BACC Bateria de Avaliação de Comprometimento … · Cátia Andreia Sousa Rocha BACC – Bateria de Avaliação de Comprometimento Cognitivo Estudos Psicométricos e Diferenciais

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  • Ctia Andreia Sousa Rocha

    BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo

    Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    Universidade Fernando Pessoa

    Porto, 2011

  • Ctia Andreia Sousa Rocha

    BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo

    Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    Universidade Fernando Pessoa

    Porto, 2011

  • Ctia Andreia Sousa Rocha

    BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo

    Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    Ctia Andreia Sousa Rocha

    Dissertao de Mestrado apresentada

    Universidade Fernando Pessoa, sob orientao da

    Prof. Doutora Ins Gomes, como parte integrante

    dos requisitos para obteno de grau de Mestre em

    Psicologia, ramo Psicologia Clnica e da Sade

  • v

    RESUMO

    A necessidade de se dispor de testes padronizados e adaptados aos diversos meios

    scio-culturais e lingusticos assume-se fundamental no contexto da avaliao

    psicolgica, em geral, e da avaliao neuropsicolgica, em particular. Na verdade, a

    identificao de foras e de fraquezas em situao de disfuno neurolgica ou de leso

    cerebral, bem como a compreenso da natureza dos dfices cognitivos exibidos, requer

    medidas especficas que atendam s caractersticas do sujeito e que se apresentem

    sensveis a variveis consideradas relevantes no processamento da informao, como

    o caso da idade e da escolaridade. Neste quadro, e dada a escassez de provas de rastreio

    cognitivo global para o portugus, foi conduzido o presente estudo que teve como

    objetivos construir um instrumento neuropsicolgico destinado a adultos a BACC,

    Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo , e avaliar o efeito da idade e da

    escolaridade no processamento cognitivo em sujeitos neurologicamente preservados.

    Assim foram desenvolvidas 58 tarefas que avaliam 8 funes cognitivas: a orientao, a

    ateno, a perceo, a memria, a linguagem, o clculo, a praxia e as funes

    executivas. A BACC foi administrada a um total de 300 sujeitos, de ambos os sexos e

    sem histria de doena neurolgica. Estes sujeitos foram divididos equitativamente em

    grupos de acordo com a idade (40 64 anos vs. 65 90 anos) e a escolaridade

    (analfabetos, 1 ciclo, 2/3 ciclo, secundrio e ensino superior). Globalmente, os

    resultados evidenciam boas qualidades psicomtricas da BACC em termos de validade

    (correlaes significativas com as Matrizes Progressivas de Raven, o MMSE e o Teste

    Breve de Avaliao Frontal), de fidelidade (correlaes teste-reteste significativas) e de

    sensibilidade. Quanto aos estudos diferenciais, verificou-se que, no geral, os sujeitos

    mais novos obtiveram um melhor desempenho do que os mais velhos. Este efeito da

    Idade atingiu significncia na maioria das tarefas (n = 38). Quanto Escolaridade, as

    maiores dificuldades foram observadas no grupo dos analfabetos, tendo os sujeitos mais

    escolarizados, em particular os do Ensino Superior, obtido um melhor desempenho.

    Este efeito foi significativo em praticamente todas as tarefas (apenas em 4 tarefas

    orientao pessoal, perceo visual, leitura de palavras e escrita por cpia no foram

    observadas diferenas significativas entre os grupos). No seu conjunto, estes resultados

    sugerem boas qualidades psicomtricas da BACC e sublinham a necessidade de se

    atender escolaridade e idade do sujeito na avaliao neuropsicolgica.

    Palavras-Chave: Adultos; Avaliao Neuropsicolgica; BACC; Escolaridade.

  • vi

    ABSTRACT

    The need of having standardized tests adapted to different socio-cultural and linguistic

    backgrounds is essential in the context of psychological assessment, in general, and

    neuropsychological assessment, in particular. In fact, specific measures are required

    when the identification of a persons strengths and weaknesses after neurological

    dysfunction or brain damage is concerned. These measures must address the persons

    characteristics and must be sensitive to variables like age and schooling that are relevant

    for information processing, for a deeper understanding of the nature of the cognitive

    deficits exhibited. In this context, and due to the lack of global cognitive screening tests

    in Portuguese, this study aims to develop a neuropsychological battery for Portuguese

    adults BACC, Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo , and to

    evaluate the Age and Schooling effects on cognitive processing in neurologically

    preserved subjects. Fifty-eight tasks assessing 8 cognitive functions (orientation,

    attention, perception, memory, language, calculation, praxia and executive functions)

    were developed. Three-hundred subjects, of both genders and without history of brain

    damage, were observed. These subjects were divided into groups of the same size

    according to age (40 64 years vs. 65 90 years) and schooling (illiterates, 1-4, 5-9,

    10-12 years of study and higher school). Overall, the results revealed good

    psychometric properties of BACC, in terms of validity (significant correlations with the

    Ravens Progressive Matrices, the MMSE and the Frontal Assessment Battery),

    reliability (significant test-retest correlations) and sensibility. Regarding differential

    studies, it was observed that, in general, younger subjects had a better performance than

    older subjects. This Age effect was significant for the majority of tasks (n = 38).

    Concerning the School effect, the greatest difficulties were observed in the illiterate

    group, while the subjects with higher education levels, particularly the higher school

    group, achieved better results. This effect was significant for almost all the tasks (in 4

    tasks only - personal orientation; visual perception, word reading and copy writing this

    effect didnt reached significance). Overall, these results suggest good psychometric

    properties of BACC, and emphasize the need of take into account the Age and

    Schooling variables in neuropsychological assessment.

    Key Words: Adults; Neuropsychological Assessment; BACC; Schooling.

  • vii

    AGRADECIMENTOS

    Dizem que a fase de elaborao de uma dissertao de mestrado um caminho muito

    solitrio, contudo no posso de todo dizer que fiz esta caminhada sozinha, pois tive

    sempre a meu lado individualidades excecionais s quais no poderia deixar de

    agradecer.

    Assim, agradeo de um modo muito especial e sincero Prof. Doutora Ins Gomes, que

    foi a impulsionadora e orientadora deste projeto, por todos os seus ensinamentos e

    conhecimentos transmitidos, pelo profissionalismo, rigor e meticulosidade do seu

    mtodo de trabalho, pela sua disponibilidade constante que revelou ao longo destes

    meses de trabalho conjunto que levou horas a fio do seu precioso tempo, pela sua

    pacincia quando lhe apresentava erros de aprendiz e serenidade quando

    cuidadosamente me esclarecia todas as dvidas que lhe apresentava. Obrigada ainda

    pelas palavras de alento, confiana e encorajamento, pela sua dedicao e ajuda

    incondicional que forneceu de modo a concluir este estudo, enfim, o meu muito

    obrigado por tudo, principalmente por fazer chegar este barco a bom porto.

    Este trabalho contou tambm com a colaborao de vrias pessoas, a quem gostaria de

    expressar um sincero agradecimento. Agradeo ento a todos aqueles que tornaram

    possvel os trabalhos de administrao da BACC, designadamente, Dra. Assuno

    Costa, Dra. Ana Pais e Silva e Dra. Joana Lima, da Santa Casa da Misericrdia Lar

    de Terceira Idade Viscondessa de Salreu, Estarreja, Dra. Teresa Magalhes, da Santa

    Casa da Misericrdia Lar de Terceira Idade Nossa Senhora da Conceio Valongo, ao

    Dr. Csar Santos Silva, Dra. Ivone Soares, ao Dr. Joo Constncio, ao Dr. Alcidio

    Jesus, ao Sr. Antnio Pinho, D. Clarinda e D. Antnia Arajo, da Universidade

    Snior de Gondomar, D. Emlia e D. Esmnia, da Universidade Snior da Foz,

    Dra. Cristina Andrade e Dra. Daniela Silva, da AMI Centro Porta Amiga do Porto,

    Dra. Helena Silveira, do Hospital de S. Joo do Porto. Ainda no mbito da aplicao da

    BACC gostaria tambm de agradecer aos responsveis pela Empresa Calandra Baslio

    em Gandra e pela Fbrica Plsticos Jacto em Alfena, bem como a todos os amigos e

    familiares, familiares de amigos, conhecidos e vizinhos, adultos e idosos que tiraram um

    bocadinho do seu tempo para ajudarem, que se voluntariaram por esta causa, que so

    parte integrante na amostra e que sem os quais a concretizao deste projeto no teria

  • viii

    sido possvel. Quero ainda agradecer ao Sr. Caetano Moreira, pela criatividade e

    dedicao na elaborao de algumas ilustraes que integram a BACC.

    Um obrigada queles que mais apoio me deram e que nesta fase to pouco eu retribui:

    aos meus pais, que estiveram sempre presentes ao longo deste caminho percorrido, um

    obrigado que nunca ser suficiente, por serem o meu porto seguro, pelo apoio

    incondicional, pela fora, incentivo e coragem imensurvel e por acreditarem sempre

    que eu conseguia mesmo quando por vezes eu deixava de acreditar. A eles estou

    eternamente e verdadeiramente grata pela forma como me ensinaram a olhar a vida e

    pelos nobres sentimentos que me transmitiram, pela sua luta constante pela minha

    instruo, educao, sade e felicidade! Um obrigada minha querida irm, que sempre

    me disse para pensar positivo e que quando me via como uma barata tonta, com uma

    voz serena, da sua tenra idade, me passava a mo pela cabea enquanto me aconchegava

    no seu colo e dizia tu vais conseguir, no stresses e minha avozinha que sempre

    rezou por mim de modo a que conseguisse alcanar os meus objectivos. Nos bons e nos

    maus momentos vocs estiveram sempre l, com a mo, o brao, s vezes o corpo

    inteiro para que eu pudesse ter sempre algum a quem recorrer. Aqui fica tambm um

    obrigada minha av velhinha, a quem eu pedi tantas vezes auxlio e que l em cima

    me guia protege e ilumina o meu caminho.

