Upload
wica-gardneriana
View
233
Download
3
Embed Size (px)
DESCRIPTION
Chegamos a sétima edição da Revista BTW, e é com grande satisfação, que após vários dias de dedicação, apresentamos mais um exemplar desta revista.
Citation preview
1
Lith
a/La
mm
as, F
ev.2
013,
Edi
ção
n° 0
7. G
ratu
ita.
2
Chegamos a sétima edição da Revista BTW, e é com grande satisfação, que após vários dias de dedicação, apresentamos mais um exemplar desta revista.
Então, que possamos aproveitar o momento para celebrar esta alegria da publicação, junto com o calor e riso do Verão. E que neste tempo de purificação, e renovação de nós mesmos, seja possível reconhecer as possibilidades para auxiliar aqueles que nos pedem auxílio, esclarecer sobre a Wica e também preservar a Arte.
É tempo de dançar, cantar e fazer amor... e nesse clima, desejamos a todos uma ótima leitura!
EDITORIALLorenna Escobar
19 de Janeiro de 2013
3
índice
Iniciação e Colheita ...............pg.06
Coven ...........................................pg.14
Litha ..............................................pg.19
O que é uma pessoaapropriada ................................pg.38
Alto Ideal....................................pg 42
4
“Cada ramo do conhecimento humano, se rastreados até sua
fonte e princípios finais, desaparece no mistério”.
Arthur Machen
5
Mario Martinez
Lorenna Escobar
Simone Abraços
Giulia JB
Equipe BTW
6
Por Mario Martinez
Quando nos aprofundamos
nos mitos antigos, percebemos que
muitos deles referem-se exatamente
ao processo iniciatório. Em diversos
mitos antigos, podemos verificar que
a morte antecede sempre à fertilidade
da natureza. Morte e renascimento
também são aspectos essenciais dos
ritos de iniciação desde a antiguidade
e especificamente na Arte dos Wica
entramos em contato com o mistério,
morrendo e renascendo como
Iniciados, ou seja, aquele que passou
pelo mistério e renasceu como uma
alma imortal.
Não é por acaso que a Arte
gira em torno do mito da Roda do Ano.
Desde a antiguidade que as antigas
nações civilizadas vêem a mudança das
INICIAÇÃO E COLHEITA
Aubrey Beardsley
7
estações com o crescimento e declínio
da natureza como eventos ligados aos
deuses, à religião e conseqüentemente
à iniciação. Nesses ritos antigos, o
movimento físico da natureza estava
ligado com a própria vida dos deuses,
onde sua morte era lamentada e
chorada e cuja ressurreição era
comemorada com ritos dramáticos.
Todos esses ritos visavam assegurar
a renovação vital, o renascimento
primaveril, a multiplicação dos animais,
após os meses de pranto e morte do
inverno.
Claro que esses ritos não estão
limitados aos nossos antepassados.
Eles nos foram legados através dos
séculos, não porque tenham sido
copiados de religiões mais antigas,
mas justamente devido ao fato de que
eles retratam claramente um mistério
que se tornou fundamental dentro
dessas religiões e, particularmente,
herdado pela Bruxaria européia.
A concepção do Deus
que morre e renasce, bem como
todos os rituais que mostram essa
transformação e evolução, está
viva na Arte dos Wica hoje em dia.
Assim sendo, se formos estudar,
por exemplo, o mito de Deméter e
Perséfone, cujo documento mais
antigo onde ele aparece é o belo Hino
a Deméter homérico, poderemos
verificar a existência de um paralelo
entre o mito e o processo de iniciação
e elevação nos graus.
O mito nos conta que a jovem
Perséfone estava colhendo flores em
um prado luxuriante, quando a terra se
abriu e o Senhor dos Mortos levou-a
para ser sua noiva no sombrio mundo
subterrâneo. Na verdade, acredito
que essa seja a condição de todo ser
humano comum, que passa sua vida
INICIAÇÃO E COLHEITA
8
brincando nos alegres e luxuriantes
prados do mundo, desconhecendo a
si mesmo e aos mistérios profundos.
Estamos passando por
Lammas, a primeira colheita da
Roda do Ano, e portanto uma época
bastante propícia para iniciações e
elevações de grau. Um dos textos
poéticos nos diz:
“Bem-aventurado é o mortal
que viu tais coisas, mas aquele que
não houver participado delas em vida
jamais será feliz na morte quando
tiver baixado às trevas do túmulo.”
Passar pelos Mistérios e
renascer como um Iniciado significa
ter passado pela morte, significa ter
descido às profundezas do submundo
e renascido, assegurando assim a sua
sobrevivência como uma alma imortal.
Isso é bem claro no mito de Deméter,
quando após a descida de Perséfone
ao submundo, toda a terra se torna
árida e estéril para depois, quando por
fim ela retorna à luz do dia, os campos
da planície eleusiana tornarem-se
dourados com os cereais.
O candidato à iniciação
passa pela morte ritualística, desce
ao submundo e renasce. Os campos
de sua alma eram estéreis, sua
compreensão vazia e árida, mas após
ter passado pelos Mistérios e ter
renascido, a vida novamente brota
nos campos, agora imortais.
No Egito antigo, a lenda de
Ísis e Osíris retrata muito bem esse
Mistério. Osíris é morto, despedaçado
e seus pedaços espalhados pelo Egito,
mas renasce. No homem comum,
perdido no nevoeiro denso da alma, o
caminho na direção do indispensável
movimento da vida foi perdido. Nos
9
John Clowder
dias de hoje, os problemas e aflições
a respeito do significado da vida
decorrem principalmente da falta
de consciência do verdadeiro ritmo
existencial. O verdadeiro propósito
dos Mistérios é o de modificar a
qualidade da alma do postulante,
elevar sua consciência a um nível
super-humano e transformá-lo numa
alma imortal.
Desse modo, todos os rituais
de nossos antepassados, no Egito,
na Grécia e no Oriente Próximo,
representam morte e ressurreição,
para que o iniciado possa vivenciar
simbolicamente um estado acima
do nível humano e a vida eterna, e
conseqüentemente uma vitória do
homem sobre o seu medo da morte.
Através da morte iniciatória o novo
iniciado saberá que não precisa temer
a morte e que doravante está salvo
porque foi iniciado. Contudo, muita
gente, aliás milhões de pessoas no
mundo, não estão totalmente em seus
corpos, ficam negando certas partes e
por isso vivem parcialmente. Poucas
pessoas sentem seu corpo realmente
vivo. Somente aquele que passou pelos
10
An
toin
e W
atte
au
Mistérios e renasceu pode amar de
verdade. O amor é quase impossível
no estado comum da mente humana.
