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Introdução “A educação psicomotora deve ser considerada como uma educação básica para a escola. Ela condiciona todas as aprendizagens pré- escolares e escolares; estas não podem ser conduzidas a bom termo se as crianças não tiverem tomado consciência do seu corpo, lateralizar- se, situar-se no espaço, dominar o tempo; se não tiver adquirido habilidade suficiente e coordenação de seus gestos e movimentos.” (Le Boulch, 1988). O treino das Capacidades Coordenativas é fundamental não só a nível desportivo como no processo educativo da criança. O seu treino é uma forma de qualquer pessoa optimizar o seu desempenho motor e o seu desempenho cognitivo e com isso o seu bem-estar, pois, a coordenação está presente em todas as actividades diárias. As capacidades coordenativas se exploradas e trabalhadas convenientemente permitem processar informação de forma mais complexa e especializada melhorando o reportório motor, permitindo uma resposta mais rápida e com um menor dispêndio energético. Neste contexto surge a Escola através da Educação Física como espaço privilegiado, para um trabalho variado de experiências motoras que permitam uma melhoria da coordenação motora e consequentemente do desenvolvimento global. É neste âmbito, que este trabalho surge, com o objectivo de ser mais um instrumento de auxílio no conhecimento, sobre a importância, na infância, do treino das capacidades coordenativas, por parte de toda a comunidade educativa. O conceito das capacidades coordenativas “Coordenação é a interacção harmoniosa e económica do sistema músculo-esquelético, do sistema nervoso e do sistema nervoso sensorial com o fim de produzir acções motoras precisas e equilibradas, importância em várias disciplinas científicas como a aprendizagem motora, o controlo motor e o desenvolvimento motor”, (Kiphard, 1976). O mesmo autor refere que “a coordenação do movimento, de acordo com a idade, é a interacção harmoniosa e, na medida do possível, económica,

CAPACIDADES COORDENATIVAS

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Page 1: CAPACIDADES COORDENATIVAS

Introdução

    “A educação psicomotora deve ser considerada como uma educação básica para

a escola. Ela condiciona todas as aprendizagens pré-escolares e escolares; estas

não podem ser conduzidas a bom termo se as crianças não tiverem tomado

consciência do seu corpo, lateralizar-se, situar-se no espaço, dominar o tempo; se

não tiver adquirido habilidade suficiente e coordenação de seus gestos e

movimentos.” (Le Boulch, 1988).

    O treino das Capacidades Coordenativas é fundamental não só a nível desportivo

como no processo educativo da criança. O seu treino é uma forma de qualquer

pessoa optimizar o seu desempenho motor e o seu desempenho cognitivo e com

isso o seu bem-estar, pois, a coordenação está presente em todas as actividades

diárias. As capacidades coordenativas se exploradas e trabalhadas

convenientemente permitem processar informação de forma mais complexa e

especializada melhorando o reportório motor, permitindo uma resposta mais rápida

e com um menor dispêndio energético. Neste contexto surge a Escola através da

Educação Física como espaço privilegiado, para um trabalho variado de

experiências motoras que permitam uma melhoria da coordenação motora e

consequentemente do desenvolvimento global. É neste âmbito, que este trabalho

surge, com o objectivo de ser mais um instrumento de auxílio no conhecimento,

sobre a importância, na infância, do treino das capacidades coordenativas, por

parte de toda a comunidade educativa.

O conceito das capacidades coordenativas

    “Coordenação é a interacção harmoniosa e económica do sistema músculo-

esquelético, do sistema nervoso e do sistema nervoso sensorial com o fim de

produzir acções motoras precisas e equilibradas, importância em várias disciplinas

científicas como a aprendizagem motora, o controlo motor e o desenvolvimento

motor”, (Kiphard, 1976). O mesmo autor refere que “a coordenação do movimento,

de acordo com a idade, é a interacção harmoniosa e, na medida do possível,

económica, dos músculos, nervos e órgãos dos sentidos, com o fim de produzir

acções cinéticas precisas e equilibradas e reacções rápidas e adaptadas à

situação”.

    Para Meinel (1976), a coordenação é a “capacidade de organizar movimentos

para atingir, um objectivo determinado”, enquanto Frey (1977), citado por Weineck

(1986), realça que a coordenação permite ao atleta dominar acções motoras com

precisão e economia, que podem ser previsíveis (estereótipos) ou imprevisíveis

(adaptação) e aprender relativamente depressa os gestos desportivos.