    Aos meus amigos agradeo pelo companheirismo, pelos risos e lgrimas partilhadas,

    pela presena nos bons e maus momentos ao longo de todos estes anos. Agradeo ainda

    queles que para alm da amizade contriburam tambm para a realizao deste

    trabalho, neste sentido aqui fica um especial agradecimento Zlia Cunha, Ana

    Ribeiro, Mafalda Vigia, Mariana Barbosa, Joana Martins, Daniela Vieira ao

    Benjamim Penela, ao Filipe Pinto, ao Bruno Prata, ao Ivo Rangel, pelas palavras de

    carinho com que sempre me presentearam, pela verdadeira amizade que criamos ao

    longo do tempo, pela preocupao, confiana e ajuda constante. Agradeo ainda ao

    Denis Lopes, que foi mais que um companheiro, mais que um amigo e apesar de hoje

    no estar presente na minha vida sempre me ajudou ao longo destes anos a ver os raios

    de sol mesmo quando os dias eram demasiado cinzentos e que sempre me incentivou na

    construo deste projeto ajudando tambm ele na elaborao de algumas tarefas atravs

    do seu conhecimento.

  • ix

    NDICE

    Resumo ........................................................................................................................... v

    Abstract .......................................................................................................................... vi

    Introduo ....................................................................................................................... 1

    Mtodo ........................................................................................................................... 24

    Participantes ............................................................................................................ 24

    Material .................................................................................................................... 25

    Procedimento ........................................................................................................... 60

    Resultados ...................................................................................................................... 63

    Qualidades Psicomtricas da BACC ...................................................................... 63

    Estudos Diferenciais ............................................................................................... 71

    Discusso ....................................................................................................................... 99

    Concluso .................................................................................................................... 105

    Referncias Bibliogrficas ........................................................................................... 109

    Anexos

    Anexo A- BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo

    Anexo B- Consentimento Informado

  • x

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 1. Ilustrao da Tarefa Corte de Relgios ......................................................... 35

    Figura 2. Ilustrao da Tarefa Trilhas de Sementes ...................................................... 36

    Figura 3. Ilustrao da Tarefa de Orientao Espacial .................................................. 37

    Figura 4. Ilustrao da Tarefa de Reconhecimento de Faces ........................................ 39

    Figura 5. Percurso utilizado na Tarefa de Orientao Direita-Esquerda ........................ 40

    Figura 6. Ilustrao da Tarefa de Cpia de Figuras ....................................................... 44

    Figura 7 Ilustrao da Tarefa de Nomeao de Imagens ............................................... 45

    Figura 8. Ilustrao da Tarefa de Memria Imediata de Figuras ................................... 46

    Figura 9. Ilustrao da Tarefa de Emparelhamento de Figuras ..................................... 51

    Figura 10. Ilustrao das Tarefas de Leitura de Frases e de Emparelhamento Frase-

    Figura ............................................................................................................................. 52

    Figura 11. Ilustrao da Tarefa de Inibio de Resposta (Sries Grafomotoras) .......... 53

    Figura 12. Ilustrao da Tarefa de Emparelhamento Significado-Figura ..................... 53

    Figura 13. Ilustrao da Tarefa de Emparelhamento Palavra-Figura ............................ 54

    Figura 14. Ilustrao da Tarefa de Descrio de Figura Complexa .............................. 59

    Figura 15. Caracterizao do processo de recolha de dados .......................................... 61

    Figura 16. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Orientao Temporal ............... 73

    Figura 17. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Orientao Espacial ................. 74

    Figura 18. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Orientao Corporal ................ 74

    Figura 19. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Capacidade Auditiva-Repetio

    de Dgitos ........................................................................................................................ 78

    Figura 20. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Capacidade Visual-Nomeao de

    Cores ............................................................................................................................... 78

    Figura 21. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Controlo Mental Auditivo-

    Repetio de Dgitos ....................................................................................................... 79

    Figura 22. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Mudana de Ateno Visual ... 79

  • xi

    Figura 23. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Reconhecimento Auditivo ....... 81

    Figura 24. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Verbal Imediata-

    Histria ........................................................................................................................... 85

    Figura 25. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Verbal a Longo Prazo-

    Palavras .......................................................................................................................... 85

    Figura 26. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Visual Imediata- Faces

    ........................................................................................................................................ 86

    Figura 27. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Visual Imediata-

    Figuras ............................................................................................................................ 86

    Figura 28. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Visual a Longo Prazo-

    Figuras ............................................................................................................................ 87

    Figura 29. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Aprendizagem Associativa a

    Longo Prazo .................................................................................................................... 87

    Figura 30. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Semntica-Relaes . 88

    Figura 31. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Memria Semntica-Significado

    ........................................................................................................................................ 88

    Figura 32. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Repetio de Palavras ............. 92

    Figura 33. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Repetio de Frases ................. 92

    Figura 34. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Nomeao ................................ 93

    Figura 35. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Compreenso Auditiva-Palavras

    ........................................................................................................................................ 93

    Figura 36. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Leitura-Frases .......................... 94

    Figura 37. Interao Idade x Escolaridade na tarefa de Praxia Construtiva ................... 96

  • xii

    NDICE DE QUADROS

    Quadro 1. Caracterizao da amostra em funo da idade, escolaridade e do sexo ....... 24

    Quadro 2.Estatstica descrita para as Matrizes Progressivas de Raven, o MMSE, o Teste

    Breve de Avaliao Frontal (FAB), a Escala de Depresso de Morris e a Escala de

    Demncia Blessed, por grupo de escolaridade, idade e sexo ........................................ 25

    Quadro 3.Descrio das tarefas da BACC por funo cognitiva .................................. 28

    Quadro 4.Sistema de cotao da tarefa de Cpia de Figuras ......................................... 44

    Quadro 5.Distratores usados na tarefa de Memria Imediata de Figuras ...................... 46

    Quadro 6. Distratores usados na tarefa de Memria a Longo-Prazo de Figuras ........... 48

    Quadro 7.Critrios de cotao para a tarefa de produo de fala espontnea ............... 59

    Quadro 8.Correlao teste-reteste por tarefa e funo cognitiva.................................... 64

    Quadro 9.Correlao entre a BACC e as Matrizes de Raven ........................................ 66

    Quadro 10.Correlao entre a BACC e o Mini Mental State - Examination ................ 67

    Quadro 11.Correlao entre a BACC e o Teste Breve de Avaliao Frontal ............... 68

    Quadro 12.Estatistica descritiva para as tarefas que constituem a BACC ..................... 70

    Quadro 13.Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Orientao por Idade ...................................................................................................... 72

    Quadro 14. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Orientao por Escolaridade ........................................................................................... 73

    Quadro 15. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Ateno

    por Idade ........................................................................................................................ 75

    Quadro 16. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Ateno

    por Escolaridade ............................................................................................................. 77

    Quadro 17. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Perceo por Idade ......................................................................................................... 80

    Quadro 18. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Perceo por Escolaridade .............................................................................................. 81

    Quadro 19. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Memria por Idade ........................................................................................................ 82

  • xiii

    Quadro 20. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Memria por Escolaridade ............................................................................................. 84

    Quadro 21. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Linguagem por Idade ..................................................................................................... 89

    Quadro 22. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de

    Linguagem por Escolaridade ......................................................................................... 91

    Quadro 23. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Clculo

    por Idade ........................................................................................................................ 94

    Quadro 24. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Clculo

    por Escolaridade ............................................................................................................ 95

    Quadro 25. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Praxia

    por Idade ........................................................................................................................ 95

    Quadro 26. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Praxia

    por Escolaridade ............................................................................................................ 96

    Quadro 27. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Funes

    Executivas por Idade ..................................................................................................... 97

    Quadro 28. Mdias, e respetivos desvios-padro entre parntesis, nas tarefas de Funes

    Executivas por Escolaridade .......................................................................................... 98

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    1

    INTRODUO

    Durante os primeiros tempos, as avaliaes neuropsicolgicas eram a medida mais

    direta da integridade cerebral em pessoas que no tinham sinais e sintomas neurolgicos

    localizados mas que apresentavam problemas a nvel das funes mentais superiores

    (Hebb, 1942; Teuber, 1948, citado por Howieson & Lezak, 2006). Esta abordagem

    clssica da neuropsicologia, centrada fundamentalmente no diagnstico, foi dando

    progressivamente lugar a uma abordagem mais compreensiva, centrada na natureza dos

    dfices. De facto, e numa perspetiva multi e interdisciplinar, a neuropsicologia foi

    crescendo ao longo das dcadas (Rizzo & Eslinger, 2004), na tentativa de aprofundar o

    conhecimento da relao existente entre o crebro humano e o comportamento (Kolb &

    Wishaw, 2003; S, 2009) atravs da aplicao de modelos elaborados no mbito da

    psicologia cognitiva.

    Apesar da mudana de objetivos, fruto do desenvolvimento cientfico e tecnolgico, a

    avaliao neuropsicolgica e o desenvolvimento de instrumentos de avaliao

    continuam, ainda hoje, a desempenhar um papel primordial como indicadores de

    diagnstico teis da disfuno cerebral (Bigler, 1999; Farah & Feirberg, 2000; Lezak,

    1995, citado por Howieson & Lezak, 2006). Para alm disso, contribuem para o

    tratamento e a reabilitao, na medida em que, sustentando-se numa anlise quantitativa

    e qualitativa, permitem estudar, compreender e detetar alteraes das funes

    cognitivas, emocionais e comportamentais, fornecendo, deste modo, diretrizes para um

    plano de programas de interveno individualizado, adequado e preciso (Lezak,

    Howieson & Loring, 2004).

    Decorre daqui a importncia de se dispor de testes padronizados e adaptados aos

    diversos meios scio-culturais e lingusticos que permitam no s a identificao de

    foras e de fraquezas em situao de disfuno neurolgica ou de leso cerebral, mas

    tambm a compreenso da natureza dos dfices cognitivos exibidos. Ora, tal finalidade

    requer medidas especficas que atendam s caractersticas do sujeito e que se

    apresentem simultaneamente sensveis a variveis consideradas relevantes no

    processamento da informao, como o caso da idade e da escolaridade. Neste quadro,

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    2

    e dada a escassez de provas de rastreio cognitivo global para o portugus, foi conduzido

    o presente estudo que teve como objetivos construir um instrumento neuropsicolgico

    destinado a adultos que designmos por BACC, Bateria de Avaliao de

    Comprometimento Cognitivo , e avaliar o efeito da idade e da escolaridade no

    processamento cognitivo em sujeitos neurologicamente preservados.

