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1979-2009 © All rights reserved Sociedade Brasileira de Nefrologia Vol. 19 nº 3 - Jul/Ago/Set de 1997 Ponto de vista histórico Páginas 0 a 0 Campanha Pró ? Memória da Nefrologia Brasileira JBN Campanha Pró ? Memória da Nefrologia Brasileira http://www.jbn.org.br/detalhe_artigo.asp?id=802 1 de 1 8/27/09 4:48 PM

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1979-2009 © All rights reservedSociedade Brasileira de Nefrologia

Vol. 19 nº 3 - Jul/Ago/Set de 1997

Ponto de vista histórico Páginas 0 a 0

Campanha Pró ? Memória da Nefrologia Brasileira

JBN

Campanha Pró ? Memória da Nefrologia Brasileira http://www.jbn.org.br/detalhe_artigo.asp?id=802

1 de 1 8/27/09 4:48 PM

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Avaliação da eficácia anti-hipertensiva e tolerabilidade demonoterapia com Lisinopril em hipertensos leves e moderadosJosé Luiz Santello, Celso Amodeo, Hilton Chaves Jr., Nelson Spritzer, Thays Suslik Spritzer,Roberto J.S. Franco e Décio Mion Jr.

Introdução

A terapêutica da hipertensão arterial vemapresentando progressos consideráveis nas últimas

Avaliar a tolerabilidade e a eficácia de Lisinopril através da medida casual da pressão arterial e da

MAPA. Estudo aberto, multicêntrico, não comparativo envolvendo 69 hipertensos com pressão

arterial diastólica entre 90 e 114 mmHg após 2 semanas iniciais de placebo. A fase seguinte

constou de 7 visitas consecutivas (14, 28, 42, 70, 98, 126 e 154 dias) após a introdução de

Lisinopril 10, 20 ou 40 mg/dia. Nas visitas V0 e V7 foram feitos: MAPA, exames bioquímicos e

ecocardiograma. Em todas as visitas a medida da pressão arterial foi feita em posição supina e

ereta. A idade média foi de 49±11 anos, com 67% de mulheres. A pressão arterial supina ao final

do placebo (V0) foi de 157±15/102±7 mmHg. Em V2 a pressão arterial supina foi de 144±17/

89±10; em V4=134±16/85±8 mmHg p<0,0001 (V0>V1>V2>(V3=V4=V5=V6=V7)). As pressões

obtidas com a MAPA foram inferiores (p<0,05) na V7 em relação à V0. Em relação ao controle

pressórico (diastólica inferior a 90 mmHg), 49% obtiveram-no em V1 e 81% alcançaram-no em

V4. Em V7, 88% dos pacientes tinham tido reduções da diastólica maiores de 10 mmHg. A

tolerabilidade avaliada pelos pesquisadores foi considerada boa para 81% dos pacientes, e

insatisfatório para 6%. Aproximadamente 5% dos pacientes apresentaram tosse e foram excluídos.

A terapêutica com Lisinopril em dose única diária mostrou-se eficaz no controle da pressão

arterial e a tolerabilidade foi considerada boa.

Liga de Hipertensão HC-FMUSP, Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia-SP, HC-Universidade Federal de Pernambuco, Cardiopress/Instituto deCardiologia de Porto Alegre, Universidade Estadual de Botucatu-UNESPEndereço para correspondência: José Luiz SantelloLiga de Hipertensão-HC-FMUSPAv. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 255, 7º andar, Sala 7032CEP: 05403-900 - São Paulo, SPTel.: (011) 282-2659 - Fax: (011) 883-7683

Hipertensão Arterial, Tratamento Farmacológico, Inibidores da ECAHypertension, Pharmacological Treatment, ACE Inhibitors

décadas. Este progresso está baseado em doisaspectos: o primeiro é um melhor entendimento dosmecanismos envolvidos na hipertensão arterial 1 eseus fatores de risco, 2 o segundo aspecto a serlembrado é a evolução no desenvolvimento de novosfármacos e formulações, mais bem tolerados, combiodisponibilidade de 24 horas e efeitos não somentehemodinâmicos. 3

Apesar do contínuo avanço no conhecimentomédico e da síntese de novos fármacos, continuasendo indispensável que o paciente seja aderente àterapêutica anti-hipertensiva 4 - farmacológica etambém não farmacológica. Por isso, é desejável queos hipotensores com propriedades que permitamadministração em dose única diária possam também,em monoterapia, controlar o maior número possível

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de hipertensos, uma vez que a monoterapia tem sidouma das estratégias sugeridas para aumentar aaderência à terapêutica anti-hipertensiva. 4

Os inibidores da enzima de conversão, surgidosna década de 80, modificaram o tratamento e atémesmo a pesquisa da fisiopatologia da hipertensãoarterial. 5 Mostrou-se que esta classe de fármacos,além de reduzir a pressão arterial também reduz ahipertrofia ventricular esquerda, 6 freqüente e gravecomplicação da doença hipertensiva.

O primeiro representante desta classe de drogas -como o Captopril - tinha um efeito relativamentecurto, necessitando, para um controle efetivo dapressão arterial nas 24 horas, de 2 a 3 tomadasdiárias. Novos derivados sintéticos, como o Lisinopril,4 estão hoje disponíveis para tratamento dahipertensão arterial e suas complicações, empregandotomada única diária.

O Lisinopril é um derivado peptídico sintético,com ação prolongada - mais de 24 horas - sobre aenzima que converte a angiotensina I emangiotensina II. O Lisinopril é lentamente absorvido esem interferências com a alimentação, sendoexcretado inalterado na urina e fezes. Por estasparticularidades farmacológicas, Lisinopril é uma dasopções iniciais para o tratamento da hipertensãoarterial.

O presente trabalho objetivou avaliar a eficáciaanti-hipertensiva de Lisinopril através da análise dopercentual de pacientes que alcançaram diastólicainferior a 90 mmHg, através da quantificação daqueda da pressão arterial maior que 10 mmHg eatravés da MAPA - Monitorização Ambulatorial daPressão Arterial. Além disso, foi objetivo deste estudoavaliar a tolerabilidade e os efeitos não hemodinâ-micos da terapêutica anti-hipertensiva, entre os quaisos efeitos sobre a hipertrofia ventricular esquerda.

Pacientes e Métodos

Pacientes

Este estudo foi desenhado para avaliar pacienteshipertensos essenciais com idade superior a 18 anos ecom pressão arterial diastólica entre 90 e 114 mmHg aofinal do período placebo. Os pacientes foramconvidados a participar deste estudo clínico indepen-dentemente da raça ou sexo. Foram alocados, inicial-mente, 73 pacientes neste estudo, dos quais 69 preen-cheram todos os critérios de restrição citados abaixo.

O protocolo do presente estudo foi submetido aosComitês de Ética Médica de cada uma das cinco

instituições participantes, sendo que cada paciente sófoi incluído nesta investigação após a obtenção doconsentimento escrito e informado.

Foram considerados inabilitados para iniciar esteestudo os pacientes com diagnóstico de hipertensãosecundária, mulheres grávidas e lactentes, assim comoos portadores de disfunção renal, doença coronarianaou insuficiência cardíaca, doenças neoplásicas ou docolágeno. Não foram incluídos no estudo os pacientesque apresentaram elevações das enzimas hepáticas oudos níveis de potássio sérico. Também foramexcluídos os pacientes que fizessem uso regular dedrogas psicotrópicas, anti-inflamatórios não hor-monais, contraceptivos, descongestionantes nasais, as-sim como aqueles que apresentaram efeitos colateraiscom placebo ou droga ativa.

Métodos

Este estudo foi desenhado para ser um estudoaberto, não comparativo, com um período placeboinicial e ênfase na avaliação da eficácia de Lisinopril,administrado em dose única diária, comomonoterapia, por um período longo de tempo.

Na fase inicial, denominada “Período Placebo” ospacientes foram avaliados clinicamente e procedeu-sea substituição de todos os anti-hipertensivos,eventualmente em uso, por 1 comprimido de placeboao dia. Esta fase constou de 2 visitas, a primeira porocasião da introdução do placebo e a segunda, após14 dias, foi denominada de Visita Zero (V0). Nestaconsulta a pressão arterial, em posição supina,deveria estar dentro dos limites descritos previamente(90 < diastólica £ 114 mmHg), para que o pacientecontinuasse nas etapas subsequentes.

A segunda fase do estudo, denominada de fase“Droga Ativa-Lisinopril” constou de 7 visitasconsecutivas e sequênciais ao “Período Placebo”. As3 primeiras visitas foram realizadas, respectivamente,14 (Visita 1), 28 (Visita 2) e 42 dias (Visita 3) apósa introdução da droga ativa, enquanto as 4 consultasposteriores - mensais - foram realizadas, respectiva-mente aos 70, 98, 126 e 154 dias após o início damonoterapia com Lisinopril. A dosagem inicial deLisinopril foi estipulada em 10 mg/dia, em tomadaúnica, administrada pela manhã.

O objetivo da terapêutica anti-hipertensiva comLisinopril foi obter - em monoterapia - um ótimocontrole pressórico, definido como pressão arterialdiastólica < 90 mmHg. Desta forma, para os pacientesque após 15 dias de Lisinopril 10 mg/dia (Visita 1)não obtivessem o controle pressórico suas prescrições

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foram modificadas para 20 mg de Lisinopril/dia, doseúnica. Adicionalmente, aos pacientes que após os 14dias adicionais referidos acima (Visita 2) nãoatingissem o controle pressórico preconizado, adosagem foi aumentada para 40 mg de Lisinopril/dia,em tomada única. A partir desta etapa (Visita 3) todosos pacientes que tomaram 40 mg/dia de Lisinopril -ou dosagem inferior - mantiveram a posologia quevinha sendo utilizada, quer tenham normalizadocompletamente os valores da pressão arterial ouapenas reduzido os níveis tensionais, até o terminodo estudo.

Aos pacientes que preenchessem todos oscritérios de inclusão foram programados examessubsidiários de bioquímica de sangue, eletrocar-diograma, ecocardiograma e monitorização ambula-torial da pressão arterial. Nas visitas V0 (início da faseLisinopril), visita 5 (98 dias) e visita 7 (156 dias deuso de Lisinopril) foram quantificados os níveisséricos de uréia, creatinina, glicose, sódio e potássio,enzimas hepáticas e bilirrubininas. Exclusivamentenas visitas iniciais e finais da fase de droga ativa (V0e visita 7) foram realizados ecocardiograma,monitorização ambulatorial da pressão arterial eeletrocardiograma.

A pressão arterial foi medida com a mesmatécnica nas 9 consultas em que o paciente participoudeste ensaio clínico. Mediu-se a pressão arterialatravés de um esfigmomanômetro de coluna demercúrio com manguito padrão adaptado ao braçodireito do paciente. O aparecimento do 1º som deKorotkoff foi associado à pressão arterial sistólica e o5º som à pressão diastólica, sons estes observadosdurante a desinsuflação do manguito com acorrespondente queda da coluna de mercúrio,preconizada para ter uma velocidade de cerca de 3mm por segundo. A pressão arterial foi medida emposição supina e ereta por 3 vezes consecutivas em5 minutos, em uma sala com pouco ruido externo.Pedia-se aos pacientes que se abstivessem de fumarou ingerir derivados cafeínicos por ocasião daconsulta médica. Para fins de análise foi consideradaa média aritmética das duas últimas medidas.

As monitorizações ambulatoriais da pressão arterialforam realizadas entre segundas e sextas-feiras, comduração de 24 horas. Por ocasião da instalação, asmedidas obtidas com os monitores (SpaceLabs modelo90207-CA EUA) foram cotejadas com as obtidas com atécnica convencional. Aceitaram-se diferenças entre osdois métodos de até 5 mmHg. Foram programadasquatro medidas por hora, das 6:00 às 23:00 horas, etrês medidas no período complementar.

Os ecocardiogramas foram realizados pelosserviços de diagnóstico por imagem de cada centroparticipante deste estudo. Utilizaram-se os registros emedidas de cavidades obtidos em modo Mono eBidimensional, obtidos através de técnica padrão. Amassa ventricular esquerda foi calculada pela equaçãode Devereux e cols. 7 corrigidas pela superfíciecorpórea, também calculada através da equação/nomograma de Du Bois e Du Bois.

Ao final do estudo foi aplicado um questionáriosubjetivo para que cada pesquisador considerasse asrespostas e resultados obtidos em seus pacientes, sobo prisma da eficácia terapêutica e tolerabilidade.

Análise estatística

Foram empregados testes paramétricos para asvariáveis reconhecidamente de distribuição normal,como pressão arterial, peso, massa ventricularesquerda e níveis de glicemia. Os examesbioquímicos, ecocardiográficos e obtidos através daMAPA foram analisados através de test “t” de Student(antes vs depois de uso de Lisinopril). Para asvariáveis com múltiplas medidas, como a pressãoarterial casual, aplicaram-se técnicas de análise devariância paramétrica, com o uso do teste deBonferroni ou Dunnet para identificação dasdiferenças entre duas ou mais situações. Valores dea<0,05 foram considerados estatisticamentesignificantes. Os resultados serão apresentados comomédia ± desvio padrão da média. Quando apropriadoou necessário outras formas de representação dadispersão dos dados serão mencionadas.

Resultados

Os resultados obtidos com 69 hipertensosessenciais estiveram disponíveis para análise einterpretação. A idade média foi de 49±11 anos,com valor mediano de 50 anos. Foram do sexofeminino 67% dos pacientes; por outro lado 55%dos pacientes foram definidos como brancos e 19%como negros, os demais foram categorizadosfenotipicamente como cafuzos, mulatos e de outrasraças (Tabela 1).

Sessenta e três pacientes (91%) estavam em usode anti-hipertensivos quando do início do estudo, 28dos quais (44%) recebiam mais de uma droga -usualmente um anti-hipertensivo associado a diuréticotiazídico. Já faziam uso de um inibidor da ECA isoladaou associadamente 16 pacientes, correspondentes a23% da amostra investigada. A duração mediana do

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arterial observados entre as visitas 4 a 7 sãoapresentados na tabela 2.

A análise estatística demonstra que a pressãoarterial sistólica supina na V0 é estatisticamentediferente da registrada na visita 1 (p<0,05), que porsua vez é maior que a da visita 2 (p<0,05) e ambassão maiores que a pressão arterial obtida nas visitas3, 4, 5, 6 e 7 (p<0,05). Por outro lado, os níveistensionais sistólicos em posição supina nas visita 4, 5,6 e visita 7 não foram diferentes entre si (p>0,05).

Os valores obtidos para a pressão arterialdiastólica em posição supina são apresentados natabela 2. Igualmente, quando estes resultados sãoanalisados através de análise de variância, demonstra-se que os valores de pressão arterial diastólica entreas visitas 2 e 7 não são estatisticamente diferentes(p>0,05). Por outro lado, a pressão arterial em V0 éestatisticamente maior que a observada na visita 1(Tabela 2), que por sua vez também é maior que ada visita 2 (p<0,05).

A tabela 2 também apresenta os valores depressão arterial sistólica e diastólica em posição eretacom as respectivas análises estatísticas.

Os resultados obtidos para a freqüência cardíacae peso corporal não foram estatisticamente diferentes(p>0,05) nas 9 visitas deste estudo (Tabela 3).

A análise dos resultados dos exames laboratoriaisobtidos na V0, visita 5 e visita 7 não mostraramnenhuma diferença estatística entre os valores deeritrócitos, leucócitos, glicemia, creatinina, uréia,sódio, ácido úrico, colesterol e triglicérides. Os níveisde potássio foram estatisticamente maiores após aintrodução de Lisinopril (V0 = 4,05 ± 0,37 vs visita 7=4,37 ± 0,69 - p<0,05). Os resultados dos principaisexames de laboratório são apresentados na tabela 3.

Tabela 1Características da população analisada.

Pacientes 69

Idade 49 ± 11 anos (variando entre 20 e 73)

Sexo 67% mulheres, 33% homens

Raça 55% brancos, 19% negros, 25% outros

Uso prévio de

anti-hipertensivos 91% pacientes; maioria há mais de 1 ano

Uso de mais de

1 anti-hipertensivo 44% pacientes

Uso de IECA

(isolado ou associado) 23% pacientes

Pressão arterial supina (mmHg):

Início de Placebo 146 ±18 X 98 ± 14 p<0,05 vs V0

15 dias de Placebo - V0 157±15 X 102 ± 7

Os resultados são apresentados como média ± desvio padrão. V0 = Visita 0,corresponde à visita realizada após 15 dias de placebo e também a do início daterapêutica com Lisinopril.

Tabela 2Pressão arterial sistólica e diastólica em posição supina, em posição ereta antes (V0), durante (V1 a V6) e depois (V7) de 5 meses de Lisinopril.

Pressão Arterial (mmHg)Posição Supina Posição Ereta

Visitas Dias Sistólica Diastólica Sistólica Diastólica

V0 0 157±15 102±7 154±17 103±7

V1 14 144±20 93±11 140±20 93±11

V2 28 141±17 89±10 137±20 91±12

V3 42 137±18 88±9 133±18 90±11

V4 70 134±16 85±8 130±18 86±10

V5 98 133±15 86±8 131±16 87±9

V6 126 134±15 87±9 130±14 86±7

V7 154 133±16 87±13 130±15 85±9

Sistólica supina: p<0,0001:V0 > V1 > V2 > (V3=V4=V5=V6=V7).Diastólica supina: p<0,00001:V0 > V1 > (V2=V3=V4=V5=V6=V7).Sistólica ereta: p<0,0001:V0 > (V1=V2) > (V3=V4=V5=V6=V7).Diastólica ereta: p<0,0001:V0 > V1 > (V2=V3=V4=V5=V6=V7).

tratamento anti-hipertensivo prévio foi de 1 ano. Emrelação ao hábito de fumar, 12% se declararamtabagistas (Tabela 1).

A pressão arterial inicial em decúbito dorsal porocasião do início do período placebo (Tabela 1) foide 146 ± 18 por 98 + 14 mmHg, respectivamente parapressão arterial sistólica e diastólica. Ao final doperíodo placebo (V0), a pressão arterial supinaelevou-se para 157 ± 15 por 102 ± 7 mmHg (p < 0,05- início vs fim do período placebo, tanto para pressãoarterial sistólica, quanto para diastólica).

A pressão arterial sistólica supina na visita 1 foide 144 ± 20 mmHg. Os valores tensionais na visita 2,visita 3 e visita 4 foram respectivamente 141 ± 17;137 ± 18 e 134 ± 16 mmHg. Os valores da pressão

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Em relação aos valores de pressão ambulatorialobtidos com a MAPA, tanto a pressão arterial sistólicaquanto a diastólica foram estatisticamente (p<0,05)menores na visita 7 em relação a V0, quer durante avigília, quer durante o período de sono. Os valoresda pressão arterial média antes e depois daterapêutica com Lisinopril, tanto no período de vigíliacomo de sono, são mostrados na figura 1. Em todosos pontos analisados a pressão arterial média depoisdo tratamento foi inferior (p<0,05) aos valores obtidosantes da terapêutica.

Em cada visita foi verificado o percentual depacientes que lograram efetivo controle da pressãoarterial com Lisinopril (pressão arterial diastólicasupina e em pé inferior a 90 mmHg). Deste modo,para a pressão arterial diastólica supina na visita 1,cerca de 49% dos pacientes já tinham alcançado oalvo da terapêutica anti-hipertensiva, enquanto navisita 2 este percentual elevou-se para 59%, 64% na

visita 3 e 81% em visita 4. Os percentuais de sucessoterapêutico em posição supina e ereta são apresen-tados na tabela 4.

Em relação à análise da eficácia terapêuticaatravés dos percentuais de visitas com queda superiora 10 mmHg verificamos que na visita 1, 37 pacientes(54%) apresentaram reduções > 10 mmHg nadiastólica supina em relação a V0. Na visita 4 estepercentual foi de 77%, enquanto na V7 observamosque este percentual elevou-se para 88%. Não houvediferenças significativas quando foram comparadasreduções superiores a 10 mmHg em relação à pressãoarterial diastólica inicial, separadas em dois estratos:maior que 100 e menor que 100 mmHg.

Em relação à tolerabilidade de Lisinopril foiverificado que 34% dos pacientes apresentaram algumsintoma ou sinal, atribuível ou não, ou uso do anti-hipertensivo, a maioria deles inespecíficos e auto-limitados. No que se refere à tolerabilidade avaliada

Tabela 3Valores médios das concentações de sódio, colesterol total, potássio, creatinina e glicemia no soro, eritrócitos no hemograma,

peso corpóreo e frequência cardíaca: antes, durante (Visita 5) e após 154 dias (Visita 7) de Lisinopril.

Sódio Potássio Creatinina Glicemia Eritrócitos Colesterol Pêso Frequência

(mEq/l) (mEq/l) (mg/dl) (mg/dl) (milhões) (mg/dl) (kg) cardíaca

Visitas

Antes

(V0) 140±4 4,0±0,4 0,9±0,2 96±15 4,7±0,5 200±46 71,6±11 77±12

Durante

(Visita 5) 139±4 4,1±0,5 0,9±0,2 94±16 4,6±0,5 202±40 71,3±10 75±11

Depois

(Visita 7) 140±3 4,3±0,7 * 0,9±0,1 98±16 4,7±0,5 207±43 71,7±11 76±12

Os resultados são expressos como média ± DP* = p<0,05 vs antes da terapêutica com Lisinopril

Tabela 4Eficácia de controle da hipertensão arterial (diastólica < 90 mmHg)

com Lisinopril entre as visitas inicial e final

Percentual dos pacientes com pressão arterialDiastólica < 90 mmHg

Visitas Posição Supina Posição Ereta

V0 0 4

Início Lisinopril

V1 49 49

V2 59 50

V3 65 60

V4 81 74

V5 78 75

V6 78 76

V7 79 77

% de controle em posição supina e ereta: V4=V5=V6=V7Figura 1. Mapa pré e pós 5 meses de tratamento com Lisinopril.

6- 9 10- 13 14- 17 18- 22 23- 2 3- 570

80

90

100

110

120

* * * *

* *

Horas do dia

Pressão Arterial Média (mmHg) n= 69

* = p<0,05 vs. pré

Pré Lisinopril

Pós Lisinopril

Desvio Padrão

Desvio Padrão

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pelo examinador, cerca de 50% dos pacientes foramconsiderados como tendo excelente a tolerabilidade,31% boa, 13% regular e 6% insatisfatória.

Foi verificado que 32% pacientes receberamLisinopril na dose de 10 mg/dia, 42% receberam 20mg Lisinopril/dia e os restantes 25% receberam 40mg/dia. A dosagem média em todo o grupo avaliadofoi de 22,5 mg/dia.

Dentre os 69 pacientes, 6 deles (8%) nãoterminaram o estudo devido a motivos diversos: 2abandonaram o tratamento, 3 interromperam esteestudo devido a efeitos colaterais (todos emdecorrência da tosse) e 1 paciente apresentou umacidente vascular isquêmico transitório.

A avaliação da tolerabilidade através de questio-nário aos examinadores recebeu conceito excelente/bom em 81% dos pacientes e insatisfatório em 6% dosexaminados. Em relação à eficácia terapêutica, o con-ceito bom/excelente foi aplicado a 88% dos pacientese 3% receberam conceito insatisfatório.

Em relação ao exame ecocardiográfico foiverificado que nos 13 pacientes (19%) queapresentavam hipertrofia ventricular esquerda aoprimeiro exame houve redução da massa ventricular,sem, no entanto, alcançar a significância estatísticarecomendada para este tipo de análise (p<0,05-bicaudal).

Discussão

Os resultados mais relevantes obtidos nesteestudo clínico foram: a) a redução da pressão arterialcom a introdução de Lisinopril, b) o excelente nívelde efetivo controle da hipertensão leve/moderadacomo monoterapia, c) a boa tolerabilidade, d) aredução da pressão arterial ambulatorial com a MAPA,sem modificar o padrão do ciclo vigília/sono e) bomperfil metábólico e bioquímico observados após 5meses de terapêutica efetiva.

O desenho do estudo privilegiou avaliar asmodificações observadas na pressão arterial após aadministração de Lisinopril, assim como a utilizaçãode diferentes critérios para quantificar o efetivocontrole da pressão arterial (queda absoluta dapressão diastólica, percentuais de visitas comdiastólica menor que 90 mmHg, percentuais de visitascom queda maior que 10 mmHg e MAPA),enfatizando a administração isolada de Lisinopril.

O segundo objetivo deste estudo foi documentara provável redução da massa ventricular esquerda,principalmente nos pacientes portadores dehipertrofia ventricular esquerda (HVE).

Com o objetivo acima referido, o protocolo desteestudo foi desenhado para ter uma duração total deaproximadamente 6 meses de terapêutica. Utilizou uminibidor da ECA, um dos anti-hipertensivos reco-mendados na vigência de HVE; empregou umrepresentante desta classe de hipotensores com umperfil que permitia controle pressórico nas 24 horas,comprovado neste estudo pela MAPA, e utilizou umfármaco que como monoterapia e dose única - emmédia 22,5 mg/dia - permitiu a normalização dos níveistensionais e, certamente, deve ter contribuido para aaderência ao tratamento. No entanto, este estudo nãodemonstrou estatisticamente a redução da hipertrofiaventricular esquerda. Vários motivos podem tercontribuido, isolada ou associadamente, para isto. Emprimeiro lugar, devemos enfatizar que mais de 90% dospacientes já vinham utilizando anti-hipertensivo antes departiciparem deste estudo. Além disso, a maioriamantinha este esquema terapêutico há mais de 1 ano,muitos deles (24%) utilizando um inibidor da ECA e/ouum diurético tiazídico; em outras palavras, já tomavamdrogas com efeitos benéficos sobre a HVE. O estudoTOMHS 7 demonstrou que os tiazídicos têm efeito sobrea redução da massa ventricular esquerda em hipertensosleves após um período de 5 anos, e Dahlöf e cols. 9

demonstraram que os inibidores da ECA são dos anti-hipertensivos aqueles com efeito mais rápido naredução da massa de ventrículo esquerdo.

Um outro aspecto a ser mencionado é que amaioria dos nossos pacientes eram mulheres ehipertensos leves, conforme pode ser inferido pelosvalores médios observados com a MAPA na visita V0.Por isso, embora haja relatos de uma prevalência deHVE de 35-50%, em hipertensos leves e moderados,na nossa amostra este índice foi de somente 19%. Aassociação de fatores citada anteriormente, assimcomo o pequeno número de pacientes com HVE (amaioria com HVE discreta) não permitiu acomprovação dos efeitos do Lisinopril sobre a HVE,fato que, no entanto, já foi comprovado na literatura.

No que se refere à redução da pressão arterial, osvalores expressos na tabela 2 demonstram umaredução significativa da pressão arterial já na visita 1e estes valores foram decrescendo progressivamenteaté a terceira ou quarta consulta, conforme fosseanalisada a sistólica ou diastólica em pé ou deitado.Estes resultados demonstram um efeito progressivo esuave na redução da pressão arterial paralelamenteao aumento da dose administrada. Além disso,observe-se que a partir da visita 4 os valores médiosde pressão arterial já são significativamente menoresque os registrados no início do estudo, quando 91%

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dos pacientes faziam uso de anti-hipertensivos e amaioria com mais de uma droga.

