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ANEXO DA CNBB: CANTO E MÚSICA NA LITURGIA(PRÍNCIPIOS TEOLÓGICOS, LITÚRGICOS, PASTORAIS E ESTÉTICOS) APRESENTAÇÃO O aspecto musical das celebrações litúrgicas, portanto, não pode ser relegado nem à improvisação nem ao arbítrio de pessoas individualmente, mas há de ser confiado a uma direção harmoniosa, no respeito pelas normas e as competências, como significado fruto de uma formação litúrgica adequada. Também neste campo, portanto, se evidencia a urgência de promover uma formação sólida, quer dos pastores quer dos fiéis leigos ” (JOÃO PAULO II, Quirógrafo sobre a música sacra, 2003, n. 8 e 9). Neste memorável documento, o saudoso Papa João Paulo II nos chama a atenção para a importância e a sacramentalidade do canto e da música na liturgia. Como “parte integrante da liturgia” (SC 112), a música deve estar plenamente incorporada à ação ritual, revelando e introduzindo os fiéis no âmago do mistério celebrado. A Igreja, no Brasil, pós-Concílio Vaticano II, se orgulha de ter dado passos qualitativos quanto à produção do canto pastoral em vernáculo. Porém, enfrenta alguns desafios, sobretudo no que tange à criação de um repertório bíblico-litúrgico, nas comunidades, conforme prevê a Sacrosanctum Concilium. De uma coisa estamos certos: é urgente uma adequada formação litúrgico-musical para os agentes de pastoral (pastores e leigos). Afinal, só se faz bem aquilo que se “conhece” (no sentido bíblico da palavra). Este subsídio: Canto e música na liturgia: princípios teológicos, litúrgicos, pastorais e estéticos, surgiu a partir do impulso dado pelo saudoso pontífice. Rogamos a Deus que este precioso texto produzido pela Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia, ajudem nossos músicos e musicistas a desempenharem, de forma mais eficaz, seu ministério nas ações litúrgicas. Brasília, 29 de setembro de 2005. Festas dos Arcanjos Miguel, Gabriel e Rafael. Cardeal Geraldo Majella Agnelo. Arcebispo de São Salvador da Bahia. Presidente da CNBB. Dom Manoel João Francisco. Bispo de Chapecó. Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia.

Canto e Música Na Liturgia - Cnbb

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ORIENTAES SOBRE A MSICA NA LITURGIA DA MISSA CNBB

ANEXO DA CNBB:

CANTO E MSICA NA LITURGIA

(PRNCIPIOS TEOLGICOS, LITRGICOS, PASTORAIS E ESTTICOS)

APRESENTAO

O aspecto musical das celebraes litrgicas, portanto, no pode ser relegado nem improvisao nem ao arbtrio de pessoas individualmente, mas h de ser confiado a uma direo harmoniosa, no respeito pelas normas e as competncias, como significado fruto de uma formao litrgica adequada. Tambm neste campo, portanto, se evidencia a urgncia de promover uma formao slida, quer dos pastores quer dos fiis leigos (JOO PAULO II, Quirgrafo sobre a msica sacra, 2003, n. 8 e 9).

Neste memorvel documento, o saudoso Papa Joo Paulo II nos chama a ateno para a importncia e a sacramentalidade do canto e da msica na liturgia. Como parte integrante da liturgia (SC 112), a msica deve estar plenamente incorporada ao ritual, revelando e introduzindo os fiis no mago do mistrio celebrado.

A Igreja, no Brasil, ps-Conclio Vaticano II, se orgulha de ter dado passos qualitativos quanto produo do canto pastoral em vernculo. Porm, enfrenta alguns desafios, sobretudo no que tange criao de um repertrio bblico-litrgico, nas comunidades, conforme prev a Sacrosanctum Concilium. De uma coisa estamos certos: urgente uma adequada formao litrgico-musical para os agentes de pastoral (pastores e leigos). Afinal, s se faz bem aquilo que se conhece (no sentido bblico da palavra).

Este subsdio: Canto e msica na liturgia: princpios teolgicos, litrgicos, pastorais e estticos, surgiu a partir do impulso dado pelo saudoso pontfice. Rogamos a Deus que este precioso texto produzido pela Comisso Episcopal Pastoral para a Liturgia, ajudem nossos msicos e musicistas a desempenharem, de forma mais eficaz, seu ministrio nas aes litrgicas.

Braslia, 29 de setembro de 2005.