O homem comum, o não
iniciado vive uma vida de lutas. Contudo
não há nenhuma necessidade de lutar
porque nenhum problema pode ser
resolvido pela luta. Os que estão
tentando resolver seus problemas
mundanos estão se movendo numa
falsa direção: desde que todos os
problemas são existenciais e todas
as soluções são produtos da mente,
com o tempo as respostas se
desgastam e os problemas voltam à
superfície. Aquele que passou pelos
Mistérios e transcendeu, cresceu
sem os problemas, cresceu além dos
problemas, porque eles nunca podem
ser resolvidos: eles podem ser
dissolvidos.
Quando a pessoa passa pelos
Mistérios e colhe os frutos dessa
transcendência, tudo simplesmente
cai por terra. Todo o esforço dos
Altos Sacerdotes é o de trabalhar
com o iniciado existencialmente
e não filosoficamente. Ninguém
está tentando resolver problemas
ou encontrar soluções. A Filosofia
tentou isso inutilmente, porque ela
não pode transformar ninguém já
que permanece no nível mental,
intelectual. Iniciação é um despertar,
uma colheita. A realidade brotou das
profundezas da terra e agora pode
11
ser colhida. Mas essa colheita só está
à disposição daquele que morreu e
renasceu.
Voltando ao mito de
Eleusis, Deméter representa a
colheita madura do ano e Perséfone
representa a semente que foi semeada
para reaparecer na primavera. A
descida de Perséfone significa então
a visão mítica da semeadura e seu
ressurgimento na primavera. Esse
despontar do novo cereal nos campos
representa a elevação espiritual do
novo iniciado que transcendeu suas
limitações. O postulante representa
a semente, o potencial que poderá ou
não desabrochar e florescer. Ele tem
que descer ao submundo, passar pelo
Reino da Morte e ressurgir como
a planta madura, o significado da
iluminação. O mito é iniciatório por
excelência. Analogias semelhantes
foram levadas da Grécia antiga para a
Europa e assimiladas pela Bruxaria.
Com esse paralelo entre
colheita e iniciação, percebemos
que a finalidade da iniciação é a
de proporcionar um estado de
preparação para o renascimento,
através de um conjunto de testes
e provas, que determinam se o
candidato é digno de elevação a uma
posição religiosa superior. Após a
morte e renascimento, ou seja, após a
transcendência espiritual do candidato
em novo iniciado, o conhecimento
pode ser disponibilizado. Mas
somente após o iniciado ter passado
pelos estados emocionais de medo,
ansiedade, morte e finalmente do
renascimento e do êxtase.
Muita gente pensa que
iniciação é um incremento do
conhecimento, um enriquecimento
da mente. Tenho observado que a
iniciação se torna mais fácil quando a
12
pessoa é jovem. Quanto mais velha é a
pessoa, mais presunçosa ela é, quanto
mais velha a pessoa mais ela acha que
sabe e nada satisfaz tanto o ego como
o conhecimento.
A analogia da semente se
aplica muito bem aqui, quando vemos
os jovens como potencialidade. Os
mais velhos geralmente ficam olhando
para algum lugar no futuro, aonde
serão melhores e por consequencia
serão felizes. Na verdade, o Iniciado
abandonou o futuro completamente.
Não se trata de manter uma idéia
de que é possível melhorar a si
mesmo, porque essa é uma das
causas da neurose. Uma pessoa que
está tentando se tornar melhor
ficará neurótica. As sementes estão
lá, dentro da pessoa e assim sendo a
colheita virá.
A morte precisa acontecer.
A morte de toda a velharia
que a pessoa mantém dentro de si, de
todo o passado que deve ser jogado
para fora. E isso só é possível quando
uma iniciação formal é realizada.
A única possibilidade de colheita é
quando o jardineiro cuida do jardim.
A própria semente não pode, em
hipótese nenhuma, romper essa casca
sozinha. Isso seria um suicídio.
Quase ninguém pode ver
que a morte é apenas uma porta,
uma abertura para uma nova vida.
E a iniciação é uma porta para o
The birth of VênusGustave Moreau
13
renascimento, e os Iniciados podem
ver isso por si mesmos, podem
ver que uma vida verdadeira está
esperando, uma vida mais elevada,
mais alta. Então é possível encontrar
dentro de nós alguma coisa que não
pode morrer e desse modo o medo
simplesmente desaparece.
O crescimento é sempre uma
coisa arriscada. O postulante sempre
tem que perder aquilo que conhece
em troca daquilo que desconhece.
Tem que abrir as mãos e entregar
o que está segurando em troca do
que ainda não conhece. É por isso
que eu digo que religião é para os
corajosos, os fortes. Religião não é
para os negociantes. Os negociantes
estão sempre procurando proteger
o que já tem, pensando em ganhar
mais e mais. Entretanto, na vida não
existe nenhuma segurança. Imaginem
se a semente se recusasse a romper a
casca ? Não haveria crescimento, não
haveria iniciação.
Desse modo, iniciação é um
abandono do velho, do antigo, da
estagnação. Iniciação acontece agora,
neste momento. O real é o que está
acontecendo agora. E conforme
podemos observar, apesar da grande
exposição e divulgação da Arte nos
últimos anos, os Mistérios ainda
mantém um poder que permanece
inalterado. Isso proporciona que os
iniciados tenham o sentimento do que
Gerald Gardner chamava de “inicial
sentido de maravilhamento.”
14
Um Coven é uma organização
mantida para o encontro de Bruxos.
É uma comunidade destinada ao tra-
balho ritual. O número máximo de
membros em um Coven, não deve
ultrapassar 13 pessoas, que, de forma
peculiar sobre suas crenças, vivenciam
os Mistérios de Vida, Morte e Renasci-
mento através de símbolos existentes
e representados nas passagens das es-
tações e nos ciclos naturais.
As Leis dentro de um Coven
são alicerçadas por uma estrutura hie-
rárquica existente e remanescente da
Tradição e mantidas pelos juramentos
feitos por cada integrante.
Alguns Iniciados dizem que a
organização do Coven reflete a Or-
dem Cósmica dos Deuses, onde, den-
tro do Círculo Mágico, a Alta Sacer-
dotisa representa a Deusa e o Alto
Sacerdote representa o Deus.
A reunião dos membros de um
Coven, ocorre geralmente nas Festi-
vidades da Roda do Ano, também co-
nhecidas como Sabás, e nos Esbás.
Por Lorenna Escobar
COVEN
15
Os membros do Coven não
podem revelar os nomes dos outros
membros, assim como a localização
dos encontros que só serão revelados
aos seus participantes.
É importante salientar que não
existe nenhum tipo de cobrança em
dinheiro para o aprendizado em um
Coven ou para Iniciações e Elevações.
Segundo modernos estudiosos da
Bruxaria inglesa, a importância mágica
dos Covens é secundária, já que a Ma-
gia praticada requer total concentra-
ção. Porém, sabemos que um grupo
de pessoas é capaz de gerar um cam-
po de energia de grande intensidade.
Um Coven precisa pensar cole-
tivamente - o que chamamos de Men-
te Coletiva - e, para que não hajam
adversidades e conflitos, o grupo deve
permanecer unido e coeso.
