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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL MESTRADO CADEIA CAUSAL DA DEGRADAÇÃO DE NASCENTES NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO GRAMAME - PARAÍBA GABRIELA CRISTINA DA SILVA SOARES Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal da Paraíba para obtenção do grau de Mestre João Pessoa - Paraíba Julho - 2015

CADEIA CAUSAL DA DEGRADAÇÃO DE NASCENTES NA … · A bacia hidrográfica do rio Gramame, que abastece cerca de 70% da população da área metropolitana da cidade de João Pessoa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA

CENTRO DE TECNOLOGIA

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL

MESTRADO

CADEIA CAUSAL DA DEGRADAO DE NASCENTES NA BACIA

HIDROGRFICA DO RIO GRAMAME - PARABA

GABRIELA CRISTINA DA SILVA SOARES

Dissertao de Mestrado apresentada Universidade Federal da Paraba para

obteno do grau de Mestre

Joo Pessoa - Paraba

Julho - 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA

CENTRO DE TECNOLOGIA

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL

MESTRADO

CADEIA CAUSAL DA DEGRADAO DE NASCENTES NA BACIA

HIDROGRFICA DO RIO GRAMAME - PARABA

Dissertao submetida ao Programa de Ps-

Graduao em Engenharia Civil e Ambiental da

Universidade Federal da Paraba, como parte dos

requisitos para a obteno do ttulo de Mestre

Gabriela Cristina da Silva Soares

Orientadora: Dr. Carmem Lcia Moreira Gadelha

Coorientador: Dr. Hamilcar Jos Almeida Filgueira

Joo Pessoa - Paraba

Julho 2015

AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter sido a minha fora, coragem, e por ter iluminado meu caminho para

que eu pudesse concluir mais uma etapa da minha vida, pois sem ele nada teria sido possvel;

e minha Me Rainha, Nossa Senhora das Graas, pela intercesso, inspirao e

ensinamentos, que me ajudaram a chegar ao fim desta nova etapa da minha vida.

Aos meus pais Valdecir de Azevedo Soares e Neuza Ana da Silva Soares, e irmos

Rafael Soares e Miguel Soares, pois sem a fora e apoio deles em minha vida eu nada teria

alcanado.

Ao meu noivo Robson da Fonseca Rodrigues, pelo seu incentivo, pacincia, por ter

sempre me apoiado nesses dois anos de curso e pelo apoio em diversos trabalho de campo ao

longo do Mestrado.

Ao meu cunhado Renato da Fonseca Rodrigues, pelos seus ensinamentos, pacincia,

amizade e por ter sempre me apoiado nesses dois anos de curso.

A minha famlia, em especial s minhas Tias Luciana Lins, Ozane e Maria Aparecida,

agradeo pelo apoio nos momentos difceis, pela fora, dedicao, amor e apoio recebido

sempre.

A minha orientadora, a Professora Dra. Carmem Lcia Moreira Gadelha, por toda a

orientao, ao longo do curso, apoio, conselhos, pacincia, conversas, ensinamentos e

amizade.

Ao meu coorientador, o Professor Dr. Hamilcar Jos Almeida Filgueira, por

disponibilizar dados imprescindveis, pela amizade, ensinamentos e pela grande contribuio

para a concluso desse trabalho.

Aos Professores do PPGECAM - Programa de Ps-Graduao em Engenharia Civil e

Ambiental, por todo o conhecimento adquirido ao longo dos dois anos do Mestrado.

Ao Professor Ronildo e ao tcnico Edilson do Laboratrio de Mecnica dos solos, pela

ajuda, pelo companheirismo e pelas idas ao campo.

Aos amigos e colegas do curso de Mestrado, em especial a Andr Pires, Andra

Cavalcanti, Patrcia, Eliamin, Tatyane Nadja, Christiane Neres, Luana e Felipe pela

convivncia, pela verdadeira amizade, apoio nos momentos difceis e por todos os momentos

que passamos juntos durante esses dois anos.

Aos amigos, em especial a Andr Luiz da Silva, pela convivncia, pelo apoio em

diversos trabalho de campo ao longo do Mestrado, e por todos os momentos que passamos

juntos durante esses dois anos.

Aos amigos-irmos Marcus Raffael, Juscelino, Izolda, Dborah e Alexandre do grupo

PEKOS que sempre me apoiaram e me deram foras a continuar.

A minha madrinha Wilsa Cardoso Padilha por ser um exemplo de f, pelo apoio e

amizade.

Ao Doutor Carlos Henrique, por ser um exemplo, pela amizade, e por ter sempre me

apoiado em minhas pesquisas.

Ao Professor Doutor Marcus Tullius Scotti, Luciana Scotti e Llia Scotti por serem

um grande referencial em minha vida e pela amizade.

Ao meu amigo, Josias Dias dos Santos, pela verdadeira amizade, apoio nos momentos

difceis e por todos os momentos que passamos juntos durante esses dois anos.

Aos irmos de comunidade em especial s minhas coordenadoras Joseana e Francisca,

assim como minha Madrinha Janana pela compreenso e apoio sempre.

Aos meus sobrinhos Gabriel Wagne e Evelyn Gabrielle e minha irm de corao

Janana pelo apoio e pela motivao durante o trabalho.

Aos professores, funcionrios e alunos que frequentam diariamente o LARHENA

(Laboratrio de Recursos Hdricos e Engenharia Ambiental) e o Laboratrio de Saneamento,

pela equipe de trabalho e amizade construda.

CAPES (Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior) pela

concesso da bolsa de estudos para a realizao do Mestrado.

7

RESUMO

A bacia hidrogrfica do rio Gramame, que abastece cerca de 70% da populao da rea

metropolitana da cidade de Joo Pessoa e vrias comunidades ribeirinhas, tem um nmero

significativo de nascentes localizadas no municpio de Pedras de Fogo. Este trabalho

apresenta um estudo realizado na rea de trs dessas nascentes: uma periurbana (Cacimba da

Rosa) e duas rurais (Nova Aurora e Fazendinha), face aos problemas ambientais e de gesto

que l ocorrem. A metodologia do estudo foi baseada na aplicao de matriz de cadeia causal,

como etapa que se sucedeu ao diagnstico socioeconmico e ambiental das reas de

abrangncia ou em torno das nascentes. Para tanto, identificamos e classificamos os principais

problemas ambientais e de gesto das guas nessas reas. Entre eles foram destacados: os

conflitos pelo uso da gua; o nvel socioeconmico e as fontes de poluio, a partir de

caminhadas exploratrias e registros fotogrficos. Esses problemas foram analisados segundo

as causas tcnicas, gerenciais, poltico-sociais e econmico-culturais, construindo-se para

cada um deles uma matriz de cadeia causal. A anlise dessas matrizes revelaram que os

conflitos pelo uso da gua se apresentam como problema de prioridade 1 e com tendncia

crescente; o nvel socioeconmico aparece como problema de prioridade 2 e com tendncia

estvel; e as fontes de poluio so um problema de prioridade 3 e com tendncia crescente

nas reas em torno das trs nascentes em estudo. Tambm constatou-se que a construo de

matriz de cadeia causal ferramenta til formulao e execuo de polticas pblicas de

conservao dos recursos naturais.

PALAVRAS-CHAVE anlise ambiental; matriz de cadeia causal; nascentes.

8

ABSTRACT

The river Gramameshydrographic basin which supplies 70% of the population in the

metropolitan area of Joo Pessoa-PB and several riverside communities has a significant

number of sources located in Pedras de Fogo-PB. This paper presents the results of a study

conducted around three of the said sources: one located in the peri-urban area (Cacimba da

Rosa) and another two located in the rural area (Nova Aurora and Fazendinha), due to the

environmental and management problems that occur there. The studys methodology is

inspired on the application of the causal chain matrix as a step that followed the

socioeconomic and environmental diagnosis of the areas around the sources. In order to do so,

we identified and classified the main environmental and water management problems in that

area: the conflicts for the use of water; the socioeconomic level and the sources of pollution,

via exploratory walks and photographic records. These problems were analyzed according to

the technical, managerial, political-social and cultural-economic causes setting up the causal

chain matrix for each of them. The analysis of each matrix revealed that the conflicts over the

water use are presented as priority problem 1 with an increasing trend; the socioeconomic

level is presented as a priority issue 2 and with stability tendency; and the sources of pollution

are a priority issue 3 with an increasing trend in the areas around the three sources studied.

We have also proved that the causal chain matrix is a useful tool to the formulation and

implementation of public policies on conservation of natural resources.

KEYWORDS: environmental analysis; causal chain matrix; sources.

9

LISTA DE ILUSTRAES

Figura 1 Nascente sem acmulo inicial de gua..................................................................... 24

Figura 2 Nascente com acmulo inicial de gua. ................................................................... 24

Figura 3 Componentes do modelo de anlise da cadeia causal do projeto GIWA UNEP/GEF

.................................................................................................................................................. 36

Figura 4 - Matriz de cadeia causal (adaptada por Silans et al. 2007) ....................................... 41

Figura 5 Diviso territorial do estado da Paraba, com o municpio de Pedras de Fogo em

destaque. ................................................................................................................................... 42

Figura 6 Localizao geogrfica da rea de estudo na bacia hidrogrfica do rio Gramame,

Paraba ...................................................................................................................................... 43

Figura 7 Localizao das nascentes Fazendinha, Nova Aurora e Cacimba da Rosa na bacia

hidrogrfica do rio Gramame, no municpio de Pedras de Fogo PB ..................................... 47

Figura 8 Matriz de cadeia causal - conflitos de destinao de uso, disponibilidade qualitativa

e quantitativa da gua nas reas em torno da nascente Cacimba da Rosa Pedras de Fogo

PB ............................................................................................................................................. 54

Figura 9 Matriz de cadeia causal - conflitos de destinao de uso, disponibilidade qualitativa

e quantitativa da gua nas reas em torno da nascente Nova Aurora Pedras de Fogo PB .. 55

Figura 10 Matriz de cadeia causal - conflitos de destinao de uso, disponibilidade

qualitativa e quantitativa da gua nas reas em torno da nascente Fazendinha Pedras de

Fogo PB ................................................................................................................................. 56

Figura 11 Nascente Cacimba da Rosa antes do aterramento Pedras de Fogo PB ........... 57

