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Rascunho (ainda falta revisão ortográfica e gramatical) de trabalho sobre a Física na Idade Média.
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Breve História da Filosofia Natural na Idade Média
Leonardo de Mello Barbosa - 17501
UNIFEI – Graduação em Física (Bacharelado) - 2012
FIS163 – Panorama da Física
LEONARDO DE MELLO BARBOSA
Breve História da Filosofia Natural na Idade Média
Trabalho apresentado no Curso de Bacharelado em Física, do Instituto de Ciências Exatas da Universidade Federal de Itajubá, como requisito parcial para a aprovação na disciplina FIS 163 – Panorama da Física
Professor: Dr Paulo Sizuo Waki
ITAJUBÁ - MG
2012
ii
Sumário
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 4
2 A FILOSOFIA NATURAL, DE PLATÃO À QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO DO OCIDENTE ................. 6
2.1 PLATÃO ................................................................................................................................. 6
2.2 ARISTÓTELES ........................................................................................................................... 9
2.3 O FIM DA ANTIGUIDADE ...........................................................................................................12
3 A IDADE MÉDIA ANTIGA.............................................................................................................15
3.1 O NEOPLATONISMO ................................................................................................................15
3.2 SANTO AGOSTINHO E SEU COMENTÁRIO LITERAL AO GÊNESIS ............................................................16
3.3 PORQUE NÃO ARISTÓTELES? ......................................................................................................19
4 O ISLÃ E A ORIENTALIZAÇÃO DE ARISTÓTELES ...........................................................................22
4.1 NASCIMENTO E EXPANSÃO DO ISLAMISMO ....................................................................................22
4.2 A INTRODUÇÃO DE ARISTÓTELES NO MUNDO ISLÂMICO ....................................................................23
4.3 O MÉTODO CIENTÍFICO E OUTRAS CONTRIBUIÇÕES ...........................................................................24
5 A ALTA IDADE MÉDIA .................................................................................................................27
5.1 A RENASCENÇA CAROLÍNGIA ......................................................................................................27
5.2 GERBERT DE AURILLAC: O PAPA ACADÊMICO .................................................................................29
5.3 O SURGIMENTO DAS UNIVERSIDADES ...........................................................................................31
5.4 ROBERT GROSSETESTE: CORES SOBRE A IDADE MÉDIA ......................................................................34
5.5 ROGER BACON: SOM E LUZ ........................................................................................................35
5.6 SANTO TOMÁS DE AQUINO: O DOUTOR ANGÉLICO ..........................................................................37
5.7 WILLIAM DE OCKHAM: UMA NAVALHA PARA A POSTERIDADE .............................................................39
5.8 JEAN BURIDAN E A TEORIA DO IMPETUS ........................................................................................40
5.9 NICOLE ORESME E UMA TERRA QUE SE MOVE ................................................................................42
6 A BAIXA IDADE MÉDIA ...............................................................................................................45
iii
6.1 A PESTE NEGRA ......................................................................................................................45
6.2 NICOLAU COPÉRNICO E O HELIOCENTRISMO ...................................................................................46
7 CONCLUSÃO ...............................................................................................................................50
8 OBRAS CITADAS .........................................................................................................................52
4
1 Introdução
À exceção dos pequisadores da História Medieval Européia, a grande maioria das
pessoas acredita que os mil anos anteriores à Renascença foram um tempo de ignorância e
repressão intelectual. Pensa-se que a suposta Idade das Trevas foi uma era na qual o
pensamento científico foi desencorajado em prol de uma atitude obscurantista de domínio
da fé, impedindo o progresso do pensamento, da razão e da cultura.
Não se pode culpar o grosso da população por este fato, visto que é assim que se diz
em boa parte dos livros didáticos e que esta é a visão cunhada na cultura popular, desde o
Humanismo Renascentista, do Iluminismo e do Racionalismo. Mesmo alguns autores atuais
de renome dão crédito a este enfoque. Veja o exemplo de Robert Lomas e Christopher
Knight, autores de Second Messiah (sucesso editorial de 2001, sendo o primeiro autor
docente na área de Gestão Tecnológica na University of Bradford – Reino Unido):
O estabelecimento da era do Cristianismo Romanizado marcou o início da Idade das
Trevas: o período da história ocidental em que as luzes se apagaram sobre o
aprendizado, e quando a superstição substituiu o conhecimento. Ela durou até que
o poder da Igreja Romana foi minado pela Reforma. (KNIGHT e LOMAS, 2001, p. 70,
apud WOODS JR, 2005, p. 3)
A historiografia atual (a historiografia da ciência, em especial), entretanto, está a
desmistificar o que foi expôsto. Um movimento iniciado pelo físico, matemático e filósofo
francês Pierre Duhem (1861-1916), quase 100 anos atrás (DUHEM, 1913-1915), mostra que a
ciência medieval era sofisticada e que foi essencial aos desenvolvimentos posteriores. Hoje
se vê que, apesar fazer questão de que Deus fosse visto como uma questão central em
qualquer consideração sobre a natureza, a predominância da Igreja Católica no cenário da
5
Idade Média, ao dar suporte e guiar a pesquisa científica, nunca apoiou a idéia de que a
Terra é plana, nunca proibiu a dissecação de cadáveres humanos, nunca baniu o zero e
certamente nunca mandou queimar qualquer um por conta de suas idéias científicas
(HANNAM, 2009).
O presente trabalho tenta fazer sua contribuição a este tema. Inicialmente
trataremos das bases filosóficas de Platão e Aristóteles. Em seguida, estudaremos como este
conhecimento foi quase perdido ao final da Antiguidade, sendo conservado com dificuldade
por 3 civilizações. Finalmente, trataremos do revigoramento, aplicação e desenvolvimento
deste saber pelos estudiosos da Filosofia Natural1 da Europa Medieval.
1 Neste trabalho, o termo Filosofia Natural deve ser entendido como o estudo das primeiras causas e
dos princípios do mundo material, com inegavelmente afinidade ao que hoje chamamos de Física.
6
2 A Filosofia Natural, de Platão à queda do Império Romano do
Ocidente
A primeira evidência escrita de algo relacionado à Filosofia Natural data de 3500 a
3000 AC, sendo associado aos interesses práticos das civilizações do Egito e da Mesopotâmia
em temas como a Astronomia, a Matemática e a Medicina. Estes estudos, registrados de
forma hieroglífica ou cuneiforme, tinham grande ênfase na mitologia e na religião como
formas de explicar a criação do mundo e seus fenômenos (GRANT, 2006).
Já na Grécia Antiga, entre os séculos VI e IV AC, grandes desenvolvimentos foram
realizados homens como Pitágoras, Parmênides, Zenão, Heráclito, Thales, Anaximandro,
Anaxímenes, Empédocles, Leucipo e Demócrito. Por brevidade e relevância para este
trabalho, entretanto, trataremos apenas de dois estudiosos posteriores a Sócrates: Platão e
Aristóteles.
2.1 Platão
Platão foi um filósofo, discípulo de Sócrates, tendo vivido em Atenas, provavelmente
entre 427 e 347 AC. Nascido em uma família aristocrática, com boa educação, Platão honrou
seu mestre até sua execução em 399 AC. Após este traumático evento, Platão passou 12
anos viajando, visitando várias partes da Grécia, Egito, Itália e Sicília, retornando a Atenas
em 387 AC, quando fundou a Academia de Atenas, a primeira instituição de ensino superior
do mundo ocidental.
Em sua época, os pré-socráticos já tinham substituído os deuses por causas naturais
na descrição dos fenômenos físicos observados. A matemática já tinha feito grandes
7
avanços, em especial nas áreas da Aritmética e Geometria. Havia a idéia do arché, a “argila”
primordial da qual são feitos todos os elementos que constituem o universo. Empédocles,
em especial, havia formulado a doutrina dos quatro elementos, transformando o arché em
quatro elementos básicos: terra, ar, fogo e água, atraídos ou repelidos por duas forças
poeticamente chamadas “amor” e “ódio”. Ainda, o Atomismo de Leucipo e Demócrito
concebera o mundo como composto de matéria (composta de pequenas partes imutáveis e
indivisíveis, combinado-se e separando-se ad infinitum) imersa num vazio total. (PONCZEK,
2002)
A obra de Platão trata majoritariamente da Filosofia Moral com aplicações políticas.
Duas concepções suas, entretanto, são fundamentais para a história futura da Filosofia
Natural: a Alegoria da Caverna e a Teoria das Idéias.
A Alegoria, ou Mito da Caverna aparece no ínício do livro VII do diálogo A República.
Nesta alegoria, devemos imaginar uma caverna, com um muro bem alto que a separa do
mundo exterior. Quase todos os homens estariam condenados a ficar no interior desta
caverna, acorrentados de forma a olharem somente para uma parede no fundo da mesma.
Desde a infância estão nesta situação. Há um fogo que queima atrás destes homens e, entre
o fogo e os condenados, há alguns outros homens que empunham estátuas de seres
humanos, figuras de animais e outros objetos, de forma a projetar sobre a parede do fundo
a sombra destes itens. Não conhecendo outro mundo, os prisioneiros acreditam que a
realidade não é senão formada pelas sombras projetadas. O filósofo seria um dos
prisioneiros, que, com custo, consegue se libertar e fazer seu caminho até a saída da
caverna, descobrindo que as sombras não existiam por si só, mas sim que eram fabricadas
por homens semelhantes aos condenados e, ainda mais, que há todo um mundo e natureza
exterior à caverna. Este filósofo teria o dever moral de retornar a caverna e explicar aos
8
condenados tudo o que descobriu, poderia, entretanto, ser ignorado ou mesmo morto pelos
seus companheiros, por pregar algo que estes considerariam loucura, simplesmente por não
conhecerem outra realidade senão a projetada (Mito da caverna, 2012).
Ao postular que o mundo é semelhante a esta alegoria, Platão afirma que os nossos
sentidos são como as correntes que nos obrigam a ficar olhando para o fundo da caverna,
fazendo-nos crer que a realidade é aquilo que nossa visão (ou audição, ou olfato, ou paladar,
ou tato) nos deixa apreender. Para atingir o conhecimento perfeito, o interessado deveria
desligar-se do que seus sentidos lhe mostram, e realizar sua jornada intelectual para fora da
caverna, obtendo, com o uso da razão, o conhecimento perfeito da realidade. Platão
explicita ainda mais a dicotomia entre o mundo sensível e a realidade através da Teoria das
Ideias.
