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CAO-Crim
Boletim Criminal Comentado – n° 045
Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais
Mário Luiz Sarrubbo
Coordenador do CAO Criminal
Arthur Pinto Lemos Junior
Assessores
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Marcelo Sorrentino Neira
Paulo José de Palma
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha
Analista Jurídica 1
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal Comentado – n° 045
abril 2019
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ESTUDOS DO CAOCRIM ............................................................................................................................3
1 - Tema: “Pirataria” envolvendo jogos eletrônicos (“videogame”). Adequação típica ...................... 3
2-Tema: Réu não citado pessoalmente, posto que não encontrado nos endereços constantes dos
autos. Poder-dever de o juiz pesquisar seu paradeiro junto a sistema públicos de
informação ...................................................................................................................................4
STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM ..........................................5
DIREITO PROCESSUAL PENAL:
1- TEMA: STJ - Denúncia não pode ser fundamentada exclusivamente em colaboração premiada ...... 5
2- TEMA: STJ - Revelação de votações unânimes no júri não provoca nulidade por ofensa ao sigilo .... 6
3- TEMA: STJ - Prisão em flagrante por mais de 24h. Demora na realização da audiência de custódia.
Ilegalidade caracterizada. Ordem concedida .................................................................................. 9
DIREITO PENAL:
1- TEMA: Art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal. Favorecimento da prostituição ou de outra forma de
exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável. Agente que pratica conjunção carnal
ou outro ato libidinoso. Habitualidade. Desnecessária ................................................................. 11
2 -TEMA: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. VIOLAÇÃO DO ART. 17 DA LEI N. 11.340/2006 ........................... 12
STF/STJ: Notícias de interesse institucional .......................................................................................... 13
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ESTUDOS DO CAOCRIM
1 - Tema: “Pirataria” envolvendo jogos eletrônicos (“videogame”). Adequação típica
Sem preocupações doutrinárias a respeito da natureza, da definição e das teorias explicativas do
direito de autor, podemos conceituá-lo como o conjunto de prerrogativas exclusivas que a lei
reconhece a todo o criador sobre suas obras intelectuais de alguma valia, abrangendo faculdades tanto
de ordem pessoal como de ordem patrimonial.
A Constituição Federal de 1988, no seu art. 5º, XXVII, assegura: “aos autores pertence o direito
exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo
tempo que a lei fixar”. A matéria, hoje, está disciplinada na Lei 9.610/98.
Vê-se, desse modo, garantido ao autor o direito à paternidade da obra, bem como dela retirar os
benefícios pecuniários advindos da sua reprodução, representação, execução, recitação, adaptação,
transposição, arranjos, dramatização, tradução e radiodifusão.
A violação do direito autoral está tipificado no CP, art. 184, punindo-se tanto quem usurpa total ou
parcial de obra alheia (plágio), como também quem, com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui,
vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de
obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista
intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de
obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os
represente.
Deve ser alerto que o CP traz norma geral, havendo crimes especiais na legislação extravagante,
protegendo objetos materiais específicos. Jogos eletrônicos(“videogame”), aplicativos e sistemas
operacionais, por exemplo, não estão abrigados pelo CP, mas pela Lei nº 9.609/98 (que dispõe sobre
a proteção da propriedade intelectual de programas de computador, sua comercialização no País, e dá
outras providências). Nesse caso, a persecutio criminis, em regra, se dá mediante ação penal de
iniciativa privada (art. 12 § 3º), sendo o MP parte ilegítima (CPP, art. 564, II). O não oferecimento da
queixa-crime no prazo legal acarreta a decadência. Apenas quando demonstrado prejuízo a entidade
de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída
pelo poder público ou ocorrência de sonegação fiscal, perda de arrecadação tributária ou prática de
quaisquer dos crimes contra a ordem tributária ou contra as relações de consumo, passa a admitir
ação penal pública.
