AZULEJO COMO SUPORTE DO DESIGN GRÁFICO

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CENTRO UNIVERSITRIO FEEVALE

VANESSA ZORGI

AZULEJO COMO SUPORTE DO DESIGN GRFICO

Novo Hamburgo, dezembro de 2008.

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VANESSA ZORGI

AZULEJO COMO SUPORTE DO DESIGN GRFICO

Centro Universitrio Feevale Instituto de Cincias Exatas e Tecnolgicas Curso de Design Habilitao em Design Grfico

Professor orientador: Maria do Carmo Gonalves Curtis

Novo Hamburgo, dezembro de 2008.

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Agradeo aos meus queridos pais Telmo Guilherme e Maria do Carmo Zorgi pelo apoio, carinho e confiana nas minhas escolhas. A orientadora Maria do Carmo pelo auxlio e dedicao. Agradeo a Deus por estar sempre presente espiritualmente e em especial aos meus amigos e ao meu namorado Lorenzo, que estiveram presentes de corao.

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RESUMO

Este trabalho apresenta a proposta do desenvolvimento de uma linha de azulejos com uso de tecnologia avanada tendo em vista uma demanda do mercado atual. Esta linha fundamenta-se em tendncias artsticas e tem como pblico alvo decoradores de interiores. Para realizar nossa proposta, inicialmente estudamos a histria do azulejo, em seu contexto geral e no Brasil, bem como seu processo de manufatura. A esttica visual de bases artsticas que influenciaram o design desde o sculo XIX at a atualidade a inspirao para nossa criao, por isso pesquisamos suas principais caractersticas plsticas e dados histricos relevantes, a fim de obter um entendimento abrangente do tema. As imagens inseridas no trabalho auxiliam na compreenso terica e destacam a principal caracterstica que contribui ao azulejo ser um produto indicado para o desenvolvimento do projeto em design de grfico: seu apelo esttico. Na continuidade da proposta do projeto desenvolvemos uma pesquisa de campo. A definio do pblico alvo, e enfim a criao de duas linhas de azulejos: Linha Nature, voltada influncia ornamental do Art Nouveau, e a Linha Shape, concebida a partir do estilo minimalista e do conceito Bauhaus. O design grfico e o design de superfcie esto interligados neste trabalho. Palavras chave: design grfico, design de superfcie, azulejo, criao.

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ABSTRACT

This work presents the proposal for the development of a line of tiles seeking a demand of the current market when doing use of advanced technology. This line is based in artistic tendencies and has as target public interior decorators. To achieve our proposal, initially we have studied the history of tiles, in its overall context and Brazil, as well as your manufacturing process. The visual aesthetics of artistic bases that influenced the design since the XIX century to present is the inspiration for our creation, for that we researched their main plastic characteristics and relevant historical data, in order to obtain an including understanding of the theme. The images inserted in the work are present to assist the theoretical understanding and also to highlight the main characteristic that contributed to the tile to be a suitable product for the surface design: its aesthetic appeal. In the continuity of the proposal of the project we developed a field research. The definition of the target audience, and finally the creation of two lines of tiles: Nature Line, returned Art Nouveau's ornamental influence, and the Shape Line, designed from the minimalist style and the Bauhaus concept. The graphic design and the surface design are interlinked in this work. Key-words: graphic design, surface design, tile, creation.

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SUMRIO

NDICE DE IMAGENS................................................................................................ 8 INTRODUO ......................................................................................................... 11 1 DESIGN............................................................................................................. 14 1.1 1.2 2 Design Grfico............................................................................................ 16 Design de Superfcie .................................................................................. 18

O AZULEJO ...................................................................................................... 22 2.1 2.2 2.3 2.4 A Histria do Azulejo .................................................................................. 24 O Azulejo em Portugal ............................................................................... 31 O Azulejo no Brasil..................................................................................... 35 A Manufatura do Azulejo ............................................................................ 48

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BASES PARA A CRIAO ESTTICO-VISUAL............................................. 59 3.1 3.2 Art Nouveau ............................................................................................... 60 Bauhaus ..................................................................................................... 65

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PESQUISA DE CAMPO.................................................................................... 71 4.1 4.2 4.3 Pblico Alvo................................................................................................ 73 Anlise de Dados ....................................................................................... 76 O Mercado do Setor Cermico................................................................... 79

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AZULEJO COMO SUPORTE DO DESIGN GRFICO..................................... 83

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5.1 5.2 5.3

A Inspirao ............................................................................................... 85 Cores.......................................................................................................... 87 Composio das Linhas ............................................................................. 89 Linha Nature........................................................................................ 90 Linha Shape ........................................................................................ 93

5.3.1. 5.3.2. 6 7

CONSIDERAES FINAIS .............................................................................. 97 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ............................................................... 100

ANEXO 1................................................................................................................ 103 ANEXO 2................................................................................................................ 105 ANEXO 3................................................................................................................ 108 ANEXO 4................................................................................................................ 111 ANEXO 5................................................................................................................ 119

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NDICE DE IMAGENS

Figura 1. Porcelanas Vista Alegre Tom Brasil 2004. ................................................ 19 Figura 2. Exemplo de revestimento com azulejos. ................................................... 23 Figura 3. Placa cermica persa de lustre ................................................................. 26 Figura 4. Azulejo islmico datado em 1575 .............................................................. 26 Figura 5. Azulejo espanhol decorado com a tcnica de aresta ................................ 27 Figura 6. Azulejos holandeses de figura avulsa, 1520 ............................................. 27 Figura 7. Azulejo de decalque. Impresso por Sadler e Green .................................. 28 Figura 8. Azulejo de decalque. Impresso por Sadler e Green .................................. 28 Figura 9. Revestimento geomtrico do pavimento da igreja de St. Leonard ............ 29 Figura 10. Azulejos revelados com vidrado de mailica opacos. ............................. 29 Figura 11. Azulejo em estilo Art Dec. Executado em 1925..................................... 30 Figura 12. Paredes revestidas de azulejos, estao de metro da Bond Street ........ 31 Figura 13. Painel de azulejos decorativos azuis e brancos ...................................... 33 Figura 14. Canal revestido de azulejos..................................................................... 34 Figura 15. Azulejo portugus de 13 x 13 cm e mdulo 4 x 4 cm .............................. 36 Figura 16. Azulejo portugus de influncia holandesa de 13,5 x 13,5 cm ................ 37 Figura 17. Azulejo portugus em Recife de 14 x 14 cm ........................................... 38 Figura 18. Azulejo em Pernambuco com influncia art nouveau.............................. 39 Figura 19. Azulejo francs em Olinda de 11 x 11 cm ............................................... 40 Figura 20. Azulejo francs em Recife de 11 x 11 cm................................................ 40 Figura 21. Azulejo portugus de 13,5 x 13,5 cm assentado de quina ...................... 41 Figura 22. Azulejo portugus com padro exclusivo de 14 x 14 cm ......................... 42 Figura 23. nico padro de azulejo ingls remanescente de 15 x 15 cm................. 42

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Figura 24. Azulejo portugus de 13,5 x 13,5 cm ...................................................... 43 Figura 25. Azulejo portugus de 13,5 x 13,5 ............................................................ 44 Figura 26. Azulejo portugus de 14 x 14 cm ............................................................ 44 Figura 27. Azulejo ingls de 15 x 15 cm em Recife.................................................. 45 Figura 28. Azulejo portugus de 13,5 cm em Recife ................................................ 45 Figura 29. Azulejos franceses de 11,5 x 11,5 cm ..................................................... 45 Figura 30. Azulejos franceses de 11 x 11 cm ........................................................... 45 Figura 31. Exemplo de mufla pequena ..................................................................... 48 Figura 32. Exemplos da diferenciao de cores de acordo com material utilizado. . 49 Figura 33. Exemplo de prateleiras dentro de uma mufla .......................................... 50 Figura 34. Famoso azulejo executado na abadia de Chertsey................................. 50 Figura 35. O processo do vidrado de estanho.......................................................... 51 Figura 36. Um dos azulejos decorados com a tcnica do esgrafito.......................... 53 Figura 37. Azulejo francs de faiana....................................................................... 55 Figura 38. Azulejo em corda seca, grande raridade datado do sculo XVI .............. 56 Figura 39. Alfons-Maria Much: Cartaz para mortalha de cigarros Job, 1898 ......... 60 Figura 40. Victor Horta: Balastre da escada da casa Solvay, 1894-9..................... 61 Figura 41. Eugne Gaillard, pedestal para J. P, 1901 .............................................. 63 Figura 42. Candeeiro MT9/ME1, 1923...................................................................... 65 Figura 43. Joseph Albers, Homenagem ao quadrado, 1964 .................................... 66 Figura 44. Cartaz de Joost Schmidt para a Exposio Bauhaus de 1923 ................ 67 Figura 45. O escritrio de Walter Gropius, 1923 ...................................................... 68 Figura 46. Elementos idnticos sobre o fundo preto e branco, 1922........................ 69 Figura 47. Painel semntico do perfil do pblico alvo............................................... 74 Figura 48. Painel de inspirao Art Nouveau. .......................................................... 86 Figura 49. Painel de inspirao conceito Bauhaus e estilo minimalista.................... 87 Figura 50. Paleta de cores da Linha Nature. ............................................................ 88 Figura 51. Paleta de cores da Linha Shape.............................................................. 88 Figura 52. Composio de cinco peas da linha Nature........................................... 89 Figura 53. Composio de cinco peas da linha Shape. .......................................... 89 Figura 54. Mtodo de encaixe localizado. ................................................................ 90 Figura 55. Mtodo de encaixe localizado. ................................................................ 91 Figura 56. Mtodo de encaixe localizado. ................................................................ 91 Figura 57. Mtodo de encaixe localizado. ................................................................ 92

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Figura 58. Mtodo de encaixe. ................................................................................. 92 Figura 59. Mtodo de encaixe por desenho avulso. ................................................. 93 Figura 60. Mtodo de encaixe. ................................................................................. 94 Figura 61. Mtodo de encaixe. ................................................................................. 94 Figura 62. Mtodo de encaixe por desenho avulso. ................................................. 95 Figura 63. Mtodo de encaixe. ................................................................................. 95 Figura 64. Mtodo de encaixe por desenho avulso. ................................................. 96

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INTRODUO

O azulejo, desde o seu surgimento histrico, apresenta composies visuais e padronagens grficas interessantes. Vale mencionar que o produto reflete sua poca ao constituir importante aspecto da cultura material do pas que o originou. Porm, atualmente, o design de superfcie deste produto precisa ser reestruturado a fim de adequ-lo ao gosto esttico contemporneo, e com esta hiptese de trabalho iniciamos nossa pesquisa. Deste modo elegemos o azulejo como foco de interesse para o desenvolvimento de projeto na rea do design grfico, em que este produto ser o suporte de criao esttico-visual, portanto, design de superfcie tambm contemplado no presente trabalho. Metodologicamente, buscamos desenvolver o projeto numa primeira etapa a partir de pesquisa bibliogrfica especializada no tema e de conhecimentos adquiridos no curso de Design que somadas nos possibilitam desenvolver projeto na rea de design grfico. Focamos nosso pblico alvo nos decoradores de interiores, os quais demandam um atendimento personalizado para atender a especialidade de seus clientes, cujo poder aquisitivo superior a mdia de populao. Iniciamos a pesquisa estudando a histria do azulejo, suas representaes em nosso pas, meios de manufatura e tcnicas. Para embasarmos a criao esttico-visual, pesquisamos caractersticas plsticas de influncias artsticas que permanecem influenciando o design contemporneo.

