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Tecnologia e Desempenho Comercial: Uma Análise Empírica para Países Selecionados no Período 2000-2015 Alanna Santos de Oliveira 1 Graciele de Fátima Sousa 2 Ernando Antonio dos Reis 3 Resumo O presente trabalho desenvolve uma investigação empírica sobre a relevância de fatores tecnológicos para o desempenho comercial dos países usando estimações de modelos de dados em painel (estático e dinâmico). A análise tem por sustentação teórica a literatura pós-keynesiana, a estruturalista e a neoschumpeteriana, sendo que o modelo da análise empírica deriva especificamente desta última. Os resultados indicam a existência de uma relação direta, positiva e significativa das principais variáveis de interesse que envolve tecnologia (incorporada e desincorporada de máquinas e equipamentos). Desse modo, a análise dos resultados sugere a importância do desenvolvimento tecnológico para as economias, permitindo uma inserção comercial externa virtuosa permeada por maior competitividade internacional. Palavras-chaves: Crescimento Tecnológico, Nível de Tecnologia, Desempenho Comercial, Competitividade Internacional. Abstract The present study develops an empirical investigation concerning the relevance of technological factors to countries’ commercial performance, using estimations of data panel models (static and dynamic). The analysis 1 Doutoranda em Economia do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia (PPGE/IERI/UFU), e Pesquisadora do Centro de Pesquisas Econômico-Sociais (CEPES/IERI/UFU). 2 Doutoranda do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e Pesquisadora do Centro de Pesquisas Econômico- Sociais da Universidade Federal de Uberlândia (CEPES/IERI/UFU). 3 Doutor em Ciências Contábeis pela Universidade de São Paulo (USP), e Professor da Faculdade de Ciências Contábeis (FACIC) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). 1

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Tecnologia e Desempenho Comercial: Uma Análise Empírica para Países Selecionados no Período 2000-2015

Alanna Santos de Oliveira[footnoteRef:1] [1: Doutoranda em Economia do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia (PPGE/IERI/UFU), e Pesquisadora do Centro de Pesquisas Econômico-Sociais (CEPES/IERI/UFU).]

Graciele de Fátima Sousa[footnoteRef:2] [2: Doutoranda do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e Pesquisadora do Centro de Pesquisas Econômico-Sociais da Universidade Federal de Uberlândia (CEPES/IERI/UFU).]

Ernando Antonio dos Reis[footnoteRef:3] [3: Doutor em Ciências Contábeis pela Universidade de São Paulo (USP), e Professor da Faculdade de Ciências Contábeis (FACIC) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).]

Resumo

O presente trabalho desenvolve uma investigação empírica sobre a relevância de fatores tecnológicos para o desempenho comercial dos países usando estimações de modelos de dados em painel (estático e dinâmico). A análise tem por sustentação teórica a literatura pós-keynesiana, a estruturalista e a neoschumpeteriana, sendo que o modelo da análise empírica deriva especificamente desta última. Os resultados indicam a existência de uma relação direta, positiva e significativa das principais variáveis de interesse que envolve tecnologia (incorporada e desincorporada de máquinas e equipamentos). Desse modo, a análise dos resultados sugere a importância do desenvolvimento tecnológico para as economias, permitindo uma inserção comercial externa virtuosa permeada por maior competitividade internacional.

Palavras-chaves: Crescimento Tecnológico, Nível de Tecnologia, Desempenho Comercial, Competitividade Internacional.

Abstract

The present study develops an empirical investigation concerning the relevance of technological factors to countries’ commercial performance, using estimations of data panel models (static and dynamic). The analysis presents as theoretical basis the post-keynesian, structuralist, and neo-schumpeterian literature, and the empirical model derives specifically of the last one. The results indicate the existence of a direct, positive and significant relation of the main variables of interest which concerns technology (incorporated or not to machines and equipment). Thus, the results’ analysis indicates the importance of technological development to economies, enabling countries with a virtuous external commercial insertion permeated by a higher international competitiveness.

Keywords: Technological Growth (TG), Technological Level (TL), Commercial Performance, International Competitiveness

Área 5: Comércio e Finanças Internacionais

1 INTRODUÇÃO

As teorias sobre competitividade internacional, em geral, são desenvolvidas com o intuito de se estabelecer relações causais entre crescimento econômico e balança comercial, identificando os elementos que influenciam nesse processo interativo (FARGEBERG, 1988). Nesse sentido, as distintas performances observadas no âmbito das relações comerciais, tanto sofrem influência de fatores internos a uma economia, como também produzem efeitos distintos sobre o crescimento desta.

Sob essa perspectiva, embora não tenha por objeto central a formulação de uma teoria da competitividade internacional, mas sim a investigação acerca dos diferenciais de desenvolvimento entre países, o pensamento estruturalista confere significativa ênfase ao papel das relações comerciais na conformação dinâmica do crescimento econômico (RODRIGUEZ, 1986).

O mesmo se pode dizer a respeito da literatura pós-keynesiana que, nesse sentido, complementa sua análise no plano teórico com deduções algébricas para construção de modelos e testes empíricos. Kaldor (1978) coloca as exportações (componente autônoma da demanda agregada) e a composição qualitativa da pauta exportadora no centro dessa discussão. Em consonância com essa abordagem, Thirlwall (1979) desenvolve um modelo de crescimento do tipo “export-led”, segundo o qual, a taxa de crescimento do produto é dependente da razão entre as elasticidades-renda das exportações e importações[footnoteRef:4]. [4: Considerada a preponderância, segundo essa literatura, da elasticidade renda (das exportações e importações), outros autores apontaram para a necessidade de maior detalhamento e, por conseguinte, apreensão desse elemento, que segundo Kaldor (1981) refletiria fatores não-preço implícitos.]

No âmago dessa discussão, Fagerberg (1988) utiliza-se de uma abordagem neoschumpeteriana, introduzindo variáveis que captam o nível de desenvolvimento tecnológico e a capacidade de atendimento da demanda de uma dada economia à equação de Thirwall, a fim de endogenizar a referida razão entre as elasticidades renda das exportações e importações. Desse modo, seriam esses fatores, em última instância, que corroborariam para explicação dos diferenciais de crescimento das economias e, por conseguinte, de competitividade internacional entre elas.

Coadunando com as perspectivas teóricas supracitadas (estruturalista, pós-keynesiana, e neoschumpeteriana), as quais enfatizam o papel da dinâmica de comércio internacional para produção de reflexos importantes sobre o crescimento das economias, este trabalho tem por objetivo geral explorar como fatores tecnológicos – reproduzidos tanto em termos de inovação “desincorporada”, quanto “incorporada” a máquinas e equipamentos – podem influenciar o desempenho comercial dos distintos países.

Adicionalmente, constitui objetivo específico do trabalho, tendo por base o arcabouço estruturalista, analisar se as economias periféricas, por razões estruturais ainda não superadas (dentre as quais se insere o diferencial das elasticidades renda de suas importações relativamente às das economias avançadas), apresentam desempenho comercial no cenário internacional inferior ao dos países desenvolvidos. Para tanto, verifica-se por meio da utilização de uma variável dummy, se o fato da economia ser periférica ou avançada importa para o desempenho comercial apresentado (este último traduzido em termos de participação das exportações do país “i” no mercado mundial).

Entende-se que num momento marcado por desafios críticos à retomada do crescimento econômico, como o que se encontra atualmente a economia brasileira, urge a necessidade de análises crítico-reflexivas integradas à investigação empírica, a fim de que, a partir delas sejam colocados elementos propositivos para uma nova configuração dinâmica (que leve em conta tanto aspectos conjunturais, como estruturais do país).

Este trabalho também se justifica por sua tentativa de integração de três importantes vertentes teóricas, todas características do pensamento heterodoxo: a pós-keynesiana, a estruturalista, e a neoschumpeteriana. O reconhecimento de tendências e similaridades entre correntes de pensamento é de suma importância para o desenvolvimento e fortalecimento de teorias e modelos que contribuam de maneira eficaz para a geração de conhecimento das ciências econômicas, especialmente no que concerne seu caráter propositivo.

