Caderno_2 CEALE - Alfabetizando

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Caderno_2 CEALE - Alfabetizandoalfabetizaçãocrianças ensino UFMGalfabetizar alunos

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  • 222Belo Horizonte

    2004

    Orientaes para a Organizao doCiclo Inicial de Alfabetizao

    Caderno

    ALFABETIZANDO

  • U58c Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Educao. Centro de Alfabetizao, Leitura e Escrita.

    Alfabetizando/Centro de Alfabetizao, Leitura e Escrita. Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Educao de Minas Gerais, 2003.

    62 p. (Coleo: Orientaes para a Organizao do Ciclo Inicial de Alfabetizao; 2)

    1. Alfabetizao Minas Gerais. I. Ttulo. II. Secretaria de Estado da Educao de Minas Gerais. III. Ceale/FaE/UFMG. IV. Ensino Fundamental de Nove Anos. V. Ttulo da Coleo.

    ISBN 85-86503-02-9 CDD 372.4

    Catalogao da Fonte: Biblioteca da FaE/UFMG

    Acio Neves da CunhaVanessa Guimares PintoJoo Antnio Filocre Saraiva

    Maria Eliana Novaes

    Gilberto Jos Rezende dos Santos

    GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAISSECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAO

    SECRETRIO-ADJUNTO DE EDUCAOSUBSECRETRIA DE

    DESENVOLVIMENTO DA EDUCAOSUBSECRETRIO DE ADMINISTRAO

    DO SISTEMA DA EDUCAO

    SUPERINTENDNCIA DE EDUCAODIRETORIA DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAO

    INFANTIL E FUNDAMENTALSUPERINTENDNCIA DE DESENVOLVIMENTO DE

    RECURSOS HUMANOS PARA A EDUCAODIRETORIA DE CAPACITAO DE

    RECURSOS HUMANOS SUPERINTENDNCIA DE

    ORGANIZAO EDUCACIONAL

    Raquel Elizabete de Souza Santos

    Bernardette Castro Salles

    Syene Maria Coelho de Toledo

    Maria Clia Basques Moura

    Maria Regina da Silva Moreira

    EQUIPE TCNICA

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAISCENTRO DE ALFABETIZAO, LEITURA E ESCRITA/CEALE

    FICHA TCNICAElaborao

    Antnio Augusto Gomes Batista - DiretorAparecida Paiva

    Ceris RibasIsabel Cristina Alves da Silva Frade

    Maria da Graa Ferreira da Costa ValMaria das Graas de Castro Bregunci

    Maria Lcia CastanheiraSara Mouro Monteiro

    ConsultoresCarla Viana Coscarelli

    Marco Antnio de Oliveira

    RevisoLuiz Carlos de Assis Rocha

    Diagramao e Editorao EletrnicaVvien Gonzaga e Silva

  • A coleo Orientaes para a Organizao do Ciclo Inicial de Alfabetizao faz parte da estratgia de preparao dos professores para atuarem no ensino fundamental que, a partir de 2004, passou a ter a durao de nove anos.

    A implantao do ensino fundamental de 9 anos, organizado em ciclos nos anos iniciais com nfase na alfabetizao e no letramento, na rede estadual e na maioria dos municpios do Estado de Minas, constitui-se em poderosa ferramenta para elevao da qualidade da educao pblica, pois significa a universalizao da pr-escola no mbito do ensino fundamental. Com mais tempo para ensinar e mais tempo para aprender, a escola ter condies de planejar seu trabalho e propiciar experincias pedaggicas e culturais a todas as crianas de modo a garantir a aprendizagem significativa.

    Agradeo equipe do Ceale (Centro de Alfabetizao, Leitura e Escrita) da Faculdade de Educao da UFMG que elaborou esta coleo. Sou grata tambm s professoras alfabetizadoras* da Rede Pblica Escolar que participaram de grupos de discusso, partilhando suas experincias profissionais com a equipe do Ceale.

    * Ana Clia Costa Conrado, Ana Maria Prado Barbosa, Bernadete do Carmo Gomes Ferreira, Dirlene Aparecida Chagas Guimares, Maria Lcia Nogueira Ribeiro, Maria Terezinha Pessoa Vieira de Aquino, Maura Lcia de Almeida, Nancy Fernandes Rodrigues de Souza, Rita de Cssia Pinheiro Quaresma, Rosa Maria Lacerda, Rosngela Presoti Versieux, Rosngela Rodrigues de Arajo Prado, Soraya do Valle.

    Vanessa Guimares PintoSecretria de Educao

  • Este caderno integra a Coleo Orientaes para o Ciclo Inicial de Alfabetizao,

    elaborada para auxiliar as escolas das redes pblicas do Estado de Minas Gerais na

    organizao do Ciclo Inicial de Alfabetizao.

    A Coleo composta dos seguintes cadernos:

    Caderno 1: Ciclo Inicial de Alfabetizao

    Caderno 2: Alfabetizando

    Caderno 3: Preparando a escola e a sala de aula

    Caderno 4: Acompanhando e avaliando

    Para que a Coleo possa, de fato, auxiliar na organizao do Ciclo Inicial de

    Alfabetizao, a sua colaborao muito importante. Escreva, dando suas sugestes e

    fazendo suas crticas.

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    Entre em contato conosco:

    SEE/SD/SED/DEIFAv. Amazonas, 5855 - GameleiraBelo Horizonte/MGCEP: 30.510-000Fax: 31 [email protected]

    Universidade Federal de Minas GeraisFaculdade de Educao/CEALEProjeto Ciclo Inicial de AlfabetizaoAv. Antnio Carlos, 6627 Campus PampulhaBelo Horizonte / MGCEP: 31.270-901Fax: 31 3499 53 [email protected]

  • SUMRIO

    Apresentao .........................................................................................7

    ..............................16

    .................................................22

    ..............................................................................................41

    Palavras finais ........................................................................................60

    Referncias ...........................................................................................61

    1. Compreenso e valorizao da cultura escrita

    2. Apropriao do sistema de escrita

    3. Leitura

    4. Produo escrita..............................................................................49

    5. Desenvolvimento da oralidade .......................................................57

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    Alfabetizando..............

    APRESENTAOEste Caderno se organizar em torno de um objetivo central: sistematizar e discriminar

    as capacidades mais relevantes a serem atingidas pelas crianas, ao longo dos diferentes momentos do Ciclo Inicial de Alfabetizao, no contexto de um Ensino Fundamental de Nove Anos, proposto para o Estado de Minas Gerais. Em outros termos, o propsito principal desta abordagem ser oferecer reflexo e discusso do professor alfabetizador uma indicao daquilo que cada criana dever ser capaz de realizar, progressivamente, nos diferentes perodos desse Ciclo.

    As capacidades delineadas neste Caderno so o eixo condutor dos demais Cadernos, pois servem de fundamento para a proposta de anlise e escolha de mtodos, materiais e procedimentos, desenvolvida no Caderno 3 (Preparando a Escola), bem como para o estabelecimento de critrios de diagnstico e avaliao do processo e de aes voltadas para alunos e professores, que vem no Caderno 4 (Acompanhando e Avaliando).

    Assim, alguns pressupostos que regularo toda a proposta de organizao do Ciclo Inicial de Alfabetizao sero explicitados de incio, para que as posies assumidas possam ser identificadas com maior clareza.

    O foco deste Caderno: uma proposta de definio das capacidades lingsticas a serem desenvolvidas pelos alfabetizandos

    O ncleo desta proposta est voltado para a apropriao, pelo aluno do Ciclo Inicial, do sistema alfabtico e de capacidades necessrias no s leitura e produo de textos escritos, mas tambm compreenso e produo de textos orais, em situaes de uso e estilos de linguagem diferentes das que so corriqueiras no cotidiano da criana. O desenvolvimento dessas capacidades lingsticas ler e escrever, falar e ouvir com compreenso em situaes diferentes das familiares no acontece espontaneamente e, portanto, elas precisam ser ensinadas.

    Sabe-se que o ciclo de alfabetizao no se esgota nessas capacidades lingsticas e comunicativas, mas elas sero o foco desta proposta, porque nelas que vm se concentrando os problemas localizados no apenas na escolarizao inicial, como tambm em fracassos no percurso do aluno durante o Ensino Fundamental.

    Espera-se que a consolidao dos princpios aqui definidos possa se combinar com propostas das outras reas de conhecimento pertinentes ao Ensino Fundamental, favorecendo uma abordagem curricular interdisciplinar.

    Outra questo sabidamente necessria nos primeiros anos de escolaridade e que no ser enfatizada neste Caderno, porque escapa a seu objetivo prioritrio, o tratamento ldico a

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    ser dado aos contedos e s atividades. A ludicidade, sem dvida, contribui para melhor promover o desenvolvimento das capacidades cognitivas, procedimentais e atitudinais que se deseja ver construdas pelas crianas nessa faixa etria. Assim, esperamos que os professores saibam compreender e complementar nossas propostas, imprimindo-lhes uma abordagem adequadamente ldica, quando de sua implementao na escola.

    H ainda uma questo de cunho metodolgico que merece ser retomada e explicitada: a proposta formulada neste e nos outros Cadernos da Coleo prev uma realizao no seriada, mas sim organizada num ciclo de trs anos. Essa organizao em ciclo tem a dimenso positiva de evitar a ruptura do processo de aprendizagem e possibilitar criana um

    Ver discusses sobre a organizao em ciclos nos

    Cadernos 1 e 4. Outros materiais a serem

    produzidos neste Projeto ainda voltaro a abordar

    esse tema. Sugerimos tambm consultar a Orientao SEE n. 01/2004, de 05 de fevereiro de 2004.

    tempo mais amplo e flexvel para o desenvolvimento das capacidades que ela precisa construir. O sucesso desse tipo de organizao do tempo escolar, entretanto, no vem automaticamente com sua implantao; pelo contrrio, depende da co-ocorrncia de outras medidas e estratgias, que permitam viabiliz-lo devidamente e s quais preciso estar atento. Essa discusso, de suma importncia, tambm no ser focalizada neste Caderno, porque foge aos seus interesses centrais, mas contemplada nos Cadernos 1 e 4 desta Coleo.

    Uma questo terminolgica

    Seria possvel falar das capacidades das crianas usando termos e conceitos similares, freqentemente empregados como sinnimos, tais como competncias e habilidades. Esses trs vocbulos tm sido utilizados como equivalentes, nos documentos oficiais de orientao curricular e em muitos estudos tericos no campo educacional. No entanto, nesta proposta, optou-se pelo uso do termo capacidades, por consider-lo amplo o suficiente para abranger todos os nveis de progresso, desde os primeiros atos motores indispensveis aquisio da escrita at as elaboraes conceituais, em patamares progressivos de abstrao, que possibilitam ampliaes na compreenso da leitura, na produo textual e na seleo de instrumentos diversificados para tais aprendizagens.

