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1 1 Autoria: Cione Haires dos Santos Manual do Professor Digital

Autoria:Cione Haires dos Santos · 2019-07-26 · OBJETOS DO CONHECIMENTO HABILIDADES 8º ANO. 9º ANO. TODOS OS CAMPOS DE ATUAÇÃO O texto literário no contexto sociocultural Dimensão

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Autoria:Cione Haires

dos Santos

Manualdo Professor

Digital

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CATEGORIA 2

8º. e 9º. anos do Ensino Fundamental

TEMAS Encontros com a diferença

Sociedade, política e cidadania

Diálogos com a história e a filosofia

AUTORIA DAS ATIVIDADES:

CIONE HAIRES DOS SANTOS

Mestranda em Linguística Aplicada pela UNITAU em São Paulo; especialista em Desenvolvimento Editorial com Ênfase em Material Didático pela PUCPR e em Leitura e Produção de Textos pela FAEPR; graduada em

Letras – Português/Inglês pela PUCPR. Há mais de 15 anos atua na área editorial desenvolvendo materiais didáticos: livros, e-books, jogos e diversos

conteúdos digitais na área de educação.

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MANUAL DO PROFESSOR DIGITAL

Cione Haires dos Santos

OFÍCIOS DO TEMPO

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Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP)(Maria Teresa A. Gonzati / CRB 9-1584 / Curitiba, PR, Brasil)

S237 Santos, Cione Haires dos. Ofícios do tempo : manual do professor digital / Cione Haires dos Santos. – Curitiba : Positivo, 2018. 20 MB ; e-PUB ISBN 978-85-54109-12-7

1. Literatura – Manuais, guias, etc. I. Título.

CDD 800

Manual do Professor Digital

© texto: Cione Haires dos Santos, 2018.

Gerente Editorial: Júlio Röcker Neto

Edição: Cristiane Mateus

Revisão: Felipe Ramalho da Silva e Luiz Henrique Tobias

Supervisão Conteúdo Digital: Cassiano Novacki

Edição de Arte: Juliana Maria Salmon Franklin

Projeto Gráfico: Daniel Cabral e Paula Rodrigues Bonardi Blaskowski

Diagramação: Paula Rodrigues Bonardi Blaskowski

Todos os direitos reservados à Positivo Soluções Didáticas Ltda.

Rua Senador Accioly Filho, 431

81310-000 – Curitiba – PR

Site: www.editorapositivo.com.br

Fale com a gente: 0800 723 68 68

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1 CONTEXTUALIZAÇÃO: AUTOR E OBRA

2 MOTIVAÇÃO PARA LEITURA E ESCUTA

3 TEMAS, CATEGORIA E GÊNERO LITERÁRIO

4ABORDAGEM DA OBRA LITERÁRIA: ORIENTAÇÕES, SUBSÍDIOS E PROPOSTAS DE ATIVIDADES DE LEITURA

5 ORIENTAÇÕES PARA AS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

6 ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR

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CONTEXTUALIZAÇÃO: AUTOR E OBRA

O AUTOR: DONIZETE GALVÃO

Donizete Galvão nasceu em Borda da Mata, pequena cidade do sul de Minas Gerais, em 1955. Em 1979, mudou-se para São Paulo, onde se formou em Jornalismo. Trabalhou muitos anos como jornalista e publicitário. Tem vários livros de poesia publicados, com algumas premiações, alguns deles dirigidos ao público jovem. Faleceu em São Paulo, em janeiro de 2014.

A ORGANIZADORA: LINDSEY ROCHA LAGNI

Lindsey Rocha Lagni nasceu em Curitiba. É escritora, artista plástica e pesquisadora no teatro, cinema e fotografi a. Autora do livro “Nervuras do silêncio” e integrante da antologia de poemas “Fantasma civil”, escreveu vários textos para jornais e companhias de teatro. É formada em Letras pela Universidade Federal do Paraná e hoje se dedica também a atividades ligadas ao mercado editorial.

A OBRA: OFÍCIOS DO TEMPO

Os poemas deste livro são um convite à exploração das coisas simples do cotidiano. Coisas tão diferentes como a água parada de um poço ou a argamassa feita com estrume de vaca para rebocar o chão da cozinha. Ou ainda uma tela de pintura, que revela aspectos tão diferentes do mundo, os aromas de outono e as ruínas das casas, as recordações ou os animais no zoológico. Sempre no ritmo do tempo, que tudo move, e tudo consome.

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PRÊMIOS DE DESTAQUE

∙ Selecionado para o catálogo brasileiro apresentado na Feira do Livro Infantil de Bolonha 2015, na Itália.

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MOTIVAÇÃO PARA LEITURA E ESCUTA

Inferir a presença de valores sociais, culturais e humanos e de diferentes visões de mundo em textos literários.

(EF69LP14 – BNCC)

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Ofícios do Tempo é uma obra que nos leva a observar e refl etir sobre o cotidiano de forma minuciosa, de nos ater aos detalhes do nosso modo de viver. Com uma talentosa organização realizada por Lindsey Rocha Lagni, os poemas apresentados neste livro mostram um pouco da origem mineira de Donizete Galvão, em Borda da Mata.

Uma leitura que promove o respeito ao outro, a acolhida e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, afi nal o campo é espaço em que os poemas são apresentados: um ambiente rural, com vocabulário típico dessas regiões, como taipa, tabatinga ou trempe.

Também possibilita a abordagem de temáticas como sociedade, política e cidadania, principalmente nos textos que dialogam ou apenas tangenciam o assunto trabalho, muito presente nessa seleção do autor.

Por fi m, também há a possibilidade de fomentar refl exões e discussões a respeito dos diálogos que os poemas fazem com questões históricas ou fi losófi cas, como em A dureza do instante ou Reboco.

