8
419 Avaliação Psicológica, 2014, 13(3), pp. 419-426 Avaliação psicológica da depressão: levantamento de testes expressivos e autorrelato no Brasil Paula Ely Universidade do Planalto Catarinense, Lages-SC, Brasil Maiana Farias Oliveira Nunes 1 Faculdade Avantis, Balneário Camboriú-SC, Brasil Lucas de Francisco Carvalho Universidade São Francisco, Itatiba-SP, Brasil 1 Endereço para correspondência: Av. Marginal Leste, 3600, Km 132, Bairro dos Estados, 88339-125, Balneário Camboriú-SC. Tel.: (47) 3363-0631. E-mail: [email protected] RESUMO Este artigo realiza um levantamento de instrumentos para avaliar a depressão como estado e como traço, incluindo a análise de técnicas expressivas e de autorrelato. Parte-se da conceituação do fenômeno, posteriormente são apresentados os testes psicológicos, com parecer favorável pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), destinados à avaliação da depressão e da personalidade, incluindo a avaliação da depressão como traço. Foram identificados 11 instrumentos com parecer favorável para a avaliação desse construto (cinco projetivos e seis psicométricos), um resultado positivo, considerando-se a quantidade de instrumentos aprovados pelo CFP. Os instrumentos são descritos levando em conta suas vantagens e limitações para avaliar a depressão. Por fim, são discutidas as possibilidades de uso desses instrumentos e alguns fatores que o psicólogo deve considerar ao selecionar um instrumento para avaliação desse fenômeno. Palavras-chave: testes psicológicos; depressão; medidas de personalidade. ABSTRACT – Psychological assessment of depression: A review of expressive and self-reported tests This article surveys instruments for assessing depression as a trait and as a state, including psychometric and projective techniques. The concept of depression is presented, followed by the presentation of psychological tests for the assessment of depression and personality (which include the measurement of depression as a trait) that are approved by the Federal Council of Psychology (CFP). Eleven instruments were identified as favorable for this construct (six psychometric and five projective), which was considered a positive result, considering the total number of instruments approved by CFP. The instruments are described with regard to their advantages and limitations for the assessment of depression. Finally, we discuss the usage of these instruments by the psychologist and some factors that should be considered when selecting an instrument to assess this phenomenon. Keywords: psychological tests; depression; personality measures. RESUMEN – La evaluación psicológica de la depresión: una revisión de las técnicas proyectivas y auto-informe en Brasil Este artículo revisa los instrumentos para la evaluación de la depresión como un rasgo y como estado, incluyendo las técnicas psicométricas y proyectivas. El concepto de la depresión se presenta, seguido de la presentación de las pruebas psicológicas para la evaluación de la depresión y de la personalidad (que incluyen la medición de la depresión como un rasgo) que han sido aprobados por el Consejo Federal de Psicología (CFP). Se identificaron 11 instrumentos para evaluar este constructo (seis psicométricas y cinco proyectivas), que se considera un resultado positivo, teniendo en cuenta el número total de los instrumentos aprobados por la CFP. Se describen los instrumentos teniendo en cuenta sus ventajas y limitaciones con respecto a la evaluación de la depresión. Finalmente, se discute la posibilidad de utilizar estos instrumentos por los psicólogos y algunos factores que se deben considerar al seleccionar un instrumento para evaluar este fenómeno. Palabras clave: las pruebas psicológicas, depresión, medidas de la personalidad. ARTIGO Atualmente, a depressão é considerada um proble- ma de saúde pública. Uma pesquisa feita na cidade de São Paulo apontou que, aproximadamente, 16% da po- pulação apresenta pelo menos um episódio depressivo no decorrer de sua vida. Na mesma direção, as estatísticas internacionais levaram a Organização Mundial da Saúde (OMS) a incluir a depressão como uma das principais causas de incapacitação para o trabalho (Lafer, Almeida,

Avaliação da depressão.pdf

Embed Size (px)

Citation preview

  • 419Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    Avaliao psicolgica da depresso: levantamento de testes expressivos

    e autorrelato no Brasil

    Paula ElyUniversidade do Planalto Catarinense, Lages-SC, Brasil

    Maiana Farias Oliveira Nunes1

    Faculdade Avantis, Balnerio Cambori-SC, Brasil

    Lucas de Francisco CarvalhoUniversidade So Francisco, Itatiba-SP, Brasil

    1 Endereo para correspondncia: Av. Marginal Leste, 3600, Km 132, Bairro dos Estados, 88339-125, Balnerio Cambori-SC. Tel.: (47) 3363-0631. E-mail: [email protected]

    RESUMOEste artigo realiza um levantamento de instrumentos para avaliar a depresso como estado e como trao, incluindo a anlise de tcnicas expressivas e de autorrelato. Parte-se da conceituao do fenmeno, posteriormente so apresentados os testes psicolgicos, com parecer favorvel pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), destinados avaliao da depresso e da personalidade, incluindo a avaliao da depresso como trao. Foram identificados 11 instrumentos com parecer favorvel para a avaliao desse construto (cinco projetivos e seis psicomtricos), um resultado positivo, considerando-se a quantidade de instrumentos aprovados pelo CFP. Os instrumentos so descritos levando em conta suas vantagens e limitaes para avaliar a depresso. Por fim, so discutidas as possibilidades de uso desses instrumentos e alguns fatores que o psiclogo deve considerar ao selecionar um instrumento para avaliao desse fenmeno.Palavras-chave: testes psicolgicos; depresso; medidas de personalidade.

    ABSTRACT Psychological assessment of depression: A review of expressive and self-reported testsThis article surveys instruments for assessing depression as a trait and as a state, including psychometric and projective techniques. The concept of depression is presented, followed by the presentation of psychological tests for the assessment of depression and personality (which include the measurement of depression as a trait) that are approved by the Federal Council of Psychology (CFP). Eleven instruments were identified as favorable for this construct (six psychometric and five projective), which was considered a positive result, considering the total number of instruments approved by CFP. The instruments are described with regard to their advantages and limitations for the assessment of depression. Finally, we discuss the usage of these instruments by the psychologist and some factors that should be considered when selecting an instrument to assess this phenomenon.Keywords: psychological tests; depression; personality measures.