Figura 12 Situao de degradao ambiental na nascente Cacimba da Rosa aps chuva

intensa que ocasionou o seu aterramento Pedras de Fogo PB ............................................ 58

Figura 13 Cercamento de proteo da rea no entorno da nascente Cacimba da Rosa

Pedras de Fogo PB, derrubado por ao antrpica ................................................................ 59

Figura 14 Presena de animais entorno da nascente Cacimba da Rosa Pedras de Fogo

PB ............................................................................................................................................. 59

Figura 15 Nascente Nova Aurora Pedras de Fogo PB..................................................... 60

Figura 16 Loteamento da comunidade rural de Nova Aurora ao redor da nascente Nova

Aurora Pedras de Fogo PB ................................................................................................. 61

Figura 17 Nascente Fazendinha Pedras de fogo PB ........................................................ 62

Figura 18 Loteamento da comunidade rural de Fazendinha Pedras de Fogo PB ............ 62

Figura 19 Matriz de cadeia causal nvel socioeconmico nas reas em torno da nascente

Cacimba da Rosa Pedras de Fogo PB ................................................................................. 78

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10

Figura 20 Matriz de cadeia causal nvel socioeconmico nas reas em torno da nascente

Nova Aurora Pedras de Fogo PB ........................................................................................ 79

Figura 21 Matriz de cadeia causal nvel socioeconmico nas reas em torno da nascente

Fazendinha Pedras de Fogo PB .......................................................................................... 80

Figura 22 Matriz de cadeia causal fontes de poluio nas reas em torno da nascente

Cacimba da Rosa Pedras de Fogo PB ................................................................................. 91

Figura 23 Matriz de cadeia causal fontes de poluio nas reas em torno da nascente Nova

Aurora Pedras de Fogo PB ................................................................................................. 92

Figura 24 Matriz de cadeia causal fontes de poluio nas reas em torno da nascente

Fazendinha Pedras de Fogo PB .......................................................................................... 93

Figura 25 Casa de farinha a montante e bem prxima a rea de captao da nascente

Cacimba da Rosa Pedras de Fogo PB ................................................................................. 96

Figura 26 Lanamento da manipueira em direo nascente Cacimba da Rosa Pedras de

Fogo PB ................................................................................................................................. 97

Figura 27 Descarte inadequado de resduos slidos na rea em torno da nascente Fazendinha

Pedras de Fogo PB .............................................................................................................. 98

Figura 28 Pontos de acmulo de lixo a cu aberto no municpio de Pedras de Fogo (Fazenda

Bulhes) PB ......................................................................................................................... 105

Figura 29 Pontos onde ocorre a prtica inadequada de queima de resduos slidos, no

municpio de Pedras de Fogo (Fazenda Bulhes) PB ......................................................... 105

Figura 30 Plantao de cana-de-acar na zona rural de Pedras de Fogo PB .................. 110

11

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Problemas ambientais e respectivos aspectos ambientais relacionados com a

degradao dos recursos hdricos, segundo a metodologia do projeto GIWA UNEP/GEF ..... 34

Tabela 2 Identificao dos problemas crticos na rea em torno das nascentes .................... 52

Tabela 3 Resultado das anlises fsico-qumicas dos parmetros das amostras de gua das

nascentes, no perodo de 2010-2012*e no ano de 2014. .......................................................... 65

Tabela 4 Resultados das anlises de coliformes termotolerantes na gua das nascentes

(2010-2011) .............................................................................................................................. 66

Tabela 5 Valores mdios das vazes das nascentes (2010-2012) ......................................... 67

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Caractersticas das captaes estudadas ................................................................ 48

Quadro 2 Metodologia analtica adotada na determinao dos parmetros fsico-qumicos da

gua das nascentes .................................................................................................................... 49

13

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AESA Agncia Executiva de Gesto das guas do Estado da Paraba

APP rea de Preservao Permanente

ADT Anlise de Diagnstico Transfronteirio

ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas

CAGEPA Companhia de gua e Esgoto da Paraba

CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

CONAB Companhia Nacional de Abastecimento

DBO Demanda Bioqumica de Oxignio

EMATER Empresa de Assistncia Tcnica e Extenso Rural

EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria

GEF Global Environmental Facility

GIWA Avaliao Global de guas Internacionais

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

IDH ndice de Desenvolvimento Humano

INCRA Instituto Nacional de Colonizao de Reforma Agrria

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis

PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

UTM Universal Transverse Mercator

PNUMA Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente

PRONEA Programa Nacional de Educao Ambiental

PMSB Plano Municipal de Saneamento Bsico

SISNAMA Sistema Nacional de Meio Ambiente

https://www.embrapa.br/

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Sumrio

1 INTRODUO ................................................................................................................... 16

1.1 Objetivos ......................................................................................................................... 19

1.1.1 Objetivo geral ........................................................................................................... 19

1.1.2 Objetivos especficos................................................................................................ 19

2 FUNDAMENTAO TERICA ...................................................................................... 20

2.1 Degradao e poluio dos corpos hdricos .................................................................... 20

2.1.1 As nascentes de corpos hdricos ............................................................................... 22

2.2Conflitos pelo uso da gua em bacias hidrogrficas e nascentes ..................................... 27

2.3 Bacia hidrogrfica: unidade de planejamento ambiental ................................................ 30

2.4 Planejamento Ambiental ................................................................................................. 31

2.4.1 Planejamento estratgico .......................................................................................... 32

2.4.2 Ferramenta de planejamento: anlise de cadeia causal ............................................ 33

3 DESCRIO DA REA DE ESTUDO ............................................................................ 42

3.1 Localizao ..................................................................................................................... 42

3.2 Clima ............................................................................................................................... 43

3.3 Solos ................................................................................................................................ 43

3.4 Geomorfologia ................................................................................................................ 44

3.5 Vegetao ........................................................................................................................ 44

3.6 Aspectos socioeconmicos ............................................................................................. 45

4 METODOLOGIA ................................................................................................................ 46

4.1 Seleo das Nascentes .................................................................................................... 46

4.2 Levantamento de dados .................................................................................................. 48

4.2.1 Medio de vazo ..................................................................................................... 48

4.2.2 Anlises fsico-qumicas da gua das nascentes ...................................................... 49

4.3 Construo das matrizes de cadeia causal ...................................................................... 50

5 RESULTADOS E DISCUSSO ........................................................................................ 52

5.1 Matriz de conflitos pelo uso da gua .............................................................................. 52

5.1.1 Causas tcnicas dos conflitos pelo uso da gua ....................................................... 56

5.1.2 Causas gerenciais dos conflitos pela gua................................................................ 69

15

5.1.3 Causas poltico-sociais dos conflitos pela gua ....................................................... 72

5.1.4 Causas econmico-culturais dos conflitos pelo uso da gua.................................... 75

5.2 Matriz de nvel socioeconmico ..................................................................................... 77

5.2.1 Causas tcnicas do nvel socioeconmico ................................................................ 81

5.2.2 Causas gerenciais do nvel socioeconmico ............................................................ 83

5.2.3 Causas poltico-sociais do nvel socioeconmico .................................................... 86

5.3 Matrizes de fontes de poluio ....................................................................................... 90

5.3.1 Causas tcnicas de fontes de poluio...................................................................... 94

5.3.2 Causas gerenciais de fontes de poluio ................................................................ 102

5.3.3 Causas poltico-sociais de poluio da gua .......................................................... 106

5.3.4 Causas econmico-culturais de poluio ............................................................... 109

6 CONSIDERAES FINAIS E RECOMENDAES ................................................. 111

REFERNCIAS ................................................................................................................... 115

16

1 INTRODUO

Enfrentar a escassez e garantir gua de qualidade e em quantidade para atender

crescente populao mundial de forma sustentvel tem sido uma das grandes preocupaes e

prioridades de planejadores e tomadores de decises. A questo da sustentabilidade aqui

referida, centraliza-se, em especial, na gesto dos usos da gua para o consumo humano, sem

comprometer a capacidade das geraes futuras de satisfazerem as suas prprias necessidades.

Diante disso, o desafio de sustentabilidade se inicia no campo e envolve trabalhos de

recuperao e preservao de reas de afloramentos do lenol hdrico subterrneo, tambm

chamadas de nascentes.

Antigamente as demandas hdricas podiam ser atendidas pelas disponibilidades

naturais sem amplos investimentos, alm daqueles indispensveis para a captao. Porm, o

desenvolvimento econmico, mais intenso nas regies de relativa abundncia hdrica e o

aumento populacional acabaram por reduzir os recursos hdricos, tanto em quantidade como

em qualidade satisfatria necessitando de maiores investimentos para obt-los (LANNA,

1993, p.739).

Segundo Valente e Gomes (2002), nascentes so manifestaes superficiais de

aquferos subterrneos, frequentemente conhecidos por lenis subterrneos, tanto freticos

(aqueles que apresentam uma camada impermevel presente s na base) como artesianos ou

confinados (quando a gua est localizada entre duas camadas impermeveis). Para Castro e

Lopes (2001), as nascentes so locais onde se iniciam os cursos d'gua (crrego, ribeiro,

etc.), que abastecem as zonas urbanas e rurais, sendo de grande importncia ambiental, social

e econmica no contexto de qualquer regio.

A explorao desordenada dos recursos naturais, o uso inadequado dos solos, o

desmatamento sem controle e a aplicao indiscriminada de fertilizantes, corretivos e

agrotxicos vm provocando inmeros problemas ambientais, principalmente em reas de

nascentes e ribeirinhas, alterando a qualidade e quantidade de gua drenada pela bacia

hidrogrfica (PINTO et al. 2004). Para Rocha et al. (2008) a qualidade da gua de uma

nascente tambm influenciada pela interao de diversos fatores dentre eles o clima, a

cobertura vegetal, a topografia, os aspectos referentes hidrogeologia local, a formao

geolgica, bem como o tipo, o uso e o manejo do solo na bacia hidrogrfica.

