17
1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações da citopatologia na medicina clínica. E eu disse-vos que existem três grandes áreas onde a citologia é importante: citologia exfoliativa , que se dividia em ginecológica e não ginecológica , e a citologia aspirativa. E nós, na semana passada, discutimos a citologia exfoliativa, principalmente a citologia ginecológica, e hoje vamos estudar um pouco mais em detalhe a citologia aspirativa, chamada, então, citologia aspirativa por agulha fina . Nós podemos definir a citologia aspirativa, num sentido estrito, como um diagnóstico morfológico baseado num exame do material celular que foi puncionado, aspirado, estendido, fixado e corado. Isto é uma forma muito redutora de definir citologia aspirativa, se nós nos fixarmos apenas na técnica. Assim, as fronteiras da citologia aspirativa ampliam-se quando a interpretação morfológica é combinada com a história clínica, exame físico e com exames complementares, principalmente a imagiologia. E o diagnóstico final deve ser, sempre, o chamado team work, deve ser um diagnóstico que tenha em consideração todos aqueles aspectos. Portanto, a citologia realizada desta maneira chama-se Citologia Clínica. E um exemplo do que é a citologia clínica é este que vos vou demonstrar. Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Biopatologia BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” 23 de Abril de 2007 Prof. Fernando Schmitt Fig 2 Fig 1 Fig 3 Fig 4 Fig 5

BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

1

Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações da citopatologia na

medicina clínica. E eu disse-vos que existem três grandes áreas onde a citologia é

importante: citologia exfoliativa, que se dividia em ginecológica e não ginecológica, e a

citologia aspirativa. E nós, na semana passada, discutimos a citologia exfoliativa,

principalmente a citologia ginecológica, e hoje vamos estudar um pouco mais em

detalhe a citologia aspirativa, chamada, então, citologia aspirativa por agulha fina.

Nós podemos definir a citologia aspirativa, num sentido estrito, como um diagnóstico

morfológico baseado num exame do material celular que foi puncionado, aspirado,

estendido, fixado e corado. Isto é uma forma muito redutora de definir citologia

aspirativa, se nós nos fixarmos apenas na técnica. Assim, as fronteiras da citologia

aspirativa ampliam-se quando a interpretação morfológica é combinada com a história

clínica, exame físico e com exames complementares, principalmente a imagiologia. E o

diagnóstico final deve ser, sempre, o chamado team work, deve ser um diagnóstico que

tenha em consideração todos aqueles aspectos. Portanto, a citologia realizada desta

maneira chama-se Citologia Clínica.

E um exemplo do que é a citologia clínica é este que vos vou demonstrar.

Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Biopatologia

BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY”

23 de Abril de 2007 Prof. Fernando Schmitt

Fig 2 Fig 1

Fig 3 Fig 4 Fig 5

Page 2: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

2

Vocês vêem este doente (Fig.1), com múltiplos nódulos cutâneos e subcutâneos, uns

maiores, outros mais pequenos, no tórax e abdómen. Foi-nos pedido que fizéssemos

uma punção aspirativa de um destes nódulos. Nós puncionámos um nódulo, o nódulo

foi puncionado, aspirado, estendido, fixado e corado. Agora imaginem-se perante este

quadro morfológico e sem esta história clínica ou sem terem visto o doente. Estas

células que vocês vêem aqui (Fig.2) são células do tipo epitelial, linfóide ou

mesenquimatoso? Estas células são compridas, com núcleos alongados, a maior parte

destas células não estão em grupo, estão soltas e isoladas e ainda vemos aqui um

fragmento de colagéneo, elemento do estroma. Então, com estas dicas, já me sabem

dizer: são epiteliais ou mesenquimatosas? Mesenquimatosas. Apesar de ser um

esfregaço muito celular, não dá para ver aqui atipias, não há pleomorfismo, mitoses, ou

seja, não vemos aqui características de malignidade. E, portanto, se nós não tivéssemos

visto aquele doente, o máximo que poderíamos dizer dessa citologia é que se trata de

uma neoplasia mesenquimatosa com características de benignidade. Ora, quais são as

neoplasias mesenquimatosas com características de benignidade que vocês conhecem?

