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Abordamos uma problemática basilar aos tratados de música: a inexistência de um consenso quanto ao emprego de uma terminologia essencialmente musical em língua portuguesa. É neste âmbito que citamos a proposta de Reginaldo Carvalho (1932), que evoca no neologismo "musiquês" o resultado de sua vasta pesquisa nessa área. Trata-se de uma coerente opção que emerge frente ao tradicionalismo impreciso, deveras prejudicial à inteligibilidade das especulações teórico-musicais.
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CCHLA – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes – UFPB VIII Conhecimento em Debate – 03 a 07 de novembro de 2008 1
Musiquês: Uma Proposta de Sistematização Terminológico-Musical
Segundo Reginaldo Carvalho
Thiago Cabral Carvalho1 Resumo
Abordamos uma problemática basilar aos tratados de música: a inexistência de um consenso quanto ao emprego de uma terminologia essencialmente musical em língua portuguesa. É neste âmbito que citamos a proposta de Reginaldo Carvalho (1932), que evoca no neologismo "musiquês" o resultado de sua vasta pesquisa nessa área. Trata-se de uma coerente opção que emerge frente ao tradicionalismo impreciso, deveras prejudicial à inteligibilidade das especulações teórico-musicais.
Palavras-chave: Reginaldo Carvalho, teoria musical, terminologia musical Introdução
Com o surgimento dos primeiros tratados sistematizados sobre teoria da música no pe-
ríodo renascentista inaugura-se uma tendência que segue crescente mesmo nos dias atu-
ais: o desejo de elaborar pressupostos norteadores que viabilizem explicar, de maneira
descritiva ou analítica, os fenômenos sonoros decorrentes de uma determinada realidade
musical. Tal fato pode ser exemplificado nos esforços que partiram de Zarlino (1517-
1590), que se dedicou à música do Renascimento, a Allen Forte (1926), importante teó-
rico e analista do século XX.
O arcabouço ideológico destes tratados reflete não somente uma realidade que se encon-
tra intrínseca ou extrínseca à partitura ou à sua performance, mas a condição essencial
da sua existência como fenômeno artístico e como agente validador daquele determina-
do procedimento co-relacionado ao fazer e ao apreciar musical. Entendemos que traba-
lhos dessa natureza são de extrema importância para uma compreensão mais elucidativa
daquilo que a música se propõe bem como oferendar-nos possíveis detalhamentos sobre
os passos que estão atrelados a seu planejamento e concretização material (partitura ou
gravação). Entretanto, certas discrepâncias terminológico-musicais chegam a inviabili-
zar a compreensão, a lógica e a consistência destes estudos, muitas vezes dúbios ou as-
sistemáticos, deficitários de uma nomenclatura própria.
É sob essa ótica que abordaremos aqui uma proposta de ajustamento e consenso termi-
nológico, denominado musiquês, elaborada por Reginaldo Carvalho, que já publicara
sete livros, sendo que mais nove estão em preparação2.
1 Mestrando em Musicologia Sistemática pela UFPB
CCHLA – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes – UFPB VIII Conhecimento em Debate – 03 a 07 de novembro de 2008 2
Reginaldo Carvalho: dados biográficos
Nasceu em Guarabira, a 105 km da capital João Pessoa, Estado da Paraíba, no dia 27 de
agosto de 1932. Ainda criança começou a estudar violino e órgão, logo dirigindo bandas
e orfeões em Campina Grande e em sua cidade. Aos 14 anos começou a compor. Sua
primeira obra foi escrita para piano em 1946, e se intitulava Ternura. Em 1949 saiu de
Recife direto para o Rio de Janeiro, onde passou a estudar composição com Villa-Lobos
(1887-1959), contraponto e fuga com Paulo Silva (1892-1967). Afirma ter sido o único
aluno particular de Villa-Lobos em composição musical. E foi justamente ele que, em
1951, aconselhou Reginaldo a ir a Paris para saber "que coisa era essa tal de música
concreta que os franceses apregoavam". Com bolsa do governo francês (obtida por in-
fluência de Villa-Lobos), realizou estágio de música concreta no antigo Centre Bourdan
na década de 50.
