Artigo - Anna Karina

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  • 7/24/2019 Artigo - Anna Karina

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    O mundo que habitamos em Dogville: um jogo entre pobreza e experincia1

    Autoras: Anna Karina Castanheira Bartolomeu2

    Roberta Veiga3

    Instituio: Universidade Federal de Minas Gerais

    Resumo

    O texto busca evidenciar como o dispositivo cinema, ao forar seus limites, na relao coma literatura, o teatro e a fotografia, pode provocar a reflexo acerca da experincia. Essaforma dispositivo pensada em Dogville (2003), de Lars von Trier. A abordagem do filmepersegue, portanto, a maneira pela qual as estratgias de encenao dos sentidos convidama um jogo capaz de revelar que a experincia forte, a re-apropriao do mundo peloshomens, pode surgir na experincia da pobreza.

    Palavras-chave

    Dispositivo; experincia; cinema; fotografia;Dogville.

    Introduo

    Que mundo habitamos? Qual a natureza da relao que mantemos com esse mundo?

    Como qualificar nossa experincia? Questes como essas parecem de uma generalidade

    excessiva. Contudo, elas nos so entregues com freqncia por esse mesmo mundo quando

    ele materializado numa forma de dispositivo audiovisual capaz de forar seus limites e de

    envergar-se sobre si mesmo para questionar a presena da imagem, destituindo e restituindo

    os modos de ver. Esta forma de dispositivo faz brilhar algo da qualidade da experincia que

    nos devolvida hoje ao engajar o espectador num jogo de revelar e esconder. Faz oscilar a

    ordem das coisas que parecem presidir a conformao contempornea, manifestando a

    coexistncia de diferentes mundos na realidade.

    A proposta que norteia esse texto a de buscar se aproximar um pouco dessas

    primeiras indagaes e premissas a partir do jogo proposto pelo filme Dogville (2003), de

    Lars von Trier. A forma de abordagem do filme passa por trs eixos de anlise, que

    perseguem a maneira pela qual as estratgias de encenao dos sentidos configuradas pelo

    1Trabalho apresentado ao NP 07 Comunicao Audiovisual do V Encontro dos Ncleos de PesquisaIntercom.2Doutoranda em Comunicao Social pela FAFICH/UFMG. Professora e pesquisadora da EBA/UFMG, co-editora da revistaDevires Cinema e Humanidades.3Doutoranda em Comunicao Social pela FAFICH/UFMG. Professora e pesquisadora da PUC-MG.

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    dispositivo conformam um mundo pobre, de experincia precria, mas, ao mesmo tempo e

    a partir dele, possibilitam uma experincia forte.

    No primeiro eixo, procuramos identificar, a partir da intriga, as relaes de poder quese instituem entre os personagens e a comunidade produzindo ou desfazendo formas de

    subjetividade. No segundo, nos perguntamos de que maneira o espao, a cidade, criado e

    manifesto pela linguagem cinematogrfica. Finalmente, buscamos evidenciar o jogo

    proposto pelo filme e por a alcanar a relao que estabelecida com o espectador.

    A noo de jogo aqui referida provm da teoria do efeito esttico em Iser (1999) na

    qual a leitura envolve uma dinmica de interao entre o texto e o leitor, opondo-se

    concepo de que o texto seria o portador do significado. Os segmentos textuais trazem

    entre si lacunas como motores da atividade ideacional do leitor que instado a supri-las.

    Quando o processo de seleo dos fragmentos que iro compor o texto envolve o

    cancelamento da validade dos campos de referncia extratextuais, a lacuna se traduz em

    negao. Lacunas e negaes correspondem negatividade: espao de indeterminao que

    compe fundamentalmente o campo de interao entre leitor e texto.

    Do experimento experincia

    Tratar da subjetividade em Dogville significa, aqui, discutir como a intriga revela as

    operaes do poder. Dito de outra forma: como as relaes de foras na comunidade de

    Dogville constituem singularidades, formas de vida, ou as destituem.

    O que aglutina os personagens de Dogville est no fato de formarem uma comunidade,

    no sentido no apenas de habitarem o mesmo lugarejo, mas de experimentarem uma vida

    precria. Dogville uma cidadezinha muito pobre, situada entre as Montanhas Rochosas

    dos EUA, que vive tempos difceis. A experincia da pobreza vai alm das condies

    materiais de vida dos habitantes. Ela se impe como um poder soberano que vampiriza ocomum que caracterizaria a comunidade como compartilhamento do diferente, como

    relaes de seres singulares em seus encontros e embates. A experincia em Dogville

    precria, pois a comunidade, longe de se abrir vida como multiplicidade, cerceadora das

    diferenas e geradora de identidades fixas.