    Concretamente, pretendeu-se desenvolver um instrumento neuropsicolgico de rastreio,

    funcional e de fcil aplicao que, a partir de tarefas curtas e simples, permitisse medir

    o nvel de funcionamento cognitivo em oito reas-chave: a orientao, a ateno, a

    perceo, a memria, a linguagem, o clculo, a praxia (ideomotora e construtiva) e as

    funes executivas. Tendo em considerao a faixa etria privilegiada (adultos com

    mais de 40 anos), pretendeu-se igualmente conceber um instrumento o mais abrangente

    possvel, capaz de ser usado em indivduos de diferentes escolaridades (mesmo

    analfabetos) e com diferentes tipos de debilidade (a nvel motor vs. produo de fala).

    Na verdade, a escassez de instrumentos desta natureza, devidamente adaptados,

    validados ou aferidos, no contexto nacional, por um lado, e a necessidade de se atender

    a especificidades da populao portuguesa (e.g. baixa escolaridade nos idosos), por

    outro lado, impulsionaram fortemente a conduo do presente trabalho.

    Justificao do Estudo

    A necessidade de se dispor de um instrumento com estas caractersticas justifica-se

    desde logo se pensarmos no envelhecimento da populao. De facto, o aumento da

    esperana mdia de vida, associado diminuio da taxa de natalidade, tem estado na

    base do crescente nmero de idosos a que assistimos nas ltimas dcadas e que

    continuaremos a assistir (INE, 2008; OCDE, 2007). Ora, a terceira idade caracteriza-se

    por um conjunto de mudanas fsicas, cognitivas, comportamentais e emocionais que

    podero condicionar os nveis de eficincia e de eficcia do indivduo em diferentes

    domnios. Do ponto de vista cognitivo, as perdas de memria e a diminuio da

    velocidade de processamento da informao constituem duas das principais alteraes

    associadas ao avanar da idade (Jones, 2006). Acresce a estes dfices uma maior

    vulnerabilidade emergncia de perturbaes mentais, de natureza neuropsicolgica,

    onde se destacam os casos demenciais (Kukowski, 2001).

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    3

    De salientar, todavia, que, apesar de associada ao envelhecimento, a demncia constitui

    um problema mdico e social em crescimento que no exclui a possibilidade de ocorrer

    em idades mais precoces (Ribeira, Ramos & S, 2004). Dos vrios tipos de demncia, a

    Doena de Alzheimer a mais comum, contando com mais de 50% dos casos

    demenciais no adulto (Santana, 2005). Trata-se de uma doena degenerativa que se

    caracteriza fundamentalmente pela perda progressiva das capacidades cognitivas, em

    particular, das capacidades mnsicas (Guerreiro, 1998).

    Para alm de fatores como o envelhecimento da populao e a maior suscetibilidade

    destas pessoas a dfices cognitivos e a situaes de demncia, a necessidade sentida

    para a construo da BACC alicerou-se igualmente no nmero elevado de Acidentes

    Vasculares Cerebrais e de Traumatismos Crneo-Enceflicos em idades cada vez mais

    precoces (Correia, 2006; DGS, 2006) e de outras condies mdicas como tumores e

    epilepsias (American Heart Association, 2000; Thurman & Guerrero, 1999, citado por

    Rizzo & Eslinger, 2004). Estas situaes, associadas idade ou a fatores de stress,

    podero limitar seriamente o funcionamento cognitivo do indivduo repercutindo-se

    negativamente na sua qualidade de vida e na dos que o rodeiam.

    A magnitude destes problemas de sade , de facto, uma preocupao mundial, j que

    envolve elevados custos do ponto de vista pessoal, familiar, social e, at, econmico

    (e.g., dor, invalidez, perda de trabalho, sofrimento e rutura familiar, aumento das

    despesas mdicas). Neste quadro, a avaliao neuropsicolgica poder ter um papel

    importante no despiste e na identificao precoce de dfices, fornecendo pistas nicas

    sobre a organizao e o funcionamento da mente humana (ibidem).

    A necessidade de se dispor de instrumentos que avaliem os processos cognitivos e que

    ajudem a esclarecer a arquitetura funcional da mente humana , deste modo, inegvel.

    nesta assumpo que ao longo das ltimas dcadas se tem assistido a um aumento

    considervel de tarefas e de provas neuropsicolgicas, bem como a uma crescente

    preocupao com a garantia das respetivas qualidades psicomtricas. Apesar desta

    tendncia, subsiste ainda alguma dificuldade em encontrar testes aferidos, com dados

    normativos tendo em considerao variveis importantes como a idade e a escolaridade.

    A ausncia de instrumentos com estas caractersticas levanta problemas metodolgicos

    (Guerreiro, 1998), relacionados quer com a validade e a fidelidade da avaliao, quer

    com a interpretao de dados (Benton & Sivan, 1984, citado por Guerreiro, Castro-

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    4

    Caldas, Reis & Garcia, 1996). No caso do contexto portugus, a avaliao

    neuropsicolgica ainda muito escassa, o que reforou ainda mais a motivao para a

    conduo do presente estudo (no havendo, todavia, a pretenso de aferir a BACC e de

    apresentar dados normativos).

    Para alm disso, os poucos instrumentos disponveis para o portugus nem sempre

    dispem de dados normativos tendo em considerao as caractersticas da populao

    portuguesa em termos da sua instruo. Ora, dado os elevados nveis de iliteracia e de

    analfabetismo (Benavente, 1996; Lima Santos & Gomes, 2004) torna-se necessrio o

    recurso a instrumentos que permitam determinar com maior rigor as dificuldades

    sentidas e manifestadas por pessoas. A ausncia de conhecimento sobre a linguagem

    escrita condiciona frequentemente as avaliaes, podendo at influenciar o resultado

    obtido em vrios testes neuropsicolgicos, sobretudo, os que incluem contedos

    aritmticos, visuo-construtivos e lingusticos (Reis, Guerreiro & Petersson, 2003).

    Segundo Lezak e colaboradores (2004), por exemplo, os analfabetos tendem a

    manifestar dificuldades em realizar tarefas como a construo dos pentgonos e podero

    no conseguir pegar e utilizar corretamente um lpis. Neste quadro, necessrio dispor-

    se de provas alternativas, que no dependam, dentro do possvel, de fatores

    educacionais e culturais.

    Acresce, ainda, a necessidade de se dispor de uma variedade de instrumentos que

    avaliem os mesmos construtos, de modo a evitar ou minimizar os efeitos de prtica,

    muitas vezes visveis nas reavaliaes neuropsicolgicas para analisar a mudana de

    desempenho ao longo do tempo ou a eficcia de um determinado programa de

    interveno (Halligan, Kischka & Marshall, 2003). Um efeito de prtica ocorre quando

    o paciente realiza pela segunda, terceira ou quarta vez o mesmo teste, apresentando

    assim melhorias no a nvel das suas capacidades cognitivas mas dado o grau de

    familiaridade com os materiais usados ou com a exigncia dos mesmos.

    neste contexto que surge o presente estudo, que pretende contribuir, ainda que

    modestamente, para a avaliao neuropsicolgica em portugus. Sem a pretenso de se

    avaliar exaustivamente cada uma das funes cognitivas, foi nosso objetivo conceber

    uma bateria de rastreio, relativamente breve, que permitisse determinar as reas

    deficitrias, levantar hipteses diagnsticas e dar pistas de reabilitao. O seu

    desenvolvimento teve como racional terico a perspetiva da neuropsicologia cognitiva.

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    5

    Neuropsicologia Cognitiva

    Assente numa perspetiva multidisciplinar e ancorada em disciplinas como a neurologia,

    a neuropsiquiatria, a anatomia, a biologia e a psicologia, entre outras, a neuropsicologia

    dedica-se a investigar de que forma diferentes leses cerebrais causam dfices em

    diversas funes mentais superiores (Manning, 2008; Portellano, 2005; S, 2009).

    Trata-se de um ramo da psicologia que estuda as bases biolgicas do comportamento

    (Junqu & Barroso, 2001).

    Historicamente, a neuropsicologia traou como objetivo central o estudo da expresso

    comportamental da disfuno cerebral (Lezak et al., 2004), enfatizando, por

    conseguinte, o papel desempenhado pelo sistema nervoso nas atividades psicolgicas

    humanas (Maia, Correia & Leite, 2009). Na ausncia de tcnicas sofisticadas de

    visualizao do crebro, esta cincia recorria avaliao neuropsicolgica como meio

    de elaborar um diagnstico e de fornecer pistas sobre quais as reas cerebrais afetadas e

    quais as intactas (Goldstein & McNeil, 2004; Rao, 1996).

    Com os avanos tecnolgicos que se fizeram sentir nas ltimas dcadas, em particular

    na rea da imagiologia cerebral, esta perspetiva clssica da neuropsicologia deixa de ser

    prioritria, passando-se de uma cincia de diagnstico para uma cincia sem

    sndromes, preocupada fundamentalmente com a compreenso da natureza dos

    dfices (mais do que com a sua categorizao). Emerge, assim, a neuropsicologia

    cognitiva que, atravs da aplicao de modelos tericos da psicologia cognitiva, procura

    descrever e explicar os mecanismos subjacentes aos dfices (Ellis & Young, 1996;

    Rapp, 2000; Gazzaniga, Ivry & Mangun, 2002, citado por Capovilla, 2007).

    Atravs do estudo dos padres comportamentais de pacientes com leso cerebral, a

    neuropsicologia cognitiva tem o potencial de contribuir para a compreenso do

    funcionamento da mente, de permitir um conhecimento mais aprofundado dos

    problemas existentes e de facilitar o delineamento de intervenes adequadas

    (Kristensen, Almeida & Gomes, 2001; Manning, 2008; Portellano, 2005). Como nos diz

    Coltheart (1986, citado por Ellis & Young, 1996) e Ellis (1983, citado por Ellis &

    Young, 1996), a nfase passa a ser colocada na explicao do desempenho cognitivo,

    alterado e intacto, de indivduos com disfuno neurolgica e na respetiva interpretao

    no mbito de uma teoria ou de um modelo de funcionamento cognitivo normal. A

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    neuropsicologia cognitiva prope-se, deste modo, a compreender a natureza dos dfices

    exibidos, no se centrando apenas na simples descrio dos sintomas apresentados ou na

    mera classificao do indivduo em relao a um grupo (Halligan, Kischka & Marshall,

    2003; Lezak et al., 2004).