Dessa forma, Souza e Fernandes (2000), relacionam a proteo das nascentes com as

prticas corretas do manejo integrado de bacias hidrogrficas. Esse manejo envolve a

17

elaborao de diagnsticos que levantam os problemas da bacia hidrogrfica, identificam os

conflitos e indicam as possveis solues em todos os nveis, integrando concluses e

recomendaes para a recuperao total do meio ambiente (SILVA e RAMOS, 2001). Por

isso, as bacias hidrogrficas vm se consolidando como compartimentos geogrficos

coerentes para planejamento integrado do uso e ocupao dos espaos rurais e urbanos, tendo

em vista o desenvolvimento sustentado no qual se compatibilizam atividades econmicas com

qualidade ambiental (SOUZA e FERNANDES, 2000).

Santos (2004) afirma que o planejamento ambiental fundamenta-se na interao e

integrao dos sistemas que compem o ambiente, com o intuito de estabelecer relaes entre

os sistemas ecolgicos e os processos da sociedade. Geralmente, esse planejamento consiste

na adequao de aes potencialidade, capacidade local e de suporte, buscando o

desenvolvimento harmnico da regio e a manuteno da qualidade do ambiente fsico,

biolgico e social. Alm disso, o autor supracitado relata que o planejamento ambiental

utiliza-se da estratgia de estabelecer aes dentro de contextos e no isoladamente, obtendo-

se, assim, um melhor aproveitamento do espao fsico e dos recursos naturais, entre outros.

De acordo com Cabral da Silva et al. (2011), a bacia hidrogrfica do rio Gramame,

apesar de possuir fundamental importncia para o abastecimento de gua de cerca de 70% da

populao da Grande Joo Pessoa, compreendendo as cidades de Joo Pessoa (capital da

Paraba), Cabedelo, Bayeux e parte de Santa Rita e de vrias comunidades ribeirinhas,

caracteriza-se por ser palco de uma srie de conflitos em torno da gua sendo o mais notvel o

de disponibilidade quantitativa entre a irrigao e o abastecimento humano. Registram-se

ainda conflitos entre a atividade da pesca e a industrial, entre outros.

Para Gadelha et al. (2001), a bacia hidrogrfica do rio Gramame possui uma base

essencialmente rural, na qual as atividades de irrigao tm-se destacado para racionalizar e

intensificar sua produo agrcola. Isso tem ocasionado grande consumo de fertilizantes e

agrotxicos (inseticidas, fungicidas e herbicidas), em grandes reas da bacia hidrogrfica,

inclusive a montante do ponto de captao de gua para o sistema de abastecimento da

Grande Joo Pessoa, comprometendo a qualidade da gua.

De acordo com o exposto no Plano Diretor da Bacia Hidrogrfica do rio Gramame

(PARABA, 2000), essa bacia hidrogrfica apresenta um elevado grau de explorao

antrpica frente s outras bacias litorneas do Estado, tendo a maior parte de sua rea ocupada

pela explorao agrcola, que tambm a maior responsvel pelo consumo de gua. A

irrigao destaca-se principalmente no consumo de gua pela cultura de cana-de-acar. Com

o aparecimento das usinas de processamento de cana-de-acar, as reas canavieiras

18

expandiram-se, passando a ocupar tambm os tabuleiros, alm dos terraos recentes de fundo

de vale. Diante disso, a cobertura vegetal atual no baixo, mdio e alto curso dos rios que

formam a bacia hidrogrfica do rio Gramame apresentam um ndice elevado de devastao

(aproximadamente, 10% da cobertura vegetal), como consequncia, principalmente da

explorao desordenada, voltada para diversas atividades, como a agrcola, a industrial, de

minerao, turismo e lazer, alm da urbanizao crescente no territrio da bacia.

As demandas hdricas da bacia hidrogrfica do rio Gramame referem-se a: os usos

consuntivos para abastecimento da populao humana urbana (ncleos urbanos) e rural; o

abastecimento animal; e a pr fim s necessidades de gua para indstrias, e para irrigao.

Identificam-se, por esse fato, reas de vulnerabilidade e que, se no existir um mecanismo

eficaz de gesto dos recursos hdricos, estaro sujeitas a conflitos de disponibilidade

quantitativa e qualitativa entre os diferentes usurios (PARABA, 2000).

Segundo Costa (2011), a bacia hidrogrfica do rio Gramame possui um nmero

significativo de nascentes localizadas no municpio de Pedras de Fogo PB, que apresentam

uma srie de conflitos envolvendo a disponibilidade e a qualidade da gua para usos

mltiplos. Alm disso, a regio vem sendo foco de srios problemas ambientais como o

desmatamento. A retirada da cobertura florestal nativa vem ocorrendo nas margens de rios e

do entorno das nascentes para a explorao agrcola, principalmente, a cultura da cana-de-

acar, em larga escala, e pequenas lavouras como batata-doce, mandioca, inhame e abacaxi,

entre outras.

Filgueira et al. (2010) em estudo realizado no alto curso do rio Gramame, envolvendo

os usos e usurios da gua das nascentes, verificaram que, do total dos moradores locais

entrevistados, 56,9% so usurios de gua de nascentes, enquanto 43,1% utilizam outras

fontes de gua, como, por exemplo, poos rasos. Alm disso, os autores supracitados relatam

que 37,9% da populao local utilizam a gua diariamente: em primeiro lugar para lavagem

de utenslios domsticos e roupas; em segundo, para irrigao de pequenas lavouras,

popularmente chamadas de lavouras brancas (batata-doce, inhame e macaxeira); e, por

ltimo, para dessedentao de animais e beber.

Assim, diante dessa realidade, importante o desenvolvimento de estudos que

subsidiem o planejamento ambiental e as melhores estratgias para a recuperao e

preservao das nascentes da bacia hidrogrfica do rio Gramame.

19

1.1 Objetivos

1.1.1 Objetivo geral

Analisar o processo de degradao de reas de captaes de gua de nascentes na

bacia hidrogrfica do rio Gramame/PB, no municpio de Pedras de Fogo, utilizando como

ferramenta a matriz de cadeia causal.

1.1.2 Objetivos especficos

Levantar as principais fontes de poluio da gua das nascentes Cacimba da Rosa,

Nova Aurora e Fazendinha;

Identificar as principais variveis sociais e ambientais envolvidas no processo de

degradao das reas das nascentes;

Identificar as causas tcnicas, gerenciais, poltico-sociais e econmico-culturais

verificadas nos principais problemas nas reas em torno das nascentes estudadas;

Construir a matriz de cadeia causal para os principais problemas identificados nas

reas em torno das nascentes;

Realizar uma anlise ambiental integrada das reas das nascentes como suporte

tcnico aos tomadores de deciso no que concerne formulao e execuo de

polticas pblicas de conservao das nascentes.

20

2 FUNDAMENTAO TERICA

2.1 Degradao e poluio dos corpos hdricos

De acordo com a Lei Federal 6.938/81, que institui a Poltica Nacional do Meio Ambiente

seus fins, mecanismos de formulao e aplicao, entende-se como degradao da qualidade

ambiental:

A alterao adversa das caractersticas do meio ambiente, e por poluio, a

degradao da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou

indiretamente: a) prejudiquem a sade, a segurana e o bem-estar da populao; b)

criem condies adversas as atividades sociais e econmicas; c) afetem

desfavoravelmente a biota; d) afetem as condies estticas ou sanitrias do meio

ambiente; e) lancem matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais

estabelecidos (BRASIL, 1981).

Quando a poluio de um determinado corpo hdrico causa consequncias a sade do

homem, diz-se que h contaminao. Assim, a contaminao pode ser compreendida como

um caso particular de poluio. Um corpo hdrico est contaminado quando recebeu ou

microrganismos ou substncias qumicas ou radioativas. Para Dores e Freire (2001), a

preocupao com a contaminao de corpos hdricos superficiais e subterrneos tem crescido

no meio cientfico, principalmente, quando a contaminao ocorre por agrotxicos, sendo a

preocupao ainda maior quando a gua dos corpos hdricos utilizada para o consumo

humano.

A poluio das guas consequncia de praticamente todas as atividades humanas, sejam

elas domsticas, comerciais ou industriais. Cada uma dessas atividades produz poluentes

especficos que causaro determinadas consequncias na qualidade da gua do corpo receptor

(PEREIRA, 2004). As consequncias de cada poluente esto relacionadas com suas

concentraes, o tipo de corpo hdrico receptor, assim como os usos da gua deste. Silans et

al. (2005), afirmam que a poluio da gua significa qualquer alterao de suas propriedades

fsicas, qumicas ou biolgicas, que possa resultar em prejuzo sade, segurana e ao bem

estar das populaes, causar dano flora e fauna, ou comprometer o seu uso para fins

sociais e econmicos.

Diante disso, a expanso da agricultura tem colaborado para a poluio do solo e das

guas. Para Gadelha et al. (2001), os fertilizantes sintticos e defensivos agrcolas (inseticidas,

fungicidas, cupinicida, nematicida e herbicidas) usados em quantidades inadequadas ou

indiscriminadamente nas lavouras, poluem o solo e as guas dos rios e lagos, onde intoxicam

21

e matam diversos organismos desses ecossistemas. Causam tambm problemas para o homem

e os animais, porque apresentam alta toxidez e efeitos cumulativos, e so de difcil

decomposio qumica. Silans et al. (2005) afirmam que as guas so poludas,

principalmente, por dois tipos de resduos: os orgnicos, formados por cadeias de carbono

ligadas a molculas de oxignio, hidrognio e nitrognio, e os inorgnicos, que possuem

composies diferentes. Os resduos orgnicos normalmente possuem origem animal ou

vegetal e provm dos esgotos domsticos e de diversos processos industriais ou

agropecurios. So biodegradveis, ou seja, so destrudos naturalmente por microrganismos.

Porm, esse processo de destruio acaba consumindo a maior parte do oxignio dissolvido

na gua, o que pode comprometer a sobrevivncia de organismos aquticos. J os resduos

inorgnicos vm, geralmente, de indstrias, principalmente as qumicas e petroqumicas, de

agrotxicos e fertilizantes e no podem ser decompostos naturalmente. Entre os mais comuns

esto os metais pesados. Conforme sua composio e concentrao, os poluentes hdricos

possuem a capacidade de intoxicar e matar microrganismos, fauna e flora aqutica, assim

podendo tornar a gua imprpria para o consumo humano.