    A experincia da pobreza , portanto, uma pobreza da experincia. Para Benjamin, ela

    filha do poder da guerra, de uma gerao de combatentes que voltavam emudecidos dos

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    campos de batalha e incapazes de intercambiar suas vivncias. Em Dogville, ela filha de

    uma comunidade americana marcada pela depresso econmica.

    Porque nunca houve experincias mais radicalmente desmoralizadas que aexperincia estratgica pela guerra de trincheira, a experincia econmica pelainflao, a experincia do corpo pela fome, a experincia moral pelos governantes.Uma gerao que ainda fora escola num bonde puxado por cavalos viu-seabandonada, sem teto, numa paisagem diferente em tudo, exceto nas nuvens, e em cujocentro, num campo de foras de correntes e exploses destruidoras, estava ofrgil eminsculo corpo humano. (BENJAMIN, 1985: 115).

    Dialogando com Benjamin, Agamben (2000) afirma que a experincia da pobreza

    emerge na impossibilidade da realizao da experincia, impossibilidade que se institui na

    ciso entre o homem moderno e o mundo. O homem moderno toma o mundo como objetode seu conhecimento, o qual ele deve compreender e dominar.

    Se a precariedade da experincia est profundamente ligada s foras do saber e do

    poder, em Dogville ela se apresenta na figura de um saber pretensamente cientfico e

    moralizante e de um poder que se exerce onde no h mais leis. Ambas figuras ganham

    corpo, principalmente, nos personagens Tom e Grace4. Tom vive a pobreza da experincia

    por assumir uma postura de observador dos acontecimentos e das relaes na cidade,

    tornando mais frouxo seu vnculo com o mundo. Grace vive a pobreza da experincia ao se

    submeter a uma fora que no mais percebe nela uma forma de vida; ao contrrio, reduz

    sua existncia a um fato de vida 5. Na ausncia de leis e direitos que resguardem sua

    condio de sujeito, Grace ocupa um estado de exceo, como se fosse um detido de guerra

    e Dogville, o campo de concentrao.

    Tom se intitula um observador, passa seus dias analisando a cidade, pensando em sua

    misso de criar ali um slido senso de comunidade e em um exemplo capaz de ilustrar a

    importncia da aceitao. Se h um problema moral em Dogville, que est para alm da

    genrica misria de um pas que se esqueceu de muita coisa6, preciso educar a

    4As foras de saber e poder poderiam ser tratadas atravs de outras micro-narrativas que compem do filme.Privilegiamos os dois protagonistas com objetivo de recortar abordagem e no tornar a anlise excessiva.5Segundo Giorgio Agamben, os gregos faziam uma distino entrezo, que expressava o simples fato de vivercomum a todos os seres (animais, humanos e deuses) e bios, que significava a forma ou a maneira de viver peculiara um indivduo ou grupo particular. Agamben sustenta que o poder sempre fundou-se sobre essa ciso entre ofatoda vida e as formasde vida, ao isolar algo como a vida nua, objeto a um s tempo de excluso e incluso,submetido ao soberano e ao seu arbtrio. (PL PELBART, 2003: 60).6As frases em itlicos so trechos retirados do filme (fala dos personagens e do narrador).

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    comunidade devolvendo a ela seu presente. Tom vai usar Grace como um experimento para

    mostrar cidade a importncia de se ajudar algum, de confiar no prximo.

    Em sua relao com Dogville, Tom est no lugar do sujeito dotado de cincia econscincia. Toma a cidade como um objeto a ser desvendado, revelado e destitudo de

    seus mistrios. uma relao que transforma qualquer possibilidade de experincia em

    experimento, ao traduzir em controle e certeza (mathema) o que seria mistrio e finitude

    (pathema).7 Essa negao do pathema pelo mathema que diz respeito trajetria da

    cincia moderna que ligou experincia e conscincia para incorpor-las ao conhecimento

    de certa maneira a negao da tica pela moral. Tom tem seus preceitos morais que

    devem ser assimilados em Dogville. incapaz de perceber uma tica, aberta inveno de

    outras possibilidades de vida, no modo de existncia dos habitantes da cidade e de Grace.

    Como bem demarcou Gilles Deleuze,

    A diferena essa: a moral se apresenta como um conjunto de regras coercitivas deum tipo especial, que consiste em julgar aes e intenes referindo-as a valorestranscendentes ( certo, errado...); a tica um conjunto de regras facultativas queavaliam o que fazemos, o que dizemos, em funo do modo de existncia que issoimplica.(DELEUZE, 1992: 125).