Foi aluno, na sua primeira estada em Paris, de Paul Le Flem (1881-1984), Olivier
Messiaën (1908-1992) (composição) e freqüentou, na Sorbonne, psico-pedagogia com
Jean Piaget (1896-1980), e, na segunda, um dos primeiros discípulos de Pierre Schaeffer
(1910-1995), o criador da música concreta. Reginaldo Carvalho tem o mérito de ser o
primeiro compositor brasileiro a trabalhar com música eletroacústica. Em 1960 estabe-
leceu-se em Brasília por 4 anos, chegando a por em prática os seus conhecimentos mu-
sicais e pedagógicos mais modernos (incluindo o “musiquês”), criando corais, bandas e
os fundamentos da Escola de Música de Brasília. Na volta definitiva ao Brasil em 1965,
montou seu Estúdio de Experiências Musicais, onde criou suas obras concretas. Mais
tarde tornou-se diretor do Instituto Villa-Lobos, que na época se transformou num im-
portante centro para a prática da música experimental no Brasil. Dentre as obras de
maior destaque da época citamos: Caleidoscópio IV; Caleidoscópio V; Estudos Incoe-
rentes; Sibemol; Temática; Troço I; Troço II.
2 Livros publicados: Teoria Musical, Tomo I – Duração e Intensidade, Editora Punaré, Teresina, 1979. (esgotado); Literatice de Cordão – Contações, Fundação Cultural do Piauí, Projeto Petrônio Portella, Editora, 1991; Esquema Essencial de Classificação para a Música Ocidental, Prefeitura Municipal de Teresina, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, Gráfica e Editora Júnior Ltda, Teresina, 1994; Organo-logia, Prefeitura Municipal de Teresina, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, Gráfica e Editora Júnior Ltda, Teresina, 1994; Cantares Piauienses I, Prefeitura Municipal de Teresina, Fundação Cultural Mon-senhor Chaves. Editora Haley Ltda. Teresina, 1996; Teoria Musical, Tomo II – Altura e Timbre, Gráfica e Editora Júnior Ltda, Teresina, 1997; Regência Musical, Prefeitura Municipal de Teresina, Fundação Monsenhor Chaves. Editora Gráfica do Povo, Teresina, 1997. Livros em preparação: TPM – II; TPM – III; TPM – IV; Dicionário essencial de termos musicais peculiares; Cultura popular; Prosódia Musical; Teoria básica de harmonia acordal; Literatice de Cordão II; Literatice de Cordão III.
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Autor de mais de quatro mil composições, Reginaldo Carvalho reside em Teresina-PI
desde 1972. Foi professor adjunto no Departamento de Educação Artística na Universi-
dade Federal do Piauí (até 2002), obtendo, em 1994, o título de Mestre em Educação
nesta mesma instituição. Atualmente dedica-se sobremaneira à divulgação de suas idéi-
as, além de desempenhar suas atividades como compositor, musicólogo, pesquisador e
escritor.
Princípios fundantes de sistematização no musiquês
O fator basilar desta taxonomia fundamenta-se no conceito do ictus - termo originário
do latim que significa golpe. Sua funcionalidade é compreendida, por exemplo, na ex-
plicação das possibilidades rotativas de tonicidade e atonicidade e suas recorrências
silábicas comuns, localizáveis tanto na língua falada (inflexão vocal) quanto escrita (si-
nal diacrítico). Na língua francesa, por exemplo, há predominância do ictus na última
sílaba (oxítona), enquanto que no português isso ocorre geralmente nos vocábulos paro-
xítonos.
A fim de equiparar os fenômenos lingüísticos à música, o autor propõe o uso do termo
Fluxão, que vem a ser “etapas de revezamento entre fluxo e refluxo. Fluxo é tese ou
tesis ou apoio ou tonicidade ou assento. Refluxo é arse ou ársis ou impulso ou atonici-
dade ou desassento” (CARVALHO, 2006, p. 01). O autor ainda ressalta:
Os poetas latinos cismaram de inverter a ordem das coisas chamando ‘tésis’ de ‘ársis’ e ‘ársis’ de ‘tésis’, ao contrário do étimo original gre-go que a música segue: na hora de abordar-se o assunto, em prosódia musical, por exemplo, os dois artigos de fé se conflitam; apesar de se constatar a qualquer momento que a oscilação pendular é uma cons-tância homogênea, na qual se baseia a música, sendo a fluxão (vai-vém) o revezamento de fluxo (tese, apoio, tonicidade) e refluxo (arse, impulso, atonicidade) situando-se no tempo, (‘antes’ e ‘depois’ signi-ficam duração e não intensidade), os teóricos musicais tradicionais in-sistem em estabelecer-se na tensão, na força (‘forte’ e ‘fraco’ são refe-renciais de intensidade e não de duração) confundindo assento com acento (CARVALHO, 2002, p. 03).
