Breves Considerações Sobre Questões Práticas Em Matéria de Direito Dos Consumidores à Luz Da Legislação Moçambicana.protected(1)

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  • 7/25/2019 Breves Consideraes Sobre Questes Prticas Em Matria de Direito Dos Consumidores Luz Da Legislao Mo

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    Breves consideraes sobre questes prticas em matria de Direito

    dos Consumidores luz da Legislao Moambicana

    Nos prximos escritos, assumimos o desafio de abordar certas questes sociaisproblemticas comuns entre ns, com inegvel relevncia jurdica e largaprojeco social, em especial no mbito dos Direitos dos Consumidores, que temsurgido da interaco entre consumidores e prestadores de produtos e servios,onde seleccionamos os mais frequentes e que achamos serem merecedores dedestaque e tratamento na nossa humilde pgina.

    1. A questo da Reserva do Direito Admisso

    comum ver em estabelecimentos hoteleiros, de restaurao, etc escritos comoreservado o direito admisso ou mesmo entrada somente permitida a pessoas

    vestidas em traje de sada. Esses escritos levam-nos a questionar a legalidadedessas restries, e ou diga-se, discriminaes. Questiona-se tambm em quemedidas e com base em que critrios o fornecedor restringe a admisso dosconsumidores, podendo com base em cada caso em concreto variar a soluo.

    Assim, por exemplo, proibindo-se a entrada de uma determinada pessoa,

    consumidor, com fundamento em que essa est (aos olhos do prestador deservios) mal trajada para aceder ao estabelecimento, consistir numa violao doprincpio da igualdade prevenido no art. 35 da Constituio da Repblica (daquiem diante, abreviadamente CRM), uma vez que este princpio no s vincula asinstituies pblicas mas tambm em igual medida vincula as instituies privadasconforme resulta do n. 1 do art. 56 da CRM. Ademais, estando por hiptese dechinelos num restaurante que estabelea um dresscodeou simplesmente um cdigode vesturio que no permite a admisso de pessoas trajadas dessa forma, umhomem que pretende pagar pelos servios, o prestador de bens e servios aoimpedir a sua entrada estar em ltima anlise a fazer uma recusa de prestao deservios ao consumidor, cometendo assim uma prtica abusiva legalmente proibidana al. h) do n. 1 do art. 29 da lei 22/2009 de 28 de Setembro, Lei de defesa doConsumidor (daqui em diante, abreviadamente LDC). Assim sendo, oestabelecimento de cdigo de vesturio como condicionante a prestao deservios ilegal. Contudo, quando o vesturio ofenda o pudor pblico, ai j

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    teremos fundamento vlido para a restrio da sua entrada, em ateno ao seutratamento em sede de Direito Criminal. De outro prisma, havendo perturbao noestabelecimento, teremos situaes que podem fundamentar a retirada/limitao dapermanncia de um determinado consumidor ou grupo de consumidores.

    2. A questo da Consumao Mnima

    A consumao mnima ou simplesmente consumo mnimo como vulgar esobejamente conhecido nos meandros comerciais, reporta-se quelas situaes emque o prestador de servios estabelece uma quantia mnima de consumo (pelasmais diversas razes, como por exemplo a afluncia de pessoas com um certopadro de vida e repulsa dos que no se encontrem em tal nvel), no sentido de ques se admitem pessoas que gastem no estabelecimento pelo menos uma certa

    quantia. Esta situao, julgamos que seja uma das mais emblemticas violaesdos direitos dos consumidores que acontece vezes sem conta em restaurantes elocais afins.

    O grave problema do consumo mnimo que constitui por um lado um actodiscriminatrio na medida em que se processa a negao de prestao de bens eservios a uma certa camada social economicamente desfavorecida que se encontraaqum dos limites mnimos, onde mesmo pretendendo adquirir um bem ou serviodentro da sua disponibilidade financeira (p. ex: comprar gua), impossibilitado,

    ou melhor, impedido, tudo porque deve consumir at um certo valor quantitativopara que os servios lhe sejam prestados.

    Outro problema que detectamos a espcie de coaco, que tanto pode ser aoconsumo como ao pagamento.

    Estaremos em face de uma espcie de coaco ao consumo naquelas situaes emque o consumidor, pretendendo adquirir e ou consumir um certo produto, ficacompelido a consumir outros tudo por forma a alcanar o valor mnimo de

    consumo. Nestes casos, percebe-se a coexistncia de duas prticas nocivas aoconsumidor, primeiro a consumao mnima e segundo a venda casada, uma vezque para a aquisio de um bem o consumidor v-se na obrigao de adquiriroutros.

