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1 Capítulo 2. Mercado de Trabalho e Desemprego 1 2.1. Conceitos e Factos 2.2. Equilíbrio no Mercado de Trabalho 2.3. Desemprego Estrutural 2.4. Desemprego Friccional 2.5. Conclusão 2.1 Conceitos e Factos Uma pessoa desempregada tem menor poder de compra, menor amor próprio, e, tende, em geral, a perder qualificações. Estes efeitos são particularmente acentuados no caso do desemprego de longa duração, ao qual está frequentemente associado um grande sofrimento, da pessoa desempregada e da sua família. A existência de desemprego significa que os recursos produtivos da economia não são plenamente aproveitados. Produzem-se menos bens e serviços do que aqueles que seria possível produzir, dados os recursos e a tecnologia existentes. Isto reflecte-se no bem-estar das gerações presentes e futuras. As pessoas empregadas também suportam os custos do desemprego, directa e indirectamente. Os sistemas de segurança social transferem recursos para as pessoas desempregadas (subsídio de desemprego). Além disso, uma maior taxa de desemprego implica uma maior taxa de criminalidade, uma maior taxa de subsídio, e um maior nível de tensão social. 1 Este texto de apoio (1E207 Macroeconomia II, FEP-UP, 2009-10) não dispensa a frequência das aulas e a consulta da bibliografia recomendada. Fotografia: “Migrant Mother” de Dorothea Lange (EUA, 1936). Comentários e sugestões: João Correia da Silva ([email protected]).

Capítulo 2. Mercado de Trabalho e Desemprego 1...3 Nos últimos 10 anos, a população activa (tal como a população total) teve um aumento de 522 mil pessoas. Hoje temos mais 326

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1

Capítulo 2. Mercado de Trabalho e Desemprego1

2.1. Conceitos e Factos

2.2. Equilíbrio no Mercado de Trabalho

2.3. Desemprego Estrutural

2.4. Desemprego Friccional

2.5. Conclusão

2.1 Conceitos e Factos

Uma pessoa desempregada tem menor poder de compra, menor amor próprio, e, tende, em

geral, a perder qualificações. Estes efeitos são particularmente acentuados no caso do

desemprego de longa duração, ao qual está frequentemente associado um grande

sofrimento, da pessoa desempregada e da sua família.

A existência de desemprego significa que os recursos produtivos da economia não são

plenamente aproveitados. Produzem-se menos bens e serviços do que aqueles que seria

possível produzir, dados os recursos e a tecnologia existentes. Isto reflecte-se no bem-estar

das gerações presentes e futuras.

As pessoas empregadas também suportam os custos do desemprego, directa e

indirectamente. Os sistemas de segurança social transferem recursos para as pessoas

desempregadas (subsídio de desemprego). Além disso, uma maior taxa de desemprego

implica uma maior taxa de criminalidade, uma maior taxa de subsídio, e um maior nível

de tensão social.

1 Este texto de apoio (1E207 Macroeconomia II, FEP-UP, 2009-10) não dispensa a frequência das aulas e a consulta da bibliografia recomendada. Fotografia: “Migrant Mother” de Dorothea Lange (EUA, 1936). Comentários e sugestões: João Correia da Silva ([email protected]).

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2

Uma pessoa diz-se desempregada se, num período de referência, verificar

simultaneamente as seguintes condições:

i) não possuir emprego;

ii) procurar activamente emprego;

iii) estiver apta/disponível para trabalhar imediatamente.

A população activa (NS) é o conjunto das pessoas que, num período de referência,

manifestam disponibilidade para trabalhar, podendo estar empregados ou desempregados.

A população inactiva (Pop-NS) é o conjunto das pessoas que, num período de referência,

não estão empregadas nem desempregadas. Inclui crianças, estudantes, reformados, e

todos aqueles que não procuram emprego ou não estão aptos para trabalhar.

A taxa de actividade (NS/Pop) é o rácio entre a população activa e a população total.

Aumentou muito significativamente na segunda metade do século XX, com a entrada das

mulheres no mercado de trabalho.

A taxa de desemprego (u) é o rácio entre a população desempregada (U) e a população

activa (NS).

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

População Activa 5.096 5.136 5.226 5.325 5.408 5.460 5.488 5.545 5.587 5.618 5.625

Empregados 4.844 4.910 5.021 5.112 5.137 5.118 5.123 5.123 5.160 5.170 5.198

Desempregados 252 226 206 214 271 342 365 422 428 449 427

População Inactiva 5.033 5.031 4.997 4.969 4.958 4.985 5.021 5.018 4.999 4.986 4.998

População Total 10.129 10.167 10.223 10.294 10.366 10.445 10.509 10.563 10.586 10.604 10.6230 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Taxa de Actividade 50,3% 50,5% 51,1% 51,7% 52,2% 52,3% 52,2% 52,5% 52,8% 53,0% 53,0%

Taxa de Desemprego 4,9% 4,4% 3,9% 4,0% 5,0% 6,3% 6,7% 7,6% 7,7% 8,0% 7,6%

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Tabela 2.1: Emprego, desemprego e inactividade em Portugal (1998-2008).

