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Capítulo 12. Manuseio Pós-Colheita de Milho Doce 12.1. Introdução O milho doce é uma hortaliça altamente perecível, devido à sua elevada atividade metabólica no período pós- colheita. O conteúdo de açúcares, notadamente a sacarose, é o principal determinante da qualidade do produto. Em função dessa característica particular, o armazenamento por períodos curtos pode ser danoso à qualidade final do produto, caso as condições de manuseio não sejam adequadas. São abordadas a seguir as principais etapas do manuseio pós-colheita de milho doce. 12.2. Colheita A colheita do milho doce deve ser realizada nas primeiras horas da manhã, a fim de evitar-se o acúmulo de calor no produto durante o dia. Após a colheita, o material deve ser rapidamente retirado da exposição ao sol e levado para uma área coberta e fria, onde será manuseado. 12.3 Seleção e classificação Após a colheita, o milho doce passa por um processo de seleção, em que são descartadas as espigas que apresentem danos externos aparentes (brocas, machucaduras, podridões), classificando-as de acordo com o tamanho de espiga preferido pelos consumidores.

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Capítulo 12. Manuseio Pós-Colheita de Milho Doce

12.1. IntroduçãoO milho doce é uma hortaliça altamente perecível, devidoà sua elevada atividade metabólica no período pós-colheita. O conteúdo de açúcares, notadamente asacarose, é o principal determinante da qualidade doproduto. Em função dessa característica particular, oarmazenamento por períodos curtos pode ser danoso àqualidade final do produto, caso as condições demanuseio não sejam adequadas.São abordadas a seguir as principais etapas do manuseiopós-colheita de milho doce.

12.2. ColheitaA colheita do milho doce deve ser realizada nas primeirashoras da manhã, a fim de evitar-se o acúmulo de calor noproduto durante o dia. Após a colheita, o material deveser rapidamente retirado da exposição ao sol e levado parauma área coberta e fria, onde será manuseado.

12.3 Seleção e classificaçãoApós a colheita, o milho doce passa por um processo deseleção, em que são descartadas as espigas queapresentem danos externos aparentes (brocas,machucaduras, podridões), classificando-as de acordocom o tamanho de espiga preferido pelos consumidores.

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12.4 EmbalagemO produto é embalado em caixas de madeira, tomando-seo cuidado de arranjar as espigas num único sentido,visando otimizar o espaço disponível na caixa.Dependendo do mercado de destino, o produto poderá serembalado em caixas de papelão ondulado, construídas detal forma que permitam a troca de calor com o meiorefrigerante empregado na etapa de resfriamento rápido.

12.5 Resfriamento rápidoUma etapa importante no manuseio pós-colheita do milhodoce é a remoção do calor de campo do produto. Quantomais rápido o produto for esfriado após a colheita, maiorserá a sua vida útil. A remoção do calor de campo dá-sepela técnica do resfriamento rápido, que consiste emutilizar um meio refrigerante para trocar calor com oproduto. As técnicas mais empregadas para resfriamentorápido de milho doce são vácuo (Figura 12.1a) e o hidro-resfriamento (Figura 12.1b), muito usadas nos EstadosUnidos.

Figura 12.1. Técnicas de remoção de calor das espigas ao chegar do campo: a)técnica de resfriamento rápido a vácuo; b) técnica de hidro-resfriamento.

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No resfriamento rápido a vácuo, um lote do produto écolocado numa câmara hermética onde vácuo é aplicado.O abaixamento da pressão atmosférica faz com que aágua presente na superfície do produto evapore atemperaturas menores, o que retira calor do produto ereduz a temperatura. Ainda no resfriamento rápido avácuo, o milho doce embalado em caixas de madeira podeser resfriado de 30 para 5°C em apenas 30 minutos. Oinconveniente dessa técnica é a elevada perda de água doproduto. Recomenda-se, portanto, a umidificação antes edurante o processo de resfriamento rápido a vácuo. Outroinconveniente é o elevado custo inicial para a instalaçãodo sistema.