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Destacamos que o processo da decorao visual do azulejo sempre teve um carter artstico, ao ser realizado nas tcnicas de serigrafia, decalque ou pintura. No entanto, com a insero de inovao tecnolgica nesta atividade possvel desenvolver projetos de design de superfcie, de acordo com o ambiente que o azulejo se insere, com maior liberdade criativa. Especificamente, esta tecnologia consiste na mquina denominada Vutek EFI. Esta tecnologia de impresso digital possibilita aplicar a imagem em qualquer rea que possua at 4 cm de altura e executar a impresso atravs de diferentes materiais como cermica, vidro, madeira, couro e plstico. A rea de design de interiores constitui um campo propcio ao designer, pois, enquanto profissional capacitado para desenvolver projetos, tem uma formao de concilia aspectos tcnicos e estticos. A hiptese de que o design de superfcie do azulejo necessita ser reestruturado, justifica a relevncia de nossa pesquisa, pois visamos alinhar o produto com os valores grfico-plsticos que definem a esttica contempornea. O designer um profissional capacitado para desenvolver projetos na rea da decorao de interiores. Deste modo, nossa proposta atual, inovadora, de acordo com os valores que definem nosso tempo. O primeiro captulo deste trabalho trata sobre design grfico e design de superfcie, visando aprofundar nossa compreenso acerca da importncia do profissional no setor produtivo. O captulo sobre azulejo apresenta o contexto histrico, em que inicialmente abordamos o tema num vis mais abrangente desde suas origens. Logo, buscamos estudar o azulejo em Portugal tendo em vista que o produto se insere no Brasil tambm em virtude da colonizao portuguesa. Decidimos mant-lo na ntegra pois a bibliografia sobre o tema escassa. No terceiro captulo abordamos as bases para criao esttico-visual com o propsito de aprofundarmos o conhecimento em tendncias artsticas que pontuaram o design grfico moderno. Alm disso, buscamos tambm indicar as repercusses que cada uma destas tendncias acarretaram no cenrio brasileiro.

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O quarto captulo constitudo da descrio de etapa de coleta dos dados, gerando assim a anlise dos dados e os grficos referentes ao questionrio. O pblico alvo definido com maior amplitude, descrevendo-o e elaborando suas caractersticas. O mercado tambm contemplado uma vez que nosso pas um grande consumidor e gerador de peas cermicas. No quinto captulo iniciamos a criao do azulejo como suporte do design grfico, justificando as criaes das linhas, suas influncias, composies e cores.

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DESIGN

[...] Num mercado onde a concorrncia cada vez mais forte e competitiva conseqncia da produo em srie e da inexistncia de diferenciao dos produtos, preciso fazer mais. Acredito que o design ser um fator decisivo no novo cenrio globalizado, e atravs dele, poderemos agregar valor, desencadeando um processo de estmulos visuais, que iro personalizar um produto ou uma empresa (RUBIM, 2004, p. 11).

Entre as diversas funes que o designer pode desenvolver escolhemos a sua interveno na criao visual sobre a superfcie do azulejo. Iniciaremos o trabalho resgatando a origem do design como profisso e em especial a rea do design grfico, a fim de melhor compreender a importncia e as funes atribudas ao designer. Para que possamos entender nossa profisso na atualidade, nos reportamos s origens histricas do design a fim de refletir sobre seu surgimento. Alguns entendem por design o planejamento formal e construtivo para qualquer tipo de produo em srie, com sua origem na Roma Antiga. Outros consideram design como uma atividade eminentemente moderna, exclusiva do sculo XX. Ainda temos a viso histrica de um grupo dos Estados Unidos que afirma que a profisso s deslanchou como uma estratgia mercadolgica para enfrentar a queda nas vendas resultante da Grande Depresso de 1930. (CARDOSO, 1996) Em relao ao possvel surgimento do design Rafael Cardoso na revista Estudos em Design, n2, volume IV, nos fala que se buscam as origens desta atividade na Roma Antiga, com as suas louas aretinas e suas armas padronizadas; ou, ento, na volumosa fabricao de azulejos praticamente idnticos da Europa

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Medieval; ou, at mesmo, no uso inaugural da prensa tipogrfica. Podemos entender que o design estaria totalmente ligado produo em srie, mesmo antes da Revoluo Industrial.[...] Na verdade, tanto faz se a primeira pessoa a ser considerada designer foi Dresser, Raymond Loewy, Peter Behrens ou algum mestre ceramista romano. muito mais relevante tentar compreender o contexto social e cultural que deu origem ao design, a fim de desvendar o significado e a funo desta atividade no mundo de hoje. Apesar da importncia do design entre as novas profisses surgidas com a industrializao, ainda no existe um anlise clara e consolidada do fenmeno do surgimento do designer como profissional. (DENIS, 1996, p. 59)

relevante ressaltar que o designer se insere no setor produtivo para suprir uma necessidade criada a partir da Revoluo Industrial, ou seja, em meados do sculo XVIII. Mas o desenvolvimento industrial um fenmeno que apresenta variaes, conforme o processo de cada nao. Ocorre em diferentes momentos para cada pas, uma vez que a industrializao no foi inserida no mundo inteiro no mesmo momento, portanto, a necessidade do profissional de design, tambm acompanha este processo.A figura do designer comea a aparecer com freqncia no universo profissional de determinada sociedade a partir do momento que esta inicia um processo de industrializao; ou seja, o designer profissional um produto da diviso total entre tarefas de planejamento e execuo que, apesar de ter existido de modo extraordinrio em diversas pocas e circunstncias, tem se tornado normativa apenas dentro do contexto do capitalismo industrial. (DENIS, 1996, p. 68)

O tempo passou e o design ampliou sua atuao profissional e hoje ganha maior evidncia no mercado. No Brasil, a profisso tem alcanado cada vez mais espao no setor produtivo contribuindo para destacar a produo nacional no novo cenrio globalizado. Segundo Renata Rubim, atravs da insero do design na indstria brasileira que poderemos agregar valor, desencadeando um processo de estmulos visuais, que iro personalizar um produto ou uma empresa. Marco (Belovo,2008:27), em entrevista a revista poca expe a importncia do design como estratgia de competio entre empresas, frisando que este fator tende a aumentar. Acredito que o futuro do design est na simplicidade. Ser simples muito diferente do que ser simplrio. A simplicidade tem que ter um sentido, ser funcional. A utilidade no pode ficar em segundo plano em nome da beleza.

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A seguir apresentamos o tema design grfico, afim de compreender as caractersticas do profissional e suas possibilidades no mercado.

1.1 Design Grfico

No livro O Valor do Design consta que de acordo com Associao dos Designers Grficos do Brasil O design grfico um processo tcnico e criativo que utiliza imagens e textos para comunicar mensagens, idias e conceitos, com objetivos comerciais ou de fundo social. Conforme o trecho descrito pela Associao dos Designers Grficos do Brasil o designer necessita, mais do que nunca, estar aparelhado para encarar as rpidas mudanas que se processam em ritmo acelerado no seu campo de atuao. O profissional da rea de design grfico est apto entre suas funes a desenvolver juntamente com o designer de produto solues adequadas para determinado produto. A interface visual que os produtos necessitam uma das funes do designer grfico. A relao existente entre os fatores visuais e os estticos, contribuir no produto a fim de facilitar a vida do ser humano ou simplesmente favorecer em seu aspecto visual. Para Alexandre (Wollner, 2004:89), os fundamentos do design existem desde a Idade Mdia. Embora ainda no intitulasse assim, j naquela poca havia a preocupao de fazer objetos para comunicar e atingir o homem com mensagens visuais. A necessidade do design evidencia-se na Revoluo Industrial, como citado acima, quando se altera a estrutura do modo de produo. O design ganha o significado atual a partir da Segunda Guerra Mundial. Diante desta sntese histrica podemos inferir que houve mudanas na estrutura do setor produtivo e que gerou a necessidade da indstria segmentar-se em duas reas: design de produto e design grfico.

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A fim de inserirmos neste item uma definio do design grfico, citamos Jorge Frascara (1996), que concebe a funo do designer grfico como atividade, ou seja, a ao de conceber, programar, projetar e realizar comunicao visual, produzida em geral por indstrias e destinadas a transmitir mensagens especficas a grupos determinados. O designer produz para um pblico amplo. Tem um talento de ordem intuitiva, que complementa suas habilidades com tecnologia e cincia, pois deve alcanar o equilbrio entre a intuio e a tcnica. No pode ser tcnico ao ponto de virar engenheiro, nem ser s intuitivo para no ser taxado de artista. Ele integra aptides destas reas agregadas a sua capacidade de comunicao para com o cliente e expor da melhor maneira o conceito de seu trabalho, a fim de justificar determinadas escolhas e caminhos (WOLLNER, 2004: 20). Na ltima dcada, o designer grfico ainda esteve bastante atrelado as transformaes tecnolgicas digitais e seus efeitos no ponto de vista formal, assim como havia ocorrido na segunda metade da dcada de 1980, quando essas transformaes foram introduzidas.[...]As recentes possibilidades da tecnologia digital permitiram que o designer se aproximasse muito mais de todas as etapas de trabalho. Desta forma ele domina mais integralmente o projeto, permitindo tomar decises desde o incio, j visualizando a soluo de problemas tcnicos que podero surgir no final do processo. No o manejo de programas grficos mais atualizados que ir conferir qualidade a um trabalho, mas sim as idias do designer, que constituem a cerne do projeto e em decorrncia das quais se desenrola este processo. (WOLLNER , 2004, p. 22)

A importncia do profissional da rea est justamente neste diferencial que pode exercer em sua atuao no setor produtivo. O designer conta com um amplo universo de possibilidade para desenvolver seu trabalho. Criaes sadas da prancheta e da tela do computador podem resultar tanto num pequeno rtulo, embalagem ou cardpio, quanto numa assinatura visual ou um enorme banner de exposio. O limite est alm das atribuies dadas a esta rea. O leque de opes no campo profissional to grande e variado que o designer inicialmente tem a oportunidade de experimentar diferentes caminhos at encontrar a melhor maneira de empregar seu talento e capacidade.

