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“Em 16 anos, o número de mortes relacionadas com depressão cresceu 705% no Brasil, mostra levantamento inédito feito pelo jornal O Estado de S. Paulo com base nos dados do sistema de mortalidade do Datasus. Estão incluídos na estatística casos de suicídio e outras mortes motivadas por problemas de saúde decorrentes de episódios depressivos.” O cenário brasileiro retrata em menor escala o que vem acontecendo no mundo globalizado a anos. A depressão como uma forma de refúgio automático para as pessoas que não se sentem e não conseguem ser felizes nos moldes da sociedade. Questionando o que muitos acreditam, é mesmo preciso ser feliz e estar sempre feliz? Se é preciso ou não, sabemos que o ser humano tem essa necessidade que já virou de sua natureza, algo instintivo, não há um mal nisso, o problema é quando isso vira uma obrigação a qualquer custo, uma obsessão, e o ser humano passa a não aceitar nenhum estado emocional diferente desse, motivado pelo “sempre mais” do capitalismo, o que você tem, sendo bens materiais ou não, nunca é suficiente, e a busca pela felicidade se torna sem fim. Quando somente há espaço para a felicidade, quando somente ela é aceita, a infelicidade é sempre rejeitada, tal infelicidade que tantas vezes é necessária e tal infelicidade que tanto inspirou poetas e escritores ao longo de anos, durante toda nossa história. Muitos deles a aceitaram e transformaram em palavras. Aceitar a tristeza não quer dizer “tê-la para sempre”, mas sim entende-la de forma perspicaz e ter a destreza de saber separar as coisas. Se torna parcialmente impossível receber a aflição de forma racional quando enraízam em nós a falta de preparo para qualquer situação adversa à felicidade. Da mesma forma que uma criança que nasce em um lugar de violência constante e de grande criminalidade tende a repetir institivamente no futuro tudo que presenciou e conviveu, assim somos todos nós, pagamos pelo despreparo da sociedade. Desde o final da Segunda Guerra Mundial, quando o capitalismo começou a aflorar de forma prepotente e mais presente em todo o mundo, a humanidade deteve-se em alimentar o mercado da maneira que o mesmo queria, com o consumo. Passamos a ser consumidores mais presentes, e gradativamente mais compulsivos. Como na antiguidade onde o ser humano era o que ele tinha, com a valorização e o aumento do consumo, passamos a valorizar demasiadamente os bens, e a depositar muito mais do que simplesmente valores neles. Os nossos pertences materiais ganharam todo o sentimento que muitas vezes nos falta nas coisas do nosso dia-a-dia. Eles podem garantir o bem-estar e muitas vezes são sim necessários, mas é um exagero coloca-los no lugar da nossa felicidade. É inegável que uma vida confortável facilite alcança-la, pois isso eles proporcionam, mas não deixa de ser possível alcança-la quando não os temos das formas mais variadas e podemos facilmente adquiri-los. O erro estaria em fundamenta-la simplesmente nos bens, sendo esta felicidade

Artigo de Opinião

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Artigo de opinião sobre a felicidade

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Page 1: Artigo de Opinião

“Em 16 anos, o número de mortes relacionadas com depressão cresceu 705% no Brasil, mostra levantamento inédito feito pelo jornal O Estado de S. Paulo com base nos dados do sistema de mortalidade do Datasus. Estão incluídos na estatística casos de suicídio e outras mortes motivadas por problemas de saúde decorrentes de episódios depressivos.”

O cenário brasileiro retrata em menor escala o que vem acontecendo no mundo globalizado a anos. A depressão como uma forma de refúgio automático para as pessoas que não se sentem e não conseguem ser felizes nos moldes da sociedade. Questionando o que muitos acreditam, é mesmo preciso ser feliz e estar sempre feliz?

