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Bloodlines (livro 1) Laços de sangue - Richelle Mead

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Depois de um evento que mudou a vida de Syndey e Adrian para sempre, Sydney luta para traçar a linha entre os ensinamentos Alquimistas e os desejos de seu coração. Então ela conhece o sedutor Marcus Finch, um ex-Alquimista que a empurra para se rebelar contra o povo que a criou. E quando Sydney fica cara a cara com um usuário de magia negra, ela finalmente começa a abraçar a misteriosa magia que tem dentro de si…

1

Eunãoconseguiarespirar.

Umamãocobriaminhabocaeoutrasacudiameuombroparamedespertardosonopesado.Milpensamentosfrenéticosforamdisparadospelaminhamenteemumpiscardeolhos.Estavaacontecendo.Meupiorpesadeloestavasetornandorealidade.Estãoaqui!Vierammepegar!Meus olhos piscaram, enlouquecidos, examinando o quarto escuro até focarem o

rostodomeupai.Pareidemedebater,totalmenteconfusa.Elemesoltouerecuouumpasso para me olhar com frieza. Eu me sentei ereta na cama, com o coração aindabatendoacelerado.—Pai?—Sydney.Vocênãoacordava.Claroqueessafoiaúnicadesculpaqueeledeuporquasemematardesusto.— Precisa se vestir e ficar mais apresentável— ele prosseguiu.— Rápido e em

silêncio.Meencontreláembaixo,noescritório.Arregaleiosolhos,masnãohesiteiemresponder.Sóhaviaumarespostaaceitável.—Sim,senhor.Claroquesim.—Vou acordar sua irmã—ele se virouemdireção àporta, e eudeiumpuloda

cama.—Zoe?—exclamei.—Paraqueprecisadela?— Shh— eleme repreendeu.—Ande logo e se apronte. E lembre-se: não faça

barulho.Nãoacordeasuamãe.Ele fechou a porta sem dizermais nenhuma palavra eme deixou lá, sem entender

nada.Opânicoquetinhacomeçadoaseacalmarvoltouacrescerdentrodemim.Paraque ele precisava de Zoe? Se estava me acordando no meio da noite, era assunto dealquimista—eelanãotinhanadaavercomisso.Tecnicamente,eutambémnãoestavamais envolvida, já que havia sido suspensa por tempo indeterminado por mau

comportamentoduranteoverão.Eseaquestão fosseessa?Ese finalmenteeuestivessesendomandadaparaumcentrodereeducaçãoeZoeiriamesubstituir?Por um momento senti o mundo girar, e me segurei na cama para manter o

equilíbrio.Centrosdereeducação.Eleseramopesadelodejovensalquimistascomoeu,lugares misteriosos para onde levavam aqueles que se aproximavam muito dosvampiros,paraqueaprendessemsobreseuserrosdeconduta.Oquerealmenteacontecialáeraummistérioqueeununcaquisdescobrir.Tinhaquasecertezadeque“reeducação”eraumjeitobonitodedizer“lavagemcerebral”.Eusótinhavistoumapessoavoltardeum lugar desses e, sinceramente, ela parecia ser apenasmetadedoque fora antes.Eracomosefossequaseumzumbi,eeunemquispensarnoquepoderiamterfeitoparaqueficassedaquelejeito.Opedidodomeupaiparaquemeapressasseecooupelaminhamenteetenteideixar

os medos de lado.Ao me lembrar de seu outro aviso, também tratei de não fazerbarulho.Minhamãetinhasonoleve.Normalmenteelanãoiriaseimportarsenosvissesaindo para atender ao chamado dos alquimistas, mas ultimamente ela não andavademonstrandomuita boa vontade comos empregadores domarido (e da filha).Desdequealquimistasirritadosmedeixaramnaportadacasadosmeuspaisnomêspassado,olugarestevetãoacolhedorquantoumpresídio.Meuspaistiveramdiscussõesterríveis,enãoraroeueaminhairmã,Zoe,acabávamossaindodefininho.Zoe.ParaqueeleprecisadaZoe?A pergunta ardia dentro demim enquanto eume apressava parame arrumar. Eu

sabia o que ele queria dizer com “apresentável”. Vestir um jeans e uma camisetaqualquer estava fora de questão. Em vez disso, coloquei uma calça social cinza e umacamisa branca bempassada.Vesti um casaquinhomais escuro, cinza carvão, por cimadelaecoloqueiumcintopretobemajustadonacintura.Umacruzdeouropequena(queeusempreusavanopescoço)foioúnicoenfeitequemedeiaotrabalhodecolocar.Já omeu cabelo era umproblema umpoucomaior.Mesmo depois de apenas duas

horas de sono, estava espetadopara todos os lados.Abaixei os fios damelhormaneiraqueconseguiepasseiumacamadagrossadespray,torcendoparaqueficassemnolugarduranteoqueestavaporvir.Aúnicamaquiagemqueusei foiumacamadadepó.Nãotivetempoparamaisnada.Oprocessotododemorouseisminutosnototal,etalvezfosseomeunovorecorde.

Dispareiescadaabaixoemsilênciocompleto,novamentecomcuidadoparanãoacordaraminhamãe.A sala estava escura,mas saía luz da porta entreaberta do escritório domeupai.Tomeiaquilocomoumconvite,empurreiaportaemeesgueireiparadentro.Umaconversaabafadacessoucomaminhachegada.Meupaimeexaminoudacabeçaaospés e demonstrou sua aprovação àminha aparência em seumelhor estilo: apenas semfazernenhumacrítica.

— Sydney — ele disse de um jeito brusco. —Acredito que já conheça DonnaStanton.A extraordinária alquimista estava parada à janela, de braços cruzados, com a

aparência tão rígida e esbelta quanto eume lembrava. Eu tinha passadomuito tempocomStantonrecentemente,apesardenãopoderdizerqueéramosexatamenteamigas—principalmentedepoisquecertasaçõesminhasacabaramnoscolocandoemumaespéciede“prisãodomiciliarvampiresca”.Mas,seelanutriaalgumressentimentoemrelaçãoamim,nãodeixoutransparecer.Elamecumprimentoucomumacenoeducadodacabeça,comumaexpressãodequemveiotratardenegócios.Havia mais três outros alquimistas ali, todos homens. Foram apresentados como

Barnes,Michaelson eHorowitz. Barnes eMichaelson tinham a idade domeu pai e deStanton.Horowitzeramaisnovo,deviaterunsvinteepoucosanos,eestavaarrumandoinstrumentos de tatuador.Todos estavam vestidos como eu, com roupas de trabalhocomuns, de cores discretas. Nosso objetivo era sempre ter boa aparência, mas semchamaratenção.HaviaséculosqueosalquimistasfaziamopapeldosHomensdePreto,muitoantesdeossereshumanossonharemcomaexistênciadevidaemoutrosmundos.Quando a luz batia no rosto deles da maneira correta, cada alquimista exibia umatatuagemdelírioidênticaàminha.Eu me senti ainda mais desconfortável. Será que aquilo era algum tipo de

interrogatório?Umaavaliaçãoparaverseaminhadecisãodeajudarumameio-vampirarenegada significavaqueasminhas lealdadeshaviammudado?Cruzeiosbraços sobreopeitoeassumiumaexpressãoneutra,torcendoparaparecertranquilaeconfiante.Seeuainda tivesse oportunidade de me defender, minha intenção era apresentar umargumentosólido.Antesquealguémpudesseproferirqualquerpalavra,Zoechegou.Elafechouaporta

atrás de si e olhou ao redor, aterrorizada, com os olhos arregalados.O escritório donosso pai era enorme (ele tinha construído um anexo à casa para ele), e abrigava osocupantescomfolga.Mas,observandoaminhairmãabsorveracena,percebiqueelasesentia sufocada e encurralada. Olhei nos olhos dela e tentei enviar uma mensagemsilenciosadesolidariedade.Deveterfuncionado,porqueelaseapressouparairatéondeeuestava,comaaparênciaumpouquinhomenosamedrontada.— Zoe — meu pai disse. Deixou o nome dela pairar no ar daquele jeito dele,

mostrando com muita clareza para nós duas que estava decepcionado. Eu adivinheiimediatamenteporquê.Elaestavausandojeanseumcasacodemoletomvelho,comocabelopresoemduas tranças fofas,masmalfeitas.Ela estaria“apresentável”de acordocomos padrões de qualquer pessoa...mas não os dele.Eu senti ela se encolher contramim e tentei parecer mais alta e mais protetora. Depois de se assegurar de que suareprovaçãotinhasidoentendida,nossopaiapresentouZoeaosoutros.Stantondirigiuaelaomesmoacenoeducadoquetinhadadoparamimesevoltouparaomeupai.

—Nãoestouentendendo,Jared—Stantondisse.—Qualdasduasvocêvaiusar?—Bom,esteéoproblema—elerespondeu.—Zoefoisolicitada...masnãotenho

certeza se ela está pronta.Aliás, sei que não está. Ela só recebeu o treinamentomaisbásico.Mas,àluzdas...experiências...recentesdeSydney...Imediatamente,aminhacabeçacomeçoua juntaraspeças.Emprimeiro lugar,eo

mais importante, aparentemente eunão seriamandada para um centrode reeducação.Não por enquanto, pelo menos.A reunião era para tratar de outro assunto. Minhadesconfiança anterior estava correta.Havia algumamissão ou tarefa em andamento, equeriam convocar Zoe porque ela, diferentemente de uma outra integrante daquelafamília,nãotinhahistóricodetraiçãoaosalquimistas.Omeupaiestavacertoemdizerque ela só tinha recebido o treinamento básico. Nosso trabalho era hereditário, e eutinha sido escolhida, anos antes, para ser a próxima alquimista da família Sage.Minhairmãmais velha,Carly, tinha sido preterida; agora já estava na faculdade e era velhademais.Emvezdela,meupaitreinouZoecomoreserva,paraocasodealgoacontecercomigo,comoumacidentedecarroouummassacredevampiros.Deiumpassoàfrente,semsaberoqueiadizeratéabriraboca.Aúnicacoisaqueeu

sabia com certeza era que não podia deixar Zoe ser sugada pelas tramoias dosalquimistas. Eu tinha mais medo de colocar a segurança dela em risco do que de sermandadaaumcentrodereeducação—eeutinhabastantemedodisso.—Converseicomumcomitêsobreasminhasaçõesdepoisdoqueaconteceu—eu

disse.— Fiquei com a impressão de que entenderam por que eu fiz as coisas que fiz.Estou totalmentequalificadapara servir damaneira que for necessária... bemmais doqueaminha irmã.Eu tenhoexperiêncianomundoreal.Conheçoeste trabalhode trásparaafrente.—Umpoucodeexperiênciademaisnomundoreal,semelembrobem—Stanton

disse,seca.—Eu,pelomenos,gostariadeescutaressas“razões”maisumavez—Barnesdisse,

traçando aspas no ar com os dedos.— Não acho nada bom atirar uma menina semtreinamentocompletoemação,mastambémachodifícilacreditarqueumapessoaqueajudouuma vampira criminosa está“totalmente qualificada para servir”—mais aspaspretensiosasnoar.Respondicomumsorrisoagradávelparamascararminhairritação.Seeumostrasse

minhasverdadeirasemoções,nãoiriameajudaremnada.—Compreendo,senhor.MasRoseHathawayacabousendoinocentadadocrimede

quefoiacusada.Portanto,tecnicamente,eunãoajudeiumacriminosa.Asminhasações,nofinal,ajudaramaencontraroverdadeiroassassino.—Podeser,masnós, incluindovocê,nãosabíamosqueelaera“inocente”naépoca

—eledisse.—Eusei—respondi.—Maseuacreditavaqueelafosse.

Barnessoltouumagargalhadadedesdém.— E este é o problema.Você deveria ter acreditado no que os alquimistas lhe

disseram,enãosairporaíaplicandoassuasprópriasteoriasmirabolantes.Nomínimo,deveriaterapresentadoasprovasquereuniuaseussuperiores.Provas?Como eu poderia explicar que não foramprovas queme levaram a ajudar

Rose,massimumasensaçãoprofundadequeeladiziaaverdade?Masissoeusabiaqueelesnuncairiamentender.Todosnósfomostreinadosparaacreditarnopioremrelaçãoa criaturas como ela. Dizer a eles que eu tinha visto verdade e honestidade nela nãoajudariaemnadaaminhacausaali.Dizeraelesqueeutinhasidochantageadaporoutrovampiropara ajudá-la seriaumaexplicaçãoaindapior.Sóhaviaumargumentoqueosalquimistastalvezfossemcapazesdecompreender.—Eu... eu não contei para ninguém porque queria ficar com todo o crédito para

mim.Eutinhaesperançasdeque,sedescobrissetudo,poderiaconseguirumapromoçãoeumatarefamelhor.Precisei usar todo o meu autocontrole para contar essa mentira com o rosto

impassível. Eu me sentia humilhada fazendo tal confissão.Até parece que a ambiçãorealmente iriame levar a comportamentos tãoextremos!Aquilo fazia comqueeumesentissedesprezívelesuperficial.Mas,comoeudesconfiava,eraalgoqueosalquimistasentenderiam.Michaelsonsoltouumagargalhadadedesdém.—Elaémalorientada,masissonãoétotalmenteinesperadoparasuaidade.Os outros homens trocaram olhares igualmente condescendentes, até o meu pai.

ApenasStantonpareceuemdúvida,mas ela tinhapresenciadomaisdodesastredoqueeles.Meupaideuumaolhadanosoutros,àesperademaiscomentários.Comoninguém

dissenada,eledeudeombros.— Se ninguém tiver objeções, então eu prefiro usar Sydney. Não que eu entenda

completamenteporqueprecisamdela.—Haviaumlevetomdeacusaçãoemsuavoz,poraindanãotersidocolocadoapardasituação.JaredSagenãogostavadeserdeixadodefora.— Eu não vejo problema em usar a garota mais velha— Barnes disse.— Mas

mantenha amais nova por perto até os outros chegarem,para o caso de alguém fazerobjeção.Fiquei imaginandoquantos“outros” iriam se juntar a nós.Oescritóriodomeupai

nãoeranenhumestádio.Alémdomais,quantomaisgentechegasse,maisprováveleraqueocasofosseimportante.Comeceiasentirarrepiosenquantopensavaemquemissãodeveria ser aquela. Eu já tinha visto os alquimistas darem conta de desastres enormescom apenas uma ou duas pessoas. Que tamanho o problema deveria ter para exigirtantaspessoasassim?

Horowitzfaloupelaprimeiravez.—Oquevocêsqueremqueeufaça?—ReforceatatuagemdeSydney—Stantondisseemtomdecisivo.—Mesmoque

elanãová,nãovai fazermalreforçaros feitiços.Nãovaiadiantarnada tatuarZoeatésabermosoquevamosfazercomela.Meus olhos se voltaram para as bochechas visivelmente nuas — e pálidas — da

minha irmã.Sim.Desdequenãohouvessenenhumlírioali,elaestaria livre.Umavezgravada a tatuagem na sua pele, não havia como voltar atrás. Você pertencia aosalquimistas.Arealidadedissosótinhameatingidomaisoumenosumanoantes.Eraalgoqueeu

não havia percebido quando criança. Desde muito pequena, meu pai me levara aacreditar piamente no caráter correto da nossa obrigação.Eu ainda acreditava que eraalgo correto,mas gostaria que ele também tivessemencionado quanto daminha vidaissoiriaconsumir.Horowitztinhaarmadoumamesadobrávelnaoutrapontadoescritório.Eledeuum

tapinhanelaelançouumsorrisosimpáticoparamim.—Subaaqui—eledisse.—Venhavalidarasuapassagemparaamissão.Barneslançouumolhardedesaprovaçãoparaele.—Porfavor.Vocêpodiamostrarumpoucoderespeitoporesteritual,David.Horowitz só deu de ombros. Eleme ajudou a deitar e, apesar de estar commedo

demais dos outros para sorrir abertamente, fiquei torcendopara que aminha gratidãoaparecessenosmeusolhos.Elesorriudenovo,comunicandoquetinhaentendido.VireiacabeçaeviquandoBarnescolocoureverentementeumapastapretaemumamesadecanto. Os outros alquimistas se reuniram ao redor e deram as mãos na frente dele.Percebi que ele devia ser o hierofante.Amaior parte do que os alquimistas faziam sebaseava na ciência,mas algumas tarefas exigiam assistência divina.Afinal de contas, anossamissão principal de proteger a humanidade partia da crença de que os vampiroseram antinaturais e contrários ao plano deDeus. É por isso que os hierofantes— osnossossacerdotes—trabalhavamladoaladocomnossoscientistas.—ÓSenhor—eleentooudeolhosfechados.—Abençoeesteselixires.Removaa

mácula domal que carregam, para que seu poder doador de vida brilhe através delescompurezaparanós,osseusservos.Ele abriu a pasta e tirouquatro ampolas pequenas, cheias deum líquido vermelho-

escuro.Rótulosqueeunãoconseguilermarcavamcadarecipiente.Comamãofirmeeolhoclínico,Barnesderramouquantidadesprecisasdecadaampolaemumfrascomaior.Depoisdeusar asquatro,pegouumpacotinhodepóeesvaziou sobreamistura.Sentium formigamentonoareoconteúdodo frasco ficoudourado.Eleentregouo frascoaHorowitz,quejáestavacomumaagulhaempunho.Quandoapartecerimonialacabou,todosrelaxaram.

Obediente,vireiparao lado,deixandoabochechaexposta.Ummomentodepois,asombradeHorowitzcaiusobremim.—Vai arder um pouco, mas não vai ser nada em comparação com a tatuagem

original.Ésóumretoque—eleexplicoucomdelicadeza.—Eusei—respondi.Játinhasidoretatuadaantes.—Obrigada.A agulha perfurouminha pele e eu tentei não me contorcer.Ardeu mesmo,mas,

como Horowitz tinha dito, não estava criando uma nova tatuagem. Simplesmenteinjetavaquantidadespequenasdetintanaminhatatuagemexistente,pararecarregarseupoder. Considerei aquilo como um bom sinal. Zoe talvez ainda não estivesse fora deperigo,mas eles certamente não se dariam ao trabalho de retocarminha tatuagem sefossemmeenviarapenasparaumcentrodereeducação.—Enquantoesperamos,seráquepodemnosdizeroqueestáacontecendo?—meu

paipediu.—Sómedisseramquevocêsprecisavamdeumaadolescente.Pelamaneiracomoelefalou,pareciaumpapeldispensável.Eusegureiumaondade

raiva.Paraele,nósnãopassávamosdisso.—Estamoscomumproblema—ouviStantondizer.Finalmente,euteriaalgumas

respostas.—ComosMoroi.Soltei um pequeno suspiro de alívio. Melhor eles do que os Strigoi. Qualquer

“problema”queosalquimistasenfrentavamsempreenvolviaumadasraçasdevampiro,eeusemprepreferiaosvivos,quenãomatam.Àsvezes,elesquasepareciamhumanos(mas eu nunca diria isso a ninguém presente ali), e viviam emorriam como nós.OsStrigoi, no entanto, eram aberrações da natureza. Vampiros assassinos, que nuncamorrem, criados ou quando um Strigoi forçava uma vítima a beber seu sangue ouquandoumMoroi tiravaavidadeoutrodepropósito,aobeberseusangue.ProblemascomosStrigoicostumavamterminarcomalguémmorto.Todosos tiposdesituaçõespossíveis sedesenrolavamemminhamenteenquantoeu

imaginavaqualproblematinhaexigidoaçãodosalquimistasnaquelanoite:umhumanoque tinha reparado em alguém com caninos compridos, um fornecedor que fugiu etornoupública suacondição,umMoroi tratadopormédicoshumanos...Esseseramostiposdeproblemasquenós,osalquimistas,maisenfrentávamos,eeutinhasidotreinadapara dar conta deles e encobri-los com facilidade.No entanto, por que precisariamde“umaadolescente”paraqualquerumadessascoisaseraummistérioparamim.—Vocêssabemqueeleselegeramsuajovemrainhanomêspassado—Barnesdisse.

Praticamente dava para vê-lo revirando os olhos. Todos os presentes soltarammurmúrios de afirmação.Claro que sabiam.Os alquimistas prestavammuita atençãoaos trâmites políticos dos Moroi. Saber o que os vampiros estavam fazendo erafundamental para mantê-los em segredo do resto da humanidade — e o resto dahumanidade a salvo deles. Essa era a nossa razão de ser: proteger nossos semelhantes.Conheçabemseuinimigoeraumditadoquenóslevávamosmuitoasério.Agarotaque

osMoroi tinhamescolhido como rainha,VasilisaDragomir, tinhadezoito anos, assimcomoeu.—Nãofiquetensa—Horowitzdissecomgentileza.Eu não tinha percebido a minha tensão.Tentei relaxar, mas pensar emVasilisa

Dragomirme fez lembrardeRoseHathaway.Pouco à vontade, pensei que talveznãodevesse ter me apressado tanto em concluir que estava fora de perigo. Felizmente,Barnes só continuou com a história, semmencionar a minha conexão indireta com ajovemrainhaeseusassociados.— Por mais chocante que isso seja para nós, é chocante na mesma medida para

algunsmembros do povo deles.Houvemuitasmanifestações contrárias e dissidências.NinguémtentouatacarameninaDragomir,masissoprovavelmentesedeveaofatodeela ser muito bem protegida. Parece que os inimigos dela encontraram um jeito deatingi-la:porintermédiodesuairmã.—Jill—deixeiescapar.Horowitzmerepreendeuportermemexido,enomesmo

instanteme arrependi de ter chamado a atenção paramim e omeu conhecimento dosMoroi.Ainda assim, uma imagem de JillianMastrano surgiu naminhamente, alta eirritantemente magra, como todos os Moroi, com grandes olhos verdes que semprepareciamnervosos.E ela tinha bonsmotivos para isso.Quando tinha quinze anos, JillhaviadescobertoserirmãilegítimadeVasilisa,oquefaziadelaaúnicaoutraintegranteda linhagem real de sua família. Ela tambémestava envolvida na confusão emquememetinoverão.—Vocês conhecem as leis deles — Stanton prosseguiu, após um momento de

silêncio constrangedor. O tom dela transmitia tudo que nós pensávamos das leis dosMoroi. Uma monarquia eletiva? Não fazia sentido, mas que outra coisa podia seresperada de seres tão antinaturais quanto os vampiros?— EVasilisa precisa ter umfamiliar para poder manter o trono. Portanto, seus inimigos resolveram que, se nãopodemremovê-ladiretamente,vãoremoversuafamília.Um calafrio percorreu minha espinha devido ao significado subentendido daquela

afirmação,emaisumavezfizumcomentáriosempensar.— Aconteceu alguma coisa com Jill? — Dessa vez, pelo menos, escolhi um

momento em que Horowitz estava recarregando a agulha, sem perigo de estragar atatuagem.Mordiolábioparameimpedirdefalarmais,imaginandoabroncanosolhosdomeu

pai.MostrarpreocupaçãoporumMoroieraaúltimacoisaqueeudevia fazer, levandoem contaminha situação incerta. Eu não era apegada a Jill,mas a ideia de que haviaalguém tentandomatar uma garota de quinze anos— amesma idade de Zoe— eraapavorante,independentementedaraçaàqualelapertencesse.—É issoquenãoestá claro—Stanton refletiu.—Ela foi atacada,disso sabemos

comcerteza,masnãotemosinformaçãosefoirealmenteferida.Detodomodo,elaestá

bemagora,masa tentativaocorreunaprópriacortedeles, indíciodequehá traidoresnoaltoescalão.Barnessoltouumagargalhadadedesdém:—Masoque sepodeesperar?Não sei comoa raçadeles conseguiu sobreviverpor

tantotemposemquesevoltassemunscontraosoutros.Ouviram-semurmúriosdeconcordância.—Sejaridículoounão,nãopodemospermitirdejeitonenhumqueentrememuma

guerracivil—Stantondisse.—AlgunsMoroifizeramprotestos,tantoquechamaramaatençãodamídiahumana.Nãopodemospermitirisso.Precisamosqueogovernodelestenhaestabilidade,eissosignificagarantirasegurançadessamenina.Talveznãopossamconfiaremsimesmos,maspodemconfiaremnós.Não adiantaria nada eu observar que os Moroi, na verdade, não confiavam nos

alquimistas.Mas,comonósnãotínhamos interesseemmataramonarcadosMoroiousuafamília,suponhoqueissonostornavamaisconfiáveisdoquemuitagente.—Precisamos fazer ameninadesaparecer—Michaelsondisse.—Pelomenos até

que os Moroi desfaçam a lei que deixa o trono deVasilisa tão vulnerável. EsconderMastrano no meio de seu próprio povo não é seguro no momento, então precisamosescondê-la entre os humanos. — Pingava desprezo das palavras dele. — Mas éimperativo que ela tambémpermaneça escondidadoshumanos.Anossa raçanãopodesaberdaexistênciadeles.—Depoisdenosconsultarmoscomosguardiões,encontramosum localque todos

acreditamosserseguroparaela,protegidotantodosMoroiquantodosStrigoi—disseStanton. — No entanto, para garantir que ela e seus acompanhantes permaneçamdespercebidos, vamos precisar ter alquimistas a postos, dedicados exclusivamente àsnecessidadesdela,paraocasodequalquercomplicaçãosurgir.Meupaidesdenhou.— Isso é um desperdício dos nossos recursos. Além disso, vai ser uma tarefa

insuportávelparaquemprecisarficarcomela.Tiveummaupressentimentoarespeitodoqueestavaporvir.—É aí que Sydney entra— Stanton falou.—Gostaríamos que ela fosse um dos

alquimistasaacompanharJilliannoesconderijo.—Oquê?—meupaiexclamou.—Nãopodeestarfalandosério.— Por que não? — O tom de Stanton era calmo e firme. — Elas têm idade

próxima;porisso,seestiveremjuntas,nãovãodespertarsuspeitas.ESydneyjáconheceamenina.Ecertamenteconvivercomelanãoserátão“insuportável”quantoseriaparaoutrosalquimistas.Amensagemsubentendidaeraaltaeclara.Eunãoestavalivredomeupassado,pelo

menosporenquanto.Horowitzfezumapausaeergueuaagulha,paramedarchancedefalar.A minha mente estava em disparada. Eu precisava dar alguma resposta. Não

queriaparecermuitoincomodadacomoplano.Euprecisavarestaurarminhareputaçãoentre os alquimistas e demonstrar a minha disposição de seguir ordens. Dito isso, eutambémnãoqueriapassaraimpressãodequemesentiaàvontadedemaisnacompanhiadevampiros,nemdeseuscorrespondentesmeio-humanos,osdampiros.— Passar tempo com um deles nunca é divertido — eu disse com cuidado,

mantendoavozdespreocupadaeinsolente.—Pormaisquevocêfaçaissováriasvezes.Masfareioquefornecessárioparamanteranós...eatodososdemais...emsegurança—nãoprecisavaexplicarque“osdemais”eramoshumanos.—Pronto,estávendosó, Jared?—Barnesparecia satisfeitocomaresposta.—A

menina sabequalé suaobrigação. Já tomamosváriasprovidênciasparaque tudocorrabem, e certamente não vamos mandá-la para lá sozinha... principalmente porque ameninaMoroitambémnãoestarásozinha.—Comoassim?—Omeupai aindanãoparecia contente comnadadaquilo, e eu

fiquei imaginandooqueestaria incomodando-omais.Eleachavamesmoque eu estariaemperigo?Ouasuapreocupaçãoeraapenascomapossibilidadedeque,seeupassassemais tempo com osMoroi, minha lealdademudaria ainda mais de lado?—Quantosdelesvirão?—Vãomandarumdampiro—Michaelsondisse.—Umdosguardiõesdeles,eeu

realmentenãovejoproblemanisso.OlocalqueescolhemosdeveestarlivredeStrigoi,mas,senãoestiver,émelhorqueeleslutemcontraaquelesmonstrosnonossolugar.Os guardiões eram dampiros com treinamento especial, que serviam de guarda-

costas.—Pronto—Horowitzdisseparamimeseafastou.—Podesesentar.Obedecieresistiàvontadedetocarnabochecha.Aúnicacoisaquesentidotrabalho

dele foi a picadada agulha,mas eu sabia queumamagia poderosa estava agindo sobremim,umamagiaquemedariaumsistemaimunológicosobre-humanoemeimpediriadefalarsobreassuntosdosvampiroscomhumanoscomuns.Tenteinãopensarnaoutraparte,arespeitodaorigemdamagia.Astatuagenseramummalnecessário.Osoutroscontinuavamempé,semprestaratençãoemmim—bom,àexceçãode

Zoe. Ela continuava com uma expressão de confusão emedo, e olhava ansiosa para aminhadireção.—Talvez haja mais um Moroi como acompanhante — Stanton prosseguiu. —

Sinceramente, não sei bem por que, mas insistiram muito para que ele ficasse comMastrano. Dissemos que, quanto menosMoroi precisássemos esconder, melhor seria,mas... bom. Eles pareceram considerar necessário, e disseram que tomariam asprovidênciasparaacomodá-lolá.AchoqueéalgumIvashkov.Irrelevante.—Ondeé“lá”?—meupaiperguntou.—Paraondequeremmandá-la?Excelentequestão.Euestavamefazendoamesmapergunta.Meuprimeirotrabalho

emtempointegralcomosalquimistashaviamemandadoparaooutroladodomundo,

até a Rússia. Se os alquimistas estavam determinados a esconder Jill, não havia comosaberqualseriaolocalremotoqueescolheriamparacolocá-la.Porummomento,ouseisonhar que poderíamos ir parar na cidade dos meus sonhos: Roma. Obras de artelendárias e comida italiana pareciam uma boa maneira de recompensar o trabalhoburocráticoeosvampiros.—PalmSprings—Barnesrespondeu.— Palm Springs? — repeti. Não era isso que eu estava esperando. Quando eu

pensava em Palm Springs, enxergava astros de cinema e campos de golfe. Não eramexatamentefériasemRoma,mastambémnãoeraoÁrtico.UmsorrisinhotortorepuxouoslábiosdeStanton.—Ficanodesertoerecebemuitosol.TotalmenteindesejávelparaosStrigoi.— Não seria indesejável para os Moroi também?— perguntei, pensando mais à

frente.OsMoroinãoeramincineradosdebaixodosolcomoosStrigoi,masaexposiçãoexcessivaaele,aindaassim,deixavaosMoroifracosedoentes.— Bom, seria — Stanton reconheceu. — Mas um pouco de desconforto vale a

segurança que o local nos proporciona.Desde que osMoroi passem amaior parte dotempo em ambientes fechados, não será um problema.Além disso, vai desestimularoutrosMoroiairematéláe...Osomdaportadeumcarroseabrindoebatendodoladodeforachamouaatenção

detodos.—Ah—disseMichaelson.—Osoutroschegaram.Vouabriraporta.Ele saiu do escritório e provavelmente se dirigiu à porta de entrada, para receber

quem havia chegado. Momentos depois, ouvi uma voz nova falando, enquantoMichaelsonvoltavaatéondenósestávamos.—Bom,meupainãopôdevir,porissomandouqueeuviessesozinho—orecém-

chegadovinhadizendo.Aportadoescritórioseabriueomeucoraçãoparou.Não,eupensei.Qualquerummenosele.—Jared—orecém-chegadodisseaoavistaromeupai.—Ébomvê-lodenovo.Meupai,quemaltinhaolhadoparamimanoitetoda,chegouasorrir.—Keith!Estivemeperguntandocomovocêestava.Osdoisseapertaramasmãoseumaondadedesgostotomoucontademim.—EsteaquiéKeithDarnell—Michaelsondisseaoapresentá-loaosoutros.— Filho deTomDarnell?—Barnes perguntou, impressionado.TomDarnell era

umlíderfamosoentreosalquimistas.—Opróprio—Keithrespondeu,alegre.Eleeraunscincoanosmaisvelho,eseu

cabelotinhaumtomdeloiromaisclarodoqueomeu.Euconheciamuitasgarotasqueo achavam bonito. Mas, eu?Achava que ele era péssimo. Era praticamente a últimapessoaqueeuesperavaverali.

—EacreditoquevocêconheçaasirmãsSage—Michaelsoncompletou.KeithvoltouseusolhosazuisprimeiroparaZoe.Haviaumadiferençamínimadeum

para o outro na cor: um olho, feito de vidro, olhava para o nada adiante e nunca semovia;ooutropiscavaparaela,enquantoseusorrisosealargava.Ele ainda consegue piscar, eu pensei, furiosa. Aquela piscadela irritante, idiota e

arrogante!Mas,bom,porquenãoconseguiria?Nós todos ficamossabendodoacidenteque ele sofrera naquele ano, acidente que tinha lhe custado um olho. Ele haviasobrevividocomumolhointacto,mas,dealgummodo,naminhacabeça,achavaqueaperdadooutroacabariacomaquelapiscadelainsuportável.—PequenaZoe!Olhesóparavocê,tãocrescida—eledisse,cheiodecarinho.Eu

nãosouumapessoaviolenta,dejeitonenhum,massentiumavontaderepentinadebaterneleporolharparaaminhairmãdaquelamaneira.Elaconseguiudarumsorriso,obviamentealiviadaporverumrostoconhecido.Mas,

quando Keith se voltou para mim, todo o charme e a simpatia desapareceram. Osentimentoeramútuo.A fúria cegae ardenteque ia crescendodentrodemimera tão avassaladoraqueeu

demoreiparaformularqualquertipodereação.—Olá,Keith—eudisse,rígida.Keith nem tentou se equiparar à minha civilidade forçada. Ele se virou

imediatamenteparaosalquimistas.—Oqueelaestáfazendoaqui?— Sabemos que você requisitou Zoe— Stanton disse com a voz firme—,mas,

depois de considerarmos, resolvemos que é melhor Sydney fazer esse papel. Aexperiênciaqueelatemsesobrepõeaqualquerpreocupaçãoquetenhamosemrelaçãoasuasações.—Não—Keith logorespondeuevoltouseuolharazuldeaçomaisumavezpara

mim. — Ela não vai me acompanhar de jeito nenhum. Não posso deixar que umaadoradoradevampirosdegeneradaestragueamissãoparatodosnós.Vamosficarcomairmãdela.

2

Algumaspessoasengoliramemseco,semdúvidaporcausadaexpressão“adoradoradevampiros”que Keith usou. Nenhuma das palavras era tão terrível assim sozinha, mas juntas...bom, elas representavam uma ideia que era praticamente um anátema a tudo que osalquimistas defendiam.Nós lutávamos para proteger os humanos dos vampiros. Estaremconluiocomessascriaturaserabasicamenteapiorcoisadequequalquerumdenóspodia ser acusado. Mesmo quando me questionaram anteriormente, os outrosalquimistastinhamsidomuitocuidadososnaescolhadaspalavras.OpalavreadodeKeithfoiquaseobsceno.Horowitzpareciairritadoemmeunomee

abriuabocaparafalar,comosepudesseretrucarcomtantaacidezquantoele.Depoisdedar umaolhada rápida emZoe e emmim, ele pareceu reconsiderar e permaneceu emsilêncio.Michaelson,noentanto,nãoconseguiusegurarummurmúrio:—Protejatodosnós—efezosinalcontraomal.Noentanto,não foramaspalavrasdeKeithquemedeixaramloucadavida (apesar

deaquilocertamentemefazersentirumcalafrio).FoiaobservaçãoqueStantondeixouescapar.NóssabemosquevocêrequisitouZoe.Keith tinha requisitadoZoeparaaquela tarefa?Aminha resoluçãodemantê-la fora

daquiloaumentouaindamais.CerreiospunhossódepensaremZoeoacompanhando.TodomundoalipodiaacharqueKeithDarnelleraalgumtipodegarotoexemplar,masele nãome enganava.Nenhumamenina—muitomenos aminha irmã—devia ficarsozinhacomele.—Keith—Stantondisse,comumleveardeadvertêncianavoz.—Possorespeitar

asuaopinião,masvocênãoestáemposiçãodefazeressaescolha.Elecorou.—PalmSpringséomeuposto!Tenhotodoodireitodedeterminarquementrano

meuterritório.—Consigoentenderporquevocêsesenteassim—meupaidisse.

Inacreditável.SeZoeoueuquestionássemosaautoridadecomoKeithtinhafeito,elenãoteriahesitadoemdizerquaiseramosnossos“direitos”—oumelhor,diriaquenãotínhamosnenhum. Keith tinha passado um verão com a minha família — jovensalquimistasàsvezesfaziamissoduranteotreinamento—,eomeupaicomeçouatratá-locomoo filhoquenuncateve.JánaquelaépocahaviadoispesoseduasmedidasentreKeithenós.Parecequeotempoeadistâncianãotinhamacabadocomisso.— Palm Springs pode ser o seu posto — Stanton disse —, mas esta missão se

originade lugaresnaorganizaçãoqueestãomuito foradeseualcance.Vocêéessencialpara a coordenação, sim;masnãoé,demaneiranenhuma, a autoridademáximanestecaso.Ao contrário demim, desconfio que Stanton devia ter batido em algumas pessoas

quando eramais nova— e acho que era exatamente isso que queria fazer comKeithnaquelemomento.Eraengraçadoelasetornarminhadefensora,jáqueeutinhacertezadequeelanãohaviaengolidoahistóriadeeuterusadoRoseparafazeraminhacarreiraavançar.Keith visivelmente se acalmou; ele teve a prudência de admitir que uma explosão

infantilnãolevariaalugarnenhum.—Eu compreendo. Só estou preocupado com o sucesso destamissão. Conheço as

duas garotas Sage.Mesmoantesdo“incidente”deSydney, já tinha sériaspreocupaçõesemrelação a ela.Mas acheiqueela tinha superado aquela fase,por issonãomedei aotrabalhodedizernadana época.Agora vejoque estava errado.Naocasião, realmenteachavaqueZoe teria sidoumaescolhamuitomelhorparaocuparaposiçãoda família.Semofensas, Jared—ele lançouparaomeupaiumsorrisoque supostamentedeveriaserencantador.Nesseínterim,iaficandocadavezmaisdifícilesconderaminhaincredulidade.—Zoetinhaonzeanosquandovocêesteveaqui—eudisse.—Comopoderiatirar

essasconclusões?—Eunãoacreditei,nemporuminstante,queeletinha“preocupações”em relação a mim naquela época. Não, apague isso. Ele provavelmente tinhapreocupaçõesnoúltimodiaquepassouconosco,quandoeuoconfronteiarespeitodeumsegredosujoqueeleguardava.Eutinhaquasecertezadequeeraesseomotivoparatudoaquilo. Ele queria me silenciar. As minhas aventuras com Rose eram apenas umadesculpaparametirardocaminho.—Zoesemprefoimaduraparaaidade—Keithdisse.—Àsvezes,agentevêlogo.— Zoe nunca viu um Strigoi, muito menos um Moroi! E provavelmente ficaria

paralisadasevisse.Issotambémvaleparaamaiorpartedosalquimistas—observei.—Qualquer pessoa que for enviada terá que aguentar ficar perto deles, eindependentementedoquevocêpensesobreasminhasmotivações,euestouacostumadaa isso. Não gosto deles, mas sei como tolerá-los. Zoe só recebeu a mais básica dasinstruções...eapenasdentrodecasa.Todomundoficarepetindoqueestaéumamissão

séria. Você quer mesmo arriscar o desfecho dela por inexperiência e receios semfundamento? — terminei, orgulhosa de mim mesma por ter permanecido calma eapresentadoumargumentotãorazoável.Barnessemexeu,mudandodeposição,poucoàvontade.—MasseKeithtinhadúvidasanosatrás...—OtreinamentodeZoeprovavelmentebastaparaqueelasevire—meupaidisse.Havia cinco minutos, ele tinha concordado que eu fosse no lugar dela! Será que

alguém tinha escutado o que eu disse? Parecia que eu tinha ficado invisível depois dachegadadeKeith.Horowitzestavaocupadolimpandoearrumandoseusinstrumentosdetatuagem,masergueuosolhosparadesdenhardaobservaçãodeBarnes.—Vocêdisseaspalavrasmágicas:“anosatrás”.Naépoca,Keithnãodeviasermuito

mais velho do que estas meninas são agora. — Horowitz fechou seu estojo deinstrumentos e se apoiou despreocupadamente na parede, com os braços cruzados.—Nãoduvidodevocê,Keith.Nãoexatamente.Masnãotenhomuitacertezasevocêpodebasearasuaopiniãoemlembrançasdequandotodosvocêseramcrianças.Pela lógica deHorowitz, ele estava dizendo que eu ainda era criança,mas nãome

incomodei. Ele havia feito seus comentários de umamaneira simples e sem esforço, eainda assim deixou Keith parecendo um idiota. Keith também percebeu isso, e ficoutodovermelho.—Concordo—disseStanton,queestavaclaramenteficandoimpaciente.—Sydney

quermuito fazer isso,epoucaspessoaspensariamassim, levandoemcontaqueelavaiterquemorarcomumavampira.Queromuito?Nãoexatamente.MaseurealmentequeriaprotegerZoeatodocusto,

erestauraraminhacredibilidade.SeissosignificavafrustrarKeithDarnellnocaminho,melhorainda...—Espere—eudisse,repassandoaspalavrasdeStanton.—Vocêdisse morarcom

umavampira?—Disse—Stanton respondeu.—Mesmoque esteja escondida, a vidadamenina

Moroi precisa ter certa semelhança com uma vida normal. Decidimos matar doiscoelhoscomumacajadadasóematriculá-laemuminternatoparticular.Issodácontadaeducaçãoe da hospedagem dela.Vamos tomar providências para que vocês dividam omesmoquarto.—Masissonãosignifica...issonãosignificaqueeuteriadefrequentaraescola?—

perguntei,sentindo-meumtantoconfusa.—Eujámeformei.Noensinomédio,pelomenos.Tinhadeixadoclaroparaomeupai,váriasvezes,que

adoraria fazer faculdade. Ele tinha deixado igualmente claro que não via necessidadedisso.—Estávendo?—Keithdisse,agarrando-seàoportunidade.—Elaévelhademais.

Zoecombinamelhoremrelaçãoàidade.

—Sydneypodepassarporalunadoúltimoano.Ela tema idadecerta.—Stantonmemediucomosolhos.—Alémdomais,vocêrecebeueducaçãoemcasa,certo?Estaseráumaexperiêncianovaparavocê.Vaipoderveroqueperdeu.—Provavelmentevocêvaiacharfácil—meupaidisse,commávontade.—Asua

educaçãofoisuperioraqualquercoisaqueelespossamoferecer.Beloautoelogiodisfarçado,pai.Eu estava com medo de demonstrar como esse acordo estava me deixando

desconfortável. A minha resolução de cuidar de Zoe e de mim mesma não tinhamudado,masascomplicaçõessóaumentavam.Repetiroensinomédio.Morarcomumavampira.Mantê-la sobumprogramadeproteçãoà testemunha.Eapesardeeu termegabadoarespeitodeficaràvontadepertodevampiros,aideiadedividiroquartocomuma—mesmoquefosseaparentementebenignacomoJill—eraenervante.Umoutrodesgostopossívelmeocorreu.—Você também seria um aluno disfarçado? — perguntei a Keith.A ideia de

emprestaranotaçõesdeaulaparaelemedeixouenjoadamaisumavez.—Claroquenão—ele respondeu,parecendo insultado.—Eu sou velhodemais.

EusereioFacilitadordeMissãodeÁreaLocal—eupodiaapostarqueeletinhaacabadodeinventaraqueletítuloalimesmo.—Aminhafunçãoéajudaracoordenaramissãoefazerrelatóriosaosnossossuperiores.Enãovoufazerissosefor elaquemestiverlá—eleolhouderostoemrostoaoproferiraúltimafrase,masnãohaviadúvidasdequemeraela.Eu.— Então, não faça— Stanton disse sem rodeios.— Sydney vai. Esta é a minha

decisão,evoudefendê-laperantequalquerautoridadesuperior, se forpreciso.Seé tãocontrário à colocação dela, sr. Darnell, providenciarei pessoalmente para que sejatransferidodePalmSpringsenãopreciselidarcomela.TodososolhossevoltaramparaKeith,eelehesitou.Percebiqueelaotinhapegado

emumaarmadilha.Euimaginavaque,comoclimaquefazialá,PalmSpringsnãodeviatermuita açãode vampiros.O trabalhodeKeith provavelmente era bem fácil; já eu,quando trabalhei em São Petersburgo, tive que remediar danos várias vezes.Aquelelugar era um porto seguro para os vampiros, assim como alguns outros lugares naEuropa e naÁsia que omeu pai tinhame levado para visitar. Sem falar de Praga. SeKeith fosse transferido, ele correria o risco de ter muito mais trabalho, além de sermandado para um localmuito pior.Afinal, apesar de Palm Springs não ser agradávelparaosvampiros,pareciaumlugarfantásticoparaoshumanos.OrostodeKeithconfirmoutudoisso.ElenãoqueriasairdePalmSprings.—Eseelaforparaláeeutivermotivosparasuspeitardetraiçãomaisumavez?— Então você a delata — Horowitz respondeu, segurando um bocejo. Ele

obviamentenãoestavanadaimpressionadocomKeith.—Damesmamaneiraquefariacomqualqueroutrapessoa.

—Enquantoisso,possoaprimorarotreinamentodeZoe—meupaidisse,quaseemtomdedesculpaparaKeith.Ficou clarodeque ladoele estava.Nãoeradomeu.NãoeratambémdodeZoe,parafalaraverdade.—Então,seencontrarfalhasemSydney,poderemossubstituí-la.EumearrepieiaopensarqueKeithiriadecidirseeutinhafalhasounão,masnemde

longeissomeincomodoutantoquantoopensamentodequeZoeaindaestariaenvolvidanaquilo.Seomeupaiiriamantê-lanareserva,entãoelaaindanãoestavaforadeperigo.Os alquimistas ainda poderiam ficar de olho nela — assim como Keith. Naquelemomentoeujureiparamimmesmaquefariatudoquefossenecessário,atédaruvasnabocadeKeith,masiriagarantirqueelenãoteriarazãonenhumaparaduvidardaminhalealdade.—Tudobem—eledisse,easpalavraspareciamcausar-lhemuitador.—Sydney

pode ir...porenquanto.Masvouficardeolhoemvocê—ele fixouoolharemmim.—Enão vou cobrir as suas falhas.Vai ser responsável pormanter aquela vampira nalinhaelevá-laparasealimentar.— Levá-la para se alimentar? — perguntei com surpresa. Claro que sim. Jill

precisariadesangue.Porummomento, todaaminhaconfiançavacilou.Era fácil falarem andar com vampiros quando não havia nenhum deles por perto. Mais fácil aindaquandonãosepensavanaquiloque faziadosvampirosoqueeleseram.Sangue.Aquelanecessidadeterríveleantinaturalquepreenchiasuaexistência.Umaideiahorrívelsurgiunaminha cabeçae sumiucomamesma rapidezque apareceu. Seráqueeuvou terquedaromeusangueparaela?Não.Issoeraridículo.Esseeraumlimitequeosalquimistasjamaisultrapassariam.Engoliemsecoetenteiescondermeubrevemomentodepânico.—Comoplanejamalimentá-la?StantonfezumsinalcomacabeçaparaKeith.— Pode explicar a ela?—Acho que estava dando a ele uma chance de se sentir

importante,umamaneiradecompensarsuaderrotaanterior.Eleentrounadela.—SóháumMoroimorandoemPalmSpringsdequetemosnotícia—Keithdisse.

Enquantofalava,repareiqueocabeloloirodesgrenhadodeleestavatodocobertodegel.Por causa disso, os fios tinham um brilho pegajoso que eu não achava nem um poucoatraente.Alémdomais,eunãoconfiavaemnenhumhomemqueusassemaisprodutosdebelezadoqueeu.—Esequer saberaminhaopinião,eleé louco.Maséum loucoinofensivo... na medida em que qualquer um deles pode ser inofensivo. É um velhorecluso que mora nos arredores da cidade.Tem alguma birra contra o governo dosMoroienão se associa anenhumdeles,demodoquenãovai contarparaninguémquevocês estão lá. E omais importante é que ele tem uma fornecedora e está disposto acompartilhá-la.Franziatesta.— Nós queremos mesmo que Jill ande com um Moroi contrário ao governo? O

motivo disso tudo émanter a estabilidade deles. Se a apresentarmos a algum rebelde,comopoderemossaberqueelenãovaitentarusá-la?—Estaéumaobservaçãoexcelente—Michaelsondisse,aparentementesurpresoao

admitirisso.Aminha intençãonãoera acabar comKeith.Meu raciocínio apenas tinha avançado

pelo caminho, localizando um problema em potencial e apontando-o.Mas, pelo olharque ele lançou na minha direção, foi como se eu estivesse tentando desacreditar ainformaçãodeledepropósitoedeixá-lomal.—Obviamente,nãovamoscontarparaelequemelaé—eledissecomumbrilho

de raivanoolhobom.— Isso seria estupidez.E elenão fazpartedenenhuma facção.Não faz parte de nada. Está convencido de que os Moroi e seus guardiões odecepcionaram,porissonãoquerterenvolvimentocomnenhumdeles.ConteiparaeleumahistóriasobrecomoafamíliadeJilltemosmesmossentimentosantissociaisqueeletem,porissoelesemostrousolidário.—Vocêestácertadetercautela,Sydney—Stantondisse.Haviaumaexpressãode

aprovação em seus olhos, como se estivesse contente por ter me defendido. Essaaprovação significava muito para mim, levando em conta que ela sempre parecia sermuitorígida.—Nãopodemosnosdeixar levarpornenhumaideiapreconcebidadeles.ApesardetambémtermospedidoinformaçõesarespeitodesteMoroiaAbeMazur,queconcordaqueeleébeminofensivo.—AbeMazur?—Michaelson desdenhou. Ele passou amão na barba grisalha.—

Sei.Tenhocertezadequeeleéespecialistaemsaberqueméinofensivoounão.Omeucoraçãodeuumsaltoaoouviraquelenome,mastenteinãodemonstrar. Não

demonstre reação, não demonstre reação, ordenei ao meu rosto. Depois de respirarfundo,pergunteicommuito,muitocuidado:—AbeMazur é oMoroi que vai acompanhar Jill? Eu o conheço...mas achei que

tinhamditoqueumIvashkovseriaseuacompanhante.SeAbeMazurfixasseresidênciaemPalmSprings,issoalterariaascoisas,emuito.Michaelsondesdenhou.—Não, nós jamais enviaríamos você para trabalhar comAbeMazur. Ele só está

ajudandocomaorganizaçãodamissão.—OquehádetãoruimarespeitodeAbeMazur?—Keithperguntou.—Nãosei

quemeleé.EuobservavaKeithcommuitaatençãoenquantofalava,embuscadealgumvestígio

dequeelequerianosenganar.Masnão.Seu rostoera só inocência,estavaobviamentecurioso. Seus olhos azuis, ou melhor, seu olho azul exibia uma rara expressão deconfusão, em contraste com sua constante arrogância de quem sabe tudo.O nome deAbe não significava nada para ele. Soltei a respiração que eu nem percebi estarsegurando.

— É um canalha— Stanton disse sem rodeios.— Ele tem informações demaissobrecoisasquenãodeviasaber.Éútil,maseunãoconfionele.Um canalha? Isso era elogio.AbeMazur era umMoroi cujo apelido na Rússia—

zmey,aserpente—resumiatudo.Abetinha feitovários favoresparamim,epreciseiretribuirdemaneirasquemecolocaramemgranderisco.UmadascoisasquepreciseifazerfoiajudarRoseafugir.Bom,elechamouderetribuição;paramimfoichantagem.Eu não tinha omenor desejo de voltar a cruzar com ele, principalmente porque tinhamedodoquemaiselepoderiapedir.Apartemaisfrustranteeraquenãohavianinguémaquemeupudesserecorrerparapedirajuda.Osmeussuperioresnãoiriamreagirbemsesoubessemque,alémdetodasasminhasoutrasatividadescomosvampiros,euaindafaziaacordosparaleloscomeles.— Nenhum deles merece confiança — meu pai observou. Ele fez o sinal dos

alquimistascontraomal,umacruznoombroesquerdotraçadacomamãodireita.— É,masMazur é pior do que amaioria—Michaelson disse. Ele disfarçou um

bocejoque serviupara lembrar a todosnósque estávamosnomeiodamadrugada.—Estamoscombinados,então?Murmúrios de concordância se fizeram ouvir. A expressão anuviada de Keith

demonstrava comoestava insatisfeitopor as coisasnão seremdo jeitoquequeria,masnãoesboçoumaisnenhumatentativadeimpedirqueeufosse.—Achoqueagoranósjápodemosirembora—eledisse.Demoreiumsegundoparaperceberque“nós”éramoseleeeu.—Agora?—perguntei,incrédula.Eledeudeombros.— Os vampiros vão chegar logo. Precisamos nos assegurar de que tudo estará

pronto para eles. Se nos revezarmos no volante, conseguiremos chegar lá amanhã àtarde.—Ótimo—eu disse, emburrada.Uma viagemde carro comKeith. Eca.Mas o

quemaiseupodiadizer?Nãotinhaescolhaemrelaçãoaissoe,mesmoquetivesse,nãoestava emposiçãode recusarnadaqueos alquimistas exigissemdemimnomomento.Naquelanoite,eutinhaavaliadotodasasminhaspossibilidades,eprecisavaacreditarqueestarcomKeitheramelhordoqueirparaumcentrodereeducação.Alémdomais,eutinha acabado de travar uma batalha árdua para provar o meu valor e poupar Zoe.Precisavacontinuardemonstrandoqueeuencarariaqualquercoisa.Omeupaimedispensoupara fazer asmalas comamesma rispidez comque tinha

meordenadoaparecerapresentávelantes.Deixeiosoutrosnoescritórioemeapresseiem silêncio até o quarto, sem deixar de pensar na minha mãe que dormia. Eu eraespecialista em fazer asmalas com rapidez e eficiência, graças às viagens-surpresa emqueomeupaihaviamelevadoduranteainfância.Aliás,euatémantinhaumanécessairecomprodutosdetoaleteprontaparapartir.Oproblemanãoestavatantonavelocidade,

esimemsaberquantacoisalevar.Aduraçãodamissãonãotinhasidoespecificada,eeufiquei com a sensação desagradável de que, na verdade, ninguém sabia. Será queestávamos falando de algumas semanas? De um ano letivo inteiro? Eu tinha ouvidoalguémmencionarqueosMoroiqueriamacabarcomaleiquecolocavaJillemperigo,masessepareciaserotipodeprocessolegalquepoderiademorarumpouco.Parapiorarascoisas,eunemsabiaoquevestirparairàescola.Aúnicacoisadequeeutinhacertezaeraqueoclimaseriaquente.Acabeicolocandonamaladezdasminhasroupasmaislevesetorciparateracessoaumalavanderia.—Sydney?EuestavacolocandoolaptopemumabolsaatiracoloquandoZoeapareceuàminha

porta.Elatinharefeitoastranças,queestavammaisbempresas,efiqueiimaginandoseaquiloeraumatentativadeimpressionaronossopai.—Oi—eudisse,dandoumsorriso.Elaentrounoquartoefechouaportaatrásde

si.Fiqueicontenteporelatervindosedespedirdemim.Eusentiriaafaltadelaequeriaqueelasoubesse...—Porque fez issocomigo?—elaperguntouantesqueeupudesse falarumaúnica

palavra.—Vocêimaginacomomesintohumilhada?Fuipegadesurpresa,efiqueimudaporalgunsmomentos.—Eu...doqueestáfalando?Euestavatentando...—Do jeito que você falou, parece que eu sou incompetente!— ela disse. Fiquei

surpresa de ver lágrimas brilhando em seus olhos.—Ficou falando sem parar que eunãotinhaexperiência,equenãopoderiadarcontadefazeroquevocêeopapaifazem!Fiqueiparecendoumaidiotanafrentedetodosaquelesalquimistas.EdoKeith.—KeithDarnellnãoéalguémquevocêprecisasepreocuparemimpressionar—eu

meapresseiemdizer,tentandocontrolararaiva.Aoverseurostoanuviado,suspireierepasseinacabeçaaconversanoescritório.AminhaintençãonãoerafazercomqueZoeparecesseruim,massimfazertodoopossívelparagarantirqueeufosseenviada,enãoela. Não fazia ideia de que ela iria se sentir assim.—Olhe, eu não estava tentandodeixarvocêenvergonhada.Estavatentandoprotegervocê.Elasoltouumarisadasecaearaivapareceuestranhavindadeumapessoatãogentil

quantoZoe.—É issomesmoquevocêpensa?Atéchegouadizerqueestavatentandoconseguir

umapromoção!Fiz uma careta. Era verdade. Eu tinha dito aquilo. Mas eu não podia exatamente

contar a verdade a ela. Nenhum humano sabia por que, de verdade, eu tinha ajudadoRose.Mentirparaaminhaprópriaespécie—eprincipalmenteparaaminha irmã—me fazia sofrer, mas eu não podia fazer nada. Como sempre, eu me senti em umaarmadilha.Porisso,desvieidoassunto.—Nunca houve a intenção de que você se tornasse alquimista—eu disse.—Há

coisasmelhoresparavocêfazer.—Porqueeunãosoutão inteligentequantovocê?—elaperguntou.—Porqueeu

nãofalocincolínguas?— Não tem nada a ver com isso — eu soltei. — Zoe, você é incrível e

provavelmentedariaumaótimaalquimista!Mas,podeacreditar,avidadealquimista...vocênãovaiquererfazerpartedisso.Aminhavontadeeradizerqueelairiaodiar.Queriadizeraelaquenuncamaisseria

responsável pelo próprio futuro, nem poderia tomar qualquer decisão sozinha. Masminhanoçãodedevermeimpediudefazerissoeeupermaneciemsilêncio.—Eu faria isso—ela disse.—Eu gostaria de nos proteger dos vampiros... se o

papaiquisesse.A voz dela vacilou um pouco, e de repente imaginei o que realmente estava

alimentandoseudesejodeseralquimista.— Se você quer ficar mais próxima do papai, encontre outro jeito.A causa dos

alquimistaspodeserboa,masdepoisquevocêsejuntaaeles,elessetornamseusdonos—eugostariadepoderexplicaraelaqualeraasensação.—Vocênãovaiquererlevarestavida.—Porquevocêquerelasóparavocê?—elaquestionou.Zoeeraalgunscentímetros

maisbaixadoqueeu,masestavatãocheiadefúriaedeterminaçãoquepareciaocuparoquartotodo.—Não!Eunão...vocênãoentende—termineipordizer.Euqueriajogarasmãos

paraoalto,exasperada,masmesegurei,comosempre.Oolharqueelalançouparamimquasemetransformouemgelo.—Ah,achoqueentendoperfeitamente—eladeumeia-voltadeumjeitoabruptoe

disparouportaafora,masconseguiusemoversemfazerbarulho.Omedoqueelatinhadonossopaisuperavaaraivaqueestavasentindopormim.Fiqueiolhandoparaolugaremqueelatinhaestadoemesentipéssima.Comopodia

pensarqueeunaverdadeestavatentandoroubartodaaglóriaeadeixarmal? Porquefoiisso exatamente que você disse, uma voz dentro de mim observou. Acho que eraverdade, mas eu nunca pensei que ela ficaria ofendida. Eu não sabia que ela tinhainteresseemseralquimista.Mesmoagora,ficavameperguntandoseoqueeladesejava,na verdade, era fazer parte de algo e provar o seu valor para o nosso pai, e nãorealmenteserescolhidaparaatarefa.Quaisquer que fossem suas razões, não era possível fazermais nada a respeito. Eu

talvez não gostasse damaneira impositiva comoos alquimistas tinham lidado comigo,mas ainda acreditava veementemente no que faziam para proteger os humanos dosvampiros.EeucomtodaacertezaacreditavaemmanterJillasalvodeseuprópriopovose isso significasse evitar uma extensa guerra civil. Era capaz de fazer esse trabalho, efariabem.EZoe...elaestarialivreparafazeroquequisessedavida.

—Porquedemoroutanto?—meupaiperguntouquandoeuvolteiaoescritório.Aminha conversa com Zoe tinha me atrasado uns minutinhos, e isso significava tempodemaisparaele.Nemtenteiresponder.—Podemosirquandovocêquiser—Keithmedisse.Ohumordeletinhamudado

enquantoeuestavanoandardecima.Eleexalavauma simpatia tão fortequeeu fiqueimaravilhadadeverqueninguémtinhapercebidoqueera falsidadepura.Parecequeeletinharesolvidoadotarumaatitudemaisagradávelemrelaçãoamim—ouparatentarimpressionarosoutros,ouparapuxaromeusacoeeunãorevelaroquesabiaarespeitodele.Noentanto,mesmocomaquelesorrisodeplásticoestampadonorosto,aposturadelecontinuavarígidaeojeitocomoelecruzavaosbraçosrevelavaparamim—apesardenãorevelaramaisninguém—queelenãoestavamais felizdoqueeupornósdoistermossidocolocadosjuntos.—Possoatédirigiramaiorpartedocaminho.— Não me importo de fazer a minha parte — eu disse, tentando não olhar

diretamenteparaseuolhodevidro.Tambémnãomesentiaconfortávelemviajarcomummotoristaquetinhaapercepçãodeprofundidadefalha.—EugostariadeconversarcomSydneyemparticularantesdesuapartida, senão

houverobjeção—meupaidisse.Ninguémapresentouobjeção;elemeconduziuatéacozinhaefechouaportaatrásde

nós. Ficamos lá em silêncio durante alguns minutos, apenas nos encarando de braçoscruzados.De repente, ousei ter esperanças de que talvez ele fosseme dizer que sentiamuitopelamaneiracomoascoisasestavamentrenósnoúltimomês,quemeperdoavaequemeamava.Sinceramente,eu ficaria feliz seodesejodele fossemedarapenasumadespedidadepaiemparticular.Ele me olhou com muita atenção, com aqueles olhos castanhos tão idênticos aos

meus.Fiqueitorcendoparaqueosmeusnuncaviessematerumaexpressãotãofria.—Nãoprecisolhedizercomoistoéimportanteparavocê,paratodosnós.Eeuquequeriaumpoucodeafeiçãopaterna.—Não,senhor—respondi.—Nãoprecisa.—Não sei sevocêpodedesfazer adesgraçaque fez se abater sobrenós ao ficardo

ladodeles,mas este éumpassonadireção certa.Nãoestrague aoportunidade.Este éum teste para você. Siga as ordens que receber. Mantenha a menina Moroi longe deproblemas—elesuspirouepassouamãonocabeloloiroescuro,queeutambémtinhaherdado.Estranho,pensei,nóstermostantascoisasemcomum...e,noentanto,sermoscompletamentediferentes.—Graças aDeusKeith está comvocê. Siga as orientaçõesdele.Elesabeoquefaz.Meucorpoficoutenso.Láestavaaqueletomdeorgulhonavozdelemaisumavez,

como se Keith fosse a melhor criatura a caminhar pela terra. Meu pai tinha seasseguradodemefornecertreinamentocompleto;masquandoKeithficouconosco,eleo levou em viagens e lhe deu lições das quais eu nunca fiz parte. Minhas irmãs e eu

ficamos furiosas. Sempre havíamos desconfiado de que o nosso pai se ressentia de terapenas filhas, e aquilo tinha servido de prova. Mas não era o ciúme que fazia o meusanguefervereosmeusdentessecerrarem.Poruminstante,eupensei: Eseeucontaraeletudoquesei?Aí,oquevaipensarde

seugarotodeouro? Masrespondiàminhaprópriaperguntaaoverosolhosendurecidosdomeupai.Ninguémiriaacreditaremmim.Emseguida, imediatamenteme lembreideoutravozedorostoamedrontadoesuplicantedeumameninaqueolhavaparamimcomolhoscastanhosarregalados. Nãoconte,Sydney.Façaoquefizer,nãoconteoqueKeithfez.Nãoconteparaninguém.Eujamaispoderiatraí-ladessamaneira.Meupaicontinuavaesperandoumaresposta.Euengoliemsecoeassenti.—Sim,senhor.Ele ergueu as sobrancelhas, claramente satisfeito, e me deu um tapinha brusco no

ombro.Issoeraomaispróximodecarinhoverdadeiroqueeleconseguiachegar,jáhaviaalgum tempo. Eu me encolhi de surpresa, e também por estar tensa com tantafrustração.—Muitobem—elesedirigiuàportadacozinhaeentãofezumapausaparavoltar

osolhosparamim.—Talvezaindahajaesperançaparavocê.

3

AviagematéPalmSpringsfoiumaagonia.

Euestavaexaustaportersidoarrancadadacamamasnãoconseguicairnosononemquando Keith tomou a direção. Havia coisas demais na minha cabeça— Zoe, minhareputação,amissãoqueseaproximava...Ospensamentosrodavamnaminhacabeça.Eusóqueriaconsertar todososproblemasdaminhavida.O fatodeKeithestardirigindonãodiminuíaemnadaaminhaansiedade.Também estava incomodada porque meu pai não tinha permitido que eu me

despedissedaminhamãe.Eleficoufalandosempararquenósdeveríamosdeixarqueeladormisse, mas eu sabia a verdade. Ele tinha medo de que ela tentasse nos deter sesoubesse que eu estava de partida. Ela tinha ficado furiosa depois da minha últimamissão:eu tinhaviajadoatéooutro ladodomundosozinha,e fui trazidadevolta semfazer a menor ideia do que ia acontecer comigo no futuro. Minha mãe achou que osalquimistastinhamfeitomauusodemim,edisseaomeupaiqueachariaótimoseelesnão quisessemmais nada comigo.Não sei se ela realmente poderia ter atrapalhado osplanosdaquelanoite,maseunãoqueriaarriscarefazerZoesermandadanomeulugar.Eu certamentenãoesperavaumadespedida calorosa e carinhosadele,mas foi estranhopartirdeixandoascoisastãomalresolvidascomaminhairmãeaminhamãe.Quando amanheceu e a paisagem do deserto de Nevada se transformou por um

instante emummar ardentevermelhoe cobre,desisti totalmentededormir e resolviapenasseguiremfrenteatodovapor.CompreiumcopãoenormedecaféemumpostodegasolinaegarantiaKeithquedirigiriaorestodocaminho.Eleabriumãodadireçãodebomgrado,mas,emvezdedormir,tambémcomprouumcaféeficouconversandocomigonas horas restantes.Ele ainda estava investindopesado em sua nova atitude deamizade, quaseme fazendo desejar nossa antipatia anterior. Estava determinada a nãolhe darmotivo para duvidar demim, por issome esforcei para sorrir e concordar damaneiraapropriada.Foiumtantodifícilfazerissoenquantocerravaosdentes.

Parte da conversa não foi assim tão ruim. Eu conseguia lidar com assuntos detrabalho,enós ainda tínhamosmuitosdetalhes a resolver.Elemedisse tudoque sabiasobre a escola, e absorvi com avidez a descrição que fez domeu futuro lar.A EscolaPreparatória Amberwood parecia ser um lugar de prestígio, e fiquei imaginando,descompromissada,que talvezpudesse tratá-la comouma faculdadedementirinha.Deacordo com os padrões dos alquimistas, eu já sabia tudo de que precisava para omeutrabalho,mas algoemmim sempre clamavapormais emais conhecimento.Tivequeaprenderamecontentarcomasminhasprópriasleiturasepesquisas,mas,aindaassim,afaculdade—ousimplesmenteestarpertodequemsabiamaisdoqueeuetinhaalgoaensinar—eraumafantasiaminhahaviamuitotempo.Comoalunadoúltimoano,euteriaoprivilégiodesairdocampus,eumadasnossas

primeirasprovidências—depoisdeobteridentidadesfalsas—seriaarrumarumcarroparamim.Saberqueeunão ficariapresaemuminternato fezascoisaspareceremumpoucomais suportáveis.Mas era óbvio que grande parte do entusiasmo deKeith paraprovidenciarmeuprópriomeiode transporte sedeviaànecessidadedegarantirqueeupoderiadarcontadequalquertarefaqueamissãoexigisse.Keithtambémesclareceuumacoisadequeeunãotinhamedadoconta—masque

deviaterpercebido.—VocêeessataldeJillvãosermatriculadascomoirmãs—eledisse.—Oquê?—Ofatodeeuteraguentadofirmeenãoterperdidoodomíniosobrea

direção serviu comomedida domeu autocontrole.Morar com uma vampira era umacoisa...masserdafamíliadela?—Porquê?—quissaber.Comminhavisãoperiférica,viquandoeledeudeombros.—Porquenão?Explicaporquevocêvaipassartantotempopertodela,eéumaboa

desculpaparavocêsduas ficaremnomesmoquarto.Normalmente,aescolanãocolocaalunos de idades diferentes no mesmo quarto, mas... bom... os “pais” de vocêsprometeramumadoaçãogenerosaqueoslevouaabrirumaexceção.Fiquei tão atordoada que nem reagi com o reflexo natural de dar um tapa nele

quando concluiu a fala com uma risadinha cheia de satisfação. Eu sabia que nós íamosmorarjuntas...mas,irmãs?Era...estranho.Não,nãoapenasisso.Erabizarro.— Isso é loucura— eu disse finalmente, ainda chocada demais para elaborar uma

respostamaiseloquente.—Ésónopapel—eledisse.Eraverdade.Mashaviaalgoemserescaladaparaopapelde parentedevampiro que

me tirava do eixo.Tinha orgulho da maneira como aprendi a me portar perto devampiros,maspartedissoderivavadacrençasólidadequeeueraumaforasteira,umaparceira de negócios diferente e afastada. Representar a irmã de Jill destruía esseraciocínio.Traziaàtonaumafamiliaridadeparaaqualeunãoestavabemcertadeestarpreparada.

—Morarcomumadelasnãodeveserassimtãoruimparavocê—Keithcomentou,batucando comos dedos na janela de um jeito que deixoumeus nervos à flor da pele.Algoem seu tomdespreocupadodemaisme fezpensarqueele estavame levandoparaumaarmadilha.—Vocêestáacostumadaaisso.—Nãodiriaqueestou—respondi,escolhendoaspalavrascomcuidado.—Passei

umasemanacomeles,nomáximo.E,naverdade,amaiorpartedotempoestivecomdampiros.— É tudo igual — ele respondeu, vago. — Se é para diferenciar, acho que os

dampiros são piores. São abominações. Não são humanos, mas também não sãototalmentevampiros.Sãoprodutosdeuniõesantinaturais.Nãorespondi imediatamentee,emvezdisso, fingiestarprofundamente interessada

na estrada à minha frente. O que ele dissera era verdade, de acordo com osensinamentos dos alquimistas. Eu tinha sido criada acreditando que ambas as raças devampiros,Moroi e Strigoi, eram obscuras e erradas. Eles precisavam de sangue parasobreviver.Quetipodepessoabebiaosanguedeoutra?Eranojento,esódepensarqueembreveeuteriaquelevarumaMoroiparasealimentarmedeixavaenjoada.Masosdampiros...aquelaeraumaquestãomaisdelicada.Ou,pelomenos,naquele

momento era paramim.Os dampiros erammeio humanos emeio vampiros, criadosemumaépocaemqueasduasraçasconviviamlivremente.Comopassardosséculos,osvampiros tinham se afastado dos humanos, e as duas raças passaram a concordar queaquelasuniõeseramtabus.Masaraçadosdampiroshaviapersistido,apesardetodasasprobabilidadescontrárias,edofatodequeosdampirosnãopodiamsereproduzirentresi.PodiamprocriarcomosMoroioucomhumanos,emuitosMoroiseapresentavamàtarefa.—Certo?—Keithperguntou.Percebiqueeleolhavafixamenteparamim,esperandoqueeuconcordassecomelena

questãodequeosdampiroseramabominações—ou talvezestivesse torcendoparaeudiscordar.Dequalquermodo,tinhaficadoemsilênciodurantetempodemais.— Certo — eu disse. Soltei a retórica padrão dos alquimistas. — Em certos

aspectos,elessãopioresdoqueosMoroi.Araçadelesnuncadeviatersurgido.—Vocêmeassustouporumsegundo—Keithdisse.Euestavadeolhonaestrada,

mas fiquei comadesconfiança chata deque ele tinhapiscadoparamim.—Achei quevocê fosse defendê-los. Eu não devia acreditar nas histórias a seu respeito. Entendototalmenteporquevocêquisjogarcomaglória...mas,cara,devetersidodifíciltentartrabalharcomumdeles.Não dava para explicar como era fácil esquecer que Rose Hathaway era dampira

depoisdepassarcertotempocomela.Atédopontodevistafísico,dampirosehumanoserampraticamenteidênticos.Roseeratãocheiadevidaedepaixãoqueàsvezespareciamaishumanadoqueeu.Rosecertamentenãoteriaaceitadoaqueletrabalhodemaneira

tãodócil,comum“sim,senhor”cheiodeafetação.Nãocomoeufiz.Rosenão tinhaaceitadonemser trancadanacadeia, comopesodogovernoMoroi

sobreela.AchantagemdeAbeMazurtinhasidoocatalisadorquemelevouaajudá-la,mas eu nunca cheguei a acreditar que Rose tinha cometido o assassinato do qual foraacusada.Essacerteza, juntocomanossaamizadefrágil, tinhamelevadoadesrespeitarasregrasdosalquimistaseajudarRoseeseunamoradodampiro,oformidávelDimitriBelikov, a enganar as autoridades. Enquanto tudo aquilo acontecia, eu observavaRosecomumaespéciedeencantamentopelasuabatalhacontraomundo.Nãotinhacomoterinvejade alguémquenãoerahumana,mas certamentepodia invejar a forçadela—esuarecusaemdesistir,independentedequalquercoisa.Mas, de novo, não dava para dizer isso a Keith. E, apesar de sua atitude bem-

humorada,eucontinuava semacreditarquederepenteelecomeçouaacharótimoqueeuparticipassedamissão.Deideombrosdeleve.—Acheiqueoriscovaliaapena.—Bom—eledisseaoperceberqueeunãoiadizermaisnada.—Dapróximavez

que você resolver se rebelar e ficar do lado de vampiros e dampiros, providencie umpoucoderetaguardaparanãosemeteremtantaconfusão.Eudesdenhei.—Nãotenhointençãodevoltaramerebelar—pelomenosissoeraverdade.ChegamosaPalmSpringsno fimda tardeecomeçamosa trabalhar imediatamente

nasnossastarefas.Àquelaaltura,eujáestavaloucaparadormir,eatéKeith—apesardesuatagarelice—pareciaumpoucoacabado.MasnósrecebemosainformaçãodequeJill e sua comitiva chegariam no dia seguinte, por isso tínhamos muito pouco tempoparadarcontadosúltimosdetalhes.Umavisita àEscolaPreparatóriaAmberwoodrevelouqueaminha“família”estava

crescendo. Parecia que o dampiro que acompanhava Jill também iria se matricular efazeropapeldenossoirmão.Keithtambémserianossoirmão.Quandoquestioneiisso,eleexplicouqueprecisávamosdealguémporpertoparafazeropapeldeguardiãolegal,para o caso de Jill ou algum de nós precisar ser tirado da escola ou receber algumprivilégio. Como os nossos pais fictícios moravam em outro estado, conseguirautorizaçõescomeleseriamais fácil.Eunãopodiaquestionara lógica,apesardeacharque ser parente dele era ainda mais repulsivo do que ter dampiros ou vampiros nafamília.Eissosignificavabastante.Mais tarde, uma carteira de motorista feita por um falsificador de boa reputação

declarava que eu agora era SydneyKatherineMelrose, daDakota do Sul. EscolhemosDakotadoSulporque achamosqueopessoal local não estavamuito acostumado a vercarteirasdemotoristadelá,eentãonãoseriacapazdenotarqualquerfalhanasnossas.Nãoqueeuachassequehaveriaalguma.Osalquimistasnãoseassociavamapessoasque

faziam trabalho de segunda linha.Também gostei da imagemdomonteRushmore nodocumento.EraumdospoucoslugaresdosEstadosUnidosqueeununcatinhavisitado.O dia terminou com a parte pela qual eu mais esperava: uma visita a uma

concessionáriadecarros.Keitheeunegociamostantoentrenósquantocomovendedor.Eu tinha sido criada para ser prática e manter minhas emoções sob controle, masadorava carros. Essa era uma das poucas coisas que eu puxara da minha mãe. Elatrabalhava como mecânica, e algumas das minhas melhores lembranças de infânciahaviamacontecidoenquantoaajudavanaoficina.Eu tinhaumaquedaespecíficapor carrosesportivose carros antigos,daqueles com

motor potente que eu sabia que prejudicavam omeio ambiente—mas,mesmo comculpa, eu os adorava. Mas eles estavam fora de questão para este trabalho. Keithargumentouqueeuprecisavadealgoemquecoubessemtodosnósemaisalgumacarga— e que não chamassemuita atenção.Mais uma vez, eu concordei com o raciocíniodele,comoumaalquimistaboazinha.—Masnãoseiporqueprecisaserumaperua—eudisseaele.Nossanegociaçãotinhanos levadoaumSubaruOutbacknovo,queatendiaàmaior

parte das exigências dele.Osmeus instintos automobilísticosmediziamque o Subaruserviria para asminhas necessidades. Seria bomde dirigir e omotor era decente parasuacategoria.Noentanto...—Estoume sentindocomo se fosseumamãe suburbana—eudisse.—Sounova

demaisparaisso.—Mãessuburbanasandamdeminivans—Keithfalou.—Enãohánadadeerrado

comosubúrbio.Desdenhei.—Masprecisamesmosermarrom?Precisava,anãoserquenósquiséssemosumcarrousado.Pormaisqueeupreferisse

algo azulouvermelho,o fatode sernovo se sobrepunha.Aminhanatureza rabugentanão gostava da ideia de dirigir o carro“de outra pessoa”. Eu queria que fosse meu—novo,limpoereluzente.Porisso,fechamosnegócio,eeu,SydneyMelrose,tornei-meaorgulhosa proprietária de uma perua marrom. Dei a ela o nome de Pingado, naesperançadequeomeuamorporcafélogosetransferisseparaocarro.Quandoterminamosnossosafazeres,Keithmedeixouefoiparaseuapartamentoem

Palm Springs. Ele ofereceu que eu passasse a noite lá, mas recusei com educação epreferiumquartodehotel,agradecidapelo fatodeosalquimistas terembonsrecursosfinanceiros.Sinceramente,euteriapagadodomeubolsoparanãoterquedormirsobomesmotetoqueKeithDarnell.Pedium jantar levenoquartoe aproveiteio tempoa sósdepoisde tantashorasno

carro comKeith. Então vesti umpijama e resolvi ligar para aminhamãe.Apesar deestar contentedeme livrarda reprovaçãodomeupaiporum tempo, sentiria faltade

estarpertodela.—Sãobonscarros—elamedissedepoisqueeucomeceianossaconversacontando

sobre a visita à concessionária.Aminhamãe sempre teveespírito livre, coisaquenãocombinava emnada comalguémcomoomeupai.Enquanto eleme ensinava equaçõesquímicas, ela me mostrava como trocar o óleo do carro. Os alquimistas não eramobrigados a se casar com outros alquimistas, mas não conseguia entender que forçasteriamatraídoosmeuspais.Talvezmeupaifossemenostensoquandoeramaisjovem.—Achoque sim—eudisse, cientedequepareciadesanimada.Aminhamãeera

umadaspoucaspessoascomquempodiaficaràvontademesmoquenãofosseperfeitaoucontenteotempointeiro.Elaeraumagrandedefensoradedeixarossentimentoslivres.—Achoqueestouincomodadaporquenãotivemuitaescolhanessamissão.—Incomodada?Euestoufuriosaporelenãotersequerfaladocomigosobreisso—

elabufou.—Nãoacreditoqueelecontrabandeouvocêparalongesemmaisnemmenos!Vocêéminhafilha,nãoumobjetoqueelepodesimplesmentemandarparaláeparacá.Por um instante, de um jeito estranho, minha mãe me lembrou Rose— as duas

possuíam uma tendência inabalável de dizer tudo que lhes passava pela cabeça. Essacapacidademepareciaestranhaeexótica,masàsvezes—quandoeupensavaarespeitoda minha própria natureza tão controlada e cuidadosamente reservada — ficavaimaginandoseaesquisitanãoeraeu.— Ele não sabia de todos os detalhes — eu disse, defendendo-o de maneira

automática.Comotemperamentodomeupai,seosdoisficassembrigados,avidaemcasaseriapéssimaparaZoe...issosemfalarnaminhamãe.Eramelhorgarantirapaz.—Nãotinhamditotudoparaele.—Às vezes euodeio essa gente—havia um rugidona vozdaminhamãe.—Às

vezesodeioeletambém.Eu não sabiamuito bem o que dizer diante disso. Eu tinha ressentimentos domeu

pai,claro,maselecontinuavasendoomeupai.Muitasescolhasdifíceisqueelefezforamporcausadosalquimistas,eeusabiaque,pormaisquemesentissesufocadadevezemquando, o trabalho dos alquimistas era importante. Os humanos tinham que serprotegidos da existência dos vampiros. Saber queos vampiros existiam criaria pânico.Piorainda:poderia levaralgunsdoshumanos fracosdeespíritoa se tornaremescravosdosStrigoiemtrocadaimortalidade,culminandonacorrupçãodasalmas.Issoaconteciacommaisfrequênciadoquegostaríamosdereconhecer.—Nãofazmal,mãe—eudisseparaacalmá-la.—Euestoubem.Nãoestoumais

metidaemconfusão,eatéestounosEstadosUnidos.Naverdade,eunãosabiaseapartedaconfusãoeraverdade,masacheiqueasegunda

informação iria acalmá-la. Stanton tinha me dito para manter a nossa localização emPalmSpringsemsegredo,masinformarquenãotínhamossaídodopaísnãofariaassimtãomal, eminhamãepensaria que eu tinhapela frenteum trabalhomais fácil doque

provavelmente era. Eu e ela conversamosmais um pouco antes de desligar, e elamedisse que tinha recebido notícias da minha irmã Carly.Tudo estava bem com ela nafaculdade, e fiquei aliviada em saber. Estava desesperada para ter notícias de Zoetambém, mas resisti e não pedi para falar com ela. Estava commedo de que, se elapegasseo telefone,eudescobrissequecontinuava irritadacomigo.Ou,piorainda,quenemqueriafalarcomigo.Fuiparaacamamesentindomelancólica;queriatersidocapazdecolocarparafora

todososmeusmedose insegurançaspara aminhamãe.Nãoera issoquemãese filhasnormais faziam? Eu sabia que ela teria gostado. Era eu que tinha dificuldades emmeabrir. Estava envolvida demais nos segredos dos alquimistas para ser uma adolescentenormal.Depoisdedormirbastante,ecomosoldamanhãentrandopela janela,eumesenti

umpoucomelhor.Tinhaumtrabalhoafazer,eterumobjetivomefezparardesentirpenademimmesma.EumelembreidequeestavafazendoaquiloporZoe,pelosMoroiepeloshumanosaomesmotempo.Assim fuicapazdeencontraromeueixoecolocarminhasinsegurançasdelado—pelomenosporora.Busquei Keith por volta do meio-dia e fomos até os arredores da cidade para

encontrarJilleoMoroireclusoquenosajudaria.Keithtinhamuitoadizerarespeitodohomem, que se chamavaClarenceDonahue. Fazia três anos que elemorava emPalmSprings,desdequeasobrinhadelehaviamorridoemLosAngeles—acontecimentoqueaparentemente tinha surtido efeito traumático sobre o homem. Keith tinha seencontrado com ele um par de vezes em trabalhos anteriores e ficava fazendo piadassobreocontatofrágilqueClarencetinhacomasanidademental.—Eletemalgunslitrosdesangueamenos,sabecomoé?—Keithdisseedeurisada

parasimesmo.Apostoqueestavahaviadiasquerendousaressapiada.Asbrincadeirasdeleeramdemaugosto—eidiotasaténãopodermais—mas,na

medidaemquenosaproximávamosdacasadeClarence,Keithiaficandomuitoquietoenervoso.Algomeocorreu.—QuantosMoroivocêjáconheceu?—pergunteiquandosaímosdaruaprincipale

entramos em uma alameda comprida e cheia de curvas. A casa parecia ter saídodiretamente de um filme gótico, quadradona e feita de tijolos cinzentos que nãocombinavamemnadacomamaiorpartedaarquiteturadePalmSpringsquetínhamosvisto.AúnicacoisaquelembravaosuldaCalifórniaeramaspalmeirasonipresentesquerodeavamacasa.Eraumacombinaçãoestranha.— O suficiente— Keith disse vagamente.— Sou capaz de suportar a presença

deles.O tom de confiança em sua voz parecia forçado. Percebi que, apesar de sua

arrogânciaemrelaçãoàqueletrabalho,seuscomentáriosarespeitodaraçadosMoroiedos dampiros, e a avaliação que fez dasminhas ações, Keith na verdade não se sentia

nada, nadinha confortável com a ideia de ficar perto de não humanos. Eracompreensível.A maior parte dos alquimistas se sentia assim. Uma grande parte donosso trabalho nem incluía interagir comomundodos vampiros—era omundodoshumanos que necessitava dos nossos cuidados. Registros tinham que ser acobertados;testemunhas,subornadas.Amaiorpartedosalquimistastinhamuitopoucocontatocomosserescentraisdonossotrabalho,eissosignificavaqueoconhecimentodamaiorpartedosalquimistassobreosvampirosvinhadehistóriaseensinamentospassadosdegeraçãoem geração nas famílias. Keith disse que conhecia Clarence, mas não mencionou terconvivido com mais nenhum outro Moroi ou dampiro — certamente nunca tinhaencaradoumgrupocomooqueestávamosprestesaconhecer.Eunãoestavamaisanimadadoqueeleparaficarpertodevampiros,maspercebique

a ideia já não me amedrontava tanto quanto no passado. Rose e seus companheirostinham feito comqueeu criasseumacouraça.Eu já tinha até visitado a corte realdosMoroi, um lugar aondepoucos alquimistas tinham ido. Se consegui sair do coraçãodacivilizaçãodeles intacta,tinhacertezadequeseriacapazdedarcontadequalquercoisaqueseencontrassenointeriordaquelacasa.Reconheçoqueseriaumpoucomaisfácilsea casa de Clarence não se parecesse tanto com uma mansão assombrada de filme deterror.Caminhamos até a porta em uma demonstração de equipe unida, vestindo trajes

formaiseelegantes.PormaisqueKeithtivessedefeitos,suaaparênciaeraboa.Eleusavacalçadesarjacomcamisabrancaegravatadesedaazul-marinho.Acamisatinhamangacurta, mas duvido que aliviasse muito o calor. Estávamos no início de setembro e atemperatura passava dos trinta graus quando saí do hotel. Estava igualmente bem-vestida, com uma saiamarrom,meia-calça e uma blusa bege commanguinha solta eestampadeflores.Quandojáeratardedemais,percebiqueestávamosmeioquecombinando.Keith ergueu a mão para bater na porta, mas ela se abriu antes que ele fizesse

qualquercoisa.Eumeencolhi,umpouconervosaapesardasgarantiasquetinhaacabadodedaramimmesma.Osujeitoqueabriuaportapareceutãosurpresoquantonós.Eleseguravaummaço

de cigarros e devia estar saindopara fumar. Fez umapausa e nos examinoude cima abaixo.—Então.Vieramaquiparameconverterouparavenderrevestimentodeparede?O comentário para nos desarmar foi suficiente para espantar minha ansiedade. O

homem que falava era um Moroi, um pouco mais velho do que eu, com cabeloscastanhos-escuros que sem dúvida haviam sido penteados com muito cuidado parapareceremdesgrenhados.DiferentedastentativasdeKeithcomumaquantidadeenormee ridícula de gel, o sujeito tinha feito de um jeito que realmente ficava bom.Assimcomo todos osMoroi, ele era pálido e alto, com um tipo físico esguio.Olhos verde-

esmeraldanosexaminavamapartirdeumrostoquepodiatersidoesculpidoporumdosartistas clássicos que eu tanto admirava. Chocada, recusei a comparação assim quesurgiunaminhamente.Afinaldecontas,eleeraumvampiro.Eraridículoadmirá-lodamesmaformaqueeufariacomumhumano.—Sr.Ivashkov—eudissecomeducação.—Ébomencontrá-lonovamente.Elefranziuatestaemeexaminoudoaltodesuaestatura.—Euconheçovocê.Deondeteconheço?—Nós...—eucomeceiadizer“nosconhecemos”,maspercebiquenãoseriabem

exato, jáquenão tínhamos sido formalmente apresentadosnaúltimavezqueovi.Eleapenas estava presente quando Stanton e eu fomos levadas à corte Moroi parainterrogatório.—Nósnoscruzamosnomêspassado.Nasuacorte.Alembrançaacendeuseusolhos.—Certo.Aalquimista—elepensouporummomento,eentãomesurpreendeuao

resgatarmeunomepelamemória.ComtudomaisqueestavaacontecendoquandoestivenacorteMoroi,nãoachavaqueminhapresençateriasidonotada.—SydneySage.Assenti, tentando não parecer aturdida por ele ter me reconhecido. Então percebi

queKeithestavaparalisadoaomeulado.Eletinhaafirmadoqueeracapazde“suportar”aproximidadecomosMoroi,masparecequeissosignificavaficarencarando,dequeixocaídoesemproferirnenhumapalavra.Comumsorrisoamávelnorosto,eudisse:—Keith,esteéAdrianIvashkov.Adrian,esteémeucolegaKeithDarnell.Adrianestendeuamão,masKeithnãoocumprimentou.Seeraporqueaindaestava

chocado ou porque simplesmente não queria tocar em um vampiro, não soube dizer.Adrianpareceunãoseincomodar.Baixouamão,pegouumisqueiroesaiuandandoparalongedacasa.Fezumsinalcomacabeçanadireçãodaporta.— Estão à espera de vocês. Podem entrar —Adrian se inclinou para perto do

ouvido de Keith e falou com voz cavernosa.— Se.Tiver. Coragem.— Cutucou oombrodeKeithesoltouumarisadamonstruosa,dotipo“muahahahaha”.Keithquasedeuumsaltoolímpico.Adriandeurisadae seguiuporumcaminhono

jardim, acendendo o cigarro enquanto caminhava. Olhei feio para ele — apesar deaquilotersidomeioengraçado—eempurreiKeithemdireçãoàporta.—Vamos—eudisse.Sentiofriodoar-condicionadonaminhapele.Paranãodizeroutracoisa,Keithpareceutervoltadoàvida.—Oque foi aquilo?—elequestionouquandoentramosna casa.—Elequaseme

atacou!Fecheiaporta.—Aquilofoivocêfazendopapeldeidiota.Eelenãofeznadacontravocê.Nãotinha

comovocêparecermaisapavorado.Elessabemquenãogostamosdeles,epelasuacaravocêestavaprestesasaircorrendo.Reconheço que até que gostei de ver Keith sendo pego de surpresa, mas a

solidariedadehumananãodeixavadúvidasquantoaoladodequemeuestava.—Não estava nada—Keith retrucou, apesar de obviamente estar envergonhado.

Caminhamosporumcorredorcompridocompisodemadeiraeacabamentotãoescuroquepareciaabsorvertodaaluz.—MeuDeus,masqualéoproblemadessagente?Ah,jásei.Elesnãosãogente.—Quieto— eu disse, um pouco chocada com a veemência da voz dele.— Eles

estãologoali.Nãoestáescutando?Encontramos portas envidraçadas pesadas no fim do corredor.O vidro era fosco e

manchado,escondendooquehaviadooutro lado,masmesmoassimdavaparaescutarummurmúriobaixodevozes.Batinaportaeespereiatéumavozmedizerparaentrar.A raiva no rosto de Keith desapareceu quando nós dois trocamos um breve olhar desolidariedade.Eraisto.Oinício.Atravessamosaporta.Quandoviquemestavapresente,tivequesegurarmeuqueixoparanãocair,comoo

deKeithtinhacaídoantes.Porummomento,nãoconseguirespirar.TinhacaçoadoKeithpor ficarcommedo

pertodevampirosedampiros;masagora,caraacaracomumgrupodeles,derepentemesentiencurralada.Asparedesameaçavamsefecharàminhavolta,eaúnicacoisaemqueconseguiapensareramcaninosesangue.Omeumundodesmoronou—enãosóporcausadotamanhodogrupo.AbeMazurestavaali.Respire,Sydney,respire ,disse amimmesma.Masnãoera fácil.Abe representava

milmedosparamim,milproblemasemquehaviamemetido.Lentamente,tudoàminhavoltasecristalizoueeuretomeiocontrole.Abenãoerao

únicopresente,afinaldecontas,emeforceiameconcentrarnosoutroseignorá-lo.Trêsoutraspessoasoacompanhavam,sendoqueduasdelaseureconhecia.Ooutro,

umMoroimaisvelhodecabelo raloegrossobigodebranco,devia sernossoanfitrião,Clarence.—Sydney!—Foi JillMastrano que falou, com os olhos brilhantes de alegria. Eu

gostava de Jill,mas não achava que tinha causado tamanha impressão namenina paraprovocartalrecepção.Jilldavaaimpressãodeestarprontaparaselevantaremumpuloemedarumabraço,erezeiparaquenãofizesseisso.EunãoprecisavaqueKeithvisseuma cena dessas. E, mais importante, não precisava que Keith fizesse um relatório arespeitodisso.Ao ladode Jill haviaumdampiroqueeuconheciadamesmamaneiraque conhecia

Adrian— quer dizer, só de vista. Eddie Castile também estava presente quando fuiinterrogadanacortereale,semelembrobem,elemesmotinhasemetidoemalgumaconfusão.Paratodososefeitos,elepareciahumano,comcorpoatléticoerostodequempassavamuitotemposobosol.Ocabelodeleeracastanhocordeareia,eseusolhosde

avelãolhavamparamimeKeithdemaneirasimpática—aindaquecautelosa.Eraassimque funcionavacomosguardiões.Estavamsemprealertas, sempredeolhonapróximaameaça.Emcertosaspectos,euconsideravaissoreconfortante.Minha inspeçãoda sala logome fez retornar aAbe, quemeobservava e parecia se

divertircomaminhatentativadescaradadeevitá-lo.Umsorrisosorrateiroseespalhouporseurosto.—Ora,srta.Sage—eledissedevagar.—Nãovaimecumprimentar?

4

Abe tinha o tipo de aparência capaz dedeixarmuita gente sem fala,mesmoquenão soubessemnadaaseurespeito.Alheio ao calor que fazia lá fora, oMoroi estava vestido de terno e gravata. Pelo

menosoternoerabranco,masaindaassimpareciaquente.Acamisaeagravataeramroxas,mesma cor da rosa enfiada no bolso.Ouro brilhava em suas orelhas e pescoço.Era de origem turca e tinhamais cor do que amaior parte dosMoroi,mas,mesmoassim,eramaispálidodoquehumanoscomoeueKeith.Naverdade,apeledeAbemefaziapensaremumapessoabronzeadaqueestivessedoentehaviabastantetempo.—Olá—eudisse,rígida.Osorrisodeleseespalhoumaispelorosto.—Comoébomvê-ladenovo.—Ésempreumprazer—minhamentirasooumecânica,maseuesperavaquefosse

melhordoquedemonstrarmedo.—Não,não—eledisse.—Oprazerétodomeu.—Seestádizendo...—eufalei.Issoodivertiuaindamais.Keith tinha ficado paralisado de novo, por isso me aproximei do velho Moroi e

estendiamão,paraquepelomenosumdenósparecessetereducação.—Vocêéosr.Donahue?SouSydneySage.Clarencesorriueapertouaminhamãocomsuamãoenrugada.Eunãomeencolhi,

apesarde sentirvontade.DiferentedamaiorpartedosMoroiqueeuconhecia,elenãoescondia os caninos ao sorrir, e isso quase fez aminha fachada desmoronar. Era outrolembretedeque,pormaishumanosqueàsvezespudessemparecer,continuavamsendovampiros.—Éumprazerconhecê-la—eledisse.—Ouvicoisasmaravilhosasaseurespeito.—Émesmo?—eupergunteicomasobrancelhaarqueada, imaginandoquemtinha

faladodemim.

