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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE FARMÁCIA MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA ALLAN CARNEIRO DE SOUZA AVALIAÇÃO DO USO DA VITAMINA K COMO RASTREADOR DE EVENTOS ADVERSOS HEMORRÁGICOS POR VARFARINA: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE HOSPITAL GERAL E INSTITUIÇÃO ESPECIALIZADA EM CARDIOLOGIA Orientador: Dr. Evandro Tinoco Mesquita Co-orientador: Dra. Selma Rodrigues de Castilho NITERÓI 2015

AVALIAÇÃO DO USO DA VITAMINA K COMO RASTREADOR …app.uff.br/riuff/bitstream/1/3075/1/Souza, Allan Carneiro de... · Avaliação do uso da Vitamina K como rastreador de eventos

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE FARMCIA

MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAO E GESTO DA

ASSISTNCIA FARMACUTICA

ALLAN CARNEIRO DE SOUZA

AVALIAO DO USO DA VITAMINA K COMO

RASTREADOR DE EVENTOS ADVERSOS HEMORRGICOS

POR VARFARINA: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE

HOSPITAL GERAL E INSTITUIO ESPECIALIZADA EM

CARDIOLOGIA

Orientador: Dr. Evandro Tinoco Mesquita

Co-orientador: Dra. Selma Rodrigues de Castilho

NITERI

2015

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ALLAN CARNEIRO DE SOUZA

AVALIAO DO USO DA VITAMINA K COMO

RASTREADOR DE EVENTOS ADVERSOS HEMORRGICOS

POR VARFARINA: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE

HOSPITAL GERAL E INSTITUIO ESPECIALIZADA EM

CARDIOLOGIA

Dissertao apresentada Faculdade de

Farmcia da Universidade Federal Fluminense

para obteno do ttulo de mestre no Programa

de Ps-Graduao em Administrao e Gesto

da Assistncia Farmacutica.

Orientador:

Prof. Dr. Evandro Tinoco Mesquita

Niteri

2015

3

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ALLAN CARNEIRO DE SOUZA

Avaliao do uso da Vitamina K como rastreador de eventos adversos hemorrgicos por

varfarina: um estudo comparativo entre Hospital Geral e Instituio Especializada em

Cardiologia

Dissertao apresentada Faculdade de Farmcia da Universidade Federal Fluminense como

requisito para obteno do ttulo de Mestre no Programa de Ps-Graduao em Administrao

e Gesto da Assistncia Farmacutica.

Aprovada em __ /__ /2015

ORIENTADOR

___________________________________________________

Prof. Dr. EVANDRO TINOCO MESQUITA Orientador

Universidade Federal Fluminense - UFF

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________

Prof. Dra. CARLA VALRIA VIEIRA GUILARDUCCI-FERRAZ

Universidade Federal Fluminense - UFF

____________________________________________

Profa. Dra. ELISANGELA DA COSTA LIMA DELLAMORA

Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ

Niteri

2015

5

DEDICATRIA

Aos meus pais, Maria da Conceio e Csar, (in memorian) pelo apoio incondicional e

exemplo de vida.

minha av, Denair, pelo grande amor e carinho.

s minhas irms, Iane e Giane, pela amizade e momentos felizes.

Aos meus amigos, Rosemburg Vargas, Leandro Avellar, Jader Gadini, Orlienes Muniz, Rgis

Simionato, Isabela Laudares, Cristina Pinho, Palloma Sobrinho, Bruna Giestal, Juliane

Bacellar e Lidiane Gomes por sempre serem fiis e estarem presentes nas minhas vitrias,

alegrias e tristezas.

s minhas primas queridas, Amanda, Jaqueline e Jssica, pelo carinho e presena fiel na

minha vida.

Aos meus tios, pela considerao, carinho e respeito.

6

AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, por permitir o meu crescimento profissional. Obrigado Meu Deus pela

tua grandeza, pelo seu amor incondicional. Obrigado pelo carinho, pelo cuidado, por nunca

desistir de mim, por ter permitido chegar at aqui e pela fora que me destes nos momentos

em que pensei em desistir.

Ao professor e Doutor Evandro Tinoco Mesquita pela orientao e conhecimentos cedidos

para que esse trabalho fosse concludo.

professora e Doutora Selma Rodrigues de Castilho por ter aberto s portas para mim me

possibilitando viver este mundo acadmico. Agradeo tambm pelos ensinamentos e

conhecimentos cedidos para concluso desta dissertao. Por fim sou grato pela pacincia,

confiana e amizade.

Agradeo tambm professora e Doutora Sabrina Calil Elias pela importante contribuio ao

meu aprendizado acadmico.

Aos profissionais do Hospital Pblico de Maca, incluindo os funcionrios do arquivo

mdico. Agradeo em especial minha coordenadora Thalita Ramalho de Oliveira, ao

farmacutico Igor Assis e aos auxiliares de farmcia que fizeram parte do meu planto no

perodo em que fiz a coleta de dados.

A minha preceptora da residncia no Instituto Nacional de Cardiologia Flvia Valria dos

Santos Almeida e a minha R1 Roseanne Marques Brasil pela amizade e cooperao.

farmacutica e amiga Cristina Pinho que foi para mim desde a poca em que fui acadmico

no Hospital Municipal Souza Aguiar referncia de profissional dedicada e competente.

Agradeo tambm por ter me concedido a primeira oportunidade de emprego e pela amizade

fiel que se estende por todo esse tempo.

7

minha me, minhas irms e minha av pelo apoio, amor e incentivo ao longo desses dois

anos.

Aos meus amigos citados na dedicatria pela amizade, respeito e companheirismo

compartilhado ao longo do tempo.

8

Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou

chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar, porque descobri, que no caminho

incerto da vida, que o mais importante o decidir."

Cora Coralina

9

RESUMO

O uso seguro de medicamentos faz parte do Programa Nacional de Segurana do Paciente. A

moderna assistncia farmacutica no ambiente hospitalar lidera os processos de

farmacovigilncia e de boas prticas, particularmente em relao aos medicamentos de alto

risco. A varfarina um medicamento de baixo custo utilizado na preveno de eventos

tromboemblicos, porm apresenta baixo ndice teraputico podendo ocasionar srias

complicaes hemorrgicas, inclusive acarretar hospitalizao, portanto um exemplo de

medicamento de alto risco. importante se conhecer a efetividade da vitamina K como

rastreador de EA (eventos adversos) causados por varfarina para entendermos a magnitude

deste problema no ambiente dos pacientes atendidos pelo SUS. O objetivo deste estudo foi

comparar a utilidade do uso da vitamina K como rastreador de eventos adversos hemorrgicos

(EAH) em dois centros hospitalares (Hospital Geral x Hospital Especializado em Cardiologia)

que atendem pacientes do SUS. O estudo foi realizado em dois centros: um hospital pblico

de referncia em cardiologia localizado na cidade do Rio de Janeiro (Hospital E) e um

hospital pblico geral e de emergncia do municpio de Maca (Hospital G). O mtodo dos

rastreadores ou trigger tools foi aplicado para anlise retrospectiva da utilizao da vitamina

K (fitomenadiona) como rastreador de eventos adversos hemorrgicos causados por varfarina.

As principais variveis determinadas no estudo foram: rendimento da vitamina K em detectar

eventos, classificao dos eventos adversos a medicamentos (EAM) quanto causalidade

atravs do algoritmo de Naranjo e quanto ao grau de dano. Outros indicadores calculados

foram taxa de eventos adversos como causa de admisso hospitalar e tempo mdio para

anlise dos pronturios que foi determinado apenas no Hospital G. O uso da vitamina K foi

avaliado em 46 pronturios no Hospital E e 54 pronturios no Hospital G. No Hospital G dois

pacientes sofreram sangramentos pelo uso de varfarina, resultando assim em um rendimento

de 3,7% (2/54) na capacidade da vitamina K em detectar eventos adversos hemorrgicos, bem

inferior ao rendimento deste rastreador encontrado no Hospital E que foi de 30,4% (14/46).

Na anlise da causalidade dos danos hemorrgicos, todos os eventos adversos, identificados

em ambos os hospitais foram classificados como provveis aps a aplicao do algoritmo de

Naranjo. Grande parte dos EA identificados nos dois centros foram classificados como H,

onde houve necessidade de medidas de suporte vida como infuso de plasma e ou hemcias.

No Hospital E a idade mdia dos pacientes que sofreram EA hemorrgicos foi 57,4 anos

(dp=15,2). Em relao ao estudo realizado no Hospital G, os dois pacientes que apresentaram

10

EAH tinham idade superior a 70 anos. No Hospital E, em 50% (7/14) dos pacientes, a

hemorragia foi a causa da internao. Enquanto no Hospital G os dois pacientes que sofreram

EAH por varfarina foram internados devido a ocorrncia do sangramento. No estudo realizado

no Hospital E treze pacientes que sofreram EAH tinham RNI 6. O odds ratio (od) de EAH

com RNI 6 foi de 24,9. No estudo do Hospital G no foi possvel calcular o odds ratio, pois

raramente havia registro dos valores de RNI. Concluso. No Hospital G o uso da vitamina K

como rastreador esteve pouco associado a eventos adversos hemorrgicos por varfarina.

Enquanto no hospital cardiolgico foi observada elevada associao.

Palavras-chave: vitamina K, eventos adversos a medicamentos, varfarina, rastreadores,

segurana do paciente.

11

ABSTRACT

The safe use of medicaments is part of the Brazilian Patient Safety Programme. Modern

pharmaceutical care in the hospital domain is the chief item in the processes of

pharmacovigilance and good practices, particularly as regards high-risk medications.

Warfarin is a low-cost medication used in the prevention of thromboembolic events, but has a

low therapeutic index, and may cause severe haemorrhagic complications, including the need

for hospitalisation, being therefore a high-risk medication. Knowing how effective vitamin K,

as a trigger of haemorrhage Adverse Events (AEs) caused by warfarin, is important to

understand the magnitude of the problem in the realm of the patients of the SUS (Brazilian

Health System). The objective of this study was to compare the usefulness of the use of

Vitamin K as a trigger of adverse haemorrhage events in two hospital centres (General

Hospital vs a Cardiology Specialist Hospital) that care for SUS patients. The study was

undertaken in two centres: a public Cardiology reference hospital in the city of Rio de Janeiro

(Hospital E) and a public general and emergency hospital in the city of Maca (Hospital G).