Page 2: CAPACIDADES COORDENATIVAS

    Na interpretação de Weineck (1986), a coordenação é “ a acção combinada do

sistema nervoso central e da musculatura esquelética, objectivando uma sequência

de movimentos”.

    Hirtz (1986), define as capacidades coordenativas como uma classe das

capacidades motoras que em conjunto com as capacidades condicionais e as

habilidades motoras, permitem retirar rendimento do corpo, e que são

determinadas na sua essência através de processos de condução nervosa.

    Para Meinel e Schnabel (1987), a coordenação motora é a capacidade de

harmonizar os processos na acção motora em relação ao objectivo que se pretende

atingir. Os mesmos autores entendem que as capacidades coordenativas

possibilitam ao atleta ”dominar, de forma segura e económica, acções motoras em

situações previsíveis (estereótipos) e imprevisíveis (adaptação), como também

aprender movimentos desportivos”.

    Segundo Adelino, Vieira e Coelho (2000) a função da coordenação é convergir as

diversas funções orgânicas e psíquicas.

    Verifica-se na literatura da especialidade uma diversidade em relação à definição

das capacidades coordenativas, segundo Barbanti (1996), isto deve-se ao facto dos

estudos serem efectuados por especialistas de áreas distintas, defende ainda que

esta definição devia ser uniformizada, com o intuito de possibilitar um melhor

planeamento e consequente operacionalização por parte dos profissionais da área.

Classificação das capacidades coordenativas

    Como nos refere Roth (1999), na literatura podem encontrar-se numerosos

estudos sobre as capacidades coordenativas, onde se pode verificar quais os

critérios usados pelos autores para definir as capacidades, como foram

quantificadas e que capacidades coordenativas foram avaliadas: Fleishman e col.

(1954, 1955), Puni (1961), Blume (1978), Roth (1982), Teipel (1982), Hirtz (1985),

Zimermann (1987) e Cumbee (1988).

    Em relação às classificações conhecidas os diversos autores recomendam

diferentes sistematizações, uma é a de Schnabel (1974), que sistematiza três

capacidades coordenativas básicas:

1. Capacidade de controlo motor - baseia-se nas componentes de coordenação

da capacidade de diferenciação cinestésica, da capacidade de orientação

espacial e da capacidade de equilíbrio;

Page 3: CAPACIDADES COORDENATIVAS

2. Capacidade de aprendizagem motora - depende da capacidade de

aprendizagem motora e ainda da capacidade de controlo motor;

3. Capacidade de adaptação e readaptação motoras – são os mecanismos da

apreensão, do tratamento da retenção da informação.

    Hirtz (1986) subordina às três capacidades básicas cinco capacidades essenciais

de coordenação:

1. Capacidade de orientação espacial - faculdade de se aperceber das

modificações espaciais à medida que elas intervêm na execução dos

movimentos;

2. Capacidade de diferenciação cinestésica - faculdade de controlar as

informações provenientes da musculatura, de apenas reter as mais

importantes e de dosear a força a empregar;

3. Capacidade de reacção - faculdade de analisar rapidamente a situação e de

lhe aplicar a resposta motora mais adequada;

4. Capacidade de ritmo - faculdade de imprimir uma certa cadência à

realização de um movimento ou de “apanhar” essa cadência se ela é dada;

5. Capacidade de equilíbrio - faculdade de manter uma posição, mesmo em

condições difíceis, ou de a recuperar rapidamente se ela é perturbada.

    Para Pohlman, citado por Barbanti (1996), as capacidades coordenativas são:

1. Capacidade de diferenciação sensorial - capacidade de diferenciar as

sensações extraídas dos objectos e dos processos através dos nossos órgãos

dos sentidos, face a uma necessidade específica de uma actividade;

2. Capacidade de observação - capacidade de perceber o desenvolvimento de

um movimento próprio ou de outros, assim como os objectos imóveis, com

base em critérios seleccionados;

3. Capacidade de representação - capacidade de mentalizar situações bem

determinadas, processos de movimentos, objectos etc., com base nas

informações disponíveis;

4. Capacidade de antecipação - capacidade de prever o desenvolvimento e o

resultado de uma acção motora ou de uma situação e, a partir desta,

preparar a próxima acção;

Page 4: CAPACIDADES COORDENATIVAS

5. Capacidade de ritmo - capacidade de articular o desenvolvimento de um

movimento e de agrupar o desenvolvimento temporal e dinâmico que

caracteriza o movimento;

6. Capacidade de coordenação motor - capacidade de assegurar uma

adequada combinação de movimentos que se desenvolvem ao mesmo

tempo ou em sucessão;

7. Capacidade de controlo motor – capacidade de poder responder às

exigências elevadas de precisão de movimentos do ponto de vista espacial,

temporal e dinâmico;

8. Capacidade de reacção motora - capacidade de reagir rápida e

correctamente a determinados estímulos;

9. Capacidade de expressão motora - capacidade de criar os próprios

movimentos, criando uma expressão artística e provocando uma expressão

estética.