Por fim, nas infrações envolvendo venda de produtos “piratas”, não raras vezes a defesa levanta a tese
do princípio da adequação social, buscando a declaração de atipicidade da conduta. Sustenta que a
conduta seria socialmente adequada, haja vista que a coletividade não recriminaria o vendedor de
produtos reproduzidos sem a autorização do titular do direito autoral, mas, ao contrário, estimularia
a sua prática em virtude dos altos preços desses produtos, insuscetíveis de serem adquiridos por
grande parte da população. De acordo com o Supremo, o fato de a sociedade tolerar a prática do delito
em questão não implicaria dizer que o comportamento do paciente poderia ser considerado lícito.
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Salientou-se, ademais, que a violação de direito autoral e a comercialização de produtos “piratas”
sempre foram objeto de fiscalização e repressão. Afirmou-se que a conduta descrita nos autos causaria
enormes prejuízos ao Fisco pela burla do pagamento de impostos, à indústria fonográfica e aos
comerciantes regularmente estabelecidos (HC 115.986/ES, rel. Min. Luiz Fux, DJe 16/8/2013).
Jurisprudência incluída a pedido do Dr Levy Emanuel Magno:
TJSP- APELAÇÃO CRIMINAL nº 0005573-98.2017.8.26.0268
Ementa:
VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. Jogos eletrônicos(“videogame”), aplicativos e sistemas operacionais
que não se enquadram na hipótese do CP, art. 184, § 2º, mas, sim, na Lei nº 9.609/98, que dispõe sobre
a proteção da propriedade intelectual de programas de computador, sua comercialização no País ,e dá
outras providências (art. 12, § 2º), cuja persecutio criminis se dá por ação penal privada (§
3º).Ilegitimidade ativa do MP. Inteligência do CPP, art. 564,II. Ausência de queixa-crime. Decadência.
Não demonstração de prejuízo a entidade de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade
de economia mista ou fundação instituída pelo poder público ou ocorrência de sonegação fiscal, perda
de arrecadação tributária ou prática de quaisquer dos crimes contra a ordem tributária ou contra as
relações de consumo a torná-la incondicionada. Decadência do direito de queixa. Extinção da
punibilidade, ex officio (CPP, art.61,caput), prejudicada a preliminar e o exame de mérito
Clique aqui para ter acesso ao inteiro teor da decisão.
2-Tema: Réu não citado pessoalmente, posto que não encontrado nos endereços constantes dos
autos. Poder-dever de o juiz pesquisar seu paradeiro junto a sistema públicos de informação.
Correição parcial. Violência doméstica. Citação por edital. Pesquisa de paradeiro do citando. A
determinação da citação do réu por edital, posto que não encontrado nos endereços já constantes dos
autos, pode ser realizada sem prejuízo da concomitante pesquisa de seu paradeiro junto a sistemas
públicos de informação.
Clique aqui para ter acesso ao acórdão
Esta jurisprudência foi enviada pelo Dr. Paulo Henrique Castex - 10º PJ GEVID da Capital
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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM
DIREITO PROCESSUAL PENAL:
1- TEMA: STJ - Denúncia não pode ser fundamentada exclusivamente em colaboração premiada
O STJ, no HC 98.062/PR, deu provimento a recurso para trancar ação penal ajuizada com lastro
exclusivo em colaboração premiada promovida por um dos agentes. De acordo com o entendimento
da Corte, a denúncia-crime não pode ser fundamentada exclusivamente em colaboração premiada.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A colaboração premiada é disciplinada nos artigos 4º e 7º da Lei nº 12.850/13. Cuida-se de meio de
obtenção de prova em que o agente colaborador, visando à obtenção de um dos benefícios elencados
na lei, contribui para a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das
infrações penais por eles praticadas; para a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas
da organização criminosa; para a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da
organização criminosa; para a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações
penais praticadas pela organização criminosa; ou para a localização de eventual vítima com a sua
integridade física preservada.