Clarenceassentiucomênfase.—Sejabem-vindaàminhacasa.Éótimorecebertantasvisitas.As apresentações foram feitas para todos os outros. Eddie e Jill eram um pouco

reservados,masambossimpáticos.Keithnãotrocounenhumapertodemão,maspelomenos parou de agir como um idiota babão. Sentou-se quando lhe ofereceram umacadeira e estampou uma expressão de arrogância no rosto, que supostamente deviademonstrarsegurança.Fiqueitorcendoparaelenãonosenvergonhar.— Desculpe-me — Abe disse e se inclinou para a frente. Seus olhos escuros

brilharam.—VocêdissequeseunomeeraKeithDarnell?—Disse, sim—Keith respondeu.EleobservouAbecomcuriosidade, semdúvida

lembrando-se da conversa com os alquimistas em Salt Lake City.Apesar da fachadacorajosa queKeith tentavamostrar, eu percebia que não estava à vontade.Abe surtiaesseefeitonaspessoas.—Porquê?—Pornada—Abefalou.SeusolhossevoltaramparamimedepoisparaKeith.—

Sómepareceufamiliar,nadamais.—Omeupaifoiumhomemmuitoimportanteentreosalquimistas—Keithdisse,

cheiodesi.Eletinharelaxadoumpouco,provavelmentepensandoqueashistóriassobreAbeeramexageradas.Tolo.—Semdúvidajáouviufalardele.—Semdúvida—Abedisse.—Tenhocertezadequedeveserisso.Elefalavadeumjeitotãodescontraídoqueninguémiriadesconfiardequenãoestava

dizendo a verdade. Só eu sabia a verdadeira razão por queAbe sabia quemKeith era,mas certamentenãoqueriaque isso fosse revelado.TambémnãoqueriaqueAbedessemaisindiretas,edesconfiavaqueestavafazendoissosóparameirritar.Tenteidesviaroassunto—eobteralgumasrespostasporminhaconta.— Eu não sabia que se juntaria a nós, sr. Mazur — a doçura na minha voz se

equiparavaàdele.—Porfavor—eledisse.—SabequepodemechamardeAbe.E,infelizmente,não

vou ficar. Só vim até aqui para garantir a chegada do grupo em segurança, e paraconhecerClarencepessoalmente.— Foi muita gentileza da sua parte — eu disse em tom seco, sinceramente

duvidando que asmotivações deAbe fossem tão simples assim. Se eu tinha aprendidoalgumacoisa,eraquenadaerasimplesquandoAbeMazurestavaenvolvido.Eleeraumaespécie de manipulador de marionetes. Não queria apenas observar as coisas, mastambémcontrolá-las.Eledeuumsorrisovitorioso.—Bom,meuobjetivoésempreajudaraquelesqueprecisam.—Sei—umavoznovaderepentedisse.—Éexatamenteoquemevemàcabeça

quandopensoemvocê,meuvelho.Não achei que ninguém fosse capaz de me chocar mais do queAbe, mas estava

errada.—Rose?—Onome saiu comouma interrogação dosmeus lábios, apesar de não

haver dúvidas sobre a identidade da recém-chegada.Afinal de contas, só existia umaRoseHathaway.—Oi,Sydney—eladisse,emelançouumsorrisinhotortoaoentrarnasala.Seus

olhosescurosebrilhanteseramsimpáticos,mastambémavaliavamtudoporali,comoo olhar de Eddie. Era uma característica dos guardiões. Rose tinha mais ou menos aminhaalturaeestavavestidademaneirabemcasual,comjeanseumacamisetaregatavermelha. Mas, como sempre, havia algo de exótico e perigoso na beleza dela que adestacavadetodososoutros.Elapareciaumaflortropicalnaquelasalaescuraeabafada.Umaflorcapazdematar.Eununcatinhavistosuamãe,maserafácilperceberquepartede sua aparência vinha da ascendência turca deAbe, como o cabelo castanho-escurocomprido.Naquela luz fraca, seu cabelo parecia quase preto. Seus olhos pousaram emKeitheelaacenoucomacabeça,emumgestoeducado.—Oi,outroalquimista.Keith ficou olhando para ela com os olhos arregalados,mas se isso foi uma reação

por estarmos cada vez mais em minoria ou simplesmente uma resposta à naturezaextraordináriadeRose,eunãosaberiadizer.—E-eusouKeith—elefinalmentegaguejou.— Rose Hathaway — ela disse a ele. Os olhos dele saltaram ainda mais ao

reconhecer o nome. Ela atravessou a sala, caminhando em direção a Clarence, e eurepareiquemetadedeseuencantoerasimplesmenteamaneiracomodominavaolugaraoseuredor.Aexpressãodelasesuavizouquandoolhouparaosenhordeidade.—Deiuma olhada no perímetro da casa, como pediu. É tão segura quanto poderia ser,masachoqueafechaduradaportadosfundosprovavelmenteprecisasertrocada.—Temcerteza?—Clarenceperguntou,descrente.—Énovinhaemfolha.—Talvez fossequando a casa foi construída—umaoutra voz falou.Olheipara a

porta e percebi que havia mais alguém com Rose quando ela chegara, mas eu tinhaficadosurpresademaisparaperceber.Denovo,essaeraumacaracterísticadeRose.Elasempreconcentravatodaaatenção.—Estáenferrujadadesdequenosmudamosparacá.Orecém-chegadoeraumMoroi,oquemedeixousobressaltadamaisumavez.Isso

elevava a conta para quatroMoroi e dois dampiros. Estavame esforçandomuito paranão adotar a atitude de Keith — principalmente porque eu já conhecia alguns dospresentes—,mas era difícil me livrar da sensação de que éramos “nós” e “eles”. OsMoroienvelheciamcomooshumanos,ecalculeiqueaquelesujeitotinhamaisoumenosa minha idade, no máximo a mesma de Keith. Ele tinha traços bonitos, acho, comcabelopretoencaracoladoeolhoscinzentos.Osorrisoqueeleofereceupareciasincero,apesardehaverumalevesensaçãodedesconfortoemsuapostura.SeuolharintrigadosefixouemKeitheemmim,efiqueiimaginandoquetalvezelenãopassassemuitotempo

na companhia de humanos. A maior parte dos Moroi não passava, apesar de nãocompartilharemdosmesmosmedosquetínhamosdeles.Masatéaíanossaraçanãoosusavaparasealimentar.— Sou Lee Donahue — ele disse e estendeu a mão. Mais uma vez, Keith não

retribuiuogesto,maseuretribuíenosapresentei.LeeficouolhandodemimparaKeith,comumaexpressãomaravilhada.—Alquimistas, certo? Nunca conheci um de vocês.A tatuagem que vocês têm é

linda— ele disse ao observar o lírio dourado naminha bochecha; amesma tatuagemquetodososalquimistastinham.—Jáouvifalardoqueelaécapazdefazer.—Donahue?—Keithperguntou.EleolhoudeLeeparaClarence.—Sãoparentes?LeelançouumolhartoleranteparaClarence.—Paiefilho.Keithfranziuatesta.— Mas você não mora aqui, mora? — Fiquei surpresa por ele se ater

especificamente a isso.Talvez se incomodassecoma ideiadeque suas informaçõesnãoeramprecisas.Afinaldecontas,eleeraoalquimistadePalmSprings,eacreditavaqueClarencefosseoúnicoMoroidaregião.—Regularmente, não—Lee respondeu.—Faço faculdade emLosAngeles,mas

nestesemestresóestoucumprindomeioperíodo.Entãoquerotentarpassarmaistempocomomeupai.AbedeuumaolhadaemRose.—Estávendo?—disse.—Issoqueédedicação.Elarevirouosolhosparaele.Keith parecia ter mais perguntas a esse respeito, mas a mente de Clarence ainda

estavanaconversaanterior.—Eupodiajurarquetinhamandadotrocaraquelafechadura.—Bom,euposso trocarembreveparavocê, sequiser—Leedisse.—Nãodeve

serassimtãodifícil.—Acho que está boa.— Clarence se levantou desequilibrado.—Vou dar uma

olhada.Leeseapressouatéoladodeleelançouparanósumolhardedesculpa.—Precisaseragora?—Comopareciaquesim,eledisse:—Voucomvocê.FiqueicomaimpressãodequeClarencecostumavafazeroquelhedessenatelha,e

queLeejáestavaacostumadocomisso.AproveiteiaausênciadosDonahueparaconseguiralgumasrespostasqueestavalouca

paraobter.EumevireiparaJill.—Vocês não tiveram problemas para chegar até aqui, certo? Não houve mais

nenhum...incidente?—Nósesbarramoscomalgunsdissidentesantesdedeixaracorte—Rosedissecom

um tom perigoso na voz. — Nada que não pudéssemos controlar. De resto, nãoaconteceumaisnada.—Evaicontinuarassim—Eddiedissecomoquemfazumaconstatação.Elecruzou

osbraçossobreopeito.—Pelomenosnoquedependerdemim.Deiumaolhadanosdois,sementendernada.—Fuiinformadadequeumdampiroiriaacompanhá-la...resolverammandardois?—Rose se convidou para vir junto—Abe respondeu.— Só para garantir que o

restante de nós não deixaria passar nada. É Eddie que vai se juntar a vocês emAmberwood.Rosedesdenhou.—Eu é quedevia ficar.Devia ser a colega de quartode Jill. Semofensa, Sydney.

Precisamosdevocêporcausadadocumentação,massoueuquevouterquedarumpauemqualquerumquecausarproblemasaela.Euéquenãoiaargumentarcontraisso.—Não—Jilldissecomumaintensidadesurpreendente.Daúltimavezemqueeua

tinhavisto, ela ficaraquieta e agira comhesitação,mas seusolhos se aguçaramcomaideia de ser um fardo para Rose. —Você precisa ficar com Lissa e mantê-la emsegurança. Eu tenho Eddie e, além do mais, ninguém sabe que estou aqui. Não vaiacontecermaisnada.A expressão nos olhos de Rose era cética. Eu também desconfiava que ela não

acreditavadeverdadequealguémfossecapazdeprotegerVasilisaouJilltãobemquantoela mesma. E isso era algo importante, levando em conta que a jovem rainha estavarodeada de guarda-costas. Mas nem Rose era capaz de estar em todos os lugares aomesmo tempo, e ela deve ter precisado fazer uma escolha. Suas palavras fizeram comqueeuvoltasseaatençãomaisumavezparaJill.—O querealmente aconteceu?—perguntei.—Você se feriu?Ouvimos falar de

umataque,masnãotivemosconfirmação.Umsilênciopesadoseinstalounasala.TodosmenosKeitheeupareciamclaramente

semjeito.Bom,nóstambémestávamossemjeito—masporoutrosmotivos.— Está tudo bem comigo— Jill finalmente disse, depois de um olhar afiado de

Rose.—Houveumataque,sim,masnenhumdenósseferiu.Querdizer,nadasério.NósestávamosnomeiodeumjantardarealezaquandofomosatacadosporunsMoroi,tipo, assassinosMoroi. Eles fizeram parecer que estavam lá para atacar Lis, a rainha,masemvezdissoforamparacimademim—elahesitouebaixouosolhos,deixandoocabelo comprido e encaracolado cair para a frente.—Mas fui salva e os guardiões osencurralaram.HaviaumaenergianervosaemJilldaqualeu lembrava.Erabonitinho,e faziacom

queelaseparecessemuitocomaadolescentetímidaqueera.—Masnãoachamosquetodostenhamsidoeliminados,eéporissoqueprecisamos

ficar longeda corte—Eddie explicou.Enquantodirigia suaspalavras amimeKeith,ele irradiavaumsensodeproteçãoemrelaçãoaJill,desafiandoqualquerumaatacarameninaquetinhaaobrigaçãodemanteremsegurança.—Enãosabemosondeestãoostraidoresnasnossasprópriasfileiras.Então,atélá,vamostodosficaraqui.—Esperoquenão seja pormuito tempo—Keithdisse.Lancei a eleumolharde

advertência,eelepareceuperceberqueocomentáriopodiasertomadocomogrosseria.—Querdizer,estelugarnãodevesermuitodivertidoparavocês,comosoletudoomais.—Éseguro—Eddiedisse.—Éissoqueimporta.ClarenceeLeevoltarameninguémmaismencionouohistóricodeJillouoataque.

Até onde pai e filho sabiam, Jill, Eddie eAdrian simplesmente tinham entrado emconflitocomumMoroiimportantedarealezaeestavamexiladosali.OsdoisMoroinãosabiamquem Jill era de verdade e acreditavamque os alquimistas a estavam ajudandodevido à influênciadeAbe.Erauma teia dementiras necessária.MesmoqueClarenceestivesseemexílioautoimposto,nãopodíamosarriscarqueele(ouagoraLee,também)deixasseescaparparaalgumdesconhecidoqueairmãdarainhaestavaescondidaali.EddiedeuumaolhadanoMoroimaisvelho.—Você disse que nunca ouviu falar de nenhumStrigoi que tivesse vindo até aqui,

certo?OsolhosdeClarenceficaramsemfocoporuminstantequandoseuspensamentosse

voltaramparadentro.—Não...masexistemcoisaspioresdoqueosStrigoi...Leesoltouumgemido.—Pai,porfavor.Nãomevenhacomisso.RoseeEddieselevantaramemuminstante,efoiumasurpresanãoteremsacadoas

armas.—Doqueestáfalando?—Rosequissaber.—Queoutrosperigosexistemporaí?—Eddieperguntoucomumtomdeaçona

voz.Leeestavarealmentecorado.—Nãoénada...porfavor.Éumdelíriodele,maisnada.—Delírio?—Clarencequestionoueapertouosolhosparaofilho.—Amorteda

sua prima foi delírio? O fato de as pessoas no alto escalão na corte permitirem queTamaranãofossevingadaéumdelírio?MinhamenteretrocedeuaumaconversaquetinhatidocomKeithnocarro.Lancei

paraClarenceumolharcomaintençãodeserreconfortante.—Tamaraerasuasobrinha,certo?Oqueaconteceucomela?—Elafoiassassinada—elerespondeu.Fezumapausadramática.—Porcaçadores

devampiros.

—Desculpe,porquem?—perguntei,certadequetinhaescutadomal.— Caçadores de vampiros— Clarence repetiu.Todos os presentes pareciam tão

surpresosquantoeu,oquefoiumpequenoalívio.AtéumpoucodaferocidadedeRoseedeEddieseaplacou.—Ah,nãovãoencontrarissoemlugarnenhum;nemmesmonosseusrelatórios.EstávamosmorandoemLosAngelesquandoelafoipega.Euinformeiosguardiões,exigiqueosresponsáveisfossemcaçados.Sabeoquedisseram?—Eleolhouemvolta,umporum.—Sabem?—Não— Jill respondeu acanhada.—O que disseram?—Lee suspirou; parecia

arrasado.Clarencesoltouumagargalhadadedesdém.—Disseramqueissonãoexistia.Quenãohaviaevidênciaparafundamentaraminha

alegação. Determinaram que os Strigoi a tinham matado e que ninguém podia fazernada,queeudeviaficaragradecidoporelanãotersidotransformada.Olhei para Keith, que mais uma vez pareceu surpreso com a história.

Aparentemente,elenãoconheciaClarencetãobemquantoalegavaconhecer.Keithsabiaqueosenhordeidadehaviatidoumproblemaenvolvendoasobrinha,masnãoconheciaa extensão da questão. Keith deu de ombros levemente na minha direção, parecendodizer:Estávendo?Oqueeudisse?Élouco.— Os guardiões são muito detalhistas — Eddie disse. Seu tom e suas palavras

claramente tinhamsidoescolhidoscomcuidado,esforçando-separanãoofender.Ele sesentouaoladodeJill.—Tenhocertezadequetiveramseusmotivosparachegaraessaconclusão.—Motivos?—Clarenceindagou.—Seconsiderar“negação”e“viverumamentira”

comomotivos,entãoachoquepodeser.Simplesmentenãoqueremaceitarofatodequeexistemcaçadoresdevampirosporaí.Masmedigaumacoisa.SeaminhaTamara foimortapelosStrigoi,porquecortaramagargantadela?Foicortadacomumúnicogolpedelâmina—elefezumgestoparaimitarogolpeembaixodoqueixo.Jillestremeceueseencolheunacadeira.Rose,EddieeAbetambémpareceramatordoados,coisaquemedeixousurpresa,porquenãoacheiqueexistianadacapazdeimpressionaraquelegrupo.—Porquenãousaramoscaninos?Assimémaisfácilparabeber.—Eufizessaobservaçãoaosguardiões,eelesdisseramque,comometadedosangue

tinha sido bebido, obviamente tinha sido um Strigoi.Mas eu disse que tinha sido umcaçadordevampirosequeeletinhafeito parecerquebeberamosanguedela.OsStrigoinãoteriammotivoparausarumafaca.Rosecomeçouafalar,fezumapausaerecomeçou.—Éestranho—eladissecomcalma.Fiqueicomasensaçãodequeprovavelmente

ela estava pronta para dizer como essa teoria da conspiração era ridícula,mas pensoumelhor.—Mastenhocertezadequeháoutraexplicação,sr.Donahue.Fiquei imaginando semencionarqueos alquimistasnão tinhamnenhumregistrode

caçadores de vampiros— pelo menos não emmuitos séculos— iria ajudar ou não.Keithderepentelevouaconversaparaumadireçãoinesperada.EleolhoubemnosolhosdeClarence.—PodeparecerestranhoparaumStrigoi,maselesfazemváriascoisasterríveissem

motivo.Seidissoporexperiênciaprópria.Meuestômagosecontraiu.Ai,não.TodososolhossevoltaramparaKeith.— Hein?—Abe perguntou e passou os dedos pelo cavanhaque preto.—O que

aconteceu?Keithapontouparaseuolhodevidro.—FuiatacadoporumStrigoinocomeçodoano.Elesmeespancaramearrancaram

meuolho.Entãomelargaram.Eddiefranziuatesta.— Sem beber sangue nem matar? Isso émesmo estranho. Não parece ser o

comportamentonormaldeumStrigoi.—NãoseiseépossívelesperarqueumStrigoifaçaalgo“normal”—Abeobservou.

Eucerreiosdentes,desejandoqueelenãoenvolvesseKeithnaquilo. Porfavor,nãofaçaperguntassobreoolho,eupensei. Deixeparalá.Claroqueerapedirdemais,porqueaperguntaseguintedeAbefoi:—Sóarrancaramumolho?Nãotentarampegarosdois?— Com licença—me levantei antes que Keith pudesse responder. Eu não podia

ficarsentadanomeiodaquelaconversa,escutandoenquantoAbetentavafisgarKeith,sópela diversão de me atormentar. Eu precisava fugir dali. — Eu... eu não estou mesentindomuitobem.Voutomarumpoucodear.—Claro,claro—Clarencedisse,comcaradequemtambémqueriaselevantar.—

Devopediràcriadaquetragaumaáguaparavocê?Possotocaracampainha...—Não,não—respondiemedesloqueiemdireçãoàporta.—Eusó...sópreciso

deumminuto.SaíapressadaeouviAbedizer:—Masquesensibilidadetãodelicada.Elanãodeviaserassimtãofrágil,levandoem

conta a profissão que tem. Mas você, rapaz, parece capaz de suportar uma conversasobresangue...A massagem no ego aplicada por Abe funcionou, e Keith começou a contar

exatamenteahistóriaqueeu,comtodaacerteza,nãoqueriaouvir.Volteipelocorredorescuro e saí da casa.O ar fresco foi bem-vindo, apesar de estar uns cinco grausmaisquente de onde eu tinha saído. Respirei fundo parame recompor e fiz força parameacalmar.Tudo iria ficar bem.Abe iria embora logo. Keith voltaria para seu próprioapartamento.Eu iria aAmberwood com Jill eEddie, que realmentenãopareciam sermáscompanhias,levandoemcontaasoutrasopçõesquepodiamtersidomandadasparaseremmeuscolegas.Semnenhumdestinoespecíficoemmente, resolvidarumavoltaporalie avaliar a

casadeClarence—que,naverdade,estavamaisparaumaamplapropriedade.Escolhiumdosladosdaconstruçãoefuidandoavoltadeumjeitomeioaleatório,admirandootrabalhorebuscadonoexteriordacasa.ApesardeestartotalmentedeslocadanomeiodapaisagemdosuldaCalifórnia,eraimpressionante.Eusempreadoreiestudararquitetura—umassuntoquemeupaiconsideravainútil—eestavaimpressionadacomoentorno.Dei uma olhada ao redor e percebi que o terreno não era igual às áreas por ondetínhamospassadoatéchegarali.Umaboapartedasterrasdaregiãohaviaganhadoumatonalidademarrom,por causado verão eda falta de chuva;masClarenceobviamentetinhagastadoumafortunaparamantertodaaquelaextensaáreaverdejante.Árvoresquenãoeramnativas—lindasecheiasdeflores—tinhamsidoarranjadascomesmeroparaformarcaminhosepátios.Depoisdeváriosminutosdepasseiopelanatureza,deimeia-voltae retorneiparaa

partedafrentedacasa.Pareiquandoouvialguém.—Onde você está?— uma voz perguntou.Abe.Que ótimo. Ele estava àminha

procura.—Aqui— mal ouviAdrian responder.A voz dele veio do outro lado da casa,

oposto ao que eu estava. Ouvi alguém atravessar a entrada de cascalho e os passospararemaoalcançaraportadetrás,ondeAbeestava,segundoosmeuscálculos.Mordio lábio e fiquei onde estava, escondidapela casa.Estavaquase commedode

respirar. Com a audição que tinham, os Moroi eram capazes de captar o menor dosruídos.—Vocênãoiavoltarláparadentronunca?—Abeperguntouemtomdesurpresa.—Nãoseiparaquê—foiarespostalacônicadeAdrian.—Poreducação.Vocêpodiaterfeitooesforçodeseapresentaraosalquimistas.—Elesnãoqueremserapresentadosamim.Principalmenteorapaz—haviauma

risada oculta na voz deAdrian.—Você tinha que ter visto a cara dele quando noscruzamosàporta.Queriaestarusandoumacapa.Agarotapelomenos temumpoucodecoragem.—Ainda assim,eles têmpapel fundamentalna suaestadia aqui.Enade Jill.Você

sabecomoéimportantequeelafiqueemsegurança.—É,euentendo.Eentendoporqueelaestáaqui.Oquenãoentendoéporque eu

estouaqui.—Nãoentende?—Abeperguntou.—AcheiquetinhaficadoóbviotantoparaJill

quantoparavocê.Precisaficarpertodela.Elesfizeramumapausa.—Éissoquetodomundodiz...maseuaindanãoseibemseénecessário.Nãoacho

queelaprecisedemimporperto,independentementedoqueRoseeLissadigam.—Vocêtemalgumacoisamelhorparafazer?—Essanãoéaquestão.—Adrianpareciaaborrecido,eeufiqueifelizporAbenão

teresseefeitosósobremim.—Essaéexatamenteaquestão—Abedisse.—Vocêestavaseacabandonacorte,

afogando-seempenadesimesmo,entreoutrascoisas.Aqui,temaoportunidadedeserútil.—Avocê.—Asimesmotambém.Estaéumaoportunidadeparavocê fazeralgumacoisada

vida.—Mas você nãome diz o que eu devo fazer!—Adrian respondeu, irritado.—

TirandoJill,qualéestagrandetarefaquevocêtemparamim?—Ouça.Ouçaeobserve.—EueracapazdeenxergarclaramenteAbepassandoa

mão no queixo enquanto falava, como se fosse o idealizador da missão.— Observetodos:Clarence,Lee,osalquimistas,JilleEddie.Presteatençãoacadapalavra,acadadetalhe,emeinformedepois.Tudopodeserútil.—Nãoseiseissoesclareceascoisas.—Vocêtempotencial,Adrian.Potencialdemaisparaserdesperdiçado.Sintomuito

peloque aconteceucomRose,masvocêprecisa seguir em frente.Talvez as coisasnãofaçamsentidoagora,masfarãomaistarde.Confieemmim.Eu quase me senti mal porAdrian.Abe também tinha me dito para confiar nele

certavez,evejasócomoascoisasterminaram.EspereiosdoisMoroivoltaremparadentrodacasaedepoisdeumminutotambém

entrei.Nasala,Keithaindamantinhasuaposturaarrogante,maspareceualiviadoaomever de volta. Discutimos mais detalhes e elaboramos uma programação para ofornecimentodesangue,queeraminharesponsabilidade,jáseriaminharesponsabilidadelevar Jill (e Eddie, porque ele não queria tirar os olhos dela) de carro para a casa deClarence,edepoisdevoltaparaaescola.—Comovocêvaisealimentar?—pergunteiaAdrian.Depoisdeouviraconversa

delecomAbe,estavamaiscuriosadoquenuncaparasaberqualseriaopapeldeleaqui.Adrian estava encostado na parede, do outro lado da sala.Os braços dele estavam

cruzadosemumaposiçãodefensivaehaviaumarigidezemsuaposturaquecontrastavacomosorrisopreguiçosoqueeletinhanoslábios.Eunãotinhacerteza,maselepareciasedistanciaromáximopossíveldeRosedepropósito.—Vouapenascaminharatéofimdocorredor.Aoverminhaexpressãoconfusa,Clarenceexplicou:—Adrian vai ficar aqui comigo.Vai ser bom termais alguém entre estas velhas

paredes.—Ah—eu disse. Paramimmesma, balbuciei:— Isso está parecendo O jardim

secreto.—Hã?—Adrianperguntoueinclinouacabeçanaminhadireção.Estremeci.Aaudiçãodeleseraboamesmo.

—Nada.Sóestavapensandoemumlivroqueeuli.—Ah—Adriandissecomdesdém,edesviouoolhar.Otomemsuavozparecia

condenartodososlivrosexistentes.—Não se esqueça demim—Lee disse e sorriu para o pai.—Eu disse que vou

passarmaistempoporaqui.—TalvezojovemAdrianaquiomantenhalongedosproblemas,então—Clarence

declarou.Ninguémfeznenhumcomentário,masviosamigosdeAdriantrocaremolharesde

surpresa.Keithnãoparecianemdelongetãoapavoradoquantoestavaquandochegamos,mas

havia umnovo ar de impaciência e irritação nele que eu não estava entendendomuitobem.—Bom—eledissedepoisdelimparagarganta.—Precisoirparacasaecuidarde

algunsassuntosdetrabalho.Ecomovocêvaimedarumacarona,Sydney...Eledeixouaspalavraspairandonoareolhouparamimcheiodeintenções.Peloque

eutinhadescoberto,estavamaisconvencidadoquenuncadequePalmSpringseraaáreacom menos atividade de vampiros da história. Sinceramente, não consegui entenderquais“assuntos de trabalho” Keith teria para cuidar,mas nós teríamos que ir emboracedooutarde.EddieeJillforampegarsuasbagagenseRoseaproveitouaoportunidadeparamepuxardelado.—Como você está?— ela perguntou em voz baixa. Seu sorriso era sincero.—

Andei preocupada com você desde... bom, você sabe. Ninguém quis me dizer o quetinhaacontecidocomvocê.Na última vez em que a vira, eu estava sendo mantida como prisioneira por

guardiões em um hotel, enquanto os Moroi tentavam descobrir a extensão da minhaparticipaçãonafugadeRose.—Nocomeço,enfrenteialgumasdificuldades—respondi.—Masjápassou.O que era uma pequena mentira entre amigas? Rose era tão forte que eu não

suportavaa ideiadeparecerfracanafrentedela.Nãoqueriaqueelasoubessequeaindavivia com medo dos alquimistas, forçada a fazer o que fosse necessário para cairnovamentenasgraçasdeles.—Quebom—eladisse.—Tinhammeditoqueeraparaasuairmãestaraqui.Essas palavras me lembraram mais uma vez que Zoe poderia me substituir a

qualquermomento.—Foiummal-entendido.Roseassentiu.—Eume sinto um poucomelhor com você aqui,mas,mesmo assim, é difícil...

ainda sinto que deveria proteger Jill,mas também preciso proteger Lissa. Eles achamqueJilléoalvomaisfácil,mas,mesmoassim,vãotentaratacarLissa.—Seuturbilhão

interior transpareceu em seus olhos escuros e senti uma pontada de pena. Eraexatamenteissoqueeutinhadificuldadeemexplicarparaosoutrosalquimistas:comoosdampirosevampirosàsvezeseramcapazesdeparecertãohumanos.—Temsidoumaloucura, sabe?DesdequeLissa assumiuo trono.Acheique finalmente iapoder relaxarcomDimitri—o sorriso dela se ampliou.—Eu devia saber que nunca as coisas sãosimplesconosco.PassamosotempotodocuidandodeLissaeJill.—Jill vai ficarbem.Enquantoosdissidentesnão souberemqueelaestá aqui, tudo

vaiserfácil.Atémesmoentediante.Elacontinuavasorrindo,masumpoucomenos.—Esperoquesim.Ah,sevocêsoubesseoqueaconteceu...—Aexpressãodelase

modificouquandofoiacometidaporalgumalembrança.Iapedirparaquemecontasseoque tinha ocorrido, mas ela mudou de assunto antes que eu pudesse fazer isso. —EstamostrabalhandoparamodificaraleiquedizqueLissaprecisaterumfamiliarparacontinuar sendo rainha.Quando isso estiver feito, tanto ela quanto Jill estarão fora deperigo. Mas isso também significa que aqueles querendo acabar com Jill estão maisenlouquecidosdoquenunca,porquesabemquetêmpoucotempo.—Quanto tempo?—perguntei.—Quanto tempo vai demorar paramodificar a

lei?— Não sei. Alguns meses, talvez? Assuntos legais... bom, não são a minha

especialidade. Não os detalhes, pelomenos— ela fez uma leve careta e voltou à suarigidez de batalha de sempre. Jogou o cabelo por cima de um ombro.—Mas genteloucaquerendoprejudicarmeusamigos?Essa éaminhaespecialidadee,podeacreditar,seidarcontadisso.—Eumelembro—respondi.Foiestranho.ConsideravaRoseumadaspessoasmais

fortesqueeuconhecia,maspareciaprecisardomeuapoio.—Olhe,váfazeroquevocêfazmelhor,eeufareiomeutrabalho.VoumeassegurardequeJillpassedespercebida.Vocêsatiraramdelásemqueninguémsoubesse.Agoraelaestáforadoradar.—Esperoquesim—Roserepetiucomavozsombria.—Porque,casocontrário,

esteseugrupinhoaquinãovaiteramenorchancecontraaquelesrebeldesenlouquecidos.

5

E,comisso,Rosemedeixouparasedespedirdosoutros.Suas palavrasme deixaram gelada. Pormeio segundo, tive vontade de exigir uma

reavaliação da missão. Queria insistir para que enviassem pelo menos meia dúzia deguardiões para ficarem ao lado de Jill, para o caso de osMoroi que a tinham atacadovoltarem. Logo descartei a ideia. Um dos elementos principais para aquele plano darcerto era não atrair atenção. Desde que seu paradeiro ficasse em segredo, Jill estariamais segura se conseguisse se misturar ao ambiente. Um esquadrão de guardiõesdificilmente passaria despercebido, e poderia chamar a atenção da comunidade Moroimaisampla.Estávamosfazendoacoisacerta.Enquantoninguémsoubessequeestávamosali,tudoficariabem.Claroque,seeurepetisseissoparamimmesmamuitasvezes,setornariarealidade.Mas...porqueRosehavia feito aquela afirmação agourenta?Porque apresençade

Eddie era necessária? Será que a missão realmente tinha sido promovida de“inconveniente”a“comriscodevida”?SabendocomoJilleRoseerampróximas,eumeioqueesperavaqueadespedidadelas

fossemais lacrimosa.Emvezdisso, Jill tevemaisdificuldadededizer adeus aAdrian.Elasejogouemcimadeleemumabraçogigante,agarrandosuacamisacomosdedos.AmeninaMoroi tinha permanecido em silêncio durante a maior parte da visita, apenasobservandoorestodenóscomaqueleseujeitocuriosoenervoso.OmáximoquetinhafaladofoiquandoLeetentarafazê-laabrirabocaantes.Suademonstraçãodedespedidatambémpareceu surpreenderAdrian,masaexpressão irritadaqueestampavanorostodeulugaraalgoparecidocomafeto,enquantodavatapinhassemjeitonoombrodela.—Estátudobem,minhapequenaChavedeCadeia.Agentevaiseverdenovologo.—Euqueriaquevocêviesseconosco—eladissecomavozbemfraca.Eledeuumsorrisotortoparaela.— Não queria, não.Talvez o restante deles possa passar despercebido por essa

brincadeiradevoltaàsaulas,maseuseriaexpulsonoprimeirodia.Pelomenosaquinãovoupodercorromperninguém...amenosqueessealguémsejaClarenceeseuarmáriodebebidas.—Euvoumantercontato—Jillprometeu.Osorrisodeleestremeceueele lançouparaelaumolharcompreensivo,aomesmo

temposurpresoedesconsolado.—Eutambém.Aquelepequenomomentoentreosdoisme surpreendeu.Comanatureza leviana e

arrogante dele e a timidez tão doce dela, eram uma dupla de amigos improvável.Noentanto,haviaóbviaafeiçãoentreosdois.Nãoparecia serdenaturezaromântica,masguardavauma intensidadedefinitivaqueeunão conseguia entendermuitobem.EumelembreidaconversaquetinhaescutadoentreAbeeAdrian,emqueAbehaviaditoqueera imperativoAdrianpermanecerpertodeJill.Algomediziaquehaviaumaconexãoentre isso e o que eu testemunhava naquele momento, mas não tinha informaçõessuficientesparajuntarospontos.Arquiveiaquelemistérioparamaistarde.Foi triste me despedir de Rose, mas fiquei contente pela nossa separação também

significarqueeuiriameseparardeAbeeKeith.Abefoiemboracomsuasobservaçõestipicamente enigmáticas, e um olhar de sabichão para cima de mim, que não gosteinada.Deixei Keith na casa dele antes de seguir paraAmberwood, e ele disse quememanteria a par dos acontecimentos. Sinceramente, fiquei imaginando que informaçõesexatamente ele iriamepassar, já que eu faria amaior parte do trabalho.Até onde eusabia, ele realmente não tinha nada para fazer além de matar o tempo em seuapartamento no centro. Mesmo assim, valeu a pena me livrar dele. Nunca achei queficariatãocontenteemsairdecarrocomumavampiraeumdampiro.Jill parecia perturbada no trajeto até a escola. Eddie, ao pressentir isso, tentou

acalmá-la.Olhouparaeladobancodafrente.—VamosvoltaraverAdrianlogo.—Eusei—elarespondeucomumsuspiro.—Enãovaiacontecermaisnadaderuim.Vocêestáasalvo.Elesnãovãoconseguir

encontrarvocêaqui.—Tambémseidisso—elafalou.— Foi ruim mesmo?— perguntei.— O ataque, quero dizer. Ninguém precisa

entraremdetalhes.Decantodeolho,viEddiedarumaolhadaemJill.—Foibemruim—elerespondeu,sombrio.—Masagoratodomundoestábem,e

éissoqueimporta.Nenhum deles disse mais nada, e eu logo entendi que não dariam mais nenhum

detalhe. Eles agiam como se o ataque não tivesse sido grave, que já tinha ficado nopassado,mas agiamdemaneira evasiva demais.Algo que eu não sabia o que era—e

que provavelmente os alquimistas desconheciam — tinha acontecido; algo que elesestavamseesforçandoparamanteremsegredo.Aminha intuiçãodiziaque issoestavarelacionadoàpresençadeAdrianali.Ele tinhamencionadouma“razãoóbvia”para tervindo a Palm Springs, e entãoAbe deu a entender que havia algum outro motivocamuflado, que o próprioAdrian não sabia qual era.Aquilo erameio irritante, tendoemvistaqueeuestavaarriscandoaminhavidaali.Comoelesachavamqueeupoderiafazeromeutrabalhodemaneiraadequadaseinsistiamnaqueleemaranhadodesegredos?Osalquimistas lidavamcomsegredosotempotodo,eapesardomeupassadocheio

depercalços eu ainda era alquimista o bastante parame ressentir quandomenegavamrespostas.Felizmente,eutambémeraalquimistaosuficienteparacaçarasrespostasporcontaprópria.Claro que eu sabia que interrogar Jill e Eddie naquelemomento não iame levar a

lugarnenhum.Euprecisavasersimpáticaepermitirquesesentissemàvontadecomigo.Elespodiamnãoalimentaracrençasecretadequeoshumanossãocriaturasdastrevas,masissonãosignificavaquejáconfiavamemmim.Eunãoosculpava.Afinaldecontas,semdúvidaeutambémnãoconfiavaneles.A noite já estava bem avançada quando chegamos a Amberwood. Keith e eu

tínhamos dado uma olhada na escola antes, mas Eddie e Jill a absorveram com olhosarregalados.Namesmamedidaemque a casadeClarence tinhaparecido antiquada, aescolaerareluzenteemoderna,formadaporconstruçõesdeestuquetípicasdaCalifórniaedaarquiteturadosudoestedosEstadosUnidos.Palmeirasseespalhavamaolongodosgramados verdejantes. Com a luz que ia desaparecendo no céu, ainda havia alunosandando em duplas e em grupinhos pelos diversos caminhos que serpenteavam peloterreno.Tínhamospassadoemumfast-foodnocaminhoparacomprarcomida,mascomojá

eratarde,JilleeuteríamosdenosseparardeEddie.Comdezoitoanos,portercarroe“permissão dos pais”, eu tinha muita liberdade de ir e vir, mas precisava respeitar ohorário de recolher como todos os outros alunos quando anoitecia. Eddie ficouincomodado em abandonar Jill, principalmente quando se deu conta de como estarialongedela.OterrenoextensodaescolaAmberwooderadivididoemtrêscampi: leste,oestee

central.Ocampuslesteabrigavaoalojamentodasmeninas;ooeste,odosmeninos.Ocentral,queeraomaiordostrês,eraondeselocalizavamasinstalaçõesadministrativas,acadêmicas e de recreação. Eles ficavam a mais ou menos um quilômetro e meio dedistânciaumdooutro,ehaviaumônibusquecirculavaduranteodiaparainterligarostrês, apesar de ir caminhando ser sempre uma opção para quem conseguia aguentar ocalor.Eddiejádeviasaberquenãopoderiaficarnoalojamentofeminino,masachoque,se

as coisas fossem do jeito que ele queria, dormiria ao pé da cama de Jill, como um

cachorrofiel.Observarosdoiseraumacoisafantástica.EununcatinhavistoumpardeguardiãoeMoroiantes.QuandoestivecomRoseeDimitri,elesestavamsimplesmentetentandosobreviver—alémdomais,osdoiseramdampiros.Agoraeufinalmenteeracapazdeverosistemaemaçãoecompreendiaporqueotreinamentodosdampiroseratão severo. Para cumprir esse papel tão vigilante, tinha que ser assim. Até nosmomentosmais rotineiros, Eddie sempre estava de olho no entorno.Nada escapava àsuaatenção.— O sistema de segurança aqui é bom? — ele questionou ao entrarmos no

alojamentodasmeninas.Elehavia feitoquestãode checá-lo antesde ir paraodele.Osaguão estava tranquilo àquela hora, e só havia um par de alunas por lá, carregandocaixas emalas em umamudança de última hora. Lançaram olhares curiosos para nósquando passamos, e eu tive que aplacar o nó de ansiedade que ia crescendo dentro demim.Levandoemcontatodasasoutrascoisasqueestavamacontecendonaminhavida,o lado social do ensinomédionãodeviame assustar—mas assustava.Os alquimistasnãotratavamdesseassuntoemsuaslições.—Asegurançaéboaobastante—eudisseemvozbaixaaomevoltarparaEddie.

— O pessoal aqui não está preocupado com assassinos vampiros, mas com certezadesejammanter seus alunos em segurança. Eu sei que há seguranças que patrulham oterrenoànoite.Eddie olhou feio para a responsável pelo alojamento, uma mulher corpulenta de

cabelogrisalhoquedesuamesasupervisionavaosaguão.—Você achaque ela temalgum tipode treinamento emcombate?Achaque seria

capazdedominarumintruso?—Apostoqueela seriacapazdedominarumsujeitoque tentasseentrarnoquarto

deumamenina—Jill brincou.Ela apoiou amãonobraçodele,oque lhe causouumsobressalto.—Relaxe.Estelugaréseguro.Em alguns aspectos, a preocupação de Eddie era reconfortante e me fazia sentir

segura.Aomesmotempo,eunãopodiadeixardemeperguntarmaisumavez porqueele se mostrava tão cauteloso. Ele estava presente no ataque que ninguém queriacomentar. Ele conhecia as ameaças porque as tinha visto com seus próprios olhos. Seestavaassimtãopreocupado,mesmoagora,entãoqualeraotamanhodoperigoquenósainda corríamos? Os alquimistas tinham me levado a acreditar que, uma vez queestivéssemos escondidos emAmberwood, tudo ficaria beme seria apenas umaquestãodeesperar.EutinhatidoamesmaconversacomRoseetentaraconvencê-ladamesmacoisa.AatitudedeEddiediziaocontrário.OdormitórioqueeuiadividircomJillerapequenoparaosmeuspadrões.Quando

criança, sempre tive um quarto sómeu, e nunca preciseime preocupar em dividir oespaço ou o armário. Durante o tempo que passei em São Petersburgo, tive até umapartamento só paramim. Pelomenos a nossa única janela tinha uma vista completa

paraopátiodos fundosdoalojamento.Tudodentrodoquartoerareluzenteearejado,com móveis com acabamento de bordo que pareciam novos: camas, escrivaninhas epenteadeiras.Eunãotinhaexperiênciacomquartosdedormitório—maspudededuzir,pela reação de Jill, que tínhamos conseguido um ótimo. Ela jurou que o quarto eramaiordoqueoqueelatinhanaescoladosMoroi,aEscolaSãoVladimir,eestavabemfeliz.Fiquei imaginandoseelanãohaviaachadooquartoassimtãogrande sóporquenós

tínhamostãopoucacoisaparacolocarnele.Nenhumadenóstinhapodidotrazermuitacoisa com a partida tão apressada.Amobília conferia a tudo uma sensação calorosa edourada,massemdecoraçãopessoalououtrostoquesoquartopoderiatersaídodiretodeumcatálogo.Aresponsávelpeloalojamento,a sra.Weathers, tinha ficadosurpresaaonosvercomtãopoucabagagem.Asmeninasqueeu tinhavistochegandovinhamabordo de carros estourando de tão cheios. Fiquei torcendo para que não parecêssemossuspeitas.Jill fez umapausa para olhar pela janela enquanto nos preparávamos para ir para a

cama.—Aquiétãoseco—elamurmurou,maisparasimesmadoqueparamim.—O

gramadoébemverde,masémuitoestranhonãosentiraumidadenoar—eladeuumaolhadaacanhadaparamim.—Soudotipoquetemdomíniosobreaágua.—Eusei—respondi,semsabermuitobemoquedizer.Elaestavasereferindoaos

dons mágicos que todos os Moroi possuíam. Cada Moroi era especializado em umelemento,quepodiaserumdosquatroelementosfísicos—terra,ar,águaefogo—ouoelementomais intangívelepsíquicodoespírito.Quaseninguémtrabalhavacomesteúltimo, mas eu tinha ouvido dizer que Adrian era um dos poucos. Se Jill tivessedificuldade para acessar sua magia, eu não ficaria desapontada. Assim como bebersangue,amagiaeraumadasatividadesdosvampirosqueserviamcomoumlembreteejogavamnaminha cara que essas pessoas comquemeudava risada e fazia as refeiçõesnãoeramhumanas.SeeuaindanãoestivesseexaustapelaviagemcomKeith,provavelmenteteriaficado

acordada,agoniadaporestardormindonomesmoquartoqueumavampira.Quandoeuconheci Rose, nem conseguia ficar no mesmo recinto que ela. Nossa fuga conjuntacaótica haviamudado isso um pouco e, no fim, eu consegui baixar a guarda.Naqueleinstante,umpoucodesseantigomedoretornounaescuridão. Vampira,vampira .Comfirmeza, disse a mim mesma que era apenas Jill. Eu não tinha nada com que mepreocupar.Nofinal,ocansaçovenceuomedoeeudormi.Quando amanhã chegou, nãopude evitarme examinar no espelhopara ver se não

havianenhumamarcademordidaououtrosinaldedanocausadoporvampiro.Quandoterminei, imediatamenteme senti uma boba. Com a dificuldade que Jill estava tendopara acordar naquele momento, não fazia sentido imaginar que ela me atacaria

sorrateiranomeiodanoite.Do jeitoque as coisas estavam, tivedificuldadede fazê-lasairpelaportaatempodaorientação.Elaestavatontadesono,comosolhosvermelhos,e ficava reclamando de dor de cabeça. Imaginei que não precisariame preocupar comataquesnoturnosdaminhacolegadequarto.Aindaassim,elaconseguiuselevantaresearrumar.Deixamosoalojamentoefomos

ao encontro de Eddie, que estava reunido commais dois alunos novos, perto de umafontenocampuscentral.Amaiorpartedos alunosparecia serdoprimeiroano,comoJill.SóunspoucostinhamamesmaidadequeeueEddie,efiqueisurpresadevercomoele conversava com facilidade com quem estava ao seu redor. Por causa docomportamentovigilantequetinhademonstradonodiaanterior,acheiqueestariacomaguardamaisarmada,queseriamenoscapazdeestabelecerrelaçõessociaisnormais—mas ele se encaixou na turma direitinho. Porém, enquanto caminhávamos, eu o viobservandooentornodisfarçadamente.Elepodiaestarfazendopapeldealuno—comoeu—,mascontinuavasendoumdampiro.Elenosdiziaqueaindanão tinhaconhecido seucolegadequartoquandoumsujeito

sorridentecomolhosbemazuisecabelomeioruivoveionanossadireção.—Oi—eledisse.Deperto,davaparaverummontedesardas.—VocêéEddie

Melrose?—Sousim...—Eddietinhaseviradoparatráscomeficiênciadeguardião,pronto

para dar conta de uma ameaça em potencial. Quando viu o recém-chegado, ficoutotalmente imóvel. Seus olhos se arregalaramumpouco e o que quer que pretendessedizerseesvaiu.— Eu sou Micah Vallence. Sou seu colega de quarto. E também seu líder de

orientação—eleapontoucomacabeçaparaosoutrosalunosqueconversavamesorriu.—Mas eu queria vir aqui primeiro dar um oi, já que só cheguei hoje de manhã.Aminhamãeesticounossasfériasomáximopossível.Eddie ainda estava olhando fixamente para Micah, como se tivesse visto um

fantasma.Também avaliei o garoto, imaginando o que eu estava deixando passar. Elemeparecianormal. Seja lá oque estivesse acontecendo, Jill tambémnão estava apar,porque olhava paraMicah com uma expressão absolutamente normal, sem alarme ousurpresa.— Prazer em conhecer — Eddie finalmente disse. — Estas são as minhas, hã,

irmãs...JilleSydney.Micah deu um sorriso para cada uma de nós. Ele tinha um jeito queme deixava à

vontade, e deu para perceber por que tinha sido escalado como líder de orientação.FiqueimeperguntandoporqueEddieestavaagindodeummodotãoestranho.—Emquesérievocêsestão?—elenosperguntou.—Últimoano—eudisse.Aomelembrardahistóriadonossodisfarce,completei:

—Eddieeeusomosgêmeos.

—Euestounoprimeiroano—Jillfalou.Ao olhar para a nossa “família”, percebi que Eddie e eu provavelmente podíamos

passar por irmãos combastante facilidade.Nossos tons de pele eram semelhantes e, éclaro, havia o fato de nós dois parecermos humanos.Ainda que umhumano não fosseolhar para Jill e necessariamente dizer “vampira!”, ela possuía certos traços que adestacavam como fora do comum. Seu tipo físico e sua palidez criavam um contrastemarcanteemrelaçãoamimeEddie.SeMicahreparounaausênciadesemelhançafamiliar,nãodeixoutransparecer.—Estánervosaparacomeçaroensinomédio?—eleperguntouaJill.Elasacudiuacabeçaeretribuiuosorriso.—Estouprontaparaodesafio.—Bom,seprecisardealgumacoisa,ésófalar—eledisse.—Agoraeuprecisodar

inícioaessafesta.Falocomvocêsmaistarde.Pelamaneiracomoaatençãodeleseconcentrouunicamentenela, ficouóbvioqueo

“se precisar de alguma coisa” era dirigido a Jill, e as bochechas vermelhas delamostravamqueela tambémtinhapercebido.Ela sorriueolhounosolhosdeleporummomento, então desviou o olhar, acanhada. Eu teria achado aquilo fofo, se nãorepresentasseumaperspectivapreocupante.Jillestavaemumaescolacheiadehumanos.Namorar um deles estava completamente fora de questão, e garotos comoMicah nãopodiamser incentivados.Eddiepareceunão se incomodarcomocomentário,mas issoporqueaindapareciaincomodadocomMicahdemaneirageral.Micah pediu ao nosso grupo que prestasse atenção e deu início à orientação.A

primeira parte era simplesmente uma volta pelo terreno. Fomos andando atrás dele,entrando e saindo de ambientes com ar-condicionado, enquanto ele nos mostrava osprédios importantes.Ele explicouo sistemadeônibus enós embarcamosemumdelespara ir ao campus oeste, que era quase uma imagem espelhada do leste. Meninos emeninas tinham permissão de entrar no alojamento uns dos outros, com certaslimitações, e ele explicou essas regras também, causando alguns resmungos.Ao melembrar da temível sra.Weathers, fiquei com pena de qualquer garoto que tentassedesrespeitarasregrasdoalojamento.Ambosalojamentostinhamseuprópriorefeitório,quequalqueralunopodiausar,e

nossogrupodeorientaçãoalmoçouenquantoaindaestávamosnocampusoeste.Micahsejuntouaosmeus“irmãos”eamim,dando-seaotrabalhodeconversarcomcadaumdenós. Eddie respondeu com educação, assentindo e fazendo perguntas, mas seus olhosaindapareciamvagamente assombrados. Jill nocomeço ficou acanhada,mas assimqueMicahcomeçouabrincarcomela,acabousesoltando.Queengraçado,pensei.AfacilidadedeadaptaçãodeEddieeJilleramaiordoquea

minha. Eles estavam em um ambiente estranho, com uma raça diferente, mas aindaentre coisas familiares, como refeitórios e vestiários. Eles logo entraram nos papéis e

nos procedimentos sem dificuldade. Enquanto isso, apesar de ter viajado e vivido nomundo todo,eumesentiadeslocadanaqueleambientequepara todasasoutraspessoaseramuitocomum.Independentedisso,nãodemoroumuitoparaeuentendercomoaescola funcionava.

Osalquimistaseramtreinadosparaobservareseadaptare,apesardeaescolaserumacoisaestranhaparamim,logoentreinarotina.Eutambémnãotinhamedodefalarcomaspessoas—estavaacostumadaapuxarpapocomdesconhecidoseencontrarexplicaçõespara escapar de alguma situação complicada. Mas tinha uma coisa que eu sabia queprecisavadesenvolver.—OuvidizerqueafamíliadelatalvezsemudeparaAnchorage.Estávamosno almoçodeorientação, eduas garotasdoprimeiro anopertodemim

conversavamsobreumaamigadelasquenãotinhaaparecidonaqueledia.Osolhosdaoutrameninasearregalaram.—Sério?Euiriamorrersetivessequememudarparalá.—Nãosei—refleti, remexendoacomidanoprato.—Comtantosraios uvaqui,

Anchorage na verdade poderia fornecermaior expectativa de vida.Não é preciso usartantoprotetorsolar,entãopareceserumasoluçãomaiseconômicatambém.Penseiqueomeucomentário tinhasidoútil,mas,quandoerguiosolhos,viqueas

duas olhavam fixamente para mim, boquiabertas. Era óbvio, pelo jeito que elas meolhavam,queeunãopodiaterfeitoumcomentáriomaisbizarro.—Achoqueeunãodeviadizertudoquemevemàcabeça—murmureiparaEddie.

Estavaacostumadaaserdiretaemsituaçõessociais,masmeocorreuquesimplesmentedizer“é,total!”provavelmenteteriasidoarespostacorreta.Eutinhapoucosamigosdaminhaidadeeestavasemprática.Eddiesorriuparamim.—Nãoseinão,irmãzinha.Vocêébemdivertidadojeitoqueé.Continueassim.Depois do almoço, nosso grupo voltou para o campus central, onde nos separamos

para ter reuniões com conselheiros acadêmicos e elaborar o horário de aulas.Quandome sentei com aminha conselheira, umamulher toda animada chamadaMolly, fiqueisurpresadeverqueosalquimistastinhamenviadohistóricosescolaresdeumainstituiçãofictícianaDakotadoSul.Eramatébemconsistentes comoque eu tinha estudadoemcasa.— As suas notas e provas a colocaram nas nossas classes mais adiantadas de

matemáticaedeinglês—Mollydisse.—Sevocêsesairbem,poderárecebercréditospara a faculdade—penaquenão vai ter comoeu ir para a faculdade, pensei com umsuspiro. Ela folheou algumas páginas no meu arquivo. —Agora, não estou vendonenhum registro de línguas estrangeiras aqui. É exigência deAmberwood que todosaprendampelomenosumalíngua.Ops.Os alquimistas tinham pisado na bola com omeu histórico escolar falso.Na

verdade,euhaviaestudadováriaslínguas.Omeupaiseasseguroudequeeutivesseaulasdesdemuitopequena, já queumalquimistanunca sabeondevai parar.Aoexaminar alista de línguas oferecidas emAmberwood, hesitei e fiquei me perguntando se deviamentir. Então decidi que realmente não queria aturar aulas de conjugações e temposverbaisquejátinhaaprendido.—Eujáseifalartodasestas—disseaMolly.Elaficoumeolhandosemacreditar.—Todasestas?Hácincolínguasaqui.Euassentiecompletei,paratentarajudar:—Maseusóestudeijaponêsdurantedoisanos.Entãoachoquepossoaprendermais.Mollycontinuoucomcaradequemnãoestavaacreditando.—Estádispostaafazertestesdeproficiência?E, assim, acabei passando o resto da tarde fazendo provas de línguas estrangeiras.

Nãoeradaquele jeitoqueeuqueriapassaromeu tempo,masacheiquevaleria apenadepois—ostesteseramfacílimos.Quandoeu finalmente terminei todas as cinco línguas, trêshorasdepois,Mollyme

fezsairapressadaparatirarasmedidasparaomeuuniforme.Amaiorpartedosalunosnovos já tinha passado por lá, então ela estava preocupada que amulher que tirava asmedidasjátivesseidoembora.Eumeapresseiomáximopossívelpeloscorredoressemchegar a correr, e quase dei um encontrão com duas meninas que dobravam umaesquina.—Ah!—exclamei,sentindo-meumaidiota.—Sintomuito...estouatrasadapara

tirarasmedidasparaouniforme...Umadelas deu uma risada gostosa. Ela tinha a pele escura, corpo atlético e cabelo

ondulado.—Não se preocupe com isso— ela falou.—Acabamos de passar pela sala. Ela

aindaestálá.Aoutrameninatinhacabeloloiroumtommaisclaroqueomeu,presoemumrabo

decavalo.Asduastinhamasegurançatranquiladaspessoasquesabiamsevirarnaquelemundo.Elasnãoeramalunasnovas.—A sra. Delaney sempre demoramais do que pensa com asmedidas— a loira

disseemtomdequemsabedascoisas.—Todoano,éa...—oqueixodelacaiu,suaspalavrassecongelaramporalgunsmomentos.—Onde...ondevocêconseguiuisso?Eu não fazia ideia do que ela estava falando, mas a outra menina logo notou e se

inclinoumaispertodemim.—Quedemais!Éissoqueestãofazendoesteano?—Asuatatuagem—aloiraexplicou.Devotercontinuadocomcaradequemnão

estavaentendendonada.—Ondevocêfezisso?—Ah. Isso—meusdedostocaramabochechasemprestaratenção.—Foi,hum,

naDakotadoSul.Deondeeuvim.Asduasmeninaspareceramdecepcionadas.—Acho que é por isso que nós nunca vimos— disse a morena.—Achei que a

Nevermoreestivessefazendoalgonovo.—Nevermore?—perguntei.Asmeninas trocaram olhares silenciosos e algumamensagem foi transmitida entre

elas.—Vocêénova,certo?Comosechama?—aloiraperguntou.—EusouJulia.Esta

éKristin.—Sydney—eudisse,aindacuriosa.Juliatinhavoltadoasorrir.—Almocecomagentenaalalesteamanhã,certo?Vamosexplicartudo.—Tudosobreoquê?—perguntei.—Éumalongahistória.Porenquanto,sóváveraDelaney—Kristincompletoue

começouaseafastar.—Elaficaatémaistarde,masnãovaificaraliparasempre.Quando elas se foram, eu continuei o meu caminho — bem mais devagar —,

imaginando que história era aquela. Será que eu tinha acabado de fazer amigas? Eurealmentenãotinhacertezadecomodeviamecomportaremumaescolaassim,masaconversatodatinhaparecidobemesquisita.Asra.Delaneyestavacomeçandoaguardarsuascoisasquandoeucheguei.—Quetamanhovocêusa,querida?—elaperguntouaomeveràporta.—pp.Ela me mostrou diversas peças: saias, calças, blusas e suéteres. Duvidei que os

suéteres tivessemmuitautilidade, amenosqueuma tempestadedeneve apocalíptica esobrenaturalseabatessesobrePalmSprings.Amberwoodnãoseimportavamuitocoma combinação que os alunos usassem, desde que as peças viessem da linha de roupasaprovada.Ascoreseramvinho,cinza-escuroebranco,eeuatéacheique ficavambemjuntas.Aomeverabotoarumablusabranca,asra.Delaneyestaloualíngua:—AchoquevocêprecisadeP.Eufiqueiparalisadacomumbotãomeioabotoadonamão.—Euusopp.—Ah, sim,vocêcabeneste tamanho,masolhe sóasmangaseocomprimentoda

saia.VaificarmaisconfortávelcomP.Experimenteestaspeças—elameentregouumapilhanovaeentãodeurisada.—Nãofiquecomestacarahorrorizada,menina!UsarPnão é nada de mais, você continua sendo um palito— ela deu palmadinhas em suabarrigagrande.—Cabemtrêsdevocênasminhasroupas!Apesardosmeusprotestos,fuimandadaemboracomasroupastamanhoP.Volteide

ônibus para o dormitório, arrasada, e encontrei Jill deitada na cama, lendo. Ela se

sentoueretaquandocheguei.—Oi,estavamesmoimaginandooquetinhaacontecidocomvocê.—Eumeatrasei—dissecomumsuspiro.—Estásesentindomelhor?—Estou,sim.Muitomelhor—Jillobservavaenquantoeuguardavaosuniformes.—Eles sãobemhorrorosos,não são?NósnãousamosuniformesnaSãoVladimir.

Vaiseramaiorchaticeusaramesmacoisatodososdias.Eunãoqueriadizer a ela que,por ser alquimista, euprovavelmente ia usar roupas

parecidascomaquelasdetodomodo.—Que tamanhoderampara você?—pergunteiparamudarde assunto.Eu sentia

umaespéciedeavidezporpunição.—pp.Umapontadade irritaçãopercorreuomeucorpoquandopendureimeusuniformes

no armário, ao ladodosdela.Eume senti enormeemcomparação.Comoéque essesMoroi eram tãomagros? Genética? Dieta de sangue com poucos carboidratos?Talvezfosseporque todoseleserammuitoaltos.Só sabiaque, semprequepassavaumtempopertodeles,mesentiainchadaedesajeitada,eficavacomvontadedecomermenos.Quandotermineidedesfazerasmalas,Jilleeucomparamosnossoshorários.Nãofoi

surpresaverque, levandoemconta adiferençade séries,nósnão tínhamosquasenadaem comum.A única coisa que compartilhávamos era a aula de educação física, quejuntavatodososanos.Osalunostinhamquefrequentaraquelaaulatodosossemestres,jáqueestaremformaeraconsideradopartedaexperiênciaescolarcompleta.Talvezeupudesseperderalgunsquilosevoltarparaomeutamanhonormal.Jillsorriuedevolveuomeuhorário.—Eddie foi lá e exigiu ficarnamesma classede educação física quenós, porque é

basicamenteaúnicaquepodemosfazerjuntos.Maselaentraemconflitocomaauladeespanhol dele, e não permitiram.Acho que ele não vai conseguir passar umdia letivointeirosemchecarseeuestouviva.Ah,eMicahestáconosconaeducaçãofísica.Fui para a minha cama pisando firme, ainda irritada por causa dos uniformes.As

palavrasdeJillchamaramaminhaatenção.—Ei,vocêsabeporqueEddiepareceuficarincomodadocomMicah?Jillsacudiuacabeça.— Não, e não tive oportunidade de perguntar, mas também reparei...

principalmente no começo. Depois, quando você estava fazendo as suas provas e nósesperávamos os uniformes, Eddie pareceu se acalmar. Um pouco. Mas, de vez emquando,euviaqueeleestavaolhandodeumjeitoestranhoparaMicah.—VocênãoachaqueelepodeconsiderarMicahperigoso,acha?Jilldeudeombros.—Elenãopareceuperigosoparamim,masnão souguardiã. SeEddie achasseque

elerepresentaalgumtipodeameaça,acreditoqueiriaagirdeoutramaneira.Commais

agressividade. Ele parecia mais estar nervoso perto de Micah. Quase, mas nãoexatamente, commedo. E isso é omais estranho de tudo, porque os guardiões nuncaparecemamedrontados.NãoqueEddiesejatecnicamenteumguardião.Masvocêsabeoqueeuquerodizer.— Sei, sim — respondi sorrindo, apesar das minhas intenções mal-humoradas.

Aqueladivagaçãonaturalemeigameanimouumpouco.—Comoassim,Eddienãoétecnicamenteguardião?Elenãofoidesignadoparaprotegervocêaqui?—Foi, sim— Jill respondeu enquanto brincava comumde seus cachos castanho-

claros.—Mas...bom,émeioesquisito.ElesemeteuemalgumtipodeconfusãocomosguardiõesporajudarRoseepor,hum,matarumcara.—ElematouaqueleMoroiqueatacouVasilisa,certo?—Issotinhasidomencionado

nomeuinterrogatório.—É— Jill respondeu, perdida em suas próprias lembranças.—Foi em legítima

defesa, e em defesa de Lissa, mas todo mundo ficou chocado por ele ter matado umMoroi.Os guardiões não podem fazer isso,mas até aí, osMoroi tambémnão podematacarunsaosoutros.Mas,bom,elerecebeususpensão.Ninguémsabiaoquefazercomele.Quandoeu fui...atacada,Eddieajudouameproteger.Depois,Lissadissequeerauma estupidez deixá-lo sem trabalhar se ele podia ser útil, e levando em conta quetambém havia umMoroi por trás do ataque, ela disse que todomundo ia ter que seacostumar com a ideia de ter alguns Moroi como inimigos. Hans, o guardiãoencarregadona corte, finalmente concordou emandouEddie vir comigo,mas eu achoque, oficialmente, o cargo de Eddie ainda não foi restituído. É estranho— Jill tinhafeitotodoodiscursosempausaeentãoparoupararetomarofôlego.— Bom, tenho certeza de que tudo vai ser resolvido — eu disse, tentando

tranquilizá-la.—Eparecequeelevaiganharpontospormanterumaprincesaviva.Jillmelançouumolharafiado.—Nãosouprincesacoisanenhuma.EufranziatestaetenteimelembrardascomplexidadesdaleidosMoroi.—Opríncipeouaprincesaéointegrantemaisvelhodafamíliareal.ComoVasilisa

éarainha,otítulopassaparavocê,certo?—Nopapel—Jillrespondeuedesviouoolhar.Otomdelaeradifícildedecifrar,

umamisturaestranhaquepareciaseramargorepesar.—Eunãosouprincesa,nãodeverdade.Souapenasalguémqueporacasotemparentescocomarainha.Amãe de Jill tinha sido amante de EricDragomir, pai deVasilisa, por um curto

período, e mantivera a existência de Jill em segredo durante anos. O fato tinha sidotrazidoàsclarasrecentemente,eeudesempenheiumpapelimportanteparaajudarRosea localizar Jill. Com toda a confusão na minha própria vida, além da ênfase sobre asegurança de Jill, eu não tinha passado muito tempo imaginando como ela tinha seadaptadoaoseunovostatus.Deviaserumatremendamudançadeestilodevida.

—Tenho certeza de que é mais do que isso — eu disse com gentileza. FiqueiimaginandoseiaterquepassarmuitotempofazendopapeldeterapeutaparaJillduranteamissão.Aperspectivaderealmente reconfortarumavampiraaindamepareciamuitoestranha.—Querodizerquevocêéobviamente importante.Todomundoseesforçoumuitoparaquevocêficasseaquiemsegurança.—Masémesmopormim?—Jillperguntou.—OuéparaajudarLissaamantero

trono?Elamalfaloucomigodesdequedescobriuqueéramosirmãs.Aquela conversa estava se desviando para águas nada confortáveis, para questões

pessoaiscomasquaiseunemsabialidar.NãopodiaimaginarcomoseriaestarnolugardeVasilisa ou de Jill.A única coisa que parecia certa era que não devia ser fácil paranenhumadelas.—Tenho certeza de que ela gosta de você— eu disse, apesar de não ter certeza

nenhuma. — Mas deve ser estranho para ela... principalmente com todas as outrasmudançasnavidadelatambém.Dêumtempoaela.Concentre-senoqueéimportanteprimeiro:ficaraquiecontinuarviva.—Vocêtemrazão—Jilldisse.Elavoltouasedeitarnacamaeficouolhandopara

o teto.— Estou nervosa com amanhã; ficar perto de tanta gente, tendo aula o diainteiro.Eserepararem?Esealguémdescobriraverdadeameurespeito?—Vocêfoiótimanaorientação—garantiaela.—Sónãomostreosseuscaninos.

E,alémdomais,eusouboaemconvenceraspessoasdequeelasnãoviramoqueachamqueviram.A expressão agradecida no rosto delame lembrou, de um jeito desconfortável, de

Zoe.Elaseramtãoparecidasemtantosaspectos,tímidasecheiasdeincertezas—e,noentanto, extremamente impetuosas e desesperadas para provar o seu valor. Eu tinhatentadoprotegerZoe—e,aosolhosdela, só falhei.Naquelemomento,estarcomJillfaziame sentir em conflito. Em certos aspectos, eu podia compensar o que não tinhasido capaz de fazer por Zoe. No entanto, quando eu pensava nisso, uma voz baixinhainteriorficavadizendo:Jillnãoésuairmã.Elaéumavampira.Istoaquiétrabalho.—Obrigada,Sydney.Ficocontentequevocêestejaaqui—elasorriu,eaculpasó

secontorceumaisfundodentrodemim.—Sabe,eumeioquetenhoinvejadeAdrian.EleachatãochatoficarnacasadoClarence,masnãoprecisasepreocuparemconhecergentenovanemseacostumarcomumanovaescola.Elesóficaláassistindo tv, jogandosinucacomoLee,dormindoatétarde...parecefantástico—elasuspirou.—Suponhoquesim—eudisse,umpoucosurpresacomtantosdetalhes.—Como

é que você sabe tudo isso?Você... falou com ele depois da nossa partida?—A ideiapareciaimprovávelenquantoeufalava.Eutinhapassadoamaiorpartedodiacomela.Osorrisodesapareceudorostodela.—Ah, não.Quer dizer, só supus que é isso que está acontecendo. Elemencionou

algumascoisasantes,sóisso.Desculpe.Estousendomelodramáticaefalandobobagem.

Obrigadapormeescutar...realmentefazcomqueeumesintamelhor.Deiumsorrisocontidoenãodissemaisnada.Nãoconseguia superaro fatodeque

estava começando a simpatizar tanto com uma vampira. Primeiro Rose, e agora Jill?Não importava o quão adorável ela fosse. Eu precisava manter a nossa relaçãoestritamenteprofissionalparaquenenhumalquimistapudessemeacusardemeapegaraela.AspalavrasdeKeithecoaramnaminhacabeça:adoradoradevampiros...Issoéridículo,eupensei.Nãohavianadadeerradoemserlegalcomumapessoaque

estavasobosmeuscuidados.Eranormal,estavamuitolongedeficar“próximademais”deles. Certo? Coloqueiminhas preocupações de lado eme concentrei em terminar dedesfazerasmalasepensarsobreanossanovavidaali.EusinceramentetorciaparaqueodiaseguintefossecorrertãobemquantoeuhaviagarantidoaJillquecorreria.Infelizmente,nãofoiassim.

6

Paraserjusta,odiacomeçouótimo.

Osolentravapelasjanelasquandoacordamos,eeujápodiasentirocalor,apesardeserbemcedopelamanhã.Escolhiacombinaçãomaisleveentreasopçõesdouniforme:umasaiacinzaeumablusabrancademangacurta.Joiassimpleserampermitidas,porissocontinueicomacruzdeouro.Omeucabeloestavaemumdaquelesdiasdifíceis—quepareciamsermais frequentesnaquelenovoclima.Minhavontadeeraprendê-loemumrabodecavalo,comoJillfezcomodela,maseletinhacamadasdemaisparaqueeuconseguisse fazer direito. Fiquei olhando para o jeito como os fios batiam nos meusombrosemcomprimentosdiferentesepenseisenãoestavanahoradedeixarcrescer.Depois de um café da manhã que nenhuma de nós realmente comeu, pegamos o

ônibusatéocampuscentral,quederepenteficoutodolotadodegente.Apenascercadeum terço dos alunos ficava na escola em regime de internato. O resto morava nasproximidades, e agora todos tinham chegado. Jill mal falou durante todo o trajeto eparecia passarmalmais uma vez. Era difícil dizer,mas a acheimais pálida do que onormal. Seus olhos estavam vermelhos de novo, pesados e com olheiras escuras. Eutinhaacordadoumaveznomeiodanoiteeavidormindoprofundamente,porissonãosabiamuitobemqualeraoproblema.Aquelasolheirasescuras,aliás,eramaprimeirafalhaqueeuvianapeledeumMoroi—apeledeleserasempreperfeita,deporcelana.Nãoeraparamenosquepodiadormiratémaistarde.Nãoprecisavasepreocuparcomocorretivoeopóqueeuusava.Àmedidaque amanhã foi avançando, Jillnãoparavademordero lábioeolhar ao

redor, preocupada.Talvez só estivesse nervosa por mergulhar em um mundo todopovoado por humanos. Ela não parecia nem um pouco preocupada com a logística dechegar às salas certas e fazer as lições. Isso era o que continuava me assustando umpouco.Apenas vá de uma aula para a outra, disse a mimmesma. É a única coisa quevocêprecisafazer.

A minha primeira aula era História Antiga. Eddie também estava nela, e elepraticamentemeatacouquandomeviu.—Estátudobemcomela?Estevecomela?—Bom,nósdividimosomesmoquarto,então,estive—nossentamosemcarteiras

vizinhas.SorriparaEddie.—Relaxe.Estátudobemcomela.Parecianervosa,masnãodáparaculpá-laporisso.Eleassentiu,masaindaparecia inseguro.Eleconcentroutodaaatençãonafrenteda

salaquandoaprofessoraentrou,masestava inquieto,ali sentado,comosemalpudessesesegurarparanãolevantaremumsaltoeirverseJillestavabem.— Bem-vindos, bem-vindos — nossa professora era uma mulher de quarenta e

poucos anos, com cabelo eriçado preto, rajado de fios brancos, e energia nervosasuficiente para rivalizar com Eddie. E se a xícara de café gigante dela servisse comopista, não era difícil descobrir por quê. Fiquei com um pouco de inveja e desejei quetodosnóstivéssemospermissãoparatrazerbebidasàsaladeaula,principalmenteporqueorefeitóriodoalojamentonãoserviacafé.Eunãosabiacomoiriasobreviveraosmesesseguintes sem cafeína. O guarda-roupa dela dava preferência ao padrão xadrez delosangos.— Eu sou a sra.Terwilliger, sua ilustre guia à jornada fantástica que é ahistóriaantiga—elafalavaemumtomdramáticoegrandiosoquefezalgunsdosalunosdarem risadinhas. Ela fez um gesto indicando um rapaz que estava sentado atrás dela,perto da mesa grande. Ele estava olhando para a classe com expressão de tédio, masquando ela se virou ele se animou todo. — E este é o meu assistente,Trey, que,acredito, alguns de vocês devem conhecer.Trey é omeumonitor estudantil para esteperíodo,então,oqueelevaifazeréficarcabisbaixopeloscantospreenchendopapelada.Masvocêsdevemser legaiscomele,porqueébemprovávelqueele sejao responsávelporpassarassuasnotasparaomeucomputador.Trey deu um leve aceno e sorriu para alguns de seus amigos. Ele tinha a pele bem

bronzeada e cabelo preto cujo comprimento flertava com as normas de aparência daescola.O uniforme bem passado deAmberwood dava a ele a impressão de sermuitocompetente,mashaviaumbrilhomarotoemseusolhosescurosquemefezpensarque,naverdade,elenãolevavamuitoasérioessenegóciodesermonitor.— Bom— a sra.Terwilliger continuou.—A história é importante porque nos

ensinaarespeitodopassado.E,aoaprendersobreopassado,nósentendemosopresente,parapodermostomardecisõesembasadasarespeitodofuturo.Ela fez uma pausa dramática para permitir que as palavras fossem absorvidas.

Quando se convenceu de que todos estavam maravilhados, foi até o seu laptop, queestava conectado a um projetor. Ela apertou algumas teclas e a imagem de umaconstruçãocompilastrasbrancasapareceunatelanafrentedasala.—Eentão?Alguémsabemedizeroqueéisto?—Umtemplo?—alguémarriscou.

—Muitobem,senhor...?—Robinson—ogarotoinformou.Asra.Terwilligerpegouumapranchetaeexaminouumalista.—Ah,aquiestávocê.Robinson.Stephanie.—Stephan—ogarotocorrigiueficoutodovermelhoenquantoalgunsamigosdele

davamrisada.Asra.Terwilligerajeitouosóculosnonarizeapertouosolhos.—Émesmo.Aindabem.Estavaaquipensandocomoasuavidadeviaserdifícilcom

umnomedesses.Peçodesculpas.Quebreimeusóculosemumacidentemalucojogandocroquetnofimdesemanapassado,porissofuiobrigadaatrazerosvelhoshoje.Então,Stephan--não-Stephanie,éissomesmo.Éumtemplo.Podesermaisespecífico?Stephansacudiuacabeça.—Alguémpodedaralgumaideia?Comoapenaso silênciorespondeuà sra.Terwilliger,respirei fundoeerguiamão.

Estava na hora de ver como era ser uma aluna de verdade. Ela fez um gesto com acabeçanaminhadireção.—ÉoParthenon.—Émesmo—elafalou.—Equaléoseunome?—Sydney.— Sydney...— ela conferiu a prancheta e ergueu os olhos, surpresa.— Sydney

Melbourne?Nossa.Vocênãofalacomoaustraliana.—Hum,éSydneyMelrose,senhora—corrigi.Asra.TerwilligerdeuumarisadinhaeentregouapranchetaparaTrey,queparecia

acharomeunomeacoisamaisengraçadadomundo.—Assuma, sr. Juarez. Seus olhos juvenis são melhores do que os meus. Se eu

continuar assim, vou ficar transformando os meninos em meninas e mocinhasperfeitamente adoráveis em descendentes de criminosos. Então— a sra.Terwilligervoltouaseconcentraremmim—,oParthenon.Sabealgumacoisaarespeitodele?Os outrosme observavam, amaior parte com curiosidade simpática,masmesmo

assim senti a pressão de estar no centro das atenções. Concentrei-me apenas na sra.Terwilligeredisse:—FazpartedaAcrópole,senhora.EmAtenas.Foiconstruídonoséculova.C.— Não precisa me chamar de “senhora” — a sra.Terwilliger disse. — Mas é

agradávelreceberumpoucoderespeito,paravariar.Earespostafoibrilhante.Eladeuumaolhadanorestodasala.—Agora,digam-meoseguinte:porquediabosdevemosnospreocuparcomAtenas

oucomqualquercoisaqueaconteceuhámaisdemilequinhentosanos?Querelevânciaissopodeterparanóshoje?Mais silêncio e olhos agitados.Quando aquele silêncio insuportável se arrastou por

um momento que pareceu durar horas, comecei a levantar a mão de novo.A sra.TerwilligernãoviueolhoudenovoparaTrey,queestavacomospésapoiadosnamesadaprofessora.Ogarotonomesmoinstantebaixouaspernaseaprumouascostas.— Sr. Juarez— a sra.Terwilliger declarou.— Está na hora de ganhar os seus

créditos.Vocêfezestamatérianoanopassado.PodedizeraelesporqueoseventosdeAtenasantigasãorelevantesparanóshoje?Senãoforcapaz,vouterquevoltarachamara srta.Melbourne.Parecequeela sabea resposta,e imagine sócomo issovai serumavergonhaparavocê.OsolhosdeTreypassaramparamimedepoisretornaramàprofessora.—O sobrenome dela é Melrose, nãoMelbourne. E a democracia foi fundada em

Atenas no séculovi. Muitos dos procedimentos que foram estabelecidos lá ainda sãoseguidospelonossogovernohoje.Asra.Terwilligerapertouopeitocomamãoemumgestodramático.— Você estava prestando atenção no ano passado! Bom, quase.A data não está

correta— o olhar dela recaiu em mim.—Aposto que você sabe a data em que ademocraciafoicriadaemAtenas.—Séculov—eurespondiimediatamente.IssomevaleuumsorrisodaprofessoraeumaolhadafeiadeTrey.Orestodaclasse

fez mais ou menos a mesma coisa. A sra. Terwilliger prosseguiu com seu estiloespalhafatoso e destacou diversos períodos e locais que iríamos estudar com maisdetalhes. Descobri que eu era capaz de responder a qualquer pergunta que ela fazia.Algumaparteemmimdiziaparaeumeconter,maseunãofuicapazdemesegurar.Seninguémsabiaaresposta,eumesentiaforçadaafornecê-la.Ecadavezqueeufaziaisso,asra.Terwilligerdizia:“Trey,vocêsabiadisso?”.Eusentiumcalafrio.Realmentenãoqueria fazer inimigos logo no primeiro dia. Os outros alunos me observavam comcuriosidadeenquantoeufalava,coisaquemedeixouumpoucoenvergonhada.Tambémvi alguns deles se entreolharem cada vez que eu falava, como se soubessem de algumsegredoqueeunãosabia.IssomepreocupoumaisdoqueofatodeirritarTrey.Seráqueparecia que eu estavame exibindo?Eunão entendia nada das políticas sociais dali parasaber o que era normal e o que não era. Aquela era uma escola em que existiaconcorrência acadêmica.Certamente não devia ser algo ruim ter bons conhecimentos,nãoé?A sra.Terwilliger nos deu como tarefa ler os dois primeiros capítulos do livro

didático. Os outros reclamaram, mas eu fiquei animada. Eu adorava história,principalmentehistóriadaarteearquitetura.Minhaeducaçãoemcasatinhasidorígidaeabrangente,mas essamatéria específicanão era algoqueomeupai consideravamuitoimportante para nós. Eu tive que estudar sozinha, então era ao mesmo temposurpreendenteemagníficopensarqueagoraeutinhaumaaulacujoúnicopropósitoeraaprenderaquilo,e, alémdisso,saberqueomeuconhecimentoseriavalorizado—ainda

quesópelaprofessora.EumesepareideEddiequandoaaulaterminouefuiparaaauladequímicaaplicada.

Enquantoesperavaaaulacomeçar,Treyseacomodouemumacarteiraaomeulado.— Então, srta. Melbourne— ele disse, imitando a voz da sra.Terwilliger. —

Quandovaicomeçaradarsuasprópriasaulasdehistória?Euacheichatoasra.Terwilligerterimplicadocomele,masnãogosteinadadaquele

tom.—Agoravocêveiomesmoparaaprender?Ouvai ficaraísemfazernada, fingindo

queestáajudandoaprofessoradenovo?Issofezumsorrisoseabriremseurosto.—Ah,eu, infelizmente,soualunonestaaulaaqui.Efuiomelhordaclassenaaula

dasra.Tnoanopassado.Sevocêfortãoboaemquímicaquantoéemhistória,querotepegarparaserminhaparceirade laboratório.Assim,voupodertirar fériasosemestretodo.Aquímicaeraumaparte fundamentaldas funçõesdeumalquimista, eeuduvidava

quehouvessealgonaquelaaulaqueeuaindanãosoubesse.OsalquimistastinhamsurgidonaIdadeMédiacomo“cientistasmágicos”,quetentavamtransformarchumboemouro.A partir dessas primeiras experiências, eles descobriram as propriedades especiais dosanguedosvampiros,ecomoelereagiacomoutrassubstâncias—oqueacaboulevandoà cruzada paramanter vampiros e humanos separados.Essa bagagemcientífica inicial,assim como nosso trabalho atual com sangue de vampiro, tornou a química uma dasmatériasprincipaisdaminhaeducaçãona infância.Ganheiomeuprimeiroconjuntodequímicaaosseisanos.Enquantooutrascriançastreinavamoalfabeto,meupaimefaziaperguntassobreácidosebases.IncapazdeconfessartudoissoaTrey,desvieiosolhosetireiumamechadecabelodo

rostoemumgestocasual.—Nãosouruim.Oolhardelepassouparaaminhabochechaeumaexpressãodecompreensãotomou

contadele.—Ah.Entãoéisso.—Oqueéoquê?—perguntei.Eleapontouparaomeurosto.—Asuatatuagem.Éissoqueelafaz,hein?Aomexernocabelo,haviareveladoomeulíriodourado.—Oquevocêquerdizer?—perguntei.— Não precisa se fazer de desentendida comigo— ele disse, e revirou os olhos

escuros.—Jáentendi.Querdizer,paramimparece trapaça,masachoquenemtodomundo se importa com a honra.Mas émuita coragem ter uma no rosto. É contra ocódigodecondutadaescola,sabecomoé...nãoqueissoimpeçaalguém.

Eumemexiedeixeiocabelocairdenovoondeestava.—Eusei.Iadisfarçarcommaquiagem,masesqueci.Mascomoassim,trapaça?Elesósacudiuacabeçamostrandoclaramentequenãoqueriamaisconversar.Fiquei

lá me sentindo impotente, imaginando o que tinha feito de errado. Logo a minhaconfusãofoisubstituídapordesalentoquandoonossoinstrutorfezumaapresentaçãodocursoede suaorganização.Eu tinhaumconjuntodequímicanoquartomais vastodoque todo o material disponibilizado porAmberwood. Paciência. No final das contas,acheiqueumarevisãoelementarnãoiriafazermal.As minhas outras aulas se passaram de maneira semelhante. Eu já estava mais

adiantadaquetodasasminhasaulaseviqueeracapazderesponderatodasasperguntas.Isso me fez ficar bem com os professores, mas não sabia avaliar a reação dos meuscolegas.Continuei vendomuitas cabeças balançando demaneira tristonha e expressõesintrigadas—masapenasTreyde fatomecondenava.Nãosabiasedeviameconterounão.CruzeicomKristineJuliaalgumasvezes,eelasmelembraramdeencontrá-laspara

oalmoço.Foioquefiz,easencontreiemumamesadecantonorefeitóriodocampusleste.Elasacenaramparaqueeumeaproximassee,enquantoeuziguezagueavaentreasfileiras demesas, dei umaolhada rápida no lugar, na esperança de encontrar Jill.Nãotinha cruzado com ela o dia todo, mas isso não era nada surpreendente, levando emcontanossoshoráriosdeaulas.Eladeviaestarcomendonooutrorefeitório,talvezcomEddieouMicah.Kristin e Julia foram simpáticas, ficaram perguntando como tinha sido o meu

primeirodiaemederaminformaçõessobrealgunsprofessorescomquemelasjátinhamcaído.Eramalunasdoúltimoano,comoeu,eestávamosjuntasemduasaulas.Passamosamaior parte do almoço trocando informações básicas, como, por exemplo, de ondetínhamos vindo. Só quando o almoço foi chegando ao fim é que eu comecei a obterrespostasparaalgumasdasperguntasqueestavammeincomodandoodiatodo.Masissoexigiuqueeuprimeiroultrapassasseaindamaisperguntas.—Então—Kristindisseesedebruçouporcimadamesa.—Serveparadaravocê

uma supermemória?Ou, tipo,não sei, chegamesmoamudar seucérebroparadeixarvocêmaisinteligente?Juliarevirouosolhos.—Nãotemcomodeixaralguémmais inteligente.Temqueseramemória.Oque

euqueromesmoésaberoseguinte:quantotempodura?Olheideumaparaaoutra,maisconfusadoquenunca.—Nãoseidoquevocêsestão falando,masoquequerqueseja,nãopodeestarme

deixandomaisinteligente,porquenestemomentoestoubemperdida.Kristindeurisada.—Asuatatuagem.Ouviquandovocêrespondeuatodasasquestõesmaisdifíceisde

matemática.Eumaamigaminhaestánasuaauladehistóriaedissequevocêdominoulátambém.Estamostentandodescobrircomoatatuagemajuda.—Semeajuda...aresponderasperguntas?—perguntei.Orostodelasconfirmou.

—Não.Aquilotudo...bom,sousóeu.Simplesmenteseiasrespostas.—Ninguémétãointeligente—Juliaargumentou.—Nãoétãoestranhoassim.Eunãosougêniocoisanenhuma.Achoquesóaprendi

muitacoisa.Eufuieducadaemcasaporumtempo,eomeupaieramuito...rígido—completei,achandoquepodiaajudar.—Ah — Kristin disse enquanto brincava com sua trança comprida. Eu tinha

reparadoque ela prendia o cabelo escurodemaneira bemprática; já o de Julia, loiro,estavasemprejogadoebagunçado.—Achoqueatépodeser...mas,então,oqueasuatatuagemfaz?—Nãofaznada—respondi.Masantesmesmoqueeuterminassedeproferiressas

palavras, senti um leve formigamento na pele.A tatuagem possuía um tipo demagiaquemeimpediadefalarqualquercoisarelacionadaaosalquimistascompessoasquenãofaziampartedonossocírculorestrito.Aquelasensaçãoeraatatuagemmeimpedindodefalardemais,nãoquehouvessenecessidadeparaisso.—Eusóacheiqueerabacana.—Ah—Juliadisse.Asduasmeninaspareciaminexplicavelmentedecepcionadas.— Por que diabos vocês iam achar que a tatuagem estava me deixando mais

inteligente?—perguntei.O sinal interrompeu a conversa ao nos lembrar de que estava na hora de ir para a

próxima aula. Uma pausa se instalou enquanto Kristin e Julia refletiam sobre algumacoisa.Kristinparecia sera líderentreasduas,porque foielaqueacenoucomacabeçaem um gesto decisivo. Fiquei com a sensação inconfundível de que eu estava sendoavaliada.—Certo—elafinalmentedisseemelançouumgrandesorriso.—Maistardenós

vamosdarmaisinformaçõesavocê.Marcamos um horário para nos encontrar e estudar mais tarde, e então nos

separamos.Aminha impressão era de que o tempo seriamais gasto para socializar emenosparaestudar,oqueparamimnãotinhaproblema,masfizumaanotaçãomentaldefazerosdeveresdecasaantesdoencontro.Orestododiapassourápido,eeurecebium recado de Molly, a conselheira, durante uma das aulas. Como eu esperava, fuiaprovada em todas as provas de línguas e ela queria que eu fosse falar com ela paraconversar sobreoassuntoduranteoúltimoperíodo,quandoeu tecnicamentenão tinhaaula. Isso significava que o meu dia letivo iria terminar oficialmente com educaçãofísica.Vestimeuuniformedeginástica, shorte camisetadeAmberwood,e saíparao sol

escaldantejuntocomosoutros.Tinhasentidoumpoucodocaloraoirdeumaaulaparaoutra,masfoisóquandopreciseificaraoarlivreporumtempoquerealmentemedei

contadequeestávamosnomeiododeserto.Deiumaolhadanosmeuscolegas,garotosegarotasde todososanos,eviquenãoeraaúnicaquesuava.Erararoeumequeimar,masfizumaanotaçãomentalparamelembrardecomprarprotetorsolarparagarantir.Jilltambémiriaprecisar.Jill!Deiumaolhadaaoredor.QuasetinhaesquecidoqueJilldeviaestarnamesmaaula.

Masondeelaestava?Nãohaviasinaldela.Quandoanossainstrutora,srta.Carson,fezachamada,nemdisseonomedeJill.Fiqueiimaginandosetinhahavidoalgumamudançadeúltimahora.Asrta.Carsoneradotipoqueachavamelhorentrarlogoemação.Fomosdivididos

emtimesdevôlei,eeumeviparadaaoladodeMicah.Apeleclaraecobertadesardasdele estava ficando cor-de-rosa, e eu fiquei com vontade de sugerir que ele tambémusasseprotetorsolar.Elemelançouumdeseussorrisossimpáticos.—Oi—eudisse.—Poracasovocêviuaminhairmãmenorhoje?Jill?—Não—elerespondeu.Suatestasefranziudeleve.—Eddieestavaatrásdelano

almoço.Eleachouqueelaestavacomendocomvocênoseualojamento.Sacudiacabeçaeumasensaçãodesagradávelfoicrescendonomeuestômago.Oque

estava acontecendo? Cenas de pesadelo passaram pela minha mente. Pensei que Eddieestava exagerando com tanta vigilância,mas e se tivesse acontecido alguma coisa comJill? Será que era possível que, apesar de todo o nosso planejamento, um dos nossosinimigos havia se esgueirado para dentro da escola e levado Jill bem debaixo do nossonariz?Seráqueeuiaterquedizeraosalquimistas—eaomeupai—quenóstínhamosperdidoJillnoprimeirodia?Opânicocresceudentrodemim.Senão iammemandarparaumcentrodereeducaçãoantes,eracertezaqueagoraeuestariaacaminhodeumdeles.—Estátudobemcomvocê?—Micahperguntou,olhandoparamimcomatenção.

—EstátudobemcomJill?—Nãosei—respondi.—Comlicença.Saí da minha formação de time e corri até onde a srta. Carson estava

supervisionandoosalunos.—Poisnão?—elaperguntouparamim.— Sinto incomodar, senhora, mas estou preocupada com a minha irmã. Jill

Melrose.MeunomeéSydney.Eladeviaestaraqui.Sabeseelatrocoudeclasse?—Ah, sim. Melrose. Recebi um recado da secretaria, logo antes da aula, para

informarqueelanãoestariapresente.—Disseramporquê?A srta.Carson sacudiua cabeçaemumpedidodedesculpaevociferouumaordem

paraumsujeitoqueestavafazendocorpomole.Volteiamejuntaraomeutimecomacabeça a mil. Bom, pelo menos alguém tinha visto Jill, mas por que diabos ela não

compareceuàaula?—Estátudobemcomela?—Micahperguntouparamim.—Acho...achoquesim.Asrta.Carsonsabiaqueelanãoviriaàaulahoje,masnão

soubedizerporquê.—Possofazeralgumacoisa?—eleperguntou.—ParaajudarJill?Hum,vocês?— Não, obrigada. É legal da sua parte oferecer.— Eu queria que houvesse um

relógioporali.—Vouverseelaestábemassimqueaaulaterminar—entãoalgomeocorreu.—Maspossopedirumacoisa,Micah?NãodiganadaaEddie.Micahmelançouumolharcurioso.—Porquenão?—Eleéprotetordemais.Vaificarpreocupado,eprovavelmentenãoénada.Alémdomais,elevaicolocaraescolaabaixoàprocuradela.Quandoaaulaterminou,tomeiumachuveiradarápidaetroqueideroupaantesdeir

atéoprédiodaadministração.Estavadesesperadaparacorreratéodormitórioantesever se Jill estava lá, mas não podia me atrasar para a reunião.Ao caminhar pelocorredornadireçãoda saladeMolly,passei pela secretaria—e tiveuma ideia.Pareiparafalarcomarecepcionistaantesdeirparaaminhareunião.—JillMelrose—arecepcionistadisse,assentindo.—Elafoimandadadevoltapara

oalojamento.—Mandadadevolta?—exclamei.—Oqueissosignifica?—Nãotenhopermissãoparadizer.Masquemelodrama,hein?Aborrecidaemaisconfusadoquenunca,fuiparaasaladeMolly,reconfortadacoma

ideiadeque,mesmoquea ausênciade Jill fossemisteriosa,pelomenosera sancionadapelaescola.Mollymedissequeeupodiafazermaisumaaulaoptativaoualgumtipodeestudoindependentenolugardeumalíngua,seumprofessormesupervisionasse.Umaideiameveioàcabeça.— Posso falar com você amanhã? — perguntei. — Preciso conversar com uma

pessoaprimeiro.—Claro—Mollyrespondeu.—Sódecidalogo.Podevoltarparaoseudormitório

agora,masnãopodeficarcirculandoporaítodososdiasnestehorário.Garanti aelaque lhedariaumaresposta logoevolteiparaoalojamento.Oônibus

não circulava commuita frequência durante as aulas, por isso fui caminhando até lá.Demorou apenas quinze minutos, mas parecia o dobro do tempo por causa do calor.Quando finalmente cheguei ao nosso dormitório, o alívio me invadiu. Jill estava lá,despreocupada,comosenadaestranhotivesseacontecido.—Estátudobemcomvocê!Jill estava deitada na cama, novamente lendo seu livro. Ela ergueu os olhos,

desanimada.

—Está,sim.Maisoumenos.Senteinaminhacamaechuteiossapatosparalonge.—O que aconteceu?Tive um ataque de pânico quando vi que você não estava na

aula.SeEddiesoubesse...Jillsesentoueretadesupetão.—Não,nãoconteparaEddie.Elevaiterumchilique.—Certo,certo.Masmeconteoqueaconteceu.Disseramnasecretariaquevocêfoi

mandadaparacá?—Fui—Jillfezumacareta.—Porquefuisuspensadaminhaprimeiraaula.Fiqueisempalavras.NãopodiaimaginaroqueJill,tãodoceetímida,podiaterfeito

para merecer isso. Ai meu Deus. Espero que ela não tenha mordido ninguém .Todomundoachavaqueeuéqueteriadificuldadesparameencaixarnosesquemasdaescola.Jilldeviaserespecialistanisso.—Porquevocêfoisuspensa?Jillsuspirou.—Porestarderessaca.Fiqueimaissempalavrasainda.—Oquê?—Euestavapassandomal.Asra.Chang...minhaprofessora...deuumaolhadaem

mimedissequeeracapazdedetectarumaressacaaumquilômetrodedistância.Elamemandou para a secretaria por desrespeitar as regras da escola. Eu disse que só estavapassando mal, mas ela ficava repetindo que sabia. O diretor acabou dizendo que nãotinha comoprovar que era por isso que eu estava passandomal, então não fui punida,masfuiimpedidadeiràsoutrasaulas.Tivequeficaraquiodiainteiro.— Isso... isso é amaior idiotice!—saltei da camae comecei a andardeum lado

paraooutro.Agoraquetinhamerecuperadodadescrençainicial,estavasimplesmenteultrajada.—Eu estava com você durante a noite passada.Você dormiu aqui. Eu iriasaber.Acordei uma vez, e você estava apagada.Como é que a sra. Chang pode fazerumaacusaçãodessas?Elanãotinhaprovas!Aescolatambémnão.Nãotinhamodireitodetirarvocêdasaulas.Eudeviairàsecretariaagoramesmo!Não,voufalarcomKeithecomosalquimistasparaqueosnossospaisentremcomumareclamação.—Não, espere, Sydney— Jill se levantou de um pulo eme agarrou pelo braço,

comoseestivessecommedoqueeusaísseparafazeraquilonaqueleminutomesmo.—Por favor.Não faça isso.Deixe para lá.Não quero causarmais confusão.Não recebinenhumanotaruim.Nãorecebinenhumcastigo.—Vocêvaificarparatrásnassuasaulas—eudisse.—Issojáécastigosuficiente.Jillsacudiuacabeça,comolhosarregalados.Percebiqueelaestavacommedo,mas

nãofaziaideiadeporquenãoqueriaqueeudissessenada.Elaqueeraavítima.— Não, tudo bem. Eu recupero. Não vai haver nenhuma consequência a longo

prazo.Porfavor,nãofaçacasodisso.Osoutrosprofessoressódevemterachadoqueeuestavapassandomal.Nemdevemestarsabendodaacusação.—Masnãoestácerto—resmunguei.—Eupossofazeralgoarespeito.Éporisso

queestouaqui,paraajudarvocê.—Não—Jilldisse,inabalável.—Porfavor.Deixeparalá.Sevocêquisermesmo

meajudar...—eladesviouoolhar.—Oquê?—perguntei,aindacheiadefúriaporcausadainjustiça.—Doquevocê

precisa?Podedizer.Jillvoltouaerguerosolhos.—Preciso...precisoquevocêmeleveatéAdrian.

7

—Adrian?—euperguntei,surpresa.—Oqueeletemavercomtudoisso?Jillsimplesmentesacudiuacabeçaeolhouparamimcomardesúplica.—Porfavor.Sómeleveatéele.—Masnósvamosvoltarládaquiadoisdiasparaoseufornecimento.—Eusei—Jill respondeu.—Maspreciso falarcomele agora.Eleéoúnicoque

vaientender.Acheidifícildeacreditarnaquilo.—Estádizendoqueeunãoiriaentender?OuqueEddietambémnão?Elagemeu.—Não.VocênãopodecontarparaEddie.Elevaificarloucodavida.Tenteinãofranziratestaenquantodigeriatudoaquilo.PorqueJilliriaprecisarfalar

comAdriandepoisdaquelepercalçonaescola?Adriannãopoderiafazernadaparaajudarqueeu não pudesse. Como alquimista, eu estava namelhor posição para prestar umaqueixa.SeráqueJillsóqueriaapoiomoral?EumelembreidecomoJilltinhaabraçadoAdrianaosedespedir,ederepentefiqueiimaginandoseelaestariaafimdele.Afinal,seJillprecisavasesentirprotegidaporalguém,Eddiecertamenteseriaumafontemelhoraquerecorrer.Seriamesmo?EddieprovavelmentecomeçariaajogarcarteirasparatodososladospeloultrajesofridoporJill.Nãodizerissoparaeletalveznãofossemáideia.—Certo—eufinalmentedisse.—Vamos.Eu peguei permissão para que saíssemos do campus, coisa que exigiu certa

negociação.A sra.Weathers foi rápida ao afirmar que Jill tinha sidomandada para odormitório pelo resto do dia. Eu prontamente observei que as aulas já tinham quaseacabado,eissosignificavaqueodiaestavaquaseterminando.Asra.Weathersnãopôdenegaralógica,masnosfezesperarosdezminutosatéosinaltocar.Jillficoulásentada,batendoopénacadeira,nervosa.Fizemos o trajeto de meia hora de carro até a propriedade de Clarence nas

montanhas sem conversar muito. Na verdade, eu não sabia que tipo de papo puxar.“Comofoioseuprimeirodiadeaula?”nãoeraexatamenteumtemaapropriado.E,detodomodo,cadavezqueeupensavanoassunto só ficavamais irritada.Nãodavaparaacreditar que qualquer professora teria a audácia de acusar Jill de beber e estar deressaca. Realmente, não havia como comprovar aquilo e, além do mais, dava paraperceberqueeraalgoimpossíveldepoisdepassarcincominutoscomela.Umahumanademeia-idadenosrecebeuàporta.OnomedelaeraDorothy,eelaera

a empregada e fornecedora de Clarence. Dorothy era bem agradável, apesar de umpouco distraída, e usava um vestido cinza de tecido encorpado, com gola alta paraesconderasmarcasdemordidanopescoço.Euretribuíosorrisodelaemantiveminhaposeprofissional,masnãopudedeixardeestremeceraopensaroqueelaera.Comoéque alguémpodia fazer uma coisa dessas?Comoé que alguémera capaz de oferecer opróprio sangue de bom grado desse jeito? Meu estômago se revirou e eu percebi quemantinhacertadistânciadela.Nãoquerianemroçarmeubraçonelasemquererquandopassasse.Dorothynosacompanhouatéasalaondetodostínhamosestadonodiaanterior.Não

haviasinaldeClarence,masAdrianestavadeitadoemumsofáverdedetecidofelpudo,assistindotv em um aparelho que tinha ficado habilmente escondido dentro de umarmário demadeira da última vez.Quando ele nos viu, desligou a tv com o controleremotoesesentouereto.Dorothypediulicençaefechouasportasenvidraçadasatrásdesi.—Ora,masquebelasurpresa—eledisse,enosmediudecimaabaixo.Jilltinha

vestidosuasroupasnormaisduranteotempoqueficouisoladanoquarto,maseuaindaestava usando a blusa e a saia deAmberwood.— Sage, vocês não tinham que usaruniforme?Essaroupapareceoquevocêsempreusa.—Queengraçado—eudisse,emesegureiparanãorevirarosolhos.Adrianfezumareverênciairônicaparamim.—Cuidado.Vocêquase sorriu.—Ele estendeu amãopara pegar uma garrafa de

conhaque em uma mesa próxima. Havia copinhos arranjados ao redor dela, e ele seserviudeumaquantidadegenerosa.—Queremumpouco?—Estamosnomeioda tarde—eudisse, incrédula.Nãoqueahoradodia fizesse

algumadiferença.—Estoucomumadordecabeçaterrível—eledeclarou,efezumgestodebrindar.

