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MATEMÁTICA FINANCEIRA NO ENSINO MÉDIO: APRIMORANDO
O DESENPENHO DE ALUNOS E PROFESSORES
Lílian Nasser (CETIQT/SENAI) - [email protected] Rosa Cordelia Novellino de Novaes (CEAN) - [email protected]
Daniela dos Santos Dias (licencianda) Instituto de Matemática - UFRJ
Constantemente o cidadão se depara com diversas opções de pagamento, seja para
adquirir um bem ou para pagar suas contas e impostos. Como decidir qual a melhor maneira
de efetuar o pagamento: à vista ou a prazo? A resposta a essa pergunta não é imediata, pois
depende de diversos fatores: a taxa de juros cobrada, o número de prestações, a data dos
pagamentos e a taxa de atratividade, isto é, a taxa com a qual se consegue fazer render o
dinheiro. O estudo da Matemática Financeira no Ensino Médio deve preparar os alunos para
enfrentar esse tipo de situação no seu dia-a-dia.
Um levantamento bibliográfico constatou que praticamente não existe pesquisa sobre a
aprendizagem de Matemática Financeira. A maioria dos livros didáticos brasileiros aborda o
tema de forma tradicional, por meio da aplicação de fórmulas ou do uso sem significado de
tabelas. Poucos relacionam o tema com o estudo de funções ou de progressões aritméticas ou
geométricas e também não problematizam situações do cotidiano. Há ainda, no mercado,
diversos livros de Matemática Financeira destinados à preparação para concursos, que são
inadequados para o Ensino Médio.
Em geral, o cidadão comete erros como somar taxas de porcentagem aplicadas
sucessivamente, comparar quantias que não se referem à mesma data ou considerar que
parcelas iguais em datas distintas tenham o mesmo valor.
Nossa pesquisa indica que grande parte dos professores não aborda esse tipo de
situação em suas aulas e, o que é pior, muitos deles não têm a formação necessária para
ensinar seus alunos a resolver os problemas concretos de Matemática Financeira que se
apresentam no cotidiano.
Nossa proposta é uma abordagem visual e prática para o tema, levando em conta os
princípios básicos da Matemática Financeira: o uso da taxa como fator e o deslocamento de
quantias no tempo. O aspecto visual da abordagem é alcançado por meio do eixo de setas e o
prático, pela exploração de situações reais que se apresentam na prática dos investimentos e
das vendas a prazo.
No ensino de porcentagem é recomendável acostumar o aluno a usar a notação
decimal, já que alguns exercícios podem ser resolvidos mais facilmente com essa notação. Por
exemplo, para calcular o preço de uma mercadoria que sofreu um aumento de 15%,
representamos a taxa i = 0,15 e basta multiplicar o preço original P por 1,15, já que:
P + 15% de P = 100% de P + 15% de P = 115% de P = 1,15 P.
No caso de um desconto de 20%, por exemplo, o novo preço é obtido por meio de uma
única operação, de multiplicação pelo fator 100% – i = 100% – 20% = 80% = 0,8.
De modo geral, para calcular o valor após um aumento de uma taxa i (na notação
decimal), basta multiplicar o valor original por (1 + i), e no caso de um desconto, multiplica-se
por (1 – i).
O uso da porcentagem na notação decimal é também mais adequado ao uso da
calculadora na resolução dos problemas, o que é recomendado, inclusive pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais (Brasil, MEC, 1998). Conjugando o eixo das setas com a porcentagem
na notação decimal e o uso da calculadora, é possível estabelecer um método de raciocínio que
pode ser aplicado a qualquer problema.
Exemplo: Imagine que um produto sofra um aumento de 30% num mês e outro de 10% no
mês seguinte. Qual será a taxa de aumento total sobre o preço do produto nesses dois meses?
Pode-se supor que o preço do produto seja R$ 200,00. Com o aumento de 30%, temos:
(100% de 200) + (30% de 200) = 130% de 200 = 1,3 x 200 = 260.
Após o aumento de 10% teremos: 200 260 286
(100% de 260) + (10% de 260) = 110% de 200 = 1,1 x
260 = 286 ou 110% de (130% de 200) =
( ) 2862004312003111 =×=×× ,,, . 0 1 2 x 1,30 x 1,10
Portanto, a taxa total de aumento é de 43%. x 1,43
O mesmo problema poderia ser resolvido sem arbitrar um valor numérico, usando uma
letra para representar o preço do produto: P x 1,3 x 1,1 = P x 1,43 e pode-se deduzir
diretamente que a taxa total de aumento é de 43%.
O ensino de juros simples e compostos deve ser associado aos tópicos de funções e
progressões. No caso dos juros simples, os valores obtidos em cada período formam uma
Progressão Aritmética e o gráfico que dá esses valores em função do tempo é representado por
pontos colineares (gráfico de uma função afim). Já nos juros compostos, os valores obtidos a
cada período formam uma Progressão Geométrica e o gráfico que representa a quantia obtida
em função do tempo de aplicação cresce de forma exponencial.
Usando o eixo das setas, evita-se a memorização de fórmulas para juros simples ou
compostos, e prepara-se o aluno para a compreensão da variação do dinheiro no tempo. Além
disso, aliando o eixo das setas à animação do power-point, é possível visualizar as operações
adequadas para a transposição de quantias no tempo estimulando o aluno a criar seu próprio
método de resolver problemas.
Exemplo:
Bia pegou um empréstimo de R$ 300,00 a juros mensais de 15%. Dois meses depois, Bia
pagou R$ 150,00 e, um mês após esse pagamento, liquidou seu débito. Qual o valor desse
último pagamento?