    Grace uma jovem rica, de uma famlia poderosa de gangsters acostumada a

    conseguir tudo pelo exerccio da fora e da violncia. Ao chegar em Dogville, uma cidademiservel, Grace v a possibilidade de encontrar um novo lar onde as relaes no se

    pautam pelo poder do dinheiro ou do status ou da fora; uma comunidade de iguais na e

    pela pobreza. A protagonista, uma fugitiva, busca todos os meios possveis para ser aceita

    na cidade. Ela precisa oferecer algo a Dogville, mas os habitantes no precisam de outro, j

    possuem seus papis fixos e institudos entre eles, no h brechas.

    Graas interveno de Tom, Grace ganha a confiana dos moradores de Dogville,

    que se deixam ser ajudados para ajudar. Mas, com o tempo, uma nova forma de poder

    nasce na cidade j que a fugitiva se deixa facilmente dominar pelo medo de ser entregue

    aos gangsters e voltar sua vida anterior. Quanto mais as foras externas cidade fixam a

    7 No mathema, o sujeito est fora experincia, pois precisa dominar o mundo sua volta para que oconhecimento se realize. Portanto, o experimentar transformado em ato de conhecer da cincia no geradono interior da vida do sujeito, que inaproprivel e finita, mas de fora, a partir de instrumentos que confere atodos, a qualquer tempo, a mesma possibilidade de fazer experimentos, da seu carter infinito. Nopathema , osujeito sofre a experincia que est encarnada em seu corpo e, portanto, em sua prpria vida. umaexperincia finita, que tem seu pice na morte (cf.AGAMBEN,Enfance et histoire , 2000.).

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    identidade de Grace como a procurada, mais a comunidade teme por estar acobertando

    uma fugitiva e mais difcil se torna barganhar por seu espao. , novamente, Tom quem

    prope uma estratgia administrativa para a aceitao de Grace. Era preciso algo de maiorvalor em troca de tamanha concesso.

    A estratgia de barganha proposta por Tom torna as relaes mais funcionais e

    impessoais entre Grace e a comunidade e a dominao pode se exercer livremente.

    Explorada, usurpada at chegar condio de vida nua, a prisioneira se transforma em

    objeto sexual e acaba acorrentada. A privao de sua subjetividade agora est no corpo; ela

    privada de sua liberdade de locomoo.

    Essa forma de poder que se institui em Dogville a partir do assujeitamento de Grace,

    remonta de certa maneira ao poder disciplinar detectado por Michel Foucault (1987) nas

    instituies (penitencirias, hospitais, escolas) a partir do sculo XIX. O modelo do

    dispositivo disciplinar, em Foucault, se aplica ao espao e ao corpo ao rastrear ambos.

    Esse espao fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos, onde os indivduosesto inseridos num lugar fixo, onde os menores movimentos so controlados, ondetodos os acontecimentos so registrados, (...) onde o poder exercido sem diviso,segundo uma figura hierrquica contnua, onde cada indivduo continuamentelocalizado, examinado e distribudo A ordem () prescreve a cada um seu lugar, acada um seu corpo, a cada um sua doena e sua morte, a cada um seu bem por meio de

    um poder onipresente e onisciente (...) at a determinao final do indivduo, do que ocaracteriza, do que lhe pertence, do que lhe acontece... (FOUCAULT, 1987: 175).

    Para chegar nesse modelo de dispositivo, Foucault retorna ao contexto da peste no

    sculo XVIII e explica como o poder poltico toma o lugar da vida, num estado de exceo,

    gerando a biopoltica. O corpo que traduz a vida humana est condenado ao poder poltico

    quando este se justifica pela sade de um coletivo abstrato maior que qualquer

    individualidade. O que vale o bem comum. Em seu nome, o corpo e a vida so

    controlados. Nesse estado de exceo, no h leis que no possam ser rompidas e novas leis

    que no possam ser geradas arbitrariamente. O poder se exerce soberano e autnomo. Com

    a peste, a diviso entre doentes e saudveis abre espao para que o dispositivo se exera

    sobre aqueles considerados anormais (loucos, velhos, criminosos). O que garante o

    crescimento capilar do poder e sua incidncia sobre o corpo e o espao a no-peste, ou

    seja, a manuteno da normalidade contra a ameaa de fora.

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    A partir da o dispositivo disciplinar, que vigia e controla a sociedade, ganha sua

    verso panptica: de um espao completamente rastreado por um poder que jamais visto,

    mas que j , desde sempre, reconhecido e introjetado pelos vigiados. Se o corpo reduzidoa um objeto de controle do poder, esse corpo um experimento da biopoltica. No filme, o

    estado de exceo acontece com a chegada de Grace, que traz consigo a representao da

    anormalidade, por ser uma fugitiva que vem de fora e que coloca a cidade em perigo. Esse

    fato determina a viglia, a manipulao e o controle exercidos sobre ela pela comunidade.

