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Direito Penal Econômico 2014 VIII Curso de Pós-graduação IBCCRIM/Universidade de Coimbra Crimes contra o Mercado de Capitais Alexandre Pinheiro dos Santos

Aula do Professor Alexandre Pinheiro – Crimes Contra o Mercado

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Direito Penal Econômico 2014

VIII Curso de Pós-graduação IBCCRIM/Universidade de Coimbra

Crimes contra o Mercado de Capitais

Alexandre Pinheiro dos Santos

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Crimes contra o Mercado de Capitais

”Executivos e sócios da (...), do RS, lucraram na Bolsa (...) com informações privilegiadas sobre sociedade com (...) grupo norte-americano (...) . A Justiça Federal de São Paulo abriu a segunda ação penal pelo crime de insider trading (uso de informações privilegiadas para lucrar no mercado de ações). Serão processadas seis pessoas, então sócias e diretoras da (...), de Caxias do Sul (...).

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Os seis são acusados de adquirirem 754 mil ações da (...) e de outra empresa do grupo (...) entre 05 de junho de 2002 e 19 de julho de 2002, cerca de dois meses antes de anunciarem a entrada da empresa (...) como sócia do grupo brasileiro, o que só foi a público por meio de fato relevante publicado em 15 de agosto de 2002. Na época em que adquiriram as ações (...) os acusados já sabiam da sociedade com os americanos. As ações foram adquiridas, segundo processo administrativo aberto pela Comissão de Valores Mobiliários (...) concluído em 2004 e que resultou em multas (...), por R$ 538 mil, e obtiveram valorização de 120% nos 12 meses após a entrada da (...) no grupo (...).” * * http://www.prsp.mpf.gov.br/sala-de-imprensa/noticias_prsp/18-02-10-segunda-acao-

penal-de-insider-trading-e-aberta-pela-justica-federal-de-sao-paulo

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I - Introdução O princípio central da regulação e da fiscalização dos emissores de valores mobiliários pela CVM é o princípio do full and fair disclosure, que norteia a lei que dispõe sobre o mercado mobiliário (Lei nº 6.385/76) e a lei corporativa brasileira (Lei nº 6.404/76). O nosso modelo de regulação e de fiscalização é fortemente inspirado na experiência estadunidense posterior ao crash da Bolsa de Nova Iorque, ocorrido após desinformados e entusiásticos investimentos no mercado de capitais. Ele coloca o Estado na posição de responsável pela exigência de um nível mínimo de informações a serem prestadas por qualquer companhia que pretenda captar a poupança popular. Os registros de emissor e de distribuições públicas de valores mobiliários junto à CVM estão inseridos no contexto acima.

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As companhias abertas devem prestar informações completas e precisas sobre os empreendimentos em comum por elas desenvolvidos e os valores mobiliários que emitam publicamente, para viabilizarem conscientes tomadas de decisão por parte de qualquer investidor. A opção estadunidense pelo princípio do disclosure foi precedida de experiência doméstica distinta (blue sky laws) e intenso debate, após o qual foram superadas opiniões no sentido de que o Estado deveria promover uma análise de mérito em relação a empreendedores e empreendimentos que pretendessem alcançar o público investidor. A ideia essencial então vencedora e ora adotada no Brasil, com temperamentos, é a de que ”a atuação do Estado não exclui o inalienável direito do cidadão de agir como um tolo, devendo-se apenas tentar prevenir que outros o façam de tolo” (adaptação de trecho do clássico Fundamentals of Securities Regulation, de Louis Loss).

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”A idéia central que orientou a elaboração das famosas leis de 1933 e 1934, nos Estados Unidos, foi exposta, pela primeira vez, em artigo de 1914 de Louis D. Brandeis (Other People´s Money), eminente advogado que seria depois juiz da Corte Suprema. Era a profilaxia do mercado, por meio da mais ampla e completa informação ao público. Na frase sempre citada, ”assim como a luz solar é tida como o melhor dos desinfetantes, a luz elétrica é o mais eficiente policial”. (...) Dever-se-ia (...) partir do princípio de que o investidor é bastante adulto para, uma vez adequadamente informado, tomar as decisões econômicas que julgar melhores, segundo seus próprios interesses, dos quais é o único juiz competente.” * * COMPARATO, Fábio Konder. A regra do sigilo nas ofertas públicas de aquisição de ações, in Revista de Direito Mercantil, vol. 49, p. 58, 1983.

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A CVM não atesta a qualidade e, portanto, não garante o sucesso de empreendimentos, conforme reconheceu, por exemplo, o MM. Juízo da 24ª Vara Federal do Rio (r. sentença nos autos do Processo nº 2003.51.01.028307-8 comentada no Portal do Investidor da CVM*), aduzindo o seguinte: ”Trata-se de ação ordinária onde os autores requerem seja a CVM condenada em R$ 430.025,00 correspondente ao prejuízo que alegam ter sofrido em razão de investimentos que realizaram, nos anos de 1999, 2000 e 2001, em Contratos de Investimentos Coletivos (CICs) emitidos pelas (...), bem como em razão de não terem conseguido que os contratos fossem resgatados pela referida sociedade nos termos entre eles firmados. *http://www.portaldoinvestidor.gov.br/portaldoinvestidor/export/sites/portaldoinvestidor/entrevistas/Arquivos/AlexandrePinheiro/Registro_na_CVM_nxo_garante_o_sucesso_do_investimento.PDF

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(...) os registros servem para concretizar a política legal de ampla divulgação de informações (full disclosure), a qual, como se sabe, consiste na ampla disponibilização a todos os investidores do mercado, ao mesmo tempo, de todas as informações necessárias à avaliação dos riscos de cada oportunidade de investimento (...) (...) a concessão de registro pela CVM possui caráter preventivo e instrumental protegendo o investidor contra investimentos temerários (frutos de desinformação), estimulando a sua participação consciente e racional no mercado. (...) a CVM não garante nem assume qualquer responsabilidade pelo sucesso do empreendimento ou pela veracidade das informações fornecidas pelas companhias (...)”.

