ASPECTOS PSICOLÓGICOS DA PESSOA COM NECESSIDADES ESPECIAIS.pdf

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    CURSO DE PS-GRADUAO LATO SENSU

    INSTITUTO EDUCACIONAL ALFA

    APOSTILA

    ASPECTOS PSICOLGICOS DA PESSOACOM NECESSIDADES ESPECIAIS

    MINAS GERAIS

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    HISTRICO DA EDUCAO ESPECIAL

    A Educao Especial uma rea relativamente nova. Como campo de estudo

    da Pedagogia, foi sistematizada em meados do sculo XX e, apenas na dcada de

    1960, passou a integrar a organizao das Secretarias de Estado da Educao co-

    mo parte da estrutura e funcionamento dos sistemas de ensino. Esse marco histri-

    co guarda um significado para a compreenso atual da Educao Especial, j que

    as concepes sobre a natureza do atendimento realizado, que o antecederam e o

    sucederam, relacionam-se a uma complexa luta de interesses decorrentes das

    transformaes polticas e econmicas por que passaram as diversas formaes

    sociais.

    Deve-se entender o movimento histrico que definiu a Educao Especial

    como integrante do sistema de ensino em meio s mesmas contradies existentes

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    no contexto geral de educao, decorrentes de suas formas de participao na soci-

    edade capitalista, constituda na dimenso da prxis e do trabalho social.

    So as mudanas nas formas de organizao da vida produtiva e material

    que determinam as transformaes na constituio do alunado da Educao Espe-

    cial, ao longo da histria. Se, em sua origem, no sc. XVIII, prestava-se ao atendi-

    mento apenas s pessoas com deficincias sensoriais como a surdez e a cegueira,

    atualmente amplia seu escopo de atuao, incorporando a ampla gama de alunos

    com necessidades educacionais especiais e que, no necessariamente, apresentam

    alguma deficincia, como o caso dos superdotados. A definio desse alunado

    est condicionada s complexas relaes de poder imersas nos movimentos sociais

    concretos e no mera relao do meio social com a representao da deficincia.

    Neste texto, apresenta-se um amplo panorama da ateno s pessoas com defici-

    ncia na histria, desde a Antiguidade aos dias atuais, destacando-se as concep-

    es de sujeito subjacentes, em cada uma das etapas que constituram marcos em

    relao ao atendimento prestado. Assim, pretende-se demonstrar que muitas das

    prticas, desenvolvidas na contemporaneidade, tm suas razes fundadas nas pri-

    meiras percepes da sociedade em relao a esse grupo de pessoas, fortalecendo

    mitos e esteretipos acerca de suas limitaes e possibilidades.

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    A organizao da Educao Especial sempre esteve determinada por um cr i-

    trio bsico: a definio de um grupo de sujeitos que, por inmeras razes, no cor-

    responde expectativa de normalidade ditada pelos padres sociais vigentes. As-

    sim, ao longo da histria, ela constitui uma rea da educao destinada a apresentar

    respostas educativas a alguns alunos, ou seja, queles que, supostamente, no

    apresentariam possibilidades de aprendizagem no coletivo das classes comuns, que

    foram, entre outras denominaes estigmatizantes, rotulados como excepcionais,

    retardados, deficientes.

    Essa concepo que motivou a sua natureza de atendimento esteve, portan-

    to, vinculada a um movimento social de sistematizao de prticas de disciplinamen-

    to relacionadas caracterizao dos indivduos (loucos, marginais, doentes men-

    tais, deficientes), a fim de enquadr-los em categorias que facilitariam seu tratamen-

    to. Essa situao remete questo histrica dos diagnsticos e prognsticos que,

    muitas vezes, perpetuaram-se como prticas de excluso social. Esclarece Veiga

    Neto (2001) que

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    Ainda que os critrios de partilha normal anormal emerjam da pura rela-

    o do grupo consigo mesmo, as marcas da anormalidade vm sendo pro-

    curadas, ao longo da Modernidade, em cada corpo para que, depois, a cada

    corpo se atribua um lugar nas intricadas grades das classificaes dos des-

    vios, das patologias, das deficincias, das qualidades, das virtudes, dos v-

    cios (p. 107).

    Assim, constata-se que a ateno educacional aos alunos, atualmente deno-

    minados com necessidades especiais, esteve motivada por concepes de atendi-

    mento que refletem diferentes paradigmas nas relaes da sociedade com esse

    segmento populacional.

    O extermnio, a separao, o disciplinamento, a medicalizao so diferentes

    prticas para se relacionar com as pessoas que fogem ao padro de normalidade,

    produzidas no interior de cada grupo social para responder s suas exigncias de

    existncia. A cada um dos momentos envolvidos nos processos histricos de produ-

    o da vida decorre uma concepo de homem, sociedade e conhecimento que de-

    terminam a natureza e a abrangncia das polticas de atendimento a essa popula-

    o.

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    DO MITO SEGREGAO: A EXCLUSO DAS

    PESSOAS COM DEFICINCIA NA HISTRIA

    Desde a concepo metafsica, que relacionava a deficincia ao sobrenatural,em que pessoas nessas condies eram tratadas como a personificao do mal,

    sendo passveis de torturas e morte para expiao dos pecados, at os sculos da

    Inquisio Catlica que se seguiram, apenas reforou-se a mstica da divindade a

    respeito das pessoas com deficincia.

    Os primeiros modelos para explicao das anomalias fsicas, mentais ou sen-

    soriais, decorrentes de deformaes congnitas ou doenas graves que acometiam

    as pessoas, foram buscados na mitologia e no sobrenatural, durante sculos. Na

    Idade Mdia essa crena foi intensificada, concebendo-se a deficincia como obra e

    interveno direta de Deus ou de outros seres superiores, seja sob a forma de casti-

    go para expiao de pecados, seja sob a forma de beno quando privilegiados pelo

    dom da vidncia ou do milagre da cura.

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    Esse conjunto de ideias, que vinculava o homem e sua existncia merc

    dos desgnios da natureza ou da religiosidade, constituiu o perodo denominado pr-

    cientficono atendimento s pessoas com deficincia, arrastou-se ao longo dos mui-

    tos sculos da Idade Mdia e alcanou parte da Idade Moderna, com poucas trans-

    formaes operadas em relao ateno social a essa populao. Muitos dos mi-

    tos e esteretipos construdos nesse longo perodo ainda povoam o imaginrio soci-

    al at a atualidade.

    Ao final do sculo XVI, na Europa, em funo do desenvolvimento das foras

    produtivas e das novas formas de elaborao do conhecimento dela decorrentes,

    foram lanadas as sementes que operariam mudanas significativas em relao a

    esse grupo de pessoas no convvio social, trs sculos mais tarde.