    Com isso, pretende-se evitar que esta proposta seja vinculada exclusivamente a uma nica teoria, considerando que as teorizaes, em geral, so parciais e se restringem a um s aspecto do fenmeno que tentam explicar. Prefere-se, ento, um termo mais genrico, no comprometido com um modelo terico especfico, para evitar qualquer distoro de interpretao que leve a uma compreenso fragmentada do campo cognitivo da criana. Busca-se, com isso, deixar claro que no devem ser subestimadas dimenses imprescindveis totalidade do processo de alfabetizao.

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    Para elaborar esta Coleo, contamos com a

    colaborao de um grupo de professores

    alfabetizadores da rede estadual. Esses professores discutiram suas prticas, os problemas que enfrentam e as solues que do a esses

    problemas.

    Natureza e objetivos desta proposta

    O objetivo maior desta proposta contribuir para a operacionalizao e instrumentalizao do trabalho docente no campo da alfabetizao.

    Considerando que o aprendizado e a progresso da criana dependero do processo por ela desenvolvido, do patamar em que ela se encontra e das possibilidades que o ambiente escolar lhe propiciar, em direo a avanos e expanses, esta proposta no deve ser confundida com um programa ou uma relao de seqncias definidas de forma rgida ou externa aos processos de ensino e aprendizagem da lngua. Este ponto essencial; tanto a faixa etria do aluno quanto sua insero num ou noutro ano do Ciclo precisam ser relativizados e flexibilizados, submetidos a critrios decisivos para o processo de aprendizagem: a) o desenvolvimento e aprendizado j conquistados na escola ou fora dela; b) o que a escola lhe oferece para sua progresso.

    Tambm no se pode entender esta proposta como simples reproduo e ratificao de um conjunto j consolidado de prticas docentes e de orientaes curriculares, nacionais, estaduais ou municipais, porque isso significaria perder a identidade de cada faixa ou segmento do Ciclo Inicial, especialmente no que diz respeito insero da criana de seis anos no nvel fundamental. Entretanto evidente que se pressupe a incorporao dessas referncias e se reafirma aqui a importncia tanto do saber do professor, produzido no dia-a-dia da sala de aula, quanto de documentos oficiais como o Referencial Curricular Nacional para a Educao Infantil (1998), que define vrios eixos de formao e capacidades a eles relacionadas, e como os Parmetros Curriculares Nacionais (1997), que sistematizam objetivos para o ensino da lngua, definindo categorias de contedos (conceituais, procedimentais e atitudinais) em funo de vrios eixos didticos.

    O que esta proposta pretende oferecer ao professor, neste Caderno, a definio das capacidades lingsticas que as crianas devem desenvolver gradualmente no Ciclo Inicial de Alfabetizao e daquilo que cada criana deve ser capaz de realizar a cada perodo desse Ciclo. Com isso, busca possibilitar ao docente uma visualizao mais clara dos objetivos de seu trabalho em sala de aula e das metas que deve procurar atingir. Noutras palavras, definindo o que as crianas precisam aprender, a cada segmento do ciclo, a proposta estar tambm, ao mesmo tempo, estabelecendo o que deve ser ensinado. Nos Cadernos seguintes, sero apresentadas orientaes quanto escolha de mtodos e estratgias adequados ao cumprimento dessas metas e quanto definio de critrios para diagnstico e avaliao do processo, com vista criao de formas de interveno para fazer frente s dificuldades detectadas.

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  • Uma abordagem bastante diferenciada da empirista poder ser encontrada na viso psicogentica, que destaca a relevncia dos

    componentes observveis na interpretao dos erros

    dos alunos e em sua realimentao pelo

    professor (PIAGET, 1983).

    As capacidades em foco neste Caderno sero delineadas atravs de procedimentos observveis. Isso no significa, no entanto, que a proposta se reduz a uma taxonomia de objetivos comportamentais, a uma percepo imediatista de desempenhos ou a uma concepo estritamente empirista de ensino-aprendizagem. O que se valoriza aqui a possibilidade de interpretao das capacidades da criana pelo professor, atravs de critrios capazes de sinalizar progressivos avanos no processo de alfabetizao. Esses componentes observveis devero estar orientando as aes do professor na definio do tipo de abordagem que deve privilegiar no trabalho pedaggico. Em outras palavras, esses componentes podem auxiliar o professor a definir, tendo em vista as capacidades j desenvolvidas por seus alunos, o que ele dever:

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    introduzir, levando os alunos a se familiarizarem com contedos e conhecimentos (ou retomar eventualmente, quando se tratar de conceitos ou capacidades j consolidadas em perodo anterior);trabalhar sistematicamente, para favorecer o desenvolvimento pelos alunos;

    procurar consolidar no processo de aprendizagem dos alunos, sedimentando os avanos em seus conhecimentos e capacidades.

    Supe-se que a clareza de diagnsticos e avaliaes do professor em relao a tais capacidades e abordagens propiciar a base para uma descrio dos desempenhos dos alunos e das condies necessrias superao de descompassos e inconsistncias em suas trajetrias ao longo do Ciclo. V-se, aqui, mais uma vez, a importncia que se atribui sensibilidade e ao saber do professor no sentido de adequar a proposta real situao de seus alunos. Espera-se que o docente em conjunto com toda a escola alie acuidade e disposio positiva para implementar esta proposta, atentando para as efetivas circunstncias em que dever desenvolver seu trabalho.

    Pressupostos tericos: lngua, ensino de lngua,alfabetizao e letramento

    a) Concepo de lngua e de ensino de lnguaEsta proposta se fundamenta na compreenso de que a lngua um sistema

    discursivo, isto , um sistema que tem origem na interlocuo e se organiza para funcionar na interlocuo (inter+locuo = ao lingstica entre sujeitos). Esse sistema inclui regras vinculadas s relaes das formas lingsticas entre si e s relaes dessas formas com o contexto em que so usadas. Seu centro , pois, a interao verbal, que se faz atravs de textos ou discursos, falados ou escritos.

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    Aqui se faz uma discusso rpida sobre mtodos de alfabetizao. Esse tema

    aparece tambm nos Cadernos 1 e 3.

    Partindo dessa concepo, esta proposta valoriza o uso da lngua nas diferentes situaes sociais, com sua diversidade de funes e sua variedade de estilos e modos de falar. Para estar de acordo com essa concepo, o trabalho em sala de aula deve se organizar em torno do uso e privilegiar a reflexo dos alunos sobre as diferentes possibilidades de emprego da lngua. Isso implica, certamente, a rejeio de uma tradio de ensino apenas transmissiva, isto , preocupada em oferecer ao aluno conceitos e regras prontos, que ele s tem que memorizar, e de uma perspectiva de aprendizagem centrada em automatismos e reprodues mecnicas. Por isso que se prope aqui o desenvolvimento de capacidades necessrias s prticas de leitura e escrita, mas tambm de fala e escuta compreensiva em situaes pblicas (a prpria aula uma situao de uso pblico da lngua).

    b) Concepo de alfabetizao e de letramentoA lngua sistema discursivo, que se estrutura no uso e para o uso, escrito e falado,

    sempre contextualizado. No entanto, a condio bsica para o uso escrito da lngua, que a apropriao do sistema alfabtico, envolve, da parte dos alunos, aprendizados muitos especficos, independentes do contexto de uso, os quais concernem aos componentes do sistema fonolgico da lngua e s suas inter-relaes. Explicando e exemplificando: as relaes entre consoantes e vogais, na fala e na escrita, permanecem as mesmas, independentemente do gnero textual em que aparecem e da esfera social em que ele circule; numa piada ou nos autos de um processo jurdico, as consoantes e vogais so as mesmas e se inter-relacionam segundo as mesmas regras.

    Como o compromisso central desta proposta , prioritariamente, a apropriao do sistema alfabtico pelo aluno do Ciclo Inicial, preciso explicitar aqui tambm a concepo adotada quanto natureza especfica desse aprendizado e aos mltiplos aspectos que o constituem.

    O estgio atual dos questionamentos e dilemas no campo da educao nos impe a necessidade de firmar posies consistentes, evitando tanto reducionismos quanto atitudes dogmticas. No h interesse, nesta proposta, em assumir a defesa ou em colocar prova concepes relacionadas a qualquer referencial ou iderio identificado como vanguarda pedaggica. Antes disso, pretende-se evidenciar que certas polarizaes tm comprometido o avano das prticas pedaggicas pertinentes apropriao da lngua escrita. Pender exclusivamente para um nico plo sempre implica ignorar ou abandonar dimenses fundamentais da totalidade do fenmeno.

    Algumas questes conhecidas dos professores podem tornar mais acessveis essas ponderaes. A opo pelos princpios do mtodo silbico, por exemplo, contempla alguns aspectos importantes para a apropriao do cdigo escrito, mas supe uma progresso fixa e previamente definida e reduz o alcance dos

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  • conhecimentos lingsticos, quando subtrai o valor de uso e as funes sociais da escrita. Da mesma forma, os mtodos de base fnica, embora focalizando um ponto fundamental para a

    Os termos fonema e grafema correspondem,

    aproximadamente, a som e letra, usados na

    linguagem corrente. A conceituao de fonema e grafema ser apresentada

    posteriormente, na seo 2.

    compreenso do sistema alfabtico, que a relao entre fonema e grafema, persistem em prticas reducionistas quando valorizam exclusivamente o eixo da codificao e decodificao pela decomposio de elementos que transitam entre fonemas e sinais grficos. Por sua vez, os mtodos analticos, que orientam a apropriao do cdigo escrito pelo caminho do todo para as partes (de palavras, sentenas ou textos para a decomposio das slabas em grafemas/fonemas), apesar de procurarem situar a relao grafema/fonema em unidades de sentido, como palavras, sentenas e textos, tendem a se valer de frases e textos artificialmente curtos e repetitivos, para favorecer a estratgia de memorizao, considerada fundamental. Essas trs tendncias podem ser consideradas perseverantes e coexistentes no atual estado das prticas escolares em alfabetizao e da produo de livros e materiais didticos em geral.

    As prticas fundamentadas no iderio construtivista, ao longo das ltimas dcadas, trazem como ponto positivo a introduo ou o resgate de importantes dimenses da aprendizagem significativa e das interaes, bem como dos usos sociais da escrita e da leitura, articulados a uma concepo mais ampla de letramento. Mas, em contrapartida, algumas compreenses equivocadas dessas teorias tm acarretado outras formas de reducionismo, na

    Ver: LERNER, Delia; PIZANI, Alicia. A

    aprendizagem da lngua escrita na escola: reflexes sobre a prtica pedaggica

    construtivista. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1995

    (cap.V: O que h de novo e o que h de velho no novo enfoque?).