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II - Alguns dispositivos da Lei nº 6.404/76 relacionados com a divulgação de informações no âmbito de companhias abertas ”Art. 157. O administrador de companhia aberta deve declarar, ao firmar o termo de posse, o número de ações, bônus de subscrição, opções de compra de ações e debêntures conversíveis em ações, de emissão da companhia e de sociedades controladas ou do mesmo grupo, de que seja titular. (...) § 4º Os administradores da companhia aberta são obrigados a comunicar imediatamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa qualquer deliberação da assembléia geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou fato relevante ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia.

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(...) § 6º Os administradores da companhia aberta deverão informar imediatamente, nos termos e na forma determinados pela Comissão de Valores Mobiliários, a esta e às bolsas de valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, as modificações em suas posições acionárias na companhia.” ”Art. 116-A. O acionista controlador da companhia aberta e os acionistas, ou grupo de acionistas, que elegerem membro do conselho de administração ou (...) do conselho fiscal, deverão informar imediatamente as modificações em sua posição acionária (...) à Comissão de Valores Mobiliários e às Bolsas (...) ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, nas condições e na forma determinadas pela Comissão de Valores Mobiliários.”

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”Art. 165-A. Os membros do conselho fiscal da companhia aberta deverão informar imediatamente as modificações em suas posições acionárias na companhia à Comissão de Valores Mobiliários e às Bolsas de Valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, nas condições e na forma determinadas pela Comissão de Valores Mobiliários.” III - Principais atos da CVM acerca de divulgação de informações no âmbito de companhias abertas A seguir são apresentados os principais atos e importantes dispositivos regulamentares relativos aos deveres de divulgação de informações no âmbito de companhias abertas.

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Instrução CVM nº 480, de 2009 (”registro de emissor”)

”Art. 43. O controlador deve fornecer tempestivamente ao emissor todas as informações necessárias ao cumprimento da legislação e da regulamentação do mercado de valores mobiliários. Art. 44. O emissor deve atribuir a um diretor estatutário a função de relações com investidores. (...) § 2º O representante legal dos emissores estrangeiros é equiparado ao diretor de relações com investidores para todos os fins previstos na legislação e regulamentação do mercado de valores mobiliários.”

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Instrução CVM nº 400, de 2003 (”ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários”) ”Art. 56. O ofertante é o responsável pela veracidade, consistência, qualidade e suficiência das informações prestadas por ocasião do registro e fornecidas ao mercado durante a distribuição (...)” Instrução CVM nº 358, de 2002 (”ato ou fato relevante”) ”Art. 3º Cumpre ao Diretor de Relações com Investidores divulgar e comunicar à CVM e, se for o caso, à bolsa (...) e entidade do mercado de balcão organizado em que os valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos (...), qualquer ato ou fato relevante (...), bem como zelar por sua ampla e imediata disseminação, simultaneamente em todos os mercados em que tais valores mobiliários sejam admitidos (...)

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§1º Os acionistas controladores, diretores, membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas (...) deverão comunicar qualquer ato ou fato relevante de que tenham conhecimento ao Diretor de Relações com Investidores, que promoverá sua divulgação. §2º Caso as pessoas referidas (...) tenham conhecimento pessoal de ato ou fato relevante e constatem a omissão do Diretor de Relações com Investidores (...), somente se eximirão de responsabilidade caso comuniquem imediatamente o ato ou fato relevante à CVM. §3º O Diretor de Relações com Investidores deverá divulgar simultaneamente ao mercado ato ou fato relevante a ser veiculado por qualquer meio (...), inclusive informação à imprensa, ou em reuniões de entidades de classe, investidores, analistas ou com público selecionado, no país ou no exterior.

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(...) §5º A divulgação e a comunicação de ato ou fato relevante (...) devem ser feitas de modo claro e preciso, em linguagem acessível ao público investidor. (...) Art. 4º A CVM, a bolsa de valores ou a entidade do mercado de balcão organizado em que os valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação podem, a qualquer tempo, exigir do Diretor de Relações com Investidores esclarecimentos adicionais à comunicação e à divulgação de ato ou fato relevante. Parágrafo único. Na hipótese do caput, ou caso ocorra oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade (...), o Diretor de Relações com Investidores deverá inquirir as pessoas com acesso a atos ou fatos relevantes, com o objetivo de averiguar se estas têm conhecimento de informações que devam ser divulgadas ao mercado.”

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”Art. 6º Ressalvado o disposto no parágrafo único, os atos ou fatos relevantes podem, excepcionalmente, deixar de ser divulgados se os acionistas controladores ou os administradores entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia. Parágrafo único. As pessoas mencionadas no caput ficam obrigadas a, diretamente ou através do Diretor de Relações com Investidores, divulgar imediatamente o ato ou fato relevante, na hipótese da informação escapar ao controle ou se ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados.”