The trigger tools method was applied in a retrospective analysis of the use of Vitamin K

(phytomenadione) as a trigger of adverse haemorrhage events caused by warfarin. The main

variables established in the study were: performance of the Vitamin K in detecting events

(EAH), classification of the adverse drug events (ADEs) as regards the causality via the

Naranjo algorithm, and as regards the damage level. Other pointers calculated were the rate of

adverse events as cause for hospital admittance and mean time for the analysis of the medical

records, done only at Hospital G. The use of Vitamin K was assessed in 46 medical records in

Hospital E and in 54 medical records in Hospital G. The latter had two patients who

underwent bleeding through the use of warfarin, thus yielding a 3.7% (2/54) performance rate

for Vitamin K in detecting adverse haemorrhage events, well below the efficiency for this

trigger as found in Hospital E, at 30.4% (14/46). In the analysis of causality of the

haemorrhagic data, all the adverse events identified in both hospitals were rated as probable

after the application of the Naranjo algorithm. A major part of the AEs identified in the two

centres was rated as H, where there was a need to deploy life support measures, such as

plasma and/or red blood cell infusions. The average age, in Hospital E, of the patients that had

adverse haemorrhage events was 57.4 years (dp=15.2). The study done in Hospital G had two

patients aged over 70 who experienced SHE. At Hospital E, 50% (7/14) of the patients had an

haemorrhage as the cause for hospital admission. In Hospital G the two patients who

12

experienced a coumarin-related episode were admitted due to bleeding after the use of

warfarin. In the study done at Hospital E thirteen patients who went through haemorrhage

AEs had a RNI 6. The odds ratio for bleeding with a RNI 6 was of 24.9. On the other

hand, in the study done at Hospital G it was not possible to calculate the odd ratio as there

rarely was a record for the values of the RNI. The use of Vitamin K, as a trigger, at the

General Hospital was little associated to adverse haemorrhage events due to warfarin. A

substantial association was observed, however, at the Cardiology Hospital.

Key words: Vitamin K, adverse drug events, warfarin, triggers, patient safety.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Classificao de dano segundo o NCCMERP Index (Institute for Healthcare

Improvement), p. 55

Tabela 2 Distribuio dos EAM do Hospital E conforme a faixa etria, sexo, tempo de

internao, tipo de unidade de internao e indicao do anticoagulante (N(a)

=14)., p. 65

Tabela 3 Resumo dos resultados do Hospital E (N=46)., p. 66

Tabela 4 Resumo dos resultados do Hospital G (N=54)., p. 67

Tabela 5 Caractersticas dos eventos adversos hemorrgicos do Hospital E., p. 68

Tabela 6 Caractersticas dos eventos adversos hemorrgicos do Hospital G., p. 69

14

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Evoluo dos incidentes envolvendo o paciente (WHO, 2009), p.28

Figura 2 Diagrama de Venn para incidentes na assistncia sade (WHO, 2009)., p.

29

Figura 3 Fluxograma da obteno dos indicadores propostos para o estudo., p. 53

Figura 4 Tipos de hemorragia causada pelo uso de varfarina que implicou na utilizao da

vitamina K no grupo de pacientes do Hospital E (N=14)., p. 60

Figura 5 Motivo do uso da vitamina K no grupo de pacientes que no sofreu eventos

adversos no Hospital E (N=32)., 62.

Figura 6 Tipos de anticoagulantes utilizados pelos pacientes do Hospital E (N=46)., 63

Figura 7 Motivo do uso da vitamina K no grupo de pacientes que no sofreu eventos

adversos no Hospital G (N=52)., 64

15

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Classificao dos erros de medicao (CASSIANI, 2005)., p. 30

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LISTA DE ABREVIATURAS E SMBOLOS

AIMS Australian Incident Monitoring System

AHCPR - Agency for Health-care Policy and Research

ANVISA - Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria

APSF Australian Patient Safety Foundation

CBA Consrcio Brasileiro de Acreditao

CEP - Comit de tica em Pesquisa

CID - Classificao Internacional de Doena

CNMM - Centro Nacional de Monitorizao de Medicamentos

DP- Desvio-Padro

EA Evento adverso

EAM - Evento adverso a medicamento

EAH Evento Adverso Hemorrgico

GGTES Gerncia Geral de Tecnologia em Servio de Sade

HPM Hospital Pblico Municipal de Maca

IHI - Institute for Healthcare Improvement

INC Instituto Nacional de Cardiologia

IOM - Institute of Medicine

JCAHO - Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations

LMC Leucemia Mielide Crnica

MS - Ministrio da Sade

NCC MERP - The National Coordinating Council for Medication Error

NPSA National Patient Safety

OD Odds Ratio

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OMS - Organizao Mundial da Sade

OPAS - Organizao Pan-Americana da Sade

PNSP Programa Nacional de Segurana do Paciente

QAHCS Quality in Australian Health Care Study

RAM - Reao Adversa a Medicamento

RDC Resoluo da Diretoria Colegiada

RNI - Razo Normalizada Internacional

RR Risco relativo

SNVS Sistema Nacional de Vigilncia Sanitria

SUS - Sistema nico de Sade

UMC - Uppsala Monitoring Centre

UTI - Unidade de Terapia Intensiva

VIGIPS Vigilncia Ps Uso das Tecnologias em Sade

VPP Valor Preditivo Positivo

WHO - World Health Organization

18

SUMRIO

1. INTRODUO, p. 20

2. REVISO BIBLIOGRFICA, p. 23

2.1 Anticoagulao Oral, p. 23

2.2 Eventos adversos a medicamentos (EAM) e a Farmacovigilncia, p. 24

2.3 Segurana do Paciente, p. 26

2.4 Segurana do Paciente no Brasil, p. 30

2.5 Mtodos de Monitoramento de Eventos Adversos, p. 33

2.5.1 Notificao Espontnea, p. 33

2.5.2 Reviso Restrospectiva de Pronturio, p. 34

2.5.3 Entrevista, p. 35

2.5.4 Trigger tool ou Mtodo dos Rastreadores, p. 36

3. OBJETIVOS, p. 50

3.1 Objetivo geral, p. 50

3.2 Objetivos especficos, p. 50

4. METODOLOGIA, p. 51

4.1 Cenrio do estudo, p. 51

4.1.1 Estudo realizado no Hospital Geral e de Emergncia, p. 51

4.1.2 Estudo realizado no Hospital de Referncia em Cargiologia, p. 51

4.2 Delineamento do estudo, p. 52

4.3 Coleta de dados, p. 52

4.4 Processamento e anlise dos dados, p. 57

4.5. Aspectos ticos, p. 58

5. RESULTADOS, p. 59

19

6. DISCUSSO, p. 71

7. LIMITAES DO ESTUDO, p. 80

8. CONCLUSES, p. 81

9. IMPLICAO CLNICA, p. 82

10. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS, p. 83

11. APNDICE, p. 102

11.1 Apndice 1: Formulrio de Coleta de Dados, p.102

11.2 Apndice 2: Formulrio de Anlise de Causalidade de Reao Adversa pelo

Algortmo de Naranjo, p. 103

12. ANEXOS, p. 104

12.1. Anexo I: Parecer Consubstanciado do CEP do Instituto Nacional de

Cardiologia, p. 104

12.2 Anexo II: Folha de rosto do projeto de pesquisa submetido ao CEP do

Instituto Nacional de Cardiologia, p. 105

12.3. Anexo III: Parecer Consubstanciado do CEP do projeto de pesquisa

realizado no Hospital Geral e de Emergncia, p.106

12.4. Anexo IV: Folha de Rosto do projeto de pesquisa submetido ao CEP da

Universidade Federal Fluminense, p. 110

12.5. Anexo V: Declarao da Instituio Co-participante, p. 111

12.6. Anexo VI: Roteiro para Aplicao do Algortmo de Naranjo. (NARANJO

et al., 1981), p. 112

12.7. Anexo VII: Fluxograma de Anlise do Grau da Dano do Evento Adverso a

Medicamentos (EAM) NCCMERP Index, p. 116

12.8. Anexo VIII: Relao de Rastreadores padronizada pelo Instituto for

Healthcare Improvment (IHI) (GIFFIN e RESAR, 2009), p. 117

12.9 Anexo IX: Aceite de Publicao dos Resultados do Hospital Especializado

(Revista Brasileira de Cincias Farmacuticas Bsica e Aplicada), p. 118

20

1. INTRODUO

O uso seguro de medicamentos faz parte do Programa Nacional de Segurana do

Paciente. A moderna assistncia farmacutica no ambiente hospitalar lidera os

processos de farmacovigilncia e de boas prticas, particularmente em relao aos

medicamentos de alto risco. O desenvolvimento da farmacovigilncia hoje uma

poltica que se consolida nas instituies hospitalares do pas.

A anticoagulao oral tem sido cada vez mais empregada na preveno de

fenmenos tromboemblicos em diversas situaes clnicas (JACOBS, 2008). O

alcance do RNI (Razo Normalizada Internacional) alvo e a manuteno do nvel

adequado da anticoagulao uma preocupao constante, pois mltiplos fatores podem

interferir neste objetivo teraputico, como por exemplo, a presena de co-morbidades,

interaes medicamentosas, fatores genticos, alimentao e adeso ao tratamento

Torna-se imprescindvel o controle cuidadoso em intervalos regulares, para evitar o

aparecimento de eventos adversos (EA) (FIHN et al., 1996; SCHULMAN, 2003).

O ndice teraputico da varfarina estreito e seu uso requer cuidados especiais,

inclusive com a alimentao. O potencial de interao medicamentosa deste frmaco

elevado, sendo os principais mecanismos a induo enzimtica, a inibio de enzimas e

a reduo da ligao s protenas plasmticas. importante ressaltar que as interaes

mais graves so aquelas que aumentam o efeito anticoagulante e o risco de sangramento

(JACOBS, 2008).

A notificao espontnea permanece o mtodo mais utilizado e eficiente de

identificao de reaes adversas a medicamentos (RAM) na fase ps-comercializao,

porm apenas 5% dos eventos adversos so identificados, sendo a subnotificao a

principal limitao deste mtodo (CULLEN et al., 1995).

Embora a vigilncia passiva (notificao espontnea) seja realmente valiosa,

necessrio desenvolver atividades de vigilncia ativa, as quais proporcionam maior

sensibilidade para identificar, confirmar, caracterizar e quantificar possveis riscos. As

atividades de farmacovigilncia ativa incluem a elaborao e desenvolvimento de

estudos de utilizao e segurana ps-registro (OPAS, 2011). Entre as estratgias

usualmente empregadas, encontra-se a procura de eventos adversos em pronturios,

prescries mdicas, exames laboratoriais ou atravs de entrevistas com pacientes e/ou

prescritores.

21

A reviso retrospectiva de pronturio outra abordagem para identificar eventos

adversos a medicamentos (EAM). No entanto, apresenta o inconveniente de demandar

muito tempo e recursos humanos (FRANKIN et al., 2010).

O Institute for Healthcare Improvement (IHI) (2009) desenvolveu um mtodo

alternativo reviso tradicional de pronturios, que emprega 74 rastreadores, incluindo

uso de determinados medicamentos e antdotos, parmetros laboratoriais, suspenso

abrupta de algum medicamento e informaes sobre o cuidado e a evoluo clnica do

paciente. A identificao de um rastreador pode sinalizar a ocorrncia de algum possvel

evento adverso provocado por medicamento, permitindo ento que uma investigao

mais detalhada seja iniciada para verificar se ocorreu ou no dano ao paciente. Este

mtodo conhecido como rastreadores ou trigger tools (GRIFFIN e RESAR, 2009;

ROZICH, HARADEN e RESAR, 2003).