    RESUMEN La evaluacin psicolgica de la depresin: una revisin de las tcnicas proyectivas y auto-informe en Brasil

    Este artculo revisa los instrumentos para la evaluacin de la depresin como un rasgo y como estado, incluyendo las tcnicas psicomtricas y proyectivas. El concepto de la depresin se presenta, seguido de la presentacin de las pruebas psicolgicas para la evaluacin de la depresin y de la personalidad (que incluyen la medicin de la depresin como un rasgo) que han sido aprobados por el Consejo Federal de Psicologa (CFP). Se identificaron 11 instrumentos para evaluar este constructo (seis psicomtricas y cinco proyectivas), que se considera un resultado positivo, teniendo en cuenta el nmero total de los instrumentos aprobados por la CFP. Se describen los instrumentos teniendo en cuenta sus ventajas y limitaciones con respecto a la evaluacin de la depresin. Finalmente, se discute la posibilidad de utilizar estos instrumentos por los psiclogos y algunos factores que se deben considerar al seleccionar un instrumento para evaluar este fenmeno.Palabras clave: las pruebas psicolgicas, depresin, medidas de la personalidad.

    ARTIGO

    Atualmente, a depresso considerada um proble-ma de sade pblica. Uma pesquisa feita na cidade de So Paulo apontou que, aproximadamente, 16% da po-pulao apresenta pelo menos um episdio depressivo no

    decorrer de sua vida. Na mesma direo, as estatsticas internacionais levaram a Organizao Mundial da Sade (OMS) a incluir a depresso como uma das principais causas de incapacitao para o trabalho (Lafer, Almeida,

  • 420 Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    Ely, P., Nunes, M. F. O., & Carvalho, L. F.

    Frguas, Miguel, 2000). Como se trata de um transtorno que pode prejudicar as pessoas e a sociedade, a depresso deve ser avaliada de forma mais precisa, considerando-se seus diferentes nveis. Assim, ser possvel oferecer trata-mentos mais adequados s caractersticas de cada pessoa.

    Alm de avaliar a depresso como estado, impor-tante avaliar a depresso como trao de personalidade. A avaliao do trao depressivo pressupe que ele varia ao longo de um contnuo, cujos extremos podem significar variados quadros clnicos depressivos, tratando-se de um trao relativamente estvel, sendo considerado uma di-menso normal da personalidade. Estudando o trao ou os sintomas depressivos, obtm-se resultados que variam na cronicidade, estabilidade e frequncia com que certas caractersticas so exibidas. Assim, a avaliao da depres-so como trao e estado so complementares (Campos, 2006, 2011).

    Este artigo tem como objetivo levantar os instru-mentos psicolgicos para a avaliao da depresso (como trao e estado) disponveis no Brasil. Apresenta-se, ini-cialmente, um breve resgate das razes histricas da de-presso, para contextualizar o leitor quanto s conceitu-aes sobre a patologia e, na sequncia, analisam-se os instrumentos voltados avaliao psicolgica da depres-so, apontando suas vantagens e limitaes. Sero alvo deste levantamento apenas os instrumentos com parecer favorvel pelo Conselho Federal de Psicologia, pois uma reviso deles ser mais til aos psiclogos com clientes que demandam a avaliao desse fenmeno.

    O termo depresso surgiu no sculo 18, no con-texto psiquitrico europeu. Sua origem vem do latim depremere, cujo significado pressionar para baixo. A princpio, o termo era associado melancolia. Apenas no final do sculo 19, o termo depresso suplantou o termo melancolia (Teixeira & Hashimotto, 2005). A concepo de depresso teve grande influncia nas contribuies advindas da psicologia (Berlim, 2005).

    O Manual Diagnstico e Estatstico dos Transtornos Mentais DSM-IV (APA, 1994) classifica as formas da depresso levando em conta a durao da patologia e sintomas, possibilitando aos profissionais da rea da sade maior segurana no diagnstico, principalmen-te aos que fazem uso da testagem psicolgica (Rang, 2001). As indicaes do DSM (APA, 1994) e tambm do CID (Classificao Internacional de Doenas, OMS, 1997) so essenciais para os profissionais de sade men-tal, pois proporcionam critrios objetivos para avaliao desse transtorno.

    A depresso classificada como transtorno de humor (DSM-IV, APA, 1994) ou transtorno afetivo (CID-10, OMS, 1997), que apresenta como caracterstica predomi-nante uma perturbao no humor, alterando de maneira constante os estados emocionais (Ballone, 2010). As pes-soas com esse diagnstico podem ficar extremamente de-primidas, manacas ou com misto de depresso e mania (Atkinson R. L., Atkinson R. C., Bem, Nole-Hoeksema,

    & Smith, 2002). Vale ressaltar que os transtornos depres-sivos incluem o transtorno depressivo maior, o transtorno distmico e o transtorno depressivo sem outra especifi-cao, com critrios diagnsticos especficos baseados no DSM-IV, derivados do modelo categrico.

    Ao longo do tempo, buscou-se elaborar ferramentas para avaliao das caractersticas da depresso. A primeira medida foi criada em 1918 por Woodworth: Psychoneurotic Inventory. O instrumento avaliava a instabilidade emocio-nal por meio de uma extensa lista de sintomas de de-presso e ansiedade. O Psychoneurotic Inventory servia para identificar soldados americanos que poderiam ter pro-blemas de ajustamento em decorrncia de suas atividades de guerra (Anastasi & Urbina, 2000).

    A partir desse perodo, a quantidade de inventrios e medidas para avaliar a depresso aumentou significati-vamente. Isso se deve ao fato de que a depresso tem sido conceituada de formas diferentes, por meio de diversas teorias, o que expande a forma de compreender e diag-nosticar a depresso (Baptista, 2004; Souza, 2010).

