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Franz Boas
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Colet;:ao Franz Boas ANTROPOLOG[A SOCIAL
dire tor: Gilberto Velho
o RISO E 0 RISIVEl
Verena Alberti
ANTROPOLOGI/\ CULTURAL
franz Roas
o EspiRITO MlliTAR
EvoLucloNlslv1o CUIJUlV\l
Os MlliMRES E ,\ REPUBLICA
Celso Clstro
DA VIDA NERVOSA
LUIZ fern,mdo Du,Hte
BRUMRIII, ORACUIOS L MACI/\
ENTRE os AZANDf
LE. EV:1I1s- Pritchard
GIIROTIIS DE F'ROCRAIv1!\
Maria Dulce G,lsp,n
Nov!\ LU2 sonlu .\ ANTl\lWllLOCI/\
OIJSERV/,NDO 0 [S[;\
Clifford Geertz
o CIY! II)I,,\N() (],\ PULl II'. ;\
Karina Kuschnit
CUITLJRA: LJM CO',("II 0
AN lllCWOI OCICO
Roque de Barl'lls LnCli'l
AUTORID;\IJI & AI ITO
Myr'lillll Lins de !\:IITO,S
GlJ[ 1\1\,\ (1[. OFI,\/\
Yvonne ivLl''''le0~
A TEO RIA VIVIDA
Marizil Peir,lno
CULTURA E MZAO PRATICA
ILH;\S Of HIST6RIA
HIST6RIA I' CULTURA
Marsh,l11 Sahlins
Os MANDARINS MILAGROSOS
Elizabeth Travassos
ANTROPOLOGIA URBAN,\
DESVIO E DIVERCE,NCIA
[NDIVIDUI\lIS~IO E CUITLJI1A
PROIETO E METMloRFosE
RIO DE JAi'JEIRO: CULTUIV\, POLITICA
I' CONfUTO
SU~JETlVIDADE I'SOClCDADE
A UTOPI,\ UR8!\N!\
Gi/berto Velho
PESQUISAS URI1ANIIS
Gilberto Velho e Karina Kuschnir
o MUNDO FUNK C'RIUU,
o M,SIEI\IO DO S'\,\IB,\
Ilcrillano Vianna
BUtYll/\ DA SII-'!f\:
PllOIJlJTO DO MORRO
Letici'l ViannCl
o IvluNDO LM ASTrlOl,OCIA
Luis I~odolro Vilhenil
S()CII:Di'\fJ!. [)[ ESQUIN;\
Willi,1I11 Foote Whyte
Antropologia Cultural
Textos selecionlldos, apresentac;:ao c traduc;:Jo:
Celso CaStl"o
4Q edi~ao
~'AJ';: v; l\~/8
y ,-\ ~ ,,' (' ~~ I
( (/':, ;/lAHAR Jorge Zahar Eelitot
Rio de Janeiro
~
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SUMARIO
Copyright da sele<;<io de textos e apresC!1t,[<;ao © 2004, Celso Castro
COI,yrighl ciesla edi<;<lo <D 2008: Jorge Zahar Eclitor Ltda. rua M~xico 5 \ sobrcloja
20051-144 Rio cle Janeiro, RJ leI.. (21) 2108-0808/ f"x (21) 2108-0800
e-mail: jzec<"zahar.coJ1].br site: www.zahar.c0111.br
Todos os direitos reservados. A reprodu<;ao nao-autorizada desta publica<;ao, no todo
ou em parte, constitui viola<;<io de direitos autorais. (Lei 9.610/98)
Edi<;()es anteriores: 2004, 2005, 2006
Capa: Valeria l'-laslausky Foto da capa: Franz Boas representando a dal1<;a do espirito caniba!' parte de
uma cerime'ni" cia sociedade secreta Hamatsa, dos indios Kwakiutl (Vancouver, Canad<i). A foto Coi tiracla para servir de modclo ao escultor de um diorama emtama
nho natural. exibido no United States National Museum em J895. Copyright © National Anthropological Archives, Smithsonian Instilution/IvlNll 8304.
CIP-Brasil. CllalogJ<;,jo-na-fonte Sinclica[o Nacional dos Editores de Livros, R).
Boas. han!.. 18'i8-1 CJ42 13634,[ !\nlrujlo[ogi" eultur,rl / rran? Boas: IraelU\;<io Cels() Ca.stro
- c1.eel. - Rio ell' Janeiro: Jori!c Zahar Ed .. 2007 (/\nlrtl[1o!oi!ia social)
ISlll" 'J7SS'i7110-7()O-1
1:i,1llI"gi;l..' ;\nlm[1ologia. I. Castro, Cclso. 19('.'-.11. Tilll[ll. Ill. Sel'le.
CD[): ,0 I CUU:Jlh
~
7 Apresel1t(/~(jo, Celso Castro
25 As limitayoes do metodo comparativo
da antropologia, 1896
41 Os metodos da etl1ologia, 1920
53 Alguns problemas de metodologia
nas cicncias sociais, 1930
67 Raya e progresso, 1931
87 Os objetivos da pesql1isa antropo16gica,1932
F=1'
...._ '.., 'lllill~~~~ilW·Q~'Il _~.('?.<f'f;,,"'~~~
66 Antropologia CU Itural
antropologia moderna reside, a meu ver, na enfase exagerada que
da a reconstruc;:ao hist6rica - cuja importancia nao deveria ser
minimizada - como algo oposto a um estudo aprofundado do
individuo sob a pressao da cultura em que e1e vive.
~Mi~J~•• I • ., 00.3' a__ J!I ,.1IiI'ilQbJ..~dl•• 1' ~ItlJllilln_.i1'il1!.loIIl ••' ..·.d.ul~~........
I-"~--"-~
Rac;a e progresso4
1931
Permitam-me chamar atenc;:ao para os aspectos cientificos de um
problema que ha muito tem agitaclo nosso pais e que, pclas suas
implicac;:oes sociais e economicas, tern suscitado fortes reac;:oes
emocionais e produzido diversos tipos de lei. Refiro-me aos pro
blemas surgidos com a mistura de tipos raciais.