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    AS BASES CIENTFICAS PARA O SURGIMENTO DA

    EDUCAO ESPECIAL

    Precisamente a partir do final do sculo XIX, com o desenvolvimento de pes-

    quisas na rea da Medicina, um novo enfoque passou a ser dado deficincia, cen-

    trado em concepes clnicas que se ocupavam da doena, dos tratamentos e da

    cura. Desse modo, pode-se afirmar que as primeiras prticas cientficas de ateno

    pessoa com deficincia tinham como finalidade sua segregao, em instituies,

    para cuidado, proteo ou tratamento mdico, caracterizando o paradigmada insti-

    tucionalizao, que vigorou aproximadamente por oito sculos, durante parte da

    Idade Mdia at o incio do sc. XX (BRASIL, 2004).

    Na anlise de Bianchetti (1998), nos sculos que se seguiram ao XVI, a pas-

    sos lentos, a preocupao com a diferena daqueles que no se encaixavam aos

    padres de normalidade como os dementes, os paralticos, os doentes venreos ou

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    toda sorte de desajustados, passava da rbita da influncia da Igreja para se tornar

    objeto da medicina, que passava a criar as bases para uma interpretao organicis-

    ta.

    Na Frana, em 1800, Jean Itard investiu na tentativa de recuperar e educar

    Victor de Aveyron, um menino selvagem criado em uma floresta com animais, sem

    qualquer contato com seres humanos, em um estado completo de privao social.

    Por suas tentativas de educar e recuperar o potencial cognitivo de Victor que, supos-

    tamente, apresentava uma deficincia mental profunda. Por meio de procedimentos

    mdico-pedaggicos, Itard considerado o precursor da Educao Especial. Guian-

    do-se por seus procedimentos iniciais, alastraram-se pela Europa instituies para a

    clausura de pessoas marginalizadas socialmente, como doentes mentais, pessoas

    com deficincia, assassinos, entre outros.

    Destaca-se, tambm, neste perodo, o trabalho do mdico francs Philippe

    Pinel que, baseado nas ideias iluministas de Descartes, sistematizou os primeiros

    estudos cientficos sobre a mente humana, tornando o psquico matria de conheci-

    mento objetivo e quantitativo, decorrendo uma classificao para as doenas men-

    tais.

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    Para Fernandes (2006a), os indicadores que ditavam a fuga aos padres de

    normalidade tiveram forte influncia mdica em sua determinao, consolidando a

    hegemonia da Medicina, poca, impulsionando a concepo de deficincia basea-

    da em critrios de definio fundamentalmente orgnicos. Dessa forma, deficincia

    confundiu-se com patologia, instituindo-se o estigma de doentes mentais queles

    que a apresentavam e que se viam impedidos de conviver, normalmente, por se

    apresentarem como perigo sociedade, em virtude de sua condio.

    Dessa compreenso equivocada, decorreu outra que atribua herana gen-

    tica a origem dos inmeros distrbios fsicos e intelectuais. Incorporava-se a viso

    inatista e o determinismo gentico concepo de desenvolvimento humano que

    ultrapassou os diferentes sculos, norteando algumas prticas em Educao Espe-

    cial at a atualidade. Ao perpetuar-se a perspectiva de que os distrbios e deficin-

    cias eram traos inerentes aos sujeitos, descartou-se qualquer possibilidade de in-

    terveno para superar essa condio.

    A consequncia mais imediata dessa tica foi proliferao de procedimentospara classificar e identificar a deficincia (ou para o desvio do padro mdio), o que

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    ocorria, via de regra, por diagnstico clnico, quando se tratava de deficincias fsi-

    cas sensoriais e no sensoriais e diagnstico psicolgico e/ou psiquitrico, para as

    deficincias intelectuais, consolidando a medio da inteligncia como prtica alta-

    mente eficaz para delimitar os diferentes nveis do atraso mental.

    Para aqueles que apresentavam diferenas fsicas significativas, atraso no

    desenvolvimento global e/ou encontravam-se abaixo da mdia intelectual, adotada

    como norma, eram organizados espaos distintos e separados para sua educao.

    Beyer (2003) aponta que as construes de diversas reas de conhecimento, como

    a psicologia e a educao, incorporaram o forte vis do disciplinamento mdico, com

    categorias teraputicas de cuidado e isolamento, em suas prticas. Essa tendncia

    seria incorporada s futuras prticas nas escolas especiais, onde essa perspectiva

    passaria a ditar, inclusive, as normas pedaggicas a serem desenvolvidas pelos pro-

    fessores.

    Conforme historiciza Bueno (1993), o aten-

    dimento pioneiro s pessoas cegas e surdas, que

    se intensificou nos sculos XVIII e XIX, com a aber-

    tura de instituies em vrios pases, correspondeu

    ao ideal liberal de extenso das oportunidadeseducacionais queles que poderiam interferir na

    ordem necessria ao desenvolvimento da nova

    forma de organizao social capitalista. Assim, o processo de racionalizao da so-

    ciedade passou a exigir, cada vez mais, o encaminhamento dos desocupados para o

    processo produtivo.

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    Nesse perodo, a Educao Especial para esses dois grupos de pessoas com

    deficincia no mantinha objetivos especificamente acadmicos. Seu currculo prio-

    rizava a instruo bsica com o ensino das letras e noes da aritmtica, mas des-

    tacava-se o trabalho manual para o treinamento industrial. O espao hbrido das ins-

    tituies asilo-escola-oficina produzia mo-de-obra barata para um processo ainda

    incipiente de produo industrial e reservava, aos cegos e surdos, um trabalho des-

    qualificado em troca de um arremedo de salrio ou um prato de comida.

    O que se pode depreender destes dois sculos o incio do movimento

    contraditrio de participao-excluso que caracteriza todo o desenvolvi-

    mento da sociedade capitalista, que se baseia na homogeneizao para a

    produtividade e que perpassar toda a histria da educao especial (BUE-

    NO, 1993, p. 63).

    No necessrio pontuar que essa educao popular estava destinada aos

    pobres e miserveis que no tiveram a beno de ter nascido em famlias nobres,

    as quais dispensavam aos seus filhos uma forma de educao realizada, em casa,

    por preceptores.

    Em relao s demais deficincias, h relatos pontuais sobre experincias in-

    dividuais de educao s pessoas com deficincia fsica ou mental em pases euro-

    peus, quando oriundos da nobreza. No mais, faziam parte da massa de excludos e

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    divergentes sociais os pobres, os mendigos e os loucos, asilados em instituies e

    encaminhados para o trabalho forado, manual e tedioso, em troca de abrigo.

    Nessa etapa, tambm denominada deperodo de segregao, pelo forte car-

    ter de recluso das pessoas com deficincia em ambientes separados, que compre-

    ende a segunda metade de 1800 e os anos iniciais de 1900, o carter do atendimen-

    to era assistencial e filantrpico, j

    que no tinha finalidade pedaggica,

    mas de proteo dos membros da

    sociedade, por meio da recluso das

    pessoas ditas anormais.