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”Art. 12. Os acionistas controladores, diretos ou indiretos, e os acionistas que elegerem membros do Conselho de Administração ou do conselho fiscal, bem como qualquer pessoa natural ou jurídica, ou grupo de pessoas, agindo em conjunto ou representando um mesmo interesse, que atingir participação, direta ou indireta, que corresponda a 5% (cinco por cento) ou mais de espécie ou classe de ações representativas do capital de companhia aberta, devem enviar à companhia as seguintes informações: (...) II - objetivo da participação e quantidade visada, contendo, se for o caso, declaração do adquirente de que suas compras não objetivam alterar a composição do controle ou a estrutura administrativa da sociedade; (...)”

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IV - Fato relevante Considera-se relevante qualquer decisão de controlador, deliberação da assembléia ou dos órgãos de administração, ou qualquer outro ato ou fato de caráter político-administrativo, técnico, negocial ou econômico-financeiro ocorrido ou relacionado aos negócios que possa influir de modo ponderável: na cotação dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados; na decisão dos investidores de comprar, vender ou manter aqueles valores mobiliários; ou na decisão dos investidores de exercer quaisquer direitos inerentes à condição de titular de valores mobiliários emitidos pela companhia ou a eles referenciados.* * Art. 2º da Instrução CVM nº 358/02 (regulamento atinente ao uso de informações relevantes referentes a companhias abertas).

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A assinatura de acordo de transferência do controle acionário de companhia aberta, a decisão de se promover o cancelamento do seu registro, a celebração de acordo de acionistas que tenha sido averbado no livro próprio e a incorporação envolvendo a companhia são exemplos de fatos relevantes. * Sou o DRI de uma companhia aberta, noto movimentação atípica das ações de sua emissão e, após consultar os demais administradores da companhia, recebo a informação de que existe um acordo preliminar para viabilizar a transferência do seu controle acionário, acompanhada de um pedido de que o fato não seja imediatamente divulgado, em razão de clara possibilidade de que tal divulgação prejudique a conclusão do negócio. Pergunta: O que devo fazer diante da situação acima?

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Resposta: Devo divulgar e comunicar imediatamente o fato relevante ao público investidor, à CVM e, se for o caso, à bolsa ou entidade de balcão organizado, observados os termos da legislação aplicável. A companhia deve zelar pelo sigilo da informação privilegiada, inclusive reduzindo o número de pessoas que a ela tenham acesso ao mínimo necessário e obtendo claro e efetivo compromisso dos insiders em relação ao resguardo da informação. O zelo da companhia pelo sigilo deve se transformar em zelo pela imediata divulgação tão logo detectado que a informação escapou ao controle (vazamento). A adoção de mecanismos de regulação privada da atuação dos insiders, como ocorre no caso de restrições de atuação constantes das Políticas de Negociação previstas no art. 15 da Instrução CVM nº 358/02, também constitui um interessante mecanismo para se tentar evitar problemas com o uso indevido de informação privilegiada.

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”Art. 15. A companhia aberta poderá, por deliberação do conselho de administração, aprovar política de negociação das ações de sua emissão por ela própria, pelos acionistas controladores, diretos ou indiretos, diretores, membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas, criados por disposição estatutária. §1º A política de negociação referida no caput não poderá ser aprovada ou alterada na pendência de ato ou fato relevante ainda não divulgado, e deverá necessariamente: I - contar com a adesão expressa das pessoas mencionadas no caput que queiram dela se beneficiar, as quais deverão observá-la estritamente; II - incluir a vedação de negociações, no mínimo, no período de 15 (quinze dias anterior à divulgação das informações trimestrais (ITR) e anuais (DFP e IAN) da companhia; e

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III - adotar procedimentos que assegurem que em nenhuma hipótese a companhia negociará com as próprias ações nos períodos de vedação estabelecidos nesta Instrução e na própria política de negociação. (...)” ” (...) 55. Uma outra questão importante é a divulgação de informações relativas a negócios (...) não concluídos, isso porque a proteção dos investidores por meio da divulgação de informações não é absoluta, podendo se adequar às necessidades empresariais das companhias. Por esse motivo, a Instrução 358/02, em seu art. 6º, permite que “os atos ou fatos relevantes [excepcionalmente deixem] de ser divulgados se os acionistas controladores ou os administradores entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia”.

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56. Assim, se a divulgação de uma informação que deveria ser tornada pública, de acordo com as regras de divulgação de informação, pode impedir a conclusão de um negócio, a conquista de um cliente ou o desenvolvimento de um produto ou serviço ou pode prejudicar legítimos interesses negociais da companhia, a companhia poderá, de acordo com a legislação específica, deixar de divulgar a informação. 57. Isso não significa que as companhias podem deixar de prestar informações simplesmente porque acreditam que seus negócios podem ser prejudicados pela divulgação. É preciso que haja um legítimo propósito empresarial na manutenção do sigilo. Assim, por exemplo, um negócio em que se beneficie um acionista específico não pode deixar de ser divulgado porque essa informação impactaria negativamente o preço das ações da companhia, aumentando o seu custo de captação.