O objetivo principal do mtodo dos rastreadores consiste na quantificao, deteco

e rastreamento do resultado dos eventos adversos, permitindo assim uma anlise precisa

dos danos em diferentes ambientes de cuidado. Os dados gerados por esta ferramenta

podem ser usados para criar um ambiente mdico seguro. Este mtodo

economicamente vivel, comeando com abordagem manual, porm, a automao do

processo facilita a sua execuo, alm de facilitar a implantao de um estudo

prospectivo (RESAR, ROZICH e CLASSEN, 2003).

A vitamina K utilizada como antdoto para reverter eventos hemorrgicos

causados por cumarnicos (JACOBS, 2008). Nos Estados Unidos foi realizado um

estudo retrospectivo em que se empregou a vitamina K e o RNI > 3 visando

identificao de eventos adversos hemorrgicos por anticoagulante. Foram encontrados

169 eventos. Setenta e quatro por cento destes resultaram em necessidade de infuso de

plasma fresco congelado e 64,8 % dos sangramentos foram classificados como maior.

Um total de 59,2% dos eventos foram responsveis pelo menos parcialmente pela

admisso hospitalar. O RNI mdio dos pacientes que tiveram danos foi de 6,1. Quase 80

% desses pacientes tinham terapia anticoagulante prescrita, mas apenas 60,0% tinham

plano de acompanhamento em pronturio eletrnico (HARTIS, GUM e LEDERER,

2005).

A realizao deste estudo buscou avaliar o uso da vitamina K como rastreador de

eventos adversos hemorrgicos visando subsidiar seu uso como estratgia de

22

monitoramento ativo de efeitos adversos em servios de sade. importante conhecer a

efetividade da vitamina K como rastreador de EA hemorrgicos causados por varfarina

para se entender a magnitude deste problema no ambiente dos pacientes atendidos pelo

SUS.

23

2. REVISO BIBLIOGRFICA

2.1 Anticoagulao Oral

Os anticoagulantes orais, tambm conhecidos por agentes cumarnicos, so

antagonistas da vitamina K, um importante co-fator para a sntese heptica dos fatores

de coagulao II (protrombina), VII, IX e X. Os representantes disponveis no mercado

brasileiro incluem a varfarina e a femprocumona. As indicaes para terapia

anticoagulante permanente incluem a preveno primria de tromboembolismo na

fibrilao atrial e em pacientes com prteses cardacas, alm da preveno secundria

de tromboembolismo venoso e sndromes coronarianas agudas. O controle laboratorial

deve ser feito a cada um ou dois dias at que a Razo Normalizada Internacional (RNI)

recomendada seja atingida. Quando o RNI estabilizar, o controle deve ser semanal e,

aps, mensal (SCHULMAN, 2003). O risco de eventos tromboemblicos est

aumentado quando o RNI encontra-se abaixo do nvel teraputico e quando acima do

mesmo, o risco de hemorragias aumenta dramaticamente. (EZEKOWITZ e FALK,

2004).

A varfarina o quarto medicamento cardiovascular mais prescrito nos Estados

Unidos. No entanto, em 1995 a Agency for Health-care Policy and Research (AHCPR)

relatou que a varfarina muito pouco utilizada para a preveno de acidente vascular

cerebral. O AHCPR observou que os mdicos esto relutantes em receitar a varfarina,

em parte porque eles no esto familiarizados com as tcnicas para administrar o

medicamento de forma segura e temem que o medicamento possa causar sangramento

(HORTON, BRUCE e BUSHWICK, 1999).

Os pacientes que tomam anticoagulantes por via oral tm com frequncia valores de

RNI fora do intervalo teraputico, aumentando o risco de EA. O melhor controle da

anticoagulao ir reduzir as taxas de eventos adversos hemorrgicos e

tromboemblicos (OAKE et al., 2007). A taxa de danos hemorrgicos por pacientes que

utilizam anticoagulantes bastante elevada e grande parte deles de alta gravidade

(JACOBS, 2008). Muitos eventos adversos por anticoagulantes so evitveis apesar de

sua severidade. Os EA causados por este grupo de medicamentos podem potencialmente

resultar em hospitalizao, leso permanente ou morte (LONG et al., 2010). Sendo

assim, o elevado risco que este tipo de medicamento representa exige o

24

acompanhamento e a mensurao dos seus danos para que medidas sejam tomadas para

preveni-los ou minimiz-los (OAKE et al., 2007).

Em relao as caractersticas farmacocinticas, a varfarina uma mistura racmica

de esteroismeros que se ligam 99% albumina plasmtica, sendo biotransformada no

fgado e rins, com a subseqente produo de metablitos inativos, que so excretados

pela urina. A meia-vida de varfarina racmica varia de 20 a 60 horas e a durao do

efeito de 2-5 dias. A varfarina pode ser detectada no plasma, uma hora aps a

administrao oral, e concentraes de pico ocorrem em 2-8 horas. O efeito de uma

dose mxima ocorre em at 48 horas aps a administrao e dura cinco dias

(SCHULMAN, 2003).

Atua como um antagonista da vitamina K, inibindo redutases envolvidas na sntese

de hidroquinona a partir do epxido, particularmente a epxido-redutase. A inibio da

converso cclica da vitamina K induz a produo e a secreo heptica de protenas

descarboxiladas ou parcialmente carboxiladas, que apresentam 10 a 40% da atividade

biolgica normal (SCHULMAN, 2003).

2.2 Eventos adversos a medicamentos e a Farmacovigilncia

Os eventos adversos a medicamentos (EAM) podem ser definidos como qualquer

dano ou injria resultante de uma interveno clnica relacionada ao uso de

medicamentos (Bates et al., 1995). Esta definio inclui os danos causados por reaes

adversas e erros de medicao.

Os eventos adversos a medicamentos (EAM) podem ser causa, prolongar o tempo

de internao ou contribuir para o bito. Uma meta-anlise estimou, em 1994, que um

milho de americanos foram internados em funo de eventos adversos a

medicamentos, tornando os EAM responsveis por 4,7 % de todas as internaes.

(LEAPE, 1995).

As reaes adversas so definidas pela OMS como qualquer efeito prejudicial ou

indesejado que se apresente aps a administrao de doses de medicamentos

normalmente utilizadas no homem para profilaxia, diagnstico ou tratamento de uma

enfermidade (WHO, 2013).

25

A Organizao Mundial de Sade (2002) definiu a farmacovigilncia como a

cincia responsvel pela atividade de deteco, avaliao, compreenso e preveno de

efeitos adversos ou qualquer outro problema relacionado a medicamento.

A determinao da correlao de causa-efeito entre o evento adverso e o

medicamento difcil de ser estabelecida, principalmente quando o medicamento

pouco conhecido ou o evento resultado de idiossincrasia. A necessidade de se

identificar e estabelecer a relao de causalidade de um EAM levou ao desenvolvimento

de algoritmos e tabelas de deciso. (GIORDANI, 2011).

Entre os algoritmos mais difundidos pode-se citar o de Karch e Lasagna (1977), que

consiste de questes fechadas com respostas dicotmicas. A combinao dos resultados

leva ao estabelecimento da fora da relao causal. Deve-se considerar como limitao

deste mtodo, o fato de um evento ser julgado como definido apenas se houver re-

exposio ao medicamento, com repetio do mesmo. Um grupo de pesquisadores

utilizando critrios semelhantes, porm mais detalhados, atriburam valores numricos

s respostas, cujo somatrio indicaria a fora da causalidade (NARANJO et al., 1981).

O Programa Internacional de Monitoramento preconiza classificar os eventos como

sugerido pela OMS (2000), ou seja, em definidos, provveis, possveis, improvveis,

condicionais, no classificados, inacessveis/ no classificado (GIORDANI, 2011).

Uma reviso sistemtica dos eventos adversos a medicamentos ocorridos em

hospitais encontrou uma variao de 4,4 a 7,0 eventos por 100 pacientes/dia. Estes

dados reforam o elevado risco em que os pacientes esto submetidos devido ao uso de

medicamentos (GIORDANI e ROZENFELD, 2009).

Apesar dos poucos estudos sobre a frequncia de EA em pases em

desenvolvimento e em fase de transio, um estudo transversal estimou a prevalncia de

EA em 58 hospitais situados nos seguintes pases: Argentina, Colmbia, Costa Rica,

Mxico e Peru. A prevalncia de EA foi de 10,5%, sendo 60% classificados como

evitveis. Este estudo analisou a internao de 11.379 pacientes (REIS, MARTINS e

LAGUARDIA, 2013).

No Brasil, uma reviso sistemtica estimou que a incidncia de EA no pas foi

7,6%, sendo 67% considerados evitveis. Os eventos mais frequentes foram

relacionados cirurgia, seguido por aqueles associados a procedimentos clnicos.

(Mendes et al., 2009).

26

O impacto dos custos dos eventos adversos para os sistemas de sade costuma ser

mensurado. Um estudo realizado na Alemanha estimou um gasto de 816 milhes de

euros com internao de pacientes que sofreram EAM no ano de 2007, onde 30% destes

danos poderiam ser evitados (STARK e JOHN, 2011). Outro estudo realizado nos

Estados Unidos mostrou que as estimativas de custos associados com a morbidade e a

mortalidade decorrentes de EAM ultrapassaram $177.4 bilhes dlares no ano 2000

(STARK e JOHN, 2011).

2.3 Segurana do Paciente

H uma impreciso conceitual nos termos utilizados para denominar os efeitos

negativos derivados da utilizao dos medicamentos. O termo segurana do paciente

aplica-se a iniciativas para evitar, prevenir e reduzir resultados adversos ocorridos a

partir do cuidado sade (CASSIANI, 2005).

A partir de 2000, a segurana do paciente foi inserida na agenda de pesquisadores

do mundo inteiro e tornou-se internacionalmente reconhecida como uma dimenso

fundamental da qualidade em sade. Os EUA e vrios outros pases com sistemas de

sade distintos, dos quais se destacam Inglaterra, Irlanda, Austrlia, Canad, Espanha,

Frana, Nova Zelndia e Sucia protagonizaram iniciativas como a criao de institutos,

associaes e organizaes voltadas questo da segurana do paciente (CASSIANI,

2005).

A publicao do livro To Err Is Human: Building a Safer Health System (Kohn,

2000), pelo Insititute of Medicine (IOM), em 1999, chamou a ateno do mundo para

questes relacionadas segurana do paciente. O relatrio foi baseado em diversos

estudos que mostraram que os erros de medicao ocasionam 7.391 mortes por ano nos

Estados Unidos. Cada paciente admitido num hospital sofrer 1,4 erros de medicao

durante sua hospitalizao e a cada 1000 prescries feitas podero ser encontrados 4,7

erros.

