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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2011.0000326735
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0164674-40.2010.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante PORTO SEGURO SEGURO SAUDE S/A sendo apelados SAVERIO LUIZ BOTINO, CELINA NOVO BOTINO, DEBORA NOVO BOTINO, PATRICIA BOTINO COSTA, BEATRIZ BOTINO COSTA (MENOR(ES) REPRESENTADO(S)) e GABRIEL BOTINO COSTA (MENOR(ES) REPRESENTADO(S)).
ACORDAM, em 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores J.L. MÔNACO DA SILVA (Presidente sem voto), CHRISTINE SANTINI E A.C.MATHIAS COLTRO.
São Paulo, 14 de dezembro de 2011.
Moreira ViegasRELATOR
Assinatura Eletrônica
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Apelação nº 0164674-40.2010.8.26.0100 2
Apelação Cível nº: 0164674-40.2010.8.26.0100
Comarca: SÃO PAULO
Apelante: PORTO SEGURO SEGURO SAUDE S/A
Apelado: SAVERIO LUIZ BOTINO (e outros)
PLANO DE SAÚDE Coletivo Rescisão unilateral pretendida pela seguradora com base em cláusula contratual Inadmissibilidade da rescisão unilateral imotivada - Cancelamento injustificado do seguro saúde que coloca os segurados do contrato coletivo em situação de desvantagem - Entendimento contrário à Lei 9.656/98 e ao Código de Defesa do Consumidor Recurso não provido.
VOTO Nº 558
Apelação interposta contra a r. sentença de
fls. 233/238, que julgou procedente ação ordinária proposta em face de
Porto Seguro Seguro Saúde S/A, para manutenção do contrato e
restabelecimento do plano de saúde, dando continuidade aos serviços
médico-hospitalares contratado pelos autores, declarando a nulidade da
cláusula 11.1.
Alega a ré que se trata de contrato coletivo,
o qual, além de proporcionar vários benefícios aos seus contratantes,
estabelece um prazo de vigência, podendo, inclusive, ser cancelado a
qualquer momento pela Seguradora, tendo em vista a maior flexibilização
das normas que o regulamentam, tanto que há tratamento diferenciado
para os contratos individuais e coletivos. Assevera que a sua conduta em
não optar pela renovação do contrato é permitida pelo artigo 13 da Lei nº
9.656/98, ainda mais porque o contrato de seguro não tem caráter vitalício,
deve declarar o início e fim dos riscos, e, se for de interesse de ambas as
partes, renovado periodicamente. Ademais, sustenta que a denúncia do
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ajuste por uma das partes constitui prerrogativa inerente aos contratos, que
tem o direito de eliminar as apólices deficitárias, sob pena de prejudicar
todo o grupo segurado.
O recurso foi preparado.
Contrarrazões às fls. 267.
A d. Procuradoria Geral de Justiça
manifestou-se, preliminarmente, pela conversão do julgamento em
diligência, e, no mérito, pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
Apesar da irregularidade no tocante à
intervenção do Órgão do Ministério Público de Primeira
Instância, que se manifestou somente às fls. 119, em
relação ao pedido de antecipação da tutela, tem-se,
todavia, que tal irregularidade encontra-se suprida em face
da R. Manifestação de fls. 278/282 ofertada pela Douta Procuradoria de
Justiça, em especial por ser o “Parquet” uno e indivisível.
Os autores são titulares de plano de saúde
mantido pela ré desde 1993 (fl. 22), tendo migrado para um contrato
“empresarial” (fls. 37 e seguintes) a partir de julho de 1997, sempre
mantendo os pagamentos em dia. Contudo, foram notificados pela
seguradora em junho de 2010 (fls. 85), com a informação de que o contrato
seria cancelado a partir de 26.07.2010, com fundamento na cláusula 11.1, a
qual teve sua nulidade reconhecida pela r. sentença.