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58. Mesmo com relação a negócios legítimos e desinteressados, essa exceção à divulgação não é absoluta, pois (...) é obrigatório "divulgar imediatamente o ato ou fato relevante, na hipótese da informação escapar ao controle ou se ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados". 59. Em razão desse dispositivo, a companhia não pode recusar-se a confirmar, negar ou complementar uma informação já dispersa pelo mercado (ou que esteja sendo utilizada pelos investidores), mesmo que ela não tenha sido divulgada pela companhia. 60. Um outro aspecto importante sobre a divulgação de fatos relevantes, é que as informações divulgadas ao mercado pelas companhias devem sempre ser prestadas de forma completa (art. 3º, §4º da Instrução 358/02), clara e precisa (§5º do mesmo artigo).

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(...) 63. Deve-se notar que o administrador é o responsável pela divulgação (...) do fato relevante de forma completa. Não obedece a legislação quem anuncia um fato, mas espera uma ordem da CVM para divulgar os aspectos relevantes (...) já (...) de seu conhecimento. (...) embora a Instrução 358/02 atribua à administração da companhia aberta a definição do que seja informação relevante (ao Diretor de Relações com Investidores, mais precisamente), esse poder conferido à administração não é absoluto. Caso os investidores alterem seu comportamento (...) em função de informação relativa à companhia da qual tenham conhecimento parcial (ou total), mas não divulgada pela companhia, (...) a administração (...) deverá negá-la ou confirmá-la e, se for o caso, complementá-la.” * * Decisão do Colegiado da CVM no âmbito do PAS CVM RJ Nº 2006/4776, disponível em www.cvm.gov.br.

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”(...) podemos classificar os casos de negociação com base em

informação privilegiada em quatro grandes grupos: i. no primeiro grupo, temos o acionista controlador e os

administradores da companhia, em relação aos quais vigora uma vedação absoluta, ou seja, eles não podem negociar com ações da empresa enquanto o fato relevante não for divulgado ao público;

ii. no segundo grupo, temos os demais integrantes da empresa, em relação aos quais vigora uma presunção relativa de que conhecem a informação e sabem que ela é sigilosa;

iii. no terceiro grupo, temos pessoas que mantêm relação profissional, comercial ou fiduciária com a companhia, em relação às quais não vigora qualquer presunção de ciência da informação, mas somente a presunção relativa de ciência do caráter sigiloso da informação, baseada no dever de investigar;

iv. no quarto grupo, temos todos os demais investidores do mercado de capitais, em relação aos quais não vigora nenhuma presunção.”

* Voto na Decisão no âmbito do PAS CVM SP Nº 2005/0155.

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V - Insider trading Em termos gerais, pode-se dizer que o uso indevido de informação privilegiada ou insider trading ocorre quando alguém utiliza informação relevante de que tenha conhecimento e que ainda não tenha sido divulgada ao mercado, para obter, para si ou para outrem, algum tipo de vantagem na negociação com valores mobiliários. Nos dias atuais a conduta do insider repercute nas searas administrativa, civil e criminal. Como se verá mais adiante, na área penal o ilícito se caracteriza se a pessoa que utiliza a informação tem o dever de mantê-la sob sigilo. No âmbito civil, além de ações judiciais individuais, é possível o ajuizamento de ação civil pública pela CVM e pelo MPF.

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A obtenção de lucros é da essência do mercado de capitais, mas se isso ocorre com base em informação privilegiada, isto é, não disponível a todas as partes nas operações, faz-se presente um dos mais nefastos ilícitos econômicos. Quem utiliza indevidamente informação privilegiada fere gravemente o princípio básico do full and fair disclosure. O insider abala a credibilidade, a estabilidade e a eficiência do mercado de capitais e mina o interesse das pessoas em investir a sua poupança em companhias que, com tais recursos, poderiam prover o desenvolvimento econômico do país. Não por outra razão se trata de um dos crimes tipificados na Lei nº 6.385, de 07 de dezembro de 1976.* * Nesse sentido: SANTOS, Alexandre Pinheiro dos; OSÓRIO, Fábio Medina; e WELLISCH, Julya Sotto Mayor. Mercado de Capitais - Regime Sancionador. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 129.

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Quanto aos âmbitos civil e administrativo, assim dispõe o art. 155 da Lei nº 6.404/76, cujo descumprimento enseja ampla responsabilização no campo civil e, por força do disposto no art. 11 da Lei nº 6.385/76, a aplicação de penalidades administrativas pela CVM: ”(...) § 1º Cumpre, ademais, ao administrador de companhia aberta, guardar sigilo sobre qualquer informação que ainda não tenha sido divulgada para conhecimento do mercado, obtida em razão do cargo e capaz de influir de modo ponderável na cotação de valores mobiliários, sendo-lhe vedado valer-se da informação para obter, para si ou para outrem, vantagem mediante compra ou venda de valores mobiliários.

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§ 2º O administrador deve zelar para que a violação do disposto no § 1º não possa ocorrer através de subordinados ou terceiros de sua confiança. § 3º A pessoa prejudicada em compra e venda de valores mobiliários, contratada com infração do disposto nos §§ 1º e 2º, tem direito de haver do infrator indenização por perdas e danos, a menos que ao contratar já conhecesse a informação. § 4o É vedada a utilização de informação relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários.”