—Issoaquiéperfeitoparaacabarcomela.—Adrian,precisoconversarcomvocê—Jilldissetodaséria.Eleolhouparaelaeosorrisinhodedesdémdesapareceudeseurosto.—Oquefoi,ChavedeCadeia?Jillolhouparamim,poucoàvontade.—Seráquevocêseimportade...

Entendiadicaetenteinãodemonstrarcomoestavairritadacomtantossegredos.— Claro, eu vou... só vou voltar lá para fora. — Não gostava da ideia de ser

exilada,masnãotinhacomoficarandandopeloscorredoresdaquelacasavelha.Eutinhaqueencararocalor.Eunão tinhaavançadomuitopelocorredorquandoalguémsurgiunaminha frente.

Soltei umgritinho e quase dei um salto olímpico.Umpiscar de olhos depois, percebiqueeraLee—nãoque isso fossemuito tranquilizador.Pormaisqueeumeesforçassepara parecer simpática com aquele grupo, antigas defesas dentro demim se agitaramporestarsozinhacomumvampironovo.Deparar-mecomelederepentetambémnãoajudouemnada,porqueomeucérebroprocessouaquilocomo umataque!Leesó ficouláparado,olhandoparamim.Pela expressãono rostodele, estava tão surpresodemevernacasadelequantoeu—mastalveznãotenhaseassustadotanto.—Sydney?—Leeperguntou.—Oqueestáfazendoaqui?Empoucosmomentos,meumedosetransformouemvergonha,comosetivessesido

pegabisbilhotando.—Ah... vim aqui com Jill. Ela teve um dia meio difícil e precisava falar com

Adrian.Quisdeixarosdoisàvontadeeestavasóindo...hum,láparafora.AconfusãodeLeesetransformouemumsorriso.—Não precisa fazer isso.Não há necessidade de se isolar.Venha, eu ia fazer um

lanche na cozinha.—Meu rosto deve termostrado um pavor abjeto, porque ele deurisada.—Nãodotipohumano.Coreiefuiatrásdele.—Desculpe—eudisse.—Éinstinto.—Semproblema.Vocêsalquimistasseassustamfácil,sabe?—É—deiumarisadapoucoàvontade.—Eusei.—Semprequisconhecerumalquimista,masvocêscomtodaacertezanãosãooque

euesperava.—Eleabriuaportaparaumacozinhaespaçosa.Orestodacasapodiaserantiga e escura,mas ali dentro tudo era brilhante emoderno.— Se isso a ajuda a sesentir melhor, você não é tão ruim quanto Keith. Ele passou aqui hoje e estava tãonervoso que ficava literalmente olhando por cima do ombro— Lee fez uma pausa,pensativo.—Talvez tenha sido porqueAdrian ficava dando risada feito um cientistaloucoenquantoassistiaaunsfilmesvelhosempretoebranco.Eupareidemaneiraabrupta.—Keithesteveaqui...hoje?Paraquê?—Vocêteriaqueperguntaraomeupai.FoicomelequeKeithmaisconversou.LeeabriuageladeiraepegouumalatadeCoca.—Queruma?—Eu...hum,não.Açúcardemais.Elepegououtralata.

—Zero?Hesiteiapenasporummomentoantesdeaceitar.—Claro.Obrigada.Eunãotinhaintençãodecomernembebernadanaquelacasa,masalatapareciabem

segura.Estavaseladaepareciatersaídodiretamentedeumsupermercadohumano,nãode algum caldeirão vampiresco.Abri a lata e dei um gole enquanto a minha mentegirava.—Vocênãofazideiadoqueelesconversaram?—Hã?—Leetinhaadicionadoumamaçãaoseucardápioe sentadonobalcão.—

Ah, Keith? Não. Mas, se eu fosse adivinhar, diria que foi sobre mim. Como se eleestivessetentandoentenderseeuiaficaraquiounão.Ele deu uma mordida gigantesca na maçã e eu fiquei imaginando se ter caninos

tornavaaquilomaisfácil.—Elesógostadeesclarecerascoisas—eudisseemtomneutro.Pormaisquenão

gostasse deKeith, continuava querendo ter uma equipe humana unida.Mas eu não fuitotalmenteinexata.TinhaquasecertezadequeKeithsesentiraprejudicadoaosaberquehaviaumMoroiextrano“territóriodele”,eagoraqueriatercertezadequeestavaaparde tudo. Em parte isso representava o bom trabalho dos alquimistas, claro, maspossivelmenteeramaisdevidoaoorgulhoferidodeKeith.Leeparecianão se incomodarmuito comaquilo e continuoumastigando suamaçã,

apesardeeusercapazdesentirseusolhosmeexaminando.—VocêdissequeJillteveumdiadifícil?Estátudobem?— Está, acho que sim. Quer dizer, não sei. Nem sei bem como as coisas se

complicaram.ElaqueriafalarcomAdrianporalgummotivo.Talvezelepossaajudar.—EleéumMoroi—Leedissecompragmatismo.—Talvez seja algoque sóele

possaentender...algoquevocêeEddienãopodem.Semquererofender.— Não me ofendi — eu disse. Era natural que Jill e eu tivéssemos diferenças

marcantes:euerahumana,eelaeravampira,afinaldecontas.Nãoconseguiríamosserainda mais diferentes nem se tentássemos e, de fato, eu meio que preferia que fosseassim.—Vocêfrequentaa faculdade...emLosAngeles?Umaescolahumana?—Essenão era um comportamento assim tão estranho para um Moroi. Às vezes eles seagrupavam em suas próprias comunidades; outras vezes tentavam se misturar àmultidãoemgrandescidadeshumanas.Leeassentiu.—Sim.Eparamimtambémfoidifícilnocomeço.Querdizer,mesmosemqueos

outros obviamente saibam que você é um vampiro... bom, há uma sensação deestranhezaquesempreestápresente.Euacabeimeacostumando...masseioqueelaestápassando.—CoitadadaJill—eudisse,ederepentepercebiqueestavaencarandoasituação

toda damaneira errada.Amaior parte daminha energia tinha se fixado no fato de aescolaacharqueadoençadeJilleraressaca.Emvezdisso,eudeviatermeconcentradoemsaberporqueelaestavapassandomal,emprimeiro lugar.Aansiedadeemrelaçãoàquelanovamudançadevidadeviaestarproduzindoseusefeitos.Eutinhalutadocontraomeuprópriomal-estar, tentandoentenderasamizadeseos indíciossociais,maspelomenoseulidavacomminhaprópriaraça.—Eurealmentenãopareiparapensarsobreoqueelaestavapassando.—Querqueeuconversecomela?—Leeperguntou.Elecolocouotalodamaçãde

lado.—Nãoqueeuachequetenhomuitasabedoriaparacompartilhar.—Qualquercoisapodeajudar—eudissecomsinceridade.Um silêncio caiu entre nós e eu comecei a me sentir desconfortável. Lee parecia

muitosimpático,masosmeusantigosmedosestavamarraigadosdemais.Partedemimsentia que ele não queria tanto me conhecer, mas sim me estudar. Os alquimistasobviamenteeramnovidadeparaele.— Será que você se incomoda se eu perguntar... a tatuagem. Ela lhe dá poderes

especiais,certo?Era quase uma repetição da conversa na escola, só que Lee realmente conhecia a

verdadeportrásdela.—Não são exatamente poderes. Há uma coerção nela que nos impede de falar a

respeito do que nós fazemos. E o meu sistema imunológico fica fortalecido. Mas, deresto,nãotenhonadadeespecial.—Fascinante—elemurmurou.Desvieioolhar,semjeito,etenteicolocarocabelo

emcimadorostocomoquemnãoquernada.FoinessemomentoqueAdrianenfiouacabeçapelafrestadaportadacozinha.Todo

seubomhumoranteriortinhadesaparecido.—Ah,vocêestáaqui.Podemosconversaremparticularumsegundo?Aperguntaeradirigidaamim,eLeepuloudecimadobalcão.—Captei adeixa. Jillestánoescritório?—AdrianassentiueLeedeuumaolhada

comarquestionadorparamim.—Vocêquerqueeu...?Concordei.—Seriaótimo.Obrigada.LeesaiueAdrianolhouparamimcomcuriosidade.—Oquefoiisso?—Ah, nós achamos queLee talvez possa ajudar Jill comos problemas dela—eu

expliquei.—Porqueeleseidentifica.—Problemas?—É,sabecomoé.Seacostumaraconviverentrehumanos.—Ah—Adrian disse. Ele pegou ummaço de cigarros e, para aminha surpresa

completa,acendeubemalinaminhafrente.—Isso.É,achoquevaiserbom.Masnão

erasobreissoqueeuqueriafalarcomvocê.Precisoquevocêmetiredaqui.Eumesobressaltei.ElenãoqueriafalarsobreJill?—DePalmSprings?—perguntei.—Não!Deste lugar—ele fezumgestoapontandoo lugarà suavolta.—Parece

queestoumorandoemumasilo!Clarenceestátirandoumasonecaagora,eelejantaàscinco.Éamaiorchatice.—Vocêsóestáaquihádoisdias.—Eissojáfoimaisdoqueosuficiente.Aúnicacoisaquememantémvivoéobelo

estoquedeálcoolquetenhoàmão.Mas,navelocidadeemqueeuestouindo,vaiacabartudo até o fim de semana. Jesus Cristo, estou subindo pelas paredes— os olhos delecaíramsobreacruznomeupescoço.—Ah.Desculpe.SemofensaaJesus.Euaindaestavachocadademaiscomoassuntoinesperadoparamesentirofendida.—MaseLee?Eletambémestáaqui,nãoestá?—Está—Adrianconcordou.—Àsvezes.Masele ficaocupadocom... saco,não

sei comoquê.Coisas da faculdade.Ele vai voltarparaLosAngeles amanhã, e vai sermaisumanoitedetédioparamim.Alémdomais...—eleolhouaoredorematitudeconspiratória.—Leeébemsimpático,mas...bom,elenãogostamuitodesedivertir.Nãocomoeumedivirto.—Issodeveseralgopositivo—observei.—Nãomevenhacomsermõesmorais,Sage.E,vejabem,comoeudisse,atéque

gostodele,maselenãopassa tempo suficientepor aqui.Quandoestápresente, ficanadele.Está sempreseolhandonoespelho,atémaisdoqueeu.Ouviquandoestava todopreocupadocomcabelosbrancosoutrodia.EunãoligavaparaasexcentricidadesdeLee.—Masparaondevocêquerir?Nãovaiquerer...—umaideiamuitodesagradável

meocorreu.—VocênãovaiquerersematricularemAmberwood,vai?—Oquevocêacha?VoubrincardeAnjosdaleicomvocês?Não,obrigado.—Anjosdoquê?— Esquece. Olhe — ele apagou o cigarro, no balcão, gesto que eu achei meio

ridículo, porque ele mal tinha fumado. Por que se incomodar com um hábito tãoimundosevocênemfosseaproveitar?—Preciso terumacasa sóminha,certo?Vocêsfazem as coisas acontecerem. Será que você não consegue me arrumar um flat legalcomoo doKeith no centro para eu podermedivertir com todos os ricos que passamférias aqui?Beber sozinhoé triste epatético.Euprecisodepessoas.Mesmoque sejampessoashumanas.—Não—respondi.—Nãotenhoautorizaçãoparafazerisso.Vocênãoé...bom,

vocênãoéresponsabilidademinha,naverdade.NóssóestamostomandocontadeJill...edeEddie,jáqueeleéoguarda-costasdela.

Adriandesdenhou.—Eumcarro?Vocêconsegueisso?Sacudiacabeça.—Eoseucarro?Eseeudeixarvocêsnaescolaepegaremprestadoporumtempo?—Não— eu disse logo. Essa foi provavelmente a sugestão mais maluca que ele

podia ter feito. O Pingado era o meu bebê. Claro que eu não ia emprestar para umsujeitoquebebiatanto,principalmenteparaalguémqueporacasotambémeravampiro.Se já existiu um vampiro que parecesse especialmente irresponsável, era AdrianIvashkov.—Vocêestáacabandocomigo,Sage!—Nãoestoufazendonada.—Exatamente.— Olhe— eu falei, cada vez mais irritada. — Eu já disse.Você não é minha

responsabilidade.FalecomAbesequisermudarascoisas.Nãoéporcausadelequevocêestáaqui?OaborrecimentodeAdrianeapenadesimesmosetransformaramemcautela.—Oquevocêsabesobreisso?Certo.Elenãosabiaqueeutinhaouvidoaconversadeles.—Querodizer,foielequetrouxevocêsparacáefezoacordocomClarence,nãoé?

—fiquei torcendoparaque fosseconvincenteobastante,equemerendesseumpoucodeinformaçãoarespeitodograndeplanodeAbe.—É—Adriandissedepoisdeváriossegundosdeexameintenso.—MasAbequer

queeufiquenestatumba.Seeutivesseumacasasóminha,nãopoderíamoscontarparaele.Desdenhei.—Entãoeucomtodaacertezanãovouajudar,mesmoquepudesse.Nemportodo

dinheirodomundoeuiriacontrariarAbe.Percebi queAdrian estava se preparandopara outra discussão e resolvime retirar.

Dei as costaspara ele e suasnovas reclamações, saí da cozinha e voltei para a sala.Láencontrei Jill eLeeconversando,e seu rostoestampavaoprimeiro sorriso sinceroqueeu tinha visto em um bom tempo. Ela deu risada de algum comentário que ele fez eentãoergueuosolhosquandoeuentrei.—Oi,Sydney—eladisse.—Oi—respondi.—Estáprontaparairembora?— Já está na hora?— ela perguntou. Ela e Lee pareciam decepcionados, mas ela

respondeu sua própria questão.—Acho que está.Você provavelmente tem lição decasa,eEddiejádeveestarpreocupado.Adrianentrounasalaatrásdemim,fazendobico.Jilldeuumaolhadanelee,porum

momento, seu olhar se voltou para dentro, como se sua mente tivesse ido parar em

outrolugar.Entãoelaseviroumaisumavezparamim.—É—eladisse.—Nósprecisamosirandando.Esperoqueagentepossaconversar

depois,Lee.—Eutambém—eledisseeselevantou.—Estareiaquidevezemquando.JilldeuumabraçodedespedidaemAdrian,claramenterelutandopordeixá-lopara

trástambém.ComLee,pareciamaisqueelaestavatristeporabandonaralgoquetinhaacabadodecomeçaraficarinteressante.ComAdrian,eramaiscomoseelanãosoubessecomo conseguiria suportar ficar longe dele. O próximo fornecimento dela estavamarcado para dali a dois dias, e Adrian a incentivou, dizendo que ela tinha forçasuficiente para sobreviver ao próximo dia de aula.Apesar de ter ficadome irritando,fiquei comovida com a sua compaixão pela jovem garota. Qualquer pessoa que fosselegalcomJillnãopodiaserassimtãoruim.Eleestavacomeçandoamesurpreender.—Vocêparecemelhor—disseaelaenquantoseguíamosparaVistaAzul.—ConversarcomAdrian...comosdois...ajudou.—Vocêachaquevaiestarbemamanhã?—Vou,sim—Jillsuspiroueserecostounoassento.—Foisónervosismo.Enão

tertomadomuitocafédamanhã.—Jill...—mordiolábio,hesitanteemseguiremfrente.Confrontonãoeraomeu

forte, principalmente em relação a assuntos pessoais constrangedores. — Você eAdrian...Jillmelançouumolhardecautela.—Oquetemnósdois?—Temalgumacoisa...querdizer,vocêsdois...?—Não!—decantodeolho,viquandoJill ficouemumtomderosa forte.Erao

máximodecorqueeujátinhavistonorostodeumvampiro.—Porqueestádizendoumacoisadessas?—Bom.Você estava passandomal hoje demanhã. E depois fezmuita questão de

falarcomAdrian.Vocêtambémsempreficatristequandosedespededele...Jillficouboquiaberta.—Vocêachaqueeuestougrávida?—Nãoexatamente—eudisseaoperceberqueaquelaeraumarespostameio sem

sentido.—Querdizer,talvez.Nãosei.Sóestoupensandoemtodasaspossibilidades...— Bom, não leve essa em conta! Não existe nada entre nós. Nada. Nós somos

amigos.Elenunca se interessariapormim—eladisse isso comcertezadesoladora, etalvezatéumpoucomelancólica.— Isso não é verdade— eu disse, esforçando-me para desfazer o dano.—Quer

dizer,vocêémaisnova,éverdade,masétãofofa...Nossa,masqueconversahorrível.Eusóestavafalandobobagem.—Não faça isso— Jill falou.—Nãome diga que eu sou legal e bonita e tenho

muitoaoferecer.Ouseiláoquê.Nadadissoimporta.Nãoseelecontinuaafimdela.—Ela?Ah.Rose.Eu tinhaquaseesquecido.Aprimeira vezqueviAdrianpessoalmente foinaminha

visita à corte, mas na verdade já o tinha visto antes uma vez, nas imagens de umacâmeradesegurançaemumcassino,comRose.Osdoistinhamnamorado,maseunãosabiabemsearelaçãotinhasidosériaounão.QuandoeuajudeiRoseeDimitriafugir,aquímicaentreosdoiseraincrível,apesardeambosnegaremofato.Atéeuteriasidocapaz de perceber a um quilômetro de distância, e eu não sabia quase nada sobrerelacionamentos.TendoemvistaqueRoseeDimitriformavamumcasaloficialagora,eusupunhaqueascoisascomAdriannãotinhamacabadobem.—É.Rose—Jillsuspiroueficoufitandoonadaàsuafrente.—Aúnicacoisaque

elevêquandofechaosolhoséela.Olhosescurosbrilhanteseumcorpocheiodefogoeenergia.Pormaisqueeletenteesquecer,pormaisqueelebeba...elasempreestálá.Elenãoconseguefugirdela.Pingava um amargor surpreendente da voz de Jill. Eu poderia ter atribuído esse

amargor ao ciúme, mas ela falava como se também tivesse sido pessoalmenteprejudicadaporRose.—Jill?Estátudobemcomvocê?—Hã?Ah—Jillsacudiuacabeça,comosetentasseselivrardasteiasdearanhade

umsonho.—Estátudobem,desculpe.Foiumdiaestranho.Estoumeioforademim.Vocênãotinhaditoquenóspoderíamoscompraralgumascoisas?Umaplacaparaapróximasaídaanunciavaumshopping.Entreinaondadamudançadeassunto,contentepormeafastardequestõespessoais,

mascontinuavabemconfusa.—Hum, é. Precisamos de protetor solar. E quem sabe podemos comprar uma tv

pequenaparaoquarto.—Seriaótimo—Jilldisse.Deixei as coisas assim e segui pela próxima saída. Nenhuma de nós voltou a

mencionarAdrianpelorestodanoite.

8

—Vocêvaicomerisso?—Eddieperguntou.ApesardenãosaberdetodaaconfusãoquetinhaacontecidocomJillnoprimeirodia

deaula,nãovê-laduranteodia inteiroohaviadeixadonervoso.Por isso,quandoeueela descemos para o segundo dia de aula, ele estava esperando no saguão do nossoalojamento,prontoparatomarcafédamanhãcomagente.Empurrei o meu prato com meiobagel para o outro lado da mesa. Ele já tinha

acabado com obagel dele, além de panquecas e bacon,mas aceitouminha oferta comrapidez.Ele atéquepodia serumacriaturahíbrida antinatural,mas,peloqueeupudenotar,seuapetiteeraigualaodequalqueradolescentehumano.—Comovocêestásesentindo?—eleperguntouaJilldepoisdeengolirumabocada

debagel.Comoelehaviaouvidofalarqueelanãotinha idoàsaulas,nóssimplesmenteinformamosaEddiequeJilltinhapassadomaldetantaansiedadeontem.Asacusaçõesderessacacontinuavammeirritando,masJillinsistiuparadeixarmosparalá.—Estoubem—elarespondeu.—Muitomelhor.Não fiznenhumcomentário sobre issomas,no fundo, tinha láminhasdúvidas. Jill

realmente pareciamelhor naquelamanhã,mas ela não tinha conseguidodormirmuitobemànoite.Aliás,tinhaacordadonomeiodamadrugada,gritando.Eupuleidacama,esperandoencontrarnadamenosdoquecemassassinosStrigoiou

Moroi irrompendo pela janela. Mas, quando olhei, só havia Jill ali, se debatendo egritando durante o sono. Corri até ela e finalmente consegui acordá-la com certadificuldade. Ela se sentou ereta, sem fôlego, agarrando o próprio peito. Quando seacalmou, disse que tinha sido apenas um pesadelo,mas havia algo em seus olhos... oresquício de algoreal. Isso me lembrou das várias vezes em que eu havia acordadoachando que os alquimistas tinham chegado para me levar para um centro dereeducação.

Ela insistiu que estava bem e, quando amanhã chegou, a únicamenção que fez aopesadelofoiparareforçarquenãocontássemosaEddie.—Sóvaiservirparadeixá-lopreocupado—eladisse.—E,alémdisso,nãoénada

demais.Euatéconcordei,masquandotenteiperguntaroquetinhaacontecido,elamudoude

assuntoeserecusouadiscutiraquestão.Depois,nocafédamanhã,elasemdúvidademonstravaumcertonervosismo,mas,

até onde eu sabia, isso estava mais relacionado a finalmente ter que enfrentar seuprimeirodiaemumaescoladoshumanos.—Aindanãoconseguisuperarofatodequesoutãodiferentedetodomundo—ela

disseemtombaixo.—Querdizer,paracomeçodeconversa,eusoumaisaltadoquequase todas as outras meninas aqui! — Era verdade. Não era incomum as Moroichegaremaummetroeoitentadealtura.AalturadeJillnãochegavaatanto,massuasilhuetaalongadaedelgadafaziacomqueparecessemaisaltadoqueeradeverdade.—Eeusoumuitoossuda.—Nãoé,não—eudisse.—Soumagrademais...comparadaaelas—Jillargumentou.—Todomundo tem alguma coisa— Eddie retrucou.—Aquelamenina ali tem

umatoneladadesardas.Aquelecararaspouacabeça.Nãoexisteessacoisade“normal”.Jill aindapareciaemdúvida,mas foipara a aulaobedientequandooprimeiro sinal

tocoueprometeuseencontrarcomEddieparaalmoçarecomigonaeducaçãofísica.Chegueiàauladehistóriaalgunsminutosadiantada.Asra.Terwilligerestavaempé

aoladodamesa,mexendoemalgunspapéis,emeaproximeicomhesitação.—Professora?Elaergueuosolhosparamimeempurrouosóculosparacimadonariz.—Humm?Ah,eumelembrodevocê.Srta.Melbourne.—Melrose—corrigi.—Tem certeza? Eu podia jurar que o seu nome era omesmo de algum lugar na

Austrália.—Bom,omeuprimeironomeéSydney—eudisse,semsabermuitobemsedevia

incentivá-la.—Ah.Entãonãoestoulouca.Nãoporenquanto,pelomenos.Emquepossoajudar,

srta.Melrose?—Euqueriaperguntar...bom,vejabem,eutenhoumalacunanohoráriodeaulas

porque jáatendia todososrequisitosde línguas.Queriasaberseasenhoranãoprecisadeoutromonitor...igualaoTrey—osupracitadoTreyjáestavapresente,sentadoemumacarteiraalocadaparaeleeorganizandopapéis.Eleergueuosolhosquandoouviuseunome e me olhou com desconfiança. — É o último período, professora. Então, sehouveralgumtrabalhoextradequeprecisa...

Os olhos dela me avaliaram durante vários momentos antes que respondesse. Eutinhame assegurado de cobrir aminha tatuagem,mas parecia que ela estava olhandodiretamenteparaela.—Nãoprecisodeoutromonitor—eladissedemododireto.Treydeuumsorriso

sacana.—Osr. Juarez, apesarde suasmuitas limitações, émaisdoquecapazdedarconta de todas asminhas pilhas de papel—o sorrisinho dele desapareceu com aqueleelogiomalsucedido.Assentiecomeceiameafastar,decepcionada.—Tudobem.Eucompreendo.—Não, não.Acho que não. Sabe, eu estou escrevendo um livro— ela fez uma

pausa,epercebiqueestavaesperandoqueeuparecesseimpressionada.—Sobrereligiãoheregeemagianomundogreco-romano.JádeiaulassobreissonaFaculdadeCarlton.Éumassuntofascinante.Treysegurouumatosse.— Então, eu realmente estava precisando de um assistente de pesquisa para me

ajudar a encontrar certas informações, executar pequenas tarefas, esse tipo de coisa.Estariainteressada?Fiqueiboquiaberta.—Claro,professora.Muito.— Para que você conseguisse crédito como estudo independente, teria que fazer

algumprojetoparalelo...pesquisaetrabalhopróprios.Nãoprecisanemchegarpertodotamanhodomeulivro,éclaro.Háalgodessaépocaqueainteressa?—Hum, sim— eumal conseguia acreditar.—Arte e arquitetura clássicas. Eu

adorariapoderestudarmaissobreisso.Agoraelapareciaimpressionada.— É mesmo? Então parece que nós formamos uma combinação perfeita. Bom,

quase.Éumapenavocênãosaberlatim.— Bom... — desviei o olhar. — Eu, hum, na verdade... eu sei ler latim —

arrisquei dar mais uma olhada nela. Em vez de impressionada, ela estava mais paraestupefata.—Nossa.Masquecoisa—elasacudiuacabeça,inconformada.—Tenhoatémedo

deperguntarsobregrego.—Osinaltocou.—Váparaoseulugar,depoisvenhafalarcomigonofimdodia.Oúltimoperíodoéomeuhoráriodeplanejamento,entãovamostertempodesobraparaconversarepreencherapapeladanecessária.VolteiparaaminhacarteiraeEddietocouseupunhofechadonomeu,emaprovação.—Belotrabalho.Agoravocênãovaiprecisarfazerumaauladeverdade.Claroque,

seelafizervocêleremlatim,vaiserpiordoqueumaauladeverdade.—Eugostodelatim—respondicomabsolutaseriedade.—Édivertido.Eddiesacudiuacabeçaedissebembaixinho:

—Nãoacreditoquevocêachaquenóssomososestranhos.OscomentáriosdeTreynaaulaseguinteforammenoselogiosos.—Uau,masvocêrealmentetemTerwilligernapalmadamão.—Eleapontoucom

acabeçanadireçãodaprofessoradequímica.—Vaidizeraelaquedesmembraátomosnashoraslivres?Temumreatornoquarto?—Nãohánadadeerradoem...—interrompiamimmesma, semtercertezado

quedizer.Quasefalei“serinteligente”,masiaparecermuitoarrogante.—Nãohánadadeerradoemsaberascoisas—eufinalmentedisse.—Claro—eleconcordou.—Quandooconhecimentoélegítimo.Eume lembreida conversamaluca comKristin e Julianodia anterior.Como tive

quelevarJillatéAdrian,tinhaperdidoasessãodeestudosenãopudedarcontinuidadeàsperguntassobreaminhatatuagem.Mesmoassim,pelomenossabiadeondevinhaodesdém de Trey — apesar de parecer absurdo. Ninguém mais na escola tinhamencionadoespecificamenteofatodeaminhatatuagemserespecial,masváriaspessoasjá tinham se aproximado para perguntar onde eu a tinha feito. FicavamdecepcionadosquandoeurespondiaquetinhasidonaDakotadoSul.— Olhe, não sei de onde veio esta ideia de que a minha tatuagem me deixa

inteligente,masseéoquevocêpensa,bom...nãopense.Ésóumatatuagem.—Elaédourada—eleargumentou.—Edaí?—perguntei.—Ésóumatintaespecial.Nãoentendoporqueaspessoas

acreditamquetenhaalgumapropriedademística.Quemacreditanessascoisas?Eledeuumagargalhadadedesdém.—Metadedestaescolaacredita.Então,comoéquevocêétãointeligente?Seráqueeueraumaaberraçãoassimtãograndenoquesitoacadêmicoqueaspessoas

tinhamquerecorreraexplicaçõessobrenaturais?Deiaminharespostadesempre.—Fuieducadaemcasa.—Ah—Treydisse,pensativo.—Issoexplicatudo.Suspirei.—Mas apostoque a suaeducaçãoemcasanão ajudoumuito comaeducação física

—elecompletou.—Oquevaifazerarespeitodaexigênciadepráticaesportiva?—Nãosei,nãotinhapensadosobreesseassunto—respondi,mesentindoumpouco

desconfortável. Eu era capaz de dar conta do conteúdo acadêmico de Amberwoodenquantodormia.Masaparteatlética?Nãosabiadizer.— Bom, émelhor decidir logo, o prazo final está chegando. Não fique com uma

cara tãopreocupada—elecompletou.—Quemsabedeixamquevocêabraumclubedelatimemvezdisso.—Oquevocêquerdizercomisso?—pergunteisemgostarnadadotomdele.—

Eujápratiqueiesportes.Eledeudeombros.

— Você é que sabe. Não parece ser do tipo atlético. Você parece muito...arrumadinha.Nãosabiadizerseissoeraumelogioounão.—Qualéoseuesporte?Treylevantouoqueixo,parecendomuitoorgulhosodesimesmo.—Futebolamericano.Umesporteparahomensdeverdade.Umsujeitoqueestavasentadoporpertoouviuoqueeledisseeolhouparatrás.—Penaquevocênãovaificarcomavagadelançador,Juarez.Chegoutãopertono

anopassado...Parecequevaiseformarsemrealizarmaisessesonho.EuachavaqueTreynãogostavade mim—masquandoelevoltouaatençãoparao

outrosujeitofoicomoseatemperaturacaíssedezgraus.PercebinaquelemomentoqueTrey só gostava de pegar nomeu pé.Mas, com esse outro cara...Trey o desprezavacompletamente.—Nãomelembrodevocêestarnopáreo,Slade—Treyretrucoucomolhosduros.

—Porquevocêachaquevaificarcomaposiçãoesteano?Slade — não ficou claro se esse era seu nome ou sobrenome — trocou olhares

significativoscomdoisamigos.—Ésóumasensação—elesseviraramparaooutrolado,eTreydesdenhou.—Maravilha— resmungou.— Slade finalmente conseguiu juntar dinheiro para

fazeruma.Quersabersobretatuagens?Váfalarcomele.Minha primeira impressão me dizia que Slade não era alguém com quem eu iria

gostar de conversar, masTrey não deu mais explicações.A aula logo começou, masenquanto eu tentava me concentrar na lição, só conseguia pensar na obsessão queAmberwoodpareciatercomtatuagens.Oqueaquilosignificava?Quando chegou a horada educação física, fiquei aliviada ao ver Jill no vestiário.A

meninaMoroimelançouumsorrisocansadoenquantosaímosparaaquadra.—Comofoioseudia?—perguntei.—Tudobem—Jill respondeu.—Não foi ótimo.Não foi péssimo.Na verdade,

nãoconhecimuitagente.—Elanãofalounada,masseutomimplicavaoseguinte:“Estávendo?Eudissequeiapareceresquisita”.Mas,quandoaaulacomeçou,noteiqueoproblemaeraqueJillpassavadespercebida

demais. Ela evitava olhar nos olhos das pessoas, deixando-se levar pelo nervosismo, enão fazia nenhum esforço para conversar. Ninguém a deixava de lado de maneiraexplícita,mas com as vibrações que ela passava, ninguém se dava ao trabalho de falarcomela.Eucomcertezanãoeraapessoamaissociáveldomundo,mas,mesmoassim,sorriaetentavaconversarcomosmeuscolegasenquantotreinávamosjogadasdevôlei.Eraosuficienteparaalimentarfaíscasdeamizade.Também reparei logo emoutro problema.A turma tinha sido dividida em quatro

times,quedisputavamdoisjogossimultâneos.Jillestavanooutrojogo,masdevezem

quandoeudavaumaolhadanela.Elapareciaarrasadaeesgotadadepoisdedezminutos,mesmo sem participar muito do jogo. Os reflexos dela também eram ruins.Váriasbolaspassaramporela, e asquepercebeu foramrecebidas commanobrasdesajeitadas.Algunsdeseuscolegasdetimetrocavamolharesdefrustraçãoportrásdascostasdela.Voltei a atenção ao meu próprio jogo, ainda preocupada com ela, bem quando o

outro time lançou uma bola para uma zona que não estava bem defendida pelo meutime.Eunãotinhaosreflexosque,digamos,umdampirotinha,mas,naquelafraçãodesegundo,omeucérebropercebeuqueeuseriacapazdebloquearabola sememovessecomrapidezsuficiente.Fazerissoeracontraosmeusinstintosnaturais,aquelesquemediziam:Nãofaçanadaquepossamachucaroutesujar.Eusempretinharaciocinadocomcuidadoantesdetomarqualqueratitude;nuncaagiporimpulso.Masnãodessavez.Eutinha que deter aquela bola.Mergulhei na direção dela e a passei para outro colega detime,queentãopôdemandá-laparaooutroladodaredeeforadeperigo.Ajogadamefez cair de joelhos com tudo, não foi nada graciosa e fez osmeus dentes se chocarem,mas eu tinha conseguido impedir que o time adversário marcasse ponto. Os meuscolegasdetimecomemorarameeufiqueisurpresaaomepegardandorisada.Eusemprehavia sido treinada só para fazer coisas que tivessem algummotivomaior e concreto.Esportes eram uma coisa meio contrária ao modo de vida dos alquimistas, porqueserviamapenasparadiversão.Talvezumpoucodediversãonãofosseassimtãoruimdevezemquando.—Ótimo,Melrose—asrta.Carsondisseaoseaproximar.—Sevocêquiseradiar

oseuesporteatéoinvernoeficarnotimedevôlei,venhafalarcomigomaistarde.—Muitobem—Micahdisseemeofereceuamão.Sacudi a cabeçaeme levantei

sozinha. Fiquei desanimada ao ver um arranhão na minha perna, mas continuavasorrindodeorelhaaorelha.Sealguémtivessemeditoduassemanasantesqueeuficariaassim tão feliz de rolar no chão, eu não teria acreditado.— Ela não costuma fazermuitoselogios.Eraverdade.Asrta.CarsonjátinhapegadonopédeJillváriasvezes,eagoraparava

o nosso jogo para corrigir a postura relaxada de um dos nossos colegas de time. Euaproveitei o intervalo para observar Jill, cujo jogo prosseguia. Micah seguiu o meuolhar.—Nãoécoisadefamília,certo?—eleperguntou,solidário.—Não—murmurei.Meusorrisodesapareceu.Sentiumapontadadedornopeito

pormeexaltartantocommeuprópriotriunfoquandoelaobviamenteestavatendotantadificuldade.Nãopareciajusto.Jillaindapareciaexausta,eseucabeloencaracoladoestavaempapadodesuor.Pontos

cor-de-rosatinhamaparecidoemsuabochecha,dandoaelaumarfebril,eelapareciaseesforçar ao máximo para continuar de pé. Era estranho Jill ter tanta dificuldade. Eutinha ouvido uma breve conversa em que ela e Eddie discutiam golpes de defesa e

combate,oquemederaaimpressãodequeJillerabematlética.ElaeEddietinhamatéfaladoemtreinarmaistardenaquelamesmanoitee...—Osol—resmunguei.—Hã?—Micahperguntou.EutinhamencionadoasminhaspreocupaçõesarespeitodosolaStanton,maselaas

tinha desprezado. Ela apenas aconselhou Jill a tomar cuidado e ficar em ambientesfechados—oqueJillfez.Excetoquandoasexigênciasdaescolaaforçavamafazerumaaulaaoar livre,claro.ObrigaremJill apraticaresportes sobosolescaldantedePalmSpringseraumacrueldade.Eraimpressionanteofatodeelaaindaestarempé.Suspireiefizumaanotaçãomentalparafalarcomosalquimistasmaistarde.—Vamosterquepedirumadispensamédicaparaela.—Doquevocêestáfalando?—Micahperguntou.Ojogohaviarecomeçadoeelese

colocounaposiçãoaomeulado.—Ah.Jill.Ela...elaésensívelaosol.Émaisoumenosumaalergia.Comoseestivesse aproveitandoadeixa,ouvimos a srta.Carsonexclamardaoutra

quadra:—MelroseJúnior!Estácega?Nãoviuabolavindobemparacimadevocê?Jillbalançouocorpo,masaceitouacrítica,cabisbaixa.Micahficouobservandoasduascomatestafranzidae,assimqueasrta.Carsonsaiu

parareclamarcomoutrapessoa,elesaiucorrendodaformaçãodonossotimeefoiatéojogodeJill.Apressada,tenteicobriraposiçãodeleeaminha.Micahfoiatéumsujeitoao lado de Jill, cochichou alguma coisa e apontou paramim.Ummomento depois, osujeitocorreuparaomeutimeeMicahficoucomaposiçãoaoladodeJill.Conforme a aula seguia, eu percebi o que estava acontecendo. Micah era bom no

vôlei—muitobom.Tantoquefoicapazdedefenderaposiçãodele etambémadeJill.Semvermaisnenhumerrocrasso,asrta.Carsonvoltouaatençãoparaoutrolugareotime de Jill ficou um poucomenos hostil em relação a ela.Quando o jogo terminou,Micahpegouobraçode Jill e a levoucomrapidez até a sombra.Pelomodocomoelacambaleava,pareciaqueeleeraaúnicacoisaqueamantinhadepé.Euestavaparamejuntaraelesquandoouvivozeselevadasaomeulado.—Vou fazerhojeànoite.Ocaracomquemeu falei juraquevai ficar incrível—

eraSlade,osujeitoquetinhadiscutidocomTreyantes.Eunãotinhapercebidonosolnomeio do jogo, mas ele era o garoto com quem Micah tinha trocado de lugar.— Émelhorquefiquemesmo—Sladeprosseguiu—pelovalorqueeleestámecobrando.DoisamigosdeSladesejuntaramaelequandotomouorumodovestiário.— Quando vão ser os testes, Slade? — um dos amigos perguntou. Na aula de

química, eu havia descoberto queo nomede Slade eraGreg,mas aparentemente todomundosereferiaaelepelosobrenome,atéosprofessores.— Sexta-feira — Slade disse. — Eu voumatar. Tipo, destruir todo mundo

completamente.VouarrancarocourodoJuarezefazerelecomer.Que amor, eu pensei enquanto observava o grupinho se afastar. Minha avaliação

inicialdeSladetinhasidocorreta.EumevireiparaJilleMicaheviqueeletinhapegadoumagarrafadeáguaparaela.Elespareciambemporora,porissochameiaatençãodasrta.Carsonquandoelapassou.—Aminhairmãpassamalnosol—eudisse.—Ficamuitodifícilparaela.—Muitosalunostêmproblemascomosolnocomeço—asrta.Carsondissecom

ardequemsabedoqueestáfalando.—Sóprecisamsefortalecer.Vocêseviroubem.—É,bom,nóssomosbemdiferentes—eudisse,seca. Ah,seelasoubesse.—Não

achoqueelaváseacostumar.—Não posso fazer nada— a srta. Carson disse.— Se eu permitir que ela não

jogue,vocêtemideiadequantosoutrosalunosderepentevãosesentir“cansados”pelosol?Amenosqueelatenhaumadispensamédica,vaiterqueaguentar.AgradeciefuimejuntaraJilleMicah.Aomeaproximar,ouviMicahdizer:—Vátomarumbanho.Euacompanhovocêatéapróximaaula.Nãoqueroquevocê

saiadesmaiandopeloscorredores—ele fezumapausaerefletiu.—Claroqueeuvouficarmuitofelizemsegurarvocêcasorealmentedesmaie.Jillestavacompreensivelmentetonta,masbemosuficienteparaagradecê-lo.Elalhe

dissequeseencontrariacomeleembreveefoiparaovestiáriofemininocomigo.Viosorriso estampado no rosto deMicah e um pensamento preocupante me ocorreu. Jillparecia bem estressada, por isso resolvi não dizer nada, mas a minha preocupaçãocresceu quando saímos para o último período. Micah acompanhou Jill, como tinhaprometido,edisseaelamaistarde,quandoanoiteceu,quepodiaensiná-laajogarvôleiseelaquisesse.Enquanto estávamosparadasna frenteda sala de aula, umameninade cabelo ruivo

comprido e atitude arrogante passou por nós, seguida por um grupinho de outrasgarotas. Ela fez uma pausa quando viu Micah e jogou o cabelo por cima do ombro,lançandoumenormesorrisoparaele.—Oi,Micah.MicahestavatãoconcentradoemJillquemalolhounadireçãodaoutragarota.—Ah,oi,Laurel.ElesaiuandandoeLaurelficouobservandocomumaexpressãosombriaenquantoele

seafastava.ElalançouumolharperigosoparaJill,jogouocabelocompridoporcimadooutroombroesaiupisandofirme.Opa,eupenseiaovê-laandandocompassospesadospelocorredor. Seráqueissovai

voltarparanosassombrar?Foiumdaquelesmomentosemqueeudesejavatertidoumaaulasobrecomportamentosocial.Fuiparaasaladasra.Terwilligeremseguida,epasseiamaiorpartedesseencontro

inicialestabelecendoosobjetivosdosemestreeesboçandooqueeufariaparaela.Teria

que ler e traduzirmuito,oqueparamimeraótimo.Tambémpareciaquemetadedomeu trabalho consistiria em organizar tudo para ela— e eu era excelente nisso. Otempovooue,assimquefui liberada,corriaoencontrodeEddie.Eleestavaesperandocomumgrupodegarotosnaparadadeônibusparavoltaraoalojamento.Quandomeviu,suareaçãofoiadesempre:—EstátudobemcomJill?—Tudocerto...bom,maisoumenos.Podemosconversaremalgumlugar?OrostodeEddiesefechou,semdúvidaimaginandoquehaviaumalegiãodeStrigoi

acaminhodaliparacaçá-la.Nósvoltamosparadentrodeumdosprédiosacadêmicoseencontramos cadeiras em um canto isolado que recebia a potência total do ar-condicionado. Fiz um relatório rápido sobre Jill e suas desventuras debaixo do sol naeducaçãofísica.—Nãoacheiquefosseserassimtãoruim—Eddiedisse,sombrio,ecoandoosmeus

pensamentos.—GraçasaDeusMicahestavalá.Vocêpodefazeralgumacoisa?—Posso,achoquepodemosconseguiralgocomosnossos“pais”oucomummédico.

— Por mais que odiasse a ideia, completei: — Keith pode nos ajudar a acelerar oprocesso.—Quebom—Eddiedisse,firme.—Nãopodemospermitirqueelasejajudiada.

Falareicomaprofessorapessoalmente,sefornecessário.Escondiumsorriso.—Bom,esperoquenãochegue a tanto.Mas temmaisumacoisa...nadaperigoso

— completei com rapidez, ao ver aquela expressão combatente passar por seu rostomais uma vez. — É só uma coisa... — tentei não dizer as palavras que estavampipocandonaminhacabeça.Terrível.Errada.—Preocupante.Acho...achoqueMicahgostadeJill.OrostodeEddieficouparalisado.—Claroqueelegostadela.Elaélegal.Eleélegal.Elegostadetodomundo.—Nãoé issoqueeuestoudizendo,evocê sabemuitobemoquequerodizer.Ele

gostadela.Dojeitoqueémaisdoqueamizade.Oquenósvamosfazerarespeitodisso?Eddie fitouooutro ladodo corredorpor algunsmomentos antes de se voltarmais

umavezparamim.—Porquenósprecisamosfazeralgumacoisa?—Comoéquevocêpodeperguntarumacoisadessas?—exclamei,chocadacoma

resposta. —Você sabe por quê. Humanos e vampiros não podem ficar juntos! Érepugnanteeerrado—aspalavrassaltaramdaminhabocaantesqueeupudessesegurá-las.—Atéumdampirocomovocêdeviasaberdisso.Eledeuumsorrisodesolado.—“Atéumdampirocomoeu”?Suponho que tenha sido um pouco insultante, mas não tinha como evitar. Os

alquimistas — eu incluída — nunca acreditavam que os dampiros e os Moroi sepreocupavam o suficiente com problemas que eram importantes para nós. Eles atépodiamreconhecerumtabucomoaquele,masanosdetreinamentodiziamquesónós,oshumanos, realmente levávamos isso a sério.Esse eraomotivopeloqual o trabalhodos alquimistas era tão importante. Se nós não cuidássemos daquelas questões, quemcuidaria?—Estoufalandosério—disseaele.—Issoéalgocomquetodosnósconcordamos.Osorrisodelesumiu.—Émesmo.AtéRoseeDimitri,quetinhamaltatolerânciaparaloucura,tinhamficadochocados

quando conheceram os conservadores,Moroi rebeldes que se relacionavam livrementecomdampirosehumanos.Eraumtabuquenóstrêscompartilhávamos,etínhamosnosesforçado muito para tolerar o costume durante o tempo que passamos com osconservadores.ElesviviamescondidosnasmontanhasApalacheehaviam fornecidoumrefúgio excelente para Rose quando ela estava foragida. Ignorar seus modos selvagenstinhasidoumpreçoaceitávelpelasegurançaqueelesnosofereciam.— Você pode falar com ele? — pedi. — Não acho que Jill tenha qualquer

sentimento forte por ele. Ela temmuitomais coisas com que se preocupar. De todomodo,devesaberqueémelhornãoseaproximar...mas,mesmoassim,seriamelhorsevocêpudessedesencorajá-lo.Podemosacabarcomissoantesqueelaseenvolva.—Oquevocêquerqueeudiga?—Eddieperguntou.Elepareciaperdido,e achei

issoengraçado,levandoemcontaqueestavaprontoparafazerqualquertipodeexigênciaàsrta.CarsonemnomedeJill.—Sei lá.Dêumade irmãomaisvelho.Ajacomosequisesseprotegê-la.Digaque

elaénovademais.EuachavaqueEddieiriaconcordar,maselemaisumavezdesviouoolhar.—Nãoseisedevemosdizeralgumacoisa.—Oquê?Estálouco?Vocêachaquetudobemse...—Não,não—elesuspirou.—Nãoestoudefendendoisso.Masolheparaasituação

da seguintemaneira. Jill está emuma escola cheia de humanos.Não é justo se ela forproibidadeconversarcomtodososcaras.—AchoqueMicahquermaisdoqueconversar.—Bom, e por que ela não pode sair com alguémde vez emquando?Ou ir a um

baile?Eladeviafazertodasascoisasnormaisqueasmeninasdaidadedelafazem.Avidadelajásofreumudançasradicais.Nãodevemostorná-laaindamaisdifícil.Olheidescrenteparaele,tentandoentenderporqueestavatãotranquiloemrelação

a isso. Claro que ele não iria encarar as mesmas consequências que eu. Se os meussuperiores descobrissem que eu estava“incentivando” um namoro entre um humano eumavampira,seriamaisumaprovacontramimeaminhasupostatendênciaaproteger

vampiros.Lánofundo,eusempresoubequehaviaapossibilidadedehaverumcentrodereeducação àminha espera.Ainda assim, eu sabia que o pessoal deEddie tambémnãogostaria da ideia. Então, qual era o problema? Uma hipótese estranha de repente meocorreu.—AchoquevocêsimplesmentenãoquerconfrontarMicah.Eddieolhoubemparamim.—Écomplicado—disse.Algoemseurostomediziaqueeutinhaacertadooalvo.

—PorquevocênãofalacomaJill?Elaconheceasregras.Vaientenderquepodeficarcomele,massósenãofornadasério.—Achoqueéumamá ideia—eudisse, ainda incapazde acreditarqueeleestava

tendoaquelaatitude.—Nósestamoscriandoumaáreacinzentaaquiquevaiacabarnostrazendoconfusão.Nóspodemosmantertudopretonobrancoeproibirqueelasaiacomalguémenquantoestiveraqui.Aquelesorrisosecovoltou.—Tudoétãopretonobrancocomvocês,alquimistas,nãoémesmo?Vocêsacham

querealmentepodemimpedirqueelafaçaqualquercoisa?Deviasaberqueascoisasnãofuncionamassim.Atéasuainfâncianãodevetersidotãoanormal.Com esse tapa na cara, Eddie saiu pisando firme e me deixou em choque. O que

tinhaacabadodeacontecer?ComoEddiepodiaacharquetudobemJillsaircomMicah?Logoele,que fazia tantaquestãode fazer sempreoqueera certopara Jill?Havia algoestranho acontecendo ali, algo ligado aMicah, apesar de eu não conseguir entender oquê. Bom, eu me recusei a deixar o assunto para lá. Era importante demais. Euconversaria com Jill para ter certeza de que ela sabia distinguir o certo do errado. Sefossenecessário,tambémiriaconversarcomMicah—apesardeaindaacharmelhorqueaconversapartissedeEddie.E,aolembrarqueeutinhaqueiratrásdeumadispensamédica,penseiemmaisuma

fontequetinhamuitainfluênciasobreJillàqualeupoderiaapelar.Adrian.Euteriaquefazermaisumavisitanofuturo.

9

Levando em conta que eu só deveria visitar a casa de Clarence duas vezes por semana para osfornecimentos, fiquei surpresa ao perceber que eu estava indo lá quase todos os dias.Além disso, essa era a primeira vez que eu ia à propriedade sozinha.Antes, eu tinhaestado lá com Keith ou com Jill, sempre com um objetivo bem definido.Agora, euestavasozinha.Nãotinhamedadocontadecomoissomeapavoravaatémeaproximardacasa,quepareceuaindamaisimponenteesombriaqueonormal.Não há nada a temer, disse a mim mesma. Você passou a semana toda com uma

vampiraeumdampiro.Jádeviaestaracostumada .Alémdomais,narealidade,acoisamaisassustadoradolugareraacasaemsi.ClarenceeLeenãoeramdeintimidartantoassim,eAdrian...bom,Adrianerabasicamenteovampiromenosassustadorqueeujátinhaconhecido.Eleagiademaiscomoumpirralhoparasuscitarqualquermedoreale,naverdade...pormaisqueeudetestassereconhecer,eumeioqueestavaansiosaparavê-lo. Não fazia sentido, mas algo em sua natureza enfurecedora fazia com que eu meesquecessedasminhasoutraspreocupações.Estranhamente,eu sentiaquepodiarelaxarpertodele.Dorothymeacompanhoupelocorredoreacheiqueseria levadaparaasaladeestar

maisumavez.Emvezdisso,aempregadameconduziuporcurvasecorredoresescurosdacasaefinalmentechegamosaumsalãodebilharquepoderiatersaídodiretamentedeum tabuleiro deDetetive.Maismadeira escura forrava o aposento e janelas de vitraiscoloridosfiltravamaluzdosolqueentrava.Amaiorpartedailuminaçãovinhadeumalumináriaquependiasobreumamesadesinucaverde,todarebuscada.Adrianestavasepreparandoparaumatacadaquandofecheiaportaatrásdemim.—Ah—eledisse,aojogarabolavermelhadentrodeumacaçapa.—Évocê.—Estavaesperandooutrapessoa?—perguntei.—Estouinterrompendosuaagenda

social?—Fizumaencenaçãoolhandoaoredordasalavazia.—Nãoquerofazervocêseafastardamultidãodefãsbatendoàsuaporta.

—Ei,agentepodeteresperança.Querdizer,nãoéimpossívelqueumcarrocheiodegarotasda faculdadecomroupas ínfimasquebrealinaruaeelasprecisemdaminhaajuda.—Éverdade—eudisse.—Talvezeupossacolocarumaplacanafrentedacasaque

diga:“Atenção,garotas:ajudagrátisaqui”.—“Atenção,garotasgostosas”—elecorrigiueaprumouocorpo.— Certo — eu disse, tentando não revirar os olhos. — Essa é uma distinção

importante.Eleapontouparamimcomotacodesinuca.—Falandoemgostosa,gosteidouniforme.Dessa vez, realmente revirei os olhos.Depois da última vez, quandoAdrian tinha

brincadoqueomeuuniformesepareciacomasminhasroupasnormais,trateidetirá-loantesdeirparalánaqueledia.Euestavausandojeansescuroeumablusaestampadadepreto e branco com gola de babados.Devia ter previsto que a troca de roupa nãomepoupariadosseuscomentáriosengraçadinhos.—Sóvocêestáaqui?—pergunteiaonotarseujogosolitário.—Quenada.Clarenceestáporaífazendo...nãoseioquê.Algumacoisadevelho.E

achoqueLeeestáconsertandoaquelafechaduraantesdevoltarparaLosAngeles.Émeioengraçado. Parece que ele está aborrecido por precisar usar ferramentas. Ele ficaachandoqueaforçadasprópriasmãosdeviasersuficiente.Nãopudedeixardesorrir.—Acreditoquevocênãotenhaseoferecidoparaajudar,certo?—Sage—Adriandeclarou.—Estasmãosnãoexecutam trabalhopesado.—Ele

jogououtrabolaemumacaçapa.—Querjogar?—Oquê?Comvocê?—Não,Sage,comClarence—elesuspirouaoveraminhacaradequemnãoestava

entendendonada.—Éclaroqueécomigo.—Não.PrecisoconversarcomvocêsobreaJill.Ele ficou em silêncio por algunsmomentos e então retomou o jogo como se nada

tivesseacontecido.— Ela não passoumal hoje— ele disse com segurança, apesar de haver um tom

amargoestranhoemsuaspalavras.—Não. Bom, não damesmamaneira. Ela passoumal no sol durante a educação

física.VoufalarcomKeithdepoisquesairdaquiparaverseconseguimosumadispensamédica.—Naverdade,eutinhatentadoligarparaeleantes,semsorte.—Masnãofoiporissoqueeuvimaqui.TemumcaraquegostadeJill...umhumano.—PeçaaCastileparadarumaduranele.Eumerecosteiesuspirei.—Essaéaquestão.Eupedi.Bom,nãoexatamenteparadarumadura.Éocolegade

quarto dele. Eu pedi a Eddie para dizer a ele que se afastasse, e para inventar algumadesculpa... tipo dizer que ela é muito nova.— Com medo de queAdrian fosse tãorelapso a esse respeito quanto Eddie, eu perguntei: —Você compreende por que éimportante,nãoé?Moroiehumanosnãopodemnamorar,certo?Eleobservavaamesa,enãoamim.—É,concordocomvocê,Sage.Mas,mesmoassim,nãoentendiqualéoproblema.—Eddie se nega a falar com ele. Diz que não acha que Jill deva ser impedida de

aproveitarachancedenamorareirabailes.QuetudobemseelaeMicahsaírem,desdequenãofiquesério.Adrianerabomemesconderseussentimentos,masaparentementeeuotinhapegado

desurpresa.Eleendireitouocorpoecomeçouagirarabasedotaconochãoenquantopensava.—Issoéestranho.Querdizer,euentendoa lógica,eele temcerta razão.Elanão

deveserforçadaaseisolarenquantoestiveraqui.SóestousurpresoporCastileterditoisso.—Poisé,maséumconceitodifícildeseguir.Qualéolimiteentreoqueé“sério”e

o que não é? Sinceramente, tenho a sensação de que Eddie simplesmente não quisconfrontarMicah...ocolegadequartodele.E issoé loucura,porqueEddienãopareceser do tipo que tem medo de nada. O que Micah tem para deixar Eddie tãodesconfortável?—EsseMicahéalgumtipodesujeitograndalhão?—Não—respondi.—Ele temumbomfísico,acho.Ébomnosesportes.Muito

simpáticoebomdeconversa...nãoédotipoqueiriasevoltarcontravocêsedissesseaelequenãoéparasaircomasuairmã.— Então você pode conversar com ele. Ou pode só conversar com a Chave de

Cadeia e explicar as coisas para ela—Adrian parecia satisfeito por ter solucionado oproblemaeencaçapadoaúltimabola.—Esseeraomeuplano.Sóqueriatercertezadequevocêmeapoiaria.Jillescutao

quevocêdiz,eacheiqueseriamaisfácilseelasoubessequevocêconcordacomigo.Nãoqueeusaibacomoelasesente.Atéondeeusei,issotudoéexagero.—Não fazmal nenhum sermos cuidadosos em relação a ela—Adrian disse. Ele

ficoufitandoonada,perdidoemseusprópriospensamentos.—Evoudizeraelaoqueeuachodisso.—Obrigada—eudisse,umpoucosurpresacomafacilidadedaquilo.Osolhosdelesdançavam,marotos.—Agora,seráquevocêjogariaumapartidacomigo?—Eu,naverdade,não...AportaseabriueLeeentrouvestidocasualmente,comjeansecamiseta.Eletrazia

namãoumachavedefenda.

—Oi, Sydney.Acheimesmo que tinha visto o seu carro lá fora— ele deu umaolhadaaoredor.—Hum,Jillveiocomvocê?—Hoje,não—respondi.Tiveuma ideiaquandome lembreidequeLeeestudava

emLosAngeles.—Lee,vocêjánamoroualgumagarotahumananasuafaculdade?Adrianarqueouasobrancelha.—EstáconvidandoLeeparasair,Sage?Eumeirritei.—Não!Leeficoupensativo.—Não,naverdade,não.Tenhoalgunsamigoshumanos,enós saímosemgrupoe

passamosumtempojuntos...masnuncafizmaisdoqueisso.SóqueLosAngeleséumacidadegrande.HágarotasMoroiporlá,sevocêsouberondeprocurar.Adrianseanimou.—Émesmo?A minha esperança de que Lee pudesse dizer a Jill que ele também tinha evitado

namorar.—EntãoasuafacilidadeemarranjarencontrosdeveserbemmaiordoqueadeJill.—Comoassim?—Leeperguntou.Contei a ele tudo sobre Micah e Eddie. Lee foi assentindo enquanto escutava,

pensativo.—Issoécomplicado—elereconheceu.— Será que podemos voltar à parte das garotas Moroi que circulam por Los

Angeles? — Adrian perguntou, todo esperançoso. — Será que você poderia meapresentaraalgumasdas...ah,digamos,dasquetêmamentemaisaberta?MasaatençãodeLeeestavaemmim.Osorrisofácildelesetransformouemarde

preocupaçãoeeleolhouparaospés.—Istopodeparecermeioestranho...mas,querdizer,eunãoachariaruimconvidar

aJillparasair.Adrian já estava dando a sua opinião antesmesmo de eu conseguir pensar emuma

resposta.—Comoassim?Tipo,emum encontro?Seufilhodamãe!Elasótemquinzeanos.

— Nem dava para imaginar que, um momento antes, ele estava falando de garotasMoroifáceis.—Adrian—eudisse.—EstouachandoqueadefiniçãodeLeeparaencontroéum

poucodiferentedasua.—Desculpe,Sage,masvocêtemqueconfiaremmimquandoaquestãoédefinirum

encontro. Pelo que eu saiba, você não é especialista em questões sociais. Quer dizer,qual foiaúltimavezemquevocêesteveemumencontro?—esseerasómaisumdoscomentários espertinhos que ele lançava para todos os lados com tanta facilidade,mas

doeuumpouco.Seráqueaminhafaltadeexperiênciasocialeraassimtãoóbvia?—Mas—completei, ignorandoaperguntadeAdrian—háumagrandediferença

deidade.EusinceramentenãofaziaamenorideiadequantosanosLeetinha.Comoeleestava

na faculdade, era uma pista, mas Clarence parecia ser incrivelmente velho. Mas terfilhosnofimdavidanãopareciaassimtãoestranho,tantoparahumanosquantoparaosMoroi.—Pronto—Leedisse.—Eutenhodezenoveanos.Nãoéumadiferençaassimtão

grande...maséosuficiente.Eunãodeviaterditonada—elepareciaconstrangidoeeufiqueicompenadeleeconfusacomigomesma.Formarcasaiseraalgoquenãoestavanomanualdosalquimistas.—PorquevocêiriaquererconvidarJillparasair?—perguntei.—Querdizer,ela

é ótima. Mas você quer fazer isso só para que ela se distraia de Micah e tenha umaalternativadeencontrosegura?Ouvocê,hum,gostadela?—Claroqueelegostadela—Adriandisse, apressando-seemdefenderahonrade

Jill.FiqueicomasensaçãodequerealmentenãohaviaumarespostaboaqueLeepudesse

daràquelaaltura.Seeleexpressasseinteressenela,osinstintoscavalheirescosbizarrosdeAdrian entrariam em ação. Se Lee não estivesse interessado,Adrian sem dúvida iriaexigirsaberporqueLeenãoqueriasecasarcomelaalimesmo,naquelemomento.Eraumadasexcentricidadesfascinantes—eesquisitíssimas—deAdrian.— Eu gosto dela— Lee disse sem rodeios.— Só conversei com ela umas duas

vezes,mas...bom,eurealmentegostariadequeagentepudesseseconhecermelhor.Adriandesdenhou,eeuolheifeioparaele.—Maisumavez—eudisse.—Achoquevocêsdoistêmdefiniçõesdiferentespara

asmesmaspalavras.—Nãoéverdade—Adrianfalou.—Todososhomensqueremdizeramesmacoisa

quando falamquequerem“conhecerumagarotamelhor”.Você éumamocinhamuitobem-educada,porissocompreendoporqueéinocentedemaisparaentender.Aindabemqueeuestouaquiparainterpretar.EumevireidenovoparaLee,semnemmeincomodaremresponderaAdrian.—Achoquetudobemsevocêsaircomela.—Issoseelaestiverinteressada—Leedissecomardeincerteza.Eu me lembrei do sorriso dela quando eles haviam conversado no dia anterior.

Aquilotinhaparecidobempromissor.Mas,bem,omesmopodiaserditoarespeitodoentusiasmodelaporMicah.—Apostoquedeveestar.—Entãovocêsimplesmentevaipermitirqueelasaiasozinha?—Adrianperguntou

emelançouumolharquediziaparanãoquestioná-lo.Dessavez,apreocupaçãodeleera

legítima.Eucompartilhavadela.JillestavaemPalmSpringsparatersegurança.Estavamatriculada emAmberwood porque era segura também. Começar de repente a saircomumcaraquenósmalconhecíamosnãoatendiaaosprotocolosdesegurançanemdosalquimistas,nemdosguardiões.—Bom,elanempodesairdoterrenodaescola—eudisse,pensandoemvozalta.

—Nãoseeunãoforjunto.—Opa—Adriandisse.—Sevocêfordevela,euvoutambém.—Senósdoisformos,Eddietambémvaiquererir—observei.— E daí? — O breve momento de seriedade e preocupação de Adrian tinha

desaparecidodiantedaquiloqueeleconsideravadiversãosocial.Comoéqueohumordealguémpodiamudarcomtanta rapidez?—Pensecomose fossemenosumencontroemaisumpasseiodafalsafamília.Quevaimedivertireaomesmotempovaiprotegeravirtudedela.Coloqueiasmãosnacinturaemevireiparaele.Issopareceudiverti-loaindamais.—Adrian,anossapreocupaçãoaquiéaJill.Nãoasuaprópriadiversão.—Nãoéverdade—eledissecomosolhosverdesbrilhando.—Tudocondizcoma

minha própria diversão. O mundo é o meu palco. Continue assim... você está setransformandoemumadasestrelasdoshow.Leeolhouparanóscomumaexpressãocômicadequemnãosabiaoquefazer.—Vocêsqueremficarasós?Eufiqueivermelha.—Desculpe.Adriannãosedesculpou,claro.—Olhe—Leedisse.Elepareciaestarcomeçandoasearrependerdetertocadono

assunto.— Eu gosto dela. Se isso significa andar com o grupo inteiro de vocês parapoderficarcomela,tudobem.—Talvezsejamelhorassim—eurefleti.—Talvez,senósfizermosmaiscoisasem

grupo... tirandoos fornecimentos dela... não vai haver o risco de ela querer namorarum humano.— E nós nem sabíamos com certeza se ela estava interessada nele. Nóstambém não sabíamos se ela estava interessada em Lee. Percebi que estávamosrealmentepegandopesadocomavidaamorosadela.—Issoémaisoumenosoqueeuqueriaantes—Adrianmedisse.—Sóumpouco

maisdevidasocial.Fiquei pensando na conversa do dia anterior, em que ele exigiu que eu achasse um

lugarparaelemorar.—Nãofoibemissoquevocêpediu.—Se vocêquiser sairmais—Leedisse—,pode ir comigo aLosAngeles hoje à

noite. Eu ia voltar para cá depois da aula amanhã de qualquer forma, então vai ser sóumaviagemrápida.

Adrian se alegrou tanto que fiquei imaginando se Lee não tinha feito essa sugestãoparatentaraplacarqualquerresquíciodetensãoporcausadeseuinteresseporJill.—Vocêmeapresentaparaaquelasgarotas?—Adrianperguntou.— Inacreditável — eu disse. Os dois pesos e as duas medidas deAdrian eram

ridículos.EusórepareiqueaportatinhasidoabertaquandoKeithjáhaviaentradonasala.Eu

nunca ficavaexatamentecontenteemvê-lo,mas foi sorteelederepenteestarali,bemquandoeuprecisavafalarcomelesobreJilleseusproblemasnaeducaçãofísica.Omeumelhorplanoerapassarnoapartamentodelee torcerparaqueeleestivesse lá.Elemepoupouotrabalho.Keith olhou para nós três—mas não compartilhou dos nossos sorrisos. Nada de

piscadelasoucharmevindodelehoje.—Vioseucarroláfora,Sydney—eledisse,ríspido,esevoltouparamim.—O

quevocêestáfazendoaqui?— Eu precisava conversar comAdrian — eu disse. —Você recebeu a minha

mensagem?Eutenteiligarantes.—Andeiocupado—eledissecomfrieza.Suaexpressãoeradura,seutomgeloua

sala.AdrianeLeetinhamperdidoosorrisoeosdoisagorapareciamconfusos,tentandoentenderporqueKeithestava tão incomodado.Eucompartilhavadacuriosidadedeles.—Vamosconversar.Emparticular.Derepente,mesenticomoumacriançalevada,semsaberporquê.—Claro—eudisse.—Eu...jáestavamesmoindoembora.AvanceiparamejuntaraKeithàporta.—Espere—Leedisse.—Eaquela...—Adriandeuumacotoveladanele,sacudiua

cabeçaemurmuroualgoqueeunãoconseguientender.Leeficouquieto.—Agentesevêporaí—Adriandisse,todoanimado.—Nãosepreocupe...vou

melembrardanossaconversa.—Obrigada—eudisse.—Agentesevêdepois.Keithsaiusemdizerumapalavraeeuoseguiparaforadacasaeparaocalordofim

da tarde.A temperatura tinha baixado desde amalfadada aula de educação física,masnão muito. Keith saiu pisando firme pela entrada de cascalho e parou ao lado doPingado.Ocarrodeleestavaestacionadoaliperto.—Vocêfoimuitogrosseiro—eudisseaele.—Nemsedespediudeles.— Desculpe se eu não exibo a minha melhor educação com vampiros — Keith

soltou.—Eunãosoutãopróximodelesquantovocê.—Oquequerdizercomisso?—exigisaberecruzeiosbraços.Examinei-odecima

a baixo e senti minha velha antipatia borbulhar. Era difícil acreditar que apenas umminutoanteseuestavadandorisada.Keithdesdenhou.

—É só que você parecia tremendamente à vontade com eles lá dentro... batendopapo,sedivertindo.Eunãosabiaqueeraaquiquevocêpassava seu tempo livredepoisdaescola.—Comovocêpodedizerumacoisadessas?Euvimaquitratardetrabalho—urrei.—É,deuparaver.—Efoimesmo.EuprecisavaconversarcomAdriansobreaJill.—Eunãomerecordodeeleseroguardiãodela.—Elesósepreocupacomela—argumentei.—Domesmojeitoqueagenteiriase

preocuparcomqualqueramigo.—Amigo?Eles não são nemumpouco parecidos conosco—Keith disse.—Eles

sãoprofanoseantinaturais,evocênãotemnadaqueficaramigadenenhumdeles.Aminha vontade era berrar que, pelo que eu tinha observado,Lee era umapessoa

cem vezesmais decente do que Keith jamais seria.AtéAdrian era. Foi só no últimosegundoqueme lembreidomeu treinamento. Não crie confusão.Não contradiga seussuperiores. Por mais que eu detestasse a ideia, Keith era o responsável ali. Respireifundo.—Não foi exatamente uma confraternização. Eu só vim aqui para conversar com

Adrian, e Lee por acaso estava em casa.Até parece que nós todos tínhamos planejadoalgumagrandefesta.Eramelhornãomencionaroplanodoencontroemgrupo.—Porquevocê simplesmentenão ligouparaAdrian se tinhaumapergunta?Você

ligouparamim.Porqueficarcaraacaracomeleémenosenjoativodoqueficarpertodevocê.— Era importante. E como eu não consegui falar com você, achei que teria que

passarnasuacasadequalquerjeito.Na esperança de desviar a atenção domeu“mau comportamento”,me apressei em

recapitular tudo que tinha acontecido naquele dia, incluindo a insolação de Jill e asatençõesdeMicah.— Claro que ela não pode namorar um humano — ele exclamou depois que

expliqueisobreMicah.—Vocêprecisaacabarcomisso.—Estoutentando.EAdrianeLeedisseramquevãoajudar.—Ah, que bom, agora eume sintomuitomelhor—Keith sacudiu a cabeça.—

Não seja ingênua, Sydney. Eu disse para você. Eles não se importam tanto com essascoisasquantonós.—Achoque se importam, sim—argumentei.—Adrianpareceuentender, e ele

temmuitainfluênciasobreJill.— Bom, não éele que os alquimistas irãomandar a um centro de reeducação por

ficarbrincandocomvampirosemvezdediscipliná-los.Eusófiqueiolhando.Nãosabiabemqualpartedoqueeletinhaacabadodedizerera

mais ofensiva: a insinuação batida de que eu era uma“adoradora de vampiros” ou queseria capazde“disciplinar”qualquerumdeles.Eudevia saberque a simpatia falsadelenãoiadurar.—Estoufazendoomeutrabalhoaqui—eudisse,aindacomavozfirme.—E,pelo

quepossover,estoutrabalhandomaisdoque você,jáquefuieuquempassouasemanatodaapagandoincêndios.Eu sabiaqueera ilusão, jáqueoolhodevidronãopodia realmenteolhar fixopara

mim,maseusentiqueelemefitavacomambososolhos.—Estoufazendomuitacoisa.Nempenseemmecriticar.— O que veio fazer aqui? — perguntei, ao me dar conta de como aquilo era

estranho.Eletinhameacusadode“socializar”,masnuncatinhaexplicadoseusmotivos.—PrecisavafalarcomClarence,nãoquesejadasuaconta.Eu queria mais detalhes, mas me recusei a demonstrar como estava curiosa. De

acordocomLee,eletambémtinhaestadoalinodiaanterior.—VocêpodeligarparaaescolaamanhãefazerJillserdispensadadaeducaçãofísica?Keithmelançouumolharlongoepesado.—Não.—Oquê?Porquenão?—Porqueficarnosolnãovaimatá-la.Maisumavez,engoliaraivaetenteiaplicaradiplomaciaquetinhammeensinado.—Keith,vocênãoviucomoelaestava.Talveznãomate,masfoiterrívelparaela.

Estavaemagonia.—Eurealmentenãomeimportoseelespassamporcoisasterríveisounão—Keith

disse.—Evocêtambémnãodeviaseimportar.Onossotrabalhoémantê-laviva.Nãohavianenhumamençãosobregarantirqueelaficassefelizeconfortável.—Acheiqueninguém precisassenosdizer isso—eufalei,estarrecida.Porqueele

estava tão incomodado? — Eu achei que, por sermos seres humanos sensíveis, nóspoderíamossimplesmenteajudar.—Bom,agoravocêpodeajudar.Oupodepedirparaalguémacimadenósmandar

umbilhete para a escola, ou pode dar banhos gelados nela depois da aula de ginástica.Pormim, realmente não importa o que você faça,mas talvez assim você vá ficar tãoocupadaapontodeparardeviraquisemavisareficarsejogandoemcimadascriaturasdaescuridão.Nãoqueromaisficarsabendoqueissoaconteceu.—Você é inacreditável— eu disse. Estava aborrecida demais e totalmente sem

palavrasparaconseguirelaboraralgomaiseloquente.—Estoucuidandodasuaalma—eledisse,cheiodesoberba.—Éomínimoqueeu

possofazerpeloseupai.Penaquevocênãoémaisparecidacomassuasirmãs.Keithdeuascostasparamimeabriuaportadocarrosemdizermaisumapalavra.

Eleentrouedeuapartida;eufiqueiláparada.Lágrimasameaçaramosmeusolhos,eeu

as engoli. Eume sentia uma idiota—mas não por causa das acusações dele. Eu nãoacrediteinemporuminstantequetinhafeitoalgodeerradoaoiratélá.Não,euestavaloucadavida—loucacomigomesma—porque tinhadeixadoqueelepartissecomaúltima palavra e porque eu não tinha tido coragem de retrucar. Eu tinha ficado emsilêncio,comotodomundosempremediziaparafazer.Chutei o cascalho de tanta raiva, espalhando-o por todo lado.Algumas pedrinhas

bateramnomeucarroeeufizumacareta.—Desculpe.—Seráqueeleiriaacusarvocêdeserdomalporfalarcomumobjetoinanimado?Eu me virei para trás, com o coração acelerado.Adrian estava apoiado na casa,

fumando.—Deondevocêsurgiu?—perguntei.Apesardesabertudoquehaviaparasabera

respeito dos vampiros, era difícil me livrar dos medos supersticiosos de que elesapareciamdonada.—Vimpelaoutraporta—eleexplicou.—Eusaíparafumareescuteiaagitação.—É falta de educação escutar a conversa dos outros—eu disse, ciente de que eu

pareciainsuportavelmentepudica,masfuiincapazdeevitar.—É faltadeeducação serum imbecil igual aele—Adrianapontoucomacabeça

paraolugarondeocarrodeKeithtinhaestado.—VocêvaiconseguirtirarJilldaquelaaula?Eususpirei,derepentesentindoumenormecansaço.—É,euachoqueconsigo.Sóvaidemorarumpoucomais,atéeuconseguiroutros

alquimistas para seremnossos pais falsos.Teria sido bemmais rápido seKeith tivesseajudado.—Obrigadoporcuidardela,Sage.Vocêatéqueélegalparaumahumana.Quasedeirisada.—Obrigada.—Vocêtambémpodedizeramesmacoisademim,sabe?CaminheiatéoPingadoefizumapausa.—Dizeroquê?—Queeuatéquesoulegal...paraumvampiro—eleexplicou.Eusacudiacabeça,semparardesorrir.—Vai ser difícil fazer com que um alquimista confesse isso.Mas posso dizer que

você até que é legal para um baladeiro irreverente com momentos ocasionais debrilhantismo.—Brilhantismo?Vocêachaqueeusoubrilhante?—elelançouasmãosparaoalto.

—Vocêouviuisso,universo?Sagedissequeeusoubrilhante.—Ei!Nãofoiissoqueeudisse!Elelargouocigarro,apagoucomopéemelançouumsorrisodesinteressado.

—Valeupelamassagemnoego.VoucontaraClarenceeaLeeaopiniãoelevadaquevocêtemdemim.—Ei,eunão...Masele já tinhadesaparecido.Aomeafastardacasa,chegueiàconclusãodequeos

alquimistas precisavam de um departamento inteiro dedicado a cuidar de AdrianIvashkov.Quandovolteiaomeudormitório,encontreiJillsentada,rodeadadelivrosdidáticos

epapéis,semdúvidatentandorecuperarasaulasperdidasdodiaanterior.—Uau—eudisse,pensandonaliçãodecasaquetambémestavaàminhaespera.—

Vocêorganizoutodoumcentrodecomando.Emvezdesorrircomaminhapiada,Jillergueuolhosgélidos.—Seráque,dapróximavezquevocêresolverestragaraminhavidaafetiva,pode

falarprimeirocomigo?—elaindagou.Eufiqueisempalavras.AdriantinhaditoqueiafalarcomJill.Sónãoacheiquefosse

sertãorápido.—Não precisa agir pelasminhas costas paramemanter afastada deMicah— ela

completou.—Eunãosouidiota.Seiquenãopossonamorarumhumano.Então,aparentementeAdriantinhacontadoissoparaela.—Alémdisso—Jillprosseguiu,semprecomaqueletomfrio—,vocênãoprecisa

me arranjar o únicoMoroi solteiro em um raio de cem quilômetros paramemanterlongedeconfusão.Certo...pareciaqueAdriantinhacontadotudoparaela.Euachavaqueeleseriamais

discreto,principalmentenapartesobreLee.—Nós...nósnãoestávamosarranjandonadaparavocê—eudissedeumjeitomeio

ridículo.—Leequeriamesmoconvidarvocêparasair.— Mas, em vez de falar comigo, ele foi pedir permissão para vocês!Vocês não

mandamnaminhavida.—Eusei—respondi.—Nãoestávamostentandofazerisso!—Comoéquetudo

tinhaestouradobemnaminhacara?—Leetomouainiciativasozinho.— Igual a você quando foi falar comAdrian pelasminhas costas— os olhos dela

brilhavamcom lágrimasde raiva,medesafiando anegar.Eunão consegui, e só agoraestavapercebendocomoeraerradooqueeutinhafeito.Desdequeeladescobriuqueerada realeza, Jill passou a ver outras pessoasmandarem em sua vida.Talvez as minhasintenções de fazerAdrian conversar com ela sobre Micah fossem boas, mas eu tinhausadoaabordagemerrada.—Vocêtemrazão—eudisse.—Sintomuitopor...—Esqueça—eladisse,ecolocouumpardefonesnosouvidos.—Nãoquerosaber

demais nada.Vocême fez pareceruma idiota na frentedeAdrian e deLee.NãoqueelesvãochegarapensarduasvezesemmimemLosAngeleshojeànoite—elafezum

gesto para eume afastar e olhou para o livro que tinha à frente.—Não queromaissaberdevocê.Seelanãopodiameouvirporcausadamúsicaousimplesmenteporquepreferiame

ignorar,eunãosabiadizer.Aúnicacoisaqueeusabiaeraquemaisumavezmepegueicomparando-aaZoe.AssimcomoaconteceucomZoe,eutinhatentadofazerumacoisaboa para Jill e o tiro saiu pela culatra.Assim como acontecera com Zoe, eu acabeimagoandoehumilhandoapessoaquetentavaproteger.Desculpe,Sage.Peloqueeusaiba,vocênãoéespecialistaemquestõessociais.Pensei com amargor que essa era a partemais triste de todas—o fato deAdrian

Ivashkovterrazão.

10

FoibemaíqueomeutelefonetocouemesalvoudoincômododenãosaberoquefazercomJill.Euatendisemnemconferiroidentificadordechamadas.—Srta.Melbourne?Precisodosseusserviçosimediatamente.—Professora?—perguntei,surpresa.Avozfrenéticadasra.Terwilligernãoerao

queeuesperava.—Qualéoproblema?—Precisoque você vábuscarumcappuccino comcaldade caramelodo Spencer’s

paramim.Nãotemcomoeuacabardetraduzirestedocumentosevocênãofor.Haviaummilhãoderespostasqueeupodiadaraisso,sendoquenenhumadelasera

muitoeducada,porissoeuuseialógicamaisóbvia.—Achoquenãoposso—eudisse.—Masvocêtempermissãoparasairdocampus,nãotem?—Bom, tenho, professora,mas está quase na hora do toque de recolher.Não sei

ondeficaoSpencer’s,masachoquenãoconsigovoltaratempo.—Bobagem.Quemé a responsável pelo seu dormitório?A tal daWeathers?Vou

ligar para ela e pedir uma exceção para você. Estou trabalhando em uma das salas dabiblioteca.Venhameencontraraqui.Apesardaminhadevoçãopessoalaocafé,pediruma“exceção”aotoquederecolher

da escola me parecia um tanto excessivo para uma coisa dessas. Eu não gostava dedesrespeitarasregras.Poroutrolado,eueraaassistentedasra.Terwilliger.Poracasoissonãofaziapartedasminhasfunções?Osvelhosinstintosdealquimistadeobedeceràsordensseinstalaram.—Bom,achoquesim,professora...Eladesligoueeufiqueiolhandoparaotelefone,chocada.—Precisosair—disseaJill.—Esperovoltarlogo.Talvezvoltebemlogomesmo,

porqueeuficariasurpresaseelaselembrassedeligarparaasra.Weathers.Elanemergueuosolhos.Deideombros,pegueimeulaptopeumpoucodeliçãode

casa,paraocasodeasra.Terwilligerselembrardemaisalgumacoisaqueeuprecisassefazer.Comcaféemjogo,amemóriadaminhaprofessorafuncionou,edescobriquedefato

tinhapermissãopara sairquandodesci.A sra.Weathersatémeexplicoucomochegarao Spencer’s, um café a alguns quilômetros de distância. Eu comprei o cappuccino,imaginandoseelaiamereembolsar,etambémcompreialgoparamim.Osatendentesda biblioteca deAmberwood pegaram nomeu pé quando eu entrei com bebidas,masquando expliqueiminha tarefa, elesme deixaram entrar e ir para as salas dos fundos.Parecequeovíciodasra.Terwilligererafamoso.A biblioteca estava surpreendentemente agitada, e logo deduzi por quê. Depois de

uma certa hora, todas as noites,meninos emeninas eram expulsos do dormitório unsdos outros.A biblioteca ficava aberta atémais tarde, por isso era o lugar certo parainteragir com o sexo oposto.Também havia muita gente que estava lá para estudar,incluindoJuliaeKristin.—Sydney!Aqui!—Kristinchamouemumsussurro.—Livre-sedaprofessoraTerwilliger—Juliacompletou.—Vocêconsegue.Ergui

ocaféquandopasseiporelas.— Estão de brincadeira? Se ela não consumir sua cafeína logo, não vou ter como

escapardela.Euvolto,sepuder.Aoseguiromeucaminho,viumgrupinhodealunosqueseaglomeravaaoredorde

alguém—eouviumavozconhecidaeirritante.AdeGregSlade.Curiosa a contragosto, caminhei até a beirada do grupo. Slade exibia algo no

antebraço:umatatuagem.Odesenho em si não era nada demais. Era uma águia voando, o tipo de arte que

qualquer estúdio de tatuagem tinha em estoque e copiava emmassa.O que chamou aminhaatençãofoiacor.Eratodafeitaemumtompratametálicochamativo.Umtommetálicodaquelesnãoerafácildeconseguir,nãocomaquelebrilhoeaquelaintensidade.Eu conhecia as substâncias químicas que faziamparte daminha tatuagemdourada, e afórmulaeracomplexaecompostadeváriosingredientesraros.Sladefaziaumatentativanadaconvincentedemanteravozbaixa—afinaldecontas,

tatuagenseramproibidaspor lá—,maseraóbvioqueeleestavaadorandotodaaquelaatenção.Euobservei em silêncio, feliz poroutras pessoas fazerem algumasdasminhasperguntasnomeulugar.Claroqueessasperguntassómedeixaramcommaisdúvidas.—Estaémaisbrilhantedoqueasqueelescostumavamfazer—umdosamigosdele

observou.Sladevirouobraçoparafazeraluzrefletir.—Éumacoisanova.Dizemqueestassãomelhoresdoqueasdoanopassado.Não

seibemseéverdade,masnãofoibarata,issoeupossodizer.Oamigoquetinhacomentadosorriu.

—Vocêvaidescobrirnostestes.Laurel— a garota ruiva que tinha demonstrado interesse porMicah— esticou a

perna ao lado de Slade e revelou um tornozelo fino enfeitado com uma borboletadesbotada.Nãohavianadametálicoali.—Talvezeuretoqueaminha,quemsabeparaobailedevoltaàsaulas,seconseguir

odinheirocomosmeuspais.Você sabe se as celestiais tambémmelhorarameste ano?— Ela jogava o cabelo de um lado para o outro enquanto falava. Pelo que eu tinhaobservadonopoucotempoquetinhapassadoemAmberwood,Laureleramuitovaidosacom o cabelo e se assegurava de jogá-lo por cima do ombro no mínimo a cada dezminutos.Sladedeudeombros.—Nãoperguntei.Laurelreparouqueeuestavaolhando.—Ah,oi.VocênãoéairmãdaGarotaVampira?Meucoraçãoparou.—Vampira?—Vampira?—Sladerepetiu.Comoéqueeladescobriu?Oqueeuiriafazer?Eutinhaacabadodecomeçarafazer

umalistamentaldetodosalquimistasparaquemprecisavaligarquandoumadasamigasdeLaurelsoltouumarisada.Laurelolhounadireçãodelase soltouumagargalhada,entãoseviroudenovopara

mim:—Éoapelidoquenósdemosparaela.Nenhumserhumanopoderia ter apele tão

pálidaassim.Euquasedesabeidetantoalívio.Eraumapiada—queseaproximavadolorosamente

daverdade,masaindaassimumapiada.Noentanto,Laurelnãopareciaseralguémqueeu devia confrontar, e seria melhor para todos nós se a piada logo fosse esquecida.Reconheçoquesolteioprimeirocomentáriodistraídoquemeveioàmente.—Olhe,temcoisapior.Quandoeuvivocêpelaprimeiravez,nãoacheiquealguém

pudesseterocabelotãocompridooutãoruivo.Masnãoépor issoqueeu fico falandosobreapliquesoutintura.Sladequasesedobrouaomeiodetantorir.—Eusabia!Sabiaqueerafalso!Laurelficouquasetãovermelhaquantoseucabelo.—Nãoé!Édeverdade!—Srta.Melbourne?Eumesobressalteicomavozatrásdemimeviasra.Terwilligerali,olhandopara

mim,surpresa.—Vocênãoganhacréditoparabaterpapo,principalmentequandoomeucaféestá

emjogo.Venha.Eumeafastei,cabisbaixa,apesardequaseninguémternotado.OsamigosdeLaurel

estavamsedivertindodemaistirandosarrodela.Euesperavateracabadocomaspiadasde vampiro. Mesmo assim, não conseguia tirar a imagem da tatuagem de Greg dacabeça.Deixeimeuspensamentosvoaremparaomistériodequaiscomponentesseriamnecessários para aquela cor prateada. Eu achava que tinha descoberto— pelomenos,tinha pensado em uma possibilidade —, e queria ter acesso aos ingredientes dosalquimistas para fazer algumas experiências. A sra. Terwilliger pegou o café,agradecida,quandochegamosaumapequenasaladetrabalho.—GraçasaDeus—eladissedepoisdetomarumgolecomprido.Elaapontoucom

acabeçaparaomeu.—Esseaíédereserva?Excelenteideia.—Não,professora—eudisse.—Émeu.Querqueeucomecea trabalharnisto?

—Umapilhade livrosconhecidosestavanamesa;eu jáos tinhavistonasaladeaula.Eram partes centrais da pesquisa dela, e ela tinhame dito que uma hora eu teria quefazerresumosedocumentá-losparaela.Pegueioqueestavanoaltodapilha,maselamedeteve.— Não — ela disse, e se dirigiu para uma pasta grande. Ela folheou papéis e

remexeumateriaisdeescritóriovariadosatépegarumlivrocomacapavelhadecouro.—Façaesteaqui.Pegueiolivro.—Possotrabalharláfora?MinhaesperançaeravoltarparaaáreaprincipaldeestudoepoderfalarcomKristin

eJulia.Asra.Terwilligerrefletiu.—Nãovãodeixarvocêtomarcaféláfora.Émelhordeixareleaqui.Vacilei,pensandoseomeudesejodeconversarcomKristineJuliasesobrepunhaao

fatodequeasra.Terwilligeririatomaromeucaféantesdeeuvoltar.Resolvicorreroriscoemedespedidomeucafé compesar ao levarosmeus livros e apetrechospara abiblioteca.Juliaolhouparaolivrosurradodasra.Terwilligercomdesdém.—Issoaquinãoestáemalgumlugarnainternet?— Provavelmente não.Acho que ninguém nem sequer olha para este aqui desde

antesdeainternettersidoinventada.—Abriacapa.Ummontedepoeiraseespalhoupeloar.—Muitoantes.Kristin tinha uma lição dematemática aberta a sua frente,mas não pareciamuito

interessada nela. Ela batucou com uma caneta na capa do livro, sem prestar muitaatenção.—Então,vocêviuatatuagemdoSlade?—Édifícilnãover—disseepegueimeu laptop.Olheiporcimadocomputador.

—Eleaindaestáláseexibindo.— Fazia um tempão que ele queria fazer uma, mas nunca teve dinheiro— Julia

explicou.—Noanopassado, todososgrandesatletas se tatuaram.Bom, todosmenosTreyJuarez.—Treyquasenãoprecisadeuma—Kristinobservou.—Eleébomdeverdade.—Agoraelevaiprecisar...sequiserseequipararaSlade—Juliadisse.Kristinsacudiuacabeça.—Mesmoassim,elenãovaifazer.Eleécontra.Tentoudedurarquemfezparaosr.

Greennoanopassado,masninguémacreditounele.Euolheideumaparaaoutra,maisperdidadoquenunca.—Aindaestamosfalandodetatuagens?SobreTrey“precisar”deumaounão?—Vocêrealmenteaindanãodescobriu?—Juliaperguntou.— É o meu segundo dia — observei, frustrada. Lembrei que estava em uma

biblioteca e faleimaisbaixo.—Asúnicaspessoasque realmente conversaramcomigoforamTreyevocêsduas...evocêsnãofalarammuitacoisa.Pelo menos elas foram graciosas o bastante para parecerem acanhadas com isso.

Kristinabriuaboca,fezumapausaeentãopareceumudaroqueiadizer.—Temcertezaqueasuanãofaznada?—Positivo—menti.—Comoéqueumacoisadessasépossível?Juliadeuumaolhadanabibliotecaesecontorceunacadeira.Elaergueuacamisaum

pouco para mostrar a parte de baixo das costas — e a tatuagem desbotada de umaandorinhavoando.Satisfeitaporeutervistoaquilo,elasevirouparaafrentemaisumavez.—Eufizessanasemanadefériasdeprimavera...e foiamelhorsemanasemaulas

daminhavida.—Porcausadatatuagem?—perguntei,descrente.—Quandoeu fiz,nãoeraassim.Erametálica...não igual à sua.NemàdeSlade.

Eramaisparecidacom...—Cobre—Kristinajudou.Juliapensouarespeitoeassentiu.—É,tipodourado-avermelhado.Acorsódurouumasemanae,enquantodurou,foi

fantástico.Tipo,eununcamesentitãobem.Foiamelhorcoisadaminhavida.— Juro, tem algum tipo de droga naqueles celestiais—Kristin disse. Ela tentava

falarcomosenãoaprovasse,masdetecteiumtomdeinveja.—Sevocêfizesseuma,iriaentender—Juliadisseaela.—Celestiais...euouviaquelameninaalifalardisso—eudisse.—Laurel?—Juliaperguntou.—É,écomoascordecobresãochamadas.Porque

elas fazem com que você se sinta do outromundo— ela parecia quase envergonhadapelopróprioentusiasmo.—Quenomeidiota,hein?

—ÉessaqueSladefez?—perguntei,atordoadacomoquesedesenrolavaàminhafrente.—Não,adeleédeaço—Kristinrespondeu.—Essasdãotipoumaforçaatlética.

Tipo, você fica mais forte, mais rápido. Coisas assim. Elas duram mais do que ascelestiais... tipo duas semanas. Às vezes, três,mas o efeito diminui. Chamam de açoporquesãofortes,acho.Etalvezporqueelascontenhamaço.Não é aço, eu pensei. É um composto de prata.A arte de usarmetal para inserir

certaspropriedadesnapeleeraalgoqueosalquimistashaviamaperfeiçoadohaviamuitotempo.Oouroeraabsolutamenteomelhor,eporissonósousávamos.Outrosmetais— quando formulados da maneira adequada— atingiam efeitos parecidos, mas nempratanemcobreeramtãoeficientesnainserçãoquantooouro.Atatuagemdecobreerafácil de entender. Um grande número de substâncias para elevar o humor ou drogaspodiam ser combinadas com esse metal para efeito de curto prazo.A prata era maisdifícildeentender—ou,melhor,osefeitosdaprata.Oqueelasdescreviampareciaumtipodeesteroideatlético.Seráqueprataeracapazdefazerisso?Euprecisavaconferir.—Quantaspessoastêmessastatuagens?—pergunteiaelas,maravilhada.Nãodava

paraacreditarquetatuagenstãocomplicadasfaziamtantosucessoali.Eutambémestavacomeçando a entender como os alunos daquela escola realmente eram ricos. Só osmateriaisdeviamcustarumafortuna,issosemmencionarossupostosefeitoscolaterais.—Todomundo—Juliarespondeu.Kristincorrigiu.—Nemtodomundo.Maseujáeconomizeiquasetodoodinheiro.— Eu diria que pelo menos metade da escola já experimentou pelo menos uma

celestial—Juliadisse,e lançouumolhardeconsoloparaaamiga.—Depoisdáparamandarretocar...mas,mesmoassim,custacaro.— Metade da escola? — repeti, incrédula. Olhei ao redor, imaginando quantas

camisas e calças escondiam tatuagens.— Isso é uma loucura. Não acredito que umatatuagempossafazercoisasassim—euesperavaestarsendoconvincenteemesconderoquantodefatoeusabia.—Façaumacelestial—Juliadissecomumsorriso.—Daívocêvaiacreditar.—Ondevocêsfazem?—ÉumestúdiochamadoNevermore—Kristindisse.—Maselessãoseletivos,e

não é fácil fazer uma.—Nãotãoseletivosassim,pensei, semetadeda escola já tinhafeito.—FicarambemmaiscautelososdepoisqueTreytentoudenunciar.LáestavaonomedeTreymaisumavez.Agorafaziasentidoeledesdenhartantoda

minhatatuagemquandonósnosconhecemos.Masfiqueimeperguntandoporqueeleseimportava tanto — o suficiente para tentar fechar a loja. Essa não era apenas umadiscordânciacasual.—Seráqueeleachainjusto?—levanteiahipótese,diplomática.

—Acho que ele só tem inveja porque não tem dinheiro para fazer uma— Juliadisse.—Ele tem uma tatuagem, sabe? É um sol nas costas.Mas é só uma tatuagempreta,normal...nãoédouradacomoasua.Eununcavinadaparecidocomasua.—Então foipor issoquevocêsacharamqueaminhamedeixava inteligente—eu

disse.—Issopoderia ter sidomuitoútilnasprovas finais—Juliadisse,esperançosa.—

Temcertezadequenãoéporissoquevocêsabetantacoisa?Eusorri,apesardeestarpasmacomoquetinhaacabadodedescobrir.—Bemqueeuqueria.Podiafazercomquefossemaisfácillerestelivro.Coisaque

eu,aliás,deviaestarfazendo—completeieolheiparaorelógio.Erasobresacerdotesemagos greco-romanos, uma espécie de apanhado detalhando vários tipos de encantos erituaiscomosquaiselestrabalhavam.Nãoeraummaterialdeleituraterrível,maseralongo.Euachavaqueapesquisadasra.Terwilligereramaisconcentradaemreligiõesdemassa daquela época, por isso o livro parecia ser uma escolha estranha.Talvez elaestivessequerendoincluirumaseçãosobrepráticasdemagiaalternativas. Independentedisso,quemeraeuparaquestionar?Seelapedisse,eufaria.PermanecimaistempodoqueKristineJulianabiblioteca,porquetinhaqueficaraté

asra.Terwilligerdecidirirembora,oqueaconteceusóquandoabibliotecafechou.Elapareceucontenteporeuteravançadotantonasanotaçõesedissequequeriaolivrotodoprontoemtrêsdias.— Sim, professora — disse de modo automático, como se eu não tivesse mais

nenhumaoutraaulanaquelaescola.Porqueeusempreconcordavasempensar?Volteiparaocampuslestecomosolhosvermelhosdetantotrabalhareexaustacom

a ideia da lição de casa que ainda faltava fazer. Jill estava dormindo pesado, coisa quetomei como uma pequena bênção. Eu não ia precisar enfrentar seu olhar de acusaçãonemdescobrircomolidarcomosilêncioconstrangedor.Eumeprepareipara irparaacamarápidoesemfazerbarulho,ecaínosonoquaseassimqueencosteinotravesseiro.Acordei por volta das três com um som de choro. Eu me sacudi para afastar a

sonolênciaeconseguidistinguir Jill sentadanacama,comorostoenterradonasmãos.Enormessoluçostrêmulosacometiamseucorpo.—Jill?—euperguntei,incerta.—Qualéoproblema?Comaluzfracaquevinhadefora,viJillergueracabeçaeolharparamim.Incapaz

deresponder,elasósacudiuacabeçaevoltouachorarmaisumavez,agoramaisalto.Eume levanteie fuimesentarnabeiradadacamadela.Eunãoconseguiaabraçá-laoutocá-lapara reconfortar.Ainda assim,me sentipéssima.Eu sabiaque aquilodevia serculpaminha.— Jill, eu sinto muito. Jamais devia ter ido falar com Adrian. Quando Lee

mencionouvocê, eudevia ter feito comque eleparasse editoque falasse comvocê seestivesse interessado, em primeiro lugar... — as palavras saíram todas confusas.