    Especificamente no Brasil, existem instrumen-tos aprovados pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP). Em consulta ao Sistema de Avaliao de Testes Psicolgicos SATEPSI (CFP, 2013), encontram-se os seguintes instrumentos de autorrelato com parecer favorvel pelo CFP: as verses I e II do Inventrio de Depresso de Beck e a Escala Baptista de Depresso (verso adulto) EBADEP-A. Adicionalmente, para a avaliao do trao depressivo, a EFN (Escala Fatorial de Ajustamento Emocional/Neuroticismo) possui fator que avalia depresso enquanto trao de personalidade, assim como a Bateria Fatorial de Personalidade (BFP) e o Inventrio de Personalidade NEO-PI Revisado (NEO-PI-R). Quanto aos instrumentos expressi-vos ou de desempenho, esto com o parecer favorvel o House-Tree-Person (HTP), o Palogrfico, o Teste das Pirmides Coloridas de Pfister, o Rorscharch e o Zulliger, todos incluindo indicadores de depresso. Vale ressaltar que nenhum dos instrumentos expressivos exclusivamente destinado avaliao de sintomas de-pressivos, e apenas trs testes de autorrelato avaliam exclusivamente esses sintomas. Assim, do total de 127 testes aprovados pelo CFP, 11 deles (8%) se destinam avaliao desse construto.

    Esses instrumentos so apresentados nos prximos pargrafos, considerando suas vantagens e limitaes na avaliao da depresso. Sero apresentados, para cada ins-trumento, seus pressupostos tericos, formato do teste, populao-alvo, estudos psicomtricos (quando dispon-veis no manual do instrumento) e estudos que aborda-ram o interesse do artigo-depresso.

    Inventrio de Depresso de Beck Verso I e II (BDI-I e BDI-II)

    O Inventrio de Depresso de Beck verso I ([BDI-I]; Cunha, 2001) foi desenvolvido para avaliar

  • 421

    Avaliao da depresso

    Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    sintomas de depresso, sendo amplamente utilizado na investigao da intensidade dos sintomas depressivos, tanto em clnica como em pesquisas (Souza, 2010). Os itens da escala se referem a insatisfao, punio, tristeza, sentimento de fracasso, pessimismo, autoaverso, retrai-mento social, indeciso, ideias suicidas, mudana na au-toimagem, choro, insnia, dificuldade de trabalhar, perda de apetite e peso, perda de libido, fatigabilidade e preo-cupaes somticas. A pontuao da escala em formato Likert de 4 pontos (0, 1, 2 e 3), podendo ter pontuaes de 0 a 63, nos 21 itens (Cunha, 2001).

    Trata-se de um instrumento que permite ao ava-liador identificar se h tendncia depresso, servindo para a construo de um diagnstico (Rang, 2001). A escala pode ser usada com pessoas entre 17 e 80 anos, sendo til para avaliar a intensidade da depresso, po-dendo ser aplicada de forma individual ou coletiva, sem limite de tempo para sua aplicao. Os itens foram criados com base na descrio de sintomas comuns da depresso e na observao de atitudes e comportamen-tos de pacientes com esse quadro. O manual do teste fornece uma indicao das mdias para grupos espec-ficos (subgrupos psiquitricos, com queixa mdica, e da populao geral), o que torna a avaliao mais deta-lhada e adequada a pessoas em situaes distintas. Os estudos de validade incluem validade convergente com outros instrumentos que avaliam o mesmo fenme-no, validade discriminante e anlise fatorial. O BDI-I permite a diferenciao de pacientes sem queixas es-pecficas, com queixas fsicas ou com queixas psiqui-tricas de depresso. capaz de identificar 77% dos casos com depresso corretamente (sensibilidade) e 95% dos casos negativos corretamente (especificidade); diferencia pacientes psiquitricos de clnicas mdicas e populao geral.

    Beck, Steer, e Brown (2010) publicaram o BDI-II, sendo tambm um teste de autorrelato composto por 21 itens e com objetivo de medir a intensidade da depres-so. A pontuao da escala em formato do tipo Likert de 4 pontos (0, 1, 2 e 3), podendo ter pontuaes de 0 a 63, nos 21 itens. A aplicao pode ser feita de forma in-dividual ou coletiva, sem tempo limite para o preenchi-mento do teste. Em geral, leva-se de cinco a dez minutos para preench-la. Quanto faixa etria para aplicao, o BDI-II indicado a partir dos 13 anos at a terceira idade (Beck et al., 2011).

    Esse inventrio avalia comportamentos associados depresso. Auxilia o psiclogo na avaliao de uma possvel severidade do caso, assim como fornece da-dos sobre os padres de pensamentos negativistas. O instrumento parte dos mesmos pressupostos tericos da BDI-I e fornece informaes semelhantes em seu manual, de modo que as informaes no sero repe-tidas aqui para evitar duplicidade. O manual apresenta diversos estudos psicomtricos, tanto da verso original do instrumento quanto da verso brasileira. Os estudos

    englobam a verificao do ndice de fidedignidade, por consistncia interna e teste-reteste, e de evidncias de validade com base na estrutura interna (anlise fatorial) e com base na relao com variveis externas (diagns-tico de transtorno depressivo e instrumentos avaliando sintomas de depresso).

    Escala Baptista de Depresso Verso Adulto (EBADEP-A)

    A Escala Baptista de Depresso (verso adulto) de Baptista (2012) foi desenvolvida com o objetivo de absor-ver o maior nmero possvel de informaes sobre a sinto-matologia da depresso, com base no manual diagnstico e estatstico de transtornos mentais (DSM-IV, APA, 1994), na classificao internacional de doenas (CID-10; OMS, 1997), na teoria cognitiva de Beck e na teoria comporta-mental de Fester. Essa escala possui 45 questes, cada uma composta por uma frase positiva e negativa, tendo como opo de resposta uma escala do tipo Likert de 4 pontos (0, 1, 2 e 3). Nessa escala, o sujeito deve responder como se sente diante das situaes propostas. A pontuao mnima a ser atingida 0; a mxima, 135.

    Para a criao de itens da EBADEP, estabeleceu-se nmero mnimo de cinco frases para cada um dos 28 indicadores de depresso: humor deprimido, perda ou diminuio de prazer, choro, desesperana, desamparo, indeciso, sentimento de incapacidade, sentimentos de inadequao, carncia/dependncia, negativismo, esqui-va de situaes sociais, queda de produtividade, inutilida-de, autocrtica exacerbada, culpa, diminuio de concen-trao, pensamento de morte, autoestima rebaixada, falta de perspectiva sobre o presente, falta de perspectiva sobre o futuro (incorporado desesperana), hipocondria, al-terao de apetite, alterao de peso, insnia/hipersonia, lentido/agitao psicomotora, perda de libido, fadiga/perda de energia e irritao.