    Aqui se fala de prticas fundadas no iderio construtivista. Essa

    questo discutida tambm nos Cadernos 1 e 3.

    medida em que relegam aspectos psicomotores ou grafomotores a um plano secundrio, reduzindo-os a restritas noes de prontido ou de maturao, desprezando o impacto desses aspectos no processo inicial de alfabetizao e descuidando de instrumentos e equipamentos imprescindveis a quem se inicia nas prticas da escrita e da leitura, o que prejudica sobretudo as crianas que vivem em condies sociais desfavorecidas e que, por isso, s tm oportunidade de contato significativo com livros, revistas, cadernos, lpis, etc., quando ingressam na escola. Outra questo controversa diz respeito oposio do construtivismo ao ensino meramente transmissivo, que limita o aluno a apenas memorizar e reproduzir conceitos e regras que lhe so apresentados prontos, sem que ele tenha a oportunidade de analisar o fenmeno em estudo e formular o conceito ou descobrir a regra. O problema que, em nome da crtica abordagem transmissiva, algumas interpretaes equivocadas do construtivismo tm recusado ao professor o papel de agregar informaes relevantes ao avano dos alunos, como se todos os conhecimentos pertinentes apropriao da lngua escrita pudessem ser construdos pelos prprios alunos sem a contribuio e a orientao de um adulto mais

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    experiente. Mais um problema resultante de interpretaes errneas do construtivismo tem sido a defesa unilateral de interesses e hipteses das crianas, o que acaba limitando a ao pedaggica ao patamar dos conhecimentos prvios dos alunos. Essa limitao gera fracassos, porque compromete a proposio e a avaliao de capacidades progressivas e acaba sendo usada, pela prpria ao pedaggica, como justificativa para o que no deu certo.

    Do mesmo modo que as opes pelos mtodos silbico, fnico ou global e as prticas inspiradas no construtivismo, algumas orientaes inadequadas fundadas no conceito de

    Aqui se fala de prticas inspiradas no conceito de

    letramento. Essa discusso aparece tambm nos

    Cadernos 1 e 3.

    Aqui se explicita a posio desta proposta sobre

    alfabetizao e letramento.

    letramento valorizam de forma parcial importantes conquistas como o prazer pelo ato de escrever e a insero nas prticas sociais da leitura e da escrita, mas fragilizam o acesso da criana ao sistema alfabtico e s convenes da escrita, deixando em segundo plano a imprescindvel explorao sistemtica do cdigo e das relaes entre grafemas e fonemas. Como conseqncia, dissociam, equivocadamente, o processo de letramento do processo de alfabetizao, como se um dispensasse ou substitusse o outro, ou como se o primeiro fosse apenas ou um perodo de preparao ou um acrscimo posterior tarefa restrita de alfabetizar.

    Nesta proposta, entende-se alfabetizao como o processo especfico e indispensvel de apropriao do sistema de escrita, a conquista dos princpios alfabtico e ortogrfico que possibilita ao aluno ler e escrever com autonomia. Entende-se letramento como o processo de insero e participao na cultura escrita. Trata-se de um processo que tem incio quando a criana comea a conviver com as diferentes manifestaes da escrita na sociedade (placas, rtulos, embalagens comerciais, revistas, etc.) e se prolonga por toda a vida, com a crescente possibilidade de participao nas prticas sociais que envolvem a lngua escrita (leitura e redao de contratos, de livros cientficos, de obras literrias, por exemplo). Esta proposta considera que alfabetizao e letramento so processos diferentes, cada um com suas especificidades, mas complementares e inseparveis, ambos indispensveis.

    A fonte de muitos equvocos e polmicas quanto aos conceitos de alfabetizao e letramento a no-compreenso de que os dois processos so complementares, e no alternativos. Explicando: no se trata de escolher entre alfabetizar ou letrar; trata-se de alfabetizar letrando. Quando se orienta a ao pedaggica para o letramento, no necessrio, nem recomendvel, que, por isso, se descuide do trabalho especfico com o sistema de escrita. Noutros termos: o fato de valorizar em sala de aula os usos e as funes sociais da lngua escrita no implica deixar de tratar sistematicamente da dimenso especificamente lingstica do cdigo, que envolve os aspectos fonticos, fonolgicos, morfolgicos e sintticos. Do mesmo modo, cuidar da dimenso lingstica, visando alfabetizao, no implica excluir da sala de aula o trabalho voltado para o letramento. Outra fonte de equvocos pensar os dois processos como seqenciais, isto , vindo um depois do outro, como se o letramento fosse uma

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  • espcie de preparao para a alfabetizao, ou, ento, como se a alfabetizao fosse condio indispensvel para o incio do processo de letramento.

    O desafio que se coloca para o Ciclo Inicial de Alfabetizao o de conciliar esses dois processos, assegurando aos alunos a apropriao do sistema alfabtico-ortogrfico e de condies possibilitadoras do uso da lngua nas prticas sociais de leitura e escrita.

    Considerando-se que os alfabetizandos vivem numa sociedade letrada, em que a lngua escrita est presente de maneira visvel e marcante nas atividades cotidianas, inevitavelmente eles tero contato com textos escritos e formularo hipteses sobre sua utilidade, seu funcionamento, sua configurao. Excluir essa vivncia da sala de aula, por um lado, pode ter o efeito de reduzir e artificializar o objeto de aprendizagem que a escrita, possibilitando que os alunos desenvolvam concepes inadequadas e disposies negativas a respeito desse objeto. Por outro lado, deixar de explorar a relao extra-escolar dos alunos com a escrita significa perder oportunidades de conhecer e desenvolver experincias culturais ricas e importantes para a integrao social e o exerccio da cidadania.

    Assim, entende-se que a ao pedaggica mais adequada e produtiva aquela que contempla, de maneira articulada e simultnea, a alfabetizao e o letramento.

    Os eixos desta proposta

    As reflexes anteriores sinalizam a necessidade de rever prticas ainda contraditrias no campo da alfabetizao e de superar a permanente nostalgia em relao a prticas do passado, que, no entanto, demandam alargamento de concepes. Por essa premissa, a proposta que se segue estar centrada nos eixos mais relevantes que devem ser considerados em um ciclo de alfabetizao:

    (1)compreenso e valorizao da cultura escrita;(2)apropriao do sistema de escrita;(3) leitura;(4)produo de textos escritos;(5)desenvolvimento da oralidade.As capacidades associadas a tais campos sero objeto de sistematizao nas

    prximas sees deste Caderno. Todas elas estaro organizadas da mesma maneira. Inicialmente, apresentam-se, num quadro, as capacidades mais gerais a serem desenvolvidas, distribudas de acordo com os trs anos do Ciclo Inicial de Alfabetizao. Essa distribuio, evidentemente, no rgida. Ela mostra, apenas, em termos ideais, o momento do Ciclo em que se deve privilegiar o desenvolvimento da capacidade. Nos quadros, a nfase a ser atribuda ao trabalho com cada capacidade est simbolizada atravs de dois recursos grficos:

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    1) A gradao dos tons de cinza.O tom mais claro significa que a capacidade deve ser introduzida, para possibilitar a familiarizao dos alunos com os conhecimentos em foco, ou retomada, se j tiver sido objeto de ensino-aprendizagem em momentos anteriores. O mdio significa que a capacidade deve ser trabalhada de maneira sistemtica, com vista ao domnio pelos alunos. O tom mais escuro significa que a capacidade, tendo sido trabalhada sistematicamente, deve ser enfatizada de modo a assegurar sua consolidao.

    2) As letras inseridas nas quadrculas.A letra I significa introduzir; a letra R, retomar; seu uso no quadro indica que a capacidade deve merecer nfase menor, sendo ou introduzida ou retomada, conforme o caso (introduzir a novidade; retomar eventualmente o que j tiver sido contemplado). A letra T significa trabalhar sistematicamente. A letra C, consolidar.

    Aps a apresentao, nos quadros, das capacidades mais gerais, elas so discutidas em verbetes (como num dicionrio ou numa enciclopdia). Muitas vezes, quando se trata de uma capacidade de natureza mais complexa, os verbetes desdobram essa capacidade em sub-capacidades. Nos verbetes, o professor poder encontrar uma descrio da capacidade, uma explicao de sua importncia para a alfabetizao e, para auxiliar sua compreenso, indicaes gerais de atividades que possibilitam o seu desenvolvimento (as indicaes so gerais porque o Caderno 3 apresentar essas atividades em detalhe).

    Optou-se por apresentar as capacidades em verbetes porque eles podem ser consultados pelos professores de acordo com seu interesse ou necessidade, no obrigando a uma leitura seqencial e linear. Nos casos em que h inter-relao entre capacidades abordadas em diferentes verbetes, faz-se a indicao para o professor buscar a informao complementar no outro verbete e, para facilitar a visualizao, essa indicao apresentada em box na margem direita do texto. Do mesmo modo, tambm os Quadros no dependem uns dos outros, cada um deles pode ser lido e compreendido sem a leitura dos outros. Por isso, os Quadros 3 e 4, para funcionarem com autonomia, retomam pontos que aparecem tambm nos Quadros 1 e 2.

    Deve-se ressaltar que as aprendizagens relativas s capacidades apontadas no constituem etapas a serem observadas numa cadeia linear. Elas so simultneas e exercem influncia umas sobre as outras. A apresentao seqencial que se faz neste Caderno se deve apenas necessidade de organizao e busca de clareza na exposio. Alm disso, sempre necessrio que o professor considere qual a melhor organizao e seqenciao, tendo em mente a efetiva situao de aprendizado de seus alunos.

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  • 1. Compreenso e valorizao da cultura escrita

    Nesta seo so focalizados alguns fatores e condies necessrios integrao dos alunos no mundo letrado. Trata-se do processo de letramento, que deve ter orientao sistemtica, com vista compreenso e apropriao da cultura escrita pelos alunos. Indicam-se aqui conhecimentos gerais e capacidades a serem adquiridos e sugerem-se, rapidamente, procedimentos pedaggicos que podem ser adotados para a realizao desses objetivos.

    Como j foi dito na Introduo, ressalta-se que o trabalho voltado para o letramento no deve ser feito separado do trabalho especfico de alfabetizao. preciso investir nos dois ao mesmo tempo, porque os conhecimentos e capacidades adquiridos pelos alunos numa rea contribuem para o seu desenvolvimento na outra rea.

    Buscando a visualizao disso que foi feita a gradao dos tons de cinza do Quadro 1. O conhecimento e a valorizao da circulao, dos usos e das funes da lngua escrita na sociedade so capacidades que devem ser trabalhadas, com vista consolidao, nos trs anos do Ciclo, ainda que isso se faa com estratgias didticas diferenciadas a cada ano. J as capacidades necessrias para o uso dos materiais de leitura e escrita especificamente escolares devem ser tratadas sistematicamente e consolidadas logo na chegada das crianas e mantidas, retomadas, sempre que necessrio, at a Fase II.