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3

Nos últimos 10 anos, a população activa (tal como a população total) teve um aumento de

522 mil pessoas. Hoje temos mais 326 mil pessoas empregadas, e mais 197 mil

desempregados.

Emprego em Portugal (1998)

2,5%

47,8%49,7%

Empregados

Desempregados

Inactivos

Emprego em Portugal (2008)

4,0%

48,9%47,0%

Figura 2.2: Emprego, desemprego e inactividade em Portugal (1998-2008). Fonte: INE.

Nos últimos 30 anos, a taxa de actividade aumentou dos 40% para os 53%. Parte deste

aumento resultou da entrada progressiva das mulheres no mercado de trabalho.

Actividade e Desemprego em Portugal (1955-2008)

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005

tax

a d

e a

cti

vid

ad

e

0%

2%

4%

6%

8%

10%

12%

tax

a d

e d

es

em

pre

go

Taxa de Actividade

Taxa de Desemprego

Figura 2.3: Taxa de actividade e taxa de desemprego em Portugal (1955-2008).

Fonte: Banco de Portugal e Instituto Nacional de Estatística.

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4

Grande parte da inactividade é devida ao facto de as pessoas em questão não estarem em

idade de trabalhar. Podemos ter interesse em ignorar esta inactividade puramente

demográfica, de forma a medir a inactividade que é originada por outros motivos,

associados à organização económica e ao funcionamento do mercado de trabalho.

Nesse sentido, pode considerar-se um universo mais restrito, a população em idade

activa, que é o conjunto de pessoas residentes, com idades compreendidas entre os 15 e os

64 anos.2

A taxa de emprego é a percentagem da população em idade activa que está empregada.

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Pop. Residente 10.129 10.167 10.223 10.294 10.366 10.445 10.509 10.563 10.586 10.604 10.623

Homens 4.884 4.905 4.934 4.971 5.009 5.052 5.087 5.115 5.125 5.133 5.141

Mulheres 5.244 5.263 5.289 5.323 5.357 5.393 5.421 5.448 5.461 5.471 5.481

Pop. Residente (15 e +) 8.445 8.505 8.577 8.654 8.724 8.800 8.863 8.912 8.942 8.975 8.993

Homens 4.021 4.053 4.091 4.132 4.168 4.209 4.243 4.268 4.285 4.291 4.310

Mulheres 4.424 4.452 4.486 4.522 4.556 4.591 4.620 4.644 4.665 4.677 4.689

População Activa 5.096 5.136 5.226 5.325 5.408 5.460 5.488 5.545 5.587 5.618 5.625

Homens 2.805 2.818 2.855 2.901 2.938 2.948 2.957 2.964 2.985 2.986 2.991

Mulheres 2.291 2.318 2.372 2.424 2.470 2.512 2.531 2.581 2.603 2.632 2.633

Empregados 4.844 4.910 5.021 5.112 5.137 5.118 5.123 5.123 5.160 5.170 5.198

Homens 2.694 2.709 2.765 2.810 2.816 2.787 2.784 2.765 2.790 2.789 2.797

Mulheres 2.149 2.201 2.256 2.302 2.321 2.331 2.339 2.357 2.370 2.380 2.401

Desempregados 251,9 225,8 205,5 213,5 270,5 342,3 365,0 422,3 427,8 448,6 427,1

Homens 110,6 108,9 89,3 91,6 121,4 160,9 172,9 198,1 194,8 196,8 194,3

Mulheres 141,3 116,9 116,2 122,0 149,1 181,4 192,2 224,1 233,1 251,8 232,7

Taxa de Actividade 50,3% 50,5% 51,1% 51,7% 52,2% 52,3% 52,2% 52,5% 52,8% 53,0% 53,0%

Homens 57,4% 57,5% 57,9% 58,4% 58,7% 58,4% 58,1% 57,9% 58,2% 58,2% 58,2%

Mulheres 43,7% 44,0% 44,8% 45,5% 46,1% 46,6% 46,7% 47,4% 47,7% 48,1% 48,0%

Taxa de Emprego 57,4% 57,7% 58,5% 59,1% 58,9% 58,2% 57,8% 57,5% 57,7% 57,6% 57,8%

Homens 67,0% 66,8% 67,6% 68,0% 67,6% 66,2% 65,6% 64,8% 65,1% 65,0% 64,9%

Mulheres 48,6% 49,4% 50,3% 50,9% 50,9% 50,8% 50,6% 50,8% 50,8% 50,9% 51,2%

Taxa de Desemprego 4,9% 4,4% 3,9% 4,0% 5,0% 6,3% 6,7% 7,6% 7,7% 8,0% 7,6%

Homens 3,9% 3,9% 3,1% 3,1% 4,1% 5,5% 5,8% 6,7% 6,5% 6,6% 6,5%

Mulheres 6,2% 5,0% 4,9% 5,0% 6,0% 7,2% 7,6% 8,7% 9,0% 9,6% 8,8%

Fonte: Instituto Nacional de Estatística .