    Ao englobar 28 indicadores de depresso em sua avaliao, o avaliador/clnico identifica, de forma mais ampla, o grau de comprometimento do avaliado. Ainda, o instrumento apresenta em seu manual diversos estudos de validade e fidedignidade, e sensibilidade e especifi-cidade, baseados na Teoria Clssica dos Testes (TCT) e Teoria de Resposta ao Item (TRI).

    No prximo tpico, sero apresentados trs instru-mentos agrupados, j que todos tm a mesma base, qual seja, o modelo dos cinco grandes fatores de personali-dade (CGF). Nesse sentido, a compreenso da avaliao da depresso por esses instrumentos tem a mesma raiz. Nos trs instrumentos, a depresso avaliada como uma faceta de Neuroticismo. Busca-se identificar as expecta-tivas de futuro, a clareza de objetivos, a capacidade de lidar com dificuldades do dia a dia, entre outros. Quanto mais elevado o escore em depresso, maior a tendncia de interpretar eventos de vida de forma negativa, de ante-cipar consequncias ruins para suas aes e de ter pouca esperana de melhorar as condies de vida. Entretanto,

  • 422 Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    Ely, P., Nunes, M. F. O., & Carvalho, L. F.

    nveis baixos nessa faceta indicam a presena de otimis-mo (Nunes, Hutz, & Nunes, 2010).

    Escala Fatorial de Ajustamento Emocional/Neuroticismo (EFN), Bateria Fatorial de Personalidade (BFP) e Inventrio NEO-PI de Personalidade Revisado (NEO-PI-R)

    A EFN foi desenvolvida por Hutz e Nunes (2001). um instrumento que visa a medir o desajustamento emocional com base no pressuposto dos CGF. O mo-delo CGF compreende a personalidade humana em cinco fatores: neuroticismo, agradabilidade/socializa-o, abertura para experincia, extroverso e conscien-ciosidade/realizao. Esses fatores se subdividem para medir construtos especficos. Especificamente sobre o fator neuroticismo: possui quatro facetas que avaliam a predisposio para a depresso, vulnerabilidade, an-siedade e desajustamento psicossocial (Hutz & Nunes, 2001; Nunes, 2000).

    A EFN um instrumento que visa a avaliar carac-tersticas de ajustamento e instabilidade emocional. autoadministrvel, possui 82 itens dispostos em uma es-cala do tipo Likert de 7 pontos (de 1 a 7). Destina-se a adolescentes a partir dos 16 anos at a idade adulta. Os estudos psicomtricos envolveram a anlise da estrutura interna e a preciso por meio do Alfa de Cronbach. No h estudo especfico sobre a depresso no manual do tes-te, porm h artigo sobre a temtica (Maciel & Yoshida, 2006). A Escala Fatorial de Neuroticismo no mede ex-clusivamente o construto da depresso, mas uma fer-ramenta til para o avaliador, pois permite a percepo dos nveis de ajustamento e instabilidade emocional. Os autores da EFN levaram em considerao os critrios do DSM (APA, 1994) para conceituao do fenmeno, juntamente com as referncias sobre os Cinco Grandes Fatores (Hutz & Nunes, 2001).

    A Bateria Fatorial de Personalidade (Nunes et al., 2010) busca a avaliao da personalidade por meio de tra-os e, assim como a Escala Fatorial de Neuroticismo, est pautada no modelo dos Cinco Grandes Fatores CGF. Por meio dessa ferramenta, possvel avaliar os estilos emocionais, interpessoais e motivacionais do avaliado, propiciando uma anlise da personalidade.

    O teste possui 126 itens, respondidos quanto ao grau de concordncia/identificao com as afirmativas. As respostas ao teste devem ser em escala do tipo Likert de sete pontos (de 1 a 7), com a pontuao maior atre-lada identificao do avaliado com a frase. A depres-so avaliada como uma das facetas de Neuroticismo. A aplicao pode ser individual ou coletiva, podendo ser usada com pessoas de 10 a 92 anos. As evidncias de va-lidade do instrumento foram buscadas por meio da sua relao com outras variveis, com indicao de seis di-ferentes estudos alm da anlise da dimensionalidade. De especial interesse para esse artigo, destaca-se a com-parao entre Neuroticismo (e sua faceta Depresso) e

    bem-estar subjetivo, assim como sua comparao com o EPQ (Eysenck Personality Questionnaire), BAI (Escala de Ansiedade), BDI I e Escala de Autoestima de Rosenberg. Alm dos estudos com base na Teoria Clssica dos Testes, h um captulo que apresenta a interpretao dos fatores da BFP com base na Teoria de Resposta ao Item.

    Assim como a EFN e a BFP, o NEO-PI-R (Costa & Mccrae, 2007) tambm se baseia no modelo CGF para a avaliao da personalidade. Trata-se de um instrumento amplamente utilizado internacionalmente em pesqui-sas, com utilidade demonstrada em diferentes culturas (Costa & Mccrae, 1992; Mccrae, 2002). O teste possui 240 questes, respondidas em escala do tipo Likert com cinco opes de resposta (de 1 a 5), indicando o nvel de concordncia com as descries das frases. Esse tes-te de autorrelato destinado ao pblico adulto de modo amplo. O fenmeno da depresso estudado como uma faceta do fator Neuroticismo, com 12 itens destinados a sua avaliao. No manual do instrumento, h diversos estudos psicomtricos verificando as propriedades psico-mtricas das dimenses e facetas, incluindo estudos de busca de evidncias de validade com base na estrutura interna e com base nas relaes com critrios externos, alm dos estudos de fidedignidade e normatizao.

    Especificamente com relao depresso, no manu-al da verso brasileira NEO-PI-R, apresentado um es-tudo relacionando traos da personalidade com sintomas depressivos. As correlaes encontradas com os instru-mentos avaliando sintomas depressivos foram de acordo com o esperado, sobretudo, com relao s facetas da di-menso Neuroticismo.