O resfriamento rápido com água gelada ou hidro-resfriamento é a modalidade mais empregada para milho.Nesse caso, caixas do produto são imersas ou sofrem umbanho com água sob temperatura próxima a 0°C. Comcusto inicial de instalação mais baixo do que a técnica avácuo, o hidro-resfriamento é também um método efetivo,embora leve mais tempo para se diminuir a temperatura doproduto. Em testes realizados em diversos locais,observou-se que milho doce embalado pode levar mais deuma hora para ir de 30 a 5°C utilizando-se o hidro-resfriamento. O inconveniente maior dessa técnica é que aágua utilizada para o resfriamento necessita serperiodicamente reciclada, a fim de evitar acúmulo depatógenos (fungos, bactérias). Recomenda-se, ainda, queseja adicionado hipoclorito de sódio na dose de 100 a 150mg.kg-1 à água de resfriamento, para redução dos riscosde contaminação microbiana.

Para o hidro-resfriamento, preconiza-se a utilização de 1kg de gelo para cada 3 kg de material a ser resfriado. Afim de reduzir o tempo de resfriamento, recomenda-se a

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instalação de um sistema de circulação da água através doproduto, para otimizar a troca de calor, reduzindo demaneira mais rápida a temperatura do produto. Umapequena hélice ou um compressor de ar podem serinstalados no tanque de resfriamento para executarem otrabalho recomendado.

12.6. Teste de resfriamento rápido de milho doce com água geladaO teste de hidro-resfriamento com milho doce foiconduzido no laboratório de pós-colheita da EmbrapaHortaliças, para um cliente que tinha o objetivo de enviaruma carreta refrigerada do produto do Estado de Goiáspara Buenos Aires, Argentina. Foi montado um sistema,em escala laboratorial, para avaliar o tempo médionecessário para o resfriamento das espigas.

O ensaio foi montado empregando-se quatro caixas deisopor de 80 litros cada, contendo 12 espigas de milho,14 kg de gelo picado e 50 litros de água (Figura 12.2).Foram monitoradas a temperatura no miolo da espiga(parte mediana e apical), superfície da água, água nofundo da caixa e superfície da espiga (Figura 12.3).

Observou-se que as espigas de milho doce demoraram, emmédia, uma hora e quinze minutos para reduzir atemperatura inicial de 22,7°C para 2,2°C (temperaturamédia entre o meio e a extremidade da espiga). Do pontode vista técnico, acredita-se que a redução da temperaturado produto na fase de resfriamento rápido para valorespróximos a 3°C é suficiente para assegurar umaconservação satisfatória do produto durante o transporte,considerando-se que o produto será transportado emtemperaturas próximas a 0°C.

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Figura 12.2. Milho doce acondicionado em caixa de isopor, com detalhe dotermopar para monitoramento da temperatura das espigas.

Figura 12.3. Detalhe da colocação do termopar na porção mediana da espiga demilho doce, em meio a gelo triturado.

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12.7. ArmazenamentoRecomenda-se que o milho doce seja armazenado emtemperaturas próximas a 0°C, mas nunca menores do que- 0,6°C, sob risco de congelamento da espiga. Nessascondições, o produto tem, em média, uma vida deprateleira variando entre cinco e oito dias. À medida quese eleva a temperatura de armazenamento, diminui-se avida útil do produto. Assim, espigas armazenadas a 5 e10°C têm conservação diminuída de três a cinco para doisdias.

A temperatura de armazenamento também afeta avelocidade de degradação da sacarose. O milho doceperde aproximadamente 20% do teor inicial de sacarosequando armazenado a 0°C por um período de quatro dias.A velocidade de degradação aumenta com a elevação detemperatura, sendo que espigas de milho docearmazenadas a 10 e 20°C perderam 60 e 80% do teor desacarose inicial, respectivamente.

12.8. Carregamento e transporteApós o resfriamento rápido e quando se fizer necessário oarmazenamento, o produto deve ser rapidamente colocadoem câmara fria sob temperatura próxima a 0°C. É práticacomum a colocação de gelo triturado nas embalagens,durante o transporte, com o intuito de contribuir para amanutenção da baixa temperatura (Figura 12.3).