    Quadro 1Compreenso e valorizao da cultura escrita

    Conhecimentos e capacidades a serem atingidos ao longo doCiclo Inicial de Alfabetizao

    Conhecimentos e capacidades FaseIntrod. Fase I Fase II

    Conhecer, utilizar e valorizar os modos de produo e circulao da escrita na sociedade

    Conhecer os usos e funes sociais da escrita

    Desenvolver as capacidades necessrias para o uso da escrita no contexto escolar:

    Conhecer os usos da escrita na cultura escolar

    I/T/C T/CT/C

    I/T/C T/CT/C

    I/T/C RT

    (i) Saber usar os objetos de escrita presentes na cultura escolar

    (ii) Desenvolver capacidades especficas para escrever

    I/T/C RT

    I/T/C RT

    I/T/C RT

    ..............Alfabetizando

    ............16

  • 17............

    os primeiros momentos do percurso de alfabetizao. Isso significa promover simultaneamente a alfabetizao e o letramento.

    A maioria das crianas brasileiras sobretudo as que so atendidas pelas redes pblicas de ensino , em sua experincia pr- e extra-escolar, tem acesso restrito escrita, desconhece muitas de suas manifestaes e utilidades. Por isso importante que a escola, pela mediao do professor, proporcione aos alunos o contato com diferentes gneros e suportes de textos escritos e lhes possibilite vivncia e conhecimento:

    dos espaos de circulao dos textos (no meio domstico, urbano e escolar, entre outros);

    !

    Conhecer e utilizar modos de manifestao ecirculao da escrita na sociedade

    A cultura escrita diz respeito s aes, valores, procedimentos e instrumentos que constituem o mundo letrado. A compreenso da cultura escrita, pelos alunos, vem de um processo de integrao no ambiente letrado, seja atravs da vivncia numa sociedade que faz uso generalizado da escrita, seja atravs da apropriao de conhecimentos da cultura escrita especificamente trabalhados da escola. Esse processo possibilita aos alunos compreenderem os usos sociais da escrita e, pedagogicamente, pode gerar prticas e necessidades de leitura e escrita que daro significado s aprendizagens escolares e aos momentos de sistematizao propostos pelo professor.

    Na nossa civilizao, todo cidado, qualquer que seja seu grau de escolaridade ou sua posio social, est, de algum modo, inserido numa cultura letrada: tem documentos escritos, realiza, bem ou mal, prticas que dependem da escrita (ex.: tomar nibus, pagar contas, etc.). Entretanto, sempre possvel alargar as possibilidades de integrao e participao ativa na cultura escrita, pela ampliao da convivncia e do conhecimento da lngua escrita. Estar ativamente inserido na cultura escrita significa ter comportamentos letrados, atitudes e disposies frente ao mundo da escrita (como o gosto pela leitura), saberes especficos relacionados leitura e escrita que possibilitam usufruir de seus benefcios. A compreenso do funcionamento da escrita e a insero nas prticas do mundo letrado incluem as capacidades de ler e escrever autonomamente (que so a meta central da alfabetizao), mas no dependem exclusivamente dessas capacidades. Ao contrrio, a insero, maior ou menor, dos alunos na cultura escrita pode ser apontada como um fator importante para o sucesso ou o fracasso desses alunos na alfabetizao. A compreenso geral do mundo da escrita tanto um fator que favorece o progresso da alfabetizao dos alunos como uma conseqncia da aprendizagem da lngua escrita na escola. Por isso um dos eixos a serem trabalhados desde

    Gneros de texto so as diferentes espcies de

    texto, escritos ou falados, que circulam na sociedade e que so reconhecidos com facilidade pelas pessoas.

    Por exemplo: carta, bilhete, romance, poema, sermo,

    conversa de telefone, contrato de aluguel, notcia

    de jornal, piada, reportagem, letra de

    msica, regulamento, etc.

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  • !!

    !

    !

    dos espaos institucionais de manuteno, preservao, distribuio e venda de material escrito (bibliotecas, livrarias, bancas, etc.);das formas de aquisio e acesso aos textos (compra, emprstimo e troca de livros, revistas, cadernos de receita, etc.);dos diversos suportes da escrita (cartazes, out-doors, livros, revistas, folhetos publicitrios, murais escolares, livros escolares, etc.);dos instrumentos e tecnologias utilizados para o registro escrito (lpis, caneta, cadernos, mquinas de escrever, computadores, etc.).

    Conhecer os usos e funes sociais da escrita

    Vivemos num tipo de sociedade que costuma ser chamada de grafocntrica, porque nossa vida social se organiza em torno da escrita. No dia-a-dia dos cidados, as prticas de leitura e escrita esto presentes em todos os espaos, a todo momento, cumprindo diferentes funes. H escritas pblicas que funcionam como documentos (o dinheiro, o cheque, as contas a pagar, o vale-transporte, a carteira de identidade), outras que servem como formas de divulgao de informaes (o letreiro dos nibus, os rtulos dos produtos, as embalagens de defensivos agrcolas, os avisos, as bulas de remdio, os manuais de instruo), outras permitem o registro de compromissos assumidos entre as pessoas (os contratos, o caderno de fiado), outras viabilizam a comunicao distncia (nos jornais, nas revistas, na televiso), outras regulam a convivncia social (as leis, os regimentos, as propostas curriculares oficiais); outras, ainda, possibilitam a preservao e a socializao da cincia, da filosofia, da religio, dos bens culturais (nos livros, nas enciclopdicas, na Bblia). Por outro lado, as prticas pessoais e interpessoais de leitura e escrita nos possibilitam organizar o cotidiano, nos entender, registrar e rememorar vivncias (agendas, listas de compras, dirios, cadernos de receita), bem como incrementar as trocas, a comunicao, a convivncia, enfim (bilhetes, cartas de amor, e-mails).

    Ter clareza quanto diversidade de usos e funes da escrita e s incontveis possibilidades que ela abre importante tanto do ponto de vista conceitual e procedimental, para que o aluno seja capaz de fazer escolhas adequadas, ao participar das prticas sociais de leitura-escrita, quanto tambm do ponto de vista atitudinal, porque o interesse e a prpria disposio positiva para o aprendizado tendem a se acentuar com a compreenso da utilidade e relevncia daquilo que se aprende.

    Trabalhar os conhecimentos e capacidades envolvidos na compreenso dos usos e funes sociais da escrita, implica, em primeiro lugar, trazer para a sala de aula e disponibilizar para observao e manuseio pelos alunos, muitos textos, pertencentes a gneros diversificados, presentes em diferentes suportes. Mas implica tambm, ao lado disso, orientar a explorao desses materiais, valorizando os conhecimentos prvios do aluno, possibilitando a ele dedues e descobertas, explicitando informaes desconhecidas.

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  • 19..........

    Especificamente, o professor pode desenvolver atividades que possibilitem aos alunos:

    reconhecer e classificar, pelo formato, diversos suportes da escrita, tais como livros, revistas, jornais, folhetos;identificar as finalidades e funes da leitura de alguns textos a partir do exame de seus suportes;

    relacionar o suporte s possibilidades de significao do texto.

    Conhecer os usos da escrita na cultura escolar

    Entre os suportes e instrumentos de escrita do cotidiano escolar nos dias de hoje podemos listar, por exemplo, livro didtico, livros de histrias, caderno, bloco de escrever, papel ofcio, cartaz, lpis, borracha, computador. Conhecer esses objetos de escrita significa saber para que servem e como so usados, identificando suas particularidades fsicas (tamanho, formato, disposio e organizao do texto escrito, tipo usual de letra, recursos de formatao do texto, interao entre a linguagem verbal e as linguagens visuais utilizadas com mais freqncia, etc.).

    Muitas crianas chegam escola sem ter tido oportunidade de conviver e se familiarizar com os meios sociais de circulao da escrita. Nessas condies, no de surpreender que essas crianas faam hipteses inusitadas sobre a natureza, as funes e o uso desses materiais, inclusive daqueles que so indispensveis ao dia-a-dia na escola. No entanto, saber usar os suportes e instrumentos de escrita presentes na cultura escolar um

    !

    !

    !

    conhecimento que se articula com outros saberes sobre a cultura escrita, as funes e usos sociais da escrita, as convenes grficas, o uso dos diferentes tipos de letra e constitui um fator importante de favorecimento da aprendizagem da lngua escrita. Por isso necessrio tratar explicitamente dessa questo na sala de aula. Esse um dos conhecimentos dos quais as crianas precisam se apropriar logo no incio do processo de alfabetizao, em face de sua importncia fundamental para a trajetria escolar do aluno.

    Quanto a cultura escrita, funes e usos da escrita:

    ver verbetes anteriores.

    Quanto a convenes grficas e diferentes tipos

    de letras: ver seo 2.

    Fora da escola, esse saber adquirido, em geral, quando as crianas tm acesso aos diversos suportes de escrita e participam de prticas de leitura e de escrita dos adultos. por meio do uso que elas apreendem a finalidade de objetos de escrita presentes em diferentes contextos sociais e a maneira adequada de lidar com eles. Assim, na escola, esse conhecimento deve tornar-se um dos objetivos do processo inicial de ensino-aprendizagem da lngua escrita, envolvendo uma abordagem didtica, com apresentao, observao e explorao dos suportes e instrumentos escolares de escrita e de suas caractersticas materiais. Com isso, pretende-se propiciar aos alunos o desenvolvimento de capacidades cognitivas e procedimentais necessrias ao uso adequado desses objetos.

    Alfabetizando..............

  • Algumas perguntas podem sugerir exemplos de atividades e possibilidades de explorao sistemtica, em sala de aula, das especificidades dos suportes e instrumentos de escrita usuais na escola:

    nos livros e nos cadernos, como se faz a seqenciao do texto nas pginas (frente e verso, pgina da esquerda e pgina da direita, numerao)?

    !

    O verbete Compreender a orientao e o

    alinhamento da escrita da lngua portuguesa ,

    da seo 2, trata de questes relacionadas a

    este tpico.

    !

    !

    !

    como se dispe o escrito na pgina (margens, pargrafos, espaamento entre as partes, ttulos, cabealhos)?como se relacionam o escrito e as ilustraes?

    como se sabe o nome de um livro e quem o escreveu? qual a sua editora e sua data de publicao?

    como se faz para localizar, no livro didtico ou no livro de histrias, uma informao desejada? como se consulta o ndice, o sumrio?como a seqenciao do texto, sua disposio na pgina, sua relao com as imagens e ilustraes funcionam no computador?

    qual a melhor maneira de dispor um texto num cartaz? que tipo de letra e que recursos grficos deve-se usar (lpis de escrever? lpis de cor? caneta hidrogrfica? tinta guache?)?como se l uma histria em quadrinhos?