Para tanto, uma análise empírica da fundamentação base desse quadro teórico é empreendida por meio da estimação de um painel composto de 70 países (dentre eles o Brasil), em uma dimensão temporal que compreende o período 2000-2015. A estimação é realizada por Random and Fixed Effects, e em seguida pelo Generalized Method of Moments (GMM) – System.

Adicionalmente, corrobora para a justificativa deste trabalho o emprego da distinção para o grau de desenvolvimento do país (se classificado como economia avançada ou em desenvolvimento), o qual constitui, outrossim, uma contribuição deste estudo, especialmente por sua tentativa de levar em conta o cerne do pensamento estruturalista, o qual diz respeito à distinção fundamental das economias entre “periferia” e “centro”, e as decorrentes implicações dessa hipótese, especialmente no que diz respeito à inserção dos países no comércio internacional.

Feita essa breve introdução, o trabalho apresenta em seguida um referencial teórico, o qual foi dividido em duas partes: a primeira discorre acerca da literatura pós-keynesiana e do pensamento estruturalista, ressaltando suas similitudes, no que concerne à apreensão que ambas apresentam do comércio internacional e seus efeitos sobre a dinâmica de crescimento econômico; ao passo que, na segunda, é apresentada a teoria neoschumpeteriana de Jan Fagerberg acerca do comércio internacional, pautada especialmente em fatores tecnológicos.

Após o referencial teórico, passa-se à análise empírica dos dados, a qual toma por base o modelo de Fagerberg (1988), especificamente sua equação para determinação do market-share das exportações de uma economia. Na primeira seção, o modelo, amostra e fonte de dados utilizada são detalhados; na segunda, tem-se a descrição completa do procedimento metodológico, ressaltando-se a explanação acerca dos métodos econométricos empregados; e na terceira, é exibida uma síntese dos resultados econométricos e correspondente interpretação dos dados. Por fim, após a parte empírica, são apresentadas as considerações finais do trabalho.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Comércio Internacional e Crescimento Econômico à luz da Literatura Pós-Keynesiana e do Pensamento Estruturalista

O crescimento econômico constitui objeto fundamental de estudo das mais distintas análises econômicas, sejam elas fundamentadas por arcabouço teórico neoclássico ou keynesiano, ou por qualquer outra corrente de pensamento que se institua como tal. Importa que, historicamente, os economistas se ocupam da tentativa de apreender os fatores determinantes do crescimento de longo prazo de uma economia, seja sobrepujando variáveis concernentes ao lado da oferta, seja da demanda.

O primeiro modelo Keynesiano moderno de desenvolvimento foi elaborado por Harrod-Domar (HARROD, 1939; DOMAR, 1946), e seu foco se deu substancialmente sobre a relação entre capital e emprego. Em resposta a esse modelo, outros foram sendo construídos como produto de críticas neoclássicas, ou mesmo como fruto de reformulações e aprimoramentos nele por parte do que viria a se constituir o pensamento pós-keynesiano.

No que respeita a essa última vertente, em linhas gerais e ressalvadas as especificidades de cada modelo desenvolvido dentro desta, assegura-se a validade dos dois pressupostos centrais da teoria Keynesiana: 1) o nível de produto de uma economia não é determinado pelo volume de recursos disponíveis, mas sim pela demanda efetiva; 2) esta última é constituída pela soma de dois componentes, sendo um endógeno e, cuja variação ocorre na proporção dos custos dos empreendedores, e outro exógeno o qual provém do capital (por empréstimo ou pela venda de ativos) e que Keynes trata como um fator dado para um período curto de tempo, determinado pelas expectativas (Kaldo, 1989).

Consideradas essas proposições, a demanda efetiva configura-se como condicionante do produto de uma economia, e nessa perspectiva, Kaldor (1989) afirma que esta seria apenas uma das restrições possíveis para o produto no curto prazo. Ele cita a possibilidade de desemprego em virtude de capacidade produtiva insuficiente, ou pleno emprego em virtude de esta capacidade, em termos de postos de trabalho, ultrapassar a oferta de mão de obra.

Ademais, o autor ressalta, o que possivelmente constitui uma de suas contribuições fundamentais na teoria econômica do crescimento: a existência de um terceiro tipo de restrição que deve ser considerado com acuidade, qual seja, a propensão a importar da economia em relação às suas exportações. Neste caso, estas últimas cumprem o papel de componente autônomo exógeno da demanda, ao passo que as importações, o consumo e o investimento conformariam a parcela endógena.

O enfoque de Kaldor sobre a exportação como variável-chave no condicionamento da taxa de crescimento do produto no longo prazo revela, inequivocamente, sua introdução a uma análise de comércio internacional e dos diferenciais de competitividade. Adicionalmente, cumpre ressaltar que a perspectiva do autor leva em conta o reconhecimento de distintas capacidades de incremento da produtividade e possibilidades de transbordamento de seus efeitos sobre a economia como um todo, apresentadas pelas diversas atividades econômicas, constatação que culmina em sua percepção da indústria como setor diferenciado.

Utilizando-se da formulação original de Harrod acerca da teoria do multiplicador do comércio exterior, Kaldor (1989) assinala que as exportações (componente exógena) juntamente com a propensão a importar, a qual é assumida como uma função linear da renda, é que determinam o nível de equilíbrio do produto, com correspondente equilíbrio no balanço de pagamentos. Desse modo:

Thirlwall (2011), seguindo a linha de raciocínio Kaldoriana, coloca as restrições do balanço de pagamentos como aspecto basilar para compreensão das distintas taxas de crescimento das economias. Com isso, o autor corrobora para o desenvolvimento desse arcabouço teórico pós-keynesiano ligado à explicação das diferenças de competitividade internacional e seus efeitos sobre o crescimento.

Segundo ele, em uma economia aberta a principal restrição ao crescimento adviria do balanço de pagamentos, e com base em dados apresentados para países desenvolvidos, atesta a hipótese de uma taxa de crescimento de equilíbrio no balanço de pagamentos, produto da taxa de crescimento das exportações dividida pela elasticidade da demanda por importações.

Formalmente seu modelo de crescimento conduzido pelas exportações com equilíbrio no balanço de pagamentos pode ser apresentado, conforme segue abaixo, partindo-se da referida noção de equilíbrio nas contas externas dado por:

(1)

Onde "" e "" representam, respectivamente, os preços das exportações e das importações, "X" e "M" as quantidades relativas a cada uma dessas pautas, e "E" a taxa de câmbio. Assim, passando-se para a forma logarítmica a referida identidade e, em seguida, diferenciando no tempo teremos:

(2)

Compreendendo melhor a determinação das importações e, em seguida, analogamente das exportações temos:

(3) , sendo""a elasticidade renda das importações,"" um parâmetro que capta o efeito preço, e"" um componente autônomo, o qual Thirlwall chegará a conclusão de ser igual a 1 mais adiante, embora, entendemos que para o caso das economias em desenvolvimento, tal suposição não se adéqua, visto que o referido componente pode ser apreendido em termos de variáveis como impostos, ou mesmo condições de infraestrutura que certamente têm implicações relevantes para as importações.

Novamente, passando-se para a forma logarítmica a referida identidade e, em seguida, diferenciando no tempo temos:

(4)

Analogamente para as exportações que são determinadas por: (5) , teremos:

(6)

Substituindo (4) e (6) em (2) e fazendo algumas adequações chegaremos a:

(7)

Considerando a validade da condição de Marshall-Lerner[footnoteRef:5], e abstraindo da presença de desigualdade nos preços externos vis-à-vis internos chega-se à sua descrição final: [5: A condição de Marhall-Lerner estabelece que para que uma desvalorização cambial tenha um impacto positivo sobre a balança comercial, a soma absoluta das elasticidades-preço das exportações e das importações seja maior que a unidade () >1.]

