Botega (2007). Suicídio Saindo Da Sombra Em Direção a Um Plano Nacional de Prevenção

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  • Rev Bras Psiquiatr. 2007;29(1):7-8

    Suicdio: saindo da sombraem direo a um PlanoNacional de Preveno

    Suicide: moving awayumbrage towards a

    National Prevention Plan

    O suicdio representa um srio problema de sade pblica.Em termos globais, a mortalidade por suicdio aumentou 60%nos ltimos 45 anos. Nesse perodo, os maiores coeficientes desuicdio mudaram da faixa mais idosa da populao para asfaixas mais jovens. Na maioria dos pases, o suicdio situa-seentre as 10 causas mais freqentes de morte e entre as duas outrs mais freqentes em adolescentes e adultos jovens. De acor-do com registros da Organizao Mundial da Sade, 900.000pessoas cometeram suicdio em 2003. Isso representa uma mortea cada 35 segundos. Para cada bito por suicdio, h no mnimocinco ou seis pessoas prximas ao falecido cujas vidas so pro-fundamente afetadas emocional, social e economicamente.1

    O coeficiente de mortalidade por suicdio no Brasil , em mdia,4,5 por 100.000 habitantes ao longo de um ano, consideradorelativamente baixo numa escala mundial. No entanto, em cer-tas cidades e regies, bem como em alguns grupos populacionais(como, por exemplo, o de jovens em grandes cidades, o deindgenas do Centro-Oeste e do Norte e entre lavradores do inte-rior do Rio Grande do Sul), as cifras se aproximam ou superama de pases do leste europeu e da Escandinvia. Os coeficientesde suicdio tm aumentado em nosso pas, notadamente entrejovens e adultos jovens do sexo masculino. Outra ponderao:como somos um pas populoso, atingimos o nono lugar em n-mero absoluto de suicdios. Os registros oficiais, que devem es-tar subdimensionados, indicam que houve no pas 7.987 suic-dios em 2004, o que representou 0,8% do total de bitos na-quele ano. Dentre os que se mataram, 55% tinham menos de40 anos de idade. Nesse grupo, o suicdio respondeu por 3% dototal de bitos.1

    Estima-se que o nmero de tentativas de suicdio supere o desuicdios em pelo menos 10 vezes. O comportamento suicidaexerce considervel impacto nos servios de sade e calcula-seque 1,4% da carga (burden) global ocasionada por doenas noano 2002 deveu-se a tentativas de suicdio. Essa cifra deverchegar aos 2,4% em 2020.1

    O primeiro estudo de base populacional que fez um levanta-mento sobre a dimenso de idias, planos e tentativas de suic-dio em pases em desenvolvimento foi organizado pela Organi-zao Mundial da Sade, tendo o Brasil como um dos pasesparticipantes. Segundo este estudo, na rea urbana do munic-pio de Campinas, ao longo da vida, 17,1% das pessoas pensa-ram seriamente em por fim vida, 4,8% chegaram a elaborarum plano para tanto e 2,8% efetivamente tentaram o suicdio.As mesmas prevalncias ao longo dos ltimos 12 meses foram,respectivamente, 5,3%, 1,9% e 0,4%.2

    Apesar de o suicdio envolver questes socioculturais, genti-cas, psicodinmicas, filosfico-existenciais e ambientais, na quasetotalidade dos casos um transtorno mental encontra-se presen-te. Uma reviso sistemtica de 31 artigos cientficos publicadosentre 1959 e 2001, englobando 15.629 suicdios na popula-o geral, demonstrou que em 97% dos casos caberia um diag-nstico de transtorno mental na ocasio do ato fatal.3

    Em nosso pas, at h pouco tempo, o suicdio no era vistocomo um problema de sade pblica. Entre as causas externasde mortalidade, o suicdio encontrava-se na sombra dos eleva-dos ndices de homicdio e de acidentes com veculos, 7 e 5

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  • Rev Bras Psiquiatr. 2007;29(1):7-8

    Suicdio: Plano Nacional de Preveno

    vezes maiores, em mdia e respectivamente. No entanto, a ne-cessidade de se discutir a violncia, de modo geral, trouxe tona o problema do suicdio.

    Em final de 2005, o Ministrio da Sade montou um grupo detrabalho com a finalidade de elaborar um Plano Nacional dePreveno do Suicdio, com representantes do governo, de enti-dades da sociedade civil e das universidades. Em 14 de agostode 2006 foi publicada uma portaria com as diretrizes que deve-ro orientar tal plano.4 Dentre os principais objetivos a seremalcanados destacam-se:

    1) Desenvolver estratgias de promoo de qualidade de vida ede preveno de danos;

    2) Informar e sensibilizar a sociedade de que o suicdio umproblema de sade pblica que pode ser prevenido;

    3) Fomentar e executar projetos estratgicos fundamentadosem estudos de eficcia e qualidade, bem como em processos deorganizao da rede de ateno e intervenes nos casos detentativas de suicdio;

    4) Promover a educao permanente dos profissionais de sa-de da ateno bsica, inclusive do Programa Sade da Famlia,dos servios de sade mental, das unidades de urgncia e emer-gncia, de acordo com os princpios da integralidade e dahumanizao.

    Antes mesmo da finalizao de um Plano Nacional de Preven-o de Suicdio, esperado para 2007, com destinao de verbaoramentria especfica, o Ministrio da Sade j lanou ummanual de preveno de suicdio destinado a equipes de sademental e uma bibliografia comentada sobre comportamento sui-cida. Outra publicao destinada ao treinamento de equipes darede bsica de sade estar disponvel brevemente. So boasnotcias, que tiram o suicdio da penumbra da negao e dotabu, para encar-lo como um problema de sade pblica.

    H, hoje, considervel informao a respeito do que, em v-rios pases, j foi feito para a preveno do suicdio, do que deucerto e do que no funcionou.5 J temos evidncias cientficasdisponveis; agora esperar o esforo final da rea tcnica doMinistrio da Sade, para fazer do Brasil o primeiro pas daAmrica Latina a elaborar e a executar aes de preveno docomportamento suicida.

    Neury Jos Botega

    Departamento de Psicologia Mdica e Psiquiatria,Faculdade de Cincias Mdicas,

    Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),Campinas (SP), Brasil

    Refernc ias

    1. World Health Organization. The World Health Report 2003: Shapingthe future. Geneve: World Health Organization; 2003.

    2. Botega NJ, Barros MB, Oliveira HB, Dalgalarrondo P, Marin-Leon L.Suicide behavior in the community: prevalence and factorsassociated to suicidal ideation. Rev Bras Psiquiatr.2005;27(1):45-53.

    3. Bertolote JM, Fleischmann A. Suicide and psychiatric diagnosis: aworldwide perspective. World Psychiatry. 2002;1(3):181-5.

    4. Brasil. Ministrio da Sade (2006). Diretrizes brasileiras para umplano nacional de preveno do suicdio. Portaria n 1.876 de 14de agosto de 2006.

    5. Mann JJ, Apter A, Bertolote J, Beautrais A, Currier D, Haas A, HegerlU, Lonnqvist J, Malone K, Marusic A, Mehlum L, Patton G, PhillipsM, Rutz W, Rihmer Z, Schmidtke A, Shaffer D, Silverman M, TakahashiY, Varnik A, Wasserman D, Yip P, Hendin H. Suicide preventionstrategies: a systematic review. JAMA. 2005;294(16):2064-74.

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    Financiamento: InexistenteConflito de interesses: Inexistente

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