    Desenvolver as capacidades necessrias parao uso da escrita no contexto escolar:

    (i) Saber usar os objetos de escrita presentes na cultura escolar

    Saber manusear os livros didticos e de literatura infantil , usar de maneira adequada os cadernos, saber segurar e manipular o lpis de escrever, os lpis de colorir, a borracha, a rgua, o apontador, a caneta, sentar corretamente na carteira para ler e escrever, cuidar dos materiais escolares, lidar com a tela, o mouse e o teclado do computador so algumas das aprendizagens que os alunos precisam desenvolver logo que entram na escola. Esses conhecimentos e capacidades so requisitados nas diversas prticas cotidianas de leitura e de escrita, dentro da escola e fora dela. Por isso, esse um tpico da aprendizagem da lngua escrita necessrio tanto para que os alunos possam obter sucesso ao longo da vida escolar quanto para que eles possam participar plenamente da vida social extra-escolar.

    Por exemplo, o professor pode discutir com os alunos como usar os cadernos e cuidar deles, mostrando a eles um caderno: passando suas folhas, falando sobre as orelhas de burro, explicando como elas se formam, mostrando o que pode acontecer quando se pe mais fora no lpis do que o necessrio para se escrever na folha do caderno, apontando e marcando as linhas da folha que servem de referncia para escrever no caderno, etc. Nesses momentos, o que ele estar tomando como foco para observao e anlise junto

    !

    !

    !

    !

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    com os alunos o instrumento de escrita caderno e suas especificidades materiais, que definem a maneira de usar esse material escolar de escrita. Tudo isso voltar a ser o foco da ateno dos alunos quando eles forem utilizar, de fato, esse instrumento, escrevendo em sala de aula.

    (ii) Desenvolver capacidades especficas para escrever

    Escrever envolve trabalho cognitivo, raciocnio deliberado, todos sabemos. Mas o ato de escrever , tambm, uma atividade motora, seja traando letras na superfcie de um papel, seja digitando num teclado de computador. As atividades motoras, precisam ser aprendidas e, na maioria das vezes, treinadas. O uso do material escolar de escrita lpis, caneta, borracha, corretivo, rgua, teclado de computador inclui, alm das capacidades cognitivas, uma habilidade motora especfica, que exige conhecimento e treinamento.

    A aquisio dessa habilidade especfica ultrapassa os limites da mera destreza motora quando associada ao conhecimento da cultura escrita. Uma das mais importantes funes da escrita possibilitar a comunicao entre pessoas distantes ou em situaes em que no possvel falar. O que se escreve para ser lido pelos outros ou por ns mesmos, algum tempo depois. Se os alunos compreenderem isso, vai fazer mais sentido para eles esforarem-se para conseguir uma caligrafia legvel e com boa apresentao esttica, como tambm empenharem-se na organizao adequada da escrita nos cadernos, nos cartazes, nos murais, enfim, nos diversos textos que produzirem (etiquetas, agendas, listas, histrias, poemas, cartas, etc).

    Esse tpico retomado no verbete Conhecer e utilizar

    diferentes tipos de letra (de frma e cursiva).

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  • FaseIntrod. Fase I Fase II

    2. Apropriao do sistema de escrita

    Esta seo trata dos conhecimentos que os alunos precisam adquirir para compreender as regras que orientam a leitura e a escrita no sistema alfabtico bem como a ortografia da lngua portuguesa. So apresentadas aqui algumas capacidades importantes para a apropriao do sistema de escrita do portugus e que devem ser trabalhadas de forma sistemtica em sala de aula.

    Quadro 2Apropriao do sistema de escrita

    Capacidades a serem atingidas ao longo do Ciclo Inicial de Alfabetizao

    Capacidades

    Compreender diferenas entre a escrita alfabtica e outras formas grficas

    Dominar convenes grficas:

    (ii) Compreender a funo de segmentao dos espaos em branco e da pontuao de final de frase

    (i) Compreender a orientao e o alinhamento da escrita da lngua portuguesa I/T/C RR

    Reconhecer unidades fonolgicas como slabas, rimas, terminaes de palavras, etc.

    Conhecer o alfabeto:

    I/T/C RR

    I/T/C RT

    I/T RT/C

    (i) Compreender a categorizao grfica e funcional das letras

    (ii) Conhecer e utilizar diferentes tipos de letra (de frma e cursiva)

    Compreender a natureza alfabtica do sistema de escrita

    Dominar as relaes entre grafemas e fonemas

    (i) Dominar regularidades ortogrficas

    (ii) Dominar irregularidades ortogrficas

    I/T/C RR

    I/T/C RR

    I T/CI/T

    I/T RT/C

    I/T RT/C

    I/T RT/C

    I T/CT/C

    I T/CT/C

    Utilizamos intencionalmente neste Caderno a grafia frma, com acento circunflexo. Embora no conste do Vocabulrio Ortogrfico da ABL, esta grafia necessria para se distinguir a

    palavra frma da homgrafa forma.

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    Antes de passar aos verbetes, insistimos na idia de que o desenvolvimento das capacidades lingsticas que constam do Quadro 1 e do Quadro 2, bem como as dos Quadros 3, 4 e 5, no acontece de maneira estritamente seqencial, mas sim simultaneamente, umas contribuindo para a aquisio das outras, e que, portanto, sua abordagem na sala de aula tambm deve ser concomitante, variando a nfase, o grau de focalizao. No se trata de contedos ou matrias a serem dados um depois do outro; trata-se de capacidades interligadas, necessrias ao domnio do sistema de escrita.

    Compreender diferenas entre escrita e outras formas grficas(outros sistemas de representao)

    Um aspecto fundamental para os momentos iniciais da alfabetizao que o aluno faa a diferenciao entre as formas escritas e outras formas grficas de expresso. Esse tambm no um saber bvio e que j vem pronto e, por isso, precisa ser trabalhado em sala de aula, em situaes que levem as crianas a distinguir entre:

    (i) letras e desenhos;(ii) letras e rabiscos;(iii) letras e nmeros;(iv) letras e smbolos grficos como setas, asteriscos, sinais matemticos, etc. ( ,

    , *, +, =, %, @ ,$).Como se trata de conhecimento bsico para a compreenso da natureza da escrita,

    ele precisa ser introduzido, trabalhado sistematicamente e consolidado logo no perodo inicial da alfabetizao.

    Esse tipo de conhecimento pode ser abordado, por exemplo, atravs da explorao, em livros, revistas e outros impressos, das diferenas grficas entre o texto escrito e o desenho, entre a escrita alfabtica e os cones e sinais, muito usados atualmente, mas que no representam a pauta sonora. Quanto distino entre letras e nmeros, possvel propor aos alunos que procurem saber ou levantem hipteses sobre a presena dos smbolos que representam os nmeros em calendrio, listas telefnicas, folhetos com preos de mercadorias, etc.

    Dominar convenes grficas

    Dois tipos de conveno grfica fundamentais no sistema de escrita do portugus precisam ser compreendidos pelos alfabetizandos logo no incio do aprendizado: (i) nossa escrita se orienta de cima para baixo e da esquerda para a direita; (ii) h convenes para indicar a delimitao de palavras (espaos em branco) e frases (pontuao). Por isso se

    orecomenda que sejam introduzidos e trabalhados sistematicamente no 1 ano do Ciclo, objetivando-se a sua consolidao.

    Alfabetizando..............

  • (i) Compreender a orientao e o alinhamento da escrita da lngua portuguesa

    Um conhecimento importante a ser ensinado na fase inicial do processo de alfabetizao se refere compreenso pelo aluno de que os smbolos da escrita so sempre unidades estveis e que obedecem a certos princpios de organizao, tais como a direo da leitura da esquerda para a direita, de cima para baixo, etc. Esse conhecimento, que parece bvio e natural para quem domina a leitura e a escrita, pode ser uma novidade inimaginvel para muitas crianas que chegam pela primeira vez escola. O alinhamento e a direo da escrita, para muitos aprendizes iniciantes, nem sempre so observveis e identificados como convenes a serem seguidas.

    A finalidade do ensino dessas convenes fazer com que o aluno perceba e domine as regras de alinhamento e orientao da escrita. Os alunos precisam compreender que escrevemos da esquerda para a direita e de cima para baixo, isto , que a seqncia das letras nas palavras e das palavras nas frases obedece a uma ordem de alinhamento e direcionamento que respeitada como regra geral e que tem conseqncia nas formas de distribuio espacial do texto no seu suporte. Por exemplo: a escrita ocupa, em seqncia, a frente e o verso da folha de papel; escreve-se dentro das margens, a partir da margem esquerda. A compreenso desse princpio convencional bsico que abrange a ordenao das letras nas palavras indispensvel para o aluno desvendar os segredos da escrita alfabtica.

    Ver tambm a seo 1 deste Caderno.

    O avano tecnolgico e as necessidades sociais de comunicao impulsionaram o surgimento de alguns gneros de texto que, eventualmente, subvertem a orientao convencional da escrita. Isso pode acontecer, por exemplo, em textos veiculados pelo computador, sobretudo na Internet, nas propagandas impressas e televisivas, nos textos literrios. Os diversos formatos desses textos sugerem diferentes maneiras de se ler: de baixo para cima, de um lado qualquer para o outro. Ou seja, excepcionalmente, a direo da escrita pode variar, dependendo do gnero do texto e do suporte em que ele circula. Os alunos precisam, ento, perceber e aprender a lidar com essas diferentes formas de ler em suas prticas cotidianas de leitura, o que constitui um item importante do seu conhecimento da cultura escrita. Essa aprendizagem, porm, pode comear pela percepo e

    Ver verbete relativo cultura escrita na seo 1.

    identificao de que a regularidade, aquilo que mais freqente, a direo convencional da escrita. As outras formas de posicionar a escrita so especficas de alguns gneros textuais e atendem a objetivos comunicativos especiais.Para aprender a ler, os alunos devem saber, logo no incio de sua aprendizagem, em que direo a escrita se orienta. bom que eles comecem por perceber e aprender a direo convencional e que, aos poucos, possam analisar outras disposies da escrita, em

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  • 25..........

    diferentes materiais. A explorao dos gneros textuais que subvertem o alinhamento e/ou a direo mais freqentes deve ser feita tomando-se como ponto de referncia a orientao convencional. Num momento posterior do processo, um objetivo a alcanar ser, por exemplo, ensinar aos alunos os princpios direcionais da leitura de grficos e tabela.

    No incio do processo, uma atividade que contribui para o aprendizado da orientao e do alinhamento convencionais o professor assinalar com o dedo as linhas dos textos que l, para que os alunos observem a direo da leitura. Nesse caso, o professor atua como modelo e, ao mesmo tempo, cria oportunidade para os alunos observarem a relao existente entre o que ele l e os signos escritos presentes no texto. Progressivamente, os alunos devero ganhar autonomia, lendo por conta prpria textos que ocupam linhas inteiras ou que se organizam em colunas, alm de poemas de diferentes configuraes.

    (ii) Compreender a funo de segmentao dos espaos em branco e da pontuao

    Um outro aspecto importante da organizao do sistema alfabtico est relacionado com o fato de que a linearidade da escrita tem caractersticas diferentes da linearidade da fala. Para quem j sabe ler, esse conhecimento parece muito simples e acionado quase que de forma automtica. No entanto, para um aprendiz iniciante, as questes decorrentes desse fato podem no ter sido ainda percebidas e representar grande dificuldade.