    Esta nova abordagem mente humana e sua arquitetura em situao de leso cerebral

    tem constitudo um verdadeiro desafio para aqueles que a tentam explicar e

    compreender (Kolb & Wishaw, 2003). Regido por atividades minuciosamente

    orquestradas, o sistema mental obedece a uma organizao modular constituda por

    mltiplos processadores ou mdulos cognitivos (Ellis & Young, 1996).

    Esta hiptese da modularidade um princpio fundamental da neuropsicologia que,

    decorrente em grande parte dos trabalhos de Marr (1976;1982, citado por Ellis &

    Young, 1996) e Fodor (1983), pe em evidncia a independncia funcional dos

    diferentes processadores de informao ou mdulos. De acordo com esta hiptese, o

    desenvolvimento ou o prejuzo de alguns destes mdulos no afeta a totalidade do

    sistema mental, j que cada um deles apresenta especificidade de domnio, ou seja,

    processa informaes especficas.

    Exemplificando, haver um conjunto de mdulos responsveis por vrios aspetos de

    reconhecimento facial, outro para reconhecer as palavras escritas, um terceiro conjunto

    encarregue da orientao espacial no meio geogrfico e assim por diante (Ellis &

    Young, 1996). Decorre daqui que uma determinada leso cerebral pode levar a uma

    alterao especfica mas no genrica do funcionamento cognitivo (Fernandes, 2003,

    citado por Manning, 2008), uma vez que pode afetar alguns mdulos deixando ao

    mesmo tempo outros mdulos intactos (da que o paciente pode, por exemplo,

    apresentar dificuldades a nvel de reconhecimento facial aps leso cerebral sem

    necessariamente tal leso afetar as capacidades de leitura; Ellis & Young, 1996).

    De sublinhar, todavia que, dada a interdependncia modular, a existncia de mdulos

    intactos nem sempre garante um funcionamento dentro dos parmetros esperados. Na

    verdade, um mdulo A, que estabelea conexes com um mdulo B transmitindo-lhe

    informaes, ao ser danificado em resultado da leso cerebral vai afeta-lo

    inevitavelmente. Mesmo que o mdulo B se encontre preservado e trate a informao

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    nos moldes habituais no poder chegar ao resultado esperado, visto que a informao

    que lhe chega se encontra comprometida (Manning, 2008).

    Neste quadro, e na senda de Shallice (1984, citado por Ellis & Young, 1996), torna-se

    importante dispor de tarefas que avaliem separadamente os diferentes mdulos de

    processamento cognitivo, de modo a permitir identificar e compreender quais as funes

    cognitivas afetadas e quais as intactas. esta identificao dos mdulos comprometidos

    mais do que a dificuldade ou o sintoma exibido que permitir elaborar programas de

    reabilitao especificamente direcionados para o problema-alvo.

    Funes Cognitivas

    O crebro no cognitivamente simtrico e embora alguns processos cognitivos estejam

    distribudos em ambos os hemisfrios cerebrais, outros encontram-se lateralizados em

    um dos hemisfrios (Halligan, Kischka, & Marshall, 2003). De acordo com a literatura

    especializada, a orientao, a ateno, a memria e as funes executivas apresentam

    uma base neurolgica distribuda, no se encontrando estritamente localizadas em uma

    s regio hemisfrica. Por conseguinte, o seu comprometimento aparece frequentemente

    associado existncia de leses cerebrais extensas e bilaterais (Hodges, 1994; Lezak et

    al., 2004).

    J as restantes funes cognitivas encontram-se lateralizadas em regies especficas de

    um dos hemisfrios. O hemisfrio dominante o esquerdo na maioria dos casos

    encontra-se especializado nas funes da linguagem, do clculo e da praxia ideomotora

    enquanto o no-dominante responsvel pelo processamento da informao visual (a

    nvel percetivo e de reconhecimento) e pela praxia construtiva (ibidem).

    As funes cognitivas podem ser, assim, distribudas ou localizadas, envolvendo

    relaes neuroanatmicas especficas, de tipo estrutural e funcional (Stirling & Elliot,

    2008). Ora, so estas relaes que sustentam o processamento da informao permitindo

    um funcionamento autnomo, mas interdependente e coordenado entre si, de uma fina

    rede de processos e de mdulos cognitivos.

    O processamento da informao depende, desde logo, do grau de conscincia de

    referentes essenciais, como o eu, o tempo e o espao, que balizam o conhecimento que

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    temos de ns e do mundo e que contribuem para dar sentido e significao s nossas

    experincias e aos nossos comportamentos, aes e pensamentos. Esta capacidade que

    designamos por orientao uma funo mental que depende da integrao de outros

    processos cognitivos como a ateno a perceo e a memria, e que envolve a

    conscincia de dimenses fundamentais (do meio e de ns prprios) para a nossa

    existncia (Lezak et al., 2004). Das vrias dimenses que a constituem, os instrumentos

    de avaliao neuropsicolgica privilegiam a orientao pessoal, a orientao temporal e

    a orientao de lugar (ibidem). Estas trs dimenses da orientao so aquelas que nos

    permitem, respetivamente, ter conscincia da nossa prpria identidade e da nossa

    localizao no tempo e no meio que nos rodeia.

    No entanto, para alm das dimenses acima referidas tambm possvel identificar

    outros tipos especficos de orientao, designadamente, a orientao espacial, relativa

    localizao dos objetos e s capacidades de estimar distncias e de rotao mental, a

    orientao corporal, referente ao corpo do indivduo, e a orientao direita-esquerda,

    que consiste na capacidade de processar informao relativa aos lados direito e esquerdo

    de si, do outro e do espao.

    Intimamente relacionada com a orientao encontra-se a ateno, uma parte integrante

    e elementar da atividade sensorial, da perceo e da memria, que consiste num

    processo complexo de mltiplas operaes mentais que se apresentam essenciais para a

    seleo e tratamento de estmulos externos e internos (input). O processamento da

    informao depende, pois, num primeiro momento, de dirigirmos a ateno para um

    determinado estmulo de modo a o podermos analisar at tomada de deciso, que

    originar a nossa resposta ou ao/comportamento. Trata-se, pois, de um construto que

    nos remete para duas dimenses fundamentais: a seletividade e a intensidade (Castro-

    Caldas, 2000).

    Relativamente dimenso da seletividade, a ateno pode ser classificada de seletiva

    (tambm designada de focalizada ou focada), quando nos permite concentrar num s

    estmulo (em detrimento dos demais), ou de dividida, quando nos permite processar

    mais do que um estmulo em simultneo. Quando se considera a intensidade, a ateno

    classificada de sustentada (ou mantida), referindo-se capacidade para manter o

    mesmo nvel de ativao durante todo o tempo necessrio para o processamento de um

    determinado estmulo ou para a realizao de uma determinada tarefa (ibidem). O

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    estado de viglia ou de alerta igualmente uma dimenso relativa intensidade

    atencional (ibidem).

    A ateno remete, ainda, para mecanismos de mudana do foco atencional (shifting, no

    original), que nos permite alternar a concentrao entre estmulos, bem como para a

    capacidade atencional, relacionada com a quantidade de informao analisada em

    simultneo, para o controlo mental, relativo capacidade de exercer operaes mentais

    sobre essa informao, e para a velocidade com que essa informao processada.

    Aps dirigirmos a ateno para um ou mais estmulos, so ativados mecanismos

    percetivos com o objetivo de os captar e de os analisar. Estes mecanismos que integram

    a perceo dizem respeito interpretao e ao reconhecimento de estmulos sensoriais,

    em termos dos respetivos traos fsicos e estruturais (Stirling & Elliot, 2008).

    A nvel da fala, a perceo remete, num primeiro nvel, para capacidades de

    discriminao de fonemas e de propriedades acsticas e prosdicas e, num segundo

    nvel, para capacidades de segmentao da cadeia sonora e de reconhecimento de

    sequncias fonolgicas como sendo palavras que integram o vocabulrio de uma lngua.

    Por sua vez, a perceo visual envolve a capacidade de discriminar as caractersticas dos

    objetos e das imagens, em termos de dimenses relacionadas com a profundidade, o

    movimento, a forma ou padro, o tamanho e a cor, entre outros. Trata-se de uma anlise

    que incide nas qualidades fsicas e estruturais do objeto e que se assume fundamental

    para o seu reconhecimento e posterior compreenso e nomeao. J quando os

    estmulos visuais so palavras escritas, o seu processamento implica, num primeiro

    momento, a identificao categorial das letras, e, num segundo momento, a

    identificao dessas sequncias ortogrficas como representando palavras de uma

    determinada lngua (observando-se, assim, o reconhecimento lexical). S aps o

    reconhecimento da palavra escrita possvel aceder ao seu significado armazenado em

    memria (Kay, Lesser & Coltheart, 1992, citado por Coltheart, 2001).

    A memria uma funo cerebral complexa que se assume como uma componente

    essencial de quase todos os domnios cognitivos, uma vez que permite registar,

    codificar, armazenar, consolidar, reter, reconhecer, evocar e recordar a informao ou

    experincias anteriormente aprendidas, sendo, na sua globalidade, uma capacidade

    adaptativa fundamental do crebro (Lezak et al., 2004; Manning, 2008; cf. Tulving &

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    Craik, 2000). Como nos diz Pinto (2004), memorizar, e consequentemente aprender,

    implica trs mecanismos bsicos: a aquisio (codificao), a reteno (armazenamento)

    e a recuperao (recordao).