Para entrar em um Coven, é
preciso ser convidado por algum Ini-
ciado integrante ou se apresentar for-
malmente a um Iniciado que levará a
solicitação para o restante do grupo
analisar. Entretanto, será necessária
uma avaliação de compatibilidade,
pois, para entrar em um Círculo Mági-
co com os demais Iniciados, será pre-
ciso mais do que um ideal de “Perfeito
Amor e Perfeita Confiança”.
Quando alguém procura um
Coven, deve ter abertura para o
aprendizado e, provavelmente, dar
um mergulho no desconhecido. Esse
alguém deve estar em busca de algo
além da compreensão e que, em um
nível mais profundo, entende que esse
é o caminho que deve percorrer.
16
Quando se é atraído para um
Coven de Bruxaria, deve existir uma
presença suficiente para a travessia,
pois os Altos Sacerdotes são conside-
rados “A Ponte”, e por isso, é preciso
se unir a Eles. Esse é um dos moti-
vos que explicam porque não existem
Bruxos solitários.
O despertar para aqueles que
desejam ser transformados pela Magia
dos Bruxos, é como um acontecimen-
to, algo descrito como um “impulso
que nasce das profundezas da Alma”.
Aquele que realmente é apropriado
para a Arte, irá encontrar o seu lugar
e assim, encontrar os Deuses.
Geralmente, quando alguém é
aceito em um Coven, ele é conside-
rado como um Dedicado. Ele fica dis-
ponível para o conhecimento da Arte,
mesmo que em um nível superficial,
mas que pode dar maiores condições
de reconhecer se ele está no caminho
certo. Após o período de “Dedica-
ção” ( um ano e um dia ), o Dedicado
poderá ser apresentado aos Portais
da Iniciação e, então, ser formalmen-
te aceito no grupo como um Bruxo e
Sacerdote da Arte, sendo reconheci-
do como um Iniciado de 1° Grau.
O conhecimento da Bruxaria
17
como um Sistema Mágico Religioso
que busca a Transcendência e que cul-
tua uma Deusa e um Deus como o
Casal Divino, talvez não seja compa-
tível com o estilo de vida da maioria
das pessoas, as quais nós chamamos
de “pessoas não-apropriadas” para a
Arte.
A Wica não é uma Religião de
massa ou de seguidores. É necessá-
rio passar por todo treinamento es-
tabelecido pelo grupo, seguindo os
princípios da Tradição ; obter o co-
nhecimento dos preceitos da Arte,
seus Dogmas, Teologia e Liturgia,
para depois ser apresentado aos Por-
tões de acesso ao conhecimento nos
Mistérios da Arte, o qual é velado e
transmitido pelos Altos Sacerdotes.
Devemos considerar que apenas um
Homem, devidamente Iniciado, pode
inicar uma Mulher e que, apenas uma
Mulher, devidamente Inicada, pode ini-
car um Homem.
Quando falamos de Wica, esta-
mos nos referindo à Tradição de Mis-
térios Iniciática difundida por Gerald
Gardner e suas Altas Sacerdotisas na
déca de 1950.
Tradição é a transmissão de
práticas e valores espirituais de ge-
ração em geração ; é o conjunto das
18
LITHA
crenças de um povo ; algo que é segui-
do conservadoramente e com respei-
to através das gerações.
Um Coven pode ser considera-
do como uma família. São laços que
transformam e que nos tornam seres
mais conscientes e conectados com
o Todo. São céluals da Tradição que
mantêm vivos os ensinamentos dos
Antigos.
O caminho dos Iniciados é um
caminho sem volta ; é um salto no
abismo ; é conhecer a Morte antes
de morrer ; é o formador do conhe-
cimento da Alquimia ; é o conhecedor
dos poderes da Magia, da Comunhão,
da Felicidade e do Amor.
19
Por Simone Abraços
e Giulia JB
LITHA
Litha, também conhecido por
Midsummer, é um Sabá celebrado no
Solstício de Verão. Por ser um evento
astronômico, não possui uma data fixa
e pode variar entre os dias 20 e 24 de
dezembro no hemisfério sul e entre
os dias 20 e 24 de junho no hemisfé-
rio norte.
O Solstício de Verão é o dia
em que o hemisfério em questão, fica
mais próximo do Sol e mais tempo ex-
posto a sua luminosidade e, por isso,
temos o dia mais longo do ano com
mais de 12 horas de duração. Nesse
dia, o zênite solar marca o seu apo-
geu e, de acordo com a sua trajetória
na esfera celeste, ele alcança o ponto
20
mais alto no céu. É o auge do poderio
solar, o dia de maior incidência de luz
e, com seu o seu poder fertilizador, a
Natureza se encontra em abundância
e plenitude.
Nossos antepassados acredita-
vam que a noite do Solstício de Verão
era um momento muito propício para
a colheita de ervas e plantas com pro-
pósitos mágicos de cura, fertilidade e
proteção. Eles descobriram isso atra-
vés de muitos anos de observação e
experimentação, mas hoje nós sabe-
mos a razão que os levaram a afirmar
que essa noite é mágica : o Sol.
Naturalmente, durante o dia
mais longo do ano, as Ervas e as Plan-
tas ficam expostas à luz solar mais
tempo que o normal ( o dia do último
Solstício durou quase 14 horas ) e as-
sim, seus princípios ativos, tanto me-
dicinais quantos ocultos, são desper-
tados, potencializados e multiplicados
pelo poder do Sol.
Na verdade, elas não são colhi-
das durante a noite, mas nas primei-
ras horas. Ao anoitecer, as ervas e as
plantas se encontram no máximo do
seu potencial porque estão impregna-
das de energia solar. Uma faca espe-
cial deve ser utilizada e elas devem ser
cortadas em um só golpe para que os
seus princípios ativos não sejam com-
prometidos.
Como uma das Ervas mais co-
lhidas nessa noite, podemos citar o
Hipérico (Hypericum perforatum L.)
também conhecido como “Erva-de-
-São-João”. O nome “Hipérico” deriva
do grande Titã Hipérion, um Titã Solar
primitivo que, na Mitologia Grega, era
o pai do Deus Hélios (o Sol), da Deu-
21
sa Selene (a Lua) e de Eos (a Aurora).
O Hipérico é um pequeno ar-
busto com flores amareladas e mui-
to aromáticas. Como todas as plantas
amarelas, elas são regidas pelo Sol e,
naturalmente, suas propriedades fi-
cam mais ativas durante o dia quando
estão expostas à luz solar. Seu nome
popular “Erva-de-São-João” é em ho-
menagem ao dia do nascimento de
São João Batista – dia 24 de junho, a
“Noite de São João”, onde, muitas ve-
zes, coincide com a data do Solstício
de Verão no hemisfério norte. Segun-
do o mito, São João é aquele que re-
presenta a luz e luta para afastar as
trevas.