Se desejamos adotar uma atitude sensata, enecessario sepa
rar claramente os aspectos biol6gicos e psicol6gicos das implica
c;:oes sociais e economicas da questao. Mais ainda, a motivac;:ao
social daquilo que esta acontecendo precisa ser examinada, nao
do estrito ponto de vista de nossas condic;:oes presentes, mas de
urn angulo mais amplo.
Os fatos com os quais estamos lidando sao diversos. 0 siste
ma de plantatioll do sui dos Estados Unidos trouxe para 0 pais um
grande contingente de populac;:ao negra. Consideravcl mistura
ocorreu entre senhores brancos e mulheres escravas durante 0
periodo da escravidao, de forma que 0 numero de negros puros
foi diminuindo continuamente, e a populac;:ao de cor tomon-se
gradnalmente mais clara. Houve tambcm uma certa mistura en
tre brancos e indios, mas, nos Estaclos Unidos e no Canada, iS50
nunca se den nnm gran suficiente para transfonnar cssa mistura
nnm importantc fen6meno social. Com 0 aumcnto da imigrac;:ao,
.1 Confercncia proferida no encontro da American Associ,ltioll for the
Advancement of Science, Pasadena. 15.6.1931. Franz Boas csLl\'a entao
assumindo a presidcllcia da associa~iio. [~,T]
67
68
~~.~_""",,·· .....l;
Antropologia cultural
~Im contingenle populacional do suI e do lcstc da Europa viu-se atraida para os Estados Unidos e atualmente comp6e uma im
portante parecla de nossa popuJa~ao. Esses migrantes diferem
entre si segundo alguns tipos, embora os eontrastes raciais entre
des sejam muito menores do que os existentes entre indios, ne
gros e brancos. Outro grupo cbegou ao nosso pais com a imigra~ao do Mexico e das Antilbas, parte dcles de descendencia sul-eu
ropeia, parte de descendeneia negra ou india misturada. A to
dos devem-se aclieionar grupos chineses, japolleses e filipinos,
que exercem um papd particularmente importante na costa do
Pacifico.
o primeiro ponto em rela~ao ao qual necessitamos de esclarecimento refere-se ao significado do termo ra~a. No linguajar
comum, quando falamos de uma ra~a, queremos denotar um
grupo de pessoas que tem em eomum algumas carClcteristicas
corporais e talvez tambclll mentais. Os brancos, com a pele clara,
os cabelos lisos ou ondulados e narizes afilados, sao uma ra~a
claramente distinta dos negros, com a pelc escura, cabelos cres
pos e narizes achatados. Em rela~ao a esses tra~os, as duas ra~as
sao fundamentalmente distintas. Nao tao definida e a distin~ao
entre tipos asiAticos orientais e curopeus, porque ocorrem for
mas de transi~ao entre individuos brancos normais, tais como
rostos acbatados, cabdos negros lisos e formato dos olllOs p;1recidos com os dos tipos asiMicos orientais; inversamente, tra~os de
tipo europeu sao encontrados entre asiMicos orientais. Em rel;1
~ao a negros e brallcos, podemos falar de tr;1~os r;1ciais heredit,f
rios, amedida que nos rcferirmos a essas caracteristicas radic;11
mente distintas. Em rcla~ao aos braneos e asiMicos orientais, a
difcren~a nao e tao absoluta, porque podem ser encontrados alguns poueos individuos em cada uma dessas ra~as aos quais
essas caraeteristicas raciais nao se aplicam bem; pOl' isso nao cabe falar, em sentido estrito, de trac;:os raciais hereditirios to
talmentc dlic!os.
Ra<;a e progresso 69
Essa condi~ao prevalcce numa extensao muito mais mareante entre as diferentes ra~as assim chamadas europeias. Estamos acostumados a nos referir aos escandinavos como altos, loiros e de olhos azuis; a um Italiano do sui como baixo, moreno e de olhos escuros; a um boemio como de porte medio, olhos marrons ou etnzentos, rosto largo e cabelos lisos. Estamos aptos a construir tipos idea is locais baseados em nossa experiencia cotidiana, abstraidos a partir de uma combina~ao de formas mais freqiicntemente vistas numa dada localidade, enos esqueccmos de que ba inllmeros individuos para os quais essa descri~ao nao c verdadcira.
Seria um empreendimento temerario determinar a localidade na qual a peSSO;1 nasceu unicamente a partir de suas carac
I terlsticas corporals. Em muitos casos, podemos scr auxiliados em t;11 proposito pOl' maneiras de arrumar 0 cabelo, mancirismos peculiares de movimentos e pela indumentaria, mas esscs tra~os
nao devon ser tomados de forma equivocada como essencialmente hereditarios. Nas popula~6es de v,fri,ls partes da Europa encontram-se muitos individuos que podem tao bem pertencer a uma parte do continente quanto a outra. Nao h,l verdade na alcga~ao tantas vezes formulada de que dois ingleses se assemclham mais em formas corpora is entre si do que, digamos, um Ingles e um alemao. Vm maior nllmero de formas pode se eluplicar na area mais restrita, mas formas similares poelem ser encontradas por todo 0 continente. Ha uma sobreposi~ao de formas corporais entre os grupos locais.
Nao cjustificavel supor que individuos que nao se cncaixem no tipo ideal local, que se constr6i a partir ele impressocs gerais, sejam elementos estrangeiros a essa popula~ao, e que sua presen~a sempre se deva amistura com tipos alienigcnas. Uma caracteristica fundamental de todas as populac;6es eque os indivlduos diferem entre si, e um estudo mais detalhado mostra que isso c valido tanto para os animais quanto para as homcns. Nesses casos, nao C portanto apropriado falar de trac;os herediUrios no
70
-'~i~:!-~
Amropologia cultural
tipo racial como urn todo, pois muitos de!es tambem ocorrem em outros tipos raciais. Tra~os raciais hereditarios deveriam ser com
partilhados pOl' toda uma popula<;ao, para que se pudesse real~a
los em contraposi~ao a outras popula~6es.