Merece ênfase a informação de que cerca de 80%dos pacientes receberam até 20 mg/dia, assim comoa verificação de que aproximadamente 80% dospacientes alcançaram pressão arterial inferior a 90mmHg, uma das recomendações mais recentes dosgrandes estudos multicêntricos, como o “HOT Study”,10 que avalia a longo prazo os efeitos da reduçãoefetiva da pressão arterial entre 85 e 95 mmHg. Osresultados preliminares são favoráveis à obtenção deum controle pressórico mais rigoroso.

Os resultados obtidos através da MAPA confirmamo controle efetivo ao longo das 24 horas do Lisinoprile comprovam, ainda, que depois de quase 6 mesesde terapêutica não houve escape ou taquifilaxia,aspecto comumente observado em algumas classes deanti-hipertensivos.

Finalmente, foram registrados em 34% dospacientes “efeitos colaterais, adversos e nãoexplicados”, dos quais a maioria de curta duração eauto-limitado. Foram obrigados a se retirarem doestudo, devido a tosse, 3 pacientes correspondente aum índice de 5%, semelhante à prevalênciadocumentada para os inibidores da ECA em geral.

A percepção subjetiva dos examinadores emrelação à eficácia e tolerabilidade foram superponíveisaos índices objetivos, baseados em redução, controleda pressão arterial e índice de intolerabilidade, esteoriundo do índice de exclusão do estudo.

Em conclusão, neste ensaio clínico aberto, comuma fase inicial de placebo, documentou-se nãosomente a redução estatisticamente significante dapressão arterial, mas também elevado índice decontrole efetivo da pressão arterial com Lisinopril.Frise-se o controle rápido e progressivo da pressãoarterial através de monoterapia em dose única diária.

Summary

Evaluation of tolerability and effectiveness oflisinoprill by casual blood pressure measurements andABPM (Ambulatory Blood Pressure Monitoring).

Open, multicentric, non-comparative studyinvolving 69 hypertensives with diastolic blood pressurebetween 90 and 114 mmHg after 2 weeks of placebo.The next step had 7 visits (at 14, 28, 42, 70, 98, 126 and154 days) after introduction of lisinopril 10 or 20, or 40mg/day. On visits V0 and V7 ABPM, biochemistric testsand echocardiogram were performed.

During all visits the blood pressure measurementswas performed in supine and orthostatic position.

The age of patients was 49±11 yrs, 67% waswomen. Supine blood pressure after placebo (V0) was157±15/102±7 mmHg. The blood pressure in visit 2 was144±17/89±10 mmHg, whereas in V4 was 134±16/85±8mmHg - p<0,0001 (V0>V1>V2>(V3=V4=V5=V6=V7)).Data obtained with ABPM showed blood pressurehigher in V0 (p<0,05 vs V7). In relation toeffectiveness of blood pressure control (diastolic < 90mmHg), 49% obtained this goal in V1 and 81% in V4.In visit 7, 88% of patients reached diastolic bloodpressure reductions higher than 10 mmHg. The overalltolerability was considered good in 81% patients andinadequate in 6% of them. About 5% of patients hadcough and were excluded of this study.

Once day Lisinopril was effective in hypertensivepatients. The tolerability of this drug was consideredgood and there was low incidence of side effects.

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and Management. Second Edition, Raven Press, 1995

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Ponto de Vista HistóricoMarli Cavalheiro Gregório

Clínica médica, uma das bases da NefrologiaProfessor Luiz Décourt, um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Nefrologia einstituto do Coração do Hospital das Clínicas da F.M.U.S.P.

A situação da nefrologia brasileira, dentro do amplo campo da clínica médicaevoluiu de uma forma muito natural, desejável e até explicável pela própria atuação dosprofissionais da especialidade. Atingiu o patamar do reconhecimento internacionalgraças ao aprimoramento que foi surgindo pouco a pouco e não de improviso. Aopinião é do professor Luiz Décourt, um dos fundadores da Sociedade Brasileira deNefrologia, que foi criada dentro da 2 Clínica Médica, sob a sua direção.

Professor da Faculdade de Medicina da USP entre 1950 e 1981, o doutor Décourtlembra que “há muitos anos atrás o ensino da clínica médica na FMUSP foi divididoem duas cadeiras: a 1a clínica médica, que era dirigida pelo professor Antonio deBarros Ulhôa Cintra, e a 2ª sob a minha direção. De comum acordo dividimos ossetores abordados por essas cadeiras em doenças do coração, do pulmão, do fígado, dosangue e do rim, que foram reunidas em dois grupos: um que ficou com o doutor Cintrae outro comigo”.

A parte das doenças renais estava a cargo do doutor Cintra e de seus assistentes.Segundo o doutor Décourt, em torno de 1952, os professores Emílio Matar e SilvioSoares de Almeida davam os primeiros cursos para os alunos da faculdade. “Nessaépoca o setor de doenças renais se incluía num grupo mais amplo, o das doençasmetabólicas. Assim o que se considerava dentro da fisiopatologia e da própria clínicanefrológica era o papel do rim em seus aspectos metabólicos, de equilíbriohidroeletrolítico, manuseio de proteínas e de glicose.”

Porém, acrescenta ele, gradativamente foi havendo uma compreensão mais amplae mais precisa da própria nefropatia. Ele destaca alguns aspectos mais significativos.“Em primeiro lugar não podemos esquecer o trabalho do doutor Tito Ribeiro deAlmeida que, em 1949, criou o rim artificial. Atitude que trouxe não só grande auxílioterapêutico, mas também uma visão mais específica do próprio funcionamento renal”.O professor Décourt assinala que o doutor Tito enfrentou inúmeras dificuldades e comseu aparelho - uma variante do equipamento de Kolff-Merril - ampliou o campo deatividade da nefrologia. “Nessa ocasião se desenvolviam em nossas enfermarias algunsgrupos mais especializados no estudo das doenças renais.”

O professor lembra que em 1952 o doutor Israel Nussenzveig, que atuava na 2ªclínica médica, conseguiu uma bolsa de estudos em Bruxelas e Paris. Ele pesquisavavários aspectos das doenças renais e na Europa teve oportunidade de se aprofundarnesse campo. “Enquanto o doutor Israel estava fora criei um grupo especializado no

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estudo das doenças renais, inclusive com assistentes de outras clínicas”. Isso ocorreupor volta de 1954 e sob a direção do professor José de Barros Magaldi - que era muitointeressado no estudo da hipertensão - atuavam os doutores Homero Pastore, EmilSabbaga, Carlos Vilela de Faria e outros.

Maior reconhecimento das nefropatias

“Já contávamos com um rim artificial, tínhamos um grupo que estudava asdoenças renais e um profissional que tinha se especializado na Europa”, conta oprofessor. Quando o doutor Israel chegou foi desenvolvido um novo setor, o debiópsias renais. Era 1955. “Nesse setor foi iniciada uma técnica relativamente original,que depois contou com outros médicos, inclusive o doutor Décio de Oliveira Pena, da1ª clínica médica e que pôde desenvolver mais o reconhecimento das nefropatias pelabíópsia renal.”

Segundo o professor Décourt. no final da década de 50, havia uma condiçãobastante satisfatória para o desenvolvimento das pesquisas e dos profissionais denefrologia. No Rio de Janeiro, o doutor Jayme Landmann realizava alguns trabalhos dehemodinãmica. “Já existia um corpo de profissionais disciplinados e entusiastas doestudo das doenças renais. Assim, no final da década, o doutor Israel propôs a fundaçãode uma sociedade brasileira de nefrologia. Em 1943 tinha sido fundada a SociedadeBrasileira de Cardiologia que serviu como estímulo para a criação da SBN. “A idéia dodoutor Israel contou logo com a aprovação do doutor Magaldi, que dirigia o setor dedoenças renais.” Assim, a formação da entidade tornou-se uma diretriz de nossopensamento’.

A idéia foi amadurecendo e tornou-se exequível no início da década de 60.Aproveitamos uma ocasião muito significativa, que foi a vinda do professor JeanHamburger, chefe da Clinique de Maladies Métaboliques, de Paris para fundar a SBN”.Segundo o doutor Décourt, o professor Hamburger não era apenas um grande clínico,mas um construtor de atividades. Naquela época ele já tinha tentado realizar transplanterenal. “O professor e dois assistentes vieram para uma conferência e o convidamos paraser um dos padrinhos da SBN. Assim, em 2 de agosto de 1960, no anfiteatro da minhaclínica houve a sessão inaugural”. Ele ressalta que além dos convidados e fundadoresestavam presentes o professor Cantídio de Moura Campos, diretor clínico do Institutodo Coração. “Quase por unanimidade foi criado o cargo de presidente para o professorMagaldi e o de vice-presidente para o doutor Jayme Landmann.”

“Estava criada a SBN”, diz o professor, para quem toda a parte científica estavasendo articulada, embora ainda tivesse poucos médicos que pudessem titular-se comonefrologista. Ele enfatiza que a parte burocrática coube ao doutor Lineu Genovesi Pires,que era procurador do Hospital das Clínicas. “É um nome que deve ser mencionado,pois como advogado do H.C. ele sempre exerceu suas atividades não apenas comcompetência, mas com grande carinho”.

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Papel importante no desenvolvimento da área

Na nefrologia houve um amadurecimento progressivo, na opinião do professorDécourt. “Não houve nenhuma improvisação, mas um amadurecimento dos médicos edas instituições interessadas. A SBN foi colhida como um fruto maduro numa árvoreainda não muito frondosa, mas suficiente para dar um fruto com capacidade de sedesenvolver”, afirma o doutor Décourt que acompanhou todos os passos iniciais dasociedade, podendo ver como ela se projetou no meio médico brasileiro. Esse foi oprimeiro degrau e esse fruto estava destinado a ter um grande papel nodesenvolvimento da área”.

Segundo o professor, quando a SBN foi criada já existiam médicos, grupos eclínicas capacitados a enfrentar os problemas médico, social e de pesquisa danefrologia. Provavelmente ela representou um grande estímulo à nefrologia brasileirapois, pouco a pouco, começaram a surgir os interessados.Progressivamente aquele fruto maduro criou um campo de atividade muito grande e arealização do I Congresso Brasileiro, apenas dois anos depois de fundada, demonstrounão só a maturidade da instituição, mas a sua importância.”

Entusiasmado, o professor Décourt acentua que nesses 37 anos de existência, aSBN representa o que uma sociedade médica deve ser efetivamente: uma fonte decongraçamento e de união para que cada especialista transmita um ao outro a suaexperiência.

Ele ressalta a colaboração da equipe do setor de anatomia patológica da FMUSP,“sem a qual os trabalhos seriam sempre parciais”. Houve um grande interesse do setore, em especial, dos professores Thales de Brito e Luiz B. Saldanha que se interessaramprofundamente pelos aspectos anátomo-patológicos da função renal.“Contemporaneamente a fundação da SBN, o professor Thales já vinha se interessandopor essa parte.”

Em todos os seus anos como professor e desde 1970 no Instituto do Coração-Incor, do Hospital das Clínicas, que ele fundou junto com o professor Zerbini e ondetem sua cadeira cativa, o doutor Décourt assinala que na nefrologia presenciou váriasconquistas. Não apenas quanto ao aperfeiçoamento do conhecimento das doençasrenais, mas principalmente quanto à terapêutica como o transplante renal. Sobre essasconquistas ele diz: o progresso de qualquer ciência e a médica, em particular, se apóiaem dois aspectos: de um lado o mais perfeito reconhecimento da doença, dodiagnóstico preciso e precoce, do reconhecimento da gravidade e de suas complicações.“Estabelecido esse quadro em que se possa ter um diagnóstico satisfatório, cabe asegunda parte, que é o tratamento, com uma oferta de terapias muito mais eficientes,não só através de medicação, mas por meio do rim artificial.”

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O professor assinala que o progresso ocorrido na nefrologia nesses quase 40 anosnão aconteceu apenas em São Paulo, mas em várias outras cidades brasileiras. “Umquadro desejável e necessário para que o Brasil seja competente em seu todo e nãoparcialmente, e a SBN contribuiu de forma extraordinária”.

Ele lembra que no início da especialidade existiam poucos centros. São Paulo eRio de Janeiro recebiam profissionais que desejavam se aprimorar. Mas, rapidamente,diferentes capitais se tornaram centros de treinamento. Porto Alegre é um deles. “Esseaprimoramento poderia ter ocorrido espontaneamente, pela própria evolução daMedicina. Mas, sem dúvida que o progresso, que é quase uma contingência dodesenvolvimento do País como um todo, contou com uma entidade construtora,disciplinadora e favorecedora do trabalho e do preparo de equipes especializadas”.

Foi com muito “orgulho e satisfação que na minha clínica foi criada aoportunidade de fundar a Sociedade, que representou a união de duas clínicas e tornou-se o terreno fértil para todos que desejavam se especializar”, diz ele, acrescentando queela foi a mãe de diferentes unidades e hoje seus filhos estão no País inteiro, comocentros renais de alto gabarito.

O doutor Décourt faz uma analogia entre a SBN e uma avenida, em que as viaslaterais levam a desembocar nela. “Iniciativas de vários locais, respeitáveis e desejadas,porém limitadas no tempo caminharam pelas vias laterais até a avenida principal ondepassava o grande cortejo dos interessados na nefrologia, no sentido de trazer para aespecialidade uma alta e eficiente atividade.”

Arcabouço da Nefrologia

Na opinião dele, na segunda metade da década de 60, completou-se o que sechamou de “arcabouço da nefrologia no Brasil”, constituindo-se em uma especializaçãoque atendia a todos os requisitos de uma especialidade com clínicos competentes,médicos capacitados para prescrever a medicação e fazer o reconhecimento dasdoenças. Enfim, profissionais especializados em diferentes técnicas de exames e detratamento com o rim artificial”.

“Profissionais de diferentes laboratórios de São Paulo e de outros centrosconduziram trabalhos experimentais de importância”, ressalta o doutor Décourt.Médicos capacitados para estabelecer a rotina de tratamento, não só a terapêuticaclínica adequada, mas também capazes de escolher métodos paralelos de terapêutica dealta importância. Ele considera que as pesquisas laboratoriais se desenvolveramprogressivamente, contando com o auxílio dos estudos dos natopatologistas quefornecem os resultados das biópsias renais e das necrópsias.

Relembrando os tempos passados e seus contemporâneos, o professor conta quemuitas vezes conversando com os doutores Magaldi e Sabbaga falava de sua“expectativa, para não dizer da minha certeza, de que a SBN seria um núcleo fecundo,

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como aconteceu. Desde a sua criação esperávamos uma boa evolução e o futuroconfirmou nossas expectativas. Hoje ela representa uma das principais sociedadesmédicas brasileiras, com projeção internacional”.

Na opinião do professor, o estágio atual da nefrologia brasileira está no mesmopatamar da mais aprimorada nefrologia internacional. Ele explica que do ponto de vistado aperfeiçoamento estamos no mesmo plano de outros países. “Não creio que umtransplante renal seja feito em qualquer outro país melhor do que se faz aqui. Temosequipes que nada ficam a dever às equipes estrangeiras”. Porém, devem serconsideradas as possibilidades econômicas, pois em algumas regiões os centrosenfrentam dificuldades financeiras.

“Determinados aparelhos e medicamentos podem chegar com pequeno retardo oque, muitas vezes, limita a atuação de alguns centros, fazendo com que a evolução daárea ocorra um pouco depois que nos Estados Unidos e na Europa”. Somando todos osaspectos, o doutor Décourt ressalta que o aperfeiçoamento dos profissionais brasileiroscompensa em grande parte as deficiências econômicas. “A demora na aquisição de umaaparelhagem mais sofisticada não representa, a meu ver, uma grande redução naprojeção internacional.”

Concluindo, o professor acentua que houve um grande desenvolvimento danefrologia. Uma demonstração disso é a presença de nefrologistas brasileiros noscongressos internacionais, cujos trabalhos “nada ficam a dever aos do PrimeiroMundo”.

Novas drogas marcam o progresso do transplante renal

Professores Luiz Estevam lanhez, (HC-FMUSP) e José Osmar Medina Pestana(Hospital São Paulo - UNIFESP/EPM)

Há 30 anos atrás, a realização de um transplante era um ato de heroísmo.Começava com o especialista indo buscar o paciente em casa, depois eram entre seis aoito horas no centro cirúrgico, sem contar que não existia UTI. ‘Era uma aventura”,resume o professor Luiz Estevam lanhez, chefe da Unidade de Transplante Renal doHospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, que participou do segundotransplante realizado no Brasil, em julho de 1965. Uma atividade menos “heróica”, masda mesma forma um trabalho intenso, quando o professor José Osmar Medina Pestana,chefe da Equipe Médica de Transplantes e diretor clínico do Hospital São Paulo daUniversidade Federal de São Paulo-UNIFESP/EPM, implantou o Programa deTransplantes, em 1983, ele fazia tudo sozinho desde a abordagem da família, a retiradados órgãos, a seleção do receptor e o transplante. “Fazia as vezes até de offíce-boy,correndo atrás de exames”, Observa ele.

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Uma área que cresceu bastante nos últimos 20 anos. Até dezembro de 1978tinham sido transplantados 1.169 pacientes em 29 centros. Atualmente existem 110centros distribuídos pelo País e cerca de 8 mil transplantes realizados. Ainda estamoslonge do ideal”, diz o professor Ianhez, pois são feitos 11 transplantes por 1 milhão dehabitantes, quando o ideal seriam 40 por milhão. “Em qualidade estamos bem, masestamos ruim em quantidade”.

Um dos membros da equipe do professor Emil Sabbaga, quando começou nestaárea, o doutor lanhez assinala que o grande progresso ocorreu no campo da imunologia,fazendo com que diminuísse consideravelmente os casos de rejeição híperaguda e deperda de enxerto imediato pós-transplante, principalmente nos casos com doadorcadáver. O professor Medina complementa que o surgimento da ciclosporina e deanticorpos monoclonais e policlonais para conter a rejeição, fizeram com queatualmente a chance de um transplante renal dar certo é de 80 a 90%.

A técnica cirúrgica para a realização de um transplante não foi alterada nodecorrer dos últimos 40 anos. É a mesma utilizada quando foi feito o primeirotransplante em Boston, na década de 50. Para o professor Ianhez o que aconteceu foique o cirurgião ficou mais experiente, passou a utilizar doadores que antes não eramaproveitados. “Hoje se usa rim com quatro artérias ou rim de recém-nascidos, o que nãose fazia anos atrás”, diz ele. Acrescenta que “com o aumento do número detransplantes, os resultados melhoraram, as complicações cirúrgicas - quer as vasculares,quer as neurológicas-diminuíram, e esses fatores contribuíram para o progresso doaprendizado do cirurgião”. Na opinião do professor Medina, a técnica é totalmentedominada, o que faz com que o índice de complicações em seu Serviço seja semelhanteao que ocorre em centros de países desenvolvidos.

Segundo o professor Ianhez, nos anos 80 houve um grande avanço na melhoriada técnica. “Em relação à técnica propriamente dita, acho que houve progressos quantoá retirada dos órgãos, que antigamente não era padronizada. Isso ajudou a aproveitarmais os órgãos de cadáver”. O surgimento das soluções de conservação de órgãos foioutro progresso, pois hoje é possível manter um rim vivo, sem ser transplantado por até48 horas, enquanto há anos atrás o período era de no máximo 24 horas. Ele consideraque quando os transplantes foram iniciados havia muitas limitações, superadas ao longodos anos.

Do ponto de vista clínico, toda a Medicina evoluiu no entender do professorIanhez, que considera que atualmente os métodos diagnósticos das complicaçõesinfecciosas - que são um grande problema do transplantado - progrediram muito. “Hojeexistem técnicas de diagnóstico - sorológicas, de cultura ou por imagem - bastanteavançadas, que não existiam alguns anos atrás. Contamos com ultrassom, ecodoppler,ressonância magnética, tomografia, aparelhos que permitem que os diagnósticos sejamfacilitados, tanto nas doenças infecciosas como em outras complicações.” Quandoiniciou nesse campo, o professor lembra que os médicos contavam apenas com o raio-Xe o exame de urina. “Os exames eram muito limitados. Quando um transplantado tinha

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uma dor no enxerto, não se sabia o que era. Então era realizada outra cirurgia para verse era coleção de urina ou se era sangue. Enquanto hoje, quando o doente é colocado namesa já sabemos qual é o problema.”

Desenvolvimento do diagnóstico e da terapêutica

O doutor Ianhez considera que houve um grande desenvolvimento do diagnósticoe também da terapêutica. As UTIs, instaladas na década de 80, foram uma grandecontribuição, pois antes delas - no caso dos transplantados- a mortalidade era de 50%.Hoje, entre 10 a 15% acabam morrendo devido a complicações.

Um passo importante que começa a ser dado no Pais, segundo o professorMedina, é a seleção do receptor baseado na compatibilidade HLA. Apesar de oslaboratórios de imunologia e imunogenética ainda existirem em pequeno número, elestêm recursos suficientes para fazer a seleção adequada e com isso as “chances de umtransplante dar certo são bem maiores”. Na opinião dele, nos últimos dez anos foramdesenvolvidas as técnicas de diagnóstico. “Hoje, o resultado de uma cultura de sanguepara saber qual a infecção do paciente é obtido com maior rapidez e é muito mais fácilfazer. Isso traz um grande benefício ao transplante, inclusive confundindo o peso dessebeneficio em relação ao peso da imunossupressão”.

Para o doutor Medina - que iniciou nessa área com os professores Sabbaga,Ianhez, Campanário e Saldanha - as novas drogas que foram surgindo ao longo dosanos ganharam repercussão em função do que acontece concomitantemente na melhoriadas formas de diagnóstico e de tratamento. “O aparecimento dessas drogas e deantibióticos têm hoje um espectro muito maior, embora as bactérias também estejamadquirindo maior resistência aos antibióticos anteriores. Estão surgindo drogas comatividades anti-virais que antigamente não existiam e que hoje são mais uma chance detratamento”.

Já na opinião do doutor Ianhez, as drogas imunossupressoras não mudaram muitonos últimos anos. Ele lembra que a chamada terapêutica clássica que lançava mão dacortisona e da azatioprina foi aplicada até os anos 80. Com o surgimento daciclosporina houve uma melhora na diminuição do número de rejeição, aumentando asobrevida dos pacientes e permitindo o uso de doses menores de cortisona e deazatioprina. Com isso diminuíram as complicações. “Esse quadro durou até os anos 90,quando surgiu outra droga, a micofenolato-mofetil para substituir a azatioprina. Opanorama não alterou muito, pois essas drogas são de manutenção.” O professorassinala que existe outro medicamento produzido no Japão e que está sendo testado nosEstados Unidos, que substitui a ciclosporina. Trata-se do FK-560. “É administradoquando a ciclosporina não é indicada.” O doutor Ianhez observa que ainda não existeoutra droga de manuseio imunossupressor, embora a tendência seja obtermedicamentos cada vez mais eficientes e menos nocivos.

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No tratamento das crises de rejeição, ele ressalta que as globulinas policlonaissurgiram na década de 60 e, no decorrer dos anos, foram apenas aperfeiçoadas. “Sãodrogas antigas que começaram com os transplantes”. Ainda segundo o professor, jáexistem em estudo outros tipos de anticorpos dirigidos a células do sistemaimunológico na tentativa de diminuir o número de rejeição. Atualmente com os novosesquemas é possível reduzir a taxa de rejeição a 30%, enquanto há alguns anos pelosmenos 60% dos pacientes tinham rejeição. “Isso é importante, porque reduzindo onúmero de rejeição aguda também se reduz o de rejeição crônica.”

O transplante a longo prazo

O professor Ianhez entende que o grande problema atualmente é que“aprendemos a tratar o transplantado muito bem até os dez anos de enxerto, massabemos pouco sobre o transplante a longo prazo. Hoje temos doentes com mais de 20anos de transplante que apresentam uma série de complicações. A principal é a altaincidência de câncer.” Essa é uma tendência mundial, segundo ele, sendo que no Brasilesse índice não é tão elevado porque “não usamos muito os monoclonais e policlonaispor serem terapêuticas caras. Para nós isso é um grande fracasso, porque um transplantenão pode ser pensado para apenas 20 anos. Deve ser para toda a vida, e isso preocupa”.Outro problema sério enfrentado pelos transplantados, segundo o doutor lanhez, são asdoenças cardiovasculares, porque as drogas para a hipertensão facilitam a evolução daarteriosclerose. E uma questão que não se tem conseguido resolver, como também nãose resolve na população em geral.

“Não apenas com relação aos transplantes, mas com a assistência médica demodo geral, o Pais dispõe de todos os recursos que os hospitais americanos, porexemplo. A grande diferença é que esses recursos se restringem a algumas regiões”. Aopinião é do doutor Medina, que considera que embora existam recursos, eles não estãodisponíveis para toda a população. “O que diferencia a atividade médica no Brasil daatividade nos países desenvolvidos é a heterogeneidade. O transplante faz parte disso.Há instituições com equipes altamente treinadas. Porém essa situação não acontece emtodo o País. Existem cidades com alguns milhões de habitantes que não contam comprograma de transplante”. Segundo ele, os programas que existem são de qualidade,contam com recursos semelhantes aos dos centros americanos, mas são restritos a umapequena parcela da população.

No entender do professor Ianhez, aqui o transplante é uma atividade maislocalizada em hospitais-escola. É trabalhosa e mal paga. “O transplante não é só acirurgia, mas todo o acompanhamento que esse procedimento exige.” Nos primeirosseis meses o paciente tem de ser examinado semanalmente. Ele lembra que em suaUnidade no HC apenas 20% dos leitos são reservados para esse procedimento, osdemais 80% são usados por pacientes que já foram transplantados e precisam dereinternação. “Com esse número de leitos conseguimos fazer 80 transplantes anuais, se

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me dessem 40 leitos poderia fazer 160. O que não falta é paciente.” A lista de espera doHC é de 2 mil doentes.

Segundo ele, o problema é fundamentalmente de ordem econômica. Apesar de oBrasil contar com centros bem instalados, equipes treinadas, drogas adequadas e UTIs,falta incentivo para fazer transplante e tampouco se “cria estrutura para isso. A nova leide transplantes, a lista única, nada disso altera o quadro atual, porque a estrutura decaptação ainda é inadequada”. Já na opinião do doutor Medina, tem aumentado onúmero de equipes transplantadoras. Ele enfatiza que o HC de São Paulo e o HospitalSão Paulo são as duas principais instituições formadoras de especialistas. “O fato dostransplantes serem pagos pelo Sistema Único de Saúde-SUS, faz com que o interesse dehospitais e de equipes médicas seja bastante restrito, por causa da baixa remuneração edo tipo de paciente. Não é o transplante em si, mas o acompanhamento ambulatorialpós-transplante que é trabalhoso.”

O professor Medina ressalta que, apesar das dificuldades, é uma área “fascinante,porque oferece desafios”. Mas, por outro lado, devido principalmente à remuneração,não aumentou muito o interesse por esse campo. “Esses programas oferecem poucasoportunidades, pois trata-se de um campo restrito em função do pequeno número detransplantes. Porém os profissionais que enveredam por este caminho têm grandedisposição para o trabalho e acabam encarando o desafio.”