Lipoma, está certo. Leiomioma e fibroma. Muito bem! Já não está mal!

Prof. Sobrinho Simões:

Srs. Doutores, condroma, rabdomioma, neurofibroma...1

Isto é diferente... Vamos pegar nestas três que disseram: lipoma, leiomioma e fibroma.

Isto podia ser um lipoma? Não, porque não tem células adiposas. Podia ser um

leiomioma? Não, porque o leiomioma tem células musculares lisas. Aqui não se vê o

citoplasma das células, porque muitas vezes os citoplasmas das células, num esfregaço,

“caem”, não são identificáveis (isto é não é um corte histológico, é um esfregaço), mas

poderia eventualmente ser um leiomioma, mas não tem muita cara... Podia ser um

fibroma? Podia muito bem ser um fibroma: tem fragmentos de tecido conjuntivo,

colagéneo, células alongadas com núcleo alongado... Agora, se juntarem este aspecto

citológico de neoplasia benigna mesenquimatosa com a observação deste doente,

sabendo apenas que a citologia veio de um dos nódulos do doente, não acende nem uma

luzinha na cabeça de vocês? O que parece que o doente tem? Eu vou dar mais uma dica:

além destes múltiplos nódulos, se eu vos disser que, nas costas, o doente tinha uma

1 “Srs. Doutores, se vocês, nesta altura, não vão lá, estamos lixados!”

Page 3: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

3

mancha que chamamos “mancha de café com leite”, com áreas escuras e áreas claras...

Então aí já pensamos na possibilidade de ser uma Neurofibromatose. E o que significa o

nome neurofibromatose? Se eu dissesse que o doente tem uma lipomatose, o que é que

vocês pensavam que ele tinha? Que tinha múltiplos lipomas. Se é uma

neurofibromatose, é porque tem múltiplos neurofibromas. Então, se vocês olharem para

o doente e associarem as características morfológicas desta citologia, vocês facilmente

fazem o diagnóstico de neurofibroma. Um destes nódulos (Fig.3) foi, depois, retirado, é

um nódulo bem delimitado (lembrem-se que é uma neoplasia benigna), fuso celular

(Fig.4), e aqui (Fig.5) cora por imunohistoquímica para a proteína S100 que, em geral,

cora os tecidos de origem neural. Este exemplo é só para vos mostrar que, associando os

aspectos clínicos com os achados morfológicos, vocês conseguem, com a citologia

aspirativa, fazer o diagnóstico de uma maneira muito mais fácil e rápida.

Um ponto muito importante da citologia aspirativa é a técnica. Muitos erros e enganos

que acontecem na citologia aspirativa acontecem muito mais na hora de colher o

material do que na própria interpretação da lâmina. Portanto, nesta técnica, a colheita do

material é muito importante. E o sucesso da citologia aspirativa depende de alguns

passos prévios essenciais, como, por exemplo: conhecer a história clínica do doente,

localizar de uma forma muito precisa o nódulo a ser aspirado, por palpação ou por

imagem, verificar se a indicação da punção aspirativa está justificada. Por exemplo, na

tireóide, para nódulos inferiores a 1 cm de diâmetro, em geral, a punção aspirativa não

está indicada, só para nódulos de 1 cm ou mais, por causa da precisão da punção.

Page 4: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

4

Hoje em dia, praticamente toda a citologia aspirativa guia a agulha através de métodos

imagem, sendo o método de imagem mais comummente utilizado a ecografia. Mesmo

nos nódulos palpáveis, preferimos guiar a punção através da ecografia, para se saber

exactamente onde é que a agulha recolheu o material.

