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Paulo Victorino CAPÍTULO ONZE OS "PRACINHAS" NA GUERRA A COBRA FUMOU NA ITÁLIA Com a conquista de Monte Castelo, após tantas tentativas frustradas, o moral das tropas brasileiras estava, finalmente, restabelecido e, ato contínuo, os pracinhasse dedicaram a outra missão igualmente importante, que era resgatar os corpos dos 14 companheiros que ficaram insepultos quando da derrota de 12 de dezembro de 1944, os quais se achavam espalhados pelas encostas, cobertos de neve, em terreno minado. Deu muito trabalho, mas a missão foi cumprida. E, mais que tudo, estava dada a resposta aos comandantes americanos que insistiam pelo afastamento do Brasil dos campos de batalha. Monte Castelo já estava conquistado pelos brasileiros, enquanto que, até aquele momento, os americanos, com sua 10ª Divisão da Montanha, ainda não haviam conseguido dominar um alvo mais fácil que lhes foi atribuído, o Monte della Torraccia. O Decreto nº 10.358, de 31 de agosto de 1942, declarando Estado de Guerra em todo território nacional seria mera peça de retórica, se a ele não se seguissem medidas efetivas objetivando a participação do Brasil no esforço conjunto para deter as ambições do Eixo, que pretendia estender seu império a todos os quadrantes do globo terrestre. Foi do próprio presidente Getúlio Vargas a declaração, feita em 31 de dezembro do mesmo ano, de que o Brasil forneceria tropas em quantidade para marcar presença no combate ao inimigo, do outro lado do Atlântico.

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Paulo Victorino

CAPÍTULO ONZE

OS "PRACINHAS" NA GUERRA

A COBRA FUMOU NA ITÁLIA

Com a conquista de Monte Castelo, após tantas tentativas

frustradas, o moral das tropas brasileiras estava, finalmente,

restabelecido e, ato contínuo, os “pracinhas” se dedicaram a outra

missão igualmente importante, que era resgatar os corpos dos 14

companheiros que ficaram insepultos quando da derrota de 12 de

dezembro de 1944, os quais se achavam espalhados pelas

encostas, cobertos de neve, em terreno minado. Deu muito

trabalho, mas a missão foi cumprida. E, mais que tudo, estava dada

a resposta aos comandantes americanos que insistiam pelo

afastamento do Brasil dos campos de batalha. Monte Castelo já

estava conquistado pelos brasileiros, enquanto que, até aquele

momento, os americanos, com sua 10ª Divisão da Montanha, ainda

não haviam conseguido dominar um alvo mais fácil que lhes foi

atribuído, o Monte della Torraccia.

O Decreto nº 10.358, de 31 de agosto de 1942, declarando Estado de Guerra

em todo território nacional seria mera peça de retórica, se a ele não se

seguissem medidas efetivas objetivando a participação do Brasil no esforço

conjunto para deter as ambições do Eixo, que pretendia estender seu império a

todos os quadrantes do globo terrestre.

Foi do próprio presidente Getúlio Vargas a declaração, feita em 31 de

dezembro do mesmo ano, de que o Brasil forneceria tropas em quantidade para

marcar presença no combate ao inimigo, do outro lado do Atlântico.

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Com efeito, a posição do Brasil perante a comunidade mundial, e diante dos

próprios brasileiros, era, naquele momento, deveras embaraçosa. Ao abrir seu

território para a instalação de bases de guerra norte-americanas, sem

efetivamente participar do conflito, o país ganhou uma feição de terra ocupada.

Assim, pois, enviar uma força expedicionária para combater, par a par com

os Aliados, era importante para dar uma satisfação à opinião pública nacional e

internacional, assim como aos militares, que estavam, de há muito,

inconformados com a passividade aparente de nosso governo.

Nesse propósito, alguns atos públicos selam os entendimentos entre Brasil e

Estados Unidos. Em 12 de setembro de 1942, a Marinha de Guerra brasileira é

posta sob o comando do almirante americano Jonas Ingram, integrando-se ao

esforço conjunto de guerra.