Uma outra planta colhida no
Solstício e muito conhecida na Bru-
xaria, principalmente nos Festivais So-
lares na Península Ibérica, é a Verbena
( Verbena officinalis). Uma planta má-
gica por excelência, com muitas pro-
priedades terapêuticas e ocultas. Por
esse motivo, a Verbena sempre está
entre as Ervas que são jogadas nas fo-
gueiras de Litha.
O Rosmaninho (Lavandula sto-
echas da Família do Alecrim, o Rosma-
rinus officinalis), também conhecida
por “Erva-de-São-João madrilenha”, é
uma erva poderosa, regida pelo Sol e
que não pode faltar nas fogueiras do
Solstício de Verão.
22HazelColl, Aveleira
Uma lenda muito conhecida
seria a das Samambaias (Dryptoteris
filix-mas), também considerada uma
planta joaneira. Tida por muitos como
uma planta masculina, acreditava-se
que à meia-noite do Solstício de Ve-
rão, elas floresciam e espalhavam suas
sementes, e aqueles que as colhes-
sem com um pano feito de cânhamo
ou linho, receberiam poderes e co-
nhecimentos miraculosos. Segundo
Andrés Laguna de Segóvia (Médico e
Farmacologista espanhol) : “Algumas
velhotas endemoniadas andaram per-
suadindo o povo que na noite de São
João, à meia-noite em ponto, a samam-
baia cresce e floresce e, se o homem
não estiver ali naquele momento para
colhê-la, sua semente cai e se perde”.
A Azinheira (Quercus ilex , da
mesma Família do Carvalho, o Quer-
cus robur) é uma grande protagonista
no Solstício de Verão para propósitos
de cura. Na região da Catalunha, na
Espanha, várias pessoas ainda se reú-
nem ao redor da grande e velha Azi-
nheira. Todas elas ajudam a abrir um
buraco no tronco, suficientemente
grande para o doente entrar e atra-
vessar, enquanto todos dizem “Tren-
cat t’el dono” (“avariado o entrego”)
o doente atravessa para o outro lado,
e então, todos dizem “Curat t’el preng
(“curado o recebo”).
Assim como as bolotas do Carvalho,
as bolotas da Azinheira , devidamente
preparadas e de acordo com a Botâ-
nica Oculta, são usadas como podero-
23
sos amuletos.
Muitos dizem que, tradicional-
mente, a Vara Mágica deve ser feita
com um galho de Aveleira (Corylus
avellana), a Árvore do Conhecimento
ou a Aveleira da Feiticeira, e que deve
ser cortado na noite do Solstício de
Verão. Uma das propriedades mágicas
e ocultas desta vara, era o da adivinha-
ção e profecia, onde se acreditava que
tesouros (metais preciosos como o
ouro) e água (mananciais escondidos)
poderiam ser encontrados.
As flores Malva-Rosa (Alcea
rosea) e Alteia (Althaea officinalis,
também conhecida por Malvarisco ou
Malva-branca), com grandes proprie-
dades analgésicas, deveriam ser colhi-
das antes do amanhecer para ter seus
princípios conservados durante todo
o ano.
Os Celtas colhiam o raríssimo
Visco do Carvalho, também conheci-
do por Agárico, apenas nos Solstícios.
Uma planta lendária cercada por mui-
to mistérios e histórias, e com mui-
tas propriedades medicinais, princi-
palmente no tratamento da epilepsia
(Visco quer dizer “aquilo que tudo
cura”).
Para colhê-lo, um grande ritu-
al era realizado e apenas os Druidas
poderiam estar presentes. A planta
era cortada com uma pequena foice
cerimonial de ouro e colocada sobre
um pano virgem de linho. Logo após a
colheita, dois bois brancos eram imo-
lados aos pés do grande Carvalho.
O Carvalho, uma árvore sagra-
da e símbolo de imortalidade e lon-
gevidade, pode atingir 40 metros de
altura e durar facilmente 400 anos.
24
Um velho ditado dizia : “O Carvalho
leva 300 anos para crescer, 300 anos
para se tornar adulto e 300 anos para
morrer".
As Ervas e Plantas jogadas nas
fogueiras de Litha podiam variar con-
forme a região, mas as mais comuns
eram, além das ervas já mencionadas,
o Gerânio, a Camomila, a Calêndula,
a Arruda, a Cinco-Folhas, folhas de
Carvalho e de Azinheira, entre outras
mais – geralmente, ervas e plantas do
Elemento Fogo e regidas pelo Sol. Um
costume muito antigo no Solstício de
Verão, é atravessar a fumaça exalada
pelas fogueiras, para todos, inclusive
animais de criação, serem agraciados
pelo seu poder de cura, de proteção,
de banimento de males e doenças e
de fertilidade. Muitos levam as cinzas
da queima das madeiras – tradicional-
mente, uma tora de Carvalho - e os
gravetos que restaram.
Nessa época, como um rito
muito antigo de fertilidade, muitas
mulheres dançavam nuas, montavam
em suas vassouras, corriam e pulavam
no meio das plantações para que elas
crescessem saudáveis e em abundân-
cia. Quanto mais elas pulassem, mais
alto as plantações cresceriam.
Mas como tudo que nasce,
cresce a atinge sua plenitude, também
declina e morre. Após o Solstício de
Verão - o auge da estação, da lumino-
sidade, do calor e do poder solares
– inicia-se o período de declínio e de
marés vazantes, ou seja, é o início do
Ano Decrescente.
O Deus de Chifres - dentro do
Ciclo de Vida, Morte e Renascimento
da Roda do Ano - encontra-se em seu
momento de maior plenitude e matu-
25
ridade – o auge do seu Poder. Após o
dia mais longo do ano, assim como o
Sol e as forças da Natureza, o Poder
do Deus Cornífero começa a declinar.
Daí em diante, os dias ficarão gradati-
vamente mais curtos, mais escuros e
mais frios. É o começo do fim do Ve-
rão (uma estação marcada pela fartu-
ra, abundância e fertilidade) o prenún-
cio de que dias mais difíceis virão (é a
certeza da proximidade do Inverno).
A troca entre os períodos de
fartura e de escassez, de luminosida-
de e escuridão, o verão e o inverno,
sempre marcaram a vida do ser hu-
mano. A natureza, entre seus ciclos de
florescimento e abundância da vida e,
a inevitável morte que segue, reflete a
dualidade que gera o movimento do
universo. É a força do Deus de Chi-
fres como Senhor da Vida e Senhor
da Morte, é a luta entre os Reis do
Carvalho e do Azevinho, é o espírito
da natureza, o Greenman e o Hor-
ned Hunter, que dão a vida a partir da
morte e cuja vida irá inevitavelmente
voltar a morrer. Ao longo da história,
diversas culturas, religiões e artes má-
gicas reconheceram essa dualidade,
traduzindo-a em mitos, costumes e
rituais.
Observando uma roda em mo-
26
vimento vemos que, enquanto um lado
sobe, seu oposto irá, inevitavelmente,
descer. A força do movimento de de-
clínio dando o impulso para a ascen-
são no lado oposto. Um homem que
trabalha o dia inteiro irá ficar cansado
e, à noite, irá dormir para recuperar
suas forças, acordando renovado para
um novo dia. O reinado de um ho-
mem irá ver seu envelhecimento.