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Contribuição da nefropatia diabética para a insuficiência renalcrônica na Grande São PauloFlavio Mendonça Pinto, Meide S. Anção, Marlene Sakumoto, Sandra R. Gouvea Ferreira

Disciplina de Nefrologia, Centro de Informática em Saúde e Depto deMedicina Preventiva da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP/EPMEndereço para correspondência: Sandra R.G. FerreiraDepartamento de Medicina Preventiva, UNIFESP/EPMRua Botucatu, 740CEP 04023-062 - São Paulo, SPTel.: (011) 571-6934 - Fax: (011) 549-5159E-mail: [email protected]

Insuficiência Renal Crônica, Diabetes Mellitus, Nefropatia DiabéticaChronic Renal Failure, Diabetes Mellitus, Diabetic Nephropathy

A nefropatia diabética (ND) constitui a principal causa de insuficiência renal crônica (IRC) em

pacientes que ingressam em diálise em países desenvolvidos, contribuindo o diabetes insulino-

dependente (DMID) e o não dependente de insulina (DMNDI) em proporções semelhantes.

Avaliamos a importância da ND como causa de IRC, pela análise dos pacientes que ingressaram em

programas de diálise em 1991 na Grande São Paulo, usando como fonte o banco de dados da

Secretaria da Saúde do Estado. Dentre 5.140 pacientes em diálise em dezembro/91, o DM

contribuiu para 9% (n=479) das causas, estando atrás da causa indeterminada (36%), da

glomerulonefrite (26%) e hipertensão (17%). A faixa etária onde situava-se o pico de casos de ND

foi de 60-69 anos, enquanto que para as demais causas foi entre 40-49 anos. Houve predomínio de

homens renais crônicos (57 vs 43% de mulheres), comportamento esse que tendeu a se acentuar

na presença de DM (61 vs 39%). Dos 1.687 que iniciaram diálise, 183 (11%) eram diabéticos. As

incidências anuais de IRC por DM, glomerulonefrite e hipertensão foram de 10, 20 e 15 pacientes/

milhão. Embora para os indivíduos diabéticos a hemodiálise tenha sido o principal tipo de

tratamento, a DPAC e peritoneal aparecem em proporções maiores do que em não-diabéticos. A

sobrevida atuarial dos pacientes diabéticos no período foi de 67%, enquanto que para os demais

renais crônicos foi de 82%. De 246 transplantes, 16 foram feitos em diabéticos. Concluímos que,

apesar de significativa, a ND é a causa mais freqüente de IRC no nosso meio, com base nos dados

de 1991. Em contraste com países desenvolvidos, a contribuição relativa do DMNDI pode ser maior

do que a do DMID entre nós. Sugere-se que homens possam ter risco mais elevado de desenvolver

IRC por ND. A presença de DM piora a sobrevida de pacientes em diálise.

Introdução

O Diabetes Mellitus (DM) tem assumidoimportância crescente em termos populacionais noúltimo século. Considerando o contingente mundial deindivíduos diabéticos, na sua grande maioriaportadores de DM não dependente de insulina(DMNDI), a complicação macrovascular aparece comoa principal responsável pela morte desses indivíduos.1 Ao lado da macroangiopatia, também a microan-giopatia a nível renal, representa importante fator asso-

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ciado à mortalidade, em particular nos diabéticosinsulino-dependentes (DMID). Ainda que ainsuficiência renal crônica (IRC) possa não representara causa direta de morte na maior parcela de DMNDI,estudos epidemiológicos mostram que a presença danefropatia constitui fator de risco independente,adicional para eventos cardiovasculares. 2 Estásedimentado na literatura o valor da pesquisa demicroalbuminúria não apenas no DMID mas tambémno DMNDI, como marcador de lesão vasculargeneralizada e de risco cardiovascular. 3, 4

O Estudo Multicêntrico sobre a Prevalência de DMno Brasil 5 apontou taxa média ao redor 7,6% napopulação adulta, provavelmente portadora deDMNDI. Estudo prospectivo de incidência de DMIDem cidades paulistas mostrou que aproximadamente 8em 100.000 crianças abaixo de 15 anos de idade setornam diabéticas a cada ano, 6 aumento na incidênciatem sido constatado em alguns países. 7, 8 Por acometeruma população jovem, há grande chance dodesenvolvimento das complicações crônicas dadoença. Entre indivíduos com DMID, a nefropatiadiabética (ND) figura como a principal causa da morbi-mortalidade elevada, 9, 10 acometendo ao redor de 35%destes. 11 Essa proporção é variável quando se trata doDMNID 12, 13 e, na dependência do grupo étnico, aprevalência de ND pode atingir até 50%. 14

Estudos estrangeiros (EUA, Japão, Escandinávia eEuropa Ocidental) mostram que o número dediabéticos que compõem a população de indivíduosem diálise vem aumentando nos últimos anos. 15 Em1990, nos EUA, a ND contribuiu para mais de 30% detodos os casos que ingressaram em diálise, sendometade destes com DMID e metade DMNDI. 16 Osregistros do European Dyalisis and TransplantAssociation - EDTA, também indicam elevadas taxasde prevalência de IRC por ND nessa década, havendovariação de país para país. 17 Considerando o registrogeral dos países europeus, a causa diabética para IRCdesponta como a primeira em freqüência na Europa,seguida da glomerulonefrite e hipertensão arterial. ASociedade Latino-Americana de Nefrologia mostrouque 19,7% dos indivíduos que ingressaram em diáliseem 1991 eram diabéticos, 18 cifra inferior à verificadano primeiro mundo. 19

A magnitude desse problema tende a se agravar,uma vez que os avanços terapêuticos e a melhora naesperança de vida fazem aumentar a prevalência dasdoenças crônicas. A variabilidade na contribuiçãorelativa do DM para a IRC leva a crer que exista umrisco variável de desenvolver tal complicação entre aspopulações. Dados da literatura mencionam que

indivíduos com DMID desenvolvem IRC mais jovensque aqueles com DMNDI e, para ambos os tipos, ohomem necessita de diálise com maior freqüência emais cedo do que a mulher. 20 Grupos de alto risco paraa IRC incluem os índios Pima, os americanos de origemmexicana e os americanos negros, enquanto que os deorigem asiática têm as menores incidências de ND. 21

Comparando as taxas de mortalidade relativa entregrupos raciais observa-se que o indivíduo negrodiabético em diálise apresenta taxa de mortalidade 45%menor do que a do branco. 22 Além do componentegenético, outros fatores contribuem para a ocorrência daND, como a duração prolongada do DM, principalmentese combinada a um controle metabólico precário. 23 Apresença de hipertensão ou de antecedente familiar dehipertensão arterial, o fumo e o índice de massacorporal elevado também têm se associado ao risco deND. 24-27 Em diversos estudos, a maioria dos pacientesdiabéticos que ingressam em diálise são DMNDI. 28, 29

No nosso meio, entretanto, as características dosindivíduos diabéticos que desenvolvem a IRC são poucoexploradas e é desconhecido se os fatores de riscoassociados a essa complicação, descritos para outraspopulações são válidos entre nós.

O Registro Brasileiro de Diálise e TransplanteRenal constatou em 1984 a existência de 4.132pacientes em tratamento dialítico em 131 centrosdistribuídos pelo país. 30 Em 1993, foram publicadosdados do V Registro Brasileiro de Diálise e Trans-plante Renal, referentes a 77 centros de transplantescadastrados. 31 A partir da criação dos SistemasUnificados de Saúde (SUS), tais procedimentospassaram a ser autorizados pelos próprios SUSregionais, permanecendo a Comissão de Nefrologiado GEPRO de Doenças Crônico-Degenerativas com acoordenação técnico-administrativa a nível do Estadode São Paulo. As causas de IRC divulgadas foram:glomerulonefrites crônicas, nefropatias vasculares(nefroesclerose benigna/maligna), nefropatiasintersticiais crônicas, doenças metabólicas (diabetes),nefropatias hereditárias e outras. Recentemente forampublicados dados epidemiológicos sobre tratamentodialítico na Grande São Paulo, onde o diabetesaparece como a terceira causa mais comumentereportada de doença de base em pacientes em diálise.32 Nesse Estado, a Secretaria da Saúde, com o apoiodo Centro de Informática em Saúde, da UniversidadeFederal de São Paulo, elaborou um cadastramentoeletrônico desses indivíduos no ano de 1991, a partirde formulários preenchidos pelos serviços de diálise.

Tendo em vista a taxa de prevalência de DM nonosso meio e seu importante papel entre as causas de

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IRC, justifica-se uma investigação da sua contribuiçãoentre nós. A proposta deste trabalho foi a de avaliara prevalência de doença renal diabética como causade tratamento dialítico na Grande São Paulo, assimcomo estimar a incidência de IRC por ND nos centrosde diálise dessa área, durante o ano de 1991.

Pacientes e Métodos

Após aprovação do estudo pela Coordenação doSetor de Saúde do Adulto da Secretaria da Saúde doEstado de São Paulo, este estudo foi realizado combase em dados específicos registrados por este órgãoem 1991, que tem o controle de todos os serviços dediálise cadastrados nas diversas regionais do SistemaÚnico de Saúde desse estado. A “área-alvo” foi aGrande São Paulo (anteriormente denominada deMacrorregião 1 do estado) que abrange “sub-áreas”administrativas ilustradas na figura 1. Informaçõessobre serviços de diálise da Grande São Paulo foramprocessadas pelo setor informática desta Secretariaem conjunto com o Centro de Informática em Saúdeda Escola Paulista de Medicina/UNIFESP. Num estudotransversal foi feito um levantamento das causas,baseado nos dados de formulários-padrão NEFRO/2,“Solicitação para Tratamento Dialítico Crônico”, eNEFRO/4, “Censo Mensal de Unidade de Diálise”. Aprevalência de DM nesta população de dialisados foicalculada para o último dia do ano de 1991, sendodefinida como a porcentagem dos pacientesdiabéticos que se encontrava em tratamento dialítico,quando esta causa figurava como a doença de base

que determinou esse procedimento. A incidência deND como causa de IRC terminal foi estimada atravésdo número de novos casos ocorridos mês a mês nosserviços de diálise durante o período de um anodividido pela população exposta da Grande SãoPaulo, de todas as faixas etárias, no meio do período.A fonte utilizada para obtenção desse dadopopulacional foi o censo estadual, cujos dados foramfornecidos pela Secretaria da Saúde. Analisou-se,ainda, a distribuição dos pacientes diabéticos quantoao sexo, faixa etária e tipo de tratamento dialítico,comparando-os com a distribuição observada nosdemais pacientes renais crônicos por outras doençasde base. Dados quanto a raça não estavamdisponíveis nos formulários-padrão. O número depacientes vivos ao final de cada mês foi estudado noperíodo dos 12 meses de 1991 e a sobrevida dosportadores de DM foi comparada com os demaisrenais crônicos.

Na análise estatística foi utilizado o teste do qui-quadrado na comparação das frequências entre osgrupos de pacientes renais crônicos com e sem odiagnóstico de DM como doença de base. Fixou-seem 5% o nível de rejeição da hipótese de nulidade.

Resultados

Um total de 5.140 pacientes em tratamentodialítico foi observado em dezembro de 1991.Dentre estes, o DM figurava como a doença básicaque determinou a IRC em 479 indivíduos (9%),estando atrás da causa indeterminada (36%), daglomerulonefrite (26%) e hipertensão arterial (17%)(Figura 2). Dos 1.687 que iniciaram diálise no

Figura 1. Esquema da distribuição por critério administrativo das áreas da

Grande São Paulo em 1991.

Figura 2. Causas de insuficiência renal crônica na Grande São Paulo nos

pacientes (n=5.140) em diálise, em dezembro de 1991.

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período, 183 (11%) eram diabéticos. A estimativapara a população total da Grande São Paulo no meiodo ano de 1991 foi de 17.853.000, resultando emincidência anual de 10,2 casos novos de IRC por DMpor milhão de habitantes. As incidências porglomerulonefrite e hipertensão arterial foram,respectivamente, de 20,2 e 15,1 casos por milhão. Adistribuição dos pacientes renais crônicos quanto aosexo, mostrou que tanto no grupo de diabéticoscomo no dos demais renais crônicos houve umpredomínio de homens com relações homem/mulherde 1,56 e de 1,33, respectivamente, as quais nãoforam estatisticamente diferentes entre si. Por outrolado, observando-se a distribuição por faixa etária(Figura 3), nota-se nitidamente que a IRC nos

Figura 3. Distribuição dos pacientes em diálise na Grande São Paulo por

faixa etária, em 1991.

Figura 4. Distribuição dos pacientes renais crônicos na Grande São Paulo

segundo a modalidade de diálise, em 1991.

Figura 5. Sobrevida atuarial de pacientes em diálise na Grande São Paulo

no ano de 1991.

Discussão

A importância deste estudo se baseia, entreoutros, no fato de enfocar numa amostra dapopulação brasileira a contribuição da ND para a IRC,já que neste sentido os dados são pouco conhecidosem nosso meio. Sendo o Estado de São Paulo umaunidade da federação desenvolvida, e a hemodiáliseum procedimento especializado, grande parcela dosindivíduos submetidos a esse tratamento encontra-se

pacientes diabéticos ocorreu numa fase mais tardiada vida (60-69 anos), quando comparados com osdemais renais crônicos (40-49 anos). Quanto àmodalidade de tratamento dialítico, em ambos osgrupos de renais crônicos houve predomínio dahemodiálise, ocorrendo parcela significantementemaior de pacientes diabéticos em diálise peritonealambulatorial contínua (DPAC), quando comparadoscom os não-diabéticos (31% vs 14%,respectivamente, p<0,0001 (Figura 4). A sobrevidaao final do período de um ano de tratamentodialítico foi menor entre os diabéticos (67% vs 82%,p<0,0001) (Figura 5).

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aqui concentrada. Este Estado representa ainda hojeum importante foco de imigração de várias regiões domundo, resultando numa população de grau elevadode miscigenação e com características próprias.

A idéia do presente estudo surgiu do pressupostode que, à semelhança do que tem sido observado emdiversos países em relação à ND, nos quais chega aser a causa mais freqüente de tratamentos de suporterenal, esta poderia ocupar uma posição significativaentre as doenças determinantes da terapia dialíticaentre nós. A causa diabética representou no períodoestudado a quarta causa mais freqüente de IRC emnosso meio, contrastando com outros dadosreportados na literatura. 33, 34 Se desconsiderarmos aorigem indeterminada, o DM passa a ocupar a terceiraposição dentre as doenças de base diagnosticadas,diferindo de países do primeiro mundo, onde temsido apontado como a principal condição que levaindivíduos a programas de diálise. 16, 17, 19 Suacontribuição para a IRC também tem sido sentida noJapão, 35 onde a incidência do DMID é reconhe-cidamente baixa, no Oriente Médio 36 e, com menorpeso, na América Latina. 18 Entre nós, uma análiseanterior das características de pacientes em diálise emSão Paulo situou a causa diabética na mesma posição,em ordem de freqüência de doença de base, que aobtida no presente estudo. 32 A grande proporção deIRC de origem desconhecida no nosso meio deve servista como uma notória imprecisão dos nossosdiagnósticos etiológicos. Pode, ainda, refletir aineficácia do nosso sistema de saúde para fazerdiagnósticos em fases precoces de doenças crônicasque, primária ou secundariamente, acometem os rins.Caberia especular se meios diagnósticos maisprecoces, associados a tratamentos mais eficazes paraglomerulonefrite e hipertensão arterial, e com maioraderência a eles por parte dos pacientes, poderiamimpedir ou ao menos retardar a evolução para a faseterminal de IRC. De fato, a experiência clínica do dia-a-dia tem nos mostrado que a hipertensão arterial estásendo subtratada no nosso meio, o que pode estarcontribuindo para que seja a segunda doença de basemais freqüente, determinante de IRC. Especificamenteem relação à terapia anti-hipertensiva na vigência deND, inúmeros estudos prospectivos corroboram paraessa idéia, uma vez que o controle rigoroso dosníveis pressóricos reduziram significativamente avelocidade de perda de função renal em portadoresde DMID. 37 No entanto, não cabe aqui discutir ospossíveis motivos para a falha no combate àhipertensão arterial, os quais, certamente, não sãodependentes da inexistência de drogas anti-

hipertensivas eficazes. Espera-se, assim, que a curtoprazo sejam tomadas medidas que possam reduzirambas as incidências, de IRC por DM (10,2 casosnovos/milhão/ano) e de IRC por HA (15,1 casosnovos/milhão/ano).

No que diz respeito ao sexo e IRC pela ND,nossos achados mostraram um predomínio do sexomasculino, o que está de acordo com a literatura. 38

Na verdade, esse excesso de homens renais crônicosnão se restringe ao DM como a doença de basedeterminante da IRC, 39 dado esse que seriaconcordante com a análise aqui realizada sobre ogrupo de renais crônicos da Grande São Paulo, cujodiagnóstico não era o de ND.

A faixa etária que englobava o pico de casos deIRC que não tiveram a ND como doença de base foientre 40 e 49 anos de idade. Analisando-seseparadamente os indivíduos diabéticos dos demaisrenais crônicos, a “idade-pico” mostrou-se desviadapara direita, dado este que poderia sugerir que umaparcela considerável destes diabéticos fosse portadorade DMNDI. Tal sugestão poderia parecer, entretanto,em desacordo com estudos de autópsia, os quaisrevelaram que 30 a 50% dos portadores de DMID, esomente 5 a 10% daqueles com DMNDI, morrerampor IRC. 40, 41 De fato, é conhecida a marcadadiferença na frequência pela qual os dois tipos de DMdesenvolvem a complicação renal, sendo ao redor de35% para os indivíduos DMID 11 e de 6% para osDMNDI, para alguns autores. 12 Todavia, deve serressaltado que o DMNDI é muitas vezes maisprevalente nas populações do que o DMID, podendo-se especular que, no contexto geral de algumaspopulações, haveria equilíbrio ou mesmo predomíniodaquele como causa de IRC, o que acontece empaíses de baixa incidência de DMID.

A modalidade de tratamento dialítico maiscomumente utilizada na nossa amostra foi ahemodiálise, caindo sua proporção ao se analisarisoladamente o grupo diabético e aumentando a dediálise ambulatorial peritoneal contínua - DPAC. Esteachado não surpreende ao considerarmos queexperiência com a DPAC tem trazido resultadossatisfatórios no acompanhamento a médio prazo depacientes diabéticos em terapias de substituição renal,sendo em alguns países a primeira escolha entre asmodalidades de tratamento. 42 A comparação dosnossos resultados com dados do EDTA 17 a respeito dadistribuição das modalidades fica prejudicada, umavez que o transplante renal é computado entre estasna Europa, dado não disponível no nosso trabalho.Apesar da freqüência de diabéticos em DPAC na

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Grande São Paulo, ao redor de 31%, não contrastarcom a de outros países, é bastante superior àsreportadas pelo US Renal Data System para o ano de1989, quando 66,1% dos indivíduos com IRC por NDsubmetiam-se à hemodiálise, em contraste com 9,3%à DPAC. 43 Os defensores da DPAC para o pacientediabético se apóiam em fatos como o deste estar maissujeito a intercorrências durante a preparação dafístula arteriovenosa ou durante as sessões dehemodiálise. Além de dificuldades técnico-cirúrgicasadvindas de artérias calcificadas, episódios frequentesde hipotensão e o risco da heparinização naquelescom retinopatia têm restringido o uso da hemodiálisea pacientes diabéticos. 44 Utilizando a DPAC, por suavez, o controle da hipertensão arterial é mais fácildevido à contínua ultrafiltração, característica essatambém desejável para o portador de insuficiênciacardíaca congestiva. Especialmente importante para odiabético é a possibilidade de se usar a via peritonealde absorção de insulina, a qual se relaciona a ummelhor controle glicêmico. 45 Como desvantagens,merecem citação o risco substancial de infecção,particularmente a peritonite ou situada no túnel docateter 46 e a hiperlipidemia, decorrente da contínuaabsorção de substâncias altamente calóricasatravessando o peritônio. 47

A sobrevida dos pacientes renais crônicosdiabéticos, avaliada durante o período de um ano, foimenor do que a dos não-diabéticos. Esta observaçãoera esperada diante da elevação nas taxas demortalidade cardiovascular associada à presença daND em pacientes com DMNDI e DMID. 48 Nossosachados são concordantes com dados norte-americanos que reportaram mortalidade mais elevadaentre os diabéticos em hemodiálise quandocomparados com os hemodialisados não-diabéticos,sendo as doenças cardiovasculares e sepsis asprincipais causas de morte. 49

Apesar de não ser a primeira causa de IRCcomo ocorre em países desenvolvidos, o DM pareceocupar no nosso meio uma posição importantecomo determinante desta síndrome, segundoindicam os dados de 1991. A incidência de IRC porND só perdeu para a de glomerulonefrite ehipertensão arterial na Grande São Paulo. Estudosposteriores se fazem necessários para confirmar asituação da ND dentre as causas de IRC entre nós,ou detectar uma possível alteração da mesma, àmedida que surgem progressos no diagnóstico etratamento das nefropatias. Nossos dados revelarama necessidade de se instituir medidas de prevençãopara esta complicação diabética, a fim de minimizar

os agravos à saúde do indivíduo diabético,melhorando sua qualidade e expectativa de vida.Ao lado disso, também poderão ser reduzidos osgastos das instituições públicas destinados àmanutenção de pacientes em programas de suporterenal.

Summary

Diabetic nephropathy (DN) is the main cause ofrenal failure (RF) for patients starting dialysisprocedures in developed countries, and both,insulin-dependent and non-insulin dependentdiabetes, contribute in similar proportions. Braziliandata do not confirm such situation and mostfrequently the cause of RF is unknown. Theimportance of DN for RF was assessed consideringthe number of patients starting dialysis therapy in1991 in the São Paulo metropolitan area. Thesource used was the State of São Paulo HealthSecretary data bank. Among 5,140 patients ondialysis in December 1991, 9% (n=479) was due toDN; the cause was unknown in 36%,glomerulonephritis in 26% and hypertension in 17%of the patients. Most of the DN cases was in theage group 60-69 years, while for the others causeswas 40-49 years. The distribution according to sexshowed preponderance of men than women (57%vs 43%), and this pattern was even clearer in thepresence of diabetes (61% vs 39%). Among 1,687patients starting dialysis in 1991, 183 (11%) haddiabetes. Incidence rates of RF due to DN,glomerulonephritis and hypertension were 10, 20and 15 cases/million of people at risk in the middleof the period. Although hemodialysis had been themain modality of treatment for diabetic patients,CAPD and peritoneal dialysis were used in higherproportions than in non-diabetic patients. Actuarialcurves revealed that 67% of the patients with DNand 82% of the others were alive at the end of 1-yr follow-up. Sixteen out of 246 renaltransplantation were performed in diabetic people.We concluded that DN did not represent the maincause of RF in São Paulo according to the datacollected in 1991, despite being considerablyimportant. In contrast to developed countries,percent contribution of non-insulin-dependentseemed to be higher among Brazilians. It issuggested that men may be at higher risk to RF dueto DN than women. The presence of diabetes inpatients on dyalisis is associated to elevatedmortality.

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Artigo recebido em 8 de novembro de 1996 e aceito parapublicação em 22 de maio de 1997

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oxigênio e silício. Dentre os metais, é o maisabundante (8,3% em peso) ao qual só se comparamo ferro (6,2%) e o cálcio (4,6%). 1 Esta abundância,associada a propriedades que determinam umagrande diversidade de uso, tornam a determinação detraços de alumínio extremamente difícil e trabalhosa,devido principalmente ao constante risco decontaminação das amostras.

A onipresença do alumínio se deve princi-palmente a emissões antropogênicas em função doseu grande emprego a nível industrial. Além de seuuso geral como metal, o óxido de alumínio écomponente de quase todos os tipos de vidros, ecompostos de alumínio são utilizados comocatalisadores na fabricação de plásticos. Isto eliminaqualquer possibilidade de encontrar recipientes livresde traços de alumínio, a não ser que tenham sidoespecialmente preparados para isto.

O uso de sulfato de alumínio como agentefloculante em estações de tratamento de águarepresenta uma fonte adicional de contaminação, umavez que traços de alumínio existentes na água nãosão totalmente eliminados pelos processosconvencionais de purificação - destilação e troca-iônica - usuais em laboratórios.

A nível biológico e relacionado à insuficiênciarenal são importantes a análise do sangue e dassoluções para diálise. A concentração de alumínio nosangue 2 situa-se em torno de 7 µg/l, e nas soluçõespara diálise não deve ultrapassar 15 mg/l, segundo o

Introdução

A análise da água e, principalmente, de águatratada não é tarefa difícil de executar, bastando paraisto instrumental adequado; entretanto, a primeiradificuldade surge quando a espécie a ser determinadaestá em concentração baixa, abaixo de miligramas porlitro - ou seja a nível de traços, como classificam osquímicos analíticos.

Neste caso, a aparelhagem necessária é maissofisticada e, consequentemente, mais qualificadadeve ser a mão-de-obra para operá-la. A segundadificuldade está na espécie a ser determinada a nívelde traços. Neste ponto o alumínio assume um papelquase único em virtude de sua elevada toxicidadepara pessoas com insuficiência renal e de sua grandeabundância em nosso planeta.

O alumínio é o terceiro elemento mais abundanteda crosta terrestre, sendo superado apenas pelo

Alumínio em Diálise - Uma visão analíticaDenise Bohrer

Departamento de Química, Universidade Federal de Santa MariaEndereço para correspondência: Denise BohrerUniversidade Federal de Santa Maria Campus UniversitárioCEP 97111-970 - Santa Maria, RSFone: (055) 220-8438 Ramal 2438 - Fax: (055) 220-8031E-mail: [email protected]

Alumínio, Contaminação, Soluções para DiáliseContamination, Aluminum, Dialysis Solutions

Uma das maiores dificuldades encontrada na análise de traços está na contaminação,

principalmente quando concentrações muito baixas de uma espécie abundante como o

alumínio devem ser medidas. A dificuldade é ainda maior quando muitas etapas para a análise

são necessárias, pois há uma extramanipulação da amostra. Este artigo descreve o grau de

contaminação e o seu controle na análise de traços de alumínio em soluções para diálise,

onde concentrações de alumínio em torno de 15 µg/l devem ser determinadas, bem como a

contaminação por alumínio encontrada em materiais e outros fluidos utilizados em diálise.

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comitê da IUPAC. 3 A análise destas amostras exigeaparelhagem ainda mais sofisticada que a utilizadapara águas e é necessário, por parte do analista, maisdo que o simples conhecimento de operações básicasde laboratório.

Para uma determinação segura de quantidadestão pequenas, considerando a complexidade dasmatrizes, a sensibilidade da maioria dos métodosnão permite uma determinação direta. A técnicamais empregada neste tipo de análise é aespectrometria de absorção atômica em forno degrafite (GFAAS), 4 com a qual, via de regra, pode-semedir diretamente baixas concentrações. Mas, tantopara as soluções de diálise quanto para amostrasbiológicas, mais especificamente o soro sangüíneo,uma determinação direta não é possível. Devido àsua alta concentração salina, as soluções de diálisesão diluídas previamente, encontrando-se naliteratura diluições de até 37 vezes. 5 No caso dosoro, diluições de no mínimo 1:1 são usuais. 6

Em função da baixa concentração, problemas comcontaminação existem a partir da coleta da amostra,do tipo de recipiente para a armazenagem e limpezado mesmo, bem como da presença de partículas depoeira no ar. Às amostras de sangue acrescentem-seainda traços de alumínio provenientes da pele dopaciente, uso de agulhas e seringas e, quandonecessário, de agentes anticoagulantes.