É um meio de obtenção de prova que, no entanto, não se basta, pois, segundo o disposto no § 16 do
art. 4º, “Nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de
agente colaborador”. O dispositivo exige, para embasar a condenação, outras provas além das palavras
do agente colaborador. É dizer: se a declaração se mostrar isolada, sem correspondência em alguma
outra prova, ela não se prestará, por si só, para justificar um édito condenatório. E é pertinente a
limitação, pois, se até mesmo a confissão perdeu seu caráter absoluto, não sendo mais considerada a
rainha entre as provas, devendo, por isso, ser confrontada com outros elementos de prova, com muito
mais razão a colaboração premiada merece esse status. Cumpre, portanto, analisá-la no bojo do
conjunto probatório, sopesando seu valor frente aos demais elementos probantes, autorizando-se, a
partir daí e se for o caso, uma condenação.
Pierpaolo Cruz Bottini e Luciano Feldens vão além. Para os autores, “evidente que a delação
premiada – por si – não é suficiente para uma acusação formal contra alguém, e que sua instituição
não transforma as autoridades policiais em meros espectadores de denúncias alheias. Trazidas as
informações, por meio de pessoa identificada, o Estado tem o dever de averiguar sua credibilidade,
seus fundamentos, para evitar que rixas e inimizades pessoais ou comerciais se transformem em
persecuções sem fundamento, como danos irreparáveis à imagem dos envolvidos. Mas isso não
desmerece o instituto, cujo êxito é percebido a cada crime desbaratado pelo arrependimento – real
ou estratégico – de um dos integrantes da empreitada criminosa. Enfim, a substituição de uma política
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simbólica, baseada no aumento de penas, por uma política eficaz, fundada na gestão da informação,
dentro dos parâmetros legais e constitucionais que cercam a atividade estatal, parece a resposta mais
adequada à criminalidade organizada”.
Com base nisso, o STJ deu provimento a recurso em habeas corpus (RHC 98.062/PR, j. 15/04/2019)
para trancar ação penal ajuizada com lastro exclusivo em colaboração premiada promovida por um
dos agentes.
No caso julgado, o colaborador relatou ter tomado conhecimento de que o recorrente, que exercia a
profissão de contador em uma empresa cujos representantes legais estavam sendo processados, havia
participado de acordo que envolvia o pagamento de vantagens indevidas a um grupo de fiscais
tributários. Em acórdão relativo a habeas corpus que havia sido impetrado em segunda instância – mas
cuja ordem foi denegada – destacou-se que a denúncia se lastreava “em indícios de autoria e
materialidade colhidas em sede de investigação preliminar”, especialmente nas declarações do
colaborador.
Mas, o STJ considerou tais elementos insuficientes para dar suporte à ação penal. Segundo o ministro
Rogério Schietti Cruz, “sendo a colaboração mero meio de obtenção de prova, forçoso constatar que
o termo do acordo de colaboração premiada – ao consignar que ‘o declarante [colaborador] soube
desse acordo [pagamento de vantagem indevida pelo peticionante ao fiscal Divaldo de Andrade]
porque à época o empresário ficou muito descontente e chegou a comentar para algumas pessoas na
Receita que tinha feito esse acordo’ – não tem como atribuir ao peticionário, pessoa física que atua
como contador da empresa, responsabilidade penal decorrente, exclusivamente, de testemunho
indireto (por ouvir dizer) como prova idônea, de per si, para imputar ao peticionário a prática de
corrupção ativa”.
