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ISBN 85-7387- 964-5 I I 97885738796 43

Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

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ISBN 85-7387- 964-5

I I 97885738796 4 3

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WWvV .com.br

EDITORES

Joôo

JOé)ü LUlz da Sil'\/a PJrneida

Amílton BUUlO ele Cezar Hober!o BitCL\ ."c

Cesar Flores Cristiano Chaves de Farias Carlos Eduardo Adriano EuçJônio Rosa

J. M. Leoni Lopes de Oliveira José dos Santos Carvalho Filho Manoel Messias Peixinho Marcellus Polastri Lima Marcos Juruena Villela Souto Nelson Rosenvald Paulo de Bessa Antunes Paulo Rangel Ricardo Máximo Gomes Ferraz Sala de Carvalho Victor Gameiro Drummond Társis Nametala Sarlo Jorge

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35

I :1 :1 n ti I

AUGUSTO de Diu'i!o F'Cl1u! c

f'rocllrlli!or do Es!([t!n do Rio de JOlleiru,

Crim iI! il I.

o Crirne e o Criminoso: Entes Políticos

2ª edição

LUMEN JURIS Rio de Janeiro

2007

Page 3: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

2007

Editorial Lumen Jur: teb.

/\ LIVRARIA E EDITORA LUi'vlEN .lUFUS LTDA. ilbde desta obr:1.

l~ proibida a , por meio ou processo, inclusive às características

c/ou editoriais. A violação de direitos autorais Penal, art. 184 e e Lei nQ 6.895,

a busca e e diversas (Lei nº 9.6] 0/98).

Todos os direitos desta reservados il Livraria c Editora Lumcn Juris Ltda.

r mpresso no Brasil Prinfed in Brasil

"Por que é qlle ell me colo

"Como um monge medieval que tivesse passado (I vida inteira no deserto pelejol1do contra o demónio e lim dia

corno a notícia de que o diabo nrlo existe. "

f\FFONSO Rorvl/\NO DE SANT' ANNA

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AUTOR

~ Norma Penal em Branco e Retrocrtil'idade HisíÔriL'() do Di/'c'i!u C'rillli!lu! {:f\'o-Brusiíeiro

- lV/C/fluol de jJara de - Q Advogado de Defeso !l

FICÇÃO:

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Capítulo 1 - A Cifra Negra .......................... , ............................... .

Capítulo 2 - A Inconsistência da Criminologia Tradicional.......... 21

Capítulo 3- A Discriminação da Justiça Penal...... ......... .............. 45

4 O Verdadeiro Conteúdo do Direito Penal Corretivo ...................... .......................... ................. 95

5 - Conclusões .................................. ..... ....................... 127

I _. I 8.149 elo Juiz Verani)........... 141

II- Procuradores Reclamam das Pressões.... ................. ...... 152 m - Superpopulação Prisional ................................... · .... ·.... 156 IV·- O Malogro do Sistema Penitenciário Sueco ............. · .. · 158 V -- Um Caso de Medida de Segurança Detentiva ......... ..... 165 VI -- Pena de Morte, Prisão Cautelar e Cia. Ilimitada .......... 171

Referências Bibliográficas ............. ... ...... .......... ... ...... ...... ............. 175

ix

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"Eu ser esta {ante do que tcr ([qllc{a velho illada soúre tudo, "

E

Raul Seixas

Thompson - Acho que ultimJ.mente minha convlvcncÍa com vocês tem sido intensa. Eu não saberia dizer se nas biritas interminá­veis que tomamos a filosofia é um pretexto pra cachaça ou o inverso. O certo é que vocês epistemologizaram meu botequim.

Rosa - Thompson, não seja mentiroso. Você semprc gostou de cachaça e filosofia. Talvez não estivesse acostumado é com o boteco como um lugar pra gente negar as "certezas científicas", O boteco sempre foi () território da eloqüência fácil, onde se trocam as receitas do senso comum, ou do senso comum teórico, como se as últi­

as grandes verdades da ciência. Kant é que di,scutindo com os percalços de sua pesquisa sobre o júri te perple-xo eom a implosão constante dos conceitos que você supõe con-fiáveis.

Kan! - Pô, eu que não tenho nenhuma para o terror como incendiário ... Vá pra mim, o pensamento

meus - também. cientista antro-

Poderiam, entuo, eom a leal frente ao leitor, sobre livro.

converSH. foi o do consumo dc duas Forestier tinto. Seriam necessélrias mais

xi

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xii

tcm que cwtodevorar··sc, . T,~m que 1111er-mú di () cercam. que há muitas verda-

(k.~. nilp Glbcl1l

p~\rtiuu CLl

S slema. l:u que pra 1111111

dcvorando as semprlê

a mudar é um jurista que a

velhas conv'

d~\s na escola de direito saher" dns tribunais. é um jurista em

"!udila" no campo do direito, também como um

destruir as

tramos no e mOllGlitízar instrumentos

cfosse dominClnte elc, Em seu discurso parece que o é coisa centralizada e de uma elite CJue detém os pri-sócio-económicos. Como se nuo houvesse d eI ou

da classe dominante se o caso é de elites ou de entre as mesmas, resistência dos dominados etc.

r -- É verdade que sou um J em e como eliz o Nelson vai abandonando LI

entrando el11 outros dom sta, Nesta acho que tenho mesmo uma illcli a pensar por OpOS

refletir com mais matizes. Fundamentar certas que anoto. Afinal, isto seria pensar teoricamente de um modo sante, Mas há razões para a forma deste livro. Eu não sou um sociólo-go, um cientista um metodólogo, um de como vocês, Venho certas coisas com voracidade mas, ao mesmo tempo, com cautelas. pra evitar uma incli Inclusive um de í que me deixasse enfastiado, paralisa-do pra intervir sobre o mCl! dia-a-dia, que se passa cm grande na esfera elo !las jurídicas. Eu lenho coisas pra dizer, pra

StlO os criminoso,\'? Crinu! crinri!1(Js(l:~': ('flfc'S xiii

mudar e não vou deix:lr de fazê-lo porque não sou um súbio moderno, E lssÍemais do direito -

Eu que pra outns pessoas, Acho

não estou me avocando urna missão e muito

tlutrd . . t ~ . t l c 'I) ',\[TU-ISSO que ear~\C[enza o eonco: es ru ura- l. ::;-

tórios; j Llstapondo a mais plausível. fvlas a minha é outra, é

, , a especialmente stificar para , JUizes, ,

que fundamenta a e o tratamento ele entIda-

des como o o Cri

E antes que eu me acusam de simplificar

nante, sistema etc.,

I a que. dou ú que llão tenho urna vi são

sempre t'xpressa uma ao K. - Não fui eu quem Calou que você não stra a d~s

dcll1liné\dos. Acho. que há uma a você considerar a clJ-. ". . .\ 1·' 'c . d' rhr VilQem económICa um lllchcador seQuro e l e 111ltlVO no . L; , (

cO;1ta da da ~ e das estratégias de tratamos do Brasil, que uma

estamos dié1l1te de uma sociedade de fundada no

que que de acordo COI11 uma ideologia

. . ld·1 I t d 'os cid'lel'íOS perante a contrato SOCial, que a Igua ac e (e () os. . ~ ( . lei, porque lhes a igualdade perante o merc:ld~), Ol;de todas as

são de conversuo a padrões econoJ11ICos? Penso que

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xiv

em nosso pJís a justiçJ se concebe, se representJ, não como um servÍ-de forma pública e mas como

que assuma os missos" necessúrios, nem sempre de caráter económico. O ideal bur-

da a!dade não se realizaria , nfío só porque essa inexiste por num sistema de e

desde o início CO;110 mas porque nos concebemos e lima sociedade de s, ele e de hierarquias, eIXO

é mas não O processo de aplicaçélo da lei no Brasil nada mais faria, po1'1<,1I1-

to, do que referendar sistematicamente esta desigualdade que entre nós ,i

ica que recobre ;t

nfio ideal é o de "nos locupletarmos todos" ...

R. Pois é, Kant, acho que esse viés analítico é muito significa­tivo. Aqui, não somente a sociedade se divide em explorados e explo­radores, em opressores e oprimidos, mas nós também assimilamos o ideal burguês de igualdade, de forma muito complicada. Quer dizer, os do direito aprendem este ideal na faculdade, na medi­da cm que importam uma cultura jurídica européia. Contudo, confliw com essa ideologia setorial uma macro-ideologia relativa ii totalidade social onde nos percebemos como desiguais, como investidos ou não de certos vilégios. Por aceitamos a lei como emanação de um poder que não é o nosso, que é o poder dos poderosos. ainda, opomos ao ideal europeu de cidadania a representaçélo de uma socie-dade hierarquizada como coisa natural.

T - E vocês acham que não percebo essa O por a mil+ha Lln;ilise sobre a "cifra

ela mostra que há outros e outras normas que não são as ionais do

resolvendo 0:-,

de resolver os

aprendidas na as recitadas direito lhes interessa utilizar LI da

. Esta forma na cifra negra, é,inclusi

Crinle e criminosos: entes xv

R. - Thompson, certamente mais a conversar, , a essas alturas, trouxemos o nossa discussão.

ele agora lendo seu trabalho confira a de nossa refle-xão. Kant e eu que este livro tem uma virtude funcla-

: ele contra o uso dos illsti-e não contra o seu abuso. E se a

ess;1 outro diretor de sistema

penitenciário - você é do Desipc - ou cm escolas de Direito, ou em cursos da OAB, anda dizendo estas coisas'?

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A

A CI

"Então lhe trollxeram os escribas e os fariseus lima 111ul qt!C fura Clll adultério c :1 puscranl no

6. lJiziClIl1 i:,lO os tLntlilHJo () acusar. Porém Jesus abaixando-se, o dedo na terra.

7. E como eles perseveravam em fazer-lhe perguntas, ergueu­se Jesus e disse-lhes: O que de vós outros está sem

o que a 8. E tornando a abaix,tr-se, escrevia na terra. 9. Mas eles ouvindo·o, foram saindo um a um, sendo os

mais velhos os E ficou só Jesus, e a mulher, que estava no me.io, cm

10. Enti'ío ergueu·se Jesus, e disse· lhe: Mulher. onde estão os (!1te te aellSitV:llll') te condenou')

II. ela: Senhor. Enti'ío disse Jcsus: Nem eu tampouco te condenarei. Vai e não peques mais:'

Silo JOcl(), 8, Novo Testamento I

do vcl visualizá-lo como um

em si mesmo, tornou natural c, de pronto, abriu oportu-

I. B SACRADA. Vers:lu de pl'. Antonio Pereira de Figueiredo. São Paulo, AlIléricus, 1950.

1

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nidade para a criação de uma ciência que tivesse por objeto específico

u seu estudo, a minologia.

O novo ramo do conhecimento do delito

como de tudo CJue lhe anda ú

sando a í Daí, em sua aI iSt,lS escreveram,

escrevem e V;)O escrever incontáveis obras, em todas as línguas, , medi classi

icadas fórmulas matemáticas, teo­

rias, , conclusões -- ah, conclusôes em avalanche, ainda que inconsistentes ou contraditórias - tudo envelopado cm atmosfera grave, scca, para UlTlCt

ve rdudei r{f ciêncio, mi nal ch::ntn)

definido conseguiu-se, cm boa medida, barrar seu à lllvasão do interes­se ou da curiosidade daqueles que vivenciam a realidade concreta das infrações penais - isto é, o comum dos mortais - porque havidos como carentes da formação indispensável que lhes autorize a penetra­ção em tão complexa disciplina. Conquistada a prerrogativa de con­templar o crime em "esplêndido Ísolamento",2 os especialistas atribUÍ­ram-se o direito de reservar um espaço de sua exclusiva competência, rejeitadas intromissões indébitas a quem não ostentasse suficiente qualificação p~a merecer o título de criminólogo, Afinal, o templo do sábio-técnico deve cerrar as portas à entrada da ignorância do vulgo, a

quem cabe apenas suportar a catadupa generosa e cachoante do saber científico, que esguicha da boca erudita dos sacerdotes,

tardou a surgir um movimento de rebeldia contra fortale­za assim hermética, puderam os criminólogos gravitar em torno às suas fantasias com desenvoltura e na segurança do proprietário que não teme esbulhos quanto ao terreno cuidadosamente cercado c defendido.

2. CHRISTIE, Nils, Prcfácio do London, Tavíslock Pub" 1968,

. SC({lIdinol'inll SI/Idies iii

sâo os criminosos: Crime e 3

Aliás, a criminologia seguiu, pura e simplesmente, o exemplo da irmã mais velha, Jpsiquíatria,

Talvez passJr, e logo, à dos erros deste engendrJmento, Isso, contudo, estaria ent .kl.i)acor­

do com a forma pela qual se deu o levantamento daqueles S o curso natural das coisas, partindo do dado que se apresen-tou como a ponta de verdade a ser

A pJrtir de meados do nosso século, algumas pesquisas ram evidenciar a existência de discrepância entre o número de cri­mes constantes das estatÍsticüs oficiais e a realidade escondida por trás dele, Observou-se que, embora os índices da ordem formal indiquem existir uma considerável quantidade de infrações, o total dos delitos de fato prat , A reduz.ida minoria das viul cimento A brecha os [rados denominou-se "clÍ' il

expressão que logo se firmou, enquanto ômel10 muito comum.

Para bem compreender a questão, impõe-se lembrar que crimi­noso, em sentido formal, é o indivíduo condenado pela justíça sobretudo se for recolhido à prisão, fazendo jus, dessa maneira, ao rótulo de delinqüente por parte do grupo social. De outro lado, cabe

recordar que, da prática do delito à condenacão do autor indo um pouco adiante, até seu encarceramento) há um obrinatório caminho a , b

ser percorrido, o qual oferece como etapas marcantes as seguintes: a) ser o fato relatado LI polícia; b) se relatado, ser registrado; c) se trado, ser investigado; d) se investigado, gerar um inquérito; se

o inquérito, dar origem a uma denúncia por parte do promo­tor; f) denunciado, redundar em condenação pelo g) se, haven­do condenação e expedido o mandado de prisão, a polí-

cia vamente o executa. Estigmatizada como criminoso a suportar a

conceitos e tratamento diferenciado por elemento

será a pessoa que, além de haver cm abstrato em norma

indicadas e termina confinada numa penitenciária. Se alguém

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viola um escapa de lido pnl' criminoso.

na este

idadns<ls demonstrar que Cll c;\da uma

fascs n.:ferida:.; ocorrc Ullla cntre o Ullivcr:;o dditos

o número dos qUL' a ordem oficial. H~.

P()I descumpasso 110 CIC!!/'{j ( ifra

n:ío ter os dados que ,Ipenas

ínfima la dos crimes a receber npe sendo que destes tão-somente uma minoria leva os autores ao cárce-

lit:lr dd ifra negra.

honestamente através de um exame

em nossa viua: de nós é de assegurar jamais haver come-

tido sequer llm único ilícito até o dia de Lembremos que concorrer de qualquer modo para

sua prúti ca) os ::ttos a arrolados

do de vista ideal: comprar de cuntrabandista uÍs-de levar

sem

suficiente provisão de fundos; de dív cometer adultério;

atestado médico gn sem paralelo, para usar ex mais ; jogar no no

buquemêiquer; sendo funcionário (inclusive juiz e char num dado sentido para atender a pcdido de

e crinlinosos: Cl1rcs 5

assinar lista ele presença à auja por ausente; etc., . etc.

de ern conse seremos cap(u~es ele nos j u inOCC1l1 de todo delito'! pr()va\'l~ll1lcllte - cntre este:s,

dizer, n~ío se encontra o autor ckstas línlus. descritas constitui crime c,

S()S, n a maioria. de nós nunca teve nenhuma fafo delituoso sequer relatado à

o conforto da ci fra ncgra. antos abortos !cVàUOS a c to ao

conhecimento das autoriuades? E fUl'tos em relacionadas com a

lesões freqüência através de entre víti-

mas e ; os roubos (a vítima, por medo ou por julgar uma de prefere não comunicar o fato Zl ; a acidentes de trânsito, e assim por diante'!

a própria polícia conduz o lesado a concorrer para o da cifra negra, já para evitar que as estatísticas demonstrem com toda a crueza a enormidade das práticas o que em dúvida sua em sufocante plctora de casos que a esmaga no

Nem se que escapa ao fenômeno da cifra negra um to como o homicídio. entre parentes

por melO do emprego de veneno ou de ficam no por certidões de óbito inexatas ou des­

por médicos que se basearam em ln de familiares da vítima'?

"Nos Estados e ainda no a de uma

vítima conduziu à de muitas outras que

sido ass,lssinadas uma a lima, enterradas c, aparentemente, nunca dadas como Histórias se com som-bria acerca de corpos encontrados enterrados cm isolados. de homicídios cm massa por empregados ou

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6

guardas de prisão tanto quanto por anarquistas ou por políticos extre­rnistas."3

da mortos,

foram executados pelos Quantas pessoas encontradas

a no sentido de terem natural, quando, cm

Veja-se, a

a de morte

"Uma após outra, oito mulheres idosas, cada qual vivendo sozinha na mesma rua cm Manhattan, foram encontradas mortas durante a e venl0 ele I havia

li duas das s

m morrer, ainda mais duas."4

a alcoolismo. ando Ulll

a lí ltil muI a as havia matado a todas e

Sobretudo ingleses e americanos têm investigado e tentado a mensuração da cifra negra neste primeiro passo (relato à polícia), pro­curando quantificá-la, ao menos, aproximadamente, concentrando as pesquisas nas três pontas do fenômeno mais propícias para tal finali dade. Para isso, realizam inquirições com respeito a grupos, os mais numerosos possíveis da população, indagando, por meio de formulcl- .-/

adequadamente preparados, quantas vezes caela uma das pessoas já praticou (pólo ativo) ou foi vítima (pólo passivo), ou de alguma forma tomou conhecimento (pólo neutro) de delitos que não rarn a ser relatados à polícia. A elos dados élssÍm obtidos com nas oficiais tornou possível a inferência de algumas conclusões que, se ser tomadas como fornecem, de qualquer sorte, uma idéia da extensão do tema.

RADZINOWICZ. Leon Hamilton Lid., 1977. p.

4. Id., p.

CrOl1'11r

sao os cril71l!1(J,I,'()S? Cl'ime e (TI.'11I170\,{.IS. 7

Em Nova Iorque, por exemplo, ocorrem pelo menos duas vezes mais ais do que as que são objeto de relato. Em Filadélfia, cinco. Na Alemanha, em termos de aborto, a é de 500 para um; cm matéria de crimes sexuais, de 10 para um; no que toca a homicídios, entre três ou seis para um; e no caso dos cri­mes contra o património, de oito a lO para cada um. Na Inglaterra, ;1S mais modestas vas indicam que o total dos delitos cados deve ser superior a quatro sendo certo que metade ao conhecimento das autoridades. Em termos de homicídio:

"Algumas estimativas v50 ao ponto de afirmar que somente um homicídio em cclda três ou dos

outras quc a rel

se a ainda mais precário em face pobreza das próprias estatísticas ofi­ciais, resulta difícil dimensionar o espaço escuro onde se abriga a delinqUência n50 relatada. Contudo, valendo-me dos 43 anos que me ligam ao cotidiano criminal, sou levado a concluir que as estimati­vas anteriormente referidas são por demais reduzidas para o panora­ma brasileiro. À minha experiência, somo a intuição de policiais, promotores, juízes, advogados, com dedicação de muitos anos na área da administração da justiça, os quais, por mim consultados, manifestaram a mesma impressão. Creio que, ainda numa previsão

cautelosa, no mínimo dois da globalidade das condutas delituosas de fato adotadas não chegam à ciência da polícia.

Crimes Mas Não Registrados

Por vezes, a notícia de um fato lO da !11 o que

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/

8

deve estar r, e

bera social, possível

razões

duros que for independentemente do

e que lhe ordenam for-mal um procedimento criminal contra o autor de um delho, desde que este, de alguma lhe ao conhecimento,

de uma os COll Í1.os

com o dos jurisdi Mostra-se vi,'ive!, em inúmeros casos, compor os interes­

ses do criminoso e da vítima por meio de um trabalho de persuasão, de apelo à mútua compreensão, de desarmamento dos espíritos; por que desprezar essa via para obedecer cegamente ao texto frio das

registrando o fato, expondo o agente ativo aos riscos de um processo criminal e cortando, praticamente, a possibilidade de o sujeito passivo ter seu prejuízo indenizado? (A lei penal empresta nenhum valor - de fato, apesar de sua retórica não admitir isso com franqueza - ao ressarcimento do dano, de maneira que se tiver de enfrentar uma acusação já formalizada o criminoso se recusará a reparar a lesão causada, pois que a providência em nada melhorará sua posição.)

Ademais, a existência do registro vai determinar, necessariamen­te, uma série de atividades por parte dos servidores da polícia; evitá­lo, pois, representa economia de trabalho e de gastos - meta de abso­luta prioridade numa delegacia policial, sempre assoberbada com quase insuportável quantidade de casos,

Lesões corporais entre parentes (sobretudo marido e mulher, pais e filhos, amigos ou colegas), mero uso de tóxicos, furtos em super-mercados, crimes contra o património de forma etc., embora levados à mesa da autoridade de dia, e embora consubsc

slio os cril1únosos? CriJJ7e

tanciem verdadeiramente delitos negra, por falta de

Neste passo, por

implica a cri

exame

resvalam para a cifra

opera gozam de tanta ou

absolutórias. efeito, a o criminoso da trilha Cc única via) capaz de conduzi-lo à da Naturalmente, como em todo e qualquer julgamento, o episódio e o autor são encara-dos da subjetiva do julgador, que os por meio cÍl;

a

crim oculta.

Importante motivação a engrossar a hipótese, encontramo-Ia no espírito de corpo dos membros da instituição policial. Quem traba:ha no ramo sabe que, a qualquer momento, pode encontrar-se env.olvld.o em evento no qual se veja apontado como infrator de algum dISpOSI­tivo penal. Semelhante expectativa é inerente à profissão. Como a própria polícia apura os delitos atribuídos a policiais, compreende-se que tal circunstância crie uma atitude de protecionismo dos colegas que atuam como autoridade repressora relativamente aos colegas que são acusados, uma vez que as posições, num amanhã próximo e pro­vável, poderão estar invertidas. Vigora, então, uma forte coesão fun­cionai, sendo considerados aqueles que recusam endossá-la como maus companheiros, traidores da classe, indignos de pertencer a seus quadros, condenados a viver em ostracismo e, até, em regime de pe!'­seguição. Ora, a maneira mais expedita de inviabiliza~'-s~ a pumçao do autor de um delito é de registrar o fato cnmll1Oso. Uma forma atenuada, ou habilidosa, largamente de executar a manobra consiste em:

"Instaurar sindicância administrativa sumária e ~vo~ar.o inquérito para a Corregedoria de Polícia são as pn~clpals providências que a polícia toma para investigar cnmes e

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10

arbitrariedades em que figuram policiais como autores ou envolvidos. "6

Em vez do no I ele a-se para uma disci inar, que correrá no âmbito interno da Secretaria de

Segurança, obviada assim a submissão do problema à do Mi o Público e do Juiz.

xam de ser de vanta-gens, dinheiro) e de prevaricação (atendimento a de pessoas poderosas, chefes, colegas, amigos, protetares e por aí afora).

o mero do evento um mCI-

piente no rumo de sua exposição ao claro. Se a ele faltar a conseqüên­cÍa de uma investigação com êxito, o fato que mereceu um lampejo de luz retroage à escuridão. Com enorme incidência, verifica-se a ausên­cia de qualquer investigação com respeito a delitos que foram objeto de registro. Este é o caso de absoluta predominância no concernente aos crimes contra o patrimônio. Já por causa do elevadíssimo número em que ocorrem, já parque em geral fornecem diminutos elementos a permitir um simples vislumbre de elucidação, tendem a jazer esqueci­dos no mofo dos livros de ocorrências. Quem já foi vítima de furto ou de roubo - de automóvel, de valores que possuía na casa assaltada, de bens partados na condução ou na rua - sabe que, mesmo ficando em cÍma dos funci a fornecer apoio, meios, gratificações etc., dificilmente a real de uma investigação sistemática, cui-dadosa, ou mesmo interessada. A maioria das pessoas, por tomar conhecimento de tal circunstância, desanima de sequer tentar provo­car algum nos deteti ves formalmente encarregados no caso, o qual só será por pura questão de sorte.

6. SILVA, J. Paulo da & BRAGA. Ronaldo . .Ioma! do Brasil, Rio de Janeiro, 198 I. 12 cad., p. 22.

selo os crinlinosos? CriUie e crinllnosos: entes

Embora o problema seja mundial, dificilmente se encontram dados elucidativos a a título de exemplo aleatório, para o quadro a

TIPO ou INCIDENTE

Homicídio

Suicídio

rncêndio doloso Furto de automóvel Lesão corporal grave Roubo Estelionato Crimes sexuais graves Lesões corporais leves Furto não-residencial Cadáveres encontrados Furto em residência Furto simples Vandalismo Perda de coisas

Todos os tipos juntos

Fonte: Cidade de Kansas - maio/novembro de 1

PORCENTAGEM

100

70,4 65,5 64,4 62,6 59,6 59 41,8 36,3 35,7 30,0 18,4 6,8 0,9

7. Apud CHAIKEN, Jan M ; GREENWOOD, Peter W. & PETERSILIA, Joan. Criminology Review Yearbook. 1 :711-41, 1979. . ,

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motivaram Se crimes a ser relata-

e, que certamente muitas das não obtêm sucesso, fica fácil avaliar a

que ostenta o mundo da criminalidade oficial relativamente ao universo da

Crimes

de Processo Penal polícia a possibilidade de arquivar autos de inquérito. Naquela época, pois, a faixa de acomodação viável de ser conseguida na delegacia estreitava-se entre a ciência do fato e seu registro.

Depois, com força irresistível, surgiu uma prática que, como ver­dadeiro direito costumeiro, veio a suplantar e revogar a norma escrita. Por ela, tornou-se possível à polícia deixar de instaurar inquérito com referência a fatos delituosos, mesmo que tenham sido objeto de relato, registro e investigação. Abriu-se, pois, à revelia do.--Código, uma opor­tunidade a mais de perda entre a globalidade dos crimes efetivamente perpetrados e aqueles a serem iluminados pelo facho das estatísticas oficiais. Conhece-se o uso ern causa pelos nomes de acaute!wnento ou arquivamento de sindicâncias. Verifica-se ocorrer, aqui, mais uma hipótese de transferência para a polícia do julgamento da causa, espé­cie de delegação manifestamente contrária a toda a sistemática de nossa legislação. até, com a atribuição de um poder mais discricio­nário ao delegado do que aquele conferido a promotores e juízes, uma vez que se dispensam maiores formalidades na citada solução, inclusi­ve no relativo à motivação justificadora da medida. Reiteradas vezes, o despacho terminativo do feito restringe-se a um lacônico e imotiva­do "Acautele-se", de sorte que ao delegado se poupa o trabalho incô­modo de armar uma convincente süstentação em amparo ao decidido,

silo os' crilninosos? CriJl1e e crinú!1()so,s': entes

coisa a que estão obrigados os membros do Poder Judiciário

A moda para o escuro.

vazadouro de do claro

Para comprovar a acaso fosse insuficiente o testcmu­nbo de bastaria lembrar um

vendo-se frustrada em na busca de melhoria de vencimentos, que chamou de . se não () aumento reívindica-

seriam instaurados inquéritos para todos os eventos objeto de registro, ou seja, obedecendo literalmente à determinação da lei, aban-donaria o aos aeautelamenlos. Atender a e1 a sol

os por obedecerem à (ou olhando de outro por recusarem a agir fora da lei). De outro lado, caso nascessem inquéritos de todos os registros, o judiciário estaria afogado em uma semana, mortalmente paralisado, sem sequer espaço físico para amontoar a ava­lanche de papel que para lá jorraria das delegacias.