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    Estaremos perante um espcie de coaco ao pagamento naqueles casos em que oconsumidor queira por qualquer razo (imagine-se o caso de algum que porrecomendao mdica no deva ingerir nada que no seja gua) adquirir um bemou servio que no cubra o valor de consumao mnima exigido pelo prestador e

    por isso e ainda assim o consumidor seja obrigado a pagar o que no consumiu porforma a cobrir o valor base.Estas situaes, embora flagrantemente violadorasdos direitos dos consumidores so bastantes comuns, especialmente na zona nobreda cidade das accias (e no s) onde se julga que tenha indivduos mais cultos. Averdade que por qualquer razo estas situaes no so por estes combatidas, sejapor disponibilidade financeira ou outro motivo.

    Esta situao observada do ponto de vista amplo ilegal uma vez que o legisladorpro consumidor, classifica como prtica abusiva e probe a imposio de limites

    quantitativos na al. a) do n. 1 do art. 29 da LDC.

    Quanto a coaco ao consumo, essa situao visivelmente e indubitavelmenteilegal, constituindo a luz da LDC uma prtica abusiva, uma vez que no se admiteque para o fornecimento de certos bens e servios o consumidor seja obrigado aaderir a outros, conforme a disposio legal retromencionada.

    Quanto a coaco ao pagamento, mais notria a existncia de uma violao dosDireitos dos Consumidores visto que este s deve pagar pelo que efectivamente

    consumiu e no pelo que virtualmente, na viso do prestador, este deveria terconsumido.

    3. A questo da Venda Casada

    Como j foi minimamente expendido, a venda casada refere-se queles casos emque o consumidor para aderir a prestao de um bem ou servio obrigado aadquirir um outro, como condio para aderir ao primeiro. No nosso meio a vendacasada uma realidade nos vrios meandros da actividade econmica, do mais

    baixo ao mais alto nvel. Pense-se naqueles casos em que um consumidor se dirigea um local de culto vespertino e l, lhe cobrado alm do pagamento da entradauma certa quantia de consumo seja de comidas ou de bebidas. Ou de forma maiselucidativa, pense-se naquelas situaes em que o consumidor se dirige a umalanchonete ou estabelecimento afim com o intuito de adquirir uma sandes echegado l, no o possa fazer sem que pague pela aquisio tambm do

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    refrigerante e das batatas, sendo por fim cobrado pelo conjunto num preo nico.Em ambos casos estamos em face de condicionamento ilegal por parte do prestadorque consubstancia uma prtica abusiva prevista e prevenida na al. a) do n. 1 do art.29 da LDC.

    questionvel se a compra de um telemvel que s reconhea o carto SIM daoperadora de telefonia mvel que efectuou a venda do mesmo constitui ou no umavenda casada. Contudo, somos de opinio que neste caso em especfico noestamos em face de nenhuma venda casa e nem de prtica abusiva por parte doprestador, desde logo porque no se condiciona a aquisio do telemvel comprado carto SIM ou vice-versa, embora o primeiro no possa ser integralmenteutilizado sem o segundo. Achamos porm, que h aqui uma prtica restritiva daconcorrncia e no propriamente violao de Direitos dos Consumidores, desde

    que o consumidor seja devidamente informado no acto de compra.

    Agora, situao diversa e bastante questionvel a dos contratos de telefoniamvel praticados c na Prola do ndico uma vez que o consumidor fica durantecerto interregno de tempo, a pagar no s pelo crdito telefnico como tambmpelo telemvel que foi casado ao crdito e embutido no contrato. Nestes casos,julgamos que se est em presena de uma venda casada oculta, visto que no seoferece ao consumidor a opo de pagar somente pelo crdito que lhe concedido

    sem que com isso tenha de pagar igualmente (ainda que a longo prazo) pelotelemvel.

    4. A questo do fornecimento de bens e servios no solicitados peloconsumidor

    O fornecimento de bens e servios no solicitados pelo consumidor ocorre quando,na inrcia do consumidor, o prestador por acto prprio e exclusivo, fornece os seusprstimos ao consumidor. At aqui nenhum problema de fundo de coloca. Oproblema surge justamente quando prestador aparece a cobrar pelos servios por siprestados sem requisio prvia por parte do consumidor.