Tabela 2.4: Emprego, desemprego e inactividade em Portugal, por sexo (1998-2008).

2 Alternativamente, consideram-se todas as pessoas com idade igual ou superior a 15 anos.

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A taxa de emprego feminina é significativamente inferior à masculina. É superior nos

países nórdicos, e inferior nos países mediterrânicos.

Emprego - Mulheres (OCDE 2005)

AustraliaAustria

Belgium

Canada Czech Rep

Denmark

Finland

France Germany

Greece

Hungary

Ireland

Italy

Japan

Korea

Luxemb

NetherlandsNew Zeal Norw ay

Poland

Portugal

Slovakia

Spain

Sw eden Sw itz

UK

USA

Slovenia

0%

5%

10%

15%

20%

40% 45% 50% 55% 60% 65% 70% 75%

taxa de emprego (15 a 64 anos)

tax

a d

e d

es

em

pre

go

Figura 2.5a: Taxa de emprego e taxa de desemprego nos países da OCDE (2005) - mulheres.

A taxa de desemprego na população masculina é, em geral, inferior à que se verifica na

população feminina. A diferença é particularmente acentuada na Grécia, Espanha e Itália.

Emprego - Homens (OCDE 2005)

Australia

Austria

Belgium Canada

Czech

Denmark

Finland France Germany

Greece

Hungary

Ireland

Italy

Japan

Korea Luxemb

Netherlands New ZealNorw ay

Poland

Portugal

Slovakia

Spain Sw eden

Sw itz

UKUSA

Slovenia

0%

5%

10%

15%

20%

55% 60% 65% 70% 75% 80% 85%

taxa de emprego (15 a 64 anos)

tax

a d

e d

es

em

pre

go

Figura 2.5b: Taxa de emprego e taxa de desemprego nos países da OCDE (2005) - homens.

Fonte: OECD Factbook 2007: Economic, Environmental and Social Statistics.

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6

Em 1962, Arthur Okun observou que o desemprego tem flutuações cíclicas, inversamente

relacionadas com as flutuações cíclicas do produto. Este facto estilizado ficou conhecido

como a Lei de Okun.

Figura 2.6: Lei de Okun.

Fonte: Gordon (2005), “Macroeconomics”, 10th ed., Addison-Wesley.

Dado este comportamento, faz sentido decompor o desemprego em desemprego natural

(UN) e desemprego cíclico (U-UN), que correspondem à tendência de longo prazo e ao

desvio relativamente a essa tendência, respectivamente.

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A taxa de desemprego natural (uN) está associada ao produto natural (YN). Quando o

desemprego é inferior (superior) ao natural, o produto é superior (inferior) ao natural, e a

inflação tende a aumentar (diminuir).3

A evolução da taxa de desemprego em Portugal, nos últimos 30 anos, parece apresentar

um comportamento cíclico inversamente relacionado com o comportamento cíclico do

produto (tal como previsto pela Lei de Okun).

Produto e Desemprego em Portugal (1978-2008)

2%

4%

6%

8%

10%

1978 1983 1988 1993 1998 2003 2008

tax

a d

e d

es

em

pre

go

50 000

75 000

100 000

125 000

150 000

PIB

(m

ilh

õe

s d

e e

uro

s)

Taxa de Desemprego

Produto Real (base 2000)

Figura 2.7: Produto real e taxa de desemprego em Portugal (1978-2008).

Fonte: Banco de Portugal e Instituto Nacional de Estatística.

A estimação empírica da Lei de Okun aponta para que um aumento de 1% da taxa de

desemprego esteja associado a uma diminuição de 2% a 3% do produto da economia.

3 A designação anglo-saxónica da taxa natural de desemprego é NAIRU: Non-Accelerating Inflation Rate of

Unemployment.

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2.2 Equilíbrio no Mercado de Trabalho

2.2.1 Oferta de Trabalho

Para adquirir e consumir os bens necessários à vida e ao conforto, as pessoas precisam de

ter rendimentos. A maior parte das pessoas obtém rendimento através da oferta de trabalho

a empresas em troca de um salário. Por outro lado, as pessoas valorizam também o seu

tempo livre. Como o tempo não estica, cada hora adicional de trabalho implica que a

pessoa tenha menos uma hora disponível para o lazer.