Segundo von Sperling (2005), geralmente os poluentes podem atingir os corpos hdricos

de duas maneiras diferentes: a primeira ocorre por meio de uma fonte pontual, onde os

poluentes atingem o corpo de gua de forma concentrada no espao. o que ocorre, por

exemplo, em lanamentos de esgotos industriais em um determinado corpo hdrico. A

segunda ocorre a partir de fonte difusa, isto , os poluentes alcanam os mananciais devido ao

seu deslocamento a partir de extensas reas, de forma espalhada ou distribuda; geralmente, os

poluentes so transportados por correntes areas, chuva ou pela atividade agrcola com o uso

de agrotxicos. Para Silans et al. (2005), em concentraes urbanas, onde no existe rede de

esgotamento sanitrio, as fossas spticas e sumidouros esto de tal forma regularmente

espaadas que o conjunto acaba por ser uma fonte difusa de poluio. Esse tipo de poluio

apresenta baixa concentrao, atinge reas extensas e seus efeitos s se tornam visveis depois

que se encontram concentrados na biota, sendo essa fonte de poluio mais complexa de

controlar.

A degradao ambiental consequncia da dinmica entre componentes

socioeconmicos, institucionais e atividades tecnolgicas. Fatores como o crescimento

econmico, da agricultura e da populao, a pobreza, urbanizao, o aumento do uso de

transportes e as necessidades de novas fontes de energia, resultam em problemas ambientais.

Assim, as causas ou fatores de degradao ambiental so resultado de caractersticas sociais,

econmicos e ambientais de uma determinada regio (CRUZ et al., 2008).

22

De acordo com o exposto no Plano Diretor da Bacia Hidrogrfica do Rio Gramame

(PARABA, 2000), a degradao do meio ambiente geralmente associada industrializao

realizada, sem levar em considerao os princpios ecolgicos e a integridade dos recursos

naturais. Resultado ento, de todas as aes e/ou omisses humanas, adquire propores de

poluio da gua, do ar e do solo, com danos qualidade de vida, ao bem estar e ao

desenvolvimento socioeconmico.

Para Jesus (2006), a fragilidade ambiental associada a fatores antrpicos pressionados

por situaes de pobreza e baixos nveis tecnolgicos causa a degradao do ambiente. Nesse

cenrio destaca-se o estado da Paraba na regio Nordeste do Brasil. As prticas econmicas

que ocorrem no Estado desde os primrdios do descobrimento do Brasil, tm sido predatrias

nos seus diferentes espaos geogrficos. Diante disso, tem-se verificado que os recursos

naturais ainda disponveis vm sendo explorados de forma imediatista, apresentando nveis de

degradao ambiental bastante evidente, quase sempre, nas reas onde as condies

hidrometeorolgicas so menos favorveis.

Assim, os recursos hdricos e seus ecossistemas associados so os mais prejudicados

pela falta de cuidados ambientais. Devido principalmente ao elevado crescimento

populacional e ocupao desordenada do solo, tem-se observado a poluio e contaminao

dos corpos hdricos superficiais e subterrneos, com o comprometimento da quantidade e da

qualidade da gua para os seus mltiplos usos. Para Costa (2011), estudos de tratos

ambientais so fundamentais para se obter a melhor compreenso das inter-relaes entre o

homem e o meio ambiente.

2.1.1 As nascentes de corpos hdricos

Muitos mananciais vm sendo cada vez mais e de diversas formas contaminados e

tambm, em alguns casos, j so constatadas relevantes redues na sua vazo ou at mesmo

seu desaparecimento (CASTRO et al. 2007). Entre os vrios tipos de mananciais existentes, as

nascentes so de fundamental importncia, uma vez que a maioria delas pode fornecer gua

durante o ano inteiro, mesmo em perodos de estiagem, assim como tambm so responsveis

pela formao dos cursos de gua. Por isso, profissionais de rgos governamentais e outras

instituies, engajados na preservao dos recursos hdricos, tm destinado um empenho

especial preservao das nascentes.

De acordo com Felippe e Magalhes Jr. (2009), para gerir os recursos hdricos e

garantir o suprimento de gua em qualidade e quantidade adequada, para seus usos mltiplos,

23

de extrema importncia o monitoramento e o acompanhamento de aes de preservao das

reas de nascentes de corpos hdricos. Estes so ambientes fundamentais para a manuteno

do equilbrio hidrolgico e ambiental das bacias hidrogrficas.

Barreto et al. (2007) afirmam que, alm da quantidade e qualidade de gua da

nascente, importante manter a sua vazo ao longo do tempo, de modo que ela apresente

volume mdio de produo, principalmente nos perodos mais secos. Para que isso ocorra

necessrio que a nascente esteja localizada em uma bacia hidrogrfica conservada, na qual os

solos sejam permeveis, possibilitando assim, o processo de infiltrao.

A nascente ideal aquela que fornece gua de boa qualidade, abundantemente e de

forma contnua. Tambm, necessrio que, alm da quantidade de gua produzida pela

nascente, ela tenha boa distribuio no tempo, assim, a variao da vazo situe-se dentro do

mnimo adequado ao longo do ano. Esse fato pressupe que a bacia hidrogrfica no deve

funcionar como um recipiente impermevel, escoando em curto espao de tempo toda a gua

recebida durante uma precipitao pluvial. Pelo contrrio, essa deve absorver boa parte dessa

gua por meio do solo, armazen-la em seu lenol subterrneo e ced-la, aos poucos, aos

cursos dgua atravs das nascentes, inclusive mantendo a vazo, sobretudo durante os

perodos de seca. Isso primordial tanto para o uso econmico e social da gua bebedouros,

irrigao e abastecimento pblico, como para a manuteno do regime hdrico do corpo

dgua principal, assegurando a disponibilidade de gua no perodo do ano em que mais se

precisa dela (CALHEIROS et al., 2009).

As nascentes podem ser divididas de acordo com o regime de gua, em perenes (de

fluxo contnuo), temporrias (s permanecem ao longo da estao chuvosa) ou efmeras (s

aparecem temporariamente aps as chuvas e duram poucos dias ou horas) (BARRETO et al.,

2007).

Para Castro et al. (2007), o aparecimento de gua na superfcie do solo resultante do

lenol fretico ocorre principalmente de duas formas diferentes e, assim, as nascentes podem

ser pontuais ou de encostas e difusas. A nascente pontual ocorre quando a camada

impermevel apresenta uma inclinao menor em relao encosta. Isso ocasiona o encontro

entre elas, e a gua brota em um nico local do terreno, formando assim a nascente ou olho

dgua. A nascente difusa ocorre quando a camada impermevel do terreno encontra-se

praticamente paralela superfcie do terreno, na sua parte mais baixa. Com isso, o fluxo de

gua das encostas promover uma elevao do nvel do lenol fretico que poder atingir a

superfcie do terreno. Nessas condies, o solo apresentar caractersticas de encharcamento,

24

caracterizando brejos, onde as pequenas nascentes brotam de maneira desordenada em toda

superfcie do terreno.

Segundo Calheiros et al. (2004), as nascentes pontuais ou de encosta (Figura 1) ainda

podem ser classificadas com relao sua formao, em nascentes sem acmulo de gua

inicial.

Figura 1 Nascente sem acmulo inicial de gua

Fonte: Calheiros et al. (2004)

Em relao s nascentes difusas, se a vazo for pequena poder apenas molhar o

terreno; do contrrio, pode originar o tipo de nascente com acmulo de gua inicial que,

devido s suas caractersticas, acabar formando um lago (Figura 2).

Figura 2 Nascente com acmulo inicial de gua.

Fonte: Calheiros et al. (2004)

25

As nascentes tambm se classificam, em relao ao estado de conservao, em trs

categorias: preservadas, perturbadas e degradadas. So preservadas as que possuem pelo

menos 50 metros de vegetao natural no seu entorno, medidos a partir do olho dgua em

nascentes pontuais ou partir do olho dgua principal em nascentes difusas; perturbadas,

quando no possuem 50 metros de vegetao natural no seu entorno, mas com bom estado de

conservao, em parte, ocupadas por pastagem e/ou agricultura; degradadas, as que possuem

um alto grau de perturbao, pouco vegetada, solo compactado, presena de gado, com

eroses e voorocas (PINTO et al. 2004).

De acordo com Mello et al. (2010), estudos sobre o uso e ocupao do solo em reas

de recarga de nascentes so cada vez mais relevantes, tendo em vista a escassez de estudos

referentes dinmica da gua nessas reas. Alm disso, os autores supracitados relatam que

principalmente com relao as nascentes, ocorre um evidente interesse na preservao e

melhoria da qualidade, quantidade e uniformidade de produo de gua. Com isso, destaca-se

a importncia de estudos cientficos sobre o controle ambiental, com aplicao em pesquisas

em regies hidrolgicas e uma maior conscientizao e envolvimento da sociedade nos

desafios relacionados gesto dos recursos hdricos.

Soares et al. (2010), avaliaram as presses antrpicas, consequentes do uso da terra,

em trs nascentes pertencentes sub-bacia hidrogrfica do crrego do Caet MT, sendo,

duas localizadas na zona rural do distrito de Sonho Azul, em Mirassol DOeste - MT

(nascentes Z Cassete e Carnaba). A terceira, a nascente do crrego Terer, situa-se na zona

urbana de So Jos dos Quatro Marcos-MT. Os autores verificaram que apenas a nascente do

crrego Carnaba encontra-se preservada, em razo da menor presso de atividades

econmicas no seu entorno. A nascente do crrego Z Cassete apresenta a situao mais

crtica devido reduo de fertilidade do solo no seu entorno, ocasionado, principalmente,

pelo cultivo de cana-de-acar. J a nascente do crrego Terer perdeu suas caractersticas

naturais em razo da urbanizao que existe no seu entorno. Concluram sobre a necessria

interveno nas nascentes estudadas para que essas possam permanecer contribuindo com a

sub-bacia hidrogrfica.

Pedrosa (2014) afirma que, h pelo menos um ano, a crise hdrica vem ocupando

espao diariamente entre as principais manchetes da imprensa brasileira. Como se tivesse

ocorrido de repente, sem previses e alertas h dcadas.

Uma pesquisa realizada pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) publicada no

Jornal Hoje, mostrou o interior do estado de So Paulo em uma situao alarmante, pois mais

da metade das 54 nascentes de gua que estavam sendo monitoradas desde 2003 secaram na

26

ltima dcada. Os autores supracitados afirmam que a falta de chuvas agravou o problema,

mas uma das causas principais desse grave problema foi o desmatamento das matas ciliares.