(8)

A equação acima apresenta algebricamente, portanto, que a taxa de crescimento do produto de equilíbrio do balanço de pagamentos depende em linhas gerais da elasticidade renda das importações (uma vez que "", elasticidade-renda das exportações, será considerada igual à unidade), e da taxa de crescimento da renda mundial.

A explicação sucinta do autor acerca da importância e dos efeitos do equilíbrio no balanço de pagamentos para o crescimento econômico e, por conseguinte, para explicar os diferenciais deste entre países, pode ser conferida na asserção abaixo:

A importância de um balanço de pagamentos saudável para o crescimento pode ser anunciada sucintamente. Se um país incorre em dificuldades no balanço de pagamentos à medida que expande a demanda, antes que a capacidade da taxa de crescimento de curto prazo seja alcançada, então a demanda deverá ser restringida; a oferta nunca será plenamente utilizada; o investimento desencorajado; o progresso tecnológico reduzido, e os bens de um país comparados aos bens internacionais tornar-se-ão menos desejáveis, portanto, piorando o balanço de pagamentos ainda mais, e assim por diante. Um círculo vicioso é iniciado. Ao contrário, se um país é capaz de expandir a demanda até o nível de capacidade produtiva existente, sem incorrer em dificuldades no balanço de pagamentos, a pressão da demanda sobre a capacidade poderá muito bem aumentar a capacidade da taxa de crescimento. (THIRLWALL, 2011, p. 430).

Com base nessas considerações, o autor coloca que há uma série de mecanismos pelos quais o cenário virtuoso de crescimento com equilíbrio no balanço de pagamentos poderia incorrer, ressaltando para tanto que este seria necessariamente conduzido pelas exportações enquanto componente autônomo da demanda, uma vez que estas não ocasionam desequilíbrios sobre as contas externas do país, mas, pelo contrário, conduzem ao aumento da taxa de crescimento do produto, contribuindo simultaneamente para a capacidade de importação da economia em questão.

Porém, Thirlwall destaca que a mesma taxa de crescimento das exportações para países distintos não levará necessariamente à mesma taxa de crescimento do produto, uma vez que: “os requerimentos de importação associados ao crescimento varia entre países e, portanto, alguns países terão a demanda limitada antes que outros para o equilíbrio do balanço de pagamentos” (THIRLWALL, 2011, p.430). Assim, a relação entre a taxa de crescimento dos requerimentos da demanda e a taxa de crescimento da economia é traduzida pela elasticidade renda da demanda por importações.

Nesse contexto, convém apontar que o papel coercitivo das restrições no balanço de pagamentos para o crescimento econômico constitui uma das bases do pensamento estruturalista latino-americano (inspirado inicialmente por Arthur Lewis e Ragnar Nurkse). Conforme Bresser-Pereira e Gala (2010) assinalam, em revisão a essa literatura, nos países subdesenvolvidos verifica-se uma latente dificuldade de conformação de poupança interna, acentuada pela elevada elasticidade-renda de suas importações (relativamente maior que a verificada pelos demais países por suas exportações), configurando esta última, uma das características essenciais do subdesenvolvimento das economias latino-americanas.

Outra consonância entre a perspectiva teórica estruturalista e a pós-keynesiana diz respeito ao papel dinâmico da indústria vis-à-vis outros setores, tendo em vista os diferencias de produtividade entre as distintas atividades econômicas. Essa constatação é que sugere aos principais expositores do pensamento estruturalista cepalino a advertirem sobre a necessidade do processo de industrialização como base ao desenvolvimento das economias latino-americanas. A confiança inicial de que o desenvolvimento industrial interno seria condição si ne qua non para que se lograsse a defesa do emprego, do crescimento autossustentado e do rompimento com os laços de dependência externa é evidenciada em Furtado (1958)[footnoteRef:6]: [6: Posteriormente o autor empreende uma revisão crítica do processo de industrialização brasileiro, especificamente ao Processo de Substituição de Importações, e a partir de seu esgotamento, articula novos elementos à sua teoria de superação do subdesenvolvimento.]

O crescimento industrial gera, portanto, seu próprio impulso de crescimento, o qual se propaga aos demais setores da atividade econômica. Esse autodinamismo é específico da indústria, e não é por outra razão que o setor industrial funciona como força propulsora do crescimento das economias avançadas que são sistemas autônomos. (FURTADO, 1958, p. 41)

A segregação da economia mundial em dois polos pelo estruturalismo (centro e periferia) é representada especialmente pelo caráter distinto de suas estruturas produtivas, sendo notável no caso da primeira, a homogeneidade e diversificação, contrapondo-se no caso da segunda, à heterogeneidade e especialização, servindo de base, outrossim, às distintas funções que cada um dos polos cumpre no sistema de divisão internacional do trabalho.

No bojo das diferenças que contrapõem centro e periferia, merece destaque a baixa produtividade do trabalho que se apresenta nesta última, e a tendência à deterioração dos termos de troca, a qual tem origem na conformação contínua de um excedente de mão de obra nos setores de baixa produtividade, e que corrobora para que os salários sejam constantemente comprimidos e, por meio desse mecanismo, o próprio preço de seus produtos exportáveis. (RODRIGUEZ, 1986).

Retomando à base teórica pós-keynesiana, e atestando suas similitudes com o arcabouço estruturalista, cabe notar que Kaldor (1989) afirma que, conforme Keynes sugeriu, dado o tempo, a produção geralmente responde à demanda, vez que o crescimento da demanda efetiva induz a uma taxa de investimento mais elevada na capacidade crescente. Contudo, essa velocidade de resposta pode ser menor em alguns setores econômicos do que em outros (citando como uma das possíveis causas disso o prazo de maturação dos investimentos). Assim, no curto prazo sempre há alguns setores que são restritos por déficits de capacidade e, por conseguinte, sofrem de desemprego clássico, e isso pode ser a causa de desemprego Keynesiano em outros setores, especialmente quando se trata de complementares.

Sob essa perspectiva, Thirlwall (2005) identifica que para Kaldor é impossível entender o processo de crescimento e desenvolvimento negligenciando os distintos rendimentos das atividades por setores e apresenta com clareza as três principais leis da teoria Kaldoriana com respeito às diferenças setoriais e os efeitos dos setores para o crescimento econômico.

A primeira lei relaciona-se à existência de forte relação causal e positiva entre o crescimento da produção manufatureira e o crescimento do PIB de uma economia, sendo que as diferentes taxas de crescimento resultam de diferenças na produtividade do trabalho. Disso deriva a constatação de que o crescimento do setor industrial ocasiona aumentos na produtividade da economia como um todo. Segundo Thirlwall (2005), essa asserção é bastante razoável, levando-se em consideração que a mão de obra que é absorvida no ramo industrial advém de setores onde há um desemprego flagrante ou disfarçado, e, de tal modo, a transferência desta para o setor manufatureiro não implica em redução no produto dos demais setores.

A segunda lei, também conhecida como Lei de Verdoorn, atesta a existência de forte relação causal entre o crescimento da produção manufatureira e o aumento da produtividade no setor manufatureiro, como resultado de rendimentos estáticos e dinâmicos de escala. Embora existam algumas contestações com respeito à direção da causalidade indicada pela Lei de Verdoorn, Thirlwall (2005) ressalta que esta não constitui elemento basilar do modelo de Kaldor e que, portanto, independente de sua validade, a expansão da indústria mantém-se como fator preponderante para a determinação do crescimento global da produção, desde que, para tanto, os recursos utilizados pela indústria acrescentem à produção de forma líquida: "seja porque de outro modo não seriam utilizados, seja por causa dos rendimento decrescentes em outra áreas - ou seja, ainda, pelo fato de a indústria gerar seus próprios recursos de um modo que outros setores não geram; pela reinversão dos lucros." (Thirlwall, 2005, p. 48).