    Circunscrita a discursos e

    prticas mdicas, a Educao Espe-

    cial consolidou-se como rea que

    tem por finalidade exercer um poder

    de normalizao sobre os sujeitos, cabendo-lhe como um saber mdico relacionar o

    educar e o cuidar, com o corrigir, o tratar e o psicologizar (FERNANDES, 2006b). Na

    viso de Lunardi (2006), a noo de norma e normalidade tem sua gnese nos scu-

    los XVIII e XIX. Em conexo com o processo de industrializao e de transformaocapitalista, o Estado Moderno passou a controlar a sade da populao, focando

    ateno no corpo social. Diz autora que a medicina a cincia que detm os mei-

    os cientficos para exercer esse cuidado: desenvolve um conjunto de tcnicas capa-

    zes de realizar procedimentos de medio, comparao e catalogao, a fim de re-

    cuperar o comportamento e a alma daqueles que, por inmeros motivos, desviam

    dos padres e constituem os anormais. A institucionalizao da norma se materializa

    http://www.google.com.br/imgres?q=INCLUS%C3%83O+ESCOLAR&start=79&hl=pt-BR&biw=1600&bih=719&addh=36&tbm=isch&tbnid=fAv2brPiD6I3JM:&imgrefurl=http://educacaoespecialbrasil.blogspot.com/2012/01/introducao.html&docid=Fp3VBtbHGXwNIM&imgurl=http://2.bp.blogspot.com/-2SqvlMOa4f0/TyC2-4GG6MI/AAAAAAAAAfU/nwHSF2RtCiA/s1600/educacao_especial_brasil_inclusao.jpg&w=400&h=362&ei=TWAQUOXLLYnW6wG90oCwDg&zoom=1&iact=hc&vpx=731&vpy=339&dur=687&hovh=214&hovw=236&tx=100&ty=163&sig=105089212720933807994&page=4&tbnh=173&tbnw=191&ndsp=28&ved=1t:429,r:17,s:79,i:59
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    em diferentes tcnicas e dispositivos: a famlia, a escola, o hospcio, a priso e a

    Educao Especial. Desse modo, nesta ltima, o dispositivo da normalidade aparece

    sob a forma de correo, de reabilitao, de prticas pedaggicas teraputicas, a fim

    de humanizar, civilizar e corrigir os anormais deficientes.

    Nesse perodo, no Brasil, sob a concepo de institucionalizao vigente na

    Europa, foram criadas as primeiras instituies para o atendimento s pessoas ce-

    gas e s pessoas surdas, como lugar de residncia e trabalho, entre 1854 e 1857,

    poca do Imprio. A preocupao com outras reas de deficincia, como a fsica e

    mental, deu-se muito mais tarde, em torno de 1950. O atendimento especializado

    centrado em cuidados assistenciais e teraputicos estendeu-se por mais de um s-

    culo, enraizando concepes e prticas at os dias atuais.

    Torna-se interessante frisar que, assim como no resto do mundo, no Brasil, as

    primeiras iniciativas no atendimento s pessoas com deficincia tiveram carter pri-

    vado, j que os grupos pioneiros envolvidos nesse processo de criao de servios

    tinham suas aes reguladas por interesses pes-

    soais, como a necessidade de oferecer algum

    atendimento a um familiar, ou simplesmente pela

    beneficncia, incentivada pela Igreja nas classesmais abastadas.

    Assim, a despeito de esparsas iniciativas

    dos setores pblicos, o atendimento especializado

    s pessoas com deficincia se firmou como ao

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    predominantemente desenvolvida por iniciativas isoladas, de amigos e familiares,

    que ganhou fora nos movimentos sociais das dcadas subsequentes, fato que no

    se alterou, significativamente, na oferta da Educao Especial at os dias atuais.

    O paradigma da institucionalizao

    permaneceu como modelo de atendimento

    at meados da dcada de 1950, quando

    eclodiram inmeros movimentos sociais no

    mundo ocidental, decorrentes do clima de

    insatisfao social, gerados aps o trmino da

    segunda Guerra Mundial. As principais ban-

    deiras ideolgicas desses movimentos foram

    sintetizadas na Declarao Universal dos Direitos Humanos, redigida sob o impacto

    das atrocidades cometidas durante a guerra pelas potncias ocidentais e apontam

    que a essncia dos direitos humanos est no direito a ter d ireitos. Dessa forma,

    esse documento passou a inspirar, desde ento, as polticas pblicas e os instru-

    mentos jurdicos da grande maioria dos pases.

    Nesse contexto, em particular, conclamava-se

    o intenso movimento mundial de defesa dos direitos das minorias, que ca-

    racterizou a dcada de 60, associado a crticas contundentes ao Paradigma

    da Institucionalizao de pessoas com doena mental e de pessoas com

    deficincia, determinou novos rumos s relaes das sociedades com esses

    segmentos populacionais (BRASIL, 2004, p. 11).

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    O ponto alto nesse perodo da histria da Educao Especial est relacionado

    mudana na concepo das pessoas com deficincia, que passaram a ser vistas

    como cidads, com direitos e deveres de participao social, embora persistisse a

    tica assistencial e caritativa e o vis da medicalizao em sua educao (FER-

    NANDES, 2006a).

    Nesse ponto, no Brasil, foram observadas as primeiras aes de ateno

    deficincia de carter pblico motivadas, resumidamente, por dois fatores: a mobili-

    zao social e os movimentos socioeconmicos mundiais. De um lado, nas dcadas

    de 1960 e 70, acirraram-se os movimentos sociais que mobilizaram pais e educado-

    res, em decorrncia da democratizao da escola s camadas mais desfavorecidas

    economicamente. Organizaram-se tambm as primeiras associaes de pais e pes-

    soas com deficincia.

    Por outro lado, o movimento econmico mundial, em meio s crises do capi-

    tal, aps a segunda Guerra, buscou sadas para acelerar o desenvolvimento dos

    pases altamente capitalizados. Assim, originou-se na Inglaterra e ganhou fora, nos

    pases que se autodenominavam sociais democratas, um movimento poltico deno-

    minado de Estado deBem-Estar Social, que buscava revitalizar a economia do Es-

    tado com a implementao de polticas sociais em servios pblicos de atendimento populao. Afirma Vieira (2000) que essa foi uma tentativa da socialdemocracia de

    humanizar o capital, mediantea proposio de reformas sociais.

    Esclarece o mesmo autor que, embora inexistente no Brasil, j que foi um

    movimento poltico de pases ricos, o denominado Estado de Bem-Estar Social inspi-

    rou o governo a desenvolver programas de interveno estatal para garantir servios

    sociais, contudo de forma setorial e fragmentada.

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    Diante desse cenrio de eferves-

    cncia no movimento econmico mundial,

    que modificava os mapas polticos e pro-

    dutivos das naes e a forte mobilizao

    social de grupos de pais e educadores,

    emergiu a preocupao do poder pblico

    com questes da educao pblica, par-

    ticularmente dos problemas de aprendizagem decorrentes da contradio na oferta

    de uma escola conservadora e elitizada aos alunos das camadas populares.

