3
Carlos Alberto Faraco, notável linguista brasileiro e grande estudioso dos escritos bakhtinianos, apresenta-nos em seu texto denominado O Círculo de Baktin - localizado no capitulo 1 da obra intitulada Linguagem & diálogo: as ideias linguísticas do Círculo de Bakhtin, 2006 – um breve panorama sobre aquele que viria a ser o grupo de estudos de maior influência nas pesquisas e consequentes discussões na área da linguagem no século XX e XXI. Faraco (2006), a fim de esclarecer aos leitores, inicia seu o texto expondo a problemática em torno da autoria de algumas obras do referido círculo, é o caso de Freudismo, Marxismo e Filosofia da Linguagem e O Método Formal dos Estudos Literários, os dois primeiros publicados com a assinatura de Valentin N. Voloshinov e o último por Pavel N. Medvedev. No entanto, Viatcheslav V. Ivanov - linguista russo - contesta a autoria do escrito Marxismo e Filosofia da Linguagem, atribuindo-a a Mikhail Bakhtin, atribuição esta que acabou por se estender as outras obras assinadas por Voloshinov. No que concerne ao Círculo de Bakhtin o autor (2006) afirma que o mesmo era composto por intelectuais de diversas formações que se reuniu de 1919 a 1929 interessados no debate de ideias e filosofia, e que apresentava como principais integrantes Mikhail Bakhtin, Valentin Voloshinov e Pavel Medvedev. O círculo bakhtiniano tinha em vista dois grandes projetos intelectuais, o primeiro deles encontrava-se sob o vislumbre particular de Bakhtin que consistia na elaboração de uma “prima philosophiae o segundo explícito nos escritos de Voloshinov e Medvedv seria contribuir para construção da teoria das manifestações da superestrutura, vocábulo conceitual marxista. A “prima philosophia” se configuraria como um processo de reflexão filosófico amplo e que consideraria o “ser-como- evento” único, ultrapassando o que Bakhtin denomina de teoreticismo, que é a objetivação da historicidade vivida

Carlos Alberto Faraco

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Carlos Alberto Faraco

Carlos Alberto Faraco, notável linguista brasileiro e grande estudioso dos escritos bakhtinianos, apresenta-nos em seu texto denominado O Círculo de Baktin - localizado no capitulo 1 da obra intitulada Linguagem & diálogo: as ideias linguísticas do Círculo de Bakhtin, 2006 – um breve panorama sobre aquele que viria a ser o grupo de estudos de maior influência nas pesquisas e consequentes discussões na área da linguagem no século XX e XXI.

Faraco (2006), a fim de esclarecer aos leitores, inicia seu o texto expondo a problemática em torno da autoria de algumas obras do referido círculo, é o caso de Freudismo, Marxismo e Filosofia da Linguagem e O Método Formal dos Estudos Literários, os dois primeiros publicados com a assinatura de Valentin N. Voloshinov e o último por Pavel N. Medvedev. No entanto, Viatcheslav V. Ivanov - linguista russo - contesta a autoria do escrito Marxismo e Filosofia da Linguagem, atribuindo-a a Mikhail Bakhtin, atribuição esta que acabou por se estender as outras obras assinadas por Voloshinov.

No que concerne ao Círculo de Bakhtin o autor (2006) afirma que o mesmo era composto por intelectuais de diversas formações que se reuniu de 1919 a 1929 interessados no debate de ideias e filosofia, e que apresentava como principais integrantes Mikhail Bakhtin, Valentin Voloshinov e Pavel Medvedev. O círculo bakhtiniano tinha em vista dois grandes projetos intelectuais, o primeiro deles encontrava-se sob o vislumbre particular de Bakhtin que consistia na elaboração de uma “prima philosophia” e o segundo explícito nos escritos de Voloshinov e Medvedv seria contribuir para construção da teoria das manifestações da superestrutura, vocábulo conceitual marxista.

A “prima philosophia” se configuraria como um processo de reflexão filosófico amplo e que consideraria o “ser-como-evento” único, ultrapassando o que Bakhtin denomina de teoreticismo, que é a objetivação da historicidade vivida oriunda dos processos de abstração típicos da razão teórica. Essa postura crítica a razão teórica, encontrada principalmente em seus primeiros textos: Para uma filosofia do ato e O autor e o herói na atividade estética, esta pautada em alguns aspectos resultantes das reflexões do círculo, no que diz respeito à concepção de linguagem do grupo, entre esses aspectos destacam-se:

A questão da unicidade do ser e eventicidade do ser; O tema da contraposição eu/outro; O componente axiológico intrínseco ao existir humano.

Outro ponto relevante e curioso da obra de Faraco (2006) é abordagem da temática do posicionamento politico-ideológico assumido pelos participantes do círculo em suas respectivas obras. Ele relata que todas as informações a disposição dos pesquisadores apontam para um desvinculamento por parte de Bakhtin do pensar marxista, fato não encontrado nas obras de Voloshinov e Medvedev, onde a postura é de uma abordagem embasada em temáticas claramente de ordem marxista.

Page 2: Carlos Alberto Faraco

É destacado pelo autor (2006) no texto o fato da linguagem assumir um papel cada vez mais importante nos debates do grupo, o que antes aparecia esporadicamente com tempo passou a ser um ponto recorrente e fundamental a ser tratado em todos os assuntos discutidos pelos integrantes, esse fato é chamado de Virada Linguística. É notório o fato de a linguagem aparecer com maior destaque nos escritos de Voloshiniov, mais precisamente os da segunda metade da década de 1920, mas acaba espraiando-se pelos escritos dos demais intelectuais do círculo, principalmente nos textos de Mikhail Bakhtin.

O questionamento exposto por Faraco em torno do papel assumido e consequentemente o caráter das pesquisas desenvolvidas pelos integrantes do círculo de Bakhtin é um ponto chave no texto, onde o questionamento é: Filósofos ou cientistas? O autor deixa claro que a maneira como ele encara os estudos do grupo é de reconhecer esses enquanto pensamento de caráter “eminentemente filosófico e não propriamente científico”. Essa postura é facilmente explica em face da revelação de outros textos da autoria de Bakhtin na década de 1920 e que deixam claro o seu pensamento mais preocupado com questões filosóficas mais amplas do que propriamente com questões de ordem linguista, fora o fato de o próprio Bakhtin se entender como um filósofo.

No último paragrafo, Faraco (2006) fala sobre o vínculo de Bakhtin a um pensamento que distingue ciências naturais e ciências humanas, vínculo este decorrente da leitura crítica de trabalhos de Wilhelm Dilthey, grande pensador alemão do final do século XX e início do XXI. Essa divisão entre ciências naturais e humanas é a relação estabelecida por parte delas com o objeto de estudo, isto é, uma relação monológica nas ciências naturais onde o sujeito é mudo, pois são fenômenos naturais (sujeito/objeto mudo) e uma relação dialógica nas ciências humanas devido ao objeto ser um texto, a expressão de alguém (sujeito/sujeito).

Encerrado o texto de Faraco, fica evidente o tom expositivo esclarecedor que sua obra possui, perfeitamente indicado a estudos introdutórios ao mundo das ideias de Mikhail Bakhtin e de seu círculo. A escrita tem pouca profundidade em assuntos específicos do pensamento bakhtiniano, mas visando um primeiro contato com esse pensar é uma obra adequada e que apresenta em seu corpo textual algumas referências de obras aos que pretendem dar prosseguimento na leitura desse pensar, tanto de integrantes do círculo como de estudiosos de suas obras, incluindo pesquisadores contemporâneos.