Isso leva à terceira lei de Kaldor, que assegura que à medida que a produção industrial cresce, há um incentivo para que trabalhadores de fora do setor industrial migrem para esse setor, o que aumenta a produtividade da economia como um todo, já que boa parte dessa mão de obra é oriunda do setor primário, cuja produtividade é menor que a do industrial.

Quando o produto marginal do trabalho fica abaixo da produção média desses setores, o produto médio (produtividade) aumenta à medida que o emprego se reduz. Por essa razão, o crescimento global do PIB tende a ficar mais lento, à medida que se esgota a capacidade de absorção de mão de obra das atividades com rendimentos decrescentes (THIRLWALL, 2005, p. 44).

Diante dessas leis, Kaldor se questiona acerca dos determinantes do crescimento na indústria manufatureira, e logo conclui que nos estágios iniciais do desenvolvimento, estes provêm da demanda oriunda da agricultura, e posteriormente do crescimento das exportações. Desse modo, o acelerado crescimento das exportações e da produção pode dar inicio a um ciclo virtuoso de crescimento, em que a elevação das exportações conduz a um aumento da produção, e de modo análogo, o crescimento desta última implicaria em aumentos na primeira.

Thirlwall (2005) destaca que alguns países têm dificuldade para experimentar desse círculo virtuoso, como é o caso de boa parte dos que se encontra em desenvolvimento. Destaca-se em relação a esse ponto que o gap temporal concernente ao processo de industrialização que divide o mundo entre periferia e centro, conforme concepção estruturalista, e que culmina na especialização em produtos intensivos em tecnologia versus produtos intensivos em trabalho ou recursos naturais, explica essa dificuldade experimentada pelos países periféricos.

Devido a esse atraso no processo de industrialização e correspondente inserção na divisão internacional do trabalho, desde o primeiro momento, no qual a demanda da agricultura constitui-se determinante para o crescimento na indústria manufatureira, revela-se de fundamental importância o desenvolvimento de políticas estratégicas para a conformação de um setor industrial nacional com vistas ao atendimento dessa demanda e cujos investimentos requeridos se aglutinem corroborando efeitos de encadeamento ao longo dessa estrutura produtiva, e fortalecendo, por conseguinte, esse setor ao ponto de sua inserção no mercado internacional se revelar competitiva.

Em suma, os fundamentos basilares da literatura até o momento apresentada ilustram a preponderância da inserção comercial para o crescimento do produto de longo prazo das economias. Nesse quadro teórico, a elasticidade-renda das importações e exportações, e os diferenciais de capacidade de geração de efeitos dinâmicos entre os setores (com ênfase para a proeminência da indústria) correspondem a elementos-chave para apreensão das distintas performances apresentadas pelos países no comércio internacional.

Sob essa perspectiva, cumpre, portanto, identificar os fatores que podem dar origem aos diferenciais de elasticidade renda das exportações vis-à-vis importações, e que, por conseguinte, resultam em desempenhos variados na dinâmica de comércio mundial, e em trajetórias de crescimento distintas em termos de sua virtuosidade e sustentação.

Coadunando com as perspectivas teóricas apresentas pelos pós-keynesianos e estruturalistas, encontra-se o referencial neoschumpeteriano, o qual concebe exímio destaque à inovação e, por conseguinte, ao grau de desenvolvimento tecnológico, para apreensão dos diferenciais de competitividade atestados no cenário internacional. Fagerberg (1988) reconhece o papel da competitividade tecnológica como um dos fatores determinantes da trajetória e desempenho econômico dos países, e desenvolve um modelo explicativo da competitividade internacional a partir de três eixos que constituem sua base axiomática: a competitividade tecnológica; a competitividade em preços; e a capacidade produtiva de atendimento da demanda[footnoteRef:7]. [7: Segundo Fagerberg (1988), mesmo que se verifique a presença dos dois primeiros fatores, a inabilidade de atender a demanda com que se depara uma economia, a faria perder participação de mercado para outros países O autor assume que a habilidade do "resto do mundo" de atender à demanda é ilimitada, ou seja, sempre haverá um país apto para atender a uma determinada demanda, caso os produtores nacionais não o façam]

A partir dessa abordagem neoschumpeteriana que enfoca o papel da tecnologia para competitividade internacional em termos de market-share e impacto sobre o crescimento econômico dos países, o autor promove uma sistematização das premissas pós-keynesianas, e endogeniza as elasticidades renda das importações e exportações, conforme será apresentada na secção seguinte, a qual apresenta detalhadamente o modelo.

2.2 Contribuições da Teoria Neoschumpeteriana: O Modelo de Fagerberg (1988) para explicação dos diferenciais de competitividade internacional

Os fatores explicativos dos diferenciais de competitividade internacional historicamente recaíram sobre a competição via preços/ diferenciais dos custos unitários do trabalho. Porém, em 1978, surge a constatação do "Paradoxo de Kaldor" com evidências empíricas para alguns países europeus que revelavam a presença de uma alta taxa de crescimento do produto de modo concomitante à elevação dos custos do trabalho.

Com respeito à literatura que enfoca os efeitos negativos do crescimento dos custos relativos unitários do trabalho (RULC) para o market-share e o crescimento econômico, Fagerberg (1988) observa que o suposto primário dessa teoria reside no reconhecimento da existência de algum grau de imperfeição e desequilíbrio no mercado, rompendo com o pressuposto fundamental neoclássico.

Resumidamente, a base axiomática da abordagem pode assim ser descrita, segundo o autor:

1. Cada país produz um bem que é um substituto imperfeito dos demais bens produzidos pelo "resto do mundo";

2. Curva de demanda para cada país será negativamente inclinada, descendente;

3. Preços são determinados pelo custo unitário do trabalho, acrescido de Mark-up (outros custos, que não o do trabalho, serão desconsiderados);

4. RULC (custo relativo unitário do trabalho) é exógeno;

5. Equilíbrio na balança comercial

As equações do Modelo são dadas por:

(9)

(10)

(11)

(12)

Conforme apresenta a equação (9), as exportações são determinadas por um parâmetro A; pelo diferencial de preços do mercado externo vis-à-vis doméstico ponderado pelo grau de sensibilidade da demanda mundial aos preços; e pela demanda mundial ponderada por sua sensibilidade a variações na renda.

De modo análogo, a equação (10) mostra que as importações são determinadas por um parâmetro B; pelo diferencial de preços do mercado doméstico vis-à-vis externo ponderado pelo grau de sensibilidade da demanda doméstico aos preços; e pela demanda doméstica ponderada por sua sensibilidade a variações na renda.

Na equação (11) verifica-se o suposto de equilíbrio na balança comercial, e na (12) a determinação dos preços (sendo “i” referente aos preços domésticos) pelo custo unitário do trabalho mais uma constante. Cabe ressaltar que até a equação (11) verifica-se uma apresentação explicativa da forma como delineada por Thirwall. Após algumas deduções algébricas chega-se à seguinte equação:

(13)

De (13), é possível depreender que o crescimento econômico é descrito como função do crescimento nos custos unitários do trabalho e da demanda mundial, sendo que o crescimento no RULC doméstico influenciará negativamente a taxa de crescimento da economia em análise. Ressalta-se que para que tal interpretação seja válida, faz-se necessário que se verifique a condição de Marshall-Lerner[footnoteRef:8]. [8: A condição de Marhall-Lerner estabelece que para que uma desvalorização cambial tenha um impacto positivo sobre a balança comercial, a soma absoluta das elasticidades-preço das exportações e das importações seja maior que a unidade (a+b) >1. ]

Uma segunda interpretação dessa abordagem foi dada por Thirwall, conforme já foi apresentado na seção anterior, com a hipótese de que os preços relativos no longo prazo são constantes e que, portanto, o primeiro termo da equação (13) pode ser omitido:

(14)

(15)

Nos casos das equações acima, fica explícito que os diferencias de crescimento econômico entre países são explicados por diferenças nas elasticidades renda das exportações e importações, ou em modelos de crescimento exógeno das exportações, por diferenças nas elasticidades das importações somente.