Na base do arquivamento de sindicâncias predomina, com inci­dência largamente superior, a corrupção e a prevaricação, embora, por vezes, expresse o sincero convencimento de que, naquela hipótese específica, inexistiu um verdadeiro delito ou, mais freqUentemente, que o indiciado refoge ao estereótipo de um típico criminoso, fazendo jus, dessa maneira, a um ato de complacência e compreensão.

Novidade mais recente que os acautelamentos, os autos de resis­tência contribuem para o incremento da cifra negra, suprindo-a de um contingente de delitos graves, perpetrados por policiais. Emprega-se o expediente como fórmula de suprimir ao exame do Judiciário homicí­dios e lesões corporais praticados pelos agentes da ordem pública quando matam OLl ferem supostos meliantes no exercício (também presumido) da atividade repressiva. Em episódios dessa na~ureza, a autoridade de plantão limita-se a lavrar um termo no qual regIstra que o sujeito ativo da infração agiu em estado de legítima defes.a, c(~n:e­de-lhe liberdade e procede à confecção de um simulacro de lI1~uento, no qual se limita a tomar as declarações dos policiais envolvldos~no

Page 16: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

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caso. Obviamente, apenas uma única versão fica consicrnada no feito b ,

exatamente a que favorece a posição do agressor Oll dos agressores. algum outro magistrado levanta a voz para demonstrar a ile-

galidade do procedimento em pauta, a judiciária ollvi-moucos, preferindo encarar a questão numa perspectiva pragmáti­

ca, e se acomodar com a solução quc simplifica e facilita as coisas. para o exemplo concreto no APÊNDICE 1.

se os policiais cobram de maneira tão exaltada o direito de dispor da vida jurisdicionados, a recusa a tal prerrogativa por

dos promotores e juízes poderia gerar um estremecimento nos laços que ligam as respectivas instituições, algo que se considera muito prejudicial ao bom funcionamento da máquina repressora como um todo. O que o sistema deseja é vê-las agir em perfeita harmonia e entrosamento. a a, "a a

do de bí Jorge Elefante i estourada na mesma hora em que o Secretário de Segurança, general Waldyr Muniz, e o comandante da PM, coronel Nilton Cerqueira, acabavam de almoçar no 12º BPM, em Níterói, eom 27 delegados do interior, 13 comandantes de quartéis da PM, sete juízes e dois promotores, convocados para a reunião a fim de 'sanar qualquer divergência entre a PM, a Polícia Civil e a Justiça. '

........................................................................................................

Na reunião, Nilton Cerqueira disse que a PM desenvolve um trabalho 'em defesa dos direitos humanos e cristãos'. 'A união faz a força', disse o general Muniz."8

Crimes Cujos Inquéritos São Arquivados pelo Ministério Público

Muitos dos inquéritos instaurados terminam sem que a polícia logre elucidar a autoria dos crimes em apuração, sendo, nesse caso,

8. O Rio de 27 jan. 1982, p. 11.

S{{O os' cril71inos{).f;: CriJne e cr;',11iI10,I,'OS:

l'emetidos a Juízo sem a indicação do culpado. Em tais hipóteses, outra alternativa falta ao Promotor senão a de pedir o arquivamento do feito. I-louve o delito, disso há certeza; porém, por falta de tos, torna-se inviável processar - e, condenar - o crimino-so, o qual, fica oculto à sombra da cifra negra.

Outras razões, como veremos adiante, podem levar o Promotor ~l

renúncia quanto a movimentar uma penal contra alguém. Por ora, contudo, chamar a para o já referido: delitos de existência comprovada, mas autores, não ter sido levan-tada a autoria, não são considerados criminosos ordem formal, ficando de fora das estatísticas oficiais. É que o dado a seguir forneci­do desacredita a alegação, por vezes sustentada pelos defensores da criminologia tradicional, de que a cifra negra só mostra relevância

a de mínima a, sendo ele delitos graves, como, por

lUdo o mais vimos sustenbndo fosse a desrazüo do a só do ria tal efeito:

o para (lémonstrar

detclmina-

"O Departamento de Polícia Especializada (DPE) admitiu ontem que existem atualmente cinco mil inquéritos de crimes de morte san solução, todos a cargo da Delegacia de Homicídios. Esta estatística - apontando uma média de um mil homicídios por ano foi feita considerando apenas os anos que se seguiram à fusão dos antigos Estado do Rio e Guanabara .

Estes números constam do relatório sobre as atividades da Delegacia de Homicídios durante o ano que passou, encami­nhado pelo delegado Arnaldo Campana ao diretor do DPE, que remeteu ao Secretário de Segurança, general Edmundo Mllrge1. 9

Somente entre 1975 e 1980, alguns milhares de assassinos engordaram as hostes da cifra negra. Como, no mesmo período, as

por homi não a casa das centenas,

9. O GLOBO, Rio de Janeiro, 15 ago. 1980, p. ! 2.

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torna-se crimes relativamente às como é o caso do mais enfaticamente

separa o universo dos num dei

merecem as real

formal assim pela ordem

à penitenciária),

na elos que identificados que servem ínfima da totalidade?

Além dos processos em que o próprio de um culpado hipótese em que se vê

Iram pUf . r de uma e outro de acentuada no tante ú

aquilatação do valor probante dos elementos carreados aos autos. Por isso mesmo, ainda quando a polícia dá o caso por resolvido, conside­rando haver descoberto a autoria do crime, ao promotor ocorre pedir o arquivamento do feito, por lhe parecer serem os indícios reunidos insu­ficientes para gerar sequer um princípio de convicção.

Percebemos aqui que também ao promotor se faculta uma oportunidade de julgamento do caso, uma vez que decidir aquilo a ser considerado como indícios s~~ficientes ou insuficientes exige uma consideração valorativa sobre o conteúdo do processo. Como em todo o julgamento, a matéria será enfocada através do subjeti­vismo de quem a examina, uma vez que inexiste a possibilidade de alguém adotar uma posição inteiramente desinteressada frente a qualquer problema relativo à espécie humana. Por outro lado, em área tão fluida como essa, inexiste fórmula apta a limitar de manei­ra rígida e exclusiva os verdadeiros motivos aceitáveis no sentido de autorizar a solução do arquivamento. Necessariamente, espaço para a manifestação da atividade discricionária quem vai decidir a matéria.

Como conseqüência, embora sustentando a posição por meio de um discurso dissimulador, muitas vezes o promotor reqller o arquiva­mento por entender que o apontado autor não um verda-

17

cieiro ainda que do e de ser o indiciado seu

Tudo isso de fato concretizados e os aparecem na claridade da ordem

formal - para cOnlradizer a realidade do r

Na ondc há

acerca da conveniência da

do !''lIi!li Poder

no concernente ao

a denúncia. recursos nesse e se resolvem no àmbito interno da instituição.

manipulação dessa faixa de poder, como sempre acontece fora dos

lei, influenciando-se o

m, são se busca aliviar a sobrecar-ga de serviço das Varas Criminais, ou porque o promotor discorda da criminalização de certos fatos, ou porque se apieda de alguns acusa­dos, ou porque, naquele dia, se reconciliou com a namorada e deseja expressar sua satisfação por meio de uma atitude de magnanimidade, ou por mil outros motivos que nada têm a ver com a efetiva existência de um delito praticado por uma pessoa perfeitamente identificada.

O que, de resto, não representa nada novo no front ocidental: ./

"Noventa e nove de cada 100 pessoas detidas por acusação de delítos graves, na maior cidade da nação (Nova Iorque), jamais vão para uma prisão estadual e mais de 80 não são sequer denunciadas como criminosas."lo

Claro, também a corrupção e os pedidos e ordens podem intluir no ânimo do promotor para conduzi-lo à decisão entre o arquivamento e a denúncia - embora a primeira causa seja infreqUente (o pape! do

corrupto, o sistema designou a polícia para desempenhá-lo).

10. THE NEW YORK TIMES, aplld Tlle Atlanta Journal, Georgia, USA, 5 jan. 1981, p.9A.

! i

,.l 'j

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18

Quanto à ÍndícÍo de seu alcance na

CriU1eS que em

Instaur,lda a

"Tudo

são absolver."

o processo terá de pros-terminativa do Juiz. Às demolls-

em sentido

a crer que houve o cnme e o acusado é seu aquela certeza

capaz de uma por que me na contingência de

muitas vezes esconde tal fórmula o verdadeiro motivo que levou o Juiz a livrar o réu de uma pena, sendo tão­somente. como a mais e cómoda maneira de

Àtrás do biombo, podem estar o de a.

sistência das afirmativas da criminologia positivista, a qual se alimen­ta quase que exclusivamente de pesquisas realizadas sobre os mem­bros das populações prisionais. Àdiante, atrevo-me a pensar. ~ .

Condenado o réu a urna pena Juiz expede uma ordem (mandado de que efetue a captura do condenado.

de que nào surs'is, o determinando à polícia

. Pois .bem, existem no país mais de mil mandados por cum-pnr. ConsIderando que contamos com cerca de 120 mil encarcerados, constata-se haver muito mais condenados soltos do que dentro das p~ni.tenciárias, ou ainda: a população prisional representa uma parcela d1l1l1nuta no que concerne aos criminosos assim etiquetados pela ordem formal, os quais, por seu turno, configuram reduzido número da cri rní total.

Àlgumas evidentes conseqüências decorrem da existência da cifra negra, como anota, por exemplo, Sir Leon Radznowicz: II a) representa a substância do crime, enquanto as estatísticas oficiais são tão-somente sua sombra; b) torna extremamente difícil descobrir os verdadeiros caminhos e composição da criminalidade; c) restrin­g~ e distorce nosso conhecimento a respeito dos criminosos; d) as atItudes d~sociedade com relação ao crime e à punição são inevita­velmente irrealistas; ,e) impõe-se como o maior fator no enfraqueci­mento de qualquer efeito intimidativo que a punição ou o tratamento dos criminosos pudesse ter; f) provavelmente, o sistema não tem o menor interesse em tentar diminuir a cifra pois a polícia, os promotores, o Judiciário e os estabelecimentos prisionais sucumbi­~'iam se tivessem que lidar com todos os que, realmente, praticam mfrações penais.

Também a ONU já afirmou que os estudos acerca da crimínaJi-dade oculta em xeque as tradicionais relativas ao problema da delinqUência. Estas doses de

! ! . 0v cit., pp, 52-4.

Page 19: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

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de modo a demonstrar que toda l~(ILL!" de e

Capitulo II

A CRIMINOLOGIA

TRADICIONAL

"O conhecillli'nto r('!l{ç'{{.')1 tl.\'sinlÍ!u os' coj,,>'{f,\'

I1cn/llurt de perdae/c. (f

i,\'so, o conhecilllento SenljJre lilll de.'lconhe-cimento. Por outro !ado, é sel!Jpre que visa, nwfdosa, insidiosa e ag.ressÊvCl/l1ente,

indiv(duos, coisas, situaç6es. "

Michel Foucault l

Três postulados seguram todo o edifício da construção crimino­lógico-positivista: l. O crime é um fenômeno naturaL O estudo do crime deve ser realizado através do mesmo processo de conhecimento usado para as ciências naturais. 3. Pela observação e pesquisa dos minosos, assim identificados oficialmente, é possível desvendar as causas do crime e extirpá-las da sociedade.

Submetidas a uma crítica que prescinde de maior profundidade, tais afirmações se esboroam, deixando à mostra o miolo nelas conti­do: um saber promovido pelo poder dominante, permeado de conteú­do político. Tratemos de examiná-las, olhando-as pelo avesso.

l. CADERNOS DA PUe. A verdade e as fórmas jurídicas. Rio de Janeiro, 1978, p. 19.

21

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o Crime Não é um Fenômeno Natural

para posicií).tHlf o crime corno ci em reconhecer-lhe a natura!", isto é, que vel como. um ser em si mesmo.

vistas a tal mister, impunha-se recusar o na fase do Direito Penal de acordo com o qual, na elegante sentença do scu mais completo e coerente mestre, Francesco Carrara: "O crime é um ente jurídico." Aceitar a concepção deli­to como alguma coisa dependente da legislação importaria em empurrá-lo para o mundo das normas, e este, obviamente, constitui regaço uado para aninhar uma natural. Dentro da

a onde nasceu a crim as

ou tra.

CGmo incomu ma deJas com

por

O objeto da ciência positiva tem que ser, de modo estável, defi­nido, absoluto. Ora, a definição das infrações pelos preceitos legais caracteriza-se pela fluidez, pela mutabilidade, pela extraordinária variação em função de sua colocação em termos de tempo/espaço. Agir de uma certa maneira pode ser crime hoje e aqui, mas pode ser lícito hoje lá ou tê-lo sido aqui ontem ou vir a sê-lo aqui. amanhã. Como observou um autor: "Uma criminalidade que é regulada em parte pela cronologia, em parte pela longitude, não se presta facilmen­te para uma discussão científica."2

A rigor, se por cientifica queremos dizer cientifica-natural, não se presta de jeito nenhum.

Somente conceituando o crime em total independência quanto leis é que se poderia elegê-lo como objeto próprio de uma disciplina ex ata.

No de atender a esse pressuposto incontáveis tentati-vas foram feitas, e continuam a sê-lo, na busca de apresentar lima

de delito.

2. ELLIS, Havelock. The Criminal. Londres, $. cd., 19 J 4. p. 2.

os crinzinosos? Crirlle e Cri!11ino:üJs: ente};

muito talento, resmas de papel e de tinta do em causa. Desde

dos

uma profusão cada crimi que se

preza adota no que concerne ao O fato indiscu­tível é ínexistir a mais longínqua ou remota esperança de consenso a

o que parece comprovar a presença de

l:m fico i para cevar experirnentaI. Nesse passo, os psicólogos obtiveram mais sucesso, ou foram mais o elemento metafísico "alma" na de

tude dessa

dela descartar

em o contas,

normativa. que tira da iI idéia de

lei que só em vir­lado

i.

Trau. B Silveira. Süo

Page 21: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

24

outros, cuja criminalidade é criminosos em todos os

resultariam

que se possa chamar atribuído por uma lei "6

U<"-,LlIJ':L{A;;' de superar o relativo à conceituação do crime como "fenômeno natural", a maior parte dos criminólogos adota impassível postura: concorda quanto a estar num beco sem saída, con­forma-se, elimina das cogitações qualquer preocupação relativamente ao ponto, mas persiste com afinco na tarefa de trabalhar no edifício da criminologia positivista - que flutua no éter, à falta de alicerces.

Assim, criminologiza-se numa espécie de colorido balão solto no espaço, carente de vínculos que o liguem ao chão da realidade.

.Quadro singular o da criminologia: ciência natural que não dis­põe de um objeto de estudo precisamente definido.

o Estudo do Crime Pode Ser Realizado Através do Mesmo Processo de Conhecimento

Usado as Ciências Naturais

do das tentativas de conformar o crime à condi-de fenómeno natural, nem por um instante ocorreu qualquer vaci-

6. BRUNO, AníhaL Direito Penal. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, s,d. tomo I, 'p. 269.

sua

slio os crhnillOSOS? CriJne e critninosos: entes 001.1111"']\' 25

com referência à escolha científica:

"Uma sol ciências naturais mcnto da

das do :~;tatlls ele objetos

a serem na

método das sob o argu-

o avanço obtido na química, física, astronomia, biologia encheu o homem

para a buscasse usar o mesmo conduto no concernente ao novo campo que se abria, aquele em que o principal objeto de estudo era o próprio homem, enquanto ser político. A assimilação deu-se de forma tão decidida que se projetou, até mesmo, na nomenclatura escolhida: v.g., à sociologia apelidou-se defísica social.

Não parece difícil, porém, apontar o erro básico que macula tal postura.

Quanto ciências naturais, o homem assume a posição de sujei-to e a matéria de seu interesse oferece-se corno objeto, algo à sua frente, autónoma com respeito ao investigador. (Advirta-se estarmos procurando simplificar a explanação, pois, em verdade, em nenhum domínio do conhecimento se identificará alguma coisa que seja intei­ramente objeto relativamente a um homem sujeito: ambos estão no mesmo mundo e, de alguma forma, interagem).8 No caso das ciências sociais, torna-se evidente a impossibilidade de realizar a cisão sujeito x objeto, haja vista estar o homem, de forma principal, nos dois pólos

7, SANTOS, Juarez Cirino dos. A da Rio de Janeiro, Forense, 1979, p. 16.

8, A da nm,b""A'''' María Alice Máximo, coIbida oralmente.

Page 22: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

26

da relação. "O homem é, a um só tempo, sujeito e objeto das relações . ,')

m

humana são funde com o

di sociedade." I o

desenvolvimento c trL1nsfor-em que se desdobra a ex istência

S, um que se con-cito que o conhece: não a ser

ela natureza e as ciências da

Com efeito, o sucesso do método ou positivo medularmente, da neutralidade e desinteresse por parte do sujeito

cln elo estu-c

vel encontrar neutralidade por parte do cientista enquanto trabalha no terreno das ciências humanas?

"A questão da neutralidade do conhecimento científico (produto de um instrumental técnico, neutro), ou de sua objetívi­dade (relativa a dados objetivamente verificados), depende, por­tanto, da imparcialidade de um sujeito que como parte de s~u próprio objetó." II

"A questão, agora, é esta: corno é possível a imparcialidade do sujeito, se este, como sujeito, é, também, do objeto investigado?" 12

o cientista está encarnado num homem, situado numa dada na qual ocupa um determinado lugar específico em

aos outros indivíduos, com se relacionando politicamente, vincu-

9, SANTOS, Juarez Cirino dos. 10. Id., íb. I I. leL 1. 12.ld.,

p. I

.v{ío os criJlÚnOS05'! Cri/11e c cri"ú!losos: enTes

lado a grupos que se formam em funçã,o da distribuição inigualitária da da propriedade, do status, das recompensas etc .

ser - ou, para usar s elucidativa, ser político - é-lhe impossível toda essa gama de

a ponto de o meio a que como alguma coisa que não lhe diz e, forma, observá-lo com a distância necessária para fazê-lo um objeto alienado de seus interesses: "... como se uma ameba saltasse da làmi-na de um para o visor, c do visor para a lâmina, tentando observar a si própria".13 Só na mais das será viáVtl conceber alguém capaz de enxergar o grupo humano sem fazê-lo atra­vés da intermediação de representações de valor, as quais estarão meadas da influência da posição do sujeito no que concerne ao confli­to de entre as chtsses Em suma, na h;i um

resultado grupos ante adas qu ainda que se pretenda cientista, sofrerá a influência do oeu relativamente ao jogo do poder, quando procurar refletir sobre a reali-dade na qual está imersa. .

Importante papel desempenha, na construção das ciências sociais de cunho positivista, a ideologia adotada pelas classes superiores. Esse "conjünto de idéias, crenças e princípios, mais ou menos sincera­mente professados, mas que não correspondem aos I apresen­tado como fruto da atividade espiritual, mas, em verdade, decorrente da ligação do espírito humano a rnúltiplas formas e pressuposições materiais e, sobretudo, leva pessoas do grupo dominante a impor como verdadeiro aquilo que ajuda à continuidade do status quo social e, à manutenção de suas e Anexar o atributo "científico" à importa em a sobremaneira, inclusive de um que a torna indene aos de todos os do título de - a

13. GOLDTHORPE, .1.E. c Social. Trad. Cabral.

Rio. Zahar, I pp,31 LT L 14. CUV1LLIER, Armam!. \'ocoblllârio do, Tl~(1. 010 .

de 01 íveira e J, g, Damasceno Penna. São Paulo, NacIOnal, 1961, p. 7 f.

Page 23: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

28

dor dos elementos de

ser de re,lcionári o.

da ciél1cizl, ou a sociais, nas socied

conheci-

articu

diz Foucault: "O ítico não está ausente do saber; ele é (ramado com o saber."1

Penso que ficarão stradas as afirmações alinhadas, não apenas por forç:a do tópico seguinte, mas, especialmente, quando cui-

da concernente ao caráter di da criminal.

Na medida em que quanto a definir e ficar o eto da disci ma - o crime como natural _. a crimi-

nologia renunciou a el como o ponto básico ele suas investi-

IS. Juarcz Cirino dos, 0/). cito p, 25, 16. FOUCi\ULT, Michel. Vigiar e jJllnir. Trad.

Vozes. 1977. p, ~2, M. PUl1dG Vassalo, is.

StlO os crilJlinos{;s? Crinlf? e crinúnoso.y: entes 29

a H lassirica-(p!e recusava revestir ;\ concreticidade

para se lhe reconbt:cer a ljllalidadc de o de uma ciCncía V;l.

obstáculo. manobra no sentido ele altCl'm !la subs-

Sé: l1l fazc-l () fOlTnél decl;1rada em lU b.:órico e verbal, o conteúdo da C!'Im!

Certo de que sem material para a de um trabalho de laboratório ficmia difícil o novu ramo elo conhl2cilllcnto com ,)S

louros da de "ciência", o por baixo da mesa, de sorte a oferecer coisa utilizóvel

na pe"sqllis~1

resumida: a doença é um mal, realizando-se muitas das suas illvesti­gações sobre o corpo do doente; o crime é um mal, logo, por anal possível seria investigá-lo por meio do corpo dos seus portadores, os

, criminosos. O achado era, como o comprova todo o or [-

mento da criminologia, de alcance extraordinário. Criminoso é um homem, e homem é algo concreto, real, existente no mundo

descritível, classificável, . Contando com um

com a entidade delito, inada a o de objeto de uma clcncia

Claro, desnecessário seria eliminar ostensivamente da nova objeto "crime". mas seria considerado como um ser de

ao e. por via deste último. se faria a naturalística daquele.

Eis a verdade: a criminologia positivista, o fato mediante uma retórica sofisticada e tomou para seu o criminoso, com o que, se livrou de enfrentar a difi-culdade ele transformar um ente político o crime -- em ser natural.

dev o problema permane-é quem pratica um ilícito penal, somente sabendo-

Page 24: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

30

se o que é crime seria possível reconhecer em alguém a qualidade de

nesses termos, voltaríamos à estaca zero. verdadeiro modelo de

entretecido dc conteúdo

o beco sem saída em encalhada a se as coisas colocadas ele franca:

O que é em sentido isto é, não-normativo ou - Não sabemos. - E quem é crimi - É quem pratica crime.

as não SabClTlU'-) u que é crime. o recemhecimento

romper a das barreiras que, ele uutro qualquer saída para a aventura do novo ramo do

conhecimento. A ideologia, fazendo as vezes de Sócrates nos diálogos de Platão, guiou os cientistas à tranqüilidade do porto em que deseja­vam atracar, usando uma lógica aparentemente razoável:

Ideologia - Que é crime, cm sentido concreto? - Não sabemos. Por mostra-se impossível

tomá-lo como objeto de uma ciência natural. Ideologia - não é crime o ato praticado pelo criminoso?

- Sim, corresponde à verdade. criminoso não é real?

- De fato, não há como negá-lo: são homens e,

o criminoso pode servir de objeto a uma cia natural.

- Mas como encontraremos o criminoso, para exa-miná-lo cientificamente, se o que crime?

Tal desconhecimento não que se encontre o Já ficou assentado que

ao crime, não é verdade?

31

então prossigamos, meus Se eu lhes pedir que me mostrem um me CO!1-

-- A uma

ica.

se nós queremos encontrar o aonde

é lá que os criminosos estão recolhidos. Ideologia Como vêem, vocês já conheciam a resposta correta,

. üs vezes ocorrem no sistema Ideologia Não contesto tais possibilidades. Trata-se, porém, de

hipóteses raras e a ciência deve desprezar as exceções na sistemati­

zação do seu saber. E aí os criminólogos, de Lobroso, Ferri, Garofalo até os mais

modernos e enciclopédicos autores, docemente convencidos por tal alaaravia que se alimenta tão apenas do senso comum, avançaram sobre as ~opulações prisionais, ou, na melhor das hipóteses, sobre os

/ indivíduos oficialmente designados como criminosos, para, em fun­da análise a que os submeteram, construírem sedutoras e brilhan-

tes teorias científico-criminológicas. Na medida em que a ciência, por meio da conspicuidade dos

abonou cientificamente o reconhecimento do o de cri-formal rotula como

Page 25: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

32

/\ cirra a nu, defi!li í i vo, tI ma anteriormente r,~;gi ao

para se resguarda da análise,

positi vamente . Talvez um

". recebe-a com entusiasmo casa ü perfeição com a por ela

vl'rcla ~

ti a lei

cnCOI1-

em clcs-

ao lodo -por escondida no

pode ser mais ilustrativo

bas i 11 ~l le'()rJ' ,'I elc} C011tl','\10 S'l')C J' ;II', ( j . c., . coe as as pessoas são Iguais perante a lei; por

é algo mau em si, soas. más; daí, nada mais do que mall! festação típica das

concluir que o cnme é urna

ernpresta sua la ao asserto cm

os crinllnosos~? C/filIe' c crinli!l()5;oS:

os

CUl1l0 Cil:;klo

quc a maioria dos prc:;os única conclusão ~1

característico do enCi\['cerUIl1C!HO.

p;tr:l c:;tudo

o criminoso constrói-se pela

33

o normativo) operadas pelo atuar discrimina-criminal.

Muito pior a emenda que o soneto. Sem embargo a llloslTOll~SC fecunda, dando a

extremamente úteis para o político. Vejamos isso. O direito criminal enraizado na idéia do contrato

búsico desse de

to caberia uma única pena, todo estranhas as características

Beccaria amava tais

leis executadas ú cuJar exalamente os inconvenientes de uma

aI teria de

) 7 BECCARIA. de, nos deli/o" (' dus jJeI70S, Trac!. Paulo M, Oliveira. s. 1" Ec!. de Ouro, 1965, p. 35,

Page 26: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

34

" ... o se mede pelo causado à e não sensibilidade do "18

Ao margem de d na leis:

"A mcira que leis fixar as penas ele cada delito e que () direito de fazer as

s não residir senão na do , qUt;;

toda a sociedade por um contrato social. 19

"Resulta, ai dos precedente-mente, que os juízes dos crimes não podem ter o direito de

as leis penais, a razão mesma de que não são

SL~ () for um raciocínio a mais, ou se o fizer por conta própria, tudo se torna incerto e obscuro. "21

"Quando as leis forem fixas e literais, quando só confia­rem ao magistrado a missão de examinar os atos dos cidadãos, para decidir se tais atos são conformes ou contrários à lei escri ta ... ,,22

Dentro de um regime natureza, a diversificação da aplica-: ção da justiça em função do status do criminoso acarretava embára­ços, problemas, o risco de evidenciar de forma ostensiva que as eventuais inequanimidades praticadas resultavam aluar dis­criminatório do aparelho repressor.

Obviamente, os donos do poder jamais tiveram a inten-ção de se ver feridos por suas armas. Afina] de contas:

i8. Id., p. 37. 19. Id .. p. 20. Id., p. 39.

1 Id., p. 40 22. Id., p. 140

selo os critnil1osos? Critne e crinúnosos: entes

"Um sistema penal deve ser mento para r diferencialmente

como um Ínstru­idades, não para

a todas. "23

, seri conciliar o discurso fi iluminismo com os fins pragmáticos a serem extraídos da

, sem colocar em demasiada evidência sua interessa-damentc di

Subordinada a lei a um lS1110 inelástico no que concerne ao tratamento Li todas as pessoas, o atuar

a deixaria a descoberto diante dos olhos do Como solucionar o impasse? Aí troou a voz da ciência. Como vimos, em virtude da inconsistência de sua

para

da

va

o quadro de dificuldades nesta existente, maleabilizando a amarração das sanções a cada ação proibida.

Transpirando autoridade, posto que ornada do título subli-me de ciência, a criminol sentiu-se suficientemente forte para invadir o campo do direito penal.