Desenvolvidos por meio de memórias, experiências e pensamentos, os poemas de Donizete Galvão distanciam-se daqueles que adornam o ambiente rural que se perdeu com os processos de urbanização, e sim se dedicam a mostrar outra faceta, aquela que envolve a beleza do mundo do trabalho, do cotidiano e seus ofícios no tempo .

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UNIDADES TEMÁTICAS

OBJETOS DO CONHECIMENTO

HABILIDADES

8.º ANO 9.º ANOTODOS OS CAMPOS DE ATUAÇÃO

O texto literário no contexto sociocultural

Dimensão social e estética do texto literário

(EF69LP14) Inferir a presença de valores sociais, culturais e humanos e de diferentes visões de mundo em textos literários.

(EF69LP15) Reconhecer, em textos literários, formas de estabelecer múltiplos olhares sobreas identidades, sociedades e culturas, considerando o momento e o local de sua produção e autoria.

Interesse pela leitura literária

Apreciação de texto literário

(EF69LP16) Ler, de forma autônoma, textos literários de diferentes gêneros, expressando avaliação do texto lido e estabelecendo preferências por gêneros, temas, autores.

Categorias do discurso literário

Elementos constitutivos do discurso poético em versos: estratos fônico, semântico e gráfico

(EF08LP33) Interpretar, em textos em versos, efeitos de sentido produzidos pelo uso de recursos expressivos sonoros (estrofação, rimas, aliterações), semânticos (figuras de linguagem) e gráfico-espaciais (distribuição do texto e da mancha gráfica na página, ilustração e sua relação com o texto poético)

Experiências estéticas

Processos de criação (EF09LP43) Parodiar poemas conhecidos da literatura.

Fonte: BNCC

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TEMAS, CATEGORIA E GÊNERO LITERÁRIO3TEMAS

Encontros com a diferença

Sociedade, política e cidadania

Diálogos com a história e a fi losofi a

CATEGORIA 2

8º. e 9º. anos do Ensino Fundamental

GÊNERO

Poema

JUSTIFICATIVA

Nesta antologia de poemas de Donizete Galvão, o leitor é convidado a observar a sociedade nas simplicidades do cotidiano. O tempo, como protagonista da obra, passa pela história por meio das palavras do autor, que apontam a beleza do ritmo do tempo, esse companheiro inseparável de todos nós.

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ABORDAGEM DA OBRA LITERÁRIA: ORIENTAÇÕES, SUBSÍDIOS E PROPOSTAS DE ATIVIDADES DE LEITURA44.1 ORIENTAÇÕES GERAIS: DIALOGANDO COM A BNCC

A obra literária não é um livro didático, ou seja, não é escrita a partir de conteúdos didáticos e não tem o compromisso de ensinar disciplinas como Matemática, Ciências, Geografi a... Se assim fosse, deixaria de ser literatura. Porém, muitos livros literários trazem – seja em seu tema, seu enredo, sua narrativa ou suas imagens – rico e vasto manancial que pode ser aproveitado pelo professor em sala de aula para estimular e desenvolver competências que visam à formação humana em suas múltiplas dimensões.

A BNCC aponta dez competências gerais que devem ser desenvolvidas pela educação. A leitura de obras literárias pode ser uma ponte valiosa para essas competências. O livro Ofícios do tempo possibilita uma relação mais estreita com as competências 1, 3 e 9 (ver quadro).

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COMPETÊNCIAS GERAIS DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construí-dos sobre o mundo físico, social e cultural para entender e ex-plicar a realidade (fatos, informações, fenômenos e processos linguísticos, culturais, sociais, econômicos, científi cos, tecno-lógicos e naturais), colaborando para a construção de uma sociedade solidária.

2. Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a refl exão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e tes-tar hipóteses, formular e resolver problemas e inventar soluções com base nos conhecimentos das diferentes áreas.

3. Desenvolver o senso estético para reconhecer, valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também para participar de práticas diversifi cadas da produção artístico-cultural.

4. Utilizar conhecimentos das linguagens verbal (oral e escrita) e/ou verbo-visual (como Libras), corporal, multimodal, artística, mate-mática, científi ca, tecnológica e digital para expressar-se e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e, com eles, produzir sentidos que levem ao entendi-mento mútuo.

5. Utilizar tecnologias digitais de comunicação e informação de forma crítica, signifi cativa, refl exiva e ética nas diversas práticas do cotidia-no (incluindo as escolares) ao se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos e resolver problemas.

6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas ali-nhadas ao seu projeto de vida pessoal, profi ssional e social, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.

7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confi áveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e deci-sões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos e a consciência socioambiental em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.

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8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional, reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas e com a pressão do grupo.

9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de confl itos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, cul-turas e potencialidades, sem preconceitos de origem, etnia, gênero, idade, habilidade/necessidade, convicção religiosa ou de qualquer outra natureza, reconhecendo-se como parte de uma coletividade com a qual deve se comprometer.

10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, fl exibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões, com base nos conhecimentos construídos na escola, segundo princí-pios éticos democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.

Fonte: BNCC

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A PRESENÇA VITAL DA LITERATURA EM SALA DE AULA

Meus primeiros anos de profi ssão foram um tempo de forte pressão. Juntamente com noções teóricas e alta taxa de entusiasmo, fui para a sala de aula disposta a fazer tudo diferente do que alguns de meus professo-res não conseguiram fazer. Eu via nos meus alunos uma dose de expectativa de boas aulas e de aprendizagem signifi cativa. Na sala dos professores, recebia a ducha fria daqueles que já haviam sido derrotados e confessa-vam abertamente sua desilusão com a carreira. Até hoje me lembro de algumas frases pouco animadoras sobre o magistério: não as esqueci, mas também não as adotei. Resolvi abrir caminho contra as amarguras e em prol de meus alunos. E foi na leitura e na literatura que aprendi a lidar com a pressão, com a desilusão e com o entusias-mo. Por isso, hoje não hesito em propor aos colegas de magistério um caminho que lhes assegure o quanto vale a pena trazer para a profi ssão e, principalmente, para os alunos que nos rodeiam, textos que tratam das lutas hu-manas, das esperanças e dos confl itos que amadurecem personagens e leitores. É um pouco dessa experiência e dessa crença na leitura que orienta este texto que fala da vida, da experiência vital com a literatura. Vital para o professor, para os alunos e para a educação.