    Na sequncia, sero apresentadas as tcnicas pro-jetivas para avaliao de caractersticas depressivas. Deve-se destacar, mais uma vez, que no se trata de ins-trumentos que avaliam exclusivamente essas caracters-ticas, mas, sim, de testes de personalidade que avaliam esse fenmeno de forma mais ampla. Desse modo, as-sim como as escalas de personalidade, as tcnicas pro-jetivas podem ser usadas de modo complementar aos instrumentos que avaliam especificamente a depresso como estado.

    House-Tree-Person (HTP)O HTP de John N. Buck uma tcnica de dese-

    nhos basicamente no-verbal, na qual o avaliado deve desenhar uma casa, uma rvore e uma pessoa, em folhas distintas. um mtodo de interpretao da realidade, uma forma de projetar os contedos internos na rea-lidade. , ainda, um instrumento sensvel s questes inconscientes (Di Leo, 1987). O desenho uma tcnica auxiliar da entrevista e permite ao examinador levantar questes sobre aspectos da personalidade do avaliado , em suma, um mtodo de investigao extremamente til (Trinca, 1997).

    Esta tcnica expressiva eficaz pois observa, por meio dos desenhos e do inqurito, como o sujeito

  • 423

    Avaliao da depresso

    Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    percebe o seu meio e como reage diante dele. Os dese-nhos permitem a expresso das vivncias emocionais e ideacionais do avaliado (Trinca, 1997). Alm da anlise dos desenhos, feita a avaliao do inqurito feito aps cada desenho. O ato de verbalizar os contedos projeta-dos nas folhas de papel permite ao avaliador investigar mais a fundo o sujeito.

    No que tange interpretao dos desenhos, o au-tor recomenda considerar o conjunto de dados coleta-dos: contedos verbais e gestuais durante a aplicao do instrumento, dados dos desenhos, informaes coletadas de outras fontes (anamnese e outros instrumentos psico-lgicos, por exemplo) e a interpretao do instrumento fundamentada em literatura cientfica (Buck, 2009). O HTP pode ser aplicado individual ou coletivamente, po-rm a coleta individual mais recomendada, uma vez que ser possvel obter dados mais detalhados. A aplicao va-ria, em geral, de 30 a 90 minutos, e depende bastante do tempo gasto para realizar cada desenho e do tempo gasto no inqurito. Destina-se a crianas (a partir dos 8 anos), adolescentes e adultos.

    Sobre os estudos de validade presentes no manu-al, h dois que abordam os desenhos de pessoas obesas, um que relaciona o HTP com o CAT, um com foco na avaliao de pessoas internadas para cirurgias invasivas e mutiladoras, dois com pessoas que sofreram abuso f-sico ou sexual e a avaliao da melhora de crianas aps interveno psicanaltica. No h estudos especficos sobre sintomas ou caractersticas depressivas no ma-nual. Na avaliao da depresso por meio do HTP, al-guns aspectos dos desenhos se relacionam aos sintomas depressivos, considerados para tanto, principalmente, a localizao do desenho, os detalhes e a qualidade da linha (Buck, 2009).

    PalogrficoO teste Palogrfico foi desenvolvido por Salvador

    Mil. No Brasil, os estudos de validao deste instru-mento foram realizados por Agostinho Minicucci. A aplicao pode ser individual ou coletiva, levando no m-ximo 15 minutos, considerando o rapport, fase de treino e o teste propriamente dito. Pode ser usado com a po-pulao adolescente e adulta. Esse instrumento avalia a personalidade atravs pela expresso grfica do avaliado. Acredita-se que o movimento possui um significado ex-pressivo e intencional, caracterizando uma manifestao vital da pessoa. Dentro dessa premissa, o teste Palogrfico analisa, por meio do trao projetado, a personalidade do indivduo (Alves & Esteves, 2009).

    A avaliao do Palogrfico se d pela integrao de medidas qualitativas e quantitativas. Nas medidas qua-litativas, considera-se o simbolismo do campo grfico, ou seja, o papel representa o mundo e cada movimento feito (palo) representa o comportamento do indivduo no mundo. Esto relacionados aos aspectos qualitati-vos da avaliao intelectualidade, impulsos, extroverso,

    introverso, fixaes e relaes consigo mesmo e com o passado, o que auxilia na identificao de traos de per-sonalidade. J os aspectos quantitativos esto voltados anlise de produtividade, qualidade e ritmo na produo dos palos, sendo possvel observar a propenso do avalia-do fadiga, por exemplo.

    Sobre os estudos psicomtricos, h estudos de preciso por teste-reteste e pelo mtodo das metades, e a normatizao apresentada com pessoas de 16 a 60 anos, com uma parte da populao geral e outra de pes-soas participantes de processos seletivos. A validade foi estudada por meio da anlise da estrutura interna, por grupos contrastantes (grupos de motoristas com e sem acidentes), e pela comparao entre um grupo contro-le e um grupo de presidirios. A depresso observada em vrios indicadores qualitativos, porm os estudos de validade apresentados no manual no so voltados para a avaliao da depresso, de modo que no se tem uma indicao da intensidade de sintomas depressivos, mas, sim, a presena ou ausncia destes, baseada ex-clusivamente em interpretao terica, no emprica (Alves & Esteves, 2009).

    Teste das Pirmides Coloridas de Pfister (TPC) (Villemor-Amaral, 2005)

    O Teste das Pirmides Coloridas de Pfister um instrumento destinado avaliao da personalidade. Nele, o avaliado executa trs pirmides coloridas no pa-pel, de acordo com a vontade do sujeito. muito til na avaliao da dinmica afetiva do paciente, sobretudo em sujeitos com dificuldades de expresso verbal (Villemor-Amaral et al., 2004). Baseia-se no referencial psicanaltico para o estudo da personalidade. De acordo com as ins-trues do teste, por meio de quadrculos coloridos em 10 cores subdivididas em 24 tonalidades, o respondente deve formar trs pirmides que lhe paream bonitas, o que seguido por um inqurito. A aplicao dura cerca de 15 minutos e a iluminao do ambiente de testagem deve ter luz natural ou tradicional, para no interferir no processo de resposta ao instrumento. O pblico-alvo abrange desde crianas de sete anos at idosos. No en-tanto, no indicado para pessoas com dificuldades para distinguir cores.