O material usado para fazer a citologia aspirativa consiste numa seringa, em geral de 10

ml, num aparelho que nós usamos para colocar a seringa e para criar pressão negativa e

em agulhas. E agora sim, por que é que nós dizemos que é citologia aspirativa por

agulha fina? Porque o diâmetro da agulha não pode ultrapassar os 0,6 mm, ou seja, este

é o diâmetro máximo de uma agulha considerada uma agulha fina. Sabem qual é o

diâmetro da agulha usada para colheita de sangue? É 0.8 mm.

Se eu vos disse que a citologia aspirativa é clínica, ela é também um método que exige

que se acompanhe uma série de passos: história e exame físico bem feito; uma palpação

bem feita do nódulo, se ele for palpável, ou uma localização precisa, se for por

ecografia; aspiração do material com agulha; depois da aspiração do material, temos que

o colocar em cima de uma lâmina, seja, fazer um esfregaço; depois do esfregaço, o

material é fixado e corado e, finalmente, interpretado no microscópio. O sucesso deste

método é maior quando um único indivíduo faz todos estes passos. Muitas vezes, não é

um único indivíduo que faz, alguns aspiram e outros interpretam no microscópio.

Page 5: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

5

Quando é o mesmo que aspira o doente e interpreta no microscópio, as taxas de sucesso

do método são bastante maiores.

A história e exame clínico são muito importantes. Por exemplo, uma senhora com

carcinoma da mama não podia ser operada, porque tinha um problema pulmonar que

não permitia fazer anestesia. Ela fazia tratamento hormonal com tamoxifeno, pois era

pós-menopáusica. Era acompanhada regularmente por punções aspirativas do nódulo da

mama. Numa das consultas em que iria fazer uma nova punção da mama, ao ser

examinada, foi-lhe detectado um nódulo subcutâneo, que, em princípio, seria uma

metástase do carcinoma da mama ou um lipoma, embora não tivesse sido observado nas

consultas prévias. Por isso, decidiu confirmar se aquilo era uma metástase do carcinoma

da mama, fazendo uma citologia aspirativa de agulha fina deste nódulo. Que tipo de

células observam aqui: epiteliais, linfóides ou mesenquimatosas? São linfóides. Na

realidade, ela tinha um linfoma, uma segunda neoplasia.

A palpação, quando o nódulo é palpável, é muito importante. Para fixar o nódulo,

principalmente quando é móvel, usam-se dois dedos e a agulha vai entrar exactamente

no meio. Quando o nódulo é muito pequeno (em geral são nódulos subcutâneos muito

pequenos), temos que usar um único dedo para pressionar e fixar e a agulha entra de

forma oblíqua, por baixo do dedo.

A aspiração é muito importante, porque é nesta fase que se cometem os maiores erros

técnicos da citologia por agulha fina. Portanto, estão a ver aqui um nódulo e a agulha é

colocada dentro do nódulo. Quando a agulha estiver dentro do nódulo, puxam o êmbolo

Page 6: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

6

da seringa, o que cria pressão negativa dentro da seringa e faz com que as células sejam

aspiradas. E vocês vão movimentar a agulha em diferentes direcções. É muito

importante que, antes de retirarem a agulha do nódulo, vocês soltem o êmbolo. Ao

soltá-lo, como há pressão negativa (não há ar aqui dentro), ele volta à posição original.

A punção aspirativa não é apunhalar o doente2! Numa punção bem feita não deve vir

sangue, não deve vir nenhum material para dentro da seringa. O material que queremos

tem que ficar na agulha. A não ser que seja um cisto cheio de líquido. Neste caso,

quando vocês colocam a agulha, o líquido enche a seringa. O líquido é, então,

centrifugado e nós fazemos citologia do líquido. Este passo é muito importante, porque

se vocês retirarem a agulha de dentro do nódulo com o êmbolo puxado, entra ar na

agulha e empurra as células para dentro da seringa. Como esta seringa é de plástico, as

células aderem ao plástico, sendo impossível retirá-las para as examinar. Por isso, é

muito importante que, antes de se retirar a agulha, se solte o êmbolo para que ele volte à

posição original. Só depois se retira a agulha de dentro do nódulo.