A FORMAÇÃO DE LEITORES

Nessa contribuição do tempo e dos escritos a respeito de leitura, aparecem algumas ideias geradoras que foram sedimentando o trabalho em sala de aula, trazendo novas refl exões e práticas voltadas à formação de novos leito-res. Entre essas contribuições estão:

• a leitura é um trabalho progressivo, atemporal e contínuo;

• a alfabetização é o primeiro e indispensável estágio para o desenvolvimento e a maturação de um leitor;

• os textos a serem lidos estão em vários suportes (li-vros, revistas, cartazes, folhetos, fi lmes, letras de can-ções, telas digitais e muitos outros);

Por isso, hoje não hesito em propor

aos colegas de magistério um

caminho que lhes assegure o quanto vale a pena trazer

para a profi ssão e, principalmente,

para os alunos que nos rodeiam, textos que tratam

das lutas humanas, das esperanças e dos confl itos

que amadurecem personagens e

leitores.

4.2 SUBSÍDIOS PARA A FORMAÇÃO DO LEITOR

Convidamos Marta Morais da Costa para escrever um texto

abordando a metodologia utilizada neste

projeto de leitura.

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• a compreensão dos escritos pressupõe conhecimen-tos já adquiridos, somados a conhecimentos que se fazem no momento da leitura e permitem atribuir signi-ficados ao que se lê;

• a interpretação dos textos requer amplitude de conhe-cimentos de muitas áreas, que vão além da língua em que o texto se apresenta, como a história pessoal e co-letiva, a cultura, a sociologia, a psicologia, a geografia, as artes e outras, que o próprio texto a ser interpretado propõe;

• a literatura é um texto verbal que provoca o leitor para exercer as mais diferentes habilidades leitoras: sensibi-lidade à estética das palavras, exercício do imaginário, desejo de ficcionalização, crença e crítica de persona-gens-situações-ações-inter-relações, compreensão da alma humana, entre outras;

• a leitura de obras desafiadoras incentiva e amadurece a reflexão e o pensamento crítico.

Esses princípios salientados podem – e devem – orientar a formação de leitores para o ingresso mais legítimo e adequado na cultura escrita. Afinal, um dos objetivos da escola é ensinar a ler e a escrever. Na sociedade com-plexa atual, em que textos se multiplicam infinitamente, o processo de ler e escrever tem que passar por moder-nização e aproximação com a realidade cultural. Há algu-mas décadas, os alunos aprendiam a ler para dar conta de funções elementares: rótulos, linhas de ônibus, en-dereços, notícias de jornais impressos, manuais simples de utilização. Tinham dificuldades para ler bulas de remé-dios, contratos, artigos científicos, narrativas literárias em ordem não cronológica, instruções de uso de novas tecnologias. Esse descolamento da evolução da vida co-tidiana produziu reações negativas às funções da leitura. Não era raro as crianças abandonarem os estudos, car-regarem para a vida adulta um estado de analfabetismo funcional e a exclusão da cultura escrita mais desafiado-ra, mais refinada, mais civilizada.

As pesquisas que investigam histórias de leitores de-monstram, bem e com frequência, a qualidade extraor-dinária que a capacidade de ler e de refletir traz para a melhoria de vida das pessoas. Pessoas que viveram momentos de grande dificuldade, mas perseveraram na busca de formação pessoal – lastimavelmente, às vezes,

A leitura de obras

desafiadoras incentiva e

amadurece a reflexão e o

pensamento crítico.

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em oposição à escola formal. Entre professores, é fre-quente encontrarmos pessoas que declaram o quanto foi difícil sua caminhada entre livros e aprendizagens.

Temos, na atualidade, condições de evitar essas dificulda-des futuras de nossos alunos. A leitura por si só não tem o poder de alterar a sociedade, mas tem excelentes con-dições para transformar o modo como as pessoas enten-dem a realidade e compreendem as relações humanas. Se acreditarmos nesse poder da leitura, todo investimento pedagógico para construir e formar leitores será recom-pensado. É com esse objetivo em mente que as orienta-ções e reflexões aqui apresentadas se desenvolvem.

DE QUAL LITERATURA ESTAMOS TRATANDO?

Ana Maria Machado, além de escritora premiada inúme-ras vezes, também tem obras dedicadas a refletir sobre leitura e literatura. Em uma delas, Silenciosa algazarra (2011), ao tratar da inter-relação entre textos – a denomi-nada “intertextualidade” –, a autora contrapõe dois tipos de livro. O primeiro, que ela qualifica como “apenas li-vrinhos para crianças”, apresenta as seguintes caracte-rísticas: “sedutores e coloridos, a ensinar a escovar os dentes antes de dormir, olhar para os lados ao atravessar a rua, ou a descrever como um dinossauro antropomor-fizado ou um bebê ursinho obedece a seus pais.” (p. 91).

A partir dessa descrição, é fácil reconhecer essa catego-ria de livros que povoa as estantes de livrarias, de esco-las, de bibliotecas, os sites de compras on-line, as bancas de revistas, os estandes de venda de livros em congres-sos e feiras e outros locais de venda ou empréstimos de livros. Ilustrações gigantes, formatos de bichos, frutas ou casas, poucas palavras, narrativa primária e, acima de tudo, a presença da ilusão de que se a criança gosta se tornará leitora para sempre. É material destinado à venda – muitas vezes em promoções vantajosas – e sem com-promisso com a literatura como inovação, criação e ato de conhecimento e de reflexão.