Oster e Prellwitz, 7 em uma revisão sobre oassunto, propõem uma série de medidas a seremadotadas na análise de alumínio no sangue, desde acoleta até a determinação propriamente dita. Osautores chegam a sugerir que os “primeiros mililitros”de sangue retirados dos pacientes sejam desprezadosa fim de evitar contaminação.

De acordo com Savory, 8 os maiores problemas dadeterminação de alumínio, a nível biológico, estão nosmétodos imprecisos de análise e na contaminação. Agrande imprecisão dos métodos está relacionadadiretamente à baixa concentração do analito somadaà extrema complexidade das matrizes, seja pelaelevada concentração salina, no caso das soluções dehemodiálise, ou pelo elevado número de constituintesno caso do sangue.

Mesmo a determinação de alumínio na águautilizada para preparo da solução de diálise não seconsegue a precisão desejada, como mostra umestudo recentemente publicado envolvendo 56laboratórios ao longo de 5 anos. Nesse estudo, cadalaboratório recebeu mensalmente duas amostras defluido para diálise e duas amostras de água quecontinham quantidades conhecidas de alumínio. Para

concentrações de até 30 mg/l, os resultadosapresentaram desvios padrões relativos entre 45,1% e92,3% no caso das soluções e entre 35,2% e 128,6%para a água. Na opinião dos autores, resultados tãopouco satisfatórios podem ser atribuídos ainterferências da matriz e à ausência de materiais dereferência. Em outro estudo 10 da mesma natureza, aconcentração de alumínio no soro de pacientes foideterminado por um grupo de laboratórios italianos,no período entre 1983 e 1990. Segundo os autores,uma parcela muito pequena dos laboratórios (9,1%)apresentou resultados satisfatórios e, ainda assim, nãode maneira constante ao longo do tempo em que oestudo foi realizado. Eles atribuem a contaminação àgrande dificuldade em analisar baixas concentraçõesde alumínio.

Este trabalho pretende mostrar o quão realmenteproblemático e importante é o controle dacontaminação na determinação de traços dealumínio. Foram analisados materiais e reagentesenvolvidos com a coleta e análise de alumínio emsangue e com o preparo de soluções parahemodiálise. As análises foram realizadas medindodiretamente a concentração de alumínio das amostrasquando estas permitiram uma análise direta. A análisede sais e concentrados para o preparo das soluçõessó foi possível após a separação da matriz salina, quepromoveu simultaneamente uma concentração doalumínio da amostra.

Material e Métodos

Equipamentos

Espectrômetro de absorção atômica Perkin Elmer1100B com forno de grafite HGA 700 e amostradorautomático AS-70, câmara de fluxo laminar classe 100TROX, homogeinizador KL 2 Edmund Bühler, bombaperistáltica Gilson Minipuls-3 com mangueiras desilicone de 1 mm de diâmetro.

Reagentes

Solução estoque de alumínio com 1000 mg/lpreparada com Al(NO

3)

3.9H

2O; solução aquosa de

cromoazurol S 0,6 % (m/v); solução tampão pH 5,8(0,5 mol/l ácido succínico/NaOH); soluções HNO

3/

etanol 0,3 % e 10 % (v/v).Os reagentes utilizados foram de qualidade para

análise da firma Merck. As soluções aquosas forampreparadas com água destilada e posteriormentetratada em sistema Milli-Q (Millipore).

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Procedimentos

Todas as medidas foram realizadas porespectrometria de absorção atômica em forno degrafite (GFAAS), cujas condições de operação estãodescritas na tabela 1. As amostras foram divididas emtrês grupos, de acordo com o procedimento utilizadopara a sua análise:

alumínio forma com o cromoazurol S (CAS) umcomplexo que é fortemente adsorvido (retido) empolietileno em pó (PE). Sendo este procedimentorealizado em uma coluna preenchida com PE em pó, ocomplexo fica retido na coluna e a matriz salina édescartada. Como coluna utilizou-se uma ponteira depipeta descartável (1000 µl) preenchida comaproximadamente 300 mg de PE. O complexo retido foieluído com a solução HNO

3/etanol 0,3% e nesta

solução, livre da matriz, o alumínio foi determinado porGFAAS. Nestas análises utilizou-se 20 ml de amostra e4 ml eluente, o que eleva em 5 vezes a concentraçãodo alumínio da amostra original. O desenvolvimento dametodologia foi realizado com soluções padrão dealumínio obtidas por diluição da solução estoque comconcentrações entre 2 e 16 µg Al/l e como controle,utilizando amostras sem alumínio, que receberam omesmo tratamento. Para o procedimento, 20 ml deamostra são adicionados a 200 µl da solução tampão e300 µl da solução do complexante cromoazurol S. Após15 min., a amostra é aspirada através da coluna de PEpor meio da bomba peristáltica, com uma velocidade de0,5 ml/min. O complexo Al-CAS adsorvido ao PE éeluído, após a lavagem da coluna com 10 ml de água,com 4 ml de eluente (solução HNO

3/etanol 0,3 %).

Precauções com a contaminação

Todas as análises foram executadas adotando-seas seguintes medidas:

- Utilização de água destilada e posteriormentepurificada em um sistema Milli-Q;

- Lavagem de todo o material por pelo menos 48h em solução de HNO

3/etanol 10%;

- Utilização de ácido nítrico destilado;- Extração do alumínio do polietileno em pó por

agitação de uma suspensão do mesmo em solução deHNO

3/etanol 10 % por 48 h; e- Execução de todas as etapas da análise, à

exceção da medida no espectrômetro de absorçãoatômica, em câmara de fluxo laminar.

Resultados e Discussão

Na tabela 2 estão os teores de alumínio extraídosdos materiais deixados em contato com a soluçãoetanólica de HNO

3. Alguns autores utilizam o ácido

nítrico em solução aquosa 13-16 para descontaminaçãode recipientes, bem como soluções de ácidoclorídrico 9, 17 e de agentes quelantes como o EDTA.18, 19 Neste trabalho optou-se por uma soluçãoetanólica de HNO

3, 20 pois a capacidade do etanol

em “molhar” tanto a superfície do vidro quanto do

a) recipientes e materiais : frascos de vidro de 50 ml,frascos de polietileno de 50 ml, seringas de 10 ml eagulhas para injeção. Os recipientes e as seringas foramenchidos, de acordo com as suas capacidades, com asolução HNO

3/etanol 10%. As agulhas foram mergulha-

das nesta mesma solução dentro de um recipientepreviamente descontaminado como abaixo descrito.Estes materiais ficaram nestas condições por 48 h sobagitação para a extração do alumínio, sendo a soluçãoposteriormente analisada diretamente por GFAAS.

b) reagentes e fluidos de análise direta : ácidonítrico com diferentes graus de pureza (p.a., Suprapure destilado), ácido sulfúrico, ácido tricloroacático,sulfato de sódio e tungstato de sódio diluídos emágua suficiente para formar soluções a 5%. Aconcentração de alumínio nestas soluções foideterminado diretamente por GFAAS. Soluçãofisiológica, glicose, heparina e proxitane foramanalisados sem diluição prévia.

c) reagentes e fluidos que necessitaram separação damatriz : cloreto de potássio, cloreto de sódio, cloreto demagnésio, cloreto de cálcio, acetato de sódio e soluçõesconcentradas para hemodiálise foram submetidos a umtratamento para a separação do alumínio. 11, 12 O

Tabela 1Condições de operação do espectrômetro de absorção atômica.

Parâmetro

Gás Argônio

Comprimento de onda 309,3 nm

Fenda 0,7 nm

Corrente 25 mA

Correção Lampada de deutério

Volume amostra 20 µl

Modificador químico -

Programa de temperatura

Etapa Temperatura Rampa Residência Fluxo gás(°C) (s) (s) (ml/min)

1 110 20 30 300

2 300 20 20 300

3 1700 20 30 300

4* 2500 0 5 50

5 2650 1 3 300

* leitura.

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plástico é maior que a da água, havendo neste casoum contato mais efetivo para a extração do alumínioda superfície destes materiais. Nestas condiçõesobservou-se que 48 h de contato é um temposuficiente para que o alumínio presente nasuperfície do material seja removido. Pelosresultados encontrados pode-se constatar que todosos materiais analisados contêm alumínio. Do vidro,a quantidade extraída é muito grande; 370 µg Al em50 ml correspondem a 7400 µg/l, nível decontaminação muito alto para uma análise de traços.Os plásticos apresentam um menor grau decontaminação, ou seja 1,3 µg Al/50 ml, no recipienteanalisado, mas, mesmo assim, se não forempreviamente limpos podem contribuir para falsosresultados. Isto mostra que recipientes de vidro sãototalmente contra-indicados devido à presença doóxido de alumínio na sua constituição, e querecipientes plásticos devem ser submetidos adescontaminação antes de sua utilização com umasolução de limpeza.

Certamente, apesar do sangue não apresentar amesma capacidade de extração do que soluções HNO

3/

etanol, seringas e agulhas podem, em maior ou menorextensão, contaminar as amostras. Foram encontrados emmédia 1,73 µg Al em seringas de 10 ml e 0,05 µg Al emagulhas. Se considerarmos que a concentração dealumínio no sangue é de aproximadamente 7 µg/l, em 10ml de sangue teríamos 0,07 µg Al. Se todo o alumínio daagulha passasse para o sangue, a concentração seriapraticamente dobrada. Se todo o alumínio da seringafosse para os 10 ml de sangue, elevaria a suaconcentração em aproximadamente 25 vezes.

Na tabela 3 estão os teores de alumínio encontradosem diversos reagentes utilizados na análise do sangue eem sais empregados no preparo das soluções de diálise.Substâncias como sulfato de sódio, ácido sulfúrico, ácidotricloroacético e tungstato de sódio utilizados comoagentes desproteinizantes do sangue, bem como cloretode sódio, potássio, cálcio e magnésio, glicose e acetatode sódio usados no preparo das soluções de diálise,

contêm traços de alumínio. Em alguns sais é praticamenteimpossível evitar a contaminação pelo alumínio mesmoque estes sejam de elevado grau de pureza, visto que aprópria matéria prima, como o cloreto de sódio obtido daágua do mar, contém alumínio como impureza. Emalguns casos a contaminação pode advir do processo defabricação, pois muitas máquinas apresentamcomponentes feitos com alumínio.

No desenvolvimento da metodologia para aseparação do alumínio por adsorção no PE, as medidaspara evitar a contaminação acima listadas foramadotadas gradativamente, devido ao desconhecimentoda extensão do problema. Como os resultadosmostravam sempre mais alumínio do que originalmentehavia sido adicionado às soluções, as etapas foramsendo uma a uma introduzidas no método (Figura 1).

Tabela 2Alumínio extraído de diferentes tipos de materiais por solução de HNO3/

etanol 10 % (v/v) em 48 h de contato à temperatura ambiente e sob agitação.

Material Tipo de uso Alumínio Extraído

Vidro Frasco 50 ml 370 µg/50 ml

Plástico Frasco 50 ml 1,3 µg/50 ml

Seringa 10 ml I 1,62 µg

Seringa 10 ml II 1,84 µg

Metal Agulha para injeção I 0,05 µg/agulha

Agulha para injeção II 0,04 µg/agulha

Tabela 3Teor de alumínio encontrado nos reagentes e soluções que podem serutilizados na análise de alumínio em sangue a fluidos para hemodiálise.

Reagente/Solução Fabricante Concentração[µg/g] [µg/l]

Ácido nítrico p.a. (frasco I) Merck 110 µg/l

Ácido nítrico p.a. (frascoII) Merck 58 µg/l

Ácido nítrico Suprapurâ ® Merck 110 µg/l

Ácido nítrico destilado Merck 24 µg/l

Ácido sulfúrico p.a. Merck 375 µg/l

Ácido tricloroacético p.a. Reagen 20,0 µg/g

Ácido tricloroacético p.a. Merck 5,8 µg/g

Sulfato de sódio p.a. Reagen 26,5 µg/g

Tungstato de sódio p.a. Merck 26,5 µg/g

Cloreto de potássio Merck 0,38 µg/g

Cloreto de sódio Merck 0,39 µg/g

Cloreto de magnésio Merck 3,45 µg/g

Cloreto de cálcio Merck 2,83 µg/g

Acetato de sódio Merck 0,08 µg/g

Glicose Merck 0,25 µg/g

Figura 1. Influência dos fatores de contaminação na determinação dealumínio em soluções padrões contendo de 0 a 80 µg Al/l.

descont.ar

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Na tabela 4 estão descritos os resultados da análisede soluções padrões de alumínio, obtidos sem e com asprecauções para evitar a contaminação. Pode-seobservar que sem o controle da contaminação osresultados são absolutamente não reprodutíveis; oalumínio encontrado nas soluções de menorconcentração é muitas vezes superior ao das maisconcentradas. Na figura 1 pode-se observar a reduçãogradual da contaminação em função da medida adotada.Pode-se observar que quanto menor a concentração dealumínio na amostra, mais significativa é acontaminação. Enquanto que para as soluções com 80µg Al/l a contaminação eleva a recuperação em cercade 20%, nas soluções contendo 20 µg Al/l elacorresponde a mais de 200% do total recuperado.

A “limpeza do ar” é tão importante quanto a derecipientes e reagentes. Ambientes livres de partículasde poeira são obtidos através da utilização de filtros dear instalados de forma a purificar o ar de uma sala oude um ambiente menor como uma capela. Isto éconseguido através da utilização de filtros HEPA (HighEfficiency Particulate Air filter) desenvolvidos nosEstados Unidos durante a II Guerra Mundial para conterpartículas radioativas. 21 Para laboratórios que analisamtraços são considerados adequados os ambientes Classe100 que devem, teoricamente, ter uma atmosfera comno máximo 100 partículas de 0,5 µm por 0,028m 3 (1 ft 3).22 De acordo com Howard e Statham 23 os filtros HEPAtem uma eficiência maior que 99,97% na remoção de

partículas com diâmetro igual ou maior que 0,3 µm.Na tabela 5 estão demonstrados os resultados da

análise de alguns produtos utilizados em diálise. Éinteressante observar a diferença entre asconcentrações de alumínio em função do material dorecipiente de armazenagem. Enquanto as soluçõesfisiológicas em ampolas plásticas quase nãoapresentam contaminação, há uma enorme diferençaentre a glicose comercializada em recipiente deplástico e de vidro. Poder-se-ia argumentar que ofabricante não é o mesmo, e que esta seria a causada diferença. Mas o fato de ser o alumínioconstituinte do vidro e não impureza como noplástico, aumenta muito a probabilidade decontaminação: a análise do mesmo produto, cloretode potássio, sólido em recipiente plástico, e emsolução a 7,5 % em ampolas de vidro da indústriaPharma Hameln, mostra que o vidro contribuiu paraum aumento da contaminação. A indústria envioupara análise a ampola e sal utilizado para prepará-la.A análise mostrou que depois de dissolvido earmazenado, a concentração de alumíniocorrespondente a quantidade de sal de uma ampolaaumenta em 0,14 µg. (0,44 µg Al/1,49 g KCl naampola contra 0,30 µg Al/1,49 g KCl no plástico).Estudos feitos por Oelschläger 24 mostraram que oalumínio pode ser extraído do vidro, e que aquantidade de alumínio extraída está relacionada como tipo de solução que é armazenada.

Tabela 4Análise de soluções contendo diferentes concentrações de alumínio (soluções padrão) utilizando a metodologia de separação da matriz e concentração do

alumínio, antes e após a adoção de medidas para evitar a contaminação.

Concentração Sem adoção das medidas Com adoção das medidasteórica de Al

Encontrado Conc. residual Encontrado Conc. residualna matriz após na matriz apósseparação do Al separação do Al

[µg/l] [µg/l] [µg/l] [µg/l] [µg/l]

0 23 4 0 0

0 32 8 2 0

0 27 1 0 1

0 16 15 1 2

10 33 8 11 0

10 35 10 11 1

20 37 5 22 0

20 30 11 21 2

40 53 6 39 1

40 61 12 42 0

60 69 4 61 0

60 86 11 59 0

80 83 15 78 0

80 105 11 82 2

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Conclusão

Pelos resultados expostos, pode-se afirmar que adeterminação de traços de alumínio, na faixa departes por bilhão, mesmo em amostras simples comoa água, apresenta resultados satisfatórios somentequando um conjunto de medidas para evitar acontaminação é adotado.

A limpeza do material, o uso de reagentes purose a análise realizada em ambiente livre de partículasde poeira (câmara de fluxo laminar) garantem o êxitode uma determinação de traços de alumínio.

Do ponto de vista clínico, além dos cuidados normaisindispensáveis para a manutenção de um ambiente livrede contaminações, a opção por embalagens plásticasparece ser uma medida simples que poderiaeventualmente reduzir o nível de contaminação poralumínio de medicamentos e fluidos que entram emcontato direto com o sangue do paciente.

Summary

The most common difficulties which occur intrace analysis are those which involve contamination,

Tabela 5Teor de alumínio em alguns produtos utilizados em diálise

Amostra Marca Tipo Embalagem Conc. Al[µg/l]

Solução fisiológica Texon Ind. Farm. 500 ml plástica 13

Lab. B.Braun 500 ml plástica 3

Fresenius 500 ml plástica 1

Baxter AZB1324-1000 ml plástica 2

Glicose 50% Braun 500 ml plástica 3

JP Ind. Farm. 500 ml plástica 1

Darrow 500 ml plástica 15

Fresenius 500 ml plástica 13

Hipolabor ampola 10 ml vidro 293

Heparina Fujisawa USA, Inc. USP vidro 4

5000 UI/ml Roche Liquemine vidro 738

Roche Liquemine vidro 792

Cristalia vidro 72

Proxitane Fresenius plástica 358

Sol. Concentrada

para hemodiálise J.P. Ind. Farm JP120 s/potássio plástica 28

Salbego plástica 75

Cloreto de potássio Pharma Hameln ampola 20 ml vidro 0,44/amp.

7,5% Pharma Hameln sal sólido plástica 0,30*

* Uma ampola de 20 ml contém 1,49g de KCl. Em 1,49 g do sal sólido determinou-se 0,30 µg Al

mainly when the measurement is at very lowconcentration of ubiquitous elements as aluminum.The worst situation is when many steps for theanalysis are necessary, because it requires extra-manipulations of the sample. This article describesthe degree of contamination and its control for thealuminum trace analysis in dialysis solutions, whenaluminum content of about 15 µg/l must bedeterminated, as well as the contamination ofmaterials and other fluids used in dialysis.

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Artigo recebido em 3 de janeiro de 1997 e aceito parapublicação em 13 de maio de 1997.

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Introdução

As modificações que a ciência médica introduziudurante este século, mais notadamente após os anossessenta, estão a permitir que o meio interno humanourêmico se recupere parcialmente pelos métodosdialíticos ou totalmente, quando se estabelecem ascondições necessárias para plena residência dosalotransplantes. Em ambos os casos, a sobrevida dopaciente é elevada e compatível com sua inserção emseus afazeres anteriores. Contudo, o tecido renal

Nefropatia crônica do alotransplante renal. Fatores co-mórbidosTeresa T. O. Mocelin, Altair J. Mocelin, Pedro A. Gordan, Anuar M. Matni, Vinicius D. A.Delfino, Aureuza C. A. Vianna, Lauro Brandina, Antonio Marcos A. Fraga, Marco Auréliode Freitas Rodrigues, Tiemi Matsuo

Foram revisados 372 casos de transplantes renais primários realizados entre junho de 1973 e

dezembro de 1992 em dois hospitais de Londrina (Evangélico e Universitário), com o objetivo

de verificar a influência de crises de rejeição aguda e de outros fatores co-mórbidos na

evolução do processo de perda crônica do aloenxerto. A exclusão englobou todos os casos

com menos de 6 meses de evolução, as perdas renais por rejeição irreversível, aqueles casos de

recorrência da doença original e os casos de documentada nefrotoxicidade por ciclosporina.

Os transplantes foram analisados de acordo com o esquema de imunossupressão utilizado em

grupo azatioprina-prednisona ou grupo tríplice com azatioprina, prednisona e ciclosporina,

recorrendo-se à regressão logística multivariável para estimar o risco de desenvolvimento de

nefropatia crônica do aloenxerto em relação a episódios de rejeição aguda, de ocorrência de

insuficiência renal aguda (IRA) pós-operatória imediata, do sexo e da idade dos receptores, da

compatibilidade HLA e do tipo de doador renal. Em ambos os protocolos verificamos nítida

correlação entre presença e severidade da rejeição aguda e risco de evolução desfavorável para

disfunção crônica do enxerto; do mesmo modo, os receptores jovens com idade < de 20 anos,

aqueles que tiveram seu curso inicial complicado por IRA e os que receberam rins não

idênticos pela tipagem HLA estiveram com maior associação à evolução para nefropatia

crônica. A adição de ciclosporina para constituir o esquema imunodepressor tríplice melhorou

o resultado do grupo de indivíduos jovens, porém se mostrou adversa se prescrita em

concomitância com a necessidade de diálise pós-operatória imediata.

Hospital Universitário, Centro de Ciências da SaúdeUniversidade Estadual de LondrinaEndereço para correspondência: Teresa T.O. MocelinRua Robert Koch, 60CEP: 86038-440 - Londrina, PR.Tel./Fax: (043) 321-1824

Nefropatia Crônica do Transplante, Transplante Renal,Imunossupressão,Chronic Allograft Nephropathy, Kidney Transplantation,Immunosupression

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próprio que sucumbiu anteriormente por variadascausas, agora reposto como alotransplante, nãopermanece funcionante por tanto tempo quanto o seucontrole não doado.

O ambiente que necessita da cooperação desteórgão vital novamente lhe é hostil ao adicionar àsagressões originais, os processos de rejeição,controláveis mais facilmente em sua forma aguda,mas que reclamam para si a responsabilidade peladestruição lenta e progressiva de um número maiordo que 50% dos rins que de alguma forma perdemvitalidade em seu novo ambiente. 1 Também umamultiplicidade de fatores não imunológicos, onde seincluem isquemia prolongada, desproporção entremassa renal e seu receptor, insuficiência renal agudapós-operatória, hipertensão arterial persistente,hiperlipidemia, parecem contribuir de maneiraimportante para o evento destrutivo, 2,3 mas nestaapresentação nos restringiremos a analisar ainfluência das crises de rejeição aguda, do tipo dedoador, da compatibilidade HLA, da idade e sexo doreceptor, na sobrevida tardia do rim transplantado.

Material e Métodos

Incluímos neste estudo longitudinal, tipo coorte,372 transplantes renais primários com sobrevida renalsuperior a seis meses, todos realizados entre junho de1973 e dezembro de 1992 em dois hospitais deLondrina (Hospital Evangélico de Londrina e Hospital

Universitário Regional do Norte do Paraná),submetidos à imunossupressão com duas drogas,azatioprina e prednisona ou com três, as anteriores eciclosporina (Tabelas 1 e 2).

A rejeição aguda foi definida como oaparecimento de todos ou vários dos sinais esintomas clínicos como febre, mal-estar geral,sensação de peso e dor no enxerto, aumento devolume do mesmo, aumento do peso corporal,diminuição da diurese, hipertensão arterial e aumentodos níveis séricos da creatinina, comprovada pelanormalização da função renal por tratamento comglucocorticóides ou por biópsia renal nos casoscórtico-resistentes. Para o tratamento da crise derejeição aguda foi inicialmente instituída a infusãoendovenosa de 500 mg de metilprednisolona por dia,durante 4-6 dias, em até duas oportunidades. Em casode reversão incompleta ou ausência de resposta,adicionou-se anticorpo monoclonal ou policlonalantilinfocitário, por 7-14 dias. A rejeição crônica foicaracterizada como perda progressiva, lenta, dafunção renal, medida por níveis crescentes dacreatininemia ou temporariamente estável, superior a2,0 mg/dl, na ausência de outras causas ou fatoresjustificantes, como nefrotoxicidade por drogas ourecorrência de doença e comprovada por biópsiarenal ao tempo do diagnóstico.

Foram excluídos todos os casos com perdas renaisagudas por causas vasculares, rejeição agudairreversível ou óbito nos primeiros seis meses, bem

Tabela 1Distribuição do sexo e disfunsão crônica do enxerto

Sexo AZA-PRED CSA-AZA-PREDRejeição crônica Rejeição crônica

Sim Não Total Sim Não Total

Masculino 43 (26,1) 122 (73,9) 165 31 (33,7) 61 (66,3) 92

Feminino 26 (33,8) 51(66,2) 77 11 (28,9) 27 (71,1) 38

Total 69 (28,5%) 173 (71,5%) 242 42 (32,3%) 89 (67,7%) 130

P = 0,84 P = 0,56

Tabela 2Influência da idade do receptor ao tempo da transplantação renal em ambos os protocolos medicamentosos.

Idade AZA-PRED CSA-AZA-PREDRejeição crônica Rejeição crônica

Sim Não Total Sim Não Total

< 21 Anos 24 (64,9) 13 (35,1) 37 6 (31,6) 13 (68,4) 19

21-40 Anos 37 (28,5)* 93 (71,5) 130 25 (41,7) 35 (58,3) 60

> 40 Anos 8 (10,7)* 67 (89,3) 75 11 (21,6) 40 (78,4) 51

Total 69 (28,5%) 173 (71,5%) 242 42 (32,3%) 88 (67,7%) 130

*= P < 0,005

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como outros dezoito pacientes de ambos os protocolosde imunossupressão, devido à recorrência da doençabásica, nefrotoxicidade da ciclosporina e pielonefritede novo, confirmados por exame anátomo-patológico.Os dados de 242 transplantes renais tratados comesquema imunossupressor duplo e de 130 com regimetríplice foram submetidos à análise estatística atravésda regressão logística multivariável e as curvasatuariais de sobrevida dos enxertos foram estimadasusando-se a técnica de Kaplan-Meyer e comparadasentre si através do teste generalizado de Wilcoxon,fixando-se o erro alfa em 5%.

Resultados

Duzentos e quarenta e dois pacientes forammantidos em protocolo imunossupressor de duasdrogas, azatioprina e prednisona: 113 deles apósreceberem um rim HLA A e B idêntico, 74 com o rimidêntico em apenas um haplótipo HLA e 55receptores de rins de cadáveres ou doadores vivosnão parentes.

O grupo que recebeu continuadamente o esquematríplice incluiu 63 pares semelhantes aos seus doadoresem apenas um haplótipo e 67 receptores de rins decadáveres ou não parentes vivos.

Na tabela 1, contendo informações referentes aosexo dos receptores, observa-se a ausência deinfluência desta variável na ocorrência de rejeiçãocrônica com qualquer dos dois programas deimunossupressão (O.R. = 0,92, p = 0,84 e O.R. = 0,75,p = 0,56).