Depois, vem outra etapa do exame, o esfregaço3. Como se faz o esfregaço de sangue

periférico, em hematologia? (o professor explicou com gestos). Num esfregaço 2 “...enquanto não vier sangue para dentro da seringa, o médico que não fica satisfeito! Tem que encher de sangue, principalmente os cirurgiões gostam de encher de sangue! Aí eles dão aquela agulhinha cheia de sangue, tem o material cheio de sangue. Depois vocês dizem “Não tem material” “Mas, como? Eu entreguei a seringa cheia de sangue!!Como vocês dizem que não tem material???” Não tem material do tumor, tem é sangue.” 3 “Muita gente acha que fazer o esfregaço é colocar o material em cima de uma lâmina e depois esfregar, como quem esfrega a roupa!”

Page 7: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

7

hematológico, o material é o próprio sangue, e o que o que hematologista quer é contar

o número de células ou identificar alguma célula estranha, usando uma camada muito

fininha do esfregaço e, por isso, utiliza aquela técnica. Aqui, este tipo de esfregaço é

totalmente contra-indicado, porque no nosso material vamos ter células do tumor/lesão

e sangue, misturados. Em geral, as células da lesão são mais pesadas que as células do

sangue. Então, se vocês fizerem como num esfregaço hematológico, removem da

lâmina as células tumorais e deixam ficar as do sangue. Vamos então ver como se faz...

Lembram-se que retiraram a agulha com o êmbolo na posição original. A seguir, antes

de fazer o esfregaço, é preciso destacar a agulha da seringa, puxar o êmbolo para encher

a seringa de ar, colocar novamente a agulha na seringa e, finalmente, “empurrar” o

material para cima da lâmina. Por vezes, o material não sai todo. Por isso, usamos uns

truques: por exemplo, batemos com a agulha em cima da lâmina, com movimentos

secos, ou, com uma agulha de insulina, mais fina, fazemos aspiração da própria agulha e

depois colocamos o material na lâmina. E é assim que se faz o esfregaço: há uma lâmina

receptora e uma lâmina que faz o esfregaço. Vocês colocam o bordo superior desta

lâmina que faz o esfregaço junto ao material e fazem o movimento. Só que aqui há uma

grande diferença relativamente ao esfregaço hematológico: antes do material chegar ao

fim, vocês levantam a outra lâmina, de modo a não arrastar o material até ao fim da

lâmina receptora. Quando o material é líquido, podemos concentrá-lo recorrendo a uma

técnica: primeiro, com a outra lâmina, levamos todo o material “lá para cima”, voltamos

até ao meio e, a partir do meio, fazemos aquele mesmo tipo de esfregaço, nunca

trazendo esta lâmina até ao fim da outra. E assim fica feito o esfregaço.

Page 8: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

8

O esfregaço de boa qualidade (1) tem o aspecto de um cometa e nunca vai até ao fim.

Um exemplo de esfregaço de má qualidade é este que foi estendido por toda a lâmina e

veio até ao fim (2); outro exemplo é este que está muito espesso, tem muito sangue(3).

Se o esfregaço ficar mal feito, vamos ter que recolher novamente o material do doente.

Depois, temos a fixação e a coloração. Na fixação e coloração, vocês podem ou deixar o

material secar ao ar e depois este material é fixado só no momento da coloração

(colorações hematológicas, como o May-Grünwald-Giemsa-MGG, o Leishman...) ou

fixar em álcool 95 (colorações tipo Papanicolau, HE, imunocitoquímica) para fixar o

material imediatamente (vocês fazem o esfregaço e colocam num recipiente com álcool

ou usam spray; isto tem que ser muito rápido, porque se passar muito tempo entre o

esfregaço e a fixação, o material fica danificado, sendo, neste caso, preferível não fixar

e fazer coloração hematológica). Quando é que se faz um e quando é que se faz outro?