Houve resistência por parte dos juristas (Escola Clássica). uma vez que as soluções propugnadas pelos invasores (Escola Positivista) pareciam incompatíveis com os pressupostos onde partiam

. os princípios do direito penal do social. encontrando uma de compromisso através da qual se as duas

melhor seria conseguem conviver enquanto

ser mais absurdo que da reserva com o da

23. FOUCAULT, Michcl. op. cit. p. 82.

to, há evidentes e de

Page 27: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

36

D~lS penas retrihutivas com CU]]] elcrnel1(os !iornl,\tivos na

l1l',mo III cc éll1 i ÍSla ~- i'undamc!1to tlV1Stc\ com u li

cIsmo O caSLllllcnt" foi n~:di/~HJo :. 111:1S vIngou

porque alUui1cnt~~ CUl1clonal

i\ cnmmoso ares de sabichona recebc pronto e ver à parceira, prestigiando-lhe os padrôes de atuação.

Dê]

Do dctcnni­]a

, apLsar

'-~S( Lido o dos

Ou, em lermos : a justiça condena os membros das pobres da população e os envia para a penitenciária; a crimi-

nologia vai aos pesquisa-lhes a e cumunica à a mais relevante característica do

abonada sua eSl1lera~se em sekcionar os para o

encarceramento; eom a de ondas de indivíduos miseráveis ~IS

os CrI ali eneastel as mãos ele con-tentamento e sentenciam: confirmado, cada vez mais crime é ( co : o repressor, ciência

bem meu árduo mister~ atesta que estou Na rneclida construindo o estereótipo do delin-

através dessa de uma ciência com a j

24. FOUCAULT, Michcl. ClllÍemo\' do PUC. Op. cir., p. ('x.

37

cada vez menos se dj da pClld 0'111

lêlr CU]1l ()

coutra /WS{[S que

na ln a a uma norma ]c

ZÜ() suficiente p~l!·~l o mediel:ls repre mlivíduos a

"Tocb a do século XIX passa a ser 111 controle, rü10 Umto sobre se. o que fizeram os mdivídllOS cstú cm c"onf\)rmi­dadc ou não com a lei, mas ao nível do que fazer. do que ~;lO capazes de Llzcr, do que estão a fazer, do que estJO na iminência de fazer."25

erradicar o mal do mundo. Criminosos, porém, para ela são as pessoas a quem a ordem ofi-

ciaI semelhante rótulo, como vimos. Sem inebriados vapores elas retortas fumegantes, os criminólogos desapercebem-se de tão sin a verdade e se aventuram nas mais

tas e variadas teorias a respeito da do delito. A matéria oportuniza uma vastidão de campo capaz de

de a sorte, fantasias desen-obras anado com o

resu mo das di versifiea-causas do crime - o ponto de das correntes que riscam a arena da crimí-

que, em realid todas tomam por base um mesmÍsSll110 o conceito de de que se não tem nada de "natural", ou de , ou de "científi-co", urna vez que estritamente, ao do aparelho repressor na oficiaL

25. Id, p. 67.

Page 28: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

38 '

Em meia dúzia de palavras é possível traçar a resenha das tais correntes - embora os pobres universitários percam no mínimo um semestre inteiro para conseguir uma pequena

a dos seus quiméricos Os da

deais a ser seguidas resultar () delito de de certos indivíduos

VIve bido o resultado

eclética). Para os

LISO elo (não há segundas intenções no

de um

Daí ;\ criminoso nato". a dos

nossos dias. O epígono da escola variou um pouco a respeito da exata identificação do tal defeito, ficando mais conhecido, porém, por pre­tender que poderia ser diagnosticado através do encontro de certas características morfológicas, tais como testa estreita, zigomas salien­tes" orelhas em couve-flor e por aí afora. Na esteira de tal visão, surge, maIS tarde, a explicação de que o delito resultaria do funcionamento anormal das glândulas internas (endocrinologistas). Nos nossos aparece a teoria genética, pela qual a existência de um Y a mais na composição cromossomas impele o portador, infal mente, Ú

perpetração de A propósito, não resisto a transcrever alguns trechos de que saudou entre nós o surgimento de teoria:

Lombroso, o autor livro O Delinquente, acaba de ver comprovada sua tese de que o crime é, na maioria

sâo os crillú!losos? Crillle e criminosos: enles

anos depois da teoria lombrosiana, a vou, no laboratório, que existenl pessoas

à de todos os crirnes.

o Leonidio Hibeíro diz que deveria haver uma revolu-mundial em ao invés de se

de a um trabalho de associais:

dos Ylo de elementos

como se faz com os e cancerosos -cou -- a sociedade deveria dedicar-se ao estudo da personalidade dos anormais, a fim de apurar as razões que os levaram à prática

anti-sociais, o facilitaria a defesa dos seus 8ltos interesses e, ao mesmo tratan-

no lO da

l' , U1Z,

irresponsável (no sentido da conscientização e dos efeitos) entre pessoas sãs, contribuindo para o aumento da criminalidade em todo o Universo.

Pois a verdade é que o crime (reiterado) é produto da ano­malia genética que condiciona malformações físicas, e todas as taras que deságuam na infração e no delito."26

Para os adeptos de , fundador da sociologia criminal, o /' mundo ao homem, no qual ele se cria_e v o ambiente que o cerca, os fatores em que imerso, seriam as condições determinantes no sentido de arrastar alguém, íncoercivelmente, à prática de ilícitos. As posteriores a esse pomo de vista atingiram construções extraordinariamente sofisticadas,

das quais, talvez porque pejadas de altas de sabor hermético, ainda apaixonam os estudiosos hodiernos - tais

diferencial, da anomia etc. Encampa a o forma de

26, O JORNAL, Rio de Janeiro, I ou!. 1969.

Page 29: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

40

alo nascerem certas pessoas com

nll1l n veremos adiante, ela está infensa ii

contrúrio lidS suas duas f\lrInadolas, de glândulas

u-

A impugnação a elas também se nu campo da natural, embora de forma um pouco diferente da já citada, Ao encontrar nas

uma popul caracterizada pela pobreza, pela ignorância, por se originar de famílias desorganiz.adas, por pertencer a minorias étnicas, os criminais concluíram solenemente: ii

za, a ignorância, o ser originário de famílias degradadas, o pertencer a mi eis as causas do crime. que a verificação de campo três por cento o número relativo de del

Para que determinantes,

Mais cómoda revela-se a ecléticos. conducentes ü eclosão das condutas s veí.rias causas de cada natureza, ainda estas se mostram falhas na hora da com-

ê sempre para uma tábua de sa]va-aumentar o número de fatores eaus,lis com ante-

riormente não indicadas. Tal ani ser ampliado e o foi -- até tornar inviável a contraprova . Atentemos para ,\ palavra de um dos mais autores da corrente:

,<,'tlO os crimiu()S(Js? Crin7C e crinlfilOSOS: entes 41

";\ i que são reconhecidos fenômeno illlli

série; de um crime

llÚO seriam criminos,ls

car nada na de ordem ca" se consegue retirar dela. Se as causas são tantas c tão diversifica­

termina-se retornando ii estaca zero, por concluir ser o crime o do imponderável.

Creio que se me permitirá repetir, a essa altura, o antes afirmado: o fundamento da criminologia amesquinha-se a uma arenga empolada, que cm torno de um núcleo cuja essên-

de mero senso comum. cri

exatamente isso, ao dizer: sem o

da o mento

riência faz o crim

de acordo com a sabedoria se condensou cm dois

lcado do meio para o c "Tal pai, tal filho" (Der

que na base da expc­"A ocasião

desencadeamento do II veit vom

27. SEFUCJ, Ernst. Mallllo! di' Armcnio Amado, 1957. v, I, p, 314.

Trad, Guilherme de Oliveira. Coimbra,

Page 30: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

42

da hereditariedade

a em crll1ll causa pasmo que

do delito, tenha

du crime, se vamos buscá-las a

o descnvolvimen-

comum <l

tão s 111-

aSSlm ordem ofici do criminoSll

dificuldade cm ser idemificaclas: J. "a - uma conclusão que pare-

28.

uu absurdn,,:!iJ do J1lccanÍs-

u das normas s, com-

de conhecimento da realidade e

cimento. a mêUS

tivas do mundo até o 'senso comum , ~lS vezes chanlado

Dennis. Tavístod: Pub .. 1968, p.

igioso, etc. Como modo de dornina­

lhe

a per-

taria­assim,

lhe criminul. London.

.VelO os cri/Hlnos'os? Crin1e e crinzillOSOS: ente!';

todo conhecimento é em alguma medida uma forma de submeti­mento."30

o grande papel ela ideologia é convencer os de que, dominadores a que os submetem, devem

dócil e disciplinadamente:

"Por esse pra comer, por esse chão para dormir A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir Por me deixar respirar, por me deixar Deus lhe pague ...

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir a qlle a

:\0. CUNHA, Rosa Maria Cardoso da. O carúter retórico Porto Alegre, Síntese, 1979, p. 20.

que cair

31. CI-HCO BUARQUE DE HOLANDA. Deus lhe pague.

da

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lU

e nel77 () será

acrescento r: niio deve sê· f(} e, sobrc[uc!o, n(/o del'c pensar que ~, "

A maioria das pessoas acredita piamente, sem dúvidas ou questionamento, em certas "crenç~as jurídicas", inculcadas de maneIra pela ideologia, tais como: "1. Que existe um legisla-dor racional nelo um sistema jurídico coerente, económico,

etc, 2, Que o ordenamento não contradições e redundâncias e, o direito penal não exibe lacunas, 3, Que a ordem justa c os

4. Que o julgador é, axiologicamente, neutro enquanto dec não há o na apl da

I, LE DESIR DE PUNIR.. Pans, p, II.

45

Page 32: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

46

Justiça. 5. Que o julgador, no direito penal, busca a verdade real e não o elo ponto de vista valorativo."2

Verdadeiros arrolados, até que se

assertivas, por total

acabado da indústria

judiciário, para estu-

porém, como o demonstra a com a realidade.

resulta da ele dois momentos: a produção das leis (legisladores), mais sua

aparelho servindo de matéria-prima para a manufatura os do povo.

Busquemos analisar cada uma das fases referidas para, por fim, verificarmos' que valor pode ser atribuído à etiqueta de "criminoso",

apl a pessoas ordem

- "Deixe-me prossegui!; disse Colin. Você neIo se arruma mais aos domingos e não se barbeia mais todas as manhãs.

- Isso não é wn crime, disse Nicolas. - Isso é um crime, disse Colin. "

Boris Vian 3

Ingenuamente, tendem os cidadãos a,encarar as leis como man­damentos baixados por um poder transcendente, que as decreta com superior neutralidade e imparcialidade, verdadeiras revelações que um ente sagrado se digna a propiciar ao povo. Algo aureolado de um halo dívino, provindo de origens mágicas ou astrais, ditado por entidades supraterrenas, de natureza misteriosa. "A lei é a lei", diz-se religiosa­mente, e estamos conversados.

Ora, a ordem jurídica resulta da atividade humana, elaborada que é por um legislador, isto é, por um ou mais indivíduos de carne e

2. Rosa Maria Cardoso da. O carâter do da If'!'nllnn/lp

Síntese, 1979, p. 1 18. DES JOURS, Paris, Union Gen. Editions, 1980, p. 130.

.';;clO os crinúnosos( C'riJne e cril1úno:u)s: ente.1)

partilha de todas as que e ama, ça, tronco e vezes ao dia.

a milit::lr, de estatuir as normas

comuns aos seus semelhantes, que possui cabe-

pura idealização ético-

dita as leis a classe

do sta/ils CfUO

Tais considerações aplicam-se, às normas definidoras de crimes Penal e leis as orientadoras da pela qual se declarará alguém de Processo leis Aqui, mais do que em outro ramo do

de passar por cima dessa realidade si e criminoso não são entidades

ser vistas como /vontade cio slaclor

a crença na embuchá-Ios com um

o resultado da a tarefa de consolidar em

dos grupos idealística que envolve

devemos

Na medida em que se obscurece a crueza de tais ene­articul voando-a por meio de uma retórica

obter a adesão camadas finalidade de manter ditos

a regras pro­em estado

usá-la por

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i.

48

de de no sentido de eoartar tentativas de

A lei, sem dúvida de

no Penal relativo

aos ü cri-

imn resllmir a um

bens ou direitos de uma pessoa para outra, sem o mento da"4

mais cantil, uma vez que vivem, na maioria

E o que é um negócio, sobretudo um bom negócio, mais que tudo um excelente negócio?

. ,Po~ieria u:na sociedade negocista sancionar com castigo os negó­~IOS? ~na, entao, o da classe negocista punir os negócios, lmpedlfldo, des.s~rte, que tal classe praticasse os fatos que se consti­tuem em sua atlvldade precípua?

vez de adotar aquele modelo, preferiu a lei estilhacá-Io em . figuras delituosas, pois, na medida em que rompe a'vincula-

dl:'et,a da regra ética com a norma jurídica, oportunidade para subtraIr a a I . , -' c s que, se etIvamente, nao lhe ll1teressa per-turbar.

A oratória jurídico-liberal, como seria de esperar, enxerga as coi­sas do m~do muito e dispõe de munição, em seu infi71ito arse­nal retÓrIco, para justificar plenamente a solução codificada: somente a precisa do comportamento proibido satisfaz à garantia da reserva legal ("não há crime sem lei anterior que o defina").

4. CHAPMAN, Denllis. anel lhe lhe CrÍll1 inai. London. Tavistock Pub., 1968, p. 72.

49.

Eu mesmo

vago, inconcusso ser

de um preceito a irlcertcza dos sobre a conduta que lhes é defesa, ao mesmo em que fica

I

do , se infiltra em os

centes ou não, quando subjugados às ditaduras e regimes asse­melhados. A sufocação, o ambiente trevoso, o fazer ou não fazer transmudado em tortura permanente, assustadora e paralisante, o dia-a-dia repassado daquele terror mórbido que Kafka tão bem sabe transmitir em O processo."s

Ufa! Por tudo a o Código preferido, à encampação de um conceito abrangente de lesão ao património, parti-lo num rol de definições, cada qual delimitando com rigor dado. comportamento específico (tipos penai tais como furto, estelionato, apropriação indébita, roubo, etc. Só minoso o indivíduo que observar no mundo fálico uma conduta precisamente adequada ao modelo abstrato prefixado em um daqueles da lei. Ocorrendo descoincidência cm algum ponto, o delito,

por ausência de tipicidade. Por con ia, se alguém para si um bem ou

direito do património de outrem, sem completa ciência ou pleno

REVISTA DE DIREITO DA em bronco e relroof;vidade

DO ESTADO. Lei Rio de Janeiro, 19:236, 1968.

Page 34: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

50

consentimento do último, mas, apesar disso, sua conduta não se exatamente das condutas tas na lei,

de delito, cm face da

cubre as que contrariam a norma moral apresentada como razão

de ser da dos contra o património: em easo vo, observemos se a ;Írea o por mero acaso,

Toda vez o se dá pelo aos objetos em si ou facilmente se encontrará cia entre o do ativo e algum dos na lei penal. A tirada no roubo, a apropriação do dinheiro da firma pelo empregado-cobradór, e assim por diante, docilmente se adequa-1710 aos modelos 111 dos infra­

conlra os sím­se modifica

kbdes em qualquer dos

registrados no Código e, ausente a famosa tipicidade, torna-se inviá­vel qualificar a ação como crime. Isso é que permite permanecerem fora da área penal hipóteses como as de jogadas de bolsa de valores; não-pagamento de empréstimos estatais obtidos mediante oferecimen­to de garantias ÍnexÍstentes ou de valor muito inferior àquele por que foram avaliadas; recebimento de subsídios governamentais em contra­dição com o fim a que se destinam; concorrências de cartas marcadas; jogos contábeis; transações fictícias entre firmas de um mesmo con-glomerado; triangulares; especulação através da de mercadorias; evasão de impostos; subida artificial de preços; esma­gamento de empresas concorrentes, de sorte a obter o domínio do mercado e imposição de condições escorchantes; fraudes ao consumi­dor; anúncios falsos; enfim, toda a imensa gama de operações a permitir a de lucros e que caracterizam a retirada de bens e direitos dos outros (em , largas da população) con-tra a vontade deles e sem que tenham conhecimento de estarem sendo defraudados. Tais contudo, revelam a se amol-darem a dos

Sabendo que os membros das classes a lidar com as coisas em (objetos, dinheiro) e as pessoas das classes

StlO os crinzinoso,Ç? Crilll(~ e crinzinosos: entes 51

média e alta com seus símbolos (títulos, papéis), percebe-se com nÍti­dez que espécie de ladrões mais provavelmente cairão na teia do apa-relho de criminal e qnais os que incólumes seus buracos.6

Penso valer a pena submeter à ise a in elo art. 17! do Código Penal - ionato - pois oferece tal delito excelente material

para etar o tema ora abordado. Reza o em causa:

para si ou para outrem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifí­cio, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento."

Levando "lO da letra o comando a

comércio lima vez que cm todu erro

crc nüo visa a outra sn senão a daquele resultado, pelo entorpecimento da capacidade de percepção do.'ô ~Jlnidores. Talvez por isso os comentadores, em geral, costu­mam criticar a fórmula legal do estelionato, por a considerarem ampla em demasia: "fraude" seria expressão vaga, de limites imprecisos, capaz de abarcar LIma enorme variedade de atos, muitos dos quais, por certo, não estavam nas cogitações do legislador ao instituir o delito. Se o anúncio da televisão e, depois, o vendedor da loja me afirmam que dada mercadoria é tanto a melhor como a mais barata que existe

/' -na praça e por isso a compro, vindo mais tarde a constatar que nao era uma coisa nem outra, parece que fui "induzido em erro" "mediante artifício", ou fui vítima ele estelionato. Para a sociedade burgue­sa, como salta aos olhos, qualificar fato dessa natureza como crime representaria um insuportável despautério.

Aí, apela-se para a capacidade inventiva dos juristas, a fim de

dar um jeitinho na questão. , , Sem se fazerem de rogados, vêm eles e declaram: espera la, ha

fraudes e fraudes, umas puníveis com pena de reclusão, outras não. E prosseguem. há fraudes s e fraudes civis, somente o

(). Cf. CHAPMAN, Dennis, op. cit., passim.

Page 35: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

52

rÓLulo de cnmlllOSOS Lll1~',H11-Se ~h

lllais de estabelece L

um tipo ele I:,) I

membros ebs d J1l n lHes, A III ioria, po

uinte : () problema llOS t rmo

de fUiílbmclltal coincidem o delito ii u outro s:to uma rebeldia cuntnl ii ordem jurídí­

ambos num fato exterior ao a título de dolo ou culpa, /\ única

elo

li

men(o do forçada, restiflilio

nulidade do só deve recorrer ii pena da ordem j não se obter com

outros meios de isto é, com os meios próprios do direito civil (ou de outro ramo do direito que não o penal),""

Essa maneira de faz em

dC;nlicas nu sua em razão do tipo de

De pela jado princípio da mundo abstrato das

mente para classificá-Ias de criminosas ou não

que as da rompe-se o feste­

não se resolve no

matéria tal idéia representa inquestionável absurdo: o definido,;, crime em abstrato é o que é, uma com caracteres

inteiramente na norma

7, HUNGRIA, Nél,üil, Comelllúrios (lO

v. 2, p, ln, S. ld., ib,

Peno!. Rio de Janeiro, Forense. I ')'i

I

S("lO (JS ( rlu:lu()sos? Crime t! criulino:úJ,v: {'nies 53

sem qu uer desses caracteres ou com o acréscimo ele nutros que nela inexi,;tam. vl:nto, do mundo cun­creto (l !ccem ,\s cin:un"U'ínc' confrontacl() com casu livo. dir-se·á: ()

mciro reqm ahstraLO JÜO é

elemento do que o tipo do cste] ÍonaLo

ele seus cuntornos. Onde

sarcir o dano na área civil. Qual a "rebeldia ú ordem jurídica"

alarme social? Ou, dito de outro modo, qual

da

rato relevante para o sistema formal-institucional, numa estratificada em classes verticalmente hierarqu ? dos membros das camadas superiores podem merecer podem vezes até irritar (individual

porque não põem cm risco o Sf{{IllS quo c, carecem da c

ponto de fazer jus aos go (visão de gru ,Incla mais i llferiores da sociedade

de a

de esta sim, causana e

ai aos estratos

Uma atitu-em face

das conseqüências indesejadas que daí decorreriam, desde a quebra da solidmiedade do grupo até a demonstração de que as pessoas gra­das não são melhores, nem mais nem que ~\S das classes inferiores. Isso ocasionaria um ll~\ distância institucional que separa as classes e poderia elar lugar a lllovimentos de insubordinação, E, nos regimes de poder, "a,c~rrup-

dos dominadores é muito menos dramática que a insurrelçao dos'

Page 36: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

54

domínados".9 Ademais, a ideologia convence ser o crime coisa típica das pessoas Um indivíduo rico, pois, a ser consi­derado por seus pares como imoral, imerecedor de con-

do de penúria.

duro homem nunca, contudo, eapaz de merecer as atrozes

do quem dis­

quem vive em esta­passo, pois, aparece com mais clareza, ainda, a

que a existência de delito (fraude penal) ou de não do estelionaUirio em termos

no nua, te

m autor de estel apanhado, não dispõe de patrimônio para indenizar o prejuízo e, por outro lado, seu golpe contra uma empresa alarma e perturba a ordem instituída. Já o dono de frigorífico que oculta a mercadoria cm mano­bra altista, se chega a ser objeto de alguma sanção, o será em área extrapenal: pode suportar os ónus da multa fiscal ("O Estado só deve recorrer à pena quando a conservação da ordem jurídica não se possa o~t~r com outros meios de reClção, isto é, os meios próprios do direito clv:1 ~~ de ou.tro ramo do direito que não o penal"); e o "alarma SOCIal ,quer dJzcr, o alarma da classe superior, foi mínimo, uma vez q:le a ação atingiu apenas os segmentos da população para quem faz dIferença pagar mais 2 ou 3 reais por um quilo de carne.

Equivocado, por tudo isso, está o dito popular ao dizer: quem rouba pouco é ladrão, quem rouba muito é financista. O certo seria, se quem rouba .- pouco ou muito - se situa na classe baixa, é ladrão: sc pertence à classe alta, é financista. .

Porque, afinal de contas, não são os comportamentos (delitos) que contam, uma vez que o importante, de fato, para o eht

9. SYKES, Gresham M. The 1972, p. 53.

o( New Princcton Ul1. Prcss.

sâo o.v criminosus;; Crinle crinlfllOS(}S: ente:'; 55

justi criminal, reside na posição social do autor. Como sugere . " .c s nao Austin Turk, o status elo é jJCSSO'l -

mas pelo que são. Acerca do cabe

'rar uma manobra elo atuantes no campo

criminólogos, e cidadãos comuns.

~cofari'nho branco" rUJln, eis que

para desrnasca~ U,-",:>,"J"" de bons pro­

angelicalmente -stas,

"crimes de da lelra da

vvhite collar crill1es; -- em bom a versão

deveria ser "crimes de e Basicamente, estão assim conceituados:

tal como defini~

livro de Sutherland haja ca central deste tipo de fato é seu caráter classista. Por isso, Heller (I967) o denomina Kavalliers-delict ou delito de cava­lheiros. Este caráter parece ser o elemento que contribui para dar a esses estudos, depois denominados das mais variadas formas (delitos económicos, delitos ocupacionais, delitos de enriqueci~ mento, deI inqüência de negócios), sua verdadeira importância em criminologia ... "11

Empolgados pela perspectiva de colher nas malhas da justiça os ';grandes" criminosos, revertendo dessa maneira o quadro cansativa­mente repetido de só eonternplar os cardumes de sardinhas que apare­cem como resultado da aparatosa manipulação do arrastão oficial, os penalistas se excitam. Escrevem, pesquisam, estudam e até pretendem agir, com vistas a tal propósito. o de certa forma uma penitência reequilibradora da consciência, que encontram

10. Cito mcmorw. II. CASTRO, LoIa Jc. para lInJa

sobre eri-

I1lCS colarinho branco na América Latina. RCl'ista

Janeiro, 25:89, 1979.

Page 37: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

ícia, ele entrada da ce de acesso fácil ~l

que­critninrtl c0l1tr~1

lada. ri

de

em tais áreas, elimina-se a forma mais qual a autorida-de toma da de crimes, dando início a seu para o mente

esquema de da a a intestinos através da sol porque crimes não são ali

tendem a

os membros da classe alta rarissima-quando constatam ter por

Há, desenvolvido e funcionaL todo um ser ~lcio!ladas dentro da e:-,fera i ntern~l

de resolver

uma vez que as roturas üs regras vistas como manobras inerentes inevilá-

12. M!AILLE, :'\lichci. rml",',I" critic(/ {/(J Direito. Coimbra, s. cd .. 1079.

57

veis de um todos os COns()c'iOs

clube dus j<1

que do

popu

da escada cnc~l1ni à ltu d,] ordem

outros lindo que: \l me mo

para () escuro da cifra negra. se ocorrer de o caso

i l;di vi cI cul í stico

.I11 1<..lil::.\l11

lL. l, . c

membros riencia de muitos anos

11n1

enxergar os criminais vanta-

da ideologia preponderante. Perigo real de punição para os infratores de colarinho e

quase não há. De outra

, nas salas ele aula, nos

néW; coturno, colhe () sistema

urn !1adora. Por tal via, instala-se nos de di midac\cs

no amparo à sua ati súditos a crença de que a

distribu concreta de vanta-

sas, tudo ficará elo dos Com isso, desvia-se

de defeitos meramente do ma, evitalldo que constate a realidade de ser intrínseca ús

estruturas a i As deI

obedecem :1 esse

que o vitima. de velhas, contra a

Page 38: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

58

Sistema "O regime em que vocês vivern é o melhor que jii houve ou que em qualquer istiu."

POl.'(} -- '"l\1as um grupo de pessoas tem carecemos até do que comer."

Sistcnw -- porque há certos elementos bando o do SíilCO

Povo - "Mas ... " Sisienw "Calma, 1 Vamos fazer uma peza,

vamos esmagar a Povo "Iv1as ... "

os

Sistema "O que precisamos é de mais combater os grandões necessitamos de mais liberdade de ação. Olha aí, vamos cortar um

força, de maior dessas boba-

de (odas as

bacharelescas, Em lhas do melhor

'() di/cm o me que." Sistema - "Quem diz isso são os subversivos! Mas não tem

nada, vamos aproveitar os novos poderes de que nos estamos munindo para, logo de saída, tirar de circulação os detratores do regime - que é o melhor que já houve ou que pode em qualquer tempo existir."

Naturalmente, há sempre a oportunidade de arranjar uns bodes expiatórios para assegurar certa credibilidade intenções manifesta­das. Agarram-se alguns i uos provenientes das camadas média ou baixa que, comportando-se de maneira igualou assemelhada aos

senhores das altas lograram ajuntar alguma riqueza de monta e se em exibição no pelouri

pública, Ou, o que é muito mais freqUente, descobrem-se que dispõem

de um ou dois carros, e de 10 ou mil de

as condi monta uma fortuna

através do de membros da classe

para descar­nos da virtu­

de entender a

59

Quantos honestos policiais, competentes promotores, magistra­dos idealistas se prestam a funcionar como instrumentos

convencidos de estar ndo como do não que nunca, nunca, nunca, concretamente,

obter sucesso, nO ele um

insetos? Ah, a miopia da classe

(S[ ou hOlfver ln!!

aos homens de

Manuel Puig l3

Como resultado ela descoberta da cifra negra, surgiu a indagação: a repartição dos delitos entre o claro e o escuro se dá aleatoriamente

'01I obedece a uma tendência sistemática?