Das 54 nascentes analisadas na pesquisa, 34 tem menos da metade de gua que tinham h dez

anos e 29 esto secas. Uma das nascentes que secaram pertencia ao rio So Jos dos Dourados,

um dos mais importantes da regio Noroeste de So Paulo (CASATTI et al. 2014).

Estudo veiculado pelo Jornal Bom Dia Brasil mostra que, no municpio de Jundia, no

interior de So Paulo, 225 nascentes correm o risco de desaparecer. Com isso, o rio Jundia

Mirim, que abastece o municpio, tambm pode ter o volume reduzido. Os autores tambm

alertam que a estiagem e a falta de vegetao j fizeram um crrego secar e que as nascentes

precisam ser protegidas por mata nativa, para ajudar a manter o volume de gua e impedir o

assoreamento. Sem as reas verdes no seu entorno, as nascentes secam no perodo de

estiagem, o que compromete o volume dos rios e reservatrios (RIBEIRO et al. 2015).

Menezes (2014) afirma que a crise hdrica to falada em So Paulo e Minas Gerais, de

fato uma condio permanente h sculos no Nordeste do Brasil, nada mais do que um

retrato da crise nacional em gesto de recursos hdricos, afinal existem leis, planos e agncias

reguladoras dos recursos hdricos e outras instncias, porm a gesto integrada desses

recursos com a clara e objetiva definio de quem faz o qu, como e onde, nem sempre

praticada.

De acordo com a Lei Federal n 12.651, de 25 de maio de 2012, que institui o atual

Cdigo Florestal (BRASIL, 2012), alterado pela Lei Federal 12.727, de outubro de 2012,

fruto da converso da Medida Provisria N 571/2012 em Lei, consideram-se reas de

Preservao Permanente APPs, as reas protegidas, cobertas ou no por vegetao nativa,

com a funo ambiental de preservar os recursos hdricos, a paisagem, a estabilidade

geolgica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gnico de fauna e flora, proteger o solo e

assegurar o bem-estar das populaes humanas. A mesma Lei, tambm determina que as

APPs, em meios rurais ou urbanos, so reas no entorno das nascentes e dos olhos dgua

perenes, qualquer que seja sua situao topogrfica, no raio mnimo de 50 (cinquenta)

metros, ou seja, aquelas nascentes ou olhos dgua que apresentam gua temporariamente,

ou s durante uma estao do ano, no esto inclusos.

Para cursos dgua, a rea de preservao varia conforme a largura do rio, mas apenas

para os perenes e intermitentes, excludos os efmeros, que so aqueles que apresentam gua

apenas aps uma grande precipitao.

Segundo o Artigo 39 Lei de Crimes Ambientais N 9.605/98 (BRASIL, 1998),

proibido destruir ou danificar floresta considerada da rea de preservao permanente, sem

27

permisso da autoridade competente, sendo prevista pena de deteno, de um a trs anos, ou

multa, ou ambas as penas, cumulativamente.

A Lei Federal N 9.433, de 08 de janeiro de 1997, que institui a Poltica Nacional de

Recursos Hdricos (PNRH) e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos

Hdricos, dentre os instrumentos estabelecidos por esta, segundo seu Art. 5, destacam-se os

Planos de Recursos Hdricos que apresentam, como contedo mnimo, o diagnstico da

situao atual dos recursos hdricos, a anlise das alternativas de crescimento demogrfico, a

modificao dos padres de ocupao do solo; a realizao do balano entre disponibilidades

e demandas futuras dos recursos hdricos, em quantidade e qualidade, com identificao de

conflitos potenciais; as metas de racionalizao de uso, aumento da quantidade e qualidade

dos recursos hdricos disponveis, assim como, avaliar medidas a serem tomadas, programas

para serem aprimorados e projetos para serem estabelecidos (BRASIL,1997).

Como se pode perceber, a Lei N 9.433, visa segurana deste recurso natural de

extrema importncia para a sobrevivncia humana e de toda biodiversidade brasileira. No

entanto, com relao aplicao e fiscalizao desta Lei, vale salientar que, na grande maioria

das vezes em nosso pas, ela no efetivamente aplicada. Desta forma, so inmeros os

problemas ambientais que ocorrem no Pas, como lanamento de efluentes industriais e

resduos gerados nos mananciais, quase sempre, sem nenhum tratamento, que levam prejuzos

fauna e flora, podendo alcanar tambm a vida humana atravs da cadeia alimentar.

2.2Conflitos pelo uso da gua em bacias hidrogrficas e nascentes

Garreta-Harkot et al. (1991 apud MARCELINO, 2000, p. 21), define o uso conflitante

como sendo:

Aquelas formas antrpicas de apropriao e utilizao do ambiente, realizadas sem

respeito aos limites impostos pelas feies, processos moduladores e caractersticas

de determinada unidade de recurso ambiental, capazes de desestruturar suas funes

dentro do ecossistema, e de, quando demasiada intensas, impedir a recuperao dos

atributos que as distingue das demais.

Marcelino (2000) afirma que os conflitos de usos dos recursos naturais esto

associados presena humana no ambiente e s diversas formas de ocupao do espao. As

desigualdades sociais e a m distribuio de renda contribuem indiretamente para o conflito

de uso dos recursos naturais, quando contribui para o surgimento de massa desempregada,

sem condies de moradia nas cidades, sem planejamento ou infraestrutura urbana, resultando

28

assim, na poluio da gua, na degradao da paisagem, na modificao de habitats e

comunidades, entre outros e, com frequncia, no esgotamento dos recursos naturais.

Para Alves e Azevedo (2014), os conflitos ambientais ocorrem na sociedade desde

tempos remotos, ocasionados pela escassez ou pelas falhas no controle e/ou gesto de um

determinado recurso natural. Os conflitos relacionados aos recursos hdricos so conhecidos,

especialmente os que procedem da intensificao e diversificao de demandas, decorrentes

em partes do aumento populacional e da urbanizao, que colaboram para que os segmentos

econmicos e industriais necessitem cada vez mais de disponibilidade hdrica. Alm disso, os

autores supracitados relatam que apesar de o Brasil ser um pas com uma considervel

disponibilidade de recursos hdricos, estes so emblemticos no que se refere gerao de

conflitos, relacionados aos usos mltiplos da gua. Na regio semirida brasileira, em

consequncia das instabilidades climticas e m gesto que condicionam a oferta de recursos

hdricos, esses conflitos so ainda mais frequentes e por vezes catastrficos, no ganhando

geralmente a importncia que deveriam.

A crescente necessidade por gua potvel, juntamente com a diminuio da sua

disponibilidade, tanto em quantidade quanto em qualidade, tem aumentando os conflitos pelo

acesso, uso, consumo e gesto desse recurso, estabelecendo assim um problema de aspecto

ecolgico, cultural, social e de poltica de gesto pblica. importante destacar que a sua

disponibilidade no tempo e no espao sofreu alteraes, tornando-se cada vez mais escassa,

consequncia do aumento da demanda agrcola, industrial e demogrfica, juntamente com a

contaminao, desperdcio e a degradao dos corpos hdricos. O problema aumenta ainda

mais devido gua ser um recurso voltado a usos mltiplos, que geralmente so simultneos

entre si. Dessa forma, Brito (2008), considera que os usos mltiplos dos recursos hdricos

constituem um dos grandes desafios para as populaes atuais.

Para Pinheiro et al. (2007), a sociedade moderna ampliou a diversidade de usos dos

recursos hdricos, assim como intensificou a explorao deste. No passado, a pequena

demanda hdrica correspondia ao uso domstico, criao de animais, ao uso agrcola, e

dessedentao. A partir do aumento da diversidade dos usos praticados, originaram-se os usos

mltiplos, isto , aqueles que atendem s diversas demandas e no se restringem a um nico

uso. Dentre os usos mltiplos dos recursos hdricos esto: abastecimento pblico; consumo

industrial; irrigao; recreao; dessedentao de animais; gerao de energia eltrica;

transporte; diluio de despejos; preservao da fauna e da flora.

De acordo com Ferreira et al. (2004), em estudo realizado na bacia hidrogrfica do

Ribeiro Santa Cruz, Lavras, MG, envolvendo o uso conflitante presente nas reas de recarga

29

de 177 nascentes, foram considerados como uso conflitante os usos que no eram de

vegetao nativa presente nas APPs das nascentes. Das 177 nascentes perenes desta bacia, 44

(24,86%) foram identificadas como degradadas, 107 perturbadas (60,45%) e apenas 26

(14,69%) encontravam-se preservadas. As reas de recarga das nascentes ocupam uma rea de

1.404 ha da bacia hidrogrfica, dos quais 9,3% estavam ocupados por algum tipo de uso

conflitantes. A pastagem representou o uso predominante sendo responsvel por 78,45% dos

9,3% de uso conflitante presente nas reas de recarga das nascentes. Alm disso, os autores

tambm afirmam que as nascentes ainda foram classificadas em seis categorias: preservada

pontual (10,17%), preservada difusa (4,53%), perturbada pontual (34,46%), perturbada difusa

(25,99%), degradada pontual (8,46%) e degradada difusa (16,38%). As principais

perturbaes identificadas foram: compactao do solo pelo gado e pelas prticas de preparo

para o plantio de culturas agrcolas, presena de lixo, estrume, eroso, grandes voorocas e

desmatamento.

A sociedade moderna tem aumentado consideravelmente a diversidade de usos da

gua ocasionando demandas conflitantes. Nas regies industrializadas, de explorao mineral

e de alta concentrao populacional, ocorre a degradao dos recursos hdricos constituindo

conflitos com aqueles usurios que necessitam de melhores condies qualitativas da gua.

Esses conflitos podem derivar da disponibilidade quantitativa, da qualidade e das destinaes

de uso da gua (LANNA, 1993, p.740).

Os conflitos relacionados ao uso da gua podem ser classificados como:

Conflitos de destinao de uso - situao que ocorre quando a agua utilizada para

destinaes outras que no aquelas estabelecidas por decises polticas, que as reservariam

para o atendimento de demandas sociais, ambientais e econmicas. Por exemplo, a retirada de

gua de reserva ecolgica para a irrigao: deste modo, acaba sendo utilizada para outros fins.