2- TEMA: STJ - Revelação de votações unânimes no júri não provoca nulidade por ofensa ao sigilo
O STJ, no REsp 1.745.056/MG (j. 15/04/2019), se posicionou pela necessidade de demonstração de
prejuízo para declaração de nulidade, conforme art. 563 do CPP, inclusive para casos de divulgação de
todos os votos dados em quesitos apurados no Tribunal do Júri.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
Dentre os diversos princípios que regem o Tribunal do Júri, cuida a Constituição do sigilo das votações,
ou seja, embora público o debate produzido em plenário, o momento da colheita dos veredictos é
sigiloso, mantida, portanto, a sala secreta do Júri para tal fim. Justifica-se esse cuidado em virtude da
própria natureza do Júri e da proteção que se deve conferir ao jurado leigo (sem as garantias, portanto,
do juiz togado), que não encontraria tranquilidade para julgar fosse pública a votação, sujeita à
interferência de populares, parentes da vítima, amigos do réu, etc. Também o trabalho do juiz, por
vezes extremamente árduo, consistente em explicar aos jurados todo o procedimento da votação,
restaria prejudicado se tivesse que ser realizado em público. Preserva-se, assim, a livre formação da
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convicção do jurado, imune a qualquer influência externa, preocupação verificada, também, no
dispositivo que impõe a incomunicabilidade entre os componentes do conselho de sentença, a fim de
que um não interfira na decisão do outro.
Aliás, não havendo possibilidade de o jurado fundamentar sua decisão, a necessidade de publicidade
do julgamento seria mesmo inócua. Esse princípio não afronta outro, também de índole constitucional,
que garante a publicidade de todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário (art. 93, inc. IX, da
CF), pois a própria norma constitucional prevê a possibilidade de exceção à regra, “se o interesse
público o exigir”. Ademais, entre uma disposição mais restrita (a que impõe o sigilo das votações) e
outra mais abrangente (a que garante a publicidade do julgamento), deve prevalecer, por aplicação da
hermenêutica, a primeira.
Interessante notar que tratando-se de um veredicto obtido de forma unânime (7 x 0), seja para
condenar ou absolver, o princípio em estudo restava prejudicado ante a conclusão óbvia de que todos
os jurados haviam julgado da mesma maneira. Por isso se sustentava, com base na jurisprudência
francesa, que uma vez obtida a maioria necessária para um veredicto irreversível (por exemplo, 4 x 1
pela absolvição ou 6 x 0 pela condenação), melhor seria que se interrompesse a colheita dos demais
votos, como forma de se preservar o sigilo. Preciosa, nesse sentido, a lição de Ruy Barbosa, para quem
“tão absoluto é o império desse preceito, de tal modo se liga às funções vitais da instituição, que, para
encerrar o sigilo das responsabilidades do jurado no mistério mais impenetrável, a jurisprudência
francesa anula os veredictos […] quando contarem com a declaração de unanimidade, porque a
resposta nesses termos dá virtualmente a conhecer a opinião de todos os jurados”.
Pois bem, a reforma do Júri, operada em 2008, comprometida com a preservação do sigilo e atenta à
sugestão doutrinária, corrige essa falha. De sorte que o § 1° do art. 483, determina que “a resposta
negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste
artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado”. É dizer: se mais de três jurados
responderem negativamente aos quesitos referentes à materialidade do fato e à autoria ou
participação, a votação estará automaticamente encerrada, no sentido da absolvição do réu, sem que
seja necessário se proceder à colheita dos demais votos. Disposição semelhante é encontrada no § 2°
do art. 483: “Respondidos afirmativamente por mais de 3 (três) jurados os quesitos relativos aos incisos
I e II do caput deste artigo será formulado quesito com a seguinte redação: O jurado absolve o
acusado?”.
Diante desse sistema, a revelação de que as votações de determinados quesitos foram unânimes é
capaz de anular o julgamento? Segundo decidiu o STJ no REsp 1.745.056/MG (j. 15/04/2019), não há
nulidade.
Naquele caso, o juiz presidente prosseguiu na apuração dos votos até o final, o que acabou revelando
votações unânimes. O Tribunal de Justiça declarou a nulidade do julgamento por violação ao sigilo das
votações, mas o Ministério Público interpôs recurso especial alegando não ter havido “prejuízo
comprovado aos jurados ou ao réu pela inobservância ao disposto no art. 483, § 1º e § 2º, do CPP, que
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determina a interrupção da apuração de um quesito quando alcançada a maioria de votos”, além de
“inexistir nulidade expressamente prevista no texto legal pela apuração de todos os votos”.