Se é preciso ou não, sabemos que o ser humano tem essa necessidade que já virou de sua natureza, algo instintivo, não há um mal nisso, o problema é quando isso vira uma obrigação a qualquer custo, uma obsessão, e o ser humano passa a não aceitar nenhum estado emocional diferente desse, motivado pelo “sempre mais” do capitalismo, o que você tem, sendo bens materiais ou não, nunca é suficiente, e a busca pela felicidade se torna sem fim.

Quando somente há espaço para a felicidade, quando somente ela é aceita, a infelicidade é sempre rejeitada, tal infelicidade que tantas vezes é necessária e tal infelicidade que tanto inspirou poetas e escritores ao longo de anos, durante toda nossa história. Muitos deles a aceitaram e transformaram em palavras. Aceitar a tristeza não quer dizer “tê-la para sempre”, mas sim entende-la de forma perspicaz e ter a destreza de saber separar as coisas.

Se torna parcialmente impossível receber a aflição de forma racional quando enraízam em nós a falta de preparo para qualquer situação adversa à felicidade. Da mesma forma que uma criança que nasce em um lugar de violência constante e de grande criminalidade tende a repetir institivamente no futuro tudo que presenciou e conviveu, assim somos todos nós, pagamos pelo despreparo da sociedade.

Desde o final da Segunda Guerra Mundial, quando o capitalismo começou a aflorar de forma prepotente e mais presente em todo o mundo, a humanidade deteve-se em alimentar o mercado da maneira que o mesmo queria, com o consumo. Passamos a ser consumidores mais presentes, e gradativamente mais compulsivos. Como na antiguidade onde o ser humano era o que ele tinha, com a valorização e o aumento do consumo, passamos a valorizar demasiadamente os bens, e a depositar muito mais do que simplesmente valores neles.

Os nossos pertences materiais ganharam todo o sentimento que muitas vezes nos falta nas coisas do nosso dia-a-dia. Eles podem garantir o bem-estar e muitas vezes são sim necessários, mas é um exagero coloca-los no lugar da nossa felicidade. É inegável que uma vida confortável facilite alcança-la, pois isso eles proporcionam, mas não deixa de ser possível alcança-la quando não os temos das formas mais variadas e podemos facilmente adquiri-los. O erro estaria em fundamenta-la simplesmente nos bens, sendo esta felicidade ilusória e vulnerável as adversas da vida, deixando assim muitas lacunas neste sentimento tão belo e tão completo.

Segundo estudos a ciência afirma que a felicidade está ligada a três fatores, prazer, engajamento e significado. Não é de meu feitio, mas discordo da ciência, ao menos neste ponto. Acredito que seu poder é limitado quanto a sentimentos, entender somente como o cérebro funciona e quais partes do mesmo são ativadas a cada sensação, não resume um sentimento, e não se deve esquecer a diferença entre alegria e felicidade. Um tão instantâneo e o outro tão duradouro e praticamente permanente.

Talvez podemos dizer que esteja aí uma das coisas que confundimos diariamente. Momentos de alegria não nos levam automaticamente às “pessoas felizes”, momentos assim até mesmo as pessoas mais infelizes possíveis possuem. O pleno sentimento aqui em questão está muitas vezes na forma de levar a vida, de encará-la, e de ter um controle sobre seus sentimentos sendo eles os mais adversos.

Uma forma de prepotência muito comum, são as “receitas de bolo” das mais variadas formas de como ter o controle da situação e achar o caminho para a felicidade. Pessoas que se dizem felizes, escrevem cada vez mais sua maneiras (sempre falhas) de nos levar aonde elas chegaram. O erro está onde estes escritos não conseguem atingir todos os leitores, a lição de vida que serviu para elas provavelmente não servirá para todos seus leitores, pois pensamentos de ambos, são certamente, muitas vezes distintos.

Page 2: Artigo de Opinião

A perfeição dos autores são inúmeras vezes ridícula, ao escreverem textos com títulos “O que as pessoas felizes fazem” ou “O que não se deve fazer para ser feliz”

“A depressão é o mal de uma sociedade que decidiu ser feliz a todo preço”, afirma o escritor francês Pascal Bruckner