Conflitos de disponibilidade qualitativa- situao prpria de uso de gua em corpos

hdricos poludos. Existe um aspecto vicioso nesses conflitos, pois o consumo exagerado

reduz a vazo de estiagem deteriorando a qualidade das guas j comprometidas

primeiramente pelo lanamento de poluentes. Isso torna impossvel o uso do recurso hdrico

para os usos mltiplos (dessedentao, abastecimento pblico, etc.) por torn-la inadequada

para o consumo.

Conflitos de disponibilidade quantitativa - condio caracterstica do esgotamento

da disponibilidade quantitativa da reserva hdrica devido ao uso intensivo, podendo ser

consuntivo e no consuntivo. Consuntivo: uso intensivo de gua para irrigao evitando outro

30

usurio de capt-la, podendo ocorrer tambm entre dois usos no-consuntivos, por exemplo,

na operao de uma hidreltrica que estabelece variaes nos nveis de gua acarretando

danos navegao (LANNA, 1993, p. 741; LANNA, 1997; SETTI et al., 2000).

2.3 Bacia hidrogrfica: unidade de planejamento ambiental

A bacia hidrogrfica definida como um conjunto de terras drenadas por um rio e seus

afluentes e constituda nas regies mais altas do relevo por divisores de gua, nas quais as

guas das chuvas, ou escoam superficialmente formando os riachos e rios, ou infiltram no

solo para formao das nascentes e dos lenis freticos (BARRELLA 2001, apud

TEODORO et al. 2007).

A Poltica Nacional de Recursos Hdricos, instituda pela Lei n 9.433/1997, incorpora

fundamentos, princpios, normas e instrumentos para o gerenciamento de recursos hdricos

seguindo a definio de bacias hidrogrficas como unidade de estudo e gesto. Ainda de

acordo com esta Lei, em seu Artigo 1, a bacia hidrogrfica a unidade territorial para

implementao da Poltica Nacional de Recursos Hdricos e atuao do Sistema Nacional de

Gerenciamento de Recursos Hdricos, onde a gesto dos recursos hdricos deve ser

descentralizada e contar com a participao do Poder Pblico, dos usurios e das

comunidades.

De acordo com o exposto no Plano Diretor da Bacia Hidrogrfica do Rio Gramame, a

bacia de drenagem ou bacia hidrogrfica atua como um coletor das guas pluviais precipitadas

na sua rea, conduzindo-as a partir da rede fluvial como escoamento ao exutrio da bacia.

Nesse processo, o relevo, a forma, a rede de drenagem, a vegetao, a natureza do solo e o

embasamento geolgico da bacia so determinantes na relao espao temporal entre a

chuva e a vazo resultante nos cursos dgua (PARABA, 2000).

De acordo com Kobiyama et al. (2008) a bacia hidrogrfica uma unidade ideal para o

gerenciamento integrado dos recursos hdricos e pode ser entendida como uma rea

geogrfica que abrange todas as nascentes de um rio principal e de seus rios afluentes, regio

na qual o escoamento superficial em qualquer ponto converge para um nico ponto de sada,

chamado exutrio.

Para Rocha e Vianna (2008), a bacia hidrogrfica tradicionalmente considerada

como a unidade fisiogrfica mais apropriada para o planejamento dos recursos hdricos, por

ser composta de um sistema aberto de fluxo hdrico a montante do ponto onde a vazo do

curso principal deve ser medida.

31

2.4 Planejamento Ambiental

Pereira (2010) considera que o processo de planejamento vlido para todo e qualquer

tipo de organizao, seja ela pblica, privada ou no governamental. adequado tambm para

governos municipais, estaduais e para o federal e seus ministrios. Claramente, para cada tipo

de organizao deve-se conhecer a devida contextualizao, isto , considerar as demandas e

especificidades de determinada organizao em que se est realizando o planejamento.

Franco (2001) afirma que o planejamento ambiental ou das aes humanas em um

determinado territrio, deve levar em conta a capacidade de suporte dos ecossistemas a nvel

local e regional, sem perder de vista as questes de equilbrio em escalas maiores, tais como, a

continental e a planetria, visando melhoria da qualidade de vida humana, dentro de uma

tica ecolgica. Ainda de acordo com Franco (2001), o principal objetivo do planejamento

ambiental alcanar o desenvolvimento sustentvel dos agroecossistemas e dos ecossistemas

urbanos (cidades), minimizando os riscos e impactos ambientais, buscando manter sua

biodiversidade e a cadeia ecolgica da qual o homem tambm faz parte. Assim, pressupe-se,

trs fundamentos de aes humanas que so a de preservao, recuperao e conservao do

meio ambiente. Dessa forma, o planejamento ambiental tambm um planejamento territorial

estratgico, ecolgico-econmico, sociocultural, agrcola e paisagstico.

Para Rodriguez et al. (2004), o processo de planejamento ambiental se apresenta como

um valioso instrumento para auxiliar os tomadores de deciso na implementao de

estratgias mais efetivas para realizar o desenvolvimento sustentvel, uma vez que permite

pensar previamente a estratgia de uso e explorao dos recursos naturais e servios

ambientais.

Nesse contexto, Silva et al. (2011), tambm consideram o planejamento ambiental

como um instrumento da Poltica Ambiental, um suporte articulado ao processo de tomada de

decises, voltado para traar diretrizes e programar o uso do seu territrio e dos espaos.

Alm disto, os autores afirmam que o planejamento ambiental ajuda a direcionar aes e

intervenes dos governos, dos atores sociais e dos agentes econmicos, aos sistemas

naturais, estando bem direcionado para a organizao espacial da bacia hidrogrfica.

No caso de bacias hidrogrficas e de recursos hdricos, Leal (2012) afirma ser

necessrio um permanente e contnuo processo de planejamento ambiental, que considere os

aspectos naturais, sociais, econmicos e polticos atuantes, de forma integrada e participativa.

32

2.4.1 Planejamento estratgico

O planejamento estratgico na viso de Souto-Maior (2013), um instrumento

esclarecedor da finalidade de uma determinada organizao, ou seja, em que condio ela

quer estar no futuro, como vai chegar l (estratgia), e se est na direo correta

(monitoramento). Dessa forma, busca-se tornar as organizaes mais eficientes, eficazes e

produtivas para que possam ser sustentveis, por maneiras mais apropriadas para realizar e

alcanar seus objetivos e metas, quaisquer que sejam.

De acordo com o Ministrio do Meio Ambiente (2006), o enfoque de planejamento e

gesto estratgica consiste em uma viso integrada destinada a implantar as aes e as

recomendaes propostas pelo estudo, buscando desenvolver capacidades gerenciais e

ferramentas de apoio para garantir a melhoria contnua do processo de planejamento e

implantao de aes. Os resultados obtidos por meio de uma gesto estratgica so

superiores a um mero acompanhamento de planos e apontamento de problemas, sendo assim

consistente para lidar com aes de longo prazo, alm de proteger a programao de possveis

problemas em mudanas de comando, algo recorrente em organizaes pblicas.

Para Marques (2002), a maioria dos recursos hdricos vm sendo utilizados de forma

no sustentvel pelo homem tendo como consequncias, alterao de vazes, rebaixamento de

lenol fretico, poluio da gua, modificao ou perda de habitats, contaminao do solo e

da gua. Logo, a realizao de aes, a elaborao de planos e projetos concentram-se na

eliminao e/ou minimizao desses problemas. No entanto, ainda de acordo com Marques

(2002), as vrias causas de natureza socioeconmica responsveis pela degradao ambiental

no so verdadeiramente investigadas. Isso ocorre porque inmeros fatores respondem pela

carncia de dados e de uma anlise mais consistente acerca das presses antrpicas em

diversos nveis que atuam sobre os recursos hdricos. Dentre estes fatores destacam-se, em

primeiro lugar, a complexidade intrnseca ao tema e em segundo, a ausncia de ferramentas

de planejamento ambiental e gesto estratgica adequada.

De acordo com Santana (2009), o planejamento estratgico deve ser elaborado pelo

Comit da Bacia Hidrogrfica (CBH), para atender s demandas de suporte tcnico,

considerando as Comisses Gestoras na Poltica de Recursos Hdricos, seus usurios e o

Conselho de Recursos Hdricos. Alm disso, o planejamento estratgico deve buscar

identificar as metas e prioridades de ao, articulaes, atribuies e parcerias institucionais a

serem efetivadas. A implantao e desenvolvimento do sistema de planejamento institucional

e de recursos hdricos busca garantir que a atuao efetivamente nas bacias hidrogrficas

33

acontea, de forma integrada, entre os diversos momentos de planejamento: plano estratgico,

plano estadual, plano de bacia, estudos bsicos e de viabilidade, planejamento operacional,

planejamento anual das disponibilidades hdricas, e projetos bsicos.

2.4.2 Ferramenta de planejamento: anlise de cadeia causal

A Anlise de Cadeia Causal (Causal Chain Analysis) foi desenvolvida pelo projeto de

Avaliao Global de guas Internacionais (Global International Waters Assessment- GIWA),

com o intuito de relacionar as presses antrpicas, responsveis pelos problemas ambientais, e

as formas como estas so realizadas (Belausteguigoitia, 2004). Assim, essa cadeia

construda para compreender caractersticas especficas de problemas ambientais e seus

impactos socioeconmicos associados, podendo orientar medidas polticas adequadas para

remediao ou mitigao dos problemas identificados.

O Projeto GIWA, dirigido desde 1999 pelo Programa das Naes Unidas para o Meio

Ambiente (PNUMA) e financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (Global

Environmental Facility-GEF), afirma que a cadeia causal til para melhor compreender as

relaes entre os impactos ambientais e socioeconmicos, assim como suas respectivas

consequncias transfronteirias. Assim, os problemas percebidos e suas principais causas

sociais so relacionadas a partir de uma srie de ligaes que demonstram e resumem, de

forma gradual, as suas correlaes. O projeto supracitado mostra que aplicou a anlise de

cadeia causal (Tabela1), em cinco grandes reas de problemas ambientais: escassez de gua

doce; poluio; modificao de habitat e comunidade; explorao no sustentvel da pesca e

de outros recursos vivos; e mudana global (GIWA, 2002).