    No estado de exceo, tudo vale para que o poder se realize, pois no h normas que

    determinem a atitude da comunidade em relao quela ameaa externa. nesse contexto

    que a vida de Grace sofre a interferncia de uma biopoltica que s tem sua frente a vida

    nua, sem nenhuma mediao, totalmente separada de uma forma de vida.

    Historicamente, essa vida em nome da qual se exerce o poder (concebida como umfato) e que se diz proteger, esteve submetida ao jugo do soberano. O poder poltico quens conhecemos a reivindica na medida em que, no prolongamento do regime desoberania, se d o direito de separ-la das formas de vida. A vida ento aparece, hojecomo ontem, apenas como uma contrapartida do direito que a ameaa de morte, numestado de exceo permanente. (PL PELBART, 2003: 60).

    Grace parece o exemplo da humildade, aceita as punies, indulgente frente s

    atitudes mais vis da comunidade e resigna-se com o sofrimento. Mas, o que parecehumildade revela-se como uma atitude arrogante. Trata-se de uma inverso de perspectiva

    sobre o poder. Quando o pai de Grace, um gangster poderoso, chega cidade, essa inverso

    revelada. Ningum pode chegar a ter os mesmos padres ticos que voc. Eu no posso

    pensar em nada mais arrogante do que isso, diz o pai protagonista.

    Esses padres ticos de Grace se aproximam mais de uma moral transcendente. Ela

    no clemente por fraqueza ou falta de opo, aceita a submisso consciente de estar

    fazendo uma experincia diferente naquele lugar. Dogville tambm um experimento para

    Grace. Ela est to acima da cidade que perdoa os atos dos habitantes. Para a protagonista,

    eles tm razes para agirem daquela forma e ela tem razes para aceitar a dominao:

    miserveis, nunca tiveram mais que a pobreza, enquanto ela sempre esteve com o poder.

    Essa moral fruto e ao mesmo tempo gera a arrogncia de um olhar superior que, de

    imediato, desfaz a potncia de subjetivao daqueles habitantes, tornando-os um mesmo.

    Tom tambm est acima da cidade. Ele o cientista, capaz de entender a comunidade e

    de formular teorias para melhor-la. essa distncia que confere, pelo saber, poder a Tom e

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    torna sua relao com a comunidade um experimento que visa resultados. como se o

    mundo de Tom e o de Grace estivessem fechados, isolados, a ponto de no permitirem

    nenhuma forma de coexistncia de outros mundos, erradicando a princpio qualquerpossibilidade de experincia forte que promovesse a reconciliao entre sujeito e objeto.

    Mas na precariedade que est a abertura que faz vivificar a coexistncia de mundos.

    Quando ambos perdem o lugar do controle, Grace sucumbe vida nua e Tom duvida de sua

    prpria pureza.

    Aps os sucessivos estupros de Chuck (o colhedor de mas), Vera (a esposa) quebra

    todos os bonequinhos de porcelana que Grace havia comprado com seu salrio. Grace,

    acostumada a no chorar, chora compulsivamente ao ser expropriada da nica prova de

    que seu sofrimento havia criado algo de valor. O choro a manifestao de seu corpo que

    parece se desintegrar ao ver e ouvir a porcelana se quebrar no cho. O mundo fechado de

    Grace parece tambm se quebrar. o marco da transio do lugar do controle para a

    entrega crueza da vida. Grace vai perdendo suas qualidades e se deixando atravessar por

    uma forma de vida imanente, sem resistncias. nessa imanncia que a vida nua pode se

    afirmar. Ali, ela se basta e j no pode mais ser penetrada pelo poder que a submete.

    Quando designada pelos poderes como vida nua, desprovida de toda qualificao

    que a viria proteger, a vida no tem escolha para resistir, seno pensar-se para alm dojulgamento e da autoridade que a condenam, como potncia se autorizando a si mesma,recusando toda autoridade. Ento, a vida nua j no se submete a uma soberania quelhe exterior, e afirma a sua prpria. (PL PELBART, 2003: 67).

    No h mais um contra-poder a ser exercido, que seria filho e de uma mesma natureza

    que o poder soberano. o no-poder que nasce e retorna num movimento imanente. A

    imanncia flui (...) mas este jorrar no sai de si, e sim desgua incessante e

    vertiginosamente em si mesmo. (AGAMBEN, 2000: 176).

    Aps a deciso da comunidade de que Grace deveria ir embora, Tom v seu

    experimento fracassar, pois nada restou na frgil conscincia dos habitantes. O exemplo por

    vir se perdeu junto com a misso moral do observador. Tom procura Grace para enfim t-

    la. Ela nega seu amor e mostra a ele que sua atitude se equivalia daqueles que a usavam.

    Tom percebe que no soube tomar a realidade como um projeto prprio.