Apesar de se enquadrar como “coletivo” o
contrato celebrado pelas partes, em se tratando de plano de saúde, são
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aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor. Aliás, tal
questão foi bem analisada pelo digno Magistrado:
“Desta forma, tem-se que os planos
individuais e coletivos se sujeitam igualmente à legislação
consumerista, de que resulta a nulidade de disposições
contratuais que estabeleçam obrigações incompatíveis com a boa
fé e coloquem o consumidor em desvantagem exagerada,
restringindo direitos fundamentais inerentes à natureza do
contrato, como é o caso da cláusula “11.1” do contrato celebrado
entre as partes. Revela esclarecer que, ainda que os planos de
saúde coletivos estabeleçam prazo determinado para sua
vigência, o fato é que quem se vincula a este tipo de ajuste tem a
expectativa legítima de sua duração e continuidade e o tempo
contribui em desfavor do consumidor, eis que, com a evolução da
idade é natural a ocorrência de eventuais agravamentos para a
saúde, com surgimento de doenças ou ampliação dos riscos de
que venham a surgir, interferindo no custo do serviço e
dificultando a viabilidade de novas contratações, além de se ver
as voltas com o cumprimento de novas carências. Nos presentes
autos, aliás, restou demonstrado que um dos autores, inclusive, é
portador de Hepatite C, cujo tratamento requer longo prazo e
constante acompanhamento. A vulnerabilidade do consumidor
frente ao risco de que, ao se desligar de um plano de saúde, não
consiga se vincular a outro, existe tanto para os contratos
individuais quanto para os coletivos, o que afasta a possibilidade
de se aceitar tratamento diferenciado para um ou outro ajuste. É
preciso consignar que este Juízo não prega a perpetuidade dos
contratos, mas apenas reconhece a vulnerabilidade que se impõe
aos consumidores ao se depararem com o cancelamento puro e
simples do ajuste, sem a apresentação de qualquer fundamento
ou justificativa que revele a impossibilidade de sua continuidade,
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amparado numa clausula contratual”.
No caso, mostra-se abusivo o
cancelamento injustificado do seguro efetuado pela apelante, uma vez que
coloca os segurados do contrato coletivo em situação de desvantagem, em
ofensa ao princípio da vulnerabilidade estatuído no Código de Defesa do
Consumidor.
É cediço que o entendimento dos tribunais
é o de interpretar o contrato em favor do consumidor, especialmente em se
tratando de contrato de adesão, nos quais as cláusulas foram redigidas por
apenas uma das partes. A previsão legal de limitação de riscos não
significa que qualquer uma delas seja aceita como legítima: existe essa
faculdade, mas ela deve ser exercida de acordo com a boa-fé e com as
regras de proteção ao consumidor, sob pena de desequilíbrio contratual ou
de imposição de cláusulas iníquas.
Ademais, ao contrário do sustentado pela
apelante, mister consignar a existência de entendimento que admite a
possibilidade do emprego analógico do parágrafo único do artigo 13 da Lei
nº 9.656/98 aos planos coletivos, especialmente no que tange à proibição
de rescisão unilateral que não tenha por fundamento a fraude ou o
inadimplemento do consumidor. De se observar, ainda, que o contrato de
seguro-saúde não pode servir apenas aos interesses da seguradora
apelante, mas deve estar em conformidade com sua função social.
Nesse sentido, há inúmeros julgados desta
Corte, inclusive desta Colenda Câmara, cujas ementas abaixo se
transcrevem:
“Ação declaratória de nulidade de cláusula contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais -
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Plano de saúde coletivo - Pretensão da operadora do plano de saúde de rescisão unilateral da avença, com base em cláusula contratual - Inadmissibilidade da rescisão unilateral imotivada - Entendimento contrário à Lei 9.656/98 e ao Código de Defesa do Consumidor - Imperiosa a manutenção do contrato, nos termos firmados - Configuração de danos morais indenizáveis, devendo ser majorada a indenização arbitrada - Reforma da sentença tão-só para majorar o valor da indenização e conseqüentemente os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação. Dá-se parcial provimento ao recurso interposto pelo autor e nega-se provimento ao recurso interposto pela ré”. (Apelação nº 0053374-73.2009, Rel. Des. Christine Santini, 5ª Câmara de Direito Privado, j. em. 21/09/2011).
