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Religião
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Anselmo Borges "Ateísmo, agnosticismo, teísmo"
Texto de Anselmo Borges :
A modernidade tem como característica fundamental a nova visão científica da
realidade. A problemática é de tal modo decisiva que o filósofo e teólogo Javier
Monserrat advoga a convocação de um Concílio para confrontar a fé com esse novo
dado - ver "Hacia el Nuevo Concilio", de onde partem as reflexões que se seguem.
Alguns resultados estão alcançados. 1. Para a ciência actual, o universo todo, incluindo
a consciência, "produziu-se pelas propriedades ontológicas e dinâmicas da matéria que
foi produzida no big bang com altíssima densidade e energia". 2. Estamos em presença
de um mundo real e aberto. 3. Este mundo aparece-nos ordenado finalisticamente.
Trata-se de uma "ordem viva" e "ordem antrópica". De qualquer modo, apresenta-se
como um mundo enigmático, sendo possíveis três conjecturas metafísicas: ateísmo,
agnosticismo, teísmo.
Os autores ateus "mostraram que entender a consistência eterna de um universo sem
Deus é possível". A ciência pode, segundo algumas teorias, conceber a auto-suficência
do universo, "a sua consistência e estabilidade dinâmica num tempo eterno, sem fim".
Perante a impossibilidade de a ciência resolver com certeza as questões últimas, de
ordem metafísica, o agnosticismo assume a ausência de resposta: trata-se de "um
incompromisso filosófico". Respeita tanto o ateísmo como o teísmo. Provavelmente a
percentagem de agnósticos é hoje muito mais elevada do que a dos ateus.
O ateísmo não pode ser excluído como "teoria possível". Mas o ateísmo não é evidente.
Se o fosse, não haveria teístas, do mesmo modo que, se o teísmo fosse uma evidência,
não haveria ateus. Perante um mundo obscuro e enigmático, tanto o ateísmo como o
teísmo constituem uma "fé filosófica", uma "crença".
Também o teísmo apresenta razões para argumentar a favor da existência de Deus. Já
não se trata de "demonstrar", mas de mostrar que a razão científico-filosófica torna
verosímil a existência de Deus: "uma certeza moral livre da existência de Deus". 1. A
hipótese de um Deus transcendente e criador enquanto fundamento da consistência,
estabilidade e suficiência de "um universo que começa no tempo (a grande explosão) e
que previsivelmente acabará numa morte energética e na sua dissolução final" surge
como a mais verosímil. É defensável a hipótese de que "o fundamento do ser, a
verdadeira realidade auto-suficente em si mesma e eterna, seja um ser divino
transcendente que - com intencionalidade - "cria", "funda" o universo visível no seu
fluir temporal finito". 2. O universo que autonomamente produziu a ordem física e
biológica, conducente à liberdade, torna verosímil um desígnio racional de Deus
enquanto criador. O teísmo actual não aceita o Deus tapa-buracos, mas, precisamente
ao reflectir sobre a ordem "quase-racional" constatável, e, portanto, sobre as
propriedades da matéria e as leis evolutivas que permitem produzir autonomamamente
a ordem psicobiofísica e a sua orientação antrópica - porquê estas propriedades e leis e
não outras? - ,constata que esta ordem, congruente com um fim inteligível, "torna
verosímil a hipótese de que poderia estar causada pelo "desígnio" racional de uma
Inteligência Criadora." 3. Esta verosimilhança é confirmada e aprofundada, quando se
constata que o processo evolutivo dá origem no seu termo a seres humanos enquanto
pessoas autoconscientes e livres. Não é mais razoável e inteligível o processo, se na sua
raiz e como sua Causa está o Deus transcendente e pessoal, que cria livremente por
amor? O teísmo actual "assumiria a superação do dualismo e identificar-se-ia com a
lógica do emergentismo, incluindo a emergência do psiquismo humano, da razão e da
sua especial abertura à Divindade", "que abarca o universo e o contém criativamente no
seu interior". Este universo é um "universo para a liberdade", a partir de um "desígnio
para a liberdade" e, portanto, do "princípio antrópico cristão", embora não se imponha
como inevitável a "solução divina".
Tanto o ateísmo como o teísmo têm na base uma crença ou uma fé, com razões,
devendo, portanto, ateus, agnósticos e teístas respeitar-se e dialogar.