Festas dos Arcanjos Miguel, Gabriel e Rafael.Cardeal Geraldo Majella Agnelo.Arcebispo de So Salvador da Bahia.Presidente da CNBB.Dom Manoel Joo Francisco.Bispo de Chapec.Presidente da Comisso Episcopal Pastoral para a Liturgia.INTRODUO

Este subsdio resume de maneira sugestiva o que de mais importante vem se definindo como rumos e diretrizes para o fazer litrgico-musical entre ns, desde a promulgao da Constituio sobre a Sagrada Liturgia, do Conclio Vaticano II, em 1963. o resultado significativo de sucessivos encontros promovidos pelo Setor de Msica Litrgica da CNBB, ao longo do ano de 2004, nas regies Norte, Nordeste e Centro-Sul.

O mais desejvel seria que todos os servidores da arte musical na liturgia se dessem tempo, regularmente, para meditar cada um dos documentos sobre msica na liturgia, especialmente, a prpria Sacrosanctum Concilium e, em nvel de Igreja no Brasil, o caderno de Estudos da CNBB, n. 79, (1998): A msica litrgica no Brasil.O tempo de muita disperso e deturpao. Uma enxurrada de coisas produzidas sem melhores critrios e divulgadas sem maiores cuidados, com fora devastadora, invade as mentes e os coraes dos fiis menos avisados, solapando os fundamentos slidos da f e da piedade. Quando se atenta para o antigo adgio lex orandi lex credendi, percebe-se quo grave a responsabilidade de quem oferece subsdios para o cultivo da f do Povo de Deus. E, a este respeito, quem desconhece a importncia do canto litrgico, sua fora motivadora e expressiva?...

O discernimento, ento, se impe como prtica da vigilncia crist, to cobrada pelo Mestre dos Mestres, Jesus, sobretudo daqueles e daquelas que tm, por misso, alimentar, de maneira substanciosa, a f do Povo de Deus: Quem o administrador fiel e atento, que o Senhor encarregar de dar criadagem a rao de trigo na hora certa? Feliz aquele servo que o Senhor, ao chegar, encontrar agindo assim! (Lc 12,42-43).Este subsdio enfocar a msica litrgica a partir dos seguintes pontos de vista: teolgico, litrgico, pastoral e esttico.

I. DO PONTO DE VISTA TEOLGICO

1. A Msica Litrgica brota da vida da comunidade de f. na contemplao da passagem do Eterno no devir da Natureza e no correr da Histria... na intuio do Mistrio de Cristo no cotidiano das pessoas e grupos humanos, que o autor e compositor litrgico encontra sua fonte primeira de inspirao (A msica litrgica no Brasil, n. 47-48. Estudos da CNBB, n. 79, 1998).

2. A Msica Litrgica reflete necessariamente o Mistrio da Encarnao do Verbo e, por isso mesmo, assume as caractersticas culturais da msica de cada povo, nao ou regio (Sacrosanctum Concilium, Constituio do Conclio Vaticano II, sobre a Sagrada Liturgia, 1963, n. 38-40 e A Msica Litrgica no Brasil, n. 211-219).

3. A Msica Litrgica se enraza na longa tradio bblico-litrgica judaica e crist. Desta tradio recebe a seiva que lhe garante a identidade, bem como o incentivo a beber na rica fonte dos salmos e demais cnticos bblicos do Antigo e Novo Testamento. As melhores composies produzidas ao longo da experincia celebrativa das Igrejas, todas elas de forte inspirao bblica, so tambm nossas melhores referncias. (Sacrosanctum Concilium, n. 121 e A Msica Litrgica no Brasil, n. 80-95).

4. A Msica Litrgica se insere na dinmica do memorial, prpria e original da tradio judaico-crist: canto, so palavras, melodias, ritmos, harmonias, gestos, dana... a servio da recordao dos fatos salvficos, um passado significativo que aflora nos acontecimentos, no hoje, no aqui-e-agora da comunidade crist, a qual prolonga a experincia da Me do Senhor, de quem se diz que guardava todas estas coisas, meditando-as no seu corao (Lc 2, 19; 51b). (A Msica Litrgica no Brasil, n 190).

5. A Msica Litrgica tem o papel pedaggico de levar a comunidade celebrante a penetrar sempre mais profundamente o Mistrio de Cristo. Por sua fora e suavidade, capacita-a, com singular eficcia, a experimentar e entender, com todos os santos, qual a largura, comprimento, altura, a profundidade... (...) o amor de Cristo, que ultrapassa todo conhecimento (Ef 3, 18-10).