    A aquisio est associada capacidade de codificar a informao, sendo varivel

    consoante o tipo de estmulos (verbal ou visual, por exemplo). esta codificao que

    permite a passagem para o estdio seguinte o do armazenamento , em que o crebro,

    tal como um computador, organiza a informao em ficheiros temticos e procede

    automaticamente ao seu arquivo temporrio ou a longo-prazo (Nunes, 2008). J o

    mecanismo da recordao diz respeito ao processo que permite aceder informao

    previamente armazenada, acesso este que poder ocorrer de modo espontneo, atravs

    de pistas ou ajudas ou atravs do reconhecimento (capacidade que consiste em

    considerar se um determinado evento ou no familiar, a partir da confrontao do

    mesmo com as informaes em memria).

    Uma das distines mais importantes dos sistemas de memria ancora-se no critrio

    temporal, dividindo a memria em memria a curto-prazo e memria a longo-prazo.

    Enquanto a primeira mantm transitoriamente uma informao consciente do presente

    (imediato), a segunda permite reter e conservar a informao passada bem como os

    projetos futuros. So, pois, sistemas que diferem entre si quanto capacidade, ao

    perodo de tempo que dispem para armazenar informao e aos processos de

    funcionamento (codificao).

    A memria a curto-prazo uma memria transitria, com uma capacidade bastante

    limitada e que apenas permite conservar a informao por breves segundos. De acordo

    com Atkinson e Schiffrin (1968, citado por Stuart-Hamilton, 2002), a informao ao dar

    entrada na memria a curto-prazo dura cerca de 10 a 20 segundos sem necessidade de

    renovao atravs da repetio, sendo posteriormente esquecida ou enviada para a

    memria a longo-prazo. Trata-se, pois, de uma memria que tem como funo reter

    temporariamente uma informao com vista ou realizao de uma tarefa imediata ou a

    um registo mais duradouro e definitivo. Esta memria definida de memria primria

    quando a sua funo exclusivamente de armazenamento, ou de memria de trabalho

    (ou memria operatria), quando, para alm do armazenamento, se observa a

    manipulao da informao (Baddeley, Eysenck & Anderson, 2009).

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    J a memria a longo-prazo uma forma de registo mnsico mais consolidada e

    permanente, capaz de reter uma quantidade ilimitada de informao que pode durar toda

    a vida (Manning, 2008). De acordo com o modelo mono-hierrquico e piramidal de

    Tulving (1985; cf. Tulving & Craik, 2000), a memria a longo-prazo divide-se em

    memria procedimental, relativa s habilidades percetivas e motoras que se encontram

    automatizadas e sobre as quais temos pouca ou nenhuma conscincia, em memria

    semntica, relativa ao conhecimento enciclopdico que temos sobre o mundo, e a

    memria episdica, auto-biogrfica, que se reporta s nossas experincias e vivncias

    no tempo e no espao.

    A linguagem igualmente uma componente importante da cognio humana, complexa

    e especializada, que funciona como um processo interativo entre o pensamento e o

    mundo externo (Harley, 2008) e que permite, entre outras funes, comunicar. Trata-se

    de uma faculdade psicolgica, de um rgo mental nas palavras de Chomsky (1965),

    que se concretiza geralmente pelo uso da fala.

    Ocorrendo praticamente sem esforo e, na maioria das vezes, de modo eficaz e

    eficiente, o uso da linguagem remete para dois modos-chave o modo expressivo ou

    produo e o modo recetivo ou compreenso que se concretizam atravs de dois meios

    o meio oral e o meio escrito (Castro, Cal & Gomes, 2007). So estes modos que,

    incidindo nas representaes mentais das palavras armazenadas em memria, nos

    permitem falar, repetir, nomear, ouvir, ler e escrever.

    Decorre daqui um conjunto de processos mentais complexos que, incidindo sobre

    smbolos (i.e., as palavras), permitem o reconhecimento, a compreenso e a produo de

    mensagens com sentido. Estes processos operam sobre a gramtica de uma lngua,

    assentando, deste modo, nos conhecimentos fonolgico, lexical, semntico,

    morfolgico, sinttico e pragmtico. O uso da linguagem apela, assim, ao conhecimento

    do inventrio dos fonemas de uma lngua, ao modo como estes se organizam e

    combinam entre si e s respetivas estruturas prosdicas (processos fonolgicos),

    traduo das representaes lingusticas em realizaes articulatrias (processos

    fonticos), ao conhecimento da configurao e das propriedades das palavras (processos

    morfolgicos) e ao conhecimento das regras que regulam a ligao das palavras nas

    frases (processos sintticos). Na base destes processos encontra-se o conhecimento

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    lexical e o conhecimento semntico que se reportam, respetivamente, palavra

    propriamente dita e ao seu significado.

    Este conhecimento das diferentes caractersticas ou dimenses da linguagem encontra-

    se armazenado no lxico mental em mdulos autnomos e interdependentes, pelo que

    podero ser seletivamente afetados aquando de uma leso cerebral (Kay et al., 1992

    citado por Coltheart, 2001). Estes mdulos diferem entre si no s quanto ao tipo de

    informao que contm mas tambm quanto aos processos que sobre essa informao

    recai (uns mais passivos, de procura de informao, e outros mais ativos, de gerao de

    informao).

    Assim, h mdulos responsveis por conter representaes mentais relativas ao modo

    como as palavras se pronunciam (lxico fonolgico), se escrevem (lxico ortogrfico) e

    o que significam (sistema semntico). H ainda mdulos responsveis pela converso

    do sinal acstico em fonemas (converso acstico-fonolgica) e pela converso dos

    sons em letras e vice-versa (converso fonema-grafema e converso grafema-fonema,

    respetivamente). o funcionamento coordenado destes mdulos que nos permite falar

    espontaneamente, repetir fala, compreender o que nos dizem, nomear objetos, ler e

    escrever (Harley, 2008).

    Intimamente relacionada com a linguagem encontra-se o clculo, uma dimenso que

    assume uma importncia fundamental no dia-a-dia. Em termos simplificados, o clculo

    corresponde capacidade de operar sobre os nmeros e sobre os quatro smbolos

    bsicos matemticos (+, -, : e x; Lezak et al., 2004). Realizado mentalmente ou

    em suporte de papel, esta funo cognitiva apela a conhecimentos e a processos

    especficos, que vo desde a habilidade de reconhecer, compreender e reproduzir os

    nmeros adequadamente at habilidade de manipulao numrica e de realizao de

    operaes matemticas simples e complexas (Hodges, 1994). Esta habilidade de

    manipulao dos nmeros engloba, num nvel mais bsico, a realizao de operaes de

    adio, subtrao, diviso e multiplicao, e, num nvel mais avanado, a traduo de

    problemas formulados verbalmente em procedimentos aritmticos e a traduo de

    procedimentos matemticos em formulaes lingusticas, entre outros.

    A praxia outra componente do sistema cognitivo que permite a execuo de

    movimentos ou de sequncias de movimentos simples e complexos, execuo esta que

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    apresenta uma relativa independncia dos sistemas sensoriais e motor. Em termos mais

    especficos, diz respeito capacidade de realizar atos motores voluntrios, aprendidos, e

    que tm uma determinada finalidade, como comer, vestir, assobiar, apertar os

    atacadores, abotoar, falar, escrever e desenhar (Stirling & Elliot, 2008).

    Dos vrios tipos de praxia, destaca-se a praxia ideomotora e a praxia construtiva. A

    praxia ideomotora consiste na capacidade de realizar, de modo espontneo, movimentos

    intencionais por comando. Esta capacidade de execuo do ato motor, quer em situao

    de gesto quer em situao de uso de objetos, envolve habilidades de seleo, de

    sequenciao e de orientao espacial. J a praxia construtiva diz respeito capacidade

    de copiar desenhos e de manipular objetos para formar padres ou construes. Trata-

    se, pois, de uma faculdade complexa que combina a perceo visual com uma resposta

    motora e inevitavelmente com uma componente espacial (Lezak et al., 2004).

    Por fim, as funes executivas agrupam um conjunto de atividades cognitivas

    responsveis pela resoluo de problemas complexos e pela regulao do

    comportamento (Halligan et al., 2003). So funes superiores que assumem um papel

    determinante para uma resposta eficaz e adaptada a novas situaes, estando na base da

    adoo de uma conduta eficiente, criativa e socialmente aceite.

    Constituem, segundo Lezak et al. (2004), o alicerce das vrias funes cognitivas e

    compreendem quatro componentes fundamentais: a volio, o planeamento, a ao

    intencional e o desempenho efetivo. A volio diz respeito capacidade de formular

    metas e objetivos de modo intencional, e requer fundamentalmente que o indivduo

    tenha conscincia de si prprio e do meio e se encontre motivado para o efeito. Por sua

    vez, o planeamento remete para a capacidade de elaborar, de organizar e de prever aes

    que permitam a persecuo dos objetivos inicialmente traados. A tomada de deciso, o

    desenvolvimento de estratgias, o estabelecimento de prioridades e o controlo de

    impulsos adquirem aqui um papel importante para o sucesso desta etapa.

    J a ao intencional tem lugar aquando da concretizao propriamente dita do plano

    inicialmente estabelecido, atravs da gerao de um determinado comportamento ou

    resposta. As capacidades de iniciao, de manuteno ou, pelo contrrio, de interrupo

    assumem-se fundamentais nesta etapa. A estas capacidades junta-se a flexibilidade

    mental, uma funo cognitiva igualmente relevante, em particular em situaes que

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    requeiram eventuais mudanas ou modificaes das estratgias adotadas. Finalmente, o

    desempenho efetivo diz respeito s capacidades de auto-monitorizao, de auto-

    regulao e de auto-correo, bem como a outros aspetos qualitativos do

    comportamento e da ao como o caso do controlo e da gesto do tempo, entre outros.

    O funcionamento integrado e coordenado destas quatro componentes apela, em maior

    ou menor grau, s funes cognitivas descritas anteriormente, em particular, a nvel da

    ateno e da memria de trabalho. Para alm disso, faz uso de outras capacidades

    mentais especficas, como o caso das capacidades de raciocnio e de abstrao, de

    planeamento, de iniciao de comportamento e de inibio de resposta.

    Funes Cognitivas em Funo da Idade e da Escolaridade

    inegvel o papel que a idade desempenha no curso evolutivo das funes cognitivas.