Depende do serviço que vocês tiverem e de quão o patologista que vai interpretar estas

laminas está treinado para um tipo de coloração ou outro.

E chegámos ao último passo, a interpretação citológica. É evidente que vocês, além de

colherem um bom material, esfregarem e fixarem, têm que saber o que significam

aquelas células.

Quando se pede para fazer uma citologia aspirativa (citologia clínica), o que é que o

clínico quer saber daquele nódulo? Quer saber primeiro se é benigno ou maligno, depois

1 2 3

Page 9: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

9

se é ou não curável, pode haver uma abordagem cirúrgica ou tem que ser feito outro tipo

de tratamento? E são estes tipos de resposta que temos que dar nos diferentes pólipos.

Aquilo que vêm agora é uma criança de um

ano de idade, com múltiplos nódulos

subcutâneos.

É benigno ou maligno? Múltiplos nódulos

subcutâneos numa criança de um ano, não

parece muito bom! Se é curável e se se deve

operar este nódulo, depende do diagnóstico.

Nesta criança, estes nódulos são uma metastase de um neuroblastoma (um tumor

maligno).

Prof. Sobrinho Simões: Blastoma é sempre maligno.

Agora vou mostrar-vos algumas aplicações da citologia aspirativa em alguns órgãos

onde é usada com mais frequência:

MAMA

Na mama, a citologia aspirativa é um método simples, rápido, barato, efectivo, e é

considerado o padrão de avaliação, tanto em lesões palpáveis, como em lesões não

palpáveis (sendo que em lesões não palpáveis deve ser guiado, ou por ecografia, ou pela

mamografia, uma técnica chamada de estereotaxia. (Lembrem-se que no seminário de

mama já falámos nas biopsias guiadas por estereotaxia.)

Neste órgão, a citologia aspirativa contribui para a decisão da conduta, tanto a nível

clínico como cirúrgico, sendo o material obtido frequentemente após o diagnóstico

primário. A mulher tem um nódulo, vocês puncionam e fazem o diagnóstico de

carcinoma, de um cisto ou de um fibroadenoma. Como muitas vezes o planeamento

terapêutico é feito antes da cirurgia, evidentemente que para nós deve ser o mais preciso

possível.

A citologia aspirativa por agulha fina e a biopsia por agulha grossa, mudaram um pouco

a filosofia dos nódulos de mama. Há 15-20 anos atrás, a mulher tinha um nódulo de

mama e não se sabia o que era. Ia para o bloco operatório, tirava o nódulo e fazia um

exame extemporâneo, para ver se era benigno ou maligno. Se fosse maligno, era

Page 10: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

10

imediatamente sujeita a mastectomia, se fosse benigno a cirurgia parava por ali. Isto era

muito agressivo pois a mulher nunca sabia se ia acordar com ou sem mama. Para além

disso, não podia discutir o tipo de cirurgia. Hoje em dia, como ela vai para o bloco com

o diagnóstico, já pode discutir se vai fazer uma cirurgia conservadora, uma mastectomia

com reconstrução…

A citologia aspirativa por agulha fina torna-se um método de “high tech” quando se

associa aos métodos de imagem, uma vez que juntos permitem o diagnóstico de um

carcinoma de dimensões muito pequenas, fazendo um diagnóstico muito precoce. E por

isso, na abordagem dos nódulos da mama, usa-se o tripé diagnóstico, tendo em conta a

clínica, a imagem e a citologia. Quando os três são benignos, o diagnóstico é de

benignidade (não é necessário retirar o nódulo ou fibroadenoma, a não ser por uma

questão estética). Pelo contrário, se os 3 forem malignos, a conduta é a cirurgia. Se

houver discordância, tem que se fazer uma biopsia.