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Ainda quanto ao âmbito administrativo, eis o que dispõe a Instrução CVM nº 358/02, em seu art. 13: ”Art. 13. Antes da divulgação ao mercado de ato ou fato relevante ocorrido nos negócios da companhia, é vedada a negociação com valores mobiliários de sua emissão, ou a eles referenciados, pela própria companhia aberta, pelos acionistas controladores, diretos ou indiretos, diretores, membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas, criados por disposição estatutária, ou por quem quer que, em virtude de seu cargo, função ou posição na companhia aberta, sua controladora, suas controladas ou coligadas, tenha conhecimento da informação relativa ao ato ou fato relevante.

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§1º A mesma vedação aplica-se a quem quer que tenha conhecimento de informação referente a ato ou fato relevante, sabendo que se trata de informação ainda não divulgada ao mercado, em especial àqueles que tenham relação comercial, profissional ou de confiança com a companhia, tais como auditores independentes, analistas de valores mobiliários, consultores e instituições integrantes do sistema de distribuição, aos quais compete verificar a respeito da divulgação da informação antes de negociar com valores mobiliários de emissão da companhia ou a eles referenciados. (...) §7º As vedações previstas no caput e nos §§ 1º a 3º não se aplicam às negociações realizadas pela própria companhia aberta, pelos acionistas controladores, diretos ou indiretos, diretores, membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas, criados por disposição estatutária, de acordo com política de negociação aprovada nos termos do art. 15.”

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”Não se pode fugir à evidência do desvalor da conduta do insider. Cabe compará-la com a do assassino que se vale de uma emboscada: a vítima não sabe que o seu matador tem conhecimento da intenção, ou o costume de passar por aquele lugar pois, se soubesse, não passaria. Já o matador tem todas as informações necessárias para matar a vítima: sabe por onde e quando ela passará por aquele lugar, e lá estará para eliminar a sua vida. A vítima passa desprevenida e o matador dispara a arma e logra o seu intento. O legislador penal compreendeu o repúdio social à emboscada e por isso mesmo a constituiu como um agravante do homicídio.” * * JOSÉ MARCELO MARTINS PROENÇA em O que falta à criminalização do insider trader no Brasil. Artigo jurídico disponível em http://www2.bmf.com.br/cimConteudo/W_Hemeroteca/ArtigoJos%C3%A9%20

Marcelo%20Martins%20Proen%C3%A7a.pdf

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”Em termos amplos, o bem juridicamente protegido pela ameaça penal contida no art. 27-D da Lei n. 6.385/76, introduzido pela Lei n. 10.303/2001 é o da estabilidade do mercado de capitais. Mais especificamente, a norma visa a tutelar o processo de disclosure, ou seja, da ampla e completa divulgação de informações como elemento essencial de proteção aos investidores do mercado de capitais. No mercado de capitais, a ampla divulgação de informações constitui, tanto entre nós como no Direito Comparado, o elemento essencial de tutela dos interesses dos investidores; assim, considera-se que, uma vez bem informados, os investidores estarão adequadamente protegidos. Considera-se, na teoria econômica, que o mercado é eficiente quando a cotação das ações reflete, de forma virtual e instantânea, todas as informações disponíveis sobre as companhias cujos títulos são publicamente negociados. (...)

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”O princípio da transparência das informações completa-se com outro (...) fundamental: as informações devem estar disponíveis a todos ao mesmo tempo (...) A repressão ao insider trading, ademais, visa a preservar um nível mínimo de confiabilidade no mercado de valores mobiliários; com efeito, há um total desequilíbrio entre o insider e os demais participantes do mercado, sendo eticamente condenável a obtenção de lucros em função única e exclusivamente do acesso e utilização privilegiada de informações. Com efeito, o lucro obtido pelo insider decorre unicamente de sua posição de acesso privilegiado (...), uma vez que ele negocia antes da sua divulgação, ou seja, a preços que ainda não estão refletindo o seu impacto no mercado.” * * MODESTO CARVALHOSA/NELSON EIZIRIK em A Nova Lei das S/A, São Paulo, Saraiva, 2002, pp. 544 e 545.

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”Há razões de ordem econômica e de ordem ética que justificam a repressão ao uso privilegiado de informações (...).” * * NELSON EIZIRIK/ARIÁDNA B. GAAL/FLÁVIA PARENTE/MARCUS DE FREITAS HENRIQUES em Mercado de Capitais - Regime Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2008, p. 524.

A prova no insider trading O insider trading pode ser provado com prova indiciária ou indireta, mas nem tudo o que se relaciona com o tema se resolve com indícios ou presunções.

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Em se tratando de acusados de uso indevido de informação privilegiada que, em razão de posição ocupada no âmbito de companhia aberta, conheciam e deveriam ter guardado sigilo da informação relevante ainda não divulgada (como ocorre com os administradores respectivos), pode-se presumir, ainda que relativamente (presunção juris tantum), a prática do ilícito. Em regra, basta, em tal hipótese, existir também a prova direta de que os acusados operaram com as ações de emissão da companhia na qual atuam previamente ao anúncio oficial da informação relevante. Em relação ao insider de mercado ou tippee a situação é diferente. Faz-se necessário demonstrar, ainda que mediante a utilização de prova indiciária, que ocorreu o uso indevido de informação privilegiada.