Invocando precedentes, o ministro Joel Ilan Paciornik deu razão ao Parquet. Segundo declinou em seu
voto, mesmo em casos como o julgado a nulidade só deve ser reconhecida se demonstrado o prejuízo
decorrente do ato atacado, o que não foi apontado nem mesmo pelo tribunal de origem. Por isso, deu
provimento ao recurso especial para afastar a nulidade e determinar o prosseguimento do julgamento
dos recursos de apelação pela segunda instância:
“O Tribunal de origem entendeu pela ocorrência de nulidade absoluta por ofensa ao sigilo das votações
porque os votos de quesitos julgados de forma unânime foram abertos e divulgados na sua totalidade,
em potencial prejuízo ao acusado. Cito o trecho:
‘B- DA NULIDADE ABSOLUTA DO JULGAMENTO. Analisando detidamente os autos, constata-se que
lamentavelmente padecem estes de vicio insanável, a exemplo do que já decidi quando do julgamento
dos Embargos Infringentes n° 1.0024.11.221650-2/009. In casu, a ocorrência verificada no julgamento
em tela colide frontalmente com a nova redação do artigo 483, § 2 o . do CPP, dada pela Lei n°
11.689/2008, e, principalmente, encontra-se em confronto com o princípio do sigilo das votações do
Tribunal do Júri. Na forma determinada pelo art. 483. do CPP, deveria o d. Magistrado ter iniciado a
divulgação das cédulas de votação, cessando a publicidade quando alcançados 04 (quatro) votos em
um mesmo sentido, já que o referido dispositivo legal não determina que todas as cédulas sejam
abertas, mas pelo contrário, define que em caso de alcançar quatro votos “sim” ou “não”, ou seja, a
maioria, deve o magistrado cessar a leitura dos votos em relação àquele quesito. Acerca do assunto,
transcreve-se o magistério de Guilherme de Souza Nucci: […] Colaciona-se também da jurisprudência
emanada do c. Supremo Tribunal Federal: […] Assim, o sigilo na votação dos jurados impede
justamente que se extraia desta qualquer presunção que ultrapasse o próprio veredicto condenatório,
o que poderia causar prejuízo ao sentenciado. In casu, percebe-se do Termo de Votação colacionado
às ff. 1.303-1.304 que 07 (sete) dos quesitos foram respondidos por unanimidade de votos, enquanto
outros 06 (seis) de forma não unânime, sendo que os votos proferidos pelos Senhores Jurados foram
portanto, abertos e divulgados na totalidade, ferindo a regra constitucional do sigilo das votações (fls.
1701/1702)’
Contudo, esta Corte se posicionou pela necessidade de demonstração de prejuízo para declaração de
nulidade, conforme art. 563 do CPP, inclusive para casos de divulgação de todos os votos dados em
quesitos apurados no Tribunal do Júri. Cito precedentes:
“PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
TRIBUNAL DO JÚRI. SIGILO DAS VOTAÇÕES. VOTAÇÃO DOS QUESITOS LEVADA ATÉ O FINAL, SEM TER
SIDO ENCERRADA QUANDO OBTIDA A MAIORIA. ARTIGO 483, §§ 1º E 3º, DO CPP. NULIDADE DO
JULGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 523/STF. AUSÊNCIA DE PREJUÍZOS À DEFESA. MERA
IRREGULARIDADE. 1. Cinge-se à questão acerca da nulidade da sessão plenária por ter sido a votação
dos quesitos levada até o final, sem ter sido encerrada quando obtida a maioria, em desrespeito ao
contido no artigo 483, §§ 1º e 3º, do CPP. 2. No ponto, o Tribunal de origem afastou o vício por não ter
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o acusado demonstrado o prejuízo sofrido, além de considerar a matéria preclusa. 3. No campo da
nulidade no processo penal vigora o princípio “pas de nulité sans grife”, segundo o qual, o