Para explicar o comportamento da oferta agregada de trabalho da economia, NS, vamos

começar por explicar a oferta individual de trabalho, recorrendo a um modelo

microeconómico simples no qual o chamado agente representativo4 divide o seu tempo

disponível entre trabalho, L, e lazer, l.

A satisfação ou utilidade do agente, U(C,l), depende do seu nível de consumo e do seu

tempo de lazer, verificando-se a lei das utilidades marginais decrescentes. Esta

propriedade implica que as curvas de indiferença sejam convexas relativamente à origem.

O trabalho proporciona um salário nominal, W, que o agente utiliza para adquirir bens de

consumo ao preço unitário P. O salário real é, portanto, w = W/P. Supondo que o agente

não poupa qualquer fracção do seu rendimento, e que não tem qualquer rendimento

adicional, obtemos:

LwCLWCP ⋅=⇔⋅=⋅ .

4 O agente representativo é uma espécie de agente médio da economia. Assume-se implicitamente a semelhança entre o comportamento da economia cujos agentes têm características diversas, e uma economia hipotética na qual todos os agentes são réplicas deste agente dito representativo.

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9

ISOU

lCdl

dCTMS −=,

l

C

teCU =

C

llC

C

l

ISOU

lC

UMg

UMgTMS

UMg

UMg

dl

dC

dlUMgdCUMg

dll

UdC

C

UlCdU

=⇔

⇔=−⇔

⇔=⋅+⋅⇔

⇔=⋅∂

∂+⋅

∂⇔=

,

0

00),(

ISOU

lCdl

dCTMS −=,

l

C

teCU =

l

C

teCU =

C

llC

C

l

ISOU

lC

UMg

UMgTMS

UMg

UMg

dl

dC

dlUMgdCUMg

dll

UdC

C

UlCdU

=⇔

⇔=−⇔

⇔=⋅+⋅⇔

⇔=⋅∂

∂+⋅

∂⇔=

,

0

00),(

Se considerarmos o dia como período de referência e a hora como unidade de medida do

tempo, então, obrigatoriamente, L+l = 24. Esta restrição temporal implica directamente a

seguinte restrição orçamental:

( )lwC −⋅= 24 .

O “preço” de uma hora de lazer, ou seja, o custo de oportunidade de uma hora adicional

de tempo de lazer, medido em unidades de bens de consumo, é w. O declive da recta

orçamental (-w) mede este trade-off entre consumo e lazer. Cada hora adicional de lazer

implica a diminuição do nível de consumo em w unidades.

A taxa marginal de substituição entre consumo e lazer mede a quantidade de consumo

de que o agente está disposto a abdicar para poder dispor de uma unidade adicional de

lazer. Graficamente, é traduzida pelo declive da curva de indiferença. Analiticamente,

pode calcular-se como a razão entre as utilidades marginais do lazer e do consumo.

Figura 2.8: Igualdade entre a TMS e o declive da curva de indiferença (em valor absoluto).

Como as utilidades marginais são decrescentes, quanto maior for o tempo de lazer e

quanto menor for o nível de consumo, menor é a quantidade de consumo de que o agente

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está disposto a abdicar para obter uma unidade adicional de lazer. Isto é, a taxa marginal

de substituição decresce com o aumento do lazer e com a diminuição do consumo.

O problema do agente é o de maximizar a sua utilidade, U(C,l), estando sujeito à restrição

orçamental, C = w·(24-l). A escolha é óptima se o agente se posicionar na curva de

indiferença mais afastada da origem, dentro da sua restrição orçamental.

É razoável assumir que as curvas de indiferença são diferenciáveis, e que o indivíduo

precisa tanto de consumir bens como de dispor de tempo de lazer para sobreviver. Nesse

caso, a solução óptima corresponde ao ponto de tangência entre a recta orçamental e o

mapa de indiferença, isto é, ao ponto no qual são iguais a taxa marginal de substituição

entre consumo e lazer (TMSC,l = UMgl/UMgC) e o salário real, ou preço (relativo) do lazer,

w.

24 l

C

2UU =

1UU =

0UU =

lazer insuficiente

óptimo

inatingível

*Lw ⋅

*24 L−

24⋅w

24 l

C

2UU =

1UU =

0UU =

lazer insuficiente

óptimo

inatingível

*Lw ⋅

*24 L−

24⋅w

Figura 2.9: Escolha óptima entre lazer e consumo.

Resolvendo este problema para uma gama alargada de valores de w, obtemos a função

oferta individual de trabalho, LS. Esta função dá-nos a quantidade de trabalho que o

agente representativo pretende oferecer, para cada valor do salário real. O impacto de uma

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variação do salário real sobre a quantidade de trabalho que o agente oferece depende da

magnitude de dois efeitos opostos: o efeito rendimento e o efeito substituição.