Pal"l 'llnuns a divisão ocorreria meramente em função da c é ~ " 1+ f , O;;tros, porém, não sendo "crentes da , ' eles,cOI: l.am

que a em causa estar a certos pnnclp,JOs~

C I apontaJ os

omprovac a a v de diferenciação, em

defeituosa tara da balança criminal costuma

PUIG, TvlanucL o do mulher urm:I/(/, cd Trad. Rio

J ancíro. 19RO. 14. CHAPlv1AN. Dennis, 017. dr" p, <)9,

Page 39: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

60

Levando Clll L'cm/a que a

no 1

maior do

i1l0Il1el1l0s distÍnl\)s

citos did:tll conLlld\l, que: I

anteriormente, (')

(c lo (k: ingresso

du Ltto (dê a indici IIl11 delito

) elo cri-

nerabilidade do a ser submetido a violências e arbitra-riedades.

Na fase policial, os elementos Cla: na judicial, o fator sub (/ torna-se an

e d c os h c c

como isso acontecc,

lUaior

Ue duas forma Ullla concreta vio] ü iei pcnal ú da ícia ciência, ele resto, decisiva em termos de fazer fUI1-

Clonar a UIIW da repressão: 1. scus vêem o delito; ou

S({O oS crinúnoslJs? ('rinlC (;' crÚniJ1osus.' entes

) s:lo

\10.

c 1 ,dcrttldos por aI que 1 tLlnsm i

ln que ucon(l i1~11l1

maior facilidade de ll:lllPO,

des

lei maiores com rapidez ao a aos logradouros

extremamente dev8ssáveis dados tipos de

61

gam populares, cuja franquia se permite a

quase () mundo e onde a te de eOllt~\r com a

fave-COl1-

I

lllde l:i, como

d~l i n

Page 40: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

62

da banda rica da

zonas urbanizadas, os trabalham apenas

ÁS classes média c alta tendem a paSS<lf a maÍor do em locttis víduos

elidas

o

vada~ . jogam, comem nas próprias resldcncJas ou nas casas uns dos outros ou nas vivendas de campo ou nos cl ou cm restnurantes e casas noturnas ele etc.: vem-se manccern

do !llOrrU, di / !lOS C praças, andam a pe ou usam transportes coletivos, freqücntam escolas públ i­cas, trabalham pelas ruas ou em massa (como na fábrica), lidam dire­lamente com o público, reúnem-se nas esquinas.

" Comprecnde-s~, por tais circunstâncias, haver muito mais proba-bIlIdades de serem os delitos dos miseráveis "vistos" pela polícia do que aqueles perpetrados pela de posição social mais elevada.

Como conseqüência, idênticos comportamentos, dependendo da classe a c!ue pertencer o sujeito, mostrarão varia~:ões quanto a gerar o reconheclmento de ser

Por exemplo: um jovem, meio bêbado, outro. causando-lhe lesões eorporaí.s. o j' t . a o se concretlza na rua ou no boteco, quer porque se presente, quer porque, estando próxima, foi atraída pelo alarido, a polícia pode comparecer ao local logo cm ida. Nesse caso, prende o agressor para conduzi-lo à e autuá-lo em "Viu" o crime e, para o claro. Se o mes-

contudo, acontece numa casa de de

se for para mocorra, ~t

que o autor receba (\

.\'60 os crinúno.\'os? Crime e crinlinosos: entes

Muito contribui para a discriminação em causa a imunidade ins-titucional os cidadãos ao rclato de

vá ficar rnais claro ao elo vale a pena aproveitar a mente, aqui.

referi-lo, ainda que resumida··

Por o crime como algo típico do pec::soal da arraia 111 os das camadas bem não conse-guem visualizar seus lá o que fizerem - como delin-

. Para enfrentar de atos elementos do próprio meio - inobstanle no como delitos - mantêm todo um mecanismo de defesa que se realiza e

dentro de suas estritas de sorte a poder dispensar da

:.l ordc o reI ismo da su

sobretudo amiu(Jada, de existirem nos estra-tos sociais de cima poria em xeque a visão maniqueísta ela ideologia que se deseja esposada, no que esta sustenta quanto a ser a sociedade formada de bons varões (os vencedores, os ricos) e homens maus (a ralé, a gentalha). Valendo-se de uma justiça privada, realizada no seu próprio âmbito, logram os grupos qualificados manter razoável disci­plina, independenternente de recurso aos organismos oficiais. Como decorr§j1cia, eventuais trapaças praticadas nas empresas são resolvi-das mediante a inclenização do dano e a demissão simples anota-

estigmatízantes) do autor, se é boa social. Ao aluno que agride o companheiro, machucando-o, aplica-se uma sus­pensão ou se pede aos responsáveis que () transfiram para outra esco­la, Se se trata de estabelecimento particular: O rapaz que estupra ou tenta estuprar a amigui as discussões e con das famílias recebe a de para Europa ou Estados Unidos, onde terá de o tempo suficiente se purificar. O clube grã-fino aplicará uma até a em caso de

aos rapazes que arrombaram de onde furtaram pares de certamente inadmissível para resolver o caso do que

de uma mulher no meio da rua, embora em ambas as hipóteses,

Page 41: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

64

IVO, il cl1l1fí uraclo delito: 1'11 (l

de cunho \adu

pela rl1 casos grav~s, o ChC!Ill~UllCl1t()

arredura da com mil!":' cClnstilJ1ci e eficiência.

nos de Ul1!.iII11Cnto que param os indivíduos para documentos c submetê-los ~l revistas s eias que constituem rica fonte de ai elas estatísticas relal i

do JÍutor ao Construido pela

o primeiro básico da imagem do criminoso que represen­si mcsma como já mos, di! a seu baix~1'status social. Pedindo a uma pessoa que descre-

ta para

de um deli teremos, em da respos-la, o retrato preciso de um da classe social in , de tal sorte se tende a estabelecer i n tercftmbio en Ire e crime ;\ teoria outro mérito nã() teve senão o de dar cunho científico a esse sentimento do senso comum. AIos sinais mor-

do "criminoso nato", descritos o pai ela crimi liL

casavam-se harmoniosamente com referentes aos párias da sociedade italiana da Ao que o criminoso é, caractc-

lermos da noso.

o l'nvo]venc!o

abre-se facilmente a idade de 0\

p,lra dizer: o é, i eamente, cri mi

irncnto de uma quantidade muito maior de deli!(" miserável do que remediados e ricos COI1'\

'Os 65

la neeessúri criJl)(;, de que uidall10s

vem

scnl ido vídu con ídcr:ldus como rnillS prupensos ,1 cksrc A lll, ao p:cr,lrc ou abcrdarl:iJ1 11 nos QUlI1S, us policiais ()Ilar~() acordo com :l idéi,l suem a respeito quem criminosu. A maior Ciscali dados grupos do que r,:lati amvntc a uutros vai rmllWl' uma taxa divcrsa (::Illrc eles quanto ~i de infralOrcs que:; fic.:a­rão idos na cifra negra. As estatísticas ofici cm de:;corrên­ela, ()stentar~o um tímero elevado de criminosos oriundos das

lJ';iSSCS

do dia-a-dia, que todos conhecenl t,dvez aprovem, o não da análise muito

e clarificador a Importante

do ponto cm exame. ele rotina na da segurança

se denomina de "batida batizada com nomes arrastão" ,

. a -flor" , c a r n Li \' a 1" ,

arco-íris" ,

"opera~~ão adeus üs

por aí afora. diligência, a uma úrea dcnsamente Obturadas

os moradores de se retirar do foi pI com todos

a contar com a número de viaturas, um

to, sofisticado sistema de Isolado o 1.') invade os

no cerco as

local at6 o lér-

'1 j de serviço IS, COl!lO afirma .bmes T. a adola um esli o (e _ ' f . ·t j'()I'Ç"l de OClIllaçao nas nas zonas das cla,se, altas, enquanto \lIlCI0na como UIll, .e

:\rc'as hahil:td:ls genle de baixa renda (cito de 111ern"lria).

Page 42: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

66

igindo documentos comprovadores de ocu lícita,

armas c t6x em aberto. sas cm fl sua 1

de mue", em das par,] uma gemo um

desde a

de bens de maior valor, apreendendo a mandado de

süo atochadas nos nele sempre cabe e

onde se submeterão a Ulnêl tria-ou dois labuta investi que

dos antecedentes dos deti através de con-aos registros policiais, até "hábeis" interrogatórios .- um verda­

deiro pandemônio, com gritos lancinantes, berros tonitroantes, porra-das para todo () lado, ordens no espa\'o, uma arrnosl'enl absurdamente histéri assisti ii mais de

s:10 I nqlll'lcls c(\n! as quais nad:l

llledi

média número em tangidas até a cadeia, apenas 20 ou 30 alt remanescem. De

qualquer sorte, porém, tais batidas determinam como efeito a trazida para o claro de um certo número de crimes e criminosos até então na sombra da cifra negra: tráfico de entorpecentes, posse de armas, receptação, contrabando, furtos, roubos, falsificação, vadiagem, pes­soas condenadas ou com prisão preventiva decretada etc. Quer dizer: a submissão de um grupamento humano a uma operação do tipo em pauta cria condições para estreitar a faixa escura de sua criminalida­de oculta.

Ora, tais so sao e só se executam, contra as áreas de habitação das populações miseráveis, as favelas:

"O delinqUente é identificado pelo fato de ser favelado antes de sê-lo ato de que é acusado. Na favela habita boa

pobres dos centros urbanos e que de

slio os crinúl1osos? Crinze e crilninoso.\': enles

maioria os moradores das favelas nua são delinqi.ientes mas são tratados enquanto tais pela polícia e justiça."16

natural que os morros e favelas consi~

derados como redutos de

verdade, esses fatos em torno da [ra determinados grupos sociais, o que

con­significa a

de uma classe sobre a olltra."18

A ninguém ocorreria empregar o mesmo método de choque nas zonas residenciais das classes média e alta. Cercar e vasculhar todos

de um r;1o do ou da urbanizada do !'vléicr z déid tcÍral1lenlc inconcebível.

n:sultados li tais locais. Daria lugar ü descoberta ele i

criminal menor, igualou maior que a observada nas favelas? A imuni­dade institucional, assegurada em nome do direito à privacidade e das garantias individuais insculpidas na Constituição e na legislação ordi­nária guarda-chuva que não protege os segmentos mais humildes do povo impede que se possa estabelecer um cotejo esclarecedor.

2. O segundo traço fundamental para a composição do estereóti­po do delinqüente fornece-o, ainda, a ideologia do contrato social. Arma-se o ilogismo de acordo com a seguinte racionalização: a sociedade é irrepreensivelmente justa; se h{l pessoas capazes-êie lhe desrespeitar as regras bL'ísicas as normas será reconhecer que tais pessoas são anormais, isto é, diferem essen­cia-il1lcnte dos demais componentes do grupo social; por serem entes anormais,

16. RAl\1ALHO. p. I

17. leL. p. 170. 18. ld .. p. 171.

constituem, em conjunto, uma cabendo admitir que seu

o verdadeiro substrato "desvio" e "desviante", tão ao da criminolo-

o mundo do Janeiro, Graal, I

Page 43: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

68

1:\

de grupo tão

m Jl1 () S (1; Ó

elemento para ;\

os Cnmll1(lSOS

: l~, num '1 L

Os dois fatores são vistos cumo elementos de um mesmo circlll-

t alimenta o o serve de ,Feedback .0, I' realimenta () outro e a.,-;slm diante.

sempre que existir ú na

ser feita desde

iro marClll1l'

nal filcij Cieará. !l()

identi Por seu tumo, a

ç.a em reconhecer o r

como ce1'-

Como a da j se com o que o acusado pam atentar cuidaclosamente para () que ele é. F aí a figura típica de um membro da a social aliada iI

no boletim de antecedentes a decisiva no \crc-

dieto do caso.

agora, a outra por melO da (omar conhecimento de UIll crime não o

(\ provocar a dn infrator, Ullla vel: que

nesse sentido tende a desanimar a ida ados

cm q ue i tes de um prucesso

69

a

ra, a fonte de crimes ú formal reduz-se, quase que cXc!llsivumcn(c, ú vítima, testemunhas pessoas a clas li por

. Considerando que tuna eventual falta de do ksado a co]allo!',H' com dccl

quc a a doutrina llOmbeteiem a ck estarem limitados a mínimas hipóteses os casos em a vontade do lesado

'udicar. e muito menos 1 r, a alividade do Trata-se de pura que encontra mínima na

concreta. De a participação ativa do do quer em j pesa bastante quanto ii sorte do

E ai no diz a do evento ma silenciar, probabilidade

de o rato deixar de ter ing:resso no que o levaria à luz do reconhecimento oficizil. A pnwa disso encontramo-la em certas i ra-

o autor, os demais pes mas. tes-da bi do

llO

enormes cOllti

não os "viu", ii falta de um lesado que ao conhecimento da pol irão ocultar-se na f<tixa escura da

criminalidade. A alternativa aberta ús vítimas, testemunhas c correlatas,

entre referir ou omitir a notícia da i à autoridade, gera, para elas, a c1ade de "julgar" () delito e o deli Esposando a

Page 44: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

,II'

ii 1

70

ideol a dominante, que a imagem que um "verdadeiro criminoso" influenciará

quem não criminoso". No lÍltimo caso, a tendênci

a em outra sede que não a A continuidade repetitiva desse modo de r faz nas

estatísticas oficiais uma predominância de acusados pertencentes às classes inferiores, o que realimenta a concepção ideológica relativa ao lil minoso Ull1to quallto tabelas e dos crim nól

beher nUnl:1 cas~1 lentam mas

pela seguranca da casa. Correspondendo os jovens à idéia que o dono do estabele~imento tem a respeito do que seja um delin­qüente, provavelmente a polícia será chamada a intervir, pois se con­sidera de toda a conveniência que sejam punidos ou, pelo menos, ganhem um registro oficial pelo delito praticado, a fim de sé coartar prossigam na única atividade que essa categoria especial de indiví­duos pode observar: perpetrar crimes. Tal registro, num amanhã que se profetiza próximo e inevitável, ajudará que sejam reconhecidos como "criminososrnesmos" da classe baixa + vida sa manchada). Se, são brancos, estudam em bons

a famílias bem e o taberneiro o res-pelo restaurante do Club ou o proprietário da boate

da preferirá comunicar-se com os dos meninos travessos, para obter a do para que

se impõe, a deve da disciplina familiar, uma vez que, mais obviamente represen­taria rematado absurdo macular a vida de que não são "verda-deiramente crim , como tudo está a indicar, com uma vexatória. No dos dois últimos a iva em ouir;1

ia também não dará a a ausência de stm, vai assegurar a cada nova diabrura a certeza de scrClll

os crlJnillosos? CrillJe

"não verdadeiros criminosos" alta +

o comércio de

mais as destas do que as concretizadas por quem

aparenta pertencer às classes média e alta. E, naquele caso, agarrado o Se u um não-este--

da de c similares ~ ou fora do âmbito cruel de uma delegacia, uma vez que representaria rematada ausência de bom senso submeter à ação da delegacia uma eriaturà que, como entrando pelos olhos da cara, nelO é um

meliante. Mesmo na hipótese de reincidência, bastante comum, dispensar-se-á o apelo à polícia: "É a terceira ou quarta vez que pega­mos essa moça surrupiando coisas; mas é claro que não é uma crimi­nosa, é filha de um médico, estuda na PUC, a família é gente finíssima, cheia de grana, tá na cara que é um caso de doença -é que se diz mesmo? - ah, sim, cleptomania."

Certa indaguei ele um de dado válido com , entre os larápios que

apareciam na loja, os que seriam verdadeiramente dignos de ir para a e os não-criminosos, a merecerem ser da à A foi imediata: "Se a pessoa não furtar, é porque o caso é de c não de crime."

Via Dennis

os executivos senio!' de um núme-ro de comerciais I acerca da grupos (e casas

ítica relati à das ladras de do que cabe con-

Page 45: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

72

cluir

c. que admite que inrimidt\da através dé\

entrevistadus abordam está

nWllto L'XC 1 USl :l1!ll'n-

que ii

forma. de

4. Tanto também os têm sua visão a pelas crenças

minaI intensamente permeada da Pressionados a aliviar a imensa caroa ele to

l1:Io só de sua repartição como do próprio Judiciário, são leva-dos a selecionar os casos que aparecem, de sorte a evitar que muitos deles prossigam no rumo de uma apuração completa e atinjam as varas com vistas a uma E o guia mais adequa-do para tal adivinhar, se consubs-tancia no exame da figura do indiciado: ou não ao estereó-tipo do meliante? ademais, que a final a tal to ao menos formalmente, ao membro da classe média hierarquia da estrutura da máquina repressora uma le 11 do herói grego: nem da dus

filtragem, de acentuada vista para o incremento da prática dos

, a ocupar na semelhélll-

que adota para emilir sua decis:lo constroell1-

fornecidos dominante. Entrc (\

19. CIIAPMAN, Dennis. Ii!). cit., p. 72.

(' crimil1usos: c//Íe,\ 73

t\) do crí\lUlo do morro dos acacos o do dl_~" possibil1"

11

Imelo CO!110 U

raUlda cum hoa \untade c escolho dois

ln~ltérj

l)uÍ.\ '()vens meio

carro esporte, tudo está a convencer

lida de mulheres

o aulom(Ívc! bem

os rapazes não elos". Daí, os patrulheiros, o der 111avratura do aulo de

o delegado hesitam em

dos e se solicita a

como uma vez que devolvam seus

Telefona-se para a casa s. Das duas ele

são. li bertados os

dos

e que duas outras, emocionadas c irritadas, recusam segtllr o

em pouco, ii icialos do estudante e a mãe do executivo. Pessoas hém compareço, na idade filhos emociona a todos há

finíssimas. Chamado JS , tam-

promessas de Mais uma o caso e dá-lo por encerrado. Os

estão mai" do que convencidos de lurmal do ,)S s, os tl'lltam vencer a resistência da mcnto definitivo: "A senhora não vê que é

Page 46: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

74

esses moços queriam realmente roubar as bolsas? São umas ninharias os minha senhora. Foi tudo um porre mal tomado, nada

mais. Isso acontccer com qualquer um. Os pais estão prontos a indenizar a scnhora susto e aborrecimento. Vamos ter um pouco de hUl11aniJade' Com alguma conversa acabou-se a um acordo. As

com o conversando

presos arrancarem a capanga de um homem. Um preto, o outro sarará,

sem os dentes da Cheiravam a úlcool. recém-saídos do serviço militar. Levaram uns e pcscoções, enquan-to eram eonduzidos ao cartório, para a autuação na forma da lei. Eram evidentemente "verdadeiros crimi , o que ainda mais

to dos antecedentes: já tinha est<ídD inicrnado na Funah,,:m.

nha. s~rias dificuldades para Ir vaga

onde estacionar o carro no centro. Alguém lhe su procurar o guardador da garagem de dada repartição pública, pois ele poderia "quebrar o galho". Seguindo o alvitre, o Doutor A. contacta o guar­dador, aceita o preço solicitado, recebe um cartão de autorização onde constam dados que o beneficiário sabe serem falsos, e passa a usufruir da tranqUilidade de dispor de lugar certo para guardar o automóvel. Meses depois é intimado a comparecer ao distrito poli­cial. A falcatrua do guardador fora descoberta. O Doutor A. e mais uma dúzia de pessoas de alta responsabilidade e inatacável gabarito moral e intelectual estavam envolvidos no easo, como usuários de documentos falsos. Convencido de que criminoso no episódio fora o guardador, não se constituindo mais do que em leviandade a conduta dos o delegado conduz o inquérito de tal maneira que, ao chegar a Juízo, o promotor, recebera pedidos de várias pessoas de suas move a penal contra o guardador, mas exclui da denúneia os demais indiciados. Na hipótese, inexistiu qualquer oferecimento de a quem que As autoridades tão-somente buscaram evitar a submissão de pessoas de bem - obvi mente não eram - ao vexame de se verem no foro criminal.

Sü() os crinúnosos? Crinu! e crinúl1osos: en/c,\'

Incapacidade do Agente Quanto a se Beneficiar da Corrupção ou da Prevaricação

75

No processo ele a que são submetidas as práticas cri-com o vo de livrar de os

centes às castas e destinar à punição formal aqueles oriundos da ralé, i emprego de variados filtros. De uma

esse cuidado assegura ma de erros -' nào se vá misturar um de por alguma falha, com o joio a ser do na lixeira penitenciária. De outra parte, como a c1ireção discrimina­tória realmente dcsejada deve ficar escondida atrás de uma cortina de ambigüidades, o emprego de variados e sucessivos dialisadores na administração da justiça permite a manutenção, formal, da crença na

e santa, cxata-

mente não a

con10 o faziam ~IS que antecederam na história. Como lembra James T. Carey: "As leis criminais revelam-se por si mesmas como instrumento de dominação. A legisla­ção dirige-se abertamente contra as classes mais baixas."

Causaria enorme constrangimento editar um texto legal como o a seguir transcrito:

"Das pessoas ql1e são escusas de haver pena vil - para que saiba, quais devem ser relevados de haver pena de açoites, ou degredo com baraço e pregão, por razão de privilégios, ou linha­gem, mandamos que não sejam executadas as tais penas em os Escudeiros dos Prelados, e dos Fidalgos, e de outras pessoas que costumam trazer Escudeiros a cavalo, ora o cavalo seja do Escu­deiro, ora de seu Senhor, nem em moços de Estribeira nossos, ou da Rainha, Príncipe, Infantes, Duques, Mestres, Marqueses, Pre­lados, ou de qualquer do nosso Conselho, nem em pajens de Fidalgos, que por tais estiverem assentados em nossOS livros, nem em ou seus filhos, nem nos Procuradores das nem em e Pilotos de Navios da que andarem em navios nossos, ou de cem , ou daí para ainda não nossos nem dos amos, ou colaços dos nossos Desembargadores, ou de

Page 47: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

76

de ou daí para nem nas pessoas que provarem, que costumam sempre ter cavalo de estada sua

c isto que ou fi lhos de os Mercadores que tratan::m com para címa."20

Naturalmente, a democracia do Estado dades de classe se di

mas várias

de chtí

aI uma.

enfocado neste itern ofere­ce excelsas vantagens, mesmo que, por sua causa, a máquil1a da justi-ça criminal a permanente increpação de desonestidade e hipocri-sia. ao reverso do que

serve ele úl íl na

prestígio Dinheiro, importância, poder são os atributos que mais agudamente extremam os grupos superiores dos inferiores numa sociedade dividi­da. Autorizando a que tais predicados ajam com eficácia na tarefa de batear a ganga criminal, obter-se-á uma separação bastante perfeita entre o metal de valor e o reles cascalho. Sob esse priS111a, por conse­guinte, o dado discriminatório em pauta se harmoniza com e comple­menta eficientemente o trabalho desenvolvido pelos outros anterior­mente examinados.

Como a principal peneirada incumbe à polícia realizar, e como, para que o fator em causa funcione a contento, impõe-se do operador aptidão para se deixar comprar e/ou intimidar em larga esca­la, fica fácil compreender que, para o sistema, só interessa contar com uma polícia tanto venal quanto submissa ao jogo das pressões.

Assim, a pretensão de reformara polícia, purificá-la, aperfeiçoá­la, dignificá-la, transformá-la num órgão reta, honesto, equilibrado, traduz aspiração ingênua, desligada da realidade.

Somente sendo corrupta e prevaricadora, a polícia satisfará as expectativas nela depositadas pelo sistema.

20. ORDENAÇÕES FILIPINAS, Livro 5, título I capur.

do

c

77

o

União Soviética ou a Coréia

em que o Estado se mas os usa para favorecer

elementos e fica deles detém a hegemonia. O que, de resto, aguça

aperfeiçoa a capacidade selctiva do de segurança. A , em de ser considerada

se mostra,

lirar até em l1lai~; um inslrumento auxíl io na stotus C/IIO.

A podridão policial, apresenta-a como questão fruto dos defeitos e vícios dos indivíduos que, no momento, exercem a ativida­de repressora. E sustenta que basta sanear e aprimorar os fun­cionais para que o órgão comece a desempenhar suas atribuições de forma lirnpa, justa e correta - quando então todos viveremos no melhor dos mundos. Ciclicamente, promove campanhas de depuração nas hostes policiais, aplica mais recursos no setor, aprimora equipa­mentos garantindo que, logo, logo, a perfeição será atingida e aÍ...

Por meio da manobra diversionista, convence a população de que o problema da distribuição de uma justiça criminal profundamen­te viciada e deteriorada decorre de mero acidente, de má administra-

ou, ainda, porque de um povo que não presta fica inviável imagi­nar que se possa recrutar gente de bem para compor o corpo policial ("cada povo tem a polícia que mas que medidas enérgicas estão sendo levadas a cabo e, daqui a pouco, teremos um organismo puro, eficiente e equânime. Com isso, as pessoas deixam de questio­nar a validade do próprio sistema, esgotando suas as em brados de revolta contra a polícia que atuall71cntc existe.

2. t. KONDER, Leandro. Introdução Rio de Janeiro, Graal, 1979.

Page 48: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

78

Enquanto se atenta para o que se pretende seja um caso de mau a que o

fundamentos do sistema. L~Ii11(:ntável é que pcssoas de bons

a trucidar as fOf11<ldas de aos altares da purifi

holocausto se concede como

embar-que costu­

verdadeiros bodes de existir da

cm alterar a si Lá se vão escri-a pagar por um estado de coi-

sas continuará o mesmo, e dentro do mellte a atorcs, pois tal imprescin­dível para que descmpenhem seus papéis de acordo com o roteiro da pcça. Ademais, os corpos sacrificados pertcncem a membros das

fcrimcs, o li ue o Crl me até cicnti

do acusado implica último.

d

altamente favoráveis para o

Enfocado do ponto de vista formal, o fato não encontra expli­cação.

De acordo com a letra da lei, afora desimportantes, nenhum espaço está previsto para a atuação de causídico no inquérito. Por obedecer ao denominado "procedimento inquisitorial", a autorida­de que o conduz age da maneira que melhor lhe aprouver na co/eta dos elementos de prová, descabendo vaza, em plano legal, para a intervenção da defesa nessa fase. O equilíbrio de ações entre as partes (princípio do contraditório) vigora quando o feito tem curso já em JUIZO. O delegado, na atividade preliminar, dirige seu trabalho como lhe parecer mais acertado, dispensado de fornecer explicações ou deferir requerimentos das partes e de seus patronos.

Inobstante tal circunstância, raro é o caso em que uma pessoa de médias posses para cima deixa de se fazer acompanhar de advogado na polícia.

Por reservado de para ser

o ser nido de acordo com as . impedir que o constituinte sofra e

os crinlillO,YO,S' ( CrinlC e crúJ1ino,yos: entes 79

arbitrariedades; manipular convenientemente os frutos de pedidos de pistolões e do fornecimento de a quem e

Examinemos a

remetemos o leitor i't 80.

Os policiais mente ar com o a fazê-lo direramente com a parte. Inspira conhece melhor as regras do . representa um de certa ou muita conduz a transação sem vacilações e riscos (coisa inevitável quando se trata com um , conhece as I i em que pode ser atendi-

de sorte a eL\s

di de si

estarem todos em coínina pena severa.

de

Quem funciona na área penal conhece sobejamente a importân­cia da presença do advogado no inquérito. Da simples leitura dos autos, com um pouco de prática, distingue-se, sem possibilidade de erro, os casos em que o indiciado deixou de contar com ela.

Como, porém, oficialmente, inexiste um papel definido para o advogado na policial, que, por suposição, seguirá os mesmos rumos com ou sem a interveniência de causídico (a lei presume, tam­bém, o respeito da polícia aos direitos de todos os indiciados), a Assistência Judiciária, instituição encarregada de prover a dos réus , não prevê de advogado para assisti-los nas delegacias. Com vez, executa-se o jogo duplo da

da igualdade de todos (no plano se desequilibra a posição dos membros das

à dos indivíduos bem situados

Trata-se de mais uma está

o sistema está atingindo seus objetivos.