"Convênio médico. Seguro saúde. Art. 13 da Lei n° 9656/98. Rescisão unilateral por parte da prestadora de serviços. Inadmissibilidade. A aparente proteção exclusiva do art. 13, parágrafo único, inciso II, aos contratos individuais, estende-se também aos contratos coletivos por adesão, sob pena de ferir gravemente todo o sistema protetivo tanto do Código de Defesa do Consumidor como da Lei n° 9656/98. Nos contratos coletivos o beneficiário final é o consumidor, tal qual nos contratos individuais ou familiares. A interpretação restritiva daria ensejo a abusos que feririam gravemente o direito dos conveniados, que, quando menos esperassem, enfermos ou não, estariam sem nenhuma assistência médica. Recurso improvido” (Apel. Cível n° 362.868.4/6-00 - São Paulo Câmara de Direito Privado - Rel. Maia da Cunha - j 28.7.05 - v.u.).
“Plano de saúde Modalidade empresarial - Missiva enviada pela requerida ao contratante em que prevista a suspensão do contrato, caso a contratante não adote medidas, com vistas ao reequilíbrio financeiro do pacto - Rescisão do contrato - Não ocorrência - Pretendida manutenção pela autora
Pedido improcedente, já que não se deu rescisão Nulidade de cláusula prevendo a rescisão unilateral pela operadora - Ocorrência - Abusividade reconhecida, na medida em que restringe direito fundamental do consumidor - Inteligência do artigo 13, parágrafo único, da Lei nº 9.656/98 - Precedente deste Colendo Tribunal - Recurso provido, em parte.” (Apel. Cível n° 449.989-4/1-00 5ª Câmara de Direito Privado - Rel. A.C. Mathias Coltro j.04.03.09 - v.u.).
“SEGURO SAÚDE. Coletivo empresarial. Manutenção do contrato. Procedência. Inadmissibilidade de direito à rescisão unilateral imotivada pela seguradora. Entendimento contrário à
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Apelação nº 0164674-40.2010.8.26.0100 7
Lei 9.656/98 e ao Código de Defesa do Consumidor. RECURSO DESPROVIDO” (Apel. Cível n° 994.05.123885-9 6ª Câmara de Direito Privado - Rel. Paulo Alcides j.01.07.10 - v.u.).
“Plano de Saúde - Contrato coletivo Cláusula permitindo a denúncia vazia pela operadora, comunicada à empresa até trinta dias antes do término do prazo anual de vigência do contrato Inadmissibilidade - Cláusula abusiva (artigo 51 §1° inciso II do CDC), pois restringe direito fundamental inerente a esta espécie de contrato, cuja natureza exige a continuidade na prestação dos serviços, na consideração de que a preservação da saúde dos beneficiários é uma necessidade permanente - Interpretação da regra do artigo 13 § único da lei n. 9656/98 segundo a jurisprudência atual do Colendo Superior Tribunal de Justiça Tutela antecipada ordenando a continuidade da prestação dos serviços - Decisão mantida - Recurso desprovido” (Agravo de Instrumento n° 475.188.4/1-00 - São Paulo - 2ª Câmara de Direito Privado - Rel. Morato de Andrade j. 27.2.07- v.u.).
Desse modo, caracterizada a abusividade da
rescisão unilateral pretendida pela empresa apelante, pois inadmissível a
denúncia imotivada ou não comprovada, a r. sentença deve ser mantida
pelos seus próprios fundamentos, nos termos do art. 252 do Regimento
Interno deste Tribunal de Justiça, por encontrar-se devidamente motivada.
Pelo exposto, nega-se provimento ao
recurso.
JOÃO FRANCISCO MOREIRA VIEGAS
Relator