reconhecimento de nulidade exige a comprovação de efetivo prejuízo (art. 563 do Código de Processo
Penal). Foi, desse modo, editado pelo Supremo Tribunal Federal o enunciado sumular 523, que assim
dispõe: No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o
anulará se houver prova de prejuízo para o réu. Nessa linha, a demonstração do prejuízo sofrido pela
defesa – que, em alguns casos de nulidade absoluta, por ser evidente, pode decorrer de simples
raciocínio lógico do julgador – é reconhecida pela jurisprudência atual como imprescindível tanto para
a nulidade relativa quanto para a absoluta. 4. No presente caso, o Tribunal a quo afastou a ocorrência
de qualquer prejuízo. Assim, ausente a demonstração do prejuízo sofrido pelo recorrente, por ter sido
a votação dos quesitos levada até o final, sem ter sido encerrada quando obtida a maioria, não há
nulidade a ser sanada. 5. Ademais, segundo julgado da Sexta Turma desta Corte Superior de Justiça
“conquanto a regra contida nos §§ 2º e 3º do art. 483 do CPP, com a redação determinada pela Lei nº
11.689/2008, estabeleça o encerramento da votação com a resposta de mais de 3 (três) jurados, a
circunstância de o magistrado haver prosseguido na abertura das respostas dos demais jurados não
maculou o princípio do sigilo das votações, tratando-se de mera irregularidade” (HC 162.443/SP, Rel.
Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 10/4/2012, DJe 9/5/2012). 6. Agravo regimental
improvido (AgRg no REsp 1454610/SP, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª TURMA, DJe
25/5/2016).
(…)
Logo, considerando que no caso concreto a Corte de origem não declinou o efetivo prejuízo suportado
pelo recorrido com a divulgação de todos os votos dados para cada quesito, deve ser rechaçada a
declaração de nulidade”.
3- TEMA: STJ - Prisão em flagrante por mais de 24h. Demora na realização da audiência de custódia.
Ilegalidade caracterizada. Ordem concedida.
HABEAS CORPUS 485.355. TRAFICO DE DROGAS E PORTE ILEGAL DE ARMA. PEDIDO DE SUPERACAO
DA SUMULA N. 691 DO STF. TERATOLOGIA. PRISAO EM FLAGRANTE POR MAIS DE 24 HORAS. DEMORA
NA REALIZACAO DA AUDIENCIA DE CUSTODIA. ILEGALIDADE CARACTERIZADA. ORDEM CONCEDIDA.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
Os textos internacionais que fundamentaram a regulamentação da audiência de custódia não
estabelecem um prazo determinado para a realização do ato. Utilizando expressões abertas, indicam,
contudo, imediatidade.
No Brasil, a Resolução 213 do CNJ estabelece um prazo de 24h da comunicação do flagrante (art. 1º.)
ou das outras modalidades de prisão (art. 13).
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No que diz respeito ao flagrante, a mesma Resolução, no §1º. do art. 1º., anuncia que a sua
comunicação à autoridade judicial se dará por meio do encaminhamento do respectivo auto de prisão.
Com isso concluímos que, primeiro, a autoridade policial finaliza a autuação em flagrante do conduzido
(que deverá ocorrer, segundo nossa legislação, em até 24h), e, depois, em até 24h, apresentar o preso
ao juiz competente.
No julgado em exame, o STJ concedeu habeas corpus para, confirmando liminar deferida
anteriormente, relaxar a prisão em flagrante de um homem acusado de tráfico de drogas e porte ilegal
de arma no Ceará. Ele passou mais de 96 horas preso apenas em função do flagrante, sem que fosse
realizada a audiência de custódia, e só foi solto por força de uma liminar concedida pelo ministro
Rogerio Schietti Cruz.