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No dia 29 do mesmo mês, vem ao Brasil, para inspeção, o secretário da

Marinha dos Estados Unidos, Frank Knox. Em 25 de janeiro de 1943, após

participar da Conferência de Casablanca, o presidente americano não volta aos

Estados Unidos, mas viaja diretamente para a base militar americana em Natal,

Rio Grande do Norte, onde se encontra com Getúlio Vargas, que está

acompanhado do embaixador americano Jefferson Caffery, do almirante Jonas

Ingram, acima citado, e do chefe da Missão Naval americana, Augusto

Beauregard, onde são discutidos assuntos relativos à defesa das nações

ameaçadas pelo Eixo.

Treinamento de oficiais

Desde os primórdios, nossas forças militares vinham sendo treinadas por

missões militares franceses, incutindo, tanto no Exército quando na Marinha,

uma filosofia tipicamente europeia, não só nas táticas operacionais como no

conceito de segurança nacional. O acordo com os Estados Unidos veio provocar

um giro de 180 graus nesses conceitos.

Militares em postos de comando (ainda não generais, mas sim oficiais

superiores), como Henrique Batista Duffles Teixeira Lott, Humberto de Alencar

Castelo Branco, Floriano de Lima Brayner e Amauri Kruel viajaram para o Fort

Leavenworth, onde ficava a Escola de Comando e Estado Maior americano, para

participar de cursos de atualização.

A partir daí, o conceito francês de guerra em trincheiras foi substituído pela

tática de avanços rápidos e fulminantes, típico da escola americana. As marchas

da Infantaria eram substituídas pelo transporte motorizado de soldados. Quanto

ao uso de cavalos, ainda em voga nos exércitos, era desaconselhado, a não ser

em casos muito especiais.

O contato com novo material bélico deu aos comandantes brasileiros a noção

de que o armamento brasileiro se tornava inútil para a guerra, dado que os

Estados Unidos haviam padronizado o uso de armas de 105 mm e 155 mm., de

que não dispúnhamos.

Assim, nossos soldados deveriam ir à Europa desarmados e lá receberiam

as armas apropriadas e o treinamento adequado, antes de serem incorporados

ao Exército americano.

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Mãos à obra!

O próximo passo é a formação da Força Expedicionária Brasileira (FEB). O

ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, pretendia criar um efetivo de 5 divisões,

com 25 mil homens cada uma, mas acabou se rendendo à realidade.

A situação financeira do país e a impossibilidade de os Estados Unidos

absorverem todo esse contingente conteve a audácia e o total de nossas forças

se reduziu a uma única divisão, com 5 escalões de 5 mil homens cada um.

Para sermos precisos, o Brasil enviou à Guerra, com a Força Expedicionária

Brasileira (FEB), 25.334 soldados e oficiais. Além destes, foi também um

contingente da Força Aérea Brasileira (FAB), principalmente para missões de

reconhecimento. E, é claro, seguiram também, médicos, enfermeiras e pessoal

de apoio de retaguarda.

Enquanto a FEB adotou o dístico A Cobra Fumando, a FAB criou outro dístico

com a expressão Senta a Pua.

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Se os oficiais eram quase todos da ativa do Exército, cerca de metade dos

soldados eram reservistas, convocados para servir a pátria nesse grave

momento. A convocação se deu em todos os Estados, mas principalmente no

Rio de Janeiro e São Paulo, que forneceram os maiores contingentes.

Todos os Estados brasileiros, com exceção do Maranhão, tiveram alguns de

seus filhos sepultados no cemitério de Pistoia, Itália. Ao final, foram 443 homens

que deixaram sua pátria para nunca mais voltar. A FAB, que atuou não só na

Itália como no sul da Áustria, perdeu 8 aviadores em combate.

Para comandar a 1ª Divisão de Infantaria foi indicado o general João Batista

Mascarenhas de Morais, já então com 60 anos de idade. Ao todo, o Brasil

preparou cinco escalões de embarque, que partiram nas seguintes datas:

02.07.44 – 1º Escalão, comandado pelo general Zenóbio da Costa;

22.09.44 – 2º Escalão, comandado pelo general Cordeiro de Faria;

22.09.44 – 3º Escalão, comandado pelo general Olímpio Falconiere;

23.11.44 – 4º Escalão, comandado pelo coronel Mário Travassos;

08.02.45 – 5º Escalão, comandado pelo coronel Iba Jobim Meireles.