o assunto e bem diferente quando os individuos sao estuda
dos como membros de suas pr6prias linhagens familiares. Hereditariedade racial implica necessariamente a existenci:l. de unidade de descendencia e a existencia, numa certa epoca, de urn pequeno nllmero de ancestrais de formas corporais definidas, dos
quais a popula~ao atual descende. Epraticamente impossive! reconstruir essa ancestralidade pelo estudo de uma popula<;ao moderna; mas muitas vezes e possivel 0 estudo de fa1l1ilias que se estendem pOl' varias gera~6es. Sempre que cle foi realizado, descobrimos que as Ilnhagens familiares representadas Duma dada popula~ao diferem muito entre si. Em comunidades isoladas, nas quais as mesmas familias casaram entre si pOl' varias gera<;6es, as
diferen~as sao menores do que entre comunidades m~lis amplas. Podemos dizer que cada grupo racial consiste de muitas linhagens familiares que sao distintas em formas corporais. Algumas dessas linhagens estao duplicadas em territorios vizinhos; e,
quanto mais duplica~ao existe, menor e a possibilidade de falarmos de caracterfsticas raciais fundamentais. Essas condi<;6es sao
tao manifestas na Europa, que tudo 0 que podemos fazer e estu
dar a freqi.iencia de ocorrencia de varias linhagens familiares pOl' todo 0 continente. As diferen<;as entre as linhagens familiares
pertencentes a cada {uea mais ampla sao muito maio res do que as
diferen~as entre as popula~6es como um todo. Embora nao seja necess,lrio considerar as grandes diferen
~as de tipo que ocorrem numa popula<;ao como fruto da mistura de diferentes lipos, c facil perceber que a mistura desempenhou um papcl importante na hist6ria das popula<;6es modernas. Recordemos as migra~(ies que ocorreram em tempos antigos na Europa, quando os ccltas da Europa ocidental espalharam-se pela ItMia e, no sen lido leste, atc a Asia Menor; quando as tribos teu
Ra~a e progresso 71
tonicas migraram do mar Negro em dire<;ao oeste, para a Italia, a
Espanha e mesmo para 0 norte da Africa; quando os eslavos expandiram-se na dire<;ao nordeste, sobre a Rllssia, e no sentido suI, sobre a peninsula dos I3alcas; quando os mouros ocuparam uma
grande parte do. Espanha; quando os escravos gregos e romanos desapareceram em meio a popula~ao gel'al; e quando a coloniza<;ao ramaDa atingiu uma grande parte da regiao mediterranea. E interessante observar que a grandeza espanhola sucedeu 0 periodo de maior mistura racial, e que seu declinio come~ou quando a popula<;ao tornou-se estave!, e a imigra<;ao foi interrompida. Isso deveria fazer com que parassemos para pensar, antes de falar sobre os perigos do. mistura de tipos emopeus. 0 que esta acon tecendo hoje no. America do Norte c uma repeti<;ao, em maior esca10. e num periodo de tempo menor, daquilo que ocorreu na Europa durante os seculos em que os povos da Europa setentrional ainda nao estavam firmemente assentados sobre 0 solo.
Isso nos leva a cOl1Siderar qual pode SCI' 0 efeito biol6gico da mistura de diferentes tipos. Muita 1m se tem lan<;ado sobre essa questao pOl' meio do estudo intensivo do fen6meno da hereditariedade. Everdade que somos limitados, no estudo do. hereditariedade humana, pela impossibilidade de experimenta<;ao, mas podemos aprender muito com a observa<;ao e a aplica~ao de estudos sobre hereditariedade em animais e plantas. Um fato se des
taca claramente: quando dois individuos sao acasalados, geram uma numerosa prole e, aJem disso, nao existe um fator ambiental
perturbadoI', entao a distribui~ao de diferentes formas na prole e determinada pebs caracteristicas genc'ticas dos pais. Aqui nao nos interessa 0 que po de acontecer apos milhares de gera~oes.
Nossas observa<;6es precedentes a respeito das caracterfsticas de tipos locais rnostram que acasalamentos entre individuos essencialmente diferentes em tipo genetico devem oconeI' mesmo na popula<;ao mais homogenea. Caso se pudesse mostrar, como as vezes se pretende, que a descendencia de individuos de propor<;6es corporais decididamente distintas }lode resultar na
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.":":~
72 Antropoiogia cu Itural
quilo que se tem chamado de car{lter desarmonico, isso deveria ocorrer com consideravd freqliencia em toda populayao, pois encontramos, digamos, individuos com mandibulas e dentes grandes e outros com mandibulas c dentes pequenos. Supondo que, na descendencia mais recente, essas combinayoes possam resultar numa combinayao de pequenas mandibulas e dentes grandes, enUlO teriamos l\ma desarmonia. Nao silbemos se isso de filtO ocone; estou merill11ente exemplificando a linha de racioclnio. Nos acasabmentos entre varios gntpOS europeus essas condiyoes nao se alterariam significativamente, embora diferenyds maiores entre pais pudessem ser mais freqllentes do que numa populayao
hOl1logenea. A quest,\o essencial a ser respondida e se temos qualquer
evidencia que indique que os acasdlamentos entre individuos de descendencia e tipos diferentes resultariam numa prole menos vigorosa do que a de scm ancestrais. Nao tivemos nenhuma
oportunidade para observar qualquer degenerdyao no homem que se deva c1aramente a essa caUSd. Pode-se demonstrar que d alta nobreza de todas as partes da Europa c de origem muito misturada. Populayoes urbanas da Franya, Alemanha e ltalia sao derivadas de todos os distintos tipos europem. Seria diffeil mostrar que qualquer degenerayao que pl\desse existir entre des pode ser atribuida a urn efeito malefico do interacasalamento. A dege
neray''1.o biol6gica c mais facilmente encontrada em pequends regioes com intensa endogamia. Aqui nOVdmente nao se trata tanto de l\ma questao de tipo, mas da presenya de condiyoes pato16gicas nas estirpes familiares, pois sabemos de varias comunidades intel1samente endogamicas que sao perfeitamente saudaveis e vigorosas. Elas sao encontradas entre os esquim6s e tambem entre muitas tribos primitivas nas quais 0 casamento com primos e prescrito pdo costume.