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”U.S. Supreme Court: ”Circumstantial evidence is not only sufficient, but may also be more certain, satisfying and persuasive than direct evidence.” Michalic v. Cleveland Tankers, Inc., 364 U.S. 325, 330 (1960).” ”(...) The Commission need not show direct evidence of the transmission of material, non-public information in order to establish that a defendant engaged (...) in insider trading. Circumstantial evidence (such as contacts between the trader and persons with possession of the material, non-public information, the suspicious timing of the trades, and the offering of implausible reasons for the trades) may support an inference that insider trading has, in fact, occurred. U.S. v. Mc Dermott, 245 F.3d 133, 138 (2d Cir. 2001); SEC v. Singer, 786 F. Supp. 1158, 1164 (S.D.N.Y, 1992) (…)” (UNITED STATES DISTRICT COURT FOR THE EASTERN DISTRICT OF PENNSYLVANIA/http://www.paed.uscourts.gov/documents/opinions/05d0428p.pdf)

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”(...) 4.2 Na minha opinião, o direito brasileiro permite que uma pessoa seja condenada por negociação com informação privilegiada mesmo que não se consiga precisar como essa informação foi obtida. 4.3 A necessidade de identificar um informante dentro da companhia, inspirada no direito norte-americano e muito criticada por lá, não foi acolhida no nosso sistema jurídico. Entre nós, basta que o acusado tenha negociado com informação relevante não-divulgada ao mercado para que se caracterize a infração. (...) 4.5 (...) basta que a pessoa que negociou no mercado “tenha tido acesso" a uma informação que seja relevante e que ainda não tenha sido divulgada ao mercado pelos canais próprios.”*

* Voto na Decisão no âmbito do PAS CVM Nº 24/05.

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”(...) No mesmo diapasão é a prova dos crimes e infrações no mercado de capitais. São as circunstâncias concretas, mesmo indiciárias, que permitirão a conclusão pela condenação. Na investigação de insider trading (uso de informação privilegiada e secreta antes da divulgação ao mercado de fato relevante): a baixa liquidez das ações; a frequência com que são negociadas; ser o acusado um neófito em operações de bolsa; as ligações de parentesco e amizade existentes entre os acusados e aqueles que tinham contato com a informação privilegiada; todas estas e outras são indícios que, em conjunto, permitem conclusão segura a respeito da ilicitude da operação”.* * STF, Pleno, Voto do Min. Luiz Fux na AP 470, DJe 19/04/2013.

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Mas e os que dizem que insider trading é bom?

”Impossível de ser regulado, insider poderia ser liberado” Brasil Econômico do dia 31/10/09

”Informações privilegiadas ajudam a precificar ações e beneficiam o pequeno investidor, defende economista (...) chefe do Departamento Econômico da Universidade George Mason, Donald J. Bourdreaux (...) defende que é saudável para o mercado ter a participação dos insiders nas negociações. A lógica é que (...) quando o insider trader opera informações privilegiadas, transfere os dados ao preço, tornando-o mais próximo da realidade das empresas.

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(...) É muito melhor, e mais prático, deixar que cada empresa defina o que é, e o que não é, a informação que aquela empresa (...) deseja proteger de uma negociação. Também é preciso deixar que cada uma tente prevenir essas negociações por (...) políticas próprias (por exemplo, tentando demitir os executivos que violam as regras) e por meio dos tribunais.”

* Entrevista decorrente do Artigo Learning to Love Insider Trading, publicado no The Wall Street Journal e disponível em http://online.wsj.com/article/SB10001424052748704224004574489324091790350.html

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Vale destacar, em relação à atuação da CVM na prevenção e no combate ao ilícito de insider trading, que atualmente a Autarquia mantém acordos de cooperação com o MPF e a PF, atuando em estrita consonância, inclusive, com o princípio do non bis in idem, e, mais especificamente, o seguinte: 1 - decisões judiciais de bloqueio de ativos em ações movidas pela CVM e pelo MPF no âmbito dos notórios casos ”Ipiranga” e ”Suzano” e ações civis públicas decorrentes. 2 - atuação da CVM, inclusive como assistente da acusação, nos três primeiros processos penais envolvendo o ilícito de insider trading do Brasil (notórios casos ”Sadia”, ”Randon” e ”Mundial”, tendo o primeiro caso ensejado, em 2011, a primeira condenação penal por insider do país, mantida e incrementada no âmbito do TRF/3ª R.).

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3 - Termo de Compromisso e de Ajustamento de Conduta no âmbito do PAS CVM RJ Nº 2007/12231 e da ACP nº 2007.51.01.022852-8 (6ª VF/RJ): A CVM e o Ministério Público Federal (MPF) assinaram, em 17/03/08, o primeiro Termo de Compromisso e de Ajustamento de Conduta firmado com um participante do mercado de capitais, para o encerramento concomitante de procedimentos administrativo e judicial. Trata-se de acordo com uma sociedade estrangeira que adquiriu ações preferenciais de emissão da Suzano Petroquímica S.A. em 27/07/07, tendo vendido toda a posição no dia 03 de agosto seguinte, logo após publicação de fato relevante relativo à aquisição do controle da companhia, obtendo lucro de mais de R$ 500.000,00. O Termo foi homologado pelo MM. Juízo da 6ª (Sexta) Vara Federal do Rio de Janeiro e a Compromitente desembolsou a quantia de R$ 2.200.000,00, destinada aos investidores que operaram com ela e ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos.