Na Teoria das Ideias (ou das Formas), Platão exalta a razão, em detrimento da
percepção sensorial. Segundo ele, o mundo físico (mundo sensível) é dominado pela
transitoriedade e imperfeição. Ao observarmos os gatos, por exemplo, vê-se que eles
apresentam diversas diferenças entre si, mas, de alguma forma, pode-se reconhecê-los
como gatos por sua semelhança com um ente ideal “Gato”. Este “Gato”, perfeito, é a Ideia
ou Forma “Gato”, que existe, mas não no espaço ou no tempo. Assim como para os gatos,
existe uma Ideia para os cães, cavalos, ou qualquer animal, planta, objeto ou mesmo
sentimento e figura geométrica. De acordo com o pensamento platônico, as Ideias (que
formam o mundo inteligível) não foram criadas, simplesmente sempre existiram, são
eternas, incorpóreas e intransitórias, nunca sofrendo mudanças. Podemos estuda-las apenas
através do pensamento e da razão, e nelas está o verdadeiro conhecimento, posto que o
que temos no mundo sensível são apenas cópias imperfeitas, por demais transitórias, do que
existe no mundo inteligível. (GRANT, 2006)
9
A obra mais proeminente de Platão no campo da Filosofia Natural é Timeu, um dos
seus últimos trabalhos, considerado por alguns o mais difícil e interessante. Neste trabalho,
fortemente influenciado pela Teoria das Ideias, Platão mostra sua opinião quanto à criação e
estrutura do mundo sensível. Ele assume que nosso mundo é como é hoje por ação de um
deus (o Demiurgo). Este Demiurgo não é exatamente um criador, mas sim um artesão, que
desenvolve o mundo a partir de uma massa caótica de materiais já disponível. O Demiurgo
tenta reproduzir no mundo sensível as Ideias presentes no mundo inteligível, mas, apesar de
ser um deus, consegue apenas cópias imperfeitas.
Várias seções de Timeu são dedicadas à descrição da forma como o Demiurgo
organizou o mundo. Platão relaciona os quatro elementos básicos (fogo, ar, água e terra) a
quatro sólidos regulares (respectivamente: tetraedro, octaedro, icosaedro e cubo),
enfatizando um mundo matematicamente estruturado, apesar de imperfeito. Ele também
explica o desenvolvimento do corpo humano, com suas partes e capacidades, assim como a
formação dos animais. Ressalta, entretanto, que qualquer ponderação a respeito deste
mundo sensível é, muito menos que conhecimento, apenas uma opinião, por conta da
constante mutação do que vemos.
2.2 Aristóteles
Com Aristóteles chega-se a um ponto culminante não só do pensamento grego, mas
de toda a História da Filosofia Natural. Tendo vivido entre 384 AC e 322 AC, foi discípulo de
Platão e preceptor de Alexandre, o Grande. Em 336 AC fundou o Lykeion (Liceu) de Atenas,
que, ao contrário da Academia, privilegiava o estudo da Filosofia Natural.
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O ponto mais importante de sua obra, para os fins deste trabalho, é sua visão positiva
a respeito da Filosofia Natural e do mundo sensível. Ao mesmo tempo em que, por força de
sua formação platônica, reconhece a imperfeição e transitoriedade das coisas materiais,
Aristóteles, ao contrário de seu mestre, não desdém dos dados obtidos pelos sentidos, mas
diz que o conhecimento começa pelo tratamento destes dados.
Observe o que diz sua obra As Partes dos Animais:
[644b 22]Entre todas as essências que se encontram constituídas por natureza,
umas são não-geradas e incorruptíveis por toda a eternidade, ao passo que outras,
porém, participam de geração e corrupção. No entanto, sucede-nos que, a respeito
daquelas primeiras, que são valiosas e divinas, poucos estudos nos são possíveis
(pois com relação àquilo a partir de que poder-se-ia investigar a respeito delas, e
com respeito àquilo que ansiamos conhecer, são inteiramente escassos os fatos
manifestos conforme a sensação), ao passo que, por outro lado, dispomos de
melhores recursos com respeito às plantas e animais corruptíveis, porque vivemos
junto com eles; pois, a respeito de cada gênero, alguém que queira se esforçar
suficientemente poderá coletar muitos atributos. apud (ANGIONI, 1999)
Esta valorização do mundo sensível só é possível porque enquanto, para Platão, não
há nada na natureza que não tenha existido antes como Idéia, para Aristóteles não existe
nada na consciência que não tenha passado antes pelos sentidos. Observe que, no texto
citado, Aristóteles não diz que não há a Idéia (a essência não-gerada e incorruptível). De
fato, Aristóteles busca esta Idéia (que chama de Forma), mas crê que ela está dentro do
objeto particular, material e sensível, de estudo. Em outras palavras: Aristóteles crê que a
verdade é imanente ao objeto.2
2 Em algumas conversas pessoais, o autor do presente trabalho costuma propor a seguinte situação
para exemplificar a questão da imanência da verdade: Imaginemos que sobre uma mesa seja encontrado um punhado de um pó branco e que seja levantada a dúvida de se este pó consiste em mero sal de cozinha ou em um veneno poderosíssimo. A natureza da verdade é tal que, se for veneno, morreremos ao provar dele, ainda que, ao utilizar todo o poder de nosso intelecto, tenhamos concluído de que se tratava de sal de cozinha.
11
Com esta epistemologia3, Aristóteles, ao contrário de seu Mestre, conseguiu grandes
avanços na área da Filosofia Natural. Aristóteles é o fundador da Biologia, enquanto
disciplina, e seus trabalhos neste assunto ainda eram considerados relevantes e influentes
no século XIX. Construiu, ainda, um sistema cosmológico que perdurou por mais de dois mil
anos, em três diferentes civilizações. Suas discussões sobre o movimento (presentes em
Física) forneceram o cenário para as futuras controvérsias que resultaram nos avanços da
Idade Média e forneceram as bases para Galileu e Newton.
É conveniente aqui introduzir a visão cosmológica de Aristóteles. Para ele, o cosmos
era uma esfera gigante, sem começo e sem fim, sem possibilidade de existência de matéria,
vácuo, tempo ou espaço fora dela. No centro estava a Terra. Esta esfera seria subdividida em
duas regiões principais: a celeste e a terrestre. A superfície esférica onde a lua se movimenta
seria o limite. Abaixo da lua havia a região terrestre, sujeita a constantes mudanças e
transformações. Tudo nesta região seria formado pelos 4 elementos básicos: terra, água, ar
e fogo, e, se lhes fosse permitido, eles se separariam de forma a ocupar o espaço da Terra à
lua na ordem em que foram citados. Acima da lua estava a região celeste, na qual residem os
planetas e as estrelas. Esta região seria formada por um quinto elemento, o éter, que,
incorruptível, permitiria apenas a mudança de posição dos astros superiores, mas não a
mudança de suas naturezas. (GRANT, 2006)
As leis do movimento por Aristóteles decorrem diretamente de sua visão
cosmológica. Em sua mecânica, havia dois tipos distintos de movimentos: os naturais
(produzidos por causas internas) e os violentos (produzidos por causas externas e que se
opõem aos naturais). Os movimentos naturais são aqueles que os corpos percorrem para
Esta conclusão, atualmente óbvia para os acadêmicos das Ciências Exatas e da Natureza, é ainda alvo
de discussões acaloradas no ambiente das Ciências Sociais, em especial a Economia e a Política. 3 Ramo da filosofia que estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento.
12
ocupar seu lugar de acordo com a separação dos quatro elementos citada no parágrafo
anterior. Assim, o elemento terra buscará aproximar-se do centro da efera, enquanto o fogo
irá elevar-se em direção à superfície da esfera lunar. Uma pedra, portanto, afunda na água,
enquanto bolhas de ar vão para a superfície. O movimento violento é causado por uma ação
que provoca um afastamento do corpo de seu lugar natural, como quando jogamos uma
pedra para cima. A pedra sobe, mas, tão logo a ação seja esgotada, ela tornará a cair, para
ocupar seu lugar natural no universo. (PONCZEK, 2002)
Apesar de partir da observação dos fenômenos físicos, a metodologia de Aristóteles
não abarcava os experimentos. Aristóteles acreditava que o caráter artificial e controlado
dos experimentos impediria a investigação do comportamento natural dos objetos. Por
conta disso, seus resultados são majoritariamente qualitativos e não quantitativos.
Apesar de não assumir uma criação do mundo (que para ele, simplesnte existiu desde
sempre), Aristóteles acredita na existência de Deus. Entretanto, o Deus de Aristóteles
serviria apenas como causa final para o mundo, sem conhecimento da existência dele,
completamente absorto em seus próprios pensamentos. Sem atuar diretamente no mundo,
este Deus teria apenas a si próprio como objeto de estudo. (GRANT, 2006)
Crê-se que Aristóteles produziu cerca de 170 obras, mas apenas 47 sobreviveram até
os dias de hoje.
2.3 O fim da Antiguidade
Na época da morte de Aristóteles, Atenas já tinha perdido grande parte de sua força.
As conquistas de Alexandre Magno mantiveram a civilização grega dominante por um
13
tempo, mas em 50 AC, aproximadamente, Roma passou a assumir o predomínio militar,
dando origem ao Império Romano.
O Império Romano dominou boa parte da Europa até o final do século V. Já no final
do século II, entretanto, um punhado de tribos germânicas vindas do Leste começava a
pressionar os romanos em suas fronteiras (o Reno e o Danúbio), enquanto que os líderes
militares estavam mais preocupados com política do que com defesa. Em 330, o imperador
Constantino, o Grande, transferiu a capital do Império Romano para Constantinopla. Sua
intenção era criar uma segunda capital romana, a fim de defender as fronteiras orientais do
Império dos ataques dos persas e outros povos do oriente. Em 395, o Império foi dividido: a
parte ocidental ficou centrada em Roma e a parte oriental em Constantinopla. A decadência
do Império Romano do Ocidente teve como resultado o saque de Roma pelos Godos em
410.
As consequências desse saque foram pequenas, se comparadas ao feito pelos
Vândalos em 455. Os Vândalos era um povo bárbaro bem mais primitivo e belicoso,
promovendo uma destruição sem precedentes na cidade, partindo com valores incontáveis e
destruindo obras de arte e bibliotecas.
O final da Antiguidade é marcado pela deposição do último imperador romano,
Rômulo Augusto, em 476, data também conhecida como Queda do Império Romano do
Ocidente.
Os romanos do ocidente formavam um povo de orientação extremamente prática.
Apesar de maravilhados com a Filosofia Grega, não chegaram a grandes desenvolvimentos
no entendimento do universo ou do mundo natural. Numa negligência com graves
consequências para os séculos vindouros, sequer chegaram a traduzir os tratados científicos
produzidos pelos gregos, ficando este conhecimento restrito a uma pequena comunidade
14
bilíngue. Por fim, a perda do contato com o oriente, por conta da Queda e da barreira
imposta pelos povos bárbaros fez com que mesmo a elite esquecesse a língua grega. Assim,
a Europa Ocidental perdeu o acesso aos tratados originais de Platão e Aristóteles, ficando
apenas com compilações truncadas severamente prejudicadas por falhas de interpretação.
Mesmo o latim ia perdendo força, visto que cada um do povos bárbaros falava sua própria
língua. Com a infra-estrutura destruída e sem língua de integração, pouco progresso
científico ocorreria por alguns séculos.
Outro era o cenário no oriente. A parte oriental do Império Romano, o Império
Bizantino, resistia firmemente. Para estes, a cultura grega era muito mais presente e mesmo
esta língua era dominante. Acabaram-se tornando herdeiros da tradição helenística, ao
mesmo tempo em que sua posição geográfica lhe permitia receber influência de povos ainda
mais orientais, como os hindus.