Um rei, que é a fonte da for-
ça de seu povo, enfraquecido é como
se a própria terra perdesse sua vita-
lidade. Sua restauração só é possível
através de sua morte e sucessão por
um novo rei, jovem e cheio de vita-
lidade - seu filho que, em essência,
representa o próprio rei. O mesmo
rei que morre e renasce a cada gera-
ção. Uma semente só irá germinar de
dentro da terra escura, do subsolo, a
partir do apodrecimento de sua casca,
alimentando-se da decomposição de
vidas passadas, o humo que é a fonte
de sua vitalidade. A morte alimenta a
vida, a vida que caminha sempre em
direção à morte...
Um ciclo só pode ser renovado
com o fim do anterior. Assim como,
um período de expansão é sempre
seguido de um período de retração e,
vice versa. Um só existe a partir do
outro. Da troca entre as grandes eras
astrológicas ou Eons, à alternância en-
tre o verão e inverno, ou do estado
de alerta ao do sono, de estar vivo ou
morto, o princípio é sempre o mes-
mo.
O tema onde dois persona-
gens representando forças antagôni-
cas (Verão / Inverno, Luz / Sombra,
Noite / Dia, Pai / Filho, Vida / Morte,
etc.) lutam pela supremacia ao final
27
de um ciclo é recorrente e represen-
ta a renovação cíclica do universo. O
princípio é quase sempre visto como
masculino, pois sua natureza é uma
de força e de movimento. É aquele
que fertiliza e aquele que ceifa, o que
remete à força masculina da ação e
transformação.
É o poder do falo, a força bruta.
Já o princípio feminino é um de cons-
tância, mais etéreo. Ela é a própria na-
tureza, sua alma, é o útero e o céu
noturno, a lua que é sempre a mesma,
embora mostrando diversas faces.
Mesmo em mitos onde uma mulher
representa uma dessas forças, vemos
uma influência masculina como a for-
ça por trás da ação (como no mito
do rapto de Persephone, onde seu
retorno para o lado de Demeter re-
presenta o lado luminoso, aqui, Zeus é
aquele que intervém na ação).
Essa observação encontra re-
flexos em costumes, mitos e ritos
tanto de sucessão entre pai e filho
(o novo que substitui o velho e que,
por sua vez, será substituído por seu
próprio filho), ou de uma geração pela
outra, quanto no revezamento entre
forças antagônicas (personagens que
representam as forças de luz e expan-
são, versus personagens das sombras
e retração). Também podemos ver o
mesmo princípio na relação entre o
homem e a natureza, o caçador e a
caça, o plantio e a ceifa.
28
O ano solar pode ser dividido
em duas partes de fundamental im-
portância para todos os seres vivos.
O verão, período de expansão e de
crescimento de luz solar, que atua do
Solstício de Inverno até o Solstício de
Verão. E, o inverno, período de amadu-
recimento das colheitas e de retração
rumo à escassez e escuridão. Este co-
meça a partir do ápice em abundância
da luz solar, o Solstício de Verão, indo
até o ponto mais escuro do inverno, o
Solstício de Inverno, a partir do qual,
a luz irá lentamente começar a retor-
nar. Também encontramos exemplos
onde o ponto de mudança se encon-
tra em outras datas. Um exemplo se-
ria no Dia de Maio, também conhecido
como Beltane (conforme o calendário
no Hemisfério Norte).
Em diversos mitos ao longo da
história, encontramos figuras arquetí-
picas que representam estes dois pe-
ríodos. Duas figuras que lutam de seis
em seis meses pela supremacia. Estes
aspectos representam, em essência, a
mesma figura, um princípio masculino
divino que nasce, fecunda a terra (ou
uma figura feminina representativa do
divino feminino) e morre ou é morto,
para então renascer, ou retomar seu
reinado, seis meses depois. Na meta-
de em que a luminosidade é crescen-
te, momentos de fertilidade e de plan-
tio, de vida, reinam os arquétipos do
Rei do Carvalho. Na metade escura
29
do ano, o inverno, momentos de es-
cassez e incertezas, de morte, reinam
os arquétipos do Rei do Azevinho.
A figura feminina também está
presente e representa a própria natu-
reza. Aparece como mãe, noiva, aman-
te, esposa, ou até irmã. Muitas vezes,
existe uma batalha pela mão de uma
mesma mulher. O conflito é solucio-
nado por uma força maior que desig-
na para cada, um período de tempo
em que a noiva ficaria ao seu lado
ou, que atua como um intermediário
em batalhas periódicas. O casamento
com a mulher (a terra) simbolizando
o reinado de cada um. Um tema pre-
sente na história galesa de Gwyn ap
Nudd, Gwythyr ap Greidawl e, Crei-
ddylad (uma dama na corte do Rei Ar-
thur conhecida como a mais bela das
Ilhas Britânicas).
Creiddylad era amada pelos
dois. Gwythr aparece em alguns con-
tos como seu noivo, onde Gwyn se-
ria seu irmão, que a rapta de Gwythr.
Em outras versões, Gwythr a rapta
da casa de seu pai Lludd Silver Hand
(Lludd Mão de Prata) e em resposta,
Gwyn a rapta de Gwythr. Em ambos
os casos, após violentas batalhas, Ar-
thur intervêm e, a cada Dia de Maio
(1 de Maio) e eles lutariam pela mão
de Creiddylad, que fica com seu pai até
a última batalha no Dia de Julgamen-
to, quando seu destino seria decidido
de acordo com o vencedor. Gwyn ap
Nudd está fortemente associado ao
submundo e aparece como o líder da
Caçada Selvagem e, senhor do mundo
dos mortos, conhecido como Annwn.
Arthur, aparecendo em mitos
galeses anteriores às lendas contadas
pelo clérigo Geoffrey de Monmouth,
30Portia St Luke
como uma figura mítica, líder de um
grupo de guerreiros com poderes so-
bre humanos e, que defendia seu rei-
no de ameaças sobrenaturais como
bestas mágicas. Nesse caso, ele pode
ser visto como uma autoridade supe-
rior, o Rei, ou até como uma divinda-
de superior similar à posição de Zeus,
na mitologia grega.
Este mito já foi associado ao
mito grego do rapto de Persephone
( Deusa da Primavera). O conflito en-
tre os guerreiros, paralelo ao conflito
entre Hades ( Deus do Submundo) e
a mãe de Persefone, Demeter ( Deu-
sa dos cereais e da fertilidade da ter-
ra). Também um mito que fala de um
conflito que determina as mudanças
entre o verão e o inverno. Demeter
e Gwythr (personagens que repre-
sentam a luz), versus, Hades e Gwyn
(ligados à morte e ao submundo, a es-
curidão).