Essas observayoes nao to cam no problema do deito sobre a forma corporal, a saude e 0 vigor dos descendentes de casamentos entre rayas que sao biologicamente mais distintas do que os
Ra~a e progresso 73
tipos europeus. Nao c tao facil fornecer evidcncia absolutamente conc1usiva a respeito dessa questao. !ulgando-se meramente com base em caracteristicas anatomicas e condiyoes de sallde de populayoes misturadas, nao parcce haver razao alguma para Sllpor resultados desfavoraveis, tanto nas primeiras quanta nas mais recentes gerayoes da prole. Os descendentes mestiyos de emopeus e indios norte-americanos sao mais altos e mais ferteis que os indios puro- sangue. Sao mais 011 tos ainda que as rayas de seus pais. Os mestiyos de holandeses e hotento tes do suI da Africa e os mestiyos malaios da ilha de Kisar sao de tipo intermediario entre as duas rayas e nao exibem qualquer trayo de degenerayao. As popu
layoes do Sudao, misturas de tipos negr6ides e mediterraneos, tern sempre se caracterizado por grande vigor. Tambcm resta pouca dLlvida de que na RLlssia oriental ocorreu uma consideravel infmao de sangue asiatico. As observayoes sobre nossos mulatos norte-americanos nao nos convencem cia existcncia de qualquer efeito ddeterio de mistura racial que seja evidente na forma e funyao anatomicas.
Tambem e preciso lembrar que em ambientes variaveis as formas humanas nao sao de forma alguma estaveis, e que muitos trayos anat6micos corporais estao sujeitos a uma limitada quanticlade de modificayoes conforme 0 c1ima e as condiyoes de vida. Temos evidencias definitivas de nHldanyas llas medidas corporais. A estatlcra das populayoes europCias tem aumentado clesde meados do seculo XIX. Guerra e fome dCLxaram seus efeitos nas crianyas que cresceram na segunda metade de nosso scculo. As propory6es do corpo tambcm mudam conforme a ocupayao. As formas cia mao do trabalhador e do mllsico rer1etem suas ocupayoes. As mudanyas que se tcm observado em rc!ayao 010 formato da cabeya sao analogas aquelas observadas entre animais sob condi<;:6es variaveis de vida, entre: le6es nasciclos no cativciro ou entre ratos alimentados com diferentes tipos de dicta. Nao se conhece a extensao em que ambientes socia is e geogrMicos podcm alterar formas corporais, mas a int1ucncla de concli<;:()es externas
~ , !s"~.lill!\il~~~~f'll!>l!flft~,t"~i9,~6~,*,"<lI\ImlJiqWll~'" ' .~.. R.". , '.' , .._,.....-....~u_.' ..,,, ...
7-'1 Antropologia cultural
tem que ser levada em considera<;:ao quando comparamos diferentes tipos humanos.
Os processos seletivos tambem atuam no sentido de alterar as caracterfsticas de uma popu]a<;:ao. Diferentes taxas de nasci
mento, mortalidade e migra<;:ao podem produzir mudan<;:as n'1
composi<;:ao hereditJria de um grupo. A magnitude dessas mu
dan<;:as elimitada peb extensao das varia<;:6es dentro da popula<;:ao original. 1\ imporUlncia da sele<;:ao sobre 0 carJter de uma
popula<;:ao cfacilmente superestimada. f: verdade que certos defeitos sao transmitidos por hereditariedade, mas nao se pode pro
var que toda uma popula<;:ao degenera fisicamente gra<;:as ao au
mento do mimero de degenerados. Estes sempre incluem os fisicamente deficientes e outros, vitimas de circunst,jncias.
A depressao economica de nossos dias mostra claramente
com que facilidade individuos perfeitamente competentes po
dem ser 1cvados a condi<;:6es de pobreza abjeta e serem submeti
dos a uma carga de press6es aqual apenas as mentes mais vigorosas podem resistir. Igualmente injustifidvel c a opiniao de que a
guerra e a luta entre grupos nacionais c um processo scletivo necess,irio para manter a humanidade em sua marcha para adiante. Noticiou-se que sir Arthur Keith, em sua conferencia
como reitor da universidade de Aberdeen, hJ apenas uma sema· na, teria dito: "A natureza mantem seu pomar humano s'1ud,ivcl
pcb poda, e a guerra c seu podao." Nao vejo como ess'1 declara<;:ao
poss'1 de modo algum se justifica~. A guerra elimina os fisicamente fortes, aument'1 todos os devast'1dores flagelos da humanidade, tals como a tuberculose e as doen<;:as venereas, e enfraquece a
gera<;:ao em crescimento. A hist6ri'1 mostra que a a~ao energctica das massas pode ser
liberada, nao apenas atr'1vcs de guerra, mas tambcm por outras for~as. N6s podemos nao compartilhar 0 fervor ou '1creditar nos ideais estimulantes; 0 ponto importante e observar que as duas cois'1s podem despertar 0 111esmo tipo de energia que c liberada
n'1 guerra. Tal estimulo foi a entrega a religiao na Idade Media,
Ra~a e progresso
I 75
como tal e 0 estimulo da entrega da moderna juventude russa a seu ideal. I
I Ate agora discutimos os efeitos da hereditariedade, do amI ;; biente e da sele<;:ao sobre as formas corporais. Mas nao estamos
tao preocupados com a forma do corpo quanto com suas fun
<;:6es, pois na vida de uma na<;:ao as atividades dos individuos contam m'1is que suas aparcncias. Nao tenho duvidas de que ha uma associa<;:ao bem defin ida entre a constitui<;:ao biol6gica do indivi
duo e 0 funcionamento fisiol6gico e psicol6gico de seu corpo. A pretensao de que apenas as condi<;:6es sociais e ambientais determinam as rea<;:6es do individuo desconhece as observa<;:6es mais
elementares, tais como diferen<;:as em ritmo cardiaco, metabolismo basal ou desenvolvimento glandular; e tambcm as diferen
<;:as mentais em sua rcla<;:ao com distllrbios anat6micos extremos do sistema nervoso. HJ raz6es organicas pclas quais individuos diferem em seu comportamento mental.