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4 - Termo de Compromisso no âmbito do PAS CVM RJ Nº 2007/11305: Para extinguir processo administrativo sancionador envolvendo indevida divulgação de informações acerca de companhia aberta, ex-governador de Estado apresentou proposta à CVM de enviar declaração a então governadores reconhecendo a importância de as informações sensíveis e relevantes, capazes de influenciar a cotação dos valores mobiliários de emissão de companhias abertas sob controle estatal, serem informadas por meio dos canais institucionais da própria companhia e de acordo com a legislação, especialmente a regulamentação da CVM. O proponente se comprometeu ainda a atender os veículos de imprensa que o procurassem para tratar do assunto. O Colegiado da CVM aprovou a proposta em 05/06/08, pois entendeu ser conveniente e oportuna e que, embora não contemplasse prestação pecuniária, justificava-se por seu caráter educativo.

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5 - Termo de Compromisso e de Ajustamento de Conduta celebrado no âmbito do PAS CVM RJ Nº 2009/428:

Em 26/02/09, foi noticiada a aprovação, pela CVM e pelo MPF, de

proposta de celebração de Termo de Compromisso e de Ajustamento

de Conduta apresentada por integrante do bloco de controle da

Construtora Tenda S.A. e membro da sua administração em novo caso

de possível insider trading. A fim de extinguir o Processo CVM N° RJ

2009/428 antes mesmo de formulada qualquer acusação, bem como

de evitar a adoção de medidas de natureza civil pela CVM e pelo MPF, o

proponente comprometeu-se a pagar R$ 200.000,00 ao Fundo de

Defesa de Direitos Difusos e ainda a não ocupar cargo de

administração ou no conselho fiscal, por três anos, em entidade

regulada pela CVM.

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6 - Termo de Compromisso e de Ajustamento de Conduta no âmbito do PAS CVM RJ Nº 10/08 e da ACP nº 2007.51.01.01.4273-7 (15ª VF/RJ): Em setembro de 2010, CVM e MPF noticiaram Termo de Compromisso e de Ajustamento de Conduta celebrado com ex-gerente da BR Distribuidora que realizou operações com ações de emissão de sociedades do Grupo Ipiranga antes e logo após o anúncio da aquisição de empresas do Grupo por Braskem, Ultra e Petrobras, no ano de 2007. O Compromitente respondia a processos administrativo e judicial sob acusação de insider trading e se obrigou ao pagamento do total do ganho com a sua atuação no mercado reputada irregular (R$ 120.067,75 mais atualização), acrescido de R$ 240.135,50, bem como a não operar no mercado por três anos.

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Insider trading ao redor do mundo Inúmeras outras jurisdições atuam na prevenção e no combate ao insider trading e adotam, essencialmente, as mesmas regras gerais e as mesmas práticas ora utilizadas no Brasil, valendo destacar, nesta oportunidade, o seguinte: - nos EUA, a regra, para a responsabilização de um insider de mercado, é a necessidade de comprovação de vínculo ou contato deste com um insider primário, sendo que a SEC (CVM estadunidense) utiliza, em grande medida, para o encerramento de casos da espécie, o denominado consent decree; e

- a primeira condenação criminal por insider trading do Reino Unido ocorreu em março de 2009 (a já citada primeira condenação do Brasil ocorreu em 2011).

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VI - CRIMES CONTRA O MERCADO DE CAPITAIS

Lei nº 6.385/76, alterada pela Lei nº 10.303/01

Manipulação do mercado

”Art. 27-C. Realizar operações simuladas ou executar outras manobras fraudulentas, com a finalidade de alterar artificialmente o regular funcionamento dos mercados de valores mobiliários em bolsa de valores, de mercadorias e de futuros, no mercado de balcão ou no mercado de balcão organizado, com o fim de obter vantagem indevida ou lucro, para si ou para outrem, ou causar dano a terceiros:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime.”

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Lei nº 1.521, de 26/12/51

Crimes contra a economia popular ”VI - provocar a alta ou baixa de preços de mercadorias, títulos

públicos, valores ou salários por meio de notícias falsas, operações fictícias ou qualquer outro artifício;

Pena – detenção, de 2 (dois) anos a 10 (dez) anos, e multa, de

vinte mil a cem mil cruzeiros.”

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INSTRUÇÃO CVM Nº 8, DE 08 DE OUTUBRO DE 1979 ”I - É vedada aos administradores e acionistas de companhias

abertas, aos intermediários e aos demais participantes do mercado de valores mobiliários, a criação de condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores mobiliários, a manipulação de preço, a realização de operações fraudulentas e o uso de práticas não eqüitativas.

II - Para os efeitos desta Instrução conceitua-se como: a) condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores

mobiliários aquelas criadas em decorrência de negociações pelas quais seus participantes ou intermediários, por ação ou omissão dolosa provocarem, direta ou indiretamente, alterações no fluxo de ordens de compra ou venda de valores mobiliários;

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b) manipulação de preços no mercado de valores mobiliários, a

utilização de qualquer processo ou artifício destinado, direta ou indiretamente, a elevar, manter ou baixar a cotação de um valor mobiliário, induzindo, terceiros à sua compra e venda;

c) operação fraudulenta no mercado de valores mobiliários, aquela

em que se utilize ardil ou artifício destinado a induzir ou manter terceiros em erro, com a finalidade de se obter vantagem ilícita de natureza patrimonial para as partes na operação, para o intermediário ou para terceiros;

d) prática não eqüitativa no mercado de valores mobiliários, aquela

de que resulte, direta ou indiretamente, efetiva ou potencialmente, um tratamento para qualquer das partes, em negociações com valores mobiliários, que a coloque em uma indevida posição de desequilíbrio ou desigualdade em face dos demais participantes da operação.”