Os dois primeiros escalões seguiram no navio de transporte General Mann e

os demais no General Meigs. Todos eles foram escoltados até o estreito do

Gibraltar por belonaves americanas e destroieres brasileiros. Uma vez no mar

Mediterrâneo, essa escolta passou para a responsabilidade de navios

americanos e ingleses.

Quanto ao pessoal de apoio (médicos, enfermeiros, etc.), este seguiu por via

aérea.

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Durante a guerra, a FEB esteve incorporada ao 5º Exército Americano,

comandado pelo general Mark Clark. Durante todo o tempo, operou em

coordenação com o 4º Corpo do 5º Exército, comandado pelo general Willis

Crittenberg. É com este último que mantínhamos contato permanente e era dele

que emanavam as ordens de comando.

Nova vida em terra estranha

O embarque do 1º Escalão se faz no mais absoluto segredo. As janelas dos

vagões ferroviários são vedadas para isolar o contato com o mundo exterior e os

soldados recebem a informação de que estão sendo transferidos para outro

campo de treinamento.

Tudo era disfarce. Quando se deram pela conta, estavam no porto do Rio de

Janeiro, embarcando no navio-transporte americano General Mann. Antes da

partida, Getúlio Vargas vai a bordo para deixar-lhes uma palavra de despedida.

E só. Não houve sequer oportunidade de se despedir dos parentes, que só

souberam da viagem quando o navio já ia em mar alto.

A bordo, para surpresa geral, ia também o comandante da 1ª Divisão de

Infantaria, general Mascarenhas de Morais, com seu estado maior. Na prática,

era ele o comandante em chefe de toda a Força Expedicionária, dono da

situação e senhor único de um segredo, que lhe fora passado pelo general

Kroner, adido militar americano.

Só ele, e mais ninguém, nem o general Zenóbio da Costa, que comandava o

escalão embarcado, sabia qual o porto de destino da embarcação.

Assim, a preocupação se instalou a bordo quando o navio ignorou todos os

portos do Norte da Itália, onde se achava o campo de guerra, rumando para o

Sul.

Há algum tempo, os Estados Unidos insinuaram a possibilidade de fazer o

treinamento dos pracinhas no Norte da África, bem distante do campo de

batalha, transformando a FEB em uma força de contingência, a ser usada no

decorrer da guerra, se isso se tornasse imperioso.

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Foi um período de tensão e de angústia, até que o general Mascarenhas de

Morais tranquilizou a todos, esclarecendo que o desembarque se daria em

Nápoles, ao Sul da Itália, por razões de segurança.

Nem por isso, as coisas ficaram mais fáceis. Chegando a Nápoles, numa bela

manhã de sol, os soldados não encontraram os caminhões prometidos para o

deslocamento até o Norte do país. Informou-se, então, que o transporte estaria

disponível em Agnano, a trinta quilômetros de distância, percurso que teve de

ser feito à pé.

As distâncias > Nápoles (local de desembarque), Agnano (local de

concentração) e o Norte da Itália (campo de guerra)

Foi assim que, caminhando em passo de estrada, desarmados, e com

fardamento semelhante ao dos nazistas, os soldados brasileiros chegaram até a

ser confundidos pelos moradores como se fossem prisioneiros de guerra.

No local de destino, outra surpresa os esperava. Os brasileiros não levaram

barracas de campanha já que os americanos asseguraram o suprimento delas

na Itália. Mas ali, não havia barracas para o alojamento.

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Esses foram os primeiros maus momentos de uma campanha que lhes

reservaria, ainda, muitas outras surpresas.

Prontos para a luta

Diga-se, a bem da verdade, que o comando americano não via com bons

olhos a participação de brasileiros na guerra, achando-os despreparados e sem

espírito de combate.

Assim, a presença da FEB no campo de treinamento de Tarquinia se deu

mais por motivos circunstanciais, do que pela vontade do comando do 5º

Exército. Com efeito, a defesa no Norte da Itália acabara de sofrer grandes

desfalques.

A França, àquela altura, havia retirado seu contingente juntando-o ao restante

do Exército francês, numa nova ofensiva para expulsar os nazistas de seu país.