Com a mamografia de rastreio, começaram a aparecer muitas lesões mamárias não

palpáveis, que são classificadas pelos radiologistas (classificação de I-V). Se acharem

que é benigno a mulher volta na próxima ronda da mamografia, se acharem que é

maligno faz a citologia, e se for suspeito tem que ser estudado. Existem várias formas

de estudar esta lesão: desde por citologia aspirativa por agulha fina, até cirurgia aberta

para remoção do nódulo (era o que se fazia antigamente). Hoje em dia há uma série de

outros métodos intermédios: citologia por agulha grossa, o chamado mamoton, que

parece um aspirador que aspira o nódulo (muito agressivo e caro).

Page 11: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

11

Um dos aspectos

mais frequentes da

mamografia, que

levanta a

possibilidade de

malignidade, são

as

microcalcificações

(sempre que forem retiradas deve documentar-se: fazer um biopsia, um RX dessa

biopsia para ver se as microcalcificações lá estão, e depois, se possível, observar no

corte histológico a presença da microcalcificação; porque se a agulha estiver no lugar

errado faz-se um diagnóstico de um falso-negativo).

Nos últimos anos tem havido uma grande pressão para substituir a citologia por agulha

fina pela biopsia por agulha grossa (CNB).

Na biopsia por agulha grossa extrai-se um cilindro de tecido. Os defensores desta

técnica defendem que esta é melhor que a citologia aspirativa por agulha fina porque se

obtém mais material, podem estudar-se os factores prognósticos e preditivos, e não é

necessário treino para fazer a citologia (colheita, interpretação…). No entanto isto é um

Page 12: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

12

“loby” tremendo a favor da citologia aspirativa por agulha grossa, uma vez que, sendo

este um método mais caro, que necessita da compra de um aparelho, há um grande

interesse da indústria na sua utilização.

Entretanto, há muitos estudos a demonstrar que não há grandes diferenças entre as duas

técnicas, na mama. A sensibilidade e especificidade são semelhantes, há falsos-positivos

e falsos-negativos nos dois.

Há uma situação em que a biopsia por agulha grossa é claramente superior à citologia

aspirativa por agulha fina: as microcalcificações. Em todas as outras situações é melhor

a citologia aspirativa por agulha fina.

Tal como o nosso grupo comprovou, não é verdade que só se pode estudar factores

preditivos, por exemplo receptores de estrogéneos e material de citologia aspirativa, por

biopsia por agulha grossa.

Evidentemente que, na biopsia por agulha grossa o aparelho faz quase tudo. Já o

sucesso da citologia aspirativa por agulha fina está relacionado com a habilidade e a

experiência de quem faz a aspiração.

Nas lesões não palpáveis da mama, tanto o exame citológico do material de punção

aspirativa como histológico de biopsia por agulha grossa não são muitas vezes o

diagnóstico definitivo. O relatório final deve ser, de preferência, enquadrado em

categorias diagnósticas, tal como acontece no exame radiológico: é maligno, benigno,

não tem material, ou é suspeito, sendo necessário retirar a lesão.

Em relação aos cistos da mama, se for único, pode fazer-se diagnóstico e tratar ao

mesmo tempo (esvaziando o cisto com a punção aspirativa).

Tecido mamário com alterações fibro-císticas.

Page 13: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

13

E aqui vêm uma imagem do seminário com as células da metaplasia apócrina que

comummente reverte para os cistos da mama.

TIREÓIDE

Bócio Colóide (difuso)

Bócio multinodular

Carcinoma papilar da tireóide

Metaplasia apócrina

Page 14: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

14

Tireoidite de Hashimoto

A tireóide pode ter patologia nodular ou

difusa, onde eu posso ver um aumento de

toda a glândula. A lesão pode ser

clinicamente palpável ou apenas

observável pela ecografia.