    Tanto a fala quanto a escrita so produzidas em seqncia linear, isto , som depois de som, ou letra depois de letra, palavra depois de palavra, frase depois de frase. Mas um dos pontos fundamentais no incio da alfabetizao compreender que essa linearidade acontece de maneira diferente na fala e na escrita. Em geral, os enunciados da fala parecem aos ouvidos uma cadeia contnua, em que no se distinguem nitidamente os limites entre as palavras. Quando falamos, articulamos consoantes e vogais, mas a inteno de nos comunicar com o outro, num determinado contexto, nos leva a marcar a seqncia sonora com determinada entonao e determinado ritmo, enfatizando determinadas palavras ou expresses, etc. Na fala de todo dia, que a que a criana domina, emendamos palavras (ex.: casamarela), deixamos de pronunciar algumas palavras ou partes de palavras (por exemplo, numa pronncia bem comum em Minas Gerais: Guardei a fita denda gaveta ao invs de dentro da gaveta). Noutros termos, falamos unidades de acento (palavras fonolgicas), mas escrevemos unidades de sentido (palavras morfolgicas). Quando escrevemos, grafamos as palavras por inteiro, de acordo com as convenes ortogrficas, e as separamos nitidamente por espaos em branco. A delimitao das unidades lexicais (palavras) por espaos em branco, bem como a delimitao de frases ou partes de frases por sinais de pontuao (pontos e vrgulas) e a delimitao de conjuntos de frases pela paragrafao, tudo isso constitui uma conveno que s foi adotada tardiamente na histria da escrita. Isso significa que as marcas que usamos na escrita para distinguir palavras, frases e seqncias de frases no so bvias nem naturais, so convenes sociais que precisam ser ensinadas e aprendidas na escola.

    Alfabetizando..............

  • No comeo do processo de alfabetizao, um bom procedimento, utilizado por muitos professores, ler em voz alta para as crianas, apontando cada palavra lida e os sinais de pontuao no final das frases. Uma outra maneira de chamar a ateno dos alunos para as marcas de segmentao da escrita , ao fazer a leitura oral em sala de aula, solicitar que eles prprios identifiquem os diferentes marcadores de espao (espaamentos entre as palavras, pontuao, pargrafos). A explorao desses marcadores, aliada ao processo de leitura, permite que os alunos descubram diferenas entre a segmentao da fala e a da escrita, o que lhes ser til para o domnio da ortografia, da morfossintaxe escrita, da pontuao e da paragrafao, em momentos posteriores de seu aprendizado da escrita.

    Reconhecer unidades fonolgicas como slabas,

    rimas, terminaes de palavras, etc.

    No uso falado da lngua, as pessoas, em geral, cuidam apenas do assunto e no costumam dar ateno aos sons que produzem. Eventualmente, por alguma necessidade comunicativa, elas destacam e enfatizam algumas pores sonoras das palavras, por exemplo, escandindo as slabas ou brincando com rimas e aliteraes. No entanto, para aprender a ler e escrever com autonomia, o requisito indispensvel, todos sabemos, ser capaz de operar racionalmente com unidades sonoras de apreenso mais difcil os fonemas e com as complexas relaes entre os fonemas e o modo de represent-los graficamente. Por isso, tem-

    Algumas dessas questes sero retomadas nesta

    seo.

    O conceito de fonema ser apresentado em box relativo ao prximo

    verbete.

    se considerado til, nos primeiros momentos do processo de alfabetizao, criar situaes em que as crianas prestem ateno pauta sonora da lngua e operem, ludicamente, com unidades do sistema fonolgico. O sombreado e as letras (I/T/C) nas quadrculas do Quadro 2, neste item, pretendem indicar que essa uma habilidade a ser introduzida,

    odesenvolvida e consolidada j no 1 ano do Ciclo Inicial de Alfabetizao.Uma maneira de introduzir essa questo focalizar as unidades fonolgicas com as

    quais os alunos j so capazes de lidar antes mesmo de entrar para a escola. So segmentos sonoros como as slabas, comeos ou finais de palavras, rimas, aliteraes. Muitas brincadeiras infantis envolvem operar com essas unidades. Por exemplo, cantigas de roda como Atirei o pau no gato; jogos de salo como L vai a barquinha carregadinha de (palavras comeadas com [ca], terminadas com [o], etc.), a lngua do p, os trava-lnguas. Trazendo essa produo cultural para a sala de aula, podem-se criar situaes ldicas que levaro os

    ..............Alfabetizando

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  • Aliterao a repetio de um fonema numa frase ou

    numa palavra (por exemplo: quem com ferro

    fere, com ferro ser ferido). Assonncia uma espcie de rima em que no

    h identidade entre os traos fnicos do final das

    palavras. Em geral, a assonncia se vale da

    coincidncia entre as vogais das palavras, como nos

    versos de Manuel Bandeira: Belo, belo, belo / Tenho tudo quanto quero. (cf.

    CMARA Jr., Dicionrio de Filologia e Gramtica).

    alunos operar deliberadamente com slabas, rimas, aliteraes, assonncias, etc. possvel tambm brincar com a posio desses segmentos nas palavras, por exemplo, formando listas de palavras que comecem, ou que terminem, com determinada slaba.

    Conhecer o alfabeto

    Com as 26 letras do alfabeto podemos escrever todas as palavras da lngua portuguesa. A importncia da aprendizagem do alfabeto na fase inicial da alfabetizao est, sobretudo, na necessidade de o aluno identificar e saber os nomes das letras. Alm disso, um conhecimento bsico a ser trabalhado nesse momento a regra geral de que o nome de cada letra tem relao com pelo menos um dos sons da fala que ela pode representar na escrita. Isso verdade para a maioria dos casos (a, b, c, d, , efe, etc.); as

    Estamos sempre colocando entre aspas a palavra som, porque, embora cmoda e fcil de entender, essa no a expresso

    mais exata para falar daquilo que o alfabeto representa. A rigor, os elementos do

    alfabeto representam fonemas, isto , unidades fonolgicas abstratas que no tm expresso acstica estvel e que, portanto,

    no correspondem a segmentos sonoros particulares comuns na fala. Por exemplo:

    quando, na fala corriqueira, pronunciamos a palavra lata, o som correspondente letra

    a na primeira slaba diferente do som que lhe corresponde na segunda slaba; o

    som correspondente letra a na primeira slaba da palavra cama, por sua vez, no igual a nenhum dos que pronunciamos na

    palavra lata. Noutros termos, o fonema /a/ uma classe de sons, que recobre

    diferentes realizaes, diferentes sons que efetivamente pronunciamos e ouvimos.

    excees so poucas e de uso menos freqente (h, y, w, por exemplo). Conseqentemente, o domnio do nome das letras pode auxiliar na leitura, na compreenso da grafia das palavras. Portanto fundamental que o aluno compreenda que as letras so unidades estveis do alfabeto, que representam na escrita os sons voclicos ou consonantais constitutivos das palavras que falamos.

    Isso significa que o professor deve apresentar aos alunos o alfabeto e promover situaes que lhes possibilitem a descoberta de que se trata de um conjunto estvel de smbolos as letras cujo nome foi criado para indicar um dos fonemas que cada uma delas pode representar na escrita. bom que o estudo do alfabeto se faa com a apresentao de todas as 26 letras, preferencialmente seguindo a ordem alfabtica. Isso permite uma viso do conjunto, que facilita a compreenso do todo e a distino de cada unidade, alm de dar condio aos alunos de ampliarem sua compreenso da cultura escrita, familiarizando-se com um conhecimento de grande utilidade social, visto que muitos dos nossos escritos se organizam pela ordem alfabtica. importante que todas as letras estejam visveis na sala de aula, para que os alunos, sempre que for necessrio, tenham um modelo para consultar. Esse mais um exemplo de como trabalhar simultaneamente na direo da alfabetizao e do letramento.

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    Alfabetizando..............

  • Com o sombreamento e as letras do Quadro 2, estamos sugerindo que o aluno comece a se familiarizar com a natureza e o funcionamento do alfabeto na Fase Introdutria do Ciclo e que as capacidades relativas a esse conhecimento sejam abordadas sistematicamente na Fase I. Se necessrio, esses conhecimentos podero ser retomados na Fase II do Ciclo.

    (i) Compreender a categorizao grfica e funcional das letras

    Conhecer o alfabeto implica, ainda, que o aluno compreenda que as letras variam na forma grfica e no valor funcional. As variaes grficas seguem padres estticos, mas so tambm controladas pelo valor funcional que as letras tm. As letras desempenham uma determinada funo no sistema, que a de preencher um determinado lugar na escrita das palavras. Portanto, preciso conhecer a categorizao das letras, tanto no seu aspecto grfico, quanto no seu aspecto funcional (quais letras devem ser usadas para escrever determinadas palavras e em que ordem). Apesar das diferentes formas grficas das letras em nosso alfabeto (maisculas, minsculas, imprensa, cursiva), uma letra permanece a mesma porque exerce a mesma funo no sistema de escrita, ou seja, sempre usada da maneira exigida pela ortografia das palavras. Dizendo de outra maneira: mesmo variando

    Ver CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetizando sem o b-b-bi-b-bu. So Paulo:

    Scipione, 1999.

    Ver tambm os verbetes Desenvolver capacidades especficas para escrever, da seo 1, e Conhecer e utilizar diferentes tipos de

    letras (de frma e cursiva), da seo 2.

    Uma das implicaes do princpio de identidade funcional das letras para o processo de alfabetizao que o aluno precisa aprender que no pode escrever qualquer letra em qualquer posio numa palavra, porque as letras representam fonemas, os quais aparecem em posies determinadas nas palavras.

    bom ressaltar que conhecer o alfabeto representa desenvolver capacidades especficas, conforme se trate de ler ou de escrever. Para ler, indispensvel a capacidade perceptiva que possibilita identificar cada letra, distinguindo umas das outras. Para escrever, alm da acuidade perceptiva, necessria a capacidade motora de saber grafar devidamente cada letra.

    A unidade foco das atividades relativas ao conhecimento do alfabeto e da categorizao formal e funcional das letras, , evidentemente, a letra. Mas o professor deve tambm promover atividades em que as letras sejam situadas em slabas, em palavras e em textos. Por exemplo, diante de textos lidos mesmo que pelo professor os alunos podem se deter no reconhecimento das letras e de sua posio, distribuio e funo nas palavras. Do mesmo modo, na tentativa de escrever

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    graficamente, as letras tm valores funcionais fixados pela histria do alfabeto e, principalmente, pela organizao das palavras em cada lngua.