A variável idade dos receptores revelou-se comoidentificando as pessoas mais jovens (< 21 anos) comrisco aumentado para desenvolvimento de rejeiçãocrônica quando medicados com duas drogas, frenteaos dois outros grupos de indivíduos, de 21-40 anos(O.R. = 0,21, p = 0,005) e > 40 anos (O.R. = 0,03,p=0,0001), com estes últimos sendo os menosprejudicados por essa causa de perda do enxerto. Aadição de ciclosporina ao esquema imunodepressor,

aparentemente, preveniu esse aumento de risco paraos mais jovens, igualando-os (O.R. = 1,72, p = 0,40e O.R. = 1,83, p = 0,96) (Tabela 2).

Na análise da variável ocorrência de insuficiênciarenal aguda (Tabela 3) como possível fator de riscopara o desenvolvimento de rejeição crônica e,portanto, maior perda renal a longo prazo, nossosdados só a identificaram com efeito deletério seassociada à medicação contendo ciclosporina (O.R. =4,02, p = 0,01).

A incidência de rejeição crônica frente aosdiversos tipos de doadores disponíveis, sobimunossupressão com azatioprina e prednisona outríplice pela adição de ciclosporina, estárepresentada na tabela 4. Os melhores resultadossão daqueles pacientes idênticos aos seus doadoresna tipagem HLA com incidência de 1,46 rejeiçõescrônicas/100 pacientes/ano, todos do grupo de duasdrogas, sem contrapartida no esquema tríplice.Dentre os demais tipos de doadores e por pequenonúmero de outros, só mencionamos, em ambos osplanos medicamentosos, os receptores de rins deirmãos haploidênticos, os das mães e aqueles cujosdoadores foram cadáveres.

Com resultados distintos do observado com osHLA idênticos, a incidência de rejeição crônica varioude 5,34/100 pacientes/ano entre irmãos um haplótipoHLA a 9,86/100 pacientes/ano quando a mãe doou.Quando a doação se fez com rim cadavérico, aincidência ficou entre 6,81-7,00 rejeições crônicas/100pacientes/ano, para ambos os planos medica-mentosos. Todos esses últimos resultados foramdistintos do observado para pares irmãos HLAidênticos (p = 0,003), porém não diferentes entre si,independentemente da medicação usada e sugerindoque a adição de ciclosporina não modificou osresultados tardios do transplante renal.

Os episódios de rejeição aguda, reconhecidos pormanifestação clínica e comprovação laboratorial, nãoocorreram em 38,43% dos pacientes incluídos nogrupo azatioprina-prednisona e em 23,85% daqueles

Tabela 3Influência da presença de insuficiência renal aguda no pós-operatório imediato e evolução para rejeição crônica.

IRA AZA-PRED CSA-AZA-PREDRejeição crônica Rejeição crônica

Sim Não Total Sim Não Total

Sim 15 (48,4) 16 (51,6) 31 17 (48,6) 18 (51,4) 35

Não 54 (25,6) 157 (74,4) 211 25 (26,3) 70 (73,7) 95

Total 69 (28,5) 173 (71,5) 242 42 (32,3) 88 (67,7) 130

P = 0,64 P = 0,01

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também medicados com ciclosporina e, nestacircunstância, desenvolveu-se rejeição crônica em 5,4%dos primeiros e 12,9% dos últimos. A documentação deuma ou mais crises de reação alogênica (Tabela 5)acompanhou-se, no seguimento a longo prazo, comfreqüência crescente de disfunção renal secundária àrejeição crônica atingindo valores de 59,1 e 56,3%,quando os pacientes foram tratados para três diferentescrises agudas e foi significativamente associada àdeterioração renal, P<0,001.

Do mesmo modo, analisada a incidência derejeição crônica, agora frente à reversibilidade dasrejeições agudas ao tratamento instituído, também seobserva a crescente presença de evolução para perdasdevido a rejeição crônica quanto maior a precariedadeda resposta observada, com a ressalva de que aciclosporina parece ter protegido a sobrevida do órgãoquando ocorreu a reversão completa da crise aguda,porém os números são insuficientes para afastar aprobabilidade de erro tipo II.

Discussão

A literatura médica é conflitante quando analisa ainfluência da variável sexo na sobrevida dos enxertosrenais a longo prazo 6,7 e neste material nãoencontramos influência do sexo do receptor nasobrevida do transplante renal.

Vários autores 4,5 sugerem que a presença demaior número de nefropatia crônica do transplante,como observado por nós entre os adolescentes, seriamotivada pela usual não aderência à medicação nessafaixa de idade; a exceção ocorreu quando nossoscasos pertenciam ao grupo da ciclosporina, onde nãoconseguimos acusar essa diferença.

Nossos casos não se associaram à piora da funçãorenal a longo prazo quando evoluiram com

insuficiência renal aguda no pós-operatório imediatose imunodeprimidos por azatioprina e prednisona,diferentemente do que ocorreu quando a lesãotubular aguda se fez em concomitância ao meiointerno receptor de ciclosporina. Esses dados sãosemelhantes aos observados por Troppmann e col., 8

em 1995.Quanto ao tipo de doador, o grande benefício

ocorreu quando o par possuia identidade HLA A e B,enquanto em todas as outras associações, além derisco aumentado para rejeição crônica, a adição deciclosporina ao regime medicamentoso não trouxequalquer melhora na sua incidência. Já a variávelnúmero de episódios de rejeição aguda, nãoimportando a associação ao tipo de doador, mostrou-se proporcionalmente deletéria ao enxerto renal,exceto quando todos os surtos responderamcompletamente à pulsoterapia.

Conclusões

A rejeição crônica é referida como causapredominante de perdas tardias de tecido renaltransplantado e duas facetas do problema são

Tabela 4Distribuição dos tipos de doadores frente a ocorrência de rejeição crônica.

Doador AZA-PRED CSA-AZA-PREDN Rejeição crônica N Rejeição crônica

100 pacientes/ano 100 pacientes/anoIrmão HLA

Idêntico 113 1,46

Irmão um haplótipo HLA 35 5,34 33 7,23

Mãe 16 9,69 18 9,86

Pai 12 15,96 4 4,91

Não parente 13 2,56 12 5,96

Filho 9 1,74 4 5,93

Outros 2 NR 4 NR

Cadáver 42 7,00 55 6,81

Total 242 130

Tabela 5Incidência de rejeição crônica frente ao número de episódios de rejeição

aguda, em dois protocolos imunodepressores.

Rejeição crônicaRejeições AZA-PRED CSA-AZA-PREDagudas

0 5/93 (5,4%) 4/31 (12,9%)

1 19/71 (26,8%) 13/43 (30,2%)

2 28/49 (57,1%) 12/36 (33,3%)

3 13/22 (59,1%) 9/16 (56,3%)

4 4/6 (66,7%) 4/4 (100,0%)

5 0/1 (0,0%) _

N 242 130

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 271-275

T. T. O. Mocelin et al - Nefropatia crônica do alotransplante renal

275

especialmente causadoras de dificuldades em seumanejo: a primeira é a ausência de um parâmetrodiagnóstico específico, restando-nos aceitá-la após aexclusão de outras patologias que também levam àdisfunção crônica e tardia; recorrência de glome-ruloesclerose focal e segmentar, glomerulonefritemembrano-proliferativa, nefropatia por IgA ouglomerulonefrite de novo, estenose da artéria renal,fibrose ureteral e hidronefrose e nefrotoxicidadecrônica da ciclosporina, formam uma lista incompletade possíveis causas. Quando essas possibilidadesforam excluídas, a presença de perda funcional eproteinúria, acompanhadas de alterações histológicasinespecíficas, tipo duplicidade e espessamento damembrana basal glomerular, espessamento intimal depequenos e médios vasos, atrofia tubular, infiltraçãode células mononucleares e fibrose no interstício, nosautorizam a aceitar o diagnóstico de rejeição crônica.

A maioria dos rins transplantados que desen-volveram rejeição crônica nesta observação tambémtiveram rejeição aguda, freqüentemente por repetidasvezes ou com resposta incompleta ao tratamentoinstituído e parecendo haver aí um forte vínculofisiopatológico.

Nossos resultados sugerem, ainda mais, que aindução imunossupressiva não deva incluir ciclos-porina quando estiver ocorrendo insuficiência renalaguda pós-isquemia.

A mudança para um protocolo de três drogas, pelaincorporação de ciclosporina ao plano medicamentosode manutenção, não modificou a perda tardia deenxertos renais, cuja tolerância definitiva ainda estápor ser obtida.

Summary

We performed a retrospective cohort study toevaluate the late development of chronic allograftnephropathy in relation to the presence of acuterejection episodes, recipient gender and age, HLAdonor-recipient disparity, type of donor and thenecessity for dialysis in the immediate post-operativeperiod in two different immunosuppressive protocols,azathioprine and prednisone or cyclosporine,azathioprine and prednisone.

After exclusion of those cases in which thekidney transplant was lost to acute, irreversible,rejection, disease recurrence, de novo pyelonephritisor cyclosporine nephrotoxicity, 372 primary renaltransplants, both from living and cadaveric donors,were included in one of two groups treated withazathioprine and prednisone or both these drugs pluscyclosporine. A multivariate logistic regressionestimated the risk of chronic disfunction.

We observed in both patient groups that thenumber of acute rejection episodes and their qualityof response to anti-rejection therapy were the majorrisk factors for chronic allograft rejection; age, post-operative acute kidney failure, HLA incompatibilityand donor type also influenced negatively theoutcome. HLA identical grafts were remarkably free ofchronic allograft nephropathy, even during prolongedfollow-up.

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Artigo recebido em 11 de março de 1997 e aceito parapublicação em 5 de maio de 1997.

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 276-279

J. L. Monteiro - et al - Efeito tubular do Trimetoprim

276

Introdução

O composto sulfametoxazol-trimetoprim ébastante utilizado para o tratamento de diversasdoenças infecciosas, sendo efetivo para bactériasgram-positivas e gram-negativas. 1

Doses elevadas endovenosas são particularmenteusadas em pacientes transplantados e com síndrome daimunodeficiência adquirida (AIDS), quando apresentampneumonia por Pneumocystis carinii. 2, 3

Estudos clínicos e experimentais relatamdistúrbios eletrolíticos e alterações renais com suautilização, ou seja hiponatremia, nefrite intersticial,

Efeitos renais do trimetoprim e sulfametoxazolJosé Luiz Monteiro, Sílvia Bernardete Campos, Antonio Carlos Seguro

Trimetoprim, Nefrotoxicidade, DepuraçãoTrimethoprim, Nephrotoxicity, Clearance

Os efeitos renais de sulfametoxazol (30 mg/kg) e trimetoprim (6 mg/kg) foram avaliados no

cão. Uma simples dose endovenosa produziu aumento do volume urinário e das excreções

urinárias de sódio e cloreto, enquanto que a taxa de filtração glomerular, as excreções

urinárias de potássio e fosfato não se alteraram. Quando o trimetoprim foi administrado em

outro grupo de 6 animais foram observados similares aumentos da diurese e da excreção

urinária de sódio, sem alteração na filtração glomerular e na excreção de potássio. A

administração de sulfametoxazol em 6 cães não produziu quaisquer efeitos. Estes dados

sugerem que o trimetoprim diminui as reabsorções tubulares de água e sódio, provavelmente

no túbulo coletor, à semelhança do local de ação do diurético amiloride.

Laboratório de Pesquisa Básica - LIM-12 - Disciplina de Nefrologia -Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina daUniversidade de São Paulo.Endereço para correspondência: José Luiz MonteiroAv. Dr. Arnaldo, 455 - 2º andar, Sala 2206CEP 01246-900 São Paulo, SPTel.: (011) 3061-4011, Ramal 2292 - Fax: (011) 280-2267

diminuição da secreção tubular de creatinina. 4, 5 Empacientes imunodeprimidos foi observada hipercalemiaem 20% dos mesmos, assim como hiponatremia apóstratamento com a droga por mais de uma semana. 6 Écontroverso se os dois componentes em associaçãocausam deterioração da função renal.

Em estudo experimental, similares achados foramobservados com infusão aguda de trimetoprim emratos, onde foi inibida a secreção de potássio comaumento da excreção de sódio em túbulos distaisperfundidos in vivo . 7 Trabalho recente, tambémrealizado em ratos, mostra que tanto a administraçãoaguda como crônica do trimetoprim acarreta umaumento da excreção urinária de sódio e bicarbonato,sem alterar os níveis sanguíneos de pH e pC0

2, e

diminuição da excreção urinária de potássio. 8

O objetivo do presente estudo é de confirmar apossibilidade do efeito tóxico tubular agudo da droga ede seus componentes individualmente, sobre a funçãorenal de cães através do método de depuração.

Material e Métodos

Foram utilizados cães mestiços machos com pesoentre 9 e 16 kg. Os animais eram anestesiados comPentobarbital (30 mg/kg EV), entubados e mantidosem respiração espontânea. A artéria femoral direita

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J. L. Monteiro - et al - Efeito tubular do Trimetoprim

277

foi cateterizada para coletas de amostras de sangue emonitorização da pressão sanguínea. A veia femoralesquerda foi canulada e através da mesma infundidauma dose inicial de creatinina (20 mg/kg), seguida deinfusão contínua na taxa de 0,1 ml/min (1 g decreatinina em 20 ml de salina 0,9%). Através deincisão supra-púbica, os ureteres eram expostos ecateterizados para coleta de urina. Após oprocedimento cirúrgico, um período de equilíbrio de30 minutos foi utilizado e a seguir deu-se início àscoletas de urina para determinação das depurações.Três grupos de animais foram estudados:

Grupo I (n=6). Após 2 períodos controle, umadose endovenosa de sulfametoxazol (30 mg/kg) etrimetoprim (6 mg/kg) foi administrada durante 5minutos. Após 15 minutos, urina era coletada em 3períodos de 20 minutos cada. Um a 1,5 ml de sangueera colhido na metade destes períodos.

Grupo II (n=6). Neste grupo, após 2 períodoscontrole, sulfametoxazol (30 mg/kg EV) eraadministrado, seguido por 3 períodos de depuração.

Grupo III (n=6). Após 2 períodos controle,trimetoprim (6 mg/kg EV) era injetado e colhidos 3períodos adicionais de depuração.

Em outro grupo de 6 animais, coletas de urinaforam obtidas sob óleo mineral para determinar o pHe pC0

2 em 2 períodos controle e 3 períodos

experimentais, após administração de trimetoprim (6mg/kg EV).

Em todas as amostras de sangue e urina osseguintes parâmetros foram determinados: creatinina(picrato alcalino), sódio e potássio (fotometria dechama), cloreto (cloridrômetro).

No grupo I fosfato inorgânico foi dosado pelométodo de Fiske-Subbarow e no grupo III o pH epC0

2 foram medidos pelo pH/gás Analyzer IL.A taxa de filtração glomerular, as excreções

urinárias absolutas de sódio, potássio, cloreto e fosfatoforam calculadas pelas fórmulas convencionais.

As drogas foram preparadas dissolvendo-se 80 mgde trimetoprim e/ou 400 mg de sulfametoxazol em 5ml de uma mistura de propilenoglicol e água destilada.

Os dados estão apresentados em média±EP erepresentam os resultados de depuração dos dois rins.A análise estatística foi realizada através do teste det-pareado e valor de p de 0,05 foi consideradosignificante.

Resultados

Grupo I. Os resultados são apresentados na tabela 1.A administração de sulfametoxazol e trimetoprim

produziu um aumento do volume urinário de0,153±0,028 ml/min para 0,292±0,063 ml/min(p<0,01), enquanto que a depuração de creatininapermaneceu inalterada (4,47±0,37 vs 4,38±0,48 ml/min/kg de peso). A excreção urinária de sódioelevou-se em todos os animais, de 18,4±7,1 para59,4±16,8 meq/min (p<0,01). Houve também umaumento da excreção urinária de cloreto de 20,9±7,9para 42,8±13,5 meq/min (p<0,05). A excreção urináriade potássio não se alterou significantemente (15,9±4,3para 18,4±4,8 meq/min), assim como a excreção defosfato (9,6±3,0 para 8,3±3,0 mM/min).

Grupo II. Efeito da sulfametoxazol na função renal.Com o objetivo de verificar se os resultados

acima são devidos a um efeito da sulfonamida, 6animais receberam somente sulfametoxazol (30 mg/kg EV). A droga não aumentou o volume urinário(0,283±0,041 para 0,296±0,047 ml/min), não alteroua depuração de creatinina (3,99±0,43 para 3,98±0,52ml/min/kg de peso), nem a excreção absoluta desódio (49,7±11,1 para 53,1±13,0 meq/min), nem aexcreção absoluta de cloreto (47,8±15,2 para50,3±20,1 meq/min), assim como a excreção depotássio (26,7±5,7 para 29,3±3,4 meq/min). Estesresultados indicam que os efeitos tubulares daassociação sulfametoxazol-trimetoprim não se devemao componente sulfonamida.

Grupo III. Efeito do trimetoprim na função renal.Neste grupo, 6 animais receberam trimetoprim (6

mg/kg EV). Na tabela 2 estão apresentados osresultados deste grupo. O trimetoprim aumentou ovolume urinário de 0,181±0,038 para 0,275±0,063 ml/min (p<0,05), enquanto que a depuração decreatinina não se alterou (3,75±0,58 para 3,51±0,55ml/min/kg de peso). A excreção absoluta de sódioaumentou de 20,8±8,9 para 47,8±16,6 meq/min(p<0,05). A excreção urinária de cloreto elevou-se emtodos os animais de 24,1±11,0 para 34,0±12,7 meq/min, porém esta diferença não foi significanteestatisticamente (p<0,07), talvez devido ao número decães estudados. Não houve alteração na excreção depotássio. Estes resultados indicam que o aumento dadiurese e da natriurese ocorre devido ao componentetrimetoprim.

Em outro grupo de 6 animais, amostras de urina,em período controle e experimental, foram coletadassob óleo mineral para medir o pH e pC0

2 urinários.

O trimetoprim não alterou o pH (6,33±0,45 para6,78±0,36), nem a pC0

2 (45,0±8,0 para 49,6±9,7

mmHg). Devido a ausência de alterações destesparâmetros urinários, os mesmos não foram dosadosno sangue.

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J. L. Monteiro - et al - Efeito tubular do Trimetoprim

278

Discussão

No presente estudo, os resultados demonstram quea administração endovenosa em bolo da sulfametoxazol-trimetoprim produziu efeitos tubulares caracterizadospor um aumento da diurese, natriurese e clorurese,efeitos estes causados pelo componente trimetoprim.

A dose de trimetoprim empregada é similaràquela administrada a pacientes com pneumonia porPneumocystis carinii 3 e, desde que o tratamentoprolongado seja usualmente necessário, pode seracentuado o seu efeito tóxico tubular.

A depuração de creatinina não se alterou comesta associação de drogas. Entretanto, o uso crônicodeste antibiótico em pacientes com função renalreduzida, e mesmo em indivíduos com funçãonormal, é capaz de acarretar queda da taxa defiltração glomerular. 9

O efeito agudo mais pronunciado no presentetrabalho foi um aumento de duas a três vezes naexcreção urinária de água, sódio e cloreto, quandoutilizamos a associação sulfametoxazol-trimetoprim ede duas vezes na excreção de água e sódio quandofoi administrado o trimetoprim, acompanhado deaumento da excreção de cloreto, porémestatisticamente não significante (p<0,07) (Tabelas 1e 2, respectivamente).

O local de ação do trimetoprim no rim não pôdeser determinado por este nosso estudo. Contudo,algumas evidências podem ser sugeridas através dosdados de excreção de fosfato e potássio, assim comoda determinação da pC0

2 urinária.

O fosfato é largamente ultrafiltrado peloglomérulo e a carga filtrada em animais normais éreabsorvida predominantemente pelo túbuloproximal. 10, 11 Uma vez que a excreção urinária defosfato não se alterou após a administração daassociação sulfametoxazol-trimetoprim, este dadosugere que a droga não atua no túbulo proximal.

A excreção urinária de potássio não é um bommarcador da ação tubular da droga. No entanto, oaumento da excreção de sódio não se acompanhoude uma elevação da excreção de potássio, falandocontra o efeito do trimetoprim no túbulo proximal ena porção espessa ascendente da alça de Henle,uma vez que nestas condições um aumento da ofertadistal de sódio acarretaria uma elevação da secreçãode potássio. 12 Esta ausência de alterações naexcreção de potássio levanta a possibilidade da açãodo trimetoprim no túbulo coletor.

Em estudo recente foi observado que a infusãoaguda do trimetoprim inibe a secreção de potássioe aumenta a excreção de sódio em túbulos distaisde ratos perfundidos in vivo 7 Outro trabalho maisrecente mostra que a administração aguda e crônicada droga em ratos eleva a excreção de sódio ereduz a excreção urinária de potássio, sendoobservada diminuição da atividade da Na-K-ATPaseno túbulo coletor cortical e no ducto coletormedular. 8 Neste mesmo estudo, o trimetoprimocasionou uma inibição direta da atividade da Na-K-ATPase, dose dependente, nos túbulos coletoresisolados in vitro . Desde que a maior parte dopotássio que aparece na urina final provém da suasecreção nestes segmentos, admite-se que otrimetoprim tem seu efeito mais pronunciado a estenível tubular.

Nossos resultados não mostram alterações naexcreção urinária de potássio. Este fato pode serexplicado pela dose infundida da droga e pelautilização de cães provavelmente desnutridos. Esteefeito do trimetoprim pode ser inferido de sersemelhante à ação do diurético amiloride sobre otúbulo coletor. 13 Realmente, existe uma grandesimilaridade química estrutural entre o trimetoprim eo amiloride, assim como com a pentamidina,também utilizada nas infecções por Pneumocystiscarinii , e o triamterene, diurético também inibidorda Na-K-ATPase 13 neste segmento.

Tabela 1Efeitos da associação sulfametoxazol-trimetoprim na função renal em cães

normais

Controle (n=6) Sulfametoxazol+

Trimetoprim (n=6)

Ccr

, ml/min/kg 4,47±0,37 4,38±0,48V, ml/min 0,153±0,028 0,292±0,063*

UVNa

, meq/min 18,4±7,1 59,4±16,8*UV

Cl, meq/min 20,9±7,9 42,8±13,5**

UVK, meq/min 15,9±4,3 18,4±4,8

UVPi

, mM/min 9,6±3,0 8,3±3,0

Ccr = depuração de creatinina; V = fluxo urinário; UV = excreção urinária

absoluta. Valores expressos em média ± erro padrão; *p<0,01; ** .p<0,05.

Tabela 2Efeitos do trimetoprim na função renal em cães normais

Controle (n=6) Trimetoprim (n=6)

Ccr

, ml/min/kg 3,75±0,58 3,51±0,55V, ml/min 0,181±0,038 0,275±0,063*UV

Na, meq/min 20,8±8,9 47,8±16,6*

UVCl

, meq/min 24,1±11,0 34,0±12,7UV

K, meq/min 12,4±2,6 15,4±6,3

Ccr = depuração de creatinina; V = fluxo urinário; UV = excreção

urinária absoluta. Valores expressos em média ± erro padrão; * p<0,05.

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J. L. Monteiro - et al - Efeito tubular do Trimetoprim

279

Uma elevação da pC02 urinária pode ser

considerada como uma inibição da reabsorção debicarbonato pelo túbulo proximal com consequenteaumento da sua oferta no túbulo coletor. 14 Nossosdados mostram que a pC0

2 na urina não se alterou

com o trimetoprim, sugerindo que este agentefarmacológico não tem ação no túbulo proximal e,portanto, não acarreta bicarbonatúria. Entretanto, seo grau de inibição proximal for modesto e asecreção de hidrogênio distal estiver intacta,moderada elevação de carga de bicarbonato notúbulo distal pode ser efetivamente reabsorvida.

Em resumo, o presente estudo mostra claramenteque alta dose da associação de sulfametoxazol etrimetoprim causa aumento da excreção urinária desódio e água por diminuição de suas respectivasreabsorções tubulares. Este efeito foi produzido pelocomponente trimetoprim. As alterações observadasna excreção de íons sugerem que o efeito seja emtúbulos coletores, no mesmo local de ação dodiurético amiloride.

Summary

The renal effects of sulfamethoxazole (30 mg/kg BW) and trimethoprim (6 mg/kg BW) wereevaluated in dogs. A single intravenous doseproduced an increase in urinary volume, urinarysodium and chloride excretion, whereas theglomerular filtration rate (GFR), urinary potassiumand phosphate excretion remained unchanged.When trimethoprim was injected in another groupof 6 animals, a similar increase in water andsodium excretion was observed without alterationin GFR and potassium excretion. Sulfamethoxazoleadministration to 6 dogs did not produce anyeffect. These data suggest that trimethoprimdecreases tubular rebsorption of H

20 and Na,

probably in the collecting tubules. These effectsare observed in the same nephron segmentaffected by amiloride.

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Artigo recebido em 18 de junho de 1996 e aceito parapublicação em 29 de janeiro de 1997

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 280-284

E. A. Furusawa et al - Síndrome Hemolítico-Urêmica

280

coli sorotipo 0157: H7 produtora de verotoxinas. 1,3,4 2)SHU atípica ou esporádica, geralmente não estáassociada a história anterior de diarréia (D-), 4

podendo estar etiologicamente relacionada ao uso dedrogas como a ciclosporina A, anticoncepcionaisorais, anti-neoplásicos, infecções virais, doença deKawasaki e anomalias do complemento sérico. 1,2,4

Outra forma de SHU atípica é aquela caracterizadapelo acometimento familiar.

A SHU familiar não difere clinicamente das outrasformas da doença. Assim sendo, afeta criançaspreviamente hígidas que apresentam palidez, vômitos,prostração, hematúria macroscópica ou oligoanúria. Emmuitos casos podem apresentar alterações do sistemanervoso central como convulsões, alterações do nívelde consciência e coma. Pode ocorrer hipertensãoarterial grave levando a encefalopatia hipertensiva einsuficiência cardíaca. Constata-se acometimento renalcom lesão glomerular e arteriolar. Neste grupo, adoença pode ocorrer após um ou mais anos doacometimento de um irmão e em várias gerações dafamília. Apresenta um prognóstico pior (68% demortalidade) quando comparada a forma clássica (19%de mortalidade). 6 Esta forma de apresentação é rara epode estar associada à herança autossômica recessivaou dominante, 1, 3 podendo afetar somente crianças, 6

adultos e crianças 7, 8, 9, 10 ou só adultos. 11

Introdução

A Síndrome Hemolítico-Urêmica (SHU) é umaentidade clínica descrita inicialmente por Gasser em1955. 1,2 Apresenta-se como um grupo heterogêneo dedesordens caracterizadas por anemia hemolíticamicroangiopática, plaquetopenia e insuficiência renalaguda. Acomete principalmente lactentes e crian-ças. 1,3,4 A microangiopatia trombótica é a lesãohistopatológica renal característica, sido descritainicialmente por Habib e cols. 5 Ambos os sexos sãoigualmente afetados

A SHU pode ser classificada em 1) SHU típica,também conhecida como clássica, epidêmica ouenteropática. Afeta principalmente lactentes compródromos de diarréia (D+). 4 Muitos desses casosassociam-se a infecções intestinais por Escherichia

Síndrome Hemolítico-Urêmica atípica na criançaErika Arai Furusawa, Vera Hermina Koch, Choong Ae Kim, Maria Fujimura, LuisBalthazar Saldanha, Yassuhiko Okay

Unidade de Nefrologia Pediátrica e Genética do Instituto da Criança "Prof.Pedro Alcântara" e Departamento de Anatomia Patológica - HCFMUSPEndereço para correspondência: Erika A. FurusawaAv. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 647CEP 05403-000 - São Paulo, SPTel: (011) 881-6311

Síndrome Hemolítico-Urêmica, PediatriaHemolytic-Uremic Syndrome, Pediatric

A Síndrome Hemolítico-Urêmica (SHU) apresenta-se como um grupo heterogêneo de

doenças caracterizadas por anemia hemolítica microangiopática, plaquetopenia e insuficiência

renal aguda. A lesão histopatológica típica é a microangiopatia trombótica. A SHU hereditária

ou familiar é rara e apresenta um prognóstico pior quando comparada à forma clássica ou

epidêmica. Os autores relatam o caso de uma criança que apresentou o quadro clínico e

histopatológico de SHU e que apresentava nos antecedentes familiares paternos, 4 adultos de

2 gerações com quadro de hipertensão arterial grave, associada a gestação em 2 casos, com

evolução para insuficiência renal. Com base nos dados clínicos e histopatológicos e através

do heredograma desta família, os autores sugerem que neste caso o fator determinante da

SHU possa ter sido devido a um gene autossômico dominante.