Quandoolheiparaela,sópudepensaremZoeeemsuasacusaçõesterríveisnanoiteemqueeuparti.Dealgumjeito,minhaajudasempresurtiaoefeitocontrário.Jill fungoueconseguiusoltaralgumaspalavrasantesdedesabarnochoromaisuma

vez.—Não...nãoéisso...Fiqueiolhandoparaas lágrimasdela impotente, frustradacomigomesma.Kristine

Juliame consideravam inteligente demaneira sobre-humana.No entanto, garanto quequalquer uma delas teria sido capaz de reconfortar Jill cem vezes melhor do que eu.Estendi amão e quase dei tapinhas no braço dela—mas recuei no últimomomento.Não,eunãopodiafazerisso.Avozdealquimistadentrodemim,aquelaquesempremealertava para manter distância dos vampiros, não permitia que eu tocasse em umavampirademaneiratãopessoal.—Então,oquefoi?—eufinalmenteperguntei.Elasacudiuacabeça.—Nãoé...Nãopossocontar...Vocênãoiriaentender.Com Jill, eu pensei, várias coisas podiamestar erradas.A incerteza de sua posição

real.As ameaças contra ela. Ser mandada para longe da família e dos amigos, presaentrehumanossobosolperpétuo.Eurealmentenãosabiaporondecomeçar.Nanoitepassada, havia um terror congelante e desesperado em seu olhar quando ela acordara.Masaquiloeradiferente.Erapesar.Vinhadocoração.—Oquepossofazerparaajudar?—perguntei,finalmente.Elademoroualgunsmomentosparaserecompor.—Vocêjáestáfazendodemais—elaconseguiudizer.—Nóstodosapreciamos...

deverdade.PrincipalmentedepoisdoqueKeithdisseparavocê.—SeráquenãohavianadaqueAdriannãotinhacontadoparaela?—Esintomuito...sintomuitoportersidotãomaldosacomvocêantes.Vocênãomereciaaquilo.Sóestavatentandoajudar.—Não...nãopeçadesculpas.Eucauseiamaiorconfusão.— Não precisa se preocupar, sabe? — ela completou. — Com Micah. Eu

compreendo.Sóqueroseramigadele.Eusabiaqueaindanãoestavaconseguindoajudá-laasesentirmelhor.Maseutinha

que reconhecer que me pedir desculpas pelo menos parecia distraí-la daquilo que ativessefeitoacordarcomtantador.—Eusei—respondi.—Nãodeviatermepreocupadocomvocê.Elamegarantiumais umavezque estavabem, semmais explicações a respeitodo

motivo pelo qual tinha acordado chorando.Eu sentia que devia terme esforçadomaispara ajudar, mas, em vez disso, voltei para a minha própria cama. Não ouvi maissoluços pelo resto da noite, mas, quando acordei algumas horas depois, dei umaolhadinha nela.Mal dava para enxergar suas feições à luz do amanhecer. Ela estava lá

deitada,comosolhosarregalados,olhandoparaonada,comumaexpressãoassombradanorosto.

11

Antesdasaulasnodia seguinte,deixeiumrecadocomalguémnasededosalquimistas,dizendoque precisava que “o sr. e a sra. Melrose” mandassem um recado para que Jill nãoprecisassefazereducaçãofísica—ou,pelomenos,asatividadesaoarlivre.Euesperavaqueelesfossemfazerissorápido.Osalquimistaseramrápidosquandoqueriam,masàsvezestinhamideiasestranhasarespeitodoqueeraprioridade.EuesperavaqueelesnãotivessemamesmaatitudedeKeithemrelaçãoàsdificuldadesdeJill.Maseusabiaquenadairiaacontecernaquelemesmodia,porissoJilltevequesofrer

emmaisumaauladeeducaçãofísica—eeutivequesofrerassistindoaoseusofrimento.O mais terrível foi que Jill não choramingou nem tentou escapar de nada. Ela nemdemonstrou qualquer sinal do episódio da noite anterior. Chegou com otimismo edeterminação, como se talvez naquele dia o sol não fosse afetá-la. Mas não demoroumuito para ela começar a ficarmole. Ela parecia enjoada e cansada, e omeu própriodesempenho foi um pouco falho porque ficava sempre de olho nela, com medo quedesmaiasse.Micah foi a salvação.Mais uma vez, ele trocou de time, destemido— desta vez,

desde o começo da aula. Ele cobriu a posição dela como tinha feito da outra vez,permitindo que nem a professora nem os colegas reparassem nela — bom, tirandoLaurel,quepareceunotareficarirritadacomtudoqueelefez.Osolhosdelapassavambravos dele para Jill, e ela ficava jogando o cabelo por cima do ombro para chamar aatenção dele. Eu me diverti um pouco ao ver que a atenção de Micah permaneceuunicamenteemmanterabolalongedeJill.Micahtambémfoi imediatamenteparao ladodelaquandoaaulaterminou, levando

uma garrafa d’água, que ela aceitou com gratidão. Eu também fiquei agradecida,masver como ele cuidava dela trouxe todas asminhas preocupações de volta. Ela cumpriusuapalavra,noentanto.Retribuiuaatençãodelecomsimpatia,masdefinitivamentenãodava para chamar aquilo de paquera.Mas ele não fez segredo de suas intenções, e eu

fiqueipreocupada, achandoque seriamelhor seelanãoprecisasse lidar comaquilo.Eufalei sério quando disse que confiava nela, mas não podia deixar de pensar que seriamuitomais fácil para todomundo se ele parasse de dar em cima dela. Isso exigiria“aconversa”.Nadafelizcomoqueeutinhaquefazer,alcanceiMicahnafrentedosvestiários.Nós

doisestávamosesperandoJill terminar,eeuaproveiteiotempoquetinhasozinhacomele.—Oi,Micah—eudisse.—Precisofalarcomvocê...— Oi — ele respondeu todo alegre. Seus olhos azuis estavam arregalados e

animados.—Eutiveumaideiaequeriafalarcomvocê.Sevocêsnãoconseguiremumadispensa para ela, quem sabe conseguemmudaro horário das aulas dela? Se ela fizesseeducação físicanoprimeirohoráriododia,nãoseriaassimtãoquente.Talveznãosejatão difícil para ela.Quer dizer, acho que ela gostaria de participar de algumas dessasatividades.—Elairiagostar,sim—eudissedevagar.—Eessaéumaótimaideia.—Eu conheço algumas pessoas que trabalhamna secretaria e vou pedir a elas que

encontremalgumasopçõesparaverseépossívelreencaixarasoutrasaulasdela.—Elefezumbico fingido.—Vou ficar tristepornãoestarnamesmaaulaqueela,masvaivalerapenaporsaberqueelanãoestásofrendotanto.— É — concordei sem muito entusiasmo, de repente me sentindo perdida. Ele

realmentetinhadadoumaboaideia.Eleeraatéaltruístaosuficienteparaabrirmãodaoportunidadedeficarpertodelaemnomedeumbemmaior.Comoéquepodiater“aconversa”comeleagora?Comoéqueeuderepente iadizer:“Deixeaminha irmãempaz”,seeleestavatendotantotrabalhoparaserlegal?EueratãoruimquantoEddie,aoevitar o confronto com Micah.Aquele sujeito era adorável demais para seu própriobem.Antesqueconseguissedarumaresposta,Micahtomouumadireçãoinesperada.—Masvocê realmentedevia levá-la aomédico.Não achoque ela tenha alergia ao

sol.—Ah,é?—perguntei,surpresa.—Masvocênãoviucomoelasofreduranteaaula

todososdias?—Não,não,podeacreditar,elacomtodaacertezatemumproblemacomosol—

eleseapressouemmegarantir.—Maspodeserqueodiagnósticoestejaerrado.Eufizuma pesquisa sobre alergia ao sol, e as pessoas costumam ter urticária junto. Essafraquezageneralizadaqueelatem...nãosei.Achoquepodeseroutracoisa.Ainão.—Tipooquê?—Nãosei—elerefletiu.—Masvoucontinuarpesquisandoteoriasedepoistedigo

oquedescobri.

Quemaravilha.A educação física também me deixou ver pela primeira vez uma das tatuagens

metálicas deAmberwood em ação. Era impossível não observarGreg Slade durante aaula, e eu não fui a única queme distraí com ele.Assim comoKristin e Julia tinhamdito, ele realmente estava mais rápido e mais forte. Ele deumergulhos que ninguémmais tinha reflexos rápidoso suficienteparadar.Quandoele acertava abola, eraumasurpresa não escutarmos um estrondo sônico logo depois. Isso lhe valeu elogios nocomeço, mas logo reparei uma coisa. Havia algo de descontrolado no jogo dele. Eleestava cheiodehabilidade, sim,mas às vezesnão se concentrava.Osgolpespoderososnemsempreajudavamporqueelemandavaabolaparafora.Equandocorriaparafazeruma jogada,erararo levaremcontaquemestavaaoseuredor.Quandoumgarotodaminhasalade inglês foiderrubadoecaiudecostasnochão, simplesmenteporestarnocaminho entre Slade e a bola, a srta.Carson parou o jogo e vociferou sua insatisfaçãocomaagressãodeSlade.Eleengoliutudocomumsorrisosacanameiodesanimado.—PenaqueEddienãoestánessaaula—Jilldissedepois.—Eleiriafazerfrenteao

Slade.—Talvez seja melhor se ninguém reparar— observei. Eddie, pelo que eu tinha

ouvidodizer, jáeraoastrodesuaauladeeducaçãofísica.Issofaziapartedotipofísiconaturalmente atléticodosdampiros, e eu sabiaquenaverdadeele estava se esforçandoparanãoserbomdemaisemtudo.Fui falar com a sra.Terwilliger depois da educação física, feliz por ver que ela já

estavabemprovidacomseuprópriocafé.Passeiamaiorpartedoperíodolendoolivroefazendoanotaçõesnomeulaptop.Depoisquetinhafeitoumaparte,elaveioconferiromeutrabalho.—Você é muito organizada— ela disse, olhando por cima do meu ombro.—

Títuloseintertítulosemaisintertítulos.— Obrigada — eu disse. Jared Sage tinha sido muito específico ao ensinar

habilidadesdepesquisaasuasfilhas.Asra.Terwilligerdeuumgolenocaféecontinuoualeratela.—Você não listou os passos dos rituais e dos encantos — ela observou alguns

momentosdepois.—Sófezumresumoempoucaslinhas.Bom,eraverdade,aqueleeraoobjetivodefazeranotações.— Eu citei todos os números das páginas — eu disse. — Se precisar checar os

componentesespecíficos,temumareferênciafácil.—Não...retorneecoloquetodosospassoseos ingredientesnasanotações.Quero

tertudonomesmolugar.Aminhavontadeeradizer: estátudonomesmolugar.Nolivro.Asanotaçõeseram

uma condensação domaterial, não a repetição do texto original, palavra por palavra.Masasra.Terwilligerjátinhaseafastadoeolhavaparaoseuarquivosemprestarmuita

atençãoenquantobalbuciavaasimesmaqueumapastaestavanolugarerrado.Comumsuspiro, voltei para o começo do livro, tentando não pensar em como aquilo iriameatrasar.Pelomenoseusóestavafazendoaquiloparaganharcrédito,nãonota.Fiqueiláatédepoisdotoquedoúltimosinal,tentandorecuperarumpoucodotempo

perdido.Quandovolteiaoquarto,preciseiacordarJill,quedormiapesadodepoisdeumdiaexaustivo.—Boanotícia—disseaelaquandopiscouparamimcomolhossonolentos.—Hoje

édiadefornecimento.Definitivamente,aquelaserampalavrasqueeununcaacheiquefossedizer.Tambémnãoacheiqueficariaanimadacomaquilo.E,comcerteza,nãoestavanada

animadacoma ideiade JillmorderopescoçodeDorothy.Maseuestavame sentindomalpor Jill, eentão ficavacontenteemsaberqueela iria se alimentar.Estar sujeita aumfornecimentodesanguetãolimitadodeviatornarascoisasduplamentedifíceisparaela.NósnosencontramoscomEddienoandardebaixoquandochegouahoradepartir.

EleolhouparaJillcompreocupação.—Estátudobemcomvocê?—Estoubem—eladisse comum sorriso.Elanãoparecia nemde longe tãomal

quanto antes. Estremeci de pensar o queEddie teria feito se estivessemesmona nossaaulaeativessevistoemsuapiorforma.—Porque isso ainda está acontecendo?—elemeperguntou.—Vocênão ia falar

comKeith?—Vaidemorarumpouco—eudisse,semdarmaioresdetalhes,eosleveiatéonde

oPingadoestavanoestacionamentodosalunos.—Vamosprovidenciar.Se os alquimistas não mandassem o bilhete, eu iria tentar a sugestão de Micah e

transferi-laparaaauladeeducaçãofísicamaiscedopelamanhã.— Sabemos que sim — Jill disse. Eu só senti a simpatia na voz dela de leve,

lembrando amimmesma que ela sabia sobre aminha briga de ontem comKeith. Eutorcia para que ela não amencionasse na frente deEddie e fui salva quando ela passouparaumtemamaisaleatório,atésurpreendente.—Achaquepodemospegarumapizzanocaminho?AdriannãoquermaiscomeracomidadeDorothy.—Quepéssimoparaele—Eddieobservouaoentrarnobancodetrás,deixandoo

assento da frente para Jill.—Ter uma chef particular àmão para preparar qualquercoisaqueeleprecisar.Nãoseicomoelesobrevive.Eudeirisada,masJillpareceuultrajadaemnomedeAdrian.—Nãoéamesmacoisa!Elasópreparacoisassuper-refinadas.—Aindaestouesperandoparasaberqualéoproblema—Eddiedisse.— Ela também tenta fazer tudo bem saudável. Diz que é melhor para Clarence.

Então,nuncatemsalnempimentanemmanteiga.—Caramba,comquefrequênciaJill

eAdriansefalam?—Nãotemnenhumsabornemnada.Eleestáficandolouco.—Tudopareceestardeixandoele louco—observei,me lembrandode sua súplica

pornovasacomodações.—Enãopodeestartãoruimassim.PoracasoelenãofoiparaLosAngelesontemànoite?—AúnicarespostadeJillfoifranziratesta.Ainda assim, eu tinha a sensação de que iríamos passar um bom tempo na casa de

Clarence, e eu particularmente não queria comer nada preparado ali. Então, foimaispormotivos egoístas que eu concordei empassar emum lugar que tinha comida paraviagemecompraralgumaspizzas.OrostodeAdrianficouradiantequandoentramosnasala de estar, onde— tirando as partidas de sinuca—parecia ser o lugar emque elemaispassavatemponacasadeClarence.— Chave de Cadeia— ele declarou e se levantou em um salto.—Você é uma

santa.Talvezatéumadeusa.—Opa—eudisse.—Quempagoufuieu.Adrianlevouumadascaixasatéosofá,paratristezadeDorothy.Elasaiuapressada,

falandoalgumacoisasobrepratoseguardanapos.Adrianmelançouumacenodecabeçaconciliador.—Vocêtambémnãoénadamau,Sage—eledisse.—Ora, ora, o que temos aqui?—Clarence entrou cambaleante na sala. Eu não

tinhareparado,maseleusavabengalaparaselocomover.Tinhaumacobradecristalnoalto, que era aomesmo tempo impressionante e assustadora. Era bem o tipo de coisaqueseriadeseesperardeumvampiroidoso.—Parecequetemosumafesta.Leeestavacomeleenoscumprimentoucomsorrisose acenosdecabeça.Osolhos

delesedemorarambrevementeemJilleelefezquestãodesesentarpertodela—masnãopertodemais. Jill se animoucomonão se animavahaviadias.TodomundoestavacomeçandoaatacaraspizzasquandoDorothyapareceuàportacomumnovovisitante.Sentimeusolhossearregalarem.EraKeith.—Oquevocêestáfazendoaqui?—perguntei,mantendoumtomdevozneutro.Eledeuumapiscadela.—Vimconferirsetodomundoestavabem.Essaéaminhafunção...tomarcontade

todomundo.Keith estava mais animado e mais simpático quando se serviu de pizza, sem

indicaçõesdabrigaquehaviaocorridodaúltimavez.Ele sorriu e conversou com todos como se fossem seusmelhores amigos, coisa que

medeixoutotalmentechocada.Ninguémmaispareciaacharquehaviaalgodeestranhonocomportamentodele—mas,bom,porqueachariam?NenhumdelestinhaomesmohistóricoqueeutinhacomKeith.Não — isso não era bem verdade.Apesar de estar envolvido em uma conversa

profunda com Eddie, Adrian fez uma pausa para me lançar um olhar curioso,perguntandoemsilênciosobreabrigadodiaanterior.EledeuumaolhadaemKeithe

depois voltou a olhar paramim.Dei de ombros,mostrando a ele que também estavaconfusaemrelaçãoàmudançadehumor.TalvezKeithestivessearrependidodaexplosãododiaanterior.Claroqueseriabemmaisfácildeaceitarsetivessevindoacompanhadodeumadesculpa.Mordisquei um pedaço de pizza de queijo, mas a maior parte do tempo fiquei

observando os outros. Jill contava paraAdrian, toda animada, como tinham sido seusprimeiro dias, e reparei que ela tinha deixado de fora todas as partes negativas. Ele aescutoucomindulgência,assentindoefazendointerjeiçõescomcomentáriosespirituososocasionalmente.Algumas das coisas que ela disse a ele eram bem básicas, e fiqueiimpressionadapornãoteremsidomencionadasemsuasconversastelefônicas.Talvezelesimplesmente tivesse tanta coisa a dizer nessas ocasiões que não sobrava oportunidadeparaela.Assim,elenãomencionouseutédionemsuasoutrasreclamações.ClarenceconversavadevezemquandocomEddieeLee,mas seusolhos sempre se

desviavamparaJill.Haviaumaexpressãodemelancoliaemseuolhar,eeumelembreide que a sobrinha dele só era um poucomais velha do que Jill. Fiquei imaginando setalvez parte da razão pela qual ele se mostrou tão disposto a nos acolher foi algumaespéciedetentativaderecuperarumapartedavidaemfamíliaquetinhaseperdido.Keith tinha se sentado perto de mim, coisa que no começo me deixou pouco à

vontade,masquedepoismedeuoportunidadede entenderopensamentodele.Aoverqueosoutrosestavamenvolvidosemconversas,perguntei,baixinho:—Você já ouviu falar em imitações de tatuagens dos alquimistas que chegaram à

populaçãoemgeral?Elemeolhouassustadoemresposta.—Nemseioqueissosignifica.— EmAmberwood está na moda. Parece que existe um lugar na cidade que faz

tatuagensmetálicas,eelastêmpropriedadesespeciais...maisoumenoscomoasnossas.Algumassódeixamapessoaalegre.Outrasmeioquetêmefeitodeesteroide.Elefranziuatesta.—Elasnãosãofeitascomouro,são?—Não.Prataecobre.Por issonãoduram.Provavelmenteparaqueos tatuadores

possamganharmaisdinheiro.—Masentãonãopodemsernossas—eleargumentou.—Háséculosnãousamos

essesmetaisemtatuagens.— É,mas alguém pode estar usando a tecnologia dos alquimistas para criar essas

tatuagens.—Sóparadeixar aspessoas chapadas?—eleperguntou.—Eunemsaberia como

chegaraissocomagentesmetálicos.—Eutenhoalgumasideias—respondi.— Deixe-me adivinhar. Elas incluem misturas com narcóticos. — Quando eu

assenti,elesuspirouemeolhoucomoseeutivessedezanosdeidade.—Sydney,omaisprovável é que alguém tenha descoberto algum método grosseiro de tatuar que éparecidocomonosso,masquenãotemnenhumarelaçãocomagente.Seforisso,nãopodemos fazer nada a respeito.Drogas existem.Coisas ruins acontecem. Se não tiverrelaçãocomosassuntosdosalquimistas,nãoédanossaconta.—Masesetiverconexãocomosassuntosdosalquimistas?—perguntei.Eleresmungou.—Está vendo?Épor issoque eu estavapreocupado coma sua vindapara cá, com

essasuatendênciadeaparecercomteoriasparalelasmalucas.—Eunão...—Por favor,nãomeenvergonhe—ele sibiloue lançouumolharparaosoutros.

—Nemcomeles,nemcomnossossuperiores.Abroncadelemesilenciou,principalmentepelasurpresa.Oqueelequisdizercom

essaminha“tendência”? Será que ele realmente estava sugerindo que tinha feito algumtipo de análise psicológica profunda de mim anos antes? A ideia de que eu iriaenvergonhá-lo era ridícula... e, no entanto, suas palavras plantaram uma dúvida naminha cabeça.Talvez as tatuagens emAmberwood fossem apenas uma modinha semrelaçãocomnada.—Comoestáaeducaçãofísica?—AspalavrasdeAdrianmearrastaramparalonge

dosmeusprópriospensamentos.EleaindaestavaouvindooresumodaescoladeJill.Elafezumacaretafrenteàpergunta.—Nãomuitobem—ela reconheceue fezumaretrospectivade algunsdospiores

momentos.Eddiemelançouumolharsignificativo,parecidocomodeantes.—Vocênãopodecontinuardessejeito—Leeexclamou.—Osolaquiébrutal.—Concordo—disseKeith,ninguémmenos.—Sydney,porquevocênãomedisse

comoestavadifícil?Achoqueomeuqueixobateunochão.—Eudisse!Foiporissoquetenteifazervocêentraremcontatocomaescola.— Na verdade, você não me contou a história toda. — Ele lançou um de seus

sorrisosmelososparaJill.—Nãosepreocupe,vouresolverissoparavocê.Vouentraremcontatocomosresponsáveisdaescola...ecomosalquimistas.—Eujáfaleicomeles—argumentei.Maseunãoprecisava terditonada.Keith já tinhamudadode assuntoe conversava

comClarencearespeitodealgo irrelevante.Deondetinhavindoessamudançaradicaldeatitude?Ontem,odesconfortodeJilltinhasidodebaixaprioridade.Hoje,Keitheraocavaleirodearmadurabrilhanteque saíaemsuadefesa.E,com isso,ele sugeriaquequemestavapisandonabolaeraeu. Esseéoplanodele,percebi. Elenãomequeraqui.Nuncaquis.Eentão,umacoisaaindapiormeocorreu.Elevaiusarissoparacomeçaramontarumcasocontramim.

Dooutroladodasala,Adrianchamouaminhaatenção.Elesabia.EletinhaescutadoquandoeudiscuticomKeithnaentradadacasa.Adriancomeçouafalar,eeusabiaqueele iapegarKeithemsuamentira.Foiumgestogalante,masnãoeraoqueeuqueria.EudariacontadeKeithsozinha.— Como estava Los Angeles? — perguntei logo, antes que Adrian tivesse a

oportunidade de dizer alguma coisa. Ele olhou para mim com um ar curioso, semdúvida imaginandoporqueeunãoqueriapermitirqueele testemunhasseameu favor.—VocêfoiparaláontemànoitecomLee,nãofoi?Adrianpareciaconfuso,masumsorrisoseabriuemseurosto.— Fui— ele finalmente disse.— Foi ótimo. Leememostrou como é a vida na

faculdade.Leedeurisada.—Eunãoiriaassimtãolonge.Nãoseiondevocêsemeteumetadedanoite.Adrianficoucomumaexpressãonorostoquedealgummodoeraencantadora,mas

quemedeuvontadededarumtapaneleaomesmotempo.—Nósnosseparamos.EuquisconheceralgunsdosoutrosMoroidaárea.NemEddieconseguiuficaremsilênciocomisso.—Ah,éassimquevocêdescreve?Jillselevantoudemaneiraabrupta.—Voutomaromeusangueagora.Tudobem?Houve um momento de silêncio constrangedor, principalmente porque acho que

ninguémrealmentesabiaaquemelaestavapedindolicença.—Claro que sim, querida—Clarence disse e assumiu seu papel de anfitrião.—

AcreditoqueDorothyestejanacozinha.Jill assentiu de leve e saiu apressada da sala.Nós, que sobramos, trocamos olhares

confusos.—Háalgumproblema?—Leeperguntou,parecendopreocupado.—Seráqueeu...

seráquedevoirfalarcomela?— Ela só está estressada— eu disse, sem coragem demencionar os episódios de

gritoedechoro.—Penseiemumacoisaquepode serdivertidaparaela...para todosnós fazermos

—eledisse,eficouesperandopelasreações.Eleolhouaoredoreentãovoltouosolhosparamim.Achoqueeutinhasidoescolhidaparafazeropapeldemãe.—Sevocêacharque tudobem.Querdizer... émeiobobo,mas acheiquepodíamos ir jogarminigolfequalquernoitedessas.Temummontedefonteselaguinhosnocampo.Elatemdomíniosobreaágua,certo?Deveestarsentindofaltadissoaqui.— Está mesmo— Eddie respondeu com a testa franzida.— Ela mencionou isso

ontem.Euestremeci.Keithestavamandandoumamensagemde textopelo telefonee ficou

paralisado.Pormaisque tivéssemosnossasdiferenças, continuávamoscompartilhandoogrosso

dotreinamentoquetínhamosrecebido,enósdoisficamospoucoàvontadedepensarnamagiadosMoroi.—Achoqueelavaigostarmuito—Adrianfalou.Elepareciarelutanteemadmitir.

AchoqueaindaestavapoucoàvontadecomaideiadeLeeestarinteressadoporJill,pormais que os dois se dessem bem.A sugestão de Lee era aomesmo tempo inocente edemonstravapreocupação.Eradifícilencontraralgumproblemanela.Leedeixouacabeçapenderparaolado,pensativo.—O toquede recolher émais tardenos fins de semana, não é?Querem ir hoje à

noite?Era sexta-feira, e isso nos garantia uma hora extra no toque de recolher do

alojamento.—Euestoudentro—Adriandisse.—Literalefigurativamente.—SeJillfor,euvou—Eddiefalou.Eles olharam para mim. Eu estava encurralada. Queria voltar e tirar o atraso da

lição de casa. Mas se eu dissesse isso ia parecer ridículo, e achava que tinha de estarpresente como a única acompanhante mulher de Jill.Além do mais, lembrei a mimmesma,aquelamissãonãoeraarespeitodemimedaminhavidaacadêmica,pormaisqueeufingissequefosse.OmaisimportanteeraJill.— Eu posso ir— disse devagar. Pensei que isso talvez se parecesse demais com

confraternizaçãocomvampiros,porissoeuolheisemjeitoparaKeith.Eletinhavoltadoamandar amensagemde texto, agora que amagia não estavamais em discussão.—Keith?—perguntei,comoseestivessepedindopermissão.Eleergueuosolhos.—Hã?Ah,eunãopossoir.Tenhoumcompromisso.Tenteinãofazercareta.Eletinhameentendidomal,eachavaqueeuestavafazendo

um convite. Por outro lado, ele tambémnãomostrou objeção em relação ao resto denósirmos.—Ah,quebacana—disseClarence.—Umpasseioparaosjovens.Quemsabenão

dividemumataçadevinhocomigoantes?—Dorothyiaentrandocomumagarrafadevinho tinto, com Jill atrás dela. Clarence sorriu paraAdrian. — Eu sei que vocêapreciariaumataça.AexpressãodeAdriandiziaquesim,comtodaacerteza.Emvezdisso,elerespirou

fundoesacudiuacabeça.—Émelhornão.—Vocêdeviabeber—Jilldissecomgentileza.Mesmodepoisdebeberapenasum

poucodesangue,elapareciacheiadevidaedeenergia.—Nãoposso—eledisse.

— É fim de semana — ela disse a ele. — Não tem assim tanto problema.Principalmentesevocêtomarcuidado.Osdoisficaramseencarandoeentão,finalmente,eledisse:—Tudobem.Podeservirumataçaparamim.—Sirvaumaparamimtambém—Keithdisse.—Émesmo?—pergunteiaele.—Nãosabiaquevocêbebia.—Tenhovinteeumanos—elecontra-atacou.AdrianaceitouataçaqueDorothylheofereceu.— Por algum motivo, acho que a preocupação de Sage não é essa.Achei que os

alquimistasevitassemoálcooldamesmamaneiraqueevitamcoresprimárias.Euolheiparabaixo.Estavavestidadecinza.Keithusavamarrom.—Umataçanãovaifazermal—Keithdisse.Nãodiscuticomele.NãoeraminhafunçãoserbabádeKeith.Eosalquimistasnão

tinham nenhuma regra específica contra beber.Nós tínhamos crenças religiosas fortesem relação ao que significava levar uma vida boa e pura, e a bebida costumava serdesprezada.Masseeraproibida?Não.Eraumhábitoqueeuconsideravasignificante.Seelenãoconsiderava,aescolhaeradele.KeithestavalevandoataçaaoslábiosquandoAdriandisse:—Humm.O+,omeupreferido.Keithcuspiuovinhoquetinhaacabadodebeberecomeçoua tossir.Fiqueialiviada

pornãoterrespingadoemmim.JillcomeçouadarrisadaeClarenceficouolhandoparaataça,cheiodedúvidas.—Émesmo?Euacheiquefosseumcabernetsauvignon.—Eémesmo—Adriandisse,comorostoimpassível.—Meenganei.Keith lançouumsorrisocontidoparaAdrian,comose tambémachassequeapiada

era engraçada, mas eu não me deixei enganar. Keith estava louco da vida por teremtirado sarro dele, e por mais que ele fingisse ser simpático com todo mundo, suasopiniõescontravampirosedampiroscontinuavammaisdurasdoquenunca.ClaroqueAdrian provavelmente não estava ajudando em nada. Eu achei bem engraçado,sinceramente, eme esforceimuito para esconder omeu sorriso, para Keith não ficarbravocomigodenovo.Foidifícil fazer issoporque,logodepois,Adrianmelançouumsorrisosecreto,cheiodesegundasintenções,quepareciadizer: Issofoiotrocopeloqueelefezantes.EddiedeuumaolhadaemJill.—Ainda bem que você tomou seu sangue hoje. Sei que queria aprender alguns

golpesdedefesa,masqueriaesperaratévocêrecuperarsuaforça.Jillsealegrou.—Podemosfazerissoamanhã?—Claroquesim—elerespondeu,parecendoquasetãofelizquantoela.

Keithfranziuatesta.—Porqueelaprecisaaprenderalutarsetemvocêporperto?Eddiedeudeombros.—Porqueelaquer,edevetertodavantagemsemprequepossível.Elenãomencionouespecificamenteosatentadoscontraavidadela—nãona frente

deLeeeClarence—,masorestodenósentendeu.—MaseuacheiqueosMoroinãofossembonsdebriga—Keithdisse.— Isso ocorre mais porque nunca são ensinados. Não são tão fortes quanto nós,

claro,masosreflexosdelessãomelhoresdoqueosseus—Eddieexplicou.—Éapenasumaquestãodeaprenderashabilidadeseterumbomprofessor.—Comovocê?—caçoei.—Eunãosouruim—eledissecommodéstia.—Soucapazdeensinaraqualquer

umquequeiraaprender.—EledeuumacotoveladaemAdrian,queesticavaamãoparapegarovinhoeencherocopomaisumavez.—Atéestesujeitoaqui.—Não,obrigado—Adriandisse.—Estasmãosnãosesujamcombrigas.—Nemcomtrabalhopesado—observei,aolembrarseuscomentáriosanteriores.— Exatamente— ele disse.— Mas talvez você devesse pedir a Castile que lhe

mostre como dar uns socos, Sage. Pode ser útil. Parece ser uma habilidade que umamoçaassimtãocorajosacomovocêdevepossuir.—Bom,agradeçoovotodeconfiança,masnãoseiquandoiriaprecisardisso—eu

falei.—Claroqueelaprecisaaprender!A exclamação de Clarence nos pegou de surpresa. Eu na verdade achava que ele

estava tirando um cochilo, já que seus olhos tinham se fechadomomentos antes.Masagora ele se inclinava para a frente com uma expressão zelosa. Eu me encolhi sob aintensidadedeseuolhar.—Você precisa aprender a se proteger!— ele apontou paramim, depois passou

paraJill.—Evocêtambém.Jurequevocêvaiaprenderasedefender.Jureparamim.Osolhosverde-clarosdeJillsearregalaramdechoque.Elatentoulançarumsorriso

reconfortanteparaele,masogestosaiudemaujeito.—Claro,sr.Donahue.Estoutentando.E,atélá,tenhoEddieparameprotegerdos

Strigoi.—Nãodos Strigoi!—Avozdele passoupara um sussurro.—Dos caçadores de

vampiros.Nenhumdenósdissenada.Leepareciaestarmorrendodevergonha.Clarenceapertouataçadevinhocomtantaforçaqueeufiqueipreocupadaquefosse

quebrar.—Ninguémfalavadissonaquelaépoca...desedefender.Talvez,seTamarativesse

aprendidoalgo,nãoteriasidomorta.Nãoétardedemaisparavocê...paranenhumade

vocêsduas.—Pai,nósjáconversamossobreisso—Leedisse.Clarenceoignorou.OolhardaquelesenhordeidadepassavademimparaJill,eeu

fiquei imaginando se ele por acaso sabia que eu era humana. Ou talvez não fizessediferença.Talvezele só tivesseum instintodeproteçãodistorcidopor todasasgarotascom a idade próxima à deTamara. Eumeio que esperava que Keith observasse, semnenhumtato,quenãoexistiamcoisascomocaçadoresdevampiros,maseleficouquieto,algoincomumparaele.FoiEddiequemfinalmentefalou,compalavrasreconfortantesegentis.Ele semprepassavaa impressãode serumguerreirodo tipomataroumorrer;foisurpreendenteperceberque,naverdade,eleeracheiodecompaixão.—Não se preocupe—Eddie disse.—Eu vou ajudar as duas.Voumantê-las em

segurançaegarantirquenadaaconteçaaelas,certo?Clarenceaindapareciaagitado,masfocadoemEddiecomesperanças.—Vocêjura?NãovaipermitirquevoltemamatarTamara?— Juro— Eddie disse, sem deixar transparecer, de jeito nenhum, como aquele

pedidoerabizarro.ClarenceobservouEddiecomatençãoporalgunssegundoseentãoassentiu.—Vocêéumbomgaroto—elepegouagarrafadevinhoeencheuataça.—Mais?

—perguntouaAdrian,comosenadativesseacontecido.—Sim,porfavor—Adriandisseepegouagarrafa.Nós demos prosseguimento à conversa como se nada tivesse acontecido, mas a

sombradaspalavrasdeClarencecontinuoupairandosobremim.

12

Quandosaímosparaoencontroemgrupooupasseioemfamíliaouseja láoque fosse,Leenãoparavadepedirdesculpaspelopai.—Sintomuito—eledisse, e se largouarrasadonobancode trásdoPingado.—

Nãodámaisparafazercomqueelerecuperearazão.TentamosdizeraelequeTamarafoimortapelosStrigoi,maseleserecusaaacreditar.Elenãoquersaber.Nãopodesevingar de um Strigoi. Eles são imortais. Invencíveis. Já um caçador de vampiroshumano...Dealgummodo,nacabeçadele,éalgoqueelepoderiaperseguir.E,seissonão for possível, ele pode se concentrar em como os guardiões se recusam a ir atrásdessescaçadoresdevampirosinexistentes.EumalouviEddiebalbuciar:—OsStrigoinãosãoassimtãoinvencíveis.Pelo espelho retrovisor, vi o rosto de Jill cheio de compaixão. Ela estava sentada

entreLeeeEddie.—Mesmoquesejaumafantasia,talvezsejamelhorassim—elasugeriu.—Issolhe

dá conforto. Quer dizer, mais ou menos.Ter algo concreto para detestar é o quepermitequeeleaguente.Senão,simplesmenteiriaseentregaraodesespero.Elenãofazmalaninguémcomsuasteorias.Achoqueeleéumamor—elatomoufôlegodaquelejeitoquefaziaquandofalavamuitodeumavezsó.Osmeusolhosestavamnaestrada,maspudejurarqueviLeesorrindo.—Isso foi legaldasuaparte—eledisseaela.—Euseiqueelegostade tervocê

porperto.Vireaqui.Essaúltimafraseeledisseparamim.Leeestavamedandoasinstruçõesdocaminho

desde que havíamos saído da casa de Clarence.Tínhamos acabado de sair de PalmSprings propriamentedita, e nos aproximávamosdoResort eCampodeGolfeDesertGods, cuja aparência era muito impressionante. Mais instruções nos levaram até oCentrodeMinigolfeMega-Fun,ao ladodoresort.Procureiumlugarparaestacionare

ouviJillengoliremsecoquandoavistouaglóriaquecoroavaocampodegolfe.Ali,nocentro de um aglomerado de gramados com decoração cafona, havia uma grandemontanhafalsacomumacachoeiraartificialcaindodoalto.—Umacachoeira!—elaexclamou.—Éfantástico.—Bom—Leedisse—,eunãoiriaassimtãolonge.Éfeitadeáguaqueébombeada

semparar, e tem sóDeus sabeoquenessa água.Querdizer, eu équenão iria tentarbeberounadarnela.Antesmesmoqueocarroparasse,Adrian já tinhasaídoeacendiaumcigarro.Nós

tínhamos discutido no caminho, apesar de eu dizer três vezes que o Pingado era umcarro estritamente para não fumantes. Logo todos nós também saímos, e eu fiqueiimaginandonoqueeutinhamemetidoenquantonosdirigíamosàentrada.—Naverdade,eununcajogueiminigolfe—comentei.Leeparoueficouolhandofixamenteparamim.—Nunca?—Nunca.—Como isso pode ser possível?—Adrian perguntou.—Como é possível você

nuncaterjogadominigolfe?—Aminhainfânciafoimeioforadocomum—eudissefinalmente.AtéEddiepareciaincrédulo.—A sua?Eu fui praticamente criado emuma escola isolada nomeio donada, em

Montana,eatéeujájogueiminigolfe.Dizerqueeutinhasidoeducadaemcasanãoserviadedesculpadessavez,porissosó

deixei para lá.Na verdade, o negócio é que aminha infância foimais concentrada emequaçõesquímicasdoqueemdiversãoerecreação.Quando começamos a jogar, eu logo peguei o jeito. Minhas primeiras tentativas

forambemruins,maseulogocompreendiopesodotacoecomomanobrarosângulosdecadacampo.Apartirdaí,foibemfácilcalcularadistânciaeaforçaparadartacadascerteiras.— Inacreditável. Se você tivesse jogado desde criança, provavelmente ia ser

profissional agora — Eddie me disse quando eu enfiei a bola na boca aberta de umdragão.Abolasaiurolandopelapartedetrás,desceuporumtubo,bateuemummuroecaiunoburaco.—Comovocêfazisso?Deideombros.— É pura geometria.Você também não é assim tão ruim— observei ao ver a

tacadadele.—Comovocêfaz?—Eusóalinhoebatonabola.—Muitocientífico.— Eu só confio no meu talento natural —Adrian disse ao chegar com passos

gingadosàTocadoDragão.—Quandosetemtantoassimàdisposição,operigoéter

demais.—Issonãofazabsolutamentenenhumsentido—Eddiefalou.A resposta deAdrian foi fazer uma pausa e pegar um cantil prateado do bolso de

dentrodocasaco.Eledesenroscouatampaedeuumgolerápidoantesdeseinclinarparadarsuatacada.—Oquefoiisso?—exclamei.—Nãopodebeberálcoolaqui.—Você ouviu o que aChave deCadeia disse antes— ele retrucou.—É fim de

semana.Eleajeitouabolaedeuatacada.Elafoidiretoparaoolhododragão,ricocheteoue

voltounadireçãodeAdrian.Depoisroloueparouaospésdele,quasenomesmolugardeondetinhasaído.—Talentonatural,hein?—Eddieperguntou.Eumeinclineiparaafrente.—Achoquevocêquebrouoolhododragão.—FicouigualzinhoaoKeith—Adriandisse.—Acheiquevocêiriagostar,Sage.Olhei feio para ele, imaginando se havia mais algum significado oculto por trás

daquilo. De maneira geral,Adrian pareceu surpreso com a própria gracinha. Eddieentendeumalaminhaexpressão.—Issofoiinapropriado—eledisseaAdrian.—Desculpe, pai—Adrian deumais uma tacada e conseguiu não aleijar nenhuma

estátuadessavez.Commaisduastacadas,eleacertouabolanamira.—Pronto.Três.—Quatro—Eddieeeudissemosemuníssono.Adrianolhouparanós,incrédulo.—Foramtrês.—Estáseesquecendodaprimeira—eudisse.—Aquecegouodragão.—Aquilo foi só aquecimento—Adrian argumentou.Eleestampouumsorrisono

rosto que, acredito, tinha a esperança de me encantar. —Vamos lá, Sage. Vocêcompreendeamaneiracomoaminhamente funciona.Vocêdissequeeuerabrilhante,lembra?Eddieolhouparamim,surpreso.—Dissemesmo?—Não!Eununcadisse isso.—OsorrisodeAdrianeradeenfurecer.—Parede

dizerissoparatodomundo.Comoeueraresponsávelpelafichadepontos,marqueiajogadadelecomosendode

quatro tacadas, apesar das reclamações subsequentes. Comecei a avançar, mas Eddieergueu a mão para me deter, com os olhos cor de avelã olhando por cima do meuombro.—Nãováainda—eledisse.—PrecisamosesperarJilleLee.Segui o olhar dele. Os dois tinham mergulhado numa conversa profunda desde a

nossachegada,tantoquetinhamseatrasadoeestavambematrásdetodosnós.Mesmoenquantodiscutia comigoecomAdrian,Eddie sempreconferiaondeelaestava—eonosso entorno. A maneira como ele fazia várias coisas ao mesmo tempo eraimpressionante.Até então, Jill eLee só tinhamestadoumburaco atrásdenós.Agoraeramquasedois,eissoeralongedemaisparaEddiepermitirqueelaficasseforadesuavista.Porisso,nósesperamosatéqueocasaldistraídochegasseàTocadoDragão.Adriandeumaisumgoleemseucantilesacudiuacabeça,maravilhado.—Vocênãotinhacomoquesepreocupar,Sage.Elafoidiretoparacimadele.—Nãograçasavocê—meirritei.—Nãoacreditoquevocêcontouparaelatodos

os detalhes da minha visita naquela noite. Ela ficou tão brava comigo por eu terinterferidocomvocê,LeeeMicahpelascostasdela.—Eunãofaleiquasenadaparaela—Adrianargumentou.—Sódisseparaelaficar

longedaquelehumano.Eddiedeuumaolhadaemnósdois.—Micah?Eutroqueiopesodocorpodeumpéparaooutro,semjeito.Eddienãosabiaqueeu

tinhatomadoiniciativas.—Lembraquandoeupediparavocêdizeralgoaele?Evocê serecusou?—Então

conteiaelecomotinhabuscadoajudacomAdrianeacabeidescobrindoo interessequeLeetinhaporJill.Eddieficouboquiaberto.—Comoéquevocênãomecontounadadisso?—elequestionou.—Bom—eudisse, imaginando se tudoqueeu fizesse sempre resultariana irade

umMoroioudeumdampiro.—Nãoeradasuaconta.—AsegurançadeJillésempredaminhaconta!Setemalgumcaraquegostadela,

euprecisosaber.Adriandeurisada.—SeráqueSagedeviaterpassadoumbilheteparavocêduranteaaula?—Não há nada de errado com Lee— eu disse.—Ele obviamente a adora e, se

estivercomele,elanuncavaiestarsozinha.—Nósnãosabemoscomcertezasenãohánadadeerradocomele—Eddiedisse.—EMicah por acaso é cem por cento confiável?Você checou o histórico dele ou

algoassim?—perguntei.—Não—Eddie respondeu, parecendo envergonhado.—Eu simplesmente sei. É

umasensaçãoqueeutenhoarespeitodele.NãotemproblemaelepassarumtempocomJill.—Tirandoofatodeeleserhumano.—Nãoiaacontecernadasérioentreeles.—Vocênãotemcomosaberdisso.—Jáchega,vocêsdois—Adrianinterrompeu.JilleLeetinhamfinalmentechegado

aoiníciodaTocadoDragão,oquesignificavaquenóspodíamosavançar.Adrianbaixouavoz.—Essadiscussãoéinútil.Querdizer,olheparaeles.Aquelehumanoestáforadequestão.Euolhei.Adriantinharazão.JilleLeeestavammuitoenvolvidos.Algumapartede

mimcheiade culpa ficou imaginando seeudeviameesforçarmaispara cuidarde Jill.FiqueitãoaliviadaporelaestarinteressadaemumMoroiquenempareiparapensarseela devia mesmo namorar alguém. Será que quinze anos era idade suficiente? Eu nãonamoravaquandotinhaquinzeanos.Bom,naverdade,eununcatinhanamorado.—Háumadiferençadeidadeentreeles—admiti,maisparamimmesma.Adriancaçoou.—Podeacreditar,jávidiferençadeidade.Adelesnãoénada.Ele se afastou e, alguns momentos depois, Eddie e eu nos juntamos a ele. Eddie

manteve sua vigília simultânea a Jill, mas dessa vez fiquei com a impressão de que operigoqueelevigiavaestavabemaoladodela.ArisadadeAdriansoouànossafrente.—Sage!—elechamou.—Vocêtemqueveristo.Eddieeeuchegamosaopróximocampoe ficamosolhando, surpresos.Entãoeucaí

narisada.TínhamoschegadoaoCastelodoDrácula.Um castelo enorme, preto e cheio de torres, guardava o buraco a certa distância.

Haviaumtúnelnomeiodelecomumaponteestreitaporondeaboladeviapassar.Seabola caísse pela lateral antes de chegar ao castelo, voltava para o ponto inicial. UmbonecoanimadodocondeDráculaficavaaoladodocastelo.Eleeradeumbrancopuro,comolhos vermelhos, orelhas pontudas e cabelopenteadopara trás.Comgestosmeiodesajeitados,ele ficavaerguendoosbraçosparaexibir suacapaem formademorcego.Nasproximidades,umalto-falantetocavabemaltoumamúsicamisteriosadeórgão.Eu não conseguia parar de dar risada.Adrian e Eddie olharam paramim como se

nuncativessemmevisto.—Achoquenuncatinhaouvidoarisadadela—Eddiedisseaele.—Comcertezanãoeraareaçãoqueeuestavaesperando—Adrianrefletiu.—Eu

estava contandocomum terror absoluto, a julgarpor seu comportamento anteriordealquimista.Nãoacheiquevocêgostassedevampiros.Aindasorrindo,fiqueiobservandooDráculasacudiracapaparacimaeparabaixo.—Issoaquinãoéumvampiro.Nãoédeverdade.Eéporissoqueétãoengraçado.

É a pura cafonice de Hollywood. Os vampiros de verdade são aterrorizantes eantinaturais.Issoaqui?Issoéhilário.Ficou claro, pela expressão deles, que nenhum dos dois estava entendendo por que

aquilotinhatantoapeloaomeusensodehumor.MasAdrianseofereceuparatirarumafotocomomeucelularquandoeupedi.FizumaposeaoladodoDráculaeestampeiumsorrisoenormenorosto.Adrianconseguiutirara fotobemquandooDráculaerguiaacapa.Quandoeuconferi a foto, fiquei felizdeverque tinha saídoperfeita.Atéomeu

cabelotinhasaídobom.Adrianacenoucomacabeçaemaprovaçãoàfotoantesdemeentregarocelular.—Certo,atéeusoucapazdeadmitirqueficoubembonitinha.Eumepegueianalisandoocomentárioexcessivamente.Oqueelequisdizercom“ até

ele era capaz de admitir”? Que eu era bonitinha para uma humana? Ou que eu tinhaatendido a algum padrão de beleza em sua avaliação? Momentos depois, me forcei aparardepensarnisso.Deixeparalá,Sydney.Foiumelogio.Aceite.Jogamospelorestodocampoefinalmentefomosdarnacachoeiraemsi.Aquelefoi

umburacoespecialmentedesafiador,eeudemoreiparacalcularaminhatacada—nãoquefossenecessário.Euestavaganhandodetodomundocombastantefacilidade.Eddieeraoúnicoquechegavaperto.FicouclaroqueJilleLeenemestavamprestandoatençãoaojogo,enoquediziarespeitoaAdrianeseutalentonatural...bom,elesocupavamaúltimaposiçãocomsolidez.Eddie,Adrian e eu ainda estávamos na frente dos outros dois, por isso ficamos

esperandopor elespertoda cachoeira. Jill praticamente correunadireçãodelaquandoteveoportunidade,admirando-acomolhosencantados.—Ah—eladisse,semfôlego.—Issoémaravilhoso.Nãovejotantaáguaassimhá

dias.—Lembre-sedoqueeudissearespeitodoníveldetoxinas—Leebrincou.Masera

óbvioqueeletinhaachadoareaçãodelaumagraça.Quandoolheiparaosoutrosdois,vique eles compartilhavam dos mesmos sentimentos. Bom, não eram exatamente osmesmos.A afeição deAdrian era obviamente a de um irmão.Mas a de Eddie... eradifícildedecifrar,meioqueumamisturadasoutrasduas.Talvezfosseumtipodeafetodeguardião.Jill fezumgestonadireçãodacachoeirae,derepente,partedaágua se separouda

cascataque caía.Essaporção tomoua formadeuma trança e se contorceu altono ar,formandoespirais,antesdesedespedaçaremummilhãodegotasquecaíramcomoumanévoa por cima de nós todos. Eu olhava para aquilo com os olhos arregalados eparalisada,masasgotasquemeatingirammedespertaram.— Jill— eu disse em uma voz quemal reconheci como sendominha.—Nunca

maisfaçaisso.Jill,comosolhosbrilhantes,malmenotouaofazeroutraporçãodeáguadançarno

ar.—Nãotemninguémporaquiparaver,Sydney.Nãoeraporissoqueeuestavatãoaborrecida.Nãotinhasidoissoquemeencherade

tanto pânico que eumal conseguia respirar.Omundo estava começando a girar, e eufiqueicommedodedesmaiar.Ummedofrioeenvolventetomoucontademim,medodo desconhecido. Do antinatural. As leis do meu mundo tinham acabado de serrompidas.Aquilo era magia de vampiro, algo estranho e inacessível aos humanos—

inacessívelporqueeraproibido,umacoisacomquenenhummortaldeviasemeter.Eusó tinha vistomagia sendo usada uma vez, quando duas vampiras usuárias de espíritotinham se voltado uma contra a outra, e eu nunca mais quis ver aquilo. Uma tinhaforçado asplantasda terra a fazerem seu encanto, enquanto aoutrausava a telecinesiaparalançarobjetoscomaintençãodematar.Tinhasidoapavorante,eapesardeoalvonão sereu,me senti encurraladaeesmagadadiantedeumpoder tãodeoutromundo.Aquele foi um lembrete de que essas não eram pessoas divertidas para ter comocompanhia.Eramcriaturascompletamentediferentesdemim.—Parecom isso—eudisse, sentindoopânicocrescer.Eu tinhamedodamagia,

tinhamedoquemetocasse,medodoquepodiafazercomigo.—Nãofaçamaisisso!Jillnemmeescutou.ElasorriuparaLee.—Vocêédoar,certo?Conseguecriarneblinaporcimadaágua?Leeenfiouasmãosnosbolsosedesviouoolhar.—Ah,bom,achoquenãoéboaideia.Querdizer,estamosempúblico...—Vamoslá—elaimplorou.—Nãovaidarnenhumtrabalhoparavocê.Elenaverdadeparecianervoso.—Não,agoranão.— Não me venha com essa você também— ela deu risada.Acima dela e à sua

frente,aquelaáguaendemoniadacontinuavarodando,rodando,rodando...—Jill—Adriandissecomumtomdevozrude,queeununcatinhaescutado.Aliás,

eunãomelembravadealgumavezterescutadoonomeverdadeirodelasaindodabocadele.—Pare.Foiaúnicacoisaqueeledisse,masfoicomoseumaondativessepassadoporJill.Ela

seencolheueasespiraisdeáguadesapareceram,desabandoemgotículas.—Tudobem—eladissecomarconfuso.Houveummomentoconstrangedor,eentãoEddiedisse:—Precisamosandarlogo,senãovamosperderotoquederecolher.Leee Jill foramdar suasúltimas tacadase logo jáestavamdandorisadae flertando

mais umavez.Eddie continuou a observá-los com suamaneira preocupada. SóAdrianprestava atenção emmim. Percebi que ele era o único que realmente entendia o quetinhaacontecido.Seusolhosverdesmeexaminavam,semvestígiodeseuhumoramargodesempre.Maseunãomedeixeienganar.Eusabiaquedeviahaveralgumaobservaçãoespertinhaporvir,paracaçoardaminhareação.—Vocêestábem?—eleperguntoubaixinho.—Estátudobem—eudisseemevireiparaooutrolado.Nãoqueriaqueelevisse

omeu rosto.Ele já tinha vistodemais, já tinha vistoomeumedo.Eunãoqueria quenenhumdeles soubesse comoeu tinhamedo.Ouvi quandodeu alguns passos naminhadireção.—Sage...

—Medeixeempaz—soltei,ríspida.Fuiapressadaemdireçãoàsaídadocampo,certa de que ele não iria me seguir.Tinha razão. Esperei até que eles terminassem apartidaeuseiotempoquetivesozinhaparameacalmar.Quandoelesmealcançaram,eu tinha quase certeza de ter apagado a maior parte das emoções do rosto.Adriancontinuavameolhandocompreocupação,eeunãogosteinadadaquilo,maspelomenoselenãodissemaisnadasobremeuataquedenervosismo.Sem surpresa nenhuma para ninguém, a pontuação final mostrava que eu tinha

ganhado eAdrian tinha ficado emúltimo.Lee tinha ficado em terceiro, e isso pareciaincomodá-lo.—Eucostumavasermelhor—elebalbuciou,comatestafranzida.—Costumava

ser perfeito nesse jogo.— Levando em conta que ele tinha passado amaior parte dotempo prestando atenção em Jill, achei que terceiro lugar tinha sido um desempenhobemrespeitável.Deixei Lee eAdrian em casa primeiro, depois quase não consegui fazer com que

Eddie,JilleeuchegássemosaAmberwoodatempo.Àquelaalturaeujáestavamaisoumenos de volta ao normal, não que alguém fosse notar. Jill flutuava em uma nuvemquandoentramosnonossodormitório,falandosempararsobreLee.—Eunãofaziaideiadequeeleviajavatanto!Talvezelejátenhavisitadoaindamais

lugares do que você, Sydney. Ele ficame dizendo que vai me levar a todos eles, quevamospassarorestodavidaviajandoefazendotudoqueagentequiser.Eele faztodotipo de aula na faculdade porque não tem certeza em que quer se formar. Bom, nãotantoassimneste semestre.Eleestá comohorário leveparapoderpassarmais tempocomopai.Eparamimissoébom.Paranós,querdizer.Segureiumbocejoeassenti,cansada.—Issoéótimo.Elafezumapausadeondeestava,procurandoumpijamanacômoda.—Aliás,queriapedirdesculpa.Congelei.Eunãoqueriaumadesculpapelamagia.Eunemqueriamelembrardeque

aquilotinhaacontecido.— Por ter gritado com você na outra noite— ela prosseguiu.—Você não me

empurrou para cima do Lee. Eu nunca devia ter acusado você de interferir. Elerealmentesempregostoudemim,e,bom...eleéomáximo,deverdade.Solteiarespiraçãoqueestavasegurandoetenteidarumsorrisofraco.—Ficocontentequevocêestejafeliz.Elaretomoutodaalegreassuastarefas,eficoufalandosobreLeeatéeusairpara ir

aobanheiro.Antesdeescovarosdentes,fiqueiparadanafrentedapiaelaveiasmãoseos braços vez após outra, esfregando com a maior força possível para lavar as gotasmágicasdeágua,queeujuravaaindasercapazdesentir.

13

Meucelular tocou aonascerdo solnodia seguinte.Eu jáestavaempé,porestaracostumadaaacordar cedo,mas Jill rolou para o lado na cama e colocou o travesseiro em cima dacabeça.—Façaissoparar—elaresmungou.EuatendiedescobriqueEddieestavadooutroladodalinha.— Eu estou aqui embaixo — ele disse. — Pronto para treinar um pouco de

autodefesaantesquefiquequentedemais.—Vocêsvãoterquefazerissosemmim—eudisse.Estavacomasensaçãodeque

Eddie estava levandomuito a sério a promessa feita aClarencedenos treinar.Eunãosentia aquele tipo de obrigação.—Tenho uma tonelada de lição de casa para fazer.Alémdisso, tenho certezadeque a sra.Terwilliger vaime fazer sair para buscar caféparaelahoje.—Bom,entãomandeJilldescer—Eddiedisse.Eudeiumaolhadaparaocasulodecobertoresnacamadela.—Achoqueissoémaisfácilfalardoquefazer.Surpreendentemente, ela conseguiu acordar o suficiente para escovar os dentes,

tomar uma aspirina para dor de cabeça e vestir uma roupa de ginástica. Ela me deutchau,eeuprometiirvercomoelesestavamsesaindomaistarde.Nãodemoroumuitoparaasra.Terwilligerligarcomseupedidodecafé,eeumeprepareiparamaisumdiadetentarconciliarmeuprópriotrabalhocomodela.Fui até o café Spencer’s e nem reparei queTrey estava lá até parar bem na frente

dele.—É para a sra.Terwilliger?—ele perguntou, e apontou para o cappuccino com

caldadecaramelo.—Hã?— ergui os olhos.Trey era o meu atendente do caixa.—Você trabalha

aqui?

Eleassentiu.—Precisoganhardinheirodealgumjeitoparapagarasminhasdespesas.Entreguei algum dinheiro para ele e reparei que tinha me cobrado a metade do

preço.—Não leve amal,masvocênãopareceestarmuitobem—eu lhedisse.Parecia

cansado emeio desgastado. Um examemais próximomostrou que ele também tinhahematomasecortes.—É,bom,omeudiaontemfoimeiodifícil.Hesitei.Aquele era um comentário que convidava paramais conversa, e não havia

ninguémnafilaatrásdemim.—Oqueaconteceu?—perguntei,cientedequeeraaquiloqueeleesperava.Treyfranziuatesta.—AqueleimbecildoGregSladecausouamaiorconfusãonostestesparaotimede

futebolamericanoontem.Querdizer,osresultadosaindanãosaíram,masébemóbvioqueelevaificarcomaposiçãodelançador.Elepareciaumamáquina,passavaporcimadetodomundo—eleestendeuamãoesquerdaemostroualgunsdedosenfaixados.—Eletambémpisounaminhamão.EumeencolhiaomelembrardaexibiçãoatléticadescontroladadeSladenaeducação

física.Apolíticadoensinomédioeaposiçãodelançadornotimedefutebolamericanonãoeramcoisasmuitorelevantesparamim.AverdadeéquefiqueicompenadeTrey,masoquemeintrigavaeraafonteportrásdastatuagens.OsavisosdeKeitharespeitodenãocriarconfusãoretornaram,maseunãoconseguimesegurar.—Euseidastatuagens—disse.—JuliaeKristinmecontaramsobreelas.Eagora

eu sei por que você ficou desconfiado da minha... mas não é o que você pensa, deverdade.—Nãofoioqueeuouvidizer.Amaioriadaspessoasdizquevocêestáfalandoisso

porquenãoquercontarondefez.Fiqueiumpoucosurpresacomaquilo.Eu tinhaquasecertezadeque JuliaeKristin

tinhamacreditadoemmim.Seráqueelasrealmenteestavamespalhandoooposto?—Eunãofaziaideiadisso.Eledeudeombroscomumsorrisinhonoslábios.—Não sepreocupe.Eu acreditoemvocê.Há algomeio ingênuoe encantadorem

você.Nãopareceserdotipoquetrapaceia.—Ei—deiumabronca.—Eunãosouingênua.—Foiumelogio.—Háquantotempoaspessoasestãofazendoessastatuagens?—perguntei,achando

melhoresclarecerlogo.—Ouvidizerquecomeçounoanopassado.Eleentregouomeucafé,pensativo.—É,masfoinofimdoanopassado.Doanoletivo,querodizer.

—EelasvêmdeumlugarchamadoNevermore?—Peloquesei,sim.—Treymeolhoudesconfiado.—Porquê?—Sóestoucuriosa—respondicomdoçura.Dois universitários vestidos comomendigos ricos entraram na fila atrás demim e

ficaramnosolhandocomimpaciência.—Seráquepodemosseratendidos?Treylheslançouumsorrisoforçadoeentãovirouosolhosparamimenquantoeume

afastava.—Agentesevêporaí,Melbourne.VolteiparaAmberwoodeentregueiocafédasra.Terwilliger.Eunãoestavaa fim

deficaracorrentadaaelaodia todo,por issoperguntei sepodia irparaoutro lugarseficasse com o celular ligado. Ela concordou.A biblioteca tinha muita atividade e—ironicamente—muitobarulhoparaomeugosto.Euqueriaasolidãodomeuquarto.Enquanto atravessava o gramado para pegar o ônibus, avistei algumas silhuetas

conhecidasatrásdeumaglomeradodeárvores.MudeidedireçãoeencontreiJilleEddietreinando emumapequena clareira.Micah estava sentadono chãodepernas cruzadas,assistindoatudocomavidez.Eleacenouparamimquandomeaproximei.—Eunãosabiaqueoirmãodevocêseramestredekungfu—eleobservou.—Nãoékungfu—Eddiedisse,mal-humorado,semnuncatirarosolhosdeJill.—Nãofazdiferença—Micahfalou.—Éincríveldomesmojeito.Eddiedeuumgolpecomose fosseatingira lateraldocorpodeJill.Elareagiucom

bastante rapidez com um bloqueio, apesar de não tão ter sido tão rápida a ponto deimpediroataquedele.Seogolpefossepravaler,eleteriaacertado.Mesmoassim,elepareceusatisfeitocomosreflexosdela.—Muitobem.Issoteriabloqueadopartedeumgolpe,masvocêaindairiasentir.O

melhoréconseguirseabaixaredesviarcompletamente,mas issoexigeumpoucomaisdetreino.Jillassentiu,obediente.—Quandovamospodertrabalharisso?Eddie olhou para ela com orgulho. A expressão se suavizou depois de alguns

momentosdeexame.—Hoje,não.Temsoldemais.Jillcomeçouareclamareentãosedeteve.Elaestavadenovocomaquelaaparência

exaustaporcausadosol,esuavamuito.Elaolhouparaocéuporummomento,comoseestivesse implorandoparaquenosdesseumpoucodenuvens.Comoelepermaneceuinalterado,elaconcordoucomEddie.—Tudobem.Masvamosfazerdenovoamanhãnomesmohorário?Ouquemsabe

maiscedo.Outalvezhojeànoite!Seráquepodemosfazerosdois?Treinarhojeànoitequandoosolestiverbaixandoedenovopelamanhã?Vocêseincomoda?

Eddiesorriu,surpresocomoentusiasmodela.—Comovocêquiser.Jill retribuiu o sorriso e se sentou ao meu lado, colocando-se o máximo possível

embaixodasombra.Eddieficoumeolhando,cheiodeexpectativa.—Oquefoi?—perguntei.—Vocênãotinhaqueaprenderadarunssocos?Eurevireiosolhos.—Não.Quandoéqueeuvouprecisardisso?Jillmecutucoucomocotovelo.—Vailá,Sydney!Comrelutância,permitiqueEddiemedesseumaaularápidasobrecomodarsocos

semmachucaramão.Eumalpresteiatençãoeacheiquesóestavadivertindoosoutros.QuandoEddieterminouminhalição,Micahperguntou:—Ei,vocêpoderiamostraralgunsgolpesdeninjaparamimtambém?—Issonãotemnadaavercomninjas—Eddiereclamou,semparardesorrir.—

Venha.Micah se levantouemumpuloeEddieoconduziupor algunsgolpes rudimentares.

Parecia que Eddie estava sobretudo avaliandoMicah e suas capacidades.Depois de umtempo, Eddie ficou à vontade e permitiu que Micah treinasse alguns golpes ofensivosparaselivrardealgumataque.— Ei — Jill reclamou quando Eddie acertou um chute em Micah. Ele nem se

incomodou, dando de ombros comoosmeninos fazem.—Não é justo.Você nãomeacertouquandonósestávamostreinando.EddiefoipegodesurpresaosuficienteparaqueMicahconseguisseacertarumgolpe

nele.Eddielançouumolharderespeitoacontragostoparaele,eentãodisseaJill:—Aquilofoidiferente.—Porqueeusoumenina?—elaquestionou.—VocênuncaseseguravacomRose.—QueméRose?—Micahperguntou.—Outraamiga—Eddieexplicou.ParaJill,eledisse:—ERose temváriosanos

deexperiênciaamaisdoquevocê.—ElatambémtemmaisdoqueMicah.Vocêestavafacilitandoparamim.EddieficoucoradoemanteveosolhosemMicah.—Nãoestava,não—eledisse.— Estava, sim— ela balbuciou. Quando os rapazes retomaram seu embate, ela

dissebaixinhoparamim:—Comoeuvouaprenderseeletemmedodememachucar?ObserveiosdoiseanaliseioquesabiasobreEddieatéentão.—Achoqueémaiscomplicadodoqueisso.Achoqueeletambémacreditaquevocê

precisa se arriscar... pois se ele estiver fazendo um trabalho bomo bastante você nãoprecisarásedefender.

—Eleestáfazendoumótimotrabalho.Vocêtinhaquetervistoodesempenhodeledurante o ataque— o rosto dela assumiu aquele ar assombrado que sempre apareciaquandooataquequeaobrigaraaseescondereramencionado.—Mas,mesmoassim,euprecisoaprender—elabaixouavozaindamais.—Eurealmentequeroaprenderausaraminhamagiaparalutartambém,nãoqueeuvápodertreinarmuitonessedeserto.Estremeciaomelembrardesuaexibiçãonanoiteanterior.—Vaihaverocasião—eudissedemaneiravaga.Eume levanteiedissequeprecisava fazer liçãodecasa.MicahperguntouaEddiee

Jill se eles queriam almoçar. Eddie disse sim imediatamente. Jill olhou paramim embuscadeajuda.—Ésóumalmoço—Eddiedissecomumamensagemnasentrelinhas.Eusabiaque

elecontinuavaachandoMicahinofensivo.Eunãotinhacerteza,masdepoisdevercomoJill estava apaixonada por Lee, passei a achar que Micah teria de fazer algunsmovimentosbemagressivosparachegaraalgumlugar.—Tenhocertezadequevaificartudobem—eudisse.Jillpareceualiviada,eogruposeafastou.Passeiodiatodoterminandoaquelelivro

miserávelparaasra.Terwilliger.Eucontinuavaachandoqueterdecopiarosfeitiçoserituaisarcaicospalavraporpalavraeraumdesperdíciodetempo.Oúnicopropósitoqueeuvianaquiloeraque,seemalgummomentoelaprecisassefazerreferênciaaelesparasuapesquisa,elateriaumarquivodigitalfácilparachecarsemarriscarestragarolivroantigo.Estavaanoitecendoquandotermineiolivromaisorestodaminhaliçãodecasa.Jill

aindanãotinhavoltado,eeuresolviaproveitaraoportunidadeparaverificarumacoisaqueestavameincomodando.Maiscedo,JilltinhamencionadoqueEddieadefenderanoataque.Euachava,desdeo

começo, que havia algo de estranho naquele ataque inicial, algo que não estavammedizendo.Assim, entrei na rede dos alquimistas e separei tudo que tínhamos sobre osrebeldesMoroi.Naturalmente, estava tudo documentado. Nós precisávamos estar a par dos

acontecimentos principais entre os Moroi, e aquele assunto era um dos maisimportantes. De algum modo, os alquimistas tinham conseguido imagens da corteMoroi,commanifestantesenfileiradosnafrentedeumdosprédiosadministrativos.Osguardiões dampiros eram fáceis de identificar, já que se misturavam e mantinham aordem.Para aminha surpresa, reconheciDimitriBelikov—onamoradodeRose—entre os que estavam controlando amultidão.Ele era fácil de identificar porque quasesempre eramais alto do que todomundo ao seu redor.Os dampiros parecemmuitohumanos, e até eu tinha de reconhecer que ele era bem bonito. Ele tinha uma belezarústica e, até mesmo em uma fotografia, dava para ver sua ferocidade enquantoobservavaamultidão.

Outras fotografias da manifestação confirmaram o que eu já sabia. Sem dúvida, amaior parte das pessoas apoiava a jovem rainha.As pessoas contrárias a ela eram aminoria — mas eram ruidosas e perigosas. Um vídeo de um noticiário humano deDenver mostrava dois Moroi quase se metendo em uma briga de bar. Eles gritavamsobre rainhas e justiça, sendo que a maior parte daquilo não faria sentido para umobservador humano. O que fazia aquele vídeo ser especial era o sujeito que o tinhafilmado— algum humano aleatório comuma câmera de celular— afirmar ter vistocaninos em ambos os homens que discutiam. O dono do vídeo tinha apresentado suagravaçãoafirmandoquetinhapresenciadoumabrigadevampiros,masninguémlhedeumuita credibilidade.A imagem estava granulada demais para qualquer coisa aparecer.Mesmoassim,eraum lembrete sobreoquepoderia acontecer se a situaçãodosMoroificasseforadecontrole.Fui conferir a situação atual e vi que a rainhaVasilisade fato estava tentando fazer

aprovarumaleiparaqueseugovernonãodependessedaexistênciadepelomenosmaisumapessoaemsua famíliareal.Especialistasalquimistasavaliavamquedemoraria trêsmeses, que era mais ou menos o que Rose tinha dito. O número pairava na minhacabeça como uma bomba-relógio tiquetaqueando. Nós precisávamos manter Jill emsegurançadurantetrêsmeses.E,durantetrêsmeses,osinimigosdeVasilisatentariam,maisdoquenunca,pegarJill.Seelamorresse,ogovernodeVasilisa iria terminar—juntocomsuastentativasdeconsertarosistema.Noentanto,nãotinhasidonadadaquiloomotivodaminhapesquisa.Euqueriasaber

sobreoataqueinicialaJill,aquelesobreoqualninguémfalava.Oqueeuencontreinãoajudoumuito.Na época, não havia nenhum alquimista por lá, claro, demodo que asnossasinformaçõestinhamcomobaseoqueasfontesMoroihaviaminformado.Aúnicacoisa que sabíamos era que “a irmã da rainha tinha sido atacada com maldade eseveridade—mas tinha se recuperado completamente”. Pelo que eu tinha observado,aquilocertamenteeraverdade.Jillnãoapresentavasinaisdeferimentoseoataquetinhaocorrido uma semana antes de ela ir para Palm Springs. Será que isso era temposuficiente para se recuperar deum ataque com“maldade e severidade”?E será queumataquecomoaqueleerasuficienteparafazercomqueelaacordasseaosberros?Eu não sabia, mas não conseguia me livrar das minhas desconfianças. Quando Jill

voltou para o quarto,mais tarde, estava de tão bom humor que não tive coragem deinterrogá-la.Tambémme lembrei, tardedemais,deque tinha a intençãodepesquisarsobre o caso da sobrinha deClarence e suamorte bizarra com a garganta cortada.OcasodeJilltinhamedistraído.Deixeiaquestãodeladoefuidormircedo.Amanhã,penseisonolenta.Façoissoamanhã.O dia seguinte chegou bemmais rápido do que eu esperava.Acordei de um sono

profundopor alguémqueme sacudia e, poruma fraçãode segundo, o antigopesadeloestava ali, aquele em que os alquimistas me levavam embora no meio da noite.Ao

reconhecerJill,conseguisegurarmeuberro,masfoiporpouco.—Ei, ei—deiumabronca.Havia luzdo ladode fora,masera arroxeada.O sol

maltinhanascido.—Oqueestáacontecendo?Qualéoproblema?Jillolhouparamimcomorostosombrioeosolhosarregaladosdemedo.—ÉAdrian.Vocêprecisasalvá-lo.

14

—Delemesmo?

Nãoconseguimesegurar.Apiadajátinhasaídoantesqueeumedesseconta.—Não—elaseempoleirounapontadacamaemordeuolábioinferior.—Talvez

“salvar” não seja a palavra certa. Mas precisamos buscá-lo. Ele está preso em LosAngeles.Esfregueiosolhos,sentei-meeretaeespereialgunssegundos,sóparaocasodeaquilo

ser só um sonho. Não. Nada mudou. Peguei meu celular da mesinha de cabeceira eresmungueiaoveratela.—Jill,aindanãosãonemseishoras.ComeceiaquestionarseAdrianestariaacordadoàquelahora,masentãomelembrei

dequeeleprovavelmenteestavafuncionandoemhorárionoturno.Sefizessemascoisasdo seu jeito, osMoroi iriam para a camamais ou menos no horário que é o fim damanhãparaorestodenós.—Eusei—eladissecomavozbaixinha.—Sintomuito,eunãoiriapedirsenão

fosse importante. Ele pegou uma carona para lá ontem à noite porque queria veraquelas...aquelasgarotasMoroidenovo.LeedeviaestaremLosAngelestambém,porissoAdrianachouqueteriacaronaparavoltar.SóqueelenãoconseguefalarcomLee,entãoagoraelenãopodevoltar.Adrian,querodizer.Eleestápresolá,ederessaca.Comeceiavoltaradeitar.—Nãotenhomuitacompaixãoporisso.Talvezeleaprendaumalição.—Sydney,porfavor.Coloqueiumbraçopor cimadosolhos.Talvez se euparecesse estardormindo, ela

me deixaria em paz. Uma pergunta de repente surgiu naminha cabeça e eu afastei obraço.—Como você sabe disso? Ele ligou?— eu não tinha o sono superleve,mas teria

escutadoocelulardelatocar.

Jilldesviouosolhosdemim.Comatestafranzida,eumesenteiereta.—Jill?Comoéquevocêsabedessascoisas?—Porfavor—elasuspirou.—Nósnãopodemossimplesmenteirlábuscá-lo?—Nãoatévocêmedizeroqueestáacontecendo.Umasensaçãoestranhaseespalhavapelaminhapele.Jáfaziaumtempoqueeuestava

me sentindo excluída de algo importante e, naquelemomento, de repente percebi queestavaprestesadescobriroqueosMoroiestavamescondendodemim.—Vocênãopodecontarparaninguém—eladisse,efinalmentemeolhounosolhos

maisumavez.Baticomodedonatatuagemdomeurosto.—Dificilmenteeupoderiacontaralgoassimparaqualquerum.—Não,paraninguém.Nãoparaosalquimistas.NãoparaKeith.Nãoparaqualquer

umdosoutrosMoroioudampirosqueaindanãosaibam.Não contar para os alquimistas? Isso seria um problema. Entre todas as outras

loucuras da minha vida, por mais que as minhas missões me enfurecessem eindependentedo tempoqueeupassassecomosvampiros,eununca tinhaquestionadoaquemdeviaserleal.Eutinhaquecontaraosalquimistasseestivesseacontecendoalgumacoisa com Jill e com os outros. Era a minha obrigação para com eles, para com ahumanidade.Claroquepartedaminhaobrigaçãoparacomos alquimistaseracuidarde Jill, eo

que quer que a estivesse incomodando agora estava ligado a seu bem-estar. Pormeiosegundo,pensei emmentir para elamas imediatamentemandei a ideia para longe.Eunão podia fazer isso. Se eu fosse guardar o segredo dela, eu guardaria. Se não fosseguardar,entãoprecisavadizeraeladeantemão.—Eunãovoucontar—eudisse.Achoqueaspalavrassurpreenderamtantoamim

quantoaela.Jillmeexaminousobaluzfracaedeveterfinalmentechegadoàconclusãodequeeuestavadizendoaverdade.Elaassentiudevagar.—Adrianeeuestamosconectados.Tipo,comumaconexãoespiritual.Sentimeusolhossearregalaremdedescrença.—Como é que isso...— tudo de repente se encaixou, com as peças que estavam

faltando.—Duranteoataque.Você...você...—Eumorri—Jilldissesemrodeios.—Foiamaiorconfusãoquandoosassassinos

Moroichegaram.TodomundoachouqueelesestavamatrásdeLissa,por issoamaiorpartedosguardiões foirodeá-la.Eddiefoioúnicoamedefender,masnãofoirápidoosuficiente.Aquelehomem,ele...—Jillcolocouamãonocentrodopeitoeestremeceu.—Eleme apunhalou. Ele... elemematou. Foi aí queAdrian entrou na história. Eleusouoespíritoparamecurareme trazerdevolta, e agoranós temosum laço.Tudoaconteceutãorápido...Aspessoasqueestavamlánemsederamcontadoqueeletinhafeito.

A minha mente girava. Um laço espiritual. O espírito era um elementoproblemáticoparaosalquimistas,principalmenteportermostãopoucosregistrosdele.Onossomundoerafeitodedocumentoseconhecimento,demodoquequalquerlacunafazia comquenos sentíssemos fracos.Sinaisdousodeespírito tinhamsido registradosao longo dos séculos, mas ninguém tinha percebido que era um elemento por si só.Aqueles acontecimentos tinham sido registrados como fenômenos mágicos aleatórios.Apenasrecentemente,quandoVasilisaDragomirtinhaseexposto,oespíritohaviasidodescoberto,juntocomseusnumerososefeitospsíquicos.ElaeRosehaviamtidoumlaçode espírito, o único registrado na modernidade.A cura era um dos atributos maisnotáveis do espírito, eVasilisa tinha trazido Rose de volta de um acidente de carro.Aquilotinhacriadoumaconexãopsíquicaentreelas,quesósedesfezquandoRoseteveumasegundaexperiênciaquasemortal.—Você consegue enxergar dentro da cabeça dele— eu disse, sem fôlego.—Os

pensamentosdele.Ossentimentosdele.Tantas coisas começaram a fazer sentido. Como por exemplo amaneira como Jill

sempresabiatudosobreAdrian,mesmoquandoeleafirmavanãotercontadonadaparaela.Elaassentiu.—Eunãoqueroenxergar.Acrediteemmim.Masnãopossofazernada.Rosedisse

que,comotempo,euvouaprenderamecontrolarparadeixarossentimentosdeledefora,mas não consigo fazer isso ainda.E ele tem tantos, Sydney.Tantos sentimentos.Elesentetudocomtantaforça...amor,pesar,raiva.Asemoçõesdelesobemedescem,disparam por todos os lados.O que aconteceu entre ele e Rose... faz com que ele sedilacere.Às vezes é difícil se concentrar emmim com tudo isso que está acontecendocom ele. Pelo menos é só durante uma parte do tempo. Eu realmente não consigocontrolarquandoacontece.Eu não disse nada,mas fiquei pensando se alguns daqueles sentimentos voláteis não

eram parte da tendência do elemento espírito de levar as pessoas que o possuíam àloucura. Ou talvez só fosse parte da personalidade inata deAdrian.Tudo isso erairrelevante,porenquanto.—Maselenãopodesentirvocê,certo?Sófuncionaemumsentido?—euperguntei.

RoseeracapazdelerospensamentosdeVasilisaeversuasexperiênciasnodiaadia—masnãofuncionavanaoutradireção.Fiqueiachandoquefosseamesmacoisaagora,mascomoespíritonãosepodiapartirdeideiaspré-concebidas.—Certo—elaconcordou.—Éporissoquevocê...éporissoquevocêsempresabecoisassobreele.Comoas

minhasvisitas.Equandoeletevevontadedepizza.Éporissoqueeleestáaqui,porissoqueAbequeriaqueeleestivesseaqui.Jillfranziuatesta.

—Abe?Não, foimais uma escolha do grupo o fato deAdrian ter vindo para cá.Rose e Lissa acharam que seria melhor se nós dois estivéssemos juntos enquanto nosacostumávamos como laço, e eu tambémqueria que ele estivesse por perto. Por quevocêachouqueAbeestivesseenvolvido?—Hum,pornada—eudisse. Jill nãodevia ter visto a instruçãoqueAbedera a

AdrianparaqueficassenacasadeClarence.—Eusóestavaconfusaarespeitodeumacoisa.—Podemosiragora?—elaimplorou.—Eurespondiàssuasperguntas.— Primeiro, deixe-me ter certeza de que entendi uma coisa — eu disse. —

ExpliquecomoelefoipararemLosAngeleseporquenãotemcomoirembora.Jill juntou as mãos e desviou o olhar mais uma vez, um hábito que eu estava

começandoaassociaràsocasiõesemqueelasabiaquesuasinformaçõesnãoseriambemrecebidas.— Ele, hum, saiu da casa de Clarence ontem à noite. Porque estava entediado.

Pegoucaronaatéacidade...atéPalmSprings...eacaboucaindonabaladacomalgumaspessoasqueestavamindoparaLosAngeles.Então,elefoicomeles.Equandoestavaemumclube,encontrouumasgarotas...umasgarotasMoroi...efoiparacasacomelas.Edaíelepassouanoiteláemeioquedesmaiou.Atéagora.Agoraeleacordou.Equerirparacasa.ParaacasadeClarence.Comtodaessaconversadecairnabaladaegarotas,umaideiadesconcertanteestava

seformandonaminhamente.—Jill,exatamentequantodissotudovocêrealmenteexperienciou?Elaaindaevitavaomeuolhar.—Issonãoéimportante.—Paramim,é—eudisse.NanoiteemqueJilltinhaacordadochorando...Adrian

tambémestavacomaquelasgarotas.Seráqueelaestavavivendoasexperiênciassexuaisdele?—Ondeeleestavacomacabeça?Elesabequevocêestáaqui,quevocêvivetudoqueelefaz,masnuncaparapra...aimeuDeus.Oprimeirodiadeaula.Asra.Changestavacerta,nãoé?Vocêestavaderessaca.Portabela,pelomenos.E ela acordava enjoada quase todas as outras manhãs — porqueAdrian também

estavaderessaca.Jillassentiu.—Nãohavianada físicoque eles pudessem testar... como sangueou algo assim...

paraprovarqueeraisso.Masera.Eracomoseeumesmativessebebido.Eucomtodaacertezamesentiaassim.Foihorrível.Estendiobraçoevireiorostodelanaminhadireção,paraqueela fosseobrigadaa

meencarar.—Eestáagoradenovo.Haviamaisluznoquarto,jáqueosoltinhaseerguidomaisalto,eeuenxergavaos

sinaismaisumavez.Apalidezdoentiaeosolhosvermelhos.Eunãoficariasurpresaemsaber que ela também estava comdor de estômago.Abaixei amão e sacudi a cabeça,aborrecida.—Elepodeficarlá.—Sydney!—Elemerece.Euseiquevocêsente...algo...porele.—Seeraafetofraternalou

romântico, realmente não fazia diferença.—Mas você não pode ficar cuidando delecomosefosseumbebêeatenderatodopedidoqueeleenvia.—Elenãoestápedindo,nãoexatamente—eladisse.—Eusósintoqueéoqueele

quer.—Bom,eledeviaterpensadonissoantesdesemeternessaconfusão.Eleécapazde

descobrirumjeitodevoltar.—Acabouabateriadocelulardele.—Elepodepedirumtelefoneemprestadoparaalgumadas“amigas”novasdele.—Eleestáemagonia—eladisse.—Avidaéassim—eudisse.—Euestouemagonia.Suspirei.—Jill...—Não,estou falando sério.Enãoé sóa ressaca.Querdizer, sim,partedissoé a

ressaca.Ecomoeleestápassandomalsemtomarnada,amesmacoisaestáacontecendocomigo!Alémdomais...ospensamentosdele...Credo.—Jillapoiouatestanamão.—Não consigome livrarda infelicidadedele.Parece... pareceque temumamarretabatendo na minha cabeça. Não consigo evitar isso. Não consigo fazer nada além depensaremcomoeleestásesentindopéssimo!Eissomedeixapéssima.Oueuachoqueestoupéssima.Nãosei—elasuspirou.—Porfavor,Sydney.Podemosir?—Vocêsabeondeeleestá?—perguntei.—Sei.—Tudo bem, então. Eu vou — deslizei pela beirada da cama. Ela se levantou

comigo.—Eutambémvou.—Não—eudisse.—Vocêvoltapara acama.Tomealgumasaspirinaseveja se

consegue ficar melhor. — Também havia algumas coisas que eu queria dizer emparticular aAdrian. Sabia que se ela estava constantemente conectada a ele acabaria“ouvindo”anossaconversa,mas seriabemmais fácildizeraeleoqueeuqueria seelanãoestivessepresenteemcarneeosso,olhandoparamimcomaquelesolhões.—Mascomoéquevocê...—Nãoqueroquevocêfiqueenjoadanocarro.Sómeliguesealgomudarouseele

foremboraoualgoassim.

AsreclamaçõesseguintesdeJillnãoforamassimtãoimpositivas,ouporqueelanãoestavaafimousóporqueestavadispostaasesentiragradecidaporqualquerpessoaquefosse“salvar”Adrian. Ela não tinha o endereço exato,mas tinha uma descriçãomuitodetalhadadoapartamentoemqueeleestava,queeravizinhoaumhotelmuitofamoso.Quando fui ver onde ficava, descobri que o hotel na verdade se localizava em LongBeach, e isso significava que eu teria de atravessar toda a LosAngeles. Eu tinha umaviagemdeduashoraspelafrente.Ocaféseriaindispensável.Odiapelomenosestavabonito,equasenãotinhacongestionamentoassimtãocedo

nodomingo.Olhandoparaosoleparaocéuazul,fiqueipensandoemcomoserialegalse eu estivesse fazendo a viagem a bordo de um conversível, com a capota abaixada.Tambémteriasidolegalseeuestivesseviajandoporoutromotivoquenãofosseresgatarumvampirobaladeiroquenãotinhacomovoltarparacasa.Euaindaestava comdificuldadepara aceitar a ideiade Jill eAdrianunidosporum

laçodeespírito.Anoçãodequealguémpodia trazeroutrapessoadevoltadosmortosnão era algo que se conciliava bem com as minhas crenças religiosas. Era tãodesagradável quanto outra proeza do espírito: restaurar um Strigoi. Nós tambémtínhamosdoiscasosdocumentadosde issoteracontecido—doisStrigoitransformadospormagiadoespíritodevoltaasuaformaoriginal.UmdeleseraumamulherchamadaSonya Karp. O outro era Dimitri Belikov. Entre aquilo e toda essa ressurreição, oespírito realmente estava começando a me apavorar.Tanto poder assim não pareciacorreto.Cheguei a Long Beach bem dentro da minha previsão e não tive problemas para

encontraro condomínio emque ele estava. Ficava bemna frentedeumhotel à beira-marchamadoCascadia.ComoJillnãotinhaligadoparainformarnenhumamudançadelocal, supus que Adrian continuava enfurnado ali. Foi fácil encontrar lugar paraestacionarnaruaàquelahoradodia,eeufizumapausadoladodeforaparaapreciaraextensão azul acinzentada do Pacífico no horizonte a oeste. Foi de tirar o fôlego,principalmente depois da minha primeira semana no deserto de Palm Springs. Quasedesejei que Jill tivesse vindo.Talvez ficar próxima de tanta água a fizesse se sentirmelhor.Osapartamentosficavamemumprédiodeestuquecordepêssegocomtrêsandares,

duasunidadesemcadaandar.PelaslembrançasdeAdrian,Jillserecordavadeeleteridoatéo altodoprédioevirar àdireita.Retracei essespassose cheguei aumaporta azulcomumaaldravapesadadelatão.Bati.Ninguém respondeu durante quase um minuto, então tentei de novo, com mais

força. Estava prestes a fazer a terceira tentativa quando ouvi a porta ser destrancada.Umafrestaseabriueumagarotaespiouparafora.ElaeraobviamenteMoroi,comocorpomagérrimodemodelodepassarela,apele

pálidaeperfeitaquemepareceuespecialmenteirritante,levandoemcontaqueeutinha

certezadequeumaespinhairiasairnaminhatestamuitoembreve.Elatinhaaminhaidade, talvez fosse um pouco mais velha, com cabelo preto liso e olhos de um azulprofundo. Ela parecia uma espécie de boneca de outro planeta.Também estava meiosonolenta.—Oquefoi?—elameolhoudecimaabaixo.—Estávendendoalgumacoisa?PertodaquelaMoroialtaeperfeita,euderepentemesentiacanhadaedesarrumada

comminhasaiadelinhoecamisadeabotoar.—Adrianestáaqui?—Quem?—Adrian.Alto.Cabelocastanho.Olhosverdes.Elafranziuatesta.—VocêquerdizerJet?—Eu...eunãoseibem.Poracasoelefumafeitoumachaminé?Agarotaassentiu,compreensiva.—Fuma.VocêdeveestarfalandodeJet—elaolhouparatrásegritou:—Ei,Jet!

Temumavendedoraaquiquequerfalarcomvocê.—Mandeembora—respondeuumavozconhecida.AMoroiabriumaisaportaefezumsinalparaeuentrar.—Eleestánasacada.Atravessei uma sala de estar que servia como alerta do que iria acontecer caso Jill

perdessetodaanoçãodeorganizaçãoerespeitopróprio.Olugareraumdesastre.Umdesastre feminino. Pilhas de roupa suja cobriam o chão e louças usadas cobriam cadacentímetro quadrado que não estava ocupado por garrafas de cerveja vazias. Umvidrinho de esmalte caído tinha criado umamancha rosa-chiclete no tapete. No sofá,enroladaemcobertores,umagarotaMoroi loiradeuumaolhada sonolenta emmimeemseguidavoltouadormir.Fui desviando de tudo e cheguei até ondeAdrian estava, passando por uma porta

envidraçada de correr. Ele estava em pé na sacada, debruçado sobre o parapeito, decostasparamim.Oardamanhãeraquentee limpo,demodoque,naturalmente,eletentavaestragartudocomseucigarro.—Medigaumacoisa,Sage—eledissesemsevirarparamim.—Porquediabos

alguém coloca um prédio perto domar e não faz as sacadas viradas para a água? Elasforam feitas para dar vista para as montanhas atrás de nós.Amenos que os vizinhoscomecema fazer algo interessante,estouprontoparadeclararqueestaestruturaéumdesperdíciototal.Cruzeiosbraçoseolheicheiaderaivaparaascostasdele.— Fico muito contente de ter a sua opinião tão valiosa a esse respeito.Vou me

assegurar de fazer essa observação quando entrar com a minha queixa sobre ainsuficiênciadevistasparaomarparaoconselhomunicipal.

Elesevirouparatráscomumaespéciedesorrisosecontorcendoemseuslábios.—Oquevocêestáfazendoaqui?Acheiqueiaestarnaigrejaoualgodotipo.—Oquevocêacha?Estouaquiporcausadassúplicasdeumagarotadequinzeanos

quenãomereceoquevocêfazelapassar.Qualquervestígiodesorrisodesapareceu.—Ah.Elacontouparavocê—eleseviroudecostas.—Contou,evocêstodosdeviamtermecontadoantes!Issoésério...édescomunal.—Esemdúvidaéalgoqueosalquimistasadorariamestudar—davaparaimaginar

osorrisinhocínicodeleperfeitamente.—Eu prometi a ela que não vou contar.De todo jeito, vocês tinham que terme

contado.Éumainformaçãoqueeuprecisavasaber,jáquesoueuquemtemdeficardebabádetodosvocês.—“Ficardebabá”émeioexagerado,Sage.—Levandoemcontaacenaatual?Realmente,achoquenão.Adrian não disse nada, e eu fiz uma rápida avaliação dele. Usava uma calça jeans

escura de boa qualidade e uma camisa de algodão vermelha com a qual devia terdormido,ajulgarpeloamassado.Seuspésestavamdescalços.—Vocêtrouxecasaco?—perguntei.—Não.Voltei para dentro e dei uma busca no meio da bagunça.A garota Moroi loira

dormia pesado e a que tinha me deixado entrar estava esparramada em uma camadesfeitaemoutroquarto.FinalmenteencontreiasmeiaseossapatosdeAdrianjogadosem um canto. Eu me apressei em pegar tudo, voltei para fora e joguei no chão dasacada,aoladodele.—Coloqueisto.Estamosdesaída.—Vocênãoéminhamãe.—Não,asuaestácumprindopenaporperjúrioeroubo,semelembrobem.Foiumacoisamuito,muitomaldosadedizer,masaomesmotempoeraaverdade.

Eserviuparachamaraatençãodele.A cabeça deAdrian se virou para trás em um gesto brusco.A raiva brilhava nas

profundezasdeseusolhosverdes;eraaprimeiravezqueeuviaaquilodeverdadenele.—Nuncamaisvolteafalardela.Vocênãofazideiadoqueestádizendo.Araivadeleeraumpoucointimidadora,maseufiqueifirme.— Na verdade, fui eu a responsável por encontrar os registros que ela havia

roubado.—Elateveseusmotivos—eledisseentredentes.—Você tem tanta disposição para defender uma pessoa que foi condenada por um

crimee,noentanto,nãotemnenhumaconsideraçãoporJill...quenãofeznada.—Tenhomuita consideraçãopor ela, sim!—Ele fezumapausapara acenderum

cigarro comasmãos trêmulas edesconfiei que tambémestava tentando controlar suasemoções.—Pensonelaotempotodo.Comoéquepoderianãopensar?Elaestáaqui...Eunão consigo sentir,mas ela está sempre aqui, sempre escutando as coisas naminhacabeça, escutando coisas que eu nem quero que ela escute. Sentindo coisas que eu nãoqueroqueelasinta.—Eletragouocigarroesevirouparaolharavista,apesardeeuduvidarqueeleestivesseenxergandoalgumacoisa.— Se você tem tanta consciência dela, então por que faz coisas assim?— Fiz um

gesto para o entorno.—Como é que você é capaz de beber se sabe que isso a afetatambém?Comofoicapazdefazer—eudissecomumacareta—ascoisasquefezcomessasgarotas,sabendoqueelaeracapazde“ver”?Elatemquinzeanos.—Eusei,eusei—elerespondeu.—Eunãosabiasobreabebida...nãonocomeço.

Quandoela foi atéacasadeClarencedepoisdaescolaemecontou,euparei.Pareideverdade.Masdaí...quandovocêsforamlánasexta,eladisseparaeubeber,porqueerafimdesemana.Achoqueelanãoestavamuitopreocupadaempassarmal.Por isso,eudisseamimmesmo:“Sóvou tomaralgumas”.Sóque,ontemànoite, foimaisdoqueisso. E daí as coisas ficaram meio loucas, e eu vim parar aqui e... o que eu estoufazendo?Nãotenhoquejustificarasminhasaçõesparavocê.—Não acho que você possa justificá-las para ninguém— eu estava furiosa. Meu

sanguefervia.—Olhasóquemfala,Sage—eleapontouumdedoacusatórioparamim.—Pelo

menos eufaço algumacoisa.Mas e você?Vocêdeixaomundo seguir em frente semasuaparticipação.FicaaíparadaenquantoaqueleimbecildoKeithtratavocêfeitomerda,esósorrieconcorda.Vocênãotemamor-próprio.Nãorevida.AtéovelhoAbepareceter vocêna palmadamão. Será queRose estava certa quandodisse que ele tinha algocontra você?Ou seráqueele é apenasmais alguémcontraquemvocênão consegue seopor?Eumeesforceimuitoparanãodeixartransparecercomoaquelaspalavrastinhamme

atingidofundo.—Vocênãosabenadasobremim,AdrianIvashkov.Eurevidosim,emuito.—Quaseacreditei.Lanceiumsorrisocontidoparaele.— Eu só não faço um espetáculo quando demonstro oposição. Isso se chama ser

responsável.—Claro.Qualquercoisaqueteajudeadormirtranquilaànoite.Jogueiasmãosparaoalto.—Bom, esta é a questão: eu não durmomais à noite porque tenho que vir salvar

vocêdesuaprópriaestupidez.Podemosiremboraagora?Porfavor?Comoresposta, ele apagouocigarroe começoua calçar asmeias eos sapatos.Ele

ergueu os olhos para mim ao fazer isso, já totalmente sem raiva. Os humores dele

mudavamcomtantafacilidadecomosefossemacionadosporuminterruptordeluz.—Vocêprecisametirardelá.DacasadeClarence—avozdeleerafirmeeséria.

