se tem aqui o pro-psito de dar continuidade segmentao da sade,em que cada pedao seria de responsabilidade deum especialista especfico, cada mbito pertenceria competncia de um profissional. Isso seria avesso fundamentao da ESF que prega o rompimento comos paradigmas do modelo anterior e busca aintegralidade; o fato descaracterizaria toda a argu-

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    mentao que se procura construir neste ensaio.O objetivo dessa reflexo ampliar! Discutir

    possibilidades de criao de propostas que possamser potentes para as prticas que a ESF pretende ins-taurar em sua lgica de trabalho. A psicologia, comodisciplina que tem em seu objeto de estudo as rela-es humanas, as interaes, os afetos, pode trazercontribuies para tal tarefa de construo dessa Es-tratgia do sistema de sade que vem tentando se pau-tar por prticas mais relacionais. Especificamente, aPsicologia Social da Sade que, como vimos, faz pon-tes conceituais com a ESF, pode auxiliar oembasamento e o suporte de aes construdas nessecontnuo fazer-fazendo que, ideologicamente, cons-titui o projeto de interveno da ESF.

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    Celiane Camargo-Borges Mestre em Psicologia eDoutoranda em Sade Pblica - Escola de Enferma-gem de Ribeiro Preto -Universidade de So Paulo.

    O endereo eletrnico da autora :[email protected]

    Crmen Lcia Cardoso Professora doutora doDepartamento de Psicologia e Educao da

    Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de RibeiroPreto - Universidade de So Paulo.

    Endereo para correspondncia: FFCLRP -USP.Depto. de Educao. Av. Bandeirantes, 3900

    CEP 14040-901. Ribeiro Preto - SPO endereo eletrnico da autora :

    [email protected]

    Celiane Camargo BorgesCarmn Lcia CardosoA psicologia e a estratgia sade da famlia:compondo saberes e fazeresRecebido:22/03/20051 reviso: 27/06/2005Aceite final: 25/08/2005

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