Um aumento do salário real torna o lazer relativamente mais caro (em termos de custo de

oportunidade). Não trabalhar passa a implicar abdicar de uma maior quantidade de bens de

consumo. Esta alteração dos preços relativos do consumo e do lazer leva os agentes a

consumir mais e a dedicar menos tempo ao lazer (substituição de lazer por consumo). O

efeito substituição age no sentido de levar os agentes a trabalhar mais (menos) e a

consumir mais (menos) quando o salário real aumenta (diminui).

Por outro lado, um aumento salarial permite aos agentes consumir uma maior quantidade

de bens, mantendo o seu tempo de lazer. Como a utilidade marginal do consumo é

decrescente, as unidades adicionais de consumo estão associadas a um menor aumento da

utilidade. Isto faz com que os agentes trabalhem menos, e dediquem mais tempo ao lazer

(mais lazer e mais consumo). O efeito rendimento age no sentido de levar os agentes a

agentes a trabalhar menos (mais) e a consumir mais (menos) quando o salário real

aumenta (diminui).5

C

24 l

C

A

B240 ⋅w

241 ⋅w

242 ⋅w

C

24 l

C

A

B240 ⋅w

241 ⋅w

242 ⋅w

5 Estamos a assumir, implicitamente, que o consumo e o lazer são bens normais. Quando o rendimento aumenta, o agente representativo passa a consumir mais e a dedicar mais tempo ao lazer.

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12

Figura 2.10: Efeito de uma variação do salário real.

A combinação óptima de consumo e lazer altera-se. Em resultado de um aumento salarial,

os agentes passam a consumir sempre mais, mas podem passar a trabalhar mais ou menos

conforme predomine o efeito substituição ou o efeito rendimento.

Graficamente, o aumento do salário real traduz-se numa rotação da recta orçamental:

aumenta a ordenada na origem e aumenta a inclinação. No caso representado na figura: o

efeito substituição predomina quando o salário real sobe de w0 para w1 (o agente passa a

trabalhar mais); mas quando o salário aumenta de w1 para w2, é o efeito rendimento que

predomina (o agente passa a trabalhar menos).

O efeito de substituir o caro pelo barato (substituição) tende a predominar para níveis

salariais baixos, enquanto que o efeito rendimento tende a predominar a partir de um certo

nível salarial. A curva oferta individual de trabalho tende, portanto, a ser positivamente

inclinada na zona de salários baixos, e negativamente inclinada a partir de um certo ponto.

LS

w

Predomina o efeito rendimento

predomina o efeito substituição

LS

w

Predomina o efeito rendimento

predomina o efeito substituição

Figura 2.11: Oferta individual de trabalho.

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Frequentemente, o trabalhador não tem a possibilidade de escolher a quantidade de

trabalho que vai realizar. É-lhe proposto um contrato que estipula um determinado horário

laboral (por exemplo, 40 horas semanais) e uma remuneração, que o trabalhador pode

aceitar ou não. Ao valor mínimo do salário que o trabalhador aceita para trabalhar

chamamos salário de reserva.

Observa-se que a reacção dos indivíduos às variações do salário é maior no longo prazo do

que no curto prazo. Isto é, a oferta individual de trabalho é rígida no curto prazo, mas

relativamente elástica no longo prazo.

A oferta agregada de trabalho, NS, é simplesmente a soma das quantidades de trabalho

que são oferecidas por todas as pessoas numa economia. É bastante mais elástica do que a

oferta individual de trabalho, e é positivamente inclinada (na zona economicamente

relevante). Mesmo que diminua a quantidade de trabalho que algumas pessoas oferecem,

essa diminuição é mais do que compensada pelo aumento das quantidades oferecidas pelas

outras pessoas, algumas das quais nem sequer procuravam trabalho ao nível salarial

anterior.

NS

w

NS

w

Figura 2.12: Oferta agregada de trabalho.

A oferta de trabalho depende não só das características individuais, mas também de

factores demográficos (população e estrutura etária), de factores culturais que

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influenciam a taxa de actividade (participação das mulheres no mercado de trabalho, idade

de reforma), e da legislação reguladora (horários de trabalho e subsídio de desemprego).

Aumentos da população activa ou do horário de trabalho fazem naturalmente aumentar a

oferta de trabalho.

2.2.2 Procura de Trabalho

Para desenvolverem a sua actividade produtiva, as empresas procuram contratar

trabalhadores, que lhes oferecem trabalho, em troca de um salário. Contratar mais um

trabalhador permite aumentar o volume de produção, mas, por outro lado, implica um

custo adicional.

Para cada nível salarial, uma empresa escolhe a quantidade de trabalho que maximiza o

seu lucro. A relação entre o nível salarial vigente no mercado e a quantidade de trabalho

que as empresas procuram designa-se por função procura de trabalho.