15
3 A Idade Média Antiga
A queda do Império Romano do Ocidente, muito mais do que uma data no ano de
476, foi um processo que durou ao menos 3 séculos, antes e depois da deposição de Rômulo
Augusto. Os primeiros anos da Idade Média, portanto, devem ser analisados em conjunto
com os últimos anos da Antiguidade, num período que ora é chamado Antiguidade Tardia,
ora Idade Média Antiga, que vai de, aproximadamente, 300 a 700 depois de Cristo4.
Foi uma fase difícil para a cultura em geral. A unidade gerada pela Pax Romana5 havia
se desintegrado, transformando o mundo ocidental numa colcha de retalhos de reinos
bárbaros, essencialmente rurais e semi-nômades. Povos que, em sua grande maioria, pouco
valor davam ao progresso facilitado pelos desenvolvimentos helênicos.
3.1 O Neoplatonismo
Um pouco antes do período aqui considerado, surgiu uma corrente filosófica
chamada posteriormente Neoplatonismo, apesar de, na época, seus seguidores acreditarem-
se, simplesmente, platônicos. O Neoplatonismo foi estabelecido por Plotino (205 – 270).
Egípcio de nascimento, este tomou contato com a filosofia persa e indiana ao acompanhar
uma expedição militar à Pérsia. Em Alexandria (cidade que, já havia alguns séculos, era o
grande ponto de encontro entre a filosofia grega e a mística oriental), apaixonou-se pela
filosofia de Platão. Aos 40 anos estabeleceu-se em Roma, onde atraiu certa quantidade de
4 Não há consenso entre os historiadores a respeitos das subdivisões históricas da Idade Média. Neste
trabalho, a dividiremos em três fases: da decadência do Império Romano até a contenção da invasão islâmica
em Poitiers: Idade Média Antiga ( 300 – 732); até a Peste Negra: Alta Idade Média ( 732 – 1348); e até o
descobrimento da América: Baixa Idade Média ( 1348 – 1492). 5 Expressão latina que significa “paz romana”. Normalmente utilizada para referir-se ao longo período
( 29 aC a 180 dC) de relativa paz, segurança e ordem, mantido pelo poderio militar dos generais Romanos.
16
alunos. Seu sonho era construir, em Campania, uma cidade chamada Platonópolis, onde os
habitantes viveriam de acordo com as regras citadas na República, de Platão.
O Neoplatonismo interpretava os ensinamentos de Platão e dos platônicos de forma
bastante diversificada, mas o importante para nosso estudo é verificar que, salvo raríssimas
exceções, os neoplatônicos compartilhavam com seu mentor grego certo desdém pela
matéria. Como dizem as Enéadas, de Plotino:
[III VI.7] [...] Porém, como a matéria não é alma, nem intelecto, nem vida, nem
forma, nem razão, nem limite – pois é ilimitude -, nem potência – pois o que ela
produz? -, mas está excluída de todas essas coisas e não pode receber propriamente
a denominação de ente, é razoável chamá-la não-ente, não do modo como o
movimento é não-ente e o repouso é não-ente, mas verdadeiramente não-ente,
imagem e aparência de massa, desejo de existência, estável mas sem estabilidade
[...] Por isso ela mente em tudo que proclama: se aparece grande, é pequena; se
mais, é menos, e seu ente em aparência é não-ente, um brinquedo fugidio [...]
(apud BARACAT JR, 2006)
Com tamanho desprezo pela matéria, não é de se espantar que os neoplatônicos não
tenham feito progressos na Filosofia Natural. De fato, estavam mais focados nos aspectos
espirituais do pensamento de Platão que, como vimos no capítulo anterior, estava por
demais absorto no uso do intelecto para levar levar em consideração os aspectos do mundo
sensível.
3.2 Santo Agostinho e seu Comentário Literal ao Gênesis
Aurélio Agostinho (354 – 430), ou Agostinho de Hipona (atual Annaba, na Argélia),
posteriormente conhecido como Santo Agostinho foi um bispo católico e o principal teólogo
da Idade Média Antiga. De fato, sua própria vida é uma alegoria da transição entre a
17
Antiguidade e a Idade Média (GAARDNER, 1995). Santo Agostinho nasceu em Tagasta, no
Norte da África (na região hoje pertencente à Argélia), filho e pai pagão e mãe católica. Aos
dezesseis anos foi estudar em Cartago e, nesta época, abraçou o Maniqueísmo (espécie de
religião de origem Persa). Tornou-se importante professor de Gramática e Retórica e acabou
sendo chamado para lecionar em Roma e em Milão. Santo Agostinho chegou a Milão aos 30
anos.
Em Roma, já decepcionado com o Maniqueísmo, Santo Agostinho aderiu ao
Neoplatonismo. Pouco depois, tendo contato com as obras dos Padres da Igreja6, converteu-
se ao catolicismo e decidiu levar uma vida clerical, abandonando, inclusive a carreira de
professor. Retornando à África, foi ordenado sacerdote e, posteriormente, bispo de Hipona.
Por conta da sua erudição e de sua larga experiência pessoal, Santo Agostinho tinha a
tendência de encontrar similitudes entre as diversas filosofias que conhecera. Em especial,
conseguiu conciliar o Neoplatonismo e o Cristianismo. Chegava mesmo a se perguntar se
Platão não teria conhecido ao menos parte do Antigo Testamento, tamanha a quantidade de
paralelos que observava entre sua doutrina e a cristã.
Mesmo em pontos aparentemente divergentes, como a criação do mundo, Santo
Agostinho encontrou uma forma de aliar o pensamento grego com o judaico-cristão. Como
vimos, para Platão o Demiurgo organizou o mundo a partir de uma massa caótica de
materiais pré-existente; mas os cristãos acreditavam que o mundo foi criado por Deus a
partir do nada. Santo Agostinho disse que, antes de Deus ter criado o mundo, as Idéias (os
entes perfeitos de Platão) já existiam em sua mente (GAARDNER, 1995). Essa explicação
6 Grandes teólogos, professores e bispos cristãos que viveram entre o séculos II e VII em todo o mundo
civilizado da época. Na confusão teo-filosófica dos primeiros anos do cristianismo, proporcionaram a unidade da interpretação da Bíblia e registraram as tradições. O estudo de suas obras denomina-se Patristica.
18
agradava as duas teorias, visto que conciliavam um mundo eterno (o mundo das Idéias), com
uma terra feita a partir do nada.
Em se tratando da criação do mundo, Santo Agostinho deixou um livro cuja leitura
surpreende quem acredita na incompatibilidade entre Fé e Razão, e é fundamental para
nosso interesse em historiografar a Filosofia Natural. Em Comentário Literal ao Gênesis (no
original latino: De Genesi ad Litteram), Santo Agostinho perfaz comentários aos 3 primeiros
capítulos do primeiro livro da Bíblia, justamente os que contém a doutrina judaico-cristão
sobre a criação do mundo, da vida e da morte7.
No livro, Santo Augustinho é particularmente enfático ao afirmar que não devemos
interpretar rígida e dogmaticamente a Bíblia, chegando a conclusões que podem ser
facilmente demonstradas falsas com base nas evidências físicas:
Normalmente, mesmo um não-Cristão sabe algumas coisas sobre a terra, os céus ,
e os outros elementos deste mundo, sobre o movimento e órbita das estrelas e
mesmo seus tamanhos e posições relativas, sobre a previsão de eclipses do sol e da
lua, os ciclos do ano e as estações, sobre os tipos de animais, arbustos, pedras, e daí
por diante, e este conhecimento é tido como certo pela razão e experiência. Agora,
é algo desgraçante e perigoso para um infiel ouvir um Cristão, presumivelmente
interpretando a Sagrada Escritura, falando bobagens sobre estes assuntos; e nós
devemos tomar todas as atitudes para pevenir uma situação tão embaraçosa, na
qual as pessoas descobrem a vasta ignorância do Cristão e riem com escárnio. A
vergonha não é tanta para o indivíduo ignorante que é ridicularizado, mas as
pessoas fora da morada da fé crêem que aquela seria a posição dos escritores
sagrados, e, com grande prejuízo daqueles para cuja salvação trabalhamos, os
escritores de nossa Escritura são criticados e rejeitados como homens iletrados...
(AGOSTINHO, 1982, p. 42-43)
7 Os excertos que serão aqui reproduzidos deste livro são uma tradução livre da versão em inglês de
John Hammond Taylor, disponível em <http://books.google.com/books/about/The_Literal_Meaning_of_Genesis.html>. Há uma tradução para o português publicada pela Ed Paulus, mas o autor não teve acesso a esta.
19
De fato, Santo Agostinho, por exemplo, afirma diversas vezes que os seis dias da
criação não têm a ver com passagem do tempo , mas sim com uma sequência lógica.
[os dias da criação] estão além da experiência e do conhecimento de nós homens
mortais e terrenos... devemos ter em mente que os dias de hoje lembram os dias da
criação mas não são de forma alguma iguais a eles (p. 135) [...] nós não devemos
pensar naqueles dias como dias solares (p. 154)
Há também um considerável esforço em relacionar Genesis I aos quatro elementos
da tradição grega.
Certamente ninguém deve pensar que nesta passagem da Sagrada Escritura há
omissão de qualquer dos quatro elementos dos quais normalmente se supõe que
constituem o mundo apenas porque parece não haver menção do ar no tratamento
do céu, água e terra (p. 76)
Quanto bom senso para uma época dita fundamentalista!8
3.3 Porque não Aristóteles?
Alguém poderia pensar que seria muito mais interessante para a Filosofia Natural um
“Neoaristotelismo”, visto que o Leitor9, ao valorizar a realidade sensível, fez muitos mais
avanços para a área que estudamos. Devemos lembrar, entretanto, que cada tempo tem seu
próprio Zeitgeist10.
8 Para mais comentários a respeito da visão agostiniana da criação, consulte (YOUNG, 1988)
9 Alcunha de Aristóteles cunhada por seu mestre Platão, pela avidez com que lia e por se ter cercado
dos livros dos poetas e filósofos. 10
Termo alemão cuja tradução literal é “espírito da época”. Significa, em suma, o conjunto do clima intelectual e cultural do mundo, numa certa época, ou as características genéricas de um determinado periodo de tempo.
20
“Tempos difíceis exigem medidas extremas”, diz um lema da cultura popular. A Idade
Média Antiga, para a Europa Ocidental, era um tempo difícil. Como já mostramos
anteriormente, o Império Romano do Ocidente havia perdido toda sua infra-estrutura e se
transformado num amontoado de tribos bárbaras, que sequer falavam a mesma língua. Uma
única instituição conseguiu manter a integridade neste processo, pela sua popularidade nas
mais diversas classes sociais e por sua penetração mesmo nas tribos bárbaras: a Igreja
Católica.
O grosso da força intelectual daquele tempo estava dentro dos mosteiros. Esses
estudiosos viviam numa atmosfera de fé, e a manutenção da proeminência da Igreja, mais
do que uma questão de status, era fundamental para a sobrevivência da própria civilização.