Mas aceitar esse fa to nao significa que todas as diferen<;:as de comportamento podem ser explicad'1s de maneira adequada
numa base puramente anatomica. Quando 0 corpo humano atinge a maturidade, sua forma permanece razoavelmente est<ivcl, ate que se manifestem as mudan<;:as devidas produzidas pelo envelhecimento. Sob condi<;:6es normais, a forma e a constitui<;:ao
quimica do corpo adulto permanecem praticamente estJveis por muitos anos. 0 mesmo nao ocone com as fun<;:6es corporais. As condi<;:6es de vida variam considerave1mente. Nosso ritmo cardiaco e diferente durante 0 sono e a vigilia, depende do trabalho que exercemos, da altitude em que vivemos e de muitos outros
fatores. Pode oconer, portanto, que 0 mesmo individuo apresen
te rea<;:6es bastante diversas sob condi<;:6es diferentes. 0 mesmo acontece com outras fun<;:6es corporais. A a<;:ao de nosso aparelho digestivo depende da quantidade e da qualidade da comida que consumimos. Em resumo, as rea<;:6es fisio16gicas do corpo estao estreitamente ajustadas as condi<;:6es de vida. POl' isso, muitos in
dividuos de estruturas organicas diferentes, quando expostos ,IS
76
_____ .... ~~ .... _~_...o.._.~ ._ ..... _ .. _~ ...............~...A._.....................__..._......, ....__ _.... ..._.II.._.... ......................# ............ ""'O"~....._".......__-..._.....~l.
1 \ I
Antropologla cultural ! I
mesmas condi<,:6es ambientais, assumemum mesmo grau de rea<;:6es similares.
No geral, e muito mais f'leil encontrar difercn<;:as claras entre ra<;:as em rela<;:ao aforma do corpo do que em rela<;:ao a seu funcionamento. Nao se pode pretender que 0 corpo funcionc, em todas as ra<;:as, de modo identico, mas aque!a especie de sobreposi<,:8.o que observamos em rela<;:8.o aforma e ainda mais pronunciada em rela<;:ao afun<;:ao. Eimpossive! dizer que, como algumas fun<;:6es flsicas - tais como 0 ritmo cardia co - tem uma determinada freqllcncia, 0 individuo deva ser branco ou negro, pois os mesmos ritmos sao encontrados em ambas as ra<;:as. Um certo metabolismo basal nao indica se uma pessoa e japone~a ou branca, embora os valores medios de todos os individuos nas ra<;:as comparadas possam exibir diferen<;:as. Mais ainda: a fun<;:ao particular ctao marcadamente modificada pelas demandas feitas ao organismo, que elas irao to roar bastante parecidas as rea<;:6es dos grupos raciais que vivem sob as mesmas condi<;:6es. Todo organismo e capaz de se ajustar a uma grande variedade de condi<;:6es; desse modo, as condi<;:6es determinarao em grande medida 0 tipo de rea<;:ao.
Aquilo que e verdadeira para as fun<;:6es fisiol6gicas e tambem valido para as fun<;:6es mentais. H<i um mOrIne volume de literatura que lida com as caracteristicas mentais das ra<;:as. Norte-europeus louros, italianos do sul,judeus, negros, indianos e chineses tem sido descritos como se suas caracteristicas mentais fossem biologicamente determinadas. Everdade que cada popula<,:ao possui um certo carateI' que se exprime em sell comporta
mento, de tal modo que ha lima distribui<;:ao geogrifica de tipos de comportamento. Ao mesmo tempo, ha uma distribui<;:ao geogrMica de tipos anatomicos, e, como resultado disso, descobrimos que uma po1'ula<;:ao sclecionada pode scI' descrita como possl1idora de um certo ti1'o anatomico e uma certa especie de comportamento. lsso no en tanto nao justifica a reivindica<;:ao de que o tipo anat6mico determina 0 comportamento. Um grande eno
t .li'.' •• 1 • ± .* .. ft,..., • t" ... $ .or 1> .. ~,,~ ." .,_'!-."'
Ra~a ~ progr~sso 77
e cometido quando nos permitimos fazer essa inferencia. Pri meira, seria preciso provar que a concla<;:ao entre formas corporais e
comportamento e absoluta, que e valida nao apenas para 0 local se!ecionado, mas para toda a popula<;:ao do mesmo tipo; e, inversamente, que 0 mesmo comportamento nao ocone quando os tipos de complei<;:ao corporal diferem. Em segundo lugar, deveria ser demonstrada a existencia de uma intima rela<;:ao entre os do is fen6menos.
Posso ilustrar esse ponto com um exemplo tomado de uma
area inteiramente diferente. Um determinado pais tem um clima
especifico e uma forma<;:ao geol6gica particular. No mesmo pais encontra-se uma determinada Dora. No entanto, 0 carateI' do
solo e do clima nao explicam a composi<,:ao da flora, exceto a medida que ela depende desses dois fatores. Sua composi<,:ao depende da evolu<;:ao hist6rica das formas vegetais em todo 0 mun
do. 0 simples fato de baver uma distribui<;:ao coincidente nao
prava uma rela<;:ao genetica entre os dois conjuntos de observa<;:6es. Os negros na Africa tem membros longos e um ce!'to tipo de
comportamento mental. Nao se deduz dai que os membras lon
gos sejam de algum modo a causa de seu comportamento mental. Nesse tipo de argumenta<;:ao, 0 pr6prio ponto a scI' provado ja c pressuposto.
Uma solu<,:ao cientifica para esse problema exige uma linha diferente de abordagem. As atividades mentais sao fun<,:6es do
organismo. Temos visto que fun<,:6es fisiol6gicas do mesmo orga
nismo podem variaI' enormemente sob condi<;:6es vari6.veis. Sera
diferente no caso das rea<;:6es menta is? Embora 0 estudo de creti
nos e genios mostrc a existcncia de diferen<;:as biol6gicas que li
mitam 0 lipo de comportamento individual, isso pesa pouco so
bre os conjuntos que constituem uma popula<;:ao, nas quais h6. grande variedade de estrutura corporal. Vimos que as mesmas
fun<;:6es fisiol6gicas ocorrem em diferentes ra<;:as com freq Liencia vari6.vcl, mas que entre eJas nao se podem estabclecer diferen<;:as
...... .,.::
. .
78 79
& ~ I •• •• _ _ .>.~ ~ ~_ _ ......-.__~~ ,""-"'-_>_ .,.ri!UlU;...tJo~iOIIA_.. 6rI t t • , t $.« t •• + t tit &1 .110 l!t~~ft5l!t~,~.lf!dl!Mt!;~ .. JltM: .....-----, !