—Eleéumsujeitobembacana,masvouenlouquecersetiverqueficarlá.—Estácomparandocomoseucomportamentoexcelentequandonãoestálá?—Dei

umaolhadaparaoapartamentoatrásdemim.—Talvezassuasduasfãstenhamlugarparavocê.—Ei,tenhaumpoucoderespeito.Elassãopessoasdeverdadeetêmnome.Carlae

Krissy—elefranziuatesta.—OuseráqueeraMissy?Eususpirei.—Eujádisseantes,nãotenhocontrolenenhumsobreassuasacomodações.Porque

étãodifícilassimparavocêarrumarumlugarparamorar?Porqueprecisademim?—Porqueeunãotenhoquasedinheironenhum,Sage.Omeuvelhomecortou.Ele

medáumamesadaquemalpagaosmeuscigarros.Penseiemsugerirqueeleparassedefumar,masessenãoseriaumrumoútilparaa

nossaconversa.—Sintomuito.Deverdade.Seeupensaremalgo,digoparavocê.Alémdomais,

poracasoAbenãoquerquevocêfiquelá?—resolviabrirojogo.—Euouvivocêsdoisconversandonoprimeirodia.Elepediuparavocêfazeralgoparaele.Adrianseendireitoucomossapatoscalçados.— É, eu não sei que negócio é esse.Você ouviu como ele foi totalmente vago

também?Acho que ele só está tentando sacanear comigo, quer me manter ocupadoporque, em algum lugar daquele coração ferrado dele, ele se sente mal pelo queaconteceucom...Adrianfechouaboca,maseupudeouvironomequenãofoiproferido: Rose.Uma

tristezaterrívelpassoupeloseurosto,eseusolhospareceramperdidosemelancólicos.Eume lembrei de quando estava no carro com Jill e ela tinha falado algo sobreRose,sobrecomoalembrançadelaatormentavaAdrian.Sabendooquesabiaagoraarespeitodolaço,fiqueicomasensaçãodequehaviamuitopoucodeJillnaquelaspalavras.Aquelatinha sido uma linha direta com Adrian. Olhando pra ele, eu mal conseguiacompreenderoalcancedaquelador,etambémnãosabiacomoajudar.Eusósabiaquederepente tinha compreendido um pouquinhomelhor por que ele queria tanto afogar asmágoas,nãoqueissoajudasseatornarovíciomaissaudável.—Adrian—eudissesemjeito.—Eu...—Deixeparalá—eledisse.—Vocênãosabeoqueéamaralguémdaquelejeitoe

depoispegaremesseamorejogaremdevoltanasuacara...Umgritode furaros tímpanosderepentecortouoar.Adrianseencolheumaisdo

queeu,comprovandooladonegativodaaudiçãodevampiro:sonsirritanteseramaindamaisirritantes.Emuníssono, corremospara dentrodo apartamento.A garota loira estava sentada

ereta no sofá, tão sobressaltada quanto nós.A outra garota, que tinha aberto a portaparamim, estava parada na frente do quarto, pálida como amorte, com um celularapertadonamão.—Qualéoproblema?—perguntei.Elaabriuabocapara falareentãomeolhoudecimaabaixoduasvezes,parecendo

lembrarqueeuerahumana.—Tudobem,Carla—Adriandisse.—Elasabesobrenós.Podeconfiarnela.IssoeratudodequeCarlaprecisava.ElasejogounosbraçosdeAdrianecomeçoua

chorardemaneiradescontrolada.—Ah,Jet—eledisseentresoluços.—Nãoacreditoqueaconteceucomela.Como

foiqueissoaconteceu?—Oqueaconteceu?—aoutragarotaMoroiperguntoueselevantoucambaleante.

Assim como Adrian, parecia que ela tinha dormido com aquela roupa. Ousei teresperança de que Jill não tivesse sido submetida a tanta indecência quanto eu tinhaimaginadooriginalmente.— Conte para nós o que aconteceu, Carla—Adrian disse com um tom de voz

gentilqueeusóotinhavistousarpertodeJill.—Eu sou aKrissy— ela fungou.—E a nossa amiga... a nossa amiga...—Ela

enxugouosolhosquandomaislágrimascaíram.—Acabeidereceberaligação.Anossaamiga...outraMoroiqueestudananossafaculdade...elamorreu.—Krissyergueuosolhosparaaoutragarota,queagoraeupresumiserCarla.—FoiMelody.ElafoimortaporumStrigoiontemànoite.Carlaengoliuemsecoecomeçouachorar,causandomaislágrimasemKrissy.Olhei

paraAdrian, nós dois estávamos boquiabertos.Mesmoque não soubéssemos quem eraessa tal deMelody, um assassinato por Strigoi continuava sendo uma coisa terrível etrágica. Minha mente de alquimista entrou em ação imediatamente. Eu precisavagarantir que a cena do crime estivesse protegida e que o assassinato fossemantido emsegredodoshumanos.—Onde?—euperguntei.—Ondefoiqueaconteceu?—EmWestHollywood—Carlarespondeu.—Atrásdeumclubequalquer.Eurelaxeiumpouco,apesardeaindaestarabaladaporaquelatragédiatoda.Erauma

região movimentada e cheia de gente, que com toda a certeza estaria no radar dosalquimistas. Se algumhumano tivesse descoberto, os alquimistas já teriamdado contadoassuntohámuitotempo.—Pelomenoselanão foi transformada—Carladisse,desamparada.—Elapode

descansar em paz. Claro que os monstros não foram capazes de deixá-la em paz semmutilarseucorpo.Fiqueiolhandofixamente,sentindo-megelada.—Comoassim?

ElaesfregouonariznacamisadeAdrian.—Melody.Elesnãosóbeberamosanguedela.Tambémcortaramsuagarganta.

15

AdriandormiuduranteboapartedocaminhodevoltaaPalmSprings.ParecequeabaladatardedanoitecomCarlaeKrissytinharesultadoemmuitopoucodescanso.Pensarnissomedeixoupouco àvontade.Pensarque Jill tinhapassadopor isso atravésdelemedeixavaenjoada.Havia muito pouco que pudéssemos fazer por Carla e Krissy, a não ser oferecer

nossascondolências.AtaquesdeStrigoiaconteciam.Eratrágicoeterrível,masaúnicamaneiraqueamaiorpartedosMoroitinhaparaseprotegereraexercercautela,manterosarredoressegurosesemprequepossível terguardiõesporperto.ParaosMoroiquenãopertenciamàrealezaequeestudavampelomundo,comoCarlaeKrissy,guardiõesnãoeramumaopção.MuitosMoroiseviravamassim;sóprecisavamtercuidado.As duas consideraram as circunstâncias relativas à morte da amiga terríveis. Era

verdade.Erammesmo.Masnenhumadasduaspensoumuitoalémdissonemachouquehouvessealgoestranhonofatodeagargantatersidocortada.Eutambémteriaagidodamesma maneira se não tivesse ouvido o relato de Clarence a respeito da morte dasobrinha.LeveiAdrianatéAmberwoodcomigoeocoloqueinalistadevisitantes,achandoque

Jilliriasesentirmelhorseovissepessoalmente.E,éclaro,elaestavaànossaesperanoalojamento quando chegamos. Ela o abraçou e lançou umolhar agradecido paramim.Eddie estava comela e, apesar de não dizer nada, havia uma expressão exasperada emseu rosto que demonstrava que eu não era a única a achar que o comportamento deAdrianeraridículo.—Euestavatãopreocupada—Jilldisse.Adrianbagunçouocabelodela,gestoqueafezseafastar.—Nadacomque sepreocupar,ChavedeCadeia.Desdequeessa camisapossa ser

passadaparadesamassar,nãoaconteceunadaderuim.Não aconteceu nada de ruim, pensei, sentindo a raiva esquentar dentro de mim.

Nada de ruim, tirando o fato de que Jill teve que assistirAdrian ficando com outrasgarotasalémdeaguentarseuconsumoexcessivodeálcool.Nãofaziadiferençaseaquedadela por Lee havia superado sua antiga queda porAdrian. Ela simplesmente era novademaisparatestemunharumacoisadaquelas.Adriantinhasidoegoísta.—Agora—Adrian prosseguiu—, se Sage puder fazer a gentileza de continuar

comochofer,convidotodomundoparaalmoçar.—Acheiquevocênãotivessedinheironenhum—observei.—Eudissequenãotenhomuitodinheiro.JilleEddieseentreolharam.—Nós,hum,íamosnosencontrarcomMicahparaalmoçar—Jilldisse.—Tragameletambém—Adrianfalou.—Assimelepodeconhecerafamília.Micahchegouumpoucodepoiseficoucontenteemconheceronossooutro“irmão”.

EleapertouamãodeAdrianesorriu.— Agora estou vendo uma certa semelhança na família. Estava começando a

imaginarseJilleraadotada,masvocêsdoissãoparecidos.—OnossocarteironaDakotadoNortetambém—Adriandisse.—Do Sul— corrigi. Felizmente,Micah não pareceu achar que houvesse algo de

estranhonodeslize.—Certo—Adriandisse.EleexaminouMicah,pensativo.—Háalgofamiliarem

você.Nósjánosconhecemos?Micahsacudiuacabeça.—EununcaestivenaDakotadoSul.TivequasecertezadeouvirAdrianmurmurar“entãosomosdois”.—Nósdevíamosirandando—Eddieseapressouemdizeresedirigiuparaaporta

doalojamento.—Precisotiraroatrasodaliçãodecasamaistarde.Eu franzi a testa, confusa com amudança de atitude. Eddie não eramau aluno, de

jeito nenhum, mas tinha ficado óbvio para mim, desde que tínhamos chegado aAmberwood,queelenãotinhaomesmointeressepelaescolaqueeu.Aqueleeraumanorepetido para ele, e ele se contentava em representar seu papel e só fazer o que fosserealmentenecessárioparamanterasaparências.Sealguémmaisconsiderouocomportamentodeleestranho,nãodemonstrou.Micah

já estava falando com Jill sobre alguma coisa eAdrian ainda parecia estar tentandodescobrirdeondeconheciaMicah.AofertagenerosadeAdriandepagaroalmoçosóseestendiaafast-food;porisso,anossarefeiçãofoirápida.Mas,depoisdeumasemanadecomida do refeitório, a mudança foi bem-vinda, e já fazia tempo queAdrian tinhadeixadoclarassuasopiniõesarespeitodacomida“saudável”deDorothy.—Vocêdeviaterpedidoumarefeiçãoinfantil—Adrianmedisseapontandoparao

meu hambúrguermeio comido e o resto dasminhas batatas fritas.—Vocême teriafeitoeconomizarmuitodinheiro.Eaindateriaganhadoumbrinquedo.

—“Muito”émeioexagerado—eudisse.—Alémdomais,vocêagoratemsobrasparaajudarcomasuasobrevivência.Elerevirouosolhoseroubouumabatatinhadomeuprato.—Évocêquedevia levarosrestosparacasa.Comoéqueconsegue funcionarcom

tãopoucacomida?—elequestionou.—Umdiadesses,vaisairvoandocomovento.—Parecomisso—eudisse.— Só estou constatando um fato — ele disse e deu de ombros. —Você podia

engordarunsbonscincoquilos.Fiqueiencarando-o,incrédula,chocadademaisparadarqualquerresposta.Oqueum

Moroipodiafalarsobreganhodepeso?Elestinhamasilhuetaperfeita.Nãosabiamoqueeraseolharnoespelhoeveralgoinadequado,nuncasesentirboaosuficiente.Paraeles,issonãoexigianenhumesforço;jáparamim,pormaisqueeumeesforçasse,pareciaqueeununcaconseguiriameequipararasuaperfeiçãoinumana.Os olhos deAdrian se voltaram para onde Jill, Eddie e Micah conversavam bem

animadossobretreinarmaisautodefesajuntos.—Eles sãomeio fofos—Adrian disse com um tom de voz apenas para osmeus

ouvidos. Ele ficou brincando com o canudo enquanto examinava o grupo.—TalvezCastiletivessecertarazãoempermitirqueelanamorassenaescola.—Adrian—resmunguei.—Brincadeirinha—eledisse.—Leeprovavelmenteiriadesafiá-loparaumduelo.

Elenãoconsegueparardefalarsobreela,sabe?Quandonósvoltamosdominigolfe,Leesó ficou repetindo:“Quando nós podemos sair de novo?”. E, no entanto, ele sumiu dafacedaterraquandoestavaemLosAngeleseeuprecisavadele.—Vocês tinham combinado de se encontrar?—perguntei.—Ele tinha dito que

levariavocêdevoltaparacasa?—Não—Adrianreconheceu.—Masqueoutracoisaelerealmenteestavafazendo?NaquelemomentoumhomemdecabelogrisalhopassoueesbarrounacadeiradeJill

enquanto equilibrava uma bandeja de hambúrgueres e refrigerantes. Nada derramou,mas Eddie se levantou de umpulo com a velocidade da luz, pronto para saltar para ooutroladodamesaedefendê-la.Ohomemrecuouebalbuciouumpedidodedesculpas.Adriansacudiuacabeça,surpreso.— É só fazer com queele seja o acompanhante sempre que ela sair com qualquer

um,enósnuncavamosterquenospreocupar.SabendosobreolaçoentreAdrianeJill,pudeobservarosensodeproteçãodeEddie

sob uma luz diferente.Ah, claro, eu sabia que seu treinamento de guardião tinhainstauradoneleessanatureza,mas semprepareciahaveralgoumpoucomais forteali.Algo quase... pessoal. No começo, fiquei imaginando se talvez fosse porque Jillsimplesmentefaziapartedeseucírculomaisamplodeamizades,comoRose.Agora,euficavapensandoque talvez fossemaisdoque isso. Jill tinhaditoqueEddie eraoúnico

que tinha tentado protegê-la na noite do ataque. Ele falhou, provavelmente mais porfaltadetempodoquedehabilidade.Masquetipodemarcaissodeviaterdeixadonele?Eleeraalguémcujaúnicarazãona

vida eradefenderoutraspessoas—e teveque assistir alguémmorrer sob sua guarda.AgoraqueAdrianatinhatrazidodevoltaàvida,seráqueeraquasecomoumasegundachanceparaEddie?Umaoportunidadedeseredimir?Talvezfosseessaasuarazãodesertãovigilante.—Vocêparececonfusa—Adriandisse.Eusacudiacabeçaesuspirei.—Achoquesóestoupensandodemaisemtudo.Eleassentiu,solene.—Éporissoquenuncatentofazerisso.Umaquestãoanteriorsurgiunaminhamente.—Ei,porquevocêdisseparaaquelasgarotasqueoseunomeeraJet?— É uma prática padrão quando você não quer que uma garota encontre você

depois,Sage.Alémdomais,acheiqueestivesseprotegendoestanossaoperação.—É,masporqueJet?Porquenão...seilá...TravisouJohn?Adrianmelançouumolharparadizerqueeuestavadesperdiçandootempodele.—PorqueJetéumnomedecaradurão.Depoisdoalmoço,devolvemosAdrianàcasadeClarenceeorestantedenósvoltou

aAmberwood.JilleMicahforamfazeroquetinhamparafazer,eeuconvenciEddieaircomigoparaabiblioteca.Lá,nósocupamosumamesaeeupegueimeulaptop.—Então,nósdescobrimosumacoisainteressantequandofuibuscarAdrianhoje—

disseaEddie,usandominhavozbaixadebiblioteca.Eddiemeolhoufeio.—ApostoqueaexperiênciatodadebuscarAdrianfoiinteressante...pelomenosde

acordocomoqueJillmecontou.—Poderia ter sidopior—especulei.—Pelomenos ele estava vestidoquandoeu

cheguei.EsóhaviaduasoutrasMoroi lá.Eunãomedepareicomumacasacheiadelasnemnadaassim.Issoofezrir.—ProvavelmentevocêteriatidomaisdificuldadeemtirarAdriandeláseessefosse

ocaso.A tela do meu laptop se acendeu e ganhou vida, e eu dei início ao processo

complicadodeentrarnobancodedadossupersegurodosalquimistas.—Bom,quandonósestávamossaindo,agarotacomquemeleestavadescobriuque

umaamigadelastinhasidomortapelosStrigoinanoiteanterior.TodoohumorsumiudorostodeEddie.Seusolhosendureceram.—Onde?

—Em LosAngeles, não aqui— completei. Eu devia ter sidomais esperta e nãocomeçaraconversa semafirmarantescomclarezaqueelenãoprecisava saircorrendoparaprocurarStrigoipelocampus.—Atéondesabemos,todomundotemrazão...osStrigoinãoestãoafimdecircularporPalmSprings.Eddieficoucercadeumporcentomenostenso.—Mas o negócio é o seguinte...— prossegui.— Essa garotaMoroi... a amiga

delas...supostamentefoimortadomesmomodoqueasobrinhadeClarence.AssobrancelhasdeEddieseergueram.—Comagargantacortada?Assenti.—Issoéestranho.Temcertezadequefoiissomesmoqueaconteceu...comasduas?

Querdizer,nóssóestamosconfiandonorelatodeClarence,certo?Eddieficoubatendocomumlápisnamesaenquantorefletiasobreaquestão.—Clarenceébemlegal,maspor favor...Todossabemosqueelenãobatebemda

cabeça.—Éporissoqueeutrouxevocêaqui.Eéporissoqueeuqueriaconsultarestebanco

dedados.NósacompanhamosamaiorpartedasmortesrelacionadasaStrigoi.Eddie olhou por cima do meu ombro quando eu puxei um texto sobreTamara

Donahuedecincoanosantes.Eláestavaainformação:elatinhasidoencontradacomagarganta cortada.Outra busca sobreMelody Croft— a amiga de Krissy e Carla—tambémrevelouumrelatóriodanoiteanterior.Meupessoaltinhachegadorapidamenteaolocaleenviadoasinformaçõescomrapidez.AgargantadeMelodytambémtinhasidocortada.Haviaoutros relatos sobre assassinatos ligados aosStrigoi emLosAngeles—afinaldecontas,aquelaeraumacidadegrande—,massódoisseencaixavamnoperfil.—Você ainda está pensando sobre o que Clarence disse... sobre os caçadores de

vampiros?—Eddiemeperguntou.—Nãosei.Sóacheiquevaliaapenaconferir.—Osguardiõesderamsuaopiniãoemambososcasos—Eddiedisseeapontoupara

a tela.—Eles tambémdeclararamque foram ataques dos Strigoi... sangue foi tiradodasduas garotas.É issoqueos Strigoi fazem.Não seioqueos caçadoresdevampirosfazem,masnãoachoquebebersanguesejapartedeseusobjetivos.—Eutambémnão.Masnenhumadasgarotasperdeutodoosangue.— Os Strigoi nem sempre bebem todo o sangue das vítimas. Principalmente se

forem interrompidos.Estagarota,Melody, foimortapertodeumclube, certo?Querdizer,seoassassinodelaouviualguémseaproximar,simplesmentefugiu.—Achoquesim.Maseessenegóciodecortaragarganta?Eddiedeudeombros.—Temos toneladas de relatos sobre Strigoi que fazem coisasmalucas. É só olhar

para Keith e o olho dele. Eles são maldosos. Não dá para entender logicamente suas

ações.—Hum, vamos deixar o olho dele fora disso.— Keith não era um caso que eu

desejasse discutir. Eu me recostei na cadeira e suspirei. — É só que tem algo meincomodandonesses assassinatos.O sanguemeiobebido.Agarganta cortada. Sãoduascoisasestranhasqueaconteceramjuntas.Eeunãogostodecoisasestranhas.—Entãovocêestánaprofissãoerrada—Eddiedisse,maisumavezsorridente.Euretribuíosorriso,aindarevirandotudonacabeça.—Achoquesim.Comoeunãodissemaisnada,elemelançouumolharcurioso.—Vocênãopensarealmente...nãoachaquecaçadoresdevampirosexistam,acha?—Não,naverdadenão.Nãotemosevidênciasparapensarqueelesexistam.—Mas...—Eddieofereceu.—Mas—eudisse.—Poracasoaideianãodeixavocêumpoucoapavorado?Quer

dizer, agora você sabe no que deve prestar atenção. Outros Moroi. Strigoi. Eles sedestacam. Mas você imagina um caçador de vampiros humano? — Fiz um gestoindicando os alunos reunidos na biblioteca. —Você não iria saber distinguir umaameaça.Eddiesacudiuacabeça.—Naverdade,ébemfácil.Bastatratartodoscomoameaça.Eu não sabia dizer se isso fazia eu me sentir melhor ou não. Quando voltei ao

alojamento,maistarde,asra.Weathersmechamou.—Asra.Terwilligerdeixouumacoisaaquiparavocê.—Elatrouxealgoparamim?—perguntei,surpresa.—Nãoédinheiro,é?—Até

agora,nenhumdoscafésqueeucompraratinhasidoreembolsado.Comoresposta, a sra.Weathersmeentregouum livroencadernadoemcouro.No

começo,acheiqueeraomesmoqueeutinhaacabadodeterminar.Entãoexamineiacapamaisdepertoe li“Volume2”.Um post-itamarelopresoao

livro trazia a caligrafia fina da sra.Terwilliger:“Próximo”. Suspirei e agradeci à sra.Weathers.Eufariaqualquercoisaqueaminhaprofessorapedisse,masestavatorcendoumpoucoparaelamedarumlivroquefossemaisrelatohistóricoemenosreceitasdefeitiços.Enquanto caminhava pelo corredor, ouvi algumas exclamações assustadas na outra

ponta. Vi uma porta aberta e algumas pessoas aglomeradas ao redor dela. Passeiapressadapelomeupróprioquartoefuiverqualeraoproblema.EraoquartodeJuliaede Kristin.Apesar de eu não ter certeza se realmente tinha o direito, forcei minhapassagementrealgumasmeninas.Ninguémmedeteve.Vi Kristin deitada na cama, contorcendo-se com violência. Ela suavamuito e suas

pupilasestavamtãodilatadasquemaldavaparaver a íris. Juliaestava sentadaao ladodela na cama, junto commais duasmeninas que eu não conhecia bem. Ela ergueu os

olhosquandoeumeaproximei,comoolharcheiodemedo.—Kristin?—exclamei.—Kristin,estátudobemcomvocê?—Comonãohouve

resposta,eumevireiparaasoutras.—Oqueaconteceucomela?Ansiosa,JuliavoltouadobrarumatoalhinhaúmidaeacolocounatestadeKristin.—Nãosabemos.Elaestáassimdesdehojedemanhã.Eufiqueiencarando,incrédula.—Entãoelaprecisairaomédico!Precisamoschamaralguémagora.Vouchamara

sra.Weathers...—Não!—Juliaselevantouemumpuloepegouomeubraço.—Nãopodefazer

isso. O motivo por que ela está assim... bom, nós achamos que é por causa datatuagem.—Tatuagem?UmadasoutrasmeninaspegouopulsodeKristineovirouparaqueeupudessevera

partededentro.Ali,tatuadaemtintacordecobrereluzente,haviaumamargarida.EumelembreidequeKristinqueriafazerumatatuagemcelestial,mas,peloqueeusabia,elanãotinhadinheiroparaisso.—Quandofoiqueelafez?—Hoje, mais cedo— Julia disse. Ela parecia envergonhada.— Eu emprestei o

dinheiroparaela.Fiqueiolhandoparaaquelaflorfaiscante,tãolindaedeaparência inofensiva.Eunão

tinha dúvidas de que ela era a causa da crise.A substânciamisturada à tinta para darbaratonãoestavareagindodamaneiracorretacomosistemadela.—Elaprecisadeummédico—eudissecomfirmeza.—Nãopodefazer isso.Vamosterquecontaraelessobreastatuagens—agarota

que segurava amão deKristin disse.—Ninguém acreditou emTrey,mas se vissemalgoassim...bom,podemacabarcomtudonaNevermore.Quebom!Eupensei.Mas,paraaminha surpresa, aspalavrasdela foramrecebidas

com acenos de cabeça afirmativos das outrasmeninas reunidas. Será que elas estavamloucas?Quantasdelastinhamaquelastatuagensridículas?Eseráqueprotegê-laseramaisimportantedoqueprotegeravidadeKristin?Juliaengoliuemsecoesesentounabeiradadacama.—Nós estávamos esperando que fosse passar.Talvez ela precise de um tempinho

paraseacostumar.Kristingemeu.Umadaspernasdelatremiacomoseestivessesofrendoumespasmo

musculareentãoparou.Seusolhoscomsuaspupilasdilatadasolhavamparaonadaesuarespiraçãoerasuperficial.—Jápassouumdiainteiro!—observei.—Gente,elapodemorrer.—Comoéquevocêsabe?—Juliaperguntou,surpresa.Eunãosabia,nãocomcerteza.Mas,devezemquando,astatuagensdosalquimistas

também não davam certo. Em noventa e nove por cento dos casos, o corpo humanoaceitava o sangue de vampiro usado em uma tatuagem de alquimista, permitindo quesuaspropriedadesseinfundissemnasnossas,maisoumenoscomoumdampirodebaixograu. Nós obtínhamos vigor e vida longa, apesar de não adquirirmos as habilidadesfísicas incríveis que os dampiros possuíam. O sangue era diluído demais para isso.Mesmo assim, sempre havia uma pessoa que ocasionalmente passavamal por causa deuma tatuagemdealquimista.Osangueasenvenenava.Erapior aindaporqueoouroeoutras substâncias químicas funcionavam para fazer com que o sangue se infundisse àpele,demodoquenuncativessecomosair.Quemnãorecebiatratamento,morria.Sanguedevampironãocausavabaratoeufórico,porissoeunãoachavaquehouvesse

algum naquela tatuagem. Mas o tratamento que nós usávamos para as tatuagens dosalquimistasconsistiaemdissociaroscomponentesmetálicosdastatuagensparaliberarosangue,permitindoentãoqueo corpoo limpassenaturalmente.Euprecisava acreditarque o mesmo princípio se aplicava ali. Só que eu não conhecia a fórmula exata docomposto dos alquimistas e nem tinha certeza se conseguiria dissociar o cobre comoaconteciacomoouro.Mordiolábio,pensando,efinalmentetomeiumadecisão.—Jávolto—disseaelasedispareiparaomeuquarto.Duranteotempotodo,uma

voz intername repreendiapelaminha tolice.Eunão tinhanadaque tentar fazeroqueestavaprestesafazer.Deviairdiretofalarcomasra.Weathers.Emvezdisso,abriaportadomeuquartoeencontreiJillcomseulaptop.— Oi, Sydney — ela disse e sorriu. — Estou conversando por mensagem

instantânea com Lee e... — Ela olhou para mim com mais atenção. — Qual é oproblema?Eu liguei omeu próprio laptop e coloquei na cama. Enquanto ele ia começando a

carregar, peguei uma maleta de metal que preparei com todo cuidado, mas que nãoachavaqueiriausar.—Vocêpodepegarumpoucodeáguaparamim?Rápido?Jillhesitousóporuminstanteantesdeassentir.—Jávolto—eladisseesaiudacamaemumpulo.Quando ela saiu do quarto, abri a maleta com uma chave que sempre carregava

comigo.Dentrodelahaviapequenasquantidadesdevárioscompostosdosalquimistas,ostiposdesubstânciasquemisturávamoseusávamoscomopartedonossotrabalho.Haviaumagrandequantidadede alguns ingredientes—comoos que euusavaparadissolvercorposdeStrigoi.Deoutros,eusótinhaamostras.Meu laptopterminoude ligareeuentreinobancodedadosdosalquimistas.Depoisdealgumasbuscas,encontreiafórmuladotratamentoantitatuagem.FoiaíqueJillvoltou,trazendoumacanecacheiadeágua.—Seráque istoéosuficiente?Senósestivéssemosemoutroclima,eupoderia ter

puxadodoar.—Estáótimo—eudisse,contentepeloclimamantê-laafastadadamagia.Dei uma olhada na fórmula, analisando quais ingredientes faziam o quê.

Mentalmente, descartei aqueles que tinha certeza que eram específicos para o ouro.Também não tinha alguns deles, mas tinha quase certeza de que só tratavam odesconfortodapeleenãoeramfundamentais.Comeceiatiraringredientesdomeukit,medindocomcuidado—apesardecontinuarfazendotudocomamaiorrapidezpossível—emoutra caneca. Fiz as substituições necessárias e adicionei um ingrediente que eutinha certeza que iria desmembrar o cobre, mas cuja quantidade necessária tive quesupor. Quando terminei, peguei a água de Jill e adicionei a mesma quantidade dasinstruçõesoriginais.Oresultadofinaleraumlíquidoquepareciasoluçãodeiodo.Ergui a caneca eme senti umpouco como se fosseuma cientistamaluca. Jill tinha

me observado sem fazer comentários, sentindo a urgência. Seu rosto estava cheio depreocupação,maselaestavaengolindotodasasperguntasqueeusabiaquequeriafazer.ElameseguiuquandoeusaídoquartoevolteiparaodeKristin.Haviamaismeninasládoqueantes,esinceramenteeraummilagreasra.Weathersnãoestarescutandotodaaquela algazarra.Paraumgrupo tãodedicadoaproteger suaspreciosas tatuagens, elasnãoestavamagindocommuitadiscrição.RetorneiàcabeceiradeKristineaencontreinomesmoestado.—Mostreopulsodeladenovoesegureobraçoomais imóvelpossívelparamim.

— Não dirigi a ordem para ninguém específico, mas falei com força suficiente parasaberque alguém iriaobedecer.Estava certa.—Senão funcionar, vamos chamarummédico—meutomdevoznãodeixavaespaçoparadiscussão.JuliapareciamaispálidadoqueJill,masmedeuumacenofracocomacabeçapara

concordar. Peguei a toalhinha que ela estava usando e molhei na minha caneca. Naverdade, eu nunca tinha visto ninguém fazer isso, e precisei tirar minhas própriasconclusõesarespeitodecomoaplicar.FizumaoraçãosilenciosaepressioneiatoalhinhacontraatatuagemnopulsodeKristin.Ela soltou um grito estrangulado e seu corpo todo corcoveou. Duas garotas que

estavampertoajudaramasegurá-laporinstinto.Fiosdefumaçasaíamdeondeeuestavasegurandoatoalhinhacontraapeledela,esentiumcheiropungenteeacre.Espereiumaquantidadedetempoquejulgueiadequadaefinalmenteremoviatoalhinha.Amargaridabonitinhasetransformavaperanteosnossosolhos.Suaslinhasdefinidas

começaram a escorrer e ficar borradas. A cor de cobre começou a mudar, foiescurecendoparaumverdeazulado.Empoucotempo,odesenhoestavairreconhecível.Eraumamanchaamorfa.Aoredordela,vergõesapareceramnapele,maspareciamserumairritaçãosuperficial,enãoalgoperigoso.Aindaassim,acoisatodapareciaterrível,eeufiqueiencarando,horrorizada.Oque

eutinhafeito?

Todasasoutrasgarotasestavamemsilêncio,semsaberoquefazer.Algunsminutosse passaram, mas pareceram horas. De repente, Kristin parou de se contorcer.Arespiraçãodelaaindapareciadifícil,maselapiscoueseusolhosentraramemfoco,comose ela estivesse vendo omundo pela primeira vez. Suas pupilas continuavam enormes,maselaconseguiuolharaoredorefinalmentefocaremmim.—Sydney—eladissesemfôlego.—Obrigada.

16

Expliquei a minha experiência química dizendo que era apenas uma substância que eu tinhaguardada da época em que fizera a minha tatuagem, para o caso de ter uma reaçãoalérgica.Certamentenãoreveleiqueeumesmaatinhapreparado.Achoqueelasteriamacreditado nessa história se não fosse pelo fato de que, alguns dias depois, eu conseguicolocarasmãosemuma fórmulaparaajudara tratarasqueimadurasquímicasnapelede Kristin.A mistura não ajudou em nada com a mancha de tinta — parecia serpermanente, a não ser que fosse removida com o uso de laser —, mas os vergõesmelhoraramumpouco.Depois disso, começou a correr o boato de que Sydney Melrose era a nova

farmacêutica de plantão.Como tinha sobrado creme depois de usar emKristin, dei oresto para umamenina que tinha um problema sério de acne, porque também serviapara isso.Aquiloprovavelmentenãomeajudouemnada.Aspessoascomeçaramameprocurarpara tratar todotipodecoisaeaté seofereceramparapagar.Algunspedidoseram inúteis,comocuraparadordecabeça.Paraessaspessoas,eu simplesmentediziaque comprassem aspirina. Outros pedidos estavam fora do meu alcance e não eramcoisasqueeuquisessetratar,comoevitargravidez.Tirandoospedidosestranhos,eunaverdadenãomeincomodavacomoaumentodas

minhas interações sociais diárias. Estava acostumada às pessoas precisando de mim,entãoaqueleeraumterritórioconhecido.Algumaspessoassimplesmentequeriamsabermais sobremimcomopessoa,oqueeraumanovidademais agradáveldoqueeuacheiqueseria.E,aindaassim,outraspessoasqueriam...coisasdiferentesdemim.—Sydney.Euestavaesperandoaminhaauladeinglêscomeçarefiqueiassustadaaoverumdos

amigos de Greg Slade de pé na frente da minha carteira. O nome dele era Bryan, eapesardeeunãotermuitas informaçõessobreele,nãomepareciaser tão insuportávelquantoSlade,oqueeraumpontoafavordeBryan.

—Pois não?—perguntei, imaginando se ele queria pegar asminhas anotações deaulaemprestadas.Ele tinha cabelo castanho despenteado que parecia ter sido cortado daquele jeito de

propósito, e na verdade era bembonitinho. Passou amão no cabelo enquanto escolhiasuaspalavras.—Vocêsabealgumacoisasobrefilmesmudos?—Claro—respondi.—Osprimeirosforamfeitosnofinaldoséculo xixeàsvezes

eram acompanhados pormúsica ao vivo,mas o som só foi realmente incorporado aosfilmesnadécadade1920,eissotornouosfilmesmudosobsoletos.Bryanficoudequeixocaído,comoseaquilofossemaisdoqueestavaesperando.—Ah.Certo.Bom,hum,temumfestivaldecinemamudonocentrodacidadena

semanaquevem.Oquevocêachadeir?Balanceiacabeça.— Não, acho que não. Eu respeito o cinema mudo como forma de arte, mas

realmentenãogostomuitodeassistir.—Hum.Tudobem—elevoltouacolocarocabeloparatrásedeuparaverqueele

estavatentandoteralgumaideia.Porquediaboseleestavameperguntandosobrefilmesmudos?—QuetalStarship30?Estreianasexta.Querassistir?—Naverdade,tambémnãogostodeficçãocientífica—respondi.Eraverdade,eu

achavaaquilocompletamenteimplausível.Bryanpareciaprontoparaarrancartodoaquelecabelodesgrenhado.—Temalgumfilmeemcartazquevocêquerver?Repasseinacabeçaumalistadosfilmesqueestavampassando.—Não.Naverdade,não.Osinaltocou,Bryansacudiuacabeçaevoltouaseafundaremsuacarteira.—Quecoisaestranha—balbuciei.—Eletemmaugostoparafilmes.OlheiparaoladoefiqueisurpresadeverJuliacomacabeçaabaixadasobreamesa,

tremendodetantorirsemfazerbarulho.—Oquefoi?—Aquilo—elarespondeu,semfôlego.—Foihilário.—Oquê?—pergunteidenovo.—Porquê?—Sydney,eleestavaconvidandovocêparasair!Eurepasseiaconversa.—Não,nãoestava.Estavafazendoperguntassobrecinema.Eladavatantarisadaqueprecisouenxugarumalágrima.—Parapoderdescobrirdoquevocêgostavaelevarvocêparasair!—Bom,entãoporqueelesimplesmentenãofalou?—Vocêétãoingênuaeadorável—eladisse.—Esperoestarporpertonodiaem

quevocêdefatorepararquetemalguéminteressadoemvocê.

Continuei sementendernadaeelapassouorestodaaula tendoataquesespontâneosderiso.Enquantome transformava em objeto de fascínio, a popularidade de Jill ia caindo.

Parte disso se devia à própria timidez dela. Ela continuava tão acanhada e preocupadacom o fato de ser diferente que partia do princípio de que todos reparavam em suaestranheza também.Ela continuounão se conectando às pessoas pormedo, e isso faziacomqueparecessearredia.A“licençamédica”deJillfinalmentetinhasidoenviadapelosalquimistas, e isso, surpreendentemente, fez as coisas piorarem.A escola não quiscolocá-la em uma optativa diferente cujas aulas já tivessem começado. Alunos doprimeiro ano não podiam sermonitores, comoTrey. Depois de uma consulta com asrta.Carson, finalmente ficoudecididoque Jill iriaparticipardeatividades internasdeeducação física e fazer“tarefas alternativas” quando as atividades fossem externas. Issogeralmente significava fazer relatórios sobre coisas como a história do beisebol.Infelizmente, o fato de ela ficar separada do resto da turma só serviu para isolar Jillaindamais.Micahcontinuavaadaremcimadela,mesmodiantedasadversidades.— Lee me mandou uma mensagem de texto hoje de manhã— ela me disse no

almoçoumdia.—Elequermelevarparajantarnofimdesemana.Vocêacha...querdizer, eu sei que vocês também teriam que ir...— ela deu uma olhada incerta entremimeEddie.—QueméLee?—Micah perguntou.Ele tinha acabadode se sentar comonosso

grupo.Algunsmomentosdesilêncioconstrangedorseinstalaram.—Ah—Jilldisseedesviouosolhos.—Eleé,hum,umcaraqueagenteconhece.

Elenãoestudaaqui.Estánafaculdade.EmLosAngeles.Micahprocessouainformação.—Eleconvidouvocêparasair?—Convidou...naverdade,nós jásaímos juntosantes.Achoquenósestamosmeio

quenamorando.— Não é nada sério— Eddie se intrometeu. Eu não tinha certeza se ele estava

dizendoissoparapouparossentimentosdeMicahousehaviaalgumanoçãodeproteçãoali,paraimpedirqueJillseaproximassedemaisdequalquerpessoa.Micah era bom em esconder seus sentimentos, admito.Depois de pensarmais um

pouco,elefinalmentelançouumsorrisoaJillquesópareciaumpoucoforçado.—Bom,issoéótimo.EsperoqueeupossaconheceresseLee.Depois disso, a conversa se voltou para o jogo de futebol americano que estava se

aproximando,eninguémmaisvoltouamencionaronomedeLee.FicarsabendodaexistênciadeLeefezMicahpassaraagirdemaneiradiferenteperto

deJill,maselecontinuavaandandoconoscootempotodo.Talveztivesseaesperançade

que Lee e Jill terminassem. Ou poderia ser simplesmente porque Micah e Eddiepassavam muito tempo juntos, e Eddie era um dos poucos amigos de Jill. Mas oproblemanãoeraMicah.EraLaurel.EuachavaqueMicahnão iria se interessarporela,mesmoqueJillnãoestivesseno

meio,mas ela continuava vendo Jill como ameaça—e fazia de tudopara acabar comela.Espalhouboatossobreelaefaziacomentáriosespecíficospeloscorredoresedurantea aula sobre a pele pálida da menina, sua altura e sua magreza — as maioresinsegurançasdeJill.Umaou duas vezes ouvi o nomeGarotaVampira sussurrado pelos corredores. Isso

faziameusanguegelar,pormaisqueeulembrasseamimmesmaqueerapiada.— Não é Jill quem mantém Laurel e Micah separados — observei para Julia e

Kristin um dia. Elas ficavam surpresas com os meus esforços contínuos para aplicarlógica e racionalidade aos comportamentos sociais na escola.— Eu não entendo. ElesimplesmentenãogostadeLaurel.— É, só que fica mais fácil para ela pensar que o problema é Jill, quando, na

verdade,onegócioéqueLaureléumavacaeMicahsabedisso—Juliaexplicou.DesdeaminhainteraçãosemjeitocomBryan,elaeKristintinhamassumidoatarefadetentarmeeducaremrelaçãoàsmaneirascomooshumanos“normais”secomportavam.—Alémdomais,Laurelsimplesmentegostadeteralguémcomquemimplicar—

Kristin disse. Ela raramente falava sobre a tatuagem, mas tinha ficado mais séria esóbriadesdeoacontecimento.—Certo—respondi,tentandoacompanharalógica—,masfui euquemdisseque

elatingiaocabelo.Elamaldirigiuumaúnicapalavraparamim.Kristinsorriu.—Não tem amenor graça implicar comvocê.Você responde. Jill não se defende

muitoetambémnãotemmuitagenteparadefendê-la.Elaéumalvofácil.Pelomenosumacoisapositivaaconteceu.Adrianestavasecomportandobemdepois

dodeslizedeLosAngeles,maseuficavameperguntandoquantotempoaquiloiadurar.Com base no que eu tinha apreendido com Jill, ele continuava entediado e infeliz. Ohorário de Lee era irregular e, de todomodo, não era função dele cuidar deAdrian.Parecianãohavernenhumaboasoluçãopara isso,deverdade.SeAdriancediaaosseusvícios, ela sofria o efeito de suas ressacas e de seus “interlúdios românticos”. Se nãocedia, então ele ficava arrasado, e essa atitude também ia tomando conta dela aospoucos.Aúnicaesperançaqueeles tinhameraque Jillno fimaprendesse a controlar asituação e fosse capaz de bloqueá-lo de suamente,mas pelo que Rose tinha dito, issopodiademorarmuitotempo.Quandochegouahoradofornecimentoseguinte,fiqueidecepcionadaaoverocarro

deKeithestacionadonafrentedacasadeClarence.Seelerealmentenãofossefazernadapara ajudarnaquelamissão,preferiaqueele ficasse longedeumavez.Aparentemente,

ele achava que essas visitas de“supervisão” contavam como trabalho e continuavam ajustificar sua presença. Só que, na hora em que nos encontramos comAdrian na sala,Keithnãoestavaàvista.NemClarence.—Ondeelesestão?—pergunteiaAdrian.Eleestavaestiradonosofáelargouumlivroqueestavalendo.Tiveasensaçãodeque

lereraumaatividaderaraparaeleequasemesentimalpela interrupção.Ele segurouumbocejo.Nãohavia álcool àvista,maseuvioquepareciamser três latasvaziasdebebidaenergética.Eledeudeombros.—Nãosei.Devemestarconversandoporaí.Oseuamigotemumsensodehumor

doentio.AchoqueeleestáalimentandoaparanoiadeClarencerelativaaoscaçadoresdevampiros.Euolhei sem jeitoparaLee, que imediatamente começou a conversar com Jill.Os

doisestavamtãoenvolvidosumcomooutroquenemperceberamsobreoqueorestode nós estava conversando. Eu sabia o quanto a conversa sobre caçadores de vampirosincomodavaLee.ElenãogostariadesaberqueKeithestavaincentivandootema.—Clarenceestá sabendodoassassinatoemLosAngeles?—Eddieperguntou.Não

havia razãoparaqueKeithnão soubesse, jáqueera informaçãoabertaaosalquimistas,maseunãosabiadizerseelefariaaconexãoparaClarenceounão.— Ele não mencionou se sabia—Adrian respondeu.— Juro que Keith só está

fazendoissoportédiooualgodotipo.Nemeuafundeitantoassim.—Éissoquevocêtemfeitoemvezdeseembebedar?—pergunteiaomesentarna

frentedele,apontandoparaasbebidasenergéticas.— Ei, não é vodca nem conhaque nem... bom, qualquer coisa que seja boa —

Adrian suspirouevirouuma lataparabeberasúltimasgotas.—Então,medêalgumcrédito.Eddiedeuumaolhadanaslatas.—Jillporacasonãodissequetinhatidodificuldadeparadormirontemànoite?—Adrian—eudissecomumgemido.Eddietinharazão.EutinhareparadoqueJill

tinha ficado se agitando na cama o tempo todo. Uma enorme quantidade de cafeínaexplicariaisso.— Ei, eu estou tentando—Adrian disse.— Se você conseguir me tirar daqui,

Sage,daínãovouserforçadoaafogarasmágoasnataurinaenoginseng.—Elanãopodefazerisso,Adrian,evocêsabemuitobem—Eddiefalou.—Será

quenãodáparavocê...seilá.Encontrarumpassatempooualgoassim?—Serencantadoréomeupassatempo—Adrianrespondeu,obstinado.—Eusoua

vidadequalquerfesta...mesmosembeber.Nãofuifeitoparaficarsozinho.—Vocêpodiaarrumarumemprego—Eddiedisseeseacomodouemumacadeira

decanto.Ele sorriu, surpresocomaprópriaesperteza.—Vai resolverambosos seus

problemas...podeganharalgumdinheiroeestarpertodeoutraspessoas.Adrianrevirouosolhos.—Cuidado,Castile.Sóháumcomediantenestafamília.Eumeendireitei.—Naverdade,nãoémáideia.—Éumapéssimaideia—AdriandisseeolhoudemimparaEddie.—Porquê?—perguntei.—Éestaaparteemquevocênosdizqueas suasmãos

nãoforamfeitasparaexecutartrabalhospesados?—Émais a parte emque eu digo que não tenho nenhuma contribuição a oferecer

paraasociedade—eleretrucou.—Eupossoajudar—ofereci.—Você vai trabalhar e me dar o pagamento? —Adrian perguntou, cheio de

esperança.—Porqueissorealmentepoderiaajudar.—Eupossodaruma caronapara as entrevistas—respondi.—Eposso fazer um

currículoparaquevocêconsigaqualqueremprego.—Olheiparaeleereconsiderei.—Bom,dentrodoslimites.Adrianvoltouaserecostar.—Desculpe,Sage.Simplesmentenãoestousentidofirmeza.Clarence e Keith entraram bem naquele momento. O rosto de Clarence estava

exuberante.—Obrigado,obrigado—eleiadizendo.—Étãobomconversarcomalguémque

compreendeasminhaspreocupaçõesarespeitodoscaçadores...EunãotinhamedadocontadequeKeithnãocompreendianadaalémdesuaprópria

natureza egoísta. O rosto de Lee se fechou quando ele percebeu que Keith estavaalimentandoairracionalidadedaquelesenhordeidade.Aindaassim,oMoroisegurouoscomentários que sem dúvida tinha vontade de fazer. Era a primeira vez que eu viaqualquer tipo de emoção sombria no rosto de Lee. Parecia que Keith era capaz dedesanimaratéapessoamaisalegre.Clarence ficou feliz em nos ver, assim como Dorothy. Os humanos que davam

sangueparavampirosnãoeramnojentosapenasporcausadoatoemsi.Oqueeramaisapavorante era o vício que resultava disso. Os vampiros soltavam endorfinas paraaqueles de quem se alimentavam, endorfinas que criavam uma espécie de baratoagradável.Os fornecedoreshumanosqueviviamentreosMoroipassavamdias inteirosnessaviagemeacabavamse tornandomuitodependentes.AlguémcomoDorothy,quevivia apenas com Clarence havia anos, não tinha experimentado mordidas suficientespararealmenteseviciar.Agora,comJilleAdrianporperto,Dorothyestavarecebendoumaquantidademaiordeendorfinasnodiaadia.Seusolhos se iluminaramquandoelaviuJill,mostrandoqueestavaansiosapormais.— Ei, Sage—Adrian disse.— Eu não quero entrevista nenhuma,mas será que

vocêpodemedarumacaronaparaeucomprarcigarro?Comeceiadizeraelequenão iriacontribuircomumvíciotão imundo,masentão

repareiqueeleolhavademodosignificativoparaDorothy.Seráqueeleestavatentandometirardali?Fiqueimeperguntando.Queriamedarumadesculpaparanãoestarporperto na hora do fornecimento? Pelo que eu entendia, os Moroi normalmente nãoescondiamseusfornecimentosunsdosoutros.JilleDorothycostumavamsimplesmentesairdasalaparamedeixarmaisàvontade.Eusabiaqueelasprovavelmentefariamissomais uma vez,mas resolvi aproveitar a oportunidade de cair fora.Claro que dei umaolhadaemKeithparaconfirmar,achandoqueele iriareclamar.Elesódeudeombros.Pareciaqueeueraaúltimacoisaqueeletinhanacabeça.—Tudobem—eudisseemelevantei.—Vamos.Nocarro,Adriansevirouparamim.—Mudeideideia—eledisse.—Aceitoasuaajudaparaarrumarumemprego.Quaseperdiocontroledadireçãoebatiocarro.Poucascoisasvindasdelepoderiam

ter me surpreendido mais — e ele dizia coisas bem surpreendentes com bastanteregularidade.—Issofoirápido.Estáfalandosério?—Comonuncafaleiantes.Aindaquermeajudar?—Acho que sim,mas não posso fazermuita coisa. Não posso de fato arrumar o

empregopara você.—Repasseiminha listamental do que eu sabia sobreAdrian.—Acreditoquevocênãotenhaideiadoquerealmentegostariadefazer,tem?—Queroalgodivertido—elerespondeu.Elepensoumaisumpouco.—Equero

ganharmuitodinheiro...mastrabalhandoomínimopossível.—Queadorável—balbuciei.—Issolimitaasopções.Nóschegamosaocentroeeuconsegui fazerumabalizaperfeitaparaestacionarque

nãooimpressionounemdelongeotantoquedeveriaterimpressionado.Estávamosbemna frente de uma loja de conveniência e eu fiquei esperando enquanto ele entrou.Assombras da noite estavam caindo. Eu saía do campus o tempo todo,mas até agora asminhasviagenstinhamsidoatéacasadeClarence,camposdeminigolfeourestaurantesde fast-food. Acontece que a cidade de Palm Springs era muito bonita. Lojas erestaurantes enchiam as ruas e eu podia passar horas só observando as pessoas.Aposentados com roupa de jogar golfe caminhavam ao lado de socialites cheias deglamour. Eu sabia quemuitas celebridades também frequentavamo local,mas eu nãoeraligadaosuficientenomundodoentretenimentoparasaberquemeraquem.—Cara—Adrian disse ao sair da loja.— Subiram o preço daminhamarca de

sempre.Tivequecomprarumavagabunda.— Sabe — eu disse. — Parar de fumar também seria uma maneira ótima de

economizarumpouco...Fiquei paralisada quando avistei algo rua abaixo.A três quarteirões de distância,

através das folhas de algumas palmeiras, eu mal enxerguei uma placa que diziaNevermore em letras góticas rebuscadas. Era o tal lugar.A fonte das tatuagens quecorriamàsoltaemAmberwood.DesdeoincidentedeKristin,euqueria irmaisfundonaquelaquestão,masnãosabiamuitobemcomo.Agoraeutinhaaminhachance.Porummomento,lembreideKeithmedizendoparanãomeenvolveremnadaque

pudesse chamar a atenção ou causar problemas. Então pensei sobre o jeito queKristinficara durante sua overdose.Era aminha oportunidadede realmente descobrir algumacoisa.Tomeiumadecisão.—Adrian—eudisse.—Precisodasuaajuda.Euopuxeinadireçãodoestúdiodetatuagemenquantoexplicavaasituação.Porum

momento,elepareceutãointeressadoemtatuagensquedavambaratoqueeuacheiqueiaquererfazeruma.MasquandoconteiaelesobreKristin,seuentusiasmoarrefeceu.—Mesmo que não seja tecnologia dos alquimistas, estão fazendo algo perigoso—

expliquei.—Não só aKristin.Aquilo que Slade e os outros garotos fazem... usandoesteroidesparasedarbemnofutebol...tambémémuitoruim.Temgentequeacabasemachucando—eupensei,derepente,noscortesehematomasdeTrey.Umpequenobecoseparavaoestúdiodetatuagemdeumrestaurante,enósparamos

diantedele.Umaportaseabriudentrodobeco,doladodoestúdio,eumhomemsaiueacendeuumcigarro.Elesótinhadadodoispassosquandooutrohomemenfiouacabeçaparaforadaportalateralechamou:—Quantotempovocêvaidemorar?Viprateleirasemesasatrásdele.— Só vou até o mercado — disse o homem com o cigarro. —Volto em dez

minutos.Ooutrosujeitovoltouparadentroefechouaporta.Algunsmomentosdepois,nóso

vimospelavitrinedaloja,arrumandoalgonobalcão.—Precisoentraraliatrás—eudisseaAdrian.—Poraquelaporta.Elearqueouasobrancelha.—Comoassim?Vocêvaiinvadir?Masquecoisamaissorrateiradasuaparte.E,ah,

sabecomoé...perigosaetola.— Eu sei — respondi, surpresa por parecer tão calma ao admitir isso. — Mas

precisodescobriralgumacoisa,eestapodeseraminhaúnicachance.—Entãoeuvoucomvocê,paraocasodeaquelesujeitovoltar—eledissecomum

suspiro.—QuenuncaninguémpossadizerqueAdrianIvashkovnãoajudadonzelasemperigo.Além domais, você viu a cara dele? Parecia ummotoqueiro insano.Os doispareciam.—Não quero que você... espere— tive uma ideia.—Vá você conversar com o

sujeitoqueestáládentro.—Hã?

—Entrepelafrente.Façacomqueelefiquedistraídoparaeupoderdarumaolhada.Falecomelesobre...seilá.Vocêvaipensaremalgo.Nós logo traçamos um plano.MandeiAdrian entrar enquanto me esgueirava pelo

becoemeaproximavadaporta.Puxeiamaçanetaeviqueestava...trancada.—Claroquesim—resmunguei.Queestabelecimentocomercialiriadeixaraberta

umaporta tão isoladaeexposta?Meuplanobrilhantecomeçoua sedesfazer atéeumelembrardequetinhaminhasferramentas“essenciais”dealquimistanabolsa.Era raro euprecisar dokit completo, a não ser quandoocorriamcrises de acnena

escola, por isso costumava deixá-lo em casa.Os alquimistas estavam sempre prontos,independentemente do lugar, para encobrir qualquer aparição de vampiro. Por isso,semprelevávamosalgumascoisasconosco.UmadelaseraasubstânciacapazdederreterocorpodeumStrigoiemmenosdeumminuto.Aoutratinhaquaseamesmaeficiênciaparaderretermetal.Era um tipo de ácido que eu guardava em uma ampola protegida na bolsa. Bem

rápido, eu a encontrei e tirei a tampa.Umcheiro amargo saiudela eme fez torceronariz. Com o conta-gotas de vidro da garrafinha, me abaixei com muito cuidado ecoloquei algumas gotas bem nomeio da fechadura. Imediatamente dei um passo paratrásquandoumanévoabrancaseergueucomocontato.Emtrintasegundos,tudotinhase dissipado e havia um buraco no meio da maçaneta da porta. Uma das vantagensdaquela substância, chamada fogo-rápido, era que sua reação ocorria com extremarapidez.Agorajáestavainerteenãorepresentavaperigoparaaminhapele.Empurreiamaçanetaparabaixoeelacedeu.Abriumafrestadaportasóparaconferirsenãohavianinguémporali.Não.Estava

vazio. Eume esgueirei para dentro, fechei a porta atrás demim sem fazer barulho eprendiumatrancainternaparagarantirquepermaneceriafechada.Comoeutinhavistodoladodefora,olugareraumadespensaondetodosostiposdeinstrumentosparafazertatuagens ficavam guardados. Havia três portas ao meu redor. Uma levava a umbanheiro,outraparaumasalaescuraeaúltimaparaafrentedalojaeobalcãoprincipal.Vinhaluzdessaporta,eeuconseguiaescutaravozdeAdrian.—Um amigomeu fez uma— ele ia dizendo.—Eu vi, e ele disse que foi aqui.

Vamoslá,nãomeenrole.—Desculpe— foi a respostamal-humorada.—Não faço ideia do que você está

falando.Lentamente, comecei a examinar os armários e as gavetas, lendo rótulos e

procurandoalgosuspeito.Haviamuitassubstânciasepoucotempo.—Oproblemaédinheiro?—Adrianperguntou.—Porqueeutenhobastante.Só

medigaquantocusta.Houveuma longapausa, e fiquei torcendoparaqueohomemnãopedisse aAdrian

paramostrarodinheiro,jáqueoquesobraraelehaviadoadoparasuacampanhaafavor

docâncer.—Não sei—o sujeito finalmente disse.—Se eu pudesse fazer essa tatuagemde

cobredequevocêestá falando... enãoestoudizendoqueposso...vocêprovavelmentenãoteriadinheiroparapagar.—Estoudizendoquetenho—Adrianrespondeu.—Ésódizeropreço.—Noqueexatamentevocêestáinteressado?—ohomemperguntoudevagar.—Só

nacor?—Achoquenósdois sabemosa resposta—Adriandisse, ardiloso.—Euqueroa

cor.Euqueroos efeitos-bônus.Eeuqueroquefiqueincrível.Vocêprovavelmentenemiriaconseguirfazerodesenhoqueeuquero.—Essaéamenordassuaspreocupações—osujeitogarantiu.—Façoissoháanos.

Consigodesenharqualquercoisaquevocêquiser.—Ah é?Você consegue desenhar um esqueleto andando demoto com fogo saindo

dela? E quero um chapéu de pirata no esqueleto. E um papagaio no ombro dele. Umpapagaio-esqueleto.Ouquemsabeumpapagaio-esqueletoninja?Não,issoseriaexagero.Mas seria legal se o motoqueiro-esqueleto pudesse atirar algunsshurikens. Queestivessempegandofogo.Nessemeio-tempo, eu aindanão tinha encontrado sinal daquilo que euprecisava, e

havia mais um milhão de cantinhos e reentrâncias para serem examinados. O pânicocomeçouacrescerdentrodemim.Nãodariatempo.Entãoavisteioquartoescuroemeapressei até ele. Dei uma olhada rápida para a frente da loja, acendi a luz e prendi arespiração.Ninguémdeviaterreparadoemnada,porqueaconversacontinuoudeondetinhaparado.—Essaéacoisamaisridículaqueeujáouvi—otatuadordisse.—Nãoéoqueasmoçasvãodizer—Adrianrespondeu.— Olhe, garoto — o sujeito disse. — O problema nem é dinheiro. É

disponibilidade. Issoquevocêdescreveuexigemuita tinta, enão tenho tanta assimemestoque.—Bom,equandoéapróximaentregadoseufornecedor?—Adrianperguntou.Fiqueiolhandofixamente,aturdidacomoquehaviaencontrado:euestavanasalaem

que as tatuagens eram feitas.Havia uma espreguiçadeira— bemmais confortável doque a mesa em que eu tinha recebido aminha tatuagem — e uma mesinha lateralcobertacominstrumentosquepareciamrecém-utilizados.—Játenhoalgumaspessoasnalistadeespera.Nãoseiquandovaichegarmais.—Seráquevocêpoderiameavisarquandosouber?—Adrianpediu.—Voudeixar

omeucontatocomvocê.MeunomeéJetSteele.Senãofossepelasituaçãotensa,teriasoltadoumgrunhido.JetSteele?Sériomesmo?

Antes que eu pudesse pensar muito a respeito, finalmente encontrei o que estavaprocurando.Apistoladetatuagemnamesatinhaseuprópriorecipientedetinta,masao

lado havia várias ampolasmenores.Todas estavam vazias,mas algumas ainda tinhamum resíduometálico dos ingredientes suficiente parame ajudar a descobrir o que era.Semnempensarduasvezes,comeceiatampá-losecolocarnabolsa.Aliperto,repareiem algumas ampolas lacradas cheias de um líquido escuro. Fiquei paralisada por uminstante.Comcuidado,pegueiuma,abriecheirei.Eraoqueeutemia.Volteiafecharatampaecoloqueiasampolasnabolsa.Naquele instante ouvi um barulho atrás de mim.Alguém estava tentando abrir a

porta dos fundos. Mas eu tinha fechado a tranca, e ela não cedeu. Ainda assim,significavaqueaminhaespionagemtinhachegadoaofim.Euestavafechandoozíperdabolsaquandoouviaportadafrenteseabrir.—Joey,porqueaportadosfundosestátrancada?—umavozirritadaindagou.—Sempreficatrancada.—Não,atrancaestavafechada.Pordentro.Nãoestavaquandoeusaí.Eraadeixaparaeuirembora.Apagueialuzemeapresseipeladespensa.—Espere!—Adrianexclamou.Haviaumtomdeansiedadenavozdele,comose

estivesse tentandochamar a atençãode alguém.Fiquei coma sensaçãodesagradáveldequeosdoissujeitosquetrabalhavamaliestavamsedirigindoparaos fundosparaveroque tinha acontecido.— Preciso sabermais uma coisa sobre a tatuagem. Será que opapagaiotambémpodeusarchapéudepirata?Tipoemminiatura?—Aguardeummomento.Precisamosconferirumacoisa.—Avozestavamaisalta

doqueantes.Maispróxima.Asminhasmãos se atrapalharampara soltar a tranca.Conseguidestrancare abri a

porta,disparandopara forano exatomomento emqueouvi vozes atrásdemim.Semfazernenhumapausaouolharparatrás,fecheiaportaesaícorrendopelobecoatéarua,devolta ao lugaronde tinhaestacionado.Eu tinhaquase certezadequeos sujeitosnãotinhammevistodireito.Achoqueeuerasóumasilhuetadisparandoportaafora.Aindaassim,fiqueicontentecomamultidãopelasruas.Pudememisturaràspessoasenquantovoltava a atenção para o carro e abria a porta.As minhas mãos estavam suadas etremiamenquantoeuremexianaschaves.Eu queria muito olhar para trás, mas tinha medo de atrair a atenção dos dois

homens, se estivessem à minha procura na rua. Enquanto não tivessem razão paradesconfiardemim...Umamãoagarrouomeubraçoderepenteemepuxou.Engoliemseco.—Soueu—disseumavoz.Adrian.Solteiumsuspirodealívio.—Nãoolheparatrás—eledissecomcalma.—Apenasentrenocarro.Obedeci. Quando nós dois estávamos em segurança lá dentro, respirei fundo,

atordoada com as batidas fortes do meu coração.A adrenalina liberada pelo medoencheuomeupeito,comtantaforçaquedoeu.Fecheiosolhosemeinclineiparatrás.

—Foipormuitopouco—eudisse.—Evocêsesaiumuitobem,aliás.—Eusei—elerespondeu,todoorgulhoso.—E,naverdade,achoquequerofazer

essatatuagemagora.Vocêencontrouoqueestavaprocurando?Abriosolhosesuspirei.—Encontrei.Emuitomais.—Então,oqueé?Estãocolocandodrogasnastatuagens?—Pior—respondi.—Estãousandosanguedevampiro.

17

Aminhadescoberta elevouoproblemada tatuagemaumnívelcompletamentediferente.Antes,euacreditavaquesóestivesse lidandocompessoasqueusavamtécnicassemelhantesaosmétodos dos alquimistas para exporAmberwood às drogas.Tinha sido uma questãomoral.Agora, com sangue de vampiro na equação, passava a ser uma questão dosalquimistas. Toda nossa razão de ser era proteger os humanos da existência dosvampiros. Se alguém estava colocando sangue de vampiro em humanos de maneirailícita, tinha extrapolado os limites que nos esforçávamos muito, todos os dias, paramanter.Eu sabiaquedevia fazerumrelatório sobre aquilo imediatamente.Se alguém tinha

colocado asmãos em sangue de vampiro, os alquimistas precisavam enviar uma forçapara cá para investigar. Se eu seguisse a hierarquia normal, acho que deveria contar aKeithepermitirqueelecontasseaosnossos superiores.Mas seelecontasse,não tenhodúvidasdequetomariaparasiocréditodadescoberta.Eunãopodiapermitirque issoacontecesse—enãoporquequisesseaglóriaparamim.HaviaalquimistasdemaisqueacreditamerroneamentequeKeitheraumapessoadecaráter.Eunãoqueriaalimentaressacrença.Mas, antes de fazer qualquer coisa, precisava descobrir o resto do conteúdo das

ampolas. Eu podia fazer suposições a respeito dos resíduos metálicos, mas não tinhacerteza se, assim como o sangue, eles tinham vindo diretamente do catálogo dosalquimistas ou eram apenas imitações. E se fossem mesmo as nossas fórmulas, nãoficaria óbvio à primeira vista qual era qual. O pó prateado em uma ampola, porexemplo, poderia ser um entre vários compostos dos alquimistas. Eu tinha meios defazer algumas experiências para descobrir, mas uma substância estava me deixandoconfusa. Era um líquido transparente e um pouco grosso, sem cheiro específico. Euachava que era o narcótico usado nas tatuagens celestiais. Sangue de vampiro nãocausaria aquelebarato, apesarde ser capazde explicar a disposição atléticamalucadas

chamadastatuagensdeaço.Porisso,comeceiafazerostestespossíveisenquantoseguiacomasrotinasnormaisdaescola.Estávamos jogando basquete em uma quadra fechada naquela semana na educação

física,por issoJillestavaparticipando—esendosubmetidaaoscomentáriosmordazesde Laurel. Eu ficava ouvindo quando ela dizia coisas como: “Achava que ela iria sermuitomelhor, já que é tão alta. Ela praticamente toca na cesta sempular.Talvez eladevessesetransformaremmorcegoevoaratélá”.Fiz uma careta.Tinha que ficar repetindo amimmesma para não darmuita bola

paraaspiadas,mascadavezqueeuouviauma,opânicotomavacontademim.Maseutinha que esconder. Se eu quisesse ajudar Jill, precisava que as gozações parassemcompletamente— e não apenas a parte sobre ser vampira. Darmais atenção a essescomentáriosnãoiriaajudar.Micah tentava reconfortar Jill depois de cada insulto, o que obviamente enfurecia

Laurel aindamais. Só que os comentários dela não eram os únicos que chegavam aosmeusouvidos.Desdeaminhaincursãoaoestúdiodetatuagem,euandavaouvindomuitainformaçãointeressantevindadeSladeeseusamigos.— Bom, e ele disse quando? —A srta. Carson fazia a chamada e Slade estava

interrogandoumsujeitochamadoTimarespeitodeumavisitarecenteaoestúdio.Timsacudiuacabeça.—Não. Estão com problemas na entrega. Parece que o fornecedor tem,mas não

quervenderpelomesmopreço.—Quedroga—Sladegrunhiu.—Precisodeumretoque.—Opa—Timdisse.—Maseeu?Aindanemfizaprimeira.Nãoeraoúnicocomentárioqueeutinhaouvidodealguémquejátinhaumacelestial

eprecisavaretocar.Eraovícioemação.O rosto de Jill estava rígido quando a educação física terminou, e eu fiquei com a

sensaçãodequeelaestava tentandonãochorar.Tenteiconversarcomelanovestiário,masela sósacudiuacabeçae foiparaochuveiro.Eumesmaestavaprontapara tomarbanhoquandoouviumgritoestridente.Aquelasentrenósqueaindaestavampertodosarmárioscorreramparaoschuveirosparaveroqueestavaacontecendo.Laureljogouacortinadesuacabineparaoladoesaiucorrendo,ignorandoofatode

estar pelada. Fiquei olhando boquiaberta. A pele dela estava coberta por uma finacamadadegelo.Gotasdaáguadochuveirotinhamsecongeladosólidassobresuapeleecabelo, apesarde já estaremcomeçandoaderreter comovapordo restodovestiário.Dei uma olhada no chuveiro em si e reparei que a água que saía da torneira tambémestavacongelada.OsberrosdeLaurelfizeramcomqueasrta.Carsonchegassecorrendo—chocada,

assim como o resto de nós, com o acontecimento aparentemente impossível queacabávamos de presenciar. Ela finalmente declarou que era algum tipo de problema

malucocomoscanoseoaquecedordeágua.Issoeratípicodosmeuscolegashumanos.Semprebuscavamexplicaçõescientíficasmirabolantesantesdeaceitarasfantásticas.Maseunãotinhanenhumproblemacomisso.Tornavaomeutrabalhomaisfácil.Asrta.CarsontentoufazerLaurelentraremoutrochuveiroparatirarogelo,mas

ela recusou. Ficou esperando até tudo derreter e então se enxugou com a toalha. Ocabelo dela estava horroroso quando finalmente saiu para a aula seguinte, e eu dei umsorrisosacana.Fiqueiimaginandoqueelanãopoderiajogarocabelodeumladoparaooutro.—Jill—chameiaovê-latentandosemisturaraumgrupodegarotasqueiasaindo

dovestiário.Eladeuumaolhadacheiadeculpaporcimadoombro,masnão fezmaisnadaparamostrarquetinhameescutado.Fuiatrásdela.—Jill!—chameimaisumavez.Elacomtodaacertezaestavameevitando.Nocorredor,JillavistouMicahecorreuatéele.Esperta.Elasabiaqueeunãofaria

nenhumaperguntaperigosacomeleporperto.Ela conseguiu me evitar durante o resto do dia, mas eu fiquei de tocaia no nosso

quartoatéelafinalmentevoltarparalá,logoantesdotoquederecolher.— Jill— exclamei assim que ela entrou pela porta.—Onde você estava com a

cabeça?Elalargouoslivrosesevirouparamim.Fiqueicomasensaçãodequeeunãoeraa

únicaquetinhapreparadoumdiscursonaqueledia.—EstoucheiadeficarescutandoLaureleasamigasdelafalaremmaldemim.—Eporissovocêcongelouochuveirodela?—perguntei.—Comoéqueissovai

fazerelaparar?Nãoécomosevocêpudessetomarocréditoparasi.Jilldeudeombros.—Fezeumesentirmelhor.— Essa é a sua desculpa?— Mal podia acreditar. Jill sempre tinha parecido tão

razoável.Elatinhasobrevividocomaconsciênciatranquilaaofatodesetornarprincesae de termorrido. Masaquilo a tinha feito perder a cabeça.—Você sabe o quanto searriscou?Anossaintençãoaquiénãoatrairatenção!—Asrta.Carsonnãoachouestranho.—Asrta.Carsoninventouumadesculpafracaparaseconsolar!Éissoqueaspessoas

fazem.Bastaumencanadorparaexaminaroscanosedizerqueelesnãocongelamassimdessejeitoaleatório,principalmenteemPalmSprings!—Edaí?—Jill inquiriu.—Edepois?Poracaso jávãosuspeitarque foimagiade

vampiro?—Claro que não—eu disse.—Mas as pessoas vão comentar.Você despertou a

desconfiançadetodomundo.Elameolhoucommuitocuidado.—Foi realmente isso que deixou você aborrecida?Ou foi o simples fato de eu ter

usadomagia?—Enãoéamesmacoisa?—Não.Querdizer,vocêestáincomodadaporeuterusadomagiaporquevocênão

gostademagia.Vocênãogostadenadaquetenhaavercomvampiros.Achoqueéumaquestãopessoal.Euseioquevocêpensadenós.Eusolteiumgemido.—Jill,eugostodevocê.Mastemrazãoemdizerqueamagiamedeixaumpouco

incomodada. — Certo,muito incomodada. — Mas não são os meus sentimentospessoais que vão fazer as pessoas ficarem imaginando qual foi a causa de a água tercongeladodaquelejeito.—Nãoécorretoelacontinuarfazendoisso!—Eusei,masvocêtemquesersuperioraela.Jillsesentounacamaesuspirou.Daquelamaneira,suaraivapareceusetransformar

emdesespero.—Odeio ficaraqui.QuerovoltarparaSãoVladimir.Ouparaacorte.Ouparao

Michigan.Qualquerlugarquenãosejaaqui.—Elamelançouumolhardesúplica.—Nãotemnenhumanotíciaarespeitodequandoeuvoupodervoltar?—Não—eudisse,semquererrevelarquepoderiademorarumpouco.—Todomundoestásedivertindoaqui—eladisse.—Vocêadora.Temummonte

deamigos.—Eunão...— Eddie também gosta. Ele tem Micah e outros caras do alojamento deles para

conversar.Alémdomais,eletemquecuidardemim,eporissotemumpropósito.—Eununca tinhapensadonaquestãodessamaneira,maspercebiqueela tinha razão.—Mas, e eu? O que eu tenho? Nada além desse laço idiota que me deixa ainda maisdeprimidaporquetenhoqueescutarAdriancompenadesimesmo.—Vou levarAdrian para procurar emprego amanhã— eu disse, sem saber com

certezaseissorealmenteajudava.Jillassentiu,desalentada.—Eusei.Avidadeleprovavelmentetambémvaificarótimaagora.Elaestavaseafundandoemmelodramaeautocomiseração,mas,àluzdetudo,euaté

quesentiaquenaquelemomentoelatinhaodireito.—VocêtemLee—eudisse.Issofezumsorrisosurgiremseurosto.—Eu sei. Ele é ótimo.Gostomuito dele, e nem consigo acreditar... quer dizer,

pareceumaloucuraelegostardemimtambém.—Nãoétantaloucuraassim.Obrilhodelaarrefeceu.—SabiaqueLeeachaqueeupodiasermodelo?Eledizqueeutenhoasilhuetamais

desejável pelos estilistas humanos, e que conhece uma estilista na cidade que estáprocurandonovasmodelos.MasquandoeuconteiaEddie,elefalouqueeraumapéssimaideia, porque eu não posso arriscar que tirem fotosminhas. Ele disse que, se vazasse,outrospoderiammeencontrar.— É verdade — falei. — Em todos os sentidos.Você tem mesmo silhueta de

modelo...masseriaperigosodemais.Elasuspirou,parecendoderrotada.—Estávendo?Nadadácertoparamim.—Sintomuito,Jill,deverdade.Euseiqueédifícil.Aúnicacoisaquepossopediré

que você tente continuar forte.Você tem sido ótima até agora. Só aguente mais umpouco,certo?ApenascontinuepensandoemLee.Asminhaspalavraspareceramvaziasatéparamimmesma.Quasefiqueiimaginando

se devia levá-la comigo eAdrian,mas acabei chegando à conclusão de que eramelhornão.Adrian não precisava de nenhuma distração.Tambémnão tinha certeza se aquiloseria interessanteparaela.SeelarealmenteestivesseassimtãoansiosaparaverAdrianpassarpelasentrevistasdeemprego,poderia“escutar”pelolaço.EumeencontreicomAdriandepoisdaescolanodiaseguintee,pelaprimeiravezem

um tempão, nem Lee nem Keith estavam na casa velha. Mas Clarence estava, epraticamentepassouporcimademimquandoeuentrei.—Vocêsoube?—eleindagou.—Soubedacoitadadamoça?—Quemoça?—perguntei.—AquefoimortaemLosAngelesháumasduassemanas.—Ah, sim — respondi, aliviada por não haver nenhuma morte nova. — Foi

trágico.TemossortepornãohavernenhumStrigoiaqui.Elemeolhoudeumjeitosurpresoecheiodecerteza.— Não foi um Strigoi!Você não presta atenção? Foram eles. Os caçadores de

vampiros.—Masbeberamosanguedela.Osenhornãodissequeoscaçadoresdevampirossão

humanos?NenhumhumanoteriamotivosparabebersanguedeMoroi.Ele me deu as costas e ficou andando de um lado para o outro da sala. Dei uma

olhadaaoredor,imaginandoondeAdrianestaria.—Todo mundo fica repetindo isso! — Clarence falou. — Como se eu já não

soubesse.Nãoseiexplicarporqueelesfazemoquefazem.Éumaturmaestranha.Eleslouvamosoletêmcrençasesquisitasarespeitodomaledahonra...sãoatémais foradocomumdoqueas crençasdevocês.—Bom, isso já era algo.Pelomenosele sabiaqueeuerahumana.Àsvezes,eunãotinhacertezaseelesabia.—Tambémtêmpontosdevistaestranhos,edeacordocomelesosvampirosdevemmorrer.ElesmatamStrigoisemrestrições.ComMoroiedampiros,sãomaisseletivos.—Osenhorcertamentesabemuitosobreeles—eudisse.

—Foioquemepropusa fazerdesdeTamara—elesuspirouederepentepareceumuito,muitovelho.—PelomenosKeithacreditaemmim.Fiqueicomorostoimpassível.—Ah,é?Clarenceassentiu.—Eleéumbomrapaz.Vocêdeveriadarumachanceaele.Meuautocontroleescapou,epercebiqueestavafazendocareta.—Voutentar.NaquelemomentoAdrianchegou,paraomeualívio.EstarsozinhacomClarencejá

eraapavoranteosuficientesemqueeleficasseelogiandoKeithDarnell.—Estápronto?—perguntei.— Pode apostar que sim —Adrian respondeu. — Mal posso esperar para me

transformaremumintegranteprodutivodasociedade.Dei uma examinada na roupa dele e tive que engolirmeus comentários. Era legal,

mas,claro,ele sempre sevestiabem. Jill tinhaditoqueasminhas roupaseramcaras,masasdeAdriandeixavamasminhasnochinelo.Hojeeleestavade jeanspretoeumacamisasocialcordevinho.Acamisapareciaserdealgumtipodemescladeseda,eeleausava solta, comalgunsbotões abertos.Seucabelo tinha sidopenteadocuidadosamenteparaparecerqueele tinhaacabadode sairdacama.Penaqueocabelodelenão tinhaamesmatexturadomeu.Omeuficavadaquelejeitosemeuprecisarfazerabsolutamentenada.Tinha que admitir que ele estava lindo — mas não parecia preparado para uma

entrevistadeemprego.Pareciaqueestavaprontoparacairnanoite.Issomecausouumcerto conflito.Ainda assim,me peguei admirando-o, emais uma vezme lembrei daimpressãoquetinhadevezemquando,dequeeleeraumaespéciedeobradearte.Eraumpoucodesconcertante,principalmenteporqueeutinhaqueficarrelembrandoamimmesma que vampiros não eram bonitos do mesmo jeito que humanos. Felizmente, apartepragmáticaemmimlogoassumiuocontroleemedeuumabronca,dizendoquenão fazia diferença se ele estava bonito ou não.O que importava é que ele não estavaapropriado para uma entrevista de emprego. Mas eu não devia ter ficado surpresa.AqueleeraAdrianIvashkov.—Então,qualéaprogramação?—eleperguntouquandopegamosaestrada.—Eu

realmenteachoque“diretorIvashkov”soabem.—Temumapastanobancodetráscomonossoitinerário,diretor.Adrian se virou para trás e pegou a pasta. Depois de dar uma olhada rápida, ele

declarou:—Você ganhou pontos por variedade, Sage.Mas não acho que nenhum destes vá

conseguirmemantercomoestilodevidaaqueestouacostumado.— O seu currículo está atrás. Eu fiz o que pude, mas estamos operando com

parâmetroslimitadosaqui.Elefolheouospapéiseencontrouocurrículo.—Uau.EufuiassistenteeducacionalnaEscolaSãoVladimir?Deideombros.—Foiacoisamaispróximadeumempregoquevocêjáfez.—ELissaeraminhasupervisora?Esperoqueeladêboasreferênciasminhas.QuandoVasilisaeRoseaindaestavamnaescola,Adrianmoravaláetrabalhavacom

Vasilisaparaaprenderodomíniosobreoespírito.“Assistenteeducacional”eraumcertoexagero,masfaziaparecerqueeleeracapazdecumprirváriastarefasaomesmotempoechegaraotrabalhonahora.Elefechouapasta,recostou-senoassentoefechouosolhos.—ComovaiaChavedeCadeia?Elapareciaprabaixonaúltimavezqueavi.Penseiemmentir,masacheiqueeleprovavelmentedescobririaaverdademaiscedo

oumais tarde, oudiretamentepor ela oupormeiode suas próprias deduções.Adrianpodianão tomarasmelhoresdecisões,maseu tinhadescobertoqueeleeraótimoparadecifrar as pessoas. Eddie alegava que isso advinha do poder que ele tinha sobre oespírito, e haviamencionado algo a respeito de auras,mas não tinhamuita certeza seacreditava naquilo. Os alquimistas não tinham evidências concretas de que elas eramreais.—Elanãoestámuitobem—eudisse,efizorelatóriocompletonocaminho.—Aquelacoisadochuveirofoihilária—eledissequandoeuterminei.—Foiumairresponsabilidade!Porqueninguémenxergaisso?—Aquelavacamereceu.Suspirei.—Vocêsesqueceramporqueestãoaqui?Você,principalmente!Vocêaviumorrer.

Nãoentendecomoéimportanteparaelaficaremsegurançaenãochamaraatenção?Adrianficouemsilênciodurantevários instantes,equandoolheiparaele,seurosto

estavasério,algopoucocomum.—Eusei.Mastambémnãoqueroqueelafiquearrasada.Ela...elanãomerece.Não

écomoorestodenós.—Achoquenóstambémnãomerecemos.—Talvezvocênãomereça—eledissecomumsorrisinho.—Afinal,vocêtemesse

estilodevida tãopuroe tudoomais.Não sei.É sóque Jill é tão... inocente.Foiporissoqueasalvei,sabe?Querdizer,emparte.Estremeci.—Quandoelamorreu?Eleassentiu,comumaexpressãomelancólicanosolhos.—Quandoeuviqueelaestavalá,todaensanguentadaesemsemexer...nãopensei

nasconsequênciasdoqueestavafazendo.Eusósabiaqueprecisavasalvá-la.Elatinhaque

viver.Euagisempararparapensar,semnemsabercomcertezaseeueracapazdefazeraquilo.—Foicorajosodasuaparte.—Talvez.Não sei. Sei que ela passou pormuitas dificuldades.Não quero que ela

passeporissodenovo.—Eutambémnão.—Fiqueicomovidacomapreocupaçãodele.Elecontinuavame

surpreendendodemaneirasbizarras.ÀsvezeseradifícilimaginarqueAdrianrealmenteseimportavacomqualquercoisa,masumladomaissuavedelevinhaàtonaquandoelefalava de Jill.—Vou fazer o que puder. Sei que devia conversarmais com ela... sermaisamiga,ouatémaisumairmãfalsa.Ésóque...Eleolhoufeioparamim.—Realmenteéassimtãoterrívelficarpertodenós?Corei.—Não— respondi.—Mas... é complicado. Me ensinaram certas coisas a vida

toda.Édifícilmelivrardelas.—Asmaioresmudançasnahistóriaaconteceramporqueaspessoasforamcapazesde

selivrardoqueosoutroslhesdiziamparafazer.Eledesviouoolhareficouolhandopelajanela.Aquelaafirmaçãomeincomodou.Pareciaalgobom,claro.Eraotipodecoisaqueas

pessoasdiziamotempotodosementenderasimplicações.Sejavocêmesmo,lutecontraosistema!Masaspessoasquefalavamessascoisas—gentecomoAdrian—nãotinhamvividoaminhavida.Nãotinhamcrescidocomumsistemadecrençastãorígidoquantoo meu; era como ser prisioneira. Elas não tinham sido forçadas a abrir mão de suacapacidadedepensarporsimesmasoudefazersuasprópriasescolhas.Aspalavrasdelenão sóme incomodaram, percebi. Elasme deixaram irritada. Elasme deixaram cominveja.Desdenheielanceiumcomentáriodignodele.—Seráquedevoadicionar“palestrantemotivacional”aoseucurrículo?—Se o pagamento for adequado, estou dentro.Ah—ele endireitou o corpo.—

Finalmentedescobrideondeoconheço.AqueletaldeMicahcomquemvocêsepreocupatanto.—Descobriudeondeoconhece?—É.Porqueelemeparecetãofamiliar.MicahéigualzinhoaMasonAshford.—Quem?—UmdampiroqueestudounaSãoVladimir.ElenamorouRoseporumtempo.—

Adrian bufou e encostou a bochecha na janela.— Bom, tanto quanto qualquer outronamorou Rose. Ela era louca por Belikov, já naquela época. Igual a quando nósnamoramos. Não sei seAshford chegou a perceber ou se ela conseguiu enganá-lo otempotodo.Esperoquesim.Pobrecoitado.

Franziatesta.—Porqueestádizendoisso?—Elemorreu.Quer dizer, foi assassinado.Você sabia disso?Um bando deles foi

capturadoporStrigoinoanopassado.RoseeCastileescaparam.Ashford,não.—Não—respondi,efizumaanotaçãomentalparadarumaolhadanaquilo.—Eu

nãosabia.Eddietambémestavapresente?— Estava. Fisicamente, pelo menos. Os Strigoi ficaram se alimentando dele, por

issoficouinútilamaiorpartedotempo.Quersabersobredanosemocionais?Ésófalarcomele.—CoitadodoEddie—eudisse.Derepente,muitacoisasobreodampirocomeçou

afazersentidoparamim.Chegamos à primeira parada, um escritório de advocacia que precisava de um

assistente de escritório. O título parecia mais glamoroso do que era na verdade, eprovavelmente iria envolvermuitas dasmesmas tarefas queTrey e eu fazíamospara asra.Terwilliger. Mas, das três vagas que eu tinha encontrado, esta também tinha omaiorpotencialparaavançosfuturos.Oescritórioobviamente iabem,a julgarpela recepçãoemque ficamosesperando.

Orquídeas cresciam em vasos gigantescos, bem colocados, e havia até uma fonte nomeiodasala.Trêsoutraspessoasesperavamnarecepçãoconosco.Umaeraumamulhermuitobem-vestida,nacasadosquarentaanos.Nafrentedelahaviaumhomemmaisoumenos damesma idade, sentado comumamulher bemmais nova cuja blusa decotadafariacomquefosseexpulsadeAmberwood.Cada vez que eu olhava para ela, tinha vontade de ir lá cobrir o decote com um

cardigã.Maseraóbvioqueostrêsseconheciam,porqueficavamseentreolhando.Adrianexaminou-os,umporum,eentãosevoltouparamim.— Este escritório de advocacia — disse em voz baixa — é especializado em

divórcio,nãoé?—É,sim—respondi.Ele assentiu e levou alguns momentos para processar a informação. Então, para o

meuhorror,eleseinclinouporcimademimedisseparaamulhermaisvelha:—Elefoiumidiota,obviamente.Vocêéumamulherestonteante,cheiadeclasse.É

sóesperar.Elevaisearrepender.—Adrian!—exclamei.A mulher se contorceu de surpresa, mas não pareceu inteiramente ofendida.

Enquanto isso, do outro lado da sala, a mulher mais nova se aprumou e parou de seaninharnohomem.—Desculpe?—elainquiriu.—Oquevocêquerdizercomisso?Desejeiqueaterrameengolisseemesalvasse.Felizmente,asegundamelhoropção

aconteceu,quandoarecepcionistachamouotrioparaumareuniãocomumadvogado.

—Sério?—pergunteiquandoelessaíram.—Vocêtinhamesmoquedizeraquilo?—Eufalooquepenso,Sage.Vocênãoacreditaquedevemosdizeraverdade?—Claro que sim.Mas tem hora e lugar! Não com completos desconhecidos que

obviamenteestãoemumasituaçãodifícil.—Tanto faz— ele disse, parecendo extremamente satisfeito consigomesmo.—

Semdúvidaeufizodiadaquelamulher.Naquele instante,umamulherde tailleurpretoe saltos altíssimos saiudeuma sala

interna.—MeunomeéJanetMcCade,souagerentedoescritório—eladisse.Olhoupara

nósdois,emdúvida,eentãoapostouemmim.—VocêdeveserAdrian.A confusão do nome era compreensível, mas não caiu bem para ele. A minha

avaliaçãodesuaroupaprontaparaabaladaestavacorreta.Minhasaiamarromeminhablusamarfimpareciammaisapropriadasparaumaentrevista.—EsteéAdrian—disseeapontei.—Souapenasairmãdele,estouaquiparadar

apoiomoral.—Émuitagentilezadasuaparte—Janetdissecomaexpressãoumpoucoperplexa.—Entãopronto.Vamosconversar,Adrian?— Pode apostar— ele disse e se levantou para ir atrás dela, e eu saltei do meu

lugar.—Adrian—sussurrei,puxandoamangadele.—Vocêquerdizeraverdade?Diga

agora.Nãocomecea inventardetalhesrebuscadosnemalegueque já foiprocuradordaJustiça.—Entendi—eledisse.—Issoaquivaisermoleza.Secom“moleza”elequisdizerrápido,entãoestavacerto.Elesaiupelaportadasala

depoisdecincominutos.Quandochegamosnocarro,eudisse:—Não imagino que ela tenha dado o emprego a você com base só no seu visual,

certo?Adrianestavaolhandoparaooutrolado,masentãomelançouumsorrisoreluzente.—Nossa,Sage,comovocêdizpalavrasdoces.—Nãofoioqueeuquisdizer!Oqueaconteceu?Eledeudeombros.—Euconteiaverdade.—Adrian!—Estoufalandosério.Elameperguntouqualeraaminhamaiorforça.Eudisseque

eralidarbemcomaspessoas.—Issonãofoiruim—reconheci.—Daíelaperguntouqualera aminhamaior fraqueza.Eeudisse:“Porondedevo

começar?”.

—Adrian!— Pare de falar meu nome sem parar. Eu contei a verdade. Quando estava no

quartoitem,elamedissequeeupodiairembora.Eusolteiumgrunhidoeresistiàvontadedebatercomacabeçanadireção.— Eu devia ter orientado você. Essa é uma pegadinha padrão. Você tem que

respondercomcoisascomo“mededicodemaisaotrabalho”ou“souperfeccionista”.Elesoltouumagargalhadadedesdémecruzouosbraços.—Issoéumabesteiracompleta.Quemiriadizerumacoisadessas?—Pessoasqueconseguemempregos.Como agora nós tínhamos um tempo extra, dei omelhor demimpara prepará-lo

para as perguntas antes da próxima entrevista. Na verdade, era no café Spencer’s, econsegui fazercomqueTreyajudasse.EnquantoAdrian fazia aentrevistano fundo,eumesenteiemumamesapara tomarumcafé.Treyveiome fazerumavisitadepoisdeunsquinzeminutos.—Eleémesmoseuirmão?—elequissaber.—É,sim—eudisse,comesperançadeparecerconvincente.— Quando você disse que ele estava procurando emprego, imaginei uma versão

masculina de você.Achei que ele iria querer organizar as xícaras por cores ou algoassim.—Oquevocêquerdizercomisso?—perguntei.Treysacudiuacabeça.—Querodizerqueémelhorvocêscontinuaremaprocurar.Acabeidesairládetrás

eouvi ele conversandocomagerente.Ela estavaexplicandocomoé a limpezaqueeleteriaquefazertodanoite.Daíelefaloualgosobreasmãosdeleetrabalhopesado.Eunãoeradotipodefalarpalavrão,mas,naquelemomento,desejeiser.Aúltimaentrevistaeraemumbardamodadocentro.Eutinhapartidodoprincípio

de queAdrian provavelmente conhecia todos os drinques domundo e tinha inventadoumacredencialfalsaparaocurrículo,afirmandoqueelejátinhafeitocursodebarman.Chegandolá,fiqueinocarroeomandeiirsozinho,achandoquesuamelhorchanceeraali.Nomínimo,aroupadeleseriaapropriada.Quandoelesaiudepoisdedezminutos,fiqueiboquiaberta.—Como?—exigisaber.—Comovocêconseguiuferraressa?—Quando cheguei, disseram que o gerente estava ao telefone e que iria demorar

algunsminutos.Entãoeumesenteiepediumabebida.Dessavez,eurealmenteapoieiacabeçanadireção.—Oquevocêpediu?—Ummartíni.— Um martíni. — Ergui a cabeça. —Você pediu um martíni antes de uma

entrevistadeemprego.

—Éumbar,Sage.Acheiquenãoteriaproblema.—Não,nãoachou!—exclamei.Ovolumedaminhavozsurpreendeuanósdoise

eleseencolheuumpouco.—Vocênãoéburro,pormaisquefinjaser!Vocêsabequenãopodefazerisso.Vocêsófezissoparasacanearcomeles.Vocêfezissoparasacanearcomigo! Foi isso.Você não levou nada a sério. Desperdiçou o tempo dessa gente e omeu,sóporquenãotinhanadamelhorparafazer!—Nãoéverdade—eledisse,masparecianãotercerteza.—Euquero,sim,um

trabalho...masnãoestes.—Vocênãoestá emposiçãode serexigente.Quer sairda casadeClarence?Estas

eram as suas chances. Poderia ter conseguido qualquer umdesses empregos se você seesforçasse só um pouquinho.Você consegue ser encantador quando quer. Poderia terconseguidoumempregosópelopapo.—Deiapartidanocarro.—Paramim,chega.—Vocênãoentende—eledisse.— Entendo que você esteja passando por um período difícil. Entendo que esteja

magoado.—Eumerecuseiaolharparaeleecoloqueitodaaminhaatençãonarua.—Mas isso não lhe dá o direito de ficar brincando com a vida das outras pessoas.Tentecuidardesimesmosozinhoparavariar.Ele não respondeu até estarmos de volta à casa de Clarence e, mesmo naquele

momento,eunãoquisescutar.—Sage...—elecomeçou.—Saiadaqui—eudisse.Elehesitoucomose fossediscordar,mas finalmenteassentiucomacabeça.Saiudo

carro em direção à casa e aproveitou para acender um cigarro no caminho. Fúria efrustraçãoqueimavamdentrodemim.Comoéqueumapessoa era capazdeme fazerpassarportantosaltosebaixos?Semprequeeucomeçavaagostardeleesentiaquenósestávamos nos conectando, ele fazia uma coisa dessas. Eu era uma idiota por mepermitircomeçaratersimpatiaporele.Seráqueeutinharealmentepensadoqueelesepareciacomumaobradearteantes?Meus sentimentos ainda estavam agitados quando cheguei aAmberwood. Eu não

estavanemumpoucoafimdeencontrarJillnonossoquarto.NãotinhadúvidadequeelajásabiatudoquehaviaacontecidocomAdrian,enãotinhaomenordesejodeescutarasdefesasqueelateriaparaele.Mas, quando entrei nomeu dormitório, nem passei da recepção.A sra.Weathers

estavanolobbycomEddieeumsegurançadocampus.Micahestavaaliporperto,como rosto pálido. Meu coração parou. Eddie disparou na minha direção, com o pânicoestampadonorosto.—Vocêfinalmenteapareceu!NãoconseguiafalarcomvocênemcomKeith.— M-meu telefone estava desligado. — Olhei para a sra.Weathers e para o

segurançaevinorostodelesamesmapreocupação.—Oqueaconteceu?

—ÉJill—Eddiedisse,sombrio.—Elasumiu.

18

—Comoassim,“sumiu”?—perguntei.

—Eraparaelaterseencontradocomagenteháumasduashoras—EddiefalouetrocouolharescomMicah.—Acheiquetalvezelaestivessecomvocê.—Não vejo Jill desde a educação física.—Estavame esforçandomuito para não

entrar no modo pânico por enquanto. Havia muitas variáveis em jogo, e não haviaevidências suficientes para começar a pensar que dissidentes Moroi enlouquecidos atinham sequestrado.—Este lugar émuito grande.Quer dizer, são três campi.Temcertezadequeelanãoestásóescondidaemalgumcanto,estudando?—Fizemosumabuscabemabrangente—osegurançadisse.—Eosprofessorese

funcionáriosestãoemalerta,àprocuradela.Ninguémaavistouporenquanto.—Eelanãoestáatendendoocelular—Eddiecompletou.Finalmentepermitiqueomedotomassecontademimdeverdade,emeurostodeve

terdemonstrado.Aexpressãodosegurançaseabrandou.—Não se preocupe.Tenho certeza de que ela vai aparecer— esse era o tipo de

reconfortoqueaspessoasdaprofissãodeletinhamquedizeraosparentes.—Masvocêtemalgumaoutraideiadeondeelapodeestar?—Eosseusoutrosirmãos?—Micahperguntou.Estava commedo que chegasse a isso.Tinha quase certeza absoluta de que ela não

estava com Keith, mas ele provavelmente já devia ter sido notificado dodesaparecimentodela.Nãoeraalgoqueeuestivesseansiosaparaqueacontecesse,porquesabia que um sermão estaria àminha espera.Também seria um sinal domeu fracassoperante os olhos dos outros alquimistas.Eudevia ter ficado ao ladode Jill. Esse era omeu trabalho, certo? Em vez disso, eu— idiota como sou— fui ajudar alguém comtarefas do dia a dia. E não uma pessoa qualquer— um vampiro. Era assim que osalquimistasiamverascoisas.Adoradoradevampiros.—EuestivecomAdrianagorinhamesmo—dissedevagar.—Achoqueelapode

terconseguidoiràcasadeClarencedealgummodoparaesperarporele.Nãochegueiaentrar.—Tambémtenteifalarcomele—Eddiedisse.—Elenãoatendeu.—Desculpe— eu falei.—Nós estávamos nas entrevistas dele, por isso deve ter

desligadootelefone.Quertentarmaisumavez?—Eu,comtodaacerteza,nãoquerialigarparaele.EddieseafastouparaligarparaAdrianenquantoeuconversavacomasra.Weathers

eo segurança.Micahandavadeum ladoparaooutro,comarpreocupado,eme senticulpadaporsemprequererqueeleficasselongedeJill.Adisputaeraumproblema,maselegostavamesmodela.EudisseaosegurançaquaiseramoslugaresqueJillgostavadefrequentarnocampus.Elesconfirmaramquejátinhamverificadotodos.—Conseguiufalarcomele?—pergunteiquandoEddievoltou.Eleassentiu.— Ela não está lá.Mas fiquei meio mal.Agora ele está bem preocupado.Talvez

devêssemosteresperadoparacontarparaele.—Não...naverdade,podeserbom.Olhei Eddie nos olhos e vi uma fagulha de compreensão.As emoções deAdrian

pareciam passar por cima das de Jill quando eram fortes. Se ele ficasse em pânicomesmo,haviaaesperançadeelaperceberqueaspessoasestavampreocupadasevoltar.Issopartindodoprincípiodequeelasóestavaescondidaouquetinhaidoaalgumlugarondenósnãoconseguíamosencontrá-la.Tenteinãolevaremcontaaalternativadealgoteracontecidoeelaestaremalgumlugarondenãopodiaentraremcontatoconosco.—Àsvezesosalunossimplesmentesaemescondidosdaescola—osegurançadisse.

—Éinevitável.Geralmente,tentamvoltarsemqueninguémpercebaantesdotoquederecolher. Espero que este seja o caso. Se ela não aparecer até lá... bom, daí nóschamamosapolícia.Eleseafastouparaentraremcontatocomosoutrossegurançaspelorádioesaberse

havia alguma novidade, e nós agradecemos sua ajuda.A sra.Weathers voltou para amesadarecepção,maselaestavaclaramentepreocupadaeagitada.Àsvezeselapareciaenfezada,mastinhaasensaçãodequeelasepreocupavacomasalunasdeverdade.Micahnos deixou para falar com alguns amigos que trabalhavam no campus, para o caso deteremvistoalgo.Assim, sobramos Eddie e eu. Sem dizer nada, nós nos dirigimos para algumas

cadeirasquehavianosaguão.Assimcomoeu,achoqueelequeriaficardeolhonaporta,paraavistarJillnoinstanteemqueelaaparecesse.—EunãodeviaterdeixadoJillsozinha—eledisse.—Vocêprecisoudeixar—eudisse, racional.—Vocênãopode ficarcomelanas

aulasnemnoquarto.—Estelugarfoimáideia.Égrandedemais.Édifícilparamanterasegurança—ele

suspirou.—Nãoestouacreditandonisso.—Não... foiboa ideia,sim.Jillprecisateralgoquesepareçacomavidanormal.