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Sugere-se que seja utilizada temperatura ao redor de 1°C,pois reduz-se consideravelmente o risco de congelamentodo produto. O principal problema dos sistemas derefrigeração empregados em unidades frigoríficas resideno fato de que, em muitos casos, para manter atemperatura uniforme de 0°C, os sistemas liberam ar frioem temperaturas variando entre - 3 e - 8°C, o que causacongelamento localizado do produto. Dessa forma,aconselha-se que o termostato do sistema de refrigeraçãoseja ajustado para 1°C.

No carregamento das caixas de milho doce, deve-se ter ocuidado de deixar espaço suficiente nas laterais, embaixoe no teto da câmara fria, para que o ar possa fluir atravésda carga, trocando calor com o produto. Recomenda-seque as caixas fiquem afastadas pelo menos 10 cm emcada lateral da parede da câmara e também do assoalho.Nesse último caso, pode-se utilizar um estrado demadeira, para evitar que a carga bloqueie a passagem doar frio.

12.9. Problemas FitossanitáriosAlgumas pragas que atacam as espigas do milho sãocausadoras de perdas significativas durante o cultivo e empós-colheita. Entre as principais estão a lagarta-da-espiga( ), a sp. (mosca) e a lagarta-do-cartucho ( ). A lagarta-da-espiga éuma das pragas mais importantes do milho, porque faz aovoposição nos “cabelos” (estigmas) e as larvasalimentam-se dos estilos-estigmas, impedindo afertilização e causando falhas nas espigas. Tambémalimentam-se diretamente dos grãos leitosos, destruindo-os, além de deixarem detritos nas espigas que depreciamcomercialmente o produto (Figura 12.4).

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Seu ataque favorece a infestação por pragas secundárias,como o caruncho ( ) e a traça (

), bem como a penetração de microorganismos ede umidade, que causam o apodrecimento dos grãos. Ocontrole químico dessa lagarta é difícil, sendo indicado oplantio de cultivares resistentes como a medida maiseficiente. sp. também pode causar danossemelhantes ou maiores que sp., podendoocorrer associada ou isoladamente. O controle cominseticidas tem baixa eficiência. Outra praga que ocorrenas espigas é a lagarta-do-cartucho (

).

As espigas de milho podem ser infectadas por váriospatógenos ainda no estádio de grão leitoso, inclusive poraqueles causadores de podridões das espigas expressasapós a maturação fisiológica dos grãos, principalmente emregiões em que predomina clima úmido e chuvoso naépoca que precede a colheita. A incidência de doenças

Figura 12.4. Lagarta-da-espiga, , alimentando-se da espiga demilho doce.

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nas espigas aumenta quando são atacadas por pássaros eprincipalmente por lagartas. Em cultivares em que aespiga fica bem coberta pela palha, os grãos dificilmentesofrem ataque direto de fungos, que, em sua maioria, sãofracamente patogênicos. Vários fungos atacam os grãose/ou as espigas, como sp., spp.,

, , , sp., spp., spp.,sp., sp., e sp. As

infecções podem ser mistas, e alguns desses fungostambém podem crescer entre ou sobre os grãos (Figura12.5).

Figura 12.5. Espigas de milho doce infectadas por causadores de putrefação dosgrãos.

A infecção por alguns desses patógenos é muito sériaporque produzem micotoxinas, como ,

e . O controle desses fungos é difícil,principalmente porque podem desenvolver-seinternamente nas espigas, a partir de uma porta de

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entrada. A escolha de cultivares com espigas bempalhadas e o controle de lagartas são as principaismedidas preventivas. Durante o armazenamento pós-colheita das espigas, deve-se evitar a condensação deágua na sua superfície, em geral causadas por mudançasna temperatura da câmara frigorífica ou quando o produtoé colocado em temperaturas mais altas. Dependendo doperíodo de armazenamento, alguns fungos podem crescersobre a palha externamente, afetando sua aparência.

12.10. Literatura citada

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