    Ganharia visibilidade, ento, a Educao Especial, reservada a um dos gru-

    pos que no responde ao padro de normalidade imposto pela escola: as pessoas

    com deficincia. A LDB n. 4024/61 exemplificou esse movimento. De maneira inova-

    dora, destinava um ttulo Educao Especial, com meno oferta de servios

    educacionais aos portadores de deficincia [sic], dentro do possvel no ensino regu-

    lar, integrando-os, pela primeira vez em um texto de diretrizes da educao nacio-

    nal, como um grupo-alvo das polticas do Estado. Ainda que estivesse expressa a

    inteno do atendimento na rede pblica regular, no mesmo texto, resguardava-se o

    incentivo financeiro s instituies particulares que ofertassem esses servios, con-

    validando aes que j ocorriam, havia quase uma dcada, com a criao da Socie-

    dade Pestalozzi e das Associaes de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAES).

    Na viso de Vieira (2000), essa estratgia de organizao para promover o

    desenvolvimento do Estado, combinando aes pblicas com o investimento priva-

    do, uma ao de mercantilizao dos direitos sociais mnimos da populao. Kas-

    sar (1998), na mesma linha de raciocnio, aponta que essa lei, ao regulamentar a

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    oferta privada, imprimiu uma marca difcil de apagar na orientao do atendimento

    especializado, em nvel nacional, dada a ambiguidade gerada na promoo dos ser-

    vios que se estende aos dias atuais: ao mesmo tempo em que prope o atendi-

    mento integrado na rede regular de ensino, delega s instituies sob administra-

    o particular a responsabilidade de parte do atendimento, atravs da garantia de

    apoio financeiro (1998, p.18).

    ABANDONANDO O DETERMINISMO:

    A CAMINHO DA INTEGRAO SOCIAL

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    Na esteira desse complexo quadro econmico, poltico e social mundial, ga-

    nhou fora um novo modelo de atendimento na Educao Especial, denominado de

    paradigma de servios, cuja principal contribuio foi implementar os servios de

    Reabilitao Profissional voltados a pessoas com deficincia, visando a prepar-las

    para a integrao ou a reintegrao na vida da comunidade.

    Este modelo caracterizou-se, gradativamente, pela de institucionalizao des-

    sas pessoas e pela oferta de servios de avaliao e de reabilitao globalizada, em

    instituies no residenciais, embora ainda segregadoras. Da segregao total, pas-

    sou-se a buscar a integrao das pessoas com deficincia, depois de capacitadas,

    habilitadas ou reabilitadas (BRASIL, 2004, p. 12).

    Esse paradigma, ambientado na dcada de 1960, teve como principal contri-

    buio terica o questionamento da tese determinista de desenvolvimento, adotada

    at ento nas prticas especializadas. Avanos nas pesquisas nas reas das Cin-cias Sociais e o impulso s teorias ambientalistas na Psicologia, na compreenso

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    das especificidades das pessoas com deficincia, deram lugar a uma tica diferenci-

    ada, passando a considerar as origens dos distrbios e deficincias como, tambm,

    motivados por determinantes socioculturais.

    A partir da dcada de 1970, movimentos organizados por pais de crianas

    com deficincias ganharam adeptos no mundo todo, inspirados nos princpios de

    individualizao, normalizao e integrao, introduzidos na Dinamarca nos anos

    sessenta, os quais buscavam ampliar as oportunidades de participao social de

    pessoas com deficincia, oferecendo-lhes o convvio em ambientes o menos segre-

    gadores possveis.

    Em relao educao, esses princpios incitavam ao reconhecimento do po-

    tencial para a aprendizagem desses sujeitos, promovendo etapas para sua integra-

    o, que envolviam diferentes possibilidades de insero: escolas especiais, classes

    especiais, classes comuns com apoios e classes comuns sem apoio. A condio

    para a insero dependia do aluno, de suas possibilidades individuais e de sua ca-

    pacidade de adaptao s opes oferecidas pelo sistema de ensino, atenuando o

    esteretipo da incapacidade que, por muito tempo, os acompanhou (FERNANDES,

    2006a).

    Assim, abriu-se a perspectiva da interveno educacional como favorecedora

    na transformao da condio, at ento imutvel, fsica e intelectual das pessoas

    com algum tipo de deficincia. As experincias pedaggicas pioneiras realizadas por

    Itard (1774-1838) e Sguin (1812-1880), no sculo XIX, ampliaram-se e ganharam

    sustentao nos trabalhos de Montessori (1870-1922), Binet (1905), Skinner (1904-

    1990) e Piaget (1896-1980), entre outros expoentes que, mesmo com vises anta-

    gnicas sobre o desenvolvimento e aprendizagem humanas, revolucionaram as pr-

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    ticas em Educao Especial e apontaram necessrias relaes entre o tipo de inteli-

    gncia, capacidades e habilidades pessoais e experincias socioambientais (ROSS,

    1998).

    A exemplo do contexto mundial, no Brasil proliferaram servios e recursos es-

    pecializados de carter clnico-teraputico, que objetivavam reabilitar aspectos ana-

    tmico fisiolgicos das pessoas, de modo a torn-las o mais prximas da normalida-

    de possvel para ento serem inseridas, integradas, ao convvio em sociedade

    (BRASIL, 2000).

    Para Marchesi e Martin (1995), o movimento pela integrao das pessoas

    com deficincia, dominante nas dcadas de 1970 e 80, teve grande importncia his-

    trica pela ruptura que promoveu de ideias e prticas cristalizadas acerca de sua

    ineficincia e incapacidade. Certamente, a principal delas foi superao, definitiva,

    do carter da incurabilidade como critrio bsico de todo tipo de deficincia.

    Exatamente naquele perodo, a

    Educao Especial ganhou visibilida-

    de ao ser caracterizada como um ti-

    po de educao voltado ao atendi-

    mento de pessoas com deficincia,

    que requerem cuidados clnicos e te-

    raputicos, em funo de suas altera-

    es orgnicas e limitaes delas decorrentes. Desse modo, reforou-se a conota-

    o do adjetivo especial, relacionando-o ao tipo de alunado a que se destinavam

    os atendimentos prestados por essa modalidade de educao: pessoas que apre-

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    sentam alteraes orgnicas, estruturais ou funcionais, que as impedem de ter uma

    vida normal em sociedade (CARVALHO, 2001).

    Em consequncia da nova viso que inclua alternativas de atendimento no

    contexto da escola comum e do aumento das matrculas escolares, em decorrncia

    do crescimento das populaes urbanas e seu acesso escola, houve uma mudan-

    a na oferta da Educao Especial. No mbito pblico, proliferaram-se as classes

    especiais nas escolas regulares, como forma de absorver a crescente demanda de

    alunos com dificuldades de aprendizagem, em sua maioria oriundos das camadas

    populares, os quais no se adaptavam s prticas homogeneizadoras, voltadas ao

    aluno ideal, realizadas nas escolas. Um novo perfil de aluno passou a compor o p-

    blico-alvo dessa modalidade educacional, incorporando as chamadas deficincias

    no acentuadas, ou leves, e os distrbios de aprendizagem, o que evidenciou as

    contradies de um sistema educacional despreparado para lidar com os diferentes

    estilos e ritmos de aprendizagem.