A relação entre os factores de produção utilizados e o volume de produção designa-se por

função de produção. Se considerarmos apenas a possibilidade de escolher a quantidade

de factor trabalho, estando os restantes (capital, terra) fixos, a função produção escreve-se,

simplesmente, como Q=F(L).

A produtividade marginal do trabalho é o aumento do volume de produção

proporcionado pela utilização de uma unidade adicional de trabalho, e calcula-se como a

derivada da função produção: PMgL = F’(L). É razoável assumir que a produtividade

marginal é decrescente.

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O lucro de uma empresa que utiliza L unidades de factor trabalho, remunerado ao salário

nominal W, para produzir F(L) unidades de produto, que vende a um preço unitário igual a

P, é dado por:

LWLFPLLT ⋅−⋅= )()( .

A quantidade de factor trabalho que maximiza o lucro da empresa é tal que a

produtividade marginal do trabalho (benefício marginal) é igual ao salário real (custo

marginal):

wP

WPMgWLFPLLTCPO L ==⇔=−⋅⇔= 0)('0)(': .

Se a quantidade de trabalho for inferior à óptima, a produtividade marginal é superior ao

salário real, de modo que compensa aumentar a utilização de trabalho (o que faz diminuir

a produtividade marginal).

L

Q

declive = PMgL

(decrescente)

L

RMgL>CMgL RMgL<CMgL

PMgL

w

L

Q

declive = PMgL

(decrescente)

L

RMgL>CMgL RMgL<CMgL

PMgL

w

Figura 2.13: Determinação da procura de trabalho.

A curva da procura individual de trabalho, LD, coincide com a curva da produtividade

marginal do trabalho.

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16

L

w

LD = PMgL

L

w

LD = PMgL

Figura 2.14: Procura de trabalho por parte de uma empresa.

A procura agregada de trabalho, ND, é a soma de todas as procuras individuais de

trabalho das empresas. É normalmente medida em horas-homem.

ND

w

w = PMgN

ND

w

w = PMgN

Figura 2.15: Procura agregada de trabalho.

Dado que a curva da procura de trabalho coincide com a curva da produtividade marginal

do trabalho, os factores determinantes da produtividade do trabalho são também

determinantes da procura de trabalho. Dois determinantes fundamentais são o

progresso técnico (aumento da produtividade dos factores de produção) e a utilização dos

outros factores (essencialmente, de capital). Quanto maior for o nível tecnológico da

economia, e quanto maior for o stock de capital existente, maior é a produtividade do

trabalho, e, portanto, maior é a procura de trabalho.

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17

N

PMgN

w

N

w

ND

N

PMgN

w

N

w

ND

Figura 2.16: Efeito de um aumento da produtividade do trabalho.

2.2.3 Equilíbrio no Mercado de Trabalho

O salário real de equilíbrio, w*, do mercado de trabalho é aquele para o qual são iguais a

quantidade oferecida e quantidade procurada de trabalho. A esta quantidade de trabalho

que é oferecida e procurada chamamos emprego de equilíbrio, N*.

N

w

*w

*N

SN

DN

N

w

*w

*N

SN

DN

Figura 2.17: Equilíbrio no mercado de trabalho.

Um factor que afecte positivamente a oferta de trabalho tem como efeito uma diminuição

do salário real de equilíbrio, e um aumento do emprego de equilíbrio. Exemplos destes

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factores são o aumento da taxa de participação das mulheres no mercado de trabalho, o

aumento populacional, e a imigração.

N

w

*N

SN

DN

*w

N

w

*N

SN

DN

*w

Figura 2.18: Efeito de um aumento da oferta agregada de trabalho.

Os factores que afectam positivamente a procura de trabalho fazem aumentar o salário real

de equilíbrio e o emprego de equilíbrio. Exemplos destes factores são o progresso

tecnológico e o aumento do stock de capital.

N

w

*N

SN

DN

*w

N

w

*N

SN

DN

*w

Figura 2.19: Efeito de um aumento da procura agregada de trabalho.

Na situação teórica de equilíbrio, não há desemprego (involuntário). Todas as pessoas que

pretendem trabalhar ao salário real vigente estão empregadas. Só não estão empregadas

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aquelas que não estão aptas ou não estão disponíveis para trabalhar. Muitas não oferecem

trabalho por considerarem insuficiente o salário vigente. Nesse caso, não fazem parte da

população activa, e, portanto, não são consideradas desempregadas. O desemprego

voluntário não é considerado como desemprego de facto.

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2.3 Desemprego Estrutural

O desemprego estrutural, Ue, resulta do facto de o salário real não se ajustar de forma

exacta e imediata ao valor do salário real de equilíbrio. Sendo o salário real superior ao

valor de equilíbrio (w’>w*), verifica-se um excesso de oferta de trabalho relativamente à

procura, de modo que nem todos os agentes que oferecem trabalho obtêm emprego.