Em vista de tal abordagem de Thirwall, Fagerberg (1988) apresenta algumas das críticas[footnoteRef:9] que são direcionadas ao sobrepeso das elasticidades-renda das exportações e importações na determinação do crescimento econômico, contrastando tal interpretação com o caso da economia britânica, a qual apresenta elasticidade-renda das importações tão mais elevadas que das exportações enquanto seu nível de renda per capita é igual ao de tantos outros países. [9: Em face desse tipo de crítica, Thirwall (1979) alega a inabilidade de competir em fatores não-preço e que estariam refletidos nas elasticidades, alegação que Kaldor (1981) também apresenta apontando para o fato de que as elasticidades do modelo refletem a habilidade inovativa e capacidade adaptativa dos produtores em diferentes países. Contudo, Fagerberg (1988, p.359) se posiciona a respeito dessas justificativas concluindo que: "[...] seria preferível incluir esses fatores nas equações para exportações e importações ao invés de repousar sobre proxies estimadas (as quais podem ser objeto de diferentes interpretações)".]

Em função do reconhecimento que o autor dispõe, portanto, acerca da competitividade tecnológica como um dos fatores determinantes da trajetória e desempenho econômico dos países, ele desenvolve seu modelo explicativo da competitividade internacional a partir das seguintes asserções que conformam sua base axiomática:

1. A competitividade tecnológica,

2. A competitividade em preços,

3. A capacidade produtiva de atendimento da demanda, já que, segundo ele, mesmo que se verifique a presença dos dois primeiros fatores, a inabilidade de atender a demanda com que se depara uma economia, a faria perder participação de mercado para outros países.

4. Além disso, o autor assume que a habilidade do "resto do mundo" de atender à demanda é ilimitada, ou seja, sempre haverá um país apto para atender a uma determinada demanda, caso os produtores nacionais não o façam.

As variáveis do modelo em Fagerberg (1988) podem, então, ser assim definidas:

T/Tw = competitividade tecnológica do país

= competitividade em preços

C = capacidade produtiva para atendimento da demanda

= market-share para as exportações

(16)

Diferenciando em relação ao tempo a equação (16) tem-se:

(17)

Ou seja, com base na equação acima a variação do market-share das exportações depende do crescimento da capacidade produtiva do país, da competitividade tecnológica e da competitividade em preços. Detalhadamente, deve-se compreender a influência de cada um dos termos dessa equação da seguinte forma: (1º termo) quanto maior o crescimento verificado na capacidade produtiva do país, maior sua capacidade de atender à demanda e, por conseguinte, isso impactará positivamente sobre o market-share de suas exportações; (2º termo) de modo semelhante, o crescimento na sua competitividade tecnológica (quanto mais avançada a tecnologia desenvolvida no país comparativamente ao "resto do mundo", produzindo um resultado positivo dentro da operação entre parêntesis) influenciará de forma positiva seu market-share; e (3º termo).

Por fim, o raciocínio para a competitividade em preços se dá ao contrário no que concerne à comparação entre doméstico e "resto do mundo", ou seja, o menor crescimento dos preços domésticos vis-à-vis dos preços externos, resultando em número negativo dentro do parêntesis, impactará de modo positivo no market-share, em virtude do sinal negativo que acompanha o coeficiente de sensibilidade "a", já que multiplicados ambos, teremos como resultado um sinal positivo.

Fagerberg (1988) empreende, a partir da equação (17), outras deduções algébricas com vistas a detalhar melhor seu modelo, conforme colocado no Apêndice deste trabalho. Por ora, de uma forma mais geral a equação (17) já fornece um importante referencial para desenvolvimento de testes empíricos, tal como o que será apresentado no próximo tópico.

3 ANÁLISE EMPÍRICA DO MODELO: TECNOLOGIA E COMPETIVIDADE INTERNACIONAL – EVIDÊNCIAS PARA ECONOMIAS AVANÇADAS E PERIFÉRICAS[footnoteRef:10] [10: Esses termos de economias avançadas e periféricas estão presentes na teoria estruturalista, sendo uma das teorias que sustentam o presente trabalho. A classificação dos países em avançados e periféricos é realizada com base na classificação empregada pelo International Monetary Fund (IMF).]

3.1 Descrição do Modelo e da Base de Dados

Para a análise empírica será tomada como base a equação encontrada em Fagerberg (1988) para apreensão dos determinantes da participação das exportações de uma dada economia no produto mundial, qual seja:

(18)

Contudo, ressalta-se que diferentemente do encontrado no trabalho do autor, as variáveis não serão diferenciadas no tempo e, portanto, não dirão respeito às taxas de crescimento, mas à variável em nível. Adicionalmente, são assumidas as seguintes hipóteses:

1. A capacidade de atendimento da demanda (C) é determinada, em última instância, pela formação bruta de capital fixo de uma economia. Essa última variável é tomada como tecnologia incorporada a máquinas e equipamentos, numa apreensão semelhante à apresentada em Dixon e Thirwall (1975). Por essa razão, ela é considerada neste trabalho como fator tecnológico, portanto.

1. A competitividade tecnológica, caracterizada por , é considerada a partir da construção de dois índices de tecnologia desincorporada, tal como realizado em Fagerberg (1988), salvo algumas alterações, e tomando-se em conta, especialmente, duas variáveis: investimento em P&D como porcentagem do PIB, e registro de patentes. As informações detalhadas sobre o cálculo dos índices encontram-se no apêndice.

1. O market-share das exportações é calculado como: , ou seja, pela participação das exportações do país “i” nas exportações totais do mundo.

1. No modelo empírico, é a formação bruta de capital fixo como porcentagem do PIB do país “i”, conforme disponibilizado na base de dados do World Development Indicators.

1. No caso da variável que reflete o fator preço, optou-se neste trabalho pela utilização da variável “termos de troca ajustados”, disponibilizada no World Development Indicators, a qual se refere à capacidade de importação do país “i” consideradas suas exportações de bens e serviços em moeda local. Entende-se que esta variável guarda relação com o poder da moeda local, considerada a entrada e saída de divisas estrangeiras resultantes de suas importações e exportações.

Desse modo o modelo que será testado empiricamente neste trabalho repousa especialmente sobre fatores tecnológicos, apreendidos em termos de: inovação incorporada a máquinas e equipamentos, e inovação desincorporada (como investimentos em P&D e registro de patentes). Para além dos referidos fatores, também são levados em consideração no âmbito das variáveis explicativas do modelo a competitividade via preços, e a classificação de desenvolvimento da economia (Tabela 1). Esta última é realizada com base na classificação empregada pelo International Monetary Fund (IMF).

Para a análise empírica desse trabalho são utilizados dados referentes a 70 países, conforme apresentado na Tabela 1, classificados em dois grandes grupos conforme a referida classificação do IMF, referente ao período de 2000 a 2015 (último ano disponível para algumas variáveis). Os dados foram extraídos do site do World Development Indicators (WDI).

Tabela 1: Países Selecionados

Economias Avançadas

(24)

Economias Emergentes ou em Desenvolvimento (46)

Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Islândia, Irlanda, Itália, Japão, República da Coreia, Países Baixos, Nova Zelândia, Noruega, Portugal, Singapura, Espanha, Suécia, Suíça, Reino Unido, Estados Unidos

Argélia, Albânia, Armênia, Argentina, Bangladesh, Bielorrússia, Belize, Bolívia, Botswana, Brasil, Bulgária, China, Chile, Colômbia, Costa Rica, Croácia, Cuba, República Dominicana, Equador, Egito, El Salvador, Estônia, Geórgia, Guatemala Honduras, Indonésia, Índia, Quênia, Malásia, México, Nicarágua, Paquistão, Panamá, Paraguai, Peru, Polônia, Romênia, África do Sul, Tailândia, Trinidad e Tobago, Tunísia, Turquia, Uganda, Ucrânia, Uruguai, Venezuela

Fonte: Elaboração das autoras.