    Estas capacidades são condicionadas pela capacidade de elaboração das

informações por parte dos analisadores implicados na formação do movimento

(tácteis, cinestésicos, estático-dinâmicos ou vestibulares, visuais e acústicos.

Segundo Meinel e Schnabel (1984), Weineck (1999), podem ser assim classificados:

Analisadores cinestésicos – funcionam através de proprioceptores existentes

nos músculos, tendões, ligamentos e articulações que informam o sistema

nervoso central, através de fibras nervosas, das forças exercidas sobre

estes;

Analisadores tácteis – funcionam através de receptores existentes na pele,

que informam sobre a forma, superfície dos objectos, etc.…;

Analisadores vestibulares – que se situam no ouvido interno, e que informam

sobre as mudanças na direcção, aceleração e velocidade dos movimentos da

cabeça;

Analisadores visuais – que através dos seus receptores informam sobre a

percepção da distância, da relação dos próprios movimentos e os de outras

pessoas.

Analisadores acústicos – estão relacionados com os estímulos que se recebe

através dos sons.

    Weineck (1999), subdivide a coordenação em geral e especial, sendo a primeira

aquela que resulta da instrução geral para o movimento em diversas modalidades

Page 5: CAPACIDADES COORDENATIVAS

desportivas, ou seja, manifesta-se em diversos sectores da vida quotidiana. Já a

coordenação especial é aquela que se forma no contexto de uma modalidade

desportiva específica, ou seja, são movimentos específicos de uma modalidade

desportiva.

    O rendimento das capacidades coordenativas depende muito da capacidade

destes analisadores fornecerem informação adequada, para Fonseca (1999), se as

informações sensoriais transmitidas por estes analisadores não forem precisas ao

nível da recepção (input), não serão bem integradas no cérebro e o produto final

(output) em consequência sairá inadequado.

Importância das capacidades coordenativas

    O trabalho em conjunto com as capacidades condicionais melhora a realização de

movimentos coordenados ( Meinel e Schnabel, 1984).

    “Uma boa disponibilidade para o movimento e um bom desenvolvimento ao nível

das capacidades coordenativas são aspectos significativos e determinantes no

quadro da formação corporal dos atletas.” (Hirtz e Holtz, 1986).

    “…as capacidades coordenativas desempenham um papel primordial na

estrutura do movimento com reflexos nas múltiplas aptidões necessárias para

responder às exigências do dia-a-dia, do trabalho e do desporto”. (Hirtz, e Schielke,

1986)

    De acordo com Meinel e Schnabel (1987), as capacidades coordenativas são

requisitos fundamentais para o atleta praticar de uma forma óptima uma

determinada modalidade desportiva, diz ainda, que associados a estas estão,

aspectos perceptivos, cognitivos e menemónicos, sublinhando a inter-relação que

existe entre estes elementos.

    O desenvolvimento das capacidades coordenativas é imprescindível ao

desenvolvimento das capacidades condicionais (força, velocidade, resistência,

flexibilidade) e vice-versa, como refere Barbanti (1996),

    Greco e Benda (1998), afirmam que quer ao longo da vida, quer na iniciação

desportiva, quer no desenvolvimento motor do Homem é imprescindível o trabalho

de coordenação motora. Os mesmos autores referem que desenvolver a

coordenação motora não só é importante na optimização das técnicas desportivas

específicas, mas também no desempenho motor e no bem-estar do indivíduo.

Page 6: CAPACIDADES COORDENATIVAS

    Weineck (1999) afirma que “as capacidades de coordenação são a base de uma

boa coordenação sensório-motora; quanto mais elevado for seu nível mais depressa

e mais seguramente poderão se aprender movimentos novos ou difíceis”.

    Segundo, Fonseca (1999), o cérebro deve integrar toda a informação dos seus

analisadores, porque sem essa interacção dinâmica, o cérebro não funciona de

forma adequada, fazendo com que a aprendizagem seja difícil e desmotivante. O

trabalho de forma sistemática das áreas de integração táctilo-quinestésica, visual e

auditiva, possibilita um aumento do seu repertório motor, o processamento de

informação de forma mais complexa e especializada, permitindo uma economia de

esforço, uma maior adaptação quando há modificações do ambiente ou de

situações.