VocêspoderiamtertrancadoJillemalgumquartinhoefeitocomqueelaficasseisoladadequalquer interação,masdequeadiantaria?Elaprecisa iràescolaeestarrodeadadegente.—Maselanãotemfeitomuitoisso.— Não — reconheci. — Tem sido difícil para ela. Eu fiquei torcendo para

melhorar.—Eusóqueriaqueelaestivessefeliz.—Eutambém.—Endireiteiascostasquandoalgoalarmantemeocorreu.—Você

nãoacha...nãoachaqueelafugiuevoltouparaamãe,acha?Ouparaacorte,ouparaalgumoutrolugar?Orostodeleficouaindamaisdesolado.—Esperoquenão.Vocêachaqueascoisasestavamtãoruinsassim?Penseinanossabrigadepoisdoincidentedochuveiro.—Nãosei.Talvez.Eddieenterrouorostonasmãos.—Nãoestouacreditandonisso—repetiu.—Eufalhei.QuandosetratavadeJill,Eddiecostumavaserapenasviolênciaeraiva.Eununcao

tinhavistotãopróximodadepressão.Viviacommedoda minhaprópriafalhadesdequetinha chegado a Palm Springs,mas só agora tinha percebido queEddie dependia tantodaquilo quanto eu. Eme lembrei das palavras deAdrian sobre Eddie eMason, amigodele, sobre comoEddie se sentia responsável. Se Jill não voltasse, não seria como se ahistóriaestivesseserepetindo?Seráqueelaseriamaisumapessoaqueeleperdeu?Tinha achado que aquela missão poderia ser a redenção para ele. Em vez disso,

poderiafazê-lorevivertudooqueaconteceraaMason.—Vocênão falhou—eudisse.—Asua funçãoéprotegê-la,evocê fez isso.Não

podecontrolarafelicidadedela.Seexistealgumculpado,soueu.Eudeiamaiorbroncanelaporcausadoincidentedochuveiro.—É,mas eu destruí as esperanças dela quandodisse que a ideia deLee de que ela

fossemodelonãoiadarcerto.—Mas você estava certo sobre...Lee!—engoli em seco.—É isso.É lá que ela

está.Elaestácomele,tenhocerteza.Vocêtemotelefonedele?Eddiesoltouumgrunhido.—Comoeusouidiota—disse,pegouocelulareprocurouonúmero.—Eudevia

terpensadonisso.Toqueinacruznomeupescoçoefizumaoraçãoemsilêncio,pedindoparaqueaquilo

tudoseresolvesse logo.Se significassequeJillestavavivaebem,eupoderiadarcontadofatodequeelaeLeehaviamfugidoparaficarjuntos.

—Oi,Lee?ÉEddie.Jillestácomvocê?HouveumapausaquandoLeerespondeu.AlinguagemcorporaldeEddierespondeuà

perguntaantesqueeuescutassequalqueroutrapalavra.Aposturadelerelaxoueoalíviopreencheusuaexpressão.—Certo—Eddie disse algunsmomentos depois.—Bom, traga Jill de volta até

aqui.Agora.Todo mundo está procurando por ela.—Mais uma pausa. O rosto deEddie ficou rígido.—Podemos conversar sobre issomais tarde.—Ele desligou e sevirouparamim.—Estátudobemcomela.— Graças a Deus— eu disse, com um suspiro. Eu me levantei, e foi só aí que

percebicomotinhaficadotensa.—Jávolto.Encontreiasra.Weatherseosegurançaedeianotícia.Osegurançainformouseus

colegas imediatamente e logo foi embora. Para a minha surpresa, a sra.Weatherspareciaestaràbeiradaslágrimas.—Estátudobemcomasenhora?—perguntei.—Está,está—elasevirouapressada,envergonhadaporterficadotãoemotiva.—

Eu só estava preocupada. Eu... eu não queria dizer nada para não assustar vocês,mascada vez que uma aluna desaparece... bom, há alguns anos, outra garota desapareceu.Nós achamos que ela só tinha saído escondida da escola... comoMatt disse, acontece.Mas,nofinal...—Asra.Weathersfezumacaretaedesviouoolhar.—Eunãodeviacontarissoparavocê.Atéparecequeelapodiaparardepoisdeumaintroduçãodessas.—Não,porfavor.Conte.Elasuspirou.—A polícia a encontrou dois dias depois... morta. Ela tinha sido sequestrada e

assassinada. Foi terrível, e nunca pegaram o assassino. Agora, sempre que alguémdesaparece,sópensonisso.Nuncamaisaconteceu,claro.Masumacoisadessasassustaagente.Eu podia imaginar. E quando retornei a Eddie, voltei a pensar nele e emMason.

Parecia que todo mundo carregava um histórico pesado de acontecimentos. Eu, comtoda a certeza, sim.Agora que a segurança de Jill não eramais preocupação, a únicacoisaemqueeupensavaeraaseguinte:Oqueosalquimistasvãodizer?Oqueomeupaivaidizer?Eddieestavaguardandoocelulardenovoquandomeaproximei.— Liguei paraMicah para dizer a ele que está tudo bem— ele explicou.— Ele

estavamuitopreocupado.Todosossinaisdoantigotraumadasra.Weathersdesapareceramnoinstanteemque

Jill e Lee passaram pela porta. Jill na verdade parecia animada, até ver nossasexpressões.Elaparounomeiodocaminho.Ao ladodela,Lee jádemonstravaopesar.Achoqueelesabiaoqueviriapelafrente.Eddie e eu avançamos apressados, mas não tive a oportunidade de falar

imediatamente.A sra.Weathers logo exigiu saber aonde eles tinham ido. Em vez deencobrirofato,Jillconfessouaverdade:elaeLeehaviamsaídodocampuseforamparaPalm Springs. Ela tomou cuidado para ter certeza de que Lee não fosse acusado desequestro,jurandoqueelenãosabiaqueelasópodiasaircomfamiliaresautorizados.Euconfirmeiaquilo—masLeeaindaestavanaminhalistanegra.—Vocêpodeesperarláfora?—pediaele,comeducação.—Gostariadefalarcom

vocêemparticular,maistarde.Lee começou aobedecer e lançouumolhardedesculpaspara Jill.Ele roçou amão

deladeleveparasedespediredeumeia-volta.Foiasra.Weathersqueodeteve.—Espere—ela disse, e ficouolhandopara ele com curiosidade.—Por acaso eu

conheçovocê?Leepareceusurpreso.—Achoquenão.Nuncaestiveaquiantes.—Temalgodefamiliaremvocê—elainsistiu.Suatestasefranziupormaisalguns

momentos.Finalmente,eladeudeombros.—Nãopodeser.Devoestarenganada.Leeassentiu,olhounosolhosdeJillcomcompaixãomaisumavez,esaiu.Asra.WeathersnãotinhaterminadocomJill.Elacomeçouadesfiarumaladainhaa

respeitodecomoaquilotinhasidoperigosoecomoelestinhamsidoirresponsáveis.— Se você queria sair em segredo e desrespeitar as regras, podia pelo menos ter

contadoparaosseusirmãos.Elesestavamempânicoporsuacausa.Era quase engraçado ela dar um conselho sobre como desrespeitar as regras de

maneira “responsável”. Mas, levando em conta como eu tinha ficado apavorada, eradifícil achar qualquer coisa divertida naquelemomento. Ela disse a Jill que aquilo iriaparaafichadelaequeseriacastigada.—Porenquanto—asra.Weathersdisse—,vocêvaificarnoseuquartosemsair

pelorestodanoite.Venhafalarcomigodepoisdocafédamanhãevamosdescobrirseodiretorachaqueéumcasoparasuspensão.— Com licença— Eddie disse.— Será que podemos conversar com ela alguns

minutosemparticular,antesdeelasubir?Gostariadefalarcomela.A sra.Weathers hesitou, e parecia querer que o castigo de Jill entrasse em vigor

imediatamente. Ela então examinouEddie de cima a baixo.A expressão no rosto deleerarígidaeirritada,eachoqueasra.WeatherspercebeuqueoirmãomaisvelhodeJillaplicariaumoutrotipodecastigonela.— Cinco minutos— a sra.Weathers disse e bateu com o dedo no relógio.—

Depoisdisso,elaprecisasubir.—Nãodigamnada—Jill falounoinstanteemqueficamossozinhos.Orostodela

eraumamisturademedoedesafio.—Euseiqueoquefizfoierrado.Nãoprecisolevarsermãodevocês.—Nãoprecisa?—perguntei.—Se você soubesse que era errado, não teria feito

isso!Jillcruzouosbraçosporcimadopeito.—Euprecisavasairdaqui.Deacordocomosmeusprópriostermos.Esemvocês.O comentário nem me atingiu. Parecia infantil e mesquinho. Mas, para a minha

surpresa,Eddierealmentepareciamagoado.—Oquevocêquerdizercomisso?—eleperguntou.—Querodizerqueeusóqueriasairdestelugarsemquevocêsficassemmedizendo

otempotodooqueestoufazendoerrado—foiumaindiretaparamim.—Ouquesesobressaltassemcomcadasombra—essa,claro,eraparaEddie.— Só quero proteger você— ele disse com um tom de mágoa.— Não quero

sufocá-la,masnãopossopermitirquenadaaconteça.Nãodenovo.— Eu corro mais perigo com Laurel do que com qualquer assassino! — Jill

exclamou.— Sabe o que ela fez hoje? Nós estávamos trabalhando no laboratório decomputaçãoeela“semquerer”tropeçounofiodomeucomputador.Euperdimetadedotrabalhoenãopudeterminaratempo,eagoravoulevarnotabaixa.Um sermão sobre fazer backup do trabalho provavelmente não seria útil naquele

momento.—Olhe,issoéhorrívelmesmo—eudisse.—Masnãoestánamesmacategoriade

alguémquerermatarvocê.Nemdelonge.Aondeexatamentevocêsforam?Poruminstante,pareceuqueelanãoiaentregarainformação.Finalmente,eladisse:—LeemelevouaSaltonSea.—Aovernossacaradequemnãoentendeunada,ela

completou: — É um lago fora da cidade. É maravilhoso. — Uma expressão quasesonhadoracruzouseurosto.—Faziatantotempoqueeunãoficavapertodetantaáguaassim...Daí nós fomos para o centro e só ficamos andandopor lá, fazendo compras etomandosorvete.Elemelevouàquelaloja,comaestilistaqueestáprocurandomodelose...— Jill— interrompi.—Nãome importa comoo seu dia foimaravilhoso.Você

nosassustou.Nãoentende?—Leenãodeviaterfeitoisto—Eddiedisse,irritado.—Aculpanãoédele—Jill disse.—EuconvenciLee a fazer isso... fiz comque

acreditasse que vocês não iriam se incomodar. E ele não sabe a verdadeira razão pelaqualestouaquinemoperigoqueeucorro.—Talveznamorartenhasidoumamáideia—balbuciei.—Leeéamelhorcoisaquemeaconteceuaqui!—eladisse,irritada.—Eumereço

sercapazdesairemedivertirigualavocês.—“Diversão”éumexagero—eudisse,aomelembrardatardecomAdrian.Jillprecisavadeumalvoparasuafrustração,eeurecebiahonra.—Nãoéoquemeparece.Vocênuncaestáaqui.E,quandoestá,sóficamedizendo

oqueeufaçodeerrado.Pareceatéqueéminhamãe.

Euestavalidandocomtudoaquilocommuitacalma;mas,derepente,algonaquelecomentáriomefezexplodir.Meucontroletãobemafinadosedespedaçou.—Quersaberdeumacoisa?Eumesintoassimmesmo.Porque,atéondeeusei,sou

aúnicadessegrupoqueagecomoadulta.Vocêachaqueeuestouaquimedivertindo?Sóestou como babá de vocês, consertando as suas confusões. Passei a tarde inteira...desperdiceiatardeinteira...levandoAdriandecarrodeumladoparaooutro,sóparaele ferrar com as entrevistas que consegui. E daí chego aqui e tenho que lidar com oproblema do seu “ passeiozinho”. Entendo que Laurel seja um saco... mas, se Micahtivesse sido alertado desde o início, esses problemas jamais teriam acontecido— esteúltimo comentário foi dirigido a Eddie.— Eu não entendo por que sou a única queenxerga a seriedade das coisas.Vampiros e humanos namorando.A vida de vocês emjogo.Nãosãocoisascomquesepodebrincar!E,noentanto...dealgummodo,éoquevocêstodosfazem.Largamtodasascoisasdifíceisparamim,paraqueeulimpeasujeiraatrásdevocês...e,enquantoisso,tenhoKeitheosoutrosalquimistasnaminhacola,sóesperandoqueeuferrecomtudoporqueninguémconfiaemmimdesdequeajudeiasuaamigaRose.Vocêachaqueissoédivertido?Querviveraminhavida?Então,viva.Podeficarnomeulugarecomeçaraassumirumpoucoderesponsabilidadeparavariar.Eunãotinhagritado,masovolumedaminhavozcertamentetinhaaumentado.Eu

basicamentetinhafeitotodoodiscursosemrespirareagorafaziaumapausaparatomarfôlego. Eddie e Jill ficaram olhando para mim, de olhos arregalados, como se nãoestivessemmereconhecendo.Naquelemomentoasra.Weathersvoltouatéondenósestávamos.—Jábastaporhoje.Vocêprecisasubiragora—eladisseaJill.Jillassentiu,aindaumpoucoatordoada,esaiuapressadasemsedespedirdenenhum

de nós.A sra.Weathers a acompanhou até a escada e Eddie se voltou paramim. Seurostoestavapálidoesolene.—Vocêestácerta—eledisse.—Eunãotenhofeitoaminhaparte.Suspirei,derepentemesentindoexausta.—Vocênãoétãomauquantoeles.Elesacudiuacabeça.— Mesmo assim... Talvez você tenha razão em relação a Micah. Talvez ele

mantenhaalgumadistânciaseeuconversarcomele,edaíLaurelvaiparardepegarnopéde Jill.Vou falar comelehoje ànoite.Mas...—ele franziu a testa, escolhendo aspalavras commuito cuidado.—Tente não ser muito dura comAdrian e Jill. Isso éestressante para ela, e às vezes eu acho que um pouco da personalidade dele estejapassandoparaelaatravésdolaço.Tenhocertezadequefoiporissoqueelafugiuhoje.Éalgoqueelefarianolugardela.—Ninguémaforçouafazeroquefez—eudisse.—Adrianmenosainda.Ofato

deelaterconvencidoLeeenãoternoscontadomostraqueelasabiaqueeraerrado.Isso

sechamalivre-arbítrio.EAdriannãotemessasdesculpas.— É... mas ele é oAdrian — Eddie disse, desanimado. — Às vezes não sei

distinguirquaisatitudessãodeleequaissãodoespírito.—Aqueles que têmo domínio sobre o espírito podem tomar antidepressivos, não

podem?Seeleestápreocupadoemsetornarumproblema,entãoprecisatomarjuízoeassumirocontrole.Eletemumaescolha.Nãoéimpotente.Nãohávítimasaqui.Eddiemeexaminouduranteváriossegundos.—Eeuacheiqueaminhavisãodavidaeradura.—Suavidaédura—corrigi.—Maselaéconstruídaemtornodaideiadequevocê

sempre precisa tomar conta de outras pessoas. Eu fui ensinada que isso às vezes énecessário,masque,mesmoassim,todomundoprecisacuidardesimesmo.—E,noentanto,aquiestávocê.—Nemmediga.QuervircomigoconversarcomLee?QualquerexpressãodearrependimentodesapareceudorostodeEddie.—Quero—eledissecomdeterminação.EncontramosLeesentadoemumbancodo ladode fora,parecendoarrasado.Ele se

levantouemumpuloquandonosaproximamos.—Pessoal,sintomuito!Eunãodeviaterfeitoisso.Maséqueelapareciatãotristee

tãoperdidaeeusóquis...—VocêsabecomonósprotegemosJill—eudisse.—Comopôdepensarquenão

irianosdeixarpreocupados?— E ela é menor de idade— Eddie falou.— Não pode simplesmente levar Jill

emboraefazeroquebementendercomela!Reconheçoque fiqueiumpouco surpresa com suaopçãopormencionar a ameaça à

virtudede Jill.Nãomeentendamal.Eu tambémestavapreocupadacoma idadedela.Mas, depois de ele tê-la visto literalmente morrer, achei que Eddie iria se preocuparcomoutrascoisasalémdeosdoisficaremjuntos.OsolhoscinzentosdeLeesearregalaram.—Nãoaconteceunada!Eu jamais faria algoassimcomela.Eu juro!Eununcame

aproveitariadeumapessoatãoinocente.Nãopossoestragaristo.Elaémaisimportantepara mim do que qualquer garota com quem já namorei. Quero ficar com ela parasempre.Acheique“parasempre”eraumexageroconsiderandoaidadedeles,mashaviauma

sinceridadecomoventeemseusolhos.Mesmoassim,nãoserviadedesculpaparaoquetinha feito. Ele levou nosso sermão a sério e prometeu que aquilo nunca mais iria serepetir.—Mas, por favor... será que eu ainda possome encontrar com ela quando vocês

estiveremporperto?Nóspodemoscontinuarafazerprogramasemgrupo?Eddieeeunosentreolhamos.

—Se ela tiver permissão para sair do campus depois disso, sim— respondi.—Realmentenãoseioquevaiacontecer.Lee foi embora depois demais alguns pedidos de desculpas e Eddie tambémvoltou

paraoalojamentodele.Euestavasubindoasescadasquandomeucelulartocou.DeiumaolhadaefiqueiassustadaaoveronúmerodotelefonedacasadosmeuspaisemSaltLakeCitynoidentificadordechamadas.—Alô?—atendi.Duranteummomentoinquieto,torciparaquefosseZoe.—Sydney.Meupai.Meuestômagoseencheudepavor.—Precisamosconversarsobreoqueaconteceu.Opânicosealastroudentrodemim.Comoéqueelejásabiadodesaparecimentode

Jill? Keith me veio à cabeça como o culpado óbvio. Mas como é que ele haviadescoberto?SeráqueestavanacasadeClarencequandoEddieligouparaAdrian?Apesarde seus defeitos, não podia acreditar queAdrian teria contado a Keith o que tinhaacontecido.—Conversarsobreoquê?—perguntei,tentandoganhartempo.—Sobreoseucomportamento.Keithme ligouontemànoitee,devodizer,estou

muitodecepcionado.—Ontem à noite— aquilo não era a respeito do desaparecimento de Jill. Então,

sobreoqueseria?—OseutrabalhoécoordenarosesforçosparaqueameninaMoroitenhaumaboa

adaptação.Não precisa ser simpática comeles!Mal pude acreditar quandoKeith dissequevocêlevoutodosparajogarboliche.—Eraminigolfe,eKeithdissequenãotinhaproblema!Eupergunteiaeleprimeiro.—E,depois,ouvidizerquevocêestáajudandooutrosvampirosacuidaremdesuas

tarefasrotineirasenãoseimaisoquê.Asuaobrigaçãoéapenascomamenina,eissosóestá relacionadoà sobrevivênciadela... coisaque tambémouvidizerquevocênãoestáfazendo.Keithmedissequehouveumincidenteemquevocênãocuidoudasdificuldadesdelanosoldamaneiraadequada?—Euinformeioproblemaimediatamente!—exclamei.EudeveriasaberqueKeith

tinha planos de usar aquilo contra mim.— Keith...— fiz uma pausa, pensando namelhormaneiradelidarcomaquilo.—Elenãoentendeubemomeurelatórioinicial.—Keithtinhadesprezadoomeurelatórioinicial,masdizeraomeupaiqueoprotegidodele havia mentido só iria servir para fazer meu pai ficar na defensiva. Ele nãoacreditariaemmim.—Eolhasóquemfala!EleestásemprecomClarenceeserecusaadizerporquê.—Provavelmenteépara se assegurardequeele esteja estável.Compreendoqueo

velhonãotemacabeçamuitonolugar.— Ele é obcecado por caçadores de vampiros— expliquei.— Ele acha que tem

humanosporaíquemataramasobrinhadele.— Bom— meu pai disse.— Hámesmo alguns humanos que ficam sabendo do

mundodosvampirosenósnãoconseguimosdissuadi-los.Nãosãoexatamentecaçadores.KeithestácumprindosuaobrigaçãoaoesclarecercomClarence.Você,noentanto,estáequivocada.—Essacomparaçãonãoéjusta!—Honestamente,culpoamimmesmo—eledisse.Dealgummodo,euduvidava

disso.— Eu não devia ter deixado que você fosse mandada para aí.Você não estavapronta... não depois daquilo pelo que passou. Passar tempo com esses vampiros estádeixandovocêconfusa.Éporissoquevoupedirparaquevolte.—Oquê?— Se as coisas fossem do meu jeito, seria imediatamente. Infelizmente, Zoe vai

demorarmaisduassemanasparaseaprontar.Osalquimistasqueremqueelapasseporalgunstestesantesdefazeratatuagem.Quandoissoestiverresolvido,vamosmandá-lanoseulugarearrumar...ajudaparavocê.—Pai!Issoéumaloucura.Estouindobemaqui.Porfavor,nãomandeZoe...—Sintomuito, Sydney—ele disse.—Vocême deixou sem escolha. Por favor,

nãosemetaemconfusãoduranteotempoquelheresta.Eledesligoueeufiqueiparadanocorredorcomocoraçãoapertado.Duassemanas!

Duas semanas e iammandar Zoe. E eu...? Para onde iammemandar? Eu não queriapensar sobre o assunto, mas sabia. Precisava impedir que aquilo acontecesse. Asengrenagens já estavam em movimento. As tatuagens, pensei de repente. Se pudesseterminar meus testes com as substâncias roubadas e descobrir informações sobre ofornecedordesangue,euganhariapontoscomosalquimistas—esperoqueosuficienteparatiraramáculaqueKeithtinhacolocadosobremim.E por que ele tinha feito isso? Por que agora? Eu sabia que ele nunca quis que eu

tivesse idopara lá.Talvezele sóestivesseganhando tempo, juntandoevidências contramim até que pudesse fazer comque eu fosse deposta comumgolpe certeiro.Mas nãoiria permitir que aquilo acontecesse. Eu desvendaria o caso das tatuagens e provariaquem era a estrela dos alquimistas. Eu tinha provas suficientes agora para chamar aatençãodeles,epoderiasimplesmenteentregaroquetinhasenadadenovoviesseàtonaemumasemana.A decisão me encheu de determinação, mas, mesmo assim, tive dificuldade para

dormirquandofuiparaacama,mais tarde.Aameaçadomeupaipairavasobremim,assimcomomeumedodocentrodereeducação.Depoisdemaisoumenosumahorarevirandonacama,finalmentecaínosono.Mas,

mesmoassim,fiqueiagitadaepreocupada.Acordeidepoisdepoucashorasetivequemeesforçarparaconseguirdormirnovamente.Dessavez,eusonhei.

Nosonho,euestavanasaladacasadeClarence.Tudoestavaarrumadoenolugar,amadeira escura e a mobília antiga davam ao ambiente uma sensação agourenta. Osdetalheseramsurpreendentementevívidos,eeracomoseeupudessesentirocheirodoslivrosempoeiradosedocourodamobília.—Hum.Deucerto.Nãotinhacertezaseiadarcomumhumano.EumevireiparatráseviAdrianapoiadonaparede.Ele não estava lá no momento anterior, e tive um flash do medo de vampiros

surgindodonadaqueeutinhanainfância.Entãomelembreidequeerasóumsonho,equeaqueletipodecoisaacontecia.—Sobreoquevocênãotinhacerteza?—perguntei.Elefezumgestoaoredordesi.—Seeuseriacapazdeentraremcontatocomvocê.Trazervocêparadentrodeste

sonho.—Eunãoentendimuitobemoqueelequeriadizerenãofaleinada.Elearqueouumasobrancelha.—Vocênãosabe,sabe?Ondevocêestá?— Na casa de Clarence — respondi, razoável. — Bom, na realidade, estou

dormindonaminhacama.Issoésóumsonho.—Vocêestámeiocerta—eledisse.—Esteéumsonhodeespírito.Éreal.Franziatesta.Umsonhodeespírito.Comoamaiorpartedas informaçõesquenós

tínhamos a respeito do espírito era incerta, não sabíamos quase nada sobre sonhos deespírito.AmaiorpartedoqueeusabiatinhaaprendidocomRose,quecomfrequênciatinha recebido visitas deAdrian enquanto dormia. De acordo com ela, a pessoa quesonhavaeovampirousuáriodeespíritonaverdadeestavamjuntos,emumencontrodementes, comunicando-se através de longas distâncias. Paramim, era difícil apreenderaquilototalmente,maseuhaviatestemunhadoRoseacordandocominformaçõesquenãopoderia ter obtido de outramaneira.Mesmo assim, não tinha evidências para sugerirquedefatoestivesseemumsonhodeespíritoagora.—Esteéapenasumsonhocomooutroqualquer—retruquei.—Temcerteza?—eleperguntou.—Olheaoredor.Concentre-se.Nãoachaquea

sensação édiferente? É como um sonho... mas não é um sonho. E também não éexatamenteigualàvidareal.Chamedoquequiser,masdapróximavezquenosvirmosnomundodesperto,podereidizeravocêexatamenteoqueaconteceuaqui.Olhei ao redor da sala, observando tudo como ele tinha sugerido. Mais uma vez,

fiquei surpresapelanitidez atédosmínimosdetalhes.Certamenteparecia real,masossonhosgeralmentepareciam...certo?Vocêgeralmentenuncasabiaqueestavasonhandoaté acordar. Fechei os olhos e respirei fundo, tentando acalmar amente. E, assim, eusenti. Entendi o que ele quis dizer. Não era exatamente igual a um sonho. Não eraexatamenteigualàvidareal.Meusolhosseabriram.—Parecomisso—exclameiemeafasteidele.—Façaacabar.Metiredaqui.Porque, ao aceitar que aquele realmente era um sonho de espírito, eu teria que

reconheceroutracoisa:euestavarodeadapormagiadevampiro.Aminhamenteestavaentremeada nisso. Eu me senti claustrofóbica. A magia fazia pressão sobre mim,esmagavaoar.—Porfavor—aminhavozfoi ficandocadavezmaisfrenética.—Porfavor,me

deixeirembora.Adrianseendireitou,demonstrandosurpresa.—Nossa,Sage.Acalme-se.Estátudobem.—Não.Nãoestá.Eunãoqueroisto.Eunãoqueroqueamagiametoque.—Nãovaiprejudicarvocê—eledisse.—Nãoénada.—Éerrado—sussurrei.—Adrian,parecomisto.Eleestendeuamãocomosefossetentarmereconfortar,eentãopensoumelhor.—Eunãovouprejudicarvocê—repetiu.—Sóescuteoqueeutenhoadizerevou

dissolvertudo.Prometo.Mesmo no sonho, meu coração estava disparado.Abracei a mim mesma e recuei

paraaparede,tentandomefazerpequena.—Certo—sussurrei.—Andelogo.—Eusóqueriadizer...—Eleenfiouasmãosnosbolsosedesviouoolhar,poucoà

vontade, antesdevoltar aolharparamimmaisumavez.Seráque seusolhosestavammais verdes do que na realidade?Ou será que era apenas aminha imaginação?—Euqueria...queriapedirdesculpas.— Por quê? — perguntei. Não conseguia processar nada além do meu próprio

terror.—Peloqueeufiz.Vocêtinharazão.Desperdiceiseutempoeseutrabalhohoje.Forceiaminhamenteparanãoficarretornandoàslembrançasdaquelatarde.—Obrigada—eudissesimplesmente.—Não sei por que faço essas coisas— ele completou.— É que eu não consigo

evitar.Eucontinuavaapavorada,continuavasufocadapelamagiaquemerodeava.Dealgum

modo,conseguireproduziraminhaconversaanteriorcomEddie.—Vocêécapazdesecontrolar—eudisse.—Vocênãoéumavítima.Adrian estava olhando para o outro lado, incomodado com seus pensamentos. De

repente,comumgestobrusco,voltouaolharparamim.—IgualzinhaaRose.—Oquê?Adrian estendeu a mão e uma rosa vermelha cheia de espinhos de repente se

materializouali.Engoliemsecoetenteirecuarmais.Elebrincoucomocaboentreosdedos,comcuidadoparanãoseespetar.—Eladisse isso.Queeuestavafazendopapeldevítima.Seráqueeusouassimtão

patético?

A rosa murchou e se desfez diante dos meus olhos; primeiro transformou-se emcinzas,edepoisdesapareceucompletamente.Fizosinalcontraomalnoombroetenteimelembrardoquenósestávamosfalando.—Patéticonãoéapalavraqueeuusaria—eudisse.—Quepalavravocêusaria?Aminhamentetinhadadoumbranco.—Nãosei.Confuso?Elesorriu.—Issoéamenizarasituação.—Vou conferir em um dicionário quando acordar e dou um retorno para você.

Podeporfavoracabarcomisto?Osorrisosetransformouemumaexpressãodesurpresa.—Vocêestáassustadamesmo,nãoestá?Deixeimeusilêncioresponderpormim.—Certo, então, sómais uma coisa. Pensei em outro jeito para conseguir sair da

casadeClarenceearrumaralgumdinheiro.Estavalendosobreauxíliofinanceiroparaafaculdade. Se eu estudasse em algum lugar, você acha que eu conseguiria o suficienteparaviver?Aquelaeraumaperguntaconcretaqueeutinhacomoencarar.— É possível.Mas acho que é tarde demais.As aulas já começaram em todos os

lugares.—Encontreiuma faculdadena internet.Carlton.Ficadooutro ladodacidadeeas

aulas ainda não começaram.Mas eu vou ter que ser rápido, e... é isso que eu não seifazer.Apapelada.Osprocedimentos.Masessaéasuaespecialidade,certo?— É triste, mas é verdade— respondi. Uma parte de mim achava que Carlton

pareciafamiliar,maseunãoconseguialocalizarainformação.Elerespiroufundo.—Vocêmeajuda?Euseiqueé fazervocêdarumadebabáoutravez,masnãosei

porondecomeçar.Sóprometoquevoufazeraminhaparte.Digaoquetenhoquefazer,eeufaço.Darumadebabá.EleandoufalandocomJilloucomEddieoucomambos.Masisso

era compreensível. Ele iria querer saber se estava tudo bem com ela. Eu só podiaimaginarcomoomeudiscursotinhasidoparafraseado.—Vocêjáestevenafaculdade—eudisse,aomelembrardosregistrosdele.Euos

tinhaexaminadoquandomonteiseufamigeradocurrículo.—Elargouosestudos.Adrianconcordou.—Foi.—Comoéquevousaberquevocênãovaifazeramesmacoisadestavez?Comovou

saberquevocênãovaisódesperdiçaromeutempodenovo?

—Nãotemcomosaber,Sage—elereconheceu.—Eeunãoculpovocê.Sópossopedirquemedêmaisumachance.Que tente acreditar emmimquandodigoquevoufazeroqueestoudizendo.Queacreditequeeuestoufalandosério.Queconfieemmim.Longosmomentos seestenderamentrenós.Eu tinha relaxadoumpouco, semnem

perceber, apesar de continuar contra a parede. Eu o examinei, desejando que fossemelhoremdesvendaraspessoas.Osolhosdeleeramverdesdaquele jeitonarealidade,concluí.Erasóqueeunãocostumavaolharparaelescomtantaatenção.—Certo—eudisse.—Euconfioemvocê.Umaexpressãochocadatomousuasfeições.—Ésério?Eu não eramelhor em desvendar as pessoas do que tinha sido dez segundos antes,

mas, naquele momento, de repente tive um insight sobre o mistério que eraAdrianIvashkov.Aspessoasnãoacreditavamnelecommuita frequência.Todos tinhambaixasexpectativas em relação a ele, por isso ele agia damesma forma.Até Eddie de certaformaodesprezava:“Eleéo Adrian”.Comosenãohouvessenadaase fazerarespeitodisso.Também percebi de repente que, por mais improvável que fosse, Adrian e eu

tínhamosmuitoemcomum.Nósdoisvivíamos tolhidospelasexpectativasdosoutros.Não fazia diferença se as pessoas esperavam tudo de mim e nada dele. Nóscontinuávamos iguais, ambos sempre tentando fugir dos limites que os outros tinhamdefinido para nós e sermos donos do próprio nariz. Adrian Ivashkov — vampirobaladeiroe irreverente—eramaisparecidocomigodoquequalqueroutrapessoaqueeuconhecia.Aideiaeratãosurpreendentequeeunemconseguirespondernahora.—Confio—eudisse finalmente.—Vouajudarvocê.—Estremeci.Omedodo

sonho tinha voltado, e eu só queria que aquilo terminasse. Teria concordado comqualquer coisa para retornar à minha cama nada sobrenatural.—Mas não aqui. Porfavor...podememandardevolta?Ouacabarcom isso?Ouseja láoquevocê temdefazer?Ele assentiu devagar, ainda com a expressão em choque. A sala começou a

desaparecer,suascorese linhassederreteramcomoumapinturadeixadanasala.Logotudoficoupreto,eeumeviacordandonacamadodormitório.Quandoissoaconteceu,malescuteiosomdavozdelenaminhamente:Obrigado,Sage.

19

Se eu estava com dificuldades para dormir antes, o sonho deAdrian só serviu para piorar ascoisas.Apesardeestardevoltaàminhaprópriacama,emsegurança,eunãoconseguiame livrar da sensação de que tinha sido invadida. Imaginei que aminha pele estivessetodaarrepiadacomamáculadamagia.Fiqueitãoansiosaparasairdosonhoquenãomedeicontadireitodoqueeutinhaconcordadoemfazer.EurespeitavaodesejodeAdriandeirparaafaculdade,masagoraficavaimaginandoserealmentedeviaajudar,depoisdereceberabroncadomeupaiporser“simpática”comvampiros.Eunãoestavanomelhordoshumoresquandofinalmentemelevantei,algumashoras

mais tarde.A tensão no nosso quarto era pesada enquanto Jill e eu nos preparávamosparaasaulas.AatitudededesafiodeJilldanoiteanteriornãoestavamaislá,eelaficavame observando, nervosa, quando achava que eu não estava prestando atenção. Nocomeço,acheiqueaminhaexplosãodanoiteanteriorativessedeixadosemjeito.Mas,quandosaímosdoquartoparatomarcafédamanhã,percebiquenãoerasóisso.—Oquefoi?—pergunteisemrodeios,finalmenterompendoosilêncio.—Oque

vocêquermeperguntar?Jillmeolhoudesoslaiomaisumavezquandonosjuntamosaofluxodasmeninasque

desciamaescada.—Hum,aconteceuumacoisaontem.Muitas coisas aconteceram ontem, pensei. Esse era o meu eu exausto e amargo

falando,esabiaquenãoeraissoqueelaqueriadizer.—Oquê?—perguntei.—Bom...euestavacomeçandoacontarparavocêqueLeemelevouàquelaloja.A

loja de roupas cuja dona ele conhece, sabe? O nome dela é Lia DiStefano. Nósconversamos,eela,hum,meofereceuumtrabalho.Maisoumenos.—Otrabalhodemodelo?—Nóschegamosàfiladacomidanorefeitório,apesarde

euestarsemapetite.Escolhiumiogurte,quepareciatristeesozinhonomeiodaminha

bandejavazia.—Nósjáconversamossobreisso.Nãoéseguro.Aindaassim,erairônicoofatodeumavisitaaleatóriaterrendidoumempregopara

Jill,aomesmotempoquetrêsentrevistasformaisnãoadiantaramnadaparaAdrian.— Mas não é para fotos posadas que seriam publicadas em uma revista ou algo

assim.Éumdesfiledeestilistaslocais.Nóscontamosaelaumahistóriadequefazemospartedeumareligiãoquetemrestriçõesarespeitodefotoseidentidade.Liadisseque,na verdade, estava pensando em fazer as modelos usaremmeia-máscara. Sabe, aqueletipoqueseusaembailesmascarados?Considerandoisso,ailuminaçãoeomovimento...bom,vaiserdifícilmeidentificarsealgumafotofordivulgada.Éumeventoúnico,maseuteriaque ir láantesparaasprovasderoupas...eparaensaiar.Ela tambémiriamepagar,masprecisodecaronaepermissãodospais.Nósnossentamoseeupasseiumaquantidadedetempodesnecessáriamexendoomeu

iogurteenquantorefletiasobreaspalavrasdela.Davaparasentirseuolharemcimademimenquantoeupensava.Comoeunãorespondinada,elaprosseguiu:—Achoqueémeiobobo.Querdizer,eunãotenhonenhumaexperiência.Eeunem

seiporqueelaquerqueeuparticipe.Talvezestejaprocurandoalgumacoisaespecífica.Modelosbizarrasoualgoassim.Finalmentecomiumacolheradadeiogurteeentãoerguiosolhosparaela.—Você não é bizarra, Jill.Você tem o tipo físico ideal para ser modelo. Isso é

difícildeencontrar.Entreoshumanos,pelomenos.—Tenteinãopensaremcomoeradifícilparanós,humanos,atingiraperfeiçãodosMoroi.Tenteinãopensarsobrecomo,anos antes, meu pai tinha criticado a minha silhueta e dito: “Se aqueles monstrosconseguem,comoéquevocênãoconsegue?”.—Masvocêachaqueéumapéssimaideia—eladisse.Não respondi. Eu sabia o que Jill queria, mas ela não conseguia me pedir

diretamente. E eu ainda não podia entregar isso a ela com facilidade.Ainda estavaperturbadademaiscomoquetinhaacontecidonodiaanterior,enãoestava inclinadaafazer nenhum favor.Por outro lado, eu tambémnãopodia dizer“não” a ela.Nãoporenquanto. Apesar da maneira irresponsável como ela tinha agido, suas palavras arespeitodecomoavidadelaera triste tinhammeatingidoprofundamente.Aquiloeraalgopositivoebomquepreencheriaseutempo.Tambémeraumainfladanoegodequeelaestavaprecisandomuito.LaureltinhadeitadoeroladousandoostraçosincomunsdeJillcontraela;seriabomseelavissequeoutraspessoasosviamdemaneirapositiva.Elaprecisava sedar contadeque era especial emaravilhosa.Não sabia se devia xingar ouagradecerLeeporaquelaoportunidade.—Achoquenãopodemosdecidir nada até conversarmos coma sra.Weathers—

finalmentedisse a ela.Dei umaolhada emum relógiopróximo.—Aliás, precisamosfalarcomelaagora.

Deimaisalgumascolheradasnoiogurteantesdejogarfora.Jillpegouumarosquinhapara viagem. Quando voltamos ao saguão do alojamento, descobrimos que haviachegadoumaencomendaparaJill:umbuquêderosasvermelhasperfeitaseumbilhetededesculpadeLee.Jillsederreteutoda,seurostoseenchendodeadoraçãocomogesto.Atéeuadmireiaquelegestoromântico,apesardeumapartesarcásticademimdizerqueLee devia ter mandado flores para mim e Eddie, e não para ela. Ele precisava pedirdesculpas para nós. De todo modo, as flores logo foram esquecidas quando nosacomodamosnasaladasra.WeathersedescobrimosqualseriaoveredictoparaJill.—Converseicomodiretor.Vocênãovai ser suspensa—eladissea Jill.—Mas,

duranteopróximomês, ficará restrita ao seudormitórioquandonãoestiver emaula.Deveseapresentarimediatamenteamimdepoisdofimdasaulas,paraeusaberqueestáaqui.Podeiraorefeitórioduranteasrefeições...massóaodoseualojamento.Nãopodeiraodocampusoeste.Asúnicasexceçõesaestaregrasãonocasodeumatarefaouumprofessor exigir que você vá a algum outro lugar fora do horário de aulas, como abiblioteca.Nósduasassentimose,poruminstante,fiqueisimplesmentealiviadaporJillnãoter

sidoexpulsaoualgodotipo.Entãooproblemarealmeocorreucomoumtapanacara.EutinhaditoaJillqueaquelareuniãoiriasurtirefeitosobrequalquerdecisãorelativaaotrabalhodemodelo,mashaviaalgomuitopioremjogo.—Seelaestiverdecastigonodormitório,entãonãopodesairdaescola—eudisse.Asra.Weathersmelançouumsorrisoseco.—Sim,srta.Melrose.Geralmenteéissoque“estardecastigo”significa.—Elaprecisasair,senhora—argumentei.—Nóstemosreuniõesdefamíliaduas

vezes por semana. — O ideal era que fosse mais vezes do que isso, mas eu tinhaesperanças de que um número baixo pudesse comprar a nossa liberdade. Eraabsolutamente essencial que Jill obtivesse sangue, e dois dias por semana era mais oumenosomínimocomoqualumvampiroeracapazdesobreviver.—Sintomuito.Regrassãoregrase,aodesrespeitá-las,suairmãperdeuoprivilégio

departicipardeatividadesassim.—Osencontrossãoreligiosos—eudisse.Detestavajogarcomacartadareligião,

mas aquilo era algo que a escola teria dificuldade em recusar. E, bom, parecia terfuncionadocomaestilista.—Nósvamosàigrejaemfamílianessesdias...nósenossosirmãos.Orostodasra.Weathersrevelavaqueeutinhaganhadoterreno.—Vamosprecisardeumacartaassinadapelospaisdevocês—elafinalmentedisse.Maravilha.Afinal,issotinhafuncionadotãobemnaeducaçãofísica...—Mas e o nosso irmão? Ele é o nosso guardião legal aqui.— Era certeza que,

naquelecaso,nemKeithpoderiaenrolar,nãoquandoaquestãoerasangue.Elarefletiusobreoassunto.

—Sim.Issopodeseraceitável.— Sinto muito — disse a Jill quando saímos para tomar o ônibus. — Sobre o

trabalho de modelo. Já vai ser bem difícil conseguir fazer você sair para osfornecimentos.Jillassentiu,esforçando-separaesconderadecepção.— Quando é o desfile? — perguntei, achando que talvez ela pudesse participar

depoisqueocastigotivesseterminado.—Daquiaduassemanas.Queideiamaisfurada.—Sintomuito.Paraaminhasurpresa,Jillchegouadarrisada.—Vocênãotemmotivoparasentirmuito.Nãodepoisdoqueeufiz.Euéquetenho

desentirmuito.EtambémsintomuitoporAdrian...pelasentrevistas.—Issoéalgopeloqualvocênãotemquesedesculpar.Maisumavez, fiquei impressionadadevercomotodomundo ficava sedesculpando

em nome dele com tanta facilidade. Ela comprovou essa teoria com seu próximocomentário.—Elenãopodefazernada.Eleéassim.Maselepodefazeralgumacoisa,sim,pensei.Emvezdisso,disse:—Aguentefirme,certo?VoupediraKeithparaassinarasualiberaçãoreligiosa.Elasorriu.—Obrigada,Sydney.Nóscostumávamosnossepararquandooônibuschegavaaocampuscentral,masela

hesitou quando descemos. Mais uma vez, pude ver que ela queria me contar algumacoisa,masestavacomdificuldadedejuntarcoragemparaisso.—Oquefoi?—euperguntei.—Eu...sóqueriadizeravocêquesintomuito,deverdade,pordartantotrabalho.

Vocêfazmuitopornós.Deverdade.Eseestáaborrecida,éporque...bom,euseiqueseimportaconosco.Eissoémaisdoquepossodizerdealgumaspessoasdacorte.—Issonãoéverdade—eudisse.—Aspessoasláseimportam.Elastiverammuita

dificuldadeparamandarvocêparacá,paraquepudesseficarasalvo.— Eu continuo achando que foi mais por Lissa do que por mim — ela disse,

tristonha.—Eaminhamãenãodemonstroumuitaoposiçãoquandodisseramqueiammemandarparalonge.— Querem que você fique em segurança — disse a ela. — Isso significa fazer

escolhasdifíceis...quesãodifíceisparaelestambém.Jill assentiu, mas não sei se acreditou emmim. Fiz o relatório damanhã a Eddie

quandochegueiàauladehistória.Orostodeleexibiutodaumagamadeemoçõesacadanovoavançodahistória.

—VocêachaqueKeithvaiassinaraautorização?—eleperguntouemvozbaixa.—Eletemqueassinar.Aquestãotodadeestarmosaquiéparamantê-laviva.Seela

morrerdefome,meioquevaicontraopropósitoprincipal.NemmedeiaotrabalhodedizeraEddiequeestavaencrencadacommeupaiecom

os alquimistas, e que havia uma grande chance de eu nem estar mais ali em duassemanas.EddiejáestavabemaborrecidocomasituaçãodeJill,eeunãoqueriaqueeletivessemaisumacoisacomquesepreocupar.Quandome encontrei com a sra.Terwilliger no final do dia, entreguei as últimas

anotaçõesdoslivrosantigosquetinhafeitoparaela.Quandoestavameacomodandoemuma carteira, reparei em uma pasta de artigos em cima de uma mesa.As palavrasFaculdadeCarltonestavamgravadasnapastaemletrasdouradas.EntãomelembreiporqueacheionomefamiliarquandoAdrianotinhamencionadonosonho.—Sra.Terwilliger...PoracasodissequeconheciaalguémnaFaculdadeCarlton?Elaergueuosolhosdocomputador.— Humm? Ah, conheço, sim. Jogo pôquer com metade do corpo docente de

história.Atédouaulalánoverão.Dehistória,querdizer,nãodepôquer.— Será que conhece alguém responsável pelas admissões de novos alunos? —

perguntei.—Não exatamente. Suponho que eu conheça pessoas que conhecem as pessoas que

trabalhamcomisso lá.—Elaretornouaatençãoparaa tela.Nãodissenadae,depoisdeváriosminutos,elavoltouaolharparamim.—Porqueestáperguntando?—Pornada.— Claro que há uma razão. Está interessada em estudar lá? Deus sabe que ia

aproveitarmaisládoqueaqui.Claroqueaminhaaulaéexceção.—Não, senhora— respondi.—Mas o meu irmão queria estudar lá. Ele ouviu

dizerqueasaulasaindanãocomeçaram,masnãotemcertezasepodeseraceitoassimdeúltimahora.— Émuito de última hora— a sra.Terwilliger concordou. Elame avaliou com

muitaatenção.—Querqueeudêumaperguntada?—Ah.Ah não, senhora. Só queria ver se conseguia uns nomes para entrar em

contato.Jamaispediriaparaasenhorafazeralgoassim.Assobrancelhasdelaseergueram.—Porquenão?Nãosabiaoqueresponder.Àsvezeseratãodifícilentendê-la...—Porque...asenhoranãotemporquefazerisso.—Eufariacomofavoravocê.Não consegui dizer nada diante daquilo e só fiquei olhando para ela. Ela sorriu e

ajeitouosóculosemcimadonariz.—Vocênãoconsegueacreditarnisso,certo?Quealguémpossafazerumfavorpara

você.—Eu...bom,querdizer...—minhavozfoisumindo,nãosabiabemoquedizer.

—Asenhoraéminhaprofessora.Oseutrabalhoé,bom,meensinar.Sóisso.—Eoseutrabalho—eladisse—éviratéestasaladuranteoúltimoperíodopara

cumprirqualquertarefarotineiraqueeutenhaparavocê,edepoisentregarumtrabalhonofimdosemestre.Vocênãoéobrigada,demaneiranenhuma,abuscarcaféparamim,vir me atender tarde da noite, organizar a minha vida, ou ter que reordenar a suacompletamenteparacumprirosmeuspedidosridículos.—Eu...nãomeincomodo—respondi.—Etudoissoprecisaserfeito.Eladeurisada.— É verdade. E você insiste em fazer muito mais e além das suas tarefas, não é

mesmo?Pormaisinconvenientequesejaparavocê.Deideombros.—Eugostodefazerumbomtrabalho,senhora.—Você fazumtrabalhoexcelente.Muitomelhordoqueprecisa fazer.Eainda faz

sem reclamar. Portanto, o mínimo que eu posso fazer é dar alguns telefonemas paraajudá-la.— Ela deu risada mais uma vez.— Isso é o quemais assusta você, não é?Receberelogios.—Ah,não—respondi,semjeito.—Querdizer,acontece.Elatirouosóculosparameobservarcommaisatenção.Arisadatinhadesaparecido.—Não,estouachandoquenãoacontece.Nãoconheçoasuasituaçãoespecífica,mas

já conhecimuitos alunos como você... alunos que os pais despacharam destamaneira.Aomesmotempoqueaprecioapreocupaçãopelaeducaçãosuperior,cadavezmaisvejoqueumaparcelamuitograndedealunosestudaaquiporqueseuspaissimplesmentenãotêm temponem inclinaçãopara se envolver...ou simplesmenteparaprestar atenção àvidadosfilhos.Estávamos lidando com uma daquelas áreas interpessoais que me deixavam

constrangida,especialmenteporhaverumelementodeverdadeinesperadoali.—Émaiscomplicadodoqueisso,senhora.—Tenhocertezaque sim—ela respondeu.Suaexpressãoganhou sagacidadeeela

ficou bemdiferente da professora estabanada que eu conhecia.—Mas escute o que eudigo.Vocêéumagarotaexcepcional,talentosaebrilhante.Nuncadeixequeninguémafaçasentirinferior.Nuncadeixequeninguémfaçacomquevocêsesintainvisível.Nãopermitaqueninguém...nemmesmoumaprofessoraqueamandabuscarcaféo tempotodo...mandeemvocê.—Elavoltouacolocarosóculosecomeçouaerguerpedaçosdepapelaleatórios.Finalmente,encontrouumacanetaedeuumsorrisodetriunfo.—Então,pronto.Qualéonomedoseuirmão?—Adrian,senhora.—Certo.—Ela pegou um pedaço de papel e escreveu o nome com cuidado.—

AdrianMelbourne.—Melrose,senhora.—Correto. Claro.— Ela rabiscou o erro e balbuciou para si mesma:—Ainda

bem que o primeiro nome dele não é Hobart.— Quando terminou, se recostou nacadeiracomumgestocasual.—Agoraquevocêfalounisso,temumacoisaquequeroquefaça.—Ésódizer—respondi.—Queroquevocêfaçaumdosfeitiçosdaqueleprimeirolivro.—Desculpe.Disseparaeufazerumfeitiço?Asra.Terwilligeracenoucomamão.—Ah,nãosepreocupe.Nãoestoupedindoparavocêabanarumavarinhanemfazer

um sacrifício com animal. Mas estou enormemente intrigada pela complexidade dealgumas das fórmulas e dos passos dos feitiços. Precisome perguntar se as pessoas defatoseguiamessasinstruçõesassimtãodetalhadas.Algumasdelassãobemcomplicadas.—Eusei—respondi,seca.—Digiteitodaselas.— Exatamente. Então, quero que faça um. Siga os passos.Veja quanto tempo

demora.Vejaseasmedidaspedidaschegamaserpossíveis.Depoisescrevaosdadosemumrelatório.Nessaparte,seiquevocêéexcelente.Nãosabiaoquedizer.Asra.Terwilligernãoestavapedindoqueeurealmenteusasse

magia,certamentenãodamesmamaneiraqueosvampirosusavam.Algodaquelejeitonemseriapossível.Magianãoeraocampodoshumanos.Eraantinaturale iacontraasleisdouniverso.Aquiloqueosalquimistasfaziamtinhabasenaciênciaenaquímica.Astatuagenstinhammagia,maseraamagiadosvampirosmoldadadeacordocomanossavontade—nãoausávamospornossaconta.Omaispertoquechegávamosdequalquercoisa sobrenatural eram as bênçãos que invocávamos para nossas poções. Ela só estavame pedindo para recriar um feitiço. Não era real. Não havia mal nenhum. E, noentanto... por que eume sentia tão sem jeito? Eume sentia como se ela estivessemepedindoparamentirouroubar.—Qualéoproblema?—elaperguntou.Porummomento,penseiemusarareligiãomaisumavez,masentãodesisti.Aquela

desculpa já tinha sido usada vezes demais naquele dia, apesar de dessa vez serparcialmentelegítima.—Nada,senhora.Ésóquepareceestranho.Elapegouoprimeirolivrodecouroeabriunametade.— Pronto. Faça este aqui... um amuleto de incineração. É complicado, mas pelo

menos você terá um projeto de artesanato quando terminar.Também deve ser fácilencontraramaiorpartedessesingredientes.Pegueiolivrodelaeoexaminei.—Ondevouarrumarurtiga?

—Pergunteaosr.Carnes.Eletemumjardimdoladodeforadaclassedele.Tenhocertezadequevaipodercompraroresto.E,sabecomoé,vocêpodemetrazerasnotasfiscais. Eu pago sempre que peço para você comprar algo. Já deve ter gastado umafortunaemcafé.Eu me senti um pouco melhor quando vi como os ingredientes eram aleatórios.

Urtiga. Ágata.Um pedaço de seda.Não tinha nada inflamável.Aquilo era bobagem.Assenticomacabeçaedisseaelaqueiriacomeçarnodiaseguinte.Nesseínterim,digiteiumacartaparaAmberwoodemnomedeKeith.Explicavaque

asnossascrençasreligiosasexigiamapresençadafamílianaigrejaduasvezesporsemanaequeJillprecisavareceberlicençadeseucastigonessasocasiões.TambémprometiaqueJill iria se apresentar à sra.Weathers antes e depois das saídas familiares. Quandoterminei,fiqueibemsatisfeitacomomeutrabalhoesentiquetinhafeitoKeithparecerbemmaiseloquentedoquemerecia.Liguei para ele quando as aulas terminaram e fiz um resumo breve do que tinha

acontecidocomJill.Naturalmente,elejogouaculpaemmim.—Vocêtemqueficardeolhonela,Sydney!—Keithexclamou.—Tambémdevo ficar aquidisfarçadadealuna,enãoposso ficarcomela todosos

segundosdodia.Nãovaliaapenamencionarqueeu,naverdade,tinhasaídocomAdrianquandoJill

fugiu—nãoqueKeithpudessefazeralgocontramim.Elejátinhacausadoseudano.—E,assim,euéquetenhoquesofrerasconsequências—eledisseemumtomde

vozexausto.—Euéqueficomalvistoporcausadasuaincompetência.—Malvisto?Vocênãotemquefazernadaalémdeassinaracartaqueeuescrevipara

você.Estáemcasaagora?Ouvaichegarlogo?Vouatéaílevarparavocê.Comoele tinhaseaborrecidocomaquestão,acheique ficaria todocontentecoma

oferta.Porisso,foiumasurpresaquandoelerespondeu:—Não,nãoprecisafazerisso.Voumeencontrarcomvocê.—Nãotemproblema.Possochegaràsuacasaemmenosdedezminutos.—Eunão

queriaqueele tivessemaisummotivoparacontinuarcoma ladainhadequeeuestavadandotrabalho,ouparareclamarcomosalquimistas.—Não—Keithdisse,comuma intensidadesurpreendente.—Voumeencontrar

comvocê.Estousaindoagoramesmo.Nosencontramosnasecretaria?—Certo—eudisse, totalmenteconfusacomamudançadeatitudedele.Seráque

elequeriavirconferirascoisasoualgodotipo?Exigirumainspeção?—Agentesevêdaquiapouco.Eujáestavanocampuscentral,entãochegueiàsecretariabemrápido.Fiqueisentada

do lado de fora, em um banco de pedra esculpido que me dava uma boa visão doestacionamento de visitantes, e esperei. Fazia calor ao ar livre, como sempre, mas asombraerabemagradável.Obancoficavaemumespaçobemgostoso,cheiodeplantas

floridaseumaplacaquediziaMemorialKellyHayes.Parecianova.—Oi,Sydney!KristineJuliaestavamsaindodoprédioeacenaramparamim.Elasseaproximaram

esesentaramaomeuladoparaperguntaroqueeuestavafazendo.—Estouesperandoomeuirmão.—Eleébonito?—Kristinperguntou,cheiadeesperança.—Não—respondi.—Dejeitonenhum.—É, sim—Julia retrucou.—Euovino alojamentono fimde semanapassado.

Quandovocêstodossaíramparaalmoçar.DemoreiumsegundoparaperceberqueelaestavafalandodeAdrian.—Ah.Éoutroirmão.Elesnãosãomuitoparecidos.—Éverdadequeasuairmãsemeteunamaiorconfusão?—Juliaperguntou.Deideombros.—Sóumpouco.Elanãopodesairdocampus,anãoserparacoisasdefamília.Podia

serpior.Mas...custouaelaumtrabalhodemodelo,entãoelaestátristeporisso.—Elaiatrabalhardemodeloparaquem?—Kristinperguntou.Eumeesforceiparalembrar.— Lia DiStefano. Haverá um desfile daqui a duas semanas, e ela queria que Jill

participasse.Maselanãopodeensaiarporquetemqueficaraqui.Osolhosdelassearregalaram.—As roupas da Lia são fantásticas!— Julia disse.— Jill tem que participar. Ela

podeganharcoisasgrátis.—Eujádisse.Elanãovaipoderdesfilar.Kristindeixouacabeçapenderparaolado,pensativa.—Mas e se fosse para a escola?Tipo uma coisa de carreira, vocacional?—Ela se

virouparaJulia.—Oclubedecosturaaindaexiste?—Achoquesim—Juliarespondeu,assentindotodaanimada.—Queboaideia.Jill

tem alguma atividade?—Além de um esporte,Amberwood também exigia que seusalunos participassem de atividades extracurriculares para que sua educação fossecompleta.—Temumclubedecosturaparaoqualelapoderiaentrar...eapostoqueelaconseguefazercomqueotrabalhocomLiacontecomoalgumtipodepesquisaespecial.Aotentarconsertarumfio soltoemseucardigãoutrodia, Jillquasedesfiouapeça

toda.—NãoachoqueJilllevejeitoparaisso.—Nãofazmal—Kristindisse.—Amaiorpartedaspessoasqueestálánemsabe

costurar.Mas,todososanos,oclubefaztrabalhovoluntáriocomosestilistaslocais.Asrta.Yamanisemdúvida iriapermitirqueaparticipaçãoemumdesfilecontassecomotrabalhovoluntário.ElaadoraLiaDiStefano.— E deixariam ela participar de qualquer jeito — Julia disse com expressão

triunfante.—Porqueseriaparaaescola.— Interessante— eu disse, imaginando se havia alguma chance de dar certo.—

VoudizeraJill.—Umcarroazulconhecidoencostounaentradaemelevantei.—Elechegou.Keith estacionou, saiudo carroe ficouolhando ao redor, àminhaprocura.Kristin

soltouumsombaixinhodeaprovação.—Elenãoénadamal.—Podeacreditar—eudisse,efuiemdireçãoaocarro.—Vocênãovaiquererse

metercomele.Keithlançouparaasmeninasalgoquesupostamentedeviaserumsorrisoencantador

eatépiscouparaelas.Noinstanteemqueelasse foram,osorrisodeledesapareceu.Aimpaciência irradiavadele,eera surpreendenteo fatodeelenãoestarbatendoopénochão.—Vamosandarlogocomisto—eledisse.—Seestácomtantapressa,devia termedeixado iratéoseuapartamentoquando

tivessemaistempo.Peguei a pasta que continha a carta e entreguei para ele com uma caneta. Keith

assinousemnemolharedevolveu.—Precisademaisalgumacoisa?—eleperguntou.—Não.—Não arrumemais nenhuma confusão— ele disse e abriu a porta do carro.—

Nãotenhotempoparaficarconsertandoosseuserros.—Efazdiferença?—euodesafiei.—Você já feztudoquepôdeparase livrarde

mim.Elemelançouumsorrisofrio.—Vocênãodeviatertentadomesacanear.Nemagora,nemdaquelavez.Com uma piscadela, ele deumeia-volta para ir embora. Fiquei só encarando, sem

conseguir acreditar em sua audácia. Era a primeira vez que ele fazia referência ao quetinhaacontecidotantosanosantes.— Bom, essa é a questão — gritei para a silhueta que se afastava. — Eu não

consegui sacanear com você daquela vez. Você se safou com facilidade. Não vaiacontecer de novo.Acha que estou preocupada com você? Você é que devia ficar commedodemim.Keith parou e se virou devagar paramim, como rosto inundadode descrença. Eu

nãooculpava.Eumesmafiqueiumpoucosurpresa.Nãomelembravadenenhumavezemque tivesse desafiado demaneira tão escancarada alguémque ocupava uma posiçãohierárquica mais elevada; e certamente não alguém que tinha tanto poder de afetar aminhasituação.—Tomecuidado—eledissefinalmente.—Possotornarasuavidabemdifícil.

Lanceiumsorrisogélidoparaele.— Isso você já fez, e é por isso que a vantagem éminha.Você já fez a pior coisa

possível...masaindanãoviutudoqueeusoucapazdefazer.Foiumblefeenormedaminhaparte,principalmenteporqueeu tinhaquasecerteza

dequeeleaindapodia fazercoisapior.Atéondeeusabia,elepodia fazercomqueZoefosse para lá amanhã. Ele podia fazer com que me mandassem para um centro dereeducaçãoemumpiscardeolhos.Mas,seeucaísse...elecairiacomigo.Ele ficou me encarando por alguns instantes, sem saber o que fazer. Não sei se

realmente o assustei ou se ele resolveu não se dignar a me dar uma resposta, masfinalmente ele se virou e foi embora de vez. Furiosa, entrei para entregar a carta nasecretaria.Asecretáriadarecepção,asra.Dawson,carimboue fezumacópiaparaeuentregaràsra.Weathers.Quandoelameentregouopapel,perguntei:—QueméKellyHayes?Orostodasra.Dawson,normalmentecheiodecovinhas,murchou.—Coitadinha.Elafoialunaaquiháalgunsanos.Minhamemóriadeuumestalo.—Foielaqueasra.Weathersmencionou?Agarotaquedesapareceu?Asra.Dawsonassentiu.—Foi terrível.Ela tambémera tãodoce...Tão jovem...Elanãomereciamorrer

daquelejeito.Nãomereciamorrer,dejeitonenhum.Detestavaterqueperguntar,maseranecessário.—Comoelamorreu?Querdizer, eu sei que foi assassinada,mas nunca soubedos

detalhes.—Provavelmente émelhor assim. Foi tudobemhorrível.—A sra.Dawsondeu

umaolhada ao redor, como se estivesse commedode semeter emconfusãopor fazerfofoca comuma aluna. Ela se debruçou por cima do balcão, naminha direção, comorostosério.—Acoitadinhasangrouatémorrer.Cortaramagargantadela.

20

Quaseperguntei:“Estáfalandosério?”. Mas,vamosencarar:elaprovavelmentenãobrincariacomaquele tipo de coisa, principalmente levando em conta como seu rosto estava sério.Outras perguntas surgiram naminhamente,mas as guardei paramim também. Elasnão eram assimtão estranhas, mas não queria chamar a atenção por demonstrar uminteresse fora do comumpor um assassinato terrível. Em vez disso, apenas agradeci àsra.Dawsonpelaajudacomacartaevolteiparaocampusleste.Asra.Weathersestavaemsuamesaquandoentreinoalojamento.Entregueiacarta

eelaaleuduasvezesantesdeguardaremseuarquivo.—Certo—eladisse.—Apenasgarantaqueasuairmãassinealistaquandosaire

quandovoltar,todasasvezes.—Podedeixar,senhora.Obrigada.—Hesitei, semsaberse iaemboraouse fazia

asperguntasquea informaçãodadapelasra.Dawsontinhasuscitado.Resolvi ficar.—Sra.Weathers...desdeodesaparecimentodeJill, ficopensandosobreaquelagarotadequemasenhoramefalou.Aquemorreu.FicopensandoquepodiatersidoJill.Orostodasra.Weatherssesuavizou.— Está tudo bem com Jill. Eu não devia ter lhe contado isso. Não era minha

intençãoassustá-la.—Éverdadequecortaramagargantadagarota?—É, sim— ela sacudiu a cabeça, tristonha.—Terrível, simplesmente terrível.

Nãoseiquemfazumacoisadessas.—Chegaramadescobriroqueaconteceu?Querdizer,haviaalgoforadocomuma

respeitodela?—Fora do comum?Não, na verdade, não.Quer dizer, era uma garota adorável.

Inteligente, bonita, popular. Era boa... não, ótima atleta.Tinha amigos, namorado.Mas nada que a fizesse se destacar especialmente como alvo.Claro que as pessoas quefazemcoisashorríveisassimprovavelmentenãoprecisamdemotivos.

—Éverdade—murmurei.Fuiatéomeuquartodesejandoqueasra.Weatherstivessedescritoumpoucomaisa

belezadeKelly.Naverdade,queriasaberseKellyeraMoroi.Sefosse,tinhaesperançadequeasra.Weatherstalvezcomentassesobrecomoeraaltaoupálida.Deacordocomos relatos de Clarence e dos alquimistas, não havia nos registros nenhumMoroi quetivesse morado na área de Palm Springs. Mas isso não significava que alguém nãopudesseterpassadodespercebido.Teriaqueencontrararespostasozinha.SeKellyfossemesmoMoroi,então já teríamos trêsgarotasMoroimortasdamesmamaneirano suldaCalifórniaemumperíodorelativamentecurto.Clarencepodiadefendersuateoriadecaçadoresdevampiros,mas,paramim,aquelepadrãoindicavaclaramenteosStrigoi.Jillestavanoquarto,cumprindoseucastigo.Quantomaiso tempopassava,menos

me sentia irritada com ela.Ter acertado a questão do fornecimento ajudou. Ficariamuitomaisaborrecidasenãopudessetirá-ladocampus.—Qualéoproblema?—elaergueuosolhosdolaptopeperguntou.—Porquevocêachaqueháalgumproblema?Elasorriu.— Você está com aquela cara. É uma ruguinha que aparece entre as suas

sobrancelhasquandoestátentandodecifraralgumacoisa.Sacudiacabeça.—Nãoénada.— Sabe — ela falou —, talvez todas essas responsabilidades que você tem não

seriamtãoruinssevocêconversassesobreelasedeixasseoutraspessoasajudarem.—Nãoébemassim.Ésóalgoqueestoutentandodesvendar.—Conteoqueé—elaofereceu.—Podeconfiaremmim.Não era uma questão de confiança. Era uma questão de deixá-la preocupada sem

necessidade.Asra.Weathers tinhamedodemeassustar,mas sehaviamesmoalguémmatando garotas Moroi, não era eu que estava em perigo. Olhei para Jill e para seuolhardeterminadoechegueiàconclusãodeque,seelaeracapazdevivercomofatodeque seu próprio povo estava tentando matá-la, seria capaz de lidar com aquilo.Apresenteiaelaumresumobrevedoqueeusabia.—MasvocênãosabeseKellyeraMoroi—eladisse,quandoterminei.—Não. Essa é a questão central—me sentei de pernas cruzadas na cama como

laptop.—Vou conferir os nossos registros e os jornais locais para ver se encontroalguma foto dela.A única informação que a sra.Weathersme deu é que ela era umaótimaatleta.—Oque pode significar que ela não eraMoroi— Jill disse.—Quer dizer, veja

comoomeudesempenhonosoléhorrível.Eseelanãofosse?Suasteoriasdependemdofatodeela serMoroi.Mase seela fossehumana?Edaí?Podemos ignorar?Aindapodeseramesmapessoa...masoquesignificariaseoassassinotivessematadoduasMoroie

umahumana?Jilltinharazão.—Nãosei—respondi.A minha pesquisa não demorou muito. Os alquimistas não tinham registro do

assassinato, mas, bom, não teriam mesmo se Kelly fosse humana. Muitos jornaistraziamreportagensarespeitodela,masnãoencontreinenhumafoto.—Equetalumanuáriodaescola?—Jillperguntou.—Alguémdeveterumpor

aí.—Naverdade,essaéumaideiaexcelente—eudisse.—Estávendo?Eudisseparavocêquesouútil.Sorriparaelaeentãomelembreidealgo.—Ah,tenhoboasnotíciasparavocê.Talvez.Fizumresumorápidodo“plano”deKristineJuliasobreelaentrarparaoclubede

costura.Jillsealegrou,masdemaneiracautelosa.—Vocêachamesmoquepodedarcerto?—Sótemumjeitodedescobrir.—Nuncatoqueiemumamáquinadecosturanavida—eladisse.—Achoqueéasuaoportunidadedeaprender—disseaela.—Outalvezasoutras

garotasjáfiquemfelizesportervocêporpertocomoamodelodaturma.Jilldeuumarisadinha.—Comovocêsabequesómeninasseinscrevemnisso?—Nãosei—reconheci.—Sóestoumeatendoaosestereótiposdegênero,acho.Meu telefone tocou e o número da sra.Terwilliger piscou na tela.Atendi e jáme

prepareiparabuscarcafé.—Srta.Melbourne?—eladisse.—SevocêeoseuirmãopuderemiratéaCarlton

daqui a uma hora no máximo, poderão falar com alguém na secretaria de admissõesantesquefeche.Vocêsconseguem?Dei uma espiada no relógio e imaginei queAdrian não devia estar fazendonada de

importante.—Hum,conseguimos.Conseguimos,sim,senhora,comcerteza.Obrigada.Muito

obrigadamesmo.—Ohomemcomquemvocêsdevem falar se chamaWesRegan.—Ela fez uma

pausa.—Eseráquepodemetrazerumcappuccinoquandovoltar?Garanti a ela que sim e então liguei para Adrian e dei instruções para que se

aprontasseemeesperasse.Comrapidez,tireiouniformeevestiumablusaesaiaatéosjoelhos.Deiumaolhadanomeureflexoepercebiqueele tinharazão.Realmente,nãohaviamuitadiferençaentreasroupasdeAmberwoodeomeuguarda-roupanormal.—Queria poder ir junto— Jill disse, esperançosa.—Gostaria de verAdrian de

novo.—Masvocênãoovêtodososdias,decertaforma?— É verdade— respondeu.— Mas eu ainda não consigo entrar na cabeça dele

quando quero. Só acontece de um jeito aleatório. E, de todo modo, não é a mesmacoisa.Elenãopodemeresponderpormeiodolaço.Quaserespondiqueaquilopareciamelhordoqueestarpertodelepessoalmente,mas

acheiquenãoiriaajudaremnada.Adrianestavaprontopara sairquandocheguei àcasadeClarence,animadoeávido

poração.—Você não encontrou com o seu amigo por pouco — ele disse ao entrar no

Pingado.—Quem?—Keith.Fizumacareta—Elenãoémeuamigo,naverdade.—Ah,jura?Amaioriadenóspercebeuissonoprimeirodia,Sage.Eume senti um pouco mal com isso. Uma parte de mim sabia que eu não devia

permitir que osmeus sentimentos pessoais em relação a Keith semisturassem com otrabalho.Nóséramosmaisoumenoscolegas,edevíamosnosmantercomoumaequipeunidaeprofissional.Aomesmotempo,estavameiofelizporessaspessoas—apesardeserem vampiros e dampiros—não acharemque eu era simpática comKeith. Eu nãoqueriaqueelesachassemquenóstínhamosmuitacoisaemcomum.Eudefinitivamentenãoqueriatermuitoemcomumcomele.OsignificadocompletodaspalavrasdeAdrianderepentemeocorreu.—Espere.Eleestavaaquiagorahápouco?—Fazmeiahora.Deviateridoparaládiretodaescola.Tivesortedenãomeencontrarcomele.Algo

mediziaqueelenãoiriaaprovarminhaajudacomaeducaçãodeAdrian.—Oqueeleveiofazeraqui?—Sei lá.Acho que veio ver comoClarence estava.O velho não anda se sentindo

muitobem.—Adriantirouummaçodecigarrosdobolso.—Vocêseincomoda?—Meincomodo,sim—respondi.—OquehádeerradocomClarence?— Não sei, mas ele anda descansando muito, e isso deixa as coisas ainda mais

entediantes.Querdizer,elenãoéamelhorpessoaparaseconversar,masalgumasdashistórias malucas dele eram interessantes — Adrian ficou melancólico. —Principalmentecomuísque.— Mantenha-me informada sobre como ele está indo — murmurei. Fiquei

imaginando se era por isso que Keith estava com tanta pressa antes. Se Clarenceestivesse com alguma doença séria, nós teríamos que tomar providências junto a um

médicoMoroi. IssocomplicariaonossoarranjoemPalmSpringsporqueou íamos terque transferirClarenceparaoutro lugar, ou trazer alguémpara cá. SeKeith estivessetrabalhando nisso, então não precisava me preocupar... mas eu simplesmente nãoconfiavaneleparafazerumbomtrabalhoemrelaçãoanada.—Não sei como você aguenta esse cara—Adrian disse.—Eu antes achava que

vocêerafracaesimplesmentenãorevidava...mas,agora,sinceramente,achoquevocêébemdurona.Épreciso teruma forçados infernosparanão reclamarenãoexplodir.Eunãotenhotantoautocontroleassim.—Vocêtemmaisdoqueimagina—eudisse,umpoucosemjeitocomoelogio.Eu

meculpavatantopeloqueconsideravafaltadereaçãoqueaté játinhameocorridoqueaquilotivesseadquiridoforçaprópria.FiqueiaindamaissurpresadetersidonecessárioqueAdrian fizesse aquela observação paramim.—Eu sempre ando na linha.Omeupai,eosalquimistas,sãomuitorígidosemrelaçãoaobediênciaeaseguirasordensdossuperiores. Estou nomeio de uma saia justa dupla porque estou pisando emovos comeles,entãoésuperimportantequeeunãocrieagitação.—PorcausadaRose?—Otomdeleeracontroladocommuitocuidado.Assenti.—É.Oqueeufizfoicomotraiçãoaosolhosdeles.—Do jeito que você fala, parecemuito sério mesmo.—Dava para ver que ele

estavameexaminandodecantodeolho.—Valeuapena?—Atéagora,sim.—Erafácildizeraquilo,jáqueZoeaindanãotinhasidotatuada

e eu não tinha pisado em nenhum centro de reeducação. Se essas coisasmudassem, asminhasrespostaspoderiamseroutras.—Foiacoisacertaa fazer.Achoque justificouumaaçãoradical.—EutambémdesrespeiteimuitasregrasparaajudarRose—eledissecomumtom

de preocupação na voz.— Fiz aquilo por amor.Amor mal direcionado, mas, aindaassim, amor. Não sei se foi algo tão nobre quanto a sua motivação. Principalmenteporque ela estava apaixonada por outra pessoa. A maior parte das minhas “açõesdramáticas”nãofoiemnomedecausanenhuma.Amaiorpartedelasfoisóparairritarosmeuspais.Percebi que,na verdade, fiquei comumpoucode inveja daquilo.Eunão conseguia

nem imaginar provocar em meu pai algum tipo de reação— apesar de certamentedesejarisso.—Achoqueoamorésempreumarazãonobre—disseaele.Euestavafalandode

maneiraobjetiva,éclaro.Nunca tinhameapaixonado,entãonão tinha referênciaparaavaliar.Combase no que eu tinha observado em outras pessoas, achava que devia seralgo maravilhoso... mas, por enquanto, estava ocupada demais com o trabalho pararepararnaquelaausência.Euficavaimaginandosenãodeviamesentirdecepcionadacomaquilo.—Eachoquevocêaindatemtempodesobraparafazeroutrascoisasnobres.

Eledeurisada.—Nuncapenseiqueaminhamaior torcedora seriaalguémquemeconsideravado

maleantinatural.Entãoéramosdois.Hesitante,conseguifazerumaperguntaquequeimavadentrodemim.—VocêaindaamaRose?Além de não saber o que era estar apaixonada, também não sabia quanto tempo

demoravaparaserecuperardoamor.OsorrisodeAdriandesapareceu.Seuolharsevoltouparadentro.—Sim.Não.Édifícilsuperaralguémcomoela.Elasurtiuumefeitoenormesobre

mim,tantobomquantoruim.Édifícilseguiremfrente.Tentonãopensarmuitosobreelaemtermosdeamoreódio.Oprincipaléqueestoutentandotocaraminhavida.Osresultados,infelizmente,nãosãoregulares.Logochegamosàfaculdade.WesReganeraumhomemgordocomcabelogrisalho,

que trabalhava na secretaria de matrículas de Carlton.A sra.Terwilliger tinha dadoaulasparticularesdegraçaparaasobrinhadeWesduranteumverão,eWesachavaquedeviaumfavoraela.— O negócio é o seguinte— ele disse quando nos acomodamos em cadeiras na

frentedamesadele.Adrianusavacalçadesarjaecamisasocialcordesálvia,oqueteriasidoummodeloótimoparaasentrevistasdeemprego.Eraumpoucotardedemaisparaisso. — Eu não posso simplesmente matricular você. Os processos de inscrição nafaculdade são longos e exigem históricos escolares, e não vai ter como você conseguirissoemdoisdias.Oquepossofazeréadmiti-locomoauditor.—Tipodoimpostoderenda?—Adrianperguntou.—Não.Auditorououvintesignificaquevocêfrequentaasaulasefazaslições,mas

nãorecebenota.Adrian abriu a boca para falar, e só fiquei imaginando que tipo de comentário ele

teriaarespeitodeestudarsemrecebercrédito.Eumeapresseieminterrompê-lo.—Edepois,oqueacontece?—Depois,sevocêconseguircumpriroprocessodeadmissão,em,digamos,umaou

duassemanas,eseforaceito,possomudarasuasituaçãoparaadealuno.— E o auxílio financeiro?—Adrian se inclinou para a frente e perguntou.— É

possívelobteralgumdinheiroparaisso?—Sevocêsequalificar,sim—Wesrespondeu.—Masvocêsópodeentrarcomo

pedidodepoisqueforaceito.Adrianlargouocorponacadeiraeeufuicapazdeadivinharseuspensamentos.Sea

matrícula ia demorar umas duas semanas, sem dúvida haveria atraso no pedido deauxílio também.Adrian iria ter que passar pelos menos mais ummês morando comClarence,eesseprovavelmenteeraumprazootimista.FiqueiesperandoqueAdrianse

levantassee colocasse tudoaperder.Emvezdisso,umaexpressãode resolução tomoucontadeseurosto.Eleconcordou.—Certo.Vamoscomeçarcomessenegóciodeouvinte.Fiqueiimpressionada.Também fiquei com inveja quando Wes trouxe o catálogo de cursos. Tinha

conseguidomeconvenceraficarcontentecomasaulasdeAmberwood,masolharparaas oportunidades de uma faculdade de verdade me mostrou que as escolas eram doismundosdiferentes.Asaulasdehistóriaerammaisconcentradasemaisprofundasdoqueeupoderia ter imaginado.MasAdriannão tinha interesse por elas.Ele imediatamenteficoudeolhonodepartamentodearte.Acabou se inscrevendo em dois cursos introdutórios: um sobre pintura a óleo, e o

outro,aquarela.Asaulaseramtrêsvezesporsemanaeumaemseguidadaoutra,oqueerabemconveniente.—Vaisermaisfácilassim,jáquevouterquevirdeônibus—eleexplicouquando

nóssaímos.Olheiespantadaparaele.—Vocêvaivirdeônibus?Elepareceusedivertircomaminhasurpresa.— E de que outro jeito eu viria?As aulas são durante o dia.Você não pode me

trazer.PenseinacasaafastadadeClarence.—Masondediabosvocêvaipegaroônibus?—Tem uma parada a menos de um quilômetro de distância. Dali, posso fazer a

baldeação para outro ônibus que vai para Carlton. O trajeto todo demora mais oumenosumahora.Confesso que aquilo me deixou sem palavras. Fiquei surpresa por Adrian ter

pesquisado tanto assim, isso semmencionar que estava disposto a ter tanto trabalho.Alémdisso, no caminhode volta, ele não soltounenhumcomentário para dizer comoaquiloseriainconvenienteouquantotempoteriaqueesperaratépodersemudardacasadeClarence.Quando voltei aAmberwood, fiquei contente de dar a Jill a notícia a respeito do

sucesso universitário de Adrian — não que ela precisasse que eu dissesse algo,provavelmente.Comolaço,elajádeviasabermaisdoqueeu.Aindaassim,elasemprese preocupava com ele e sem dúvida iria ficar contente de ver algo dando certo paraAdrian.Jill não estava no quarto quando cheguei, mas um bilhete me dizia que ela estava

estudando em outro lugar do alojamento.A única parte positiva do castigo era quelimitava os lugares em que ela poderia estar. Resolvi aproveitar aquela oportunidadeparafazeroamuletomalucodasra.Terwilliger.Faziadoisdiasqueeuestavajuntando

os ingredientese, juntocomacooperaçãodaprofessoradebiologia,a sra.Terwilligertambém tinha garantido o meu acesso a um dos laboratórios de química. Não havianinguémláàquelahoradanoite,por issoeutinhaespaçoetranquilidadedesobraparaprepararafórmula.Como tínhamos observado, as instruções eram extremamente detalhadas e— na

minha opinião— supérfluas. Não era suficiente apenas medir as folhas de urtiga.Asinstruçõespediamqueelas“descansassemduranteumahora”e,duranteesse tempo,eutinha que ficar dizendo para elas“em vós, chamas eu coloco” a cada dezminutos. Eutambém tinha que ferver a pedra de ágata “para infundi-la de calor”. O resto dasinstruçõeseraparecidoeeusabiaquenãoteriacomoasra.Terwilligerdescobrirseeutinhaounãoseguidotudoaopédaletra—principalmenteoscânticos.Mesmoassim,opropósito daquela tarefa era relatar como agia um praticante antigo.Assim, eu seguitudo à risca, e me concentrei tanto em executar cada passo com perfeição que logoentreiemumtranseemquenadaexistiaalémdofeitiço.Terminei duas horas depois e fiquei surpresa de ver como tinha ficado exausta.O

resultado final certamente não parecia justificar toda a energia que eu tinha gastado.Finalizeicomumacordinhadecouroqueamarravaumsaquinhodesedacheiodefolhasepedras.Leveiaquiloeasminhasanotaçõesdevoltaparaoquartonoalojamento,coma intenção de escrever o relatório para a sra.Terwilliger e deixar a tarefa para trás.Quando cheguei ao quarto, engoli em seco ao ver a porta.Alguém tinha pegado tintavermelha e desenhado morcegos e rostos com caninos afiados na porta inteira.Rabiscadasnafrente,emletrasgrandes,estavamaspalavras:

garotavampira

Empânico, irrompi quarto adentro. Jill estava lá— junto com a sra.Weathers eoutraprofessoraqueeunão conhecia.Estavamrevirando todas asnossas coisas. Fiqueiencarando,descrente.—Oqueestáacontecendo?—perguntei.Jillsacudiuacabeça,comumaexpressãototalmenteenvergonhada,enãoconseguiu

responder.Parecequeeutinhachegadoaofinaldabusca,porqueasra.Weathersesuacompanheiralogoterminaramecaminharamatéaporta.Fiqueicontenteporterlevadomeus equipamentos de alquimista comigo para o laboratório naquela noite. O kitcontinha algumas ferramentas de medida que eu achei que talvez fosse precisar.Certamentenãoqueriaexplicarporquemantinhaumacoleçãodesubstânciasquímicasparaasresponsáveispelodormitório.—Bom—asra.Weathersdisse,severa.—Parecenãohavernadaaqui,masposso

fazer outra busca mais tarde... por isso, não tenha nenhuma ideia. Já está bemencrencadasemadicionarmaisumaacusaçãoàlista.—ElasuspirouesacudiuacabeçaparaJill.—Estoumuitodecepcionadacomvocê,srta.Melrose.Jillficoupálidacomopapel.

—Estoudizendo.Étudoumerro!—Vamos torcer para que seja mesmo — a sra.Weathers falou, de maneira

agourenta.—Vamostorcerparaqueseja.Estoumeiotentadaamandarquevocêlimpeovandalismodoladodeforadaporta,mascomonãotenhonenhumaprovaconcreta...bom,vamospedirparaafaxineiradarcontadissoamanhã.Quandoasnossasvisitasseforam,imediatamentequestionei:—Oqueaconteceu?Jilldesabounacamaegemeu.—Laurelaconteceu.Eumesentei.—Explique.— Bom, eu liguei para a biblioteca para saber se eles tinham aqueles anuários...

sabe, com Kelly Hayes? Acontece que eles costumam ter, mas todos tinham sidoretiradospelaequipedo jornalparaumaediçãode aniversáriodeAmberwoodoualgoassim.Evocênãovaiacreditarquemestáàfrentedoprojeto:Laurel.—Temrazão—eudisse.—Jamaisteriaadivinhado.Elanãoestánoprimeiroano

deinglês?—Laureljáeraalunadoúltimoano.—Está,sim.—Achoquetodomundoprecisaterumaatividade—balbuciei.Jillassentiu.—Mas,bom,asrta.Yamaniestavanoprédio,entãofuifalarcomelaparaverseeu

podiaentrarparaoclubedecosturaetrabalharparaLia.Elaficoutodaanimadaedissequeiadarumjeito.— Bom, já é alguma coisa— eu disse com cautela, ainda sem saber muito bem

comoaquilotinhalevadoavandalismoeaumabuscanonossoquarto.—Quando eu estava voltando, cruzei comLaurel no corredor.Resolvi arriscar...

cheguei pra ela e disse: “Olhe, eu sei que nós tivemos as nossas diferenças, mas eurealmenteestouprecisandodeumaajuda”.Daíeuexpliqueiqueprecisavadosanuárioseperguntei se podia pegá-los emprestados só por esta noite e que devolveriaimediatamente.A isso, eu não disse nada. Com certeza foi uma atitude nobre e corajosa de Jill,

principalmente depois de eu tê-la incentivado a ser superior a Laurel. Infelizmente, eunãoachavaqueLaurelteriaamesmaatitudemaduraemrelaçãoaela.Euestavacerta.—Elamedisse...bom,emtermosbemexplícitos,dissequeeununcavouveresses

anuários.—Jillfezumacareta.—Elamedissealgumasoutrascoisastambém.Entãoeu,hum,chameiLaureldevadiadelirante.Provavelmentenãodeviaterfeitoisso,mas,bom, elamereceu! Bom,mas daí ela foi falar com a sra.Weathers com uma garrafade...seilá.Achoqueera schnappsdeframboesa.Eladissequeeutinhavendidoparaelae que tinhamais nomeu quarto.A sra.Weathers não podiame castigar sem provas

concretas,masdepoisde a sra.Chang terme acusadode estarde ressacanoprimeirodia,asra.Weatherschegouàconclusãodequeaquiloerasuficienteparadarumabuscanoquarto.Sacudiacabeça,descrente,comairritaçãocrescendodentrodomeupeito.— Para um lugar tão prestigioso e de elite, esta escola realmente tira conclusões

apressadasarespeitodequalqueracusação!Querdizer,acreditamemqualquercoisaquequalquerpessoadizsobrevocê.Edeondeveioatintanaporta?Lágrimasdefrustraçãobrilharamnosolhosdela.—Ah, foi Laurel, é claro. Ou, sei lá, alguma amiga dela.Aconteceu enquanto

Laurelestavafalandocomasra.Weathers,entãoéclaroqueelatemumálibi.Vocênãoacha...nãoachaquealguémestádesconfiandodeverdade,acha?Antes,vocêtinhaditoqueerasóumabrincadeirademaugosto...equeoshumanosnemacreditamemnós...certo?—Certo—respondinoautomático.Maseuestavacomeçandoameperguntarseeraverdade.Desdeotelefonemadomeu

pai,quandoelemencionouquehaviahumanosquedesconfiavamequenãohaviacomosilenciá-los, fiquei me perguntando se eu tinha me apressado demais em desprezar apiadinha de Laurel. Será que ela simplesmente tinha encontrado uma piada cruel paramaltratarJill?Ouseráqueelaeraumdesseshumanosquesuspeitavamdaexistênciadomundodosvampirosepodiacausarmuitosproblemasporcausadisso?Euduvidavaquealguémfosseacreditarnela,masnósnãopodíamosarriscaratrair a atençãodealguémassim.SerápossívelelarealmentepensarqueJillévampira?AexpressãodesconsoladadeJillsetransformouemraiva.—Talvez eudevessefazeralgumacoisaarespeitodeLaurel.Háoutrasmaneirasde

mevingardelaalémdefazeraáguacongelar.—Não—me apressei emdizer.—Não se rebaixe a isso.Vingança é uma coisa

mesquinha, e você é melhor do que isso. — Além do mais, pensei, se houver maisqualquer atividade sobrenatural, Laurel pode perceber que as provocações dela erammaisverdadeirasdoquepensavanocomeço.Jillmelançouumsorrisotriste.—Você ficamedizendo isso.Masnãoachaquealgoprecisa ser feitoemrelaçãoa

Laurel?Ah,sim.Achavaquesim,comtodaacerteza.Aquilo tinha ido longedemais,eeu

estavaerradapornãodarmuitaimportânciaaofato.Jilltinharazãoaodizerquehaviaoutras maneiras de se vingar. E eu estava certa ao dizer que vingança era uma coisamesquinha e que Jill não devia usar isso para se consolar. Era por isso que eu iria mevingar.—Eucuidodisso—disseaela.—Vou...voupediraosalquimistaspara fazerem

umareclamaçãoformalemnomedosnossospais.Elapareceuduvidar.—Evocêachaqueissovaidarcontadasituação?— Positivo — respondi. Isso porque a reclamação traria algo a mais. Dei uma

olhadanorelógioepercebiqueestavatardedemaisparavoltaraolaboratório.Nãofaziamal.Euapenasajusteimeudespertadorparabemcedo,comaintençãodemelevantareiratéláantesdeasaulascomeçarem.Eutinhamaisumaexperiênciaparafazernofuturo,eLaurelseriaaminhacobaia.

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Misturaroqueeraprecisofoifácil.Colocarondeeuqueriademorouunsdoisdias.PrimeirotivequeprestaratençãonotipodexampuqueLaurelusavanoschuveirosdaeducaçãofísica.Aescolaforneciaxampuecondicionador,claro,maselanãoconfiavaemalgoassimtãobanal para usar em seu cabelo precioso.Quandodescobri amarca que ela usava, fui auma lojadeprodutosdebeleza localpara comprarum igual, e joguei aquele conteúdocaropeloralo.Enchiofrascocomaminhafórmulacaseira.OpassoseguinteeratrocarofrascocomodeLaurel.RecruteiKristinparaisso.O

armário dela ficava ao lado do de Laurel na educação física, e ela estavamais do quedispostaameajudar.EmparteporqueelanãogostavadeLaurel,assimcomonós.Mastambémporque, desde que eu a tinha salvado de sua reação à tatuagem,Kristin tinhadeixado claroque tinhaumadívida comigo e iriame ajudar emqualquer coisa que euprecisasse.Eunãogostavadaideiadeelamedeveralgo,masaajudaveioacalhar.Elaencontrou uma oportunidade quando Laurel desviou o olhar do armário aberto e,disfarçadamente, fez a troca.Nós então só tivemosque esperar até apróximavezqueLaurelusasseoxampuparaverosresultadosdomeutrabalhomanual.Nessemeio-tempo,aminhaoutraexperiênciadelaboratórionãoobteveexatamente

oreconhecimentoqueeuesperava.Asra.Terwilligeraceitouomeurelatório,masnãooamuleto.—Elenãomeservedenada—elaobservou,aoerguerosolhosdospapéisqueeu

tinhaentregadoaela.—Bom...paramimtambémnão,comcerteza,senhora.Elapousouospapéisnamesa.—Istoaquié tudoverdade?Vocêseguiucadapassocomprecisão?Certamentenão

tenhocomosabersevocê,sabe,passouporcimadealgunsdetalhes.Sacudiacabeça.—Não.Euseguitodosospassos.

—Muitobem,então.Parecequevocêarrumouumamuletodefazerfogo.—Senhora!—eudisse,emtomdereclamação.Elasorriu.—Oquedizemasinstruções?Parajogarerecitaroúltimoencanto?Vocêsabequal

é?—“Em chamas, em chamas”— respondi prontamente. Por ter digitado o feitiço

paraasanotações,edepoisaindarecriá-lo,eradifícilnãoterdecoradotudo.Deacordocom o livro — que era uma tradução para o inglês de um texto em latim —, alinguagemnãoimportavamuito,desdequeosignificadofosseclaro.— Bom, então pronto. Experimente um dia desses e veja o que acontece. Só não

botefogoemnadaquepertençaàescola.Porqueissonãovaisernadaseguro.Erguioamuletopelacordinha.—Mas isso aqui não é real. É uma bobagem. É ummonte de lixo junto em um

saquinho.Eladeudeombros.—Quemsomosnósparaquestionarosantigos?Fiquei encarando-a, tentando descobrir se estava fazendo uma piada. Soube que ela

eraexcêntricadesdeoprimeirodia,mas,aindaassim,passavaa impressãodeserumapesquisadoraséria.—A senhora não pode acreditar nisso. Magia desse tipo... não é real. — Sem

pensar, completei: — E mesmo que fosse, senhora, seres humanos não devem ficarbrincandocompoderesassim.Asra.Terwilligerficouváriosmomentosemsilêncio.—Vocêacreditamesmonisso?Toqueinacruzpenduradanomeupescoço.—Fuicriadaassim.—Entendi. Bom, então, pode fazer o que quiser com o amuleto. Jogue fora, doe

paraalguém,façaexperiênciascomele.Independentedequalquercoisa,euprecisodesserelatoparaomeulivro.Obrigadapordedicarseutempoaisso.Comosempre,vocêfezmaisdoqueeraexigido.Coloqueio amuletonabolsa ao sair, sem termuita certeza a respeitodoque fazer

comele.Erainútil...e,noentanto,tambémtinhamecustadomuitotempo.Euestavadecepcionada por ele não ser mais importante para a pesquisa dela. Tanto esforçodesperdiçado.Masoúltimodosmeusprojetosmostrouseuresultadonodiaseguinte.Emquímica

aplicada,GregSladeealgunsdosamigosdeleentraramnaclassecorrendobemquandoosinaltocou.Aprofessoraolhoufeioparaeles,quenemligaram.Sladeestavaseexibindocom a tatuagem de águia, mostrando a pele para todo mundo ver.A tinta brilhavaprateada mais uma vez.Ao lado dele, um de seus amigos também mostrava, todo

orgulhoso,outra tatuagemprateada.Eraumparde adagas cruzadasestilizadas, sóumpouquinhomenos cafona do que a águia. Era omesmo amigo quemais cedo, naquelamesmasemana,estavapreocupadodenãoconseguirfazeratatuagemdele.Parecequeascoisas tinham se resolvido com o fornecedor. Interessante. Parte do motivo para euaindanão ter feitomeu relatório aos alquimistas era esperarpara ver se aNevermoreiriareporoestoquequeeuroubei.—Éimpressionante—oamigodeSladedisse.—Ovigorquedá.—Seicomoé—Sladeocumprimentoubatendoseupunhofechadonodele.—Bem

atempodeamanhã.Treyobservavaosdoiscomexpressãosombria.—Oquetemamanhã?—sussurreiparaele.Eleolhouparaosdoiscomdesprezodurantealgunsmomentosantesdesevirarpara

mim.—Vocêmoraembaixodeumapedra?Éonossoprimeirojogoemcasa.— Claro que sim — eu disse.A minha experiência no ensino médio não seria

completasemofurorcausadopelosjogosdefutebolamericano.—Eissovaisermuitobomparamim—eleresmungou.—Vocênãoestámaisusandocurativo—observei.—É,maso treinadorestáme fazendopegar leve.Alémdomais, agora souquase

umpesomorto—eleapontoucomacabeçaparaSladeeoamigodele.—Comoéqueelesnão semetememconfusãoporcausadas tatuagens?Elesnão seesforçamnemumpouco para esconder. Esta escola não tem mais disciplina. Estamos praticamente naanarquia.Eusorri.—Praticamente.—Oseuirmãodeviaestarnotime,sabia?Euovinaeducaçãofísica.Elepodiaser

umastrodoesportesetivesseotrabalhodeconcorrernotesteparaalgumamodalidade.—Elenãogostade chamar a atenção—expliquei.—Mas eleprovavelmente vai

assistiraojogo.—Vocêvaiaojogo?—Provavelmentenão.Treyarqueouumasobrancelha.—Temalgumencontrocomumgostosão?—Não!Ésóque...bom,eunãogostodeassistiraesportes.Eachoquedevoficar

comJill.—Vocênãovainemparatorcerpormim?—Vocênãoprecisadaminhatorcida.Treymelançouumolhardedecepçãocomoresposta.—Talvezsejamelhorassim—eledisse.—Porquevocênãomeveriajogandocom

meuníveldeexcelênciatotal.—Éumapena—concordei.—Ah,parelogocomessesarcasmo—elesuspirou.—Meupaiéquevaificarmais

decepcionado.Háexpectativanafamília.Bom,issoeraalgocomqueeueracapazdemeidentificar.—Eletambémjogafutebol?—Quenada,temmenosavercomofutebolemsiemaiscomestarsemprecoma

melhorformafísica.Seromelhor.Estarprontoparaserchamadodeúltimahora.Seromelhor do time estava sendo uma maneira de deixá-lo orgulhoso... até as tatuagenscomeçarem.—Vocêébomsemaajudadenenhumatatuagem.Eledeviasesentirorgulhosode

todojeito—eudisse.—Vocênãoconheceomeupai.—Não,masachoqueconheçoalguémigualzinhoaele—sorri.—Sabe,achoque,

nofinaldascontas,estouprecisandoiraumjogodefutebol.Treysimplesmentesorriueaaulacomeçou.Odia passou calmo,mas Jill veio correndo atémim assim que entrei no vestiário

paraaeducaçãofísica.— Lia me procurou! Ela pediu para eu ir lá hoje à noite. Ela já fez os ensaios

regulares com as outras modelos, mas achou que eu podia aproveitar uma sessãoespecial,jáquenãotenhonenhumaexperiência.Claroqueonegócioéque...eu...sabecomoé,precisodecarona.Vocêachaque...Querdizer,seráquevocêpode...—Claro—respondi.—Éparaissoqueestouaqui.—Obrigada,Sydney!—elameabraçou,emedeixouespantadacomogesto.—

Euseiquevocênãotemmotivonenhumparameajudardepoisdetudoquefiz,mas...—Tudobem, tudobem—eudissemeio sem jeitoedei tapinhasnoombrodela.