Nota: Classificação adotada de International Monetary Fund (2017).

Tabela 2: Definição de Variáveis e Fonte dos Dados — Análise Econométrica

Variáveis

Definição

Fonte

msx

Percentual das exportações do país nas exportações mundiais;

WDI 2017

tl

Índice do nível de tecnologia (Technological Level);

WDI 2017

tg

Índice do crescimento tecnológico (Technological Growth);

WDI 2017

fbkf

Percentual da formação bruta de capital fixo no Produto Interno Bruto, por país;

WDI 2017

termstrade

Termos de troca ajustados;

WDI 2017

d_desenv

Dummy que representa a classificação dos países: economias avançadas=1, e economias periféricas=0;

WDI 2017

d1, d2, d3, d4, d5, d6, d7, d8

Dummies de tempo.

WDI 2017

Fonte: Elaboração das autoras.

Em consonância com boa parte da literatura econômica voltada para o desenvolvimento de modelos de crescimento econômico (embora não seja este o caso do modelo aqui testado, já que este se refere a um modelo de competitividade internacional), foram utilizadas médias bienais, a fim de se minimizar efeitos cíclicos e termos de erro autocorrelacionados, quando da estimação de painéis (GOMES DA SILVA et al, 2013). Isto por que parte das variáveis depende do produto, e este se encontra com frequência sujeito a períodos de crises específicas, ou quaisquer outros choques adversos que podem recair sobre um determinado ano. Além disso, essa opção pelas médias a cada dois anos, minimiza problemas associados à falta de dados para alguma variável em um ano específico.

A Tabela 3 apresenta de algumas estatísticas descritivas das variáveis que farão parte dos modelos. Ressalta-se que a variável dependente (msx) está em percentual e que as variáveis tl e tg são índices calculados com base em Fagerberg (1988) – ver Apêndice.

Tabela 3: Descrição Sumária das Variáveis

Variáveis

Obs

Média

Desvio Padrão

Mínimo

Máximo

msx

559

0.01054

0.017014

0

0.101467

tl

406

0.048062

0.151748

5.76E-05

1

tg

391

-7.9E-05

0.000187

-0.00058

0.001173

fbkf

556

22.58868

5.771259

7.973547

45.3902

termstrade

545

1.05E+12

1.47E+13

-1.14E+14

1.85E+14

d_desenv

560

0.342857

0.475089

0

1

Fonte: Elaboração das autoras com base nos dados de WDI (2017).

3.2 Aspectos Metodológicos[footnoteRef:11] [11: Esta subseção foi desenvolvida com base em Arellano-Bond (1991), Hsiao (1999), e Roodman (2006).]

Os modelos de dados em painel apresentam a notada vantagem de permitir análises econométricas em duas dimensões conjuntas, quais sejam: temporal, e seccional. Por outro lado, é necessário ter em conta que as “lições” ou “inferências” a serem extraídas serão sempre para o agregado dos indivíduos presentes na amostra. Logo abaixo, é apresentada uma representação para dados em painel:

(19)

Na notação exibida, “i” designa os diferentes indivíduos da amostra, ao passo que “t” denota o período de tempo para o qual os dados estão sendo analisados. Já o refere-se ao parâmetro de intercepto, como de costume, e os demais (, ) aos coeficientes angulares das variáveis explicativas do modelo. O termo diz respeito a fatores que não variam no tempo, mas sim entre indivíduos (como é o caso de gênero, e cor ou raça, por exemplo).

Painel Estático: Efeitos Fixos e Aleatórios

Ao estimar os modelos de painel estáticos, por Efeitos Fixos ou Aleatórios, é necessário ter em mente que eles não lidam com a presença de variáveis endógenas no modelo, algo que os modelos de painel dinâmico, como o GMM Difference e o GMM System conseguem fazer.

No Modelo de Efeitos Fixos a estimação é feita por Mínimos Quadrados Ordinários (MQO), removendo-se o termo “” da equação. Isso ocorre porque a média desse termo é o próprio termo (já que ele não varia no tempo), então quando é calculado o desvio do termo em relação à sua média obtêm-se o resultado zero (). Desse modo, tem-se a seguinte equação:

(20)

A diferenciação básica entre a estimação do painel dinâmico por efeitos fixos ou aleatórios guarda relação com o supracitado termo “”. Se esse termo não tiver correlação com as variáveis fixas, c, torna-se inapropriada essa exclusão porque os estimadores tornam-se inconsistentes, e, portanto, deve-se optar pelo modelo de efeitos aleatórios. O Teste do Hausman deve ser empreendido para proceder a essa escolha.

No modelo de efeitos aleatórios verifica-se, portanto, um termo de erro de composição que abarca e :

(21)

O termo representa o erro de composição em cada período de tempo e, portanto, os serão serialmente correlacionados ao longo do tempo:

(22) , t ≠s

O que ocorre a partir de então é uma transformação do modelo aplicando-se Mínimos Quadrados Generalizados (MQG), ponderando-se os estimadores por λ, o qual varia entre 0 e 1:

(23) ;

(24)

Por conseguinte, é justamente a identificação dessa fração à qual serão ponderados os estimadores no desconto de sua própria média que o Teste do Hausman proporciona. Se a hipótese nula do teste for rejeitada, a opção deve ser feita por Efeitos Fixos (FE).

Painel Dinâmico: GMM System

Os chamados modelos de painel dinâmico nas suas versões Generalized Method of Moments (GMM) Difference e System são bastante apropriados para as situações em que a dimensão temporal é relativamente pequena, mas a dimensão de corte transversal é relativamente elevada (destacando-se que, neste caso, quanto maior for esta última, melhor).

Os principais ganhos no uso desses modelos relativamente ao painel estático relacionam-se à possibilidade de lidar com endogenia no modelo, uma vez que a estimação por GMM utiliza-se de instrumentos para mitigar o referido problema. Estes instrumentos são as próprias variáveis defasadas no tempo (inclusive, a variável dependente defasada, a qual se torna, então, mais uma variável explicativa no modelo).

Além disso, é possível trabalhar com autocorrelação de primeira ordem no modelo utilizando-se GMM, desde que não seja apresentada autocorrelação de segunda ordem no termo de erro (os testes de Hansen de restrições sobreidentificadoras para verificar a validade dos instrumentos é indicado, bem como o teste Arellano-Bond (AR2) que testa a hipótese de ausência de correlação serial).

A diferença essencial entre as duas versões reside no fato de que o GMM Difference trabalha com as equações em diferenças, ao passo que o GMM System trabalha com as equações em nível com sistemas em diferença. Convém ressaltar que a transição do primeiro para o segundo apresenta ganhos, já que o estimador será expandido. Por outro lado, essa opção tem também um custo, o qual está implícito num arranjo de restrições adicionais nas condições iniciais do processo de geração da variável dependente.

Contudo, um problema comum que se pode enfrentar com a utilização dos modelos GMM refere-se ao crescimento exagerado do número de instrumentos da amostra, o qual pode comprometer resultados assintóticos e testes de especificação, enfraquecendo, por exemplo, o Teste do Hansen. Para se avaliar a proliferação dos instrumentos o ideal é observar se eles são maiores que a dimensão seccional do modelo, e, caso seja esta a situação, é indicada a utilização de comandos como o “collapse” e o “lag limits”, para colapsá-los, por meio da adição em conjuntos menores.