    Os primeiros anos de vida assumem-se fundamentais e determinantes para o

    desenvolvimento destas capacidades e competncias. Na presena de um meio rico e

    estimulante e na ausncia de problemas neurolgicos, a criana encontra assim as

    condies para um desenvolvimento harmonioso do seu sistema mental a par da

    maturao do Sistema Nervoso. Trata-se de um desenvolvimento progressivo que

    culmina na adolescncia, fase do ciclo vital em que as principais aquisies se

    encontram concludas e em que se comea a observar uma menor plasticidade cerebral.

    Apesar de a adolescncia ser considerada o marco cronolgico que assinala o fim do

    perodo crtico em resultado da menor plasticidade cerebral que se observa nesta etapa

    (Lenneberg, 1967), os progressos cognitivos vo continuar a desenvolver-se, a

    aperfeioar-se e, at, a automatizar-se durante a vida adulta, fruto do conhecimento que

    se vai obtendo, das experincias que se vo vivenciando e do treino que se vai

    praticando (Sousa, Figueiredo & Cerqueira, 2004). No entanto, com o avanar da idade

    comeam a observar-se mudanas fsicas, cognitivas, comportamentais e emocionais,

    algumas das quais associadas a um declnio ou perda de capacidades. Como nos diz

    Stuart-Hamilton (2002), o envelhecimento repercute-se a nvel biolgico, social e

    psicolgico.

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    15

    Segundo Almeida (2006), medida que envelhecemos o crebro vai evidenciando uma

    atrofia global, observando-se uma reduo no seu volume de cerca de 15% entre os 20 e

    os 90 anos de idade, em particular nos plos frontais e nas regies temporais antero-

    superiores. Ora, esta diminuio do peso do crebro pode afetar negativamente o

    funcionamento psicolgico do indivduo (Stuart-Hamilton, 2002), atravs de um

    decrscimo de funes cognitivas especficas (Marchand, 2005).

    De acordo com a literatura especializada, as principais alteraes cognitivas associadas

    ao envelhecimento dizem respeito ateno, memria, capacidade de aprendizagem,

    capacidade percetiva e espacial, resoluo de problemas, velocidade de

    processamento e s funes executivas (Almeida, 2006; Nunes, 2008).

    As dificuldades percetivas prendem-se, desde logo, com o declnio sensorial que se

    observa com o aumento da idade. Problemas visuais trazem consigo uma maior

    dificuldade e uma maior lentido no processamento de estmulos visuais, exigindo

    pessoa idosa que os olhem por mais tempo antes de os identificarem com preciso

    (Walsh, 1982, citado por Stuart-Hamilton, 2002). Problemas auditivos, como o caso

    da presbiacusia, dificultam a discriminao e a perceo de sons da fala, em particular,

    de sons agudos como as fricativas (Almeida, 2006).

    Para alm da perceo, e segundo Rabbitt (1979, citado por Stuart-Hamilton, 2002), a

    ateno seletiva poder sofrer igualmente o efeito deletrio da idade, principalmente

    quando esta envolve estmulos visuais, exigindo mais tempo de processamento nos

    indivduos mais velhos. Quanto ateno dividida, parece no haver diferenas entre os

    mais novos e os mais velhos quando se trata de tarefas simples (Simes, 2006); j em

    tarefas mais complexas, observa-se uma desvantagem no processamento de dois

    estmulos em simultneo nas pessoas idosas em resultado da sua menor velocidade de

    processamento (Vaneste & Pouthas, 1999, citado por Stuart-Hamilton, 2002).

    O mesmo padro de resultados se observa quando se considera a ateno sustentada, a

    mudana de ateno, a capacidade atencional e o controlo mental: as pessoas mais

    velhas tendem a obter um pior desempenho do que as mais jovens, quer quando se trata

    de estmulos visuais quer auditivos (Rogers, 2000; McDowd & Shaw, 2000; Morrow &

    Miller, 1999, citado por Stuart-Hamilton, 2002).

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    16

    Tal como a ateno, tambm a memria afetada pelo avanar da idade. Verifica-se

    que, no que respeita aprendizagem, h tendncia por parte dos mais velhos a uma

    assimilao mais lenta da informao, bem como uma dificuldade acrescida nas

    capacidades de organizao, de armazenamento e de utilizao de dados (Balota, Dolan

    & Duchek, 2000). Este declnio da capacidade de aprender com o aumento da idade

    tinha sido j observado no estudo de Berlim (Baltes & Mayer, 1999, citado por Stuart-

    Hamilton 2002), que alertou para o facto de tal resultado no significar uma total

    incapacidade de aprendizagem. Na verdade, a maioria dos sujeitos que participaram

    nesse estudo conseguiram aprender algo, melhorando a sua aprendizagem. Como nos

    diz Atchley (2000, citado por Simes, 2006) embora a performance na aprendizagem

    tenda a declinar com a idade tal declnio no substancial at depois dos 70 anos (p.

    57).

    Relativamente memria de trabalho, Nunes (2008) refere que as diferenas associadas

    idade no so muito evidentes na realizao de tarefas simples de span, uma vez que

    estas exigem apenas a reteno de informao no sistema mnsico, sendo, todavia,

    notrias em tarefas mais complexas que implicam um processamento mais ativo de

    informao para alm da reteno.

    Para alm da memria a curto-prazo (imediata), tambm a memria a longo-prazo

    (fixao), em particular, a episdica, afetada pela idade. De facto, as pessoas mais

    velhas apresentam dificuldades na memorizao de nova informao e na evocao de

    registos armazenados mentalmente (Almeida, 2006; Berger & Mailloux-Poirier, 1995;

    Nunes, 2008).

    Quanto s Funes Executivas, e de acordo com Berger e Mailloux-Poirier (1995),

    verifica-se que as pessoas mais velhas apresentam uma maior dificuldade na utilizao

    de novas estratgias, uma maior rigidez de pensamento (pensamento mais concreto do

    que abstrato), uma maior tendncia para manter velhos hbitos e uma diminuio da

    criatividade em certos domnios. H igualmente uma tendncia para se violar as regras e

    para se aumentar o nmero de movimentos necessrios resoluo de uma determinada

    tarefa (como o caso do teste da Torre de Hanoi usado para avaliar o planeamento;

    Parente et al., 2000, citado por Parente, 2006). Ou seja, o funcionamento executivo que

    permite organizar e monitorizar comportamentos e que permite gerar solues perante

    problemas apresenta igualmente um decrscimo global com o aumento da idade. De

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    17

    salientar que as dificuldades executivas tornam-se mais evidentes quando exigida a

    coordenao de mltiplas operaes cognitivas (Nunes, 2008).

    Para alm da Idade, tambm a Escolaridade desempenha um papel crucial no

    processamento cognitivo. De um modo geral, quanto mais elevada for a escolaridade do

    indivduo, melhor o seu desempenho em tarefas neuropsicolgicas. Tal resultado

    decorre do facto de a instruo gerar diferenas nas estratgias cognitivas empregues

    por cada sujeito, o que por sua vez interage com outras variveis demogrficas,

    condies scio-econmicas e culturais, nvel intelectual e fatores ambientais (Foss,

    Vale & Speciali, 2005).

    Na verdade, pessoas escolarizadas adquirem habilidades para organizar e processar

    informaes de maneira mais eficiente em comparao com pessoas analfabetas (Luria

    1976; Morris et al., 1999, citado por Reis, Guerreiro & Petersson, 2003). O nvel de

    literacia e educao influencia, por conseguinte, o resultado obtido em vrios testes

    neuropsicolgicos, sobretudo os que incluem contedos aritmticos, visuo-construtivos

    e lingusticos (Reis et al., 2003). Estes resultados indicam que a aquisio da leitura e da

    escrita representa vantagem para os grupos mais letrados (Foss, Vale & Speciali, 2005).

    Em termos da linguagem, os analfabetos tendem a apresentar dificuldades a nvel da

    compreenso da linguagem, da repetio de palavras e da nomeao de imagens

    (Rosselli, 1990, citado por Caldas, Reis & Guerreiro, 1997). Tambm nas tarefas de

    clculo os analfabetos tm mais dificuldade na sua realizao principalmente a nvel de

    multiplicao e diviso (Reis et al., 2003).

    Apesar da relao direta entre linguagem e escolaridade, o efeito desta ltima estende-se

    a outras funes cognitivas. No caso da orientao, e como nos dizem Caldas, Reis e

    Guerreiro (1997), os sujeitos analfabetos evidenciam algumas dificuldades,

    principalmente na orientao de lugar, na orientao direita-esquerda e na orientao

    corporal (em particular na nomeao de dedos).

    Tambm a memria, em particular a memria a longo-prazo, significativamente

    afetada pelo nvel de escolaridade (Reis et al., 2003), com vantagem para os sujeitos

    mais instrudos. Este efeito da escolaridade sobretudo evidente na memria semntica

    e no tanto na memria episdica, como acontece quando se considera o efeito da idade.

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    18

    Por fim, relativamente s funes executivas, os indivduos de baixa escolaridade

    tendem igualmente a apresentar mais dificuldades na sua resoluo de tarefas que

    envolvem planeamento e raciocnio, bem como capacidades de iniciativa e de

    monitorizao de resposta, como o caso das tarefas de labirintos, de categorizao de

    figuras e de fluncia verbal (Guerreiro, 1998).

    Avaliao Neurocognitiva

    A avaliao neuropsicolgica assume um papel relevante no estudo e na compreenso

    do indivduo, fornecendo no s informao quanto ao desempenho nos diversos

    domnios cognitivos avaliados, mas tambm pistas essenciais para a implementao de

    programas de reabilitao adequados problemtica em anlise (S, 2009). Para

    cumprir com este propsito so necessrios instrumentos de avaliao adequados ao que

    se pretende medir, devidamente estudados e fundamentados. Isto , so necessrios

    instrumentos que tenham em considerao os objetivos e as necessidades da avaliao, a

    relevncia dos construtos e as dimenses em anlise, bem como os parmetros

    psicomtricos e as caractersticas dos sujeitos a avaliar (Almeida, Gonalves & Simes,

    1995).

    A seleo dos testes depende, desde logo, do pedido formulado, da cooperao e das

    caractersticas do indivduo a ser examinado e da existncia de respetivas normas

    (Boake, 2008). O examinador pode optar por baterias de testes mais extensas e

    complexas ou por testes mais breves e de rastreio: enquanto os primeiros examinam de

    modo mais detalhado as funes cognitivas, os segundos fornecem uma impresso

    global do estado mental do indivduo.