Em 2003 a The Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations

(Joint Commission, 2008), agncia que regula a acreditao de servios e sistemas de

sade, estabeleceu metas para a segurana do paciente. Ainda nos Estados Unidos, o

Instituto for Healthcare Improvement (IHI) lanou, em 2004, a campanha The 100.000

Lives, visando reduo em nvel nacional das mortes evitveis nos hospitais, durante

27

um perodo de 18 meses e posteriormente em 2006 foi lanada a campanha The

5.000000 Lives que almejava uma reduo de danos e mortes nos hospitais americanos

nos prximos dois anos.

Considerando a magnitude global do problema da segurana do paciente, a

Organizao Mundial de Sade (OMS) estabeleceu em 2004 a Aliana Mundial para a

Segurana do Paciente (World Alliance for Patient Safety) com a presena de vrios

pases, inclusive o Brasil. O objetivo dessa iniciativa foi definir e identificar prioridades

na rea de segurana do paciente em diversas partes do mundo e contribuir para agenda

mundial para a pesquisa no campo (CASSIANI, 2005).

As deficincias do sistema de prestao de cuidados de sade, em sua concepo,

organizao e funcionamento so apontadas como principais fatores responsveis pela

ocorrncia de EA. Os seres humanos cometem falhas, portanto, erros so esperados.

Sendo assim, importante tratar os erros como consequncias e no como causas. Os

EA podem ser resultados de problemas na prtica, produtos, processos ou sistemas.

(REIS, MARTINS e LAGUARDIA, 2013).

A fim de unificar as percepes internacionais das principais questes relacionadas

segurana do paciente e para facilitar a descrio, comparao, mensurao, controle,

anlise e interpretao, a OMS elaborou um documento sobre a estrutura conceitual

envolvendo a segurana do paciente. Neste documento, a segurana do paciente

definida como a reduo de riscos desnecessrios associados assistncia em sade at

um mnimo aceitvel (WHO, 2009).

importante ressaltar que um incidente ou erro pode envolver ou no o dano ao

paciente. O incidente sem dano aquele que atingiu o paciente, mas no causou evento

adverso, como um medicamento administrado erroneamente a um paciente sem que

nada acontea ao mesmo. Enquanto o incidente com dano ou evento adverso um

incidente que atingiu o paciente e causou EA. A segurana do paciente tambm se

preocupa com eventos que podem gerar um potencial para o dano. A OMS define

circunstncias notificveis como aquelas em que no ocorreu o incidente, mas envolve

evento com expressivo potencial para o dano ao paciente, como um desfibrilador sem

manuteno, apresentando risco como a probabilidade de ocorrer incidente (WHO,

2009b).

28

Alguns erros no resultam em incidentes ou eventos adversos, em geral so

caracterizados como quase falhas ou near miss que possui uma definio dbia

quando se traduz, onde segundo o documento da OMS esse termo definido como um

incidente que no alcanou o paciente, por exemplo, uma bolsa de sangue conectada a

um paciente errado, entretanto o erro foi detectado antes da infuso iniciar. Por outro

lado, no seria um quase erro, pois no processo o erro aconteceu, apesar dele no ter

atingido o paciente. Entretanto, este conceito ainda utilizado por instituies de

cuidado, inclusive nos manuais de acreditao da Joint Commission International (Joint

Commission, 2008). A figura 1 mostra o resumo destes conceitos estruturados pela

OMS, sendo o ponto mais crtico aquele que atinge o paciente e causa dano, ou seja, o

evento adverso.

Figura 1: Evoluo dos incidentes envolvendo o paciente (Fonte;. Adaptado de WHO,

2009).

O diagrama de Venn abaixo demonstra a relao entre estes conceitos que

envolvem a segurana do paciente.

29

Figura 2: Diagrama de Venn para incidentes na assistncia sade (Fonte; adaptado de

WHO, 2009b).

Os erros so observados em todas as fases do sistema de medicao. Um estudo

mostrou que trinta e nove por cento ocorrem durante a prescrio, 12% na transcrio,

11% na dispensao e 38% durante a administrao. Os profissionais da enfermagem e

farmacuticos so responsveis pela interceptao de 86% dos erros de medicao

relacionados a erros de prescrio, transcrio e dispensao, Apenas 2% so

interceptados pelos pacientes (LEAPE et al., 1995). O quadro 1 apresenta a

classificao para os erros de medicao.

30

Erros de prescrio Seleo incorreta do medicamento (de acordo com contra-indicao,

alergias conhecidas e outros fatores); monitorao; dose; via de

administrao, concentrao; velocidade de infuso; instrues de uso

inadequadas feitas por mdico; prescrio ilegvel ou ordens que possam

induzir a erro.

Erros de omisso No administrao de uma dose ou mais de determinado medicamento ao

paciente.

Erros devido ao horrio Administrao do medicamento fora do intervalo de tempo pr-definido.

Erros de dose Administrao de dose maior ou menor do que a prescrita.

Erros de administrao Administrao em outras formas que no a prescrita. Erros devido ao

procedimento ou tcnica inapropriados na administrao do medicamento.

Podem ser includas aqui doses administradas pela via incorreta (diferente

da prescrita) ou pela via correta, mas no local errado (troca do olho/ouvido

esquerdo pelo direito) e os casos em que o padro de administrao no

obedecido (ex.: velocidade de infuso).

Medicamentos

imprprios para uso

Medicamento formulado ou manipulado incorretamente (casos de diluio

e/ou reconstituio incorretas, misturas incompatveis e armazenamento

inadequado); administrao de medicamentos expirados ou cuja

integridade fsica ou qumica est comprometida (medicamentos com

prazo de validade vencido ou armazenados incorretamente).

Erros de adeso Um exemplo o paciente que se recusa a seguir o regime teraputico ou

no aceita a administrao de uma dose.

Erros de transcrio Equvocos na transcrio da prescrio mdica manual para o sistema de

prescrio eletrnica.

Erros de separao

/dispensao

So os desvios que ocorrem no momento da separao e dispensao dos

medicamentos pelo servio de farmcia (ex.: dose diferente, outra forma

farmacutica e apresentao, outro medicamento diferente do

originalmente prescrito).

Quadro 1: Classificao dos erros de medicao (CASSIANI, 2005).

2.4. Segurana do Paciente no Brasil

No Brasil, a Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (ANVISA), criada no

governo Fernando Henrique Cardoso em 1999 a agncia governamental que atua na

rea de segurana do paciente cuja funo a promoo da proteo da sade da

populao. A Gerncia Geral de Tecnologia em Servios de Sade (GGTES/ANVISA)

da ANVISA tem realizado as aes propostas pela Organizao Mundial de Sade

31

(OMS) que buscam a segurana do paciente, minimizao dos riscos e a melhoria da

qualidade em servios de sade. Estas aes incluem: a higienizao das mos; os

procedimentos clnicos seguros; a segurana do sangue e hemoderivados; a

administrao segura de injetveis e de imunobiolgicos e a segurana da gua e no

manejo de resduos (GOUVA e TRAVASSOS, 2010).

O Brasil um dos pases que compem a Aliana Mundial para a Segurana do

Paciente (World Alliance for Patient Safety), estabelecida pela Organizao Mundial de

Sade, em 2004. O principal propsito dessa aliana instituir medidas que aumentem a

segurana do paciente e a qualidade dos servios de sade, fomentado pelo

comprometimento poltico dos Estados signatrios (WHO, 2012). Isso despertou os

pases membros para o compromisso de desenvolver polticas pblicas e prticas

voltadas para a segurana do paciente, incluindo o Brasil (GOUVA e TRAVASSOS,

2010).

Duas iniciativas no governamentais merecem destaque no Brasil. A criao, em

1998, do Consrcio Brasileiro de Acreditao (CBA), representante da Joint

Commission International no Brasil, (CBA, 2008). E a criao, em 1999, da

Organizao Nacional de Acreditao (ONA), cujo objetivo implantar processo

permanente de avaliao e de certificao da qualidade dos servios de sade.

O Brasil possui um sistema nacional de notificaes, o NOTIVISA. Este um

sistema informatizado na plataforma web, previsto pela Portaria n 1.660, de 22 de

Julho de 2009, Portaria n 529, de 1 de Abril de 2013,do Ministrio da Sade, e RDC n

36, de 25 de Julho de 2013, da ANVISA, e desenvolvido para receber as notificaes

de incidentes, eventos adversos (EA) e queixas tcnicas (QT) relacionadas ao uso de

produtos e de servios sob vigilncia sanitria. A ANVISA atravs do NOTIVISA

registra os problemas relacionados ao uso de tecnologias e de processos assistenciais,

por meio do monitoramento da ocorrncia de queixas tcnicas de medicamentos e

produtos para a sade, incidentes e eventos adversos, com o propsito de fortalecer a

vigilncia ps-uso das tecnologias em sade, conhecida como VIGIPS, e na vigilncia

dos eventos adversos assistenciais (BRASIL, 2009).

Como estratgia para concretizar a Vigilncia Sanitria ps-uso e a comercializao

de produtos (Vigips), a ANVISA criou em 2002 a rede sentinela. Esta rede, composta

atualmente por 192 hospitais, funciona como observatrio no mbito dos servios para o

http://www.anvisa.gov.br/hotsite/notivisa/apresenta_ea.htmhttp://www.anvisa.gov.br/hotsite/notivisa/apresenta_qt.htm

32

gerenciamento de riscos sade, em atuao conjunta e efetiva com o Sistema Nacional

de Vigilncia Sanitria (SNVS). Cada servio que compe a Rede possui uma Gerncia

de Risco, que representa a referncia interna da Vigips na sua instituio. Em conjunto,

esses hospitais monitoram um conjunto de eventos adversos no atendimento aos

pacientes (ANVISA, 2014).

Em abril de 2013 com a publicao da Portaria Ministerial (MS) n 529 de 01/04/13

foi lanado na sede da OPAS/OMS no Brasil pelo Ministrio da Sade (MS), o

Programa Nacional de Segurana do Paciente (PNSP), que tem como objetivo geral

contribuir para a qualificao do cuidado em sade em todos os estabelecimentos de

sade do territrio nacional (BRASIL, 2013).

Ao todo seis protocolos vo orientar os profissionais na ampliao da segurana.

So eles: cirurgia segura, prtica de higiene das mos em servios de sade, preveno

de lceras por presso, preveno de quedas em pacientes hospitalizados, identificao

do paciente e segurana na prescrio, uso e administrao de medicamentos (BRASIL,

2013).

O protocolo de identificao do paciente tem a finalidade de reduzir a ocorrncia de

incidentes. O processo de identificao deve assegurar que o cuidado seja prestado

pessoa para a qual se destina (BRASIL, 2013).

O protocolo para preveno de lcera por presso visa prevenir a ocorrncia dessa e

de outras leses da pele, visto que uma das consequncias mais comuns da longa

permanncia em hospitais. Sua incidncia aumenta proporcionalmente combinao de

fatores de riscos, entre eles, idade avanada e restrio ao leito (BRASIL, 2013).