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O objetivo deste trabalho é a descrição do casode uma criança com quadro clínico e histológico deSHU e que apresentava nos antecedentes familiarespaternos, 4 adultos de duas gerações com históriapregressa de hipertensão arterial grave, associada àgestação em 2 casos, com evolução para insuficiênciarenal. Através dos dados clínicos e histopatológicosdo caso e dos familiares e estudo do heredograma dafamília, os autores sugerem que, neste caso, apredisposição genética com gene autossômicodominante possa ter sido o determinante da doença.

Descrição do Caso

C.C.C., 4 anos e 4 meses, sexo feminino, branca,natural e procedente de Guarulhos, SP. Dezoito diasantes da internação em nosso serviço, apresentavafebre, vômitos incoercíveis e diarréia. Ficou internadaem outro serviço por 8 dias, com melhora da diarréiae febre; recebeu uma transfusão sangüínea poranemia, sendo transferida por apresentar oligoanúriae recorrência dos vômitos. Trata-se de filha única, demãe jovem de 25 anos, sadia. Nasceu de partocesáreo, a termo, peso de 2.900 g, estatura de 47 cm,sem intercorrências neonatais.

A paciente deu entrada em regular estado geral,hidratada, descorada ++/4+, acianótica, anictérica,eupnéica. Peso 13.740 g (p 2,5-10), 12 estatura 101 cm(p 10-25), 12 pressão arterial 150 x 90 mmHg (acimado percentil 95 para idade e sexo), 13 freqüênciarespiratória de 30 inspirações por minuto, murmúriovesicular presente bilateralmente sem ruídosadventícios, freqüência cardíaca de 112 batimentospor minuto, bulhas rítmicas e normofonéticas comsopro sistólico suave, audível em foco mitral ++/4+.

Abdômen plano, normotenso, indolor a palpação,sem visceromegalias, ruídos hidroaéreos presentes,rins não palpáveis.

Gênito urinário sem alterações.Extremidades com discreto edema pré-tibial.Sistema nervoso com desenvolvimento neuro-

psicomotor adequado para a idade.Os exames laboratoriais à entrada estão

resumidos na tabela 1.O hemograma apresentava hemácias crenadas,

anisocitose, hipocromia, poiquilocitose. As dosagensdas bilirrubinas total e indireta foram normais. Aurina tipo 1 apresentou sangue oculto +++, 17.300eritrócitos/ml no sedimento urinário, proteinúrianegativa (0,02 g em 24 horas). A avaliaçãoultrassonográfica renal e abdominal foi normal. Apaciente evoluiu com melhora da função renal com

tratamento conservador, hipertensão arterial sistêmicagrave, necessitando a associação de nifedipina,captopril e furosemida para o controle dos níveispressóricos.

No 34º dia de internação, realizou-se biópsiarenal que evidenciou glomérulos com forma,volume, celularidade preservadas, cápsula deBowman preservados, membrana basal preservada.Túbulos dilatados com epitélio necrótico, emdescamação para a luz. Interstício com fibrose focal,infiltrado linfo-histiocitário. Artérias com proliferaçãofibromuscular da íntima, edema mucóide da íntima,trombose arteriolar (Figura 1). A imunofluorescênciadireta revelou presença de IgM e C3 em médiaarterial.

Recebeu alta hospitalar após 75 dias dainternação, com insuficiência renal leve (clearancede creatinina 60 ml/min/1,73m² ) 14 e drogashipotensoras para o controle da pressão arterial.

A análise dos antecedentes familiares paternosrevelou a existência de casos comprovados dehipertensão arterial grave e insuficiência renal em 2gerações sucessivas (Figura 2), que descreveremosresumidamente a seguir:

• pai aos 31 anos de idade, apresentouhipertensão arterial grave e insuficiência renal,necessitando realizar diálise peritoneal intermitente

Tabela 1Exames laboratorais

Exame Resultado Referênciauréia 160 mg/dL 10 a 40 mg/dL

creatinina 2,0 mg/dL 0,2 a 1,2 mg/dL

sódio 129 mEq/L 132 a 142 mEq/L

potássio 3,1 mEq/L 3,5 a 5,0 mEq/L

eritrócitos 1,4 milhões/mm³ 4,1 a 5,1milhões/mm³

Hb 4,5 g/dL 10,6 a 15,2 g/dL

Ht 14% 32,5 a 42,5%

glóbulos brancos 9.800/mm³ 5.000 a 10.000/mm³

plaquetas 97.000/mm³ 200.000 a 400.000/mm³

reticulócitos 18% 0,8 a 1,2%

DHL 2414 U/L 80 a 240 U/L

AST 79 U/L até 20 U/L

ALT 11 U/L até 20 U/L

TP 13 seg 10 a 18 seg

TTPA 40 seg 22 a 35 seg

gasometria venosa

p H 7,37 7,32 a 7,42

pCO²

35 mmHg 41 a 51 mmHg

HCO³

20,4 mEq/L 24 a 28 mEq/L

Hb = Hemoglobina, Ht = Hematócrito, DHL = Desidrogenase láctica; AST = Aspartatoaminotransferase, ALT = Alanina aminotransferase, TP = Tempo de Protrombina, TTPA =Tempo de tromboplastina parcial ativado, pH = Logaritmo negativo da concentraçãohidrogeniônica, pCO

2 = Pressão parcial de dióxido de carbono, HCO

3 = Bicarbonato

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por 1 mês. Realizou biópsia renal percutânea, cujoexame histológico evidenciou glomérulos com formae celularidade preservados, alguns com discretadiminuição do volume por isquemia, outros comexpansão da matriz mesangial. Túbulos focalmenteatróficos. Interstício com focos de fibrose. Os vasosarteriais e arteriolares apresentavam intensahipertrofia da média e hiperplasia fibrointimal comobliteração da luz (Figura 3). A imunofluorescênciadireta revelou depósitos de IgM e C3 em mesângiocom padrão granular e distribuição segmentar e focal.Faleceu aos 33 anos de idade.

• tia de 25 anos de idade, com história deedema de membros inferiores, diminuição dovolume urinário, com início 48 dias após partonormal, sendo diagnosticadas hipertensão arterial

grave e insuficiência renal aguda, necessitando detratamento dialítico. A biópsia renal revelouglomérulos com forma, volume e celularidadepreservados, membrana basal com enrugamento.Espaço de Bowman aumentado e cápsula deBowman sem alterações. Focos de atrofia tubular efibrose intersticial. Algumas arteríolas com trombosfibrinosos oclusivos na luz, outras com deposição defibrina no espaço subendotelial. Artérias comacentuada proliferação fibromuscular da íntima comedema mucóide (Figura 4). A imunofluorescênciadireta revelou depósitos de C3 em íntima e médiaarterial e C1q em íntima arterial. Esta pacienteabandonou o seguimento.

• tia de 23 anos, com história de hipertensãoarterial em investigação há um ano. Na 20ª semana

Figura 1. Aspecto da biópsia renal de C.C.C., 4 anos e 4 meses. Notam-seendoarterite obliterante com edema mucóide em arteríola aferente (Tricrômiode Masson-140 X).

Figura 2. Heredograma

Figura 3. Aspecto da biópsia renal do pai da paciente com hipertensão arterialmaligna e insuficiência renal. Notam-se endoarterite obliterante com edema mucóidee trombo misto oclusivo em arteríola aferente (Tricrômio de Masson - 160X).

Figura 4. Aspecto da biópsia renal da tia da paciente com insuficiência renalpós-parto. Notam-se arteríolas com intensa hipertrofia da média com trombosfibrinosos ocluindo a luz (Tricrônio de Masson - 140X).

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de gestação, iniciou com edema de membrosinferiores, diminuição do volume urinário e piora dosníveis pressóricos. A gestação foi interrompida na 33ªsemana devido a hipertensão arterial com riscomaterno. A biópsia renal evidenciou glomérulos comforma, volume e celularidade preservados, alçascapilares patentes, membrana basal sem alterações.Cápsula e espaço de Bowman dilatados e algunsglomérulos com fibrose perivascular. Túbulosfocalmente atróficos com espessamento eenrugamento da membrana basal. Interstício comfibrose moderada e infiltrado inflamatório linfocitáriadiscreta. As artérias interlobulares e arqueadasapresentavam intensa fibrose da íntima com reduçãoda luz e hipertrofia da média (Figura 5). Aimunofluorescência direta evidenciou depósitos de C3em alça capilar e mesângio com padrão granular edistribuição global e difusa.

• avó falecida aos 50 anos por problemas renaise hipertensão arterial.

várias gerações da mesma família. Esta condiçãofamiliar é de ocorrência rara e pode apresentar duasformas de herança: autossômica recessiva eautossômica dominante.

Há na literatura cerca de 50 famílias acometidaspela SHU familiar. A grande maioria apresenta opadrão de herança autossômica recessiva. 11,15,16 Hárelato de acometimento de SHU em gêmeosmonozigóticos. 17 A forma de herança autossômicadominante é ainda mais rara. 7 ,8, 10

A forma autossômica recessiva manifesta-se emadultos ou crianças, o acometimento renal pode serprecedido por fenômenos respiratórios. A doençacostuma evoluir de forma gradual, com recidivasfreqüentes, levando comumente à insuficiência renalterminal. Aproximadamente 65% dos casos evoluempara o óbito. A forma autossômica dominanteacomete freqüentemente adultos, o acometimentorenal pode ser deflagado na mulher pelo estadogravídico. A evolução com curso gradual parainsuficiência renal terminal é muito freqüente,podendo apresentar reagudizações, porém menosfreqüentemente que a forma recessiva e apresentauma mortalidade superior a 90%. 18

Carreras e cols. 2 descreveram 3 membros de umafamília com SHU recidivante e encontraram fatorescomuns como a hipocomplementenemia persistente ehaplótipo HLA A3,B7 nos membros afetados,sugerindo uma condição hereditária e congênita, naqual os fatores imunogênicos tivessem implicados napatogênese da doença. O estudo do HLA da famíliapresentemente descrita não foi infelizmente possível,pois o pai e avó paterna são falecidos e as duas tiasafetadas abandonaram o seguimento clínico.

Os achados histológicos encontrados na biópsiarenal da paciente e de seu pai foram nitidamentearteriolares, traduzindo uma atividade da doença anível renal. As alterações observadas na biópsia dastias de 23 e 25 anos são respectivamente compatíveiscom a forma cicatricial do envolvimento renal da SHUe microangiopatia trombótica com endoarteriteobliterante. As lesões histológicas dos familiares destacriança não são patognomônicas da SHU, sendo quetambém podem ser encontradas na nefroesclerosemaligna e no envolvimento renal da esclerodermia.

O quadro clínico de insuficiência renal aguda pós-parto e o achado histológico de microangiopatiatrombótica com endoarterite obliterante apresentadapor uma das tias paternas, podem ser compatíveis coma SHU pós-parto. A SHU pós-parto, também chamadade insuficiência renal aguda pós-parto idiopática, é umquadro de insuficiência renal rapidamente progressiva

Figura 5. Aspecto da biópsia renal da tia da paciente com hipertensão arterial egravidez. Notam-se arteríolas com hipertrofia da média, com intensa fibrose daíntima e redução da luz (Tricrômio de Masson - 160X).

Discussão

A SHU ocorre predominantemente sob a formaclássica e raramente sob a forma familiar.

Na SHU clássica, a incidência e a gravidade sãovariáveis e epidemias foram descritas em váriospaíses tais como Argentina, África do Sul, costa oestedos Estados Unidos e Holanda. Neste grupo, aprevalência varia com o período sazonal,predominando no verão e outono.

A SHU familiar ou hereditária não apresentapredileção sazonal, a doença pode ocorrer após umou mais anos do acometimento de um irmão, e em

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que se desenvolve poucos dias a várias semanas apósuma gravidez e parto sem intercorrências. 19 Arecorrência da SHU atípica tem sido descrita emassociação com gravidez ou uso de contraceptivo oral,e também pré e pós-transplante renal. 18

Em conclusão, a presença do quadro clínico ehistopatológico de SHU na criança descrita, aocorrência de duas tias paternas com insuficiênciarenal e hipertensão arterial grave, uma após partonormal e outra associada à gravidez, o óbito paternorelacionado a insuficiência renal e hipertensão arterialgrave, e os achados histopatológicos de endoarteriteobliterante com nítido envolvimento arteriolar nessesfamiliares sugerem neste caso uma predisposiçãogenética com gene autossômico dominante.Infelizmente, este diagnóstico só poderá ser sugeridoe não firmado, o que dificulta o aconselhamentogenético da paciente e de outros membros da famíliapaterna, pois há risco de ocorrência da doença em50% nas gestações futuras.

A avaliação deste caso ressalta a importância daavaliação global da história clínica e familiar dapaciente. Até o momento, ainda não se dispõe denenhum exame específico para o diagnóstico precocee prevenção pré-natal da SHU familiar.

Summary

Hereditary hemolytic uremic syndrome (HUS) is arare disorder presenting with a worse clinicalprognosis than the classical or epidemic form of thedisease. The authors present a case of HUS ofsuspected autossomal dominant inheritancecharacterized by similar clinical findings in familymembers of two generations and both sexes.

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Artigo recebido em 23 de dezembro de 1996 e aceito parapublicação em 18 de julho de 1997

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Comentário Editorial

Principalmente nas duas últimas décadas, o tratamento dahipertensão arterial leve a moderada passou por inúmerasmodificações. Cerca de 10 a 20% da população adulta é portadoradesta doença e uma terapêutica consensual e única é impossívelde ser aplicada a todos os pacientes. Além disso, o desafio danormalização dos níveis tensionais deixou de ser uma missãodifícil, para se tornar um evento factível na imensa maioria dosindivíduos hipertensos com boa adesão ao tratamento.

Hoje existem disponíveis um grande número de fármacos, deeficácia comparável, que podem ser utilizados em monoterapia ouem associação. No entanto, atualmente, se procura mais do quetão somente a normalização da pressão arterial. É desejável queefeitos benéficos adicionais possam ser oferecidos ao pacientehipertenso. Assim, os inibidores da enzima de conversão daangiotensina (ECA) têm sido associados com reversão dehipertrofia ventricular esquerda e cárdio-proteção, 1,2 prevenção oureversão de alterações estruturais vasculares, 3 proteção renal, 4

além de permitirem comodidade posológica, 5 sem interferir comos perfis glicídico e lipídico.

Os inibidores da ECA, a partir da segunda geração, não possuem ogrupamento sulfidrila em sua estrutura molecular, o que possibilitaação prolongada e, portanto, dose única diária. 5 Adicionalmente,esse grupo de drogas é bem tolerado, com efeitos colateraisinfreqüentes e pouco intensos, favorecendo assim a boa adesãodos pacientes ao tratamento. 6

Neste trabalho de J.L. Santello e cols., 7 os autores utilizaramLisinopril, por período prolongado, em monoterapia, paratratamento de hipertensos leves a moderados. Sua eficácia podeser comprovada através da MAPA, recurso cada vez mais utilizadoem ensaios clínicos de boa qualidade, que possibilitou demonstrarainda a inexistência de taquifilaxia ou escape.

Neste estudo multicêntrico nacional puderam ainda os autorescomprovar a excelente tolerabilidade à droga, que não interferiucom os parâmetros metabólicos e bioquímicos aferidos após cincomeses de terapêutica efetiva. No entanto, não puderam confirmar a

Efeitos adicionais do tratamento anti-hipertensivo: uma necessidade

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esperada reversão da hipertrofia ventricular esquerda nos pacientesque a apresentavam no primeiro exame (19%), embora tenhaocorrido redução não significante da massa ventricular. O efeitocolateral mais freqüente foi tosse seca em 5% dos pacientes, queforam excluídos. Certamente, cada vez mais, médicos e pacientesexigirão dos pesquisadores e da indústria farmacêutica aperseguição de uma droga anti-hipertensiva “ideal” que tragamúltiplos benefícios, custo razoável e efeitos adversos desprezíveis.

Cibele Isaac Saad RodriguesProfa. Associada da Disciplina de Nefrologia

Departamento de Medicina-CCMB-PUCSP

Referências

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Comentário Editorial

Apesar dos grandes progressos obtidos nos últimos anos nocontrole metabólico e no tratamento anti-hipertensivo, muitospacientes diabéticos ainda continuam evoluindo para ainsuficiência renal crônica terminal (IRCT). Nos Estados Unidos, anefropatia diabética é, isoladamente, a causa mais frequente deIRCT, contribuindo com cerca de um terço dos pacientes emprogramas de diálise e transplante renal. 1 Nos países europeus, osregistros da European Dialysis and Transplantation Association(EDTA) mostram que, desde 1965, tem ocorrido um contínuoaumento no número de pacientes diabéticos que iniciamanualmente a terapêutica de substituição da função renal; 2 entre1966 e 1973, menos de 2% de todos os pacientes que atingiam aIRCT na Europa eram diabéticos. Esta proporção se elevou até 14%em 1990 e, atualmente, se encontra ao redor de 16%. Outro fatointeressante apontado nos registros do EDTA tem sido o aumentoda casuística de diabéticos nefropatas na faixa etária de 45 a 65anos em 1991, numa proporção 3 vezes maior em relação aogrupo mais jovem, de 25 a 44 anos.

No Brasil, os dados referentes a nefropatia crônica em diabéticossão escassos e as casuísticas, de modo geral, são regionalizadas. NoMunicípio de Campinas, São Paulo, Faria e cols. 3 relataramprevalência de 17,6% de nefropatia diabética em pacientes admitidospara tratamento dialítico, constituindo a terceira causa de IRCT,precedida pelas glomerulonefrites crônicas e pela hipertensãoarterial. Gonzaga e cols., 4 de Porto Alegre, realizaram levantamentodas características demográficas de pacientes com IRCT em 15unidades de diálise e constataram a ocorrência de diabetes mellitusem 27,3% dos pacientes, nos quais foi mais elevada a taxa demortalidade após o seguimento médio de 30 meses. Taxasemelhante, de 28%, foi relatada por D’Ávila e cols., 5 observada emoutra casuística da região de Sorocaba, no interior de S. Paulo.

O trabalho de Pinto e cols., nesta edição do JBN, 6 vem acrescentarmais uma importante contribuição para o melhor conhecimentosobre a prevalência da doença renal diabética como causa de IRCT

Insuficiência renal crônica por nefropatiadiabética: Qual sua real prevalência emnosso meio?

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na grande São Paulo, além de analisar a sobrevida atuarial dospacientes, com base nos dados do ano de 1991. Dentre 5140pacientes sob tratamento dialítico naquele ano, o diabetes mellituscontribuiu com 9,0% das causas de IRCT e sua incidência anual foide 10 pacientes/milhão de habitantes.

Estes resultados estão muito aquém dos demais relatos brasileiros,não havendo uma explicação plausível para estas diferenças. Taisdados conflitantes, quanto a real prevalência e incidência anual dodiabetes como causa de IRCT em nosso meio, apontam para aurgente necessidade de um estudo amplo, de âmbito nacional, quepossa melhor esclarecer a dimensão deste problema e de suasconsequências, tais como a adoção de medidas que impliquem naredução da elevada taxa de mortalidade cardiovascular nestapopulação.

Rui Toledo BarrosDisciplina de Nefrologia

Faculdade de Medicina - USP

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 289 289

Comentário Editorial

Os efeitos tóxicos do acúmulo de alumínio em pacientes urêmicos sãoconhecidos e foram muito estudados, especialmente na última década.

A intoxicação alumínica provoca doenças ósseas, piora a anemiaobservada nos urêmicos, além de levar a quadros de encefalopatiasevera. Atualmente são raros os casos graves de intoxicaçãoalumínica. Entretanto, em nosso meio, um grande número depacientes submetidos a hemodiálise apresentam ainda depósitos dealumínio revelados pela biópsia óssea.

Os elementos traços como o alumínio apresentam forte ligaçãoprotéica, dessa forma sua transferência do paciente para odialisado somente se dá quando as concentrações de alumínio nodialisado são muito baixas, ou seja menores que 3 mg/l, e se oalumínio sérico não exceder 30 mg/l. 1

As dificuldades em dosar alumínio são conhecidas; a acurácia,precisão e controle da contaminação somente são obtidos comequipamento apropriado e pessoal técnico altamente qualificado.

O artigo “Alumínio em Diálise - uma visão analítica” 2 descrevecom precisão os níveis de contaminação pelo alumínio, bem comoas precauções necessárias para evitá-la e, dessa forma, obterresultados reprodutivos.

São benvindos em nosso meio grupos como o da UniversidadeFederal de Santa Maria, que dispõe de equipamentos e pessoalqualificado para dessa forma preencher uma lacuna de pelo menos20 anos no controle da intoxicação alumínica no Brasil.

Vanda JorgettiServiço de Nefrologia -Hospital das Clínicas da FMUSP

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Controle de intoxicação alumínica nainsuficiência renal crônica

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290 J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 290-291

Comentário Editorial

O termo rejeição crônica definia uma forma lenta e progressiva deperda da função do enxerto renal principalmente vinculada a umaresposta imune antígeno dependente, cujos mecanismos humorais,moleculares e celulares envolvidos não são conhecidos. 1 Maisrecentemente, outros eventos não imunológicos estão sendoclaramente relacionados ao desenvolvimento deste quadro crônico.Desta forma, a denominação rejeição crônica vem sendosubstituída por disfunção ou nefropatia crônica do enxerto, querepresenta a via final da ação conjunta destes fatores, resultandono processo inflamatório crônico característico. 2

A participação de eventos não imunológicos neste processo vemsendo elegantemente estudada em modelos de transplanteexperimental pelo Prof. Nicolas L. Tilney, que demonstrou o papelda redução da massa renal, 3 da presença concomitante de infecção4 e também o limite de reversibilidade do processo 5 em transplanteentre ratos.

É interessante também a correlação com a mudança nos conceitoshoje admitidos como fatores relacionados à progressão da doençavascular. Em estudo recente, Epstein e cols. 6 demonstraram queinfecção prévia pelo CMV era um forte fator de risco preditivo parare-estenose depois da aterectomia coronariana. O DNA do vírus foirelacionado com a hiperplasia da neointima e remodelação arterial,sendo uma das proteínas (IE84) do vírus capaz de ligar-se e inibirum produto gênico com atividade supressora tumoral (p53). Estesefeitos aumentam a proliferação das células musculares lisas ouinibem apoptose, contribuindo para a restenose. 6 No processo derejeição crônica, cuja lesão vascular é semelhante a infecção pelocitomegalovírus, pode também contribuir para sua progressão. 1

Neste número do Jornal Brasileiro de Nefrologia, Mocelin e cols. 7

estudaram os fatores co-mórbidos críticos no desenvolvimento dadisfunção crônica do enxerto. Estudando prospectivamente 372pacientes transplantados em 19 anos em dois hospitais, os autoresencontraram uma incidência de disfunção crônica do enxerto de5,4% dos pacientes em uso de esquema imunossupressor duplo

Fatores co-mórbidos críticos nodesenvolvimento da disfunção crônica doenxerto

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 290-291291

(azatioprina e prednisona) e uma taxa maior de 12,4% naquelescom esquema tríplice usual. Diferença que podemos atribuir àpresença de maior número de rejeição aguda e a um maiornúmero de receptores HLA incompatíveis em relação ao doador.Menor taxa de disfunção crônica foi observada nos pacientes commaior compatibilidade HLA, conforme literatura. Os autoresressaltam, também, a maior ocorrência de disfunção crônica entrereceptores jovens, em concordância com a literatura, onde a maiortaxa de não complacência à terapia encontra-se nesta faixa etária.

Sem tratamento efetivo conhecido da disfunção crônica doenxerto, resta o tratamento das complicações presentes emconcomitância ao diagnóstico, como a hipertensão arterialsistêmica, a hiperlipidemia, visando diminuir possíveis lesõesadicionais. Sua prevenção passa pela prévia adequadacompatibilidade HLA entre doador-receptor, pela redução daincidência de necrose tubular aguda pós-transplante, e nodesenvolvimento de esquemas imunossupressores individuais paratipos selecionados de pacientes.

José Osmar Medina PestanaProfessor Adjunto da Disciplina de Nefrologia

UNIFESP-EPM

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292J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 292-293

Comentário Editorial

Um grande número de drogas de uso comum na prática médicainduz modificações na função renal, tão evidentes como umafalência global da função renal, ou alterações sutis, tais como levemodificação da excreção fracional de NA +, K +, HCO

3-, ou discretas

alterações na capacidade de concentração e diluição urinárias, quepodem eventualmente passar despercebidas.

Estas alterações, no entanto, ainda que sutis, podem levar adificuldades na manutenção do balanço hidroeletrolítico ou ácido-base de pacientes com afecções sistêmicas mais complexas que, àsvezes, exigem a utilização crônica desses medicamentos. Uma vezque a taxa de filtração desses eletrólitos é muito elevada, pequenasmodificações na excreção fracional resultam em significativasalterações no balanço global dos mesmos. A busca do esclarecimentodos mecanismos pelos quais essas drogas modificam algunsparâmetros da função renal, visando esclarecer os mecanismos deinteração molecular das drogas com as células epiteliais tubulares oucom componentes vasculares da estrutura renal, é um aspectoimportante da pesquisa contemporânea em fisiopatologia renal, quepoderá resultar em avanços significativos para o aperfeiçoamento daestrutura dessas drogas ou na maneira como são administradas.

Dentro desse aspecto, essa edição do Jornal Brasileiro de Nefrologianos traz uma investigação dos efeitos renais do trimetroprim esulfametoxazol, 1 drogas essas amplamente utilizadas na práticamédica, inclusive com utilização crônica em pacientesimunodeprimidos. Os resultados dessa investigação sugeremfortemente que o trimetopim modifica o transporte de eletrólitos eágua nas porções mais distais do nefro. Esses resultados fornecemalgumas pistas para investigação dos mecanismos moleculares quelevam a modificação de sistemas de transporte iônico em umsegmento tubular específico, tais como receptores de superfície, porexemplo, que poderiam eventualmente sugerir modificaçõesestruturais específicas nessa droga.