Quantas vezes escolas e professores apresentam às crian-ças esse material de propósitos moralizadores disfarçado de historinhas e figurinhas? Assim mesmo no diminuti-vo. Sua narrativa é de fácil compreensão (por exemplo, personagens que têm nomes e corpos diferentes, mas

Quantas vezes escolas e professores

apresentam às crianças

esse material de propósitos moralizadores disfarçado de historinhas e

figurinhas?

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fazem sempre ações iguais e com finais felizes), palavras e frases rasas e simplificadas e, lá no final, sempre, sem-pre, a vitória da virtude e o castigo da maldade. Virtude e maldade tratadas de modo superficial, que é para não complicar ou melindrar a sensibilidade dos leitores. Essa literatura comportada e padronizada não tem a ver com o que lemos nos livros que proclamam as qualidades posi-tivas da literatura para formar cidadãos, pessoas autôno-mas e espírito crítico. São textos para passar o tempo e para vender aos montões.

O segundo tipo de livro, segundo Ana Maria Machado, é de uma “narrativa digna desse nome, com conflitos, anta-gonismos, crises, personagens de alguma complexidade, com um trabalho de linguagem capaz de criar ambiguida-des semânticas e estratégias de relato que deem margem a situações ricas em possibilidades de sentidos variados e a uma dinâmica de plurissignificação” (p. 91). O con-ceito de literatura passou ao longo da história a se definir por diferentes atributos, funções e objetivos. Na cultura ocidental contemporânea, há, ao menos, duas correntes bem distintas. Uma delas considera literatura tudo o que está escrito e publicado em forma de livro, sem que ne-cessariamente passe pelo critério da arte. Desse modo, usam-se os termos “literatura jurídica”, “jornalismo literá-rio”, “literatura médica”, “literatura didática”. A segunda cor-rente trata o termo “literatura” pela qualidade do uso artís-tico da língua em que está escrito o texto. O critério passa a ser, portanto, a língua com “possibilidades de sentidos variados” e “uma dinâmica de plurissignificação”, confor-me qualificou Ana Maria Machado. Obedecendo a esses dois atributos, a linguagem literária é aquela que se apoia, mais do que a fala cotidiana, em sentidos plurais, em ca-madas de significados e na pluralidade das interpretações que esse uso pressupõe. As palavras da autora têm um sentido prefixado por teorias linguísticas que usam termos objetivos como “plurissignificação” e “sentido”. Não pos-so substituir o primeiro por “pluralismo” e o segundo por “sentido do olfato”, por exemplo.

Observemos o seguinte fragmento de uma narrativa de Ana Maria Machado: “A Perereca era parecida com os sapos da lagoa. Mas pequenininha, sapinha à-toa. Uma sapa sapeca. Moleca. Fulustreca. Pra lá e pra cá, de pulo em pulo, de pinote em pinote. Como bola de

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papel quando leva piparote” (A Jararaca, a Perereca e a Tiririca). Temos aqui um personagem humanizado, antro-pomorfizado, mas que não perde a ligação com a realida-de: comporta-se como sapo, próximo à água, saltando. Temos sonoridades repetidas – formando rimas, mesmo que o texto seja em prosa. Temos a comparação com a bola, motivada pelos pulos da perereca. Temos carac-terísticas pouco precisas: o que é ser moleca? Há uma mistura de registros da língua: o convencional (perereca, sapos, lagoa, papel) e a linguagem oral (sapinha à-toa, fulustreca, pra, piparote). Essa mistura provoca o diferen-te, o humor, a leveza do texto infantil. A narrativa em sua totalidade vai tratar de solidariedade, aventuras, papéis assumidos, valorização dos bichos de tamanho pequeno (personagens iguais aos pequenos leitores) e que ven-cem seus obstáculos, mudam seus destinos. Isso signi-fica: a narrativa expande seus significados, entra na vida dos leitores criando semelhanças e diferenças, provocan-do reflexões. A linguagem brinca com o leitor a partir de brincadeiras com ela mesma, por meio de sonoridades, termos diferentes e engraçados, frases simples e curtas que chegam diretamente aos leitores. Há uma leveza do texto que indica, pela própria linguagem, que a autora se preocupou em escrever pensando em seus leitores reais e usando para essa comunicação os recursos existentes na língua, mas organizados em forma inovadora.

A LEITURA DA LITERATURA EM SALA DE AULA

Por isso, ao trazer textos literários para a sala de aula e para dentro de uma pedagogia da literatura, os professo-res estarão proporcionando a seus alunos essas vivências linguísticas, essas realidades imaginárias, essa comuni-cação via sentidos, sensações e identificações. Trata-se de promover o encontro da criança leitora com histórias e, ao mesmo tempo, com a sua própria história. Princi-palmente as crianças, costumam ler a realidade apenas a partir de seu umbigo, de forma autocentrada. O mesmo procedimento aplica-se aos textos literários. Aos poucos e à medida que o trabalho com literatura se intensifica e se diversifica (pela variedade dos textos lidos), a crian-ça leitora passa a viver em outros personagens, passa a lidar com outras realidades, espaços, culturas e tempos. Esse crescimento só é possível se a leitura da literatura não ficar restrita ao mesmo gênero literário (apenas nar-rativas, apenas poemas, apenas aventuras, etc.) e houver

Esse crescimento só é possível se a

leitura da literatura não ficar restrita

ao mesmo gênero literário (apenas

narrativas, apenas poemas, apenas

aventuras, etc.) e houver a conversa

sobre livros, as rodas de interpretação, as atividades criativas, a expressão pessoal

e voluntária dos leitores, o entusiasmo

pela aprendizagem por meio do lúdico e

do imaginário.