N

wSN

DN

SND

N

eU

*w

'w

N

wSN

DN

SND

N

eU

*w

'w

Figura 2.20: Rigidez real e desemprego estrutural.

Seria de esperar que o salário real diminuísse, dado que os agentes desempregados

estariam dispostos a trabalhar por um salário inferior ao vigente. Mas observa-se que o

salário nominal é bastante rígido à baixa (isto é, não diminui instantaneamente em

resultado de um excesso de oferta). Uma das origens da rigidez nominal dos salários é a

influência dos sindicatos.

Os movimentos sindicais procuram aumentar o poder negocial dos trabalhadores.

Invocam que a relação entre patrão e empregado não é paritária, o que origina uma

partilha do rendimento entre salários e rendimentos do capital que não está de acordo com

a produtividade dos factores.

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Sendo os salários determinados por negociação bilateral entre o patronato e os sindicatos,

o mercado de trabalho não funciona em condições de concorrência perfeita.

Em geral, se compararmos a oferta de um monopolista com a oferta concorrencial,

verificamos que o monopolista vende uma menor quantidade de produto a um preço mais

elevado. É de esperar que a influência dos sindicatos implique salários superiores, mas

menos emprego. Chamamos oferta colectiva de trabalho, NC, à oferta agregada de

trabalho que resulta das ofertas individuais e da influência dos sindicatos.

De certa forma, os sindicatos defendem os interesses dos indivíduos empregados (salários

mais elevados) à custa dos indivíduos desempregados (menos emprego). Este tipo de

conflito entre um grupo instalado e um grupo excluído designa-se por conflito

insiders/outsiders.

N

wSN

DN

SNDN

eU

*w

'w

CN

N

wSN

DN

SNDN

eU

*w

'w

CN

Figura 2.21: Oferta colectiva de trabalho e desemprego estrutural.

A fixação de um salário mínimo também contribui, evidentemente, para a rigidez

nominal dos salários. O objectivo do Governo ao fixar um salário mínimo é o de limitar a

compressão artificial dos salários por parte de empregadores com elevado poder negocial

e o de evitar a exploração do emprego juvenil. A presença de um salário mínimo

desencoraja as empresas de recrutar trabalhadores com baixa produtividade, como, por

exemplo, os idosos não qualificados.

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Em maior ou menor medida, a produtividade dos trabalhadores depende do empenho e

dedicação com que encaram o trabalho. Se uma empresa não observar perfeitamente o

esforço dos seus trabalhadores, é natural que estes se esforcem tanto mais quanto mais

motivados estiverem.

Um salário superior pode proporcionar ao trabalhador uma motivação adicional, que se

reflecte na sua produtividade. Pode interessar, portanto, às empresas, pagar aos seus

trabalhadores um salário superior ao salário de reserva. O salário que, nestas condições,

maximiza o lucro da empresa designa-se por salário de eficiência.

O facto de as empresas pagarem salários de eficiência (superiores ao salário de equilíbrio)

origina desemprego no mercado de trabalho. Por sua vez, um maior nível de desemprego é

geralmente um factor adicional de motivação para as pessoas empregadas. Passa a ser

maior o custo de perder o emprego, dado que os desempregados demorarão, em princípio,

mais tempo a encontrar um novo emprego.

Em suma, os salários de eficiência podem permitir:

- obter maior dedicação e esforço por parte dos trabalhadores, que pretendem

evitar o despedimento ou conseguir uma promoção, estão mais motivados, e estão mais

saudáveis;

- contratar trabalhadores mais produtivos, dado que o excesso de oferta de

trabalho permite maior selecção no processo de recrutamento;

- diminuir a rotatividade dos trabalhadores e os consequentes custos associados à

formação e à fuga para a concorrência.

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2.4 Desemprego Friccional

O desemprego friccional resulta do dinamismo inerente ao normal funcionamento da

economia e do mercado de trabalho em particular. Em cada momento são criados novos

postos de trabalho, desaparecendo outros, e há novos trabalhadores que entram no

mercado, saindo outros. Existe desemprego friccional porque é necessário tempo para que

se encontrem um trabalhador (que procura um emprego) e uma empresa (que pretende

preencher um posto de trabalho) com características compatíveis.

Relativamente ao mercado de trabalho, um indivíduo pode estar numa de três situações:

empregado, desempregado ou inactivo. O desemprego friccional está relacionado com as

velocidades de transição entre estes três estados.

Figura 2.22: Fluxos entre emprego, desemprego e inactividade.