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    Na realidade, a educao especial na sociedade moderna que, na sua ori-

    gem, absorvia deficincias orgnicas (auditivas, visuais e, posteriormente, mentais),

    com o desenvolvimento do processo produtivo, foi incorporando a populao com

    deficincias e distrbios cadavez mais prximos da normalidade mdia determina-

    da por uma abordagem cientfica quese pretende neutra e objetiva, culminando

    com o envolvimento dos que no tm quaisquer evidncias de desvio dessa mesma

    normalidade mdia (BUENO, 1993, p. 80).

    Dessa forma, a expanso quantitativa da Educao Especial e sua organiza-

    o como sistema ocorreu, de fato, na segunda metade do sculo XX, com a prolife-

    rao de escolas especiais, centros de reabilitao, oficinas protegidas de trabalho,

    clubes sociais especiais, associaes desportivas especiais, entre outros segmentos

    que objetivavam oferecer servios especficos ao grupo de pessoas com deficincia.

    As estatsticas desse perodo, principalmente nos pases capitalistas centrais, a

    exemplo dos EUA, sobrepujam as matrculas gerais, ocorrendo em classes especiais

    e, prioritariamente, nas instituies especializadas. Contudo, o forte vis clnico que

    determinou a concepo dos servios prestados pelas diferentes instituies especi-

    alizadas pouco contribuiu para transformar as representaes e prticas sociais es-

    tigmatizantes acerca do alunado da Educao Especial.

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    A DCADA DE 1990 E OS NOVOS PARADIGMAS

    EDUCACIONAIS

    Nas dcadas de 1970 e 80, marcadas por profundas transformaes nas re-

    laes sociais de produo, com os avanos cientficos e tecnolgicos, fundou-se a

    compreenso da diversidade como constituinte das diferentes sociedades e culturas.

    Tanto os avanos da democracia, que passou a exigir um tratamento mais humani-

    trio e proteo dos direitos das minorias, quanto s novas possibilidades de apro-

    priao do conhecimento oferecidos pelas modernas tecnologias, exigiram da socie-

    dade uma nova relao com os grupos estigmatizados socialmente.

    Passou, ento, a ficar cada vez mais evidente que a segregao social de

    segmentos populacionais minoritrios no condizia com o respeito aos seus direitos

    de acesso e participao no espao comum da vida em sociedade, como tambm a

    impedia de aprender a administrar a convivncia respeitosa e enriquecedora, com a

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    diversidade de peculiaridades que os constituem. Estavam a postas as bases de um

    novo modelo, denominado paradigma de suportes:

    Este paradigma associou a ideia da diversidade como fator de enriquecimento

    social e o respeito s necessidades de todos os cidados como pilar central de uma

    nova prtica social: a construo de espaos inclusivos em todas as instncias da

    vida na sociedade, de forma a garantir o acesso imediato e favorecer a participao

    de todos nos equipamentos e espaos sociais, independentemente das suas neces-

    sidades educacionais especiais, do tipo de deficincia e do grau de comprometimen-

    to que estas apresentem (BRASIL, 2004, p. 13).

    Se o pressuposto que caracteriza esse paradigma reside no fato de que tor-

    nar disponveis suportessocial, econmico, fsico, instrumentalgarante o direito

    convivncia no segregada e ao acesso imediato e contnuo aos recursos dispon-

    veis aos demais cidados na comunidade, fez-se necessrio identificar o que pode-

    ria garantir tais circunstncias e favorecer um processo que passou a ser denomina-

    do de incluso social.

    A concepo de incluso social traz em seu bo-

    jo a mudana das representaes sociais em torno

    das pessoas com deficincia e evidencia que elas po-

    dem ser participativas e capazes. Essa compreenso

    tem como foco a organizao da sociedade para que

    sejam propiciadas as condies, o respeito e a valori-

    zao das diferenas e lhes sejam oferecidas oportu-

    nidades iguais, com equidade de condies, conforme

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    prope o paradigma de suportes.

    No final do sculo XX, fortaleceu-se o debate em torno dos direitos das pes-

    soas com deficincia, impulsionado por inmeras transformaes sociais: a mobili-

    zao poltico-social de organizaes no-governamentais, com vistas dos direitos

    de pessoas com deficincia; a introduo das teorias scio histricas acerca da

    aprendizagem aos debates educacionais; os avanos tecnolgicos e seu uso na re-

    abilitaorteses, prteses, softwares..., entre outros aspectos importantes.

    A partir da dcada de 1980, inmeras leis foram aprovadas, organismos inter-

    nacionais sistematizaram documentos norteadores das polticas pblicas, grupos

    sociais organizaram-se politicamente e ganharam fora nas reivindicaes em torno

    da igualdade de direitos e oportunidades, ocasionando uma revoluo nos instru-

    mentos jurdicos.

    Apesar do inegvel avano no reconhecimento poltico dos direitos, Ross

    (1998, p. 68) alerta para a viso ingnua da crena de que a igualdade de direitos,

    baseada apenas em postulados formais, amplia, concretamente, as possibilidades

    de participao, pois o mero direito jurdico no produz o novo sujeito poltico, no

    materializa formas organizativas, no expressa necessidades nem institucionaliza

    bandeiras de luta e resistncia.

    A aceitao abstrata da igualdade, apenas no plano legal, contribui para a so-

    ciedade eximir-se de seu papel histrico de socializar todos os seres humanos e o

    aparato tcnico e antropolgico, pois a desigualdade reside em no poder comparti-

    lhar plenamente o acesso e a produo desses bens sociais. A prtica social d legi-

    timidade a essas polticas, de maneira que o avano dos direitos, a definio de me-

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    tas e as polticas pblicas dependem de condicionantes econmicos, mas tambm

    so definidos de acordo com o ritmo das presses populares, da organizao dos

    grupos sociais.

    No Brasil, o instrumento jurdico precursor na legitimao da voz dos movi-

    mentos sociais pela incluso educacional a Constituio Federal de 1988 (CF) na

    qual se explicita, pela primeira vez, que o atendimento educacional especializado

    aos alunos com deficincia dever ocorrer, preferencialmente, na rede regular de

    ensino. Alm desse claro indicador integrador, a CF estabelece diretrizes para tratar

    a Educao Especial como modalidade de educao escolar obrigatria e gratuita,

    ofertada tambm em estabelecimentos pblicos de ensino, de maneira a propiciar

    aos alunos com deficincia os benefcios conferidos aos demais alunos e a integra-

    o das escolas especiais aos sistemas de ensino.