Com a citologia por agulha fina faz-se

diagnóstico da grande maioria das

patologias da tireóide (ex: bócios

colóides, tireoidite de Hashimoto…) e também de tumores (carcinomas papilares da

tireóide, que classicamente têm esta inclusão dentro do núcleo – ver imagem

correspondente; carcinomas medulares da tireóide, através da comprovação de que

produzem calcitonina – ver imagem correspondente).

Carcinoma folicular

No entanto, há uma situação em que a citologia aspirativa por agulha fina da tireóide

não consegue definir o diagnóstico: são os chamados tumores foliculares. Isto é uma

citologia em que aparecem muitas células, formando folículos, com pouco colóide, não

sendo possível definir, se é um adenoma folicular da tireóide ou um carcinoma. Porque

na histologia, como é que se diferencia o adenoma do carcinoma? Através de dois

� Celularidade abundante � Arranjos microfoliculares � Escasso colóide

Carcinoma medular da tireóide

Page 15: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

15

critérios: a invasão da cápsula e a invasão vascular (que não se vêm na citologia). Nesta

situação recomenda-se a cirurgia, remove-se o lóbulo e só depois se estuda a cápsula

para ver se há áreas de invasão.

Vantagens da citologia aspirativa da tireóide:

- Diagnóstico muito rápido;

- Custo muito baixo;

- Reduz muito as cirurgias desnecessárias

(Depois veio a cintilografia: via-se se captava ou não iodo. Quando o nódulo não

captava e era frio, em geral era maligno; quando era quente, era benigno. Esta técnica dá

muitos falsos-negativos e falsos-positivos. Se imaginarem um cisto da tireóide, ele deve

ser frio ou quente? Frio. É um cisto, como tal é o último a captar o iodo. Estes cistos

eram antigamente interpretados como malignos e eram retirados. Deste modo, a

citologia reduziu muito estas cirurgias desnecessárias.)

- O risco é muito baixo, mesmo em doentes com contra-indicações cirúrgicas;

- Os cistos podem ser diagnosticados e tratados;

- Pode permitir a confirmação diagnostica de um caso inoperável;

- Permite o acompanhamento de doenças funcionais como a tireoidite de Hashimoto.

GÂNGLIOS LINFÁTICOS

Faz-se citologia aspirativa por agulha fina para, por exemplo pesquisar um gânglio

aumentado num doente previamente saudável, fazer o estadiamento dos tumores

malignos, seguimento de tumores tratados, audiação do material para uma coloração ou

uma investigação especial. Praticamente não existe contra-indicação para fazer uma

citologia aspirativa por agulha fina.

Nos gânglios, a citologia aspirativa por agulha fina tem um papel muito importante nas

doenças infecciosas. Por exemplo, permite que se faça o diagnóstico da linfadenite

granulomatosa, ou seja uma inflamação crónica dos gânglios com granulomas. Pode ter

muitas causas: tuberculose, toxoplasmose, pode ser um fungo, uma micose sistémica

que pode comprometer os gânglios. Este granuloma com muitos PMN aqui no fundo, é

o granuloma de uma doença que é relativamente frequente em gânglios cervicais ou

axilares – a doença da arranhadela do gato – causada por uma bactéria, a Bartonella.

A citologia aspirativa dos gânglios linfáticos também pode fazer o diagnóstico de uma

metastase. Vocês podem chegar ao diagnóstico do sítio primário desta metastase se, por

Page 16: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

16

exemplo, pensarem na localização do gânglio e do aspecto morfológico. Mas por

exemplo, se virem uma metastase cervical de um carcinoma numa doente relativamente

jovem, vão pensar na possibilidade de ser um tumor da tireóide. As metastases que têm

células com nucléolos muito grandes e um pigmento acastanhado no citoplasma são

provavelmente de um melanoma. Se por exemplo tiverem uma metastase de um

adenocarcinoma, na região supraclavicular esquerda, vão pensar em quê? Carcinoma

gástrico.