Page 49: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

80

mais eslÍ-l11ulado ficará ()

indefeso estará o D30-nos notícias os

ia de os U acreditar que ()

E no nos,>o caso'?

sociaL

para a Rússia ou a China ficilmcnLL' comunistas são fornecidas por fontes desa-

A m~lioria avassaladora dos delitos elucidados o com base na confissão do autor. () da concentra-se

do indiciado ou O resto da atividade 1-

núcleo. elementos contra si mesmo, o trabalho subse-

demonstrar a veracidade sua por isso ou por a confissão inocorre.

to central cap~lz de fornecer um sentido coordenado ao 1I1VCS­

l o tenderá a se , os adorando dirc-

81

ma rOl,) de que cio

de !'Clrma quase' absoluta, nbtcr :1 con­

Ct~l S cm coagir.

lidade d,) O reslo e()nsuhsC1l1l:t~1 l11ero

a l11V1

delitos

Quanto aos dois itens, há uma direta deles com o nível social a que o indiciado e com económica. Tendo recursos, poderá contratar um bom qual não só saberá eficientemente para garantir a cliente como, também, por sua . rcceio aos ais ele virem a ser emprego da tortura. De outro lado, no cír­culo de conhecinlcntos dos familiares elo se tal se dá llum padrão de das em

que estiver sendo autor, à para mexer-se

contra a violência, uma vez que, de qu uer se reconhece formalmente como Trat,lI1-

de um elemento izado,

ciai que, dessa abusar de esclarecimento do se 1

dos métodos q II e cone! li zi ram ao sucessu ela i J1 vcs( i cm face da prova da cul pa e!o

Page 50: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

82

embora raramente ou nunca se reconheça expressamente, todo o mundo concorda em que a única via que se mostra segura para

de um delito é a da que, por . Com

examinar um processo, um são minuciosa do detalhando

todos os elementos para autoridades não se sensibilizam 110 sentÍ­o motivo que levou o deI inqüente a se

auto-acusar? A não ser um que outra razão será 1 como válida para icar uma confissão intei-ramente comprometedora? Afora raríssimas exceções, as declarações auto-incriminadoras só ser concebidas como fruto de exercícío

caV:l

i vamcnl de q ue Li lou de tortura, encontramo-la os dias na maior parte dos processos criminais, que constituem massa de trabalho do dia-a-dia do foro: confissão por­menorizada na delegacia e negativa enfática no interrogatório em juízo, explicando o réu a discrepância pelo fato de haver sofrido seví­cias na polícia. Na maioria das hipóteses, duvido que alguém tenha dúvidas a respeito da veracidade da . A preocupação, contu-

do promotor e do juiz desliga-se de tal circunstância para se CC)!1-

centrar na verificação de existir no processo dados comprobatórios de encerrarem as declarações um conteúdo de verdade.

Limitam-se a indagar: há contra o acusado somente a confissão, de outros elementos demonstrativos de que o nela

descrito é verossímil, ou casa-se com outros elementos de prova? Assim, por exemplo, se o delinqUente contou na polícia que fur-

tou isso ou aquilo e que vendeu coisas a fulano de ou as empenhou na Caixa Económica, e a realmente encontra e apreende os objetos no destino indicado, tem-se por seguro que a con-fissão só pode ser verdadeira, de outro

da res mediante o conteúdo de verdade do )

, limita-se o julgador a expressar seu COI1-

83

a absurda, mas que ocorre na

nio samentc parte de ll1(lgistrados

rem o llnico adeqmh para tais casos, no scntido de que: ° acusado é culpado, pois sua confissão está confirmada por t:ircunstâncias que lhe comprovam a veracidade; mas dita confissão evidentemente foi conseguida mediante mento da vontade

icinis que a arrancaram, \) cmprego da tortura

!l1

reitt:.rada c o cndusso dos tribunais. Illstituci\lllaIJzanclo­sc, funciona com maior eficiência. Às vezes, nem é necessário à polí­cia bater: a certeza de que a violência no interrogatório ocorre sem maiores rebuços, sem possibilidade de ser coartada e sem perspectiva de gerar qualquer responsabilidade para seus autores, leva o indiciado miserável, mesmo antes de sofrer concretamente a aplicação de sevÍ­cias (maus-tratos sempre há, tais como berros, ameaças, empurrões, cascudos), a relatar todos os pecados de sua vida.

S que dos milhares de delitos patrimoniais cometidos, air;da dos que chegam a ser objeto de registro (a maioria não é), prati­camente nenhum Gera uma investigação específica. Não há meios b " ~

para realizá-Ia. Serão os casos (inclusive, com freqUência, os não-registrados) deslindados quando, preso um ladrão por qualquer moti­vo, for submetido a "hábil interrogatório" - corriqueira, que encerra manifesta ironia, mas que é encarada com absoluto cinis­mo por todo o mundo, que não provoca nenhuma verdadeira repul­sa. Aí, o ladrão confessa 10, 20, 40 delitos, e os casos que estavam adormecidos no bolor das são trazidos à tona e

como de "'l de êxito",

as não sucedem ao relato do Relativamente ao ora nem se cuida muito

de disfarçar por meio de complicadas ambigüidades e construções

Page 51: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

mostra-se de fáeil

com bas­"tem que

ele indivíduos e náo a outras - c aí ocorre algo pos-da Essa

se enraíza no mesmo elemento qUl:, fun-eomo de na do

crirninal: a classe social dc onde Ern virtude ela de em que ficam os poli-

s -- cobra-se-lhes a solução dos casos, ainda que 11, oficial

a autoria do crime e fazer boa prova quando recebem vantagens elo criminoso. Nessa área, a corrupção torna-se muito difícil de ser com­batida. Aqueles que poderiam puni-la reconhecem: sem o emprego da violência, a maioria das investigações fica fadada ao insucesso; porém, por outro lado, não podem do policial que use a violên­cia, pois formalmente está ela vedada. Para desespero, sobretudo dos promotores, à vista de uns autos de inquérito que transitam da polícia para juízo .e;' vice-versa, por meses e anos a fio, sem que se consiga recolher quaisquer elementos conspícuos de prova, descabe uma ação formal capaz de pôr cobro ü inépcia do investigador, embora, como se pode perceber sem muito esfoí'ço, comprado para não descobrir nada.

A corrupção, como já verificamos, aproveita a quem dispõe de recursos e todos sabemos quem dispõe ele recursos numa sociedade capitalista.

Sem embargo de reconhecer na confissão do indiciado o ponto mais importante quanto à eficácia da violência policial, cabe lembrar que não está ela limitada exclusivamente a essa questão. As invasões de .. casas, a detenção e, às vezes, a tortura de testemunhas, o falsea­mento dos fatos, o seqUestro de parentes do indiciado, a em flagrante por vadiagem (contravenção inafiançável) como recurso

to em contra frutam.

,",'tio os criminoso,)''! Crinlc crill1inoso,L' ente,)' 85

de coisas em desacordo de toda uma séric de

de um c1cli­mais uI

em face do baixo St{ltus social de que des-

a de chamar a para uma interessante manobra inventada para ou o esclarecimento de certos crimes que nilo interessa esclarecer, mas com base na silivo de s

Refiro-me iI pela de, promotor público para acompanhar certos

ado ta-se tal

que, em rica ou faz-se mister a presença moralizadora do promotor, a fim de que seja viável chegar a bom termo a investigação. Geralmente, são escolhidos para desempenhar tais missões os membros do Ministério Público mais afamados em termos de responsabilidade e reputação.

À primeira vista, a medida afigura-se altamente positiva. Tenho para mim, contudo, que, quando se determina a um corre­

to promotor que participe do trabalho policial, objetiva-se, precisa­mente, não solucionar o caso, contando-se com a presença da ilustre figura tão-somente para respaldar o insucesso.

Na verdade, a presença do promotor serve para assegurar, pri­mordialmente, a interdição ao emprego da violência na investigação. E, 'sem violência, ou não se apura nada, ou o que se apura padece de pobreza franciscana em termm: de prova - tudo a benefício do culpa­do. Quer dizer: o promotor funciona como garantia de que a lei vai ser respeitada; ora, quem se beneficia do respeito à lei é o indiciado, uma vez qtíe a polícia costuma mostrar rotunda ineficiência quando se dis­põe a trabalhar estritamente dentro da legalidade. Com a presença do promotor, o indiciado faz até economia, lÍm vez que não precisa pagar aos investigadores para que respeitem a leí. Isso, aliás, origina uma indisfarçável má vontade por parte dos agentes encarregados d~ c~so: não conseguem dele tirar proveito pessoal nem conseguem elUCIda-lo.

Page 52: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

86

E resmungam, enquanto fracassam: "Com esse cara aí, como é que Se me meter o cacete em dois ou

lava resolvido há muito tempo, mas o é cheio de com ele para eu à moda - ih, o Então quc se Ele que se vire.

r:.; o inocente promotor não que sua se em última como forma de

so ele I LIXO - exatarl.1ente ao contr6rio do que

participação no o crimino-

De acordo com a estrutura formal do aparelho repressor, ~,~re () a llvacla do

esta!l­sob o

mia a Na rcal é a l'Cl','1 C'jllCll1 "t

faixa de atuação dos promotores e juízes, a estes concedida mínima possibilidade de se insurgir contra tal controle.

Formalmente, o sistema clama por LIma polícia honesta, branda e equânime. De fato, exige que seja corrupta, violenta e parcial.

Observemos os mecanismos através dos quais se torna viável levar a máquina repressora a atuar concretamente dentro dos padrões esperados e a vomitar, ao mesmo tempo, um sermão em que sustenta exatamente o contrário do que faz.

~ecrutarn-se os promotores e magistrados dos estratos superiores da SOCIedade, enquanto os policiais, sobretudo os que desempenham o papel de lidar diretamente com a descoberta e dos delin­qüentes, das camadas mais baixas; àqueles se fornecem recompensas (status, vencimentos) equivalentes aos dos membros da alta classe média; a estes, os do operariado qualificado; os primeiros merecem uma prote~~o institucional quanto a seus defendidos por uma llldevassabIlIdade quase sagrada; aos segundos se vota um desprezo temperado de complacência, que vezes pode

do para

ou por são poupa-U"'''f''"ét,,.,,,, de se comportar desavergonhada-

süo os crinúl1o,\'o!>'! Cri!llt! (' cri/nino,vos: en/ex 87

mente no concernente à aplicação de uma justiça parcial e classista; a massa dos policiais é retirada da ralé social, cabe-lhes a

de suportar, de forma altamente nantc, os ónus

dores das pu n'

dores penmmeccr intocados.

entre os autores devem purgar as , merecem de tais

Aos domi por sua cm ii que devem ostentar e, até, em razão do autoconceito, repugna mãos em atividades indignas. Que as executem, os que não pres­tam. Postura, de resto, sempre repetida na história do homem, como o comprova a posição social dos indivíduos destacados para exercer as atividacles de carrascos, dos cam-

do chuço da dOl11ina-r que

, daria risco de passar a"atuar como organismo capaz de autodireção e, nesse caso, geraria o enorme perigo de poder vir a ferir a quem a criou e a usa. Por isso mesmo, persistiremos assistindo à condenação e reprovação - verbal - dos abusos e podridão da polícia, no mesmo passo em que se ado­tam - concretamente - as medidas necessárias no sentido de perseve­rar naqueles predicados.

Submetendo o universo dos delitos ao crivo seletivo da visibili­dade da infração, ela influência do estereótipo do criminoscv,das con­seqüências ela corrupção e ela prevaricação, do emprego de violência,

a polícia separar com enorme eficácia, do ponto de vista do sistema, os delinqüentes a serem esmagados nas engrenagens da justi­ça relativamente às pessoas que devem estar imunes à trituração.

Exatamente ao reverso do que apregoa a ideologia, é a polícia quem controla e comanda a atividade do Judiciário, pois este só traba­lha com o material concedido por aquela. Graças a pode o Judi-cÚ'irio manter uma de e pureza, urna vez que a parte ostensivamente se realiza temente à sua e JUIzes inteiramente com ao papel a desempenhar. Afinal, seria um contra-senso desprezar a possibilida..:

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88

de de usar eventuais

até

a justiça parcial e a) a prerrogativa atribuída ao juiz de decidir a causa em função do seu "livre convencimento"; b) a regra do in dubio pro reo, isto é, só pode condenar quando estiver absoluta­mente seguro a respeito da culpabilidade do acus'ado, pois, ocorrendo alguma hesitação, deve inclinar-se pela absolvição,

Descontada a forma impressionista da apresentação, as duas máximas resumem-se, na prática, a garantir um poder discricionúrio e amplo ao juiz no julgamento, /'

Em que consiste, afinal de contas, a famosa "certeza lega]"? Em algo que só tem existência no subjetivismo de quem profere; decisão terminativa, Qualquer pessoa que atua junto ao aparelho judiciúrio sabe, perfeitamente, que fica muito mais f,kil vaticinar o resultado de um processo através do dado "qual o juiz que vai julgú-Io" do que fazer a previsão em função do fator "qual a prova constante dos autos?", O caráter corporativo da magistratura, armação hierárquica em pirâmide cujo cimo é ocupado pelo Supremo Tribunal, para onde são designados ministros nomeados pelo Presidente da República, o sistema de promoções, no qual desempenha papel decisivo ainda o Poder Executivo, tudo se combina de sorte a dar lugar à uniformidade quanto a um certo aspeçto das decisões, ao mesmo tempo em que per­mite, quanto a outros, caracterizarem-se pela incerteza e ausência de

89

incrustados no campo A t;refa básica na apreciação de um processo criminal diz 1'es­ao exame da nele contida, Por busca-se reproduzir um

do

rcu ~ muito grande a do grau de perfeição , de ser " na operação, haja vista que os seres humanos envolvlClos l~um epls~­dio criminal tendem a ter sua capacidade de senso-percepçao prejUdI­cada pela emoção, pelo tipo de relacionam~nto ~om, as partes, pela maneira de olhar o~ mundo, pelas crenças llTaClOnalS que adotam, enfim, por uma de empecilhos que dificu:tam a ~pre,ensão da verdade dos fatos na sua pureza objetiva, Além dISSO, o luncJOname~­to da memória, no que atende à evocação, traduz, como o ate:ta a PSI­

cologia, uma reconstrução voluntária do passado, consclC~te ou inconscientemente distorcida em função de uma de condICiona­mentos deformadores a que está submetido o indivíduo, O ambiente do tribunal também tensões emocionais nos depoentes, que, com freqüência, sofrem bloqueios e terminam dizendo coisas que nem estavam na sua intenção dizer nem guardam correspondênCia com a verdade do que se passou, A prática forense cunhou LIma bastélll­te si 0nificativa a respeito da precariedade das declarações prestadas nos l~rocessos: "A prova testemunhal é a prostituta elas provas," Nesse caso, a imensa maioria das sentenças se apóia sobre um bordel.

. E o que é dúvida, o que é certeza plena? Há dúvida quando há uma possibilidade em dez de que a acusa-

, 1 I' "O I' 'a OSsl'bl'j'Idade é de uma para não seja vere ele eIra! II quanc o esse p " cem? Ou para mil?

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90

Em uma lidade, ainda veraz. Minha

Por a a

incerteza. Na estará livre de

as , uma vez que o material sobre r um de certeza -- ou,

- mas tão apCIl<lS dc

011

objeto, ou, ao contrário, da

mcnos, de certe/o

objeto.

se resulta da vista do dêlCJuele CJue viu ()

Por

sJo q alru OU CICI1-

ou llão séÍo

uma certeza extrínseca.'·22 senil0 ele

Tal circunstância está reconhecida de resto .' " c I . cessu'tJ qu ~ t' ;o-' , • ., plOplld el pro-, " ~', . e ou 10. ndO pode ser o sentIdo do intrincado aranhol de I ecm sos por ela cUIdadosamente elaborado

,~, vDiant~ ~a dificuldade de extrair da p;'ova do processo uma real cei teza, o JUIZ tende a deslocar o objeto de i c" , -I .. ' menos dúbi-l " .. paI d sec e

" c para ele, se ahgura mais palpável mais concret'\-mente apreensível' a fiuu" I· d . ' < o . ,'. . b. I d (O dcusa o. E aqUI relcvo especial ganha

que subJeuvamente alimentado um criminoso.

. .rOUVET, Tmílé de

um que conduz o juiz

Paris, E. Vilte, 1949, v, I. p, 1

,v/ío os' crinllnosos? (:rimc crinzinosos: entes 91

mas opções eticamente comprometidas que, por sua vez, já cm escolhas probatórias valorativamcntc determina-

das. Assim, no discurso j , () critério de é

anto ü ia entre os cfetivamente ocorridos e os juízos decisórios, sabemos que a lhe o verossímil e não o verdadeiro, Nilo c',;{io mente ditos que se provam. as afirma-

de sua existência e da a partir desta o juiz resgata o que

e constrói a

"Assim, no processo penal, não existe demonstração da Em ambas as instf\n-

Na forma da o deveria examillar a prova do pro·-cesso para concluir se está demonstrada a existência do delito e sua autoria por parte do réu. Atingida tal certeza, então se preocuparia com as condições pessoais do culpado, para o efeito de escolher a pena a ser aplicada. Na prática, porém, há uma inversão na operação:

o exame da pessoa do réu, a ver se corresponde ao estereótipo do clelinqliente, para depois verificar-se se os autos fornecem elemen­tos razoáveis para amparar a decisão sugerida pela convicção previa­mente ·Para tal convicção, a fonte de certeza reside em algo extrínsecoü prova do fato, pois sobre a prova relativa ü per­sonalidade do acusado. E, então, um dado uma importância

: seus antecedentes. A existência ele anteriores cnml-funciona como o verdadeiro fundamento em que se vaI basear a

certeza do Mesmo o aeusado a

l~ curioso observar corno se tem em ainda há

Rosa Maria Cardoso da. op. ciL, p. I 1.

até

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92

ASSlnl, apesar de tecnicamente de antecedentes."

a existência de um conceito de fora dos limites pela

o fato de ter transi-tada cm j por delito anterior. O que é uma defini-

jurídica de reincidência, da qual não se consegue entender como

o acusado só se compreende ade-

rência dos magistrados ao estereótipo do criminoso definido pela ideologia: indivíduo da baixa classe sociaL com folha de antecedentes rnanchada.

Configurado o tipo abstrato do deJinqüente, basta encontrar sua confissão no inquérito policial: dissipadas estão as dúvidas que pode­riam torturar o espírito do juiz, e este condena de consciência tranqUi­la. O móvel da decisão vincula-se muito menos ao fato em si ou à sua prova; o importante é saber se aquele indivíduo deve ou não ir para a cadeia. Não interessa o que fez, mas o que é.

Outro fator de fecundas conseqüências para a distribuição discri-minatória da justiça está representado pela atuação do

O processo, em JUÍzo, reveste a forma de um duelo. Do lado da está o promotor, às vezes ajudado por causídico contratado

vítima ou seus parentes para funcionar como assistente. Da outra parte, obrigatoriamente, terá de haver um advogado a exercer a defesa do réu. O resultado da pugna dependerá, em da combati-vidade, experiência e força dos trocados pelos rios. O sistema encontra similar na ldade Média:

"Outro tipo de I que, não sendo duelo-vingança, nem dllelo-meio-de-prova, não se confllnde~ também, com o duelo de

93

examinavam se os lidadores se tidas as

ita ele

VéU "os I são de Os promotores são servidores públicos,

concurso, em geral bem-remunerados, gozando de elevad? ~·tCltl~S social, tudo concorrendo para que sejam recrutados entre proflssIon~s de médio a bom nível. Os advogados contratáveis pelos acusados sao profissionais autónomos, cuja sobrevivência depende, em grande parte, da obtenção de resultados favoráveis nas causas e:11 que atuam, escalonando-se, informalmente, em razão de suas qualIdades, .desde aqueles pouco dotados (mas baratos) até algu..!).S verdadeiros lUJ11mares (porém caros). Aos réus carentes de recursos . contratar ad~ogado particular, o Estado os defensores públIcos - esco1l21clo.s ~e maneira semelhante aos promotores, mas com ganhos e çoes mte-

riores a estes. . . aqui, embora de fato ocorra algum desnível, pode-:,c admitIr

que, os campeões um certo eqUlI. em termos de força. Dadas circunstâncias, todavia, drastIcamente

o quadro. -Já anotamos, anteriormente, que o indiciado que pode contratar

adVOGado conta com sua atívidade desde a fase policial o que nunca b

26.-'ITIOMPSON, Augusto P. EscQrço histórico do díreiro criminal Rio de Janeiro, Editora Liber Juris, 19R2, pp. 53-54.

Page 56: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

Y4

facilitando o que o cliente da defensoria

ça a terreno no ilíbrio de Isso vai acentuar-se, de maneir<l brutal. em seguida. A grande massa de réus que a íci,\

um tipo

barra tribunais constitui-se de honorários ainda ao mais modesto ou

Com isso, a clientela dos defensores Fica-lhe, literalmente impossível dedicar cuj-

a cada um dos casos que são postos sob sua responsa­conversar COI11

CJua pruva guem re;Jliz~lr: os aIos s - J

l1111nhas, alegações orais e escritas - sucedem-se numa torrente insu­portável, que não consegue ser acompanhada, mesmo em plano mera­mente formal, pelos massacrados defensores. Para resolver o proble­ma, o jeito é apelar para o concurso de - estudantes de direito - no sentido de lhes cometer a maior parte das atividacles na defesa dos réus Corriqueiramente, o passa a exercer

uma fiscalização sobre o trabalho dos estudantes, ]imi tando-se a chancelá-los com natura em e defesas, com o que atende, formalmente, à constitucional da "ampla defe-sa" a todos os Em nada foi

uma vez que a ocasional boa - ou até o e o de estudante - é insuficiente para permitir o desenvolvimento

de uma Triste verdade que com absoluta segurança: a

maioria dos réus é sem ou, o que dá no mesmo, com um mero simulacro de defesa.

Por tudo 95 das camadas nalizadas da

dicional recebe decidido amparo a do fato.

que cega nClscença, depois' mil dos anciãos, que pensnva pr()fundal71enle, teve 1:01/0

idéia. Ele era () mClior doutor entre esse povo, seu e tll7ho um espírito filosófico e . assim a idéia de curar Nunez de suas peculiaridades. Um dia, quando faco!J se

ele voltou afolar no caso de • • 0. /7al'" !'ll·l·}1 o caso é claro. Examine I L Lf'

Considero muito ele ser curado. _ É o que sempre supus - disse o velho Yacob. __ com o - () doutor cego.

é que () ataca?

Ah! - disse o - Isto -

Edaí?- o

e que existem no caso de

Süo movem e, em

constante de

-E

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96

-- Creio cml! !JasfOlIfe certeza que. para curá-h) por bosto-nos IIIIW e

saber renw~'cr esses irritontes. luento/mente :;

smlio e será fim cidadüo admircíve/. eéils ciência.! eXc!(//1l011 () velho

imediataJ/lente cOJl/wlicar (l SilOS e.\'I)C-

com as cores vistosas do pro­gresso e da benemerência, por isso endossado ingenuamente por libe­rais e homens de boa vontade, atua, de fato, como eficiente ferramen­ta da opressflo/repressão, a fornecer-lhe meios tão duros e cruéis quanto os castigos empregados pelo direito penal retributivo. Pior: na medida em que oculta o verdadeiro objetivo atn1s da fraseolonia da

. . b

ressocwhzação do delinqUente, cega as pessoas quanto à violência dos métodos empregados, dificultando, assim, o surgimento de movimen­

resistência contra eles, Os instrumentos inventados como aptos para atender a tais pro­

pósitos ambivalentes são a penitenciária, o manicômio judiciário e o internato para menores, com um desdobramento posterior constituído pelo denominado "tratamento em comunidade", cujos precursores foram o livramento condicional, a suspensão condicional e a liberdade

ada. A incapacidade de alcançarem as instituições fechadas os fins a

que se propõem encontra-se hoje comprovada de maneira irrebatível, embora ainda haja batalhões de e que cOI1ti~

I FROMM, Erich. Psíc{//uílise da suciedade 3. cd. Trad. L A. Bahia e Giasone Rebuá. Rio de Janeiro, Zahar, s.d., pp. 190-1.

97

meta-

sistéma viu-se do fracasso dos cíta-

a mesma c evitar o desmascaramento dos reais

a cm

niio tinha (l menor idéia do que significavam latitu­

de que er(lm

em variados nomes: ção, cura, educação, reeducação, reabilitação, regeneração, emenda e outras tantas, o que parece indicar, por um lado, que ninguém sabe precisar exatamente aquilo que se visa a conseguir, e, de outro lado, que o verdadeiro desígnio a ser alcançado se oculta sob o véu dessa

rica prolixidade. De qualquer sorte, o tratamento penitenciário aponta-se como o

alvo principal a ser atingido pela pena prisionaL Principal, mas não exclusivo. A seu lado, alinham-se outros, menos altissonantes no plano verbal, mas cobrados com severo rigor: punição retributiva pelo mal causado com o crime; prevenção da prática de novas através da intimidação (particular e geral); e separação do indivíduo relativamente à comunidade livre, Havendo atrito operacional entre estes fins e aquele alardeado como meta precípua, inadmite-se o

fício de uns em homenagem ao outro.

2. A é de Rupert Cross em PlIllíshmellf. Prísol1 (md lhe PlIb/ic. Londoll,

Steves and Sons, 1971, p. 165. 3. A matéria deste n. 2 contém um resumo da obra de minha autoria, A

lencíâríLl. 5;[ cd. Rio de Jancíro, Forense, 1993. 4. CARROL, Lewis. Alice's Adventures in Wonder/(ll1d. Oxford, Uno Press, 1976,

p.l1.

Page 58: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

98

A combi dos objetivos dificuldade de ser ainda no plano meramente

retributivamente é E os

A falta de penitenci

uma ada ao tratamento em duas

correntes: uma, aproximan o trabalho reeu i1 ativi m é d i c a ; o II t r a , a sim i 1 a 11 d o - o p r ~lt 1 C a s e LI li C a c i o Il is.

mente. em terreno Uio indefinido e fi há urna forte ten-dência para as co do que resulta o

teórico da condução da vida prisional, com grande freqUên-cia, a aparência de um colorido coquetel, cujo conteúdo pouco tem a ver com os materiais que, , o . E se olvida uma Clrcu lâilcia relevante quanto ao dcft~it() de L10

é, sofrer, em nume ela retríbu () paciente/aluno durante o desenvolvimento do processo curatí­:o/didéltico. Só mesmo o penitenciarista, que nem é doutor nem pro­fessor, pode ser capaz de encarar a sério a estrambótica incumbência que lhe é proposta.

Gravame de maior envergadura, porém, na rota da satisfa-ção do alvo apresentado como o mais importante. É que ao lado das metas formais atribuídas à prisão - as quais, como parece evidente, testilham entre si -- há ainda objetivos outros por alcançar concomi­tantemente: impedir que o preso fuja e fazer com que sil ordem intramuros J inauaoem "sses b b \...,' ~ ,

nam-se segurança e disciplina). Em doutrinárias, informais são rigor pela sociedade, razão que os a se transformar, em verdade, na finalidade centra-/. dos estabelecimentos Para

se, predominantemente, os controles do mundo livre, no sentido de fiscalizar-lhes uma exata consecução, no mesrno passo ern que aque-les demonstram frouxa no que aos

Bernard Shaw CROSS. Steves aml Sons. 1971. p. 47.