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a conversa sobre livros, as rodas de interpretação, as ati-vidades criativas, a expressão pessoal e voluntária dos leitores, o entusiasmo pela aprendizagem por meio do lúdico e do imaginário.

A dinâmica da vida contemporânea exige que a escola e seus rituais de ensino e de aprendizagem acompa-nhem esse movimento, esse mudar constantemente de práticas, principalmente para buscar a aproximação de conteúdos e áreas de conhecimento às necessidades e expectativas das crianças. Cumpre lembrar sempre que a escola ocupa uma parte considerável do tempo de vida diária das crianças. Tornar intensas essas horas com aprendizagens efetivas e significativas deveria ser o objetivo mais relevante do trabalho pedagógico. Com a intenção de acompanhar o professor em seu professo-rar diário, elaboramos algumas reflexões para o trabalho com a literatura, divididas em três períodos: preparação, desenvolvimento e conclusão, aqui denominados segun-do o tempo da prática em que se desenvolvem – antes, durante e depois da leitura.

Ler é um ato múltiplo porque pede ações diversificadas e porque chega a resultados variados e, muitas vezes, imprevisíveis. Esse pressuposto faz com que encaremos a formação de leitores como uma dinâmica incontrolável e riquíssima. No entanto, para que possamos realizar um trabalho digno e eficaz, podemos aproveitar experiências que já demonstraram resultados positivos. A experiência docente de cada professor será sempre um elemento considerável para a aplicação de atividades que visam a essa formação. Nas sugestões oferecidas, os professo-res devem sempre considerar tudo o que conhecem a respeito de seus alunos e do modo como aprendem. Por-tanto, a orientação que aqui é oferecida tem um caráter genérico que precisa sempre da colaboração e da ade-quação dos professores em sua história como leitores e como mediadores.

A CONSTRUÇÃO DA LEITURA E POSSÍVEIS ETAPAS

A preparação visa apresentar de modo indireto, mas es-tabelecendo relações de assunto, estético ou formal, o texto literário a ser lido. É possível ler qualquer texto sem

No entanto, para que possamos

realizar um trabalho digno e eficaz,

podemos aproveitar experiências que já demonstraram

resultados positivos. A experiência

docente de cada professor será

sempre um elemento considerável para

a aplicação de atividades que visam

a essa formação.

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preparação formal, sem informações iniciais. No entanto, essa primeira abordagem vai enriquecer a leitura posterior, conferindo-lhe densidade e linhas mais seguras de com-preensão. A literatura em geral pode ser lida, mesmo que não conheçamos o autor, o gênero textual, a língua em que o texto foi escrito (podemos ler em uma tradução) e o con-teúdo. Os leitores em nível inicial de formação para a leitu-ra precisam de orientação mais ampla e que os aproxime positivamente do texto. Por isso, os professores podem trazer para sua aula elementos, materiais e informações relacionados com o texto a ser lido posteriormente, a fim de que os alunos possam aproximar-se de seu conteúdo com melhores condições de compreensão e análise.

A preparação também abre a sensibilidade do imaginá-rio para apreender a poesia do texto, sua beleza como literatura, suas ideias e as imagens (visuais, emotivas, de leituras anteriores) que necessariamente tornarão o livro mais significativo, isto é, mais próximo à vivência dos estudantes.

A preparação não pode ser apenas um momento formal de informações biográficas ou históricas sobre o autor ou o livro. Ela é, antes de tudo, um tempo de averiguação prévia sobre as expectativas dos leitores, sobre seus co-nhecimentos prévios, sobre um modo de ver e entender o mundo e a realidade. O texto literário que virá a seguir poderá confirmar essas posições, ou alterá-las, nesse úl-timo caso, fazendo com que a maturidade leitora cresça.

Alguns procedimentos podem auxiliar os mediadores a apresentar previamente o texto literário, objeto central do trabalho com a leitura. Por exemplo, escolher um dos temas propostos pela obra literária (a amizade, a solida-riedade, a compaixão, a paz, a diversidade cultural, etc.) e acrescentar fotos, filmes, recortes de jornal, um texto literário curto – como um poema, desenhos, historietas, piadas, canções, textos publicitários, folhetos. Ou, ainda, comparar os textos entre si e anotar as respostas. O diá-logo perguntas-respostas pode ser feito em formato de roda, em divisão em grupos, em formato de entrevistas, como no rádio ou na televisão.

É possível também informar sobre o autor, sua obra total, narrar outros textos, fazer pesquisa na internet, construir

A preparação também abre a

sensibilidade do imaginário

para apreender a poesia do texto, sua beleza como

literatura, suas ideias e as imagens (visuais, emotivas,

de leituras anteriores) que

necessariamente tornarão o livro

mais significativo, isto é, mais

próximo à vivência dos estudantes.

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uma biografia imaginária (como esse autor pode ter co-meçado a ler e a gostar de literatura, por exemplo). Lem-brar sempre que a relação autor-obra não é determinante em um texto literário: muitas vezes, o autor escreve com o imaginário, e não com a sua biografia.

Muitas outras atividades podem ser realizadas nessa fase: os professores e mediadores conhecem melhor seus alunos e as experiências de sala de aula exitosas e sabem como apresentar os livros de literatura de forma mais eficiente.

As orientações para a leitura efetiva do volume supõem a leitura em voz alta (fundamental para a fase iniciante e a fase medial da formação) ou a leitura silenciosa, que pode ser realizada por leitores com alguma autonomia, tanto de decodificação da língua escrita como de atribui-ção de sentidos ao texto. Recomenda-se que a leitura em voz alta seja feita de uma só vez, em especial para textos curtos. A atitude de interromper a leitura para co-mentários, observações sobre ilustração ou perguntas aos alunos quebra a unidade do texto, corta o possível envolvimento dos alunos com a narrativa ou o poema e prejudica a visão unitária e sequencial do texto. Essas ações podem ser efetivadas em uma segunda leitura em voz alta, quando os alunos já têm a visão total do livro e podem emitir relações mais pertinentes.