    Por exemplo, as letras A, , A, a, a, ou representam, todas, o mesmo fonema / a /, apesar de terem formas grficas diferentes.

    a

  • mesmo que textos simples como etiquetas, crachs, listas os alunos podero operar direta e produtivamente com a categorizao grfica e funcional das letras. Essa sugesto mostra uma das maneiras de trabalhar simultaneamente um conhecimento especfico do domnio do cdigo escrito, isto , do processo de alfabetizao, como a compreenso funcional das letras do alfabeto, com conhecimentos relacionados insero no mundo letrado (isto , conhecimentos que incrementam o grau de letramento do aluno), como o emprego til da escrita em textos que fazem sentido para as crianas.

    (ii) Conhecer e utilizar diferentes tipos de letra (de frma e cursiva)

    Alguns estudos recomendam o uso exclusivo de letras de frma maisculas nos primeiros momentos da alfabetizao, pelo menos at que o aluno passe a reconhecer todas as letras e tenha destreza na escrita das palavras. Essa orientao apia-se em alguns pontos. No mbito da leitura, um argumento que, por serem unidades discretas (e no emendadas como as letras cursivas manuscritas), as maisculas de imprensa podem ser diferenciadas e contadas mais facilmente pelos alunos. Outro argumento que mais fcil reconhecer as letras que aparecem em seqncia nas diversas palavras quando essas letras se apresentam com tipos uniformes e regulares, ao invs de mostrarem traos variados (ora maisculas, ora minsculas; ora letra de frma ou de imprensa, ora letra cursiva). No mbito da escrita, o principal argumento que as letras maisculas so mais fceis de escrever, especialmente para as crianas pequenas.

    J os defensores do mtodo analtico e/ou global recomendam adotar, no incio do processo de alfabetizao, a letra de frma minscula e a letra cursiva. A justificativa para essa recomendao que a memorizao do texto, sentena ou palavra, que a estratgia bsica nesse mtodo, apia-se na imagem ideovisual e facilitada pela configurao grfica diferenciada das palavras, com letras de traado ascendente, isto , para cima, com relao linha (bola, tatu, farelo), ou descendente, quer dizer, para baixo, com relao linha ou pauta (pipoca, gago, quase), ou ascendente e descendente (galo, peteca, galope).Em sala de aula, essa questo poder ser encaminhada de maneira produtiva com flexibilidade e sensibilidade para o aprendizado especfico que estiver em foco a cada momento. Por exemplo, quando buscar desenvolver a capacidade de leitura autnoma dos alunos, ser mais adequado que o professor trabalhe com textos escritos em letras de frma maisculas, cuja identificao mais fcil para as crianas. No entanto, no proveitoso nem recomendvel que, em nome dessa facilidade, o professor procure impedir o contato de seus alunos com outros tipos de letras, que estejam presentes em outras manifestaes da escrita. A utilizao das letras maisculas de frma nas atividades sistemticas de escrita no deve ser motivo para impedir a entrada de impressos com tipos variados de letras na sala de aula. O aprendizado do alfabeto pode e deve se fazer

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    Alfabetizando..............

  • concomitantemente ao desenvolvimento da compreenso da cultura escrita, que requer a interao e a familiaridade com textos diversos, que circulam socialmente em diversos suportes, cumprindo diferentes funes.

    Ver o verbete,na seo 1.

    Ver os verbetes relacionados, na seo 1.

    Ver, na seo 1, os verbetes Desenvolver as

    capacidades necessrias para o uso da escrita no

    contexto escolar e Desenvolver capacidades especficas para escrever.

    Por outro lado, tambm importante que o professor saiba perceber qual o momento adequado para apresentar sistematicamente aos seus alunos as letras minsculas e as cursivas.

    Com vista ao aprendizado da leitura, para introduzir a diversidade de tipos de letras, uma das estratgias pode ser propiciar aos alunos o manuseio de escritos diversos, impressos e manuscritos, perguntando-lhes em que gneros de texto e em que suportes existentes na sociedade se podem encontrar exemplos de cada tipo de escrita, pedindo-lhes que classifiquem as letras quanto a suas caractersticas grficas. Com isso, alm de lidar com a diversidade de tipos de letras, o professor estar criando oportunidades para que os alunos ampliem seus conhecimentos sobre a natureza e usos sociais da escrita no mundo letrado.

    Quanto ao aprendizado da escrita, necessrio orientar os alunos a traar os diferentes tipos de letra, buscando propiciar-lhes o domnio dos instrumentos da escrita e tambm o domnio das formas de registro alfabtico. preciso lidar com o traado de letras isoladas, sem dvida, mas esse procedimento no precisa ser exclusivo. Pode-se investir nas acuidades motoras e cognitivas necessrias ao domnio dessas capacidades tambm propondo aos alunos a escrita de palavras, em textos curtos mas significativos, como etiquetas, crachs, listas, parlendas, trovas

    Ver tambm o verbete Desenvolver capacidades especficas para escrever,

    da seo 1.

    e canes conhecidas. com estratgias desse tipo que se consegue aliar alfabetizao e letramento.

    Especificamente quanto s funes da escrita cursiva, importante o aluno saber que, alm de representar estilos individuais de traar as letras, ela tambm serve para se escrever com rapidez. Porm, no se pode desconsiderar que, como uma das funes da escrita a de nos possibilitar produzir textos para que outras pessoas leiam, preciso escrever de maneira clara e elegante. Compreendendo os usos da escrita cursiva, os alunos podero concluir que possvel escrever com a letra que quiserem quando fizerem anotaes pessoais, mas que devero procurar fazer letra boa quando forem escrever para outras pessoas. O desenvolvimento de uma caligrafia legvel e com boa apresentao esttica, alm da organizao adequada da escrita nos cadernos, ainda continuam sendo objetivos a serem alcanados pela escola.

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  • Compreender a natureza alfabtica do sistema de escrita

    Nem todos os sistemas humanos de escrita grafam os sons da lngua falada, e entre os que o fazem, nem todos so alfabticos. H smbolos da escrita chinesa, por exemplo, que no representam sons, mas idias, conceitos. So ideogrficos. Na escrita japonesa, h sinais que representam slabas. sobretudo na escrita das lnguas indo-europias que se usa representar, em linhas gerais, cada unidade da pauta sonora por um smbolo grfico, ou seja, cada som por uma letra, cada fonema por um grafema. Um sistema de escrita alfabtico quando seu princpio bsico o de que cada som representado por uma letra. A histria da inveno da escrita e a existncia de diferentes sistemas de escrita mostra que a correspondncia som-letra nem bvia e natural, nem a nica possvel. Isso significa, por um lado, que perfeitamente plausvel que algumas crianas imaginem que a escrita do portugus seja ideogrfica, ou silbica, por exemplo. E, por outro lado, significa que necessrio trabalhar essa questo em sala da aula.

    Dizendo de outra maneira, um conhecimento fundamental que os alunos precisam adquirir no seu processo de alfabetizao diz respeito natureza da relao entre a escrita e a cadeia sonora das palavras que eles tentam escrever ou ler. Analisando as relaes entre a fala e a escrita, muitas crianas chegam, por exemplo, a elaborar a hiptese de que cada letra representa uma slaba e no

    Sobre a histria da escritae sobre os diferentes

    sistemas de escrita, ver, entre outras obras:

    1. KATO, Mary. No mundo da escrita: uma perspectiva

    psicolingstica.So Paulo: tica, 1986.

    2. ZATZ, Lia. Aventura da escrita: histria do

    desenho que virou letra. So Paulo: Moderna, 1991.

    um fonema, conforme j descreveram os estudos da psicognese da escrita. necessrio que o professor saiba identificar e compreender esse tipo de raciocnio feito pelos alunos, para conseguir orient-los com sucesso na superao dessa hiptese e na descoberta da explicao que realmente funciona para o sistema de escrita do portugus.

    Esse aprendizado, que representa um avano decisivo no processo de alfabetizao, se realiza quando o aluno entende que o princpio geral que regula a escrita a correspondncia letra-som, ou, em termos tcnicos mais apropriados, grafema-fonema. Isso significa compreender a natureza alfabtica do sistema de escrita e se manifesta quando a criana comea a tentar ler e escrever de acordo com o princpio alfabtico (uma letra, um som). muito importante que o professor saiba reconhecer e valorizar esse progresso fundamental do aluno em direo conquista do sistema de escrita.

    Por outro lado, importante tambm que o professor saiba identificar e dimensionar algumas dificuldades que podem aparecer nos primeiros momentos da apropriao do sistema alfabtico. Nas primeiras tentativas de lidar com as relaes entre fonemas e grafemas, alguns alunos podero tender a ler, por exemplo, beola, em vez de bola. possvel que esses alunos estejam operando com o seguinte raciocnio: esta palavra comea com a letra b, que tem o som de [b], ento devo ler be-o-la. Nesse caso, as crianas esto radicalizando o chamado

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    Alfabetizando..............

  • princpio acrofnico, aquele que relaciona o nome da letra ao fonema que ela representa. O professor poder ajud-las a abandonar essa hiptese equivocada explorando o trabalho contrastivo com palavras em que o fonema consonantal aparea seguido de diferentes vogais, por exemplo, desafiando-as a ler e escrever bala, bela, bola, bula, ou taco, teco, tico, toco, Tuca, Tuco.

    como, por exemplo, a identificao do fonema /f/ nas palavras fita, foto, futebol, farofa. Outro exemplo o das atividades que explorem a contraposio entre palavras parecidas, cuja diferena se deve a um fonema, representado na escrita por uma letra: cala, cola; janela, panela; maleta, muleta; saleta, valeta. Um convite formulao de hipteses pelas crianas pedir-lhes o ordenamento de um conjunto de letras dispostas aleatoriamente, com o objetivo de produzir determinadas palavras. Nesse caso, o desafio descobrir a correspondncia entre sons e letras para obter a grafia das palavras desejadas.

    A sugesto sinalizada pelo sombreamento e as letras, no Quadro 2, que as capacidades relativas natureza alfabtica do sistema de escrita comecem a ser introduzidas e trabalhadas na Fase Introdutria do Ciclo Inicial de Alfabetizao e que sejam tratadas sistematicamente, visando consolidao pelas crianas, na Fase I.

    Como j foi definido em box anterior, os fonemas so unidades fonolgicas

    abstratas que no tm expresso acstica estvel e

    que, portanto, no correspondem a segmentos sonoros particulares da fala.

    Trata-se de entidade abstrata, que faz parte do conhecimento intuitivo da lngua que os falantes tm.

    a noo intuitiva de fonema que permite, por

    exemplo, que consideremos que os dois sons do /a/ na

    palavra lata valem a mesma coisa, apesar de,

    efetivamente, serem diferentes.