Assim, a unidade da Igreja precisava ser mantida a qualquer custo. Havia um
policiamento constante contra as heresias e contra as ideologias externas que pudessem
feri-la. O próprio saber Clássico era visto com extremas reservas. Esta era uma cultura a se
condenar, porque vinha de um ambiente por demais ligado ao saber humanístico e filosófico
(temporal e secular, portanto), além de ligado ao paganismo, tido por muitos da época como
causa da decadência do Império. (AMARAL, 2006)
Santo Agostinho foi um dos primeiros a perceber que a cultura helenística, se
devidamente utilizada, não iria causar dano à Igreja:
Pois tal como os egípcios não só possuiam ídolos e grande cargas que o povo de
Israel não podia senão detestar e evitar, também possuíam vasilhas e adornos de
ouro e prata e vestimentas que o povo que saia do Egito reivindicou como
destinados ao melhor uso, não levados pela sua própria decisão, senão por
mandato divino, assim as doutrinas dos gentios não só contém criações inventadas
e perniciosas e alforjas carregadas de esforço inútil, coisas todas que nós que
saímos da sociedade dos gentios, sob a guia de Cristo, devemos não aceitar e
evitar, senão também matérias dignas de aprendizagem adequadas para acender
21
as verdades da fé e certas normas morais muito úteis e também que se encontram
certas verdades sobre o culto de Deus. O cristão deve tomá-las com o justo fim de
predicar o evangelho. (AGOSTINHO, 1969 apud AMARAL, 2006)
Ao “batizar” Platão e o Neoplatonismo, Santo Agostinho conseguiu manter viva a
chama grega nas bibliotecas dos monastérios. Entretanto, o uso deste conhecimento deveria
servir primordialmente aos interesses da fé.
Se a Filosofia Natural de Aristóteles superava a de Platão, a Filosofia Moral (mais afim
às questões religiosas) do último suplantava a do primeiro. E o estudo dos conhecimentos
naturais era uma pequena parte da escolaridade dos intelectuais de então. Era necessário
estudar o movimento das estrelas para saber a hora certa de rezar e para computar a data
da Páscoa, mas não mais que isto11. Ainda, o Demiurgo atuante de Platão era mais
cristianizável que o deus estranho de Aristóteles, que sequer tinha conhecimento da Terra.
A semente de Aristóteles precisava do terreno de uma civilização que estivesse sobre
menos pressão para florescer, e esse terreno era formado pelas escaldantes areias das
arábias.
11 O desenvolvimento da agricultura foi uma notável exceção a esta regra (WOODS JR, 2005, p. 28-34).
22
4 O Islã e a orientalização de Aristóteles
4.1 Nascimento e expansão do Islamismo
A civilização islâmica teve início com o profeta Maomé (571-632), nativo da cidade de
Meca (no atual território da Arábia Saudita). Segundo os muçulmanos, o arcanjo Gabriel
visitou Maomé e lhe ditou o texto do Alcorão Sagrado, que seria a revelação final de uma fé
que foi mostrada em vários momentos anteriores da história, por meio de Abraão, Moisés e
Jesus, por exemplo. Estes, entretanto, ao contrário de Maomé, teriam alterado e
corrompido esta fé, cabendo ao Profeta proclamar a palavra literal de Deus. (Islão, 2012)
Meca, à época, tinha um importante comércio, frequentado por mercadores de
diversas partes do mundo. Ficava inserida no deserto árabe, que não foi anexado pelos
impérios Bizantino ou Persa, mas dominado por uma miríade de tribos nômades que viviam
do comércio e da bandidagem.
A pregação de Maomé em Meca mostrou-se infrutífera, e ele a deixou, dirigindo-se
ao norte, para a cidade de Medina, em 622 (ano zero do calendário islâmico). Lá ele teve
sucesso e acabou retornando a Meca como um conquistador. Em seguida, reuniu os povos
do deserto sob a bandeira do Islã e formou um exército capaz de dominar boa parte do
mundo antigo.
À época, o Império Bizantino havia acabado de derrotar o Persa na última de uma
longa série de guerras que havia deixado ambos os exércitos severamente enfraquecidos.
Não foi difícil para o Islã conquistar rapidamente toda a Pérsia, a Palestina, o Egito e a Síria.
Dirigiram-se, em seguida, à costa norte da África (incluindo Cartago), até o Marrocos,
cruzando o estreito de Gibraltar e chegando à Espanha em 710. Após dominarem a
23
Península Ibérica foram finalmente parados por Carlos Martel nos Pireneus em outubro de
732. (HANNAM, 2009)
4.2 A introdução de Aristóteles no mundo islâmico
Já tratamos de como a perda da fluência na língua grega tirou do Ocidente boa parte
de sua herança clássica. Os árabes não tiveram este problema, visto que conquistaram vários
povos onde este idioma era largamente difundido. Os cristãos sírios, em especial, eram
excelentes tradutores, posto que, ao mesmo tempo em que tinham o grego como língua
litúrgica, falavam no dia-a-dia o siríaco, uma língua intimamente relacionada com o árabe
(HANNAM, 2009). Para tirar proveito deste fato, o Califa al-Ma’mun (786-833) fundou em
Bagdá a Casa da Sabedoria, uma sociedade dedicada à tradução e preservação de obras
antigas.
Em constraste ao Cristianismo, que se espalhou paulatinamente e através do
proselitismo, o Islã se espalhou rapidamente e através de conquistas militares. A jihad,
conceito de “guerra santa” que exprime a expansão do Islã por toda a terra através das
armas (MATTEI, 2002), é teorizada pelo próprio Alcorão:
[IX.29] Combatei os que não crêem em Deus nem no Último Dia nem proíbem o que
Deus e o Seu Enviado proíbem, os que não praticam a religião da verdade entre
aqueles a quem foi dado o Livro! Combatei-os até que paguem o tributo por sua
própria mão e sejam humilhados. (Alcorão. Parte I, 1978)
Neste contexto, não é de se espantar que o processo de tradução tenha se iniciado a
partir das obras científicas (MACEDO, 2009), cuja utilização militar (estudo dos materiais,
orientação astronômica, etc.) era mais imediata. Desta época, consta a primeira tradução de
24
Timeu e de muitos textos apócrifos, além de outras obras científicas de Aristóteles.
Posteriormente, quase todos os textos Aristotélicos foram traduzidos.
Citaremos aqui dois filósofos islâmicos aristotélicos que muito influenciaram a
Europa posteriormente:
Avicena (980 – 1037), cujo nome foi latinizado a partir de Ibn Sina, foi o mais famoso
polímata do Islã medieval. Procurou conciliar as doutrinas de Platão e Aristóteles e cerca de
240 dos seus livros chegaram aos nossos dias. Promoveu grandes avanços na medicina e sua
visão da metafísica foi fundamental para a aceitação futura de Aristóteles na Europa.
Averroes (1126-1198), cujo nome foi latinizado a partir de Ibn Ruchd. Foi,
provavelmente, o maior conhecedor e comentarista de Aristóteles de sua época.
4.3 O método científico e outras contribuições
Estaríamos errados se tratássemos do Islã simplesmente como um duto por onde o
conhecimento antigo chegou à Europa Ocidental. Na verdade, a importância da ciência
islâmica reside nos seus trabalhos inovadores no campo da filosofia, matemática e medicina,
dentre outros. A origem árabe de termos como álgebra e algoritmo indica que devemos
bastante à Era de Ouro Islâmica12.
De fato, os islâmicos tiraram bastante proveito de seu contato com os povos chineses
e hindus, por exemplo. Na Batalha de Talas (território atualmente localizado no Quirguistão),
ocorrida em 751, os árabes capturaram chineses que conheciam técnicas de fabricação de
papel, barateando e tornando mais eficiente o registro da cultura (que antes utilizava pele
de animais ou papiro como suporte da escrita). Do contato com os hindus, adveio a
12 Época do florescimento cultural muçulmano, normalmente datada entre os séculos VIII e XIII
25
revolucionária numeração indo-arábica, com os algarismos13 tendo valor posicional e
incluindo o zero.
Ainda mais impressionante é a história de Alhazen (965 – 1039), cujo nome foi
latinizado a partir de Ibn al-Haytham. Já mencionamos que a Filosofia Natural de Aristóteles
não se apoiava em experimentos e era meramente qualitativa. Pois bem, Alhazen, com as
ferramentas introduzidas por al-Khwarizmi, pôs o seguinte prefácio em sua obra Ótica (em
tradução livre):
Nosso assunto é obscuro e o caminho que leva ao conhecimento de sua natureza é
difícil; ainda mais, nossa pesquisa requer uma combinação de ciências naturais e
matemáticas. Depende das ciência naturais porque a visão é um dos sentidos e
estes pertencem às coisas naturais. Depende das ciências matemáticas porque a
visão percebe a forma, posição, magnitude, movimento, e repouso, em adição ao
fato de ser caracterizada por linhas retas; e desde que são as ciências matemáticas
que investigam estas coisas, a pesquisa em nosso assunto verdadeiramente
combina as ciências naturais e matemáticas. (The Optics of Ibn al-Haytham Books I-
III, 1989 apud GRANT, 2006)
No mesmo livro, Alhazen desenvolve um rigoroso método experimental para verificar
suas hipóteses teóricas. Muitos historiadores, portanto, creditam a ele a invenção do
método científico e a quantificação dos resultados da Filosofia Natural (GRANT, 2006).
Quanto à cosmologia, cabe também a Alhazen o crédito da primeira tentativa de
observar e medir a paralaxe da Via-Láctea, concluindo que, por não ter paralaxe observável,
seria muito distante da Terra e não pertenceria à nossa atmosfera. Parte do legado islâmico
da época também são as centenas de instrumentos astronômicos que se conservam, como
esferas, relógios de sol e astrolábios.
13
Palavra cuja etimologia remete ao matemático persa al-Khwarizmi, que, em 825, escreveu o livro Sobre o cálculo com Numerais Hindus. Outro livro seu, Sobre o cálculo Algébrico e confrontação, é considerado o primeiro da história da álgebra.
26
Infelizmente, o mundo islâmico também foi alvo de invasões bárbaras. Tribos
mongóis atacaram o oriente islâmico durante o século XIII. Em 1258, Hulagu Khan invadiu e
destruiu Bagdá. Pelo lado central e ocidental, havia o perigo imposto pelas Cruzadas. Tal
qual aconteceu com a Europa Ocidental, o declínio territorial levou ao declínio cultural. Foi o
fim da Era de Ouro Islâmica.
Os avanços filosóficos e científicos, entretanto, ficaram registrados. Sem sombra de
dúvida, seriam utilizados nos séculos seguintes por quem tivesse contato com esses
registros.
27
5 A Alta Idade Média
5.1 A Renascença Carolíngia
A derrota dos muçulmanos em Poitiers (732) avivou o poderio militar dos francos.