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No contexto deste trabalho importa salientar que o designer grfico est diretamente ligado ao design de superfcie. Antropologicamente falando a primeira expresso grfica, possivelmente, deu-se sobre uma pedra. O designer grfico no pode prescindir da superfcie, uma vez que a mesma pode influenciar na qualidade do produto final. Uma assinatura visual, por exemplo, concebida para ser visualizada na superfcie do papel. Deve se cogitar o comportamento da cor da assinatura visual perante o papel branco e o papel reciclado. A superfcie pode alterar a percepo visual do projeto. Este exemplo simples serve para evidenciarmos a importncia do conhecimento amplo que o profissional deve possuir no desenvolvimento de um projeto. Por isso preciso considerar a superfcie a qual o design grfico ser aplicado, ou seja, tratar a superfcie enquanto varivel projetual, a fim de entend-la a partir de suas limitaes e vantagens em relao ao produto em questo. Dentre as atribuies do designer, destaca-se a necessidade de conhecer muito bem todas as implicaes tcnico/estticas referentes ao produto em desenvolvimento, dominar tcnicas e saber aplic-las de acordo com seus objetivos. Deste modo a profisso de designer grfico comprova sua importncia porque sua formao alia conhecimentos de natureza tcnico/cientfica em a sensibilidade esttica, contribuindo para uma qualificao interdisciplinar. Portanto possvel afirmar que o designer tem o poder de agente transformador da cultura material.

1.2 Design de Superfcie

Dentre as mltiplas atuaes do design grfico, escolhemos o design de superfcie para desenvolvimento de nossa pesquisa. E diante das suas diversas aplicaes possveis, optamos pelo azulejo como suporte do design grfico pela riqueza de sua histria e as inmeras possibilidades criativas que suscita nos aspectos tcnicos e estticos. Esta arte permeia o objeto de estudo do nosso

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trabalho, e seu conceito ser valioso para nossa proposta final na segunda etapa do Trabalho de Concluso. Design de Superfcie todo projeto de tratamento dado a uma superfcie, seja ela contnua ou no. O termo tem origem do ingls Surface Design, porm no Brasil mais usual o termo Design de Estamparia, o que restringe seu significado impresso sobre tecidos. Segundo RUBIM (2004: 21), Design de Superfcie todo projeto elaborado por um designer, no que diz respeito ao tratamento dado a uma superfcie, industrial, ou no [...] oriundo de um processo criativo, original e nico. Considerando-se esta afirmao, podemos inferir que design de superfcie diferencia-se da arte medida que um projeto executado por um profissional do design e visa, a priori, um objetivo de carter funcional, como por exemplo, desenvolver a estamparia de uma toalha de mesa, um papel de parede, uma superfcie cermica.

Figura 1. Porcelanas Vista Alegre Tom Brasil 2004. (Fonte: Desenhando a Superfcie, p. 76).

As aplicaes possveis do design de superfcie so inmeras. As mais comuns incidem no setor txtil, cermico, porcelana, plstico e papel. Existem outras superfcies que podem receber aplicao atravs de projetos interessantes, tais como vidro e emborrachados, pois estes materiais ainda no foram suficientemente explorados.

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O design de superfcie no segmento da rea de cermica requer uma formao especfica do designer. H muitas indstrias neste setor no Brasil, que vo desde as de grande porte at as micro-empresas. A tecnologia utilizada pelas indstrias de cermica est em constante modificao o que exige do designer um aperfeioamento contnuo sem o qual fica difcil desenvolver o trabalho de maneira a alcanar as metas do cliente/projeto. Na arquitetura moderna, Le Corbusier preconizou o emprego dos azulejos que, alm do seu carter funcional de proteo contra a excessiva umidade do clima, possibilita expresso plstica, ou seja, riqueza formal e decorativa. Depois de Portinari, vrios outros artistas brasileiros trabalharam no campo da azulejaria integrada arquitetura. Como Burle Marx, Djanira, Poty, Carib, Udo Knof, Antnio Maluf e Athos Bulco. Para a execuo deste trabalho usaremos conhecimentos que foram agregados no curso de design grfico e que sero adaptados ao design de superfcie, como, por exemplo, a composio. O design de superfcie pressupe distribuir os motivos de maneira controlada e harmnica. Devemos considerar para que fim estamos criando e seu pblico-alvo. O conhecimento tcnico ser fundamental para a criao da linha de azulejos, uma vez que iremos fazer uso de tecnologia inovadora. O designer em todos seus projetos deve ter conhecimento sobre as tcnicas e processos (industriais) que podero ser usados na fabricao do produto que est projetando (estamparia, serigrafia, matrizaria, tecelagem) e materiais para controlar os efeitos visuais desejados. O conceito de "repetio", no contexto de design de superfcie, a organizao dos elementos formais contidos no desenho em unidades ou mdulos, que se repetem os intervalos constantes de acordo com um sistema determinado, gerando um padro. um pr-requisito importante ao designer de superfcie a compreenso da repetio tanto como recurso tcnico como possibilidade expressiva, pois muitas vezes na repetio do mdulo surgem diferenas visuais inesperadas, mas interessantes, provocando um dilogo com o seu criador.

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A repetio que fundamental em um painel de azulejos e tambm uma exigncia da maioria dos processos industriais mecnicos e automatizados para produo em grande escala. Esta condio est sendo liberada pela introduo de novos processos produtivos com base na tecnologia digital. O designer que faz uso de padres contnuos precisa ter o domnio sobre os efeitos causados na composio pela repetio, alm dos elementos conhecidos da linguagem visual como o ponto, a linha, a forma, textura, cor, direo, etc. que compem seu projeto. Deste modo, no mbito do design de superfcie, considera-se o azulejo como uma referncia vlida para desenvolver o projeto, a qual corresponda a uma aplicao prtica resultante de pesquisa e comprovao da hiptese inicial apresentada neste trabalho.

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O AZULEJO

O azulejo foi escolhido como suporte para aplicao do design grfico em virtude da sua relevncia histrica e sua funcionalidade enquanto produto. Tanto no passado, quanto no presente a sua funcionalidade no perdeu valor. Seu visual apresenta caractersticas de culturas diferentes. Vamos compreender a histria deste artefato para que assim, possamos intervir em seu aspecto visual de acordo com a necessidade dos dias atuais. Desde milhares de anos, os azulejos tm sido usados como um elemento para decorao de superfcie na arquitetura externa e no interior de ambientes. Alm de decorativos os azulejos so muito resistentes, bastante durveis, impermeveis e antitrmicos qualidades que os tornam uma escolha natural para pavimentos, coberturas, lareiras, cozinhas e casas de banho. Na poca medieval, eram usados azulejos admiravelmente ornamentados e coloridos para criar padres decorativos em fontes e ptios do Oriente. No mundo ocidental na atualidade, podemos ver com freqncia azulejos em edifcios pblicos, restaurantes, lojas, hospitais e piscinas, lugares onde se revelarem prticos e higinicos.

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Figura 2. Exemplo de revestimento com azulejos. (Fonte: www.decori.com.br).

Essas atribuies decorativas e utilitrias mantm o azulejo ainda muito atual e contribuem para constitu-lo enquanto superfcie para futura criao em design grfico. O azulejo alm de ter uma presena muito significativa nas civilizaes, apresenta sua superfcie em branco, o que suscita nossa criatividade e acaba gerando uma superfcie sempre rica em apelo esttico, no sentido de constituir um convite a nossa imaginao para preench-la e embelez-la, enfim, decor-la. Durante sculos, os azulejos tm sido dispostos em padres geomtricos, variando entre solues grficas coloridas e monocromticas. Frequentemente tem sido decorados por artistas, que, desse modo, lhes conferem uma outra dimenso, transformando um quadrado funcional num objeto de beleza singular, devido ao tratamento visual em sua superfcie. Existem algumas controvrsias perante o surgimento da palavra azulejo. Alguns autores citam que sua origem decorre da palavra rabe al zuleyche. Outros tambm acreditam que o termo rabe, mas se origina do vocbulo al zulaicha ou zulija, que significa "pequena pedra polida (Revista Nossa Histria - Ano 03 - N. 29, Editora Vera Cuz - Maro/2006). Na lngua portuguesa designa ladrilho de loua vidrado, branco ou colorido, com ou sem motivos, desenhado ou em relevo, empregado na arquitetura para revestimento de paredes. Embora no haja consenso, tambm se atribui a origem da palavra cor azul.

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2.1 A Histria do Azulejo

A histria do azulejo recua ao nascimento da prpria civilizao. Com efeito, em perodo to remoto como o 4 milnio a.C. j os egpcios decoravam as suas casas com tijolos vidrados de azul. Por volta do sculo XIV a.C. desenvolveu-se a tcnica de manufatura de azulejo que associava diferentes barros coloridos. O barro era o material natural utilizado em construes em forma de azulejo. Estes eram secos ao Sol ou cozidos em uma mufla1 e era o revestimento ideal para os telhados deixando os edifcios frescos em dias quentes e proporcionando um bom isolamento aps o pr do Sol. Originalmente, os azulejos eram castanhos ou vermelho-acastanhados, a cor da prpria terra. A partir do momento que passaram a ser vidrados e decorados em decorrncia evoluo tcnica desenvolvida dos oleiros eles foram dispostos de forma mais elaborada em padres concntricos e decorativos. No ano de 1449 a.C. os Egpcios usavam preferencialmente azulejos de chacota2 arenosa com uma superfcie vidrada tingida com azul-esverdeado. Na seqncia dos seus conhecimentos na produo de vidro, desenvolveram vidrados e padres mais sofisticados que aplicariam a sua olaria e cermica arquitetnica. O azul era a cor mais comum e os primeiros azulejos foram decorados pelos egpcios que riscavam padres no barro antes das peas serem vidradas. Foram encontrados azulejos parietais com decoraes de escravos aprisionados, animais e bestas imaginarias, sinais simblicos e ornamento. Isso datado cerca de 1180 a.C. no templo de Medinet Abu, em Tebas no delta do Nilo. Entre os sculos XIII e VI a.C. os Assrios e os Babilnios produziam azulejos e tijolos parietais cermicos decorados com vidrados ricamente coloridos. Em Susa,Todos os objetos de barro requerem uma cozedura inicial numa mufla, de modo a transform-los numa cermica dura e durvel. As cozeduras subseqentes servem para as camadas de decorao na superfcie, tais como vidrados e engobes cermicos. Na sua essncia, uma mufla idntica a qualquer outro forno, mas as temperaturas que atinge so muito maiores do que as que se atinge em qualquer forno caseiro. (FANNING e JONES, 2001, p. 56)2 Chacota ou biscoito a denominao para a pea de azulejo que ainda s foi cozida uma vez antes de ser vidrada. 1