34

Tabela 1 Problemas ambientais e respectivos aspectos ambientais relacionados com a

degradao dos recursos hdricos, segundo a metodologia do projeto GIWA UNEP/GEF

Problemas Ambientais Aspectos Ambientais

I. Escassez de gua doce

1. Modificao de vazo

2. Poluio das fontes de abastecimento existentes

3. Mudanas no nvel fretico

II. Poluio

4. Microbiolgica

5. Eutrofizao

6. Qumica

7. Slidos em suspenso

8. Resduos Slidos

9. Trmica

10. Radionucldeos

11. Vazamentos

III. Modificao de habitat e

comunidades

12.Perda de ecossistemas

13. Modificao de ecossistemas ou ecotonos

IV. Explorao no

sustentvel de

recursos pesqueiros

e outros recursos

vivos

14. Sobrepesca

15. Captura incidental e descarte excessivos

16. Prticas de pesca destrutiva

17. Reduo da viabilidade dos estoques devido poluio e doenas

18. Impacto na diversidade biolgica/gentica

V. Mudanas

Globais

19. Mudanas no ciclo hidrolgico

20. Mudanas no nvel do mar

21. Aumento na radiao UV-b devido destruio da camada de

oznio

22. Mudanas na funo do oceano como fonte e sumidouro de CO2

Fonte: GIWA, (2002).

A anlise de cadeia causal (Figura 3) desenvolvida por GIWA (2002) foi elaborada

principalmente a partir de sucessivas respostas a questo "Por qu?" ou "Qual a Causa?" dos

problemas ambientais identificados nos recursos naturais. Assim, sua construo consiste na

identificao das diversas causas (de natureza fsica e socioeconmica) responsveis por um

determinado problema ambiental e o conhecimento das inter-relaes entre as mesmas,

formando uma abordagem til na identificao de tendncias. Essas diversas causas so

geralmente organizadas em trs categorias principais: Causas imediatas so as que

pertencem ao mundo fsico, isto , so de natureza fsica, qumica ou biolgica; Causas

setoriais - so aquelas associadas s causas imediatas, e relacionadas s atividades de setores

econmicos especficos, tais como comrcio, indstria, urbanizao, transporte, energia, entre

outras e que concorrem diretamente para as causas imediatas de um problema ambiental;

Causas razes so associadas s causas setoriais e podem ser definidas como falhas nos

35

mecanismos de articulao social, em outras palavras, falhas institucionais (MARQUES,

2002).

Para Marques (2002), a anlise de cadeia causal destaca-se por ser uma abordagem

importante na elaborao de diagnsticos, identificao de tendncias, formulao de polticas

e na construo de Planos de Ao Estratgica (PAE) eficientes, identificando diversas causas

de natureza fsica e socioeconmica e como elas esto interligadas e responsveis pela

degradao do meio ambiente. Alm disso, a autora supracitada relata que a partir da cadeia

causal possvel determinar aes para minimizar as presses antrpicas (ex.:

populacional/demogrfica, econmica, tecnolgica, poltica), que atuam nas tendncias dos

processos de degradao ambiental dos recursos hdricos. Compreender estas presses de

fundamental importncia para a realizao do planejamento estratgico e para a construo de

cenrios que envolvam projees futuras.

De acordo com Silans et al. (2007), a matriz de cadeia causal foi desenvolvida com o

intuito de propor diretrizes e normas para melhorar a gesto dos recursos hdricos,

combinando uma avaliao ambiental estratgica com a melhoria do desenvolvimento

socioeconmico da rea circundante.

Tambm uma ferramenta de diagnstico e planejamento ambiental (SILANS et al.

2009), traando as vias de causa e efeito dos impactos socioeconmicos e ambientais.

Apresenta ainda importncia na identificao e compreenso das principais causas dos

problemas ambientais.

36

Figura 3 Componentes do modelo de anlise da cadeia causal do projeto GIWA UNEP/GEF

Fonte: Marques, (2002).

37

A matriz de cadeia causal uma metodologia de avaliao estratgica de impactos e

de formulaes de poltica, que foi aplicada em 66 regies do mundo, dentre as quais, dez

encontram-se na Amrica Latina e Regio do Caribe, e quatro incluem o territrio brasileiro.

O intuito avaliar os impactos ambientais, socioeconmicos e a forte ligao entre os

variados usos do solo e seus efeitos sobre o ambiente marinho, em guas transfronteirias

(bacias hidrogrficas compartilhadas por dois ou mais pases ou estados), respectivas zonas

costeiras e recursos vivos associados, ou seja, ecossistemas aquticos, costeiros, estoques

pesqueiros, entre outros (GIWA, 2015).

A localizao do projeto GIWA no Brasil, compreende quatro regies: da plataforma

patagnica, compartilhada pelo Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai que inclui, em territrio

brasileiro, as bacias dos rios Paran, Uruguai e Paraguai; a da Corrente do Brasil, que se

localiza apenas no Brasil, inclui as bacias hidrogrficas do rio So Francisco, do Atlntico

Leste, Sul e Sudeste; a do nordeste brasileiro, que inclui as bacias hidrogrficas do Atlntico

Nordeste Oriental, do rio Parnaba e do Atlntico Nordeste Ocidental; e a do Amazonas que

abrange toda a bacia hidrogrfica do rio Amazonas (compartilhada pela Bolvia, Peru,

Equador, Colmbia, Guiana, Venezuela e Brasil) e pela bacia hidrogrfica do rio Tocantins

(GIWA, 2015).

Segundo Barthem et al. (2004), a bacia hidrogrfica do rio Madeira, um dos afluentes

principais do rio Amazonas, foi uma das escolhidas pelo projeto GIWA no Brasil para

aplicao da matriz de cadeia causal, devido a sua importncia socioeconmica para regio e

por sua natureza transfronteiria. Essa bacia hidrogrfica estende-se pelo Brasil, Bolvia e

Peru, e portanto, requer uma gesto transnacional, afim de garantir um manejo dos recursos

hdricos e o estabelecimento de um plano de desenvolvimento socioeconmico adequado. A

cadeia causal construda identificou as causas razes, os impactos ambientais e

socioeconmicos, as presses antrpicas e as propostas de respostas polticas para esta bacia.

As principais causas razes identificadas para a poluio qumica, por resduos slidos, e para

a modificao de habitats e comunidades na bacia hidrogrfica do rio Madeira foram: falhas

do governo; falhas ou deficincias polticas de mercado; pobreza; falta de conhecimento da

populao e fatores demogrficos da regio. A anlise ainda identificou as principais relaes

entre os impactos ambientais e socioeconmicos, as suas causas principais, as atividades

humanas relacionadas, os setores econmicos responsveis, e por fim as causas que

determinam o comportamento dos setores.

38

Lanna (2006) utilizou a matriz de cadeia causal juntamente com a Anlise de

Diagnstico Transfronteirio (ADT) na bacia hidrogrfica do rio Prata que se estende pela

Argentina, Bolvia, Brasil, Paraguai e Uruguai, para realizar o Macro-Anlise-Diagnstico

Transfronteirio, com o intuito de identificar os temas crticos transfronteirios(TCT) e propor

aes mitigadoras. Para cada um dos 11 TCTs identificados, foram construdas cadeias

causais. So eles: extremos hidrolgicos, conflitos de uso da gua nos aspectos quantitativos;

inundaes e secas; excessos e dficits hdricos; uso no sustentvel de aqufero

transfronteirio; barragens; segurana e planos de emergncia; qualidade de gua; eroso,

transporte e sedimentao em corpos de gua; degradao de solos; alterao da

biodiversidade limitaes navegao; uso no-sustentvel dos recursos pesqueiros;

insalubridade relacionada s guas e impactos ambientais dos cultivos irrigados. A partir da

construo das cadeias causais foi possvel identificar as causas razes e seus respectivos

efeitos para cada tema crtico da rea estudada, assim como a seleo daquelas sobre as quais

possvel agir, atravs de um acordo prvio entre os pases que a integram. Foram tambm

determinados os principais problemas da bacia do Prata, permitindo selecionar aqueles os

quais seria possvel atuar na implementao de aes mitigadoras.

Rosa et al. (2007), realizaram um trabalho no rio Morto, pertencente a bacia

hidrogrfica de Jacarepagu - BHJ, localizada no litoral sul do estado do Rio de Janeiro, para

apresentar as interrelaes dos componentes da matriz de cadeia causal dos principais

problemas ambientais identificados para auxiliar na elaborao do plano estratgico da cidade

do Rio de Janeiro. O estudo mostrou que a modificao de vazo enchentes, foi o problema

ambiental prioritrio para a BHJ. Alm disso, os autores referenciados relatam que, as causas

imediatas para este possuem duas origens: antropognica e natural. As de origem natural so:

aspectos topogrficos; rede fluvial lagoas litorneas. De origem antrpica so: remoo da

cobertura vegetal nativa, impermeabilizao da superfcie; canalizao/retificao da

superfcie. A cadeia causal elaborada, identificou as causas imediatas, setoriais e razes,

impactos ambientais e socioeconmicos, para a rea de estudo. Tambm foram apresentadas

algumas sugestes no contexto do planejamento integrado urbano e dos recursos hdricos para

mitigar os impactos da problemtica ambiental apresentada.

Yongli et al. (2009), analisaram o nvel de degradao ambiental no rio Taihu,

pertencente a bacia hidrogrfica Taihu, considerada uma regio densamente povoada na costa

leste da China que enfrenta complexos problemas sociais, econmicos e tcnicos que

atravessam provncias, utilizando a matriz de cadeia causal associada a uma anlise de

diagnstico transfronteirio (ADT). Conforme esse estudo, a poluio foi identificada como o

39

problema de maior preocupao ambiental. E para este foi elaborada a cadeia causal,

determinando as principais causas, os impactos ambientais e as propostas de respostas

polticas frente o acelerado processo de poluio da rea. As principais causas observadas na

rea foram: densa populao; alta urbanizao; industrializao pesada; rpido

desenvolvimento econmico; tratamento de esgoto insuficiente; falta de capacidade

institucional; monitoramento insuficiente e falta de aplicao da lei. E os principais impactos

ambientais percebidos: eutrofizao; proliferao de algas; perda da qualidade da gua;

reduo da biodiversidade e degradao do solo. Para os autores supracitados, a cadeia causal

associada a ADT, se mostrou eficiente para auxiliar em questes transfronteirias complexas e

para ajudar a desenvolver polticas para mitigar problemas ambientais em escalas regionais,

provinciais e nacionais.