O protocolo de segurana na prescrio, uso e administrao de

medicamentos objetiva a promoo de prticas seguras no uso de medicamentos em

estabelecimentos de sade (BRASIL, 2013).

O protocolo para cirurgia segura diz respeito ao estabelecimento de medidas a

serem implantadas para reduzir a ocorrncia de incidentes e eventos adversos e a

mortalidade cirrgica, possibilitando o aumento da segurana na realizao de

procedimentos cirrgicos, no local correto e no paciente correto, por meio do uso da

lista de verificao de cirurgia segura desenvolvida pela OMS (BRASIL, 2013).

http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/identi_paciente.pdfhttp://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/upp_revisado.pdfhttp://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/seguran_medica.pdfhttp://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/seguran_medica.pdfhttp://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/prot_cirursegura.pdf

33

O protocolo para a prtica de higiene das mos em servios de sade fornece

informaes sobre a instituio e promoo da higiene das mos nos servios de sade

do pas. Seu intuito prevenir e controlar as infeces relacionadas assistncia

sade, visando segurana do paciente, dos profissionais de sade e de todos aqueles

envolvidos nos cuidados aos pacientes (BRASIL, 2013).

O protocolo de preveno de quedas a sexta e ltima norma que tem como meta

reduzir a ocorrncia de queda de pacientes nos pontos de assistncia e o dano dela

decorrente, por meio da implantao/implementao de medidas que contemplem a

avaliao de risco do paciente, garantam o cuidado multiprofissional em um ambiente

seguro e promovam a educao do paciente, familiares e profissionais (BRASIL, 2013).

No mesmo ano foi publicada a RDC 36/2013 que reitera a necessidade do

monitoramento de eventos adversos para a garantia da segurana do paciente atravs da

notificao destes. Esta RDC da Anvisa estabelece a obrigatoriedade de criao de

Ncleos de Segurana do Paciente nos servios de sade e da notificao de eventos

adversos associados assistncia do paciente (BRASIL, 2013).

2.5 Mtodos de Monitoramento de Eventos Adversos

2.5.1 Notificao espontnea

A notificao espontnea permanece o mtodo mais utilizado e eficiente de

identificao de novas reaes adversas a medicamentos (RAM) na fase ps-

comercializao (CULLEN, 1995). Porm, apenas 5% dos eventos adversos so

identificados (BGAUD, 2002; CULLEN, 1995). Os bancos de dados de eventos

adversos permitem uma viso mais ampla dos eventos adversos. Existem os internos aos

servios de sade, em especial nos hospitais, ou de base mais abrangente, como alguns

sistemas de carter nacional.

Os bancos de dados que armazenam as notificaes de eventos adversos so

importantes fontes de informaes sobre os efeitos indesejveis dos medicamentos. O

sistema da National Patient Safety Agency (NPSA) um dos mais conhecidos para

notificao de eventos adversos do sistema de sade do Reino Unido. No Brasil alguns

grandes hospitais tm sistemas internos de notificao voluntria. A Agncia Nacional

http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/prot_higiene.pdf

34

de Vigilncia Sanitria (ANVISA) lanou em 2009 o NOTIVISA que um sistema

informatizado na plataforma web criado para receber as notificaes de eventos

adversos (EA) e queixas tcnicas (QT) relacionados a medicamentos e outros produtos

como agrotxicos e cosmticos.

A maioria dos hospitais identifica os eventos adversos a medicamentos usando o

mtodo de notificao voluntria, mas esta abordagem carece de sensibilidade. (JHA et

al., 1998). Porm til para identificar reaes raras ou novas (WATT, 1992;

BGAUD, 2002).

A subnotificao um grande problema da notificao espontnea e representa um

obstculo para hospitais que monitoram eventos adversos apenas por este mtodo. A

publicao de trs estudos realizados na Frana mostrou a magnitude da subnotificao

ao se comparar as reaes notificadas com as obtidas atravs de relatos dos pacientes

por monitoramento prospectivo, durante o mesmo perodo. Todos os estudos em

questo mostraram taxas semelhantes, onde no mais do que 5% das reaes adversas

foram notificadas. importante ressaltar que o sistema de farmacovigilncia francs

considerado eficiente podendo ser comparado em termos de qualidade ao sistema de

notificao dos Estados Unidos (BEGUD et al., 2012).

Vrias so as causas apontadas como obstculos para notificao espontnea como:

sobrecarga de trabalho, medo de punies, no reconhecimento da importncia da

notificao (KARSH et al., 2006). Mtodos para identificar EAM usando dados de

ensaios clnicos, registros mdicos e bases de dados informatizadas dos usurios de

medicamentos devem ser utilizados para complementar o sistema de notificao

espontnea (TEJAL et al., 2003).

2.5.2 Reviso Retrospectiva de Pronturio

O mtodo de reviso retrospectiva de pronturio considerado o padro ouro

para a identificao de eventos adversos, porm tem sido criticado devido ao seu alto

custo e limitaes para o monitoramento da ocorrncia de eventos adversos nos servios

de sade (MURFF e al., 2003). A reviso de pronturios geralmente realizada

retrospectivamente em uma amostra aleatria de internaes (MICHEL, 2003).

http://www.anvisa.gov.br/hotsite/notivisa/apresenta_ea.htmhttp://www.anvisa.gov.br/hotsite/notivisa/apresenta_ea.htmhttp://www.anvisa.gov.br/hotsite/notivisa/apresenta_qt.htm

35

A reviso de pronturio identifica mais eventos adversos (EA), porm dependendo

dos recursos, s vezes invivel para a monitorizao de rotina. Alm disso, os

registros mdicos precisam ser lidos com detalhes para se evidenciar o dano (OTERO e

DOMINGUEZ-FIL, 2000, FRANKIN et al., 2010;). As maiores crticas ao mtodo

esto relacionadas sensibilidade alta para deteco de casos graves, mas com a

possibilidade de subestimar alguns tipos de eventos adversos (MICHEL, 2003).

Um estudo realizado na Austrlia mostrou que uma combinao de

acompanhamento de notificaes espontneas e reviso de registros mdicos deram

informaes teis sobre os eventos adversos. Os dois mtodos se complementam nos

tipos de eventos adversos que detectam e nas informaes que cada um fornece. A partir

da informao que recolhida pelos dois mtodos, possvel no s conhecer os

eventos adversos, mas tambm saber por que eles ocorreram. (MALPASS, 1999).

2.5.3 Entrevista

As entrevistas aos pacientes por profissionais de sade constituem importante

mtodo de monitoramento de eventos adversos, pois permitem que sejam obtidas

informaes diretas e de forma mais rpida, evidenciando questes que no so

registradas em pronturios ou outros relatrios. Alm disso, as entrevistas permitem

identificar eventos adversos de menor gravidade que podem ter sido registrados durante

a internao ou como fonte de informao sobre eventos que ocorrem aps a alta do

paciente. (FORSER et al., 2006).

Este mtodo bastante til na deteco de EAM em pacientes ambulatoriais.

importante ressaltar que embora os eventos adversos a medicamentos em pacientes

internados atualmente recebam considervel ateno, relativamente pouco conhecido

sobre a incidncia, severidade e prevenibilidade dos EAM em pacientes ambulatoriais.

(HONIGMAN, 2001).

Um estudo de coorte prospectivo em pacientes ambulatoriais observou que dos 661

pacientes que responderam entrevista, 162 (24,5%) apresentaram EAM, tendo sido um

total de 181 eventos (27 por cada 100 pacientes). Alm disso, 20 (11%) eram

considerados evitveis. Os eventos adversos a medicamentos so comuns nos cuidados

primrios e muitos so evitveis, sendo o monitoramento e a comunicao importantes

provedores para ajudar a prevenir os eventos adversos relacionados a medicamentos.

36

Uma poderosa estratgia de monitoramento de eventos adversos a medicamentos tem

sido a participao do farmacutico clnico com papel ativo na terapia de cuidado ao

paciente. Este processo se d atravs da utilizao de formulrios padronizados de

coleta de dados visando o monitoramento simultneo do resultado da terapia

farmacolgica em populaes especficas de pacientes. A cuidadosa anlise e

interpretao dos dados clnicos traro informaes relevantes sobre o resultado da

terapia medicamentosa. Este mtodo pode ser aplicado por meio de consulta

farmacutica ao paciente que pode ser realizada em visita ao leito ou atendimento a

pacientes ambulatoriais (TEJAL ET AL., 2003).

Recentemente foi realizado um estudo observacional descritivo atravs de dados

coletados em consultas mensais farmacuticas e a partir de busca ativa em pronturio

mdico e eletrnico em pacientes com Leucemia Mielide Crnica (LMC) portadores

de cromossomo philadlphia positivo. No acompanhamento de 228 pacientes foram

relatadas 227 reaes adversas (214 eventos a cada 100 pacientes) no hematolgicas ao

Mesilanato de Imatinibe por 106 pacientes (46,7%). Deste total de 106 pacientes com

queixa de reaes adversas, 87 relataram melhora aps interveno do farmacutico

junto ao paciente ou equipe de sade. Este trabalho mostrou a importncia da interface

da farmacovigilncia com a ateno farmacutica realizada em pacientes ambulatoriais

no monitoramento de EAM atravs de entrevista ao paciente (LIMA, ALMEIDA e

QUEIROZ, 2010).

O mtodo de monitoramento de eventos adversos por entrevista ao paciente

segundo Michel (2003) se mostrou efetivo e confivel. A maior limitao para seu uso

est relacionada ao custo, o que no permitiria a incorporao na rotina dos servios de

sade. Um estudo mostrou que o mtodo de entrevista o que mais detecta eventos

adversos em pacientes ambulatoriais (30-50%), enquanto a reviso de registros (13%)

(HONIGMAN et al., 2001).

2.5.4 Mtodo dos Rastreadores

O mtodo dos rastreadores ou trigger tool consiste em um mtodo de

monitoramento ativo de EAM baseado na utilizao de marcadores de EAM.

Introduzido por Jick, em 1974 foi padronizado pelo Institute for Healthcare

Improvement (IHI) (2004), reeditado e atualizado por este mesmo instituto em 2009 e se

37

apresenta como alternativa reviso tradicional de pronturios (RESAR, ROZICH e

CLASSEN, 2003).

O IHI padronizou 74 rastreadores, incluindo uso de determinados medicamentos e

antdotos, parmetros laboratoriais, suspenso abrupta de algum medicamento e

informaes sobre o cuidado e a evoluo clnica do paciente. A identificao de um

rastreador pode sinalizar a ocorrncia de algum possvel evento adverso provocado por

medicamento, permitindo ento que uma investigao mais detalhada seja iniciada para

verificar se ocorreu ou no dano ao paciente (GRIFFIN e RESAR, 2009).