Quando e como desenvolver as capacidades coordenativas

    Weineck (1986), Hirtz e Schielke (1986), afirmam que é necessário respeitar a

idade sensível a estas capacidades para que se obtenham bons resultados, é

consensual a ideia que é durante a infância até a puberdade o período propício,

para que exista sucesso, pois, ocorre uma rápida maturação do sistema nervoso

central.

    Greco e Benda (1998), complementam esta ideia quando dizem que é nos

primeiro anos de vida que o desenvolvimento da coordenação motora se inicia e

existirão melhorias no seu desenvolvimento se estimulado desde a infância, ideia

esta, reforçada por Fonseca (1999), se o cérebro durante o período pré-escolar

trabalhar bem e de forma sistémica as várias áreas de integração táctilo-

quinestésica, visual e auditiva vão poder processar informação de forma mais

complexa e especializada.

    Segundo Barbanti (1979), Weineck (1999), devem realizar-se algumas tarefas

para que exista um aperfeiçoamento coordenativo na educação física e no desporto

de jovens, tais como:

Aperfeiçoar e utilizar as várias formas de base de motricidade (marchar,

correr, saltar, balançar, trepar, lançar, apanhar, etc.) e garantir o

enriquecimento sistemático de experiências motoras;

Aperfeiçoar as capacidades coordenativas fundamentais (capacidade de

diferenciação cinestésica, capacidade de orientação espacial, capacidade de

equilíbrio, capacidade de reacção, capacidade de ritmo);

Page 7: CAPACIDADES COORDENATIVAS

Garantir uma racional aquisição e consolidação das técnicas desportivas

através de uma ligação sistemática do aperfeiçoamento das capacidades

coordenativas com o processo de aprendizagem motora;

Combinar de forma óptima o aperfeiçoamento das capacidades condicionais

e coordenativas.

Bibliografia

Adelino, J., Vieira, J., Coelho, O. (2000): Treino de Jovens o que todos

precisam de saber!: Lisboa: M.J.D./C.E.F.D.

Barbanti, V. (1996): Treinamento físico: bases científicas. 3. ed. São Paulo:

CLR Balieiro.

Fonseca, V., (1999): Perturbações do Desenvolvimento e da Aprendizagem.

Tendências Filogenéticas e Ontogenéticas: Lisboa: fMH edições.

Greco, P. J., Benda, R. N. (1998): Iniciação Esportiva Universal: da

aprendizagem motora ao treinamento técnico. V. 1. Belo Horizonte: Editora

UFMG.

Hirtz, P., (1986): Rendimento desportivo e capacidades coordenativas:

Horizonte III (13).

Hirtz, P., Holtz, D., (1986): Como Aperfeiçoar as Capacidades Coordenativas.

Exemplos Práticos: Horizonte III (17).

Hirtz, P., Schielke, E., (1986): O Desenvolvimento das Capacidades

Coordenativas nas Crianças, nos Adolescentes e nos Jovens Adultos:

Horizonte III (15).

Le Boulch, J. (1988): O Desenvolvimento Psicomotor – do Nascimento até aos

6 anos: Rio de Janeiro: Editora Artes Médicas.

Kiphard, E. J. (1976): Insuficiências de movimiento y de coordinación en la

edad de la escuela primaria: Buenos Aires: Kapeluscz.

Meinel, K. (1976): Motricidade II. O desenvolvimento motor do ser humano.

Ao Livro Técnico: Rio de Janeiro.

Meinel, K., Schnabel, G. (1984): Motricidade I. Teoria da Motricidade

Esportiva Sob o Aspecto Pedagógico. Ao Livro Técnico: Rio de Janeiro.

Meinel, K., Schnabel, G. (1987) Teoria del Movimiento: 7. ed. Buenos Aires:

Stadium.

Roth, K. (1999): De lo fácil a lo difícil. Gradualmente: aspectos teóricos,

metodológicos y práticos del aprendizaje motor en el deporte: Buenos Aires:

Stadium.

Page 8: CAPACIDADES COORDENATIVAS

Weineck, J.(1986): Manual do Treino Desportivo: 2. ed. São Paulo. Ed.

Manole.

Weineck, J.(1999): Treinamento Ideal: São Paulo. Ed. Manole.

BIBLIOGRAFIA: http://www.efdeportes.com/efd132/treino-das-capacidades-coordenativas.htm