6. A Msica Litrgica brota da ao do Esprito Santo, que suscita na assemblia celebrante o fervor e alegria pascais, provocando em quem canta uma atitude de esperana e amor, diante da realidade em que vive. Sua tnica principal e ser sempre a alegria escatolgica: mesmo vivendo em meio a rupturas dolorosas de todo tipo de opresso, excluso e morte, a msica litrgica expressa a esperana de um novo cu e uma nova terra (Ap 21,1; Is 65,17).

7. A msica litrgica, a seu modo e por sua vez, expressa, finalmente a natureza e sacramentalidade da Igreja, Povo de Deus, na diversidade de seus membros e ministrios, j que diversidade de dons, mas o Esprito o mesmo... (1Cor 12,4-7).

II. DO PONTO DE VISTA LITRGICO

8. A Msica Litrgica, em todos os seus elementos, palavra, melodia, ritmo, harmonia... participa da natureza simblica e sacramental da Liturgia crist, celebrao do Mistrio de Cristo. (Sacrosanctum Concilium, n. 121 e A Msica Litrgica no Brasil, n. 194).

9. A Msica Litrgica autntica traz consigo o selo da participao comunitria. Ela reflete o direito que todo cristo e toda crist tm, por fora do sacerdcio batismal, de expressar-se como assemblia celebrante que louva e agradece, suplica e oferece por Cristo, com Cristo e em Cristo, ao Pai, na unidade do Esprito Santo. Cantando, tocando e danando, a assemblia celebrante, qual nao santa, povo que ele conquistou, proclama os grandes feitos daquele que nos chamou das trevas a sua luz maravilhosa (1Pd 2,9). (Pastoral da Msica Litrgica no Brasil, Documentos da CNBB, n. 7, 1976, n. 2.2.1).

10. A Msica Litrgica manifesta o carter ministerial de toda a Igreja, corpo de Cristo, ao mesmo tempo, uno e diverso, com membros e funes diferentes, se bem que organicamente convergentes: nem todos, a todo momento, fazem tudo. A um(a) cabe animar, a outro(a) interpretar. A um(a) presidir, aos demais, responder. Um(a) o que proclama, os(as) demais escutam. Embora todos e todas comunguem na mesma f, vibrem na mesma alegria e, a seu tempo, cantem em unssono e se balancem no mesmo ritmo, em total sintonia e prazerosa harmonia (Sacrosanctum Concilium, n. 28).

11. A Msica Litrgica msica ritual. Como tal, ela tem um carter exigentemente funcional, precisando adequar-se especificidade de cada momento ou elemento ritual de cada tipo de celebrao, originalidade de cada tempo litrgico, singularidade de cada festa (Sacrosanctum Concilium, n. 112 e A Msica Litrgica no Brasil, n. 189-202).

12. A Msica Litrgica est a servio da Palavra. Sua grande finalidade , portanto, realar a Palavra emprestando-lhe sua fora de expresso e motivao. Jamais poder empan-la ou dificultar-lhe a audio, compreenso e assimilao (Sacrosanctum Concilium, n. 121. Pastoral da Msica Litrgica no Brasil, n. 2.1.4; e A Msica Litrgica no Brasil, n. 203-204).

13. A Msica Litrgica expressa o mistrio pascal de Cristo, de acordo com o tempo do ano litrgico e suas festas (Sacrosanctum Concilium, n. 102-111).

III. DO PONTO DE VISTA PASTORAL

14. A Msica Litrgica, por um lado, encarna as finezas e cuidados do Bom Pastor para com seu rebanho. Quem exerce algum tipo de ministrio litrgico musical prima, ento, por adequar-se diversidade dos ambientes sociais e culturais, s vivncias e contingncias do cotidiano, s possibilidades e limitaes de cada assemblia. Cabe-lhe, portanto, com sensibilidade e sensatez, no s ajudar na escolha, no aprendizado e na utilizao do repertrio mais conveniente, mas tambm cuidar oportunamente da formao litrgico-musical da assemblia.

15. A Msica Litrgica, por outro lado, reflete aquela solidariedade que caracteriza os discpulos de Cristo na sua relao com toda a Humanidade, pois, as alegrias e as esperanas, as tristezas e as angstias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, so tambm as alegrias e as esperanas, as tristezas e as angstias dos discpulos de Cristo. No se encontra nada de verdadeiramente humano que no lhes ressoe no corao. (...) Portanto a comunidade crist se sente verdadeiramente solidria com o gnero humano e com a histria (Gaudium et Spes, Constituio do Conclio Vaticano II, sobre a Igreja no mundo de hoje, 1965, n. 1).