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o palcio dos reis da Prsia, possua frisos de placas decoradas em relevo colorido mostrando motivos de lees e msticos touros alados. Aps a conquista do Oriente Mdio por Alexandre, o Grande, entre os anos 334 e 325 a.C. a prtica desta tcnica decorativa foi esquecida, assim tendo permanecido por muitos sculos, at a sua redescoberta durante o domnio dos reis sassnidas (221 641). Ao invs dos habituais azulejos parietais os painis de estuque so neste momento moldados e esculpidos com figuras e representaes estilizadas de plantas. Esse tipo de decorao continuaria a ser popular entre os muulmanos. No ano 750, o centro do mundo Islmico deslocou-se para Meca, e a partir de ento tornou-se predominante a influncia dos artfices Persas e, inspirada nas mercadorias importadas da China, iniciou a grande tradio islmica, que se espalharia pela Europa, e mais tarde pelo mundo. O desenvolvimento mais importante ocorrido no sculo VIII constitui na decorao de lustre. A superfcie dos azulejos era primeiramente vidrada com branco opaco. Depois, era pintada em tons de amarelo, vermelho e castanho, sendo a decorao realada por um pigmento produzido a partir de um composto de prata e ouro ou cobre e ouro em suspenso num engobe3 lquido. Quando cozido, este pigmento denominado lustre, produzia uma luminosidade metlica que resplandecia luz do Sol, sendo usado para realar a decorao de mesquitas, templos e palcios. Esta tcnica espalhou-se pelo Egito, sendo usada mais frequentemente nas olarias do que nos azulejos. No sculo XIII seria estabelecido em Kachan, ao sul da Prsia, um importante centro de produo de azulejos, onde peas reveladas com lustre foram produzidas e usadas por toda a Prsia e Oriente Mdio.

3 Mistura de argila lquida, xidos e outros componentes que pode ser aplicada em uma pea antes da esmaltao.

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Figura 3. Placa cermica persa de lustre, com inscrio do Coro em escrita nashki ou cursiva, do sculo XIII. (Fonte: A arte do azulejo, p. 21).

Figura 4. Azulejo islmico datado em 1575. (Fonte: A arte do azulejo, p. 29).

No continente europeu, durante este perodo, os azulejos eram menos coloridos. Os azulejos decorativos eram colocados no pavimento de mosteiros e igrejas medievais, mas de um modo geral eram da cor natural do barro com qual eram feitos. Somente a partir do sculo XVIII, com o Grand Tour, dos jovens aristocratas britnicos, seria descoberta a rica extica decorao vigente no Oriente Mdio, tendo sido igualmente por essa altura que a Companhia das ndias Orientais comeara a importar moblia, faiana e porcelana da sia e do Oriente. O estilo decorativo empregado na porcelana chinesa inspiraria os fabricantes de azulejos

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holandeses neste perodo e respectiva produo de azulejos de mailica4, mais conhecidos como porcelana de Delft. Os azulejos produzidos na Holanda tornaramse to populares que a sua indstria expandiu-se por toda a Europa atravessando posteriormente o Atlntico at chegar a Amrica.

Figura 5. Azulejo espanhol decorado com a tcnica de aresta. (Fonte: A arte do azulejo, p. 47).

Figura 6. Azulejos holandeses de figura avulsa, 1520, na capela de Vyne, na Inglaterra. (Fonte: A arte do azulejo, p 47).

At meados do sculo XVIII, a decorao de azulejos era feita mo. Tratava-se de um processo moroso e dispendioso. Mas, em 1756 seria desenvolvidaProcesso de decorao usado em cermicas de baixa temperatura, onde xidos corantes e pigmentos so aplicados sobre a superfcie da pea esmaltada com vidrados a base de estanho, aps a queima as cores so fixadas sobre o esmalte.4

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em Liverpool, por John Sadler e Guy Green, uma tcnica de impresso que permitia uma reproduo consistente de pormenores muito delicados. Os seus criadores transferiram uma imagem de uma gravura impressa para um azulejo por meio de um papel de decalque. Essas primeiras imagens eram habitualmente reproduzidas em uma cor, muitas vezes preto, vermelho ou castanho, e os desenhos eram cozidos sobre o azulejo branco a temperaturas relativamente baixas. Os primeiros desenhos consistiam em simples paisagens ou figuras, pois as primeiras matrizes eram blocos de madeira semelhantes s usadas na poca para imprimir tecido. Com o desenvolvimento da impresso, as matrizes passariam a ser feitas em cobre com o desenho gravado delineado na superfcie do metal, possibilitando a reproduo de pormenores mais complexos e delicados. Ao longo do tempo o processo de manufatura se tornou mais sofisticado, mais cores foram sendo utilizadas nos desenhos.

Figura 7. Azulejo de decalque. Impresso por Sadler e Green. (Fonte: A arte do azulejo, p. 78). Figura 8. Azulejo de decalque. Impresso por Sadler e Green. (Fonte: A arte do azulejo, p. 78).

A Revoluo Industrial do sculo XIX conduziu a uma vasta expanso na construo de casas, para alojar as classes mdias recentemente enriquecidas. Igual expanso se verificaria no nmero de fbricas, igrejas e outros edifcios pblicos. O estilo vitoriano era muito ornamental e os azulejos eram amide usados para decorar pavimentos e paredes dessas novas casas. Os azulejos eram quase sempre colocados nos vestbulos para criar grande impacto, estendendo-se s varandas, aos terraos e s estufas que foram sendo agregadas s casas para

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albergar as plantas exticas importadas de pases tropicais. Os azulejos usados no exterior tinham de ser a prova de gelo. Com o passar do tempo a praticidade e a durabilidade dos azulejos pavimentares se revelavam mais notrias, a sua utilizao espalhou-se por toda a casa, em geral dispostos em padres de azulejos amareloclaro e pretos, muitos dos quais ainda hoje podem ser vistos.

Figura 9. Revestimento geomtrico do pavimento da igreja de St. Leonard, na Inglaterra. Data de 1857. Esmalte amarelo embutido sobre o barro. (Fonte: A arte do azulejo, p. 98).

Figura 10. Azulejos revelados com vidrado de mailica opacos, aplicados nas paredes do escritrio da firma Milton, Hollins & Co. na Inglaterra. (Fonte: A arte do azulejo, p. 47).

Com o sistema de canalizao, comeou-se a utilizar azulejos nas casa de banho proporcionando paredes e pavimentos prticos. Tambm se tornou moda ornamentar as lareiras com azulejos frequentemente bastante decorativos. O estilo gtico vitoriano foi imitado em todo mundo, tendo como conseqncia a aplicao de azulejos geometrizantes nos pavimentos de muitas igrejas, edifcios civis e grandes casas, assim como de painis concebidos para sugerirem frescos ou tapearias. Ao final do sculo XIX, o estilo decorativo passou do Gtico Vitoriano para a Arte Nova e, depois, para os desenhos geomtricos da Art Dco. Os azulejos acompanharam o gosto da poca e, sobretudo aquele com motivos egpcios, tornaram-se especialmente populares aps a descoberta do tmulo de Tutankamon, em 1922.

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Entre as duas guerras mundiais, os interiores de muitos hotis e restaurantes foram decorados com azulejos, predominando, ento a preferncia pelo Estilo Cunard5 inspirados nos transatlnticos. Nas casas, deixaram de se utilizar azulejos para os pavimentos dos vestbulos e o emprego das peas mais decorativa ficaria essencialmente confinado s cercaduras das lareiras, enquanto os azulejos mais simples seriam utilizados em casas de banho e cozinhas. Podemos notar que o azulejo era inserido apenas nos ambientes internos, mas que mais tarde e principalmente no Brasil serviriam de revestimentos exteriores.

Figura 11. Azulejo em estilo Art Dec. Executado em 1925. (Fonte: A arte do azulejo, p. 98).

Na atualidade os azulejos esto disponveis em um amplo leque de padres e desenhos, em que modernos oleiros concebem motivos originais. Numerosos azulejos so decorados a mo, conferindo assim uma grande individualidade a uma superfcie, parede ou painel; outros tantos podem ser desenhados por encomenda e muitos deles ainda executados combinando a cor com a moblia e com os tecidos usados para as cortinas. Os novos materiais e mtodos de produo so objetos de pesquisa e, com muita freqncia, os responsveis olham para o passado em busca de referncias. A ttulo de exemplo, os modernos acabamentos de polimento reproduzem o efeito da

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Estilo que fazia referncia ao conceito nutico.

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loua de lustre vitoriana que por sua vez, trazia como referncia de inspirao os azulejos de lustre produzidos na Prsia durante o sculo XIII.

Figura 12. Paredes revestidas de azulejos, na estao de metro da Bond Street, em Londres redecorada na segunda metade do sculo XX. (Fonte: A arte do azulejo, p. 98).

2.2 O Azulejo em Portugal

Para compreendermos o processo que possibilitou a chegada do azulejo ao Brasil necessrio o conhecimento sobre os movimentos artsticos que estiveram presentes ao passar dos anos. Principalmente no momento em que os portugueses chegam ao nosso pas. Os primeiros azulejos portugueses datam do incio do sculo XV, mas s no sculo seguinte, inspirados na Renascena, eles adquiriram um estilo nacional que se expressava na policromia, e assimilaram as formas populares da faiana (loua) lusitana, do tapete de Arraiolos e das colchas de Castelo Branco, vilarejos de Portugal. No decorrer do sculo XVII os azulejos foram empregados no revestimento de igrejas e capelas e os temas geomtricos policromados passam a ser utilizados nas construes religiosas, representando cenas neoclssicas, bblicas ou hagigraficas (a vida dos santos). Mas foi no sculo XVIII que o azulejo portugus alcanou seu apogeu, graas variedade de temas, religiosos e profanos,

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riqueza ornamental de seus enquadramentos, e reputao de alguns azulejadores, que assinavam e datavam sua obra. Os azulejos, como podemos observar tiveram grande presena na cultura de muitos pases. Eles refletiam simbologias e arte a ambientes diferentes, agregando valor em igrejas, banheiros e lareiras. Algo aconteceu para que Portugal se tornasse uma referncia no assunto. Isso se deve ao fato de que os artistas deste pas tratar do azulejo de forma diferente. Uma das diferenciaes perante outros paises so as grandes dimenses de painis de azulejos. Na Espanha a decorao com peas cermicas se concentrava sobretudo nos interiores, e apenas com um emprego limitado nos exteriores de edifcios religiosos. Em Portugal os azulejos adornavam tanto os interiores quanto nos exteriores de igrejas, mosteiros e conventos, escolas, edifcios pblicos, palcios e residncias, casas comuns. Por volta do incio do sculo XVIII, eles constituam j uma caracterstica intrnseca na arquitetura, nica no mundo. Embora seja certa a implantao da manufatura de azulejos desde meados do ano de 1.500, s nos finais desta centria a produo nacional comearia a desenvolver as suas prprias caractersticas. Os azulejos eram, ento, executados em pequenas Oficinas, que obtinham inspirao para seus desenhos em mbitos muito diversificados, como os txteis importados da ndia, nessa mesma poca propiciando, por exemplo as chitas, decoraes aplicadas em frontais no altar. Durante os sculos XVII E XVIII, produziam-se milhares de azulejos, essencialmente em Lisboa, Porto e Coimbra, destinando uma grande porcentagem exportao. Contudo, a partir de meados de 1.600 a manufatura portuguesa viu-se ameaada pelo influxo macio de peas provenientes da Holanda. A sua importao chegaria mesmo a ser interditada entre 1687 e 1698. No entanto, os estilos decorativos holandeses, tinham se tornado extremamente populares, pelo que a prtica das imitaes, rapidamente se alastrou. Deste modo, suscitaria alguma hesitao a distino de azulejos holandeses e portugueses produzidos, sobretudo desde o comeo do sculo XVIII. Entretanto, continuaram a importar exemplares holandeses, ainda que em pequena escala, at, pelo menos, pouco depois de 1730. Tal como aconteceu na Espanha, a partir de Quinhentos utilizara-se painis de

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azulejos pintados com temas religiosos para decorar os altares e as paredes das igrejas. Nos final deste sculo, a produo de azulejo azul e branco era o preferido entre os consumidores.