A leitura em voz alta requer alguns cuidados para que atin-ja o objetivo previsto de apresentar de forma estimulante o texto literário. Nem sempre a formação profissional dos professores prepara adequadamente para essa atividade por supor que traduzir letras em sons está na natureza automática do processo de alfabetização e na prática diá-ria de nossas leituras de textos escritos. Sabemos todos que não é bem assim que funciona a leitura em voz alta de textos literários. A essência literária trabalha com a beleza das palavras e com as emoções. A voz humana tem condições de realçar essas qualidades. Porém, sem preparação adequada, sem a compreensão dos sentidos que queremos acentuar no texto que lemos, a leitura em voz alta poderá ser pouco eficaz e pouco atraente. Pode até mesmo criar o desencanto com a história ou o poe-ma. A recomendação é que os professores preparem a leitura, isto é, que façam com antecedência uma prévia

A essência literária trabalha com a

beleza das palavras e com as emoções. A voz humana tem

condições de realçar essas qualidades.

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da leitura oral, tal como se planeja uma aula. Algumas perguntas podem orientar essa preparação: Que aspec-tos quero enfatizar? Que partes da história ou do poema quero ressaltar? Como farei isso? (Somente a voz? O ges-to? O olhar? Mostrarei as imagens? Todo esse conjunto simultaneamente?) Que atitudes tomarei? (Lerei em pé? Em que posição na sala? E os alunos, como estarão? Dei-xarei a sala às claras ou à meia-luz?) Usarei diferentes vo-zes para os diferentes personagens? Não há previamente atitudes ou decisões corretas. Dependerá muito da quali-dade da intervenção do professor e das características da turma. O importante é que a leitura não pareça artificial, mas sim com uma conversa bem conduzida.

Decididas essas pequenas questões, os professores pre-cisam cuidar de sua dicção, pronunciar com clareza, mas com naturalidade, as palavras. Lembrar que os ouvintes dependem de sua voz para conhecer a história ou o poe-ma. Eles poderão ser encantados pela leitura, compreen-der melhor as palavras pela condução da voz, descobrir nuances de personagens e ações que não perceberiam na leitura silenciosa e individual. Relatos de leitores dão conta com frequência de como, em sua infância, foi importante a leitura em voz alta. Pelo acalanto da voz, pela proximida-de afetiva, pela presença viva de um narrador. Creio que os professores precisam redescobrir essa técnica milenar. Convém lembrar que sociedades analfabetas cultivaram a literatura oral para sua perpetuação cultural, para seu pra-zer, para desenvolver o imaginário coletivo. Nas socieda-des letradas, trata-se de um recurso extraordinário para atrair leitores, para lhes mostrar as funções psíquicas, cul-turais, sociais e estéticas da literatura.

Após a leitura, coletiva ou individual, é o momento da leitura compartilhada, em que, por meio de atividades di-versas e em especial pelo diálogo com os alunos, vão surgindo a compreensão e a interpretação. Convém lembrar que a compreensão e a interpretação implicam a relação entre as palavras literárias e os sentidos que os leitores vão construindo pouco a pouco. Os alunos vão atribuir sentidos significativos ao que leram. Por sig-nificativos, entendemos a apropriação pessoal da leitu-ra, trazendo o que foi compreendido para uma etapa de valores, apreendidos pelos alunos individualmente. Esse trajeto pode ser balizado por perguntas e respostas, por

Os alunos vão atribuir sentidos significativos ao

que leram. Por significativos,

entendemos a apropriação

pessoal da leitura, trazendo o que

foi compreendido para uma etapa

de valores, apreendidos pelos alunos

individualmente.

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jogos e brincadeiras, por pesquisa, por textos criativos produzidos individualmente ou em grupo, por entrevis-tas, recortes, murais e tantos outros recursos pedagógi-cos. Indispensável e relevante é que os alunos tenham oportunidade de participar ativamente, expressando suas opiniões, relacionando, criticando e criando. A prática de fichas de leitura e de questionários caiu em desuso por-que limitava a respostas únicas um texto que é plurissig-nificativo. Essa recusa está alicerçada em recentes teo-rias sobre o modo como as pessoas interpretam: há um estímulo que nasce da palavra, mas que só encontra seu significado em áreas mentais de conhecimento prévio e, no caso da literatura, nas experiências com o imaginário e com a história de leituras de uma determinada pessoa.

Por exemplo, uma narrativa ou um poema com a pala-vra “árvore” dá margem a diferentes imagens que têm a ver com a experiência pessoal do leitor (pode ser co-pada, seca, enorme, boa para subir, carregada de frutas, etc.). Mas tem também a ver com o modo como o leitor se relaciona com ela: uma criança da cidade ou que vive na área rural atribuirá às árvores valores diferentes. Tam-bém leituras anteriores interferem no modo como o leitor significa a palavra: pode lembrar uma ilustração de livro que viu e de que gostou, pode lembrar as árvores das virtudes, a árvore que dava dinheiro, as árvores de um desenho animado, a árvore em que se escondia a prince-sa do conto A moura torta e assim por diante. Toda essa riqueza pode – e deve – ser explorada pelos mediadores de leitura. E confirma a plurissignificação como elemento característico e definidor do texto literário.

Na mesma linha de multiplicação, atividades que contri-buem para expandir a leitura para outras linguagens ar-tísticas podem surgir das oportunidades oferecidas aos leitores de recriarem, em outras linguagens, o que con-seguiram interpretar no texto lido. Assim, atividades que levem à produção de cenas teatrais, canções, desenhos, fotos, ilustrações, danças, esculturas, quadrinhos e ou-tras manifestações significam uma tradução em outras linguagens e mobilizam os leitores.