PUI/ishelllcnf, Prisoll mu! Puhlic.

selo os criJninosos CriOlC e crÍnlÍ!lo.\'os,' entes 99 .

vos formais. Observe-se, verbi gratia, a assiduidade com que retor­üs vezes de 101lf'O pessoas que mal saÍ­

ram exatamente por. haverem ídênti-cos aos que as levaram a ser A reíncid(~ncia presl~me-se que entre do que não há certeza por falta de est,ltÍS-

número, porém, que se considerar como muito face dos dados de outros

com o mais rico c sofisticado sistema do munJo, mais de A .recidiva implica a prova incontestável de

a falhou no como na meta intimidação): submetido ao tratamcnto, com freqüêncía por vários, muitos anos, o indivíduo continuou tão criminoso como antes. O fato,

ostensivas ou mani

assimilado com hiJi Illlltilll. u! homicídio intramuros dand()

lugar, muitas vezes, a verdadeiros escândalos públicos. Movimentam­se os de comunicação social, a matéria ganha manchetes de primeira página dos jornais e o horário nobre das de televi­são. Os episódios são investigados com a finalidade de apurar respon­sabilidades e disso resultam punições formais (demissões, processos cri ou informais desmoralização dos culpados). Ora, nunca ninguém se lembrou de adotar medidas semelhantes para o caso da 1:9l1cidência do egresso da prisão indivíduo submetido ao trabalho curativo/reeducativo elo tratamento penitenciário que comete nova i i1 entretanto, prova de que a i quanto ao alvo apresentado oficialmente como o mais importante c, logo, seria curial identificar

pelo insucesso, se tal é a medida adotada no diz res-na dos fins informais de seguran-

vê-se

ele, Ir

um me de asfixiante cerceamento à da disciplina "preço alto que se paga pela

Page 59: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

100

do (e'l

ma requer ()

d~lde, ~t ~1111ocunfi;HH:;~~1~ ~lt)

coerente FeLl

do aUlodisccmÍmenlo, (1<, de

I i­ra\'or:íYel

d com uma

que a lilli­I i-

c!,;

(cdu" os fins

íolítica uper(1-infnrmais

ser ati concumitantel s() resla saerificlr tlllS cm uutros, Pelos motivus ,1lL1S -apon

livre para soas, ou não em reconhecer a manifesta

Dois al a controles do de quc tal troles forem

de livre,

fornece mínima segurança v s que os C()l1-

dife-

;\ i fechada "não é uma miniatura da sociedade livre. mas uma sociedade delltro de uma sociedade",') uma VC7 que nela foram alteradas, drasl numerosas elo mundo extra­muros:

JONES. H,)W;lrd' Crime ({/Ir! lhe 1'('110/ 3, ccL Londol1. lJn, Tutorial Prcss. s.d" p, 24"+.

,SYKES, CJreslJaIll, up, cÍí" p, 4i:l, í-\, FOX. Vemoll. Prisol1 nar)' I'roblcms, ln' JOHNSTON; SAVrrZ & WOLF-

GANO, orgs, Tile !'lIllishmcl1l ([1Ir! Corrcclioi1, 2, cd, York. John Wi af1(! Sons, s,lI" p. :19,+.

,){IU (JS cTinúnosos! Crill)( .. ' e c'}'inú!iosoS. eníes IIH

"N:t vida vil. o cidadão é, geralmente, membro de uma

la, um nl1;:\ ,de

ilIIU CC111l níd

permanente, con.línuu c,

cm contraste.

da 111cnt,; resultantes da muradia numa

embora cm

reI compu!sórí;lS

local de

s, que "treinar homens pare ti vida livre

os a de II se tão absurdo "como 12

para uma corrida ficando na cama por O uso da da liberdade humana deu lugar ZI

como é dinaria este. eOn1l1l11ente acontece, desenvolveria um mal, chi concreta dos

ndendo esse fato,

nificado da vida intramuros não muros e celas e trancas. Os

<). SYKES. Grcsh~l111. ()jl (ir., p, 75, 1o, CHAPMAN, Dcnnis. (1), (·il., Pi', 201. 203.

mas, como infor-

dos se iram en\'ol idos.

1 I. CROSS, Rup,:rL "IJ, !'ÍI. p, ! C" . 1 Thomas M, Osbornc iljmrl SUT1-IERLi\i'JD & CRESSEY. PrinciJJes

I e J'li71I1IO-

V crsflO francc,sa do Inslituto de Direito dn de

Paris. Ed, Cujas. 1966, p, 51 J,

Page 60: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

102

comunitárias são de . fundamental, se se las no modo real ele

Pois é

a caractcrística marcante da a tentativa mai extremada

captá-

ele um grupamenlo mano a um de controle total. As regula-estendendo-se a todo o c;:lmpo ele individual, a

lfincÍa constante, a do nas mãos de uns pou-cos, o abismo entre os que li-dade de si de tudo concorre pare identificar no caso um Acrescente-se que a ali - presos, soaI da direção -, vê-se comprimida numa área física angusta, as pes­soas viver numa intimidade esl onde a conduta de

"Nuo é ~1 rba os indivíduos mas u

'ndo cm cOlldi-que Illl ln na vida 1 que illgrcssd

dade peculiar submete-se a um processo dc assimilação, a que Donald Clemer 15 batizou com o nome particular de prisonizaçclo. O pri mei ro passo, e o mais obviamente integrativo, diz com o status do novo membro: transforma-se, de um golpe, numa figura anónima de um grupo subordinado; traja as roupas características elo grupo; é interro­

descobre que os custodiadores são toelo­as classes e graus de autoridade dos funcionários:

usando ou não a gíria local, apreende-lhe o acostuma-se (l

comer apressadamente e a obter alimentos através elos truques empre­pelos lhes estão próximos; adquire -novos hábitos sexuais: ria de todos; olha com rancor I"OS;

do de diversificadas e deve administrar por ele -

uma

cÍl" p. 14.

JOHNSTON, SAV!TZ ol P!llIisfll)/Cnr (/1Ir! Correcrioll. pp. 47 t)·N3.

o ele que o meio ambiente

e de difícil da atitude

(j,y crilninosos? CriJne e criJllinu,Yos: entes 103

na vida civil -, do que lhe resulla "adotar do mundo".!6 A da e clis-

ilimitado sobre Vcda-se-lllc

Cumo de um elas. O preso está (inal' J

as minuciosarnen devem provir dos

rimcntar () sentimento serem corretas ou uma obediência cega, que leva ao automatismo da conduta, habituan­

ele. E

ObVl:J!llcntc

di ;,111 o modo de vida nada surpreendente, a grande maioria dos egressos dos estabelecimen­tos carcerários tende a retornar a eles, pois se transforma em clientela crónica da instituição fechada.

A incapacidade regeneradora da prisão, como se resulta de condições ínsitas na própria illStítuição, ao contrário da desculpa

pela qual se justifica a insistência na sua manutenção, de que os fracassos constatados da sua história - em todos os em todos os lugares -- decorrem de meras circunstâncias conjunturais, sobretudo pela precariedade dos recursos alocados ao setor. Não é

ste a mcnor de resol-

tica concordam em do tratamento

necessário resolver, preliminarmente, o problema da superpopulação . Acontece que tal insol A

de quem estudou o

1(1. i\ nbservaçilo é Tania Maria Dahmer Pereiral colhida

Page 61: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

104

sistema CE

vagas

do Estado de Süo

o País tem cerca ue 60 mil

viabilizar o conseguíssemos nosso sistema úrio ao da

metamorfosear os criminosos em nüo-crimi colhidas por Jonatham

e mesmo nas galeras és nocivo és um estorvo, és um tUlnO/: ..

Se pensas que pensas, estás redondamente enganado e com.o disse o DI: Eiras vem chegando aijunto com o delegado para te levw: .. "17

.Caracterizados por pertinaz repugnância quanto a se submeter pacificamente à injustiça das estruturas sociais, impermeáveis à cate­quese da ideologia, dotados de teimosa resistência aos castigos infligi­dos aos transgressores das normas penais, destoando com freqüência da conduta desejada pelo sistema, uma categoria de infratores gera uma preocupação - verdadeira dor de cabeça aos mantene­dores do slatus quo; os criminosos multi-reincidentes. À proposta ele vida que se lhes faz, no sentido de renunciar de forma quase absoluta ao usufruto das amenidades do mundo, ~t possibilidade de realização como seres humanos, reagem vigorosamente, às ferozmente, na

17, CHICO BUARQUE DE HOLANDA, Hino de f)UrlIl1,

105

ini-maIs

tendem a

revela o grupo, Insuficientes mostram-se, para an comum dos !lO manto de uma

desu-

mano e O discurso de como lógico e

as penas, embora dirigidas precipuamente à recuperação ainda um expiatório, de punição

o não pode ser estes

gos, ao praticá-los em contradição com as normas legais; corno, porém, a permanência tais seres em meio à comunidade livre acar­retaria gravames para a última, pondo em risco a própria seguran~a pública, tornou-se forçoso encontrar uma solução que atendesse as duas ordens de interesses: defender a paz social, de um lado, e, de outro, fazê-lo independentemente da submissão de irresponsáveis às dores das sanções criminais .

./

"As medidas de segurança justificam-se porque necessárias à defesa da ordem jurídico-social contra o crime, Alguns autores não se satisfazem com essa justificação e procuram aprofundar a pesquisa em busca de apoio ético-jurídico. Mas deve-se ponderar que a ordem jurídico-social é um valor é legítimo de~e12der pelos meios necessários, embora estes impliquem em restnçao a direitos individuais, desde que esses meios sejam empregados, com as garantias pelo Direito, Essa necessidade de

de um valor IJrimordial para a coexistência humana basta a justificação jurídica e ética na medida de

"18

18, BRUNO, Aníbal, o[l, cit" v, 3, p, 287.

Page 62: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

106

No que concerne ao delinqUente multi-reincidente, a justificativa panl excluí-lo do c8mpo ela pena para medidas de segurança mostrou-se um foi apelar para ()

Ea fornecer o

na viável assimilá-los aos irres-

26 - É isento de pena o que, por mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao

da ou da inteiramente incapaz de entender fato ou de dctefl1l in de aconlu

os mul I1C dos ri pena, foral!l para o redil das medidas de segurança. Porque estas, corno

se reconhece na justificação que lhes acompanhou a criação, podem importar "em restrição a direitos individuais", compreende-se que dis­ponham de força para determinar o sacrifício da liberdade de seus beneficiários. Daí, não deve causar nenhuma surpresa que a legislação

a previsão de medidas de segurança detentivas - haja vista tratar­se de mero corolário das colocações antes feitas.

Em princípio, no plano teórico, essa detenção há que ocorrer em outro tipo de estabelecimento01ue não os penitenciários, pois não são penas. Destinaram-se, então, os manicómios (novo nome dos hospícios) para os multi-reincidentes.

A éonseqüência mais importante - ou grave - a se retirar da inidentificação entre penas e medidas de segurança, com base na idéia de que estas ditadas a de scus contemplados, é que:

de segurança nc7a se estende a sistema de que cerca a área de penas.

tratemos de descobrir que de carne se esconde debaixo do angu da retórica atinente ao em causa.

107

"Multi-Reincidentes

"Da terra, de um rar

uma de aviões no ar. Mas fora de rota. O avião se encontre 'fora de

pode 'louco' do ponto de vista dos louca

pria 'Fora de é um critério cl 'Desviado da rota' é um critério ontológico. Um dois

juízos ao longo de diferentes . É ele fundamental r 'fora de

fica que se encontre necessariamente 'na rota'. porcos de Gerasa. Não é obrigatório que a pessoa 'fora de fOl,,­mação' esteja mais 'na rota' do que a formação. Não há neceSSI­dade de idealizar alguém só porque ele foi classificado de 'fora de formação'. Não há necessidade de também persuadir a pessoa nessas condições de que a cura consiste em voltar ~l formação."19

o arcabouço jurídico autorizativo do internamento compulsório dos doentes mentais que praticaram infrações penais escora-se, por inteiro no conceito de doença mental que em edifício estra­nho a; direito, qual seja, o da psiquiatria. Ai surge a primeira .dificul­dade: nada pode ser mais fluido que a definição de normalIdade e

anormalidade em sede psiquiátrica. . A •

Os juristas, cheios pudor, tomam as afirmações da Cle!1Clél

vizinha como verdades absolutas, ignorando - ou fingindo ignorar. - a perplexidade que grassa naquela área a respeito da validade dos dwg-nústicos de seus cultores. Como su um de seus

Il). LAING. R.D. A Vozes, 1974, p. 88.

da Trad. Aurca B. Weissemberg.

Page 63: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

108

ao status quo

"N,l do como

lk seus respeitavelmente

dispôs a instrumentar."20

o l:onceito de saber dcsinte-é

instrumento contra os

Mesmo a esquizofrenia, que aparece aos olhos dos leigos como enfermidade de cuja realidade ninguém pode duvidar e sobre a qual se pensa que a psiquiatria detém profundo conhecimento e domínio, não merece ser vista assim por eminentes estudiosos da disciplina:

"Não existe 'condição esquizofrênica', mas a etiqueta é um fato social e o fato social é uma ocorrência politica. Este aconte­cimento político, ocorrendo na ordem cívica da sociedade, impõe definições e conseqüências à pessoa assim definida. É uma pres­crição social que racionaliza um conjunto de SOCIaIS, por meio das quais a pessoa é anexada por outros, que possuem san-

legal, poderes médicos e obrigação moral para se tornarem responsáveis pela pessoa etiquetada. Esta é introduzida não só no papel, como na carreira de pela ação combinada de uma

20. SERRA, Antonio A. & PEREIRA, Cristina Rnuter. A psiquiatria como discurso polífico e os carreirisw,l" da indisciplina. Rio ele Janeiro, Achia:mé/Socii. 1979. pp. 12·3. .

109

do como exame como

"O esquizofrénico é alguém que estranhas expe-riências e/ou age de maneira estranha, do ponto de vista habitual

aos seus parentes e a nós ... Que o paciente diagnosticado esteja sofrendo de um proces-

so patológico é um fato, ou uma hipótese, uma suposição ~u u~ juízo. Considerá-lo um fato é inequivocamente falso. Consldera­lo uma hipótese é legítimo. É desnecessário fazer a suposição, ou o juízo. O psiquiatra, adotando uma clínica nS} da pessoa pré-diagnosticada, a quem já contempla e ouve como a um paciente, inclina-se a crel' que se encontra diante do 'fato' da esquizofrenia. como se sua existência um fat.o e;st~lhe­lecido. Precisa então descobrir a causa, ou fatores etlOlog1cos múltiplos, para calcular a prognose e estahelecer o tratamento. O âmago da doença coloca-se então fora da agéncia da pessc;a. Isto é, a doença é considerada um processo a que a pesso.a esta .suJe;­ta, seja ele genético, constitucional, endógeno, orgâniCO, pSlcolo­rrico ou uma mistura de todos.,,22 b '

21. LA] NO, R.D., op. cit., p. 90·1. 22. Id., p. 79.

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1W A

Agora, imagine-se o que dizer a respeito da sociopatía - cuja nomenclatura tern variado bizarramente no tempo -, a qual se projeta de maneira tão intensa no campo criminal, uma vez que empresta caráter ao de! de

Trata-se de patologia· e cura impossível.

A identifi dificuldade se realiza fora da muI ti-reincidente.

Frente a esse estranho q idéia de que:

mal, medicina:

fica difíci 1 de aceitar a

"Como veremos, o que está em jogo é a busca, por parte da medicina de um de ús de cor; social, ii

Nesta l1i tôri a, vamos uma extremamente semelhante à da criminologia, com a diferença, porém, de possuir a protegê-la o escudo de uma disciplina mais tradicional e, em sua maior parte, classificável como ciência natural - a medicina. De outro lado, em compensação, nem sequer desenvolveu uma arma­ção sofisticada, estagiando, ainda, lá pelas concepções preconeeituosas de Lombroso, amarrando-se a idéia do sociopata à do criminoso nato.

O nome tem mudado através dos tempos: desde monomaníaco (Esquirol), louco moral, sandeu com impulsos perversos, desvaira­do moral inato, louco sem delírio, até portador de personalidade psicop;hica, portador de personalidade anti-social e, finalmente, sociopata. Afirma a psiquiatria que a enfermidade se caracteriza por uma patologia dos sentimentos e da vontade, sem comprometi­mento ou perturbação do entendimento, definindo-se em função de procedimentos sociológicos que rompem uma faixa média que se tem em mente: aqueles que sofrem ou fazem sofrer a socieda­de" (Kurt Schneider). A pessoa nasce com o mal e dele jamais se livrará. Além disso, ou por causa disso, inexiste tratamento eficaz para

23. SERRRA, Antonio A. & PEREIRA, Cristina Rantcr, op. cit., p. 4 J.

111

complementar a explanação com o excerto:

e

Destas facilmente é infe-

o que

menta o ~lS leis:

"O comportamento da personalidade sociopata impede o ajustamento psicossocial e vai da estranheza à criminalidade,

com un, deli

!l1oslr:Ul1 a!itude de Se' i

Quem não enxerga aí a medical ização do conceito de criminoso nato, habitual ou por tendência, da criminologia positivista?

E, nesse caso, como deixar de estender ao terreno da psiquiatria todos os argumentos antes alinhados a respeito da inconsistência

daquela espécie de criminologia? _ ~ . b) Lá, como aqui, o esteio onde se apóia toda a construçao teonca

(chamada de "científica") é, sempre, a aceitação da sociedade existente COI12,9 padrão de perfeição e, pois, de nor~n~lidade: devendo ser consid~­rados desviantes (criminosos, para a cnmmologla, loucos, para a PSI­

quiatria) os indivíduos que se insurgem contra suas regras e estruturas:

"Evidentemente a psiquiatria como toma as leis da sociedade como norma da qual se constitui cm patologia."26

a de poder qualquer desvio

O reconhecimento da justiça da sociedade atual, a não ser para quem tem interesse em como ou quem padeça de

24. ld., p. 25. Id., 26.ld.,

Page 65: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

112

nu

1l10Samcllte extravasa minha COl

quialria." A outra de V. Exa. haver reconhecido que se trata de um deI

diagnostico-o como doente e o assumo; porém com os instrumentos de

ista" de uma Por isso, sou levado a falar

pela boca dos próprios psiquiatras acerca do caráter acicntífico da psi­quiatria:

"É que a psiquiatria apresentou-se e firmou-se como um saber científico, ou seja, como algo que falava de uma realidade (vagamente, a "mente humana") com as garantias do método científico."f\o embarcar na medicina, a psiquiatria passou a aufe­rir os lucros da credibilidade científica desta, tornando-se por tabela legítima. Da mesma forma que a outra, a psiquiatria tratou de se propor corno um método de conhecimento de algo que se passava além das conseqüências sofridas que as anomalias fisio­lógico-anatômicas provocavam. O que a medicina afirmava apoiada na dissecação dos corpos, nas análises de laboratório ou na observação dos doentes a psiquiatria (de contrabando) mou como derivado igualmente da observação e da análise das funções cerebrais. Só que uma defasagem permaneceu sutilmen­te pois o progresso da medicina foi a ponto de devas-

"rIo os crirninosos? CrÍlne e crilnínosos: entes' 113

A essa

á das mo hUl1lanit(lrio das mel!"

Acontece que às medidas de segurança não se fixa data certa para seu término, podendo, inclusive, revestir caráter de perpetuidade.

O deli

q raias; disso, dela não cm , ser superior a 30 anos (Código Penal, arL 75). Finalmente, ao completar o prazo da sanção imposta, o condenado será necessariamente posto em liberdade, independentemente da opinião de qualquer pessoa a respeito da inconveniência da soltura.

Dessarte, se um indivíduo pratica um assalto (furto mediante violência contra a pessoa) e é tido por sadio mentalmente, est<:1 sujeito a uma pena de quatro a 10 anos de reclusão. Ainda que o julgador entenda de lhe aplicar a sanção no grau máximo, o condenado pode contar por seguro qLH.\ no dia em que completar 10 anos de prisão, será devolvido à liberdade poúco importando se isso agrada ao juiz, ao diretor da cadeia, ao Presidente da República ou a quem quer que seja.

Já com relação ao que está tolhido da liberdade em virtude de submissão a medida de segurança, o quadro revela-se muito diverso.

O juiz, ao determinar a internação do irresponsável, não marca data certa para o término da providência, porque, na forma do Código Carl. 97, 9 12): "A internação, ou tratamento ambulatorial, por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada,

28. Id., pp. 11-2.

Page 66: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

1I4

mediante perícia médica, a cessação de periculosidade. O prazo mÍni­mo deverá ser de 1 (um) a 3 (três) anos."

Recolhido ao o feliz de medida de segu-rança só libertado se e quando o juiz achar que o momen­lo azado. Caso nunca tal o indivíduo perma-necerá até morrer.

Para decidir se a periculosidade, vale-se de um exame

culosidade", no qual vezes coadjuvado por psicólogo. mental se marca pela dubiedade, elo laudo de "cessação de periculosidade"!

de cessação de

O de pericuJosidade inorerece problema: o direito presume de maneira

ou a lei, desprezadas colaborações extrajurídicas. Como

já vimos, porém, aplicada a medida de segurança de internação, ela só será revogada se e quando se apurar que desapareceu o estado perigo­so do paciente. Aqui, a psiquiatria volta a dominar. Cabe-lhe a palavra decisiva. Os juízes curvam-se ao prognóstico da ciência e de seus especialistas. Quer dizer: o problema do internado desloca-se da ins­tância judicial para a médica, onde se inadmitem o atuar das garantias que cercam o funcionamento da justiça. Não há advogado para defen­der, nem recursos, nem tribunais, para onde apelar, nem formalidades a observar - o psiquiatra merece confiança total, é dono da verdade. Se sentencia: continua ao juiz incumbe, na prática, prorro­gar o prazo da internação, que pode protrair-se até a perpetuidade.

"na prática", porque o juiz, legalmente, não está adstrito à con­clusão das perícias. No caso de laudo psiquiátrico, porém, em rarÍssi­mas o magistrado ousará lançar mão de tal prerrogativa: se o fizer, pode vir a ser tachado de louco.)

Que isso ocorra -- o internado nos exa-mes de de de periculosidade

em se tratando de ual.' """. uma vez que a

não tem tratamento nem cura. De fato, a

entes 115

que cessou a periculosidade representa - embora, em geral, ninguém atenção a isto a demonstração de que o diagnóstico inicial

menos do ponto de vista a da liberdade por do sociopata constitui-se cm

Isso resolve uma importante para o ao mesmo em que ostenta a no território da

_. onde avulta a da de pena determinada na cuja duração não em caso algum, ser superior a 30 anos de uma fórmula para manter em confinamento tuo (em nome da ciência) os indivíduos mais rebeldes, que arrostam a dureza das sanções repressivas sem deixar quebrar o espírito de insub­missão.

A terceira a de todo esse o controle

sobrc rnétodos do tratamento do que au o.

das concorda-se operadores (autoridades prisionais) submetidos à ciário, pois, embora aureoladas de um sentido regenerador, conservam as penas caráter expiatório e, logo, devem ser controlados para que não extravasem os limites desejados pela lei:

"Esse esquema é puramente formal, mas é importante por­que fixa para o Estado os limites da punição (a pena não pode ser maior ou diversa da que está prevista na lei) e estabelece para O réu a aarantia de não ser atinaido senão nos limites dos ditéitos

b b

diminuídos pela Que direitos são Em princípio, apenas a perda da liberdade e a dos direitos necessariamente afe­tados por ela."29

O apelo à idéia do conteúdo suficiente para autorizar os ,-"Ue'"')U}

os processos que lhes parecerem mais

da pena carece de força arbitrariamente

29. FRAGOSO, Heleno; Yolanda & SUSSEKIND, Elisabeth. presos. Rio de Janeiro, Forense, 1980, p. 3.

Page 67: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

116

sobre a para mudar

humano."3u

Rêlativamente ás de

ele limitar os aos internos que o

é o documento de , ele 1 "31

diferente. porque, sendo em

as

de

estando, expungidas de qualquer traço retaliativo ou de fornecem a ilidade de que não

exime de intervir, em virtude de escrúpulos que merecem o ,aplauso dos doutos. Afinal, ao saber científico não cabe ficar submetido à ingerência das leis e de seus fiscais. Dessa forma, os executores das medidas de segurança detêm um poder sobre seus pacientes m amplo e desaçaimado, ainda, que o do carcereiro sobre os presos.

No hospital psiquiátrico ~ cujas características, como mostra Goffmal1,32 são idênticas às da penitenciária -, o uso de recursos que ilegalmente podem ser aplicados na prisão: a camisa­de-força, o choque elétrico, sobretudo o consumo de medicamentos que, causando a intoxicação da vítima, suprimem-lhe a capacidade de autovolição (em gíria, conhecidos como sossega-leão). O criminoso renitente, por sua incrível capacidade de à conformação, constitui tragédia para a administração prisional, eis que não se deixa venccr através dos meios repressivos de emprego naquele tipo de estabelecimento. Mas, para o manicómio, a coisa torna-se mais fácil: basta ministrar-lhe doses de sossega-leão e,

30. ld., p. 38. 31. Id., ib. 32. GOFFMAN, Ervíng, Memicômios, e cO/1\'entos. Trad. Dante M, Leite. São

Paulo. 1974.

S(/() O~'i crinlino:'}"()s? Crilne 117

manter a em nível su com-

como um buneco sem alma. Bern, em último assunto foi

sentes, das medidas de segurança, a tornar teúdo ali Assim ocorre, V.g., quando os se

de abrir vagas. Alguns p.p. internados há muito demons-

tram uma certa exaustão quanto à potencialidade de rebeldia contra o ordenamento disciplinar do mento fechado e, por isso,

a 11

O infrator cerceado em sua I causa da doença; não fosse a doença, nada justificaria que continuasse preso; mas, se é doente, como admitir que vá para a prisão comum?

Na medida, porém, em que a psiquiatria fornece o respaldo cien­t(flco, a justiça, de alma lavada, adere à proposição e a sust.enta com seu poder: é então que pegamos em flagrante a falta de sene?ade de toda essa intrincada novela das medidas de segurança. Por melO desse jogo de cabra-cega, torna-se possível trancafiar na cadeia, em caráter de perpetuidade, inúmeras pessoas - apesar de o comando do art. 75 do Código Penal proibir penas superiores a 3~O anos.

A título de exemplo, transcrevo no APENDICE VI um caso ~lu.e é típico e freqüente, no qual toda a inconsistência da colocação medI­co-jurídica a respeito da sociopatia fulgura com clareza ~e cegar.

Em suma: porque as medidas de segurança são aplicadas a bene­fício do aaente porque não têm sentido de punição, estão liberadas das

b ' . t garantias legais que cercam a imposição das penas. Porque o Soclopa a é um doente, faz ao privilégio da medida de segura.nça. Com~, todavia, para ele não há cura nem tratamento, deve cumpn-Ia ~la pem­tenciáría, onde provavelmente permanecerá até o fim de seus dIas.

. . d 1't erendo e entenclen-Sorte a do cnmmoso que perpetrou o e 1 o qu . , . . 1" d " . t ção" das med1das de do-lhe o carater delttuoso, pOIS se Ivra a pj o e . l'

. .., . data certa para saIr de a. segurança: VaI para a pemtenclana com uma

Page 68: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

118

em

no concernente à metidos ii a encontrar uma fórmula alternativa que, tos

consiste em em à sociedade livre, sob que lhes a as si lecn metamorfoseá-los de desviantes em não-desviantes.