Figura 13. Painel de azulejos decorativos azuis e brancos com figuras avulsas, uma produo portuguesa dos finais do sculo XVII. (Fonte: A arte do azulejo, p. 86).

A abundncia de bens do sculo XVIII, decorrente da forte importao de ouro e de outros artigos preciosos do Brasil e da ndia, proporcionaram o enriquecimento de Portugal, e isto refletiu na manufatura de cermicas. Os motivos mais representativos deste perodo so em torno das histrias mitolgicas, alegricas, paisagens, fantasias arquiteturais. Do mesmo modo no final da centria caracterizava os azulejos em motivos policromos puramente decorativos de flores e ornamentos de estilo rococ. Os azulejos no eram utilizados apenas para a nobreza, que os aplicava tanto nas paredes interiores quanto exteriores de suas casas de campo e dos seus palcios, mas tambm se destinavam aos diversos membros das categorias profissionais existentes. Na segunda metade de Setecentos, etapa em que a policromia voltaria a estar na moda, verificou-se uma gradual substituio das

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grandes sees de pinturas mural parietal por composies de azulejos de molduras compostas por peas menores e frequentemente cortadas.

Figura 14. Canal revestido de azulejos, no jardim do Palcio Nacional de Queluz. (Fonte: A arte do azulejo, p. 86).

Aps o terremoto de 1755, que afetaria praticamente toda a cidade de Lisboa, surgiu um modelo mais disciplinado de decorao com azulejos. Era com repetio de padres de flores coloridos e foi aplicado na reconstruo da cidade. Em 1790 a decorao de azulejos tinha sido absorvida pelo novo estilo neoclssico. No princpio do sculo XIX, o ritmo de produo comeou a diminuir acabando por cessar. Neste momento o envolvimento do Brasil ganha destaque para a continuidade de produo:[...] Seria, depois, continuada com grande vitalidade no Brasil. Entretanto, nas dcadas de 60 e 70 do sculo XVII, a manufatura portuguesa viveu um processo de renascimento anlogo ao do norte da Europa, sobretudo graas aos esforos de Brasileiros que se estabeleceram em Portugal, A partir de ento, s peas cermicas executadas j pelos mtodos industriais foram usadas para adornar edifcios domsticos de todos os gneros. Tornada a muito uma tradio, essa prtica ainda hoje se mantm, verificando-se tambm uma ampla exportao dos azulejos nacionais (RILEY, 2004:87)

Com as Invases francesas, a corte portuguesa refugia-se no Brasil e o incio do sculo XIX trazem estagnao produo de azulejo em Portugal. Mas no Brasil o emprego do azulejo vai ter um desenvolvimento paralelo autnomo e, desde finais do sculo anterior, observa-se, especialmente ao norte do pas, sua aplicao como revestimento total de fachadas de edifcios. Este fenmeno tem a sua principal

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origem nas condies climticas; assume-se o azulejo como elemento impermevel, protetor contra chuvas intensas, simultaneamente possibilita o arrefecimento do interior por refletir o calor. Estes revestimentos, inicialmente em branco, desenvolvem-se para padres simples a duas cores. Com a decadncia das oficinas de Lisboa o fornecimento de azulejos para o Brasil feito pela Inglaterra, Frana e Holanda. Mas rapidamente se reconhece que os gostos no so similares e a produo de azulejo em Portugal renasce para atender s encomendas brasileiras. Devido o regresso de um grande nmero de portugueses ao territrio, o novo gosto brasileiro vai ser implementado em Portugal, principalmente na regio do Porto, surgindo nesta altura as primeiras fachadas revestidas de azulejo fabricadas pelos novos mtodos de produo semi-industriais e industriais. Este hbito provoca diferentes reaes no territrio portugus, por um lado encarado como uma deturpao dos revestimentos que pertencem ao intimismo do interior da habitao sendo mesmo utilizado o termo casas de penico, para designar o uso do azulejo como revestimento nas fachadas-, por outro lado reconhece-se o seu potencial de valorizao esttica dos exteriores. No livro PORTUGAL: Madeira e Aores (SYMINGTON, 1999, p.22-23), h uma pesquisa que atribui os reflexos das criaes em padronagem dos azulejos feitos em cada poca em Portugal aos movimentos, Renascentista (1500), Maneirista (1600), Barroco (1700), Neoclssico (1800), Art Nouveu (1900) e Moderno (anos seguintes).

2.3 O Azulejo no Brasil

No primeiro perodo do sculo XIX, produziu-se uma descontinuidade na exportao de placas cermicas portuguesas para o Brasil, em virtude da liberdade de comrcio decretada em 1808 por Dom Joo VI e como conseqncia do

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rompimento com a metrpole devido proclamao da Independncia em 1822, aps o que o mercado foi conquistado por outros pases. Iremos focalizar o assunto nos azulejos existentes nas cidades de Olinda e Recife, cidades onde receberam influncia portuguesa na decorao. Alm disso, o Brasil importou no sculo XIX azulejos da Frana, Holanda e Inglaterra, os quais tambm fazem parte da nossa histria. No incio do sculo XVI a 1630 em Lisboa se faziam tentativas de desenvolver o azulejo vidrado, das tentativas surgiram os azulejos lisos, esmaltados, pintados de verde-cobre para a produo de enxadrezados. Neste mesmo momento instalam-se os primeiros fornos, capazes de cozer o esmalte vtreo. De 1630 a 1650 aconteceu um intenso desenvolvimento do azulejo tipo mailica, que proporcionava a pintura direta sobre o vidrado. Porm no bastou para que os azulejos holandeses invadissem Pernambuco. Os azulejos holandeses constituram palcios de nosso pas. Essas peas geralmente traziam uma figura central dentro de uma reserva, ou apenas, uma figura popular, tendo nos cantos, desenhos de arabescos, labirintos chineses, cabeas de boi estilizadas e flor de lis. Distinguiam-se bastante das peas portuguesas, que no eram to bem acabadas e possuam nos cantos, simples ptalas ou estrelinhas azuis, alm de apresentar dimenses ligeiramente maiores.

Figura 15. Azulejo portugus de 13 x 13 cm e mdulo 4 x 4 cm, na cidade de Recife. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 52).

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De 1680 at o fim do sculo XVII aconteceu a predominncia cromtica para o azul de cobalto, com reduo gradual da policromia por influncia das porcelanas chineses do ltimo perodo Ming, em que as tonalidades de azul sobre fundo branco so a regra. Esse tipo de pintura foi bem aceito pelos holandeses a partir de meados do sculo XVII, em que comearam a aplicar tal colorao.

Figura 16. Azulejo portugus de influncia holandesa de 13,5 x 13,5 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 51).

De 1700 a 1725 podemos citar os mestres da pintura portuguesa como Antnio de Oliveira Bernardes (1660-1732) e Antnio Pereira. Nesta mesma poca comeou a fabricao de azulejos em azul e branco, de figura avulsa, painel de vasos floridos, figura de santos, enquadramento com faixas barrocas de folhas contorcidas, painis retangulares. nesta altura que participavam das composies elementos arquitetnicos como pilastras, consolos, incorporando vos reais. Entre 1725 e 1755 Portugal encontrava-se em um perodo de grande produo. Artistas como Bartolomeu Antunes (1688-1763) colaboraram para esta produo. Portugal paralelo a sua produo de painis figurados, ocupando completamente a superfcie das paredes, executava peas avulsas que tinham uma ornamentao mais modesta: vasos floridos, sereias, meninos, golfinhos, vias sacras. quando se exportam para o Brasil as mais belas e perfeitas composies portuguesas.

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Figura 17. Azulejo portugus em Recife de 14 x 14 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 83).

As faixas barrocas, que emolduravam os quadros, estreitaram-se e acabaram por ser substitudas por decoraes recortadas. Neste momento atingi-se um novo estilo, o rococ, cuja entrada substitui o azul cobalto pela policromia. A partir de 1760 encontramos a tendncia para uma decorao abstrata e regressa-se ao cromatismo. Os desenhos das molduras evoluem para o rococ. A paleta cromtica aceita as cores amarela, verde, roxa, azul. Aparecem as assimetrias. De 1780 a 1808 passaram a adaptar desenhos leves e graciosos, policromados. A decorao tornou-se delicada, utilizando aves orientais, laos, fitas ondulantes cercando paisagens buclicas e encantadoras. O sculo XIX foi uma forja das experincias mais variadas. Por um lado, o neoclassicismo, acadmico e entregue s regras do passado, animado pelas descobertas obtidas nas escavaes de Herculano (1711) e Pompia (1748). No ltimo decnio do sculo XIX, despontaram ainda novos movimentos artsticos, a Art Nouveau e a Art Dco em 1925, que deixaram traos em todo mundo, inclusive nos azulejos.

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Figura 18. Azulejo em Pernambuco com influncia art nouveau de 15 x 15 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 67).

Alguns acontecimentos marcantes no Brasil no sculo XIX: a chegada da corte de Dom Joo VI (1808), o decreto da liberdade de comrcio e indstria (1808), a partida do Brasil de Dom Joo VI em 1821 e sua morte em 1826, a proclamao da Independncia do Brasil em 1822 e seu reconhecimento pelas cortes portuguesas em 1825. A partir de 1922, continuou-se, no Brasil, a empregar azulejos. Depois de cerca de vinte anos de interrupo da exportao, Portugal retomou a posio de grande fornecedor de azulejos, at a Primeira Guerra Mundial. Acontece que, mesmo antes da Independncia do Brasil, durante o perodo do Reino Unido, os construtores de edifcios recorreram aos mercados fornecedores europeus para a obteno daquele material, como conseqncia da abertura dos portos pelo decreto de 28 de janeiro de 1808. So essas algumas razes da existncia, no Brasil, de azulejos, holandeses, franceses, ingleses e alemes. Todos apresentavam caractersticas da industrializao: pasta fina, dimenses padronizadas pequenas, vidrado liso, espessura do biscoito reduzida, decorao estampilhada, decalcada, entre outras.