    Como a luz da lua que se esgueira em cada fresta das casas dos habitantes da

    cidade e muda por um instante a configurao de Dogville, os acontecimentos criam

    novas formas de subjetividade e os protagonistas reencontram na precariedade de suas

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    vidas a experincia. Grace tem na imanncia na vida menos humana, pois livre de

    qualquer pessoalidade a possibilidade do estilhaamento do poder que se exercia sobre

    ela e daquele que cultivava em sua arrogncia. Tom encontra, naquilo que possui de maishumano, a diluio de seu saber e de sua moral: o impedimento de ter domnio sobre a

    experincia; essa que, mesmo na precariedade, vaza.

    Mas a imanncia est aberta a novamente se qualificar em alguma forma de vida, da

    sua potncia de subjetivao8. Quando o pai de Grace e seus gangsters chegam a Dogville,

    a fugitiva que j aceitava a vida nua como uma forma de vida qualquer, desqualificada, se

    revolta contra os habitantes de Dogville e pede ao seu pai que mate a todos. A vingana vai

    instituir um novo vnculo com a cidade, no qual o poder de Grace pde ser exercido de

    forma ilimitada. Outra inverso do poder. Grace passa da imanncia soberania e Tom

    passa do mathemaaopathema, pois encontra na morte, a finitude da experincia.

    A pobreza da imagem

    Se a experincia da pobreza em Dogville se manifesta na narrativa fabuladora de von

    Trier, ela no pra de se restituir na linguagem cinematogrfica. Bem distante da linguagem

    clssica do cinema, onde o ilusionismo garante a autonomia da fico ao tratar o filme

    como real (realismo), colhendo imagens da realidade como ela vivida ou performando a

    vida atravs de enquadramentos da realidade, est von Trier. O diretor resgata o teatro para

    coloc-lo em dilogo com o cinema, usa o teatro para esvaziar a imagem do cinema e usa o

    cinema para preencher o vazio do teatro.

    Dogville no um filme em que o mundo l fora, os mundos da vida, so filmados e

    re-criados cinematograficamente para nos oferecer as imagens de um real. No h mundo l

    fora, Dogville um cenrio construdo e desenhado num palco de teatro, uma encenao

    que se quer encenao, que no se esconde por trs de imagens que buscam reproduzir asimagens da vida vivida e no performada. Mas no to somente um teatro filmado: o

    cinema se faz presente a todo momento nos movimentos, enquadramentos, cortes, contra-

    planos, primeirssimos planos que so montados. Por isso, h um movimento tenso de

    distanciamento do espectador tpico do teatro (o espectador sabe que algo est sendo

    encenado naquele momento) e de aproximao, tpica do cinema (o espectador se projeta

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    no filme em funo do efeito de realidade prprio do carter ilusionista da imagem

    cinematogrfica).

    A cidade de Dogville no aparece em fotogramas de cidade - casas, montanhas, ruas mas desenhada como numa planta e construda por divisrias de madeira, tudo sobre um

    palco plano. Os personagens passeiam por essa cidade maquete, olhando casas e paisagens

    que no existem, abrindo e fechando portas imaginrias, contemplando um sol inexistente.

    Na cena teatral, o cinema vive na presena insistente da cmera e na montagem que re-

    constroem e re-inventam o cenrio sem dele sair e emolduram as expresses e aes dos

    personagens, intensificando seus sentimentos. H, portanto, uma instabilidade da imagem

    que no a mesma que vivenciamos no teatro, pois no teatro estamos sempre a uma mesma

    distncia da cena e no filme a cmera est muito longe ou excessivamente perto.

    O olhar produzido pelo filme est confinado a esse nico cenrio que parece exibir-se

    por completo e permitir a tudo ver. A percepo que se cria a de que o enquadramento do

    palco inteiro o enquadramento do mundo, no h nada para alm das bordas da tela, no

    h partes escondidas das casas, das ruas, da cidade.

    Quando pergunto pela autenticidade de uma imagem no estou, portanto, discutindosua verdade em sentido absoluto, incondicionado. No discuto a existncia das figurasdadas ao olhar. Pergunto pela significao do que dado a ver, numa interrogao cuja

    resposta mobiliza dois referenciais: o da foto (enquadre e moldura), que define umcampo visvel e seus limites, e o do observador, que define um campo de questes eseu estatuto, seu lugar na experincia individual e coletiva. (XAVIER, 2003: 33)

    Alm do dilogo com o teatro, o filme fortemente interceptado pela literatura, pela

    narrativa literria produzida na voz de um narrador (de fora), onipresente e onisciente, que

    ao contar a fbula de Dogville, preenche de sentidos as lacunas do texto imagtico e dos

    dilogos entre os personagens. O narrador no somente busca descrever os fatos que

    ocorrem na cidade, como tambm interpret-los de forma extraordinria para deles revelar

    alguma moral.Alm da literatura se fazer presente no texto do narrador, o filme dividido em

    captulos o que remete formalizao tpica da composio literria: o suporte livro, que

    tem como forma principal de suas interfaces o ndex. Cada captulo contm um ttulo que

    antecipa os acontecimentos da histria e que, ao mesmo tempo em que prepara, ilude o

    espectador sobre o que vir. A estratgia literria presente no filme tambm reitera a

    sensao de tudo ver, a partir da iluso de tudo saber.