Outro mito galês que mostra
a batalha entre os arquétipos do Rei
do Carvalho e do Rei do Azevinho é
aquele que conta a história de Lleu
Llaw Gyffes e sua esposa Blodeuwedd.
Lleu Llaw Gyffes, filho de Arian-
rhod que nele colocou três determi-
nações / feitiços (tynghedau), privan-
do-o de um nome, de armas e de uma
esposa. Junto com a ajuda de seu tio
Gwydion, Lleu consegue enganar sua
mãe a dar-lhe um nome e armas. E,
com flores da giesta, da filipêndula e
do carvalho, Gwydion, com a ajuda do
rei Math fab Mathonwy, fez Blodeu-
wedd, a esposa de Lleu. Assim o herói
31
passa pelos três desafios (ou inicia-
ções) e torna-se um homem.
Porém, em dia em que Lleu es-
tava fora, Blodeuwedd vê um cervo
cansado sendo perseguido por um
caçador e seus cães, este era Gronw
Pebr, senhor de Penllyn (o cervo, re-
presentando o próprio Lleu e, os cães
de Grown e o fato deste caçar o cer-
vo, o indicam como tendo ligações ao
submundo, o Líder da Caçada Selva-
gem). Eles se apaixonam e conspiram
para matar Lleu. Porém, como Blo-
deuwedd descobre, Lleu só pode ser
morto por uma flecha forjada durante
um ano durante as horas do sacrifício
aos domingos (a missa), com um pé em
um caldeirão e o outro em um bode,
ao cair da noite. E, assim os amantes
o fazem. Quando a flecha atinge Lleu,
ele se transforma em uma águia e voa
para o alto de um carvalho.
Ao ouvir a história, Gwydion
sai a procura de seu sobrinho. No
caminho, hospedado na casa de um
vassalo, ouve um caso em que uma
porca foge todo dia de manha e que
ninguém sabe para onde. No dia se-
guinte, Gwydion segue a porca, que
para ao lado de um carvalho, comen-
do vermes e insetos que caem de uma
águia empoleirada no pico da árvore.
Gwydion percebe que a águia é, na
verdade, seu sobrinho e transforma-
-o de volta à sua forma original. Lleu
Alan Lee 1984
32
volta muito fraco e depois de um ano
se recuperando, desfia Gronw em um
duelo onde ele vence. Blodeuwedd,
fugindo, é transformada em uma águia
por Gwydion (o que sugere a face da
sabedoria do divino feminino, repre-
sentado por Blodeuwedd).
(Obs: A presença da porca e dos ver-
mes pode sugerindo conceitos simila-
res aos dos Thesmophoria, rituais em
homenagem à Demeter para promo-
ver a fertilidade dos campos, lembran-
do o tempo em que Demeter lamenta
o rapto de sua filha, fazendo com os
campos fiquem estéreis (inverno). A
participação era exclusiva de mulhe-
res casadas. Durante os rituais, porcos
eram colocados em buracos na terra
junto a cobras.
Os restos dos porcos do ano
anterior eram misturados aos grãos
para serem plantados. Os simbolis-
mos sugerem, novamente, a vida e fer-
tilidade que nasce da podridão e da
morte.)
No conto, encontramos temas
da transformação e iniciação de Lleud
Llaw Gryffes. Primeiro através dos de-
safios impostos por sua mãe e, depois
pela experiência da morte e ressurei-
ção por magia. E também, o tema da
rivalidade entre as forças da vida e da
morte. A transformação de Lleu em
uma águia e a árvore de carvalho são
simbolismos claros de sua associação
como uma face do divino masculino
expansivo, o Rei do Carvalho.
O Carvalho, uma árvore de
grande porte, com raízes e troco for-
tes, tem sido uma árvore simbólica da
perenidade, força e vitalidade, sagrada
a aos deuses que traziam a fertilida-
de com a chuva e o trovão. É um dos
33
símbolos religiosos mais antigos e está
presente em mitos por toda a Euro-
pa. Entre os gregos, era um símbolo
de Zeus, pai de Deuses e homens,
que com seus raios e chuva fertiliza a
terra. Seus muitos contos de *escapa-
das* amorosas não são à toa e, muito
mais do que falarem de um deus que
gostava de romance, seu papel nestes
contos é condizente com seu aspecto
de fertilidade. O próprio raio poden-
do ser visto como o deus que descia
para fertilizar a terra, o feminino.
Vemos estes mesmos aspectos
ligados a divindades em outras cultu-
ras, onde o carvalho aparece como
sinalizador desse poder. Na mitologia
nórdica, Thor era o Deus dos trovões
e da fertilidade. Seu pai, Odin, Deus da
sabedoria, magia e da morte.
Um dos feitos de Odin foi ter
sido pendurado na árvore do mundo,
Yggdrasil, por nove dias e nove noites,
ferido por sua própria lança. Um ato
de auto sacrifício para que pudesse
obter sabedoria dos nove mundos. O
que, curiosamente, lembra em muito
a experiência de morte do herói Lleu
Llaw Gyffes, quando este pousa em
um enorme carvalho como uma águia,
vermes e insetos caindo dos galhos.
Em ambos, a experiência de morte é
um portal para a sabedoria (que no
conto de Lleu seria sinalizado pela
transformação de Blodeuwedd em
Alan Lee 1984
34
uma coruja). O que nos mostra, no-
vamente, o processo de morte como
uma fase para o crescimento. No caso
de Odin, vemos ainda seu papel como
o pai de muitas divindades, incluindo,
notadamente, Thor. Uma dinâmica que
se repete no caso de Zeus, cujo pai,
Cronus, está ligado à ceifa e a colheita.
Em um rito dos povos celtas,
realizado pelos druidas, o visco que
crescia em carvalhos era colhido no
Solstício de Verão com uma pequena
faca em forma de lua crescente, como
uma pequena foice. o que sugere um
formato ligado à Lua e o papel femini-
no como constante nos mitos.
Como se trouxesse o nasci-
mento do Rei que trás a ceifa e mor-
te, tanto quanto o nascimento do Rei
que trás a fertilidade. Como foi argu-
mentado no livro de Robert Graves,
The White Goddess, este ato simbo-
liza a castração do antigo rei, no caso,
o Rei do Carvalho. O visco era usado
como um potente agente para a cura
e fertilidade e, era um símbolo fálico
por natureza, assim como o carvalho
em si. Sua morte ou castração era
uma forma de garantir a renovação da
terra e seu futuro renascimento.
Os exemplos de culturas em
que o regicídio era comum ou até sis-
temático são abundantes. Entre alguns
dos mencionados no livro The Gol-
den Bough, de James Frazer, estão os
35
Khazars no sul da Rússia, em que os
reis eram mortos ao final de um pe-
ríodo, ou caso alguma calamidade de-
monstrasse o enfraquecimento de seu
poder. Entre os escandinavos o perío-
do de reino de cada rei teria sido de
nove anos, antes sua morte, diversos
exemplos no continente Africano, en-
tre muitos outros.