Sobre sua vitória, Carlos Martel e seus descendentes transformaram a França na maior
potência da Europa. Ao mesmo tempo, a conversão dos francos (sálios e ripuálios), saxões,
bávaros e suábios à fé Católica, era um fator de união das principais tribos da Europa Central
e Ocidental contra um inimigo que os cercava pelo sul e pelo oeste. Tal inimigo, o Islã, pela
sua própria motivação, não seria convertido. Era necessário fazer retornar a unidade que
existia na época do Império Romano. A solução foi a intituição do Sacro Império Romano-
Germânico, cujo primeiro Imperador foi Carlos Magno (742 – 814), coroado no Natal do ano
800 pelo Papa Leão III e durou até o início da Idade Contemporânea como um símbolo da
união dos povos europeus.
Com a relativa paz e a ascenção de Carlos Magno, a Europa viveu uma época de
grande florescimento cultural, conhecida como Renascença Carolíngia. Apesar de iletrado,
Carlos Magnou utilizou sua influência e grandes recursos para encorajar o ensino e as artes,
chegando mesmo a ordenar a criação de escolas formais nos monastérios e catedrais.
Muitos dos que frequentavam estas escolas viriam a tornar-se clérigos, mas tal condição não
era compulsória. Mercadores, advogados, médicos, cientistas práticos e intelectuais em
geral poderiam iniciar sua educação aos pés de um Mestre nomeado pelo Bispo ou Abade
(HANNAM, 2009). Desta época, ficaram famosas as escolas de Fulda, Corbey e São Galo
(GRANT, 2006). Nestas e em outras, uma das principais atividades era o ensino do Latim
28
gramaticalmente correto, que vinha sendo perdido pela profusão de línguas germânicas,
com grave prejuízo para a continuidade da tradição clássica.
Outra atividade muito importante era a cópia, correção e divulgação de textos latinos
da Antiguidade e da Idade Média Antiga, cuja gerência geral Carlos Magno incumbiu
inicialmente a um sacerdote inglês, que viria a ser conhecido posteriormente como Santo
Alcuíno de York, tido pela Igreja Católica de hoje como o santo padroeiro das universidades
cristãs. Diz um historiador atual:
[tradução livre] Nem sempre as pessoas percebem que apenas três ou quatro
manuscritos originais de autores latinos existem até os dias de hoje: todo nosso
conhecimento de literatura antiga se deve à coleção e ao trabalhos dos copistas
que começou sob Carlos Magno, e quase todo texto clássico que sobreviveu até o
século VIII sobreviveu até os dias de hoje. (CLARK, 1969 apud WOODS JR, 2005)
Os manuscritos desta época são facilmente reconhecíveis por conta de outro dos
avanços da Renascença Carolíngia: a minúscula Carolíngia, uma nova família caligráfica. Os
textos anteriores eram escritos em maiúsculas, sem espaços entre as palavras ou pontuação.
Além disso, a forma das letras era tão regional, que dificilmente um texto copiado em um
mosteiro conseguia ser lido pelos monges de outro (WOODS JR, 2005). A minúscula
Carolíngia sanou estes problemas, tornando a leitura uma tarefa mais fácil e prazeirosa.
A disseminação do ensino atingiu até mesmo as crianças e o menos favorecidos.
Teodulfo ( 750 – 821), Bispo de Orleáns, foi um pioneiro no campo do ensino público,
acreditando que todos tinham direito à educação e que a falta de dinheiro não deveria
impedir as pessoas de aprender. Assim ele instruia os padres de sua diocese:
[XX] [...] Os presbíteros devem ter escolas em suas vilas e distritos, e se qualquer fiel
quiser lhe recomendar suas crianças para que aprendam as letras, apoiem e
29
ensinem. Não recusem, mas ensinem com a maior caridade, em atenção ao que
está escrito: “Os que são esclarecidos resplandecerão, como o resplendor do
firmamento; e os que ensinam a muitos a justiça serão como as estrelas, por toda a
eternidade” (Dn 12, 3). Quando terminarem de lhes ensinar, nenhum pagamento
lhes deve ser exigido, nem qualquer outra coisa lhes deve ser tomada, exceto o que
os pais oferecerem de própria vontade. tradução livre de (THEODULFUS
AURELIANENSIS, 821)
Mesmo sem ter ocorrido ainda a introdução da Filosofia Natural Aristotélica, ou da
ciência islâmica, o ambiente intelectual sofria uma revolução. Uma abordagem mais crítica
do conhecimento, tendo a razão por ferramenta, ficava mais popular. A lógica de Boécio,
baseada no uso da razão e fortemente inspirada na de Aristóteles era ensinada livremente e
seria fundamental para a aceitação posterior de Aristóteles (GRANT, 2006).
A Europa Ocidental seria novamente vítima de ataques exógenos durante os séculos
IX e X. Invadiram desta vez os Muçulmanos, os Vikings e os Hunos. A Renascença Carolíngia
perderia seu ímpeto, mas o legado permaneceu.
5.2 Gerbert de Aurillac: o Papa Acadêmico
Um fruto direto da Renascença Carolíngia foi o advento de um homem como Gerbert
de Aurillac (946-1003). Gerbert nasceu na aldeia francesa de Belliac, numa família humilde.
Aos 17 anos, ingressou no mosteiro de São Geraldo de Aurillac. Por sua origem, o natural
seria que Gerbert recebesse apenas a formação básica do trivium (gramática, lógica e
retórica) e depois passasse o resto de sua vida como irmão leigo, fazendo os trabalhos
braçais do dia-a-dia. O desempenho de Gerbert, entretanto, fez com que ele fosse admitido
entre os Monges, recebendo a formação avançada do quadrivium (aritmética, geometria,
30
música e astronomia), além de noções básicas da língua grega, e o próprio Abade permitiu
que ele se dedicasse à vida acadêmica. (HANNAM, 2009)
Por volta de 967, Borrel II, um nobre militar de Barcelona (território atualmente
espanhol, na região da Catalunha), de passagem pela França, visitou o mosteiro de Aurillac.
Borrel II era conhecido por dar suporte a jovens interessados nos estudos avançados e, de
comum acordo com o Abade, Gerbert foi convidado a retornar à Catalunha com o nobre,
onde passou um tempo no mosteiro de Vich e na abadia de Santa Maria de Ripoll, o centro
intelectual mais importante da região.
O Condado de Barcelona de então situava-se numa região de fronteira com o Islã,
que, como vimos, dominava toda a porção central e sul da Península Ibérica na época. Nos
raros períodos de calma, portanto, era comum por ali a presença de líderes islâmicos
andaluzes14, vindos, principalmente da grande Córdoba. Em Santa Maria de Ripoll havia
grande número de documentos moçárabes15 e mesmo árabes, trocados de estudiosos
islâmicos por outros manuscritos de seu interesse. (MAYFIELD, 2012)
Nos quase 3 anos que viveu ali, Gerbert teve contato com traduções de vários
trabalhos de Aristóteles, além dos tratados matemáticos e astronômicos que mencionamos
no capítulo anterior. De volta ao coração da Europa, em 969, Gerbert chegou à Roma
proficiente em dois assuntos que poucos europeus já tinham ouvido falar: o astrolábio e o
uso dos algarismos indo-arábicos. Ao ser apresentado ao Papa João XIII e ao Imperador Otto
I, seus conhecimentos foram tão impressionante que o Imperador contratou-o para ser tutor
de seu filho, o futuro Imperador Otto II. Alguns anos mais tarde, Gerbert foi nomeado
professor na escola da catedral de Reims. (Pope Sylvester II, 2012)
14
Nativo de al-Andaluz (latinizado para Andaluzia): nome dado à Península Ibérica pelos conquistadores islâmicos.
15 Os moçárabes eram cristãos ibéricos que viviam sob domínio muçulmano na Andaluzia. Bilíngues entre Árabe e Latim, traduziram muitos documentos da cultura islâmica.
31
Enquanto professor em Reims, Gerbert escreveu uma série de livros sobre o
quadrivium, de acordo com uma didática que conheceu ao ler sobre o sistema educacional
de Córdoba. Projetou o órgão de tubo mais perfeito da época, utilizando um sistema
hidráulico e aplicando seus conhecimentos de matemática e música. Redesenhou o ábaco,
que havia sido esquecido, introduzindo nele os algarismos indo-arábicos. Com este novo
ábaco, Gerbert conseguia executar com velocidade contas que eram extremamente difíceis
com o uso apenas dos numerais romanos. Trouxe para a Europa, ainda, a esfera armilar,
como um meio auxiliar para o ensino da astronomia. (Pope Sylvester II, 2012)
Fruto de suas relações com a elite Gerbert acabou por ser nomeado Papa, adotando
o nome de Silvestre II. Passou apenas 4 anos nesta situação, entretanto, vindo a falecer no
ano de 1003.
Ao adotar seu nome, Silvestre II homenageia o primeiro Silvestre, que batizou
Constantino, o primeiro Imperador Romano cristão. E, se o primeiro Silvestre foi o
responsável por internalizar a cultura cristã dentro da Europa pagã, o segundo fez o caminho
oposto, trazendo para a Europa cristã os conhecimentos árabes e abrindo caminho ao
reconhecimento de Aristóteles.
5.3 O surgimento das universidades
Tal como aconteceu com Gergert de Aurillac, muitos talentos foram descobertos pela
popularização do ensino. À medida que isso acontecia, mais e mais alunos ficavam
interessados em frequentar as classes de ensinos superiores. As escolas ligadas aos
mosteiros das pequenas cidades já não davam conta da instrução a tantos estudantes. A
32
urbanização das cidades também já dificultava o acesso à escolas ligadas a catedrais, que,
em geral, não tinham estrutura para mais de 100 alunos.
Por volta dos séculos XII e XIII, em diversas cidades européias, mas, principalmente,
em Paris e Bologna, aconteceu um processo importante para o surgimento das
Universidades:
Em Paris, com as escolas locais lotadas, alguns professores começaram a alugar
salões fora da catedral e dos monastérios, e para ali acorriam estudantes que não
conseguiam ter aula no corpo principal da escola, principalmente os que desejavam estudar
com os professores da escola da Catedral de Notre Dame (na época, a mais prestigiosa no
estudo da Teologia). Com o tempo, o bairro, que ficou conhecido como Quartier Latin,
reuniu professores e alunos de mais renome que os da própria Catedral. (NELSON, 2001)
Já em Bologna, a introdução de uma escola fora da catedral foi feita pelos próprios
alunos. Na época, esta cidade era um grande centro intelectual, e atraía um enorme número
de estudantes, vindos de todas as partes da Europa, interessados numa das artes mais
rentáveis do tempo: o Direito (tanto Canônico quanto Civil). A política de Bologna, na época,
para conter a arruaça causada por um número tão grande de jovens estrangeiros reunidos,
era creditar a todos os estudantes de uma determinada nacionalidade a pena por qualquer
transgressão causada um deles. Por exemplo: se um francês não conseguia pagar uma dívida
de sua hospedagem, o governo mandava outro francês assumir a dívida. Ou se um
cometesse um crime e fugisse, outro poderia ser preso em seu lugar. Os estudantes
começaram, então, a, em grupos, contratar os próprios professores da escola local para lhes
ensinar como se defender no tribunal de casos assim, bem como para discutir outros
assuntos que lhes interessavam, mas que não eram abordados com profundidade nas aulas
oficiais. A questão foi se generalizando até o ponto em que a maior parte das aulas era dada
33
fora da escola. Nesta situação, os alunos tinham mais poder que os próprios professores,
visto que montavam o próprio currículo e puniam financeiramente os instrutores
preguiçosos ou que não cumpriam o prometido. De fato, era um ambiente em que os
professores competiam pelos alunos. (LONG, 1994)
Com o tempo, essas “corporações” (universitas, em latim) de mestres e alunos foram
ganhando força numérica e exigiram reconhecimento, proteção e autonomia, sob pena de
simplesmente abandonarem as cidades onde tinham surgido, com grave prejuízo para a
economia local. Tanto o poder secular quanto a Igreja cederam a esta pressão, e em 1088 foi
oficializada a primeira universidade da Europa: a de Bologna, seguida pela de Paris (1150).