Evidencias da contribuio do mtodo dos rastreadores

Vrios autores consideram que o monitoramento atravs de rastreadores pode

contribuir para a criao de um ambiente mais seguro no campo da utilizao de

medicamentos, por ser capaz de identificar, quantificar e classificar os danos causados

por frmacos (RESAR et al., 2003; ROZICH et al., 2003; GRIFFIN e RESAR, 2009 e

SCHILDMEIJER et al.,2013).

Em 2003, um estudo descreveu o emprego de uma lista de 24 rastreadores em 86

hospitais, divididos em 4 grupos com base no perfil de servios prestados. Uma mdia

de 2,68 EAM foi identificada para cada 1000 doses de medicamentos administradas. A

maioria dos eventos (79,9%) envolveu a necessidade de intervenes, com danos

temporrios. No entanto, foram identificados eventos de maior gravidade, inclusive

relacionados ao bito do paciente. Os autores apontaram a possibilidade de uso dos

rastreadores no monitoramento longitudinal de taxas de ocorrncia de EAM como

estratgia para o alcance de maior segurana clnica. Tambm enfatizam o bom

desempenho dos profissionais na utilizao da ferramenta, com investimento de uma

hora de treinamento (ROZICH et al., 2013).

Uma anlise por especialistas foi realizada atravs da avaliao de 100 registros

eletrnicos, selecionados aleatoriamente em 5 centros urbanos de ateno primria. Os

autores apontaram a necessidade da adequao do mtodo para a identificao de EAM

no identificados anteriormente entre pacientes ambulatoriais. Entretanto, questionaram

a adequao da aplicao mtodo rotina das unidades de ateno primria, sugerindo

que sua aplicao poderia ser mais eficiente como ferramenta de auditoria (WET e

BOWIE, 2009).

38

Outro estudo identificou a congruncia entre diferentes mtodos para identificao

de EAM: (I) indicadores de segurana do paciente (PSI), desenvolvidos pela Agency for

Healthcare Research and Quality, que se baseia na anlise de cdigos CID-9 em

resumos de alta; (II) relato voluntrio de eventos pelos provedores e (III) mtodo dos

rastreadores ou trigger tools, com confirmao pelo mdico. Chama a ateno o fato de

que apenas 6% dos 235 EAM foram identificados por todos os trs mtodos

empregados no estudo. Em 27,7% das altas, o mtodo dos rastreadores identificou um

rastreador e apenas 17% destes casos foram tambm descritos pelos provedores. Os

resultados encontrados so condizentes com outro estudo (OLEARY, 2013), que

sugere a combinao de mtodos para avaliao da segurana do paciente visando

melhorias internas (NAESSENS et al., 2009).

O mtodo dos rastreadores tambm foi utilizado em um estudo visando auxiliar o

desenvolvimento de uma abordagem prtica para a ateno primria em sade visando

envolver profissionais na questo da melhoria da segurana no uso de medicamentos. O

trabalho foi realizado em seis unidades ambulatoriais de sade, onde foram aplicados 39

rastreadores para a reviso manual de relatrios. Os rastreadores identificados com mais

frequncia foram a suspenso do uso de um medicamento (VPP 26,3%), hospitalizao

(21,8%) e visita emergncia (14.9%). Cerca de 40 % dos EAM identificados foram

considerados prevenveis (SINGH et al., 2009).

O desempenho do mtodo dos rastreadores foi avaliado em termos de

confiabilidade para uso em estudos nacionais de determinao de taxa de EAM, atravs

de um estudo retrospectivo envolvendo a reviso de uma amostra aleatria de 2008

relatrios de 10 hospitais. Os resultados mostraram alta especificidade, moderada

sensibilidade e confiabilidade favorvel tanto intra quanto inter avaliadores. Desta

forma, os autores concluram pela adequao do uso da metodologia em futuros estudos

baseados em registros hospitalares (SHAREK et al., 2011).

Um estudo visando comparao entre mtodos de monitoramento de eventos

adversos foi realizado por pesquisadores americanos. Este trabalho comparou a

identificao de EAM atravs da aplicao do mtodo dos rastreadores, da notificao

voluntria em cada hospital, e da varredura com base nos indicadores propostos pela

Agency for Healthcare Research and Qualitys Patient Safety Indicators, em 3 hospitais

americanos. Ao todo, foram identificados 393 EAM, dos quais o mtodo dos

rastreadores identificou 354, a notificao voluntria identificou 4 EAM e os

39

indicadores de segurana do paciente dectaram 35 eventos. Os autores concluram pela

superioridade do mtodo dos rastreadores frente aos outros dois mtodos analisados

(CLASSEN et al., 2011).

Outro estudo comparativo tambm observou maior identificao de EAM atravs

do mtodo dos rastreadores em comparao a um sistema de notificao voluntria de

um setor de reabilitao peditrica. O autor apontou que 16 dos 17 EAM identificados

no haviam sido relatados pela notificao voluntria (BURCH, 2011).

Alguns autores compararam a identificao de EAM por trs mtodos diferentes no

atendimento a pacientes com cncer, intra e extra-hospitalares: a busca de palavras

chave em um banco de dados (The Danish Cancer Society), o mtodo dos rastreadores e

o relato de pacientes e cuidadores. Embora o mtodo trigger tools tenha identificado

260 eventos em 572 buscas, os autores ressaltam a limitao da ferramenta por ser

genrica e desenhada para uso intra-hospitalar e sugerem a combinao de mtodos

como uma estratgia interessante para aumentar a compreenso sobre os riscos e dar

suporte aes preventivas (LIPCZAK et al., 2011).

Por fim, outro estudo realizado um hospital universitrio sueco tambm comparou

o mtodo dos rastreadores com a notificao espontnea. A utilizao do mtodo dos

rastreadores permitiu a identificao de 33,2 EAM /100 pacientes-dia, enquanto a

notificao voluntria registrou apenas 6,3% destes EAM (RUTBERG et al., 2014).

O grau de concordncia entre 5 especialistas de diferentes hospitais na identificao

de EA pelo mtodo dos rastreadores foi avaliado. Os especialistas foram treinados para

o uso do mtodo dos rastreadores, quanto ocorrncia de eventos adversos. O nmero

de eventos identificados variou entre as 5 equipes, de 27,2 a 99,7 EA/1000 hospitais-

dia. O nvel de concordncia quanto aos EA variou de 88 a 96%. Os autores

consideraram que estes resultados no encorajam o uso de rastreadores para a realizao

de comparaes entre hospitais diferentes, apontando que, para esta finalidade, so

necessrias aes substanciais de treinamento, visando obter maior grau de

concordncia entre grupos de revisores (SCHILDMEIJER et al., 2012).

Um trabalho empregou o mtodo dos rastreadores como forma de identificar

eventos adversos no processo de avaliao de um programa de melhoria da qualidade

em ateno primria. O estudo envolveu diferentes braos de instituies que sofreram

intervenes educativas para melhoria da qualidade (SINGH et al., 2012).

40

Alguns pacientes ambulatoriais foram monitorados quanto ocorrncia de EAM

atravs da utilizao de seis rastreadores laboratoriais para identificar EAM em

pacientes adultos Um total de 516 pacientes foram acompanhados. Os autores

apontaram a necessidade de que o mtodo sofra algumas adaptaes como a reviso do

limiar de alguns rastreadores, bem como a incluso de outros, para melhor adaptao

realidade ambulatorial (BRENNER et al., 2012).

O mtodo dos rastreadores tambm foi aplicado na avaliao da segurana de

pacientes em dois hospitais da Palestina. Os autores identificaram que um em cada 7

pacientes sofreu algum dano, 59,3% dos quais seriam prevenveis e 70,4% levaram ao

aumento do tempo de internao. Os autores apontaram que o uso do mtodo dos

rastreadores permitiu identificar que os eventos adversos ocorrem em uma proporo 20

vezes maior do que havia sido relatado at ento (NAJJAR et al., 2013).

O mtodo dos rastreadores tem sido utilizado para determinao da incidncia de

EAM. Um estudo realizado em um hospital tercirio do Rio de Janeiro empregou o

mtodo dos rastreadores e encontrou uma incidncia de 14,4% de EAM (ROZENFELD

et al., 2013).

A lista de rastreadores do IHI foi emprega em um hospital de ensino Belga. O valor

preditivo positivo (VPP) ou rendimento dos rastreadores variou de 0 a 0,67, com metade

deles tendo VPP inferior a 0,2. (CARNEVALI et al., 2013). O mesmo mtodo foi

aplicado em um hospital de ensino na Coria, tendo o rendimento dos rastreadores

variado de 0 (zero) a 1 (HWANG et al., 2014).

Alguns autores avaliaram uma srie temporal de 6 anos em termos de frequncia,

gravidade e possibilidade de preveno de EAM detectados atravs do mtodo dos

rastreadores em um hospital de urgncia geritrica. Os autores relataram a ocorrncia de

29,4 agravos fsicos para cada 100 admisses e puderam observar a reduo da

ocorrncia e da gravidade dos agravos ao longo do tempo. Entre as aes relatadas no

perodo encontra-se o treinamento da equipe de sade (SUAREZ et al., 2014).

41

Adaptao do Mtodo:

Rastreadores tm sido desenvolvidos para populaes e ambientes de cuidado

especficos, incluindo hospitais gerais, unidades cirrgicas, peditricas, unidades de

tratamento intensivo e ateno primria (CHAPMAN et al., 2014), visando facilitar e

viabilizar a sua implementao, bem como aumentar sua especificidade. De modo

geral, os estudos consideram elegveis para o monitoramento pacientes com 48 horas de

internao (ROZICH et al., 2003 e ROQUE e MELO, 2012) ou mais (VENTURA et al.,

2012 e KENNERLY et al., 2013). No entanto, h relatos de incluso de pacientes com

pelo menos 24 horas de internao (SUAREZ et al., 2014).

As adaptaes envolveram a seleo, a incluso de rastreadores e a modificao dos

patamares propostos. Um estudo ressaltou a importncia da adaptao do mtodo dos

rastreadores proposto pelo IHI, s metas organizacionais e limitao de recursos de

diferentes instituies de sade para sua efetiva aplicao nestas unidades. O estudo

utilizou uma amostra menor de pacientes, apenas um revisor seguido de uma anlise no

setor de Segurana do Paciente. Tambm compararam a taxa de EAM identificadas

entre pacientes com menos de 3 dias de internao com a incidncia de EAM nas

internaes com tempo superior 3 dias ou mais, tendo observado cerca de 4 vezes

mais EAM entre os pacientes com mais de 3 dias de internao (KENNERLY et al,

2013).

Alguns pesquisadores realizaram uma adaptao da metodologia proposta pelo IHI

em um estudo feito num hospital pblico do Rio de Janeiro e com base em anlise

retrospectiva de 32 pronturios foram encontrados eventos adversos em 16%, utilizando

38 critrios rastreadores (ROZENFELD et al., 2009).