Respireifundoparamerecompor.PensenissocomoJilldandoumabraçoemvocê.Nãocomoumavampiradandoumabraçoemvocê.—Ficocontenteemajudar.—Vocêsduasqueremprivacidade?—Laurelcaçoouaoentrarcomseuséquito.—

Sempreacheiquetinhaalgodeestranhonafamíliadevocês.Jilleeunosseparamoseelaficoutodavermelha,coisaquesóserviuparaelasdarem

aindamaisrisada.—MeuDeus,comoeudetestoessasmeninas—Jilldissequandoelasabriramuma

distânciasuficienteparanãoescutar.—Eurealmentequeromevingardelas.—Paciência—murmurei.—Elasvãoreceberotrocodelasumdiadesses.—Dei

umaolhadanoarmáriodeLaurelefiqueipensandoque“umdiadesses”podiaacontecerbemembreve.Jillsacudiuacabeça,maravilhada.—Nãoseicomovocêconsegueperdoartantoassim,Sydney.Nadateatinge.

Eusorri, imaginandooqueJill iriapensar se soubesseaverdade—queeunãoeraassim tãode“perdoar” quantoparecia.E não só noquedizia respeito aLaurel. Se Jillqueriapensarissodemim,entãoquefosse.ClaroqueaminhafachadadeboazinhaquedáaoutrafacesedespedaçouquandooberroestridentedeLaurelencheuovestiárionofimdaaula,umahoramaistarde.Foi quaseuma repetiçãodo incidentedo gelo.Laurel saiudo chuveiro às lágrimas,

enroladaemumatoalha.Elacorreuhorrorizadaatéoespelho,segurandoocabelobempertodele.—Qualéoproblema?—umadasamigasdelaperguntou.—Vocênãoestávendo?—Laurelexclamou.—Temalgodeerrado...nãoparece

certo.Éóleo,ou...nãoseioqueé!Ela pegou um secador e secou uma mecha enquanto todas nós observávamos com

interesse. Depois de alguns minutos, os fios compridos estavam secos, mas mal davapara ver. Realmente parecia que o cabelo dela estava coberto de óleo ou de gordura,como se não tivesse sido lavado havia semanas.O cabelo que normalmente brilhava eesvoaçava agora escorria em molas soltas e feias.A cor também estava um poucodesbotada.Overmelhobrilhanteefogosotinhaassumidoumtomdeamarelodoentio.—Ocheirotambémestáesquisito—elaexclamou.—Lavedenovo—outraamigasugeriu.Foi o que Laurel fez, mas não ia ajudar.Mesmo depois de ela perceber que era o

xampuqueestava causandooproblema,não seria fácil tirar aquela coisaque eu fizdocabelodela.Aáguairiacontinuaralimentandoareação,eelaprecisariaesfregarmuitas,muitasvezes,atéconsertaroproblema.Jillmelançouumolhardesurpresa.—Sydney?—elasussurrou,comummilhãodeperguntas.—Paciência—garantiaela.—Estefoisóoprimeiroato.Naquelanoite,leveiJillatéalojadeLiaDiStefano.Eddienosacompanhou,éclaro.

Lia só era alguns anos mais velha do que eu e quase trinta centímetros mais baixa.Apesardo tamanhodiminuto,havia algograndee cheiode forçanapersonalidadedelaquandonosconfrontou.A lojaeracheiadevestidos formaise casuais lindos, apesardeela própria estar vestida com um jeans rasgado e uma bata bem larga. Ela colocou aplaquinhade“fechado”naporta,eentãofalouconoscocomasmãosnacintura.—Então, JillianMelrose—ela começou.—Temosmenos de duas semanas para

transformá-laemmodelo.—Osolhosdelarecaíramemmim.—Evocêvaiajudar.—Eu?—exclamei.—Eusódoucarona.—Nãosequiserqueasuairmãparticipedomeudesfile.—Elavoltouaolharpara

Jill;adiferençadealturaentreasduaseraquasecômica.—Vocêtemquecomer,bebererespirarcomomodelosequiserfazer issodireito.Eprecisafazertodasessascoisas...usandoistoaqui.

Comum floreio,Lia pegouuma caixa de sapatos próximadeonde retirouumparroxocintilantecomsaltosquedeviamterpelomenostrezecentímetrosdealtura.Jilleeuficamosencarando.—Maselajánãotemalturasuficiente?—finalmenteperguntei.Lia soltouuma gargalhada de desdéme jogouos sapatos em cimade Jill.—Estes

aqui não são para o desfile. Mas, depois de dominar este par, vai estar pronta paraqualquercoisa.Jillpegouos sapatoscheiadeanimaçãoeosergueuparaexaminá-los.Os saltosme

lembravam das estacas de prata que Eddie e Rose usavam para matar Strigoi. Se Jillrealmente quisesse estar preparada para qualquer situação, era só estar com aquelessapatossempreporperto.Acanhadacomofatodetodomundoestarolhandoparaela,finalmentedescalçouossapatosbaixosmarronsqueusavaeprendeuasdiversascorreiastrabalhadas do par roxo.Quando estava calçada, levantou-se devagar—e quase caiu.Levantei-meapressadaparasegurá-la.Liaassentiuemsinaldeaprovação.—Estávendo?Eradistoqueeuestavafalando.Trabalhoemequipedeirmãs.Vocêé

quetemquegarantirqueelanãovaicairequebraropescoçoantesdomeudesfile.Jill me lançou um olhar de pânico que, eu desconfiava, estava refletido no meu

própriorosto.ComeceiasugerirqueEddieficasseresponsávelporajudarJill,maselejátinhasedeslocadocomdiscriçãoparaalateraldalojaparaobservarepareciaterpassadodespercebidoaLia.Achoqueosserviçosdeproteçãodeletinhamlimites.Enquanto Jill tentava simplesmente não cair, ajudei Lia a abrir espaço nomeio da

loja.Liaentãopassoumaisoumenosahoraseguintedemonstrandocomocaminhardamaneira adequadapara amoda, comênfasenapostura enopassoparapoder exibir asroupascomomelhorefeitopossível.Masamaiorpartedosdetalhesmais sutispassoubatidaparaJill,queseesforçavaparasimplesmenteconseguiratravessarasalasemcair.Graçaebelezanãoerampreocupaçõestãograndesquantopermanecerempé.Ainda assim, quando olhei para Eddie, ele observava Jill com uma expressão

encantadanorosto,comosecadapassoqueeladessefossemagiapura.Aoperceberqueeuestavaolhando,eleimediatamenteretomousuaexpressãoprotetoradeguardião.Eufizoquepudeparaoferecerpalavrasde incentivoaJill—e,sim,para impedir

que ela caísse e quebrasse o pescoço.Nomeio da sessão, ouvimos alguém batendo naportadevidro.Liacomeçouafazerumacaretaeentãoreconheceuorostodooutroladodaporta.Elasealegrouefoiabrir.—Sr.Donahue—eladisse,deixandoLeeentrar.—Veiovercomoasuapequena

estrelaestáindo?Lee sorriu e seus olhos cinzentos dispararam na direção de Jill imediatamente. Ela

olhounosolhosdeleesorriutantoquantoele.Leenãotinhaestadopresentenoúltimofornecimento dela, e apesar de os dois se falarem o tempo todo ao telefone e por

mensagemdetexto,eusabiaqueelaestava loucaparaseencontrarcomele.SódedarumaolhadanorostodeEddiepercebiqueelenãoestava,nemdelonge,tãofelizquantoelacomapresençadeLee.—Jáseicomoelaestáindo—Leedisse.—Elaéperfeita.Liadeuumagargalhadadedesdém.—Eunãoiriaassimtãolonge.— Ei — eu disse quando uma ideia me ocorreu. — Lee, você não quer ficar

responsávelporimpedirqueJillquebreopescoço?Euprecisofazerumacoisa.Evidentemente, Lee estavamais do que disposto a fazer aquilo, e eu sabia que não

precisavatemerpelasegurançadelacomEddiedesentinela.Eu os deixei e percorri apressadamente dois quarteirões, até a Nevermore. Desde

que eu tinha ouvido Slade e os amigos dele confirmarem que os tatuadores estavamtrabalhandomais uma vez, estava com vontade de ir até lá pessoalmente.Mas eu nãoqueria irescondida.Oqueeutinharoubadojátinharendidoprovas.Tirandoo líquidotransparente, eu tinha identificado todas as outras substâncias das ampolas.Todos oscompostos metálicos eram combinações exatas das fórmulas dos alquimistas, e issosignificavaouqueessaspessoastinhamumcontatoentreosalquimistas,ouqueestavamroubando.Dequalquermodo,omeucasosóestava ficandocadavezmais importante.Eu só esperava que fosse suficiente para me redimir e manter Zoe longe dali,principalmente porque omomento da chegada dela se aproximava. Já tinha se passadoquaseumasemanadesdequeomeupaihaviaditoqueelairiamesubstituir.Meu plano era ver qual a disposição da Nevermore para fazer uma tatuagem em

mim.Euqueriasaberquaiseramosavisosqueelesdavam(seéquedavamalgum)eseeraounãofácilconseguirumatatuagem,emprimeirolugar.AconversadeAdriannãotinharendidomuitainformação,eprovavelmenteseupedidoporumatatuagemdeumamoto em chamas com um esqueleto e um papagaio não tinha servido muito paraaumentar sua credibilidade.Hoje eu estava armada comdinheiro vivo, e esperava queaquilomelevasseaalgumlugar.Do jeitoque as coisas aconteceram,nempreciseimostrardinheironenhum.Assim

queeuentrei,o sujeitoatrásdobalcão—omesmocomqueAdrian tinhaconversado—pareceualiviado.—GraçasaDeus—eledisse.—Porfavor,digaquetemmais.Essagarotadaestá

medeixandomaluco.Quandonósentramosnessa...eunão fazia ideiadeque iria ficartão grande assim. O dinheiro é bom, mas, por Deus. É uma loucura acompanhar ademanda.Mantivemeurostoisentodaconfusãoqueestavasentindo,imaginandodequediabos

eleestariafalando.Eleagiacomoseeufizessepartedoesquemadele,eaquilonãofaziao menor sentido. Mas então seus olhos dispararam para a minha bochecha e eu derepenteentendi.

Aminhatatuagemdelírio.Não estava escondida, já que as aulas do dia tinham terminado.E foi então que eu

soube, com certeza absoluta, que a pessoa com quem ele trabalhava para obter seumaterialeraumalquimista.Eleachouqueatatuagemfaziademimumaaliada.—Nãotenhonadacomigo—respondi.Eleficoudecaranochão.—Masademanda...—Você perdeu a outra remessa— eu disse, enfezada.—Deixou que roubassem

bemdebaixodoseunariz.Sabequantotrabalhodeuparaarrumaraquilo?—Jáexpliqueiparaoseuamigo!—eleexclamou.—Eledissequeentendia.Disse

quetinhadadocontadoproblemaequenósnãoprecisávamosmaisnospreocupar.Sentiumapertonabocadoestômago.— É, bom, ele não fala em nome de todos nós, e não temos tanta certeza se

queremoscontinuar.Vocêsficaramcomprometidos.—Nóssomoscuidadosos—eleargumentou.—Aqueleroubonãofoinossaculpa!

Agora, fala sério. Ele não contou para você? Há uma demanda enorme para amanhãporque os garotos da escola particular têm jogo. Se pudermos fazer o serviço, vamosganharodobrododinheiro.Lanceiaeleomeumelhorsorrisogélido.—Vamosdiscutiraquestãoentrenósedaremosumretorno.Comisso,deimeia-voltaparairembora.—Espere—ele chamou.Olhei bravapara ele.—Será que vocêpode fazer com

queaquelapessoaparedeligar?— Que pessoa? — perguntei, imaginando se ele estava falando de algum aluno

insistentedeAmberwood.—Aquela que temuma voz bizarra e fica perguntando se apareceu alguma pessoa

alta e pálida por aqui. Gente que parece vampiro.Achei que fosse alguém que vocêconhecesse.Gente alta e pálida? Não gostei nada de ouvir aquilo, mas fiquei com o rosto

impassível.—Desculpe.Nãoseidoquevocêestáfalando.Devetersidoumtrote.Saí e fiz uma anotaçãomental para investigarmelhor a questão. Se alguém estava

fazendoperguntas a respeitodepessoasquepareciamvampiros, eraumproblema.Noentanto, não era o problema imediato.Aminhamente corria em disparada enquantoprocessavaasoutrascoisasqueotatuadortinhamedito.HaviaumalquimistaqueeraofornecedordomaterialdaNevermore.Emcertosaspectos,issonãodeviasersurpresa.Dequeoutramaneiraelesconseguiriamsanguedevampiroetodososoutrosmateriaisnecessáriosparaastatuagens?Eparecequeessealquimistarebeldetinha“dadocontadoproblema”quelevouaoroubodomaterial.Quandofoiqueomeupailigoudizendoque

euseriatiradadamissãoporcausadosrelatóriosdeKeith?LogodepoisdeeuinvadiraNevermore.Eusabiaquemeraoalquimistarebelde.E eu sabia que“o problema” era eu.Keith tinha dado um jeito emmim, tomando

providênciasparaqueeufosseafastadadePalmSpringsequemandassemnomeulugaruma pessoa nova e sem experiência, que não iria interferir em sua operação ilícita detatuagens.EraporissoqueelequeriaZoedesdeocomeço.Euestavachocada. JánãotinhaKeithDarnellemaltaconta,de jeitonenhum.Mas

eununca,jamaistinhaimaginadoqueeleserebaixariaaessenível...Eleeraumapessoaimoral,mas,aindaassim,tinhasidocriadocomosmesmosprincípiosqueeuarespeitodehumanosevampiros.Abandonaressascrençaseexporinocentesaosefeitoscolateraisterríveisdosanguedevampiroemnomedeseupróprioganhomaterial...bom,issoeramaisdoquetraiçãoaosalquimistas.Eratraiçãoatodaaraçahumana.Minha mão estava no celular, pronta para ligar para Stanton. Só seria necessário

aquilo, mais nada. Bastava uma ligação com o tipo de notícia que eu tinha, e osalquimistas iriam dar uma batida em Palm Springs — e em Keith. Mas e se nãohouvesse evidências concretas para ligar Keith ao crime? Era possível que outroalquimistafizesseamesmacoisaqueeu,levandootatuadorapensarqueelefaziapartedaequipedeKeith.Maseraelequeeuqueriapegar.Euprecisavagarantirquenãoteriacomoeleescapardaquilo.Tomeiaminhadecisãoe,emvezdeligarparaosalquimistas,ligueiparaAdrian.QuandovolteiàlojadeLia,viqueoensaiohaviaterminando.LiaestavadandoaJill

alguma instrução de últimominuto enquantoEddie e Lee esperavampor perto. Eddiedeusóumaolhadanomeurostoelogopercebeuquehaviaalgodeerrado.—Qualéoproblema?—Nada—respondi,semconvicção.—Ésóumproblemacomqueeuvouterde

lidarembreve.Lee, seráquevocê se incomodade levar Jill eEddiedevolta àescola?Precisodarcontadealgumascoisinhas.Eddiefranziuatesta.—Estátudobem?Precisadealguémparaprotegervocê?—Játenhoalguém.—Reconsiderei,tendoemvistaquelogomeencontrariacom

Adrian.—Bom,maisoumenos.Detodomodo,nãomemetiemnenhumaconfusão.OseutrabalhoéficardeolhoemJill,estálembrado?Eobrigada,Lee.—Umaideiaderepentemeocorreu.—Espere...euacheiquehojeeraumdosdiasemquevocêtinhaaula à noite. Será que nós estamos prendendo você... ou... bom, quais são os dias emquevocêtemaula?Eunãotinhapensadomuitonaquilo,sótinhareparadoquealgunsdiasLeeestavapor

láe,outros,emLosAngeles.Mas,pensandobem,naverdadenãohaviamuitopadrão.PercebipelorostodeEddiequeeletinhasedadocontadamesmacoisa.

—Éverdade—ele disse e olhoudesconfiadoparaLee.—Que tipode horário éessequevocêtemnafaculdade?Leeabriuabocaeeusentiqueumahistóriaprontaestavaparasair.Entãoeleparou

e lançou um olhar ansioso para Jill, que ainda estava conversando com Lia. Seu rostodesabou.—Porfavor,nãocontemparaela—elesussurrou.—Contaroquê?—perguntei,mantendoavozbaixatambém.—Nãoestouna faculdade.Querdizer... euestava.Masnãoestouneste semestre.

Euqueria darum tempo,mas... nãoqueria decepcionaromeupai.Então, disse a elequeestavaestudandosómeioperíodo,eeraporissoquepodiaficarmaisaqui.—Então,oquevocêtemfeitoemLosAngelesdurantetodoessetempo?—Eddie

perguntou.—Euaindatenhoamigoslá,eprecisomanteromeudisfarce.—Leesuspirou.—

É idiotice, eu sei. Por favor... deixem que eumesmo conte para ela. Eu queria tantoimpressionar Jill emostrarparaelaomeuvalor.Ela émaravilhosa. Sómepegouemummomentoruim.Eddieeeutrocamosolhares.—Eunãovoucontar—eudisse.—Masvocêrealmenteprecisadizeraela.Quer

dizer, achoquenãohámalnenhum...masvocênãodevemanteresse tipodementiraentrevocêsdois.Leepareciaarrasado.—Euseiquenão.Obrigado.Quandoeleseafastouumpouco,Eddiesacudiuacabeçaparamim.—Eunãogostoqueeleminta.Nemumpouco.— Lee tentando manter uma boa fachada é a coisa menos estranha que está

acontecendoaqui—eudisse.FoientãoqueeupercebiqueJill jáconseguiaandardeumladoparaooutrodaloja

semcair.Nãoeranadagracioso,maseraumcomeço.Elaaindaestavabemlongedeseparecercomasmodelosda tv,maslevandoemcontaqueelanemconseguiaficarempésobre aqueles sapatos no começo, achei que tinha feito umprogresso considerável. Elacomeçouatirarosapatodesalto,masLiaadeteve.—Não.Eujádisse.Vocêtemqueusaressessapatosotempotodo.Treine,treine,

treine.Use-osemcasa.Use-osemtodolugar.—Elasevoltouparamim.—Evocê...—Jásei.Precisogarantirqueelanãováquebraropescoço—eudisse.—Masela

nãovaipoderusarissootempotodo.Anossaescolatemumcódigodevestimenta.—Esefordeoutracor?—Liaperguntou.—Nãoachoquesejaapenasacor—Jilldisse,emtomdedesculpa.—Achoqueé

apartedosaltoagulha.Maseuprometousarforadasaulasetreinarnoquarto.AssimestavabomparaLiae,depoisdemaisalgunsconselhos,elanosdeixouir.Nós

prometemos treinar e voltar dali a dois dias.Disse a Jill queme encontraria com elamais tarde,masnão sei se ela ouviu.Ela estava tão envolvida na ideia de queLee irialevá-laparacasaquetudoomaissetornouinsignificante.FuiàcasadeClarenceeAdrianmeencontrouàporta.—Uau—eudisse, impressionada com a iniciativa dele.—Não achava que você

ficariaprontocomtantarapidez.—Nãoestou—elerespondeu.—Precisoquevocêvejaumacoisaimediatamente.Franziatesta.—Certo.—Adrianmelevouparadentrodacasa,paraumlugardepoisdasalaque

eunormalmentefrequentava,eissomedeixounervosa.—Temcertezadequeissonãopodeesperar?Essacoisaqueprecisamosfazerémeiourgente...—Issoaquitambémé.OquevocêachoudeClarencenaúltimavezqueoviu?—Esquisito.—Masoqueachoudasaúdedele?Penseiarespeito.—Bom,euseiqueeleandacansado.Mas,demaneirageral,pareciabem.—É,bom,elenãoestá“bem”agora.Estámuitomaisdoquecansado.Está fraco,

tontoeacamado.ChegamosaumaportademadeirafechadaeAdrianparou.—Você sabe qual a causa?— perguntei, assustada.Tinhame preocupado com as

complicaçõesdeterumMoroidoente,masnãoachavaque iaterde lidarcomissotãocedo.— Tenho uma boa ideia do que aconteceu — Adrian respondeu com firmeza

surpreendente.—FoioseuamigoKeith.—Pare de dizer isso. Ele não é“meu amigo”!— exclamei.—Ele está acabando

comaminhavida!Adrian abriu a porta e revelou uma cama toda entalhada, com dossel. Entrar no

quarto de umMoroi não era algo que me deixasse à vontade, mas o olhar firme deAdrianerafortedemais.Euoseguie fiqueiboquiabertaquandoviClarencedeitadonacama.—Nãoésócomasua—Adriandisseeapontouparaosenhordeidade.OsolhosdeClarenceseabriramumpoucocomosomdanossavozeentãovoltaram

asefecharquandoelecaiunosono.Masnãoforamosolhosdelequechamaramaminhaatenção. Foi a palidez doentia em sua pele— assim como a ferida sangrenta em seupescoço. Era pequena, feita com uma picada só, como se tivesse sido causada por uminstrumentocirúrgico.Adrianolhouparamim,cheiodeexpectativa.—Bom, e então, Sage?Tem alguma ideia por queKeith está tirando o sangue de

Clarence?Engoli em seco, quase sem conseguir acreditar no que estava vendo.Aquela era a

última peça. Eu sabia que Keith fornecia omaterial para os tatuadores, e agora sabiatambémondeeleconseguiaseus“estoques”.—Tenho, sim— respondi finalmente, com a voz bem baixinha.—Tenho uma

ideiamuitoboadomotivodele.

22

Clarence não quis falar conosco a respeito do que tinha acontecido. Aliás, ele negoucategoricamente que houvesse algo de errado, alegando que tinha cortado o pescoçoenquantosebarbeava.—Sr.Donahue—eudissecomamaiorgentilezapossível—,esta ferida foi feita

porumaferramentacirúrgica.EsóaconteceudepoisdavisitadeKeith.—Não,não—Clarenceconseguiudizercomavoz fraca.—Nãotemnadaaver

comele.Naquelemomento,Dorothyenfiou a cabeçanoquarto, trazendoumcopode suco.

Nós a tínhamoschamadopoucodepoisdeeuchegar.Paraperdade sangue,o remédioeraomesmotantoparaMoroiquantoparahumanos:açúcare líquidos.Elaofereceuocopoparaelecomumcanudinho,comorostoenrugadocheiodepreocupação.Eufaziameuinquéritoenquantoelebebia.—Digaoqueestáacontecendo—implorei.—Qualéoacordo?Oqueeledápara

vocêemtrocadoseusangue?—ComoClarencecontinuouquieto,tenteioutratática.—Temgentequeestásendoprejudicada.Eleestádistribuindooseusanguedemaneiraindiscriminada.Issocausouumareação.—Não—Clarencedisse.—Ele estáusandoomeu sangue e aminha salivapara

curaraspessoas.Paracurarhumanosdoentes.Saliva? Eu quase soltei um gemido. Era isso. O líquido transparente misterioso.

Agoraeusabiaoquedavaàstatuagenscelestiaisseubaratoviciante.Quenojo.Adrian e eu trocamos olhares. Cura certamente era um dos usos do sangue de

vampiro.Atatuagemqueeu tinhaeraprovadisso,eosalquimistas tinhamtrabalhadomuito para tentar reproduzir algumas das propriedades do sangue para uso medicinalmais amplo. Até agora, não havia maneira de criar essas propriedades de modosintético,eusarsanguerealsimplesmentenãoeraprático.

—Elementiu—respondi.—Eleestávendendoparaadolescentesricosparaajudarnosesportes.Oqueeleprometeuparavocê?Umapartedodinheiro?Adriandeuumaolhadanoquartoopulento.—Elenãoprecisadedinheiro.Sóprecisadaúnicacoisaqueosguardiõessenegaram

alhedar.JustiçaporTamara,nãoé?Surpresa,mevireiparaClarenceeviaspalavrasdeAdrianconfirmadasnorostodo

velhoMoroi.— Ele... ele está investigando os caçadores de vampiros para mim— ele disse

devagar.—Dizqueestáperto.Pertodedescobrirquemelessão.Sacudiacabeça,comvontadededarumsocoemmimmesmapornãoterpercebido

antes que Clarence era a fonte do sangue. Isso explicava por que Keith sempre estavaaqui sem que eu esperasse— e por que ele ficou tão aborrecido quando apareci semavisar.Aminha“confraternizaçãocomosvampiros”nãotinhanadaavercomisso.— Senhor, garanto que a única coisa que ele está investigando é como gastar o

dinheiroqueandaganhando.—Não...não...elevaimeajudaraencontraroscaçadoresquemataramTamara...Eumelevantei.Nãosuportavaouvirmaisnada.—Tragaumpoucodecomidadeverdadeparaele,evamosveroqueeleconsegue

comer— disse a Dorothy.— Se estiver fraco só por causa da perda de sangue, sóprecisadetempo.FizumsinalparaAdrianmeseguirparafora.Enquantocaminhávamosemdireçãoà

sala,observei:—Bom,há ladosbonseruinsnisto.PelomenospodemostercertezadequeKeith

temumaquantidadedesanguefrescoparapodermospegá-lonoflagra.SintomuitoporClarencetersidotãoafetado...Fiqueiparalisadaquandoentreina sala.Eu sóquis irpara láporque seriaum lugar

familiarparadiscutirmosnossosplanos,umlugarmenosassustadordoqueoquartodeClarence. Levando em conta a maneira como a minha imaginação costumava corrersoltaquandoeuestavanaquelacasavelha,poucascoisasmesurpreendiam.Mas,nunca,nemnosmeussonhosmaisloucos,euimagineiqueasalateriasetransformadoemumagaleriadearte.Cavaletes e telas estavam montados por toda a sala.Até a mesa de sinuca estava

coberta com um rolo grande de papel.As imagens variavam muito em conteúdo.Algumas eram só manchas de cor jogadas. Outras traziam retratos tão realistas deobjetosedepessoasquesurpreendiam.Umaamplavariedadedetintasaóleoeaquarelaseespalhavapelomeiodosquadros.Por um momento, todos os pensamentos a respeito de Clarence e Keith

desapareceramdaminhacabeça.—Oqueéisso?

—Liçãodecasa—Adrianrespondeu.—Você... você não acaboude começar as aulas? Como é possível já ter recebido

tantatarefa?Elecaminhouatéumatelaquemostravaumalinhavermelhaemespiraltraçadapor

cimadeumanuvemnegraeexperimentoudelevecomodedoparaverseatintaestavaseca.Euaexamineie tenteidecidirsede fatoestavavendoumanuvem.Haviaalgodequaseantropomórficonaquilo.—Claroquenãonosderamtantacoisaparafazer,Sage.Maseutinhaqueirbemna

primeira tarefa, de qualquer jeito. É necessário tentar muitas vezes para atingir aperfeição.—Ele fezumapausaparareconsiderar.—Bom,excetoparaosmeuspais.Elesacertaramdeprimeira.Nãopudedeixardesorrir.DepoisdeverohumordeAdrianoscilardemaneiratão

descontroladanasduasúltimassemanas,eralegalvê-loalegre.—Bom, istoébastante fantástico—reconheci.—Oqueelesrepresentam?Quer

dizer,euentendiaqueleali—aponteiparaumquadroqueeraoolhodeumamulher,castanhoecomcílioscompridos,edepoisparaoutroderosas.—Masosoutrosestãoabertosa,hum,umpoucomaisdeinterpretaçãocriativa.—Estão,é?—Adrianperguntouesevoltouparaapinturacomaespiralvermelha.

—Acheiqueeraóbvio.EsteéAmor.Vocênãopercebe?Deideombros.—Talvezeunãotenhaumamentesuficientementeartística.—Talvez—eleconcordou.—DepoisquepegarmososeuamiguinhoKeith,vamos

discutiraminhagenialidadeartísticaotantoquantovocêquiser.—Certo—eudisse,evolteia ficarséria.—Precisamos fazerumabuscanacasa

dele para encontrar evidências.Achei que a melhor maneira de fazer isso seria eu oatrairparalongeevocêinvadirenquantoelenãoestálá.Paraabrirafechadura...Adrianmedispensou.—Euseiarrombar fechaduras.Comovocêachaqueeuabriaoarmáriodebebidas

dosmeuspaisquandoestavanoensinofundamental?—Eudeviateradivinhado—eudisse,seca.—Tenhacertezadeprocuraremtodos

oslugares,nãosónosmaisóbvios.Elepodetercompartimentosescondidosnasparedesounosmóveis.Vocêdeveficaratentoparaampolasdesangueoudelíquidometálico,etambémparaoinstrumentoqueperfurouClarence.—Entendi.—Nósacertamosmais algunsdetalhes, incluindoparaquemeledevia

ligarseencontrassealgo,eestávamosparasairquandoeleperguntou:—Sage,porquevocêmeescolheuparaseroseucúmplicenisso?Penseiarespeito.—Poreliminação, acho. Jill nãodeve semeteremencrenca.Eddie seriaumbom

parceiro,masprecisavavoltarcomelaeLee.Alémdomais,eusabiaquevocênãoteria

nenhumaquestãomoralemrelaçãoainvadiracasadealguém.—Essafoiacoisamaisbacanaquevocêjámedisse—eledeclaroucomumsorriso.Depoisdisso,fomosparaacasadeKeith.Asluzesestavamacesasnoprimeiroandar

doprédiodele,oqueacaboucomaminhaúltimaesperançadequetalveznãoprecisasseatraí-loparafora.Naverdade,euiagostardeajudarnabusca.DeixeiAdrianlápertoefui para um restaurante vinte e quatro horas que ficava do outro lado da cidade, nosarredores.AcheiqueseriaperfeitoparamanterKeithforadecasa.SóotempodepegarocarroeiratélájádariatempoextraparaabuscadeAdrian,apesardesignificarqueAdrian teria que esperar um bom tempo do lado de fora até Keith sair. Quandofinalmentecheguei,senteiaumamesa,pediumcaféedigiteionúmerodoKeith.—Alô?—Keith,soueu.Precisofalarcomvocê.— Então fale — ele disse. Parecia arrogante e cheio de confiança, sem dúvida

contenteporterconseguidorealizaraquelasvendasdetatuagemdeúltimahora.—Nãopelotelefone.Precisoquevocêvenhaseencontrarcomigo.—EmAmberwood?—perguntou,surpreso.—Jánãopassoudahoradotoquede

recolher?Játinhapassadomesmo,masesseeraumproblemaparadepois.—Nãoestounaescola.EstounoMargaret’sDiner, aquele lugarque ficapertoda

estrada.Longosilêncio.Eentão:—Bom,seoseuhoráriojápassou,simplesmentevenhaaqui.—Não—eudissecomfirmeza.—Vocêéquevematéondeeuestou.—Porquê?Hesiteisóumpoucoantesdedaracartadaqueeusabiaqueiriaconvencê-lo,aúnica

coisaqueofariapegarocarroeiratéalisemlevantarsuspeitassobreastatuagens.—ÉsobreCarly.—Oquetemela?—eleperguntoudepoisdeummomentodepausa.—Vocêsabeexatamenteoqueé.Depoisdeumapausadeumsegundo,Keith cedeuedesligou.Repareiqueeu tinha

umamensagemdevozdaquelemesmodia,maiscedo,queeunãohaviaescutado.Ligueieescutei.—Sydney,aquiéWesRegandaFaculdadeCarlton.Eusóqueriarepassaralgumas

coisascomvocê.Emprimeiro lugar,achoquetenhomásnotícias.Parecequenãovoupoder passar o seu irmão da situação de ouvinte para a de aluno regular. Possomatriculá-locomcertezanopróximosemestreseeletiverumbomdesempenhoagora,mas a únicamaneira de continuar frequentando as aulas agora é se permanecer comoouvinte. Por causa disso, ele não poderá obter auxílio financeiro e, inclusive, vocêsprecisarãopagarumataxaparaelepoderfrequentarasaulas.Seelequiserlargartudo,

tambémépossível.Sómeligueparadizeroquevocêsqueremfazer.Fiqueiolhandodesoladaparaotelefonequandoamensagemterminou.Láse iamos

nossossonhosdecolocarAdriannasituaçãodealunoregular,semfalarnossonhosdelede obter auxílio financeiro e sair da casa de Clarence. O semestre seguinte deviacomeçar em janeiro, então Adrian teria que ficar mais quatro meses na casa deClarence.Adrian tambémteriadeenfrentarmaisquatromesesde trajetosdeônibuseaulasdafaculdadesemrecebercréditoporelas.Mas será que os créditos e o auxílio financeiro realmente eram as coisas mais

importantes ali?Lembrei comoAdrian tinha ficado animadodepoisde sóumaspoucasaulas, como ele tinha se lançado à arte.O rosto dele estava radiante nomeio de sua“galeria”.As palavras de Jill também ecoaram pela minha mente, sobre como a artetinhadadoaAdrianumamaneiradecanalizarseussentimentos,etinhafeitocomquesetornassemaisfácilparaelalidarcomolaço.Asaulaseramboasparaosdois.Quantoseriaa taxadeouvinte?Eunãosabiacomcerteza,mas imaginavaqueseria

menosdoqueocursocomcrédito.Tambémeraumcustoúnicoqueeuprovavelmentepoderiaincluirnosmeusgastossemchamaraatençãodosalquimistas.Adrianprecisavadaquelas aulas, disso eu tinha certeza. Se ele soubesse que o auxílio financeiro não eraumaopçãoparaessesemestre,haviaumaboachancedequeeledecidissesimplesmentelargar tudo.Eunãopodiapermitir que aquilo acontecesse.Ele seria informadodequetalvez houvesse um“atraso” até o auxílio financeiro acontecer. Se eu conseguisse fazercomque ele ficasse naCarltonmais umpouco, então talvez ele pudesse se envolver osuficientecomaarteparacontinuar,mesmodepoisquedescobrisseaverdade.Eraumacoisadissimuladadesefazer,masfariabemparaele—eparaJill—nofinal.TelefoneiparaoescritóriodeWesRegan,masjásabiaqueiriacairnacaixapostal.

Deixeiumrecadoparaeledizendoqueeudeixariaumchequeparaa taxadeouvinteequeAdriancontinuariaocursoatépodersematricularnosemestreseguinte.DesligueiefizumaprecesilenciosaparaquedemorasseumpoucoatéAdriandescobriroqueestavaacontecendo.A garçonete ficava me olhando feio porque eu só tinha pedido café, até que eu

finalmentepediumafatiadetortaparaviagem.Elatinhaacabadodecolocaracaixanamesa quando Keith entrou no restaurante, todo irritado. Ele ficou parado à porta,olhandoaoredorcomimpaciência,atémelocalizar.—Certo,oqueestáacontecendo?—elequestionouesesentoucheiodepompa.—

Oqueétãoimportantequevocêsentiuanecessidadededesrespeitarasregrasdaescolaedemearrastaratéooutroladodacidade?Porum instante, fiqueiparalisada.OlharnosolhosdeKeith—tantooverdadeiro

quantooartificial—trouxeàtonatodosossentimentosconflituososqueeuhaviatidoemrelaçãoaeleaolongodoúltimoano.Medoeansiedadeemrelaçãoaoqueeuestavatentando fazer brigavam com o ódio profundo que eu carregava fazia tanto tempo.

Instintosmais básicos desejavam que eu o fizesse sofrer, que jogasse alguma coisa emcimadele.Comoatorta.Ouumacadeira.Ouumtacodebeisebol.—Eu...Antes que pudesse dizer qualquer outra palavra, meu telefone tocou. Olhei para

baixoeviumamensagemdetextodeAdrian:consegui.ligaçãofeita.umahora.Enfiei o celular na bolsa e soltei a respiração.Keith tinha demorado vinteminutos

parachegare,duranteessetempo,Adriantinhafeitoabuscadetalhadanoapartamento.Pareceque tinha sidobem-sucedido.Agoraminha função era segurá-lo até os reforçosaparecerem. Uma hora na verdade era bemmenos tempo do que eu esperava.Tinhadado aAdrian o telefone de Stanton, e ela devia ter despachado os alquimistas queestivessemmaispróximos.AcheiqueissosignificariaLosAngeles,maseradifícildizer,devidoaoalcancedonossotrabalho.Sehouvessealquimistasdoladolestedacidade,eleschegariambemrápido.Tambémerapossívelqueganhassemtemposeviessememumjatinhoparticular.—Oquefoi?—Keithperguntou,irritado.—Umamensagemdetextodeumdos

seusamigosvampiros?—Podeparar comaencenação—eudisse.—Eu seiquenaverdadevocênão se

importacomofatodeeuestarme“aproximandomuito”deles.Eu não tinha a intenção de que aquele fosse o tema para distraí-lo,mas aquilo era

bomosuficiente.—Claroqueeumeimporto.Eumepreocupocomasuaalma.—Foiporissoqueligouparaomeupai?—perguntei.—Éporissoquequerme

verlongedePalmSprings?—Éparaoseuprópriobem—eledisse,eestampounorostoumartodoangelical.

—Você tem ideia de como foi errado você querer este trabalho, para começo deconversa?Nenhumalquimistateriaessedesejo.Masvocêpraticamenteimplorou.—É—respondi,esentiaminhairritaçãocrescer.—ParaqueZoenãotivesseque

passarporisso.—Digaasimesmaoquevocêquiser.Euseiaverdade.Vocêgostadessascriaturas.—Porqueascoisastêmquesertãopretonobranco?Nasuavisão,oueutenhoque

odiá-losoumealiaraeles.Háummeio-termo,sabia?Eupossocontinuarsendolealaosalquimistasesersimpáticacomvampirosedampiros.Keitholhouparamimcomoseeutivessedezanosdeidade.— Sydney, você é tão inocente. Não entende como omundo funciona domesmo

jeito que eu entendo.— Eu sabia tudo a respeito de como ele achava que “o mundofuncionava”,e teriadito issoseagarçonetenãotivessechegadoparapegaropedidodebebidadelebemnaquelemomento.Quandoelaseafastou,Keithcontinuousualadainha.—Querdizer,comoéquevocêpodesaberquerealmenteestásesentindodojeitoquesesente?Osvampirospodemforçar,sabecomoé.Elesusamocontroledamente.Os

quecontrolamoespírito,comoAdrian, sãobonsdeverdadenisso.Atéondesabemos,eletemusadoseuspoderesparaconquistarvocê.PenseiemtodasasvezesquetivevontadedechacoalharAdrianparaverseadquiria

umpoucodenoçãodascoisas.—Entãoelenãoestáfazendoumtrabalhomuitobom,não.Nósficamosdiscutindooassuntoduranteumtempoe,pelomenosdessavez,fiquei

felizcomaobstinaçãodeKeithecomsuarecusaemenxergararazão.Quantomaiseledebatiacomigo,maistempoosalquimistastinhamparachegaraoapartamentodele.SeStanton tinha dito aAdrian que iria demorar uma hora, devia ter sido exata.Mesmoassim,eramelhorgarantir.Agotad’águafoiquandoKeithdisse:—Vocêdeviasesentiragradecidaporeucuidardevocêdestamaneira. Issoaquié

maisabrangentedoqueosvampiros,sabecomoé.Estoudandoliçõesdevidaparavocê.Você podememorizar os livros, mas não entende as pessoas.Você não sabe como seconectaraelas.Vaicarregaressamesmaatitudeingênuacomvocêparaomundoreal,achando que todo mundo tem boas intenções, e alguém... algum garoto,provavelmente...vaisimplesmentetirarvantagemdevocê.—Bom—explodi.—Evocêsabetudoarespeitodisso,nãoémesmo?Keithdeuumagargalhadadedesdém.—Eunãoestouinteressadoemvocê,podeficartranquila.—Nãoestoufalandodemim!EstoufalandodeCarly.Pronto.Eraisso.Omotivooriginaldonossoencontroali.—Oqueelatemavercomtudoisso?—Keithmanteveotomfirme,maseupude

perceber.Amenordascentelhasdeansiedadeapareceuemseuolho.—Euseioqueaconteceuentrevocês.Euseioquevocêfezcomela.Eleficoumuitointeressadoemmexerogelodocopocomocanudinho.—Eunãofiznadacomela.Nãoseidoquevocêestáfalando.—Você sabe exatamente do que estou falando! Elame contou.Veio falar comigo

depoisdoqueaconteceu—me inclineiparaa frente, sentindomuita segurança.—Oquevocêachaqueomeupaifariasedescobrisse?Oqueoseufaria?Keithergueuosolhosemumgestobrusco.—Setemtantacertezadequeumacoisahorrívelaconteceu,entãocomoéqueoseu

pai ainda não soube? Hein?Talvez seja porque Carly tem consciência de que não temnadaparacontar.Qualquercoisaquenóstenhamosfeito,elaquisfazer,podeacreditar.—Comovocêémentiroso—sibilei.—Euseioquevocêfez.Vocêaestuprou.E

nuncavaisofrerobastanteporisso.Deviaterperdidoosdoisolhos.Eleficoutensocomareferênciaaosolhos.—Essa foi forte. E não temnada a ver com isso aqui.Que diabos aconteceu com

você,Sydney?Comofoiquevocêvirouumavacaassim?Talvezlevarvocêaseassociar

com vampiros e dampiros tenha causado mais danos do que nos demos conta. Aprimeira coisa que vou fazer amanhã é ligar para Stanton e pedir para tirarem vocêdaqui imediatamente. Nada de esperar até o final da semana.Você precisa se afastardessa influência sombria.— Ele sacudiu a cabeça eme olhou de um jeito que era aomesmo tempo condescendente e cheio de pena.— Não, você precisa ser reeducada,ponto final. Devia ter acontecido hámuito tempo, assim que pegaram você ajudandoaquelaassassina.—Nãomudedeassunto—faleiemtominsolente,apesardeelemaisumavezter

despertadoumafagulhademedoemmim.EseAdrianeeutivéssemosfalhado?EseosalquimistasdessemouvidosaKeithememandassemparaumcentrodereeducação?Elenunca mais teria que se preocupar comigo. — Não estávamos falando de mim.EstávamostratandodeCarly.Keithrevirouosolhos,irritado.—Paramim,jáchegadefalardasuairmãgalinha.Naquele instante, meu impulso inicial de jogar alguma coisa em cima dele me

venceu.Para a sortedele, foi sóomeu café e nãouma cadeira.Tambémpara a sortedele,ocaféjátinhaesfriado.Aindatinhasobradobastante,eeleseespalhouportodososlados,ensopandoaescolhainfelizdeleporumacamisabranca.Eleficoumeencarando,atordoado,cuspindoaoproferirsuaspalavras:—Suavaca!—eledisseeselevantou.Quandoele começou a sedirigir para aporta, percebi que aminha irritaçãopodia

terestragadooplanotodo.Corriatéeleeopuxeipelobraço.—Espere,Keith.Eu...eusintomuito.Nãováembora.Eledesvencilhouobraçoeficoumeolhandocomódio.—Jáétardedemaisparavocê.Tevesuachanceenãoaproveitou.Euoagarreimaisumavez.—Não,não.Espere.Aindatemmuitacoisasobreoqueprecisamosconversar.Ele abriu a boca para fazer alguma observação espertinha e então prontamente a

fechou.Elemeexaminouduranteváriossegundosesuaexpressãofoificandomaisséria.—Vocêestátentandomeseguraraqui?Oqueestáacontecendo?Comoeunãoconseguidarnenhumaresposta,ele sedesvencilhoue irrompeuporta

afora.Volteicorrendoparaamesae jogueiumanotadevinteemcimadela.Pegueiatortaedisseparaagarçoneteemchoquequeficassecomotroco.Orelógiodomeucarroinformouquenóstínhamosvinteminutosatéohorárioem

que os alquimistas deviam chegar à casa de Keith.Também era o tempo que ele iriademorar para voltar até lá. Fui seguindo na sua cola, sem fazer nenhum esforço paraesconder a minha presença.Agora não era segredo que algo estava acontecendo, algopara longedoqualeuohaviaatraído.Abençoeicadasinalvermelhoquenos fezparar,rezandoparaqueelenãochegassecedodemais.Seissoacontecesse,Adrianeeuteríamos

queatrasá-lo.Nãoseriaimpossível,mastambémnãoeraalgoqueeuquisessefazer.Finalmente chegamos. Keith parou no estacionamento minúsculo do prédio e eu

estacionei semme incomodar emuma área reservada para os bombeiros, à frente.Euestava apenas algunspassos atrásdelequandoele correu até aporta,maspareceunemnotar.Suaatençãoestavanasjanelasiluminadasdoprédioenassilhuetasescurasquemaldavaparadistinguirportrásdascortinaspesadas.Eleirrompeupelaporta;entreiatrásum segundo depois e quase dei um encontrão nele, que tinha ficado completamenteparalisadoali.Eu não conhecia os três homens de terno que estavam comAdrian,mas sabia que

eramalquimistas.Passavamaquelaimpressãofriaepolidaquetodosnósalmejávamos,esuasbochechas traziamamarcado líriodourado.Umdelesexaminavaos armáriosdacozinha de Keith. Outro segurava um bloco de notas e conversava comAdrian, queestavaapoiadoemumaparedeefumava.Elesorriuquandomeviu.Oterceiroalquimistaestavaajoelhadonochãodasala,pertodeumpequenoarmário

embutido.Umapintura cafonadeumamulher comas costasnuas,que aparentementetinha servido para esconder o compartimento, estava jogada ali perto.A porta demadeira tinha sidovisivelmente aberta à força e seu conteúdodiverso estava espalhadopor todos os lados—com algumas exceções.O alquimista estava se dedicandomuitopara separar a pilha de objetos: tubos de metal e agulhas usadas para drenar sangue,junto com ampolas de sangue e pacotinhos de pó prateado. Ele ergueu os olhos com anossaentradarepentinaesefixouemKeithcomumsorrisofrio.—Ah, que bom que está aqui, sr. Darnell.Queríamosmesmo lhe fazer algumas

perguntas.Keithficoudecaranochão.

23

—Oquevocêfez?

Eu estava sentada na ponta de uma fileira de cadeiras no desfile de Jill, quase umasemana depois, no centro de Palm Springs, esperando as coisas começarem. Eu nemsabiaqueTreyestavanodesfileefiqueisurpresaaovê-loderepente,ajoelhadoaomeulado.—Doqueexatamentevocêestáfalando?—pergunteiaele.—Hámaisoumenos

ummilhãodecoisaspelasquaiseupossoassumiraresponsabilidade.Ele desdenhou e manteve a voz baixa, o que não era muito necessário devido ao

barulhodeconversasaonossoredor.Váriascentenasdepessoashaviamcomparecidoaodesfile.—Estou falandodeSladeedosamigosdele,evocêsabemuitobemdisso—Trey

disse.—Eles andammuito aborrecidosporcausade algumacoisaesta semana.Ficamsó reclamando dessas tatuagens idiotas — ele olhou para mim cheio de segundasintenções.—Oquê?—pergunteicomexpressãodeinocêncianorosto.—Porquevocêacha

queissotemalgumacoisaavercomigo?—Estádizendoquenãotem?—eleindagou,semsedeixarenganarnemumpouco.Senti um sorrisinho traidor brincando nos meus lábios. Depois da inspeção ao

apartamento deKeith, os alquimistas haviam garantido que os colegas tatuadores delenãoteriammaismeiosdecontinuarcomastatuagensilícitas.Alémdisso,ninguémmaisfalou sobre Zoe me substituir. Demorou vários dias até que Slade e seus amigospercebessem que a conexão que tinham com aquelas tatuagens que melhoravam odesempenho não estava mais lá. Eu tinha passado a semana toda observando suasconversasfurtivascominteresse,masnãotinhapercebidoqueTreytambémnotara.—Vamos dizer apenas que é possível que Slade em breve já não seja mais o

superastro que tem sido — respondi. — Espero que você esteja pronto para se

apresentareocuparolugardele.Treymeexaminoudurantemaisalgunsmomentos;pareciaqueestavaesperandoque

eudissessealgomais.Comoeunãofaleinada,elesósacudiuacabeçaedeurisada.—Semprequequisercafé,Melbourne,ésófalarcomigo.—Anotado—respondi.Fizumgestoparaopúblicoquecontinuavacrescendo.—

Mas, aliás, o que você está fazendo aqui?Não sabia que você se interessava pelamodamaisquentedaatualidade.— E nãome interessomesmo— ele concordou.—Mas algumas pessoas que eu

conheçoestãotrabalhandonodesfile.—Garotas?—pergunteiemtomdesacanagem.Elerevirouosolhos.—Amigasminhas.Nãotenhotempoparaessabobagemdedistraçãofeminina.—Émesmo?Acheiquetinhasidoporissoquevocêfezasuatatuagem.Asmulheres

gostamdessascoisas.Treyseretesou.—Doquevocêestáfalando?EumelembreidequeKristineJuliatinhammencionadocomoeraestranhoofatode

Treytertatuagem,edepoisEddietinhamencionadoquetinhavistoodesenhonapartebaixadascostasdeTreynovestiário.Eddietinhaditoquepareciaumsolcomdiversosraios, feita com tintamuito comum.Euestava esperando a chancepara tirar sarrodeTreyporcausadela.—Nãosefaçadedesentendido.Estousabendodoseusolbrilhante.Comoéquevocê

sempremecriticatanto,hein?—Eu...Elerealmentenãosabiaoquedizer.Maisdoque isso.Elepareciapoucoàvontade,

preocupado — como se aquilo fosse algo que ele não queria que eu soubesse. Foiestranho. Não era nadatão sério assim. Eu estava prestes a questioná-lomais quandoAdrianderepenteabriucaminhoaténóspelomeiodamultidão.Treydeuumaolhadano rosto perturbado deAdrian e se levantou imediatamente. Dava para entender areaçãodele.AexpressãodeAdriantambémteriameintimidado.— Bom—Trey disse, sem jeito. — Obrigado mais uma vez.A gente se fala

depois.Murmurei umadespedida e observei quandoAdrian passoupormim.Micah estava

sentadoaomeulado,depoisvinhaEddieeemseguidaduascadeirasvaziasquetínhamosguardado. Adrian se sentou em uma delas e ignorou o cumprimento de Eddie.Momentos depois, Lee chegou apressado e ocupou a outra cadeira. Ele pareciaincomodado com algo, mas, mesmo assim, conseguiu ser simpático comAdrian. Elefitavaonada,eomeubomhumor seesvaiu.Dealgummodo, semsaberporquê,eutinhaasensaçãodequeeueraomotivodaquelemauhumortodo.

Mas não tivemos tempo de discutir a questão.As luzes diminuíram e o desfilecomeçou.Aapresentaçãoerafeitapeloâncoradeumtelejornallocal,quefalousobreoscincoestilistasqueiriamseapresentaraquelanoite.AdeJilleraaterceira,eassistiraosquevieramantesnosdeixouaindamaisansiosos.Aquiloestavamuitolongedassessõesde ensaio que eu tinha presenciado antes.As luzes e a música faziam com que tudoassumisseumnívelmaisprofissional, e asoutrasmodelospareciambemmaisvelhaseexperientes. Comecei a compartilhar do receio que Jill havia tido, de que talvez elaestivessetentandofazeralgoforadeseualcance.EntãochegouavezdeLiaDiStefano.Jillfoiumadesuasprimeirasmodelosaentrar,

eapareceucomumvestidodenoiteprateadofluido,feitoumtecidoquepareciadesafiaragravidade.Umameia-máscaradepérolasepratacobriapartedeseurosto,escondendosua identidade daqueles que não soubessem quem ela era. Eu achava que eles fossemamenizar um pouco suas características de vampira, possivelmente lhe dando uma cormaisparecidacomadeumahumana.Emvezdisso,tinhamacentuadoseuvisualforadocomum,comumpópara iluminarapelequeadeixavaaindamaispálida,deumjeitoqueafaziaparecersobrenatural.Cadacachotinhasidoajeitadonolugarecaíaaoredordorostodemaneiraartística;osfiosestavamenfeitadoscompedrinhasbrilhantes.Amaneiradeandardelatinhamelhoradoimensamentedesdeoprimeiroensaio.Ela

praticamente dormia com aqueles saltos e tinha ido além de simplesmente tentar nãocair. Havia uma nova confiança emotivação nela que não existiam antes. De vez emquando,eu captavaumvislumbredenervosismoem seusolhos,ouumajuste em seuspassos enquanto ela controlava os saltos prateados altíssimos. Mas eu duvidava quealguémmais estivesse reparandonessas coisas.Qualquerpessoaquenãoconhecesse Jillnemsuascaracterísticassóiriaverumamulherforteeetéreadesfilandopelapassarela.Era uma coisa fantástica. Se ela era capaz de se transformar tanto assim só com umpoucodeincentivo,oquemaisestariaporvir?Dei umaolhada nos rapazes aomeu lado e vi sentimentos parecidos espelhados em

seus rostos. O de Adrian estava cheio daquele orgulho de irmão que ele sempredemonstravaporela,comtodososvestígiosdeseumauhumoranteriordesaparecidos.Micah e Lee demonstravam adoração pura e sem filtro. Para a minha surpresa, aexpressão deEddie tambémera de adoração, junto commais alguma coisa. Era quasecomo se ele... a idolatrasse.Era isso, percebi.Ao semostrar comoessa criatura comjeito de deusa, maior do que a vida, Jill concretizava todas as fantasias de proteçãoidealizadas de Eddie. Ela era a princesa perfeita agora, com seu cavaleiro prestativoprontoparaservi-la.EladesfiloumaisduasvezesparaalinhadeLia,estonteantetodasasvezes,apesarde

nãoseequipararexatamenteàestreiacomovestidoprateado.Assistiaorestododesfilesó com meia atenção. Meu orgulho e meu afeto por Jill me distraíram demais e,sinceramente, amaior parte das roupas que eu vi naquela noite era chamativa demais

paraomeugosto.Havia uma recepção depois do desfile, em que convidados, estilistas e modelos

podiam interagir e beber alguma coisa. Nosso grupo encontrou um canto perto dossalgadinhosparaesperarJill,queaindanãotinhachegado.Leetinhanasmãosumbuquêenormedelíriosbrancos.Adrianobservouumagarçonetepassarcomumabandejacheiadetaçasdechampanhe.Seusolhosseencheramdedesejo,maselenãofeznadaparaqueelaparasse.Fiqueitãoorgulhosaealiviada!Jill,equilíbrioeálcoolnãoeramcoisasquenósíamosquerermisturar.Quando a garçonete se afastou,Adrian se virou para mim e eu finalmente vi a

irritaçãodeantesretornar.E,comoeudesconfiava,oalvoeraeu.—Quandoéquevocêpretendiamecontar?—eleperguntou.AquiloeratãoenigmáticoquantoafaladeaberturadeTrey.—Contaroquê?—Queoauxíliofinanceironãovairolar!Converseicomasecretariadematrículae

disseramquevocêjásabia.Suspirei.—Eunãoestavaexatamenteescondendodevocê.Sónãotinhatidooportunidadede

contarainda.Haviamaisummontedecoisasacontecendo.Certo, eu na verdade estava adiando, exatamente por este motivo. Bom, não

exatamente.Eunãosabiaqueeleiriaficartãoaborrecidoporcausadaquilo.—Masparecequevocê teve tempo suficienteparapagar a taxadeouvinte.E teve

dinheirobastanteparaisso.Masnãoparafinanciaraminhamoradia.Achoqueoquemaismeincomodavanaquilo,alémdotema,eraainsinuaçãodeque

dealgummodoeuhaviaoptadoporagirdeumamaneirainconvenienteparaele.Comoseeutivessemesubmetidodepropósitoàquilo,apesardehaverumamaneiradeevitar.—Éfácilincluirumpagamentoúniconasdespesas—disseaele.—Maspagarum

alugueltodomês?Nemtanto.—Entãoparaquesedaraotrabalho?—eleexclamou.—Oobjetivotododissoera

conseguirdinheiroparasairdacasadoClarence!Senãofosseporisso,eunãofariaessescursosidiotas.Vocêachaqueeugostodepassarhorasnoônibustodososdias?—As aulas estão te fazendo bem — retruquei, sentindo que eu mesma estava

ficandoirritada.Aminhaintençãonãoeraperderapaciência,nãoaliecertamentenãocom todos os nossos amigos assistindo a tudo. No entanto, fiquei estarrecida com areaçãodeAdrian.Seráqueelenãoeracapazdeenxergarcomoerabomparaele fazeralgo útil? Eu tinha visto o seu rosto quandomemostrara os quadros. Eles tinham lhedadoumcanalsaudávelparalidarcomRose,issosemfalaremumamotivaçãoparaele.Alémdisso,fiqueiarrasadadevercomoelefoicapazdedesprezarcomtantodesdémasaulas“idiotas”.Eramaisumlembretedecomoomundoerainjusto,comoeunãopodiaterascoisasàsquaisosoutrosnãodavamvalor.

Eledesdenhou.—“Mefazendobem”?Falasério,paredebancaraminhamãemaisumavez!Nãoé

oseutrabalhomedizercomoviveravida.Seeuquiserosseusconselhos,eupeço.—Certo—eudisse,ecoloqueiasmãosnacintura.—Nãoéminhafunçãodizera

vocêcomoviveravida... sóéminha função facilitaraomáximoparavocê.PorquesóDeussabecomovocênãopodesofrercomnadaquesejalevementeinconveniente.Oqueaconteceu com todas aquelas coisas que você disse? Sobre como estava determinado amelhorarsuavida?Quandomepediuparaacreditaremvocê?—Paremcomisso,pessoal—Eddiedisse,semjeito.—Nãoéahoranemolugar.Adrianoignorou.—VocênãotemnenhumproblemaemfacilitaravidadeJillomáximopossível.—Estaéaminhafunção—resmungueiemresposta.—Eelaaindaéumamenina.

Eunãoachavaqueumadultocomovocêprecisassedosmesmoscuidadosqueela!OsolhosdeAdrianseencheramdefogocordeesmeraldaquandoeleolhoufeiopara

mim, e então seu olhar se fixou em algo atrás de mim. Eu me virei e vi Jill seaproximar.Elausavao vestidoprateadomais umavez e sua expressão estava cheiadealegria radiante— uma alegria que desabou quando ela se aproximou e percebeu queuma briga se desenrolava. Quando ela parou ao meu lado, toda a animação de ummomentoantestinhasidosubstituídaporpreocupaçãoeinquietação.—Oque está acontecendo?—ela perguntou e olhou deAdrian paramim.Claro

queela jásabia,porcausadolaço.Eraumasurpresaqueossentimentossombriosdelenãotivessematrapalhadoodesempenhodelaantes.—Nada—dissecomavozinalterada.—Bom—disseAdrian.—Issodependedasuadefiniçãode“nada”.Querdizer,se

vocêconsideraquementire...—Pare com isso!—exclamei, erguendo a voz apesar de todos osmeus esforços.

Haviabarulhodemaisno salãopara alguémescutar,mas algumaspessoasque estavampor perto olharam para nós com curiosidade.—Apenas pare com isso,Adrian. Seráquevocêpodenãoestragaressemomentoparaela?Seráquenãopodefingir,apenasporumanoite,queexistemoutraspessoasnomundoalémdevocê?—Estragarascoisasparaela?—eleexclamou.—Comovocêousadizerumacoisa

dessas?Vocêsabeoqueeufizporela!Eufiztudoporela!Abrimãodetudoporela!—Émesmo?—perguntei.—Porquepeloqueeusei,nãopareceque...DeiumaolhadanorostodeJilleprontamentemeinterrompi.Atrásdamáscara,os

olhosdelaestavamarregaladosdedesalentocomasacusaçõesqueAdrianeeuestávamostrocando. Eu tinha acabado de dizer a ele que era egoísta e não pensava em Jill e, noentanto, lá estava eu, brigando semparar com ele na grande noite dela, na frente dosseus amigos. Não importava se eu estava certa— e eu tinha certeza de que estava.Aquele não era o momento de ter aquela discussão. Eu não devia ter permitido que

Adrianmefizessecairnessa,eseelenãotinhasensatezdepararantesquetudopiorasse,entãoeufariaisso.— Estou indo — eu disse. Forcei o sorriso mais sincero possível para Jill, que

pareciaestaràbeiradelágrimas.—Vocêfoimaravilhosa.Deverdade.—Sydney...—Está tudo bem—disse a ela.—Tenho algumas coisas a fazer—me esforcei

parapensaremalgo.—Eupreciso,hum,limparascoisasqueKeithdeixouparatrás.AlgumdevocêspodelevarEddieeeladevoltaaAmberwood?—estaperguntaeufizparaMicaheLee.Eusabiaqueumdelesiriaseoferecer.Nãoacheiqueprecisassetomara mesma providência paraAdrian. Sinceramente não me importava com o que fosseacontecercomeleaquelanoite.—Claro que sim— Lee eMicah responderam em uníssono.Mas, depois de um

momento,Leefranziuatesta.—PorquevocêprecisaarrumarascoisasdeKeith?—Éuma longahistória—balbuciei.—Vamosdizerqueele saiudacidadeenão

vaivoltarporumbomtempo.Talveznãovoltenuncamais.Demaneirainexplicável,Leepareceuincomodadocomaquilo.Talvezdurantetodoo

tempoqueKeith tinhapassadonacasadeClarence,osdois tivessemficadoamigos.Sefosseisso,Leemedeviauma.Jillcontinuavaaborrecida.—Acheiquenóstodosiríamossairparacomemorar,não?—Vocêspodem ir sequiserem—eudisse.—DesdequeEddie esteja comvocê,

para mim não faz diferença— estendi a mão sem jeito para Jill. Quase fiquei comvontade de abraçá-la, mas ela estava tão rebuscada e magnífica com sua roupa e suamaquiagemqueeufiqueicommedodeestragar.Eumecontenteicomumtapinhanãomuitoconvincentenoombro.—Faleisério.Vocêestavadetirarofôlego.Eume afastei apressada, com um pouco demedo de que ouAdrian ou eu não nos

aguentássemos e disséssemos algo idiota um para o outro. Eu precisava sair dali.AminhaesperançaeraqueAdriantivessenoçãosuficienteparadeixaraquestãodeladoenãofizesseanoiteficaraindapiorparaJill.Eunãosabiaporqueabrigacomeletinhameincomodadotanto.Nósvivíamosbrigandodesdequenosconhecemos.Quediferençafaziamaisumadiscussão?Eraporquenósandávamosnosdandobem,percebi.Euaindanãopensavaneleemtermoshumanos,mas,emalgumpontodocaminho,tinhapassadoaconsiderá-lomenoscomomonstro.—Sydney?Fuidetidaporumavozinesperada:Laurel.Elatinhatocadonomeubraçoenquanto

eu passava por um grupo de garotas deAmberwood. Eu devia estar parecendo bemirritadamesmoporque, quando olhei nos olhos dela, ela chegou de fato a estremecer.Deviaseralgoinédito.—Oquefoi?—perguntei.

Elaengoliuemsecoeseafastoudasamigascomosolhosarregaladosedesesperados.Umchapéu cobria amaior parte do cabelo que—pelo que tinha ouvidodizer—elaaindanãotinhaconseguidorecuperarefazervoltaraonormal.—Euouvi...ouvidizerquetalvezvocêpoderiameajudar.Comomeucabelo—

eladisse.Esse eramais um favor queKristin tinha feito paramim.Depois de deixarLaurel

sofrer durante alguns dias, pedi a Kristin que fizesse correr a notícia de que SydneyMelrose— com sua farmácia no dormitório— talvez fosse capaz de consertar o queestavaerrado.MaseutambémtinhameasseguradodedeixarbemclaroqueLaurelnãoera a minha pessoa preferida no mundo e que ela teria muito trabalho para meconvencer.—Talvez—respondi,tentandomanterumaexpressãosevera,oquenãofoidifícil

porqueeuaindaestavamuitobravacomAdrian.— Por favor — ela disse. — Faço qualquer coisa que você quiser se puder me

ajudar! Já tentei tudo nomeu cabelo, e nada funciona.—Para aminha surpresa, elaempurrou alguns anuários para cima de mim.— Pronto.Você queria ver isso, nãoqueria?Fiquecomeles.Fiquecomqualquercoisaquequiser.Mais cinco dias de lavagem com detergente forte iriam na verdade resolver o

problema,maseuéquenãoialhedizeraquilo.Pegueiosanuários.— Se eu ajudar você— falei—, vai ter que deixar a minha irmã em paz. Está

entendendo?—Estou—elaseapressouemresponder.— Não sei se está. Chega de pegadinhas, de bullying ou de falar mal dela pelas

costas. Você não precisa ser a melhor amiga dela, mas não quero que continueinterferindo. Fique fora da vida dela.— Fiz uma pausa.— Bom, menos para pedirdesculpas.Laurelconcordavacomtudoqueeudizia.—Tudobem,tudobem!Voumedesculparagoramesmo!Ergui os olhos para o lugar emque Jill estava com seus admiradores e as flores de

Leenosbraços.—Não.Nãofaçacomqueestanoitesejaaindamaisestranhaparaela.Amanhãestá

bom.—Voupedirdesculpas—Laureldisse.—Prometo.Sómedigaoquefazer.Como

euconsertoisto.Eu não achava que Laurel fosse falar comigo naquela noite específica,mas estava à

esperadelamaisdia,menosdia.Porisso,estavacomovidrinhodeantídotoprontonabolsa.Euopegueieosolhosdelaquasesaltaramparaforadasórbitasquandooestendinasuafrente.—Você só precisa de uma dose. Use como se fosse xampu. Depois, vai ter que

tingirdenovo.—Elaestendeuamãoparapegaro frascoeeuotireidoalcancedela.—Estou falando sério.Vocêvaipararde incomodar Jill agoramesmo.Seeuder istoparavocê,nãoqueromaisouvirdizerquevocêestácausandoproblemasparaela.Chegade ficar ofendida se ela falar com Micah. Chega de piadas dizendo que ela é umavampira. Chega de ligar para a Nevermore e ficar perguntando sobre pessoas altas epálidas.Elaficouboquiaberta.—Chegadoquê?Eununcaligueiparaninguém!Hesitei. Quando o tatuador tinha mencionado que alguém ficava ligando para

perguntar sobre pessoas que pareciam vampiros, achei que era Laurel dandocontinuidade a sua piada. Pela expressão estarrecida no rosto dela, já não achava quefosseverdade.—Bom, se eu ficar sabendo que qualquer uma das outras coisas continua, então o

que aconteceu com o seu cabelo não vai ser nada em comparação com o que vaiaconteceraseguir.Nada.Estáentendendo?Elaassentiu,trêmula.—P-perfeitamente.Entregueiofrascoparaela.—Nãoseesqueça.Laurelcomeçouasevirareentãolançoumaisumolharsemjeitoparamim.—Sabe,àsvezesvocêpodeserassustadoracomoodiabo.Fiquei imaginando se os alquimistas tinham alguma ideia do que eu andava fazendo

emrelaçãoàquelamissão.Pelomenosaconversaserviraparaconfirmarumacoisa.Odesespero de Laurel me convenceu de que as piadas de vampira só tinham sido umatática.Na verdade, ela não acreditava que nada daquilo fosse verdade.Mas, por outrolado, aquilo deixava no ar a pergunta preocupante de quem era a pessoa que estavaligandoparaaNevermoreeperguntandosobrevampiros.Quandofinalmentesaídoprédioeseguianadireçãodocarro,resolviquerealmente

iriaàcasadeKeith.Alguémprecisavasepararospertencesdele,epareciaumamaneiraseguradeevitarosoutros.AindatinhaumasduashorasantesdotoquederecolheremAmberwood.Ninguém tinha mexido no apartamento de Keith desde que os alquimistas haviam

feito a inspeção. Os indícios incriminadores de antes estavam lá, onde tínhamosdescobertosuasreservasdesanguedeClarenceedeprata.Osalquimistaspraticamentesó tinham tirado o essencial e deixado o resto dos pertences dele para trás.Aminhaesperança de ir até lá naquela noite era pegar os outros ingredientes dele, os que nãoeram usados na produção de tatuagens ilícitas. Sempre era útil ter quantidades extrasdessas substâncias químicas à mão, seja para destruir corpos de Strigoi ou para fazerexperiênciasnodormitório.

Nãotivetantasorte.Apesardeosoutrossuprimentosdelenãoseremilegais,pareciaque os alquimistas acharam melhor confiscar tudo. Mas, como eu estava ali, resolviconferir se alguns dos outros bens dele seriamúteis paramim.Keith comcerteza nãotinha se segurado para gastar seus fundos ilícitos incrementando o apartamentotemporário com todos os confortos que ele devia ter em casa.Apague isso.Duvidavaqueele tivesseemcasaqualquercoisadaquele tipo:umacamabemmaiordoqueumaking size, uma tv de tela plana gigantesca, um sistema de som digno de um teatro ecomidasuficienteparadarfestatodasasnoitesduranteummês.Examineiarmárioapósarmário,chocadaporverquantacomidaera sóporcaria.Aindaassim, talvezvalesseapenalevarumpoucoparaJilleEddie,porissocoloqueiosdocesmaistransportáveisemsacolasapropriadas,organizandoporcoretamanho.Tambémfiqueipensandosobreoladopráticodelevara tvparaAmberwood.Parecia

umdesperdíciodeixar alipara a turmadedesmanchedos alquimistas,maseu jápodiaimaginaraexpressãodasra.Weatherssenosvissearrastandoaquiloescadaacimaparaoquarto.NemtinhacertezadequeJilleeutínhamosumaparedegrandeobastanteparacomportá-la. Sentei na cadeira reclinável de Keith para refletir sobre a questão da tv.Até a poltrona era da mais alta qualidade. O couro luxuoso parecia manteiga, e eupraticamente afundei nas almofadas. Pena não haver espaço para ela na sala da sra.Terwilliger.Eueracapazdeenxergá-larelaxandoalienquantotomavaumcappuccinoeliadocumentosantigos.Bom, seja lá o que acontecesse com o resto das coisas de Keith, seria necessário

contratarumcaminhãodemudança,porqueoPingadocomcertezanãoiaterlugarparaa tv, a poltrona e amaior parte das outras coisas.Quando isso ficou decidido, eu nãotinhamaismotivoparaficaralinaquelanoite,masdetestariaterquevoltar.Estavacommedode ver Jill.Eunão iria receber bemnenhuma reaçãodela. Se ela ainda estivessetriste por causa da briga, iria me sentir culpada. Se ela tentasse defenderAdrian, eutambémficariaaborrecida.Suspirei. A cadeira era tão ridiculamente confortável que eu bem que podia

aproveitarmaisumpouco.Remexinaminhabolsaa tiracoloparaacharaminha liçãodecasaemelembreidosanuários.KellyHayes.Quasenãotinhatidotempodepensarnelaounosassassinatos,nãocomtodoodramasobreKeitheastatuagens.Kellyestavanopenúltimoanoquandomorreu, e eu tinhaumanuáriode cadaumdos anosqueelatinhapassadoemAmberwood.Mesmoquandoeracaloura,Kellyocupavamuitoespaçonoanuário.Eumelembrei

de como a sra.Weathers tinha dito que Kelly era boa atleta. Não estava brincando.KellytinhaparticipadodepraticamentetodososesportesoferecidosporAmberwoodetinha sido excepcional em todos eles. Ela entrou para os times competitivos já noprimeiro ano e ganhou todo tipo de prêmios. Outra coisa que eu também descobriimediatamenteeraqueKelly,comtodaacerteza,nãoeraMoroi.Issoeraóbvio,mesmo

embrancoepreto,efoiconfirmadonapáginaduplaemcoresdosegundoano.Seutipofísicoerabemhumanoesuapelebronzeadaobviamenteadoravasol.Eu estava examinando o índice do anuário do penúltimo ano quando ouvi alguém

bateràporta.Porummomento,nãoquisatender.Atéondeeusabia,deviaseralgumamigo fracassado que Keith tinha feito em seu período de estadia, querendo comer acomidadele e assistir à televisão.Mas então fiquei preocupadaquepudesse ser algumacoisa relacionada aos alquimistas. Encontrei a seção de homenagem aKelly que estavaprocurandoepusoanuárionochão,antesdemeaproximardaporta.Espieipeloolhomágicoeavisteiumrostoconhecido.—Lee?—pergunteiaoabriraporta.Elemelançouumsorrisotímido.—Oi.Desculpevirincomodarvocê.—Oqueestáfazendoaqui?—exclameiefizsinalparaqueeleentrasse.—Porque

nãoestácomosoutros?Elemeseguiuatéasala.— Eu... precisava conversar com você. Quando disse que vinha para cá, fiquei

imaginandoseoqueomeupaidisseeraverdade.QueKeithnãoestámaisaqui.Volteiamesentarnapoltronareclinável.Leeseacomodounosofazinhopróximo.—É.Keithsefoi.Ele,hum,recebeuoutramissão.Keithtinhasidoafastadoeestavarecebendoseucastigoemalgumlugar,epormim

estavamaisdoquebom.Leedeuumaolhadaaoredoreabsorveuamobíliacara.—Este lugar é bacana— os olhos dele pousaram no armário onde omaterial de

alquimia ficava guardado.A porta ainda estava pendurada de maneira precária pelasdobradiças,eeunãomedeiaotrabalhodearrumar,jáqueosalquimistastinhamlevadoemboratodooconteúdo.—Estelugar...—Leefranziuatesta.—Estelugarfoiinvadido?— Não exatamente— respondi. — Keith, hum, só precisou pegar umas coisas

apressadoantesdeirembora.Leetorceuasmãoseolhouaoredormaisumpoucoantesdesevirarparamimoutra

vez.—Elevaivoltar?—Provavelmentenão.Leeficoudesolado,eissomedeixousurpresa.Sempretinhatidoaimpressãodeque

elenãogostavadeKeith.—Algumoutroalquimistavaisubstituí-lo?—Não sei— respondi.A questão ainda estava sendo debatida.O fato de eu ter

entregadoKeithtinhaimpedidoqueeufossesubstituídaporZoe,eStantonagoraestavapensandoemsimplesmentemecolocarcomoaalquimistalocal, jáqueasfunçõeseram

leves.—Sealguémformandadoparacá,aindavaidemorarumpouco.— Então você é a única alquimista na área— ele repetiu, parecendo ainda mais

triste.Deideombros.—TemalgunsemLosAngeles.Issoinexplicavelmentefezcomqueelesealegrasseumpouco.—Émesmo?Seráquevocêpodemedizerqualéo...Lee se interrompeu quando sua atenção se voltou ao anuário aberto que estava aos

meuspés.—Ah—eudisseeorecolhi.—Ésóumprojetodepesquisaqueeuestoufazendo

sobre...—KellyHayes—aexpressãoanimadadesapareceu.—É.Vocêouviufalardela?—Estendiobraçoparapegarumpedaçodepapel,para

usarcomomarcadornaseçãodehomenagem.—Pode-sedizerquesim—elerespondeu.Eucomeceiaperguntaroqueelequeriadizer,efoiaíqueeuvi.Napáginaduplaque

tinha sido feita em honra a Kelly, havia fotos de todas as suas atividades no ensinomédio. Como não era de surpreender, na maior parte das fotos ela praticava algumesporte.Haviaalgumasdeoutrasáreasdeseumundosocialeacadêmico,incluindoumadela no baile de formatura. Ela usava um vestido de cetim azul estonteante queressaltava sua silhueta atlética e dava um enorme sorriso para a câmera enquantoabraçavaseulindopar,vestidocomumsmoking.Lee.Ergui a cabeça de supetão e olhei para ele, que agora me observava com uma

expressãoimpassível.Eumevolteidenovoparaafotoeaanaliseicomcuidado.OmaisnotávelnãoeraofatodeLeeestarnafoto—apesarde,podeacreditar,euaindanãoterentendidooquehavia sepassado ali.Oquemepegou foiomomento.Aquele anuáriotinhacincoanos.Leeteriacatorzeanosnaépoca,masosujeitoqueolhavaparamimaoladodeKellycomtodaacertezanãoeratãonovoassim.OLeeda fotoera igualzinhoaorapazdedezenoveanosqueestavasentadoàminhafrente,eaquiloeraimpossível.OsMoroinão tinham imortalidade especial.Eles envelheciamcomoos humanos.Voltei aerguerosolhos,imaginandoseeudeviaperguntarseeletinhaumirmão.MasLeemepoupouapergunta.Elesimplesmentemeolhoucomumaexpressãode

tristezaesacudiuacabeça.—Merda.Eunãoqueriaqueascoisasacontecessemassim.Eentão,elepegouumafaca.

24

É estranho como a gente reage emmomentos de perigo iminente. Parte de mim era pânicopuro,comocoraçãodisparadoearespiraçãorápida.Aquelasensaçãodevazio,quefaziaparecerqueumburacotinhaseformadonomeupeito,voltou.Outrapartedemimfoicapaz de inexplicavelmente continuar pensando com raciocínios lógicos, algo como:Certo,esteéotipodefacaquepoderiacortarumagarganta.Orestodemim?Bom,orestodemimestavaapenasconfuso.Fiqueiondeestavaemantiveminhavozbaixaeinalterada.—Lee,oqueestáacontecendo?Oqueéisso?Elesacudiuacabeça.—Nãofinja.Euseiquevocêsabe.Vocêéinteligentedemais.Sabiaqueiadescobrir

tudo,masnãoacheiqueseriatãorápido.Aminhamente girava.Mais uma vez, alguémme achavamais esperta do que eu

realmente era.Acho que devia ficar lisonjeada com a crença que as pessoas tinhamnaminha inteligência,masaverdadeéqueaindanãosabiaoqueestavaacontecendo.Masnãosabiasedeixarissotranspareceririameajudaroumeprejudicar.Resolviagircomcalmaenquantoconseguisse.—Évocênafoto—eudisse,comcuidadoparanãofazersoarcomoumapergunta.—Claroquesim—elerespondeu.—Vocênãoenvelheceu—ouseidarumaolhadarápidana foto,sóparaconfirmar

porcontaprópria.Aquiloaindaestavameconfundindo.SóosStrigoinãoenvelheciamepermaneciamimortaiscomaidadeemquetinhamsidotransformados.—Isso...issoéimpossível.VocêéMoroi.—Ah,euenvelheci—eledissecomamargor.—Nãomuito.Nãoosuficientepara

vocêpoderperceber,mas,podeacreditar,euenvelheço.Nãoémaiscomoeraantes.Aindanão fazia amenor ideiadoqueele estava falando, aindanão tinha certezade

comotínhamoschegadoaopontodeLee—cujosolhossemprebrilhavamemorriamde

amores por Jill— estarme ameaçando com uma faca.Mas eu também não entendiacomoeletinhaexatamenteamesmaaparênciadeumafotodecincoanosantes.Sóhaviaumacoisaterríveldaqualestavacomeçandoatercerteza.—Você... matou Kelly Hayes— o medo no meu peito se intensificou. Ergui o

olhardalâminaparafitarosolhosdele.—Mas,comcerteza...comcertezanãomatouMelody...nemTamara...Maseleassentiu.—EDina.Mas vocênãodeve ter ouvido falar dela, não émesmo?Ela era apenas

humana,evocêsnãoacompanhamasmorteshumanas.Sóasdosvampiros.Eradifícilnãovoltaraolharparaafaca.Eusóconseguiapensaremcomoeraafiada

e estava perto de mim. Com apenas um golpe eu acabaria igualzinha àquelas outrasgarotas, com a vida se esvaindo em sangue àminha frente.Tentei enlouquecidamenteencontrar algopara dizer, desejandomais uma vez ter aprendido as habilidades sociaisqueeramtãofáceisparaoutraspessoas.—Tamaraerasuaprima—conseguidizer.—Porquematousuaprópriaprima?Ummomentodearrependimentopassoupelorostodele.—Não era o que eu queria... quer dizer, era sim...mas, bom, eu estava fora de

mim quando voltei. Eu só sabia que precisava ser despertado mais uma vez.Tamaraestavano lugarerradonahoraerrada.Eu ataquei aprimeiraMoroiquevi...masnãofuncionou. Foi aí que tentei outros.Achei que com certeza umdos tipos ia funcionar.Humano,dampiro,Moroi...nadadeucerto.Haviaumdesesperoterrívelnavozdelee,apesardomeumedo,umapartedemim

queriaajudá-lo...masestavaperdida,semesperança.—Lee,sintomuito.Nãoestouentendendo.Porquevocêprecisava“tentaroutros”?

Porfavor,largueestafacaevamosconversar.Talvezeupossaajudar.Elemelançouumsorrisotriste.—Epode.Maseunãoqueriaquefossevocê.QueriaquefosseKeith.Elecertamente

merecemorrermaisdoquevocê.EJill...bom,Jillgostadevocê.Euqueriarespeitarissoepoupá-la.—Aindaépossívelfazerisso—eudisse.—Ela...elanãoiaquererquevocêfizesse

isso.Elaficariatristesesoubesse...Derepente,Leeestavaemcimademimemeprendiaàcadeiracomafacanomeu

pescoço.—Você não sabe! — exclamou. — Ela não sabe. Mas vai saber, e vai ficar

agradecida. Ela vai me agradecer, e nós dois seremos jovens e ficaremos juntos parasempre.Vocêé aminhachance.Osoutrosnãoderamcerto,masvocê... elepassou alâminada facapertodaminha tatuagem.—Vocêéespecial.Seusangueémágico.Euprecisodeumalquimista,eagoravocêéaminhaúnicachance.—Deque...chance...vocêestáfalando?—eusoltei,semfôlego.

—Minhachancedeserimortal!—eleexclamou.—MeuDeus,Sydney.Vocênemé capaz de imaginar. Como é ter isso nas mãos e depois perder.Ter força e poderinfinitos...nãoenvelhecer, saberquevocêvaiviverpara sempre.Eentão,acabou!Foitiradodemim.Sealgumdiaeuencontrarousuáriodeespíritofilhodamãequefezissocomigo, eumato.Mato ebeboo sanguedele já que,depois destanoite, voltarei a sercompleto.Voumeredespertar.Umcalafriopercorreuaminhaespinha.À luzde tudo, seriadesepensarqueeu já

estava no nívelmáximo de terror.Que nada.Acontece que ainda haviamais por vir.Porque, com essas palavras, comecei a formar uma teoria frágil a respeito do que elepoderiaestarfalando.“Despertado”eraumtermousadonomundodosvampirosapenassobcircunstânciasmuitoespeciais.—Você era um Strigoi antes — sussurrei, sem nem mesmo ter certeza se eu

mesmaacreditavanoquedizia.Elerecuouumpoucocomosolhoscinzentosarregaladosecomumbrilhofebril.—Anteseueraumdeus!Evouvoltaraser.Issoeujuro.Sintomuito,deverdade.

SintomuitoporservocêenãoKeith.SintomuitoporvocêterdescobertoarespeitodeKelly. Se isso não tivesse acontecido, eu podia procurar outro alquimista em LosAngeles. Mas você não percebe?Agora eu não tenho outra alternativa... — a facacontinuava na minha garganta. — Eu preciso do seu sangue. Não posso continuarassim...nãocomoumMoroimortal.Precisovoltaraseroqueeraantes.Alguémbateunaporta.—Nãodênenhumpio—Leesibilou.—Apessoavaidesistir.Segundosdepois,abatidaserepetiu,seguidapor:— Sage, eu sei que você está aí. Eu vi o seu carro. Sei que você está irada, mas

precisameescutar.Ding-dong,adistraçãoestáchamando.— Adrian! — eu berrei e levantei da cadeira em um salto. Não fiz nenhuma

tentativadedesarmarLee.Omeuúnicoobjetivoeraasegurança.Euoempurreiantesquepudesse reagir e fui nadireçãodaporta,mas ele estavamais preparadodoque euesperava.Elepulouparacimademimemejogounochão;a facapegounomeubraçoquandoeucaí.Griteidedorquandosentiapontadalâminaentrarnaminhapele.Eumedebaticontraele,masissosóserviuparaafacaseenterraraindamais.A porta se abriu de repente e eu fiquei feliz por tê-la deixado destrancada após

convidarLeeparaentrar.Adrianavançouesedeteveaoabsorveracena.—Nãoseaproxime—Leeavisou,eencostoua facanaminhagargantamaisuma

vez.Dava para sentir o sangue quente escorrendo domeu braço.—Feche a porta. Eentão...sente-seecoloqueasmãosatrásdacabeça.MatoSydneysenãofizeristo.— Ele vai me matar de qualquer jeito... ahh! — as minhas palavras foram

interrompidasquandoafacaperfurouaminhapele,nãoosuficienteparamematar,mas

simparacausardor.—Certo, certo—Adriandisse e ergueu asmãos.Ele pareciamais sóbrio emais

sério do que eu jamais tinha visto.Quando se sentou no chão, com asmãos atrás dacabeça conforme tinha sido ordenado, ele disse em tom suave:— Lee, não sei o quevocêestáfazendo,masprecisapararcomissoagora,antesquevámaislonge.Vocênãotemumaarmadefogo.Nãovaitercomosegurarnósdoisaquisócomumafaca.— Já deu certo antes—Lee disse.Ainda sem afastar a faca demim, ele enfiou a

outramãonobolsodocasacoepegouumpardealgemas.Aquilofoiinesperado.JogouparaAdrian.—Coloque issonospulsos.—ComoAdriannãoreagiu imediatamente,Leeforçouafacaatéeuberrar.—Agora!Adriancolocouasalgemas.— Eram para ela, mas você ter vindo pode ser uma coisa boa— Lee disse.—

Provavelmentetereifomequandoforredespertado.Adrianarqueouumasobrancelha.—Redespertado?— Ele era Strigoi — consegui dizer. — É ele que anda matando as garotas...

cortandoagargantadelas...paratentarvoltaraserumdeles.—Fiquequieta—Leedisse,irritado.— Por que você cortava a garganta delas? —Adrian perguntou. —Você tem

caninos.—Porquenãofuncionava!Euusei, sim,osmeuscaninos.Bebiosanguedelas...mas

nãodeucerto.Nãovolteiameredespertar.Então,preciseicobrirosmeusrastros.Osguardiões sabem distinguir as mordidas de Moroi e de Strigoi. De todo modo, euprecisava da faca para dominá-las. Por isso, cortei o pescoço delas para esconder orastro...fazercomqueelespensassemqueeueraumStrigoimaluco.Ouumcaçadordevampiros.DavaparaverAdrianprocessandoaquilotudo.Nãoseiseeleacreditouounão,mas,

detodoomodo,eletinhafacilidadeparaembarcaremideiasmalucas.—Seasoutrasnãofuncionaram,entãoSydneytambémnãovaifuncionar.— Elatemque funcionar—Leedisse em tom fervoroso.Eleme virou, demodo

quefiqueivoltadacomabarrigaparacima,aindapresapelopesodocorpodele,maiordoqueomeu.—Osanguedelaéespecial.Euseiqueé.Esenãodercerto...vouprocurarajuda.

Vouprocurarajudaparameredespertar,eentãovoudespertarJillparapodermosficarjuntosparasempre.Adrianselevantouemumsalto,cheiodeumafúriasurpreendente.—Jill?Nãofaçanadacontraela!Nemtoquenela!—Sente-se—Leevociferou.Adrianobedeceu.—Jamaisfarianadademalcontra

ela. Euamo Jill. E é por isso que voume assegurar de que ela permaneça exatamente

comoé.Parasempre.Voudespertá-ladepoisquemeredespertar.Tentei olhar nos olhos deAdrian, imaginando se seria capaz de transmitir alguma

mensagem silenciosa. Se nós dois atacássemos Lee juntos — mesmo com Adrianalgemado—,talveztivéssemosumachancededominá-lo.Leeestavaapontoderasgaraminhagarganta,eutinhacerteza,naesperançadeque...oquê?DequepudessebeberomeusangueesetornarStrigoi?—Lee—eudissecomavozbaixinha.Movimentodemaisnaminhagargantafaria

comquea facamecortasse.—Nãodeucertocomasoutrasgarotas.Nãoachoqueofatodeeuseralquimista façadiferença.Seja láoqueovampirousuáriodeespírito fezpara salvar você... agora não dámais para voltar atrás.Não importa de quem seja osanguequevocêbeber.—Elenãomesalvou!—Leevociferou.—Eleacaboucomaminhavida.Fazseis

anosqueeutentorecuperá-la.Euestavaquaseprontoparaoúltimorecurso...atévocêeKeithchegarem.Eeuaindatenhoessaúltimaopção.Masnãoqueroquechegueaisso.Pelobemdetodosnós.Eunãoeraoúltimorecurso?Sinceramente,nãoconseguiavercomoqualqueroutro

plano alternativo poderia ser pior para mim. Nesse ínterim,Adrian continuava semolhar na minha direção, coisa que me deixou frustrada— até eu perceber o que eleestavatentandofazer.—Issoéumerro—eledisseaLee.—Olheparamimedigaquevocêrealmente

querfazerissocomela.Algemado ou não,Adrian não tinha a velocidade nem a força de um dampiro,

alguémquepoderiadarumpuloedesarmarLeeantesqueafacacausassedanos.Adriantambémnão tinhaopoderdeusarumelemento físico, comoo fogo, algoquepoderiaser usado como arma concreta.No entanto,Adrian tinha a habilidade de compelir.Acoação era uma habilidade inata a todos os vampiros,mas para os que controlavam oespírito a aptidão era especial. Infelizmente, funcionava melhor quando se olhava nosolhos, e Lee não estava cooperando. Sua atenção estava toda emmim, bloqueando asiniciativasdeAdrian.—Tomei minha decisão há muito tempo — disse Lee. Com a mão livre, ele

molhou os dedos no ferimento domeu braço que sangrava. Levou os dedos aos lábioscomumaexpressãoderesignaçãosombrianorosto.Elelambeuosanguedamão,coisaque não me pareceu nem de longe tão nojenta quanto teria parecido sob outrascircunstâncias. Com tanta coisa acontecendo naquele momento, sinceramente não eramaisterríveldoqueorestoeeusimplesmentedeixeipassar.Uma expressão de choque e surpresa total passou pelo rosto de Lee, que logo se

transformouemnojo.—Não— ele disse sem fôlego. Repetiu omovimento, passandomais sangue nos

dedoselambendo.—Temalgumacoisa...temalgumacoisaerrada...

Ele levou a boca até omeupescoço e eu choraminguei, temendoo inevitável.Masnãoforamosdentesdelequeeusenti,esimapenasumroçarbemdelevedeseuslábiosedalínguanoferimentoqueeletinhacausado,comoalgumaespéciedebeijoperverso.Elerecuoudesupetãoimediatamenteemeencarou,horrorizado.—Oquehádeerradocomvocê?—sussurrou.—Oquehádeerradocomoseu

sangue? — Ele fez a terceira tentativa de experimentar o meu sangue, mas nãoconseguiu terminar. Ele fez uma careta.—Eu não consigo.Não consigo engolir nemumpouco.Porquê?NemAdriannemeu sabíamos responder.Lee ficoumurchocomaderrotadurante

um momento, e eu de repente ousei pensar que ele poderia simplesmente desistir ecolocarfimàquelaloucura.Elerespiroufundoeendireitouocorpo,comdeterminaçãorenovada nos olhos. Fiquei tensa, esperando ele dizer que agora iria tentar beber osangue deAdrian, apesar do fato de que uma Moroi — duas, contando Melody —pareciaterfeitopartedocardápiodeseusfracassosanteriores.Emvezdisso,Lee tirouo celulardobolso, semafastar a facadaminhagarganta e

impedindo que eu tentasse qualquer tipo de fuga. Ele digitou um número e ficouesperandoatenderem.— Dawn? É Lee. É... é, eu sei. Bom, tenho dois para você, prontinhos, só

esperando.UmMoroi e uma alquimista.Não... não é o velho. Sim. Sim, ainda estãovivos.Temqueserhojeànoite.Elessabemsobremim.Podeficarcomeles...massabequal é o acordo.Você sabe o que eu quero... isso.Ã-hã.Certo.—Lee disse o nossoendereço e desligou.Um sorriso de satisfação cruzou seu rosto.—Nós temos sorte.ElasestãonolestedeLosAngeles,entãonãovãodemorarmuitoparachegaratéaqui...principalmenteporquenãoestãomuitopreocupadascomoslimitesdevelocidade.—Quemsão“elas”?—Adrianperguntou.—Eumelembrodevocêligarparauma

tal deDawn emLosAngeles,mas achei que fosse algumadas suas amigas gostosas dafaculdade.—Sãoelasquefazemonossodestino—Leerespondeuemtomsonhador.—Quecoisadeliciosamenteenigmáticaesemsentido—Adrianbalbuciou.LeeolhoufeioeentãoexaminouAdriancomatenção.—Tireagravata.Percebiqueeu tinhapassado tanto tempocomAdrianqueestavaprontapara fazer

algumcomentáriodo tipo:“Ah, fico felizemsaberqueas coisas jánãoestãomais tãoformais”.Aparentemente, a situação era perigosa o suficiente — e a faca na minhagargantaproblemáticaosuficiente—paraAdriannãoretrucar.Eletinhaalgemadoospulsos na frente do corpo e, depois de algumas manobras complexas com as mãos,finalmenteconseguiusoltaragravataquetinhavestidoparaodesfiledeJill.EleajogouparaLee.— Cuidado —Adrian falou. — É de seda. — No final das contas, não estava

completamentedesprovidodesarcasmo.Leemerolouparaqueeu ficassedebarrigaparabaixo;eleme livrouda faca,mas

não me deu tempo para reagir. Com habilidade notável, rapidamente amarrou asminhasmãos nas costas com a gravata deAdrian. Para isso, precisou segurar e puxarumpoucoosmeusbraços,oquedoíabastantedepoisda facada.Eleme largouquandoterminouepermitiuquemesentassecautelosamente,massódetentarforçaragravatajápercebiquenãoconseguiriadesataraquelesnóstãocedo.Inquieta,fiquei imaginandoquantas garotas ele tinha amarrado antes naquela sua tentativa doentia de se tornarStrigoi.Um silêncio estranho e constrangedor recaiu enquanto esperávamos pelas “pessoas

que fazemodestino” chegarem.Osminutos iampassandoe eupensava, enlouquecida,noquefazer.Quantotemponóstínhamosatéqueaspessoasparaquemeletinhaligadochegassem?Pelo que ele tinha dito, imaginava que seria quase uma hora. Sentindo-mecorajosa,finalmentetenteimecomunicarcomAdrian,maisumavezesperandoquenóspudéssemos combinar um ataque conjunto a Lee disfarçadamente— apesar de a nossapossibilidadedesucessoterdiminuídodemaiscomnósdoisdemãosamarradas.—Comofoiquevocêchegouatéaqui?—perguntei.Oolhar deAdrian estava fixado emLee, ainda esperançoso por contato direto dos

olhos,maseledeuumaolhadelarápidaesecaparamim.—Damesmamaneiraqueeuvouatodolugar,Sage.Deônibus.—Porquê?—Porqueeunãotenhocarro.—Adrian! — Impressionante. Mesmo com a nossa vida em perigo, ele ainda

conseguiameenfurecer.EledeudeombrosevoltouaseconcentraremLee,apesardeaspalavrasobviamente

seremparamim.—Para pedir desculpas. Porque eu fui um grande imbecil com você no desfile da

ChavedeCadeia.Poucodepoisdevocê sair,percebique tinhaque ir atrás.—Ele fezuma pausa eloquente e olhou ao redor. —Acho que nenhuma boa ação passa semcastigo.De repente me senti péssima. O fato de Lee ter se transformado em psicopata

certamente não era minha culpa, mas fiquei incomodada por Adrian estar naquelasituaçãoporteridopedirdesculpasparamim.—Tudo bem.Você não foi, hum, assim tão mau— eu disse de um jeito meio

ridículo,naesperançadefazê-losesentirmelhor.Umsorrisinhobrincounoslábiosdele.—Vocêéumapéssimamentirosa,Sage,mas,mesmoassim,estoucomovidopela

suatentativademeconsolar.Dounotadezparaoseuesforço.— É, bom... o que aconteceu lá parece meio pequeno à luz da situação atual—

balbuciei.—Éfácilperdoar.AtestadeLeeiaficandomaisfranzidaàmedidaquenosescutava.—Osoutrossabemquevocêsestãoaqui?—eleperguntouaAdrian.—Não—Adrianrespondeu.—EudissequeiavoltarparaacasadeClarence.Nãosabiaseeleestavamentindoounão.Porummomento,nãoacheiquefossefazer

diferença.Osoutros tinhamouvidoquando eudisse que ia para lá,mas nenhumdelesteriarazãoparairatrásdenós.Nenhumarazãoanãoserolaço.PrendiarespiraçãoeolheinosolhosdeAdrian.Elevirouorosto,talvezcommedo

de entregaroque eu tinha acabadodeperceber.Não importava se a turma toda sabiaondeeuestava.SeJillestivesseconectadaaAdrian,elasaberiaagora.Esaberiaquenósestávamos encrencados. Mas isso era partir do princípio de que aquele era um dosmomentos em que ela era capaz de enxergar dentro da mente dele. Os dois tinhamadmitido que o laço era inconsistente e que emoções fortes podiam causar a conexão.Bom,seissonãocontassecomosituaçãodeemoçãoforte,nãoseioquecontaria.Mesmoque ela se desse conta do que estava acontecendo, haviamuitas questões em jogo. Jillteria que chegar até ali, e não poderia fazer isso sozinha. Ligar para a polícia seria ométodo mais rápido, mas ela podia hesitar se soubesse que era caso de vampiro. Elaprecisaria de Eddie. Quanto tempo eles demorariam se já tivessem voltado para oalojamento?Eunãotinha ideia.Aúnicacoisaqueeusabiaeraqueprecisávamoscontinuarvivos

porque,seconseguíssemos,Jill iriamandarajudaparanósdeumjeitooudeoutro.Sóqueeunãosabiamaisquaiseramnossaschancesdesobrevivência.Adrianeeuestávamosconfinados,encurraladoscomumsujeitoquenãotinhamedodematarcomumafacaeque estava desesperado para voltar a ser Strigoi. Essa era uma péssima combinação, eameaçavapiorar...— Quem está vindo para cá, Lee? — perguntei. — Para quem você ligou? —

Como ele não respondeu, tirei a próxima conclusão lógica. — São Strigoi. VocêchamouStrigoiparaviraqui.—Éoúnicomodo—eledisse,enquantojogavaafacadeumamãoparaaoutra.—

Aúnicamaneiraque restou.Sintomuito.Nãopossomais ficardesse jeito.Nãopossomaissermortal.Jápassoutempodemais.Claro. Os Moroi podiam se tornar Strigoi de duas maneiras. Uma era beber o

sangue de outra pessoa e matá-la no processo. Lee tinha tentado isso, usando todacombinaçãodevítimasqueconseguiu,efracassou.Issoodeixavacomumaúltimaopçãodesesperada: a conversão por meio de outro Strigoi. Normalmente, isso acontecia àforça, quando um Strigoi matava alguém e depois dava seu próprio sangue para avítima. Era o que Lee queria que fizessem com ele, e em troca daria nossas vidas aosStrigoiqueiriamconvertê-lo.EdepoiselequeriafazeromesmocomJill,motivadopor

algumtipodeamorequivocado...—Masnãovaleapena—eudisse,comodesesperoeomedoamedarcoragem.