Marques et al. (2010), aplicaram a cadeia causal com o intuito de identificar

problemas e impactos ambientais nos ecossistemas aquticos do rio Tocantins relacionados

com o desenvolvimento do seu potencial hidroeltrico, de maneira a cooperar com a

compatibilizao de gerao de energia, conservao da biodiversidade e manuteno dos

fluxos gnicos. Os autores referenciados conseguiram identificar os problemas e impactos

ambientais prioritrios e as relaes destes com diferentes causas imediatas, setoriais e razes.

Os impactos ambientais mais relevantes no estudo foram: queda na qualidade dos recursos

hdricos; perda e alterao de habitats; mudanas na estabilidade dos ecossistemas, reduo de

recursos pesqueiros, interferncia com as comunidades de bentos e de microorganismos,

alterao nas cadeias alimentares e interferncia na disperso de comunidades de mamferos.

Liang et al. (2011), utilizaram a cadeia causal juntamente com a ADT, com intuito de

analisar o desastre de inundao da bacia hidrogrfica do rio Taihu, localizada na costa leste

da China. A cadeia causal construda identificou as causas razes, os impactos ambientais, as

presses antrpicas e as propostas de respostas polticas relacionadas ao risco de desastre de

inundao. As causas razes foram: demografia (dinmica populacional humana);

urbanizao; clima; governo; institucional; mudana de uso da terra; relevo e a falta de

colaborao. Como principais impactos ambientais foram mencionados: perda econmica;

qualidade da gua; biodiversidade; eroso do solo e reas inundadas. Tambm apresentaram,

por meio de exemplos, como essas anlises podem ajudar a desenvolver polticas pblicas

para prever e reduzir os desastres de inundao em escala regional, provincial e nacional. Os

autores concluram que a cadeia causal associada a ADT, foi uma ferramenta eficaz para o

desenvolvimento de polticas para essas questes transfronteirias complexas, pertencentes ao

projeto GIWA.

40

A matriz de cadeia causal foi adaptada por Silans et al. (2007) e aplicada na regio de

influncia direta do aude pblico Presidente Epitcio Pessoa, inserido no semirido

nordestino, na microrregio do Cariri Oriental paraibano. Teve como objetivo a identificao

e classificao dos problemas/temas de maior relevncia, segundo uma ordem de ao. Sua

aplicao se deu em etapa posterior ao diagnstico socioeconmico e ambiental da regio.

As adaptaes na matriz (Figura 4), realizadas por Silans et al. (2007), ocorreram

principalmente na nomenclatura: causas setoriais, imediatas e razes passaram para tcnicas,

gerenciais, poltico-sociais e econmico-culturais. Tambm foi acrescentada na matriz uma

coluna com recomendaes. Dessa forma os autores consideraram ser a matriz uma

ferramenta til no apoio aos tomadores de deciso, no que concerne formulao e execuo

de polticas pblicas de conservao dos recursos naturais.

41

Figura 4 - Matriz de cadeia causal (adaptada por Silans et al. 2007)

42

3 DESCRIO DA REA DE ESTUDO

3.1 Localizao

As nascentes estudadas esto localizadas na bacia hidrogrfica do rio Gramame, entre

as latitudes 9.204.728m S e 9.210.728m S e as longitudes 280.619m E e 290.619m E (em

coordenadas UTM, SAD 69, Zona 25), na zona rural do municpio de Pedras de Fogo (Figura

5), que fica situado na mesorregio da Mata Paraibana. O municpio de Pedras de Fogo foi

criado pela Lei estadual n 895, de 11 de maro de 1953, e tem uma rea total de 404,882

km2, representando 0,7107% da rea territorial do Estado e pertence microrregio do Litoral

Sul da Paraba (Figura 6). Limita-se a Norte com Cruz do Esprito Santo e ao Sul com

Itamb/PE; a leste com os municpios de Santa Rita, Alhandra e Caapor; a oeste com

Juripiranga e So Miguel de Taipu. Sua sede municipal se encontra 161 metros de altitude,

com uma distncia de cerca de 42 km de Joo Pessoa, capital do estado da Paraba.

Figura 5 Diviso territorial do estado da Paraba, com o municpio de Pedras de Fogo em

destaque.

Fonte: Plano Diretor do Municpio de Pedras de Fogo (2006).

43

Figura 6 Localizao geogrfica da rea de estudo na bacia hidrogrfica do rio Gramame,

Paraba

Fonte: Filgueira et al. (2010)

3.2 Clima

O municpio de Pedras de Fogo apresenta, de acordo com a classificao de Kppen, o

tipo climtico AS quente e mido, com chuvas de outono/inverno iniciando em abril e

podendo prolongar-se at os meses de junho/julho. A precipitao pluviomtrica mdia anual

de 1.500 mm, com uma temperatura que varia de 18C a 30C. As baixas de temperaturas

podem ocorrer nos meses de julho e agosto, com a mnima de 10C e a umidade relativa do ar

mdia de 80% (LIMEIRA, 2008).

3.3 Solos

As principais unidades de solos identificadas na Mesorregio da Mata Paraibana so:

Alissolos, Neossolos Flvicos e Neossolos Quartzarnicos. Segundo Limeira (2008), a maior

limitao destes solos ao uso na agricultura ocorre devido sua baixa fertilidade natural,

necessitando, assim, de calagem e adubao para utilizao agrcola intensa. Os solos

44

Neossolos Flvicos, so do tipo profundos e heterogneos em suas propriedades fsicas e

qumicas. Apresentam como principais restries: riscos de inundao, baixa fertilidade

natural, excesso de umidade pela presena do lenol fretico prximo superfcie e

dificuldade no manejo mecanizado quando apresentam a textura muito fina. Quando a textura

mdia, com boa drenagem, oferecem alto potencial para o uso na agropecuria.

Os solos Neossolos Quartzarnicos so de grande profundidade efetiva, topografia

aplanada e boas condies climticas regionais. Tm como principais limitaes a baixa

fertilidade natural, a textura extremamente arenosa, e a baixa capacidade de reteno de gua

e nutrientes. No caso dos hidromrficos, so do tipo que apresentam a presena do lenol

fretico bem prximo superfcie, sendo assim, pouco cultivados, constatando-se apenas o

uso casual para a cultura do coco e caju. Nas reas desprovidas de hidromorfismo so

cultivados para as culturas de mandioca, mangueira, mangabeira, cajazeira, entre outras

(OLIVEIRA NETO e SILVA, 2011).

No subsolo do municpio de Pedras de Fogo podem ser encontradas jazidas de pedras

calcrias, argilas e reservas de caulim (PARABA, 2000).

3.4 Geomorfologia

O territrio do municpio de Pedras de Fogo apresenta terrenos ondulados, com

colinas, tabuleiros e vrzeas. A sede do municpio situa-se em uma superfcie plana, sendo

suavemente inclinado, podendo proporcionar um desenvolvimento da cidade de forma

ordenada (LIMEIRA, 2008)

De acordo com Beltro et al. (2005), o municpio de Pedras de Fogo est inserido na

unidade Geoambiental dos Tabuleiros Costeiros. Esta se estende por todo litoral do Nordeste

e apresenta altitude mdia de 50 a 100 metros. Compreende plats de origem sedimentar, que

apresentam grau de entalhamento varivel, ora com vales estreitos e encostas abruptas, ora

abertos com encostas suaves e fundos com amplas vrzeas.

3.5 Vegetao

No municpio ocorre a predominncia de uma paisagem coberta pela cultura da cana-

de-acar, em larga escala. Nos ltimos 20 anos essa cultura tem se expandido deixando

marcas em toda regio, pois os canaviais se estendem pelas vrzeas, colinas e tabuleiros do

territrio (LIMEIRA, 2008).

45

As espcies florestais nativas so raras. As vrzeas que, antigamente apresentavam

uma fauna numerosa, de rvores de grande porte, como a oiticica (Licania rigida Benth.), a

sapucaia (Lecythis pisonis Camb.), a parahyba (Schizolobium parahyba), a imberiba

(Eschweilera ovata Cambiss.), o pau-ferro (Caesalpineae ferrea), o pau-brasil (Caesalpinia

echinata Lam.), o pau darco amarelo (Tabebuia chrysotricha) entre outras, foram quase

completamente destrudas. Porm, ainda so consideradas terras frteis, onde se cultiva

principalmente a cana-de-acar. Tambm se cultivam legumes, inhame, abacaxi, mandioca,

dentre outras culturas. Nas colinas, localizam-se ainda fragmentos de Mata Atlntica, como

macaba (Acrocomia intumescens Drude), imbaba (Cecropia pachystachya Trec.), pau cinza

(Ingastipularis DC.), genipapo (Genipa americana L.), entre outras (COSTA, 2011).

3.6 Aspectos socioeconmicos

De acordo com Limeira (2008), Pedras de Fogo foi um dos poucos municpios da

Paraba em que o nmero de habitantes na zona urbana chegou a ficar muito prximo da rural.

Sua populao em 2004 foi estimada pelo IBGE em 26.034 habitantes, sendo 13.910 na zona

urbana e 12.124 na rural. J no ano de 2010, a populao do municpio de Pedras de Fogo era

de27.032 habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), sendo

16.358 habitantes na zona urbana e 10.674 na rural. Sua densidade demogrfica (hab./km2)

era de 67,51 (IBGE, 2010).

Segundo o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil (2013), o municpio de

Pedras de Fogo apresenta um ndice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de

0,590. Para os ndices especficos do IDHM, como renda, longevidade e educao este

apresenta, respectivamente, os valores: 0,568, 0,771 e 0,468 (PNUD, 2013).

46

4 METODOLOGIA

4.1 Seleo das Nascentes

Para o desenvolvimento deste trabalho foram selecionadas trs nascentes (Figura 7),

dentre as 71 catalogadas na bacia hidrogrfica do rio Gramame por Di Lorenzo (2007). Estas

nascentes foram selecionadas, aps vrias inspees no campo, por serem representativas para

as comunidades locais, pois esto localizadas prximas a comunidades rurais de explorao

agrcola familiar e de fcil acesso. Das nascentes selecionadas, duas