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    A misria de Dogville a misria da imagem. Arrastado ao mnimo de detalhes, de

    signos, de objetos, o espectador obrigado a enxergar realmente as pessoas, a viver a saga

    de Grace, a penetrar nas relaes intersubjetivas, pois nada ali pode distra-lo para outroscaminhos que a profuso de smbolos numa imagem tradicional do cinema de levaria.

    A misria em Dogville no est estampada como nas imagens de lugarejos miserveis

    que vemos a todo momento nos jornais, revistas, tev, cinema ou mesmo na vida cotidiana.

    A misria em Dogville uma misria do ver, do olhar, pois no h nada alm daquele

    insistente cenrio, no h nada alm daquelas parcas divisrias de casas e marcaes no

    cho. Por isso mesmo, a experincia da pobreza est na linguagem, que estrategicamente

    esvazia o cinema de seus recursos imagticos e confina o espectador a um espao de

    pessoas, corpos, sons e luzes. E a a vida nua se escancara, pois os personagens devolvem

    novamente ao filme a pobreza da imagem.

    Se a imagem minimalista, no se v muito, porque o avesso do jogo tudo ver.

    Pela pobreza da imagem, o espectador est preso em Dogville, assim como Grace e os

    outros habitantes da cidade. A sensao de confinamento ainda maior, pois o espectador

    est de fora, no pode interferir e nem sair dali. Ele assiste e sabe de tudo que acontece ou

    pensa que sabe, uma vez que no h nada escondido numa cidade sem casas e sem portas.

    Essa tenso do espectador que tudo v, pois no h nada para se ver alm, est bem

    cristalizada na cena em que Chuck estupra Grace dentro de sua casa. A cmera capta o

    cenrio inteiro e possvel ver os movimentos de todos os personagens e o ato do estupro

    ao fundo. No h efeito de desfocamento da imagem, mas h um desfocamento do olhar

    que procura o estupro ao mesmo tempo em que obrigado a ver a cidade inteira. Nesse

    momento, a crueza da vida de Grace se confunde com a sensao de confinamento do

    espectador.

    O jogo

    Mas o jogo de tudo ver proposto pelo filme ter seu revs. O logro do jogo de von

    Trier fazer o espectador achar que ele viu tudo em Dogville. Essa certeza estilhaada ao

    final do filme quando, inesperadamente, fotos daqueles mesmos anos difceis da Amrica

    que ambientam a trama so exibidas, seguidas de outras fotos mais contemporneas, como

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    base para a apresentao dos crditos. como se von Trier nos dissesse: no sejam to

    arrogantes, ningum v tudo ou sabe tudo, vocs no viram nada.

    No momento em que essas fotografias so projetadas, constri-se uma lacuna poderosana estrutura textual do filme, capaz de produzir uma perturbadora oscilao no espectador

    que, sem aviso, deslocado do lugar onde se encontrava. Esta lacuna mobiliza o espectador

    no sentido de superar o hiato, propondo possveis conexes entre esses dois segmentos: o

    filme que acabamos de assistir e a seqncia de fotografias.

    Durante trs horas, o filme nos imps um tipo de jogo cinematogrfico bem diferente

    do realismo que o cinema habitualmente oferece. Tudo filmado com uma cmera que

    percebemos presente, revelando a encenao, em constante movimento, solta na cena junto

    com os personagens. Ou seja, o filme nos fora a aprender novas regras para se ver o

    cinema na sua extrema economia de recursos. E ainda, a pobreza da imagem e o cenrio

    restrito e transparente criam a tenso de um jogo que coloca o espectador entre a iluso de

    tudo ver e a sensao opressiva e crescente de confinamento.