    Na dcada de 1990, todos esses princpios foram reforados e explicitados,

    com maior clareza, nos textos legais subsequentes, inspirados em documentos in-

    ternacionais como a proposta de Educao para Todos (Jomtien-Tailndia) e a De-

    clarao de Salamanca (Espanha, 2004). Tais documentos abriram espao para a

    ampla discusso sobre a necessidade de os governos contemplarem em suas polti-

    cas pblicas o reconhecimento da diversidade dos alunos e o compromisso ematender s suas necessidades nos contextos escolares comuns.

    O Plano Nacional de Educao para Todos (1990), a Poltica Nacional de

    Educao Especial (1994) e, especificamente, a Lei de Diretrizes e Bases da Edu-

    cao Nacional de 1996, que destina o Captulo V (Artigos 58, 59 e 60) Educao

    Especial, so emblemticos em apontar novos caminhos para essa modalidade de

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    ensino. Alm disso, reafirmam a perspectiva progressiva de seu carter pedaggico

    ligado educao escolar e ao ensino pblico.

    Nesse conjunto de fundamentos poltico-legais, inmeros aspectos conceitu-

    ais ganham nova significao. O primeiro deles a redefinio do alunado da Edu-

    cao Especial, apontando-se os alunos com necessidades especiais como o p-

    blico-alvo a que se destina essa modalidade de educao. Estabelece-se, tambm,

    de forma inovadora, a ampliao de sua oferta no sistema, contemplando desde a

    Educao Infantil at o Ensino Superior, com a oportunidade de articulao e intera-

    tividade da Educao Especial com os demais nveis e modalidades de ensino. Des-

    faz-se, assim, o equvoco conceitual da compreenso da Educao Especial como

    subsistema, paralelo e distanciado das prticas do contexto geral de educao, his-

    toricamente posto.

    Assim, verifica-se uma nova con-

    cepo de atendimento especializado que

    se estende diversificada rede de apoio

    dos recursos humanos, tcnicos, tecnol-

    gicos e materiais oferecidos, de modo a

    apoiar e complementar as prticas do en-sino comum, abandonando a ideia de que

    os servios especializados se resumem

    s classes e escolas especiais. Diante de

    tantas mudanas, tornaram-se inevitveis

    as controvrsias e polmicas em relao aos avanos propostos a serem problema-

    tizados: a excessiva abrangncia relacionada nova terminologia adotadane-

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    cessidades educacionais especiais e a clara contradio entre as pretenses

    legais e a limitada realidade do sistema escolar brasileiro.

    Em relao primeira questo, o conceito de necessidades educacionais

    especiais amplia a tica dos problemas de aprendizagem decorrentes no apenas

    de quadros orgnicos vinculados a deficincias ou distrbios mas, tambm, daque-

    les advindos de condies socioculturais diversas e econmicas desfavorveis.

    Considerando que muitos problemas de aprendizagem apresentados pelos alunos

    tm origem, em sua maioria, no carter elitista e homogeneizante das prticas pe-

    daggicas e sua inadequao em relao diversidade presente na escola, em te-

    se, sugeriria que a maioria dos alunos apresenta necessidades especiais, tendo em

    vista as alarmantes estatsticas com os ndices de evaso e fracasso escolar. Isso

    produziria uma inverso na organizao dos sistemas de ensino, sobrepondo a Edu-

    cao Especial comum.

    Conforme aponta Fernandes (2006a), essa contradio determinou uma rede-

    finio do conceito e dos grupos que, de fato, necessitariam de um conjunto de re-

    cursos e apoios especializados, diversos daqueles normalmente oferecidos pela

    educao escolar, em virtude de suas caractersticas de aprendizagem diferencia-

    das.

    Ento, a fim de organizar os sistemas, nas Diretrizes Nacionais para a Educa-

    o Especial, consideram-se alunos com necessidades educacionais especiais os

    que, no processo educacional, apresentarem dificuldades acentuadas de aprendi-

    zagem ou limitaes para acompanhar as atividades curriculares (no vinculadas a

    uma causa especfica, ou relacionadas a condies, disfunes, limitaes ou defi-

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    cincias); condies de comunicao e sinalizao diferenciadas dos demais

    alunos, demandando uso de linguagens e cdigos aplicveis e altas habilidades ou

    superdotao.

    O segundo aspecto, conforme a autora, revela dissonncia entre teoria e

    prtica. A despeito das mudanas nas concepes e instrumentos jurdicos que fun-

    damentam as polticas pblicas, permanece a hegemonia por parte da iniciativa pri-

    vada na oferta da Educao Especial. De acordo com dados da Organizao Mun-

    dial de Sade (OMS), estima-se que 10% da populao apresentem algum tipo de

    deficincia, o que representaria 15 milhes de brasileiros. Destes, apenas 300 mil

    esto matriculados, oficialmente, em todo pas. Dos estabelecimentos que oferecem

    atendimento especializado, 53,1% pertencem iniciativa privada, representada, em

    grande maioria por instituies filantrpicas, 31,3% so estaduais, 15,2% municipais

    e 0,3% federais (FONTES, 2002, p. 515).

    Em relao s diretrizes poltico-pedaggicas, emanadas do Ministrio de

    Educao nos ltimos anos, destaca-se a Poltica Nacional de Educao Especial

    (BRASIL, 1994), que contribuiu para organizar os sistemas de ensino, embora ainda

    sob a perspectiva da integrao.

    No contexto da elaborao

    dos Parmetros Curriculares Na-

    cionais para a Educao Bsica,

    a partir de 1995, mais uma vez, a

    Educao Especial sucumbiu ao

    status de coadjuvante no sistema

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    de ensino, j que no houve qualquer produo vinculada rea. Apenas em 1999,

    o Governo Federal publicou um caderno intitulado Adaptaes Curricularesdos Pa-

    rmetros Curriculares Nacionais Estratgias para a educao de alunos com ne-

    cessidades educativas especiais, cujo propsito era oferecer subsdios ao profes-

    sor, considerando a incluso dos alunos com necessidades educacionais especiais.

    O caderno tratou do tema genericamente, e de forma superficial foram elen-

    cadas conceituaes e indicadores poltico-pedaggicos para a educao dos alu-

    nos com necessidades especiais. Pela inconsistncia, ao final de 2002 (gesto

    FHC), foram publicados oito mdulos relativos ao Programa Adaptaes Curricula-

    res em Ao, dos quaisquatro so especficos por rea de atendimento: altas habi-

    lidades/superdotao, deficincia fsica/neuromotora, deficincia visual e surdez.

    Segue-se a esta a publicao de nove fascculos sobre as necessidades educacio-

    nais permanentes, destinados Educao Infantil, denominados Estratgias para o

    atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais na Educao Infan-

    til.

    Na mesma lgica de raciocnio, aponta-se a nfase figura do professor co-

    mo principal responsvel pela implementao das adequaes propostas. Ainda que

    o documento explicite as responsabilidades dos sistemas de ensino em relao capacitao profissional e ao suporte tcnico-material incluso, so reforadas as

    aes de reorganizao dos componentes curriculares como condio impres-

    cindvel incluso dos alunos com necessidades educacionais especiais.