Seguiram o exemplo outras cidades: Oxford (1167), Modena (1175), e muitas outras.
A estrutura de “corporação” (ou “guilda”) refletiu-se na sequência de títulos
fornecidos por estas universidades. A situação do aluno iniciante (como o de graduação,
hoje) era análoga à de um aprendiz. A ele eram passados os princípios do trivium e do
quadrivium. Ao completar, recebia o título de bacharel em artes. Ao desejar uma educação
mais avançada, ele escolheria entre as especializações em Direito, Medicina ou Teologia
(esta última a mais longa). Completando-as, era análogo a um artista e podia lecionar na
universidade. O maior status era concedido a quem apresentasse uma “obra-prima”, na
forma de uma tese. A estes, um título similar ao de Doutor era concedido, podendo ser
eleito para assumir uma das cadeiras principais. Normalmente, as universidades
reconheciam os títulos uma da outra, e era grande a movimentação dos graduados. (COLICH,
1997)
O surgimento da universidade medieval coincidiu com a reintrodução em larga escala
do Aristotelismo na Europa, através dos escritos Bizantinos e Árabes. A autonomia das
universidades permitiu colocar Aristóteles e a Filosofia Natural no currículo de diversos
34
cursos, numa época da história que ficou conhecida como Renascença do século XII. Já no
século XIII, quase a metade dos corpo dos Abades, Arcebispos e Cardeais era formada por
ex-universitários (visto que as universidades aceitavam tanto os que desejavam uma vida
leiga quanto os que almejavam carreira dentro da Igreja), e boa parte dos maiores
intelectuais da Idade Média tinham o título de doutorado. Era o caso de Robert Grosseteste
e Santo Tomás de Aquino.
5.4 Robert Grosseteste: cores sobre a Idade Média
Robert Grosseteste (1175 - 1253) foi um religioso inglês nascido em Suffolk. Em 1214
recebeu seu título de doutor em Teologia pela Universidade de Paris, indo, em seguida,
lecionar em Oxford, sendo nomeado seu Chanceler (o que corresponde hoje ao reitor) em
1234, um ano antes de se tornar Bispo de Lincoln. Seu conhecimento da língua grega lhe
permitiu estudar vários dos manuscritos de Aristóteles sobre Filosofia Natural (manuscritos
que, como vimos, chegaram à europa através de mãos bizantinas e árabes). Ao contrário de
seus sucessores, entretanto, Grosseteste não tentou cristianizar Aristóteles. Sua teologia era
quase completamente Agostina (por consequência, Neoplatônica). Seu interesse em
Aristóteles era primariamente científico e ele sequer tenta qualquer tipo de sincretismo.
(Robert Grosseteste, 2012)
A maior parte de seus estudos científicos relacionou-se à luz e a seus fenômenos. Em
sua obra De luce16, talvez o tratado cosmogônico mais original da Idade Média, ele
determina a luz como “a primeira forma corpórea”, sendo o principal elemento de partida
para a construção da matéria. Ao mesmo tempo, ele hierarquiza as ciências: por exemplo, a
16 Tradução inglesa disponível em <http://www.lumen.nu/rekvelkd/wp/?page_id=175>
35
ótica seria subordinada à geometria porque a primeira utiliza conhecimentos da última.
Conclui, assim, que a matemática é a mãe de todas as ciências naturais.
Grosseteste critica Aristóteles, no entanto, quando se trata de sua recusa à
experimentação. Seu método científico (bastante similar ao atual) implica generalizar
observações particulares experimentais e chegar a uma lei universal, e então utilizar estas
leis universais para prever novas situações particulares. Grosseteste chamou este método de
“resolução e composição”. (Robert Grosseteste, 2012)
O método foi utilizado, por exemplo, no estudo das cores. Em experimentos com
lentes esféricas, Grosseteste observou a decomposição da luz. Generaliza o fato ao afirmar
que as cores não existem por si próprias, mas como uma propriedade da interação da luz
com a matéria. Define algumas propriedades das cores, que segundo ele variam de clara a
obscura, de multa a pauca, e de purum a impurum (BROOKS, 2012). Em seguida, ao observar
o arco-íris, conclui que elçe é causado pela refração da luz por uma nuvem composta de
gotas de água que atuam como lentes. Robert Grossetest é ainda capaz de matematizar a
refração de raios de luz quando atravessam lentes esféricas e convexas, sugerindo que as
lentes poderiam ser capazes de aumentar a imagem de objeto e corrigir deficiências da
visão, um trabalho que posteriormente seria aplicado aos telescópios e, já no final de seu
século, nos óculos. (COLICH, 1997)
5.5 Roger Bacon: som e luz
Roger Bacon (1214 – 1294) foi um frade franciscano inglês, nascido em Somerset.
Após seu mestrado na Universidade de Oxford (onde teve, provavelmente, contato com
Grosseteste), entrou para a Ordem Franciscana. Diz-se que, nessa época, ele havia gasto
36
todos os seus recursos em materiais para o estudo da alquimia, e a Ordem pagava bem aos
mestres e doutores que guiassem as missões de evangelização. Como um franciscano, Bacon
lecionou tanto em Oxford quanto em Paris. (HANNAM, 2009)
Sendo fluente em árabe, Bacon uniu os trabalhos de Grosseteste e Alhazen sobre
ótica, dando-lhes uma abordagem ainda mais matemática que os primeiros. Bacon
estabeleceu a distância focal em vários tipos de lentes e espelhos. Discutiu também a
fisiologia da visão humana a partir da dissecação de olhos de bovinos e suínos. Ofereceu,
ainda novas hipóteses sobre a luz, incluindo a idéia de de ela tinha uma velocidade que,
apesar de enorme, seria finita. (COLICH, 1997)
Bacon é o primeiro europeu a tratar da composição da pólvora. Provavelmente após
ouvir falar dos fogos de artifício vistos por outros missionários franciscanos e Marco Polo
(1254 – 1324), ele apôs em sua obra Opus Tertium:
Há um brinquedo infantil de som e fogo produzido em várias partes do mundo com
pó de salitre, enxofre e carvão. Este pó é compactado num compartimento do
tamanho de um dedo. Este pode produzir um barulho que irrita seriamente o
ouvido humano, especialmente dos que são pegos desprevenidos, e o terrível flash
de luz também é alarmante. Se um instrumento de tamanho maior fosse usado,
ninguém poderia suportar o terror do barulho e da luz. Se o instrumento fosse
produzido em material sólido, então a violência da explosão seria muito maior.
apud (COLICH, 1997)
Baseado nas últimas frases deste exceto, podemos afirmar que Bacon chegou mesmo
a imaginar o advento das armas de fogo.
Assim como Grosseteste, Bacon era admirador de Aristóteles, traduzindo e
comentando diversos de seus livros. Enfocou que a verdade deveria ser conhecida a partir da
37
realidade da matéria e da experimentação, menosprezando o procedimento argumentativo,
ainda proeminente nas universidades. Diz em sua Opus Maius e na Opus Tertium:
Sem experimentos, nada pode ser adequadamente conhecido. Um argumento
prova teoricamente, mas não dá a certeza necessária para remover toda dúvida;
nem a mente repousará na clareza da verdade, a não ser que a encontre pelos
experimentos. [...]
O maior dos argumentos não prova nada se as conclusões não forem confirmadas
pela experiência.
apud (WOODS JR, 2005)
O temperamento firme e um tanto agressivo de Bacon, aliado à sua visão radical de
Aristóteles, fez com que ele fosse perseguido, e mesmo acusado de corromper a Igreja. Por
conta disso, muitas de suas idéias não tiveram o valor devido na época. Para que Aristóteles
fosse aceito definitivamente, seria necessário um homem que sabia convencer as pessoas
com a linguagem de seu tempo.
5.6 Santo Tomás de Aquino: o Doutor Angélico
Santo Tomás de Aquino (1225 – 1274), foi um frade dominicano, nascido em Aquino,
pequena cidade da parte central da península itálica. Estudou na Universidade de Nápoles e,
posteriormente, na Universidade de Paris, onde foi titulado Doutor em Teologia aos 32 anos.
Na época de Santo Tomás, a maior parte dos filósofos de Aristóteles baseava seus
estudos nas traduções de comentários de Averroes, um islâmico cuja trabalho havia
deturbado um pouco as obras aristotélicas, contaminando-as com suas próprias idéias, fruto
de um ambiente islâmico. Se, no início as diferenças não eram tão notadas, logo elas
mostraram incompatibilidades com a tradição católica, tornando Aristóteles vítima de
38
preconceito. Por conta das traduções imprecisas, muitos viam Aristóteles como mais
compatível com a fé islâmica do que com a católica, e isso era fatal para a fama de um
pensador numa sociedade que tinha o mundo muçulmano como inimigo em duas frentes de
batalha: a Reconquista17 e as Cruzadas18, ao mesmo tempo que fazia os que se dedicassem
ao estudo do mundo natural (uma proposta mais próxima à Aristóteles do que a Platão)
serem ainda vistos com certa reserva pela Igreja. Santo Tomás não desprezou Averroes, mas
mostrou seus erros comparar os comentários com o de outros autores não-cristãos, como
Maimonides (1135 – 1204). Santo Tomás tomou Aristóteles por um servo ancestral da
cristandade; de resto, conseguiu uma amálgama filosófica entre o aristotelismo e o
cristianismo de tal forma que seria quase impossível distinguir entre os dois. Mais do que
compatível, o Aristóteles de Santo Tomás era essencial para a difusão da doutrina cristã.
(COLICH, 1997)
Foge do escopo deste trabalho estudar como Santo Tomás de Aquino conseguiu feito
tão grandioso, mas podemos nos deter às suas idéias mais relevantes à Filosofia Natural.
Nosso comentado esforçou-se por mostrar que não há incompatibilidade entre a fé e
a razão. Segundo ele, o homem tem a capacidade de chegar ao conhecimento da maior
parte da verdades usando apenas os métodos naturais (razão), enquanto a fé deve dominar
o caminho das verdades sobrenaturais. Não deve haver incompatibilidade entre as
conclusões a que chegamos pelo caminho da fé ou pelo caminho da razão, posto que uma
deve justificar a outra, principalmente em campos que se situam entre o natural e o
sobrenatural. É famosa, inclusive, a passagem da Suma Teológica em que Santo Tomás de
Aquino busca provar a existência de Deus através de cinco argumentos: três deles
17
Sequência de guerras na península ibérica, entre os séculos VIII e XV, visando retomar dos muçulmanos as regiões da Espanha e Portugal.