Antropologia cultural Ra~a e progresso
essenciais quali ta tivas. Epreciso pergu ntar se as mesmas condi<;:oes prevalecem na vida mental.
Se Fosse possivel sujeitar duas popula<;:oes de diferentes tipos as mesmas condi<;:oes externas, nao seria dificil dar uma resposta. o obstaculo em nosso caminho repousa na impossibilidade de se estabelecer uma igui11dade de concli<;:oes. Investigadores diferem fundamentalmente em suas opinioes com respeito aquilo que constitui a igualdade de condi<;:oes. Nossa aten<;:ao precis a, 1'01'
tanto, se dirigir para essa quesU\o.
Muilo se teria a ganhar se pudessemos mostrar como pesso as com exatamente a mesma composi<;:ao biologica reagem em diferentes tipos de ambiente. Parece-me que os dados hist6ricos autorizam que se formule uma suposi<;:ao bastante fundamentada em favor de mudan<;:as substanciais do comportamento mental entre pessoas que tem a mesma composi<;:ao genctica. 0 Ingles livre e tranqi.iilo do periodo elisabetano contrasta violentamente com 0 vitoriano pudico; os vikings e os moclernos noruegueses nao nos parecem os mesmos. 0 severo romano republica no e seu descendente dissoluto da era imperial apresentam contrastes surpreendentes.
l\1as precisamos de evidencias mais tangiveis. Pelo menos no que diz respeito a rea<;:oes inteligentes diante de problemas simples da vida cotidiana, podemos apresentar um consideravel volume de evidencias experimentais. Nao devemos supor que nossos modernos testes de inteligencia nos dao uma pista sobre a inteligencia absolutamente determinada bioJogicamente - seja o que for que isso signifique. Eles certamente podem nos dizer sobre como os individuos reagem a situa<;:oes simples, mais ou menos familiares. A primeira vista, pode parecer que se encontram acentuadas diferen<;:as raciais. Refiro-me aos muitos testes comparativos sobre a inteligcncia de individuos entre varios tipos europe us centre europeus e negros. Os emopeus do norte testados em nosso pais apresentaram-se em conjunto decididamente superiores aos emopeus do suI; e os europeus como um todo em
rela<;:ao aos negros. Impoe-se a questao: 0 que isso signiftca? Se ha uma diferen<;:a real determinada pe!a ra<;:a, deveriamos encontrar o mesmo tipo de diferen<;:a entre esses tipos raciais onde quer que e!es viYam.
o professor Garth recentemente coletou todas as evidcncias disponiveis e chegou a conclusao de que nao e possive! provar uma diferen<;:a imput8.vel aos fatores geneticos. Todas as observa<;:oes que temos podem ser melhor e mais facilmente explicadas pelas diferen<;:as no ambiente social. Parece-me que a prova mais convincente da corre<;:ao dessa opiniao foi dada pclo dr. Klineberg, que examinou os v,11'ios tipos europeus em comunidades rurais e urbanas na Europa. Ele descobriu que ha, em todos os lugares, um marcante contraste entre popula<;:oes urbanas e rurais; a cidade proporciona resultados consideravclmen te mclhores do que 0 campo; alCm disso, os v,\[ios grupos nao seguem de forma alguma " mesma ordem na cidade e no campo; essa ordem depende mais de condi<;:oes sociais, tais como a excelCncia dos sistemas escolares e os con[1itos entre 0 lar e a escola. Ainda mais convincentes sao suas observa<;:oes sobre os negros. Elc examinou um consideravel numero de negros em cidades do suI que haviam se mudado para a cidade vindos de distritos rurais. Descobriu que quanto mais tempo haviam morado na cidade, melhores eram os resultados dos testes; nesse sentido, os negros que tinham vivido na cidade pOl' seis an os eram bem superiores aqueles que tinham acabado de se mudar para 0 meio urbano. 0 dr. Klineberg chegou aos mesmos resultados ao estudar negros que haviam se mudado do suI para Nova York: houve uma mclhora de acordo com 0 tempo de residencia na cidade.
Esses resultados estao de acordo com aqucles obtidos pOl' Brigham em rela<;:ao a italianos que viveram 1'01' periodos variaveis nos Estados Unidos. Muitas vezes alega-se, como inicialmente 0 proprio Brigham, que tais mudan<;:as devem-se a um processo de sele<;:ao, que individuos menos dotados tern migrado para 0
pais nos t'lltimos anos e representam 0 grupo que acabou de che
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Antropologia cultural
gar acidade. Seria diffci1 manter essa opiniao diante da regularidade com que tal fenameno reaparece a cada teste. E ainda mais,
o dr. Klineberg tambcm fornecell evidcncia solida de que a sele
<;:ao e responsavel por essas diferen<;:as. EIe comparou os dados de grupos que migraram com aqudes de grupos que permaneceram em casa. Os dad os coIetados em Nashville e Birmingham mostra
ram que nao ha diferen<;:a sensivcl entre os dois grupos. Os migrantes estavam mesmo urn POLlCO abaixo do que aqucles que permaneceram em cas,l. Elc tambem descobriu que os migrantes
que vieram para Nova York cram ligeiramente inferiores aqueles que permaneceram no suI.