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    Por fim, pelas inmeras con-

    cesses que o documento faz s pr-

    ticas vinculadas reabilitao das

    deficincias, apesar de se tratar de

    um texto de diretrizes pedaggicas,

    permanecem inalteradas as vises

    acerca da normalizao da pessoa

    com deficincia, vista como pessoa

    incompleta, aquela que precisa se

    adaptar a um conhecimento previa-

    mente selecionado de uma cultura mais ampla, no necessariamente a sua [...], o

    que pressupe a busca da homogeneizao (FRANCO, 2000, p. 81).

    Em setembro de 2001, cinco anos aps a promulgao da nova LDB, o Minis-

    trio da Educao homologou a Resoluo n. 02, do Conselho Nacional de Educa-

    o, referente s Diretrizes Nacionais para a Educao Especial na Educao

    Bsica, instituindo as bases para a elaborao de normas para a Educao Especi-

    al, a fim de reorganizar a proposta de educao escolar dos alunos com necessida-

    des educacionais especiais, no contexto da educao inclusiva.

    Neste relato que envolve a origem da ateno social s pessoas com defici-

    ncia, at o momento atual, observa-se que o emaranhado contexto histrico da

    Educao Especial revela, entre tantas coisas, a complexidade de sua organizao

    social e a luta de foras que se tensionam nos diferentes setores da sociedade. A

    compreenso do homem marcado por uma distino biolgica, fsica, sensorial est

    referida s condies concretas de uma poca construda na prxis. A superao da

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    marginalidade, da incapacidade e da inutilidade se d em meio s continuidades e

    descontinuidades dos processos histricos.

    A INCLUSO E OS ALUNOS COM NECESSIDADES

    EDUCACIONAIS ESPECIAIS

    Em meados da dcada de 1990, no Brasil,

    passou-se a discutir a incluso de alunos com ne-

    cessidades educacionais especiais, preferencial-

    mente na rede regular de ensino. Em Educao

    comum que, de tempos em tempos, surjam novas

    terminologias ou que sejam retomados termos

    antigos que atestam o movimento de transfor-

    mao nos princpios e pilares terico-filosficos que conduzem as ideias pedaggi-

    cas de determinadas pocas.

    O termo necessidades educacionais especiais um exemplo desse processo.

    A maior parte das terminologias adotadas em Educao Especial tem origem es-

    trangeira, muitas usadas em pocas anteriores: invlido (minusvlido), anormal

    (handicapped person), retardado (retardadion), deficiente (dficiente). A traduo

    para o portugus muitas vezes no mantm o sentido que os originou no contexto

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    histrico de sua adoo, o que gera ambiguidades, impreciso e inadequao ao

    serem empregados em um novo contexto social (FERREIRA E GUIMARES, 2003).

    Embora as denominaes propostas busquem identificar grupos ou sujeitos com

    caractersticas diferenciadas, sem criar rtulos negativos ou estigmas, quase sempre

    essas expresses tm carga pejorativa e negativa, relacionadas patologia e in-

    capacidade. Sabe-se que as palavras no so neutras e imparciais, elas carregam

    ideologias, insinuam crenas, delineiam pontos de vista, revelam intenes.

    Na ampla literatura especializada, ou mesmo em palestras e eventos de ca-

    pacitao, comum o uso de expresses como pessoas portadoras de necessida-

    des especiais e pessoas portadoras de deficincia, como sinnimos. Cabem a

    alguns esclarecimentos.

    Primeiramente, necessrio esclarecer que necessidades especiais ou defi-

    cincias no se portam como objetos que so carregados de um lado a outro, dos

    quais se pode desfazer quando bem se entende. Por conta disso, nos ltimos anos,

    a expresso portador de tem sido evitada para se referir a esse grupo de pessoas,

    preferindo-se, em seu lugar, referir-se apessoas com, ou alunos com necessidades

    educacionais especiais.

    Deficincias so inerentes aos sujeitos, constituem sua subjetividade; no de-

    finem sua essncia, mas determinam modos de ser e estar no mundo que podem

    gerar ou no impedimentos ou colocar os sujeitos que as apresentam em situao

    de desvantagem.

    Embora no se negue que sejam condies orgnico-funcionais concretas,

    que acarretam incapacidades, as limitaes decorrentes dessa situao sero de-

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    pendentes dos resultados da interao das caractersticas diferenciadas das pesso-

    as com deficincia com as representaes em torno dela e das tecnologias dispon-

    veis no meio social a seu servio.

    J o sintagma necessidades especiais no deve ser tomado como sinnimo

    de deficinciasmentais, sensoriais, fsicas ou mltiplas , pois abrange uma srie

    de situaes e/ou condies pelas quais qualquer um pode estar submetido em de-

    corrncia de uma limitao, temporria ou permanente, oferecendo obstculos vi-

    da em sociedade, considerando-se idade, sexo, fatores culturais, condies de sa-

    de, quadros afetivo-emocionais, entre outros (FERREIRA E GUIMARES, 2003, p.

    32).

    Dito de outro modo, a fratura de uma perna, a senilidade, a depresso pro-

    funda ocasionada pela perda de um ente querido, a obesidade mrbida, a necessi-

    dade de uso permanente de medicamentos, rteses ou prteses, entre tantas outras

    adversidades a que se est sujeito, caracteriza uma situao de necessidades es-

    peciais e no se referem, necessariamente, a uma situao de deficincia.

    Fica evidente, em todos esses exemplos, o fato de que as necessidades es-

    peciais no se referem s limitaes apresentadas pelas pessoas, mas s exign-

    cias de ampla acessibilidade que oportunize condies necessrias independncia

    e autonomia dos sujeitos. Evidencia-se a responsabilidade social de prever e prover

    meios de satisfazer essas necessidades, ao invs de destacar o sujeito que a apre-

    senta.

    Como esclarece Ross (2004, p. 204) as necessidades especiais so decor-

    rentes das oportunidades, existentes ou no, bem como dos instrumentos e medi-

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    es que possam ser apropriados por estas pessoas em suas relaes sociais e no

    resultam unicamente das deficincias biolgicas que possam apresentar. Se favor-

    veis forem as condies sociais, a situao de deficincia ser atenuada, uma vez

    que no sero impostas restries participao dessas pessoas.

    Quando essas exigncias (apoios materiais, tecnolgicos ou humanos) so

    pertinentes ao campo da educao, a servio da remoo de barreiras para a

    aprendizagem e participao de todos os alunos (CARVALHO, 2000), so deno-

    minadas necessidades educa-

    cionais especiais.

    Justamente pela abran-

    gncia e impreciso da ex-

    presso, considerando os in-

    meros grupos contemplados

    nessa terminologia, seu uso

    tem sido objeto de controvr-

    sias e gerado inmeras arbitra-

    riedades na conduo das pol-

    ticas educacionais. Isso se deve porque a nova terminologia aparece na Lei de Dire-trizes e Bases da Educao (1996), no captulo destinado Educao Especial.