Ou seja, se o apoio e o impulso em música são originalmente enquadrados no étimo
grego, verificamos a discernência quanto à significância dos termos assento e acento. O
primeiro é relativo ao parâmetro sonoro duração e o segundo ao parâmetro sonoro in-
tensidade. A afirmação é confrontada da seguinte maneira pelo autor:
Fluxão é vaivém. Uma alternância isocrônica. O paradigma é a oscila-ção do pêndulo em que se pode observar, incontestavelmente, as bati-
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das equânimes, sem que ocorra, de jeito nenhum, uma batida forte se-guida de outra fraca (CARVALHO, 2006, p. 01).
Para evitar qualquer sorte de ambivalência existente na abordagem teórica, particular-
mente nestes dois parâmetros musicais: duração e intensidade, o autor sugere, por e-
xemplo, o ajuste do termo ponto de aumento (signo representante do somatório de du-
ração) por ponto de acréscimo, de mesma significância na teoria tradicional, porém, o
termo “aumento” refere-se à crescença de “volume sonoro” (potência=decibel), ou seja,
parâmetro intensidade e não duração, como originalmente ocorre. Seguindo tal proble-
mática, o autor enuncia-nos uma situação de significância dúbia entre os parâmetros
intensidade e altura:
Faz-se uma tremenda confusão, entre os parâmetros altura e intensida-de, a toda hora, mandando-se, por exemplo, “falar mais alto ou mais baixo” querendo-se dizer “falar mais forte ou mais fraco”; “falar alto e bom som” ao invés de “falar a plena voz”; mandando-se “abaixar o rádio” enquanto se quer “diminuir o volume sonoro” (CARVALHO, 1997, p. 09).
Ainda sobre antagonismos entre os dois parâmetros citados acima:
Não se pode dizer também que ‘o sustenido aumenta a nota um pon-to’, pois aumentar é referencial de intensidade, e sustenido e nota são correspondências com altura, e o ponto, que pode ser de redução ou de acrescentamento ou ainda aleatorizante, é que varia a duração do va-lor, conforme sua disposição, enquanto que o sustenido altera a fre-qüência da nota, elevando-a em semitom (CARVALHO, 1997, p. 08).
Outro desajuste terminológico comumente visto está relacionado ao termo no-
ta=codificação de altura relativa do som, índice frequencial, portanto, pertencente ao
parâmetro altura. Equívocos podem ser encontrados em sua totalidade nos textos advin-
dos da língua inglesa, onde não há, praticamente, diferenciação entre nota=altura e va-
lor=duração, ou, alto=agudo/baixo=grave e figura=sonoro/pausa=assonoro respectiva-
mente. Como exemplo, citamos o caso de atribuir-se o termo “nota” ao valor positivo
semibreve, sem mesmo considerá-lo ou não regido por uma clave, onde, neste caso sim,
além de estar codificado temporalmente encontra-se um referencial de altura.
Também é muito freqüente nos escritos sobre música atribuir-se a designação de “cor”
do som ao parâmetro timbre. Na abordagem de Reginaldo Carvalho, a união entre lin-
guagem visual e linguagem musical dá margem à imprecisão e a subjetividade, impon-
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do, sobre esses fatores, a necessidade de se ajustar cientificamente tal parâmetro físico
do som. Isto pode ser confirmado no seguinte comentário:
O timbre – é preciso urgentemente e insistentemente afirmar-se, por incrível que pareça, tendo em conta os permanentes equívocos em vol-ta do assunto - é parâmetro sonoro, portanto, do ouvido, para ser escu-tado, não podendo em hipótese alguma ser visto (pelos olhos), não tendo o menor cabimento a definição de que venha a ser freqüência sonora, em termos de percepção cerebral, uma vez que cor vem a ser freqüência luminosa; timbre, índice constitutivo de estrídulos ou har-mônicos, distintivo autônomo de cada fonte soante, adequar-se-ia me-lhor talvez a matiz, índice constitutivo de pigmentos de cada cor; tim-bre não quer dizer “colorido” (CARVALHO, 1997, p. 305).