16. A Msica Litrgica, enfim, fruto da inspirao de quem vive inserido(a) no meio do povo e no seio da comunidade eclesial, em profunda sintonia com o Mistrio de Cristo, contemplado, luz das Escrituras, no dia-a-dia da vida (Pastoral da Msica Litrgica no Brasil, Documentos da CNBB, n. 7, 1976, n. 2.2.5.) Uma msica assim produzida leva a assemblia a celebrar, como Maria na casa de Izabel, a ao transformadora e libertadora do Deus-Pastor. O Cntico de Maria, por sinal, cantado todas as tardes no Ofcio de Vsperas e no momento da comunho nas festas marianas, a grande referncia do canto da Igreja, onde cada autor e compositor deveria se espelhar.

IV. DO PONTO DE VISTA ESTTICO17. A Msica Litrgica, ao mesmo tempo, brota da cultura musical do povo, de onde provm os participantes da assemblia celebrante. Nesta cultura, ento, que, prioritariamente, busca e encontra os gneros musicais que melhor se encaixem na variedade dos Tempos Litrgicos, das Festas e dos vrios momentos ou elementos rituais de cada celebrao: toda linguagem musical bem vinda, desde que seja expresso autntica e genuna da assemblia (Sacrosanctum Concilium, n. 39-40; 119; Musicam Sacram, Instruo da Sagrada Congregao dos Ritos, sobre a msica na sagrada liturgia, 1967, n. 54-61 e Pastoral da Msica Litrgica no Brasil, n. 2.1.5.).

18. A Msica Litrgica privilegia a linguagem potica. Toda autntica experincia de orao antes de tudo uma experincia potica, e a linguagem potica, portanto, a que mais se ajusta ao carter simblico da liturgia. Evitem-se, textos de cunho explicativo ou didtico, textos doutrinrios, catequticos, moralizantes ou ideologizantes, estranhos experincia propriamente celebrativa (Musicam Sacram, n. 61 e A Msica Litrgica no Brasil, n. 191).

19. A Msica Litrgica prioriza o texto, a letra, colocando tudo mais a servio da plena expresso da palavra, de acordo com os momentos e elementos da cada rito: uma coisa musicar um texto para canto de abertura, outra musicar um texto como salmo responsorial; uma coisa musicar uma aclamao ao evangelho, outra, musicar um texto para a procisso das oferendas ou da comunho; uma coisa musicar um texto para o ato penitencial, outra musicar a aclamao anglica do Santo; uma coisa musicar a prece eucarstica, outra a beno da gua batismal, outra, ainda, o invitatrio no incio do Ofcio Divino; uma coisa musicar um repertrio para o Tempo da Quaresma, outro musicar um repertrio para a Festa de Natal... Muito vai depender, tambm, da prpria experincia litrgico-espiritual de quem compe ou da assemblia para a qual se compe.

20. A Msica Litrgica chamada a realizar perfeita simbiose (combinao vital) entre a palavra (texto, letra) e a msica que a interpreta. Esta simbiose implica, inclusive, em que o texto seja composto de tal maneira que a mtrica e a cadncia dos versos, bem como os acentos das palavras sejam convenientemente levados em conta pela msica, evitando-se descompassos, desencontros e dissonncias entre o embalo da msica e a cadncia dos versos ou os acentos de cada palavra.

21. A Msica Litrgica prescinde de tenses harmnicas exageradas. A riqueza de expresso do sistema modal do canto gregoriano e a grandiosidade da polifonia sacra continuam sendo referenciais inspiradores para quem se dedica ao fazer litrgico-musical.

22. A Msica Litrgica, ao ser executada, embora se destine a ser expresso autntica de tal ou qual assemblia, prima por manter-se fiel concepo original do(a) autor(a), conforme est expressa na partitura, sob pena de perder as riquezas originais da sua inspirao e, conseqentemente, empobrecer-lhe a qualidade esttica e densidade espiritual.

Exultai, justos, no Senhor,

que merece o louvor dos que so bons.

Louvai o Senhor com ctara,

com a harpa de dez cordas cantai-lhe.

Cantai-lhe um cntico novo,

tocai a ctara com arte, bradai (Sl 33,1-3).