Apresento esses dados deta1hadamente porque cles mos
tram de modo dcfinitivo que 0 ambiente cultural C0 mais importante fatar para determinar os resultados dos assim chamados testes de intdigcncia. De fato, um cuidadoso exame dos testes
mostra claramente que em nenhum dcles nossa expericncia cultural foi eliminada. Vida urbana e vida rural, 0 suI e 0 norte, todos
apresentam tipos diferentes de een,1rios culturais aos quais aprendemos a nos adapLar, e nossas rea<;:oes sao deterl1l inadas por essas adaptac.;6es, freqlienLel1lente tao obscuras que podem ser detectadas apenas par um conhecimento muito intimo d'1s condic.;6es de vida. Temos indicac.;6es de tais adapta<;:6es em ouLros casos. Pareee que, entre os indios d,lS planicies, a expericncia das
meninas com bordado de contas eonfere a clas superioridade quando lidam com testes baseados em formas. Ealtamente dese
jave! que os testes sejam examinados com 0 maior cuidado em rela<;:ao a influcncia indireta da expericncia sobre os resultados. Tenho forte suspeita de que tais influcncias sempre podem ser
descobertas, e que se concluira ser impossive! construir qualquer teste em que se dimine tao completamente esse elemento, que
possamos considerar os resultados uma expressao de fatores de
terl1lin,ldos apenas pela biologia. Emuito mais diffcil obter resultados convincentes em rela
<;:ao as rea<;:6es emocionais nas diferentes ra<;:as. Nao se imaginou
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qualquer metodo experimental satisfat6rio para responder a questao crucial: em que propor<;:ao a bagagem cultural e a base biol6gica da personalidade sao responsaveis pcbs diferen<;:as observadas? Nao h3. dLlvida de que individuos diferem a esse respeito gra<;:as asua constitui<;:ao biologica. Mas cmuito questionavel se 0 mesmo pode ser dito das ra<;:as, pois em todas das encontramos Ul1la ampla variedade de diferentes tipos de personalidade. Tudo que podemos afirmar com certeza eque 0 fator cultural c da maior importancia e poderia bem ser responsavel por todas as diferen<;:as observadas, embora isso nao exclua a possibilidade de existirel1l diferen<;:as biologicamente deterl1linadas. A variedade de respostas de grupos da mesma ra~a, porcm culturalmente diferentes, e tao grande, que provavclmente qualquer diferen<;:a bio16gica existente tem imporUincia menor. Posso dar apenas alguns poucos exemplos.
Os indios norte-americanos tem a reputa<;:ao de serem est6icos, prontos a enfrentar dor e tortura sem murmurar. Isso c correto em todos os casos nos quais a cultura exige repressao da emo<;:ao. Os mesmos indios, quando doentes, entregam-se a uma desesperan<;:ada depressao. Entre tribos indigenas estreitamente relacionadas, algumas sao dadas a orgias ext<iticas, enquanto outras apreciam l1ma vida que flui por suaves call1inhos convencionais. 0 ca<;:ador de bUJalos tem uma personalidade inteiramente diferente da do indio pobre que depende de ajuda governamental, ou daquele que vive da renda da terra alugada por sellS vizinhos brancos. Assistentes sociais estao familiarizados com a sutil infl uencia das rcJa<;:6es pessoais que diferenciam as caracterlsticas dos membros de l1ma l11esma familia. A evidcncia etnol6gica toda fala em favor da suposi<;:ao de que os tra<;os raciais hereditarios nao sao importantes quando comparados ,IS condiC;:6es culturais. Na realidade, os estudos et11016gic05 nao se preocupam com a ra<;:a como um fator ha forma cultural. Desde Waitz, passando por Spencer, Tylor e Bastian, atc nossos dias, os etn610gos nao tem dado seria aten<;:ao ara<;:a, pois des encontram as formas culturais distribuidas independen temen te dela.
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Acredito que 0 estado atual de nosso conhecimcnto nos au
toriza a dizer que, embora os individuos difiram, as diferen\as
biol6gicas entre as ra<;:as sao pequcnas. Nao h,l razao para acredi
tar que uma ra<;:a seja naturalmentc mais inteligente, dotada dc
grande for<;:a de vontade, ou emocionalmente mais estavel do que
outra, e que essa diferen<;:a iria int1uenciar significativamente sua
cultura. Tambem nao ha razao para acrcditar que as diferen<;:as
entre as ra<;:as sao tao grandes, quc os dcscendcntes de casamen
tos mistos devem ser infcriores a SCllS pais. Biologicamente nao
h3. razao para se opor a endogenia em grupos saudaveis, nem a mistura das principais ra<;:as.
Tcnho considcrado ate aqui apcnas 0 lado biologico do pro
blema. Na vida real, devemos considerar os cenarios sociais, pois
eles tem uma existencia muito concreta, nao importando quao
erroneas scjam as opini6es sobrc as quais estejam fundados. 0 antagonismo racial c entre nos um fato, e deviamos tentar com
precndcr scu significado psicologico. Para esse prop6sito, cum
pre considerar 0 comportamento, nao apcnas do homem, como
tambem dos anima is. Muitos animais vivem em sociedades. Fode
ser um cardume de peixes ao qual qualquer individuo da mesma
especie possa sc juntar, ouum enxamc de mosquitos. Nao bft la<;:o
social aparcnte ncsses grupos, mas ha outros grupos que pode
mos chamar dc sociedadcs fechadas, que nao pcrmitem a ne
nhum individuo de forajuntar-sc ao grupo. Matilbas dc caes e
bandos bem organizados de grandes mamiferos, formigas e abe
lhas sao exemplos desse tipo. Em todos csses grupo, b'l um con
sider'lvel grau de solidariedade social que se exprcssa particular
mente pclo antagonismo contra qualquer gl'llpO extcl'11o. 13andos
de macacos que vivcm cm um dcterminado tcrritorio nao pcrmi
tirao que outro bando venha se juntar a eles. Os mcmbros de uma
socicdadc animal fcchada sao mutuamentc tolcrantcs ou mcsmo
prestativos cntrc si, mas rcpclc111 todos os intrusos.
As condi<,:6cs na socicdadc primitiva sao bcm similarcs.
Obriga<;:oes sociais estritas existcm entre os membros de uma tri
Ra~a e progresso
bo, mas todos os estrangeiros sao inimigos. A etica primitiva de
manda auto-sacrificio para 0 grupo ao qual 0 individuo pcrtence
c inimizade mortal contra qualquer cstrangeiro. Uma sociedade
fechada nao existe sem antagonismos contra outras. Embora 0
grau de antagonismo contra estrangeiros tenba diminuido, as so
cicdades fechadas continuam a existir em nossa pr6pria civiliza
<;:ao. A nobreza constituiu uma sociedadc fechada ate tempos bem
recentes. Patricios e plebe us em Roma, grcgos e barbaros, as gan
gues de nossas ruas, maometanos e infieis e nossas modernas
na<;:6es sao, nesse sentido, sociedades fecbadas que nao podem
existir sem antagonismos. Os principios quc mantCl11 as socieda
des unidas variam enormemente, mas a todas elas sao comuns as
obriga<;:6es sociais dentro do grupo eo antagonismo contra ou
tros grupos paralelos.