A Inglaterra mandou parte de suas tropas para auxiliar os franceses e outra parte

para reforçar a linha de defesa na Grécia. Só um pequeno grupo permaneceu na

Itália.

Assim, a chegada dos brasileiros foi entendida pelos americanos como um

mal necessário, para tapar as brechas deixadas com essas perdas.

No mais, foram os pracinhas que tiveram de mostrar sua bravura e

tenacidade, nivelando-se aos mais corajosos e experientes soldados americanos

e merecendo, por fim, um registro elogioso do próprio general Mark Clark,

comandante do 5º Exército.

Talvez tenha sido melhor assim. Desacreditados ao início, tudo fizeram para

marcar sua presença de forma inequívoca. E conseguiram intento, ao

demonstrar, em coragem e destemor o que lhes faltava em experiência no

manejo das armas e nas táticas de guerra americanos.

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“Pracinhas” desembarcam em Nápoles

Em 5 de agosto de 1944, o Primeiro Escalão da FEB foi, finalmente,

incorporado ao 4º Corpo do 5º Exército e transferido para Vada, um local mais

acidentado e semelhante ao campo de batalha, onde se iniciou a segunda fase

de preparação.

Todo esse treinamento, bastante útil, não pode ser dado, mais tarde, aos

outros quatro escalões, que entraram imediatamente no combate e aprenderam

as táticas de enfrentamento já no campo de batalha, no rude confronto com os

experientes germânicos.

A cobra está fumando

Procuremos entender o contexto em que os brasileiros são postos à luta no

Norte da Itália, inteirando-nos de fatos aos quais nem os pracinhas tiveram

acesso.

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O ditador italiano, Benito Mussolini, havia sido deposto em 25 de julho de

1943, um ano antes de nossos soldados chegarem à Itália e, embora preso, fora

resgatado pelos alemães, achando-se em lugar incerto e não sabido.

Em 8 de setembro do mesmo ano, a Itália se rende, mas alguns rebeldes,

como a Divisão Bersagliari, se juntam aos nazistas, prosseguindo na guerra.

Nossa luta, pois, não era contra a Itália, mas, ao contrário, pela sua libertação,

com a expulsão dos nazistas que permaneciam em seu território. Os italianos

estavam cansados de guerra e tinham bom relacionamento com os pracinhas

brasileiros.

Os alemães, que haviam conseguido atravessar a Itália e descer até o Norte

da África, foram obrigados a recuar, deixando livre o continente africano e o Sul

da Itália, indo se alojar, agora, em posição defensiva, ao norte da península

itálica.

Chegando primeiro, os alemães tomaram as melhores posições defensivas,

no alto das montanhas. Estavam em seu poder os montes Belvedere,

Gorgolesco, Mazzancana, La Torrachia, Della Croce, Torre de Nerone,

Soprassasso, e, entre outros mais, o diabólico Monte Castelo, uma fortaleza

natural e inexpugnável.

Esse cordão de defesa era a chamada Linha Gótica, que ia desde Spezia,

no mar Ligúrico, até Rimini, no mar Adriático, cortando o país de Oeste a Leste.

Os aliados, ao contrário, se achavam nos vales, totalmente desprotegidos e

à vista do inimigo, cabendo-lhes avançar até as montanhas, para desalojar as

tropas adversárias, uma operação que exigia muita experiência, coragem e

predisposição para a morte, já que esse avanço seria feito sempre ao alvo da

artilharia germânica.

Os brasileiros eram os únicos latino-americanos a participar da guerra e

cabia-lhes cobrir um trecho da Linha Gótica numa extensão de 18 quilômetros.

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A 15 de setembro de 1944, a FEB entrou em operação, sob o comando do

general Zenóbio da Costa, em coordenação com três companhias norte-

americanas, substituindo outra força, também americana, que, por razões

internas, havia sido desligada do 4º Corpo.

Não era, ainda, o teste de fogo. Enfrentando pouca resistência, em dois dias,

foram conquistadas as localidades de Massarosa, Bozzano e Quiesia,

merecendo um telegrama de congratulações do general Mark Clark e

cumprimentos do general Crittenberg.

Prosseguindo no avanço, as armas brasileira e norte americana desalojaram

os nazistas de Monte Prano e outros locais de menor importância, seguindo

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depois para o vale do rio Serchio, em direção à importante fortaleza representada

por Castelnuovo di Garfagnana.