3.3 Síntese dos Resultados Econométricos

O objetivo central deste trabalho é investigar como fatores tecnológicos podem influenciar o desempenho comercial dos países. Com isso, pretende-se ressaltar a importância da dinâmica tecnológica no crescimento de longo prazo das economias selecionadas, tendo em vista o papel que uma performance comercial virtuosa exibe sobre essa variável, conforme colocado pela literatura pós-keynesiana e pela estruturalista. Ademais, visa-se testar a hipótese de que as economias periféricas, por razões estruturais ainda não superadas (dentre elas, o diferencial das elasticidades renda de suas importações relativamente às das economias avançadas), apresentam inserção comercial externa inferior à dos países desenvolvidos.

Os modelos estimados incluem como variáveis independentes, a variável que representa o nível de tecnologia das economias (tl), índice calculado com base no trabalho de Fagerberg (1988) e a partir deste, considera-se que o coeficiente associado seja positivo. Outra variável incluída para testar o grau de desenvolvimento tecnológico no desempenho comercial dos países, é a tg, representando o crescimento tecnológico e calculado com base em Fagerberg (1988) e espera-se que o coeficiente associado seja positivo. A variável fbkf é incluída entre as variáveis independentes como proxy a fim de expressar tecnologia incorporada a máquinas e equipamentos em cada país. Acredita-se que um aumento em investimento em infraestrutura tenha impacto positivo sobre o desempenho comercial dos países, à medida que eleva sua capacidade de atendimento eficaz da demanda com que se depara. Por fim, a variável dummy de classificação dos países em economias avançadas e periféricas, sendo que se espera que os países tidos com economias avançadas tenha um desempenho comercial superior aos dos países periféricos.

Estimaram-se modelos de dados em painel estático e dinâmico tendo como a variável dependente a participação das exportações do país nas exportações mundiais (msx). As estimações dos modelos utilizam dados de média a cada dois anos para o período de 2000 a 2015.

Ademais, foram realizados os testes de especificação dos modelos, sendo que foram realizados os testes de verificação de ausência de autocorrelação, de heterocedasticidade, teste de multicolinearidade para os modelos estáticos. Enquanto que para os modelos dinâmicos foram realizados os testes de ausência de autocorrelação de segunda ordem, AR(2), o teste de Hansen para as restrições sobreidenficadoras (validade dos instrumentos) e o teste para a exogeneidade dos instrumentos (Hansen-Difference).

Os resultados das estimações dos modelos estáticos[footnoteRef:12] da investigação do impacto da tecnologia no desempenho comercial dos países estão reportados na Tabela 4. [12: As estimações do painel estático de efeitos fixos e de efeitos aleatórios foram desenvolvidos com a utilização da rotina XTREG para o STATA 12.]

Tabela 4: Modelos de Painel Estático de Efeitos Fixos e de Efeitos Aleatórios – Coeficientes Estimados para a Variável Dependente msx

 

Efeitos Fixos

Efeitos Aleatórios

Efeitos Fixos Robusto

Efeitos Aleatórios Robusto

Variáveis

 

L.msx

0.719***

0.988***

0.719***

0.988***

 

(0.0292)

(0.00598)

(0.0739)

(0.00980)

fbkf

-2.59e-06

2.06e-05

-2.59e-06

2.06e-05

 

(1.89e-05)

(1.49e-05)

(1.83e-05)

(1.72e-05)

tl

0.0104***

0.00140**

0.0104

0.00140

 

(0.00303)

(0.000645)

(0.0142)

(0.00109)

tg

-0.185

0.649*

-0.185

0.649

 

(0.512)

(0.391)

(0.305)

(0.453)

termstrade

-1.27e-17

9.54e-18

-1.27e-17

9.54e-18

 

(1.07e-17)

(1.11e-17)

(2.63e-17)

(1.27e-17)

d_desenv

-0.000181

-0.000181

 

(0.000208)

(0.000164)

Constant

0.00339***

-6.70e-05

0.00339***

-6.70e-05

 

(0.000566)

(0.000362)

(0.000918)

(0.000406)

 

Observações

329

329

329

329

Número de países

60

60

60

60

Fonte: Elaboração das autoras com base nos dados do WDI (2017) e estimações no Stata 12.

Notas: Erro-padrão em parênteses.

*, ** e *** indicam significância estatística a 10%, 5% e 1%, respectivamente.

Todos os modelos incluem dummies de tempo.

Ressalta-se que além das variáveis explicativas já mencionadas, nos modelos foram incluídas as variáveis dummies de tempo, porém, os seus resultados não foram reportados na Tabela 4. Cabe destacar que diante da presença de heterocedasticidade foi necessária a estimação dos modelos com erros robustos. Assim, a Tabela 3 mostra os resultados dos modelos de efeitos fixos e de efeitos aleatórios, sem e com erros robustos.

Os coeficientes estimados para a variável L.msx (variável dependente defasada) foram positivos e estatisticamente significativos a 1% em todos os modelos estáticos estimados (de efeitos fixos e de efeitos aleatórios), com o coeficiente de menor valor de 0,719 e o maior valor de 0,988, indicando que uma elevação de 10% na participação passada das exportações do país no mercado externo tem um impacto de 0,71% a 0,98% no desempenho comercial do referido país a cada dois anos, representando um aumento médio anual entre 0,35% a 0,49% no market-share comercial desta economia no ano seguinte. Esse resultado corrobora para a apreensão de que há uma trajetória cumulativa no desempenho comercial externo, de tal modo que, ceteris paribus, ciclos virtuosos tenderiam a se retroalimentar[footnoteRef:13]. Esta foi à única variável significativa nos modelos de efeitos fixos e de efeitos aleatórios com erros robustos. [13: Similarmente, Dixon e Thirwall (2005) identificam a existência de um processo de causação cumulativa para o crescimento econômico, ressaltando o quanto as trajetórias históricas importam para entendimento de uma situação presente com respeito a essa variável.]

Entretanto, menciona-se que nos modelos sem os erros robustos a variável que representa o nível de tecnologia (tl) apresentou-se estatisticamente significativa e positiva, tanto para efeitos fixos quanto para os efeitos aleatórios. Já a variável tg apresentou o coeficiente positivo no modelo de efeitos aleatórios, sendo significativo estatisticamente a 10%. Já nos modelos com erros robustos (que devem ser os considerados devido à presença de heterocedasticidade), tais variáveis não foram estatisticamente significativas, mas apresentaram os sinais esperados. Considerando os modelos de efeitos aleatórios, observa-se que as variáveis que representam a dinâmica tecnológica têm impactos positivos no market-share do país no comércio internacional, indicando que aumentos nos níveis de tecnologia impactam em melhorias no desempenho comercial dos países.

Diante desses resultados e conforme fora explicado na subseção anterior, realizou-se estimações para o modelo de painel dinâmico Generalized Method of Moments (GMM) System[footnoteRef:14] com erros robustos e lidando com a proliferação dos instrumentos. Os resultados para este modelo estão na Tabela 5. Salienta-se que no modelo inclui as dummies de tempo, mas, os resultados não foram reportados na tabela. [14: As estimações foram desenvolvidas com a utilização da rotina XTABOND2 e utilizaram-se os comandos lag limits para o Stata 12.]

A análise dos resultados do teste de ausência de autocorrelação de segunda ordem (a hipótese nula é de ausência de autocorrelação de segunda ordem) e do teste Hansen e do Hansen-Diff (as hipóteses nulas são de validade dos instrumentos e de exogeneidade dos instrumentos, respectivamente) e considerando o nível de significância de 5% permite concluir que no modelo dinâmico estimado não há problema de correlação de segunda ordem, os instrumentos são válidos e são exógenos.

Tabela 5: Modelo de Painel Dinâmico – GMM System – Coeficientes Estimados para a Variável Dependente msx

 Variáveis

Modelo Dinâmico Robusto

 

 

L.msx

1.014***

 

(0.0100)

fbkf

5.69e-05*

 

(3.38e-05)

tl

0.00147

 

(0.00143)

tg

3.509**

 

(1.628)

termstrade

2.21E-17

 

(2.63E-17)

d_desenv

-0.000407

 

(0.000316)

AR(2)

0.071

Hansen

0.286

Hansen-Diff

0.919

Número de países

60

Número de Instrumentos

58

Observações

329

Fonte: Elaboração das autoras com base nos dados do WDI (2017) e estimações no Stata 12.