    Ao final, o espectador que se submeteu a este jogo dever estar com seu corpo

    mobilizado pelo desprazer experimentado ao longo do filme, pela atmosfera cada vez mais

    pesada e pelo impacto das ltimas cenas. O narrador finaliza o relato enquanto vemos a

    cidade numa vista area: os moradores mortos no cho e o carro que levar Grace embora

    na rua principal. A cmera vai se aproximando lentamente e vemos Moses, o cachorro at

    ento virtual que sobrevive chacina, se materializando diante de nossos olhos. Ele late

    raivoso interpelando-nos diretamente. Tudo escurece. a que o jogo faz o movimento

    inesperado. Ainda na tela escura, ouve-se a batida da msica pop, elemento estranho

    tessitura do filme que acabamos de assistir e que ensaia o movimento de resgatar o corpo

    do espectador daquele lugar profundamente incmodo. Inicia-se em seguida a projeo das

    fotos cujo teor se choca com o ritmo alegre de Young Americans(1975), de David Bowie.O que vemos? Uma mulher pobremente vestida dentro de seu casebre segura uma

    criana no colo e outra pela mo. O rosto choroso e sujo de uma criana pequena. Outra

    mulher com criana no colo na frente de um carro velho cheio de malas e badulaques no

    seu teto. Um homem com o rosto enegrecido pela fuligem encara a cmera. Sabemos que

    so fotografias antigas, em preto e branco, ainda sem nenhuma inscrio sobre elas, que

    remetem mesma poca em que se desenrolaram os acontecimentos narrados no filme. A

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    ligao imediata. Temos a ntida sensao de que os personagens de Dogvillereaparecem

    encarnados diante de nossos olhos atravs dessas imagens.

    As fotografias reapresentam inesperadamente algo que foi sonegado na representaoem Dogville. Os ndices de realidade habitualmente percebidos nas imagens

    cinematogrfica e fotogrfica so devolvidos. Os traos reconhecveis da vida cotidiana

    voltam com toda sua fora indicial e nos retiram do espao confinado onde estvamos,

    arremessando-nos ao mundo real, junto com os personagens, para fora da fico. O

    espectador ter agora os elementos necessrios para voltar ao filme e completar tudo o

    que faltava na encenao propositalmente despojada de von Trier.

    De repente, ns que pensvamos tudo ver em Dogville, nos damos conta de que

    camos numa armadilha preparada por von Trier. Aquela cidade, aqueles personagens que

    pareciam no guardar segredos para ns brilham agora iluminados pelas fotos que

    explicitam o confinamento sufocante em que estvamos e nos retira dele. O desconforto da

    vida nua vai ricochetear no mundo ordinrio que aparece nas fotografias, no mundo

    cotidiano do espectador. A oscilao acontece.

    Logo em seguida, j com os nomes dos atores se sucedendo sobre elas, sero

    projetadas fotografias mais contemporneas, em cor, de esttica mais crua, que abordam o

    mesmo universo de uma Amrica decadente, o outro lado do sonho americano. Sentados

    numa calada, debaixo da inscrio na parede que diz Little Man, alguns homens

    descansam suas muletas. O cenrio de runas. Numa cena noturna, esto mulheres

    tristemente maquiadas que poderiam pertencer constelao de personagens das fotos de

    Diane Arbus: freaks ou grotescos, mesmo na sua normalidade. Um homem,

    completamente escondido sob seu chapu e casaco pesado, vasculha uma lata de lixo. Uma

    senhora apia a cabea nas mos diante de garrafas de usque. Bbados dormem nas ruas.

    Nos quase cinco minutos que dura toda a seqncia, as imagens antigas e novas vo semisturando. Cada uma delas fica na tela por alguns segundos apenas. Vemos desfilar uma

    galeria de personagens j perdidos no passado ou bem prximos do nosso tempo. Eles se

    acumulam diante de ns. Em comum, a sensao de desamparo, abandono, degradao. A

    passagem das fotografias velhas para as contemporneas acaba por configurar uma outra

    lacuna, ao atualizar a imagem da pobreza, ligando os personagens de Dogville aos

    despossudos de hoje.

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    Do mesmo modo que as fotografias nos fazem re-significar todo o filme, a

    precariedade da imagem cinematogrfica presente na encenao de von Trier faz com que

    tambm as fotos recuperem ou ampliem sua potncia. Justapostas ao filme que acabamosde assistir, as fotografias parecem se encher de novos sentidos. As pessoas retratadas

    ganham corpo, voz, densidade.

    Estas fotos so apropriadas pelo diretor, no para serem publicadas num jornal,

    colocadas na parede de um museu ou mesmo de um hall de shopping. Elas vo integrar

    uma outra estrutura textual, distinta das situaes de recepo mais freqentes da

    fotografia, em que a seqncia e o tempo para fruir as imagens so mais frouxos. No filme,

    elas so peas de um jogo diferente, marcado pelas questes presentes no relato e pela

    forma como este construdo. Tm sua durao fixada no tempo, assim como uma ordem

    de leitura imposta ao espectador, o que gera outras associaes de sentido. A proximidade

    das fotos contemporneas com as fotos antigas, por exemplo, parece contaminar as

    primeiras da aura que as imagens fotogrficas adquirem com o tempo.