Estávamos já no mês de outubro e, com ele, chegava um novo inimigo: a

chuva, que enlameava os caminhos e tornava quase impossível o avanço.

A exemplo dos americanos, que possuíam um sinal de identificação na farda,

o general Mark Clark sugeriu que os brasileiros criassem seu próprio distintivo,

facilitando o reconhecimento. Coube a Sena Campos fazer o desenho que,

depois de sofrer algumas modificações, se tornou em uma serpente, com um

cachimbo na boca, encimados pelo nome Brasil.

Esse distintivo passou a ser usado em todo o fardamento da Força

Expedicionária Brasileira (FEB). Quanto à Força Aérea Brasileira (FAB), esta

passou a usar outro distico, bem mais complicado, em que entravam uma ema,

uma serpente, o Cruzeiro do Sul e a expressão "Senta a Pua".

A FEB conhece sua

primeira derrota

Enquanto isso, os alemães estavam reforçando sua posição em Castelnuovo

de la Garfagnana. Zenóbio pediu e lhe foi concedida autorização para atacar

aquele ponto, antes que o inimigo conseguisse torná-lo uma fortaleza

impenetrável.

Não obstante as chuvas que não paravam de cair, as tropas avançaram em

direção ao alvo proposto, conquistando pequenos pontos, como Lama di Soto,

Monte San Quirico e Somocolonia.

Isso foi a 30 de outubro de 1944. Os sucessos deram ânimo para o ataque

maior e fulminante a Castelnuovo, que deveria ser realizado no dia seguinte.

Mas, antes disso, os alemães contra-atacaram com todo seu poder de fogo,

obrigando os brasileiros a recuar a Somocolonia.

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Depois desse insucesso, Zenóbio permanece com a Infantaria, mas sob as

ordens de Mascarenhas de Morais, que, além de comandante em chefe da FEB,

assume em definitivo o comando da 1ª Divisão.

Os brasileiros foram transferidos, então para o vale do rio Reno a 120

quilômetros do vale do Serchio (Trata-se do Reno italiano. Não confundir com o

outro rio Reno, que nasce na Suiça, atravessa a Alemanha e deságua na

Holanda).

A essa altura, tínhamos feito 208 prisioneiros e os alemães aprisionaram 10

dos nossos. Mas o insucesso da última batalha nos custou 13 mortos e, desde

o início de nossa participação, contabilizávamos 183 feridos em acidentes e 87

em combate. A guerra começava a pesar, e não era nem uma pequena amostra

do que estava por acontecer.

Primeiro ataque a

Monte Castelo

De todas as batalhas vividas pela FEB na Itália, nenhuma se compara aos

sucessivos ataques para a conquista do Monte Castelo, e às tentativas

frustradas de desalojar os alemães daquele refúgio, que era considerado a mais

importante fortaleza de toda a Linha Gótica.

O primeiro desses ataques envolvia o complexo Belvedere-Castelo e se deu

a partir do dia 24 de novembro de 1944, sob a responsabilidade da Força-Tarefa

45, do Exército Americano, com a participação de dois batalhões brasileiros a

ela agregados. Foram três dias de insucessos e pesadas baixas, quando o

poderoso contra-ataque germânico obrigou as tropas aliadas a recuar ao ponto

de origem.

O general Crittenberguer, decidiu, então pelo deslocamento da FEB mais

para o Oeste, de maneira que a tomada do Monte Castelo passou, a partir

daquele momento, a ser responsabilidade da nossa força expedicionária, com o

apoio da aviação e de tanques americanos.

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Um novo contingente, descansado, estava sendo trazido para o campo de

batalha. Estávamos ao final de novembro e o frio do inverno que se aproximava

já era sentido pelos nossos pracinhas, acostumados que estavam ao clima

tropical.

Segundo ataque a

Monte Castelo

No segundo ataque ao Monte Castelo, que começou na manhã de 28 de

novembro, tudo conspirou contra os brasileiros. Na noite passada, as tropas

americanas foram rechaçadas do Monte Belvedere, ao lado, deixando aquele

flanco a descoberto, em poder dos alemães, o que tornava mais arriscada a

aventura.