18 Sequência de expedições militares à região da Palestina, entre os séculos XI e XIII, visando conquistar, ocupar e manter essa região, então sob domínio de turcos muçulmanos.
39
puramente racionais e duas verdades de fé (HANNAM, 2009). Por Santo Tomás, qualquer
contradição entre as conclusões deve-se a uma falha de raciocínio, e não à estanqueidade
das duas formas de pensar (WOODS JR, 2005).
Santo Tomás de Aquino recomenda veementemente o método epistemológico de
Aristóteles, projetando-o para, ao mesmo tempo, gerar o conhecimento científico do mundo
natural, e estudar os objetos metafísicos com rigor lógico (GRANT, 2006). Com isso, ele, por
um lado, torna a Teologia uma ciência, enquanto por outro justifica os cientistas perante à
Igreja.
O trabalho do Doutor Angélico, como ficou conhecido este aquinense, tornou-o
considerados por muitos a mente mais brilhante da era cristã. À ele a ciência deve todo o
suporte que lhe foi dado pela Igreja nos séculos seguintes.
5.7 William de Ockham: uma navalha para a posteridade
William (ou Guilherme) de Ockham (1288 – 1348), foi um frade franciscano nascido
na pequena vila de Ockham, em Surrey, sudeste da Inglaterra.
Assim como seu mestre, Duns Scot (1256 – 1308), discordava de Santo Tomás de
Aquino quanto à perfeita integração entre fé e razão. Segundo eles, os caminhos de Deus
não são acessíveis à razão, restando impossível à lógica humana compreendê-los. Não
caberia mais, portanto, à filosofia ser uma serva da teologia, mas adquirir autonomia para
suas próprias investigações (Duns Scot, 2012). Esta posição foi utilizada por alguns filósofos
naturais como uma carta de liberdade, autorizando-os a estudar a natureza livres de
implicações teológicas ou metafísicas (COLICH, 1997). Séculos depois o Renascimento a
chamaria para tentar resgatar a incompatibilidade entre Igreja e ciência.
40
Vamos nos ater aqui, entretanto, a outro desenvolvimento de Ockham, um princípio
lógico de parcimônia que ficou conhecido como a navalha de Ockham. De acordo com este
princípio, “a pluralidade não deve ser colocada sem necessidade”19. Originalmente, esta
questão foi utilizada numa discussão ontológica entre o realismo e o nominalismo, mas
acabou como fundamental para o desenvolvimento de diversas teorias científicas. Seguindo
esta linha de pensamento, as teorias mais simples para explicar um fenômeno são
preferíveis às mais complexas.
Segundo Hawking (2003, p. 731), Newton afirmou que não iria admitir “mais causas
às coisas naturais do que aquelas verdadeiras e suficientes para explicar suas aparências.”.
Einstein teria dito que “tudo deve ser tão simples quanto possível, mas não mais simples que
isso”.
A navalha de Ockham, enunciada há mais de 650 anos, é uma linha geral de
raciocínio que vem guiando os cientistas até hoje.
5.8 Jean Buridan e a teoria do impetus
Jean Buridan (1300 – 1358) foi um sacerdote francês, nascido em Béthune, e formado
pela Universidade de Paris. Sua maior contribuição à ciência foi a introdução do conceito
moderno de inércia, que aqui trataremos.
Aristóteles afirmava que todo deslocamento de um corpo é devido a um agente, que
causa um movimento violento e, logo este agente cesse seu poder, o corpo busca seu lugar
natural através de um movimento natural. Assim, não existe inércia na Filosofia Natural de
Aristóteles, posto que, cessada a causa, cessa o movimento. Uma aplicação direta seria a
19 “... numquam ponenda est pluralitas sine necessitate.” (KRETZMANN, KENNY e PINBORG, 1982, p.
458)
41
visão de então a respeito dos projetis. Segundo a física aristotélica, os projetis tem trajetória
triangular, pois se movimentam para frente e para cima por ação do agente causador do
movimento violento, seguido de vibrações do meio e, tão logo cesse essa causa, caem
verticalmente em movimento natural. (PONCZEK, 2002)
Em seu Questões de Física, Buridan afirma que Aristóteles não lidou bem com a
questão, propondo que, ao colocarmos um objeto em movimento, fornecemos-lhe certa
propriedade que ele chama de impetus. GRANT (2006, p. 195)credita a Buridan as seguintes
palavras:
Parece-me que a ação de por em movimento um objeto imprime a ele um certo
impetus ou uma certa força motivacional dos corpos em movimento, na direção à
qual o agente estava movendo o corpo, tanto para cima quanto para baixo, ou
lateralmente, ou circularmente. E tão maior for a intensidade do agente, tão mais
ele imprimirá um impetus mais forte. É pelo impetus que a pedra se move após o
agente projetor cessar o movimentos. Mas o impetus é continuamente diminuído
pela resistência do ar e pela gravidade da pedra, que a inclina em direção contrária
àquela que o impetus naturalmente estava disposto a move-la. Então o movimento
da pedra continuamente torna-se mais lento, e finalmente o impetus é tão
diminuído ou corrompido que a gravidade da pedra o vence e move a pedra para
baixo até seu lugar natural.
Percebemos que uma das poucas diferenças desta visão para a de Newton, quatro
séculos mais tarde, é a de que o momentum de Newton é um efeito do movimento,
enquanto o impetus é sua causa.
Buridan também é um dos primeiros a sugerir que o movimento aparente dos astros
no céu, do leste para o oeste, pode ser causado não por um movimento deles, mas da Terra,
numa rotação do oeste para o leste. Buridan solicita que imaginemos alguém num barco,
que imagina estar em repouso, vendo outro barco, este sim em repouso. Por acreditar
42
firmemente que está em repouso, o marinheiro dirá que o outro barco está se movendo. Da
mesma forma, Buridan crê que a esfera solar está em repouso e que a Terra esta a
rotacionar. (GRANT, 2006)
Esta idéia seria mais bem desenvolvida, entretanto, por um cientista posterior.
5.9 Nicole Oresme e uma Terra que se move
Nicole Oresme (1320 - 1382) nasceu nas proximidades de Caen, França. Muitos o tem
como o pensador mais original do século XIV (WALLACE, 1981, p. 42). Oresme estudou as
artes e teologia na Universidade de Paris, tendo sido, propavelmente, aluno de Jean Buridan.
De fato, muito do pensamento de Buridan está nas obras de Oresme, mas ele vai
além na questão da rotação da Terra, argumentando que, com pressupostos da razão e das
evidências, não havia base para se decidir entre a rotação da Terra ou dos céus.
No seu Livre du ciel et du monde (uma tradução em francês com comentários da
obra De Caelo, de Aristóteles, escrito a pedido do rei francês Carlos V) Oresme estuda uma
série de argumentos contra e a favor da rotação diária da Terra em volta de seu eixo. Assim
como Buridan, Oresme se baseia na relatividade do movimento para mostrar como a
rotação é plausível. Oresme também cita um argumento oposto, usado na época, de que, se
a Terra rotacionasse, sentiríamos um vento forte e constante vindo do leste. Quanto a este,
Oresme responde que o ar poderia estar se movendo junto com a Terra. Outro argumento
contra seria o fato de uma flecha atirada na vertical cair aproximadamente no mesmo local
onde foi lançada, e não à oeste. Nosso pensador utiliza a teoria do impetus de seu mestre
para contradizer este argumento. (GRANT, 2006)
43
Por fim, Oresme utiliza a navalha de Ockham, ao afirmar que o movimento dos céus
seria causado por Deus de forma mais simples fazendo a pequena Terra girar, do que
fazendo os astros monumentais se movimentarem. Teologicamente, havia também um
argumento que utilizava uma passagem bíblica contra a hipótese da rotação da Terra:
“Quando o Senhor entregou os amorreus aos israelitas, nesse dia Josué falou ao
Senhor e gritou na presença de Israel: ‘Sol, pára em Gabaon! E tu, lua, no vale de
Aialon!’. E o sol ficou parado e a lua imóvel, até que se vingou dos povos inimigos.
Assim consta no livro de Iasar: O sol se deteve no meio do céu e demorou um dia
inteiro para pôr-se.” Josué 10, 12-14.
Oresme, à semelhança de Santo Agostinho, diz que as passagens da Bíblia não devem
ser interpretadas literalmente, que Deus causaria o mesmo efeito fazendo a Terra parar, ao
invés dos astros. Que a Bíblia diz que o sol e a lua pararam apenas pelo uso comum da
linguagem da época, como faz, aliás, em várias outras passagens (GRANT, 1986, p. 66).
Posteriormente, Galileo e Kepler responderiam a este argumento de forma bastante similar
(GRANT, 2006).
Ao examinar sua cosmologia, deve-se notar também que Oresme, à semelhança de
vários outros intelectuais de seu tempo, aceitou a conclusão de que a Terra deveria ter certa
forma de translação, ainda que sutil. Este movimento seria causado pelo fato do centro de
gravidade da Terra estar sendo constantemente alterado em função das mudanças
climáticas e geológicas. Sendo, segundo ele, o centro de gravidade da Terra o centro do
mundo, surge um movimento translacional do centro geográfico da Terra em volta do seu
centro de gravidade. (CLAGETT, 1970)
Nicole Oresme também desenvolve um método bidimensional de representação da
velocidade dos corpos, útil para demonstrar geométricamente suas idéias a respeito. È
44
provável que estas representações gráficas já tivessem sido utilizadas pelo italiano Giovanni
di Casali, mas Oresme as aperfeiçoou consideravelmente, sendo considerado, por isso, um
precursor da geometria analítica, mais de 200 anos antes de Descartes. (WALLACE, 1981, p.
43-44)
Os argumentos de Buridan e Oresme a favor da rotação e translação da Terra
marcam um significante abandono da visão Aristotélica de importância do nosso planeta
como centro absoluto e imóvel do universo. Muitos dos seus argumentos foram repetidos
por Copérnico em 1543. Nos dias de hoje, muitos pensariam que ambos teriam sido
perseguidos pela Igreja e talvez mesmo presos ou queimados vivos. Nenhum dos dois o foi,
mas ambos morreram tragicamente por conta de outro fator, que nem mesmo a Igreja pode
conter e que marca a passagem da Alta para a Baixa Idade Média: a Peste Negra.