Um dos resultados dessas atividades será, sem dúvida, a transformação do texto literário em algo presente e vivo na vida dos leitores. Provavelmente o objetivo mais dese-jado do trabalho com a literatura em sala de aula.

Marta Morais da Costa é escritora, contadora

de histórias e professora aposentada de literatura da

Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Pontifícia

Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

Entre os diversos livros e artigos de sua autoria,

publicou “Mapa do Mundo: crônicas sobre

leitura”; “Sempreviva, a leitura”; e “Metodologia

do ensino de literatura infantil”, obra singular que

enfrenta os principais problemas encontrados

por professores das séries iniciais para a formação de

leitores em literatura.

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BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

• ALLIENDE, Felipe; CONDEMARÍN, Mabel. A leitura: teoria, avaliação e desenvolvimento. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Artmed, 2005.

É uma obra imprescindível para o tra-balho com a formação de leitores. Traz uma exposição minuciosa sobre a for-mação de significados, os processos de leitura, os modos de ler, as etapas de formação de leitores competentes. São muitos exemplos que podem auxiliar o professor no desenvolvimento de suas práticas pedagógicas.

• ANDRUETTO, María Teresa. Por uma literatura sem adjetivos. São Paulo: Pulo do Gato, 2012.

Artigos curtos sobre a definição de lite-ratura para crianças, sobre a importância de ler, sobre exclusão e inclusão na lei-tura, sobre o narrador na literatura. São reflexões atuais e apresentadas em uma linguagem poética e atraente.

• COSSON, Rildo. Letramento literá-rio: teoria e prática. São Paulo: Con-texto, 2006.

O livro trata das relações entre literatura e escola. Expõe dados teóricos e práticos sobre os conflitos vividos em sala de aula para a formação de leitores de literatura. Questiona e promove a reflexão sobre práticas usuais e sobre o ensino de lei-tura na escola.

• MACHADO, Ana Maria. Silenciosa algazarra. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

Uma coletânea de palestras da autora que abordam os mais diferentes aspectos da leitura da literatura. Há textos sobre o estágio de leitura no Brasil, sobre his-tórias de leitores, sobre a intertextuali-dade, sobre a formação de leitores e as bibliotecas.

• YUNES, Eliana. Professor leitor. Curi-tiba: Hum Edições, 2016. (Coleção Mediações).

O texto expõe práticas inovadoras com a leitura em sala de aula, apresenta for-mulações teóricas sobre essas práticas e considera o modo como os leitores cons-troem os sentidos e compartilham suas experiências com os colegas.

• ZILBERMAN, Regina. A literatura in-fantil na escola. 11. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Global, 2003.

A autora constrói sinteticamente a histó-ria da literatura infantil no Brasil, analisa obras, discute a importância de autores, em especial Monteiro Lobato. A trajetó-ria dos capítulos parte dos pioneiros e chega até a contemporaneidade.

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4.3 PROPOSTAS DE ATIVIDADES DE LEITURA

1. Apresentar aos alunos o título do livro Ofícios do tempo. Deixar que eles, com o auxílio da ilustração da capa, procurem antecipar o conteúdo que vão encontrar.

2. Discutir com os alunos o texto introdutório das p. 8 e 9.

a. Por que o livro recebeu esse nome?

b. Que observação é sugerida ao leitor?

c. O que quer dizer “com a paciência de um artesanato”?

d. Quais conhecimentos os alunos conseguem compartilhar acerca dos temas tratados no livro?

3. É importante apresentar a biografia do autor Donizete Galvão, para resgatar sen-tidos, em sua obra, com base em suas origens no interior de Minas Gerais. Por exemplo, o tempo que passa devagar, as lembranças, “as cristaleiras antigas, o enterro dos nossos mortos, nossas idas e vindas pelo mundo” (p. 9).

4. Provocar a criatividade dos alunos.

a. O que é poesia?

b. O que é ser poeta?

c. Quais os elementos que envolvem a criação poética (sentimento, emoções, experiências)?

d. Quais poetas eles conhecem?

e. De quais poesias eles gostam?

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ORIENTAÇÕES PARA AS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA55.1 PRÉ-LEITURA

1. Estimular os alunos a criarem um momento prazeroso para a leitura das poesias. Participar da leitura, proporcionando momentos de pura fruição estética.

a. Veja:

oração natural

Fique atento

ao ritmo,

aos movimentos

do peixe no anzol.

Fique atento

às falas

das pessoas

que só dizem

o necessário.

Fique atento

aos sulcos

de sal

de sua face.

Fique atento

aos frutos tardios

que pendem

da memória.

Fique atento

às raízes

que se trançam

em seu coração.

A atenção:

forma natural

De oração.

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2. Que relação tem a ilustração da capa com as poesias? Retomar a discussão do momento de pré-leitura. Qual a relação que os botões, peneiras, tíquetes, a ilus-tração em azul, dentre outros elementos, têm com as poesias elencadas no livro?

3. Instigar os alunos e promover questionamentos.

a. Por que “oração natural” (p. 13) com iniciais minúsculas?

b. Que imagens eles conseguem criar mentalmente, a partir da leitura desse poema?

c. Como eles referenciam “A atenção: forma natural de oração”?

4. Selecionar vários outros textos do livro para trabalhar com os alunos.

Verificar se eles conseguem perceber assonâncias, aliterações, gradações, dentre outras.

5. Incentivar os alunos a pensar sobre as escolhas linguísticas que o autor fez em cada poesia, em cada verso.

6. Estimular os alunos a reconhecer a dimensão espacial do poema (trabalhar os ele-mentos que caracterizam os textos desse gênero: rimas, estrofes, verso).