Consciencia racial e antipatia racial diferem num aspecto
dos grupos sociais aqui enumerados. Enquanto em todas as ou
tras sociedades humanas nao h3. uma caracteristica externa que
ajude a definir 0 pertencimento de um individuo a scu grupo,
aqui, 0 que indica e sua propria aparencia. Se, como uma vez
ocorreu, predominasse a cren<;:a de que todos as individuos rui
vos tem urn carater indesejftvel, eles seriam prontamente segrega
dos e nenhum individuo ruivo poderia escapar dc sua dassc, in
dependentemente das caracteristicas pessoais que pudesse ter. 0 negro, 0 asiatico oriental ou 0 malaio que possam scr prontamen
te reconhecidos por sua complei\i'io corporal sao automa
ticamente incluidos em sua dasse, e nenl1ll111 deles podc escapar
de ser excluido de um grupo estrangeiro fcchado. 0 meS1l10 acon
tece quando um grupo ccaracterizado por um traje circunstan
cialmente imposto, quer por escolha, quer porque um grupo do
minante Ihes tenha prescrito urn simbolo que os distinga
como a vestimenta dos judeus na Idade Media, au as listras do
condenado -, de modo que cada individuo, nao importa qual 0
seu carater, c imediatamente idcntificado a seu grupo e tratado
como tal.
84 85 Alltropologia cultural
Se a antipatia racial fo~~e ba~eada em trac;o~ humano~ inato~, i~~o ~e expre~saria em aver~ao ~exual inter-racial. A mistura livre de don os de e~cravos com suas e~crava~, a notavel diminuiy,IO re~ultante do nllmero de negro~ puro-sangue, 0 progressivo desenvolvimento de uma populac;:ao de sangue meio-indio e a facilidade de casamento com indios quando se podiam obter assim vantagen~ economicas mostram claramente que nao ha f\1ndamentos biologicos para 0 sentimento racial. Nao ha dllvida de que 0 estranhamento em relayao a um tipo racial alienigena exerce um papcJ importante, pois 0 ideal de bcJeza do branco que cresce numa sociedade puramente branca ediferente do de um negro. Mais uma vez i~so e analogo ao sentimento de di~tanciamento entre grupos que se caracterizam pOl' roupa~ diferente~,
modos diferente~ de expressar emoyoes ou por um ideal de forc;:a corporal contrario a um ideal de forma~ refinadas. 0 e~tudio~o
das rcJac;:oe~ raciai~ deve responder i\ ~eguin te quesUio: em sociedades nas quais diferente~ tipo~ raciais formam um grupo socialmente homogcneo, de~envolve-se ou nao uma marcada con~ciencia racial? Essa pergunta nao pode ser re~pondida categoricamente, embora a~ condic;:oes inter-raciais no Brasil e 0 desdem pela filiac;:ao racial entre maometanos e infieis mostre que a consciencia racial pode ser bastante insignificante.
Quando as divi~oe~ sociais seguem fronteiras raClai~, como acontece entre nos, 0 grau de diferenya entre formas raciais e um eJemento importante para 0 estabelecimento de grupos raciais e
para a criaC;:'lo de cont1ito~ entre rac;:as. A relac;:ao efetiva nao cdiferente daqllela que surge. no~ ca~os
em que se de~envolvem clivagen~ ~ociais: em cpocas de intenso sentimento religioso, conflito~ ~ectarios; em tempos de guerra, os conflitos entre nayoes seguem 0 mesmo curso. 0 individuo cfundido com seu grupo, e nao avaliado conforme seu valor pes~oal.
Entretanto, a natureza ctal que constantemente se formam
novos grupos, aos quais cada individuo subordina-se por vontade propria. 0 individuo expre~sa ~eu ~entimento de solidarieda
Ra~a e progresso
de por meio de uma idealizac;:ao de ~e\l grupo e de um desejo emocional de que ele se perpetue. Quando o~ grupos ~ao sectarios, ha um forte antagonismo contra casamentos fora do grupo, que precisa selmantido puro, embora sectarismo e descendencia nao estejam de forma alguma relacionados. Se os grupos sociais sao tambem grupos raciais, encontramo~, no mesmo sentido, 0
desejo de endogamia racial como forma de manter a pureza de raya.
A esse re~peito, discordo de sir Arthur Keith, a quem ~e atribui a afirmayao, na conferencia ja referida, de que "a natureza implantou em voces a antipatia eo preconceito raciais para cumprir sua pr6pria finalidade - 0 aperfeic;:oamento da humanidade por meio da diferenciayao racial". Eu 0 desafio a provar que a antipatia racial c "implantada pela natureza", e nao 0 efeito de camas sociais atuantes em todo grupo social fechado, nao importando ~e ele seja racialmente heterogeneo ou homogcneo. A completa falta de antipatia sexual e 0 en fraq uecimen to da cOl15ciencia racial em comunidades na~ quai~ as crianyas crescem como um grupo quase homogeneo; a ocorrencia de antipatia~ igualmente fortes entre grupos sectarios, ou entre e~trato~ sociai~ - tal como te~temunhado pelos patricio~ e plebeus romano~, pclo~ espartanos e hilotas lacedemonios, pclas ca~tas egipcias e alguma~ das castas indianas; tudo isso mostra que as antipatias ~ao fenomenos sociai~. Caso se deseje, podem-~e chama-las "implantadas pcla natureza", mas apenas i\ medida que 0 homem for um ~er vivendo em grupos sociais fechados, deLxando totalmente indeterminado que grupos sociais cles podem ~er.
Nao importa quao fraco 0 argumento em favor da pureza racial po~sa ~er, n6s compreendemos seu apcJo social em nossa sociedade. Embora as razoes biol6gicas aduzidas possam nao SCI'
relevante~, a estratificac;:ao da ~ociedade em grupos ~ociais de carater racial inlsempre lev,ll" i\ di~criminac;ao de rac;a. Tal co111 0 em todos o~ outros agrupamenros humano~ bcm marcados, 0 individuo nao ejulgado como um individuo, mas como membro de sua