45
6 A Baixa Idade Média
6.1 A Peste Negra
“A Peste Negra” é o nome como ficou conhecida a mais devastadora pandemia da
história humana, que atingiu seu pico entre 1348 e 1350. Hoje se sabe que o patógeno
causador foi a bactéria Yersinia pestis, relacionada com a peste bubônica, que era
transmitido pelo ar e pelos ratos, por meio das pulgas. (Black Death , 2012)
Tudo indica que a primeira aparição da Peste ocorreu em 1346, no sul da Rússia, em
terras na época sob domínio Mongol. Em 1347 atingiu Constantinopla e, a partir dali, Chipre,
Alexandria, Grécia, Sardenha, Córsega, Pisa, Gênova, Marselha e Mallorca até o final deste
ano. Em 1348 a praga já tinha se alastrado pela maior parte das áreas mais povoadas do
mundo muçulmano e cristão. (HAYS, 2005)
O poeta italiano Bocaccio (1313 – 1375) narra o horror da época em sua obra
Decamerão:
Já tinha chegado o ano de 1348 da fecunda encarnação do filho de Deus, quando a
cidade de Florença, nobre entre as mais famosas da Itália, foi vítima da mortal
epidemia. [...] Todas as medidas sanitárias foram sem efeito. Por mais que os
guardas especialmente encarregados disso limpassem a cidade dos montes de
imundície, por mais que se proibisse a entrada a todos os doentes e se
multiplicassem as prescrições de higiene [...] nada deu resultado. [...] Quanto ao
tratamento da doença, não havia receita médica ou remédio eficaz que parecesse
bom ou desse qualquer alívio. [...] A verdade é que as curas eram raras; e, nos três
dias que se seguiam ao aparecimento dos sintomas já referidos (mais ou menos
depressa segundo os casos, mas geralmente sem febre nem qualquer pertubação
aparente), quase todas as pessoas atacadas morriam. [...] [as características da
peste] fizeram nascer, naqueles que continuavam vivos, pânicos e obsessões de
diferentes espécies, que em geral conduziam à mesma atitude cruel: fugia-se ao
46
doente e a tudo o que o cercava. No pensamento íntimo de cada um, era este o
meio de se conseguir a própria salvação. (BOCACCIO, 2002)
Estudos recentes estimam que 50 milhões de europeus (de uma população total de
80 milhões) pereceu entre 1346 e 1353 (HAYS, 2005).
Não é de se espantar que o caos econômico e social que se seguiu à morte de 60% da
população tenha freado o desenvolvimento científico da época. Cientistas como Buridan e
Oresme morreram, bem como boa parte do clero. Nas grandes cidades, em especial, a
mortalidade era ainda maior, pelo adensamento da população; assim, as Universidades
perderam a maior parte de seus alunos e mestres.
A Europa precisou de tempo para se reerguer mais uma vez, causando uma lacuna
temporal na linhagem dos grandes cientistas. Apesar das idas e vindas da peste terem
durado até o século XIX, já no século XV surgiu o último personagem de nossa história.
6.2 Nicolau Copérnico e o heliocentrismo
Nikolaj Koppernigk (posteriormente latinizado para Nicolaus Copernicus e
aportuguesado para Nicolau Copérnico), foi um cônego católico nascido em Torun, Polônia,
em 1473 e falecido no mesmo país em 1543, logo depois do lançamento de seu livro mais
famoso: De revolutionibus orbius coelestium (Sobre as revoluções das esferas celestiais, em
tradução livre).
Copérnico estudou o trivium e o quadrivium na Universidade de Cracóvia e, em
seguida, continuou sua formação em Bolonha e Pádua, até ser titulado Doutor em Direito
Canônico em Ferrara, retornando, em seguida para a Polônia (HANNAM, 2009). Como
cientista, Copérnico tinha grande renome nos círculos eclesiásticos, apesar de nunca ter-se
47
tornado sacerdote. Foi, por exemplo, consultor do Quinto Concílio de Latrão (1512 – 1517),
nos assuntos relacionados à reforma do calendário (WOODS JR, 2005).
Sua formação básica em Cracóvia compreendia os fundamentos do ensino
matemático-astronômico (que, na época, se confundiam). Copérnico, influenciado talvez por
Ockham, acreditava que o sistema geocêntrico herdado de Aristóteles e Ptolomeu era por
demais complexo, com seus círculos excêntricos, equantes e dezenas de epiciclos (PONCZEK,
2002). Em algum momento antes de 1514, Copérnico delineia sua teoria heliocêntrica, numa
obra que seria conhecida como Commentariolus. Era ainda uma teoria sucinta, sem o
aparato matemático e geométrico da futura De revolutionibus. Um dos principais momentos
do Commentariolus é o enunciado das exigências em que ele desenvolve sua teoria:
1ª – Não existe um centro único de todos os orbes ou esferas celestes.
2ª – O centro da Terra não é o centro do mundo, mas apenas o da gravidade e do
orbe lunar.
3ª – Todos os orbes giram em torno do Sol, como se ele estivesse no meio de todos;
portanto, o centro do mundo está perto do Sol.
4ª – A razão entre a distância do Sol à Terra e a altura do firmamento é menor do
que a razão entre o raio da Terra e a sua distância ao Sol; e com muito mais razão
esta é insensível confrontada com a altura do firmamento.
5ª – Qualquer movimento aparente no firmamento, não pertence a ele, mas à
Terra. Assim a Terra, com os elementos adjacentes, gira em torno dos seus pólos
invariáveis em um movimento diário, ficando permanentemente imóveis o
firmamento e o último céu.
6ª – Qualquer movimento do Sol não é causado por ele, mas pela Terra e pelo nosso
orbe, com o qual giramos em torno do Sol como qualquer outro planeta. Assim, a
Terra é transportada por vários movimentos.
7ª – Os movimentos aparentes de retrogressão e progressão dos errantes
[planetas] não pertencem a eles, mas a Terra. Apenas o movimento desta é
suficiente para explicar muitas irregularidades aparentes no céu. (COPÉRNICO,
2003)
48
Ao contrário do que uma mente atual pensaria, não houve, por parte da Igreja,
críticas ou censuras à idéias expostas do Commentariolus. Ao contrário, muitos o
incentivaram a prosseguir em seus estudos. Há, por exemplo, o caso do Arcebispo de Cápua,
Nicolau Schönberg, que lhe escreve uma carta em 1536, incentivando-o a publicar o trabalho
que havia concluído por volta de 1530: o Revolutionibus. (MERLO, 2005)
Ao contrário da obra anterior, esta (dedicada ao Papa Paulo IIII e finalmente
publicada em 1543, às vésperas da morte de Copérnico) é intensamente matemática. Isso é
dito no próprio prefácio, que argumenta que a chave para seu entendimento é a
matemática, e não a física. De fato, a geometria utilizada nos seis livros em que
Revolutionibus é dividida é tão sofisticada que ao fim da obra percebe-se que Copérnico
utilizou 48 círculos para descrever o movimento dos planetas, contra os 40 círculos de
Ptolomeu (MERLO, 2005).
Para a comprovação observacional de sua teoria, Copérnico utilizou dados de
longitude de Mercúrio obtidos por Bernhard Walther (1430 – 1504), um astrônomo amador
alemão (De revolutionibus orbium coelestium, 2012). Copérnico apenas melhora a precisão
de algumas medidas; consegue explicar, por exemplo, porque Mercúrio e Venus são visíveis
sempre próximos ao sol (HANNAM, 2009), mas não desenvolve novas observações.
Assim como Baridan e Oresme, Copérnico não afirma que sua teoria é a única
verdadeira, visto que não havia razão física para rejeitar a hipótese anterior: a teoria
ptolomaica continuava predizendo com razoável exatidão os fenômenos celestes. Desta
forma, a reação geral dos astrônomos foi considerar Copérnico matematicamente genial,
mas sua teoria fisicamente absurda (PONCZEK, 2002). Apesar disso, novas tabelas
astronômicas foram publicadas em 1551, baseadas no trabalho de Copérnico, e estas
rivalizavam em popularidade com as anteriores (HANNAM, 2009).
49
A Igreja, em especial, utilizou com poucas reservas as tabelas de Copérnico. Era
responsabilidade dela gerenciar o calendário, a partir das efemérides Cristãs. A regra dos
anos bissextos utilizada desde Júlio Cesar era a de acrescentar um dia a cada 4 anos para
compensar inexatidões. Foi baseado nas novas tabelas que isso foi corrigido: o mês de
outubro de 1582 perdeu 10 dias e, de acordo a nova regra, o ano bissexto passou a ser
aquele múltiplo de 4, desde que não fosse múltiplo de 100, a não ser que fosse múltiplo de
400. (HANNAM, 2009)
A comunidade científica precisaria ainda de mais de 100 anos para aceitar
completamente o heliocentrismo, o que só ocorreu com o desenvolvimento da teoria da
gravidade por Newton, em seu Principia, de 1687 (GRANT, 2006, p. 282).
50
7 Conclusão
No decorrer deste trabalho, observamos como o saber da Antiguidade foi gerado e
quase perdido, e como coube aos medievais recuperá-lo e engrandecê-lo. Da postura
conservadora, tão necessária para a época, dos Padres da Igreja, até a visão revolucionária
de Copérnico, foi a Filosofia Natural da Idade Média a responsável por nos fazer
compreender os aspectos naturais das coisas do mundo e do universo físico.
Como estaríamos hoje sem as Universidades, esses cantões cuja origem remonta ao
desejo de um território onde o saber pudesse reinar soberano? Não compete também à
Idade Média a origem dos conceitos de inércia, gravidade e imanência da verdade no
objeto? Acima de tudo, não devemos creditar à Idade Média a manutenção da civilização
como a conhecemos?
Sim, é verdade que a postura científica da época estava impregnada da presença do
sobrenatural ou de coisas que jamais seriam respondidas pelo uso exclusivo da razão. Mas
não será que a ciência moderna restou ingrata à filosofia e à metafísica? Não será que
estamos tão preocupados hoje em explicar “como o mundo funciona” que esquecemos de
perguntar: “o que é o mundo”?
O pêndulo faz seu movimento de retorno. O impasse atual na determinação exata de
o que é matéria e o que é energia, por exemplo, nos faz retornar às bases do pensamento
ocidental, ao questionamento do que é e o que não é um ser. A interferência da experiência
na realidade põe limites na capacidade humana de conhecer toda a verdade através do
empirismo. É chegada a hora de repensar essas questões mais profundas da ciência.
A preocupação dos medievais com o divino era a tradução dessa atitude ontológica e
epistemológica que retorna à ciencia atual. Ao mesmo tempo, revela uma posição de
51
respeito à moral que reaparece nas discussões hodiernas de bioética, desenvolvimento
sustentável e bom uso da tecnologia. Longe do obscurantismo, esses 10 séculos de história
iluminaram o saber humano, mostrando como colocá-lo a serviço do maior bem estar
comum. Já disse o Papa Leão XIII, claramente se referindo a estas tais luzes da Idade Média:
Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados. Nessa época,
a influência da sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam as leis, as
instituições, os costumes dos povos, todas as categorias e todas as relações da
sociedade civil. [...] Organizada assim, a sociedade civil deu frutos superiores a toda
expectativa, frutos cuja memória subsiste e substistirá, consignada como está em
inúmeros documentos que artifício algum dos adversários poderá corromper ou
obscurecer. (PAPA LEÃO XIII, 1885)
52
8 Obras Citadas
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53
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