    Os estudos de validade apontaram que o Pfister til para o diagnstico de alcoolistas, esquizofrnicos, pessoas com sndrome do pnico, pessoas com transtorno obses-sivo compulsivo e com depresso. As cores desempenham papel importante na avaliao do Pfister, sobretudo na avaliao da depresso. As pesquisas do manual do teste e de artigos cientficos apontam que, nos estados depres-sivos, a intensidade das cores esmaece, tornando-se sem contrastes. Mais especificamente, observou-se aumento significativo da cor verde, constncia absoluta da cor vio-leta, maior incidncia de pirmides cortadas e formaes das pirmides, tendendo a estruturas. O Pfister tem es-tudo de validade de critrio realizado com 19 pacientes

  • 424 Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    Ely, P., Nunes, M. F. O., & Carvalho, L. F.

    depressivos, que mostrou a utilidade da tcnica para esses quadros, sendo possvel diagnosticar corretamente pessoas depressivas, com sensibilidade de 86,4%, mas baixa especi-ficidade (34,2%). Desse modo, so imprescindveis novas pesquisas com vistas a fortalecer a relao entre os aspec-tos cromticos e os afetos (Villemor-Amaral et al., 2004; Villemor-Amaral, 2005).

    RorscharchO teste Rorschach foi desenvolvido pelo psiquiatra

    suo Hermann Rorschach, na Sua, e publicado pela pri-meira vez em 1921 (Torres, 2010). Trata-se de uma tcnica clnica, no campo da percepo e projeo, apresentando--se como um instrumento bastante sensvel a variaes do quadro clnico (Manfredini & Argimon, 2009). O objetivo informar sobre a estrutura da personalidade do avalia-do. composto de dez pranchas com borres de tinta. Cinco pranchas possuem manchas em preto e branco, duas apresentam tambm a cor vermelha e as trs outras so policromadas. O avaliado instrudo a dizer, para cada prancha, o que a mancha lhe parece, sugere ou o faz lem-brar (Torres, 2010). Existem diversos sistemas de aplica-o, correo e interpretao do Rorschach. Considerando o sistema compreensivo (Exner, 1999; Exner & Sendn, 1999), o teste pode ser aplicado tanto em crianas (a par-tir de cinco anos de idade) como em adultos, com tempo de aplicao entre 40 e 60 minutos em adultos, e 30 e 45 minutos em crianas. O manual apresenta estudos para verificao das propriedades psicomtricas do Rorschach no sistema compreensivo. Exemplos so os estudos sobre nveis de fidedignidade por consistncia entre avaliadores e teste-reteste, e a busca por evidncias de validade com base na relao com critrios externos (incluindo a refe-rncia a estudos de meta-anlise).

    Sobre a interpretao, as respostas dadas a cada mancha so avaliadas em funo de trs elementos: loca-lizao, que se refere parte da mancha visualizada pelo avaliado e significa a maneira como percebe e faz contato com a realidade, ou seja, sua relao com o mundo; os determinantes, que dizem respeito qualidade percep-tiva da resposta (se existe cor, movimento, forma, etc.); contedo (humano, anatmico, animal, etc.). A avaliao considera a sequncia e qualidade das respostas dadas s manchas, o simbolismo de cada prancha e os indicado-res de ansiedade. No resultado, o teste apresenta dados a respeito da estrutura da personalidade e indica focos de possveis conflitos (Torres, 2010).

    Especificamente sobre a avaliao de caracters-ticas depressivas, o Rorschach, pelo sistema compre-ensivo (SC), apresenta o ndice de depresso (DEPI), especfico para a identificao de traos depressivos. O DEPI composto por 15 variveis afetivas, cognitivas e relacionais, agrupadas em sete condies. Considera-se DEPI positivo se cinco ou mais condies forem preenchidas (Exner & Sendn, 1999). Tambm no ma-nual so apresentados dados com grupo de pacientes

    depressivos internados, que apresentaram, na maio-ria, DEPI positivo (isto , igual ou superior a 5). Vale ressaltar que existem publicaes, no apresentadas no manual, sobre o indicador DEPI, entre outros (Nascimento, 2006).

    ZulligerO teste Zulliger foi desenvolvido pelo psiclogo su-

    o Hans Zulliger em 1948. Com mtodos fundamentais do Rorschach, Zulliger buscou a criao de um instru-mento que avaliasse um grande nmero de pessoas, de forma rpida e eficaz (Vaz, 2000). um instrumento destinado avaliao da personalidade, bem como ao funcionamento de seus psicodinamismos, que identi-fica condies intelectuais, traos de personalidade, n-vel de depresso e ansiedade (Manfredini & Argimon, 2009). composto por trs pranchas com manchas de tintas. Nisso, e em algumas instrues, o Zulliger segue o Rorschach. Pode ser utilizado com adultos e leva cerca de 30 minutos para aplicao. No que tange aos estudos psicomtricos com o Zulliger, foi verificada a fidedig-nidade por teste-reteste e entre avaliadores, bem como estudos de evidncias de validade com base na estrutura interna e variveis externas (por exemplo, diagnsticos psiquitricos e desempenho profissional).

    Atravs da percepo de estmulos no estrutu-rados, ou seja, manchas de tinta, o avaliado expe as-pectos inconscientes de sua personalidade, auxiliando o psiclogo no diagnstico. No manual apresentado por Vaz (2000), o estudo dos determinantes (quais as-pectos da figura contriburam para formar o conceito e determinaram a resposta da pessoa) analisa os sintomas depressivos e o contedo das associaes. No manual mais recente do teste, h a apresentao de estudo de validade de critrio com pacientes depressivos com o uso do Zulliger. Diferentemente, o Zulliger pelo siste-ma compreensivo (ZSC) no apresenta, por sua vez, o ndice DEPI para a avaliao da depresso, pois pesqui-sas revelaram que, nesse instrumento, o ndice no tem se mostrado eficaz para a avaliao e identificao do quadro depressivo (Franco &Villemor-Amaral, 2012; Villemor-Amaral & Machado, 2011; Villemor-Amaral & Primi, 2009). Vale ressaltar que existem publica-es, no contidas no manual, com dados sobre o uso do Zulliger baseados em indicadores para depresso (Villemor-Amaral & Machado, 2011).