    Dominar as relaes entre fonemas e grafemas

    Apropriar-se do sistema de escri ta depende fundamentalmente de compreender um princpio bsico que o rege: os fonemas, unidades de som, so representados por grafemas na escrita. Grafemas so letras ou grupos de letras, entidades visveis e isolveis. Exemplos: a, b, c, so grafemas; qu, rr, ss, ch, lh, nh tambm so grafemas. Os fonemas so as entidades elementares da estrutura fonolgica da lngua, que se manifestam nas unidades sonoras mnimas da fala. preciso, ento, que o aluno aprenda as regras de correspondncia entre fonemas e grafemas, a partir do tratamento explcito e sistemtico encaminhado pelo professor na sala de aula.

    Essas regras de correspondncia so variadas, ocorrendo algumas relaes mais simples e regulares e outras mais complexas, que dependem da posio do fonema-grafema na palavra (so posicionais), ou dos fonemas/grafemas que vm antes

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    Ver os verbetes relativos categorizao grfica e funcional das letras e ao

    uso de diferentes tipos de letras, da seo 2.

    Muitas atividades podem ser (e normalmente so) desenvolvidas em sala de aula para facilitar aos alunos a indispensvel compreenso do princpio alfabtico. Entre elas, aquelas que envolvem a identificao de determinada relao fonema-grafema em um conjunto de palavras que a apresentam,

  • ou depois (so contextuais). A complexidade ocorre porque no sistema alfabtico nem sempre a relao entre um fonema e um grafema equivale a uma nica correspondncia. Na verdade, na lngua portuguesa temos pouqussimos casos em que h apenas uma correspondncia entre um fonema e um grafema. So exemplos dessa correspondncia rara em que um fonema representado por um nico grafema e esse grafema s representa esse nico fonema: fonema / p / grafema [p]; fonema / b / grafema [b]; fonema / f / grafema [f]; fonema / v / grafema [v]. Mas, mesmo assim, h padres bsicos nos valores atribudos aos grafemas, h regras, que o professor alfabetizador precisa compreender, para saber propor atividades adequadas a seus alunos e para interpretar com pertinncia as dificuldades que eles apresentam.

    Alguns exemplos de atividades propcias para esse aprendizado so as que se baseiam na decomposio e composio silbica de palavras, na fala e na escrita. Separar em slabas palavras faladas e observar de que maneira essa separao se configura na escrita ajuda os alunos na identificao e percepo da representao grfica dos fonemas. Outras atividades importantes so as que pedem a identificao e comparao da quantidade, da variao e da posio das letras na escrita de determinadas palavras: bingo, texto lacunado, colocao de palavras em ordem alfabtica, confronto entre a escrita produzida pelo aluno e a escrita padro.

    Uma questo que no pode ser esquecida o ponto de vista do aprendiz. A criana que est sendo alfabetizada conhece a fala, no a escrita, e parte de seu conhecimento da fala para descobrir os segredos da escrita. As palavras da lngua falada so conhecidas, fazem sentido, mesmo quando decompostas em suas unidades sonoras. Assim, no aprendizado do sistema de escrita importante para o aluno contar com o apoio do significado, ao invs de ser obrigado a lidar exclusivamente com abstraes tais como fonemas e slabas. Prever o significado das palavras a serem reconhecidas na leitura pode ser uma chave importante na decifrao das seqncias de grafemas e de aprendizado das relaes fonemas/grafemas. Essa proposta corresponde natureza da lngua, na medida em que alia as dimenses fonolgica e semntica, que funcionam integradamente

    Aqui se prope integrar as dimenses fonolgica e semntica da lngua no

    processo de alfabetizao.

    no sistema lingstico. A busca do sentido pode se valer de elementos como o conhecimento do suporte (livro didtico? livro de histria? jornal? cartaz?) e do gnero do texto que est sendo lido (lista de nomes de colegas? lista de materiais escolares? histria? notcia? aviso?). No caso da leitura, o professor poder explorar a relao que estiver estudando com os alunos, criando situaes em que as crianas possam usar elementos textuais como pistas para inferir as palavras que devem ser lidas (sabendo, por exemplo, que o que esto lendo uma lista de materiais escolares). Paralelamente, no caso da escrita, possvel prever um conjunto de palavras que podem ser usadas na produo de determinado texto (por exemplo, um convite de aniversrio, um comunicado da escola aos pais sobre uma reunio com as professoras) e, ento, discutir e explorar com os alunos as possibilidades de grafia dessas palavras. Esses so

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    Alfabetizando..............

  • outros exemplos em que se aliam esforos que vo na direo da alfabetizao e do letramento para favorecer o domnio da lngua escrita.

    Outro procedimento que pode ser til nesse sentido promover o reconhecimento automtico de algumas palavras pelos alunos e deixar essas palavras visveis na sala de aula. As palavras conhecidas, expostas, serviro como apoio e recurso para as crianas analisarem e, da, empregarem corretamente, na leitura e na escrita de outras palavras, as relaes fonema-grafema pertinentes.

    possvel ler e escrever pequenos textos mesmo antes de ter domnio do

    sistema da escrita.

    Adotar um princpio de progresso no significa

    impedir os alunos de ver o que ainda no est na

    ordem prevista nem deixar de responder a perguntas

    deles sobre contedos planejados para serem

    tratados posteriormente. O contato dos alunos com

    textos autnticos e a produo de escrita

    espontnea, em muitas ocasies, podem trazer

    tona discusses sobre relaes fonema-grafema e

    cabe ao professor dar respostas e esclarecer

    dvidas, ainda que prefira no aprofundar a questo

    naquele momento.

    A leitura e a produo escrita, em princpio, seriam atividades que exigiriam o domnio do sistema ortogrfico de escrita. No entanto, quando a criana se encontra na situao de aprendizagem desse sistema, essas atividades, sob orientao do professor, podem contribuir para o progresso do aprendizado. A escrita de pequenos textos, que faam sentido para as crianas e que no partam de modelos de palavras e frases a serem copiados, outro tipo de exerccio que contribui para a compreenso da natureza alfabtica do sistema de escrita por parte dos alunos. Por exemplo, na situao de escrever listas teis de nomes, de objetos ou de decises, etiquetas que serviro para organizar a sala de aula, pequenos avisos, etc., o aluno se v desafiado a grafar as palavras que quer empregar e isso provoca a necessidade de refletir e formular hipteses sobre como cada fonema e cada slaba pode ser representada na escrita. A criana ter ento que se esforar para distinguir os fonemas que compem tais palavras e descobrir possibilidades coerentes de escrever os sons identificados, apoiando-se nos princpios e regularidades que j tiver apreendido, mas tambm buscando solues inditas.

    Considerando a complexidade do sistema e a existncia de padres bsicos de correspondncia fonema-grafema, alguns estudiosos recomendam que seja levado em conta, no trabalho de alfabetizao, o princpio de progresso do mais simples ao mais complexo. Esse princpio pode ser assumido na organizao geral do trabalho de alfabetizao ou, conforme a opo do professor, pode ser adotado nos momentos de sistematizao de conhecimentos que tenham sido desenvolvidos por meio de aprendizagens conduzidas de maneira menos sistemtica.

    Dominar as relaes fonema-grafema significa, em ltima instncia, dominar a ortografia. A discusso sobre qual o papel da ortografia, a ser considerado durante o processo de alfabetizao, tem gerado muita polmica no interior das escolas pblicas. Os debates mais freqentes tm se voltado ora para o excesso de rigor com os erros ortogrficos dos alunos, ora para a ausncia de rigor, justificada pela concepo de que os erros so elementos

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  • importantes do processo de ensino e aprendizagem. Uma posio defende que os alunos devem ter aprendido a ortografia correta de todas as palavras quando chegam ao final do primeiro ano de alfabetizao, sob pena de serem reprovados. Nessa perspectiva, quando a escola decide pela aprovao de alunos que ainda no dominaram as regras ortogrficas, reconhecendo seus avanos e sua capacidade de superao desses problemas, surgem crticas severas ao trabalho do professor alfabetizador por parte dos professores dos anos posteriores. Em contraponto a esse excesso de rigor, uma outra posio a de que os erros ortogrficos no devem ser corrigidos nem tomados como objeto de reflexo, porque o que considerado importante incentivar o aluno a escrever sem medo de errar, sem se preocupar com as regras que organizam o sistema de escrita. De acordo com essa concepo, a ortografia deveria ser estudada somente aps o domnio pelo aluno da base alfabtica.

    preciso achar o caminho do meio entre essas duas posies radicais.O ensino das regras ortogrficas parte indissocivel do processo de alfabetizao.

    Ele pode ter incio na Fase Introdutria, com a apresentao de algumas regras bsicas para a compreenso do sistema da escrita, e certamente se estender durante o Ciclo Inicial e o Ciclo Complementar de Alfabetizao. Para organizar os contedos de sua prtica, o professor precisa considerar que a decifrao do sistema de escrita faz parte dos conhecimentos a serem ensinados no processo de alfabetizao.

    No incio do processo de alfabetizao, quando o aluno comea a compreender as regras que organizam o sistema da escrita e, assim, a descobrir como funcionam os mecanismos de codificao e decodificao, no necessrio que o professor o atropele com preocupaes sistemticas com a ortografia. Nessa fase, as situaes de produo de textos criadas em sala de aula podem oportunizar o surgimento de diferentes questes dos alunos sobre a forma correta de grafar algumas palavras, que devem ser respondidas prontamente pelo professor.

    Mas, medida que os alunos vo aprendendo a escrever com certa fluncia, o professor precisa organizar de maneira sistemtica o estudo de algumas regras ortogrficas. O importante a ser considerado o fato de que os alunos no vo conseguir, ao final do primeiro ano, dominar todas as regras ortogrficas. Esse um trabalho a ser desenvolvido no apenas durante o decorrer dos trs anos do Ciclo Inicial de Alfabetizao, mas ao longo do Ensino Fundamental, considerando a progresso da complexidade dessas regras e as situaes de uso.

    Para esse aprendizado, so muito teis as discusses coletivas da adequao ortogrfica de textos produzidos pelos alunos, bem como a orientao do trabalho de autocorreo, a partir do estabelecimento de critrios compatveis com o desenvolvimento j alcanado pelas crianas e os avanos que o professor pretende desencadear.

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  • A seguir, apresentamos rapidamente algumas das regras de correspondncia entre grafemas e fonemas, organizando-as em dois grupos: o dos grafemas cujo valor no depende do contexto e o daqueles cujo valor dependente do contexto. Advertimos que, com isso, estamos longe de esgotar a questo. Essa apresentao sucinta serve apenas para que o professor tenha uma idia do quanto importante um aprofundamento nesse tema, para que possa conduzir adequadamente o seu trabalho.

    Grafemas cujo valor no depende do contexto Esse o caso dos grafemas considerados os mais fceis para o aluno aprender, pois a cada grafema corresponde apenas um fonema. So exemplos desse caso as letras p, b, t, d, f, v e tambm grupos de letras, como o dgrafo nh, que representa sempre o mesmo fonema e a nica possibilidade de grafar esse fonema em portugus. Deve-se chamar a ateno para o fato de que os valores desses grafemas no so pronunciados isoladamente, seus sons so defini