Por trás desses costumes esta-
va a crença de que o Rei seria como
a encarnação do poder divino, o pai e
consorte da terra. Se fosse permitido
seu enfraquecimento, assim também
a terra perderia sua vitalidade. Sen-
do morto antes que isso aconteces-
se (como o visco que era colhido em
seu auge), este se tornaria imortal, sua
força sempre renovada. Junto a isso, a
morte do rei representa o sacrifício
divino, a colheita, sua morte trás a fer-
tilidade à terra, alimenta a terra. Tan-
to que, em diversos ritos de sacrifício
do rei (ou de seus representantes), o
ato simbólico ou real de consumir seu
corpo é comum.
Porém, nem sempre o rei, pro-
priamente dito, era morto de fato. Na
antiga Babilônia, durante o festival da
Sacaea um rei postiço reinava durante
cinco dias e, no final de seu termo, era
flagelado e morto. Porém, o fato des-
te ter direito a deitar-se com as con-
cubinas do rei verdadeiro, sugere que
o costume era levado muito a serio,
sendo o rei temporário visto como
um rei, de fato. Em outros casos, o
rei colocava-se sob risco mortal, per-
mitindo que fosse atacado, em alguns
desses casos, quem o matasse seria
seu sucessor. Em outros casos ainda,
o sacrifício do rei foi substituído pelo
sacrifício humano, animal ou vege-
tal. No caso dos animais, os de pelo
36
branco ganham destaque, em especial
o touro branco. Em Creta, o mito do
minotauro, a quem jovens atenienses
seriam sacrificados, é provavelmente
a descrição de ritos sacrificiais para a
renovação da força do rei Minos.
Para finalizar, podemos dizer
que o Solstício de Verão é o dia de
maior incidência de luz solar do ano.
É o auge que parte o momento de
plantio do momento de amadureci-
mento, colheita e morte, a partir do
qual um novo ciclo poderá renascer.
Na natureza, muitos animais e
plantas nascem e morrem logo após se
reproduzirem. A continuidade da vida
garantida, voltam para a terra através
da transformação de seus corpos pela
decomposição, que por sua vez, será
o berço da nova vida. É uma imagem
que pode parecer dura, ou estranha à
sensibilidade moderna, tão distante de
sua própria natureza, mas que foi (e é)
reconhecida por aqueles que obser-
vam sem restrições ao mundo em que
vivem.
O sacrifício do rei divino, visto
como parte do ciclo, algo necessário
para que roda da existência pudesse
continuar girando. Os ritos não eram
simbólicos, mas vistos como atos par-
ticipativos na continuidade dos ciclos
da vida, morte e renascimento do uni-
verso. Os mitos, ecos que nos falam
da sabedoria de seus criadores.
37
***
“Dance, Senhora, dance - sobre a tumba do Rei do Carvalho,Onde ele repousa por meio ano em teu útero tranquilo
Dance, Senhora, dance - ao poder do Deus SolE seu toque de ouro sobre o campo e a flor.
Dance, Senhora, dance, com tua lâmina na mão,Que chamará o Sol para abençoar tua terra.
Dance, Senhora, dance - na roda de Prata,Onde o Rei Carvalho repousa, com suas feridas para curar.
Dance, Senhora, dance - para o reinado do Rei Azevinho,Até que seu irmão o carvalho se erga novamente.
Dance, Senhora, dance - no céu iluminado pelo luarPara o nome Tríplice pelo qual os homens te conhecem.
Dance, Senhora, dance - na Terra que se transformaPara o Nascimento que é Morte, e para a Morte que é Nascimento.
Dance, Senhora, dance - para o Sol nas alturas,Pois seu esplendor candente, também, deve morrer.
Dance, Senhora, dance - para a longa maré do ano,Pois através de toda mudança deves tu residir.”
***
(retirado do livro A Witches’ Bible)
38
Nos últimos 15 anos, dezenas
de pessoas me escreveram angarian-
do uma oportunidade de iniciação
na Arte. O que me chama a atenção
nessas cartas e e-mails de contato, é
que num primeiro momento essas
pessoas não se apresentam correta-
mente, não informam em que lugar
estão vivendo, nem ao menos qual
a sua idade. Não sei se isso é falta
de educação, já que desde pequeno,
fui ensinado que ao entrar em conta-
to com pessoas que eu não conheço,
primeiro de tudo tenho que me apre-
sentar. Mas neste país isso não ocor-
Por Mario Martinez
O que é umapessoa
apropriada
39
re, o que é muito estranho. Assim
sendo, como levar à sério esse tipo
de buscador ?
Gerald Gardner disse que uma
Pessoa Apropriada para a Arte, “é
aquela pessoa que nós encontramos,
que nós reconhecemos como um da-
queles que nós conhecemos e que
amamos antes”. Ou seja, alguém que
nossa intuição nos diz ser um Wica.
Atualmente isso não funciona.
Com a imensa comercialização da
chamada “Wicca” pública, isso nun-
ca será suficiente para considerar al-
guém uma Pessoa Apropriada. O que
acontece é que muita gente procura
um Coven Tradicional, aparece osten-
tando uma bonita fachada, toda pinta-
da e enfeitada, mas que com o tempo
desmorona como tudo o que é falso,
tudo que é forçado. Como a Antiga
Arte virou moda nos anos 1990 em
diante, muitas pessoas surgem com
uma conversa muito boa, mas a Ver-
dade está escondida sob os ornamen-
tos dessa bela fachada.
Nós temos determinado que
uma Pessoa Apropriada deve possuir
determinadas qualidades intrínsecas;
essas qualidades não são passíveis de
ser assimiladas do dia para a noite, já
que são qualidades que trazemos do
berço, e muitas vezes de vidas ante-
riores. Devido a isto, é necessário
que os prováveis candidatos este-
jam incluídos na categoria de Pessoa
Apropriada antes de serrem aceitos
em um Coven Tradicional.
Isso é imprescindível, uma vez
que, pela nossa observação sobre os
buscadores que tem nos procurado, a
maioria deles acredita que tem algum
“direito” de ser iniciado na Arte, à
exemplo de religiões de massa que
40
mantém suas portas abertas para
qualquer um. A Arte dos Wica nun-
ca foi uma religião de massa. Todo o
treinamento na Arte visa despertar lá
do fundo das nossas profundezas as
camadas mais antigas de nossa alma e
nosso perfil psicológico; esse apren-
dizado não é racional, mas precisa
arrancar do fundo da mente do bus-
cador todos os seus traumas e bar-
reiras, causando uma transformação
interna, uma metamorfose. E isso
não pode ser atingido quando a pes-
soa está fazendo de tudo para manter
uma fachada bonita, mas completa-
mente falsa.
Pela minha experiência pessoal
e vivência com esse tipo de pessoa,
tenho notado que todos eles, em al-
gum momento do percurso, viram
suas mentiras subirem à superfície,
causando um estrago muito maior do
que o de empurrar as neuroses para
baixo do tapete. É o que eu chamo de
cobrança dos Deuses.