( )( ) 15,115015,1300P 2 ×−×=
P = 283,76
0
300,00
–
1 2
. (1,15) 2
. (1,15)
3
246,75
396,75150,00
283,76
. (1,15)
Os pontos principais da seqüência didática adotada são:
uso da porcentagem como fator, na notação decimal, de modo que, para encontrar um
valor com uma taxa i de aumento, multiplica-se a quantia original por (1+i) e se for
desconto de i, multiplica-se a quantia original por (1- i);
representação da situação problema no eixo das setas e transposição dos valores para
uma mesma data para que possam ser comparados e/ou somados;
exploração de problemas práticos, do dia-a-dia dos cidadãos;
integração com outros conteúdos como progressões e gráficos das funções afim e
exponencial;
análise de diversas estratégias para resolver um mesmo problema, exemplificadas por
soluções apresentadas por alunos de Ensino Médio.
Essa proposta tem sido divulgada em oficinas de capacitação para professores e os
primeiros resultados indicam que, após vivenciar a resolução das atividades pelo método do
eixo das setas, os professores e licenciandos deixam de cometer os enganos iniciais e passam a
dominar os princípios da Matemática Financeira. Como conseqüência, sentem-se seguros para
abordar situações financeiras desafiadoras em suas aulas.
Isso tem sido constatado por meio da aplicação de um problema do cotidiano, resolvido
antes do início de cada oficina. Em alguns casos foi possível pedir aos professores que
resolvessem o mesmo problema após vivenciar a nossa proposta para o ensino de Matemática
Financeira.
O problema é o seguinte:
A diretora da escola juntou dinheiro para comprar um computador. Comparando os preços de mercado, encontrou a seguinte oferta numa loja:
Computador: R$ 1 800,00 à vista ou em
3 x iguais sem juros (entrada + 2)
A diretora pediu um desconto para o pagamento à vista, mas o vendedor respondeu que o preço a prazo sem juros era igual ao preço à vista e, portanto, não era possível dar desconto. Considerando que o dinheiro pode render 4% ao mês, qual seria o preço justo para o pagamento à vista?
A resolução desse problema envolve a noção básica de variação do dinheiro no tempo, e
é uma ótima oportunidade de alertar os alunos para a proposta enganosa anunciada pela mídia
de que o preço a prazo sem juros pode ser igual ao preço à vista. Uma vez que todos os
pagamentos não são feitos na data da compra, e considerando que sempre é possível aplicar o
dinheiro referente às prestações futuras, conclui-se que o a soma das prestações não é
equivalente ao preço à vista.
Para nossa surpresa, no primeiro grupo a que apresentamos esse problema, composto
por 15 professores do Ensino de Jovens e Adultos do Município do Rio de Janeiro, apenas um
deu a resposta correta. Uma segunda aplicação foi feita numa turma do Curso de
Especialização em Ensino de Matemática e, dos 27 professores que resolveram o problema,
novamente apenas um deu a resposta correta. Os principais erros cometidos foram a
comparação de quantias em datas distintas, uso de juros simples em vez de juros compostos e
tentativa mal sucedida de usar fórmulas.
Numa amostra com 80 licenciandos e professores, após assistir à aula com a
abordagem do eixo das setas, o número de acertos subiu para 48, o que corresponde a 60% do
grupo. Uma solução correta para o problema usando o eixo das setas é apresentada a seguir.
A cada mês, o dinheiro é valorizado em 4%. O eixo das setas abaixo representa a situação, onde o fator de correção é de 1,04. A entrada foi de R$600,00. O segundo pagamento, de R$600,00, um mês após, equivale, na data da compra,
600 600 600
÷ 1,04
÷ (1,04)2
a 04,1
600 e o terceiro pagamento, também de R$600,00, efetuado 2 meses após a
compra, equivale, na data da compra, a 2)04,1(600 .
Logo, na data da compra, os pagamentos efetuados a prazo equivalem a:
600 + 04,1
600 + 2)04,1(600 = 600,00 + 576,92 + 554,73 = R$1 731,65.
Comentários finais:
Neste trabalho apresentamos problemas práticos, que ocorrem no dia-a-dia do cidadão.
Infelizmente. A maioria dos alunos egressos do Ensino Médio não estão preparados para
enfrentar situações desse tipo. E, o que é pior, os professores em geral não estão preparados
para ensinar Matemática Financeira de modo eficaz, abordando esse tipo de problema.
É preciso alertar os cidadãos para alguns erros comuns no trato com situações
financeiras, como:
− acréscimos ou descontos sucessivos devem ser multiplicados e não somados;
− pagamentos da mesma quantia em datas distintas não têm o mesmo valor;
− quantias que se referem a datas distintas não podem ser somadas;
− só é possível comparar formas diferentes de pagamento se o valor total das diversas
formas de pagamento estiverem na mesma data.
O ensino de Matemática Financeira deve esclarecer essas dúvidas, ajudando os alunos
a evitar as armadilhas anunciadas na mídia. E isso pode e deve ser feito de modo dinâmico e
visual, usando a notação decimal e o eixo das setas. A animação ajuda os alunos a
compreender a variação do dinheiro no tempo e facilita o desenvolvimento de estratégias
próprias na resolução de problemas.
Referências bibliográficas:
Brasil, Ministério da Educação (1988): Parâmetros Curriculares Nacionais.
Lima, EL, Carvalho, PCP, Wagner, E, Morgado, AC (2000): A Matemática do Ensino Médio,
vol. 2, Coleção do Professor de Matemática, SBM.
Novellino, JEF e Novaes, RCN (a aparecer): Matemática Financeira: um método visual.