Notas: Erro-padrão em parênteses.

*, ** e *** indicam significância estatística a 10%, 5% e 1%, respectivamente.

O modelo inclui dummies de tempo e o controle para o excesso de instrumentos — Comandos Laglimits — Stata 12.

Os resultados da Tabela 5 indicam que os coeficientes estimados para as variáveis fbkf e tg foram positivos e estatisticamente significativos a 1% e a 5%, respectivamente. Indicando que, para a variável fbkf, um aumento nos investimentos em infraestrutura (máquinas e equipamentos) tende a impactar positivamente no market-share do país, implicando em uma melhoria no desempenho comercial do país no cenário mundial. Em linhas semelhantes, o resultado do modelo dinâmico indica que o crescimento na competitividade tecnológica de um país (e o aumento deste) significa em um aumento do market-share do comércio exterior. Deste modo, essas variáveis são importantes estatisticamente e apresentam impactos positivos para uma melhor performance comercial e competitividade internacional do país. Ressalta-se que estas variáveis apresentaram resultados similiares ao trabalho de Fagerberg (1988).

As demais variáveis não foram estatisticamente significativas a um nível de significância de 10% para o período e observações selecionadas. Contudo, cabe mencionar o sinal e a magnitude dos coeficientes estimados. O coeficiente estimado da variável tl foi positivo, indicando que o aumento do nível de tecnologia tende a elevar o desempenho comercial dos países, caso fosse importante estatisticamente. A termstrade também apresentou um coeficiente positivo, indicando que uma melhoria nos termos de troca implica em aumento na competitividade internacional do país, indicando um melhor desempenho comercial. Por fim, o coeficiente da d_desenv foi negativo, contrário ao sinal esperado, indicando que ser um país periférico implica em uma melhor performance comercial internacional. Entretanto, tal análise não se mostra apropriada, não só pela falta de significância estatística encontrada, como também pelo fato de que a maioria das observações da amostra foi constituída de países classificados como periféricos, de tal modo que essa composição pode ter afetado o resultado do coeficiente.

De maneira geral, a estimação dos modelos, estático e dinâmico, resultou em coeficientes positivos e significativos (na maioria dos casos) para as principais variáveis de interesse que envolve tecnologia, a saber, as variáveis fbkf, tl tg. Assim, esses resultados indicam que a dinâmica tecnológica (expressa em termos desincorporados como investimento em P&D e submissão de patentes de residentes) e os investimentos em máquinas e equipamentos permitem os países terem um melhor desempenho comercial com ganhos de competitividade internacional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerada a importância atribuída pelos pensamentos estruturalista e pós-keynesiano à dinâmica comercial externa para a trajetória de crescimento econômico, e tendo em vista o papel da tecnologia para a competitividade internacional, conforme apontado pela literatura neoschumpeteriana, este trabalho visou apreender por meio de análise empírica como fatores que denotam o grau de desenvolvimento tecnológico influenciam o desempenho comercial das economias. Adicionalmente, visou-se atestar a hipótese de que as economias periféricas apresentam uma inserção externa que resulta em desempenho comercial inferior ao das avançadas, fato que, entre outras razões, deriva de um diferencial de elasticidade-renda de suas importações e exportações.

Para tanto, o modelo testado foi obtido com base em Fagerberg (1988), com ressalva para algumas modificações próprias no que concerne à escolha das variáveis empiricamente utilizadas. Essas alterações se justificam, na medida em que o atual momento de elaboração do trabalho vis-à-vis o ano em que o estudo original do autor foi realizado apresenta outras possibilidades em termos de dados, não existentes outrora. A investigação empírica foi realizada por meio da estimação de modelos em painel, estático e dinâmico.

Os resultados da estimação econométrica, sobretudo do GMM System, indicam a importância dos fatores tecnológicos, já que os coeficientes estimados para fbfk e tg foram positivos e estatisticamente significativos, indo ao encontro dos resultados encontrados por Fagerberg (1988). Ademais, a elaboração deste trabalho mostra a relevância da tecnologia para as economias, à medida que essa variável permite uma melhoria no nível de desenvolvimento comercial e competitividade internacional, o que, por conseguinte, pode apresentar impactos importantes para o crescimento econômico, conforme concepções pós-keynesiana e estruturalista.

Assim, este trabalho pode indicar que políticas que visam o desenvolvimento tecnológico dos países são fundamentais para o estímulo do desenvolvimento comercial e melhorias na sua competitividade internacional. Tal questão é debatida por diversos autores da literatura, sendo uma agenda futura de trabalho, relacionar as questões aqui abordadas com o fomento de programas de promoção à competitividade comercial baseados em políticas de apoio ao desenvolvimento tecnológico, o que pode ter repercussões significativas para o Brasil, que ainda se encontra categorização de economias classificadas pelo IMF como “emergentes ou em desenvolvimento”.

Desse modo, a investigação empreendida neste trabalho e seus resultados apontam para um direcionamento estratégico dos esforços políticos – qual seja, o fomento ao desenvolvimento tecnológico – que resulta em incremento no desempenho comercial externo, e este último, constitui componente importante da demanda agregada de uma economia, com elevada capacidade de estímulo ao crescimento econômico. Esse reconhecimento pode delinear uma importante estratégia para superação de períodos de crise, tal como o que enfrenta hoje a economia brasileira.

REFERÊNCIAS

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World Development Indicators (WDI). Acesso em junho de 2017. Disponível em: http://data.worldbank.org/data-catalog/world-development-indicators

APÊNDICE

Os índices a seguir são calculados com base em Fagerberg (1988).

Cálculo do Índice de nível de tecnologia (tl)

Onde, o índice de patentes (P) é igual à razão entre o número de patentes registradas no país por sua população multiplicada pelo grau de abertura da economia (exportações como porcentagem do PIB):

Cálculo do Índice crescimento tecnológico (tg)

O índice refere-se ao crescimento na competitividade tecnológica de um país “i” relativamente aos demais países. Ele é definido por uma média ponderada dos índices de crescimento das patentes (PG) e do R&D (RG).

Para tanto, PG e RG são obtidos assim:

Ou seja, PG é a diferença entre a taxa de crescimento das patentes no país “i” pela taxa média de crescimento das patentes de todos os países (“w”).

RG é definido como a diferença entre a razão dos gastos em P&D como porcentagem do PIB pelo PIB per capita no país “i”, e mesma razão média para os demais países (“w”)

Diferentemente do realizado pelo autor, neste trabalho optou-se por não proceder a uma média aritmética (ou mesmo ponderada pela população do país) da variável R&D de todos os países da amostra. Ao invés disso, a fim de se obter , bem como , calculou-se as referidas variáveis para o conjunto dos países. Esse procedimento está em consonância com o que, por exemplo, o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil faz ao calcular um indicador a nível Brasil, a partir de dados municipais. Um caso se refere ao Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) do Brasil, o qual é calculado a partir de indicadores que são extraídos diretamente da base de dados dos censos, considerando todas as pessoas do país. Isto não é a mesma coisa que tirar uma média aritmética simples dos valores dos IDHMs dos 5565 municípios do país, pois, neste caso, em vez de pessoas, estariam sendo considerando municípios, e todos entrariam com o mesmo peso no cálculo, seja um município muito grande ou um muito pequeno. Poderia então ser pensado, como alternativa, o cálculo do IDHM do país por meio da média aritmética ponderada pela população dos municípios. Neste caso, o valor do IDHM se aproximaria bastante do valor obtido pelo método de cálculo adotado para o IDHM do Brasil, ainda assim, o resultado não seria ideal (Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, 2013).

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