Durante o dia todo o avanço se deu bem, tão bem que valia à pena desconfiar

que alguma surpresa estava sendo preparada. Com efeito, ao final do dia,

acelerou-se o contra-ataque alemão, acompanhado de pesados bombardeios,

obrigando as tropas brasileiras a um recuo rápido e inesperado.

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O avanço mal-sucedido deixou um triste resultado: 34 mortos e 133 feridos.

A operação toda fora planejada pelo tenente-coronel Humberto de Alencar

Castelo Branco, ao qual foram debitados os maus resultados.

O Monte Castelo permanecia um desafio e não deixava outra escolha: ou se

fazia uma nova tentativa para conquistar a fortaleza, ainda que com perdas

sensíveis em homens, ou o fantasma continuaria a perseguir os brasileiros,

minando o ânimo e dificultando, senão impedindo o ataque a outros alvos.

Terceiro ataque a

Monte Castelo

Os próximos dias foram de avaliação e, testando o poder do inimigo, houve

algumas escaramuças entre forças brasileiras e alemãs, sem que qualquer dos

lados se aventurasse a um ataque mais consistente.

Aliás, a essa altura, os alemães já compreendiam bem a importância de

Monte Castelo. Assim, sua intenção não era a de avançar, mas sim de manter,

a todo custo, essa posição privilegiada.

Informações colhidas de prisioneiros e de guerrilheiros (partegiani) davam

conta de que os alemães estavam recebendo reforços, o que tornava cada dia

mais difícil e incerta a tomada de Castelo.

Como se não bastasse, as chuvas frias e constantes enlameavam as

estradas e tornavam difícil o abastecimento. Já ocorriam as primeiras nevascas,

anunciando um inverno que, nos meses seguintes, faria os termômetros

baixarem a 20 graus negativos. E os brasileiros foram mandados para a Itália

vestindo os uniformes tropicais usados aqui no Brasil!

O novo ataque estava programado para 12 de dezembro de 1944. Nesse dia,

chuvas nublaram os céus, impedindo as incursões da Força Aérea. E muita lama,

inutilizando as estradas, impediu o avanço dos tanques, presos em atoleiros.

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Ali pelas seis horas da manhã, a artilharia americana começa a bombardear

o Monte Belvedere, enquanto tropas brasileiras avançam em direção ao pé do

Monte Castelo.

É então que a artilharia alemã se faz sentir sobre os pracinhas, em toda sua

intensidade, e com o contra-ataque vindo de todos os lados do monte. Impedidos

de prosseguir, os brasileiros receberam ordem de bater em retirada, para evitar

maiores baixas, além dos mortos e feridos já registrados naquele início da noite.

O recuo não foi bem recebido pelo comando americano, sendo opinião de

alguns de seus comandantes de que o Brasil deveria ser afastado da linha de

ataque, por falta de espírito ofensivo. Com efeito, nos meses de dezembro e

janeiro, por precaução ou preconceito, a FEB ficou apenas com tarefas menores,

acompanhando a movimentação inimiga.

Quarto ataque > Monte

Castelo é nosso!

Uma outra data foi marcada para a tomada do Monte Castelo: 21 de fevereiro

de 1945. Nas primeiras horas da manhã, a Divisão da Montanha (americana)

marchou sobre o Monte della Torraccia, ao Norte do Monte Castelo, depois de

guarnecido o Monte Belvedere e montanhas próximas a ele.

Cumprindo seu papel, a FEB, firmadas as suas posições de campo,

desfechou um formidável ataque ao Monte Castelo, movimentando toda a

artilharia e dois terços da infantaria. O ataque cerrado se prolongou pelo resto

do dia.

Às quatro horas da tarde, o posto de observação do general Mascarenhas

recebeu uma visita em peso do comando americano, incluindo o comandante do

4º Corpo, general Crittenberg e o próprio comandante do 5º Exército, general

Mark Clark.

Além de seu apoio moral, estes deixaram a recomendação para que o ataque

fosse intensificado, evitando serem apanhados de surpresa com a chegada da

noite, que favoreceria mais aos alemães, familiarizados com o local.