    Sendo de aplicao muito rpida, o uso de testes de rastreio em situaes de fase aguda

    ou para uma primeira impresso clnica poder ser vantajoso. Apesar de pouco

    abrangentes e, consequentemente, pouco informativos (Guerreiro, 1998), permitiro dar

    pistas sobre quais os domnios que devero ser aprofundadamente examinados. Na

    verdade, uma avaliao de screening ou de rastreio tem um papel fundamental na

    avaliao neuropsicolgica pois permite identificar indivduos em risco, que necessitem

    futuramente de uma avaliao diagnstica compreensiva (Lezak et al., 2004). Decorre

    daqui que os instrumentos de rastreio devero ser complementados com testes

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    19

    neuropsicolgicos adicionais, que constituem um conjunto mais exaustivo de medidas

    que explorem mais detalhadamente o funcionamento cognitivo (Guerreiro, 1998).

    Idealmente, ambos os instrumentos rastreio ou especfico/detalhado , devem dispor

    de dados normativos que ajudem na identificao e na compreenso da natureza dos

    dfices exibidos. Apesar de a avaliao neurocognitiva ter de considerar o nvel de

    funcionamento pr-mrbido do indivduo em observao, a padronizao dos testes

    assume-se importante para o estabelecimento de perfis cognitivos antes, durante e/ou

    aps tratamento, bem como para a elaborao do diagnstico diferencial (Spreen, 1998,

    citado por Azambuja, 2007).

    Na verdade, a inexistncia de dados normativos levanta problemas a nvel metodolgico

    (Guerreiro, 1998), relacionados com a validade e a fidelidade da avaliao e com a

    interpretao de dados (Benton & Sivan, 1984, citado por Ellis & Young, 1996;

    Guerreiro, 1998). De sublinhar, ainda, que estes dados normativos devem ter em

    ateno variveis demogrficas como a idade e o nvel de educao do indivduo j que

    as mesmas, como vimos, influenciam significativamente o desempenho do sujeito

    (Yudofsky & Hales, 2006).

    De facto, a literatura parece ser concordante quanto influncia que o nvel de literacia

    parece exercer no processamento da informao (Reis, Guerreiro & Petersson, 2003).

    Exemplificando, e como j foi referido anteriormente, segundo Lezak et al. (2004), os

    analfabetos demonstram dificuldades em realizar tarefas como a construo dos

    pentgonos presentes no Mini Mental State Examination (MMSE) e podero at

    apresentar dificuldades para pegar e utilizar um lpis. Tais exemplos reforam a

    necessidade de se dispor de dados normativos por grupos de idade e por nveis de

    escolaridade de modo a evitar a elaborao de hipteses de diagnstico erradas

    (Bergquist & Malec, 2002; Lezak et al., 2004; Reis, Guerreiro & Petersson, 2003).

    Para alm da idade e da escolaridade, existem outros fatores que podem influenciar o

    desempenho dos pacientes numa situao de avaliao neuropsicolgica (Halligan,

    Kischka & Marshall, 2003). Desde logo, a situao do teste em si pode ser ameaadora

    ou causar alguma ansiedade no sujeito (Goldstein & McNeil, 2004). Tambm o

    cansao, a falta de motivao, a distrao, a depresso ou o uso de medicao, entre

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    20

    outros, podem afetar quantitativa e qualitativamente o desempenho nos testes

    (Guerreiro, 1998; Spreen & Strauss, 1998).

    Deste modo, a interpretao dos resultados deve ter presente a eventual interferncia

    destes fatores e deve preferencialmente alicerar-se em dados no s quantitativos mas

    tambm qualitativos, como o perfil de resultados e o padro de erros (Boake, 2008). Na

    verdade, uma abordagem estritamente psicomtrica limitada e pode, at, ser errada, j

    que no permitir captar as nuances do desempenho do indivduo. Torna-se, pois,

    fundamental complementar a anlise quantitativa com dados qualitativos (Maia, Correia

    & Leite, 2009). A fuso destas duas componentes permite um melhor enquadramento e

    compreenso entre os resultados obtidos e o comportamento do indivduo alcanando

    assim uma validade ecolgica mais significativa (Lezak et al., 2004).

    Na verdade, o aspeto fulcral no processo avaliativo na maior parte das vezes no tanto

    o resultado quantitativo que se obtm mas o modo como o indivduo se comporta no

    decorrer da avaliao. A forma como resolve o problema ou a forma como se entrega

    tarefa, a impulsividade, a auto-crtica ou, ainda, os estados de hesitao, fadiga ou

    depresso, podem ser visveis no desempenho do indivduo e devem ser tidos em

    considerao (Goldstein & McNeil, 2004; Lezak et al., 2004; Manning, 2008).

    Em sntese, assume-se, assim, fundamental que o neuropsiclogo suporte a sua

    avaliao em instrumentos devidamente validados e adaptados s caractersticas do

    sujeito e na observao e anlise do seu comportamento durante a realizao das tarefas

    propostas (Halligan, Kischka & Marshall, 2003). Dever ainda ser capaz de identificar

    potenciais fatores ou variveis e respetivos impactos na avaliao realizada.

    Avaliao Neurocognitiva em Portugus

    Quando se considera o contexto nacional, e comparativamente com outros domnios

    como a inteligncia, a personalidade ou o educacional, verifica-se que os instrumentos

    neuropsicolgicos disponveis so ainda escassos. Apesar deste panorama, de relevar

    nas ltimas dcadas uma preocupao crescente, por parte dos investigadores, em

    colmatar esta insuficincia, principalmente atravs da adaptao de testes construdos

    originalmente para outras populaes.

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    21

    Parte destes instrumentos adaptados encontra-se direcionada para funes cognitivas

    especficas, como o caso, por exemplo, da Figura Complexa de Rey (2002), para

    avaliao da capacidade de organizao percetivo-motora, da ateno e da memria

    visual imediata, da Escala de Memria de Wechsler (2008), para avaliao da memria,

    da bateria PALPA-P (Kay, Lesser & Coltheart, 1992; verso portuguesa de Castro, Cal

    & Gomes, 2007), para avaliao da linguagem, e do Teste Breve de Avaliao Frontal

    (Dubois et al., 2000; adaptao portuguesa de Lima et al., 2008), para avaliao das

    funes executivas.

    A par destes instrumentos que permitem avaliaes mais finas e diferenciadas de

    funes cognitivas especficas, tm sido conduzidos estudos de adaptao de baterias de

    rastreio, que fornecem informao sobre o funcionamento cognitivo global. O Mini

    Mental State Examination (MMSE; Folstein et al., 1975), ou, em portugus, Avaliao

    Breve do Estado Mental, um desses exemplos. Trata-se de um instrumento de rastreio

    que, pela sua forma breve e de fcil aplicao, se apresenta como um dos mais

    utilizados mundialmente, quer a nvel do contexto clnico quer a nvel de investigao

    (Guerreiro, 1998). Concretamente, o MMSE avalia as funes cognitivas, em particular,

    a orientao, o clculo/ateno, a memria, a linguagem e a capacidade visuo-

    construtiva (Lezak et al., 2004). Validado para a populao portuguesa com mais de 40

    anos por Guerreiro et al. (1994), utilizado para rastreio cognitivo, monitorizao da

    evoluo da doena, ou como forma de estimar o efeito da medicao prescrita (S,

    2009). Contudo, apesar de ser til como instrumento de rastreio num primeiro momento

    de avaliao neuropsicolgica, o MMSE apresenta algumas limitaes. A principal

    limitao diz respeito limitada sensibilidade do score total obtido (dependente do

    ponto de corte), em que, por um lado, os resultados dentro da amplitude normal podem

    no indicar um funcionamento cognitivo necessariamente normativo os falsos

    negativos , e, por outro lado, os resultados fora dessa amplitude poder sugerir uma

    deteriorao cognitiva na ausncia da mesma os falsos positivos (Coelho, Bastos,

    Camara & Landeira-Fernandez, 2010). Acresce ainda o facto de se tratar apenas de um

    instrumento preditivo, o que o impossibilita a elaborao de um diagnstico definitivo

    que s poder ser efetuado com o recurso a medidas mais especficas.

    Para colmatar algumas das limitaes do MMSE, foi elaborado o Montreal Cognitive

    Assessment (MoCA; Nasreddine et al., 2005). Trata-se igualmente de um instrumento

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    22

    de rastreio, de aplicao rpida, que foi concebido fundamentalmente para detetar a

    existncia de dfice cognitivo ligeiro. Contrariamente ao MMSE, o MoCA inclui itens

    que permitem avaliar as funes executivas frontais. Para alm disso, parece ser uma

    escala com uma maior sensibilidade para a deteo do declnio cognitivo (Freitas,

    Simes, Martins, Vilar & Santana, 2010; S, 2009) ou para a deteo de dfices

    cognitivos iniciais na doena de Parkinson (Zadikoff et al., 2008). A verso portuguesa

    do MoCA, de Freitas et al. (2010), apresenta-se um instrumento com particular utilidade

    clnica evidenciando boas qualidades psicomtricas. No entanto, e conforme referido

    anteriormente, tratando-se de uma escala de rastreio no permite a formulao de

    hipteses diagnsticas.

