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Berdiaev - De l'esclavage
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BERDIAEV
DE
L'ESCLAVAGE
Nicolas Berdiaeff apresenta a reflexão filosófica como um reflexo das
lutas do espírito1. Segundo ele, as contradições que aparecem em qualquer
sistema filosófico são as que nascem da “luta espiritual”: são inerentes à
própria existência e não se deixam dissimular por baixo de uma aparente
unidade lógica. A verdadeira unidade do pensamento, de fato inseparável
da unidade da pessoa, é uma unidade existencial, não lógica. E a
“existencialidade” é contraditória2. A pessoa é a invariabilidade na variação:
é uma das definições essenciais da pessoa. As variações efetuam-se no
interior de um único e mesmo sujeito e elas destroem o sujeito quando elas
se tornam traição. O homem é um ser contraditório e polarizado e o
pensamento do filosofo torna-se contraditória e polarizada no momento em
que em vez de abstrair-se das fontes primitivas da vida, ele guarda
constantemente contato com elas. O pensamento filosófico é uma formação
complexa, e mesmo nos sistemas filosóficos os mais lógicos e os mais
unidos, é fácil perceber a presença de elementos contraditórios. Longe de
ser um mal, é um bem. O monismo perfeito e definitivo do pensamento é
irrealizável e sua realização seria um mal. Por isso, o pensamento
desabrocha necessariamente numa perspectiva escatológica, que projeta
sobre ela uma luz por assim dizer, retrospectiva, e ilumina ao mesmo tempo
os paradoxos e as contradições da vida do mundo. Para ele, existe o
conflito entre dois sentimentos: o apego a um mundo superior, uma
aspiração para a altura, e a piedade para um mundo inferior, para um
mundo que sofre. Quando uma tirania niveladora fere sua concepção da
dignidade humana, seu amor da liberdade e da atividade criadora, ele se
revolta contra ela e está pronto para expressar a própria revolta na forma
mais violenta. Mas quando ele vê os partidários da desigualdade social
defender sem pudor seus privilégios, quando vê o capitalismo oprimir as
massas trabalhadoras, transformar os homens em coisas, ele prova o
mesmo sentimento, a mesma necessidade de revolta. Num caso como no
outro, ele nega os fundamentos do mundo moderno. Para entender as
1 BERDIAEFF, Nicolas, De l’esclavage et de la liberté de l’homme, Paris, Aubier,
Editions Montaigne, 1939, En guise d’introduction; des contradictions de ma pensée.
2 Neologismo também em francês.
articulações interiores de uma concepção filosófica, é preciso apelar para o
primeiro sentimento que homem experimentou na presença do mundo, sua
primeira visão do mundo. Na base do pensamento filosófico, sempre existe
uma experiência concreta. O conhecimento de si sendo uma das fontes
principais do conhecimento filosófico, descubro em mim, como ponto de
partida inicial, uma revolta contra o dado do mundo, a recusa de aceitar
qualquer objetividade, considerada como uma escravização do homem,
uma oposição da liberdade do espírito à necessidade do mundo, à violência
e ao conformismo. Depois de um longo trabalho intelectual e espiritual,
Berdiaeff confessa ter reconhecido que nenhuma pessoa humana não
poderia, enquanto portadora do ser supremo, servir de meio em vista de
qualquer que seja o fim, que cada pessoa possui um centro existencial e
tem direito não somente à vida, o que lhe é denegado pela civilização
moderna, mas à participação ao conteúdo universal da vida.