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Assim se disse, e assim se fez. A artilharia intensificou o bombardeio,

enquanto a infantaria avançou ao cume da montanha, que foi dominado pelos

soldados do general Zenóbio da Costa, às seis e meia da tarde. Finalmente,

Monte Castelo era nosso e iniciavam-se os preparativos para a manutenção do

ponto conquistado.

Se este foi o mais pesado de todos os ataques ao Monte Castelo, nem por

isso produziu maiores baixas que os anteriores, pelo contrário, o balanço geral

nos foi bastante favorável, com apenas 41 feridos.

Os jornais brasileiros repercutiram com júbilo à Tomada de Monte Castelo

e um exemplar de O Globo chegou até os pracinhas

Refeito o moral das tropas brasileiras, sanado o orgulho, duramente atingido

com as derrotas anteriores, os pracinhas se dedicaram a outra missão

igualmente importante, que era resgatar os corpos dos 14 companheiros que

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ficaram insepultos quando da derrota de 12 de dezembro, os quais se achavam

espalhados pelas encostas, cobertos de neve, em terreno minado. Deu muito

trabalho, mas a missão foi cumprida.

Estava dada a resposta aos comandantes americanos que insistiam pelo

afastamento do Brasil dos campos de batalha. Monte Castelo já fora

conquistado, enquanto que, até aquele momento, a 10ª Divisão da Montanha

ainda não havia conseguido dominar um alvo mais fácil que lhe foi atribuído, o

Monte della Torraccia.

Conquista de Castelnuovo

O próximo alvo a ser atingido era Castelnuovo, a noroeste do Monte Castelo,

no caminho em direção a Bolonha. O cerco foi planejado para o dia 5 de março

de 1945, quinze dias após a tomada do Castelo. Como da outra vez, a operação

envolvia a Força Expedicionária Brasileira, em conjunto com a 10ª Divisão da

Montanha.

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O cerco se iniciou pela manhã, quando o 1º Batalhão do 11º Regimento de

Infantaria obteve o controle de Precária, ao Sul de Castelnuovo. Logo depois, o

2º Batalhão domina também o Sudeste. Horas depois, os norte-americanos dão

sinal combinado para o avanço geral e o cerco vai se fechando sobre o inimigo,

de forma quase que perfeita.

Ainda assim, o general Crittenberg telefonou, reclamando do vagar com que

avançavam os brasileiros e alertando que, nesse caminhar, a noite os pegaria

ainda na luta.

Desnecessária era a reclamação. Se as tropas tiveram seu avanço retardado

pelo terreno cheio de minas, não é menos verdade que, pelas seis horas da

tarde, Castelnuovo já estava conquistado. Foram aprisionados 98 alemães, com

registro de 70 baixas em consequência de ferimentos.

Durante o restante de março, e ao início de abril, dentro da Ofensiva da

Primavera, as tropas conseguiram um avanço relativamente fácil, até se

depararem com outro alvo complicado, que exigiria novos atos de heroísmo. Era

a tomada de Montese.

A tomada de Montese

Em 8 de abril de 1945, os generais ligados ao 4º corpo se reúnem em torno

do general Crittenberg para estudarem, juntos, os planos de ataque a Montese,

a noroeste de Castelnuovo, onde era grande a concentração de tropas alemãs.

No dia 12 de abril, inicia-se um ataque conjunto em toda a região. A FEB

avança sobre Montese e Sorreto, enquanto que a 10ª Divisão da Montanha

americana persegue seu objetivo, alcançando Monte Pigna, Le Coste e Tole,

com a cobertura de aviões de combate.

Ainda que não tendo o mesmo simbolismo da conquista de Monte Castelo,

as batalhas em Montese foram árduas, situando-se entre as mais difíceis que os

pracinhas enfrentaram nos campos da Itália.

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A resistência inimiga foi feroz e infernizou a vida dos brasileiros. Se, de um

lado, conseguimos fazer 452 prisioneiros, de outro, tivemos 426 baixas,

incluindo-se nelas 34 mortos.

Igualmente heroica foi a operação da Divisão da Montanha americana. que

abriu um flanco na unidade alemã, deixando uma brecha para a passagem de

forças em direção ao Noroeste, onde se acham os Montes Apeninos.