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Figura 19. Azulejo francs em Olinda de 11 x 11 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 120). Figura 20. Azulejo francs em Recife de 11 x 11 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 112).

No sculo XIX, na produo de azulejos pintados e vidrados, o Brasil praticamente no teve xito. O fabrico iniciou-se entre 1861 e 1866 na provncia do Rio de Janeiro. Em 1861, Pedro Antnio Survillo & Cia. Apresentaram exemplares de sua produo na I Exposio do Rio de Janeiro. II Exposio, efetuada na mesma cidade, concorreram Jos Botelho de Arajo e Rougest-Aine. Em Portugal, graas ao impulso dado indstria pelo Marqus de Pombal, o fabrico de azulejo iniciado em oficinas portuguesas teve a primeira linha de produo na fabrica Real do Rato (Lisboa), que funcionou at 1836. Seguiram-lhe outras, como Juncal (desde 1775); Sacavm (1856); Massarelos (Porto), que produziu azulejos em relevo; Carvalhinho (1853); Santo Antnio da Piedade, no Porto; Devezas (1865), em Gaia; e Bordallo Pinheiro (1884), em Caldas da Rainha. A primeira produo efetuada no primeiro quartel do sculo XIX foi realizada dentro do estilo neoclssico, mantendo a paleta de cores que compreendia o amarelado, o verde, o azul e o roxo, com tonalidades leves. Os azulejos de figura avulsa continuaram sendo feitos dentro da tcnica artesanal de mailica. Na segunda metade do sculo, a industrializao comeou a penetrar nos centros produtores, dando aos azulejos avulsos maior expanso.

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Para a decorao destes, deu-se diferente forma e expresso aos prottipos de Delf, usando novas tonalidades de azul e criando cantos de estrelinhas, ou de ptalas de ligao, e colocando, no centro, figuras populares nacionais.

Figura 21. Azulejo portugus de 13,5 x 13,5 cm assentado de quina. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 89).

A execuo de peas por prensagem de molde teve lugar na fbrica de Massarelos e em Vila Nova Gaia. O movimento Art nouveau e da Art dco teve dois centros que produziam azulejos: a fbrica de Sacavm (Lisboa) e a de Bordallo Pinheiro (Caldas da Rainha), da onde saram obras de grande beleza e criatividade. As oficinas de Devezas e Santo Antnio (Porto) abasteceram o mercado brasileiro de peas decorativas de faiana branca e policromada (figuras mitolgicas, lees, vasos, urnas...), bem como de ladrilhos, a que chamamos de hidrulicos. Ainda hoje se podem admirar, no Brasil, esses trabalhos coloridos e esmaltados decorando jardins e ptios. Algumas cidades brasileiras, como So Lus do Maranho, Belm do Par, Recife, Salvador e Rio de Janeiro, apresentam ainda a fachada de casas revestida de azulejos portugueses inspirados nos motivos tradicionais ou em prottipos estrangeiros modificados. Os azulejos franceses tambm se encontram em muitos edifcios do Recife e de So Lus do Maranho. Constituem, sobretudo, documentos histricos do sculo XIX.

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Figura 22. Azulejo portugus com padro exclusivo de 14 x 14 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 43).

Figura 23. nico padro de azulejo ingls remanescente de 15 x 15 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 40).

So pequenos quadrados de argila cozida, com razes num passado anterior ao incio de nossa era, aos quais as cores e os esmaltes com a luz refletida transformam fachadas antes em interesse, em lugares admirveis e que davam prazer em viver.

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Figura 24. Azulejo portugus de 13,5 x 13,5 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 148).

No Brasil, as fachadas comearam a receber o revestimento parietal azulejar nos anos de 1830 para os 1840. Alm do aspecto decorativo, de embelezar o imvel, o azulejo tinha a funo utilitria de proteger contra a umidade (que trazia mofo e fungos) caracterstica do clima tropical de nosso pas. Umidade agravada pela salinidade existente nas cidades litorneas ou situadas s margens dos rios. Tanto assim que aquelas que mais receberam fachadas azulejadas foram as que apresentavam uma ou mesmo as duas caractersticas geogrfica: Belm do Par, So Lus do Maranho, Recife, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Confirmando a poca de incio da aplicao do azulejo na arquitetura civil, a primeira notcia da chegada, ao Estado, de um carregamento de azulejos publicada no Dirio de Pernambuco em 1837. Informa sobre a remessa de 1.400 azulejos trazidos um navio espanhol vindo do Rio de Janeiro, que aportou em 2 de novembro daquele ano. No entanto, no informa a origem, com toda a probabilidade portuguesa, como foram todos os primeiros que vieram. Tanto que outras notcias, publicadas pelo mesmo jornal nos anos subseqentes (1838,1839 e 1840), j especificam que navios precedentes de Lisboa pra c traziam caixas de azulejos de Portugal. No mesmo sculo decorrido entre 1840 e 1890, foi mesmo muito difundido o costume de azulejar casas e sobrados. A partir de 1860, com a importao em

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grande quantidade de azulejos franceses, os portugueses perdem a exclusivismo inicial e os padres comeam a se diversificar mais. Em muito menor escala tambm de outras procedncias, como, por exemplo, os ingleses, hoje quase inexistentes em Pernambuco.

Figura 25. Azulejo portugus de 13,5 x 13,5. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 168). Figura 26. Azulejo portugus de 14 x 14 cm, padro raro no desenho e nas cores. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 80).

Mesmo com menor intensidade que aquela verificada at 1890, o costume do revestimento parietal continuou at o final do sculo XIX. H uma casa, na Rua Santa Cruz, 54, no Bairro da Boa Vista, no Recife, com a fachada toda recoberta de azulejos franceses em dois belssimos padres policrmicos, com a data de 1894 inscrita no fronto. Logo na primeira dcada do sculo XX, um decreto Municipal baniu o til e belo costume de azulejar fachadas no Recife. A Lei nmero 546 de 25 de fevereiro de 1909 proibia o emprego de ladrilho vidrado, vulgarmente chamado de azulejo, nas fachadas dos prdios que se constiturem ou reconstiturem neste municpio. No se conseguiu saber quais os motivos e alegaes os legisladores municipais invocaram para medida to drstica. No entanto, foi uma proibio lamentvel. Mas ainda no sculo XIX, em plena moda as fachadas azulejadas, verificam sua expanso alm do eixo Recife-Olinda. Outras cidades comeam a adotar o mesmo modelo.

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Nossa inteno de estudo neste segmento acompanhar a evoluo visual do azulejo. O Brasil teve influncias portuguesas, inglesas e francesas em seus revestimentos.

Figura 27. Azulejo ingls de 15 x 15 cm em Recife. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 41). Figura 28. Azulejo portugus de 13,5 cm em Recife. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 41).

Figura 29. Azulejos franceses de 11,5 x 11,5 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 35). Figura 30. Azulejos franceses de 11 x 11 cm. (Fonte: O azulejo na arquitetura civil de Pernambuco, p. 53).

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Podemos destacar algumas peculiaridades entre os azulejos portugueses e franceses. A principal diferena a dimenso. Enquanto o azulejo portugus media entre 13x13 e 14x14 centmetros, o francs sempre menor tinha 10,5x10,5 cm e 11,5x11,5 centmetros. Tanto um quanto o outro apresentam as modalidades azul e branco e policromia, mas tambm h diferenas. O azul e branco portugus tem o desenho (azul sobre o fundo branco) mais ntido que o francs. Neste, em torno do desenho azul h um esfumaado azulado, como se o azul transbordasse. O azulejo francs, tambm, contm o padro na prpria pea; enquanto no portugus comum o desdobramento do mesmo em mdulos de 2x2 (4 peas compe o desenho) e 4x4 (oito peas formam o desenho completo). Os primeiros acontecem com mais freqncia nos padres bicolores e o segundo em padres policrmicos. Outra diferena no revestimento: os azulejos portugueses so contornados por frisos, elementos que correspondem em tamanho metade do azulejo e cujo padro muitas vezes o mesmo, ou bem parecido, emoldurando os mais variados padres de azulejos. Os franceses aparecem ss, ou seja, um azulejo de mesmo padro estendem-se por toda a superfcie azulejada. Em alguns poucos casos, h cercaduras, que so na realidade outros azulejos, nas mesmas dimenses, mas de padro diferente, contornando o principal. Em raros casos, aparecem frisos franceses semelhantes em tamanho aos portugueses. Alguns padres se repetem em vrios imveis e at cidades. Isso ocorre pela grande quantidade de azulejos vinda de Portugal. Com os azulejos franceses so raros os casos. Outra ocorrncia interessante a aplicao de dois padres de procedncias diferentes. Dos antigos azulejos do sculo XIX encontrados em Pernambuco, h um total de 120 portugueses e 45 franceses. Este total de 165 o nmero que temos que imveis que ainda apresentam azulejos nas fachadas. Quanto ao processo de fabricao, era o de estampilha, semi-industrial, o mais comum, que consistia na aplicao de um molde, normalmente de metal, com o desdenho recortado, que se aplicava sobre a pea de cermica em que o arteso, com um pincel, coloria o correspondente ao espao aberto. Nos padres policromados fazia-se um molde para cada cor. Por terem sido assim fbricas, de

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modo semi-artesanal, que se observam muitas vezes certas imperfeies em inmeras peas. No Pernambuco, s no Recife pode comprovadamente constatar a lamentvel diminuio do patrimnio azulejar, em razo do j citado primeiro Inventrio, realizado no fim da dcada de 1950. Recife era o que detinha a maior parte deste patrimnio e tambm o que mais perdeu. Em Olinda, com base no Inventrio de 1982 feito por Antnio de Menezes, felizmente as perdas foram mnimas, em boa parte graas proteo legal que seu ncleo histrico usufrui. Sobre o surgimento do costume de azulejar as fachadas das casas e sobrados podemos atribuir ao Brasil este mrito. Por isso podemos destacar que mesmo utilizando peas de pases diferentes o Brasil formou uma caracterstica que at ento no era utilizada: revestimento externo de casas com azulejos. Alm dos dados contextualizados na introduo o Inmetro analisou o produto a partir de denncia da ANFACER Associao Nacional dos Fabricantes de Cermica para Revestimento, que rene quarenta e seis empresas do Setor de Cermica, que so responsveis por cerca de 60% da produo nacional, 71% do faturamento anual do setor e por 97% de toda a exportao brasileira. De acordo com a ANFACER, existe, dentro do setor, uma concorrncia desleal provocada pela existncia, no mercado interno, de produtos de baixa qualidade, resultantes de processos de fabricao deficientes, principalmente no que diz respeito etapa de queima, muito importante para definio das caractersticas do revestimento. Segundo a Associao, alguns fabricantes, com o objetivo de aumentar a produo e ganhar mercado, reduzem, propositalmente, o tempo de permanncia no forno, reduzindo, com isso, os custos de fabricao do produto e gerando produtos de qualidade inferior. Esses produtos, por serem comercializados a um preo mais baixo, atraem consumidores que utilizam o preo como fator decisivo no momento da compra. O tempo passou e o processo de fabricao evoluiu, porm a fabricao de azulejo ainda exige tempo e pacincia de quem o produz. Para obter xito a qualidade indispensvel seguir os passos corretos da manufatura. Principalmente obedecer ao tempo de execuo e a qualidade das matrias primas empregadas.