    Aps a anlise e descrio do estado da arte dos ins-trumentos projetivos e psicomtricos destinados ava-liao da depresso, percebeu-se que 8% dos testes apro-vados pelo Conselho Federal de Psicologia avaliam este construto. O nmero expressivo, haja vista a quanti-dade de construtos psicolgicos que potencialmente po-deriam ser avaliados. Por exemplo, h somente um ins-trumento aprovado pelo CFP para avaliao especfica da ansiedade. Ressalta-se, contudo, que frente ao panorama internacional, o nmero de instrumentos disponveis no

  • 425

    Avaliao da depresso

    Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    pas para avaliao da depresso pequeno. Do total de instrumentos analisados, trs deles se destinam exclusi-vamente avaliao da depresso e seis deles (os psico-mtricos) permitem a anlise da intensidade dos sinto-mas. Nenhum teste analisado permite o diagnstico de diferentes quadros depressivos (os quadros indicados pelo CID ou DSM, por exemplo). No entanto, vale res-saltar que existem instrumentos, disponveis na literatura internacional, desenvolvidos para o diagnstico de trans-tornos psiquitricos - por exemplo, a Structured Clinical Interview for DSM SCID.

    Uma possvel desvantagem dos testes psicom-tricos seria fornecer questes e opes de resposta es-pecficas aos indivduos, sendo possvel que algum tenha sintomas depressivos no descritos/abordados em um teste psicomtrico. Assim, os testes projetivos agregariam nessa direo de conhecer as idiossincrasias de cada pessoa. No entanto, conforme mencionado, as tcnicas projetivas apenas apontam a presena ou au-sncia de sintomas depressivos (sem indicar exatamente quais). , portanto, impossvel conhecer a intensidade dos sintomas com o uso exclusivo dessas tcnicas. Desse modo, refora-se a importncia do uso conjunto de di-versas estratgias de avaliao e de testes coerentes com o referencial terico adotado pelo psiclogo, de modo que ele interprete adequadamente os resultados. Ao es-colher um instrumento para a avaliao da depresso, o psiclogo dever considerar sua familiaridade com o referencial terico adotado pelo manual, as condies de sua administrao (como o tempo de aplicao), os estudos de validade e preciso com a populao-alvo e as normas que permitam diferenciar caractersticas

    especficas de pessoas com e sem sintomas depressi-vos. Considerando todos esses fatores, o psiclogo ter condies de escolher o instrumento mais adequado ao pblico avaliado, ao contexto e aos objetivos amplos da avaliao.

    Sobre os referenciais tericos adotados pelo teste, no houve muita variao entre os instrumentos ana-lisados. Os manuais dos testes psicomtricos referen-ciam ora o DSM-IV (APA, 1994), ora os cinco grandes fatores de personalidade, indicando que a compreenso desse fenmeno pode diagnosticar um quadro mdi-co ou avaliar, de nveis normais a patolgicos, o fun-cionamento da personalidade. Por sua vez, os manu-ais dos testes projetivos usam como base a psicanlise (HTP, Zulliger, Rorscharch e Pfister) ou a anlise da grafia e movimentos corporais (Palogrfico). Assim, os psiclogos que adotam outras concepes teri-cas no tm opes de instrumentos para a avaliao deste construto.

    Por fim, essa reviso de literatura permitiu observar a carncia de pesquisas sobre os instrumentos, sobretu-do o teste NEO PI-R (inventrio de personalidade NEO revisado) em bases de dados de artigos cientficos e teses e dissertaes. Defendem-se estudos de validade de cri-trio com os instrumentos para avaliar quadros clnicos, pois o uso de instrumentos com base apenas em infern-cias tericas (e no empricas) pode resultar em conse-quncias desfavorveis para a populao atendida. Assim, tanto se pode diagnosticar a depresso em pessoas sem esse quadro (falsos positivos), como se pode diagnosti-car a no depresso em pessoas com tais sintomas (falsos negativos).

    Referncias

    Alves, I. C. B., & Esteves, C. (2009). O teste palogrfico na avaliao da personalidade (2a ed). So Paulo: Vetor Editora. American Psychiatric Association [APA]. (1994). Diagnostic and statistical manual of mental disorders: DSM-IV (4a. ed.). Washington, DC: Autor.Anastasi, A., & Urbina, S. (2000). Testagem psicolgica (7a ed.). Porto Alegre: Artes Mdicas.Atkinson, R. L., Atkinson, R. C., Bem, D. J., Nolen-Hoeksema, S., & Smith, E. E. (2002). Introduo psicologia de Hilgard. Porto Alegre:

    Artmed. Ballone, G. J. (2010). Depresso: tipos. Recuperado de http://www.psiqweb.med.br/.Baptista, M. N. (2004). Suicdio e depresso: atualizaes. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan.Baptista, M. N. (2012). Escala Baptista de Depresso Verso Adulto EBADEP-A. So Paulo: Vetor Editora.Beck, A. T., Steer, R. A., & Brown, G. K. (2011) BDI-II Inventrio de Depresso de Beck. Adaptao de Clarice Gorenstein, et al. So Paulo:

    Casa do Psiclogo. Berlim, M. T. (2005). Transtornos depressivos, ideao suicida e qualidade de vida em pacientes deprimidos ambulatoriais. (Dissertao de mestrado no

    publicada), Universidade Federal Do Rio Grande Do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.Buck, John N. (2003). H-T-P: Casa rvore Pessoa. Tcnica Projetiva de Desenho: Manual e Guia de Interpretao. (1 ed.). So Paulo: Vetor Editora.Campos, R. A. G. C. (2006). Depressivos somos ns: um estudo de conceptualizao e avaliao da personalidade depressiva e da depresso. (Tese de

    doutorado no publicada), Universidade de vora, vora, Portugal.Campos, R. A. G. C. (2011). Construo e aferio do inventrio de traos depressivos. Trabalho apresentado no VIII Congresso Ibero-Americano

    de Avaliao Psicolgica, Lisboa, Portugal.Conselho Federal de Psicologia CFP. (2013). Sistema de Avaliao dos Testes Psicolgicos SATEPSI. Recuperado de http://www.pol.org.br.Costa Jr., P. T., & McCrae, R. R. (2007). Brazilian version of the NEO-PI-R. So Paulo: Vetor Editora. Costa Jr., P. T., & McCrae, R. R. (1992). Revised NEO Personality Inventory (NEO-PI-R) and Five Factor Inventory (NEO-FFI) professional

    manual. Odessa, FL: Psychological Assessment Resources. Cunha, J. A. (2001). Escalas Beck. So Paulo, SP: Casa do Psiclogo.