Em Fornovo, a

consagração

É na região dos Apeninos que fica Fornovo, para onde seguem, agora os

brasileiros, com a missão de impedir o avanço da 148ª Divisão Alemã, que se

acha ali acantonada, juntamente com remanescentes da 90ª Divisão Blindada e

da Divisão de Atiradores (Bersagliari), que prosseguiram na luta junto aos

alemães, mesmo depois da rendição da Itália. Era uma força considerável,

reunindo perto de 15.000 homens em condições de combate.

Desta vez, não havia qualquer apoio externo, seja da Divisão da Montanha,

ou dos aviões de combate, ou dos tanques. A estratégia de ataque e o pessoal

envolvido era todo da FEB. O início do avanço estava programado para 28 de

abril de 1945.

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As tropas brasileiras se concentraram ao Norte, na área de Collechio, que

acabaram de conquistar, e dali partiram em três alas, atacando simultaneamente

pelo Norte, pelo Sudeste e pelo Sudoeste de Fornovo e, não obstante a

resistência enfrentada, os alemães permaneceram encurralados, mantendo sua

praça, sem condições nem de avanço, nem de recuo.

Contando com o auxílio do vigário da localidade de Neviano di Rossi, o

comando brasileiro mandou um ultimato ao comandante da 148ª Divisão alemã,

general Otto Fretter Pico intimando-o a render-se para evitar um desnecessário

derramamento de sangue. Este tentou ganhar tempo, dizendo que iria consultar

seus superiores.

Pode parecer audácia brasileira, ou pelo menos um blefe, a intimação

enviada ao comando alemão, ratificada depois como ordem de rendição

incondicional.

Não era, todavia, um ato impensado. As coisas não iam bem para as forças

do Eixo. No dia anterior, Benito Mussolini fora preso e fuzilado. Os corpos do

líder fascista, de sua amante e de seus mais próximos companheiros foram

pendurados, de cabeça para baixo em uma praça pública.

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Nos campos da Europa, a Alemanha perdia terreno a olhos vistos e a luta

nazista na Itália não oferecia, àquela altura, grande motivação. As tropas há

muito não vinham sendo renovadas e nem o suprimento de alimentos estava

chegando a base. Os soldados alemães passavam fome e a prisão seria, mais

que tudo, uma perspectiva de ganhar uma ração que lhes permitisse a

sobrevivência.

No meio de todas as vicissitudes, o momento era, pois, propício para deter

em um campo de concentração aquela valiosa concentração de soldados

alemães, tirando-os do campo de batalha.

Nessas circunstâncias, os inimigos, finalmente, renderam-se aos brasileiros,

depondo suas armas. Tanto o general Otto Fretter Pico, comandante da 148ª

Divisão alemã, quanto o general Mário Carloni, comandante da Divisão

Bersagliari italiana foram escoltados até Florença e ali entregues ao comando do

5º Exército americano.

O desfecho da guerra

Os brasileiros improvisaram um campo cercado, onde foram abrigados, como

podiam, os 14.779 alemães e italianos, feitos prisioneiros após a rendição.

Poderiam até fugir se quisessem. Para onde e para que?

Três dias depois, morria Adolph Hitler e, em 8 de maio de 1945, era assinado

o armistício, dando fim à guerra na Europa. Restava apenas o Japão que se

renderia em 14 de agosto de 1945.

Após seis anos de apreensão, incerteza e, por vezes, desespero, o mundo

respira aliviado.

Os pracinhas brasileiros, também carregando consigo as marcas indeléveis

da guerra, voltavam ao Brasil, trazendo no peito o orgulho de um dever cumprido.

O Brasil estava esperando por eles. Primeiro, os que tiveram a felicidade de

voltar vivos e que chegaram aqui dois meses após o Armistício.

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Depois, como um compromisso de honra, foram trazidos os que jaziam no

cemitério de Pistoia, a seu tempo repatriados, com direito a repousar dignamente

na pátria que defenderam com o sacrifício de suas vidas.

Lá fora, a liberdade, fora reconquistada. Aqui dentro, os pracinhas

encontraram vigente a mesma ditadura do Estado Novo.

Na Itália, lutaram pela liberdade do povo europeu. E não havia frustração

maior do que essa, de encontrar em sua própria pátria, as restrições à liberdade

pelas quais, em lugar distante, ofereceram seu próprio sangue.