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2.4 A Manufatura do Azulejo

Para compreendermos o processo de produo de um azulejo precisamos entender alguns termos especficos desta tcnica, alguns j foram conceituados nas citaes em forma de notas de rodap e outras sero esclarecidas a seguir. Ressaltamos que a manufatura dos azulejos ser exemplificada a fim de compreendermos o ofcio que os oleiros executaram. Os azulejos so feitos de barro previamente cozido numa mufla, processo que o torna um material mais duro e durvel. Os diversos tipos de barro disponveis nas lojas fornecedoras de artigos de olaria variam consideravelmente, de acordo com os usos na qual se destinam.

Figura 31. Exemplo de mufla pequena, indicada para um ceramista amador. (Fonte: A arte e o Ofcio do Azulejo, p. 58).

Alguns barros so utilizados em seu estado bruto, mas a maioria primeiramente refinada, adicionando-lhe outros materiais antes de serem usados na cermica. Esses corpos cermicos so geralmente compostos por trs elementos: material granular que fornece textura e porosidade, minerais de barro que conferem plasticidade ao corpo e fundentes qumicos que liquidificam e unificam a argila.

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Figura 32. Exemplos da diferenciao de cores de acordo com material utilizado. (Fonte: A Arte e o Ofcio do Azulejo, p. 52).

H um nvel recomendado de cozedura para cada corpo cermico, dependente da sua qumica, conhecido como nvel de maturao. H dois nveis principais: os corpos cozidos abaixo de 1100 C so chamados de faiana, e os acima de desta temperatura so denominados grs. Os barros inadequados podem provocar problemas como a tendncia de quebrar o material, rachar o vidrado ou deformar o prprio azulejo. Um detalhe interessante a respeito dos azulejos a sua dimenso. As placas de cermica europia chegaram a ter 7,5 cm de espessura. Sem dvida pelo hbito de cobrir foges e lareiras com azulejos contribuiu para tal fator, uma vez que era necessrio a reteno de calor. Ainda como exemplo, temos os azulejos medievais, vitorianos, ingleses e holandeses, que possuam em torno de 2,5 cm de espessura. Isso foi constatado no sculo XVIII. A mdia depois passou a ser de 0,6 cm. Depois de efetuar o processo que envolve o barro na sua pea, o oleiro transfere formas a suas peas, seja cortando-as a partir de um bloco de barro, seja colocando-as em uma moldura ou em um molde. Nesta fase do processo, pode-se aplicar uma decorao em relevo, habitualmente com um cunho de madeira. Os azulejos depois disso so deixados secar lentamente de modo uniforme para evitar sua deformao. Ao atingir dureza eram retirados com facas.

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Figura 33. Exemplo de prateleiras dentro de uma mufla. (Fonte: A arte e o Ofcio do Azulejo, p. 59).

Figura 34. Famoso azulejo executado na abadia de Chertsey na Inglaterra nos anos 60 e 70 do sculo XIII. (Fonte: A arte do azulejo, p. 38).

Os azulejos embutidos caracteristicamente medievais so feitos por meio da impresso de um desenho sobre a superfcie frontal e, depois, pelo preenchimento da depresso resultante com barro lquido leitoso, denominado engobe. As peas vo ao forno, adquirindo uma cor amarelada clara, em contraste com a cor avermelhada do fundo do barro. Houve sempre muitos tipos de azulejos, sobretudo no perodo medieval na Inglaterra, cujos exemplares eram vidrados a chumbo e cozidos apenas uma vez. No princpio, o vidrado era aplicado na forma de sulfureto de chumbo em p, que cozia at atingir uma transparncia clara. Desse modo, proporcionava uma tonalidade amarelada ao engobe branco, que podia tornar-se verde com acrescento de

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sulfureto de cobre ao minrio de chumbo. O verde plido resultava de um vidrado de chumbo aplicado a uma superfcie coberta de engobe, enquanto uma concentrao maior de cobre propiciava um tom de verde mais escuro, por vezes quase negro. Sobre o vidrado:[...] Um vidrado consiste numa camada de vidro aplicada na superfcie de um obejto cermico e depois nele fundida por meio da cozedura numa mufla. O barro no cozido pode ser decorado com um engobe, na sua essncia uma mistura de argila fina com gua. [...]O principal constituinte de todos os vidrados de olaria o xido de slica ou uma combinao sua com o brax (xido brico), conhecidos como vitrificantes, porquanto a sua presena numa fuso que encoraja a formao de um vidro. O xido de slica, por si s, derretia bem acima da variao normal de cozedura da maior parte dos barros de olaria. Mas quando lhe so acrescentados outros qumicos, o seu ponto de fuso reduz-se. Esses qumicos so designados de fundentes e afetam de modo relativo a dureza do vidro que formam. (FANNING E JONES, 2001, P. 60)

Figura 35. O processo do vidrado de estanho. (Fonte: A arte do azulejo, p. 98).

Os vidrados lquidos de chumbo foram desenvolvidos no sculo XVIII fase em que quase todos os azulejos eram cozidos duas vezes. A cozedura processava-se numa cmara ou forno especialmente construdo com um sistema de aberturas e orifcios, que no s permitia atingir altas temperaturas (cerca de 1000 C durante 30-40 horas) como tambm facilitava um maior controle do calor no seu interior. Os azulejos e outras louas tinham de ser cuidadosamente dispostas para se conseguir o mximo rendimento da fornalha. O forno e a sua organizao revelaram-se sempre

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questes extremamente delicadas, pois possveis erros podiam significar a runa financeira de uma olaria. Os azulejos com vidrado de estanho devem ser cozidos mais do que uma vez, sendo-lhes dada uma cozedura sem vidrado antes de serem coberto com vidrado de estanho branco opaco, que consiste na base da decorao pintada. O vidrado de estanho essencialmente um vidrado de chumbo transparente que se torna branco com a adio de xido de estanho. Ao aplicar-se este vidrado em estado aquoso numa face de cada azulejo, o barro absorve a gua deixando a superfcie frontal coberta com uma camada de vidrado em p. Quando seca, essa pea pintada e depois cozida de novo para fundir os pigmentos no vidrado. Antes da cozedura, os azulejos holandeses e alguns outros recebiam uma ultima camada fina de vidrado de chumbo transparente chamado kwaart sobre a pintura, de modo a conferir um brilho mais lustroso superfcie acabada. Algumas das primeiras louas com vidrado de estanho eram pintadas antes de serem vidradas, devendo os pigmentos como azul-cobalto, ser suficientemente fortes para parecerem atravs do vidrado de estanho aps a cozedura. No entanto, a tcnica pictrica da mailica, com as suas variaes de cor e tom, exigia de aplicao de tinta por cima do vidrado, tornando-se assim uma pratica corrente para todas as louas de vidrado de estanho, ou faiana. As cores provinham de xidos metlicos. Os pigmentos eram modos at ficarem em p e, depois, aplicados em forma lquida. Era fundamental que os pintores de mailica possussem uma grande leveza de toque, sobretudo se trabalhassem mo livre. Vrios mtodos e aplicaes foram trabalhados desde o surgimento do azulejo. Iremos a seguir destacar alguns desses procedimentos. Uma alternativa decorao relevada ou embutida consiste no esgrafito (do termo italiano sgrafitto), tcnica mediante ao qual se cobre toda superfcie do azulejo com engobe, riscando-se depois o desenho sobre ela, de modo a revelar o barro mais escuro que fica por baixo.

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Figura 36. Um dos azulejos decorados com a tcnica do esgrafito, representando cenas retiradas de histrias sobre a infncia de Jesus Cristo, datados no sculo XIV. (Fonte: A arte do azulejo, p. 41).

A decorao dos azulejos na Holanda se tornava rpida com a aplicao da pedra pomes ou carvo em p nos orifcios do padro de papel disposto sobre azulejo, formando assim o desenho em contorno ponteado. S ento se podia pintar a superfcie com pincel fino, podendo igualmente preencher os sombreados. Para obteno dos fundos coloridos, procedia-se a cobertura das partes do azulejo que iriam ficar brancas ou pintadas, passando-se depois a espalhar o pigmento em p nas zonas expostas da superfcie. Por vezes, com o pincel pintavase um fundo colorido. Depois disso recebiam uma segunda cozedura durante a qual os xidos e o vidrado se fundiam na superfcie. As vezes era necessrio um terceira cozedura com uma temperatura mais baixa a fim de aplicar pigmentos como dourado, vermelho ou ainda para fazer efeitos de lustre. As impresses por decalque criadas por Sadler e Green, naturais da cidade de Liverpool (Inglaterra), eram aplicadas em azulejos brancos previamente vidrados de vrios tipos. Os desenhos, em cores de esmalte misturadas com chumbo branco e leo de linhaa, eram transferidos de um bloco de madeira ou de uma chapa de cobre gravada para um papel de seda que era, depois, colocada sobre a pea cermica com a face virada para baixo. Depois de ser pressionado, de maneira a garantir que a impresso ficasse registrada na superfcie da pea, o papel era retirado e o azulejo gravado era cozido num forno a baixa temperatura. Essa

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cozedura relativamente rpida representaria uma poupana de tempo e risco, para alm das vantagens decorrentes da considervel multiplicao da produo.[...] Por volta de 1756, foi introduzido em Liverpool um novo mtodo de decorar azulejos que iria causar um grande impacto no s na manufatura de azulejos, mas tambm na generalidade da produo de cermica. Assim, em agosto desse ano, dois impressores da cidade, John Sadler e Guy Green, assinaram uma declarao em que asseveravam ter imprimido, em menos de 6 horas mais de 12000 azulejos de faiana com diferentes padres, que eram mais e melhores em nmero, qualidade e perfeio dos que as peas que 100 habilidosos pintores de potes pudessem ter pintado no mesmo espao de tempo recorrendo ao processo habitual e freqente de pintura com pincel. (RIVEY, 2004:78)