.j ndicada para

A respeito, permito-me produzir resenha que fiz acerca das

tuti ao de reabilitação em instituições fecha-

das -- é tão ineficiente quanto este, não sendo levado mais a sério que o hiperbólico blablablá que defendia o último. Os dados ofe­recidos como prova da eficácia do primeiro são tão manipulados

ressaltam-se os sucessos, obscurecem-se os fracassos - quanto o eram os da recuperação nas organizações fechadas. A fórmula ~e proseJitismo é idêntica à que se usou quanto à tranca terapêu­tlca: um superentusiasmo inicial, usualmente baseado em peque­no número de relatórios otimistas sobre casos singulares - e, naturalmente, muito discurso literário. Submetido o regime a estudos sistemáticos, nada confirma as assertivas inaugur~s. Em outras palavras: o 'tratamento comuniuirÍo' que, ndo se alega, substitui a 'terapêutica em confinamento', não tem sido mais que um slogan, com pouco ou nenhum conteúdo de realida-

sendo sua capacidade reabilitadora tão aleatória e nominal quanto a antes atribuída ao tratamento institucional. Outro ponto de sintomática semelhança entre os na estra-

defesa para da resso-

trilha o mesmo caminho a ante o impacto da com a

selo os criminv,yos? Crin1e e critnil1osos: entes 119

acercou inicialmente: ainda não produziu os seus inevitáveis resultados positivos não concederam os recursos de

O erro não é do mas de sua , como antes, não se toma qualquer para

conceder os tais recursos, para rncnsurá-los ou para saber se são e se, de fato, acaso fornecidos, trallsformariam em

derrota. A dos indiví-duos submetidos a c a

incremento, quer em à

ao exigível. Um vigilante de probation atende, às vezes, a 200 liberados; em de 10 minutos

'lnltamento em

Outro precisa ser diz alegação de estar demonstrada a superioridade da terapêutica comunitária através das estatísticas relativas à taxa de reincidên­cia. Em primeiro lugar, os levantamentos até aqui oferecidos pela propaganda desprisonizadora são marcantemente inconsis­tentes e inadequados, apresentando-se aleatórios, falhos, incom­pletos, freqüentemente tendenciosos e, às vezes, desenganada­mente manipulados. Em segundo lugar, não parece ser essa espé­cie de demonstração a mais apropriada para assegl]J./ar que a solução do tratamento em comunidade é melhor que a do trata­ment-o em estabelecimentos fechados. Cumpre lembrar que não são escólhidos ao acaso os indivíduos destinados àquele: exata­mente o contrário se dá, como, aliás, não só reconhecem como fazem questão de proclamar enfaticamente os fautores da despri-

lI~U'-'U'J, ou é feita uma cuidadosa descobrir !-,',,,J0'JU0 que demonstrem 'aptidão' para o regime aberto, cir­

apurada tendo em conta serem menos ruins, menos autores de atos menos etc. esses des-

uma taxa de menor relatÍvamente aos companheiros considerados 'inaptos' - restando muito difícil

Page 69: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

120

avaliar em que medida a troca de causal na estórl:t,

se a cO!l1unidm!c é cm

Abunda a intelectualmente sério para demonstrar a

entra como coeficiente

vlll-se

cornunítáría, Ao disso, ladeia-se o cerne do

nfio o vizinho e as famílias atendem prontamente e voluntariamente às necessidades dos membros com problema - ou seja, eleva-se a correção comunitária a nma nova panacéia terapêutica ..

Três elementos básicos sustentam o programa de despriso­nização: 1 º - interesse em resguardar os internados da destruição de sua humanidade essencial, ameaça sempre presente em face dos efeitos corruptores da instituição fechada; 2º - promessa de reabilitação, via tratamento comunitário; 3º -- a existência (alega-

de uma tolerância crescente, por parte da sociedade, em con­viver com e cuidar dos membros desviantes, Quanto ao último, cabe indagar de onde veio tal tolerância, o que não é e, muito menos, provado de qualquer maneira. Parece mais certo reconhecer que não foi a tolerância surgida no povo que justifi­cou a mudança da política a ser adotada mas que a da política é que deu lugar a um conhecimento a respeito da alegada (mas não demonstrada) modificação na tolerância comunitária, De concreto tem-se, em verdade, os protestos vociferantes dos cidadãos ante as decisões de libertar criminosos ou deixar soltos na rua, sob mínima ou nenhuma supervisão, doentes mentais -'-'w~v,~" dificilmente conciliáveis com a idéia de se haverem tor­

nado tolerantes com a presença dos desviados,

121

dos em

maIS

mento que deve-

E a del no das comunidades miseráveis, começar a gerar pânico, levan­

do as populações a adotar a prática de fazer justiça pelas próp:'ias mãos? Quem guardará os desviantes contra os vizinhos? Em face de tal questão, não seria de levar em conta, além da proteção que a instituição fechada oferece em favor da comunidade contra o desviante, o resguardo que oferece em favor do desviante contra

a comunidade? Para finalizar: verifica-se que a desprisonização, na prática,

tem mínima semelhança com o discurso liberal que a defend~ e, embora provavelmente fora da intenção de seus autores, tem.sldo usada como uma camuflagem ideológica para obter economIa de custos mascarada de benevolência e tolerância, Por certo, uma dada de liberados tem condi~~ão de volt~r a viver no meio de onde saiu sem causar traumas. Alll1al de contas, muitos daqueles submetidos a processo pelas , oficiais de controle social são escassamente distinguíveIs dos vizinhos que estão abandonados e, pois, podem ser expelidos d~s , . . - ' 'ldl'Cl'Oll,ol'S Porém para mUl-ll1stttmçoes sem rISCOS < c<, , ,_

, . . t Cl' '11 a substltUlçao da tos outros eX-ll1ternos ou mternos cm po en . c,, ., , , " de desViados ,

internacão representa um mcremento <lOS , .' h b" Com is'so se instaura um estilo neofeudal de contróle: os a}-

Page 70: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

122

lantes de tais guetos ~o as da poHcia será não a de , prevenir ou

o crime em seu interior, mas a de evitar que transborde seus limites."33

Em que consiste, afinal de contas, o direito corretivo? Qual seu verd,ldeiro conteúdo? os curar os· mentais que praticaram fatos previstos como crimes; educar os meno­res portadores de desvio de conduta - trovejarão os juristas, criminó­logos, psiquiatras, penitencíatistas e todos os

() é bem outro. O jogo da violência, no antigo direito penal, era jogado franca­

mente: "eu tenho o poder; eu dito as regras; quem desobedecer, trata­rei de triturar na roda ou esquartejar em praça pública."

O desobediente pagava com o corpo os atas de rebeldia. A vio­lência, agora, atua disfarçadamente e, a título de amparar o insubordi­nado, se permite transformá-lo em objeto de um trabalho de adapta­ção. Como conseqüência, porque pretende "tratá-lo", arroga-se o direito de invadir-lhe o próprio eu, de alterar-lhe a personalidade, de executar uma tarefa que viola o mais íntimo de todos os direitos do ser humano: o de ser ele próprio.

"O afrouxamento da severidade penal no decorrer dos últi­mos séculos é um fenômeno bem conhecido dos historiadores do direito. Entretanto, foi visto, durante.muito tempo, de forma geral, como se fosse fenômeno quantitativo: menos crueldade, menos sofrimento, mais suavidade, mais respeito e 'huma-

. Na tais se concomitantes

33. REVISTA DE DIREITO PENAL, Rio de Janeiro, Forense, 27: 114-6,1980.

ao deslocamento do objeto da ação punitiva. Redução de i dade? Talvez. Mudança de objetivo, certamente.

123

Se não é mais ao corpo suas formas mai s dos

que abriram, que ainda não se encerrou - é inscrita na Pois não é mais o corpo, é a alma. À que tripudia sobre o deve suceder um que atue, profundamente, sobre o o a as disposições."34

o crime autoriza a ação punitiva, que busca a manutenção do de aI como criminoso, muito

cujo ista unia o não é mais castigo, mas alguma coisa a ser operada cientificamente em prol do condenado, desnecessário se faz apurar se infringiu a norma penal. Basta a constatação de que precisa de tratamento, e o socorro oficial lhe prestado - até pela vida toda, se for necessário.

Cada vez mais, a justiça criminal escorrega da sede judiciária para outras esferas, as quais, por serem cientificas, desnecessitam de

justificação legal para se pôr em ação:

"Resumindo: desde que funciona o novO sistema penal ( ... ) um processo global levou os juízes a julgar coisa bem divel~sa do que crimes: foram levados em suas sentenças a fazer cO.lsa diferente de julgar: e o poder de julgar foi, em transfendo a instâncias que não são as dos da A operação penal inteira de elementos e extrajurí-

dicos."36

34. POUCAULT. Michel. , ap. cit., p. 20. 35. POUCAULT, Michel. A verdade e 36. FOUCAULT, Michel. e punir, op. cit., p. 25.

ap. cit., p. 68.

Page 71: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

124

so instâncias

do proces-

o

De resto, na medida em se com referên-de duras repressoras aos seme··

os juízes sentir-se aliviados:

lllente, damos um vcrcdito,

urn

E:

"A justiça criminal de hoje em dia só funciona e só se justi­fica por essa perpétua referência a outra coisa que não é ela mesma, por essa .incessante reinscrição nos sistemas não-jurídi­cos. Ela está votada a essa requalificação pelo saber.

Sob a suavidade ampliada dos castigos, podemos então verificar um deslocamento de seu ponto de aplicação; e através desse deslocamento, todo um campo de objetos recentes, todo um novo me da verdade e uma quantidade de papéis até então inéditos no exercício da justiça criminal. Um saber, técni­cas, discursos 'científicos' se formam e se entrelaçam com a prá­tica do poder de punir."39

o tratamento penitenciário, as medidas de seguranca a medícali-~ "

zação na execução das o emprego de métodos psico-psi-

37. leI., p. 24. 38. Id., p. 25. 39. Id., pp. 25-6.

e cl'i111l'J70.\'OS: cnles 125

de sentimentos generosos muitas vezes, que o crime é uma e que o criminoso é um

Essa forma de vcr as coisas gera duas ex!rem~r-

mente s a manutenção do status quo, razão por que merece os aplausos do sistema: fortalece a idéia ele à sociedade, para ser

falra

em extensão ilimitadas, pacificamente às normas opressoras.

ar, de maneira que reagem a se sul1n1eter

Page 72: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

e

"A vida, meu caro é sempre mais ampla que a doutrina; a vida não é para ser espremida dçntro dos limites de nenhuma doutrina,"

"H:t na socicdnde russa quc: tcm a cnragcln úe cllfrcn!~lr o rnundo:

"N a It:í I i ,',do

rcs Marx c c toda a cor­rente social-democrática alemã, falam com tão profundo desprezo, Sem dúvida, isso é um erro, pois é nesse proletariado, e não nas camadas burguesas da cl asse trabal hadora, que residem toda a razão e a força da futura Revolução Social."

Bakul1in

Criminoso é: a) o indivíduo que age em contradição com a lei penai; e b) sofre oficial.

A omissão no termo b elimina a concreticidade da definição, conduzindo a um conceito ideal de válido no mundo das metafísicas.

O infrator que, por se haver extraviado em do

percurso que conduz ao claro da ordem negra não é criminoso, nem seu ato constitui crime:

127

Page 73: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

128

que I1fío tenha sido criada lei e que se assinala nos

Por isso mt~S1110, de passagem, trabalhar com uma entida-de do { "criminosos dc colarinho branco"

a de pessoas bem e onde ocorre - a título de

ceI' rele vo par,L o exame do \10

tasia para se descartar de ver submetida a exame a

1.

"De ~mportância crítíea - embora geralmente subestimada -é que 'crime', 'o criminoso' e outros conceitos que devemos clis­cutir são definidos pela organização política da sociedade. O cnme é definido pela lei e as atividades do sistema de justica cri­~11lna~ (aqu~las instituições que a sociedade faz responsáveis pela l~entlfIcaça~, apreensão e lida com que se pensa tenham VIOlado a leI em parte, reguladas lei - e a lei é criação de um processo político. O legislador o dos Estados (ou se nega a político do Estado

como um corpo leis cri

dade política quando rio é também político' (no mesmo duos acusados de violar a lei. A polícia, tion, e outros órgãos

. . de. Sistema penal c sistema social: LI

crlll1lnal como de um mesmo processo. Trad. Rel'lsra de Direito Pellal, Rio de Janeiro, Forense, 30: 12, 19R I.

aprova

no ramo do

Por ISSO fica fáci! entender ii demon

que, mera

s, básico princípio político: o de ~l tirania dos grupos dominantes.

neutros

129

indivíduus yc/cs nem a

~lS inferio-risco um

das estas quer pela lei, quer de da ci negra. fnexistem diversidades ontológicas entre condutas criminosa e

não-criminosa. Também não se encontram divergências essenciais entre criminoso e não-criminoso. O dado distintivo entre tais catego­rias decorre, exclusivamente, de uma visão axiologicamente dirigida e

parciaL' A explicação do comportamento criminoso nada tem de diferen-

te da relacionada com o comportamento não-criminoso. Como acen­tua J amcs T. Carey, porque as pessoas agem como o fazem e porque certas condutas são definidas como criminosas, consubstanciam dois

problemas distintos. Idênticas apresentadas como negativas ao se I

rem a um criminoso, ganharão sentido positivo se estiverem vincula-

das a uma prestigiada pela ordem vigente.

Por exemplo: Refere Cressey que a máfia de seus membros lealdade,

espírito de equipe, honestidade para com a associação, coragem em

SILVER, lsidore. TI/e Crime-COI/Iro! Estahlishment. New Jerscy, EUA, Prcntiec­

Halllnc., 1974. p. 7.

Page 74: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

130

face da adversidade, dureza. Ora, que outras qualidades cobra uma muftinacionaJ de seus executivos?

de de luta e ausên-cia de vista mesmo à custa

e abater, ainda

de alguém: é inflexível, frio, entranh:.ls na de mas com os 'amigos, com os na hora de gastar -

indústria? Por que não de um descrição de um altruísta capitão de assaltante?

ele é

Quem assassinou maior quantidade de inde mas: o homicida famigerado ou o festejado piloto do bombardeiro de guerra?

A elevação de certos comportamentos à classificação de crimes e, sobretudo, a designação de certos indivíduos para serem oficial­mente considerados criminosos estão diretamente ligadas com a hie­rarquização social e o esforço de manutenção do status quo que inte­ressa às classes dominantes.

Tal circunstância, de resto, pode ser surpreendida nas comunida­des mais rudimentares, como anotou Malinowskr"em seus estudos sobre as populações primitivas da Melanésia:

3. 4.

"Assim, em conexão com o meiro objeto que chamou nossa atenção - a canoa nativa se nos depararam a lei, a ordem priviléaÍos definidos e um bem desenvolvido sistema de , b

"4

"Seja lá como a maneira em que funciona, é uma rnaneira de o statlls quo, um método de Íne-

R io de Janeiro, Graal, I p. lO7. Broníslaw. CrÍme ond Custom Ín London,

Baul, J 978. p. 21 ..

qualidades novas."s

A

e impedir a

opressoras; a das massas

outras

criminosa, de da luta

as

':No mais lato sentido, pode-se afirmar que todos os crimes são crimes políticos, uma vez que todas as proibições com san-ções penais representam a defesa de um dado de ou de no o social

Reitero a declaração que abre o livro: trata-se de uma reporta­gem.

Em face da circunstância, fornecidos os dados resultantes do tra­balho investigatório, incumbe deixar à elaboração de eada um as con­clusões a tirar. Seria eu desastrado se quisesse fechá-lo por meio de opinativas colocações pessoais. .

Nada impede, porém e acredito até que faça parte da técnica jornalística -, terminar o relato com alguns tópicos provocadores e desafiantes, os quais devem estar codimentados por exposição desor­denada, incoerente e, às vezes, contraditória. o toque excitante, sem o qual inexiste reportagem que se preze.

I

o incremento da onda de crimes ou a modifi-das estruturas sociais·

The Politicai Criminal. New York, The Free Press, 1974.

Page 75: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

132

o cOllletil11cnto de (kli

nürÚL 1i

lC~t lnu

llLilmcnh: (k'l1omillada

/\ '\mda 1 rallsf

estas_ 0\1

numa

limitar-se i\ idéia ele p:lssdr do

o

hierarquizada ou

manter-se sem serú viável abolir a

Mas não é a

deve ser visto como ":llivid:ldc ()-

nesta nossa

) " d

quem bc

iS!:l P,lril () soei

de que tipo hoje, conceber uma socie­

sem estar dividida em ou dividida cm

, classista ou hierárquica que inve/]-

11

Sem istência elas entidades crime e criminoso se tem

mostrado parel a da ordem social vigen--te, Além das razões s ao longo deste caberia chamar a

para as alinhadas sinteticamente a seguir:

Juarcl. Ciril1(J dns, A mdicu/. Rio cie Janeiro, Forense,

os ('!"!núnnsos? CrinIC e crirniJloyos: enTes' 133

fll nc i Oiwr COllH)

cI iní'crioll's_ cri m I1()S(h, A di CUSJO

de mesma classe,

dimenlos de urn cotidi:H1() concentram sua assim qualifi pela

cu

tos por C,lUsa exige tratamento c

-- o si s í e rn {l

natureza aos clcmen-

Page 76: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

134

A que se pode pedir socorro nesse mister? A burocracia, naturalmente. Como a burocracia do Estado sai mais barato para as camadas

do que a da indústria e todos contri­buem, os custos ao de sorte a a maior pmcela da imensa miJo-ele-obra da de colarinho e gravata.

E que ficar a ue burocráti-

III

Reconheço a funcionalidade que o crime tem representado para o

no futuro? Üu o nosso tempo é o momento')

Com respeito aos criminosos classificados como "políticos" ou "propriamente políticos" ou "políticos reconhecidos como tais pela ordem oficial", o Estado industrial aperfeiçoou e aguçou sua resposta, tanto que vem obtendo vitórias e sucessos no seu enfrentamento. Somente quem não tem "olhos de ver" deixa de perceber a neutraliza­ção a que estão condenados os movimentos revolucionários tradicio­nalístas, como os partidos comunistas ocidentais ou os dissidentes da China. De outra parte, as que optaram pela luta armada foram destroçadas - v.g., grupo Baadcn-Mcinhot", Brigadas Verme­lhas, Exército Simbíonês, Tupamaros, Sendero Luminoso.

Em contrapartida, a criminalidade apelidada de "comum" ou "ordinária" só fez e só faz aumentar, em quantidade e violência, sem que se encontre fórmula - sequer esperança de fórmula - apta a lhe estiolar o desenvolvimento.

Em que consiste o fator de diversificação dos resultados colhidos pelo sistema na contra o crime" numa e noutra

sabe está em que, à o busca o combate no terreno nas que favorecem o Üs "cri-

, recrutados em maioria da classe média para cima,

135

necessitam burocrática e tecnicamente para

Ora,

menos do ponto dc vista

caracterizam-se as elo banditismo comum con-industrial de tra a ordem social. positivamente, o

ausência de vocação para - quanto mais para pelejar __ nas áe:uas ela anarquia. Aliás, não será este oceano "o único túmulo

digno cl~ um almirante" técnico-burocrático? Ponco i se o mel

caso, mitente contra o status qilO. Por isso, é político c por isso é tratado politicamente pelos detentores do poder. Vale lembrar: a História se

constrói tanto de atos quanto de fatos. Com referência a acontecimentos afastados da realidade em que

estamos imersos, que podemos contemplar a uma distância sl:ficic:lt.e para permitir uma visão razoavelmente descompromissada, fIca facIl compreender a questão. Quanto às tropelias dos bandos de ros, pelo fim do século passado,):1o interior do Nordeste: por exel~plo, a maioria de nós, moradores dos centros urbanos elo fmal d~ sec~lo

. aÍlrmatIva provavelmente sem malOres a

de que:

eles travavam uma luta de classes. lnconscientemente, não

mas uma luta de classes. 10

No que dias de

10. Rui. Brasileira, 1978, p. 166.

que, ao

nas metrópoles nos estuprar, matar,

5. cd. Rio de Janeiro, Civil

Page 77: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

136

, destruir, dallific~lL :tm Irm·'ando illilU II/lu de

dO cnco:,{ar u carro para ir ,íllillla minha mul () de: lcmo cncontruc () P;lraibínha ou o POS,\O lido ÍLico do

() CjU;t!110 cunLÍu!a dos tílti

Os sitiados começam a sÍti;lr?

de ousadia.

S;lO outros, agora, os que vive:m dos por

aos vadia.

lhes

vai a noite e

II. Ic!, ib.

é rico. pois o povo decbrado guerra de extermínio."11

li

diria

JSS\),

clus j)t1T11cirus, sou

cobrada por um

atrás de

(os

Teles: fOlllcccr um último

(JS criJniJ)()sns? Cri!}!(' e crinlino,)'()s: eliTes 137

dado ú medi! que :l1'recadei reiterada com 1111-

!1USOS margll1,lls quc tem marcado minha vida -- dado que costunw l'iclr ('b:-;clI do na quem prcleciui1(\ subre

haVl'r )IlVér~;;\ alxcrLt clin:ta com

Ao PCl1S;L sobretudo no concernente

aos donos de !idade í!1te CD t re a morte o a tal

ia" que caracterizaria () dos criminosos não jJ"S",:1 de cen..:brina nascida do :-;ellSO cumum ntclcetu,lÍs. Com uma

LI falar o

indivíduos urna detcr-ordem social da s6

i nl~r

até seus ó ilustres cm uma VIa de

e haverão de mentos que os vão deixar estupcfatos.

eonseguirão entender o que lhes parece irracional cm seu como, por exemplo, por que ceream a prática da sub-

património alheio de uma constel de alos nada na aquisição dos

torná-los mais vulnerúveis ú perseguI , causar e maj()r severidade elos que o roubo funciona, apenas, car explosões de confronto enraivecido contra um sistema que teima em lado de fora de suas amcnidades.

O criminoso não é não é besta não é fera insen-sível, nuo nenhuma di qmlllto a outro ser humano - afora a indómita rebeldia o leva a lutar contra os com crueldade a crueza com é desde () vcntrê ela llÜle.

A de acerca da plebe que fez rebentar a Revolu-

merece ser lembrada:

Page 78: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

138

"Porque há 25 milhões deles, a quem, contudo, nós agrupa­de obscura unidade compendiosa, monstruosa

mas de hei ou mais humana-'as

ver8s que dadc delas tem o seu com a sua pele e se a

acha-se coberta

... que cada unidade dessas massas é um hornem milagroso, exatamcnte como tu és; lutando, com visão ou com cegueira, pelo seu reino infinito (esta vida, que ele pU5sui uma vez só, no meio elas , com unn centelha da divi aquilo que tu alma imortal, dele!

um o governo, lidar estas massas; mesmo o único ponto e problema de governo, e todos os outros pontos meras ninharias acidentais, superficialidades e golpes de vento! Porque digam o que disse­rem as cartas de privilégio, o uso e os costumes, a lei comum e a especial, as massas contam uns tantos milhões de unidades; fei­tas, segundo todas as aparências, por Deus - a quem, como se proclama, pertence esta Terra. Alem disso, o povo não é isento de ferocidade; tem nervos e indignação." 12

* Bem, agora é fazer bom proveito da reportagem; ou desprezá-Ia;

ou marcar o palpite na loteria da História de que marchamos para uma (salutar?) cambalhota

12. CARL YLE, Thomas. História da Francesa. 2, ed. Trad. Antonio Ruas. São Paulo, Melhoramentos, 1961, p. 44.

Page 79: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

I

"iVCSle,\' ccnútério\' gerois Juí l!!Orte iso!tu/o

Indefiro o arquivamento a Fundamentou-se o ilustre em que "os

em estrito cumprimento do dever legal e não é curial que sobre eles palre , em nada contribu para o combate à violência e entrave ao aumento de criminalidade", concluindo, afir-ma que "denunciar estes ais é o mesmo inibir a atividade

de aís que arriscam suas no combate ao cri me", Injustificável, sob lodos

1\1 i de propor. na

do sistema

do sistema punitivo. são em a sua danosa e a sua ínfima social devem ser desde

reconhecidas e Isso não ocorrer, de matar julgamento, é bom que se

141

Page 80: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

142

dever de matar. Marques:

E no processo do Júri, pela de da

" o cumprimento de dever legal. Salvo no caso de

guerra ou revolução, nem ao soldado não pode ser reconhecida a justificativa. Tampouco ao agente da autoridade pública, ou ao policial em serviço. Quando há resistência à ordem legal de pri­são, cabe ao executor usar dos meios necessários para defender­se ou para vencer a resistência, consoante o disposto no art. 292, do C PP. Evidente é, no entanto, que matar não se encontra entre esses meios necessários. A ocorrência de homicídio, em casos dessa natureza, pode encontrar jusfificativa na legítima ou no estado de necessidade, nunca, porém, no estrito cumpri-mento de dever legal" (Tratado Direito Penal, pp. , v. 4).

que a própria versão dos policiais não se apresenta nítida nos autos. Afirmam todos monocordiamente, que a foi

durante a troca de tentou fuga, invadindo as de Manoel Alberiques e senhora Mirian Wanderley Oliveira sendo encontrado em um terreno

ocorre-a entrar correndo cozinha e o muro (fls. A vítima,

crimino.yos? Crilne e crinJinosos,' elites 143

fugindo quando foi atingida. Observe-se que o cfetuado da direita para a de diante para trás e de baL\.D para cima

localizando-se a ferida de entrada "na metude direita da frontal, a 15 mm da causa do io direito" e a

O tórax na linear de tonalidade avermelhada.

do auto de exame aliada ao que se vê no laudo de local indica, sem muita di

21 - o corpo caído ao muro --, que a vítima, tentava

pujar o muro ao ser ati ., . _ . de ser ificada como marglllaJ, a Vitima nao pOSS'Ul

qualquer anotação em sua t'olha penal (fls. 78). E Manoel Alberiqu~s (fls. , cuja filha era noiva da vítima, informa que a conhecJa "desde idade", tratava-se de pessoa traba e que "nunca

) 'l ,j(, a conduta da vítima, S( ti lL L 00

que a casa"

A conduta dos pol militares extravasou, bem se os limi-tes da sua atuação legai, empregando força não consentida a pretexto de ter encontrado resistência. O policial, como qualquer cidadão, deve reagir quando é agredido injustamente. Tal circunstância, p01:ém,. deve ficar exaustivamente demonstrada através do processo constltuclOnal­mente estabelecido para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Saliente-se, ainda, que, mesmo no Código Penal Italial1~ ~~mo se sabe, de inspiração fascista -, que prevê, no seu art. 53, a Just:flca­tiva autônoma de "1 'uso legittimo della armi", exige-se a necessldade desse uso, respeitando-se o princípio da proporcionalidade. .

Acolhendo as lições de Manzini, Bataglini, Bettiol, MaggIOre, Antolisei e Pannain, o professor Heitor Júnior, abrilhanta o Ministério Público do Estado do Rio, disserta:

"Adotando o ensinamento da melhor doutrina, , . dência não encon-data que a matéria a maXJlna pru .,

trando o uso de arma por de que . 1 ~ ou morte do a ocaSIOnar esoes venha

salvo a de excesso ausente outra forma de lograr a captura, por

Page 81: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

144

\10 do leu!!

11 qUt~:

'~ir o [unbito udcntc ê

i'unciuil;írio o preso que , so porque leria <1 C(inclellií-lo á morle Ídto da o que seria m011S-truoso,"

\)'

autores dos disparos sequer do

desde ciais -já

i na condUla dos poli-

A poJ dever que lhe

lizar o tradicional

o

um cidadãos.

em heróis -, como se vê na s, "homicídio -- estrito cumprimento de dever

deixou de lavrar o auto e sequer deu-se ao

de res

em f1a-

ver e , instalando o medo e a insegurança nos

que as vítimas desse o o homicídio no

am, quase sempre, cidadãos das classes marginalizadas e

no sern e para

São os deserdados da lei, nascidos para cumprir um desti-sobre os quais se por isso

reeer instrumento'

de

com o

o ilu Promotor de

do tipo, sem que, com ela

l.

o na

minaI da Comarca da tal - I Silva.

o

145

icial em de

Page 82: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

146

Filho, sob o fundamento de que inexistiu crime na ação que do estar com-

da favela nesta cidade,

ao vislumbrarem três em atitudes suspei deles tentaram se aproximar, ocasião

em que f~ram recebidos a bala, travando-se, então, cerrado tiroteio. Os ll1ch

disparavam seus

da da

das meninges" (fls. 48v.).