  • 426 Avaliao Psicolgica, 2014, 13(3), pp. 419-426

    Ely, P., Nunes, M. F. O., & Carvalho, L. F.

    Di Leo, J. H. (1987). A interpretao do desenho infantil. (2 Ed.) Porto Alegre: Artes Mdicas.Exner, J. (1999). Manual de classificao do Rorschach para o Sistema Compreensivo. (A. C. Pacheco Trad.). So Paulo: Casa do Psiclogo. Exner, J. E., & Sendn, C. (1999). Manual de Interpretao do Rorschach para o Sistema Compreensivo. So Paulo: Casa do Psiclogo.Franco, R. R. C., & Villemor-Amaral, A. E. (2012). O Zulliger e as Constelaes do Rorschach no Sistema Compreensivo. Avaliao

    Psicolgica, 11(1), 141-152. Hutz, C. S., & Nunes, C. H. S. S. (2001). Escala Fatorial de Neuroticismo. So Paulo: Casa do Psiclogo. Lafer, B., Almeida, O. P., Frguas R. Jr., & Miguel, E. C. (2000). Depresso no ciclo da vida. Porto Alegre: Artes Mdicas Sul.Maciel, M. J. N., & Yoshida, E. M. P. (2006). Avaliao de alexitimia, neuroticismo e depresso em dependentes de lcool. Avaliao Psicolgica,

    5(1), 43-54.Manfredini, V., & Argimon, I. L. (2009). Prevalncia de transtorno de humor em um setor da populao de Porto Alegre: a tcnica de

    Zulliger como instrumento diagnstico. Em IV Mostra de Pesquisa da Ps-Graduao PUCRS. Recuperado de http://www.pucrs.br/edipucrs/IVmostra/IV_MOSTRA_PDF/Psicologia/72044-VANESSA_MANFREDINI.pdf. Acesso em 31.01.2012.

    McCrae, R. R. (2002). NEO-PI-R Data from 36 cultures: Further international comparisons. Em R. R. McCrae, & J. Allik (Eds.), The Five-Factor Model of Personality Across Cultures (pp. 105-126). New York: Kluwer Academic, Plenum Publishers.

    Nascimento, R. S. G. G. (2006). Estudo normativo do Sistema Compreensivo do Rorschach para So Paulo: resultados dos ndices PTI, SCZI, DEPI, CDI, HVI, OBS e S-COM. Avaliao Psicolgica, 5(1), 87-97.

    Nunes, C. H. S. S. (2000). A construo de um instrumento de medida para o fator neuroticismo/estabilidade emocional dentro do modelo de personalidade dos cinco grandes fatores. (Dissertao de mestrado no publicada), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.

    Nunes, C. H. S. S., Hutz, C. S., & Nunes, M. F. O. (2010). Bateria Fatorial de Personalidade (BFP) Manual tcnico. So Paulo: Casa do Psiclogo.

    Organizao Mundial da Sade [OMS] (1997). CID-10 Classificao Estatstica Internacional de Doenas e Problemas Relacionados Sade. So Paulo: Universidade de So Paulo.

    Rang, B. (2001). Psicoterapia comportamental e cognitiva de transtornos psiquitricos, Vol. II. Campinas: Editora Livro Pleno.Souza, M. S. (2010) Evidncias de validade e preciso para a Escala de Depresso de Baptista e Sisto (EDEP). (Tese de doutorado no publicada),

    Universidade So Francisco, Itatiba, SP, Brasil.Teixeira, M. A. R., & Hashimotto, F. (2005). Da melancolia depresso: genialidade versus loucura. Artigo desenvolvido no Grupo de Pesquisa:

    Subjetividades e Psicanlise prticas clnicas e educacionais UNESP. Recuperado de http://www.assis.unesp.br/encontrosdepsicologia/ANAIS_DO_XIX_ENCONTRO/21_Marco_Antonio_Rotta_Teixeira.pdf. Acesso em 10.12.2011.

    Torres, J. M. A. (2010). O Teste Rorschach na histria da avaliao psicolgica. Revista NUFEN, 2(1), 92-104. Trinca, W. (2003). Investigao clnica da personalidade. O desenho livre como estmulo de apercepo temtica. 3 Ed. So Paulo: EPU.Vaz, C. E. (2000). A tcnica de Zulliger no processo de avaliao da personalidade. Em J. A. Cunha (Org.). Psicodiagnstico V (5. Ed. pp.

    386-387). Porto Alegre:Artmed.Villemor-Amaral, A. E., & Primi, R. (2009). Zulliger no Sistema Compreensivo ZSC forma individual Manual. So Paulo: Casa do Psiclogo.Villemor-Amaral, A. E., & Machado, M. A. S. (2011). Indicadores de depresso do Zulliger no Sistema Compreensivo (ZSC). Paidia,

    48(21), 21-27. Villemor-Amaral, A. E. (2005). As Pirmides Coloridas de Pfister: manual tcnico. So Paulo: CETEPP.Villemor-Amaral, A. E., Primi, R., Farah, F. H. Z., Silva, S. M., Cardoso, L. M., & Franco, R. R. C. (2004). A depresso no teste das

    Pirmides Coloridas de Pfister. Paidia, 14(28), 169-176.

    Sobre os autores

    Paula Ely possui graduao em Psicologia pela Fundao Universidade do Contestado.Maiana Farias Oliveira Nunes possui Doutorado em Psicologia pela Universidade So Francisco. Atualmente professora do curso

    de psicologia da Faculdade Avantis.Lucas de Francisco Carvalho possui Doutorado em psicologia com nfase em Avaliao Psicolgica pela Universidade So

    Francisco. Atualmente docente do Programa de Ps-Graduao Stricto Sensu em Psicologia da Universidade So Francisco.

    Recebido em outubro de 2013Reformulado em maio de 2014

    Aprovado em junho de 2014