Todas essas afirmações reforçam a necessidade de um repensar frente aos princípios
terminológicos básicos da música. Formulam o cerne desta proposta: a lógica e, segun-
do o autor, “o bom senso”. Numa de suas passagens, Reginaldo afirma seu desconten-
tamento sobre a produção musical na atualidade, sinalizando uma adoção a pressupostos
tradicionalistas, muitas vezes considerados imutáveis, onde a reflexão do emprego ter-
minológico-musical inexiste:
É preciso, por conseguinte, urgentemente, dar-se um tranco nessa con-juntura insólita que se vem estendendo demasiadamente, por puro co-modismo das pessoas usuárias, - por receio de mudança, talvez, ou de confrontação perante o que se tem estabelecido ou, simplesmente, por preguiça mental, resignando-se, às vezes, até com inexatidões e aber-rações, ambivalência esta que torna difícil de discernir-se se está dian-te de falta de honestidade, de ingenuidade ou simplesmente de incom-petência, - colocando-se, por fim, refletidamente, as coisas na sua de-vida ordenação (CARVALHO, 2002, p. 03).
A fim de ilustrar de maneira mais sintética esta proposta, demonstramos, através do
quadro abaixo, alguns exemplos de sua usabilidade. Baseamo-nos nas quatro proprieda-
des físicas do som as quais a teoria musical básica se detém. Os “novos” termos foram
analogamente dispostos para que o leitor possa observar o processo de ajuste do mesmo
verbete tanto na terminologia tradicional quanto no musiquês.
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QUADRO 1
Comparação entre a terminologia tradicional e o musiquês entre os quatro parâmetros sonoros
PARÂMETROS DO SOM
ALTURA DURAÇÃO INTENSIDADE TIMBRE
Tradicio-nal Musiquês Tradicional Musiquês Tradi-
cional Musi-quês Tradicional Musiquês
Linha melódica (visual)
Seqüência melódica (auditiva)
Fermata
Ponto coro-ado aleato-rizante em valor positi-
vo
Fortissis-síssimo Poss forte Voz é ins-
trumento
Espécie: vocal (bioe-nergética) e instrumental (mecânica)
Quin-tas/oitavas parale-
las
Quin-tas/oitavas
diretas Acento Assento
(fluxão) Sinal de ataque
Sinal diacrítico Som cheio Timbre amplo
Modular
(mudar de modo e
tom)
Modular
(mudar de modo),
Tonular
(mudar de tom)
Síncope=
Prolongamento do tempo forte
Síncope=
Impulso prolongado
Gradação de dinâ-
mica
Gradação de inten-sidade
Timbre dos instrumentos de percussão
Timbre dos instrumentos de marcação
Harmonia
vertical,
horizontal
Harmonia
acordal,
frasear
A semínima “vale”
um tempo
A semínima dura
um tempo
Pianissis-síssimo
Poss piano Cor do som Consistência
sonora
Aplicação metodológica dos pressupostos teóricos
Reginaldo Carvalho consegue reformular, de maneira lógica, os fundamentos teórico-
terminológicos de música, propondo conceituações tecnicamente precisas dos fenôme-
nos musicais, privando por um linguajar singular, resultado dos seus 50 anos de experi-
ência docente, ministrando, sobretudo, disciplinas teóricas. Tal aplicação pode ser pre-
sencialmente vista em suas obras mais recentes, ainda não publicadas, aos quais tivemos
acesso: TPM (Teoria e Percepção Musical – Parte Teórica, 4 volumes) e Dicionário
essencial de termos musicais peculiares.
Como exemplificação de aplicação do musiquês à elaboração textual, faremos uma
comparação do texto original de Roy Bennet (1986, p.12) e, em seguida, redigiremos,
de acordo com a proposta do musiquês, o mesmo trecho:
Cada instrumento tem uma qualidade de som que lhe é própria, aqui-lo que poderíamos chamar de “cor do seu som”. Por exemplo, a sono-ridade característica de um trompete é que nos faz reconhecê-lo ime-diatamente como tal, de modo a podermos dizer que diferença há en-tre esse instrumento e, digamos, um violino. É a essa particularidade do som que se dá o nome de timbre. O compositor tanto pode jogar com a mistura de timbres, ou seja, misturar a seção de cordas de uma orquestra com as ricas e misteriosas sonoridades do corne inglês, dos violoncelos e dos fagotes, como também pode jogar com contras-
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te, procurando destacar um som do outro. Seria o caso, por exemplo, de um fundo formado por sonoridades mais sombrias, constituídos pelos baixos das cordas e metais, em contrastes com os sons lumino-sos e penetrantes do flautim, da requinta, do trompete com surdina e do xilofone.