A taxa de separação (s) define-se como a fracção de trabalhadores empregados (E) que

se tornam desempregados, num determinado período de tempo. Pode também ser

interpretada como a probabilidade de um trabalhador deixar de estar empregado. Tem uma

componente cíclica, sendo evidentemente superior nas fases de recessão económica, altura

em que há uma maior destruição de postos de trabalho.

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A taxa de ingresso (f), ou taxa de contratação, é definida como a fracção de

desempregados (U) que encontra emprego, num determinado período de tempo. Pode ter

interesse interpretar este parâmetro como a probabilidade de um desempregado conseguir

emprego. É maior nas fases de expansão económica, altura em que há um aumento dos

volumes de produção, e, portanto, um maior ritmo de criação de postos de trabalho.

Supondo que a população activa, NS, permanece constante, a variação do desemprego é

dada por: ∆U = s·E – f·U. Considerando também como fixos os valores destes parâmetros,

podemos estimar o desemprego friccional, como o nível de desemprego estacionário, isto

é, aquele para o qual ∆U = 0:

Ef

sUUfEsU =⇒=⋅−⋅⇒=∆ 00 .

Como NS = E + U, podemos determinar a taxa de desemprego friccional. Naturalmente,

esta é tanto menor quanto menor for a taxa de separação e maior for a taxa de contratação:

fs

su

fs

fs

UE

UuUEN S

+=⇒

+=

+=⇒+=

1.

O ritmo de progresso técnico tem uma influência decisiva nos valores das taxas de

separação e de contratação. A inovação torna obsoletos postos de trabalho, produtos, e

mesmo indústrias, criando, por outro lado, novos postos de trabalho a serem preenchidos,

novos produtos e novas indústrias.

O desemprego friccional também é determinado pelo ambiente social e institucional e

pelas restrições legais. A taxa de separação é maior em países com menos restrições legais

ao despedimento. A taxa de contratação é maior quanto melhor for a disseminação da

informação relativa às ofertas de emprego, e quanto maior for o esforço dos

desempregados no sentido de encontrar emprego.

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Em Portugal, no 4º trimestre de 2008, a taxa de separação foi igual a 1,3%, enquanto que a

taxa de ingresso foi igual a 18,0%. Destes valores resultaria, no longo prazo, uma taxa de

desemprego friccional igual a 6,7%.

Figura 2.23: Fluxos entre emprego, desemprego e inactividade – Portugal (4ºT 2008).

Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

O subsídio de desemprego tem um impacto importante no mercado de trabalho. As

condições em que é concedido variam significativamente de país para país. Um sistema de

apoio aos desempregados tem como principais características: (1) os critérios de

elegibilidade; (2) o nível de substituição do rendimento do trabalho; e (3) o período de

duração.

Em Portugal, um desempregado é elegível se tiver obtido remunerações durante 450 dias

nos 24 meses imediatamente anteriores à data do desemprego. O montante do subsídio é

igual a 65% da remuneração média, tendo como máximo o triplo do salário mínimo e

como mínimo o salário mínimo. O período de concessão depende da carreira contributiva

do beneficiário e da sua idade, variando entre os 270 e os 900 dias.

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Estes apoios fazem aumentar o desemprego friccional, por acomodação da pessoa à

situação de desemprego, especialmente se o período de duração for muito elevado. Na

medida em que a situação de desemprego acarreta perda de capacidades produtivas, as

pessoas podem cair na chamada armadilha do desemprego, tornando-se desempregados

de longa duração.

Por outro lado, algumas pessoas aproveitam a situação de desemprego para adquirir novas

qualificações profissionais e para procurar um posto de trabalho mais adequado às suas

características produtivas. Em casos como estes, a perda económica associada ao

desemprego é temporária e pode ser mais do que compensada por um acréscimo da

produtividade futura.

Todos estes factores devem ser tidos em conta na definição do sistema de apoio aos

desempregados, de modo a que se encontre um bom compromisso entre o grau de

protecção social e a eficiência económica.

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2.5 Conclusão

O desemprego natural é um nível de desemprego de equilíbrio, associado ao produto

natural e, portanto, à ausência de pressões no sentido de aumento ou diminuição da

inflação. Tem uma componente estrutural e uma componente friccional, a primeira de

natureza estática, e a segunda de natureza dinâmica.

A componente estrutural do desemprego resulta da diferença entre o salário real

estacionário e aquele para o qual são iguais a oferta e a procura de trabalho. Esta diferença

deve-se à influência dos sindicatos, à existência de um salário mínimo legal, e à fixação de

salários de eficiência por parte das empresas.

Mesmo se o salário real fosse igual ao salário real de equilíbrio, o dinamismo inerente ao

processo económico implicaria sempre a existência do chamado desemprego friccional,

que é originado pelo processo permanente de criação e destruição de postos de trabalho, e

pelos fluxos constantes de entrada e de saída das pessoas do mercado de trabalho.