Além de deferir o habeas corpus, o colegiado decidiu comunicar o caso à corregedoria do CNJ, a fim
de que tome as providências cabíveis diante do descumprimento das normas sobre a audiência de
custódia. “A ilegalidade ora reconhecida não configura prática isolada no Estado do Ceará”, afirmou o
ministro Schietti, relator do processo, mencionando dois outros habeas corpus daquele estado que
trataram de situações semelhantes e nos quais também foi concedida liminar.
O caso mais recente diz respeito a um indivíduo que foi preso em flagrante na posse de maconha,
crack, balança de precisão e um revólver. A defesa argumentou que o acusado ficou detido por mais
de 96 horas sem a análise da legalidade da prisão ou a realização da audiência de custódia.
Foi impetrado habeas corpus no Tribunal de Justiça do Ceará, mas o desembargador plantonista se
negou a despachar o pedido de liminar por entender que o caso não se enquadrava nas hipóteses
passíveis de análise no plantão judiciário – o que levou a defesa a buscar o STJ.
Para o ministro Rogerio Schietti, a ilegalidade presente no caso justifica a não aplicação da Súmula 691
do Supremo Tribunal Federal (STF), a qual, em princípio, impediria o exame do pedido da defesa antes
da conclusão do julgamento do habeas corpus anterior no tribunal estadual.
Segundo o relator, o artigo 1º da Resolução 213 do CNJ – em conformidade com decisão do STF na
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347 – determina que toda pessoa presa em
flagrante seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas, à autoridade judicial competente.
“Considerando que a prisão em flagrante se caracteriza pela precariedade, de modo a não se permitir
a sua subsistência por tantos dias sem a homologação judicial e a convolação em prisão preventiva,
identifico manifesta ilegalidade na omissão apontada”, afirmou o ministro.
Schietti frisou que, apesar de relaxar o flagrante, essa ordem não prejudica a possibilidade de
decretação da prisão preventiva, se for concretamente demonstrada sua necessidade, ou de
imposição de alguma medida alternativa prevista no artigo 319 do Código de Processo Penal. Ele
lembrou a importância de o juiz avaliar a necessidade de manutenção da prisão preventiva, pois a
medida atinge um dos bens jurídicos mais expressivos do cidadão: a liberdade.
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DIREITO PENAL:
1- TEMA: Art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal. Favorecimento da prostituição ou de outra forma de
exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável. Agente que pratica conjunção carnal
ou outro ato libidinoso. Habitualidade. Desnecessária.
INFORMATIVO 645 STJ- QUINTA TURMA
O crime previsto no inciso I do § 2º do artigo 218-B do Código Penal se consuma independentemente
da manutenção de relacionamento sexual habitual entre o ofendido e o agente (PROCESSO: HC
371.633/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, por unanimidade, julgado em 19/3/2019, DJe 26/3/2019).
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A Lei 12.015/2009, reunindo no art. 218-B os artigos 244-A do ECA, e 228, § 1º, do Código Penal, criou
o delito de favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável. A Lei
nº 12.978/14 modificou o nomen iuris do art. 218-B, sendo agora rotulado como “favorecimento da
prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável”.
Além disso, o novo diploma incluiu o art. 218-B, em todas as suas formas, no rol dos crimes hediondos.
Trata-se de crime comum, podendo qualquer pessoa praticá-lo.
O polo passivo será integrado por pessoa (homem ou mulher) menor de 18 anos ou que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato.
Embora o texto legal não diga, faz-se necessário que o menor não tenha menos de 14 anos, pois, nesse
caso, o crime poderá ser o estupro de vulnerável (art. 217-A).
Ainda poderá figurar como sujeito passivo quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o
necessário discernimento para a prática do ato. Nessa última hipótese, a exploração sexual não pode
atingir o nível da prática do ato de libidinagem, sob pena de poder configurar o estupro de vulnerável
já mencionado.
Seis são as ações nucleares típicas anunciadas pelo “caput”: submeter (sujeitar), induzir (inspirar,
instigar), atrair (aliciar) a vítima à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la
(proporcionar meios, afastar dificuldades), ou impedir (opor-se) ou dificultar (criar obstáculos) que
alguém a abandone.