7. Por que foi feita a opção por registrar os títulos de cada poesia com iniciais minús-culas?

8. Voltar ao índice com os alunos e lê-lo com atenção. Escolher outros poemas a se-rem lidos em grupo.

9. O autor trata em seu livro de temas e sensações relacionados à natureza. Trabalhar essas percepções com os alunos. Mostrar a eles, por exemplo, a poesia, “aves” (p. 18) ou ainda “o grito” (p. 23):

O porco guincha

e sob a pata dianteira

sai a golfada de sangue

que enche a bacia

Horas depois,

pronto o chouriço,

comemos o sangue preto,

as tripas, o grito.

10. Possibilitar que os alunos percebam a força da atitude poética, ao final dessa poesia, na página 23. a) O que significa comer o grito? Procure deixar os alunos extravasarem.

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11. Na página 19, o poema “jardinagem” apresenta a estrutura dos textos da tipolo-gia narrativa.

a. Qual é essa estrutura?

b. Por que, então, esse texto está num livro de poesias?

c. Quais as características dos textos poéticos o poema “jardinagem” apresenta?

d. Discutir com os alunos os sentidos, as sensações, as reflexões que esta histó-ria pode suscitar.

12. Quais são os sentidos construídos pelo autor para a morte, lembranças, tempo, memória, eternidade, por exemplo? Apresentar outros sentidos aos alunos.

13. Trabalhar com a poesia da página 36 (autorretrato como boi), em contraponto à letra da canção “Admirável Gado Novo”, composta por Alceu Valença e Zé Ramalho:

Autorretrato como boi

Eu boi.

Boi de mim mesmo.

Boi sonso.

Boi de canga.

Boi de carro.

Boi de ônibus.

Boi de arado.

Boi sangrado por ferrão.

Boi de carreto.

Boi em prédio de vidro.

Boi com crachá.

e carteira assinada.

Boi comprovado.

Boi indistinto

na boiada da cidade.

Boi tangido.

Boi bernento.

Boi de joelhos

sem mugido

na escuridão.

No curral da insônia,

rumino palavras pastadas

na ribanceira dos dias.

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Admirável Gado Novo

Vocês que fazem parte dessa massa

Que passa nos projetos do futuro

É duro tanto ter que caminhar

E dar muito mais do que receber

E ter que demonstrar sua coragem

À margem do que possa parecer

E ver que toda essa engrenagem

Já sente a ferrugem lhe comer

Êh, ô, ô, vida de gado

Povo marcado

Êh, povo feliz!

Lá fora faz um tempo confortável

A vigilância cuida do normal

Os automóveis ouvem a notícia

Os homens a publicam no jornal

E correm através da madrugada

A única velhice que chegou

Demoram-se na beira da estrada

E passam a contar o que sobrou!

Êh, ô, ô, vida de gado

Povo marcado

Êh, povo feliz!

O povo foge da ignorância

Apesar de viver tão perto dela

E sonham com melhores tempos idos

Contemplam esta vida numa cela

Esperam nova possibilidade

De verem esse mundo se acabar

A arca de Noé, o dirigível

Não voam, nem se pode flutuar

Êh, ô, ô, vida de gado

Povo marcado

Êh, povo feliz!

14. Resgatar com os alunos os sentidos construídos pelos autores das duas obras. Propor que relacionem as reflexões suscitadas com a situação social que vivemos atualmente. Relacionar com o uso massivo das tecnologias, por exemplo.

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1. Retomar com os alunos o artigo “Um ofício entre terra e céu, uma poesia entre pouso e vôo”, na página 55, de Mariana Ianelli, no qual a autora traça um perfil da obra de Donizete Galvão. Confronte com as per-cepções levantadas pelos alunos.

2. Propor a reescrita de um dos poemas. Possibilitar aos alunos a escolha de um texto que será alterado. Seria interessante que a alteração passasse pelo trabalho com a paródia ou com a paráfrase.

3. Organizar um sarau poético com os alunos, no qual será distribuído o Pacote de Poesia. Uma embalagem do tipo papel de pão, com a caricatura do poeta home-nageado, acompanhado da biografia de Mário Quintana e de filipetas contendo parte da obra desse autor. Os pacotes podem ser distribuídos pela escola, para as famílias ou, ainda, em um Sarau para apresentação, feita pelos alunos, de alguns poemas selecionados.

5.2 PÓS-LEITURA

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ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR6MÚSICA

Almir Sater e Renato Teixeira compuseram a letra “Tocando em Frente”, que logo se tornou uma canção muito conhecida e apreciada no ambiente rural. Assim como o livro Ofícios do Tempo, ela dedica-se a mostrar a importância que o tempo tem em nossas vidas. Oportunidade para fazer um encadeamento entre as obras.

Outra canção que aborda a temática tempo, mas por um viés diferente, é interpretada pela banda de rock nacional Titãs, chama-se “Epitáfi o”. Com características de um desabafo, essa letra pode ampliar a refl exão dos alunos sobre “aproveitar o tempo” de vida.

CINEMA

O longa-metragem A culpa é das estrelas também traz uma temática que tangencia Ofícios do tempo. Esse fi lme conta a história de Hazel, uma garota que tem câncer, conhece Augustus Waters e se apaixona por ele imediatamente. Certamente contribui para ampliar a discussão em torno do livro, pois mostra experiências que ensinam que é possível dar sentido à vida, não importando quanto tempo resta.

ARTES VISUAIS

A tela “A persistência da memória” de Salvador Dalí é uma ótima oportunidade para articular com a temática apresentada em Ofícios do Tempo.

DALI, Salvador. A persistência da memória. Óleo sobre tela, 24 cm x 33 cm. Nova York: Museu de Arte Moderna, 1931.