—Nãovaleapenaopreçodematarinocentesecolocarasuaalmaemperigo.OolhardeLee recaiu sobremime sua expressãode indiferença era tão gélida que

tivedificuldadepara assimilar que a pessoa àminha frente era amesmapara quemeusorriacomindulgênciaenquantopaqueravaJill.— Não vale, Sydney? Como é que você pode saber?Você se privou de prazer a

maiorpartedavida.Vocêédistantedosoutros.Vocênuncasepermitiuseregoísta,eolhesóondeissoafezparar.Asua“moral”fezcomqueasuavidafossecurtaeaustera.Podemedizeragora,quandoestáprestesamorrer,quenãogostariadetersepermitidoumpoucomaisdediversão?—Masaalmaimortal...—Quediferença isso fazparavocê?—ele inquiriu.—Porque se incomodarem

viver uma vida triste, toda regulada, nestemundo, na esperança de que talvez a nossaalmaváparaalgumdomíniocelestial, seeupossoassumirocontroleagora...garantirquevouviverparasemprenestemundo,comtodososseusprazeres,forteejovemparasempre?Issoéreal.Issoéalgoemquepossodepositaraminhafé.—Éerrado—eudisse.—Nãovaleapena.—Vocênãodiria issose tivessepassadopeloqueeupassei.Se tivesse sidoStrigoi,

tambémnãoiaquererperderissonunca.—Como foiquevocêperdeu?—Adrianperguntou.—Qualvampirousuáriodo

espíritosalvouvocê?Leedeuumagargalhadadedesdém.—Vocêquerdizerqualme roubou.Nãosei.Tudoaconteceutãorápido.Masassim

queeuencontraressevampiro...ahh!Um anuário não é a melhor das armas, principalmente se for do tamanho do de

Amberwood,masemumasituaçãodesesperadora—edesurpresa—serve.Eu tinha percebido antes que não ia conseguir soltar os nós da gravata rápido. Era

verdade.Demoreitodoessetempo,masconsegui.Poralgummotivo,darnóseraumahabilidadeútilnocurrículodosalquimistas,queeutinhatreinadonainfânciacomomeupai.AssimquemelivreidagravatadeAdrian,estendiobraçoepegueiaprimeiracoisaqueconsegui:oanuáriodopenúltimoanodeKelly.Eume levanteiemumpuloebaticomtudonacabeçadeLee.Eleseencolheucomoimpactoelargouafacanoprocesso,eeuaproveiteiaoportunidadeparadispararatéooutroladodasalaeagarrarobraçodeAdrian.Elenãoprecisoudaminhaajudaejáestavatentandoselevantar.Não fomos muito longe antes de Lee nos alcançar.A faca tinha escorregado para

algumlugarqueninguémviu,eeleconfiavaapenasnaprópriaforça.Elemearrastoueme separou deAdrian, com uma mão no meu braço machucado e a outra no meucabelo,mefazendotropeçar.AdriansaiuatrásdenósefezoquepôdeparaacertarLee,

apesar das mãos algemadas. Nós não éramos a força de luta mais eficiente, mas sepudéssemossegurarLeeaindaqueporummomento,haviachancedeconseguirmossairdali.Lee estava distraído com nós dois, tentando lutar conosco e nos afastar aomesmo

tempo.Semqueeumedesseconta, a auladeEddiemevoltouàcabeça, aparte sobrecomoum socobemdado era capaz de causar danos sérios a alguémmais forte doquevocê.Avalieia situaçãoemsegundosechegueiàconclusãodeque tinhaumaabertura.FecheiamãodojeitoqueEddietinhameensinadonaquelaaularápidaeposicioneimeucorpodemaneiraadirigiropesodemaneiraeficiente.Deiogolpe.—Ai!Berreidedorquandomeupunhofechadobateunele.Seessaeraamaneira“segura”

de dar um soco, não era capaz de imaginar quanto um golpe desleixado devia doer.Felizmente,parecequecausouomesmoníveldedor—senãomaior—aLee.Elecaiuparatrásebateunapoltronareclináveldeumjeitoqueperdeuoequilíbrioedesabounochão. Fiquei de queixo caído com o que tinha feito, mas Adrian continuava emmovimento.Elemeempurrouparaaporta,aproveitandoadesorientaçãomomentâneadeLee.—Vamoslá,Sage.Éagora.Nós corremos até a porta, prontos para fugir enquanto Lee gritava palavrões para

nós.Estendiamãoparaamaçaneta,masaportaseabriuantesqueeuencostassenela.EduasStrigoientraramnasala.

25

Eu tinha tirado sarro deKeith quandochegamos aPalmSprings,por ficarparalisadopertodeumMoroi.Mas,aliparada,caraacaracomumpesadelo,eusoubeexatamentecomoelese sentiu.Eunão tinhaomenordireitode julgar alguémporperder todoo raciocíniológicoaoseconfrontarcomseusmaioresmedos.Dito isso, seKeithestivesseali,achoqueele iriaentenderporqueosMoroi jánão

eram lá grande coisa para mim. Porque em comparação com os Strigoi... Bom, derepente as pequenas diferenças entre humanos e Moroi se tornavam insignificantes.Apenasumadiferençaimportava:adiferençaentreosvivoseosmortos.Eraessaalinhaquenosdividia,eeueAdriannosencontrávamosjuntosefirmesdeumladodessalinha—defrenteparaasqueseencontravamdooutro.Já tinha visto Strigoi antes. Na época, nãome senti imediatamente ameaçada por

eles.Além domais, estava comRose eDimitri àmão, prontos parame proteger. Eagora?Nãohavianinguémaquiparanossalvar.Sónósmesmos.Elas eram apenas duas, mas poderiam ser duzentas. Os Strigoi operavam em um

nível tão diferente do restante de nós que não era necessáriomuitos deles para fazer abalança pender.As duas mulheres deveriam estar na casa dos vinte anos quando setornaram Strigoi. Há quanto tempo isso tinha sido, não sabia dizer. Lee tinha sepreocupadomuitoemfalarrepetidamentearespeitodecomoserStrigoisignificavaser“jovem para sempre”. Mas, ao olhar para aqueles dois monstros, eu realmente nãopensava assim. Claro que elas tinham a aparência superficial da juventude, mas eramanchada pormaldade e podridão.A pele delas podia não ter rugas, mas era de umbrancodoentio,muitomaisbrancodoqueadequalquerMoroi.Osolhosavermelhadosque nos fitavam não faiscavam com vida ou energia, mas sim com uma espécie dereanimaçãoprofana.Nãoeramexatamentepessoas.Elasnãoeramnaturais.—Que amor— disse uma, loira de cabelo curtinho. Os traços dela me faziam

achar que tinha sido dampira ou humana antes de ser transformada.Ela nos olhava da

mesmamaneira como eu costumava ver o gato daminha família olhandopassarinhos.—Eexatamentedeacordocomadescrição.—Eles são tãããão lindos—entoouaoutra, comumsorriso lascivono rosto. Sua

alturadiziaqueantestinhasidoMoroi.—Nãoseiqualdosdoiseuqueroprimeiro.Aloiraolhoufeioparaela.—Nósvamosdividir.— Igual da última vez— a outra concordou e jogou uma juba de cabelos pretos

encaracoladosporcimadoombro.—Não—aprimeiradisse.—Daúltimavez,vocêmatouosdois.Aquilonãofoi

dividir.—Maseudeixeivocêsealimentardelesdepois.Antes que a outra pudesse retrucar, Lee se recompôs de repente e cambaleou até

ondeaStrigoiloiraestava.— Esperem, esperem. Dawn.Você prometeu. Prometeu que iria me despertar

primeiro,antesdefazerqualquercoisa.AsduasStrigoivoltaramaatençãoparaLee.Euaindaestavaparalisada, incapazde

memexer ou de realmente reagir enquanto estava tão próxima daquelas criaturas doinferno.Mas,dealgummodo,atravésdoterrordensoeesmagadorquemerodeava,euainda assim consegui sentir uma pena inesperada de Lee. Havia um pouco de ódio alitambém,éclaro,levandoemcontaasituação.Mas,namaiorparte,eusentiaumapenaenormedealguémquerealmenteacreditavaquesuavidanãotinhasentidoamenosquesacrificasse sua alma pela imortalidade vazia. Não só isso, eu tinha pena dele porrealmente pensar que poderia confiar nessas criaturas para lhe darem o que queria.Porque,aoexaminá-las,ficouperfeitamenteclaroparamimqueelasestavamdecidindoseiamounãotornaraquiloumarefeiçãodetrêspratos.Lee,eudesconfiava,eraoúnicoquenãosedavaconta.—Porfavor—eledisse.—Vocêprometeu.Mesalve.Mefaçavoltaraseroque

euera.Tambémnãopudedeixardenotarapequenamanchaavermelhadano lugaremque

euo tinhaacertado.Eumepermiti sentirumpouquinhodeorgulhopor isso,masnãoera convencida o suficiente para achar que tivesse qualquer habilidade de luta digna denota para conseguir escapar daquela situação só com a força física.As Strigoi estavampertodemais,enóstínhamosmuitopoucassaídas.—Eu sei onde temmais—ele completou, começando a parecer pouco à vontade

por suas“salvadoras” não estarem agindo imediatamente para realizar seus sonhos.—Uméjovem...umdampiro.—Faz umbom tempoque eunão tenhoumdampiro—disse a Strigoi de cabelo

cacheado,quasedesejosa.Dawnsuspirou.

—Naverdadeeunãomeimporto,Jacqueline.Sequiserdespertá-lo,váemfrente.Eusóqueroestesdois.Elenãoimportaparamim.—Entãoeuficocomodampirosóparamim—Jacquelineavisou.—Tudobem,tudobem—Dawnfalou.—Sóandelogo.Leeficoutãoradiante,tãocontente...eraumacoisarepugnantedesever.—Obrigado—eledisse.—Muitoobrigadomesmo!Faztantotempoqueeuquero

issoquenãoacreditoquevai...ahh!Jacquelinefoitãorápidaquemalviquandoaconteceu.Emummomentoelaestavaà

portae,noseguinte,tinhaprendidoLeecontraacadeirareclinável.Leesoltouumgritosemiabafadoquando elamordeuo pescoçodele, umgrito que logo se aquietou.Dawnfechouaportaenosfezavançar.Eumeencolhitodaquandoelatocouemmim.—Bom—eladisse,divertida.—Vamosnosaproximarparavermelhor.NemAdriannemeurespondemos.Nóssimplesmenteavançamosmaispelasala.Eu

deiumaolhadanele,masnãopudepercebermuitacoisa.Eleeratãobomemesconderseus verdadeiros sentimentos de maneira geral que eu acho que não devia mesurpreendercomsuacapacidadedemascararterrorabjetocomamesmafacilidade.Elenãome deu incentivo nem com a expressão nem com palavras, coisa que na verdadeconsiderei bem adequada. Porque, realmente, eu não estava vendo nenhum final felizparaaquelasituação.De perto, forçada a assistir ao ataque de Jacqueline, eu agora via a expressão de

enlevo que se instalara no rosto de Lee. Era a coisa mais horrível que eu já tinhapresenciado.Minha vontade era de fechar os olhos bem apertados ou de virar para ooutro lado, mas alguma força maior do que eu me fazia olhar fixamente para aqueleespetáculohorripilante.Eununcatinhavistonenhumvampirosealimentar,nemMoroinemStrigoi,masagoraeuentendiaporque fornecedorescomoDorothyeramcapazesdeseentregardetãobomgradoaseuestilodevida.EndorfinasestavamsendoinjetadasnacorrentesanguíneadeLee,tãofortesqueocegavamparaofatodequesuavidaestavasendosugada.Emvezdisso,eleexistiaemumestadodeêxtase,perdidoemumtorporquímico.OutalvezestivesseapenaspensandoemcomoseriafelizquandovoltasseaserStrigoi, se fosse possível manter qualquer tipo de pensamento consciente sob aquelascircunstâncias.PerdianoçãodequantotempodemorouparatodoosanguedeLeesersugado.Cada

momento era agonizanteparamim, como se eu estivesse sentindo a dor pela qualLeedeviaestarpassando.Oprocessopareceudemorarumaeternidadee,aindaassim,haviaumasensaçãoesquisitadevelocidadenele.Pareciaerradoocorpodealguémserdrenadode sangue em tão pouco tempo. Jacqueline bebia sem parar, só fez uma pausa paraobservar:—Osanguedelenãoétãobomquantoeuachavaqueseria.— Então pare — Dawn sugeriu. Ela estava começando a parecer entediada. —

Deixequeelemorraedividaestesdoisaquicomigo.Jacqueline realmente parecia estar considerando a ideia,mais uma vezme fazendo

pensaremcomoLee tinha sidoboboemdepositar suaconfiançanaquelasduas.Depoisdealgunsminutos,eladeudeombros.—Estouquaseacabando.Erealmentequeroqueelemetragaaqueledampiro.Jacquelinevoltouabeber,mas,comotinhadito,nãodemoroumuito.Aestaaltura,

Lee estava quase tão pálido quanto os Strigoi, e sua pele tinha adquirido uma texturaesticadaeestranha.Agoraeleestavaperfeitamente imóvel.Seurostopareciaparalisadoemumsorriso

que era tanto choque quanto êxtase. Jacqueline ergueu o rosto e limpou a boca,examinando sua vítima com prazer. Ela então ergueu amanga da camisa e pousou asunhasnopulso.Masantesquerasgasseaprópriapele,avistoualgumacoisa.—Ah,assimvaifazerbemmenosbagunça—elaseafastoueseabaixouparapegar

a faca de Lee. Tinha escorregado para baixo do sofazinho durante nosso embate.Jacqueline a pegou e, sem esforço nenhum, cortou o próprio pulso; o sangue bemvermelho começou a escorrer. Parte do meu cérebro não achava que o sangue delesdeviasertãoparecidocomomeu.Deviaserpreto.Ouácido.ElacolocouopulsosanguinolentonabocadeLeee inclinouacabeçadeleparatrás,

paraqueagravidadepudesseajudaro fluxo.Cadahorrorqueeutestemunhavanaquelanoite era pior doqueo anterior.Amorte era terrível—mas também fazia parte danatureza.Aquilo?Aquilo não fazia parte do plano da natureza. Eu estava prestes atestemunharomaiorpecadodomundo,acorrupçãodaalmapormeiodamagianegrapara reanimarosmortos.Aquilo fazia eume sentir imunda, e desejei poder fugir.Eunão queria ver. Eu não queria ver um sujeito que eu cheguei a considerar quase umamigoderepenteseerguercomoumaespéciedeperversãodanatureza.Umtoquenaminhamãomesobressaltou.EraAdrian.SeusolhosestavamsobreLee

e Jacqueline, mas ele tinha pegado na minha mão e apertado, apesar de ainda estaralgemado. Fiquei surpresa com o calor de sua pele.Apesar de eu saber que osMoroieramtãovivosquantoeueportantotinhamosanguetãoquentequantoomeu,medosirracionaissempremefaziampensarqueelesseriamfrios.Igualmentesurpreendentefoio confortoe a conexão repentinaque senti comaquele toque.Nãoerao tipode toquequedizia:Olhe,eutenhoumplano,porisso,aguentefirme,porquenósvamosescapardessa.Eramaisotipodetoquequesimplesmentedizia: Vocênãoestásozinha .Essaerarealmenteaúnicacoisaqueelepodiaoferecer.E,naquelemomento,foisuficiente.Então,umacoisaestranhaaconteceu.Oumelhor,nãoaconteceu.OsanguedeJacquelinesederramavaemumfluxocontínuonabocadeLee,eapesar

de não termos muitos casos documentados de conversões de Strigoi, eu sabiabasicamentecomofuncionavam.OsanguedavítimaeradrenadoedepoisoStrigoiquetinhamatado a pessoa dava seu sangue para omorto.Eu não sabia exatamente quanto

tempodemoravaparafuncionar—certamentenãoexigiatodoosanguedoStrigoi—,mas,acertaaltura,Leedeviacomeçaraseagitarealevantarcomoummorto-vivo.Aexpressão fria e arrogante de Jacqueline começou a se transformar em curiosidade e,então,confusão.ElaolhouparaDawncomardequemnãoestavaentendendonada.—Porqueestádemorandotanto?—Dawnperguntou.—Nãosei—Jacquelinerespondeu,esevirouparaLeemaisumavez.Comamão

livre,elacutucouoombrodeLee,comoseissopudesseacordá-lo.Nãoaconteceunada.—Vocênuncafezistoantes?—Dawnperguntou.—Claroquefiz—Jacquelinerespondeu,irritada.Nãodemorou tantoassim,nemde longe.Ele jádeviaestar acordado, andandopor

aí.Háalgoerrado.Eume lembrei das palavras de Lee, quando ele contou que todas as suas tentativas

desesperadasaotirarvidasinocentesnãotinhamfeitocomqueelevoltasseaserStrigoi.Eunãosabiamuitoarespeitodoespírito—emenosaindaarespeitoderestaurarumStrigoi—,masalgomediziaquenãoexistiaforçanaterracapazdefazerLeevoltaraserStrigoi.Maisumlongominutosepassouenquantoobservávamoseesperávamos.Finalmente,

desgostosa, Jacqueline se afastou da poltrona reclinável e ajeitou a manga da camisa.FicouolhandocomraivaparaocorpoimóveldeLee.—Algoestáerrado—elarepetiu.—Eeunãoquerodesperdiçarmaissanguepara

descobriroqueé.Alémdomais,meucortejáestásarando.NãohavianadaqueeuquisessemaisdoqueDawneJacquelineesqueceremaminha

existência, mas as palavras seguintes escaparam da minha boca antes que eu pudessesegurá-las.Acientistaemmimestavaenvolvidademaisemumarevelação.—Elefoirestaurado...eissooafetoudemaneirapermanente.Amagiadoespírito

deixoualgumaespéciedemarca,eagoraelenãopodevoltarasertransformado.AsduasStrigoiolharamparamim.Eumeencolhitodasobaquelesolhosvermelhos.—Eununcaacrediteiemnenhumadessashistóriasdeespírito—Dawndisse.Jacqueline,noentanto,continuavaclaramenteconfusacomseufracasso.—Mashaviaalgodeerradocomele.Nãoseiexplicar...masfoiotempotodo.Ele

nãopareciacerto.Elenãotinhaogostocerto.—Esqueça—Dawndisse.—Eleteveachancedele.Recebeuoquequeria,eagora

vouseguiremfrente.Viaminhamortenosolhosdelaetenteitocaraminhacruz.—Deusmeproteja—disse,bemquandoelaseprojetouparaafrente.Contra todas as probabilidades, Adrian estava pronto para detê-la — ou, pelo

menos,paratentar.Naverdade,elesósecolocounafrentedela.Nãoteveavelocidadenemoreflexonecessáriosparabloqueá-lacomeficiência,eestavaaindamaisatrapalhadoporcausadasmãosalgemadas.Achoqueelesópercebeuoqueaconteceriaemseguida,

que ela ia me atacar, e se colocou na minha frente para evitar o bote, em algumatentativanobre,porémmalsucedida,demeproteger.Ecomofoimalsucedida.Comummovimentoágileaparentementesemesforço,ela

oempurroudeladoeomandouparaomeiodasala.Fiqueisemfôlego.Elecaiunochãoeeucomeceiaberrar.Derepente,sentiumadoragudanagarganta.Semparar,Dawnhaviaprontamentemeagarradoemeerguidonoarparaganharacessoaomeupescoço.Eu balbucieimais uma oração frenética quando a dor se espalhou,mas, em segundos,tantoarezaquantoadordesapareceramdomeucérebro.Tinhamsidosubstituídasporuma sensação doce, tão doce, de felicidade e enlevo e encantamento. Eu não tinhapensamentos, a não ser de que eu de repente existia no estado mais feliz e maisesplêndido que se podia imaginar. Eu queria mais. Mais, mais, mais. Eu queria meafogarnaquilo,meesquecerdemimmesma,esquecertudoaomeuredor...— Ugh— exclamei quando bati no chão de maneira súbita e inesperada.Ainda

naquelanévoadeêxtase,eunãosentiador.Porenquanto.Com a mesma rapidez que tinha me agarrado, Dawn tinha me soltado e me

empurradoparalonge.Porinstinto,estendiobraçoparanãocair,masnãoconseguimesegurar.Euestava fracaedesorientadademaisemeestateleidemaneiranadagraciosano carpete.OsdedosdeDawn tocavam seus lábios comuma expressãodeultraje quecontorciaaindamaisseustraçosjápavorosos.—Oquefoiisso?—elainquiriu.Meucérebro aindanãoestava funcionandodireito.Eu só tinha sentidoumgostinho

daendorfina,masfoisuficienteparamedeixarpodre.Eunãotinharespostaparaela.—Qual é o problema?— Jacqueline exclamou, avançando em nossa direção. Ela

olhoudemimparaDawn,confusa.Dawn fezumacaretaeentãocuspiunochão.O líquidoeravermelhoporcausado

meusangue.Quenojo.—Osanguedela...tinhaumgostohorrível.Nãodavaparaengolir.Imundo.—Ela

cuspiudenovo.OsolhosdeJacquelinesearregalaram.—Igualaooutro.Estávendo?Eudisseparavocê.—Não—Dawn sacudiu a cabeça.—Não pode ser amesma coisa.Você nunca

teria conseguido beber tanto dela.—Cuspiumais uma vez.—Não é só que tivessegostoestranhoouruim...eracomoseestivesseadulterado.—Aoveroolhardescrentede Jacqueline, Dawn deu um soco no braço dela. — Não acredita em mim?Experimenteparaver.Jacquelinedeuumpassonaminhadireção,hesitante.EntãoDawncuspiumaisuma

vezeachoque,dealgummodo,convenceuaoutraStrigoidequeelanãoiaquerersaberdemim.—Nãoquerooutrarefeiçãomedíocre.Caramba.Issoaquiestáficandoabsurdo.—

JacquelinedeuumaolhadaemAdrian,queestavaperfeitamenteimóvel.—Pelomenos,aindatemoseste.—Senãoestiverestragadotambém—Dawnbalbuciou.Meussentidosestavamvoltandoe,durantemeiosegundo,fiqueiimaginandosehavia

algumamaneirainsanadenóssobrevivermosàquilo.TalvezasStrigoinosdispensassemcomorefeiçõesruins.Masnão.Mesmonutrindoessaesperança,eusabiaque,aindaqueelas não se alimentassem de nós, não nos deixariam vivos. Não tinham motivo parasimplesmenteirembora.Iriamnosmatarpordiversãoantesdesair.Comamesmavelocidadenotável,JacquelinesaltounadireçãodeAdrian.—Estánahoradedescobrir.EugriteiquandoJacquelineprendeuAdriancontraaparedeemordeuopescoçodele.

Só demorou alguns segundos para experimentar. Ela ergueu a cabeça e fez uma pausaparasaborearosangue.Umsorrisovagarososeespalhouporseurosto,mostrandoseuscaninosensanguentados.—Este aqui é bom.Muito bom.Compensa o outro.—Ela passou os dedos pela

bochechadele.—Éumapena.Eleétãobonito.Dawnfoipisandofirmeatéondeelesestavam.—Queroexperimentarantesquevocêacabecomtudo!JacquelineaignorouejáestavaseinclinandoporcimadeAdrianmaisumavez;ele

estavacomosolhosvidrados.Nesse ínterim,eu jáestava livreobastantedaendorfinaparaclarearospensamentosmaisumavez.Ninguémestavaprestandoatençãoemmim.Tenteimelevantaresentiomundogirar.Fiqueiagachadaefuiengatinhandonadireçãodaminhabolsa,queestava jogadaeesquecidanocantoda sala. Jacqueline tinhabebidodeAdrianmais uma vez,mas só umpouquinho, antes deDawn a puxar para longe eexigirsuavez,parapodertirarogostodomeusanguedaboca.Assustada com a velocidade com que me movia, remexi na minha bolsa funda,

procurandodesesperadaporalgoquepudesseajudar.Algumapartefriaelógicaemmimdizia que não havia como escaparmos, mas também não havia como ficar lá paradaolhando enquanto as duas secavam o sangue deAdrian. Eu tinha que lutar.Tinha quetentarsalvá-lo,domesmojeitoqueeletinhafeitocomigo.Nãoimportavaseatentativanãodessecertoouseeumorresse.Dealgummodo,euprecisavatentar.Algunsalquimistascarregavamarmas,maseunão.Aminhabolsaeraenorme,cheia

com mais coisas do que eu realmente precisava, mas nada em seu conteúdo seassemelhava a uma arma. Emesmo que se assemelhasse, amaior parte das armas erainútil contra os Strigoi. Uma arma iria detê-las por um tempo, mas não matá-las.Apenasestacasdeprata,decapitaçõesefogopodiammatarumStrigoi.Fogo...Minhamãosefechouemvoltadoamuletoqueeutinhafeitoparaasra.Terwilliger.

Eutinhaenfiadonabolsaquandoelameentregou,semsabermuitobemoquefazercom

aquilo. Só podia supor que a perda de sangue e os pensamentos dispersos tinhammelevadoapegá-loeconsiderarapossibilidadedeusá-lo.Atéessepensamentoeraridículo.Nãodavaparausaralgoquenãofuncionava!Eraumabugiganga,umsaquinhoinútildepedrasefolhas.Nãohaviamagiaalieeueraidiotasódeconsiderarapossibilidade.E,noentanto,eraumsacodepedras.Não era pesado, mas certamente bastava para chamar a atenção de alguém se lhe

batesse na cabeça. Era amelhor coisa que eu tinha.O único objeto que eu tinha paraadiar a morte de Adrian. Coloquei o braço para trás, mirei em Dawn e joguei,recitandooencantotolo:—Emchamas,emchamas!Foi um belo lançamento.A srta. Carson teria ficado orgulhosa. Mas eu não tive

chancedeadmirarminhashabilidadesatléticasporquefiqueidistraídademaiscomofatodequeDawntinhapegadofogo.Meu queixo caiu enquanto eu olhava fixo para o impossível. Não era um fogo

enorme.Nãoeracomoseocorpo tododelaestivesse sendoengolidoporchamas.Masno lugar em que o amuleto a atingiu, um fogo pequeno se acendeu e se espalhou comrapidezporseucabelo.Elaberrouecomeçouabaternacabeçaemgestosfrenéticos.OsStrigoi tinham medo de fogo e, por um instante, Jacqueline recuou. Então, comdeterminação firme,ela soltouAdrianepegouumamanta.ElaaenrolounacabeçadeDawneabafouofogo.— Mas que diabo? — Dawn quis saber quando saiu de baixo da manta. Ela

imediatamente começou a avançar naminhadireção em sua ira.Eu sabia que só tinhaconseguidoacelerarminhaprópriamorte.Dawnmeagarrouebateuaminhacabeçacontraaparede.Omundogiroueeume

sentienjoada.Elaestendeuamãoparamimmaisumavez,masficouparalisadaquandoaportaseabriudesupetãoeEddieapareceucomumaestacadepratanamão.Omais impressionante sobreoque aconteceu a seguir foi a velocidade.Nãohouve

pausa,nenhumlongomomentoparaavaliarasituaçãoenenhumatrocadeprovocaçõesentreoscombatentes.Eddiesimplesmenteatacou;foiparacimadeJacquelineprimeiro.Ela reagiu com igual rapidez, avançando rápido para enfrentar sua única ameaçapresente.DepoisqueelasoltouAdrian,eledesabounochão,aindasobosefeitosdasendorfinas

da Strigoi. Sem me levantar do chão, corri até ele e ajudei-o a se arrastar até a“segurança” do outro lado da sala, enquanto Eddie lutava com a Strigoi. Só dei umaolhadaneles,osuficienteparaperceberanaturezamortaldeseusgolpes,quepareciamuma dança. Ambas Strigoi estavam tentando agarrar Eddie, provavelmente comesperançadequebrarseupescoço,mastomandocuidadoparaescapardosgolpesdesuaestacadeprata.Olhei para Adrian, que estava perigosamente pálido e cujas pupilas tinham se

reduzido ao tamanho de pontas de alfinete. Eu só tinha uma impressão grosseira doquantoJacquelinetinhabebidodeleenãosabiaseoestadodeAdrianeramaisdevidoàperdadesangueouàsendorfinas.—Estoubem,Sage—elebalbuciouepiscoucomosea luzomachucasse.—Mas

estou bem chapado. Isso faz as coisas que eu uso parecerembem fracas—ele piscou,como se estivesse se esforçando para acordar. Suas pupilas se dilataram para umtamanhomais normal e então pareceram se focar emmim.—MeuDeus. Você estábem?—Vouficar—eudisseecomeceiamelevantar.Mas,antesmesmoqueeupudesse

terminar de falar, uma onda de tonturame atingiu e eu cambaleei.Adrian fez o quepôdeparamesegurar,masestavabemdesajeitadoporcausadasmãospresas.Nósnosapoiamosumcontraooutroeeuquasedeirisadadoridículodasituação,umtentandoajudarooutro,sendoquenenhumdosdoisestavaemcondiçõesdefazerisso.Entãoalgochamouaminhaatençãoetodososoutrospensamentossedesfizeram.—Jill—sussurrei.Adrian imediatamente seguiuomeuolhar atéo lugar emque Jill tinha acabadode

aparecernaportadasala.Nãofiqueisurpresaemvê-la.EddiesópodiaestaraliporqueJill devia ter dito a ele o que estava acontecendo comAdrian por meio do laço deespírito.Ali parada, com os olhos faiscando, ela parecia algum tipo de deusa feroz, pronta

paraabatalhaenquantoassistiaaoembatedeEddiecomaStrigoi.Aquilofoiaomesmotempoinspiradoreassustador.Adriancompartilhoudosmeuspensamentos.—Não, não, Chave deCadeia— elemurmurou.— Não faça nenhuma idiotice.

Castilevaiterquedarcontadissosozinho.—Elasabelutar—eudisse.Adrianfranziuatesta.—Maselanãotemnenhumaarma.Assim,elaéumpeso-penanestaluta.Ele tinha razão, é claro.E aomesmo tempoqueeunãoqueriaque Jill arriscasse a

própria vida, não podia evitar pensar que, se ela estivesse equipada adequadamente,poderiasercapazdeajudar.Nomínimo,umadistraçãopoderiaserumbenefício.Eddieestava tomando conta de seu terreno contra as duas Strigoi, mas também não estavafazendo nenhum progresso contra elas. Uma ajuda seria boa. E nós precisávamosgarantir que Jill não entrasse apressada naquilo, só com os próprios punhos para sedefender.Uma inspiração se abateu sobremim e eu consegui ficar em pé.Omundo girava

ainda mais do que antes, mas — apesar das reclamações de Adrian — conseguicambalear até a cozinha.Mal consegui chegar até a pia e abrir a torneira e asminhaspernascederamembaixodemim.Eumeagarrei àbeiradadapiaeconseguicontinuarempé.

—Jill!—berrei.Elasevirounadireçãodomeugrito,viuaáguacorrendoenomesmoinstantesoube

oquefazer.Elaergueuamão.Ojatodeáguaquesaíadatorneiraderepentemudoudedireçãoedisparouparaforadapia,paraooutroladodasala.ElefoiatéJill,quepegouuma grande quantidade com as mãos e, usando magia, forçou a água a assumir umformatocilíndricolongo.Elesesustentounoarassim,umtacodeáguaaparentementesólido,aindaqueondulante.Elaoagarroueentrouna luta,dandoumgolpenascostasde Jacqueline com sua arma. Gotas saíram voando do “taco”, mas ele manteve suarigidez o suficiente para que ela desferisse um segundo golpe antes de ele explodircompletamenteemumborrifodeágua.JacquelinesevirouparatráscomamãoestendidaparaacertarJill.Maselajáestava

esperando por isso e se jogou no chão, desviando-se exatamente da maneira como eutinhavistoEddieensiná-la.ElarecuouparalongedoalcancedeJacquelineeaStrigoifoiatrás— dando assim uma chance a Eddie de acertar suas costas. Eddie aproveitou aoportunidade,esquivando-sedeDawn,eenterrousuaestacanascostasdeJacqueline.Eununca tinha pensado nisso, mas se fosse enfiada com força suficiente, uma estaca eracapazdeperfurarocoraçãodealguémpelascostascomamesmafacilidadequeteriasefosse enfiada pelo peito. Jacqueline ficou rígida, e Eddie arrancou a estaca, pormuitopouco se esquivandodeumgolpedesferido com toda a forçadeDawn.Mesmo assim,ela o acertou um pouco e ele cambaleou de leve antes de retomar o equilíbrio comrapidezevoltaraatençãoparaela.Jillfoiesquecidaelogocorreuaténós,nacozinha.—Está tudobemcomvocês?—elaexclamouaoolharparanósdois.Aexpressão

feroz tinha desaparecido.Agora ela era só uma garota comum preocupada com osamigos.—Ai, meu Deus. Eu estava tão preocupada com vocês dois...As emoçõeseramtãofortes!Eunãoconseguiamefixarnoqueestavaacontecendo,sósabiaquealgoestavamuitoerrado.ArrasteimeuolharparaEddie,quedançavadeumladoparaooutrocomDawn.—PrecisamosajudarEddie...Dei dois passos para longe da pia e comecei a cair. Tanto Jill quanto Adrian

estenderamosbraçosparamesegurar.—PorCristo,Sage—eleexclamou.—Vocêestápéssima.—Nãotantoquantovocê—reclamei,aindapreocupadaemajudarEddie.—Elas

beberammaisdevocê...—É,maseunãotenhoumaferidanobraçoqueestásangrando—eleapontou.—

Nemumapossívelconcussão.Eraverdade.Comtodaaquelaagitação,euestavatãocheiadeadrenalinaquequase

tinhameesquecidodafacadaqueLeetinhamedado.Nãoeraparamenosqueeuestavatão tonta.Ou talvez fossepor terbatido a cabeça com toda a forçanaparede.Àquelaaltura,qualquerumadasalternativaspodiaestarcorreta.

—Pronto—Adrian disse com gentileza. Ele pegou osmeus braços com asmãosalgemadas.—Eucuidodisto.Um calor lento e formigante tomou conta daminha pele.No começo, o toque de

Adrianfoireconfortante,comoumabraço.Sentiatensãoeadorcomeçaremarelaxar.Tudoestavacertonomundo.Eletinhatudosobcontrole.Eleestavacuidandodemim.Eleestavausandosuamagiaemmim.—Não!—solteiumberroestridenteemeafasteidelecomumaforçaqueeunão

sabia ter.Opavoreapercepção totaldoqueestavaacontecendocomigo forammuitofortes.—Nãotoqueemmim!Nãotoqueemmimcomasuamagia!—Sage,vocêvaisesentirmelhor,podeacreditar—eledisseeestendeuamãopara

mimmaisumavez.Eu recuei, agarrada à beirada da pia parame apoiar.A lembrança fugidia daquele

caloreconfortoeradiminuídapelopavorqueeutinhacarregadoavidatodaemrelaçãoàmagiadosvampiros.—Não,não,não.Nadademagia!Nãocomigo.Atatuagemvaimecurar!Eusou

forte!—Sage...—Pare,Adrian.— Jill disse. Ela se aproximou demim, incerta.—Tudo bem,

Sydney.Elenãovaicurarvocê.Juroquenãovai.—Nadademagia—sussurrei.—PeloamordeDeus—Adrianresmungou.—Issoébesteirasupersticiosa.—Nadademagia—Jilldissecomfirmeza.Elatirouacamisadeabotoarqueusava

porcimadeumacamiseta.—Venha aqui eeuvouusar istopara amarrar,paravocênãoperdermaissan...Umberrodeperfurarotímpanofezcomquetodosnósvoltássemosaatençãoparaa

sala.Eddietinhaacertadosuavítima,enfiandoaestacabemnomeiodopeitodeDawn.DuranteminhabrevedisputacomAdrianeJill,DawndeviateracertadoalgunsgolpesemEddie,porquehaviaumamarcavermelhagrandeemumdos ladosdo rostodeleeseulábiosangrava.MasaexpressãoemseusolhoseraduraetriunfantequandoelepuxouaestacaeobservouDawncair.No meio de toda aquela confusão e horror, os instintos básicos de alquimista

tomaramcontademim.Operigotinhaacabado.Haviaprocedimentosqueprecisavamserseguidos.—Os corpos—eu disse.—Precisamos destruí-los.Temuma ampola naminha

bolsa.—Opa,opa—Adriandisse,enquantoeleeJillamarravamacamisaemmim.—

Fiqueondeestá.Castilepodepegar.Oúnicolugaraondevocêvaiéatéummédico.Nãomemexi,masimediatamentediscordeidaúltimaafirmação.—Não!Nadademédicos.Pelomenos,vocêstêmque...vocêstêmquearrumarum

médicoquesejaalquimista.Osnúmerosestãonaminhabolsa...—Vápegarabolsadela—AdriandisseaJill—,antesqueelatenhaumchilique.

Euamarroobraço.—Olheifeioparaele.—Semmagia.Que,porsinal,poderiafazercomqueissofossedezvezesmaisfácil.—Vousararsozinha—eudisseenquantoobservavaJillpegaraminhabolsa.—Você se dá conta—Adrian completou— de que vai precisar superar a sua

fixação por dieta e consumir umas boas calorias para lutar contra a perda de sangue?Açúcar e líquidos, igualzinho aClarence.Ainda bem que alguém embalou todos essesdocesqueestãonobalcão.Eddie caminhou até onde Jill estava, e ela fez uma pausa quando ele perguntou se

estava tudobemcomela. Jillgarantiuquesime,apesardeEddieestarcomo jeitodequemseriacapazdematarmaisunscinquentaStrigoi,tambémhaviaumaexpressãonosolhos dele... algo que eu acreditei nunca ter notado.Algo sobre o que eu teria querefletir.—Droga—disseAdrian, lutandocomopano.—Eddie,vejanocorpodeLeese

temumachaveparaestasalgemasdesgraçadas.Jill tinha se envolvido na conversa com Eddie, mas ficou paralisada ao escutar as

palavras “o corpo de Lee”. O rosto dela ficou tão pálido que ela poderia ser um dosmortos.Nomeio de toda aquela confusão, ela não tinha reparado no corpo de Lee napoltrona.TinhahavidoagitaçãodemaiscomasStrigoi,distraçãodemaiscomaameaçaqueelasrepresentavam.Eladeualgunspassosnadireçãodasalaefoiquandooviu.Suaboca seabriu,masnenhumsomsaiu imediatamente.Entãoeladeuumpassoadianteeagarrouasmãosdele,berrando.—Não!—elaexclamou.—Não,não,não!—elaosacudiu,comoseissopudesse

acordá-lo. Em um piscar de olhos, Eddie estava ao seu lado, abraçando-a, enquantomurmurava coisas sem sentidopara reconfortá-la.Elanão escutou. Seumundo inteiroeraLee.Senti lágrimas brotando nosmeus olhos e detestei o fato de estarem ali. Lee tinha

tentado me matar e depois tinha chamado mais duas para terminar o serviço.Tinhadeixado um rastro de inocentes atrás de si. Eu devia estar contente por ele não estarmaisali;noentanto,eumesentiatriste.EleamavaJill,àsuamaneirainsana,epeladorno rosto dela, era óbvio que ela também o amava. O laço de espírito não tinha lhemostrado a morte dele nem o papel que ele tinha desempenhado para nossa captura.Naquelemomento, ela simplesmente achava que ele tinha sido vítima das Strigoi. Elalogoficariaapardaverdadesobreosintuitosdele.Eunãosabiaseissoiriaaliviaradordelaounão.Estavaachandoquenão.De uma maneira estranha, uma imagem do quadro Amor deAdrian me veio na

cabeça. Pensei no traço vermelho torto, rasgando omeio da escuridão, dilacerando-a.Ao olhar para Jill e sua dor inconsolável, de repente entendi a arte dele um pouco

melhor.

26

Demoroudiasatéqueeuconseguissereunirahistóriatoda,tantoemrelaçãoaLeequantosobrecomoEddieeJilltinhamchegadoparanossalvarnaquelanoite.Depois de ter Lee como a peça que faltava, foi fácil conectar os assassinatos de

Tamara, Kelly, Melody e Dina, a garota humana que ele tinha mencionado.Todastinhamsidomortasnodecorrerdosúltimoscincoanos,ouemLosAngelesouemPalmSprings,emuitagente tinhaprovasdocumentadasdeconhecê-lo.Elasnão tinhamsidovítimas aleatórias. O pouco que conseguimos descobrir a respeito da história de Leepartiu de Clarence, apesar de nem isso ter ficado muito claro. Pelo que pudemosconcluir, Lee tinha sido transformado em Strigoi à força, cerca de quinze anos antes.Tinhapassadodezanosassim,atéqueumvampirousuáriodeespíritoorestaurou,parao desgosto deLee.Clarence já não tinha a cabeçamuito no lugar naquela época e nãohavia questionado como o filho tinha voltado para casa depois de dez anos semenvelhecer. Ele evitou responder às nossas perguntas relativas a Lee ser Strigoi, e nósnão sabíamos seClarence simplesmentenão sabiaou seestavaemnegação.Damesmamaneira,nãoficouclaroseClarencesabiaounãoqueoprópriofilhoestavaportrásdamortedeTamara.Ateoriamalucadoscaçadoresdevampirosprovavelmenteeramaisfácilparaeleengolirdoqueaverdadesobreocaráterassassinodofilho.InvestigaçõessobreafaculdadedeLeeemLosAngelesmostraramqueelenaverdade

não estivera realmentematriculado desde antes de se tornar Strigoi.Quando voltou aserMoroi, tinhausadoa faculdadecomodesculpapara ficaremLosAngeles,ondeeramais fácil encontrar suasvítimas—enósdesconfiávamosquehaviamaisdelasdoquenossos registrosmostravam.AssimcomoMelodyeDina,parecequeele tinha tentadotomarosanguedealgumasvítimasdecadaraça,naesperançadequealgumadelasfosse“acerta”,queofariavoltaraserStrigoinovamente.A pesquisa mais aprofundada sobre Kelly Hayes revelou algo em que eu devia ter

pensado logo de cara. Ela era dampira.Tinha aparência de humana, mas o histórico

estrelar nos esportes foi o queme deu a dica. Lee tinha se deparado com ela quandovisitavaopaicincoanosantes.Atacarumadampiranãoerafácil,eporissoelepareciateraplicadootruquedenamorá-laparaatraí-la.Nenhum de nós sabia nada sobre o “maldito usuário de espírito” que o tinha

convertido, apesar de isso ser do interesse tanto dos alquimistas quanto dos Moroi.Havia poucos usuários de espírito nos registros, e com tantas informações aindadesconhecidas sobre seus poderes, todo mundo queria saber mais. Clarence afirmavacomveemênciaquenãosabianadaarespeitodesseusuáriodeespíritomisterioso,eeuacreditavanele.Alquimistas passaram a semana toda indo e vindo de Palm Springs, dando jeito na

bagunça e entrevistando todos os envolvidos.Tive reuniões com vários deles, contei aminha história vez após outra, e finalmente tive meu último interrogatório comStanton,nahoradoalmoçoemumsábado.EumeioquetinhauminteresseperversoemsaberoquetinhaacontecidocomKeith,maschegueiàconclusãodequenãodeviatocarnoassuntoà luzdetudoomaisqueestavaacontecendo.Elenãoestavaali,eeraoqueimportavaparamim.—AautópsiadeLeenão revelounada foradocomumparaumMoroinormal,de

acordocomosmédicosdeles—Stantonmedisseentregarfadasdelinguiniàcarbonara.Parece que comer e discutir cadáveres não eram coisas excludentes.—Mas, bom, éprovávelqueumacoisa...mágicanãofosseaparecermesmo.—Masdevehaveralgodeespecialarespeitodele—eudisse.Estavasóremexendo

a comida pelo prato.—O fato de seu envelhecimento ter sido retardado já era umaprovasuficiente...maseoresto?Querdizer,elebebeudetantasvítimas.Eaíeuvioque Jacqueline fez com ele.Aquilo devia ter funcionado. Todos os procedimentoscorretosforamseguidos.Fiqueisurpresadesercapazdefalardemodotãoclínicoarespeitodaquilo,depoder

parecer tão desapegada. Mas, na verdade, era apenas o meu lado de alquimistaassumindoocontrole.Dentrodemim,osacontecimentosdaquelanoitetinhamdeixadoumamarcapermanente.Quandofechavaosolhosnahoradedormir,enxergavaamortedeLee e Jacqueline lhe dando sangue.Lee, que tinha dado flores para Jill e nos levadoparajogarminigolfe.Stantonassentiu,pensativa.—EissosugerequeaquelesquesãorestauradosdepoisdesetornaremStrigoificam

imunesaumanovatransformação.Ficamos ali em silêncio por um momento, deixando o peso das palavras ser

absorvido.—Issoéalgoimportantíssimo—eufinalmentedisse.Nossa,eramuitomaisdoque

isso.Leeapresentavadiversosmistérios.Eletinhacomeçadoaenvelhecerquandovoltoua ser Moroi, mas em ritmo bem mais lento. Por quê? Nós não sabíamos dizer com

certeza, mas essa descoberta por si só era monumental, assim como a minhadesconfiança de que ele não podia mais usar a magia dos Moroi. Eu tinha ficadoapavorada quando Jill pediu a ele que criasse névoa enquanto estávamos jogandominigolfe,mas,pensandomelhor,ocorreu-mequeelenaverdadepareceunervosocomospedidosdela.Maseo resto?O fatodequealgo tinhamudadonele,queoprotegia,aindaquecontrasuaprópriavontade,devoltaraserStrigoi?Poisé.“Importantíssimo”nemcomeçavaadescreveragravidadedaquilo.— Muito — Stanton concordou. — Metade da nossa missão é impedir que os

humanos escolham sacrificar sua alma pela imortalidade. Se houvesse umamaneira decaptaressamagia,descobriroqueprotegeuLee...bom,osefeitosteriamlongoalcance.—ParaosMoroi também—observei.Eu sabiaqueentre eles eosdampiros, ser

forçadoasetransformaremStrigoieraconsideradocomfrequênciaumdestinopiordoqueamorte.Sehouvessealgumamaneiramágicadeseproteger,issosignificariamuito,jáqueelessedeparavamcomStrigoimuitomaisdoquenós.Podíamosestarfalandodealgumtipodevacinamágica.—Claro que sim—disse Stanton, apesar de seu tom implicar que ela não estava

muitopreocupadacomosbenefíciosparaaquelaraça.—Podeatéserpossível impedircriaçõesfuturasdeStrigoi.Mastambémháomistériodoseusangue.VocêdissequeosStrigoinãogostaramdele.Issotambémpodeserumtipodeproteção.Estremecicomalembrança.—Talvez.Aconteceutãorápido...édifícildizer.Ecertamentenãoserviuparame

protegercontraosStrigoiquereremquebraromeupescoço.Stantonassentiu.— Certamente é algo que vamos ter de investigar mais para a frente. Mas,

primeiro,precisamosentenderoqueaconteceucomLee.—Bom— eu disse.—O espírito deve ter um papel importante, certo? Lee foi

restauradoporumusuáriodeespírito.UmgarçomseaproximoueStantonfezumsinalparaquelevasseseuprato.—Exatamente. Infelizmente, temosumaquantidademuitoreduzidadeusuáriosde

espírito comquem trabalhar.VasilisaDragomirmal tem tempode fazer experiênciascomseuspoderes.SonyaKarpseofereceuparaajudar,eestaéumanotíciaexcelente,jáqueelaprópria éumaex-Strigoi.Nomínimo,poderemosobservar adesaceleraçãodoenvelhecimentoemprimeiramão.Ela só temdisponibilidadeporumperíodocurto,eosMoroiaindanãoresponderamaomeupedidoporalgunsoutrosindivíduosúteis.Mas,se tivéssemos outro usuário de espírito àmão, que não tivesse outras obrigações paradistraí-lodesuatarefadenosajudaremtempointegral...Elaolhouparamim,esperandoumareação.—Adrian?—perguntei.—Você acha que ele ajudaria nessa pesquisa? Sobre algumamaneiramágica de se

proteger contra a conversão em Strigoi? Como eu disse, entre Sonya e os outros, eleteria ajuda — ela se apressou em completar. — Falei com os Moroi, e eles estãomontando um grupinho com bastante experiência com os Strigoi. O plano é que osmandemparacáembreve.SóprecisamosqueAdrianajude.—Uau.Vocêssãorápidos—murmurei.Com as palavras“Adrian” e“pesquisa”, aminhamente juntou imagens em que ele

estavaemumlaboratório,comaventalbranco,debruçadoporcimadetubosdeensaioebéqueres.Eusabiaqueapesquisarealnãoserianemumpoucoparecidacomisso,masera uma imagem difícil de desfazer.Também era difícil imaginarAdrian concentradocom seriedade em qualquer coisa. Só que eu ficava pensando e pensando queAdrianpoderia se concentrar se tivesse algo com que se preocupar. Será que aquilo tinhaimportânciasuficiente?Realmentenãosabiadizer.Eradifícildemaisimaginarquemotivopoderiasernobre

o suficienteparachamaraatençãodele.Maseu tinhaquasecertezadeconheceralgunsbenefíciosbemmenosnobresquepoderiamfazercomqueeleficassedonossolado.—Sevocêsarrumaremumlugarparaelemorarsozinho,eleajuda—eufinalmente

disse.—EleestáloucoparasairdacasadeClarenceDonahue.AssobrancelhasdeStantonseergueram.Elanãoestavaesperandoporisso.—Bom.Estenãoéumpedidoenorme,suponho.E,naverdade,estamospagandoa

conta do antigo apartamento de Keith, já que ele tirou um ano de licença. O sr.Ivashkovpoderiasimplesmentesemudarparalá,sóque...—Sóqueoquê?Stantondeudeombrosdeleve.— Eu ia oferecer o lugar paravocê. Depois de muita discussão, resolvemos

simplesmentedeixarvocêcomoaalquimistaresponsávelpelaáreaaqui,tendoemvistaa... partida desafortunada de Keith.Você pode sair deAmberwood,mudar-se para oapartamentodeleesimplesmentesupervisionarasatividadesdelá.Eufranziatesta.—MaseuacheiquevocêsqueriamalguémparaficarcomJillotempotodo.— Queremos, sim. Na verdade, encontramos uma opção melhor... sem querer

ofender.OsMoroiconseguiramlocalizarumagarotadampiradaidadedeJillque,alémdeservircomocolegadequartoparaela,tambémpoderásersuaguarda-costas.Elavaivirparacájuntocomospesquisadores.Vocênãoprecisamaisfazeropapeldealuna.O mundo rodou. Tramoias e planos dos alquimistas estavam sempre em ação.

Parecia quemuita coisa tinha sido decidida naquela semana. Refleti a respeito do queaquilo significava.Nadamais de lição de casa, nadamais de política de ensinomédio.Liberdadedeirevirquandoeubementendesse.Masissotambémsignificavameafastardos amigos que eu tinha feito—Trey,Kristin, Julia. Eu continuariame encontrandocomEddieeJill,masnãotanto.Eseeuestivessesozinha,seráqueosalquimistas—ou

omeupai—iriamajudarapagaraulasnafaculdade?Poucoprovável.—Tenho mesmo que sair da escola? — perguntei a Stanton. — Posso dar o

apartamentoaAdriane ficaremAmberwoodmaisumpouco?Pelomenosatévermosseconseguimosoutrolugarparaeumorar?Stantonnãosedeuaotrabalhodeescondersuasurpresa.—Não achei que você iria querer continuar lá.Achei que ficaria particularmente

felizpornãoprecisarmaisdividiroquartocomumavampira.E, assim, todos osmedos e a pressão que eu tinha enfrentado antes de vir a Palm

Springsdesabaramemcimademim.Adoradoradevampiros .Comoeuera idiota.EudeviateragarradoachancedemeafastardeJill.Qualqueroutroalquimistateriaagidoassim.Aome oferecer para ficar, era provável que eu estivesse levantando suspeitas ameurespeitomaisumavez.Comoeupoderiaexplicarquehaviamuitomaiscoisaemjogonaminhaescolhadoqueapenasumatrocadecolegadequarto?—Ah—eudisse,comexpressãoneutra.—Quandovocêdissequeiaprovidenciar

paraJillumadampiradamesmaidadedela,acheiqueelasficariamnomesmoquartoeeu não precisaria mais ficar com ela.Achei que ia ter um quarto só para mim noalojamento.—Issoprovavelmentepodeserprovidenciado...— E, sinceramente, depois de algumas das coisas que aconteceram, me sentiria

melhorsepudesseficardeolhoemJill.Vaisermaisfácilseeuestivernaescola.Alémdo mais, se é necessário um apartamento para deixar Adrian feliz e trabalhar nomistériodosStrigoi,entãoéoqueprecisamosfazer.Eupossoesperar.Stantonmeexaminoudurantevárioslongossegundosesórompeuosilêncioquando

ogarçomdeixouacontanamesa.—Issoémuitoprofissionaldasuaparte.Voutomarasprovidências.—Obrigada—eudisse.Umasensaçãodealegriatomoucontademim,eeuquase

sorri,imaginandoorostodeAdrianquandoeleficassesabendodesuacasanova.—Sótemmaisumacoisaqueeunãocompreendo—Stantonobservou.—Quando

investigamosoapartamento,encontramosalgunsdanoscausadosporfogo.Masnenhumdevocêsmencionounadaaesserespeito.Franziatestademaneirafingida.— Sinceramente... uma parte grande do que aconteceu ficou confusa na minha

cabeça pela perda de sangue e a mordida... não sei dizer com certeza. Keith tinhaalgumas velas. Não sei se alguma foi acesa... ou, não sei. Só fico pensando naquelesdenteseemcomofoihorrívelsermordida...— Sei, sei — Stanton disse.A minha desculpa era fraca, mas nem ela estava

totalmente imune à ideia de ter seu sangue sugado por um vampiro. Esse erabasicamente o pior pesadelo de um alquimista, e eu tinha direito aomeu trauma.—Bom,nãosepreocupecomisso.Aquelefogoéamenordasnossaspreocupações.

Não era a menor dasminhas preocupações. E quando voltei ao campus naquelemesmodia, finalmente fui dar conta do assunto e achei a sra.Terwilliger emumdosescritóriosdabiblioteca,ondeelaestavatrabalhando.—Você sabia — eu disse, fechando a porta.Todos os protocolos entre aluna e

professora sumiram da minha mente. Eu estava ignorando a minha raiva fazia umasemana, e agora finalmente podia colocá-la para fora.Tinha passado a vida toda sendoensinada a respeitar a autoridade, mas agora uma delas tinha me traído, pura esimplesmente.—Tudooquemefezfazer...copiaraqueleslivrosdefeitiços,produziraqueleamuleto“sóparevercomoera”!—sacudiacabeça.—Eratudomentira.Vocêsabia...sabiaqueera...real.Asra.Terwilligertirouosóculoseolhouparamimcomcuidado.—Ah,entãopresumoquetenhaexperimentado?—Comopôde fazer isso comigo?—exclamei.—Não tem ideia de comoeume

sintoemrelaçãoàmagiaeaosobrenatural!—Ah — ela disse, seca. — Na verdade, eu tenho, sim. Sei tudo sobre a sua

organização—eladisse,batendocomodedonaprópriabochecha,espelhandoaminhaque continha a tatuagem.—Eu seiporque a sua“irmã” tem licençamédicaparanãofazeratividadesexternaseporqueoseu“irmão”éótimoemesportes.Estoumuitobeminformada a respeito das diversas forças que trabalham no nosso mundo, as que seescondemdamaiorpartedosolhoshumanos.Nãosepreocupe,minhacara.Comtodaacerteza,nãovoucontarparaninguém.Nãoestoupreocupadacomvampiros.—Porquê?—perguntei,decididaanãoconfirmarqueela tinhaexposto tudoque

meesforçavatantoparamanteremsegredo.—Porqueeu?Porquemeforçouafazeraquilo...principalmentesealegasabercomoeumesinto?— Mmm... por algumas razões. Os vampiros, como sabe, têm uma espécie de

magia interna. Eles se conectam com os elementos em nívelmuito básico, quase semesforço.Oshumanos,noentanto,nãotêmessamesmaconexão.—Oshumanosnãodevemusarmagia—dissecomfrieza.—Vocêmeobrigoua

fazeralgocontrárioàsminhascrenças.—Paraoshumanos fazeremmagia—elaprosseguiu, como se eunão tivessedito

nada—precisamosarrancá-ladomundo.Issonãonosvemcomtantafacilidade.Claroqueosvampirosusamfeitiçoseingredientesdevezemquando,masnãoénadaparecidocomoquenósprecisamosfazer.Amagiadelessaidedentroparafora.Anossavemdefora para dentro. É necessáriomuito esforço,muita concentração e cálculos exatos...bom,amaiorpartedoshumanosnãotempaciêncianemhabilidadeparaisso.Masumapessoacomovocê?Essastécnicasdetalhadasforamincutidasemvocêdesdequeaprendeuafalar.—Entãoesseéoúnicorequisitoparausarmagia?Capacidadedeorganizaremedir?

—Nãomedeiaotrabalhodeescondermeusarcasmo.

—Claroquenão—eladeurisada.—Certotalentonaturaltambéménecessário.Uminstintoquesecombinaàdisciplina.Eusenti issoemvocê.Sabe,eumesmatenhouma certa proficiência nisso. Ela me dá um status de bruxa, mas é relativamentepequeno.Masvocê?Soucapazdesentirumafontedepoderemvocê,eaminhapequenaexperiênciasóserviuparacomprovarqueeutinharazão.Eumesentigelar.—Issoémentira—eudisse.—Vampirosusammagia.Nãohumanos.Nãoeu.—Aqueleamuletonãopegoufogo sozinho—eladisse.—Nãonegueoquevocêé.

Eagoraque terminamoscom isso,podemos seguirem frente.Oseupoder inatopodesermaiordoqueomeu,maseupossoiniciá-lanotreinamentobásicodemagia.Não dava para acreditar que eu estava ouvindo aquilo.Não era real. Era como se

fossealgosaídodeumfilme,porquenãotinhacomoaquelaseraminhavida.—Não!—exclamei.—Vocêé...vocêélouca!Amagianãoéreal,eeunãotenho

nenhuma!Issoéantinaturaleerrado.Nãovoucolocaraminhaalmaemperigo.—Tantanegaçãoparaumacientistatãoboa...—elarefletiu.—Estoufalandosério—eudisse,malreconhecendominhaprópriavoz.—Eunão

quero ternenhumarelaçãocomestudosdooculto.Ficocontenteemcontinuar fazendoanotações e comprando café para você, mas se continuar fazendo essas afirmações eexigências malucas... vou à secretaria exigir uma mudança de professora. Podeacreditar,quandoénecessáriodarcontadeburocraciaeconvencergentequetrabalhanaadministração,aísimeutenhoumpoderinato.Elaquasesorriu,masentãomurchou.— Você está falando sério? Realmente rejeita este potencial fantástico... essa

descoberta...quevocêpossui?Nãorespondi.—Então,queseja—elasuspirou.—Éumaperda.Eumdesperdício.Mastema

minha palavra de que eu não vou voltar a tocar neste assunto, a não ser que parta devocê.—Issonãovaiacontecermesmo—eudissecomveemência.Asra.Terwilligersódeudeombroscomoresposta.—Muitobem,então.Jáqueestáaqui,entãoémelhorirbuscarumcaféparamim.Eumedirigiparaaportaeentãopenseiemumacoisa.—EravocêqueligavaparaaNevermoreperguntandosobrevampiros?—Porqueraioseufariaisso?—elaperguntou.—Jáseiondeencontrá-los.Mais tarde, cheguei ao refeitório bem quando Eddie, Jill e Micah estavam

terminando de jantar. Compreensivelmente, Jill estava com dificuldade de aceitar amortedeLeeetodasasrevelaçõesquenóstínhamosfeito—incluindoodesejoqueeletinhadetransformá-laemsuarainhamorta-viva.TantoEddiequantoeuconversávamoscomelaomáximopossível,masMicahpareciasurtirumefeitomaisreconfortantepara

ela.Achoque era porque ele nunca abordavao assuntodemaneira explícita.Ele sabiaqueLeetinhamorrido,masachavaquetinhasidoumacidenteenaturalmentenãosabiadas conexões vampirescas do acontecimento. Enquanto Eddie e eu ficávamos tentandodarumadepsicólogosamadores,Micahsimplesmentetentavadistraí-laefazê-lafeliz.— Precisamos ir— ele disse em tom de desculpa quando me sentei.— Rachel

Walkervainosdarumaaulaemumadasmáquinasdecostura.Eddiesacudiuacabeçaparaele.—Aindanãoacreditoquevocêseinscreveunoclubedecostura.Isso,claro,nãoeraverdade.Nósdois sabíamosexatamenteporqueMicahhavia se

inscrito.OrostodeJillestavacomaexpressãogravequenãoaabandonaradesdeamortede

Lee—umaexpressãoqueelaaindacarregariaduranteumtempo,desconfiava—,masofantasmadeumsorrisoseagitouemseuslábios.—Acho queMicah tem tudo para ser um verdadeiro estilista.Quem sabe eu não

desfiloparaeleumdia?Sacudiacabeça,escondendomeuprópriosorriso.—Nadadefazertrabalhodemodeloduranteumtempo.Depoisdodesfile,Liaeoutrosestilistastinhamentradoemcontato,todosquerendo

voltaratrabalharcomJill.Tínhamosprecisadorecusarparaprotegera identidadedelaaqui,masJilltinhaficadotristepornãopoderparticipar.Jillassentiu.—Eusei,eusei—elaselevantoucomMicah.—Vejovocêmaistardenoquarto,

Sydney.Queroconversarmaisumpouco.Euassenti.—Claroquesim.Eddieeeuobservamosenquantoelesseafastavamapressados.Suspirei.—Issovaiserumproblema—disseaele.—Talvez—eleconcordou.—Maselasabeoquepodeeoquenãopodefazercom

ele.Elaéinteligente.Vaiserresponsável.—Maselenãosabe—eudisse.—AchoqueMicahjáestáapaixonadodemaispor

ela.—OlheiparaEddiecomcuidado.—Entreoutraspessoas.Eddie ainda observava Micah e Jill, de modo que demorou um momento para

entenderoqueeuestavadizendo.Voltouoolharparamimemumgestobrusco.—Hein?—Eddie,nãovoudizerque souespecialista emromance,mas até eu sou capazde

verquevocêéloucoporJill.Eleprontamentedesviouoolhar,apesardeseuruborotrair.—Nãoéverdade.— Percebi desde o começo, mas foi só na noite na casa de Keith que realmente

entendioqueeuestavavendo.Euvicomovocêolhavaparaela.Euseioquevocêsenteporela.Então,oqueeuquerosaberéoseguinte:porquenóstemosquecontinuarnospreocupando com Micah? Por que você não a convida para sair e nos poupa muitaconfusão?—Porqueelaéminhairmã—eledisse,seco.—Eddie!Estoufalandosério.Elefezumacareta,respiroufundoeentãosevoltouparamimmaisumavez.—Porqueelapodearrumarcoisamelhordoqueeu.Querfalarsobreregrassociais?

Bom,nolugardeondenósviemos,Moroiedampirosnãotêmrelacionamentossérios.—É,masissoétipoumaquestãodeclasse—eudisse.—Nãoéamesmacoisaque

humanosevampiros.—Talveznão,mas,comela,podemuitobemser.ElanãoéumaMoroiqualquer.

Elaéda realeza.Umaprincesa.Evocêviucomoelaé! Inteligentee fortee linda.Elaestá destinada a coisas grandiosas, e uma delas não é se envolver com um guardiãocontroverso como eu.A linhagemde sangue dela é real.Diabo, eu nem sei quemé omeu pai. Namorar Jill não é possível.A minha função é protegê-la. Mantê-la emsegurança.Énissoquetodaaminhaatençãodeveseconcentrar.— Então você acha que, em vez disso, ela merece ficar com um humano? —

perguntei,incrédula.—Dançandonolimitedeumtabuqueexisteemnossasraças?—Nãoéideal—elereconheceu.—Mas,aindaassim,elapodeterumavidasocial

divertidae...—Mas e se fosse outro cara?— interrompi.—E se outro humano a convidasse

para sair e eles simplesmente tivessem um encontro casual?Você iria achar que tudobem?Elenãorespondeu,eeuviqueaminhaintuiçãoestavacorreta.—IssoaquivaialémdevocênãosesentirdignodeJill—eudisse.—Temaver

comMicahtambém,nãotem?ÉporqueelefazvocêselembrardeMason.Eddieempalideceu.—Comoéquevocêsabedisso?—Adrianmecontou.—Desgraçado—Eddie disse.—Por que ele não é tão desencanado quanto finge

ser?Issomefezsorrir.—Vocênãodevenada aMicah.Certamentenãodeve Jill a ele.Ele não éMason,

pormaisqueosdoissepareçam.—Émaisdoqueovisual—Eddiedisse,pensativo.—Éamaneiracomoeleage

também.Micahéigual:simpático,otimista,animado.Masoneraassim.Existemmuitopoucas pessoas desse jeito no mundo: pessoas boas de verdade. Mason foi levado domundocedodemais.NãovoupermitirqueissoaconteçaaMicah.

—Micahnãoestáemperigo—eudissecomsuavidade.—Maselemerececoisasboas.E,mesmoquesejahumano,continuasendoumadas

melhores combinações que eu conheço para Jill. Elesmerecem um ao outro.Os doismerecemcoisasboas.—E,porisso,vaipermitirseuprópriosofrimentocomoconsequência?Porqueestá

tãoapaixonadoporJilleconvencidodequeelamerecealgumtipodepríncipequevocênãoé?Eporquevocêsentequeé suaobrigaçãodarapoioa todososMasondomundo?—Sacudiacabeça.—Eddie,issoéloucura.Atévocêtemqueperceberisso.—Talvez—elereconheceu.—Maspareceacoisacertaafazer.—Acoisacerta?Issoémasoquismo!Vocêestáincentivandoameninadequemgosta

aficarcomumdosseusmelhoresamigos.—Euqueroqueelasejafeliz.Valeapenamesacrificar.—Nãofazomenorsentido.Eddielançouumpequenosorrisoparamimedeuumtapinhadelevenomeubraço

antesdesedirigiraumônibusqueseaproximava.— Lembra quando você disse que não era especialista em romance? Bom, estava

certa.

27

AchoqueAdrianteriaconcordadocomqualquercoisaparaterumapartamentosódele.ElenãoperdeutempoemtransferirseuspoucospertencesparaoantigoapartamentodeKeith,para o desalento deClarence. Precisei reconhecer que fiqueimeiomal pelo senhor deidade. Ele tinha passado a gostar de Adrian, e perdê-lo logo depois de Lee foiespecialmente difícil. Clarence continuou disponibilizando sua casa e sua fornecedorapara o nosso grupo,mas se recusou a acreditar em qualquer coisa que lhe dissemos arespeitodeLee eos Strigoi.Mesmodepoisde aceitar queLee estavamorto,Clarencecontinuouculpandooscaçadoresdevampiros.Poucodepois deAdrian semudar, fui ver como ele estava.Tinhamnos informado

queo“grupodepesquisa”dosMoroi iachegarnaqueledia,eresolvemosnosencontrarcomosenviadosprimeiro,antesdeapresentarJilleEddieaeles.Comotinhaacontecidoantes,Abe aparentemente iria acompanharos recém-chegados,que incluíamSonyae anovacolegadequartode Jill.Eu tinha a impressãodeque talvezhouvesseoutros comeles,masaindanãotinhasidoinformadasobreosdetalhes.—Opa!—eudissequandoAdrianabriuaportadoapartamentoparamim.Elesóestavaláhaviapoucosdias,masatransformaçãoeraimpressionante.Tirando

atv,nãohaviasobradonenhummóveloriginal.Estavatudodiferente,eatéadisposiçãodoapartamentotinhamudado.Ascoresdadecoraçãotambémeramtodasnovasehaviaumcheiropesadodetintafrescanoar.—Amarelo,é?—pergunteiaoolharparaasparedesdasala.—O tom se chama“junco dourado”— corrigiu.—E, supostamente, é alegre e

calmante.Comeceiacomentarqueasduascaracterísticasnãoandavamjuntas,masentãoachei

que era melhor não falar nada. A cor, apesar de ser levemente detestável, tinhatransformadoa salacompletamente.Com issoeaspersianasque tinhamsubstituídoascortinaspesadasdeKeith,asalaagoraestavacheiadecoreluz,oqueajudavaemmuito

a obscurecer a lembrança da batalha. Estremeci ao me lembrar dela. Mesmo que oapartamentonãotivessesidonecessárioparaconseguiraajudadeAdrian,nãoseidizerseeuoteriaaceitadoememudadoparalá.AlembrançadamortedeLee—edasduasmulheresStrigoi—erafortedemais.—Comofoiquevocêtevedinheiroparacomprarmóveisnovos?—perguntei.Os

alquimistastinhamlhedadoolugar,masnãohaviamaisnenhumaverbaincluída.— Eu vendi as coisas antigas—Adrian disse, aparentementemuito contente.—

Aquela poltrona reclinável... — a voz dele sumiu e uma expressão de perturbaçãocruzouseurostoporuminstante.Fiqueiimaginandoseeletambémficavaselembrandoda vida deLee se esvaindo junto com seu sangue, sugado naquela poltrona.—Aquelapoltrona valiamuito dinheiro.O preço dela é um exagero de caro, até para osmeuspadrões.Masconseguio suficienteporelaparapoder substituiro resto.É tudousado,masqueopçãoeutinha?— Ficou legal— eu disse, passando a mão em um sofá xadrez estofado demais.

Ficavahorrorosocomaquelasparedes,maspareciaestarembomestado.Alémdomais,assimcomoo tomamareloberrantedasparedes, amobílianadaconvidativaajudavaaamenizar as lembrançasdoque tinha acontecido.—Vocêdeve ter feito comprasbemeconômicas. Deixe-me adivinhar: você não está acostumado a comprar muitas coisasusadas.—Fiquesabendoqueeununcatinhafeitoisso—eledisse.—Vocênãofazideiadas

coisas aqueeu tivequeme rebaixar.—Osorriso contentedelediminuiuquandomeobservoucomcuidado.—Comovocêestáindo?Deideombros.—Tudobem.Porqueseriadiferente?Oqueaconteceucomigonãoénemdelonge

tãoruimquantoascoisasporqueJillpassou.Elecruzouosbraços.—Nãosei. Jillnãoviuumsujeitosermortona frentedela.Enãovamosesquecer

queeraomesmosujeitoquequismatarvocêapenasmomentosantes,parapodervoltaraseerguerdosmortos.Essas eram coisas que definitivamente tinham ocupado demais a minha mente na

semana anterior, coisas que eu iria demorar um pouco para superar. Às vezes eu nãosentia absolutamente nada.Outras vezes, a realidadedo que tinha acontecidodesabavasobremimcomtantaforçaepesoqueeunãoconseguiarespirar.PesadeloscomStrigoitinhamsubstituídoosdoscentrosdereeducação.— Na verdade, estou melhor do que você pode imaginar — eu disse devagar,

olhando para nada em específico.—Tipo, o que aconteceu comLee e o que ele fez éterrível,mas sinto que vou superar como tempo.Mas sabe qual é a coisa em que eumaisficopensando?—Oquê?—Adrianperguntoucomgentileza.

Aspalavraspareceramsairsemomeucontrole.Eunãoesperavadizê-lasaninguém,ecertamentenãoaele.—Leetermeditoqueeuestavadesperdiçandoaminhavidaememantendodistante

daspessoas.Edaí,nomeuúltimoencontrocomKeith,elemedissequeeueraingênua,quenãoentendiaomundo.Eéverdadedecertomodo.Querdizer,nãooqueeledissesobre vocês serem do mal... mas, bom, eu fui ingênua. Eu devia ter tomado maiscuidadocomJill.AcrediteinomelhordeLee,masdeviatersidomaisprecavida.EunãosouumalutadoracomoEddie,massouumaobservadoradomundo...oupelomenoséoquegostodepensar.Masfracassei.Nãosouboanotratocomaspessoas.—Sage,oseuprimeiroerroemtudoistoédarouvidosaqualquercoisaqueKeith

Darnelldiz.Osujeitoéumidiota,umimbecilemaisumadúziadepalavrasquenãosãoadequadasparaumadamacomovocê.—Está vendo?—eu disse.—Você acabou de admitir que eu sou algum tipo de

almaintocávelepura.—Nuncadissenadaparecido—eleretrucou.—Querodizerquevocêestáléguas

acimadeKeith,equeoqueaconteceucomLeefoiumazaridiotaeridículo.Elembre-se de que nenhum de nós percebeu o que ia acontecer, não foi só você. Isso não temnenhumarepercussãosobrevocê.Ou...—assobrancelhasdeleseergueram.—Talveztenha.Você não disse que Lee pensou em matar Keith para conseguir o sangue dealquimista?—Disse...masKeithfoiemboracedodemais.—Bom, então pronto.Até um psicopata reconheceu o seu valor o suficiente para

querermataroutrapessoaprimeiro.Eunãosabiaseriaousechorava.—Issonãofazcomqueeumesintamelhor.Adriandeudeombros.—Oqueeutinhaditocontinuavalendo.Vocêéumapessoasólida,Sage.Vocêfaz

bem para os olhos, apesar de ser um poucomagra, e a sua capacidade dememorizarinformação inútil vai sem dúvida fazer algum cara se amarrar.Tire Keith e Lee dacabeça,porqueelesnãoestãonemumpoucoenvolvidosnoseufuturo.—Magra?— perguntei, torcendo para não estar vermelha.Também torcia para

parecer ultrajada o suficiente para que ele não notasse comoo outro comentário tinhamedesarmado.Fazbemparaosolhos.Nãoéexatamenteamesmacoisaquedizerqueeueraagostosuraempessoaoulindademorrer.Masdepoisdepassaravidatodavendoaminhaaparênciaserjulgadacomo“aceitável”,eraumelogioetanto—principalmentevindodele.—Sóestoudizendoascoisascomoelassão.Quasedeirisada.—É,éissomesmo.Agora,porfavor,faledeoutroassunto.Estoucansadadesse.

—Claro que sim—Adrian às vezesme enfurecia,mas eu tinha que admitir queadoravasuacurtacapacidadedeatenção. Isso tornavabemmais fácilevitarosassuntosdesconfortáveis.Oupelomenoseraoqueeupensava.—Estásentindoessecheiro?Umaimagemdoscorpospassoupelaminhacabeçae,porummomento,sóconsegui

pensarqueeleestavafalandodocheirodepodridão.Entãorespireimaisfundo.—Estousentindoocheirodatinta,e...espere...issoépinho?Elepareceuimpressionado.—Nossa,está certa.Produtode limpezacomcheirodepinho.Ou seja,eu limpei

—elefezumgestodramáticoparaacozinha.—Comestasmãos,estasmãosquenãofazemtrabalhopesado.Olheiparaacozinha.—Noquevocêusouoproduto?Nosarmários?—Osarmáriosestãoótimos.Eulimpeiochãoeapia.—Devoterparecidomais

confusadoquesurpresa,porqueeleacrescentou:—Atémeajoelhei.—Vocêusoupinhonopisoenapia?—perguntei.Opisoeradelajotadecerâmica;

apiaeradegranito.Adrianfranziuatesta.—Passei,edaí?Elepareciatãoorgulhosoporrealmenteterlimpadoalgoumaveznavidaqueeunão

tivecoragemdedizeraelequeprodutodelimpezacomcheirodepinhogeralmenteerausadoemmadeira.Lanceiumsorrisodeincentivoparaele.—Bom,estáótimo.Agoraprecisoquevocêváatéomeualojamentoparalimparo

meuquarto.Estácobertodepoeira.—Dejeitonenhum,Sage.Limparaminhaprópriacasajáéruimobastante.—Mas seráquevaleapena?Se ficassenacasadeClarence, teriaumacozinheirae

faxineiraresidente.—Com certeza absoluta, vale a pena. Eu nunca tive uma casaminha de verdade.

Meioquetinhanacorte...masestavamaisparaumdormitóriochique.Mas, isto?Istoaquiémaravilhoso.Mesmoquepreciselimpar.Obrigado.Aexpressãocômicadehorrorqueele tinhanorostoenquanto falavada limpezada

casa tinha sido substituídapor seriedade, enquanto aquelesolhos verdesme avaliavam.Derepentemesentipoucoàvontadesobseuexameemelembreidosonhodeespírito,emqueeutinhaquestionadoseosolhosdeleerammesmotãoverdesnarealidade.—Porquê?—perguntei.—Por isto... eu sei que vocêdeve ter torcido alguns braçosde alquimista.—Eu

nãotinhaditoaelequenaverdadetinharecusadooapartamento.—Eportudoomais.Pornãoterdesistidodemim,mesmoquandoeufuiomaiorimbecil.E,sabe,pelapartedetersalvadoaminhavida.Desvieioolhar.

—Eu não fiz nada. Foi Eddie... e Jill que fizeram isso. Foram eles que salvaramvocê.—Não seimuito bem se estaria vivo para o salvamento deles se você não tivesse

postofogonaquelavaca.Comofezaquilo?—Não foi nada—retruquei.—Foi só, hum,uma reação química do arsenal de

truquesdosalquimistas.Aqueles olhos me examinaram mais uma vez, pesando a verdade das minhas

palavras.Nãotenhocertezaseeleacreditouemmim,masdeixoupassar.—Bom,pelacaracomqueelaficou,asuapontariafoicerteira.Edepoisvocêlevou

otrocoporcausadisso.QualquerpessoaqueapanhaporAdrianIvashkovmerececertocrédito.Eu me virei de costas para ele, ainda tímida com o elogio — e nervosa com a

referênciaaofogo—efuiatéajanela.—Masvocêpode ficar tranquilo,porque foiumatoegoísta.Vocênão faz ideiado

sacoqueépreencherapapeladaquandoumMoroimorre.Ele deu risada, e foi uma das poucas vezes que eu o ouvi rir com humor e calor

verdadeiros—enãoporcausadealgumacoisadistorcidaousarcástica.—Certo,Sage.Seestádizendo...Sabe,vocêhojeémuitomaisespirituosadoque

quandoagenteseconheceu.— É mesmo? Com todos os adjetivos do mundo à sua disposição, você escolhe

“espirituosa”? — Suas brincadeiras eu era capaz de encarar. Desde que ele seconcentrassenaquilo,eunãoiaprecisarpensarnosignificadoportrásdaspalavrasnememcomomeucoraçãocomeçouabatersóumpouquinhomaisrápido.—Sóparavocêsaber,vocêhojeéumpoucomaisestáveldoquequandoagenteseconheceu.Eleseaproximoueparouaomeulado.— Bom, não conte para ninguém, mas acho que sair da corte me fez bem. Este

clima é um saco, mas Palm Springs pode fazer bem para mim... isso e todas asmaravilhas que tem aqui.Vocês.Aulas de arte. Produto de limpeza com cheiro depinho.Nãoconsegui segurarumsorrisoeolheiparaele.Euestava fazendopiada,masera

verdade:eletinhamudadodemaneiranotáveldesdequetínhamosnosconhecido.Aindahavia um homem que sofria lá dentro, que carregava as cicatrizes daquilo queRose eDimitritinhamfeitocomele,masdavaparaverossinaisdemelhora.Agoraeleestavamais firme e mais forte, e se conseguisse continuar nos trilhos, sem crises por umtempo,umatransformaçãonotávelpoderiaacontecerdeverdade.Demorou vários segundos de silêncio para que eu percebesse que estava olhando

fixamenteparaele,enquantoaminhamenteteciaessespensamentos.E,naverdade,eleolhavafixoparamimtambém,comumardeencantamento.—MeuDeus,Sage.Osseusolhos.Comofoiqueeununcarepareineles?

Aquelasensaçãodesconfortávelseespalhavapormimmaisumavez.—Oquetêmeles?—Acor—eledissesemfôlego.—Quandovocêficanaluz.Elessãofantásticos...

comoouroderretido.Eupoderiapintá-los...—eleestendeuamãonaminhadireção,masentãorecuou.—Sãolindos.Vocêélinda.Algonamaneiracomoeleolhavaparamimmeparalisouefezomeuestômagodar

cambalhotas,masnão sabiadeduzirexatamenteporquê.Só sabiaqueelepareciaestarmeenxergandopelaprimeira vez... e aquilome assustou.Conseguia deixarpara lá oselogios fáceis e engraçadinhos dele, mas aquela intensidade era algo completamentediferente, algo a que eu não sabia como reagir. Quando ele olhou para mim daquelejeito,euacrediteiqueeleachavaosmeusolhosbonitos—queeuerabonita.Aquiloeramaisdoqueeuestavaprontaparaouvir.Semjeito,deiumpassoparatrás,paralongedosol,comanecessidadedemeafastardaenergiadoolhardele.Eutinhaouvidodizerqueoespíritopoderiaenviá-loatangentesestranhas,masnãofaziaideiaseeraisso.Fuisalvadaminhatentativaparcadedarformaaalgumcomentárioespertinhoquandoumabatidanaportanoscausouumsobressalto.Adrianpiscou,eumpoucodaquelaconexãosedesfez.Oslábiosdelesetorceramem

umdeseussorrisinhosmaliciososefoicomosenadadeestranhotivesseacontecido.—Estánahoradoshow,hein?Assenti, agitada comumamistura confusa de alívio, nervosismo e... animação. Só

não sabia se os sentimentos tinham sido causados porAdrian ou pelos visitantes quechegavam.A única coisa que eu sabia era que de repente consegui respirar commaisfacilidadedoquealgunsmomentosantes.Ele atravessou a sala e abriu a porta com um floreio. Abe entrou esvoaçante,

resplandecentecomumternocinzaeamareloquecombinavademaneiradesconcertantecomapinturadeparededeAdrian.UmsorrisoenormeseabriunorostodoMoroimaisvelho.—Adrian,Sydney...comoéadorávelvê-losdenovo.Acreditoqueumdevocêsjá

conheçaestamocinha,não?—Elepassoupornóserevelouumagarotadampiramagra,comcabelocastanhoavermelhadoeolhosazuisgrandescheiosdedesconfiança.—Olá,Angeline—eudisse.Quandome disseramqueAngelineDawes iria ser a nova colega de quarto de Jill,

achei que era a coisa mais ridícula que eu já tinha escutado.Angeline fazia parte dosconservadores,umgruposeparatistadedampiros,humanoseMoroiqueviviamjuntosnasflorestasdaVirgíniaOcidental.Elesnãoqueriamsaberda“civilização”denenhumadas nossas raças e tinham diversos costumes bizarros, não sendo o pior deles suaabomináveltolerânciaarelacionamentosinter-raciais.Depois,quandopenseimelhor,chegueiàconclusãodequeAngelinetalveznãofosse

umaescolhatãoruim.ElatinhaamesmaidadequeJill,provavelmenteirialheoferecer

umaconexãomaispróximadoqueeueracapazdedar.Angeline,apesardenãotersidotreinadadamesmamaneiraqueumguardiãocomoEddieera,detodomodoseriacapazdesedarbememumabriga.SealguématacasseJill,teriammuitotrabalhoparapassarporAngeline. E com a aversão que o povo deAngeline tinha em relação aos Moroi“maculados”,elanãoteriamotivoparadarapoioàpolíticadequalquerfacçãorival.Mas,enquantoeuaobservavacomsuasroupasgastas, fiqueipensandoemcomoela

iria se adaptar a ficar longe dos conservadores. Ela tinha uma expressão arrogante norosto que eu tinha visto quando visitara sua comunidade, mas aqui ela ficava menosacentuada, por causa do nervosismo, enquanto ela ia absorvendo a casa deAdrian.Depoisdepassar a vida todamorandona floresta, aquele apartamentinho com sua tv eseusofáxadrezprovavelmenteeraoaugedoluxomoderno.—Angeline—Abedisse.—EsteaquiéAdrianIvashkov.Adrianestendeuamãoeligouseucharmenatural.—Prazer.Elaapertouamãodeledepoisdehesitarporummomento.—Prazeremconhecer—eladissecomseuestranhosotaquedosul.Elaoexaminou

durantemaisalgunssegundos.—Vocêparecebonitodemaisparaserútil.Eu não conseguime segurar e engoli em seco.Adrian deu risada e apertou amão

dela.—Palavrasmaisverdadeirasjamaisforamditas—elefalou.Abedeuumaolhadaemmim.Eudeviaestarcomumaexpressãodeterrornorosto,

porque já estava imaginando o controle de danos que precisaria efetuar seAngelinedissesseoufizessealgocompletamenteerradoemAmberwood.—Sydneysemdúvidavaiquerer...orientarvocêarespeitodoqueesperarantesque

comecenaescola—Abedisse,diplomático.—Semdúvida—repeti.AdriantinhaseafastadodeAngeline,mascontinuavasorrindo.—DeixemqueaChavedeCadeiafaçaisto.Melhorainda,deixemparaCastile.Vai

serbomparaele.Abe fechou a porta, mas não antes que eu desse uma olhada atrás dele, para o

corredorvazio.—Não são sóvocêsdois,nãoémesmo?—perguntei.—Ouvidizerquehaveria

outros.Sonyaéumdeles,certo?Abeassentiu.— Eles já vêm. Estão estacionando o carro. Émuito difícil estacionar na rua por

aqui.Adrianolhouparamim,atingidoporumarevelação.—Ei,eutambémvouherdarocarrodeKeith?—Acreditoquenão—eudisse.—Eradopaidele,quepegoudevolta.

Adrianficoucomacaranochão.Abe enfiou as mãos nos bolsos e caminhou pela sala como quem não quer nada.

Angelinepermaneceuondeestava.Achoqueaindaestavaavaliandoasituação.—Ah, sim —Abe refletiu. — O finado e grande sr. Darnell.Aquele garoto

realmente foi acometido por tragédias, não émesmo?Que vida dura.—Ele fez umapausa e se voltouparaAdrian.—Mas você, pelomenos, parece ter se beneficiadodaruínadele.—Opa—Adriandisse.—Eumereci isso,portantonãovenha fazer comqueeu

mesintamalportersaídodacasadeClarence.Seiquevocêqueriaqueeuficasseláporalgummotivoesquisito,mas...—Deucerto—Abedissecomsimplicidade.Adrianfranziuatesta.—Hã?—Você fezexatamenteoqueeuqueria.Eudesconfiavaquehaviaalgodeestranho

acontecendocomClarenceDonahue,queelepodiaestarvendendooprópriosangue.Euachavaquetervocêporpertoiriadesvendarocaso.—Abemassageouoqueixodaquelejeitodequemtemamentecheiadetramoias.—Claroqueeunãofaziaideiadequeosr.Darnell estivesse envolvido.Nemachava que você e a jovemSydney iriam se unirparadesvendartudo.—Eunãoiriaassimtãolonge—disse,seca.Umpensamentoestranhomeocorreu.

—Porquevocê iria se incomodar seKeitheClarenceestivessemvendendo sanguedevampiro?Querdizer,nós,os alquimistas, temosmotivosparanãodesejar isso...masporquevocêsesentiriaassim?Um brilho de surpresa passou pelos olhos deAdrian, seguido pela iluminação. Ele

examinouAbecomcuidado.—Talvezporqueelenãoqueiraconcorrência.Meu queixo quase caiu.Não era segredo para ninguém, nempara alquimistas nem

paraMoroi, queAbeMazur fazia tráficodebens ilegais.O fatode ele vender grandesquantidades de sangue de vampiro para humanos que desejassem a mercadoria nuncatinhameocorrido.Mas,aoexaminá-lodemaneiramaisprofunda,percebiquedeviaterpensadonisso.—Ora,ora—Abedisse,semsuarnemumpouquinho.—Nãoprecisamostocar

emassuntosdesagradáveis.—Desagradáveis?—exclamei.—Sevocêestáenvolvidoemalgoque...Abeergueuamãoparamedeter.—Basta, por favor. Porque se esta frase terminar com você dizendo que vai falar

comosalquimistas,então,porfavor,traga-osaquiparaquepossamosdiscutirtodotipodemistério.Digamos,porexemplo,comoosr.Darnellperdeuoolho.Fiqueiparalisada.

—ForamStrigoiquearrancaram—Adriandisse,impaciente.—Ah,porfavor—Abedissecomumsorrisotorcendoseuslábios.—Minhaféem

você acabou de ser restaurada. Desde quando Strigoi aleijam alguém de maneira tãoprecisa?Efoiumaleijamentomuitoartístico,devoacrescentar.Nãoquealguémjamaistenhanotado.Umtalentodesperdiçado,voulhesdizer.—Doqueestá falando?—Adrianperguntou, estarrecido.—Não foramStrigoi?

Estádizendoquealguémarrancouoolhodeledepropósito?Estádizendoquevocê...—ele não encontrou as palavras, e simplesmente ficou olhandodemimparaAbe e vice-versa.—Éisso,nãoé?Seusmalditosacordos.Masporquê?Eumeencolhi todaquando trêsparesdeolhos se fixaramemmim,masnãohavia

como reconhecer as peças queAdrian estava começando a encaixar.Talvez eu pudessecontarparaeleseestivéssemossozinhos.Talvez.MaseunãopodiacontarparaelecomAbe com aquele ar de tanta arrogância, e certamente não com uma forasteira comoAngelinealiparada.Nãopodia contar aAdriancomo tinhaencontradoaminha irmãCarly alguns anos

atrás,depoisdeumencontrocomKeith.Foiquandoeleaindaestavamorandoconoscoelogo antes de ela ir para a faculdade. Ela não queria sair com ele, mas o nosso paiadoravaKeithetinhainsistido.Keitheraogarotodosolhosdeleejamaispoderiafazeralgoerrado.Keithtambémacreditavanisso,efoiporissoquenãoconseguiuaceitarum“não” como resposta quando ele e Carly ficaram sozinhos. Ela me procurou depois:esgueirou-separaomeuquartotardedanoiteeficouchorandoenquantoeuaabraçava.A minha reação instantânea era contar para os nossos pais, mas Carly ficou com

muitomedo—principalmentepor causadonossopai.Eu era nova e fiquei quase tãoassustadaquantoela,prontaparaconcordarcomqualquercoisaqueelaquisesse.Carlytinhamefeitoprometerquenãoiacontarparaosnossospais,por issodediqueitodoomeu esforço para garantir a ela que não tinha culpa. Durante todo o tempo, ela medisse,Keith ficou lhedizendocomoela era linda e comonãodeixava escolhapara ele,que era impossível tirar os olhos dela. Eu finalmente a convenci de que ela não tinhafeitonadadeerrado,quenãootinhaencorajado—masaindaassimelamefezmanterapromessadequeficariaemsilêncio.Foi um dosmaiores arrependimentos daminha vida. Eu detestava omeu silêncio,

masnãotantoquantodetesteiKeithporacharquepoderiaestuprarumapessoatãodocee gentil quanto Carly e sair impune. Foi só bem mais tarde, quando recebi a minhaprimeiramissãoeconheciAbeMazur,quepercebiquehaviaoutrasmaneirasparaKeithpagarpeloquehavia feitoe aindaassimeupodermanter aminhapromessa aela.Porisso, fiz o meu acordo com o diabo, sem me importar que aquilo me deixariacomprometida—nemquesignificariamerebaixaraníveisbárbarosdevingança.Abetinhaencenadoumataque falsodeStrigoiearrancadoumolhodeKeithnocomeçodoano.Emtroca,eutinhametransformadoemumaespéciede“alquimistacontratada”de

Abe.Emparte,eraporissoqueeutinhaajudadoRoseafugirdacadeia.Eutinhaumadívidacomele.Emcertos aspectos, refleti comamargor, talvez eu tivesse feitoum favor aKeith.

Com um olho apenas, talvez ele não achasse tão“impossível” ficar afastado de moçasinteressantesnofuturo.Não,eucertamentenãopodiacontaraAdriannadadisso,maseleaindaolhavapara

mim com um milhão de perguntas no rosto enquanto tentava entender o que raiospoderiatermelevadoacontratarAbecomomercenário.As palavras de Laurel de repente me voltaram: Sabe, às vezes você pode ser

assustadoracomoodiabo.Engoliemseco.—Lembraquandovocêmepediuparaconfiaremvocê?—Lembro...—Adrianrespondeu.—Precisoquefaçaamesmacoisapormim.Longosmomentos se seguiram.Não conseguia olhar paraAbe porque eu sabia que

eleteriaumsorrisomaliciosonoslábios.— “Espirituosa” foi meio que uma palavra leve —Adrian disse. Depois de um

tempoquepareceuumaeternidade,eleassentiudevagar.—Certo.Euconfioemvocê,sim,Sage.Confioquevocêtembonsmotivosparaascoisasquefaz.Elenão falava comzombarianemsarcasmo.Estava sendo absolutamente sinceroe,

porummomento,fiqueimeperguntandocomoeutinhaconseguidoganharaconfiançadele demaneira tão intensa.Tive um flashback estranho dosmomentos logo antes deAbechegar,quandoAdriantinhafaladosobremepintareosmeussentimentosficaramtodosconfusos.—Obrigada—eudisse.—Doqueéquevocêsestãofalando?—Angelinequestionou.—Nadadeinteressante,garanto—Aberespondeu.Elerealmenteestavaapreciando

demais tudo aquilo.— Lições de vida, desenvolvimento de caráter, dívidas que nãoforampagas.Essetipodecoisa.—Quenão forampagas?—Surpreendiamimmesmaaodarumpassoà frentee

olharmuitofeioparaele.—Eupagueiaqueladívidacemvezes.Nãodevomaisnadaavocê.Agora aminha lealdadeé apenas aos alquimistas.Nãoavocê.Onossocasoestáterminado.Abe ainda sorria,mas vacilou de leve.Acho que o fato de eume defender o tinha

pegadodesurpresa.—Bom, issoéoqueainda...ah.—Maisbatidasnaporta.—Eisaquiorestodo

nossogrupo.Eleseapressouatéaporta.Adriandeualgunspassosnaminhadireção.

—Nadamal,Sage.AchoquevocêacaboudeassustarovelhoMazur.Sentiumsorrisocomeçaraseformaremmeuslábios.—Nãoseiseissoéverdade,masatéquefezeumesentirbem.—Vocêdeviaconfrontaraspessoascommaisfrequência—eledisse.Nóstrocamos

sorrisos e ele me olhou com carinho; senti a mesma sensação enjoativa de antes. Eleprovavelmente não estava com a mesma sensação, mas havia algo fácil e alegre nele.Raro—emuitoatraente.EleapontoucomacabeçaparaondeAbeabriaaporta.—ÉSonya.Osusuáriosdeespíritoeramcapazesdepressentirunsaosoutrosquandoestavamem

proximidade suficiente, mesmo atrás de portas fechadas. E, claro, quando a porta seabriu,SonyaKarpentroupisandofirmefeitoumarainha,altaeelegante.Comocabeloruivopreso emumcoque, aMoroi poderia ser a irmãmais velha deAngeline. Sonyasorriupara todosnós, apesarde eunãopoderdeixar de estremecer aome lembrardaprimeiravezemquea tinhavisto.Naépoca,elanãopareceutãobonitaeencantadoraquantoagora.Estavacomosolhosvermelhosetentounosmatar.SonyaeraumaStrigoiquetinhasidorestauradaaMoroi,eporissorealmenteeraa

escolha idealpara trabalharcomAdrianedescobrircomousaroespíritopara impedirqueaspessoasfossemtransformadas.Sonya abraçouAdrian e estava caminhando naminha direção quando alguémmais

apareceu à porta. Pensando bem, eu não devia ter me surpreendido com quem era.Afinal de contas, se queríamos descobrir qual era amagia de espírito especial emLeequetinhaimpedidoqueelefossetransformadomaisumavez,entãoiríamosprecisardetodos os dados possíveis. E se ter uma Strigoi restaurada era bom, ter dois era aindamelhor.Adrian empalideceu e ficou totalmente imóvel enquanto olhava fixo para o recém-

chegadoe,naquelemomento, todasasgrandesesperançasqueeutinhaparaelevieramabaixo.Antes, eu havia tido certeza de queAdrian simplesmente seria capaz de ficarlongedeseupassadoedosacontecimentostraumáticosdele,queseriacapazdeencontrarmotivaçãoesefirmar.Bom,pareciaqueseupassadootinhaencontrado,eseissonãosequalificava como acontecimento traumático, não sabia o que poderia se encaixar nessacategoria.O novo parceiro de pesquisa deAdrian entrou porta adentro e eu vi que a paz

desajeitada que tínhamos acabado de estabelecer em Palm Springs estava prestes a sedesfazer.DimitriBelikovhaviachegado.

CORTESIADEMALCOMSMITHPHOTOGRAPHY

RICHELLEMEAD nasceu emMichigan, mas atualmente mora em Seattle, nosEstadosUnidos.Éautoradediversosbest-sellersdefantasiaparaadultosejovens,entre eles a aclamada série Academia de Vampiros, e seus livros já foramtraduzidosparamaisdedozelínguas.Alémdeescritora,Richelleéleitoraassíduaeadoramitologia e humor.Quando não está escrevendo, gosta de passar o tempocomafamília,viajarecomprarvestidos.