Incorre nas mesmas penas (§ 2º):
I – quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com pessoa menor de 18 (dezoito) e maior
de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo. Com razão alerta Nucci: “quer se punir,
de acordo com o art. 218-B, aquele que insere o menor de 18 anos no cenário da prostituição ou outra
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forma de exploração sexual, facilita sua permanência ou impede ou dificulta sua saída da atividade.
Por isso, passa-se a punir o cliente do cafetão, agenciador dos menores de 18 anos, que tenha
conhecimento da exploração sexual. Ele atua, na espécie, como partícipe. Não há viabilidade de
configuração do tipo penal do art. 218-B, § 2º, I, quando o menor de 18 e maior de 14 procurar a
prostituição por sua conta e mantiver relação sexual com outrem. Afinal, ele não se encontra na
‘situação descrita no caput deste artigo’ (expressa menção feita no § 2º, I, parte final)” Crimes contra
a dignidade sexual, p. 59).
Diferentemente do “caput” do artigo 218-B da Lei Penal, que reclama a habitualidade para a sua
configuração, a figura do inciso I do § 2º independe da manutenção de relacionamento sexual habitual
entre o ofendido e o agente.
2 -TEMA: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. VIOLAÇÃO DO ART. 17 DA LEI N. 11.340/2006.
STJ- RECURSO ESPECIAL Nº 1.790.508 - SP (2019/0004261-0)
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PENAL. AMEAÇA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. VIOLAÇÃO DO ART. 17 DA LEI N.
11.340/2006. TRIBUNAL DE ORIGEM QUE APLICOU, DE FORMA ISOLADA, A PENA DE MULTA.
IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS.
NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 44, I, DO CP. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. FIXAÇÃO DA PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE COMINADA NA SENTENÇA QUE SE IMPÕE.
Recurso especial provido
Esta jurisprudência foi incluída a pedido do Setor de Recursos Criminais Extraordinários e Especiais.
COMENTÁROS DO CAO-CRIM
O legislador, por meio do art. 17 da Lei 11.343/06, vedou a aplicação, nos casos de violência doméstica
e familiar contra mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a
substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa. A intenção é ver o agressor cumprir
pena de caráter pessoal.
Devemos, em adendo ao citado artigo, recordar que tampouco se admite a substituição da pena
privativa por restritiva de direitos, segundo enunciado da Súmula 588, do STJ, in verbis:
“A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no
ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos”.
Clique aqui para ter acesso ao inteiro teor da decisão.
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STF/STJ: Notícias de interesse institucional
Notícias STF
22 de abril de 2019
1- Ministro nega recurso de ex-prefeito de Indaiatuba (SP) envolvido em suposta desapropriação fraudulenta
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23 de abril de 2019
2- 1ª Turma nega HC a condenado por tráfico internacional de drogas acusado de lavagem de dinheiro
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3- Negado habeas corpus a acusado de homicídio no trânsito por acidente ocorrido em 2011, em São Paulo
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4- 2ª Turma determina arquivamento de investigações contra Ricardo Berzoini
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5- Rejeitado recurso que buscava homologação de acordo feito com a Polícia Federal
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25 de abril de 2019
6- Ministro Alexandre de Moraes apresenta informações em ação sobre trâmite de inquérito no STF
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Notícias STJ
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abril 2019
14
22 de abril de 2019
7- Ministro autoriza prorrogação do prazo de internação de João de Deus em hospital de Goiânia
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23 de abril de 2019
8- Quinta Turma reduz pena do ex-presidente Lula para oito anos e dez meses
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24 de abril de 2019
9- Sexta Turma substitui prisão de ex-secretário do Rio por outras medidas cautelares
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25 de abril de 2019
10- Sexta Turma nega habeas corpus a advogado acusado de denunciação caluniosa contra promotor
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