Essas pessoas procuram um
Coven Tradicional para se salvar de
suas neuroses, para buscar uma liber-
tação das suas ilusões, mas procuram
fazer isso criando uma prática mora-
lista, o que leva a uma maior aliena-
ção de sua própria condição.
Quase ninguém está disposto
a se transformar, porque isso certa-
mente doerá, será tremendamente
desconfortável. A massa ignoran-
te procura a religião para se sentir
“melhor”, para “encontrar a paz”, e
outras bobagens. No entanto, uma
religião de Mistério e transcendência
não fará isso num primeiro momento.
Uma religião de transcendência vai
desestruturar totalmente o buscador,
para que ele veja toda a miséria que
arrasta consigo, todo o sofrimento
41
que continua arrastando ao longo dos
anos, justamente por falta da cora-
gem necessária para abrir os olhos e
ver sua realidade.
A busca de iniciação na Arte
não é um desejo de poder, mas a ne-
cessidade de operar uma transforma-
ção total, onde o buscador precisa
se desvencilhar de seus padrões de
auto-estima e auto-identidade, total-
mente alienados da realidade. Essas
máscaras ou essas fachadas tem que
desmoronar. Contudo, na imensa
maioria das vezes, esses buscadores
abandonam a religião por medo de
enfrentar sua própria realidade.
Uma Pessoa Apropriada para
a Arte deverá, desse modo, possuir
qualidades que não podem ser com-
pradas no supermercado, tais como
honestidade, lealdade, compaixão,
etc. Todas essas qualidades serão ob-
servadas pelo Coven, e só então, se
todas as exigências forem observadas,
o buscador poderá então ser levado
através dos Portais da Iniciação.
42
Dentro de nós existe um para-
doxo que sempre exige mais empenho
e dedicação. Sempre temos uma sede
para ser saciada, mas nunca a fonte
amorosa dá o suficiente de beber. O
amor é algo buscado por todo “Ser”
e, mesmo que não tenhamos consci-
ência dessa busca, todos nós sabemos
que, no íntimo, existe um desespero
para encontrá-lo.
Todo amor que desejamos ob-
ter do outro sempre representa mui-
to pouco, migalhas ou nada. O motivo,
é que essa ilusão se torna um ideal, e
como uma busca, pode persistir por
décadas. Sabemos que a grande massa
ainda sofre por vivenciar as mentiras
nas quais somos condicionados. Nes-
sa busca longínqua de mentiras, onde
nunca encontramos nada, estaremos
procurando e filosofando sobre as
chaves, mas sempre nos esquecendo
das portas.
Para compreendermos os Mis-
térios da Transformação, precisamos
nos envolver. Muitas vezes ouvimos
dizer que a vida é um jogo duro, no
entanto , precisamos aprender a jogar
e a conhecer as peças do jogo para
alcançarmos o objetivo desejado. Ne-
cessitamos aprender a ver e a ouvir,
Por Lorenna Escobar
ALTO IDEAL
43
inclusive, aprender a aprender. Preci-
samos observar nossas atitudes para
alcançarmos nossos ideais.
Muitas pessoas vão dizer que as
artimanhas para compreendermos e
conhecermos os Mistérios, alguns de
forma velada, são apenas formas de
persuasão do próprio sistema. Muitas
vão imaginar que tudo isso é bobagem
e muitas não vão dar a mínima. Ape-
nas aqueles que estão despertos, que
atingem um nível superior de consci-
ência, conseguem “enxergar” melhor
e reconhecer o seu papel no jogo.
A busca pelo despertar também
precisa ser desejada. Provavelmente,
este é o mais alto ideal do Homem,
assim como o propósito da semente
quando é lançada na Natureza.
No entanto, muitos obstáculos
estarão presentes. A semente precisa
romper a casca, reconhecer seu po-
tencial e percorrer a vasta escuridão
para alcançar a luz e florescer.
Não somos seres criados para
viver sozinhos. Precisamos do outro
para nos complementar, e, durante
o intercurso na maturidade, e fazer
jorrar o fluído mágico já existente
e latente dentro de cada ser. Assim,
como a semente precisa de cuidados,
o adepto precisa do Mestre.
44
Nosso ego dita que, por preci-
sarmos do outro, podemos estar vul-
neráveis e em alguma espécie de peri-
go. A partir desse tipo de pensamento
nascem os desajustes, o desejo pela
dominação, pela aniquilação, pelo ape-
go, pelo medo e pela culpa causando
infelicidade e dor a todos os envolvi-
dos.
Algumas pessoas acreditam
que somente à beira da extinção
pode ocorrer um “salto” evolutivo e,
que apenas aprendendo com nossa
infelicidade e dor, valorizaremos tudo
aquilo que nunca teremos. No entan-
to, não podemos afirmar que isso seja
verdadeiro, mas também não se trata
de uma alegoria. Apenas podemos afir-
mar que existem outras formas mais
poderosas e gratificantes de aprendi-
zado que levam ao desenvolvimento
do espírito, que é transcendental, e
transmitidas religiosamente entre os
Wica.
A Natureza é fiel e verídica.
Ela classifica e determina cada ser de
acordo com o seu trabalho e o seu
ideal, e assim, cada um tem o poder da
transformação e dos mais altos ideais
que estão além do que se é conheci-
do.
45
Fundamentos da Wica Tradicional, o novo livro de Mario Martinez, está disponível em uma Edição Especial e limitada para os leitores de BTW.
O livro aborda temas importantes e necessários para a compreensão da Wica Tradicional Iniciatória, como a Teologia, a se-xualidade e os Mistérios.
Esta obra está disponível aos interessados, bastando fa-zer o pedido através do e-mail:
[email protected] No ato do pedido por e-mail, o solicitante deverá incluir uma cópia do boleto bancário de pagamento, no valor de R$ 30,00 e que deverá ser feito para:
Mario MartinezBanco 001 - Banco do Brasil
Agência: 5757-6 (Ag. Estilo Avenida Chile 230/RJ)
Conta Corrente: 347.273-6
A Edição do livro é limitada.Todas as cópias são numeradas e autografadas pelo autor.
NOVO LIVROMARIO MARTINEZ
46
A revista BTW é publicada quatro
vezes ao ano e seu objetivo é
formar, esclarecer e desmistificar
origens, dogmas e práticas da Wica
Gardneriana e mostrar que os ensinamentos
de Gerald Gardner ainda estão vivos e
florescendo no seio dos covens tradicionais.
47
Esta revista é aberta a comunidade em geral,
caso desejem publicar algum artigo ou mensagem. Basta
nos mandar o texto para [email protected] , com o
assunto “artigo”.
Participe da seção Carta do Leitor e envie suas
opiniões, dúvidas e sugestões. É só enviar para o endereço
[email protected] com o assunto “carta do leitor”.
http://wiccagardneriana.net/
*Imagens cuja fontes não foram atribuídas, favor entrar em contato com a revista para que possamos dar os devidos créditos.
48