Nancy A. RebouçasDepartamento de Fisiologia e Biofísica

Instituto de Ciências Biomédicas - USP

Efeitos renais do trimetoprim e sulfametoxazol

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 292-293293

Referência

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294 J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 294-300

Comentário Editorial

A síndrome hemolítico-urêmica (SHU) é uma entidade muitoconhecida dos nefrologistas pediátricos, especialmente no sul doBrasil. Observa-se, ao longo dos anos, um aumento crescente nonúmero de casos que pode corresponder a um aumento real nasua incidência ou à realização de mais diagnósticos, em função deum maior conhecimento desta patologia. Prevalências aumentadasde SHU foram descritas na Argentina, Canadá, Inglaterra e EstadosUnidos, mas ela ocorre em todo o mundo.

Em 1955, foi publicada em alemão por Gasser e cols. 1 umadescrição da SHU. Embora este não tenha sido o primeiro relato,ele é considerado seu marco inicial. Os autores individualizaram aSHU da púrpura trombocitopênica trombótica e definiram suasmanifestações clínicas cardinais (concomitância de anemiamicroangiopática, trombocitopenia e insuficiência renal aguda).Eles observaram a ocorrência de duas formas, uma familiarrecorrente e outra que se associava a um prognóstico favorável alongo-prazo. No estudo da SHU, três autores contribuíramsignificativamente para o entedimento da doença: Renée Habib(França), Carlos Gianantonio (Argentina), falecido em 1995, eBernard Kaplan (Canadá, Estados Unidos). Habib 2 definiu ahistopatologia da SHU. Gianantonio 3 foi responsável pordescrições detalhadas do quadro clínico da SHU clássica (associadaà diarréia) e a introdução da diálise peritoneal no tratamento dadoença. Desde então, várias tentativas de tratamento da SHU(heparina, dipiridamole, agentes trombolíticos e plasmaferese,entre outras) foram feitas. Apesar do número restrito de estudoscontrolados até o momento, o diagnóstico precoce e os avançosintroduzidos no tratamento da insuficiência renal aguda foram osúnicos, nos últimos 30 anos, que modificaram, de formairrefutável, a mortalidade da SHU. 4 Kaplan 5 disseminou oconceito de que a SHU é uma síndrome (portanto, pode ter váriasformas clínicas e diferentes etiopatogenias) e é responsável porestudos sobre a SHU familiar e sua transmissão genética. 6

Síndrome hemolítico-urêmica e suasdiferentes formas de apresentação: umapatologia atual da Nefrologia

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J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 294-300 295

No Brasil, o primeiro caso de SHU foi relatado por Penna,Manissadjian e Okay. 7 Deve-se a Lobato e cols., 8, 9 de PortoAlegre, a difusão da entidade em nosso meio e a maiorexperiência brasileira relatada na década de 60. Riella, 10 em 1976,foi o primeiro autor de um trabalho, realizado em Seattle, sobreSHU na infância, publicado no Nephron.

Embora em muitos países a SHU seja a principal causa deinsuficiência renal aguda em lactentes e pré-escolares, 11 somenteem 1983, no 6th International Congress of the International Societyfor Pediatric Nephrology , realizado em Hannover, Alemanha, é quese realizou, pela primeira vez, uma mesa-redonda totalmentededicada à SHU. 12 Em congressos de Nefrologia, a SHU é muitopouco discutida. No XIX Congresso Brasileiro de Nefrologia, quese realizará em Porto Alegre, em 1998, haverá, pela primeira vezno Brasil, um simpósio inteiramente dedicado à SHU, com aparticipação de Bernard Kaplan.

Em adultos, situações predisponentes da SHU incluem gravidez,uso de anticoncepcionais orais, doenças sistêmicas, hipertensãoarterial maligna, infecção por HIV, câncer e tratamento comantiblásticos. 13, 14, 15 As formas associadas com gestação, em geral,ocorrem próximo ao termo, como uma complicação da pré-eclâmpsia, e na maioria há recuperação completa com o parto. 15, 16

A SHU pós-parto é uma entidade nebulosa, caracterizada pelaocorrência de hipertensão severa e prognóstico desfavorável. 15, 16, 17

A SHU associada ao vírus HIV é hoje a causa mais comum depúrpura microangiopática em adultos. 15

A SHU pode ser classificada em (1) clássica, típica, epidêmica ouD+: ocorre predominantemente em lactentes e pré-escolares e seassocia, em geral, com infecção por bactérias (Escherichia coli ,Shigella dysenteriae e Streptococcus pneumoniae) produtoras deuma toxina, que é chamada tanto de Shiga-like toxin , como deverotoxina. A Escherichia coli O157:H7 18 é, nos Estados Unidos eno Canadá, o germe mais comumente isolado em pacientes comSHU. Na Argentina, onde é relatada a maior prevalência mundialde SHU clássica, a Escherichia coli O157:H7 foi identificada emapenas 2% das crianças com esta doença. 18 A transmissão destabactéria se dá predominantemente através de comida contaminada.A ingestão de hamburgers contaminados é responsável porepidemias de SHU. Em alguns estados canadenses, a infecção poresta Escherichia coli é de notificação compulsória. A infecção podeocorrer também por disseminação pessoa-pessoa em famílias,creches, escolas, tanto com a Escherichia coli O157:H7, como coma Escherichia coli O111. 18, 19 Evidências de infecção porEscherichia coli produtora de verotoxina foram relatadas em 75%

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296 J. Bras. Nefrol. 1997; 19(3): 294-300

das crianças com SHU típica. 16 Por outro lado, 30% dos pacientescom colite hemorrágica associada a Escherichia coli 0157:H7desenvolvem SHU. 15 Há relatos isolados de SHU causada porSalmonella typhi, Campylobacter jejuni, Versinia pseudotuberculosis ,Pseudomonas, Bacteroides e vírus ( portillo , HIV, coxsackie, Epstein-Barr, influenza, entre outros). Muitos destes agentes podem, naverdade, não estar implicados a patogênese da SHU; 5 (2) atípica,esporádica ou D-: não apresenta variação sazonal, tal como aforma típica. Está associada ao uso de fármacos (ciclosporina A,mitomicina, contraceptivos orais), herança genética autossômicarecessiva ou dominante, gravidez, transplante (renal, de medula,fígado, pulmão, coração). 13, 15, 19 SHU atípica foi relatada em 12%das 192 crianças atendidas em Londres 20 e em 35% das 66hospitalizadas na Suiça. 21 A SHU D- é, portanto, um grupoheterogêneo, que se diferencia da SHU D+, por suas característicasepidemiológicas, clínicas, laboratoriais, histológicas e peloprognóstico, que é mais desfavorável. 20,21

O risco de recorrência da SHU após transplante renal e o papel daciclosporina (se é que ele existe) também é motivo decontrovérsias. 15, 19, 20, 22, 23 Não há relatos de recorrências na formatípica de SHU. 20, 22 Numa série de 91 pacientes com SHU pós-transplante de órgãos sólidos, verificou-se que em 90% deles suaocorrência estava relacionada a transplante de rim. 19

Do ponto de vista histopatológico foram definidos três grupos: (1)necrose cortical; (2) predominância de lesões glomerulares; (3)predominância de lesões arteriolares. Pode haver concomitância delesões glomerulares e arteriolares. Sugere-se que os casos típicosapresentem lesões predominantemente glomerulares e que a lesãomais significativa da forma atípica é arteriolar. 24, 25, 26

Estima-se que na Europa 10% dos casos de SHU atípica sejamfamiliares. 21 Na Argentina, a prevalência descrita de casosfamiliares foi de 3% entre pacientes com SHU, atendidos entre1960 e 1992. 27 Em 1975, Kaplan e cols., 6 baseados no estudo de83 irmãos em 41 famílias, propuseram a divisão da SHU familiarem dois grupos. O prognóstico e intervalo entre o início dadoença é que os diferenciava. No grupo I, os casos foramesporádicos e o prognóstico mais favorável. O intervalo entre oinício da doença, em irmãos, variou de dias a semanas. Estaforma seria adquirida. Grupo II: Casos, em geral, recorrentes.Prognóstico desfavorável com mortalidade elevada (68%). Ointervalo entre o início da doença, em irmãos, foi maior que 1ano. Esta forma seria herdada, 6 com um padrão de herançaautossômico recessivo 26 ou dominante. 23, 28 Voyer e cols. 27

classificaram seus casos de SHU familiar em: 1) concomitante; 2)

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não-concomitante; 3) recorrente. Alguns pacientes com SHUatípica (sem diarréia nos pródromos, com episódios recorrentes,curso progressivo e comprometimento arteriolar grave), podemter a forma autossômica recessiva, mesmo que não existam outrosfamiliares acometidos. Nestes é que haveria recorrência dadoença, após transplante renal. 26, 27 Em 1994, demonstrou-se quea herança do HLA-B40 aumenta o risco de desenvolver SHU. 29

Evidenciou-se, posteriormente, que a freqüência do HLA-B40 napopulação branca era significativamente maior que na populaçãoafro-americana da mesma área. 30 Isto explicaria a ocorrênciamaior de SHU em indivíduos caucasianos. 30, 31 A formaautossômica dominante, embora menos freqüente é mais fácil deser identificada. Caracteriza-se pela presença de hipocomple-mentenemia e de haplótipo HLA-A3, B7. 26, 32 Acomete maisadultos, o controle da hipertensão arterial é mais difícil e amortalidade mais elevada (maior que 90%). 28 Em 1997, foirelatado um caso de SHU recorrente com hipocomplementenemiae linfangiectasia intestinal que poderia ser uma nova associaçãodentro dos subgrupos da SHU que cursam com complementodiminuído. 33

Neste número do J.B.N., Furusawa e cols. 34 nos brindam com orelato de uma família, provavelmente portadora de SHU familiar,forma autossômica dominante, na qual a doença se manifestou emtrês gerações. Tal como relatado, a SHU em mulheres adultas foiprecipitada por gravidez. 35

Este artigo propicia a reflexão sobre vários aspectos da medicinamoderna, na qual se constata a pouca integração entre os diversosespecialistas, que atendem os pacientes. Na área de Nefrologia,nos principais hospitais brasileiros, há uma quase total falta decomunicação entre as Unidades de Nefrologia e NefrologiaPediátrica. Com isso, ambas saem perdendo, porque nenhumadelas acompanha longitudinalmente a história natural de doençasque se iniciam na infância e evoluem até a idade adulta. Não hátroca de experiências entre profissionais que atendem uma mesmapatologia, mas que têm apresentações clínicas diversas, emdiferentes grupos etários. Enfatiza, também, a importância daanamnese, tão negligenciada atualmente diante de enormedisponibilidade de métodos diagnósticos muito sofisticados. Estapublicação ressalta a imperativa integração entre a clínica e apatologia para a interpretação correta das anormalidades dabiópsia renal. Deixa evidente, também, a necessidade urgente deuma maior colaboração da Nefrologia com a Unidades deGenética.

Tenho certeza que foi a determinação dos autores do presente

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estudo que resgatou e integrou os dados dos outros familiaresacometidos. Lamentavelmente, o diagnóstico de SHU familiar,forma autossômica dominante não foi feito, por não terem sidosolicitadas, para nenhum deles, as determinações de complementoe de HLA. Isso impediu o diagnóstico de certeza desta forma rarade SHU. Ficaram prejudicadas medidas preventivas, tais comoorientações quanto ao uso de anticoncepcionais e gravidez nasoutras mulheres da família.

Noemia Perli GoldraichProfessora Adjunta, Depto. de Pediatria,

Faculdade de Medicina, Porto Alegre, UFRGS

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Introdução

Evidências acumuladas desde o início de 1980sugerem que células da glândula paratireóideexpressam um receptor de superfície celular sensívela variações do cálcio extracelular, conhecido comoreceptor-sensor de cálcio. Este receptor de cálciofunciona como um regulador fisiológico primário paraa secreção do paratormônio (PTH), sendo ativado porelevações na concentração de cálcio extracelular. Oreceptor reconhece não apenas cátions divalentescomo o cálcio e magnésio, mas também cátionstrivalentes e policátions (neomicina, spermine,protamina, bário, gadolinium, lantânio e estrôncio),demonstrando ser o primeiro exemplo de receptor desuperfície celular que detecta íons inorgânicos como1° s mensageiros e não moléculas como seu maiorligante.

Elevações na concentração de cálcio extracelularsão inicialmente detectadas pelo receptor a nível demembrana celular, e através do acoplamento comproteínas G reguladoras 1,2,3 ativam diferentes 2 os

mensageiros intracelulares. Um destes sistemasativadores da fosfolipase C leva à hidrólise depolifosfoinositídeos, acúmulo de inositol 1,4,5-trifosfato (IP3) produzindo rápida elevação no cálciocitosólico resultante da mobilização de cálciointracelular do retículo endoplasmático para o citosole influxo de cálcio extracelular através de canais decálcio. 4 Adicionalmente, outro sistema ligado àproteína G inibitória reduz a atividade daadenilciclase.

Em 1991, Racke et al., 5 assim como Shoback etal., 6 observaram que oócitos de rã (Xenopus laevis)podiam ser utilizados como modelo experimentalpara demonstrar a expressão do receptor isolado daparatireóide bovina, através da ativação de correntesde cloro.

Em 1993, Brown et al. 7 clonaram a sequência doDNA complementar (cDNA) do receptor de cálcioextracelular de paratireóide bovina (BOPCaR1).

Posteriormente, Ricardi et al. 8 identificaram eisolaram o cDNA do receptor de cálcio em rim derato (RaKCaR) que apresentava 92% de homologiacom o receptor bovino.

A análise através de “Northern blot” e imuno-histoquímica revelou que também existem receptoresde cálcio em outros tipos celulares como células C datireóide, 9 intestino delgado e grosso, e cérebro. 9,10

Em 1995, Garrett et al., 11 utilizando o clonebovino, demonstraram a presença de transcritos doreceptor de cálcio em adenoma de glândulaparatireóide removidos de um paciente comdiagnóstico de hiperparatireoidismo primário e istopermitiu a descoberta da sequência de aminoácidosdo receptor de cálcio humano. A característicaestrutural da molécula apresenta uma sequência deaminoácidos compreendendo 3 domínios: grandedomínio extracelular aminoterminal, uma porçãocentral hidrofóbica com 7 regiões transmembranacaracterísticas das proteínas G e um grande domíniointracelular carboxiterminal relativamente longo epresumivelmente citoplasmático. Ainda não éclaramente conhecido qual o local onde os agonistascatiônicos se ligam ao receptor de cálcio, masprovavelmente isto ocorra no domínio extracelular. Oreceptor de cálcio mostra alta homologia apenas coma família dos receptores glutamato metabotrópicos(mGLURs), que são receptores para o maiorneurotransmissor excitatório do sistema nervosocentral (SNC), sugerindo que o receptor possa serresponsável por ações regulatórias dentro do SNCainda não compreendidas. 9,10

Relação cálcio e PTH

Um complexo sistema homeostático é designadopara a manutenção da concentração de cálcioionizável extracelular através de alterações nasecreção de hormônios reguladores de cálcio, como oPTH e calcitonina, produzidos respectivamente pelaglândula paratireóide 12 e tireóide. 13 Além destes,

Revisão/Atualização em Fisiologia e Fisiopatologia Renal:Importância dos receptores de cálcioSuely Tiaki Yumiya, Mirian Aparecida Boim e Ita Pfeferman Heilberg

Disciplina de NefrologiaEscola Paulista de Medicina, UNIFESP/EPMEndereço para correspondência: Ita Pfeferman HeilbergRua Botucatu, 740, Vila ClementinoCEP 04023-900 - São Paulo, SPTel.: (011) 574-6300 - Fax (011) 573-9652

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outros sistemas efetores localizados a nível renal,ósseo e intestinal respondem a mudanças notransporte iônico para restaurar a concentração decálcio ao normal.

Mudanças minímas na concentração de cálcioionizável extracelular estimulam a secreção de PTHem segundos, 14, 15, 16 produzindo alterações na ligaçãode hormônios a receptores específicos de altaafinidade em tecidos alvos. 17 A nível renal, o PTHproduz aumento da reabsorção tubular distal decálcio em minutos 18 e a nível ósseo aumenta aliberação de cálcio dentro de horas. 19,20,21,22,23 Se ahipocalcemia é mais prolongada, outros mecanismoshomeostáticos são ativados, ocorrendo a hidroxilaçãoda 25(OH)D pela 1a-hidroxilase no túbulo proximalrenal para formar 1,25(OH)

2 D

3,

24, 25 que atua em

receptores específicos a nível intestinal, promovendoabsorção de cálcio e fósforo. 26 Quando se mantémdurante vários dias ou semanas, ocorre proliferaçãocelular da glândula paratireóide, com aumento dasecreção de PTH e ações mais pronunciadas a nívelrenal, ósseo e intestinal são observados.

Distribuição e Importância doReceptor de Cálcio a Nível Renal

Os rins exercem papel fundamental namanutenção do metabolismo ósseo e mineral atravésda reabsorção tubular de íons cálcio, magnésio efosfato do filtrado glomerular e, dependendo dasnecessidades homeostáticas, pode alterar dramatica-mente a excreção e os níveis circulantes desses íons.A síntese de 1,25 diidroxicolecalciferol (1,25(OH)

2D

3)

permite ao rim participar ativamente na regulação emanuseio esquelético e gastrointestinal de cálcio efosfato. A 1,25(OH)

2D

3 aumenta a absorção intestinal

de cálcio e fosfato e, juntamente com o PTH, ativa areabsorção óssea, aumentando a liberação esqueléticade cálcio e fosfato.

O receptor de cálcio está localizado dentro deregiões do rim que são diretamente reguladas pelocálcio extracelular, 8 exercendo um papel chave namanutenção da homeostase iônica através da reab-sorção tubular renal do filtrado glomerular para manteras necessidades homeostáticas, e pode alterar drama-ticamente a excreção e o nível circulante de cálcio.

Através de várias técnicas, incluindo imunohisto-química com anticorpos específicos anti-receptor,hibridização in situ e reação em cadeia da polimerase(PCR), foi demonstrada expressão do receptor decálcio em rim de rato a nível de alça ascendente

espessa medular, alça ascendente espessa cortical(principalmente na superfície basolateral da célula),túbulo contorcido distal, ducto coletor cortical, ductocoletor medular (membrana apical) e papilar. 8 Osefeitos do cálcio extracelular nestes segmentos são:inibição da hidroxilação da 25-dihidroxivitamina D notúbulo proximal independente de PTH, 27 inibição dotransporte de NaCl na alça ascendente espessa, 28

redução da reabsorção de cálcio e magnésio na alçaascendente espessa medular, 29 redução no acúmulode AMP cíclico hormônio-estimulado (toxina pertus-sis-sensível) em alça ascendente espessa de Henle(AAEH) medular e cortical, 30 inibição da ação dohormônio anti-diurético (ADH) no ducto coletor 31 eefeito direto no mRNA da calbindin-D

28 em túbulo

contorcido distal. 32

Tem sido demonstrado que o receptor de cálcioa nível renal tem implicações importantes nomanuseio tubular de cátions divalentes como o cálcioe magnésio. Níveis elevados de cálcio peritubularativam o receptor de cálcio expresso na membranabasolateral e reduz a reabsorção de NaCl e avoltagem transepitelial (lúmen menos positivo) emAAEH, resultando em menor reabsorção de cálcio emagnésio pela via paracelular. 33, 34 Outro efeito daativação do receptor de cálcio na membranabasolateral da AAEH é a inibição dos canais depotássio apicais que reduzem a recirculação depotássio necessário para o bom funcionamento do co-transportador Na-K-2Cl, 35,36 bem como para amanutenção do lúmen positivo. O efeito final deambos os processos mediados pelo receptor de cálcioé a redução do transporte paracelular de cálcio (etambém magnésio) semelhante ao que se observaapós administração de furosemide.

A nível de túbulo coletor medular, o receptor decálcio também participa na regulação da reabsorçãode água. Primeiramente o cálcio peritubular podeinfluenciar a produção de AMP cíclico estimuladopelo ADH. O cálcio luminal não reabsorvido na AAEHreduz a habilidade do ADH em estimular a atividadede canais de água aquaporina-2 37 na membranaapical, resultando na redução da permeabilidade àágua estimulada pelo ADH no ducto coletor. Estesmecanismos produzem um aumento do cálcio urinárionum volume urinário maior, ou seja, urina maisdiluída. Durante hipercalcemia crônica ou patológica,estes mecanismos podem ser responsáveis peloaparecimento de diabetes insípidus nefrogênico. Afigura a seguir publicada por Hebert et al., 38 mostrao papel do receptor-sensor de cálcio no manuseio deágua e cátions divalentes a nível renal.

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Condições Patológicas

Recentes estudos têm demonstrado patologiashumanas decorrentes de mutações que resultam emativação e inativação dos receptores de cálcio. Asmutações inativadoras estão presentes nas formashomozigóticas (hiperparatireoidismo neonatal severo)e heterozigóticas (hipercalcemia hipocalciúricafamiliar) e as mutações ativadoras causam uma formaautossômica dominante de hipocalcemia. A hiper-calcemia hipocalciúrica familiar (FHH) é uma desor-dem hereditária autossômica dominante, caracterizadapor hipercalcemia moderada, geralmente assintomá-tica, hipocalciúria relativa e níveis de PTH inapro-priadamente normais. 39 O hiperparatireoidismoneonatal severo (NSHPT) é uma forma grave dehiperparatireoidismo que ocorre em recém-nascidos 40

caracterizada por concentrações séricas de cálcioextremamente elevadas (algumas vezes superiores a20 mg/dl), desmineralização esquelética e hiperplasiade glândula paratireóide usualmente fatal, a menosque seja realizada paratireoidectomia poucos diasapós o nascimento. Estudos in vitro e in vivo mostramanormalidades do receptor de cálcio em glândulaparatireóide destes indivíduos, documentandomodesta a severa redução na capacidade de célulasda paratireóide em responder às elevações de cálcio.A localização do gene defeituoso responsável peloFHH no braço longo do cromossomo 3q2, 41 permitiudemonstrar através de análise genética que o NSHPTé a forma homozigota do FHH. Através de técnicas

como o PCR e uso de enzimas de restrição, demons-trou-se que membros de famílias com FHH apre-sentam mutações únicas na sequência de aminoácidosdo receptor de cálcio, incluindo mutações no códon796 (troca de arginina por triptofano), códon 298(troca glutamina por lisina) e códon 186 (troca dearginina por glutamina), sendo que nenhuma dasmutações observadas foram identificadas emindivíduos normais, demonstrando que a seqüênciavariante do gene do receptor tem consequênciasfuncionais. A Hipocalcemia Autossômica Dominanteresulta da redução do limiar da célula paratireóidepara a secreção de PTH em resposta ao cálcio, emembros afetados apresentam uma mutação nocódon 128 do domínio extracelular (troca glutaminapor alanina). Esta mutação ativa o receptor de cálcioque interpreta níveis reduzidos de cálcio (hipo-calcemia) como níveis dentro da normalidade,bloqueando o estímulo para a secreção de PTH.

Papel do Receptor de Cálcio nasDiferentes Formas deHiperparatireoidismo

Apesar da evolução da biologia celular emolecular e do conhecimento dos efeitos do cálcio ecalcitriol na glândula paratireóide, o controlefisiológico da função secretória e crescimento dotecido paratireoidiano no hiperparatireoidismo aindapermanece mal compreendido.

No Hiperparatireoidismo Primário (HPT 1ário )observa-se elevação no “ set point ” de cálcio para asecreção de PTH que pode ser resultante de mutaçõessomáticas no receptor de cálcio, alterações naquantidade do receptor relativo ao aumento da massano adenoma hipercelular, redução da sensibilidade doreceptor ao cálcio extracelular, 42, 43 ou devido aalterações dos mecanismos de sinalização à frente doreceptor. Redução da expressão de outras proteínassensoras de cálcio que pertencem a superfamília dereceptores lipoprotéicos de baixa densidade 44, 45 têmsido propostas no HPT 1ário .

Existem vários mecanismos envolvidos na gênesedo hiperparatireoidismo secundário (HPT 2ário ) queacompanha a insuficiência renal crônica (IRC).Primeiramente, a perda progressiva da massa renalleva à retenção de fósforo e diminuição da síntese de1,25(OH)

2D

3.

Devido a redução de 1,25(OH)

2D

3,

ocorre menor absorção intestinal de cálcio, resultandoem redução do cálcio sérico que, por sua vez,estimula a secreção de PTH. Tal estímulo leva à

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hiperplasia ou hipertrofia da glândula paratireóide.Outros mecanismos também envolvidos na gênese doHPT2ário incluem a redução do catabolismo renal doPTH, resistência óssea ao PTH e aumento do set-point de cálcio. 46 A redução de receptores para avitamina D a nível de paratireóide em IRC tambémcontribui para o HPT 2ário , considerando-se os efeitosde feed-back negativo de 1,25(OH)

2D

3 sobre a

secreção de PTH. Expressão reduzida de receptorpara vitamina D tem sido observada principalmenteem áreas nodulares, 47 e dados sugerem que glândulasaumentadas de tamanho são mais resistentes à terapiacom calcitriol devido à redução do número dereceptores no interior do núcleo. 48 Por fim, oreceptor de cálcio pode potencialmente participar nagênese do HPT 2ário em IRC.

Estudos através de hibridização in situ eimunohistoquímica demonstram redução da expressãodo receptor de cálcio no HPT 1ário e HPT2ário , maispronunciado em áreas nodulares de glândulashiperplásticas de pacientes urêmicos com HPT 2ário ,que podem contribuir para o aumento do set-point decálcio. 49, 50 A nível experimental, Hernández et al 51

avaliaram a expressão do receptor de cálcio emmodelo de nefrectomia 5/6 e indução de HPT atravésde dieta com baixos teores de cálcio e alto defósforo, não tendo encontrado alterações. Diferençasno grau de insuficiência renal e tempo de HPT 2ário

podem explicar tal achado.Estudos complementares ainda são necessários

para elucidar de modo mais definitivo o papel doreceptor de cálcio na gênese do HPT 2ário em IRC.

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Introdução

Doença renal progressiva, levando à necessidadede tratamento dialítico e/ou transplante renal porinsuficiência renal terminal, pode ser iniciada pordiferentes mecanismos patogenéticos. Patologiasimunes, metabólicas e degenerativas levam a umquadro final comum, caracterizado por fibroseglomerular e túbulo-intersticial. 1, 2, 3 Há fortesevidências de que mecanismos adaptativos à injúriainicial desempenhem um papel importante naprogressão, 4, 5, 6, 7 já que, independentemente daresolução da agressão inicial, o quadro histológico efuncional progride até a perda total do néfron.