    Nestes casos em especfico, o consumo e ou aproveitamento dos bens fornecidospelo prestador no corporiza uma situao de aceitao tcita no sentido avanadopelo n. 1 do art. 217 do Cdigo Civil, uma vez que o facto de o consumidor teraproveitado do bem prestado sem sua solicitao, no constitui um sinal de que o

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    mesmo se disponibiliza a pagar, tudo porque para alm do facto de o consumidors dever pagar pelo que houver consumido, este tambm s dever pagar namedida dos seus pedidos.

    Imaginemos o caso em que um consumidor se desloca a certo restaurante e quechegado l servido (oferecido) uma poro de salgados a ttulo de aperitivo. Aofim da refeio, este mesmo consumidor no tem a obrigao de pagar pelo que lhefoi prestado sem que este requisitasse, sendo ilegal qualquer cobrana depagamento conforme resulta do n. 4 dos arts. 11 e 21 todos da LDC. Ainda nestasenda, o legislador classificou esta prtica como abusiva e por forma a acautelar osDireitos dos Consumidores, determinou que as prestaes fornecidas aoconsumidor, so para todos efeitos havidas como amostras gratuitas, da que nohaja qualquer dever de pagamento.

    5. A questo da no devoluo

    A questo da no devoluo sem sombra de dvidas a violao dos direitos dosconsumidores mais emblemticas que ocorre em Moambique. praticamenteuma regra nos estabelecimentos comerciais encontrar uma placa escrito noaceitamos devoluo em claro desrespeito pelos direitos bsicos dos

    consumidores. Este um daqueles casos que denotam o quo enraizado est e secriou um costume mercantil contra legemcom efeitos nefastos.

    A no devoluo pode comportar duas realidades, sejam elas a devoluo do bempara efeitos de troca ou reparao, como tambm a devoluo do bem paraposterior devoluo do valor.

    Naquelas situaes em que eventualmente um consumidor tenha adquirido umproduto que no tenha a eficincia esperada, assiste ao consumidor emconsequncia do seu direito a qualidade dos bens e servios (vide al. a) do n. 1 art.5 da LDC) o direito a reparao de danos desde que a ineficincia no seja em

    resultado de mau uso do bem e se ache dentro dos prazos de garantia que conformeos n.s2 e 3 do art. 6 da LDC devero ser de um mnimo de 1 ano para bem mveise 5 anos para bens imveis e comunicados 30 dias ou um ano aps o conhecimentoda deficincia conforme os casos (vide n. 2 do art. 14 da LDC). Assim podemosassistir a quatro situaes: a primeira que seria a reparao da coisa ineficiente; asegunda que seria a substituio da coisa inoperacional por uma outra eficaz; a

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    reduo do preo, quando eventualmente da reparao da coisa esta perca o seuvalor de mercado originrio; ou a devoluo das prestaes em face de resoluodo contrato. Ademais, a aposio deste tipo de clusulas consideradas abusivaspelo legislador, havida como no escritas e de nenhum efeito uma vez que com

    as mesmas se pretende exonerar a responsabilidade do prestador pelos vcios queos bens e servios por ventura sofram (cfr. als. a) e b) do n. 1 do art. 22 LDC).

    6.

    A questo da perda de valores nos casos de pagamentos em prestaes

    Outra face tpica dos casos de violao dos direitos dos consumidores a perda dosvalores nos pagamentos em prestaes. Sucede que a esmagadora maioria decomerciantes estipula contratualmente que havendo incumprimento por parte doconsumidor (quer porque extrapolou os prazos para pagamento da prestao

    subsequente, quer porque no mais conseguiu pagar as prestaes ou qualqueroutra razo), o valor que tenha sido pago fica perdido a favor do fornecedor debens e servios. Esta situao bastante incmoda pois o consumidor duplamente lesado pois perde o bem que j era (pelo menos virtualmente) seunalguma quota, e perde igualmente todos os valores que investiu para aquisio dobem no importando a percentagem de satisfao do valor por referncia ao valorglobal da coisa. Esta situao colocaria o fornecedor de bens e servios em umautntico enriquecimento sem causa as expensas do fragilizado consumidor.

    Atento a este tipo de situaes, o legislador alm de dispor na al. b) do n. 1 do art.22 da LDC que as clusulas que retirem ao consumidor a opo de devoluo dovalor j pago so consideradas nulas e de nenhum efeito, veio reforar esteentendimento especificamente para os casos de pagamentos em prestaes no art.26 da LDC onde vem indubitavelmente robustecer a nulidade deste tipo declusulas.

    ALI SALUSTIANO J. UBISSE