Após a revisão terminológica:
Cada som tem uma qualidade que lhe é própria, aquilo que podería-mos chamar de consistência sonora. Por exemplo, a sonoridade pecu-liar de um trompete é que nos faz reconhecê-lo imediatamente como tal, de sorte a podermos dizer que diferença há entre esse instrumento e, digamos, um violino. É a essa particularidade do som que se dá o nome de timbre. O compositor tanto pode jogar com a mistura de tim-bres, ou seja, misturar a seção de cordas de uma orquestra com as pe-culiaridades sonoras do corninglês, dos violoncelos e dos fagotes, como também pode jogar com contraste, procurando destacar um som do outro. Seria o caso, por exemplo, de uma textura formada por so-noridades mais graves, constituídos pelos baixos das cordas e bocais, em contrastes com os sons agudos e pungentes do flautim, da requin-ta, do trompete com surdina e do xilofone.
Conclusão
A proposta de um repensar terminológico sobre os fenômenos musicais, muitas vezes
tratados de sorte metafísica e subjetiva, não atende, a nosso ver, as necessidades expli-
cativo-textual que se exige hoje nos cursos de pós-graduação em música ou em qualquer
publicação da área. Infelizmente não encontramos relatos de outros pesquisadores inte-
ressados em rever basilar problemática no campo da música, sempre aglomerando ter-
mos de outras áreas, muitas vezes imprecisos, inviabilizando significância e entendi-
mento ao que se propõe escrever sobre música.
Consideramos as publicações de Reginaldo Carvalho de extrema importância ao campo
de estudos da música, sempre sugerindo, sem qualquer tipo de imposição, a melhor ma-
neira de sistematizarmos o pensamento musical com base, principalmente, na lógica, na
coerência e na “honestidade”. Tais obras encontram-se atualmente em números limita-
dos e restritos à venda e divulgação pelos órgãos públicos do estado do Piauí, sendo que
algumas destas encontram-se esgotadas. Eis uma questão centralizadora a contribui so-
bremaneira para que estas obras permeiem no desconhecido. Ainda na década de 1960,
em Brasília, o autor referencia as opiniões que recebeu a respeito de suas publicações:
Para não dizer que ninguém se manifestou, recebi uma carta do maes-tro Koellreutter e um recado indireto, via outro amigo, de Bruno Kief-fer. Koellreutter reconheceu a iniciativa, achou válido o interesse.
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Bruno só ficou em dúvida se intensidade não seria mesmo sinônimo de dinâmica “como todos os livros atestavam”, apesar do “Tratado Geral dos Objetos Musicais”, de Pierre Schaeffer contestar e provar o contrário. E pronto. Mais ninguém. Nem um pio. Não é de desesperar? (CARVALHO, 1997, p. 13)
Expomos aqui apenas uma amostra das dimensões as quais se compreende a nova pro-
posta de sistematização terminológo-musical. Grande parte da produção escrita no cam-
po da música permanece ainda calcada no tradicionalismo imutável, dogmático. Enten-
demos música também como ciência, por sua vez, susceptível a revisões constantes
quanto aos seus pressupostos teóricos, a fim de equacionar eventuais limitações de pre-
cisão descritiva das especulações de âmbito sonoro. O repensar perpassa o descondicio-
namento de imposições seculares, onde o sentimento de mudança deve tornar-se neces-
sário para o desenvolvimento e fortalecimento da produção musical em sua amplitude.
Utilizar ou não o musiquês é uma opção de livre arbítrio, e, em defesa desta proposta,
aqui partilhamos, mais uma vez, das palavras do autor:
Eu estou canso de afirmar que se você falar errado, todo mundo en-tende, embora se entenda igualmente se você falar certo. É uma ques-tão de escolha, uma opção pedagógica. Em derradeiro caso, um bom processo judicial em que na argumentação prevaleçam a lógica e a sensatez pode resolver a contenda (CARVALHO, 2002, p. 03).
Referências CARVALHO, Reginaldo. TPM-I – Parte Teórica. Teresina: s/e, 2002. ____. Teoria da Fluxão – Um novo enfoque na Teoria Musical. Teresina: s/e, 2006. ____. Teoria Musical – Tomo II. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1997. BENNETT, Roy. Uma breve história da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986.