Tangentemente à matéria fática, baseia-se o Dr. Juiz fundamen­taln:ente,. no depoimento do ManoeI Alberiques que 'informa ter ouvIdo. d:sp~ros após a vítima entrar correndo pela porta da sala de sua res~dencla, sair pela cozinha e galgar o muro (fls. 37).

Dla.nte desta ~ssertíva, e considerando que o disparo fora efetua­do de baIXO para CIma (fls. 48v.), o ilustre Dr. Juiz, invocando o laudo d~ .10caI (tls. 21/31), conclui que tudo - verbis - "indica, sem muita dI.fIc,:ldade, que a vítima, provavelmente, tentava pular o muro ao ser atmgJda. "

mente, o ún ponto destoante do Inquérito reside no n:o.men,~o em que os tiros foram trocados, dado que enquanto os poli-CIaIS ailrmam que a vítima adentrou pela d S' M'~ I ' . . o 1. dnoe apos o tJrotelO, este afirma que o mesmo Ocorreu "minutos

que ~~ versão policiais também neste ponto 1~1ere-Em se prevalecesse a narrativa Sr.

da o fato

com

silo os crinú!1o'\'{),)' Crime e crinú!1o.l,'os: entes

existência de qualquer disparo, durante ou ter a vítima passado sobre seu Ímóvel.

Por outro do Dr. Juiz no sentido de que a víti­ar o muro ao ser atingida" não nos

([ WIW porque, como teriam e a duas porque a vítima tombara - verbis --

ii abertura destinada ao ão", não razoável admitir-se tivesse ela por pular U:ll cerca de

mo tinha a seu ele local, fls. 21

uma de cerca ele

111, e fundamentalmente em face do que se contém no rito policial, parece-nos devidamente comprovado nos autos terem os policiais agido em conformidade com o Direito, na medida em que

escorreita o anjUI

~lr que para a propo-situra de ação penal reside na presença de elementos de convicção indicadores da autoria e da existência de conduta adequável a tipo penaL Estes elementos, contudo, devem referir-se não apenas a wn fato aparentemente típico, mas, sobretudo, a uma ação penalmente reprovável. E, se tais elementos indicam que a conduta questionada se posiciona ao agasalho da sistemática jurídica, não se h;:1 que cogitar de deflagração de ação penal pelo Ministério Público, ainda que presente a de tipícidade.

Demais, no entendimento de que a mecânica de ade-do fato à norma incriminadora deve processar-se com

não apenas aos formais do tipo, mas em conta, também, o subjetívismo da conduta cogitada.

Pesem, embora, respeitáveis posicionamentos em contrário, temos que a pretensão de se retirar do tipo qualquer alcance do tivo, consoante o magistral Mezger em seu tipo em estrito On

Ein Lehrbuch), em à simpli-ficada de Beling, em seu Die Lehre von deve ceder passo ao campo vale dizer, ao necessário do da conhecimento este que há de se operar simultaneamente à pesquisa da norma

Page 83: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

148

C1SOS, tratou

ico i'nsltu desc!1vol-

mio do cntendimento bjJjdadc da doutrina que faz a torno

na

ricdadc com o da tc, se assinalou.

o em face do que

verificando que o caso em tela encerrava ta com o direito de causa

acerto, se houve o Dr.

te,

a admitir, da descriminantc e da o certo é

entre o Magistrado e o Promotor de Justiça quanto a doutrinário não servir de óbice à concessão da

nada havendo que o o reconhecer que LI hipótese melhor se à exc!udente rotulada por defesa do que a invocada pelo Dr. Promotor de J llstiça.

os crÍIIl/nn.'-:os? Criuu) (' Crillli!loS(l.\: cn/es 149

de seu divCf<;;lS outras cOllsi-

Enlclltk n Ilustrc d\) Tr: hu 1 do

do proccsco L'omu a fasc da in~;tru

Promotor de . entretanto, o culto colega

por da lei cm caso de fuga strado trecho do citado autoe em

\'crbis -- "Ampliar o âmbito da exeludcme c

assim, ainda ise judicial. É a institu

Não vemos como se possa éldmitir os cis que parte de uma

Page 84: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

150

que são responsáveis pela justiça criminal não pode murchar e secar, e atrofiar-se".

A aI

penal, deixou de fazê-lo por entender que os elementos do inquérito indicavam terem os policiais agido ao amparo de causa excIudente de antijuridicidade, portanto, em perfeita harmonia com o direito.

Com o arquivamento, não pretendeu a homologação 'da arbitra­riedade e da violência policiais', nem a 'legalização da impunidade', incompatibilizando-se com os princípios do 'Estado de Direito De­mocrático' .

Ao contrário. Com o arquivamento, o que e violência contra os transformando-os em que

quando foram recebidos a bala por Cely e seus companhei­ros, transmudando-se de vítimas de tentativa de homicídio para auto­res de crime doloso contra a vida.

Com o arquivamento, a Democrático', porque a e isto não mereceu a

a descabelada e até abusiva con-tra quem as peças informativas nada revelaram em termos de mento pela ausência de do face a ope-rância de causa excludente de

i51

não ter sido

Rio de Janeiro, 9 de janeiro de 1981

Evandro

As:;ístenle do ProclIrudo/"-Geral dli

"APROVO O PJiRECER ..

Rio de Janeiro, 28 de janeiro de 1981

Nelson Pccegueíro do Amaral Procurador-Geral da Justiça"

Page 85: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

"

II

*

em que diz estarem todos revoltados com o fato de não terem independência no acompanhamento de inquéritos, apesar de ingressa­rem na carreira por concurso público.

Segundo a mesma fonte, a revolta aumentou depois do afasta­mento do inquérito e posterior assassinato em Recife do procurador

Jorge de Melo e Silva, o denunciante do escândalo da mandio­ca, mas a queixa contra a falta independência é antiga. O procura­dor Osvaldo por exemplo, afirma estar lutando há 10 anos contra a censura que o procurador sofre na redação do seu parecer.

e

Ele diz que "a censura além de quem o parecer, tem o condão de embretá-Jo, submetendo-o ao aprovo ou não de uma única pessoa, que passa a ser censor e juiz". pessoa, segu.ndo Degrazia, é o procurador-geral da Repúhl nomeado e SUjeIto a ser demitido a qualquer momento pelo idente da

Maria Tereza. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14 mar. 1932,! cad .. p. 3 ..

152

Em Nova Lei

deve ilibada".

saber

te da Assoei Nacional dos Procuradores da República, Henrique que a classe está revolta­

a morte do

um milhões. Os cinco procuradores confirmaram que não é a que um integrante do Ministério Público sofre pressões.

Banco Cidade

Outro episódio recente também envolv~ um escândalo financei­ro. início do ano passado, a Polícia Federal concluiu um inquérito que apurou de fiscal e remessa ilegal de dólares para o exterior, a partir de um clandestino ligado ao Banco Cidade, que funcionava em São Paulo, sem autorização do Banco

A partir do momento em o inquérito chegou à Justiça Federal, a procuradora Márcia Dometila de Carvalho passou a pedir providências ao Banco Central, para que entrasse nas à Receita Federal, para a obtenção de provas dos crimes de fiscal.

Desde o da República na época, Firmino Ferreira chefe do Ministério Público em São Paulo, Benevídes de Carvalho, para que afastasse a procu-radora do inquérito. Este fato foi denunciado por Célio de Carvalho,

Page 86: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

154

sou ir n São Paulo afastar

o ue a denúncia dos v no

lbrahim Abadi -­resolver o caso o

nitivamente.

o outros mornentos de tensão. Foi o

e

bl v

recebeu a incumbência de emitir parecer no processo em que a União, por intermédio da Funai, e o Grupo Slaviero (indústria e comércio de madeiras) disputavam a propriedade da reserva pinheiral de Mangueirinha - 7 mil e 200 hectares de terras cobertas de araucária brasiliensis - área avaliada em mais de Cr$ 3 bilhões.

Logo que o procurador manifestou o entendimento de que era da União a propriedade da reserva, um colega seu informou que ele esta­va sendo pressionado por Firtnino Paz a dar parecer em favor do Gru­po Slaviero. Para adiar o parecer, João Serra Azul tirou líeença e disse que esperava a de Firmino Paz para assumir o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, o que só veio a acontecer em 1981.

No final da parecer contra informação na L.1J\JL,ct.

tava: "O está entre a cruz e a o processo sobre a

Carlos CoI iDe] Uni

lum Eo

ou dava um Ao

Guimar?ies ao parlamentar aproveitara um programa partidária para fazer declarações acusando

no entanto, o

não

155

na

e, Ulisses

o a divulgar doutrina

o Govemo@ftprátíca de a

Page 87: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

cil

construída para vale dizer estamos com excesso populacional da ordem de 3.800 homens.

públicas do interior, estão recolhidos 7.200 homens, em excesso populacional, que deveriam estar recolhidos a presídios da Secretaria da Justiça, mas presídios que não existem.

Não vamos apontar falhas e culpas do passado, até porque isso não resolve o problema: vamos constatar uma realidade que existe, e que pode ser detectada através destes números.

Há um excesso populacional, portanto, da ordem de 11 mil só na área da da Justiça.

Sabendo-se que uma

depende uma tipicamente izada, e de alto custo, para o número de 500 presos

vamos relacionar este recentes que o Estado de São Paulo está -', as penitenciárias de Pi uí e de Araraquara, com capacidade para 500 cada uma, portanto, o total de um mil, custaram ao Estado a soma global de 200

de ou 200 bilhões de antigos.

PIMENTEL, ManoeJ Pedro, Brasil Rotório, jul. 1976, pp. 30-1

156

,\'ào os critninasos? CrinlC e crhuil1osos: 157

Vale dizer que, para 200 milhões de de lima vaga em

mil cruzei o custo da que da mil dó]

que um emprego industrial cria 10 empregos i retos, é rentável, que o custo maior de LI vaga de pre-sídio é inteiramente ocioso da

Este de 22 para cada uma,

morreu, nl,lS

mento bem grande, de mais de teríamos ainda válidos para C:1l11-

prir em São Paulo 30 mil mandados de prisão, o qU,e der~andana a construção de 60 penitenciárias para 500 presos a razao de 100 milhões de cruzeiros cada uma. . '

Se todo o orçamento do Brasil fosse colocado a servl~o dess~s construções, como solução tradicional do problema do cnme, n~s ainda não teríamos resolvido o problema, porque os mandados de pn­são crescem à razão de um mil por mês, demandando constru­ção de duas penitenciárias por mês, o que se fosse possível, em ter­mos económicos, não seria possível em termos de con em ter­mos de engenharia.

Page 88: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

"A litação penitenciáría."

v

Para os criminalistas estrangeiros, que vêm encarando a Suécia como um laboratório de reforma experimental do sistema presidiário, o fracasso das tentativas de reabilitação, na Suécia, tem minado seu empenho em exercer pressões no sentido de obter uma legislação cri-minal de caráter reabilitador nos seus próprios países.

desolador", disse um visitante, perito em prisões de um país do Oeste da Europa. "Em meu país, ainda estamos na Idade Média, se compararmos a assistência que se aos detentos na Suécia. Mesmo nas melhores oportunidades nos é difícil convencer o governo a pres­tar melhor assistência aOs presidiários. Atualmente há um clamor crescente por lei e ordem, e nós nem podemos citar os suecos como excmplo e argumento para nossa causa de um tratamento

liberal para os presos."

Há 3.300 nas qual for o dia do ano - um número

de habitantes. que possui somente

das penas é de 100 dias.

NEW YORK 1972.

"~fJUUU~,""v por O Estado de S(IO Paulo. São Paulo. ouL

158

.\'ÜO os criJllino:·;os? C~rifl1e e crinúnosos: entes

Todos os prisioneiros têm quartos individuais que aparentam aloja­mentos de universitários -, sendo 'o termo cela recebido com repulsa.

Sem

condenados a penas inferiores a um ano é enviada a sem muros ou cercas, e os conde-nados manter empregos, o dia, nas cidades próximas.

distante 120 quilômetros ele Estocolmo, os deten­tos recebem salários ao mercado de trabalho "lá fora" ou podem freqüentar escolas. Essa prisão-albergue oferece inst~l.ações para banhos de sauna, natação, esquiagem e espaço para a pratica de

Estocoimo -, há mais nos campos cional, psiquiátrico e de treinamento profissional do qu~ ~m ~stabele­cimentos semelhantes situados em outros países. As pnsoes lechadas preparam, ainda, visitas conjugais pelo menos uma vez por semana_ e concedem uma licença mensal de três dias para todos, com exceçao de alguns poucos presidiários de alta periculosídade.

É rara a violência nas prisões. Quase não se ouve falar de ata­ques homossexuais. Os guardas, desarmados, teriam de chamar a polí­cia 10C'ál em caso de ocorrer um improvável motim.

Um funcionário do presídio de Norrkoping relatou a ocorrência de uma invasão de um grupo armado que libertou um detento. m que conseguiram entrar", disse ele, "nós não pu~emo.s nada:.a não ser ficar parados e assistir à fuga do preso no mtenor ~e ~lm cau.o

Foi bom que os não portas~em armas, pOlS ISSO tena aumentado o risco de vida eles."

A tolerância do sistema sueco é, em um reflexo do baixo índice de violência criminal. Somente 1 das 10 mil que

são cona,en f1 °O passam de tos, e os u.

violen­"J sso

ser icado fato de tensões raciais e étn~cas .em uma sociedade tão homogênea como li nossa", disse Lars Bolm, dlre-

Page 89: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

tor do de trabalho c treinamento da Admi

cede

sediado cm "Isso em guerra por

uma arma de tenciárias também pro-

há muito aceita - com acentuada-- de que conden:\dos deve ser dado tra-das últimos anos iriam pro-

as mais da da e nos Estados Unidos.

Central dos Presidiários, que de reivindicações que

nhou

é dirigida por toda a

solí-

tra-balhadores.

Embora não esteja ansioso por ver a organ emergindo como um sindicato com plena capacidade, Henrik Martinsson, que preside a Administração Nacional de Presídios, requereu salários equiparados - determinados pelo mercado para todos os detentos. Esse sistema já existe em diversas instituições. São também tomadas medidas visando manter os condenados em prédios próximos a :;uas

a fim dê' que mantenham seus e no sentido de lhes possibilitar a obtenção de emprego tão Jogo am postos em liberdade.

Interpretações Diferem

Por que, então, o alto índice de retorno à prisão? Entre de detentos que tinham sido condenados ante-

riormente - entrevistados por funcionários e críticos - muitos concor­daram em que a sociedade sueca, tanto quanto qualquer outra,

de ex-presidiários. Afora esse consenso, as v,<,,",,,,-,., diferem amplamente, e o fato parece perturbar

I ao processo criminal.

en/es 161

"A maioria das os como se todos nós andássemos com máscaras em nossas faces e com

, disse Lasse líder da Central dos Presidiários. "Os Não i dificuldade em obter empregos."

nd, que está detido em manifestou que no seu entender "as

têm tremenda

sües são bastante aceitávei , mas certamente não dissuadem do crime", e disse: "Você se habitua à vida do Não acho que as prisões possam reabilitar a maioria das Qualquer reabilitação

principalmente, dos vínculos do recluso com a sociedade lá

atual sentença deve-se a diz que abandonará o crime para isso".

por roubo· ua

por fraude. Aos 47 anos, ele "porque estou ficando velho demais

Programas Ineficazes

Urn detento norte-americano, cumprindo pena de anos e meio por introdução de narcóticos, disse que julga os programas de reabilitação empregados na Suécia tão ineficazes como os que se empregam nos EUA, onde também cumpriu

"A grande diferença, comparando-se a Suécia com os é que os indivíduos aqui são muito passivos", explicou. "Não há aquela raiva e violência que se vê nas prisões norte-americanas. Aqui, eles

muito bem convencer os detentos de que a vida na não é tão terrível assim. Dessa forma, isso é um simples parque de di versões."

"Veja esses indivíduos", ele continuou, apontando para um grupo que passava. "Todos eles já estiveram aqui anteriormente.

deles já estão inclusive planejando voltar. Eles não têm mais nada lá rara."

Page 90: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

162

acreditam que as tido mais sucesso na reabil

se infiltr~lll1 nas prisões, através de . E temos éstado totalmente

para o Somente há pouco tempo foi aberta a primeira instituição peni­

tenciária para tratamento de presos viciados, em caráter voluntário.

rela-

de progt-amas de levou os tanto os ligados como os desligados do sistema, a insistir em que as prisões sejam usadas somente para proteger a sociedade dos criminosos mais violentos. Henrik Martinsson, diretor do sistema penitenciário, disse que gostaria de ver algumas prisões desatívadas e uma redução de 50% na população carcerária, fazendo com que pequenos furtos, rou­bos sem uso de armas e o crime de dirigir sob embriaguez sejam puni­dos com I11uItas ao invés de reclusão.

Jar! antigo do nou um importante crítico das instituições

das sejam abolidas e que o desenvolvido em contato com a sociedade indivíduo a exercer maior

Conservador, que se tor-

a fim de obrigar o em público. "Nós

de mais burocratas. mas uma rede de vo-

insistem na abol do sistema - exceto das classes ricas. bastante

163

do fato da violência criminal, tais críticos têm até um culto de perso­nalidade, romanceado, em torno dos mais conhecidos Em

a csse Clark Olofsson, um como um dos mais

com sas, e tornou-se de um

de caráter biográfico.

e tem suas cartas e publicados com I 1 t·e '1111'\ ,c> outra Ele já L.uas vezes, uma (U1'an c ( '-'

mediante arrombamento da "Enquanto eu for não haverá outra forma de eu me aturar que não seja pela ca de atos

minosos", escreveu artigo recente, apresentando uma

"..c'.'~'" para te r .

Na maior parte dos países desenvolvidos do Ocidente, as tentati­vas de recuperação de criminosos têm sido abandonadas se não na teoria, o foram na prática -,- numa tentativa do governo para contraba­

as severas reclamações do público, alarmado com a escalada do crime e a superlotação dos sistemas penitenciários.

Nos Estados Unidos havia mais de 283 mil detentos nas prisões estaduais e federais no início do ano um aumento de 13% errt rela-ção a de 1 Os membros do têm repetidarnente ouvido denúncias de superpopulação, instalações, lon-gos períodos de espe~a por julgamento .e

Mas os leglsladores estaduais,

substancialmente a Na Grã-Bretanha, um projeto de lei aprovado em julho estipula

de prisão composta de dois O cumpri-maior ele

uma

pena iria dis-

da principalmente

Page 91: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

164

maiS

o governo ampliando os horários de IÍvros

está que em

para terroristas e criminosos iberdade 10 mil condenados

para muÍtos crimes IncnOS

um uma de .reformas, inclusive

permitindo que os detentos ha e methor;~() ti condi

para reabllllar uma popu

10.266 - Rio de Janeiro, 13 de setembro de 1977. Exmo. Sr. Juiz de Direito da Vara de Execuções Criminais do Estado do Rio de

Janeiro. Os abaixo-assinados, peritos encarregados do exame de srmidade

mental em FRANCISCO DE SOUZA PEIXOTO - RG nº 88.562 -

dão a seguir o laudo respectivo. IDENTIFICAÇAo: -- FRANCISCO MARIA PEREIRA DE

SOUZA PEIXOTO ou MARIA PEREIRA SOUZA PEI­XOTO ou FRANCISCO MARIA PEREIRA DE SOUZA, branco, solteiro, de 38 anos de iclade, nascido em 7/l /l brasileiro, natUl~al cio católico, instrução secundária, internado no Manicómio

Judiciário Heitor Carrilho.

O periciado vem

HISTÓRICO

submetido a exames de de 1959.

mental

neste Manicómio Judiciário a Ao todo foram 10 os exames, que se converteram em 10 laudos,

o primeiro deles realizado em 1959, por solicitação do Juízo da llª

165

Page 92: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

166

em foi de maconha.

eis outros foram para

de

da

ele arma e

de maco­o de

No primeiro exame realizado em nosso serviço os peritos, depois de fazerem um estudo primoroso da personalidade do periciado, fir-

tam. cor~clusões diversas, pois o feito em 1960 diz que Francisco Mana nao tem condições de ser posto em liberdade, face à sua defor­mação de caráter, enquanto o realizado em 1961 recomenda liberdade vigiada c~n: indicação de comparecer a um serviço especializado, sob responsabIlIdade de um familiar.

A primeira perícia solicitada pela 14il Vara Criminal resultou nas mesmas conclusões dos exames anteriores responsabilidade, pois os peritos assinalarri: é claramente uma ~ersonalidad~~psicopática, mentiroso, dissimulado, cínico, que atraves de uma atItude exterior estudada, procura simpatias em torno de si para melhor obter seus entretanto

delitos são todos o atual ~ produto mesmo, de uma tábua sui gene-

anormal­nitidamente psícóti~

ca, detectada atual.

sâo os crilninosos? Crinie e crinlinosos: ente,')'

um especialista menos de 20 dias antes do delito

à com o mesmo forçando o sorri-so no curso do diéílogo, com o campo ideativo se limitando aos

de é vítima de tudo o que acontece no Manicômio, acusando funcionários e outros internos de serem desonestos e maco­nheiros, ao contrário dele que é 'homem sério e honesto'. Não tem

agressivos que nas sua de de relacionar-se ao nível afetivo. Procura superar essa deficiência através de atitudes artificiais, estudadas, de mímica, sorriso e verbali­zação, simuladoras de reação emocional. Juízo crítico comprometido. Memória sem alterações.

O paciente revela não se encontrar nunca triste, nem mesmo pelo fato de estar internado e condenado: 'isto é um hábito, a gente se acostmna' ... "

Termina por concluir pelo diagnóstico de personalidade psicopá­tica com traços predominantes de caráter paranóide.

Um eletroencefalo!Yrama em 4/7/77 não revelou anor-"" malidades de bioeletrogênese cerebral.

volta a ser o psicopata de tudo e de

procura assumir ati tu-retratando-se como vítima da vida e dos demais interna-

com a finalidade de nos examinadores.

Page 93: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

168

para rnclhúr nos convencer de que é um (ornar

n as personalidades são personalidades anormais que, por sua anormalIdade, sofrem ou fazem sofrer os outros. personalida­des q:le ~empre ch~gam, em qualquer situação vital, em qualquer cir­cunstancIa, a conflItos externos ou internos. 'O psicopata é um indivÍ­duo. que, por si embora não se tenha em conta as circunstâncias SOCiaiS, é uma personalidade estranha, afastada do termo médio' (K. Schneider).

não são doentes mentais, psicóticos. A expressão tamb.ém não tern mais curso. É, uma variaçüo ano1'-

mal de p~rsonalldade. Conseqüentemente, o que se h21 de fazer no que diZ respeito ao tratamento não pode ser o preconizado para os mentazs. O m,élnllsel'o e' d't"'1 " .. ". I ICI e ex] oe normas s. O que hoje quase não se bilidacte de educar, em ou pequena medida, os indi i-dade anormal no de melhorar seu caráter. Até pouco tempo a maioria dos identificava o psicopata com;} . ~~. in.divíduo para ser modificado educação e o tratamento. 111l1elpalmente ao da 'psicologia' robusteceu-se a nova atitude, adotada pelo próprio Klages ao que certa-mente os , podem ser tratados e o são: se se quer, até !)odem ser S empre que seentender como tal seu deslocamento para

silo os crirninosos 169

e

acreditam per-

tratar Contando com enormes dificuldades, de toda ordem, em todos estes anos vem procurando dar assistência a esquizofrênicos, psicóticos, maníacos-depressivos, para­líticos etc., usando as técnicas mais avançadas mercê da ultra­passagem de grandes obstáculos, como já se acentuou.

A falta em nosso meio de uma casa de custódia e tratamento tem trazido para nosso hospital nurneroslssimos psicopatas para cumpri­mento de medidas de segurança. Esta situ j:ll1ormal é uma das principais causas do desvirtuamento gradual dos objetivos iniciais elo manicômio judiciário.

Os psicopatas trazem problemas disciplinares, administrativos de toda ordem, q ue, com o correr dos tempos, foram enorme monta, sobrepujando os demais. l-foje, sem medo de errar ou ser acu­sado de podemos fazer esta afirmação: o manicómio não cumpre suas finalidades de acordo com os mais avançados métodos da psiquiatria porque teve que sofrer no tempo uma verdadeira adap-

para cobrir a falta da casa de custódia e tratamento. O resultado é que os doentes mentais, sen.YU strictu, não são bem atendidos como tal, porque ainda temos que usar métodos coercitivos' rígidos veis aos É impossível LI uma casa ser, a só hos-pital e casa de custódia e tratamento.

Page 94: Augusto Thompson - Quem são os criminosos - O crime e os criminosos - Entes Políticos (2007)

170

Defendendo a tese da inutilidade Grulhe

"Não queremos discu!ir-- e casas de custódia tratamento

Senhor Diretor-Geral, Face conclusões do laudo de Exame de Verificação de Cessação

de Periculosidade efetuado no apenado FRANCISCO MARIA PEREIRA DE SOUZA PEIXOTO, RG. nº no Manieômio Ju­diciário Heitor Carrilho, onde se acha recolhido, solicito a V.Sa., determinar providências no sentido de ser o mesmo recolhido às dependênc~as penais desse Departamento, se possível no INSTITUTO PENAL CANDIDO MENDES, na Ilha

Outrossim, esclareço a V. Sa. que este Juízo, nesta data, àquele nosocômÍo, determinando a do apenado em tela a essa Diretoria-Geral. anexo, do laudo do exame do nado.

de de da

G. THOMPSON -Ao llmº Sr. Dr. AUGUSTO MM. do

VI

Alegoria (com adereços e sem harmol1ia)

Atirada para o meio do palco, a violência criminal transforma-se no objeto único da concentração de todos os projetores disponíveis no teatro. Em cena, apenas ela recebe o banho intenso das luzes. O resto é penumbra, às vezes escuridão absoluta. Surpreen?ida, ofuscada pelos faróis, sem conhecer o papel a desempenhar, a atnz estrela se contorce canhestramente, salta, uiva, range os dentes e espuma de ódio, na ten­tativa frustrada de romper o cerco brilhante que a envolve. Cada movi­mJ;mto, tragi-ridículo de que se reveste, excita enorme atenção do público e, por conseqüência, maior empenho dos donos do espetácul0 no sentido de em e singularmente.

Ora! Eis que 'quer abandonar a ribalta! Cumpre coartar tão Apertem o cerco! Que metida a

cortem-se-lhe os as mãos, dêem-lhe freqüentes .. mas não a matem! Para que a

preservar-lhe a vida, a os guinchos al.ucinantes. ':'amos, umas cutiladas a mais as cabriolas do corpo mutilado, os reverberos rubros do sangue a tam de maneira

TRIBUNA DO

acrescem em a iman-os sentidos dos

Rio de Janeiro, OAB, fev. 1980. p. 2.

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172

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posseiros da casa mais enraivecida e revolta entope as enchendo os olhos, entorpecem o lar, o rebaixamento da 1 morte, maior franquia para a tortura", seguida: "Tudo urro

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voe ex a:;~ a essa maldita que socorJ\~m'r com , com c

das fi las primeira:; não se 11 o ] e no corpo, que rola

teia, c dú arrancos c gira, irisado no vermelho os novos agressores,

negro manto e catadura. " não O sacrifício desse trabalho cabe só a

iea atende a pronta uI malvada o olho.

risca o ar com os cotocos sangui ,) Olhd () resultado da ]oteca l ".

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