    Ao contrrio do MMSE e do MoCA, a Bateria de Avaliao Neuropsicolgica de Luria-

    Nebraska (Golden, Purisch & Hammeke, 1985; verso experimental portuguesa de

    Maia, Loureiro & Silva, 2002) um instrumento mais extenso que visa avaliar o

    funcionamento neuropsicolgico atravs do cruzamento de informao qualitativa,

    proveniente das tcnicas de Luria, com os mtodos quantitativos, culminando numa

    abordagem hbrida que considera elementos pertinentes de ambas as partes. Destina-

    se a uma avaliao global do funcionamento cognitivo, auxiliando, por conseguinte, na

    localizao de dfices cerebrais focais (Golden, Freshwater & Vayalakkara, 2000;

    Hebben & Milberg, 2002, citado por Maia et al., 2009). Esta bateria compreensiva

    apresenta actualmente duas formas. A forma I constituda por 269 itens distribudos

    por 11 escalas clnicas: funes motoras, ritmo, tcteis, visuais, linguagem recetiva,

    linguagem expressiva, escrita, leitura, aritmtica, memria e inteligncia. Por sua vez, a

    forma II apresenta uma escala clnica adicional designada de memria intermdia. Das

    escalas clnicas derivam outras 5 escalas: patognomnica, hemisfrio esquerdo,

    hemisfrio direito, elevao do perfil e dfice. Destinada a jovens e adultos, esta bateria

    apresenta algumas desvantagens, onde se destaca o elevado tempo de administrao

    (dada a sua extenso), a existncia de domnios cognitivos que no so detalhadamente

    avaliados (como o caso da memria no-verbal, por exemplo) e a baixa sensibilidade

    de algumas tarefas a perturbaes mais leves ou difusas (Lezak et al., 2004).

    Situada entre os instrumentos de rastreio, como o MMSE e o MoCA, e os instrumentos

    mais extensos, como a Bateria de Avaliao Neuropsicolgica de Luria-Nebraska,

    encontra-se a Bateria de Lisboa para Avaliao das Demncias (BLAD; Guerreiro,

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    23

    1998). Constituda por um total de 28 provas, a BLAD avalia o funcionamento

    cognitivo a nvel da orientao, da ateno, da memria, da linguagem, do clculo, da

    praxia, da capacidade construtiva, da iniciativa e da capacidade de abstrao. Trata-se

    de um instrumento que tem revelado boas qualidades psicomtricas em termos de

    fidelidade e de sensibilidade (ibidem) e que, apesar de inicialmente ter sido concebida

    para avaliao de situaes demenciais, o seu uso tem vindo a ser alargado avaliao

    neuropsicolgica em geral de adultos. De facto, as suas principais caractersticas, quer

    em termos de uma avaliao mais completa do funcionamento cognitivo quer em termos

    de uma maior economia do tempo de administrao, fazem da BLAD um instrumento

    com particular utilidade clnica. No entanto, a no publicao da mesma limita

    seriamente o seu acesso por parte de profissionais da rea. Para alm disso, nem todas

    as reas do funcionamento cognitivo, como o caso, por exemplo, da ateno dividida

    ou da orientao espacial, se encontram contempladas na BLAD. Acresce, ainda, a

    inexistncia, por um lado, de provas alternativas que possam ser usadas em funo de

    dificuldades motoras ou expressivas exibidas pelo sujeito (e.g., tarefa que avalie a

    memria de dgitos em sujeitos com graves dificuldades de produo de fala) e, por

    outro lado, de provas no dependentes do conhecimento da linguagem escrita que

    possam ser usadas em sujeitos analfabetos (e.g., tarefa que avalie a ateno seletiva sem

    consistir no corte de letras). Tambm a inexistncia de procedimentos que assegurem a

    aprendizagem nas tarefas de memria verbal e visual imediata poder condicionar a

    avaliao da correspondente memria a longo-prazo (Lezak et al., 2004).

    No sentido de colmatar algumas destas limitaes, procedeu-se concepo e

    construo de uma bateria neuropsicolgica para adultos a BACC, Bateria de

    Avaliao de Comprometimento Cognitivo. Ancorada na abordagem da

    Neuropsicologia Cognitiva, a BACC foi desenvolvida de modo a permitir a

    interpretao dos dfices do indivduo, de diferentes nveis de escolaridade, luz dos

    modelos cognitivos actuais.

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    24

    MTODO

    Participantes

    Participaram neste estudo 300 adultos portugueses (da regio norte e centro do pas), de

    ambos os sexos e com idades compreendidas entre os 40 e os 88 anos de idade. Os

    sujeitos foram divididos em grupos de 15 elementos cada um, de acordo com a idade

    (40-64 anos vs. 65-90 anos), com o nvel de escolaridade (analfabetos, com frequncia

    ou concluso do 1 ciclo, 2 e 3 ciclos, ensino secundrio e ensino superior) e o sexo

    (feminino vs. masculino) (cf. Quadro 1).

    Quadro 1. Caracterizao da amostra em funo da idade, da escolaridade e do sexo

    40 64 anos 65 90 anos

    Idade Sexo Idade Sexo

    Escolaridade M (DP) Min.-Mx. F M M (DP) Min.-Mx. F M

    Analfabetos 58,03 (7,26) 40-64 15 15 76,03 (5,45) 67-88 15 15

    1 Ciclo 53,20 (5,89) 41-63 15 15 73,40 (6,43) 65-88 15 15

    2/3 Ciclos 45,90 (4,44) 40-56 15 15 69,73 (5,06) 65-84 15 15

    Secundrio 51,43 (8,11) 40-64 15 15 69,83 (5,15) 65-82 15 15

    Ens. Superior 52,50 (8,11) 40-64 15 15 70,00 (3,25) 65-77 15 15

    Nenhum dos sujeitos apresentava histrico de perturbaes cognitivas, emocionais ou

    disfuno neurolgica nem evidenciava alteraes sensoriais (a audio e a viso eram

    normais ou com correo) ou motoras graves. Foram excludos da amostra todos

    aqueles que apresentavam um baixo nvel intelectual (avaliado atravs das Matrizes

    Progressivas de Raven), dfice cognitivo (avaliado atravs do MMSE), alteraes

    frontais (avaliado atravs da BAF), nveis elevados de depresso (avaliado atravs da

    Escala de Depresso de Morris) e/ou com alteraes sugestivas de demncia (Escala de

    Demncia de Blessed) (cf. Quadro 2).

  • BACC - Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    25

    Quadro 2. Estatstica descrita para as Matrizes Progressivas de Raven, o MMSE, o Teste Breve de

    Avaliao Frontal (FAB), a Escala de Depresso de Morris e a Escala de Demncia de Blessed, por grupo

    de escolaridade, idade e sexo

    Teste Analfabetos 1 Ciclo 2/3 Ciclos Secundrio Ens. Superior

    40 64 anos, Sexo F

    Matrizes 22,33 (3,90) 28,93 (3,58) 44,71 (5,82) 48,93 (5,97) 51,67 (3,42)

    MMSE 25,20 (2,37) 28,13 (1,41) 29,00 (1,30) 29,27 (1,58) 29,93 (0,26)

    FAB 10,60 (1,60) 12,73 (1,79) 15,29 (1,14) 15,47 (1,36) 15,47 (1,06)

    Depresso 1,00 (0,66) 1,33 (1,59) 0,86 (0,95) 0,47 (0,83) 0,67 (0,90)

    Blessed 0,27 (0,46) 0,27 (0,46) 0,29 (0,61) 0,13 (0,35) 0,27 (0,46)

    40 64 anos, Sexo M

    Matrizes 24,27 (3,60) 27,60 (5,87) 46,00 (8,20) 48,87 (6,36) 53,53 (2,17)

    MMSE 22,53 (2,33) 27,27 (1,94) 29,67 (0,62) 29,47 (0,74) 30,00 (0,00)

    FAB 10,53 (1,41) 12,00 (1,73) 15,20 (1,08) 14,80 (1,57) 15,27 (1,03)

    Depresso 0,87 (0,64) 0,67 (0,82) 0,87 (0,99) 0,27 (0,46) 0,47 (0,64)

    Blessed 0,47 (0,52) 0,07 (0,26) 0,27 (0,46) 0,07 (0,26) 0,07 (0,26)

    65 90 anos, Sexo F

    Matrizes 20,87 (3,83) 24,13 (4,72) 43,47 (4,76) 41,40 (5,33) 51,27 (4,13)

    MMSE 22,47 (2,64) 27,33 (1,11) 29,20 (1,08) 29,47 (0,83) 29,60 (0,74)

    FAB 10,87 (1,25) 11,73 (1,53) 14,13 (1,73) 13,40 (1,06) 14,40 (1,72)

    Depresso 1,40 (0,51) 0,87 (0,92) 0,53 (0,74) 0,73 (0,59) 0,93 (0,80)

    Blessed 0,47 (0,52) 0,47 (0,64) 0,07 (0,26) 0,60 (0,51) 0,27 (0,46)

    65 90 anos, Sexo M

    Matrizes 20,67 (4,48) 25,73 (4,27) 42,47 (5,37) 46,93 (6,77) 53,60 (2,47)

    MMSE 22,73 (2,09) 27,07 (1,67) 29,27 (1,10) 28,93 (1,39) 30,00 (0,00)

    FAB 10,47 (1,25) 11,13 (1,30) 14,27 (1,67) 13,60 (1,18) 15,20 (1,27)

    Depresso 1,00 (0,76) 0,93 (0,70) 0,53 (0,64) 0,67 (0,72) 0,73 (0,59)

    Blessed 0,60 (0,51) 0,60 (0,51) 0,13 (0,35) 0,47 (0,52) 0,53 (0,52)

    Material

    Tendo em considerao os objetivos do estudo, procedeu-se conceo e elaborao de

    uma bateria de testes destinada a avaliar as funes cognitivas, que designamos por

    BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo. No sentido quer dos

    estudos de validade deste instrumento quer da seleo da amostra foram ainda utilizados

    os seguintes instrumentos: as Matrizes Progressivas de Raven, para avaliao da

    capacidade intelectual, o Mini-Mental State Examination (MMSE), para avaliao de

  • BACC Bateria de Avaliao de Comprometimento Cognitivo: Estudos Psicomtricos e Diferenciais

    26

    defeito cognitivo, o Teste Breve de Avaliao Frontal (BAF), para avaliao de

    alteraes cognitivas dependentes do lobo frontal, a Escala de Depresso de Morris

    (Protocolo CERAD), para avaliao da depresso, e a Escala de Demncia de Blessed,

    para determinao do grau de comprometimento funcional nas atividades de vida diria

    e de mudanas de hbito, de personalidade e de conduta.

    Matrizes Progressivas de Raven

    As Matrizes Progressivas de Raven (Raven, 1938, 1947 citado por Raven, 1995) so

    uma medida do fator geral G. Trata-se de um conjunto de escalas no-verbais que

    avaliam a inteligncia ou o raciocnio. Concretam