Outro estudo realizado no Brasil apresentou o processo da adaptao dos

rastreadores para aplicao em hospital de cardiologia. Foi utilizado o mtodo Delphi

modificado para obter consenso atravs de um painel de especialistas composto por 10

profissionais de sade (4 enfermeiros, 2 farmacologistas, 1 farmacutico e 3 mdicos)

visando definio dos sinalizadores a serem utilizados. A partir da listagem de

rastreadores do IHI foram selecionados 21 critrios de rastreamento que foram

aplicados de forma retrospectiva em 112 pronturios para avaliar a ocorrncia de EAM,

tendo sido observada uma incidncia de 14,3% de EAM (ROQUE e MELO, 2010).

42

Os mesmos autores do estudo citados no pargrafo acima aplicaram uma adaptao

do mtodo proposto pelo IHI em unidade hospitalar especializada em cardiologia, no

Rio de Janeiro, tendo observado uma incidncia de 14,3% de eventos adversos, e, em

31,2% dos casos, houve a necessidade de interveno para suporte de vida (ROQUE e

MELO, 2012).

Nos Estados Unidos um trabalho adaptou a listagem de rastreadores para uso em

pacientes peditricos. A reviso retrospectiva foi aplicada em uma amostra aleatria de

960 pronturios de 12 hospitais peditricos americanos. Foram identificados 107 EAM.

A incidncia de eventos adversos a medicamentos foi 11,1%. Este estudo tambm

comparou o mtodo com a notificao voluntria e concluiu que o mtodo dos

rastreadores mais eficaz, uma vez que apenas 3,7 % dos eventos identificados atravs

de marcadores foram detectados usando o mtodo tradicional de notificao espontnea

(TAKATA et al., 2008). A adaptao dos rastreadores populao peditrica foi

tambm objeto de vrios outros estudos (TAKATA et al, 2008b; MATLOW et al.,

2011; KIRKENDALL et al., 2012; MATLOW et al., 2012; VENTURA et al., 2012;

SILVA et al., 2013; CALL et al., 2014 e CHAPMAN et al., 2014).

O processo de adaptao do mtodo dos rastreadores tambm foi realizado por

pesquisadores canadenses que descreveram o processo de desenvolvimento e validao

dos rastreadores especficos para a populao peditrica pela Canadian Association of

Paediatric Health Centres (The Canadian Trigger Tool - CPTT), atravs do mtodo

Delphi e de uma anlise de risco. Este processo conduziu reduo da relao proposta

de 94 para 47 rastreadores (MATLOW et al., 2011).

Outro hospital peditrico teve os EAM monitorados pelo mtodo dos rastreadores e

tambm foi necessria uma adaptao do mesmo. A busca ativa foi feita em 240

relatrios aleatrios representando 1206 pacientes-dia. Embora os autores apontem para

a adequao da utilizao do mtodo dos rastreadores em unidades peditricas,

considerando que encontraram 2 a 3 vezes mais EAM que em estudos anteriores na rea

de pediatria, ressaltam que foram feitas modificaes no mtodo para torn-lo mais

adequado aos eventos que ocorrem neste grupo de pacientes (KIRKENDALL et al.,

2012).

Um estudo realizado em um hospital de ensino no Brasil selecionou alguns

rastreadores da lista do IHI e identificou 497 rastreadores em 177 pronturios. Os

43

rastreadores encontrados com mais freqncia foram: antiemtico (72,1/100

pronturios), suspenso abrupta de medicamentos (70/100 pronturios) e sedao

excessiva, sonolncia, torpor, letargia e hipotenso (34,6/100 pronturios). Os mais

eficientes na sinalizao de EAM foram antagonista de benzodiazepnico,

antidiarricos e rash cutneo (GIORDANI et al., 2012).

A necessidade de desenvolvimento de rastreadores especficos para a populao

peditrica e oncolgica se faz necessria uma vez que vrios rastreadores empregados

apresentaram VPP baixo (CALL et al., 2014). Outro estudo tambm ressaltou a

limitao do mtodo dos rastreadores, por ser uma ferramenta genrica e desenhada

para uso intra-hospitalar, sugerindo combinao de mtodos como estratgia

interessante para aumentar a compreenso sobre os riscos e dar suporte aes

preventivas. Segundo os autores, a melhoria da resposta nesta rea deveria envolver

ainda uma adaptao para o tratamento oferecido a pacientes no hospitalizados

(LIPCZAK et al., 2011).

No Brasil, recentemente este mtodo foi utilizado em um estudo observacional

prospectivo realizado em uma unidade peditrica de tratamento intensivo. Foram

utilizados rastreadores como suspenso abrupta de medicamentos, antdotos e exames

laboratoriais para deteco de EAM. A identificao de 110 eventos adversos ocorreu

aps busca em 244 internaes. Os autores puderam concluir aps a realizao deste

estudo que o uso de muitos medicamentos, bem como a pouca idade destes pacientes

favorece a ocorrncia de EAM podendo resultar no aumento do tempo de permanncia

na UTI. O uso de marcadores como ferramenta de busca ativa mostrou-se importante

para identificar EA em unidade de tratamento intensivo (SILVA et al., 2013).

Um estudo selecionou 51 rastreadores especficos para pacientes cirrgicos. Os

autores relataram bom nvel de concordncia tanto inter quanto intra-avaliadores com

97,8 a 98,5% de concordncia. Comparado com o mtodo tradicional de rastreadores, a

nova ferramenta encontrou a ocorrncia de mais 363 eventos, 18 EAM, 3 dos quais era

prevenveis. Desta forma, os autores concluram que a modificao na ferramenta a

tornou uma boa alternativa, em particular para avaliar a segurana no uso de

medicamentos em pacientes cirrgicos (DE BOER et al., 2013).

Sendo assim, a adaptao desta metodologia de busca ativa muito importante para

permitir a sua aplicao em diferentes ambientes de cuidados e grupos de pacientes,

44

alm de permitir melhor sensibilidade e especificidade para os rastreadores, fator

importante para a viabilidade da aplicao da ferramenta na rotina das unidades.

Uso de sistemas informatizados para deteco dos rastreadores

O potencial da aplicao de mtodos automatizados de busca de informao tem

sido descrito em vrias reas da sade, inclusive na avaliao de pronturios e sistemas

de informao em sade para busca de eventos adversos (TEGEDER, 1999;

HONIGMAN et al., 2001; DORMANN et al., 2000; DORMANN et al., 2004; JAH et

al., 2008 e FOSTER et al., 2012).

A utilizao de programas de computador para identificao de rastreadores de

eventos adversos mostrou-se importante facilitador para execuo deste tipo de

ferramenta de controle de risco (HWANG et al., 2008). O mtodo trigger tool foi

aperfeioado ao se utilizar sistemas informatizados para identificar os sinais atravs da

gerao de relatrios ou alertas. Sendo assim, a automao do processo pode simplificar

a execuo deste mtodo, alm de facilitar a implantao de um estudo prospectivo

(Resar et al., 2003).

Um estudo descreveu a criao de um sistema integrado de informao hospitalar

que permite a deteco de mltiplas fontes de potenciais eventos adversos a

medicamentos. Entre os sinais usados esto a suspenso abrupta de medicamentos,

antdotos e determinados valores laboratoriais anormais. No final do dia, uma lista de

eventos adversos em potencial era gerada e os pronturios revisados por um

farmacutico. Entre os 36.653 pacientes, foram identificados 731 eventos (2,0 EAM por

100 pacientes), evidenciando uma taxa de 1,67%. Durante este mesmo perodo, apenas

nove eventos adversos foram identificados atravs de mtodos tradicionais de deteco.

Os autores consideraram que a triagem de rastreadores ou sinais utilizando um sistema

de informao hospitalar informatizado ofereceu um aumento do potencial de deteco

de EA em pacientes hospitalizados (CLASSEN et al., 2005).

O processo de desenvolvimento de uma ferramenta informatizada para a aplicao

do mtodo de rastreadores foi realizada para utilizao em unidades de cuidado

ambulatorial. Os autores apontaram o potencial dos avanos no processamento de

linguagem natural e outras ferramentas de busca de informao para melhorar a

capacidade de deteco dos rastreadores. Segundo eles, no futuro, os rastreadores

45

podem ser desenhados para detectar uma gama maior de EA usando os registros dos

profissionais de sade (MULL e NEBEKER, 2008).

Pesquisadores de um estudo afirmaram que o desenvolvimento de processos

automatizados proporciona aumento da eficincia e do potencial de aplicao da

ferramenta na melhoria dos cuidados em sade (NAESSENS et al., 2010). Esta

contribuio foi tambm ressaltada pelos autores de outro estudo realizado em 2012, em

funo dos profissionais de sade envolvidos na avaliao dos pronturios

apresentarem, em sua maioria, tempo escasso para realizao desta atividade

(GIORDANI et al., 2012).

Outro estudo desenvolveu um sistema automtico para identificao de EAM

atravs dos rastreadores naloxona para sobre-sedao por opiides e administrao de

glicose em bolus durante o uso de insulina, nos registros eletrnicos de um hospital. Os

rastreadores foram identificados diariamente. Uma anlise subsequente por um

especialista foi implementada. Os autores concluram que o uso de uma ferramenta para

a identificao automtica dos rastreadores, complementada pela anlise em

profundidade conduzida por especialistas, til para a identificao de alvos para

interveno e melhoria de processos (MUETHING et al., 2010).

Atravs da avaliao de eventos adversos em uma rede integrada de cuidados em

sade nos Estados Unidos atravs do mtodo dos rastreadores, os autores ressaltaram a

facilidade de aplicar um gerenciador de banco de dados comercial, amplamente

acessvel, para analisar os rastreadores e a importncia de uma ferramenta informatizada

para a realizao desta tarefa (GOOD et al., 2011).

No entanto, o fato de que a informatizao da busca pode implicar em altos custos e

na necessidade de se ter pronturios eletrnicos como requisito (ROZICH et al., 2003).

Neste sentido, sugere-se que em instituies com menos recursos pode ser utilizado uma

abordagem manual, enquanto nas mais ricas a incorporao de produtos de software

mais sofisticados pode ser interessante (Resar et al., 2003). Porm, importante a busca

de alternativas para facilitar a utilizao do mtodo dos rastreadores, como a coleta

automtica de parte dos rastreadores que pode ser obtida atravs da informatizao da

prescrio e dos exames laboratoriais (GIORDANI et al., 2012).

46

Rendimento ou Eficincia dos Rastreadores

A determinao do rendimento ou valor preditivo positivo (VPP) dos rastreadores

tem se mostrado bastante til para anlise de sua eficincia na deteco de danos

causados por medicamentos. importante ressaltar que o desperdcio de tempo na

reviso de pronturio pode ocorrer na utilizao do mtodo trigger tool, pois muitas

vezes os rastreadores no esto relacionados a EAM, tendo baixo rendimento

(LEVINSON, 2010; CARNEVALI et al., 2013 e HWANG et al., 2014). Sendo assim,

vrios estudos procuraram calcular o Valor Preditivo Positivo (VPP) ou rendimento

(eficincia) dos rastreadores, ou seja, aqueles que uma vez identificados sinalizaram um

nmero maior de possveis eventos adversos.