Em relação aos tumores primários dos gânglios, a citologia aspirativa por agulha fina

muitas vezes não faz o diagnóstico definitivo do tumor. A citologia aspirativa pode

dizer: isto é um linfoma (já devem ter ideia que a classificação dos linfomas exige

muitas vezes olhar para a arquitectura do gânglio e exige que se façam técnicas

adicionais, e por isso a citologia aspirativa até pode dizer que é um linfoma, ou até que é

um linfoma de Hodgkin, mas muito frequentemente exige a retirada para estudo

histológico).

Mas há outras situações em que a citologia aspirativa pode ser muito importante,

situações que são, por vezes, de emergência médica, como acontece no linfoma

linfoblástico, um linfoma que muitas vezes acomete o mediastino de crianças. E ao

acometer o mediastino ele cresce muito rapidamente e pode comprimir a veia cava,

dando um quadro clínico chamado sdr. da veia cava superior. Esta um situação de

emergência médica (a criança pode morrer em insuficiência respiratória). Nessa

situação, a citologia aspirativa por agulha fina é muito importante pois faz o diagnóstico

deste linfoma, e este linfoma linfoblástico pode ser tratado imediatamente com drogas,

para reduzir a massa tumoral (embora não seja o tratamento definitivo da doença), de

forma a que o doente pare com a síndrome da veia cava, sendo depois abordado

novamente para um diagnóstico definitivo.

Dei-vos alguns exemplos (mama, tireóide e gânglios), mas praticamente qualquer sítio

onde uma agulha pode chegar pode ser aspirado de forma a fazer o diagnóstico:

Exemplos:

Lipoma

Page 17: BIÓPSIA ASPIRATIVA E “CORE BIOPSY” - cc04-10.med.up.ptcc04-10.med.up.pt/biopatteoricas/Aula24_Biopsia.pdf · 1 Na semana passada, na aula teórica, discutimos as aplicações

17

Este senhor tem um nódulo no pescoço: o que é que parecem estas células? Adipócitos,

portanto isto é um lipoma (não tem sinais de malignidade).

Às vezes também se faz biopsias aspirativas a órgãos profundos, exigindo

evidentemente maior cuidado do que com os órgãos superficiais, uma vez que aumenta

o risco de complicações. Este era um doente que tinha sido operado à 5 anos por um

adenocarcinoma do cólon. Este doente voltou à consulta com queixas respiratórias,

febre, foi feito um RX e ele tinha um nódulo no pulmão. Pensou-se numa metástase.

Estranhamente este era um nódulo único, e este doente não tinha qualquer outra

manifestação de recidiva da doença, não tinha metástases no fígado, não tinha mais

nenhum sinal. Mas tinha febre, e por isso, antes de fazer quimioterapia o clínico fez uma

citologia aspirativa por agulha fina daquele nódulo. Qual foi a surpresa, que este era um

granuloma por uma infecção fúngica do pulmão. Se o doente tivesse feito

quimioterapia iria diminuir a imunidade com consequente disseminação fúngica, que

poderia ser fatal. Este é então um caso em que a citologia aspirativa foi muito

importante para fazer o diagnóstico definitivo da doença.

GLOSSÁRIO

Ora aqui está mais uma aulinha desgravada! Espero que vos seja muito útil! Boa sorte

a todos para esta última etapa! **Ana Luísa Aires**Ana Lúcia Cordeiro**

- Biópsia do tipo "core-needle"

- Citologia aspirativa por agulha fina

- Esfregaço citológico

- Imunocitoquímica

- Neurofibromatose

- Fibroma

- Leiomioma

- Lipoma

- Neurofibroma

- Pólipo

- Metastase

- Neuroblastoma

- Mama

- Mamografia

- Exame extemporâneo

- Fibroadenoma

- Metaplasia apócrina

- Tireóide

- Bócio colóide (difuso)

- Bócio multinodular

- Carcinoma papilar

- Carcinoma medular (tireóide)

- Tireoidite de Hashimoto

- Carcinoma folicular

- Invasão

- Linfadenites

- Melanoma

- Adenocarcinoma