Modelos experimentais de doença renalprogressiva têm sido utilizados para avaliar osmecanismos envolvidos, sendo especialmente úteis osde uninefrectomia ou ablação subtotal de massa renal.A perda substancial de néfrons leva a mecanismosadaptativos de hipertrofia dos remanescentes e, alongo prazo, evolução para glomeruloesclerose. Ahipertrofia glomerular nesses modelos se acompanhade aumento da pressão hidrostática capilar, e essaalteração tem sido vista tradicionalmente como umimportante evento deflagrador de mecanismos quelevam a fibrose renal. 8, 9

A hipertensão glomerular se acompanha deaumento da permeabilidade glomerular a macro-moléculas com maior concentração de proteínas notúbulo proximal. 10 O aumento de reabsorção tubularde proteínas leva a um acúmulo de proteínas nosendolisosomos e retículo endoplasmático que, porsua vez, gera sinais nucleares para ativação de genesinflamatórios e vasoativos dependentes de NFkB(fator de transcrição nuclear kappa B), promovendo

Revisão/Atualização em Nefrologia Clínica: Citocinas eprogressão de doença renalEuthymia Brandão de Almeida Prado

Laboratório de Fisiopatologia Renal - LIM 16Faculdade de Medicina da Universidade de São PauloEndereço para correspondência: Euthymia Brandão de Almeida PradoAv. Dr. Arnaldo 455, 3 o andar, sala 3342CEP 01246-903 - São Paulo, SPTel.: (011) 3066-7466

aumento de proliferação de fibroblastos e reaçãoinflamatória intersticial com aumento de síntese dematriz extracelular e fibrose renal cicatricial. 11, 12

Estudos mais antigos já sugeriam que a perda denéfrons funcionantes se acompanha de aumento devolume dos néfrons remanescentes. 13 Coelhosuninefrectomizados apresentam aumento do volumeglomerular, confirmando-se posteriormente aumentodo conteúdo de RNA, sugestivo de hipertrofiaglomerular. 14 Também se demonstra aumento dostúbulos proximais após uninefrectomia, maior que ade outros segmentos. 15

A assim chamada hipertrofia renal compensatórialevou à suposição da existência de fatoresrenotrópicos, funcionando como fatores decrescimento. Demonstrou-se inicialmente atividaderenotrópica em frações de urina, soro e fígado deanimais uninefrectomizados. 16, 17 Caracterizou-se aindução de alterações bioquímicas com incorporaçãode nucleotídeos radiomarcados em DNA depreparações renais isoladas, assim como estímulo decrescimento em culturas de células renais. 18

Mais recentemente, grande número de substânciascom atividade de fatores de crescimento foi descrito,geralmente em culturas de células de túbulosproximais ou células mesangiais: IGF-1, 19 EGF, 20

HGF, 21 PDGF, 22 PGE2 e alguns hormônios:hidrocortisona, tiroxina, AVP, Angiotensina II. 23-26

Atuam de forma não específica após seremdeflagrados por estímulos renais específicos nãoclaramente identificados. Sendo dado o sinal, háprodução sequencial de diferentes fatores que levamao crescimento coordenado de células renaisespecíficas.

Além da hipertrofia e proliferação celular,participa de forma nuclear na progressão de doençarenal o estímulo para aumento de produção e/oudiminuição de degradação de matriz extracelular 27-29

responsável pelo quadro de esclerose glomerular efibrose túbulo-intersticial. 30 Neste fenômeno estãoimplicadas várias citocinas, especialmente TGF-b, 31

na regulação da homeostase da matriz extracelular,

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PDFG 32 na proliferação celular e FGF, 33 na induçãode angiogênese e proliferação fibroblástica.

As citocinas e fatores de crescimento compreendemum grande número de glicoproteínas de baixo pesomolecular que atuam na intercomunicação celular.Podem ser secretados, expressos em membranascelulares ou armazenados na matriz extracelular. Amaioria das ações ocorre na vizinhança da célula deorigem, de forma autócrina ou parácrina. 34

A denominação das citocinas em geral temrelação com o ensaio biológico que descreveu oefeito original (TNF: fator de necrose tumoral; TGF:fator de crescimento transformador, FGF: fator decrescimento de fibroblastos, etc.). De fato, considera-se atualmente que há uma grande variedade de açõesbiológicas para cada citocina, dependendo não só desua atividade primária mas também do estado deativação da célula alvo e da interrelação com outrascitocinas liberadas concomitantemente, podendo serproduzidas por diferentes tipos celulares. 35

O aumento de produção de matriz extracelularpor diferentes citocinas é feito às custas daparticipação de todas as células renais, tantoconstitutivas como infiltrantes, incluindo célulastubulares e fibroblastos, interagindo com células dasérie monocítico-macrofágica. 36, 37 A agressão inicial(deposição de imunocomplexos, por ex.) levaria aliberação de fatores de crescimento e citocinas, comindução de aumento de produção de colágeno,alteração na sua degradação por proteases, estímulopara proliferação celular e o balanço final entre osprocessos reparadores e fibrosantes dará o efeito derestauração ou progressão da lesão renal. 38

Border postula que a regulação gênica dacitocina seria programada para responder a umúnico episódio de injúria tecidual, auto-limitado. 39

Havendo episódios repetidos, um defeito naregulação, ou a auto-indução continuada, criar-se-iaum círculo vicioso de superprodução de citocina efibrose. Essa hipótese está de acordo com o queacontece, por ex., na glomerulonefrite difusa agudapós-estreptocócica, auto-limitada, com evolução paracura sem sequela histológica, enquanto que doençascom imunocomplexos ou auto-anticorpos circulantespersistentes levam a perda progressiva da funçãorenal, com glomeruloesclerose e fibrose túbulo-intersticial (nefropatia de Berger, nefrite lúpica,glomerulonefrite membranosa idiopática, glome-rulonefrite rapidamente progressiva, etc.). Tambémalterações metabólicas, como a hiperglicemia dodiabetes mellitus , levaria a estímulo de citocinasfibrosantes com crescimento glomerular e expansão

de matriz mesangial. 40 O desenvolvimento deglomeruloesclerose no diabetes mellitus estáassociado a diversos hormônios e citocinas, sendo osmais importantes o IGF-1, FGF, PDGF e EGF. 41 Osprodutos finais de glicosilação são responsáveis pelaindução de múltiplas citocinas que aumentam aprodução de matriz mesangial, sendo a maisimportante o TGF-b. 42

Produção de Matriz Extracelular

Esclerose glomerular e fibrose túbulo-intersticialsão fenômenos estreitamente ligados ao aumento dematriz extracelular. Esta consiste de vários tipos decolágeno, fibronectina e proteoglicanos. Em situaçãofisiológica, o balanço entre a formação e adegradação de matriz é adequado, enquanto nassituações pró-fibrogências há um predomínio deaumento de síntese de matriz, acompanhado dediminuição de sua degradação por proteases, além daprodução de inibidores de proteases. 43

O processo de fibrogênese pode ser dividido em3 etapas:

- indução: compreende a infiltração por célulasinflamatórias, a liberação de citocinas pró-fibrogênicas, a ativação e proliferação de fibroblastos;

- síntese de matriz: com a liberação continuadade citocinas pró-fibrogênicas pelas célulasinflamatórias há aumento de síntese e deposição dematriz, com diminuição de sua degradação;

- síntese de matriz pós-inflamação: tendo jácessado o estímulo inflamatório inicial, este seperpetua por estimulação autócrina e há aumentocontinuado de síntese, com consequente deposiçãode matriz. 44

As citocinas envolvidas na indução de infiltradoinflamatório celular e promoção de fibrogênese são:IL-1 a IL-7, IFN-a, IFN-b, IFN-g, PDGF-A, PDGF-B,TNF-a, TNF-b, FGF, EGF, IGF-1, TGF-a, TGF-b. 45

As duas citocinas pró-inflamatórias mais potentessão IL-1 e TNF-a. 46 Ambas são precocementeestimuladas e levam a infiltrado inflamatórioleucocitário que precede a inflamação. A citocinamais importante na fibrogênese é o TGF-b, 47 queaumenta a produção de fibronectina, colágeno eproteoglicanos, e inibe a degradação de matriz poraumento de síntese de PAI-1.

A fibrogênese é caracterizada não só peloaumento de síntese de matriz extracelular, mastambém pela proliferação de células produtoras dematriz. Os principais mitógenos para fibroblastos sãoPDGF, IGF-1, EGF, TGF-a, IL-1 e endotelina. 48

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Consideraremos a seguir as principais citocinasfibrogênicas.

Citocinas Pró-fibrogênicas

TGF-b

TGF-b1 a TGF-b3 apresentam homologia de 70 a80% da sequência de aminoácidos, ligam-se aosmesmos receptores e induzem respostas similares. Naforma ativa, tem peso molecular de 25 kDa. 49 Édocumentada sua produção por células mesangiais ecélulas tubulares proximais, além de célulasendoteliais, monócitos, neutrófilos, linfócitos T e B eplaquetas. 50 Aumento de expressão ocorre emdoenças renais humanas e experimentais. 51 Quanto àmodulação de inflamação, suas ações podem ser pró-inflamatórias e imunossupressoras. Em geral, célulasimaturas em repouso respondem sendo estimuladaspor TGF-b, enquanto que estas mesmas células, jáativadas, podem ser inibidas por TGF-b. 52 Sua açãopró-inflamatória inclui quimiotaxia para macrófagos eem menor escala para fibroblastos, aumento deexpressão de moléculas de adesão, e auto-indução deTGF-b, com uma fraca ação angiogênica. 47, 53, 54 Oefeito crítico do TGF-b no processo de inflamaçãoglomerular é seu efeito na matriz extracelular. É umpotente estímulo para produção de colágeno tipo IV55 fibronectina 56 e os proteoglicanos decorin ebiglican em células mesangiais e epiteliaisglomerulares. 57 Aumenta ainda a produção decolágeno tipo I e tipo IV pelos fibroblastos túbulointersticiais. Leva a aumento de produção decolágeno I por células mesangiais e fibroblastosintersticiais, 59 aumento de colágeno III por célulasmesangiais, aumento de colágeno IV por célulasepiteliais glomerulares e fibroblastos intersticiais, 55

aumento de laminina por células epiteliaisglomerulares, 58 aumento de fibronectina por célulasmesangiais e epiteliais glomerulares. 59 e aumento desíntese de proteoglicanos por células mesangiais,epiteliais, endoteliais, células tubulares proximais. 60

Exibe um efeito de inibição de degradação dematriz, potencialmente importante no acúmulopatológico em doenças glomerulares, especialmenteatravés da diminuição de secreção de ativador deplasminogênio 65 e aumento de produção de inibidorde ativação de plasminogênio (PAI). 61, 62

TGF-b inibe ainda a expressão de proteases,como a estromelisina, mas aumenta a atividade decolagenase tipo IV e inibidor tecidual demetaloproteinase (TIMP-1), levando novamente a

aumento de deposição de matriz mesangial. 63

Aumenta a expressão de receptores para fibronectina,a5b1, aumentando a incorporação de fibronectina namatriz. 64

Esses achados sugerem que a superprodução deTGF-b pode levar a cicatrização e lesão tecidual, eimplica num mecanismo patogênico na esclerose efibrose que caracteriza as glomerulonefrites crônicas.

Transfecção de gene de TGF-b para rim normal derato induz proliferação de matriz extracelular com danoglomerular severo, levando a glomeruloesclerose. 65

bFGF

É uma proteína catiônica de 18 kDa, expressa porcélulas mesangiais e por podócitos e células epiteliaisglomerulares. 66,67 Além de um papel sobre aproliferação destas mesmas células, tem sido estudadasua participação na glomeruloesclerose. Aadministração crônica de bFGF a ratos normais por 13semanas levou a proteinúria e insuficiência renalcrônica, com lesões renais clássicas deglomeruloesclerose focal. 68 Lesão podocitária foi umachado comum nessa fase, com figuras mitóticas semaumento de celularidade, sugerindo que bFGF estimulaos podócitos a entrar no ciclo celular e iniciar divisãonuclear. Sendo o podócito uma célula altamentediferenciada, não é capaz de terminar a divisão celular,resultando em células bi ou multinucleadas e inclusivea degeneração celular. Como sequela dodesgrudamento podocitário é a formação de adesõesdo tufo à cápsula de Bowmann. Em sequência háformação de sinéquias com capilares colapsados,resultando em glomeruloesclerose. Outro modeloestudado foi a nefrite passiva de Heymann comadministração prolongada de bFGF, levando a quadrohistológico de figuras mitóticas, formação depseudocistos, retração podocitária, descolamento focalda membrana basal glomerular e expressão dedesmina. 69

PDGF

Esta citocina, composta de uma cadeia A de 16 kDa(PDGF-1) e uma cadeia B de 14 kDa (PDGF-II) comhomologia de 60%, compreende 3 possíveis isoformas,de acordo com as cadeias A e B (AA, AB, BB). 70 É ummitógeno e quimioatraente para células mesenquimais,participando na fibrose, na aterosclerose e cicatrizaçãode feridas, principalmente. 71

Pode ser liberada por células renais (podócitos,células mesangiais e tubulares), fibroblastos,plaquetas, monócitos e macrófagos. 72

Quanto à fibrogênese, há evidências de que

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PDGF participe no acúmulo de matriz extracelular,especialmente colágeno III. 73 Não é claro se o efeitoé direto ou mediado por indução de TGF-b. 74 Emmodelo de nefrite por anticorpo anti-Thy-1.1, oaumento de expressão de PDGF se correlacionou comexpansão mesangial e maior deposição de colágenoIV, laminina, fibronectina, além de mitogênese decélulas mesangiais. 75 Esses dados mostram atividademitogênica de PDGF para células mesangiais.

Em modelo experimental de nefropatia por IgA,PDGF foi encontrado por hibridização “in situ” emrins de camundongos, localizado primariamente emcélulas mesangiais e, em menor grau, no interstício.A expressão de PDGF se correlacionou com o grau dehipercelularidade. 76

Em patologia humana, o aumento de expressãode PDGF se correlaciona com a severidade dasalterações proliferativas. 77

Outras Citocinas

IL-1/TNF

São mediadoras de reações inflamatórias eimunológicas, sinergísticas entre si. 78 Além de induzirresposta de fase aguda e febre, produção de PAF e PG,são quimiotáticos para células inflamatórias. 79 Sãoproduzidas por monócitos/macrófagos infiltrantes, assimcomo por células mesangiais, epiteliais glomerulares etubulares. 80-82 Podem favorecer a perpetuação de lesãorenal por diferentes mecanismos (expressão deantígenos MHC de classe II, de moléculas de adesão,síntese e secreção de eicosanóides, óxido nítrico emetabólitos de oxigênio). 83-84 Promovem a síntese dequimioatraentes (IL-8, MCP-1, Rantes) e regulam asíntese de outras citocinas (IL-6, PDGF, GM-CSF). 85-88

Aumentam a síntese de matriz extracelular comocolágenos, laminina por células mesangiais e epiteliais.Regulam ainda a atividade pró-coagulante glomerularpela produção de PAI. 89

IL-6

É uma citocina de 26 kDa, sintetizada por váriostipos celulares (linfócitos T e B, monócitos,fibroblastos, células epiteliais e endoteliais). Ascélulas mesangiais também sintetizam IL-6 e suaprodução é estimulada por IL-1, TNF, PDGF. 90-92 Foidemonstrada ação de expressão gênica decomponentes de matriz extracelular. 93 Colágeno tipoI inibe a síntese de IL-6 por células mesangiais).Exposição prolongada a IL-6 se associa a proliferaçãode células mesangiais. 94-95

Aumento de expressão de IL-6 tem sido descritaem glomerulonefrites proliferativas (rapidamenteprogressiva, doença de Berger, nefrite lúpica), 96

assim como em nefropatia diabética. 97 O grau deproliferação celular se correlaciona com a excreçãourinária de IL-6. 98 A excreção renal reflete nãoapenas a síntese, mas alterações no manuseio tubular.Não se pode afirmar se o aumento de IL-6 promovea lesão ou é consequente a ela. 99

Abreviações

RNA: ácido ribonuclêico; DNA: ácido desoxir-ribonuclêico; IGF: fator de crescimento insulina-símile;HGF: fator de crescimento hepatocitário; PDGF: fatorde crescimento derivado de plaquetas; PGE:prostaglandina; AVP: arginina vasopressina; TGF: fatorde crescimento transformador; FGF: fator decrescimento fibroblástico; TNF: fator de necrosetumoral; IL: interleucina; IFN: interferon, PAI: inibidorde ativação de plasminogênio.

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Introdução

A insuficiência renal aguda (IRA) na infânciaapresenta taxas de morbidade e mortalidade variáveise relacionadas às diferentes etiologias. No nossomeio, bem como nos países em desenvolvimento deuma forma geral, o fator etiológico mais freqüente éa desidratação aguda por diarréia, seguido por sepse,glomerulonefrite aguda pós-infecciosa (GNDA) eSíndrome Hemolítico-Urêmica (SHU). Em paísesdesenvolvidos o perfil etiológico é diferente,apresentando a SHU como principal causa infantil deIRA. 1,2 Seguem-se a desidratação aguda em neonatos(por asfixia perinatal ou cirurgias por cardiopatiascongênitas) e septicemia. 2 Outras causas menoscomuns são esporadicamente relatadas, como casosde IRA secundária a drogas nefrotóxicas, 3 apielonefrite aguda, 4,5 doenças imunológicas (p. ex.Lúpus Eritematoso Sistêmico) e choques elétricos. 6

Causas consideradas “pós-renais” também são raras,como obstrução aguda por litíase renal e vesical,obstrução ureteral por intervenção anti-refluxo,válvula de uretra posterior e bexiga neurogênica.

Os dois fatores etiológicos de maior importâncianestes perfis - desidratação aguda pós-diarréia e SHU- apresentam patogenia, quadro clínico e evoluçãodiferentes. Sua expressão histológica também o é,sendo representada respectivamente pela NecroseTubular Aguda (NTA) e pela MicroangiopatiaTrombótica (MAT).

Necrose Tubular Aguda

A expressão NTA deve ser empregada emsituações nas quais a alteração tubular seja

Revisão/Atualização em Nefrologia Pediátrica: InsuficiênciaRenal Aguda na infância. Aspectos anátomo-patológicosDenise Maria Avancini Costa Malheiros

Departamento de Patologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casade São Paulo e Laboratório de Investigações Médicas-LIM-16 do Hospital dasClínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São PauloEndereço para correspondência: Denise M.A.C. MalheirosRua Pascal, 600, apto. 22CEP 04616-002 - São Paulo, SPTel.: (011) 530-8245 - Fax: (011) 881-9849

considerada como responsável pela disfunção renal,sem evidências de lesões anatômicas de glomérulos,interstício ou vasos que pudessem explicar a IRA.

As principais alterações histológicas observadasno quadro são:

- “achatamento” do epitélio dos túbulos proximaisconvolutos, eventualmente com dilatação da luz.

- necrose individual de células do epitélio tubular( single cell necrosis ) com descamação, reposiçãodefeituosa e efeito de “apagamento do núcleo”.

- perda total ou parcial da borda em escova emtúbulos proximais (que por vezes assumem umaspecto quase impossível de ser diferenciado daqueledos túbulos distais).

- alterações degenerativas (vacuolização citoplas-mática) e regenerativas (núcleos hipercromáticos evolumosos) do epitélio tubular.

- edema intersticial e infiltrado mononuclear dis-cretos (um infiltrado moderado já sugere nefriteintersticial aguda).

Schubert descreveu a presença de cristaisbirrefringentes, visíveis por microscópio de luzpolarizada no citoplasma de células tubulares distaisem NTA. 7 Estes cristais estariam presentes tambémem parênquimas renais com outras patologias, comopielonefrite crônica e glomerulopatias crônicas. Estesachados não costumam ser citados por outros autores.

Quanto à correlação anátomo-clínica, não hádiferenças histológicas significativas entre a NTAoligúrica e a não-oligúrica. Na fase de estabele-cimento da NTA, há maior número de necrosesindividuais de células tubulares e perda da borda emescova. Na fase de restabelecimento, há umaporcentagem maior de túbulos com epitélio depadrão regenerativo.

Necrose Tubular Aguda emTransplantes

Com o número crescente de transplantes renaissendo realizados, tem-se tornado mais comum aocorrência de NTA pós-transplante. De patogênese

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semelhante àquela da NTA isquêmica do rim primitivo(pelos fatores etiológicos já apresentados), a lesãoisquêmica pode ocorrer ainda no doador (faseterminal), durante os períodos de isquemia quente efria ou na implantação do enxerto. Do ponto de vistahistológico, esta forma de NTA diferencia-se daquelasjá discutidas do rim primitivo: o infiltradomononuclear é mais intenso, há necrose de setoresmaiores do epitélio tubular e menor perda da bordaem escova. O uso de ciclosporina, em esquemas deimunossupressão de transplantes renais ou de outrosórgãos, também pode resultar em nefrotoxicidade eIRA com lesão tubular característica, embora nãopatognomônica. Neste caso há microvacuolizaçãocitoplasmática do epitélio tubular proximal. Outrostúbulos proximais podem apresentar células comgranulações citoplasmáticas correspondendo amitocôndrias gigantes. Finalmente, é provávelencontrar microcalcificações de células tubulares(provavelmente resultantes de calcificação deproteínas de Tamm-Horsfall e também de necrose decélulas tubulares). Ao contrário do que pode ocorrerem nefrotoxicidade por outras drogas (como agentamicina), a ciclosporina não está associada anecrose tubular extensa. É interessante salientar quea nefrotoxicidade à ciclosporina pode levar ainda aoaparecimento de SHU, cujas lesões histológicas serãodiscutidas adiante.

Síndrome Hemolítico-Urêmica

A SHU é a causa mais freqüente de IRA emcrianças em países desenvolvidos. 1,2 É encontradatambém de forma especialmente importante naArgentina 1,8 e como principal causa de IRA infantilem grande parte da Índia. 9, 10

Cerca de 90% de todos os casos de SHU são dotipo pós-diarréica por infecções por E. coli êntero-hemorrágicas produzindo Verotoxinas ou toxinas“Shigella-like” (SLT). Os outros 10% sãorepresentandos por SHU secundárias (outrasinfecções, como por pneumonia estreptocócica,glomerulopatias primárias, etc.) e por formasidiopáticas (familiares ou esporádicas, geralmenterecorrentes).

A forma clássica de SHU (pós-diarréica) ocorrecom maior freqüência no verão, em crianças menorese sem predileção por sexo, 1 predominando eminfecções com linhagens que produzem SLT tipo 2(mais virulenta que a de tipo 1).

Apesar de estar estabelecido que a lesão à célulaendotelial de capilares glomerulares e arteríolas é o

pivô das alterações observadas na MAT, não foipossível determinar que a célula endotelial é o alvoinicial da toxina. 1

Formas Histológicas

Como ocorre em outras glomerulopatias, a SHUtem substrato anátomo-patológico variável. Gasser etal., 11 em 1955, descreveram a forma de NecroseCortical: necrose sem particularidades, em focos oucomprometendo grande parte da cortical renal e,muitas vezes, apresentando lesões arteriolares eglomerulares nas zonas preservadas. Aimunofluorescência é negativa ou inespecífica. Habibet al., 12 em 1958, descreveram duas outras formas deapresentação histológica: Microangiopatia Trombóticacom predomínio glomerular (incluindo lesõesglomerulares e arteriolares) e MicroangiopatiaTrombótica com predomínio arteriolar. Quando hácom predomínio glomerular, a lesão nos gloméruloscaracteriza-se por tumefação e destaque das célulasendoteliais, levando a um alargamento do espaçosub-endotelial, com formação do chamado “espaçoclaro”, e diminuição da luz do capilar. Este espaçomuitas vezes é preenchido por fibrina e interposiçãomesangial, conferindo às alças um aspecto de duplocontorno irregular. Não há aumento da celularidademesangial, mas as células estão hipertrofiadas comexpansão da matriz e mesangiolise. Esta última,posteriormente, pode ser substituída por esclerosenodular ou esclerose pálida. É comum observarem-setrombos nas luzes dos capilares glomerulares earteríolas. As arteríolas mostram tumefação doendotélio e proliferação miointimal, conferindo-lhesum aspecto de “casca de cebola”, com redução da luzarteriolar ou mesmo obstrução desta por trombos. Aporcentagem de glomérulos acometidos é variável.

Na microangiopatia trombótica de predomínioarterial há comprometimento difuso das arteríolas eartérias interlobulares, com tromboses e endarteritefibrosa. Os glomérulos comprometidos podemapresentar o aspecto em duplo contorno característicojá descrito ou uma retração isquêmica do tufo. Aimunofluorescência na fase aguda mostra fibrina nasalças capilares espessadas e no mesângio e,ocasionalmente, IgM e C

3 mesangiais, em glomérulos

lesados. A microscopia eletrônica confirma os achadosda óptica. A necrose cortical e a microangiopatiatrombótica glomerular são os aspectos maisfrequentemente encontrados em lactentes, quegeralmente apresentam evolução clínica maisfavorável, sem hipertensão arterial ou com forma de

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hipertensão reversível. O prognóstico é particular-mente bom se a necrose cortical atingir áreas pequenase se a porcentagem de glomérulos com lesões demicroangiopatia trombótica for pequena.

A forma com microangiopatia trombótica arterial,mais freqüente em crianças maiores, tem sidorelacionada por alguns autores com pior prognósticoe com hipertensão de difícil controle.

A recorrência da SHU na sua forma clássica (pós-diarréia) em rins primitivos é rara. O transplante éindicado para casos que evoluíram para insuficiênciarenal crônica, com pouca ou nenhuma recorrência.

Evolução e Prognóstico

Atualmente o prognóstico geral da SHU melhoroumuito, devido ao diagnóstico e procedimentosdialíticos precoces, reduzindo em até 2,5% a taxa demortalidade durante a fase aguda. 1 Este maior índicede sobrevivência levou a um aumento na porcentagemde casos que desenvolvem alterações crônicasresiduais (hipertensão arterial, proteinúria, azotemia)ou evoluem para insuficiência renal crônica, chegandoa representar 25 a 35% do total de casos. Em algunspacientes, esta evolução ocorre após aparenterecuperação, com aparecimento de proteinúriainsidiosa, com ou sem hipertensão arterial.

Caletti et al. 8 observaram o aparecimento dequatro padrões histológicos diferentes num grupo dedoentes com seguimento prolongado após ocorrênciade SHU. Os padrões são os seguintes:

I - glomerulosclerose segmentar e focal comhialinose (lesões idênticas às encontradas naglomerulosclerose segmentar e focal idiopática).

II - glomerulonefrite proliferativa mesangialdifusa.

III - glomerulosclerose difusa em estádio final.IV - alterações glomerulares mínimas (maior parte

dos glomérulos normais).Nos grupos I, II e III, havia atrofia tubular e

fibrose intersticial. Em 2/3 dos pacientes foramencontradas lesões de hialinose sub-endotelialarteriolar, fibrose da íntima arterial e reduplicação damembrana elástica interna. A maior parte dos doentesapresentou hipertensão arterial. A imunofluorescênciaera negativa ou positiva para IgM e C

3. Provavelmente

as lesões dos grupos I e II são expressões de 2estádios diferentes do mesmo processo dinâmico. Amaior parte dos pacientes que apresentaramproteinúria nefrótica evoluíram rapidamente para

insuficiência renal crônica. Já aqueles queapresentaram proteinúria tardiamente, mantiveramfunção renal normal por longo período. Um fatorprognóstico importante de desenvolvimento de lesãorenal crônica pós-SHU é a duração do período deoligoanúria na fase aguda. 1 No entanto, um períodocurto de oligoanúria não implica obrigatoriamente embom prognóstico. Outros fatores que também devemser considerados como de risco são formas atípicas deapresentação (não diarréicas), manutenção deproteinúria e de hipertensão arterial de difícil controle.

Estes fatores apontam para a importância doacompanhamento a longo prazo e uso de medidaspreventivas para o desenvolvimento da insuficiênciarenal crônica. A SHU deve agora ser consideradacomo mais uma causa secundária de síndromenefrótica por glomerulosclerose focal.

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