    Essa confuso conceitual trouxe, tambm, implicaes negativas para a or-

    ganizao do atendimento especializado. Muitos rgos municipais e estaduais de

    Educao, inadvertida e precipitadamente, operaram o desmonte da Educao Es-

    pecial, j que, a ampla abrangncia sugerida pela nova terminologia indicava que

    todos experimentam necessidades educacionais especiais em algum momento da

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    trajetria escolar, significando que, se mantida, essa modalidade de educao esta-

    ria destinada maioria dos alunos.

    Em outras palavras, isso significa que nem todos os que apresentam necessi-

    dades educacionais especiais so pessoas com deficincias, j que h um enorme

    contingente de alunos com problemas e dificuldades em seu processo de aprendi-

    zagem, advindos de inmeros fatores, quase sempre atrelados s condies socioe-

    conmicas e/ou pedaggicas desfavorveis. E mais: a expresso necessidades

    educacionais especiais sugere a existncia de um problema de aprendizagem, mas

    no apenas isto. Indica que recursos e servios educacionais diferenciados daque-

    les comumente utilizados no contexto escolar, para a maioria dos alunos, sero indi-

    cados. Assim, quem apresenta necessidades educacionais especiais no so ape-

    nas os alunos, mas, tambm, as escolas e sistemas de ensino (FERNANDES,

    2006a).

    Ao valer-se da experincia acumulada historicamente na rea da Educao

    Especial e da experincia de pases desenvolvidos que j se encontram em fase de

    avaliao de suas polticas de incluso, a SEED reitera a indicao das Diretrizes

    para a Educao Especial, em nvel nacional e internacional e define, em sua legis-

    laoo alunado a quem se destina a Educao Especial: alunos com necessidadeseducacionais especiais, em carter permanente.

    Isso significa que a SEED no somente reconhece o enorme contingente de

    alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, com vrios projetos

    que enfocam sua incluso social e cidadania. No entanto, define que a oferta de ser-

    vios e apoios especializados, em Educao Especial, destina-se a crianas, jovens

    e adultos com necessidades educacionais permanentes, em funo de:

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    dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitaes no processo de de-

    senvolvimento, vinculados a distrbios, limitaes ou deficincias, que demandem

    apoios intensos e contnuos no processo educacional, como o caso de alunos com

    deficincia mental, mltiplas deficincias e/ou

    transtornos de desenvolvimento associados

    a graves problemas de comportamento;

    dificuldades de comunicao e sinaliza-

    o, demandando o uso de outras lnguas,

    linguagens e cdigos aplicveis como o

    caso de alunos surdos, surdo cegos, cegos,

    autistas ou com sequelas de paralisia cere-

    bral;

    superdotao ou altas habilidades que, devido s necessidades e motivaes

    especficas, requeiram enriquecimento, aprofundamento curricular e acelerao na

    oferta de acesso aos conhecimentos.

    A definio desses grupos evidencia, em muitas ocasies, a origem das resis-

    tncias dos professores em relao incluso escolar. Historicamente, com exceo

    daqueles que apresentam superdotao, esto os alunos que apenas na ltima d-

    cada foram contemplados pelas polticas educacionais e tiveram sua educao sob

    a responsabilidade de especialistas, em classes ou escolas especiais. Essa situao

    provocou uma ciso no campo da educao, determinando que os alunos ditos nor-

    mais estivessem sob a responsabilidade do ensino regular e os alunos com deficin-

    cia receberiam atendimento por meio da Educao Especial.

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    Nessa direo, Gonzalez(2002, apud FERNANDES, 2006b) aponta que dife-

    rentes modelos e tcnicas, oriundos de reconhecidas concepes psicolgicas,

    sempre nortearam os objetivos educacionais, de carter geral, da Educao Especi-

    al, os quais so sintetizados nas principais vertentes que seguem:

    modelo inatista/determinista: baseado na vertente inatista da psicologia, foi pre-

    ponderante nos primrdios do atendimento educacional especializado; atribua ao

    indivduo com deficincia a origem de suas dificuldades e limitaes, as quais difi-

    cilmente poderiam ser modificadas por uma ao exterior;

    modelo comportamental: com base na psicologia da aprendizagem, fundamen-

    tada nos princpios do condicionamento clssico operante, centra sua ao em tc-

    nicas de interveno e modificao do comportamento visando correo de desa-

    justes obtidos por reforos inadequados;

    modelo cognitivo: aplica tcnicas de interveno como a estimulao precoce,

    hierarquias de experincias cognitivas e programas para desenvolver a memria,

    ateno e formao de conceitos, a fim

    de superar transtornos causados por d-

    ficits de processamento da informao;

    modelo humanstico: baseado na fe-

    nomenologia e psicanlise, considera o

    desequilbrio do eu e os conhecimentos e

    sentimentos do paciente sobre si mesmo

    e sobre os demais, como envolvidos na

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    origem dos distrbios e transtornos; as terapias corporais, a musicoterapia e o rela-

    xamento, entre outras tcnicas de interveno so estratgias para superao de

    problemas;

    modelo sociocultural: focaliza sua ao nas mudanas a serem realizadas nas

    instituies educativas, para atender s necessidades sociais dos sujeitos; prope a

    compreenso da deficincia/anormalidade como uma construo social que deriva

    dos fatores e critrios que definem um sujeito como diferente/incapaz no grupo soci-

    al; tem na mediao social, com destaque ao professor, o principal elemento para

    superar diferenas individuais na aprendizagem.

    Esses modelos coexistem, de forma isolada ou combinada, na base das

    aes da Educao Especial, demonstrando que foi a Psicologia e no a Pedagogia,

    em suas diferentes vertentes, a cincia a compor e justificar discursos e prticas na

    rea. A forte psicologizao da Educao Especial, aliada ao arsenal de tcnicas e

    mtodos especiais para habilitao ou reabilitao das pessoas com necessidades

    especiais contribuiu para sua mitificao e recobriu-a de uma aura misteriosa e ina-

    tingvel para a maioria dos educadores (SILVA, 2001, apud FERNANDES, 2006a).

    Influenciado pelas tendncias dos movimentos educativos internacionais,

    principalmente da Espanha e Inglaterra, apenas a partir da dcada de 1990 o Brasil

    iniciava a tentativa de articular discursos e prticas da educao comum e especial,

    incorporando-se, nesta ltima, debates e tendncias presentes na educao regular.

    fundamental que professores do ensino regular compreendam esse contingente

    histrico, considerando que ele sinaliza a origem da insegurana e do despreparo

    que os acometem ao se depararem com a possibilidade de educar crianas que

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    apresentem algum tipo de deficincia em suas turmas, por exemplo. Obviamente,

    nos moldes em que foi concebida e praticada, nos ltimos anos, no haveria como

    justificar a impropriedade da mera transposio dos alunos e prticas da Educao

    Especial para o ensino regular, denominando esse processo de incluso.

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