Durante o sculo XIX, os processos de fabricao e decorao de azulejos, foram aperfeioados e mecanizados para poderem dar resposta s necessidades de uma enorme indstria, revelando-se um contraste com tipos de produo existentes anteriormente. Neste momento as caractersticas dos azulejos medievais de irregularidades de formato, as incorrees no padro, os imprevistos de cor encantavam ainda por suas peculiaridades que tornavam esta arte nica. Mesmo assim o avano prosseguiu. Os processos de impresso por decalque estavam extremamente avanados. Elas que eram feitas por decalque em p eram j suficientemente lisas e brancas para serem decoradas antes de vidradas. As impresses por decalque eram efetuadas no corpo do azulejo no vidrado e cobertas com um vidrado de chumbo transparente. A cor podia ser aplicada a mo tanto por cima quanto por baixo do vidrado. Se havia muitas firmas que tinham os seus prprios departamentos para executar gravuras, outras recorriam a desenhos fornecidos por impressores especialistas, motivo pelo qual se encontram os mesmos desenhos nos azulejos produzidos por numerosas fbricas no sculo XIX. Num outro tipo de fornecimento, como as cores e os vidrados j misturados, os artigos podiam ser adquiridos em firmas como a Wengers of Etruria, que abasteceu a indstria de olaria, com toda espcie de materiais e equipamentos. Essas novidades traduziram-se num grande avano em relao aos perodos anteriores, quando os oleiros tinham que misturar as suas prprias cores e conhecer a qumica dos vidrados. As impresses com blocos proporcionavam a obteno de reas planas de cor e no apenas contornos na superfcie. Este mtodo, igualmente conhecido

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por Nova Prensa, recebeu uma patente em 1848, tendo sido inicialmente utilizado com exclusividade pela firma Minton, e s depois por outras companhias. Contudo, acabaria de ser suplantado pelo processo litogrfico multicolor, j no sculo XX. Atualmente, o recurso de impresso por serigrafia ainda que ocupa destaque para fins de decorao em superfcies. Os fabricantes de azulejos comerciais tm a sua disposio diversos mtodos de produo. Um deles, citado como inteiramente moderno chamado de extruso. Neste processo se passa uma placa de barro por uma mquina que faz ranhuras at o meio e depois corta o comprimento de cada pea. Quando a placa extrusionada se separa ao longo dessas ranhuras, transforma-se num par de azulejos gmeos, A secagem, a vidragem e a cozedura respeitam o procedimento habitual. Para fixarmos algumas das principais tcnicas adotadas pelos oleiros iremos analisar algumas imagens e definir as suas tcnicas. Uma das tcnicas adotadas a da faiana, que se caracteriza por ser uma forma de cermica branca. So massas porosas de colorao branca ou marfim e precisam de posterior vitrificao. Uma classificao usual da cermica branca baseia-se no teor em peso da gua absorvida pelo corpo cermico: a faiana um dos tipos mais porosos, apresentando absoro geralmente superior a 3%. Os produtos que podem ser citados com obra deste processo so jogos jantar, de ch, xcaras e canecas.

Figura 37. Azulejo francs de faiana, executado por Formaintraux de Desvres, na segunda metade do sculo XIX. (Fonte: A arte do azulejo, p. 83).

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A mailica veio revolucionar a produo do azulejo, pois permite a pintura direta sobre a pea j vidrada. Aps a primeira cozedura colocada sobre a placa um lquido espesso (branco opaco) base de esmalte estanfero6 que vitrifica na segunda cozedura. O xido de estanho oferece superfcie (vidrado) uma colorao branca translcida na qual possvel aplicar diretamente o pigmento solvel de xidos metlicos em cinco escalas de cor: azul cobalto, verde bronze, castanho magnsio, amarelo antimnio e vermelho ferro (que por ser de difcil aplicao pouco surge nos exemplos iniciais). Os pigmentos so imediatamente absorvidos, o que elimina qualquer possibilidade de correo da pintura (designada decorao ao grande fogo). O azulejo ento colocado novamente no forno com temperatura mnima de 850C revelando, s aps a cozedura, as respectivas cores utilizadas. A tcnica designada corda seca surge no final do sculo XV e incio do XVI ela resulta da separao das cores ou motivos decorativos onde abre sulcos na pea que, preenchidos com uma mistura de leo de linhaa, mangans e matria gorda, evitam que haja mistura de cores (hidrossolveis) durante a aplicao e a cozedura.

Figura 38. Azulejo em corda seca, grande raridade datado do sculo XVI. (Fonte: A arte do azulejo, p. 26).

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Estanho, xido de chumbo, areia rica em quartzo, sal e soda.

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Verglio Correia publicou em 1937 a Etnografia Artstica Portuguesa, onde aborda entre as p. 21 e 26 o tema "Esgrafitos". Diz ele:

"O esgrafito era um motivo ornamental que se obtinha colocando sobre a superfcie caiada das paredes uma folha de metal com um ornato em aberto; raspando-se a cal por meio de uma colher de ferro, a cor cinzenta ou avermelhada do barro ficava a descoberto, constituindo o fundo do desenho(...)Por todas as vilas e cidades do Alentejo os "esgrafitos" dominam o alto das fachadas, avivam as esquinas das casas, acompanham a volta das janelas, abraam em vrias ordens de fiadas o fuste das torres sineiras (...) e embelezam ainda mais, se possvel, as chamins. (CORREIA, p. 21, 26)

Cuenca ou aresta a tcnica onde a separao das cores feita levantando arestas (pequenos muros) na pea, que surgem ao pressionar o negativo do padro (molde de madeira ou metal) no barro ainda macio. Este processo mais simplificado reduz o preo do produto acabado e permite uma maior variedade de padres, embora o acabamento nem sempre seja perfeito. Com os maiores centros de produo em Sevilha e Toledo esta tcnica foi tambm empregue em Portugal, onde se desenvolve a variante em alto-relevo (azulejo relevado) de padres com parras. A tubagem se baseava na prensagem do barro em p umedecido dentro de um molde metlico esculpido, que revelava o desenho com finas linhas de aresta na superfcie do azulejo. Era ento preenchido com vidrados ricamente coloridos, com as arestas a funcionarem como fronteiras entre cada cor. Na tcnica denominada estampilha a decorao da superfcie vidrada com trincha atravs da utilizao de uma estampilha, uma pea de metal onde est recortado o motivo decorativo a pintar. Alm das tcnicas, a composio dos mdulos produzidos tambm de suma importncia. So eles que fornecero o efeito desejado. As escalas e a noo matemtica sempre estiveram presentes para quem executava e executa a decorao do azulejo. As repeties no azulejo e os encaixes variam, mas o mais comum com 4 placas que formam um desenho, ou 8 placas que tambm formam um desenho, e assim vo se repetindo, sempre utilizando no mximo 5 cores.

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Um bom exemplo de variao de formas o da composio denominada de tapete. Ele formado pela repetio de padres inspirados nos desenhos das tapearias, e por isso rodeados de cercaduras e faixas. O azulejo com desenho avulso tambm destaque entre as decoraes mais usadas. Nele feito apenas detalhes nos cantos do azulejo e dentro o desenho solitrio. O que une o padro so as extremidades. Na pgina 30 do presente trabalhos tm um exemplo que abrange tanto o desenho avulso como a composio de tapete, pela utilizao de moldura. A repetio por encaixe acontece prevendo os pontos de encontro das formas entre um mdulo e outro de maneira que se forme o desenho contnuo. Trata-se de uma ateno s vizinhanas formais. A apresentao do encaixe deve conter, no mnimo, uma unidade completa (normalmente, apresenta quatro unidades) com informaes suficientes dos pontos de encontro das formas, indicando claramente o efeito que ser criado no desenho posto em repetio. Atualmente contamos com uma tecnologia inovadora no que se refere a impresso em azulejos. Vimos nesta tecnologia uma oportunidade de criao em design grfico, por isto este trabalho contar com o auxlio da Empresa Colorgraf. A empresa adquiriu o maquinrio pela necessidade de apresentar um diferencial no mercado que no poderia ser conquistado com serigrafia, transfer ou carta cida. Esta tecnologia de impresso digital encontrada na mquina denominada Vutek EFI. Nesta mquina praticamente possvel aplicar qualquer rea que possua at 4 cm de altura e atravs de tcnicas diferentes executar a impresso em cermica, vidro, madeira, couro e plstico, por exemplo. Ela permite a impresso em at 2m de largura. As cores so CMYK em cartuchos adaptados. As extenses de arquivo que a mquina faz a leitura so: pdf, eps, tiff, jpg, giff, png, psd, pmp. A impresso no azulejo pode ser feita em pea nica ou ainda ocupando todo espao permitido pela impressora, ou seja, mais que uma placa cermica por vez.

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BASES PARA A CRIAO ESTTICO-VISUAL

Algumas caractersticas de bases artsticas que influenciaram no design sero nosso alicerce para a criao. Consideramos conhecimentos voltados a histria da arte de suma importncia para o profissional de design grfico que pretende projetar para decoradores, uma vez que as influncias destes profissionais so muitas vezes voltadas aos movimentos artsticos e estilos de diversas pocas (vide questionrio). Com o auxlio do questionrio direcionaremos qual influncia iremos utilizar para a criao da linha de azulejos. O principal motivo de desenvolvermos este questionrio foi investigar no universo dos decoradores de ambientes atravs de uma amostragem a fim de verificar a validade de nossa pesquisa. A principal hiptese que a personalizao/exclusividade um caminho para obter sucesso junto ao pblico visado. A anlise dos dados obtidos no questionrio serviu para direcionar nossa criao para obter caractersticas estticas-visuais que as pessoas gostariam de ter em suas casas na atualidade e assim efetuar a criao baseada em inspirao que fosse aceita pelo mercado.

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3.1 Art Nouveau

O termo Art Nouveau tem origem na inaugurao da loja de decorao de S. Bing, aberta em Paris, 1895, e o nome alemo correspondente Jugendstill, de um jornal de 1896, mas anterior a estes fatos, acredita-se que a pequena casa de Victor Horta, na rua Paul-Emile n. 6, em Bruxelas, construda em 1893, marca a passagem do estilo da pequena para a grande escala e do design para a arquitetura. As origens do estilo esto nos anos de 1883 88. Para os artistas do Art Nouveau a seleo consciente dos estilos do passado (neo-gtico, neo-barroco, etc.), representava um ordem baseada no intelecto, postura que questionavam, pois acreditavam que a imitao dos estilos histricos significava um principio de ordem forada.

Figura 39. Alfons-Maria Much: Cartaz para mortalha de cigarros Job, 1898 . (Fonte: A Art Nouveau Mestres da Pintura Moderna,