Um estudo aplicou os rastreadores na busca de EAM em pronturios eletrnicos de

um hospital especializado, encontrando um VPP global de 16%. No entanto, alguns

rastreadores mostraram um VPP bastante superior, como a hialuronidase, que teve VPP

de 60% (CALL et al., 2014).

A determinao da sensibilidade dos rastreadores em detectar eventos adversos

pode ser til para a seleo dos rastreadores empregados no monitoramento de

determinados sistemas de sade. Um estudo utilizou uma equipe mutidisciplinar para

avaliar a sensibilidade dos rastreadores atravs do emprego da escala de Likert, onde a

atribuio do valor 5 indica forte probabilidade do rastreador em detectar possveis EA.

Os resultados apontaram que a protamina e a vitamina K (fitomenadiona) que detectam

eventos adversos hemorrgicos por heparina e varfarina respectivamente foram os

rastreadores mais sensveis (HANDLER et al., 2008).

Os rastreadores com maior VPP devem ter prioridade de incorporao nos sistemas

de rotina de monitorao das unidades de sade. Outra concluso do mesmo estudo

que pacientes que permanecem mais tempo internados devem ser monitorados mais de

perto pela aplicao dos rastreadores. Carnevali e colaboradores (2013) tambm

relatam que apenas seis rastreadores tiveram VPP maior que 50%, (infeco associada

ao cuidado, qualquer complicao nos procedimentos, uso de medicamentos, retorno

cirurgia, ocorrncia de qualquer complicao ps-operatria e intubao/reintubao) e

quinze rastreadores no foram identificados (CARNEVALI et al., 2013). Outros

autores tambm ressaltaram a grande variao do VPP entre os rastreadores

(FRANKLIN et al., 2010; NAESSENS et al., 2010 e HWANG et al., 2014).

47

Em um estudo, a maioria dos rastreadores apresentou VPP inferior a 5%. Os

autores enfatizaram o fato de 9 rastreadores terem sido responsveis pela identificao

de 94,4% dos EAM encontrados. Assim, os autores sugerem que a elaborao de uma

lista mais enxuta pode contribuir para aumentar a aplicabilidade do mtodo s unidades

ambulatoriais (SINGH et al., 2009).

Outro estudo calculou o valor preditivo positivo global (VPP) desta ferramenta

utilizando a lista de rastreadores proposta pelo Institute for Healthcare Improvement

(IHI), obtendo VPP de 40,1%. Este estudo tambm mensurou a mdia de tempo para

concluir a avaliao da identificao de determinado rastreador que foi de 8,8 minutos

(dp=5,7). Os autores puderam ento concluir que o uso desta ferramenta mostrou-se

eficaz e eficiente na deteco de possveis EAM (MARCUM et al., 2013).

Principais Vantagens e Limitaes do mtodo

Uma importante vantagem do mtodo se deve ao fato de no exigir recursos

exorbitantes (RESAR et al., 2003 e ROZENFELD et al., 2010) e permitir a realizao

de estudos em tempo reduzido ao se utilizar uma amostra representativa de pronturios

(ROZENFELD et al., 2010). A facilidade da aplicao do mtodo foi ressaltada por

vrios autores (RESAR et al., 2003; ROZICH et al., 2003 e SCHILDMEIJER et al.,

2013).

O mtodo dos rastreadores funciona bem para a identificao de eventos adversos a

medicamentos, sua adaptabilidade a diversas especialidades apontada por vrios

autores como uma de suas principais fortalezas (RESAR et al., 2003 e SCHILDMEIJER

et al., 2013).

Algumas limitaes descritas para o mtodo so a ausncia de um padro ouro

(ROZICH et al., 2003 e GRIFFIN e RESAR, 2009) e a variao de resposta entre os

avaliadores prejudicando a comparao entre diferentes estudos que utilizam estes

marcadores na identificao de EA (ROZICH et al., 2003 e SCHILDMEIJER et al.,

2013). Para reduzir esta subjetividade na avaliao dos registros pelos profissionais o

IHI sugere que a anlise dos eventos adversos deva seguir algumas regras. A equipe de

avaliao deve constituir de, no mnimo, trs profissionais. Dois revisores (por exemplo,

mdicos, enfermeiros e farmacuticos) que analisam o pronturio em duplicata, de

forma independente e um mdico que no analisa os registros, mas autentica o consenso

dos dois revisores primrios do registro. Durante a reviso, o mdico deve estar

48

disponvel para responder as dvidas que possam surgir (GRIFFIN e RESAR, 2009). Os

analistas devem ter conhecimento e experincia clnica e precisam ser treinados na

aplicao do mtodo (MATLOW et al., 2005 e SCHILDMEIJER et al., 2013). Alm

disso, a equipe de reviso deve se reunir pelo menos uma vez ao ms para tratar e

resolver as variaes (GRIFFIN e RESAR, 2009).

Ainda so necessrias medidas para aperfeioar o mtodo dos rastreadores visando

reduzir os falsos positivos e aumentar a sensibilidade do mtodo (FRANKIN et al.,

2010). evidente a necessidade da realizao de outros estudos que busquem uma

padronizao do mtodo visando garantir maior reprodutibilidade na sua aplicao

permitindo comparaes mais efetivas entre diferentes estudos (SCHILDMEIJER et al.,

2013).

Outro problema do mtodo dos rastreadores que tambm foi relatado a baixa

reprodutibilidade da avaliao de EAM por diferentes especialistas. Este fato aponta

para a necessidade de treinamento para minimizar este problema (SCHILDMEIJER et

al., 2013).

Algumas mudanas metodolgicas aliadas a um maior conhecimento por parte dos

especialistas e a adaptao da ferramenta identificao de dano segundo a tica dos

usurios podem contribuir para aumentar substancialmente as potencialidades da

ferramenta. A possibilidade de aplicar o mtodo dos rastreadores para a anlise de risco

em grupos especficos de pacientes interessante. O fato de alguns rastreadores serem

imprecisos e outros pouco usados foram apontados como fraquezas do mtodo

(SCHILDMEIJER et al., 2013).

Embora no seja especfica do mtodo, a disponibilidade e a qualidade da

documentao em sade foram apontadas como desafios para a aplicao do mtodo

(MULL et al., 2008; ROZENFELD et al., 2010 e SCHILDMEIJER et al., 2013).

Os resultados permitem considerar que a adaptao da lista de rastreadores, a

determinao dos marcadores mais sensveis atravs do clculo do valor preditivo

positivo (VPP) ou rendimento e a discusso sobre a utilizao de sistemas

informatizados para o monitoramento de eventos adversos so aspectos importantes a

serem considerados para o sucesso da incorporao do mtodo dos rastreadores em

servios de sade.

49

Mesmo com as limitaes citadas no tpico anterior a utilizao do mtodo dos

rastreadores mostrou-se uma importante estratgia para o monitoramento ativo de

eventos adversos, apresentando-se inclusive mais eficaz do que a notificao voluntria.

Sendo assim, o uso de sinalizadores de eventos adversos pode contribuir de forma

expressiva para promoo do uso racional de medicamentos e da segurana do paciente

por permitir a identificao dos danos e o acompanhamento do resultado da implantao

de mudanas direcionadas reduo da incidncia de eventos adversos podendo

proporcionar uma melhoria da qualidade da assistncia prestada ao paciente.

Conforme observado, todos os mtodos de monitoramento de eventos adversos

apresentam pontos positivos e negativos, sendo assim, o ideal explorar as vantagens

de cada um para criao de um ambiente hospitalar e ambulatorial seguro. Dessa forma,

todos os mtodos se bem aplicados podem contribuir para o monitoramento de eventos

adversos a medicamentos e a utilizao de mais de um mtodo pode ser necessria para

incorporao de segurana no campo da utilizao de medicamentos em hospitais.

50

3. OBJETIVOS

3.1 Objetivo Geral

Comparar a utilidade do uso da vitamina K como rastreador de eventos adversos

hemorrgicos em dois centros hospitalares (Hospital Geral x Hospital Especializado em

Cardiologia) que atendem pacientes do SUS.

3.2 Objetivos especficos

Comparar o mtodo dos rastreadores com a notificao espontnea na

identificao de eventos adversos hemorrgicos;

Identificar e classificar os possveis sangramentos causados por varfarina quanto

ao grau de dano e causalidade;

Avaliar se a Razo Normatizada Internacional (RNI) esteve associada com

evento adverso hemorrgico por varfarina.

51

4. METODOLOGIA

4.1 Cenrio do estudo

Trata-se de um estudo comparativo realizado em dois locais distintos. A busca

ativa ocorreu em um Hospital Especializado em cardiologia (Hospital E) e em um

Hospital Geral e de Emergncia (Hospital G).

4.1.1 Hospital Geral e de Emergncia

O Hospital Geral de Emergncia localizado na cidade do Maca no estado do Rio

de Janeiro com 154 leitos ativos exclusivos do SUS. A unidade o principal hospital de

urgncia e emergncia que atende a ocorrncias clnico-cirrgicas provenientes do

municpio de Maca e regies adjacentes.

A instituio possui sistema eletrnico que permite a obteno de relatrios sobre a

sada de medicamentos por paciente e ou setor, mas no apresenta sistema eletrnico de

prescrio e exames laboratoriais e nem ferramenta de suporte deciso clnica. O

hospital no apresenta qualquer atividade de gerenciamento de risco e

farmacovigilncia.

O sistema MV2000i constitui o sistema informatizado da instituio. Este sistema

foi utilizado para obteno da relao dos pacientes que fizeram uso de Vitamina K no

perodo do estudo.

4.1.2 Hospital Especializado em Cardiologia

O Instituto Nacional de Cardiologia (INC) uma unidade hospitalar de

referncia e alta complexidade em cardiologia com 206 leitos ativos exclusivos do SUS.

A unidade hospitalar pertence ao Ministrio da Sade e se restringe ao atendimento de

mdia e alta complexidade em cardiologia, incluindo transplante cardaco. O hospital

atende principalmente pacientes de todo estado do Rio de Janeiro, mas tambm recebe

demanda de pacientes de outros estados como Minas Gerais e Esprito Santo.

A instituio faz parte da rede de hospitais sentinelas da ANVISA. A Gerncia de

Risco responsvel por receber as notificaes do hospital e enviar para o setor

responsvel para anlise e providncias.

52

A farmacovigilncia de responsabilidade da Farmcia hospitalar tendo a funo

de receber e analisar as notificaes voluntrias.

O sistema MV2000i constitui o sistema informatizado do Instituto Nacional de

Cardiologia. Este sistema foi utilizado para obteno da relao dos pacientes que

fizeram uso de Vitamina K no perodo do estudo e tambm para consulta de prescries

e exames laboratoriais.

4.2 Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo transvers