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Objeto: o regular funcionamento do mercado de valores mobiliários

(bolsa de valores, de mercadorias e de futuros, mercado de balcão ou mercado de balcão organizado) e, portanto, a estabilidade e a confiança no mercado de capitais.

Sujeito ativo: qualquer participante do mercado mobiliário (conceito amplo e dinâmico adotado pela Lei nº 6.385/76).

Sujeito passivo: titulares de valores mobiliários, investidores do mercado mobiliário, CVM e sociedade como um todo.

Condutas típicas: realização de operações simuladas ou a execução de outras manobras fraudulentas com o fim de alterar artificialmente o regular funcionamento do mercado e obter vantagem ou causar dano.

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Consideram-se idôneos para alterar artificialmente o regular funcionamento dos mercados os atos que possam modificar as condições de formação dos preços ou as condições normais de oferta ou de demanda de valores mobiliários.

Elemento subjetivo: o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de realizar as operações simuladas ou executar outras manobras fraudulentas na forma do tipo de que se trata.

Momento consumativo: o crime se consuma com a efetiva realização da operação simulada ou com a execução de manobras tendentes a burlar o regular funcionamento do mercado de capitais e obter vantagem ou causar dano. É crime formal e de perigo abstrato.

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Ação penal: pública incondicionada.

Pena: reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime. O art. 27-F da Lei nº 6.385/76 estabelece que a multa cominada para o crime deverá ser aplicada em razão do dano provocado ou da vantagem ilícita auferida pelo agente, bem como que, nos casos de reincidência, a multa pode ser de até o triplo do valor fixado.

* Manipulação x especulação/Manipulação x estabilização de preços

** Churning, scalping, boiler room, difusão de informações falsas (...)

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Uso Indevido de Informação Privilegiada

”Art. 27-D. Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliários:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime.”

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Objeto: o regular funcionamento do mercado mobiliário (bolsa de valores, de mercadorias e de futuros ou mercado de balcão) e, portanto, a estabilidade e a confiança nos mercados, mais precisamente o processo de disclosure, ou seja, da ampla e completa divulgação de informações, como elemento essencial para a proteção dos investidores, e a própria eficiência do sistema, assim como a atuação institucional da CVM.

Sujeito ativo: aqueles que, por exemplo, em razão de ofício, têm acesso a informações privilegiadas (ex: administradores de companhia aberta).

Sujeito passivo: titulares de valores mobiliários, investidores do mercado mobiliário, companhia, CVM e sociedade como um todo.

Condutas típicas: utilizar (fazer uso), de qualquer modo, informação relevante com as características previstas no tipo.

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Elemento subjetivo: o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de utilizar a informação relevante ainda não divulgada ao mercado, nos estritos termos do tipo.

Momento consumativo: o crime se consuma com a efetiva utilização de informação relevante com as características previstas no tipo. Trata-se de crime formal e de perigo abstrato.

Ação penal: pública incondicionada.

Pena: reclusão - 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime. Aplica-se, também aqui, o art. 27-F da Lei nº 6.385/76.

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Exercício Irregular de Cargo, Profissão, Atividade ou Função ”Art. 27-E. Atuar, ainda que a título gratuito, no mercado de valores

mobiliários, como instituição integrante do sistema de distribuição, administrador de carteira coletiva ou individual, agente autônomo de investimento, auditor independente, analista de valores mobiliários, agente fiduciário ou exercer qualquer cargo, profissão, atividade ou função, sem estar, para esse fim, autorizado ou registrado junto à autoridade administrativa competente, quando exigido por lei ou regulamento:

Pena - detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.”

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Objeto: o interesse social de que funções especiais e de claro interesse público da espécie das abrangidas pelo tipo somente sejam exercidas por pessoas aptas e confiáveis, nos termos da lei.

Sujeito ativo: qualquer pessoa.

Sujeito passivo: o Estado e, secundariamente, as pessoas que exercem as funções de que se cuida nos estritos termos da lei.

Condutas típicas: atuar na forma do tipo.

Elemento subjetivo: o dolo.

Momento consumativo: prática do primeiro ato sem autorização.

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Ação penal: pública incondicionada.

Pena: detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Competência nos crimes contra o mercado de capitais

A ação penal será promovida pelo Ministério Público Federal perante a Justiça Federal. Nesse sentido resposta à consulta formulada pela PFE/CVM à 2ª Câmara Criminal do MPF e acordo de cooperação para o intercâmbio de informações e a prevenção e o combate a ilícitos no mercado de capitais firmado pela CVM e pelo MPF em 08/05/08 (tal posicionamento foi também o adotado, por exemplo, em v. acórdão do TRF/3ª R. na AC 45484):

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”Considerando que diversas práticas lesivas ao mercado de capitais

também constituem crimes previstos nos artigos 27-C a 27-F, todos da Lei 6.385, de 7 de Dezembro de 1976, bem como infrações contra a coletividade e os investidores difusos (Art. 129, inciso III, da Constituição da República; Art. 6º, inciso XII, da Lei Complementar n.° 75/93; Art. 1º, inciso I, da Lei n.° 7.347/85 e Lei n.º 7.913/89); cabendo ao MPF a atribuição para ajuizar ações penais e ações civis públicas;”

”Art. 109 - Aos juízes federais compete processar e julgar: IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em

detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

(...) VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;” (sem destaques o original - CF/88)