    A verdadeira diferena entre a aura que pode ter uma foto e a aura da pintura repousa narelao diferente com o tempo. A devastao do tempo tende a agir contra as pinturas.Mas parte do interesse incorporado s fotos, e uma fonte importante de seu valor esttico,so precisamente as transformaes que o tempo opera sobre elas, o modo como as fotosescapam das intenes de seus criadores. Aps o tempo necessrio, as fotos adquirem defato uma aura. (...) Pois enquanto pinturas ou poemas no se tornam melhores, maisatraentes, apenas por envelhecer, todas as fotos so interessantes, alm de comoventes, seforem velhas o bastante. (SONTAG, 2004: 156).

    O mesmo movimento do tempo que confere s fotografias essa aura tambm aquele

    que solta as amarras que a ligam a um significado localizado ou s intenes primeiras dos

    fotgrafos. Uma foto apenas um fragmento e, com a passagem do tempo, suas amarras

    se afrouxam. Ela se solta deriva num passado flexvel e abstrato, aberto a qualquer tipo de

    leitura (ou de associao com outras fotos). (SONTAG, 2004: 86).

    possvel que o espectador reconhea nas primeiras fotografias (as mais antigas) as

    imagens do ambicioso projeto de documentao fotogrfica levado a cabo nos EUA pela

    Secretaria de Segurana no Trabalho Rural, mais conhecida como FSA (Farm Security

    Administration), no final dos anos de 1930, durante o governo Roosevelt. O projeto, de

    carter francamente propagandstico, procurava retratar a populao de baixa renda dos

    rinces da Amrica, a que mais sofria com a grande depresso econmica que o pas

    atravessava. Justamente o grupo no qual poderiam se encaixar tambm os moradores de

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    Dogville. O objetivo era sensibilizar a classe mdia americana convencendo-a da

    necessidade das polticas assistencialistas que o governo vinha adotando. A orientao de

    Roy Striker, o autoritrio coordenador do projeto (que chegou a destruir os negativos dasfotos que no julgava adequadas), era de que as imagens produzidas deveriam demonstrar

    que os pobres eram mesmo pobres e, alm disso, eram dignos, tinham valor.Alguns

    fotgrafos se fazem de cientistas, outros de moralistas. Os cientistas fazem um inventrio

    do mundo; os moralistas concentram-se em pessoas com srios problemas (SONTAG,

    2004: 73-74).

    Tal moralismo subjacente s imagens do FSA, na perspectiva de Sontag, poderia ser

    colocado lado a lado ao moralismo da misso assumida por Tom em Dogville, iluminando

    um pouco mais o carter emblemtico do personagem para pensar a Amrica dos anos de

    1930. Ao convocar todos a ajudar uma estranha, Tom preocupava-se em recuperar os mais

    nobres e esquecidos valores morais da sua comunidade, que julgava quase perdidos devido

    dura experincia da pobreza. Pretendia produzir com aquele experimento um exemplo

    edificante, que poderia resgatar a dignidade dos moradores da pequena cidade.

    Analogamente, o projeto fotogrfico do FSA teve a pretenso de convocar o povo

    americano a apoiar os esforos do governo para ajudar a parcela mais miservel de sua

    populao. Se fosse bem sucedido, toda a nao sairia engrandecida e as conscincias mais

    sensveis ao drama da misria alheia, quem sabe, poderiam ser apaziguadas.

    Se serviram ou no aos propsitos do governo americano, o fato que as fotografias

    do FSA, com seus exemplos, tiveram grande repercusso na poca; foram publicadas na

    imprensa, em livros e exposies. Tornaram-se uma referncia iconogrfica importante

    daquele perodo, a representao da Grande Depresso, inspirando certamente von Trier e

    seus atores na composio dos personagens.

    J as fotografias coloridas que aparecem nos crditos, em sua maioria, so do europeuJacob Holdt, um outsider radical que viveu 15 anos nos guetos pobres dos EUA, onde

    predominam negros, realizando um trabalho cotidiano de documentao social atravs das

    pessoas que ia encontrando. O projeto gerou o livroAmerican Pictures.

    Lars von Trier usa as imagens do FSA e de Jacob Holdt para, junto com sua fbula,

    compor um lbum pessoal da Amrica, sem nunca ter estado l. O sentido delas est atado

    a este projeto, ao campo de interao armado pelo diretor. As intenes do fotgrafo no

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    determinam o significado da foto, que seguir seu prprio curso, ao sabor dos caprichos e

    das lealdades das diversas comunidades que dela fizerem uso (SONTAG, 2003: 36). Em

    Dogville, as pessoas retratadas nas fotos do FSA e de Holdt e os personagens de von Trieresto fixados na mesma moldura. Caber ao espectador consentir ou no a sua prpria

    entrada no jogo, submeter-se a ele, sofr-lo. Sem deixar de jogar ativamente no instigante

    espao de interao criado para ele pelo diretor.

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