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BOAS PRÁTICAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA AGRICULTURA FAMILIAR Exemplos de ações educativas e práticas sustentáveis no campo brasileiro rie EducAtiva

CARTILHA PEAAF Final Kz corrigido · Agroecologia e Conservação: Frutificando no Assentamento 102 Revitalização Ecossocial do Cerrado 111 Assentamento Sustentável Recupera Nascentes

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  • BOAS PRÁTICASEM EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA AGRICULTURA FAMILIAR

    Exemplos de ações educativase práticas sustentáveis no

    campo brasileiro

    Série EducAtiva

  • República Federativa do BrasilPresidenta: Dilma RousseffVice-Presidente: Michel Temer

    Ministério do Meio AmbienteMinistra: Izabella TeixeiraSecretário Executivo: Francisco Gaetani

    Secretária de Articulação Institucional e Cidadania AmbientalSecretária: Samyra CrespoChefe de Gabinete: Aldenir Paraguassú

    Departamento de Educação AmbientalDiretor: Nilo Sérgio de Melo DinizGerente de Projetos: Renata Maranhão (José Luis Neves Xavier - Substituto)

    Endereço do EditorMinistério do Meio Ambiente, Secretária de Articulação Institucional e Cidadania AmbientalDepartamento de Educação AmbientalEsplanada dos Ministérios – Bloco B, sala 95370068-900 – Brasília – DFTel: 55 61 2028.1207 Fax: 55 61 2028.1757

    Centro de Informação e Documentação Ambiental – CID AmbientalSEPN 505 Norte – Bloco B - Edifício Marie Prendi Cruz70730-542 – Brasília – DFTel: 55 61 2028.2184e-mail: [email protected]

    Iza Antunes Araujo - CRB1/079

    B823b Brasil. Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Articulação Institucional e Cidadania Ambiental.Boas práticas em educação ambiental na agricultura familiar: exemplos de ações educativas e práticas

    sustentáveis no campo brasileiro / organizado por Adriana de Magalhães Chaves e Ana Luiza Teixeira de Campos. – Brasília :

    MMA, Departamento de Educação Ambiental, 2012.244p. ; il. ; color ; (Série EducAtiva; v, 1)

    ISBN: 978 85 7738 173-9

    1. Agricultura familiar, Brasil. 2. Educação ambiental, Brasil. I. Chaves, Adriana de Magalhães (org.). II. Cam-pos, Ana Luiza Teixeira (org.). III. Programa de Educação Ambiental e Agricultura Familiar. IV. Série V. Título.

    CDU: 631 (81)CDD: 630.981

  • Ministério do Meio AmbienteSecretaria de Articulação Institucional e Cidadania Ambiental

    Departamento de Educação Ambiental

    BOAS PRÁTICASEM EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA AGRICULTURA FAMILIAR

    Exemplos de ações educativas e práticas sustentáveis no campo brasileiro

    Série EducAtiva

    Brasília2012

  • BOAS PRÁTICAS

    Equipe Técnica do Programa de Educação Ambiental e Agricultura Familiar – PEAAFAdriana de Magalhães Chaves Martins – CoordenadoraAida Maria Farias da SilvaAlex Barroso BernalAna Luísa Teixeira de CamposThiago Fernando Nascimento Baracho Martins – Estagiário de Jornalismo

    Comissão de Seleção das ExperiênciasAdalcira Santos Bezerra - GT PEAAF/SRHUAdriana de Magalhães Chaves Martins – DEA/PEAAFAida Maria Farias da Silva - DEA/PEAAFAlex Barroso Bernal - DEA/PEAAFAna Luísa Teixeira de Campos – DEA/PEAAFÂngela Paiva de Oliveira - GT PEAAF/SMCQCláudio Rodrigues dos Santos – GT PEAAF/SEDRFranciene Martins Araújo - GT PEAAF/SEDRLarissa Alves da Silva Rosa - GT PEAAF/SRHU

    Organização e Editoração TécnicaAdriana de Magalhães Chaves MartinsAna Luísa Teixeira de Campos

    RevisãoAna Luísa Teixeira de CamposNilo Sérgio de Melo DinizJosé Luis Neves XavierAlex Barroso Bernal

    SupervisãoNilo Sérgio de Melo Diniz

    Diagramação e ImpressãoGráfica e Editora Movimento

    O conteúdo das informações e as ideias apresentadas nos relatos das experiências são de responsabilidade de seus orga-nizadores e não expressam, necessariamente, posicionamentos do MMA.Os créditos de fotos e referências bibliográficas são de responsabilidade de seus organizadores, que foram previamente e formalmente consultados.

  • Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Prefácio

    Caminhos para a sustentabilidade no Campo

    A Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20, foi um ponto de infl exão, um marco no entendimento mundial pela busca do crescimento econômico, associado ao combate à pobreza e à preservação dos recursos naturais. É uma nova visão que agora tem o desafi o de produzir uma agenda que norteará os debates em torno do desenvolvimento e do meio ambiente para os próximos 20 anos.

    O Brasil consolidou na conferência o seu protagonismo nas questões ambientais. O mundo nos vê com grande expectativa, o que é compreensível. No território brasileiro há mais de 12% das reservas de água doce do planeta, quase 50% da cobertura vegetal intacta e algo em torno de 15% de toda a biodiver-sidade conhecida. Ao mesmo tempo, estamos entre os maiores produtores de alimentos do mundo. Isso nos dá plenas condições para liderar o debate em torno da economia com sustentabilidade. No exterior, já somos vistos como exemplos de soluções equilibradas pela melhoria da qualidade de vida, distribuição de renda e preservação ambiental.

    O mundo terá que enfrentar o desafi o de alimentar 9 bilhões de pessoas nos próximos 30 anos, segundo estimativas da ONU. Essa tarefa dá a dimensão da importância que o setor agrícola tem para as estratégias globais de segurança alimentar. A produção agrícola de grãos e o rebanho brasileiro garantem o nosso equilíbrio comercial mas é na agricultura familiar que a nação garante a sua segurança alimentar. Mais de 70% de todos os alimentos à mesa, no campo e nas cidades, vêm desse setor, que detém apenas 24,3% das áreas agrícolas. É por isso que nossas políticas públicas têm priorizado os pequenos produtores, dando acesso ao crédito e ao mercado, com programas de compras preferenciais e assistência técnica.

    A agricultura familiar, representada pelos seus movimentos sociais, tem sido interlocutora privile-giada do Ministério do Meio Ambiente. Antes, durante e depois da discussão em torno do novo Código Florestal, o Governo tem dado especial atenção as suas demandas legítimas. Virada esta página, a parceria seguirá, com a implantação do Cadastro Ambiental Rural e do Programa de Recuperação Ambiental, duas medidas da maior importância para que se conheça o campo e se recupere 25 milhões de hectares de áreas degradadas. É isso que vai garantir água em quantidade e qualidade para o campo e para a cidade, além de preservar nossa fauna e fl ora.

    O MMA já está implementando a Política Nacional de Agroecologia e Agricultura Orgânica, bem como o Programa de Educação Ambiental e Agricultura Familiar (PEAAF). O objetivo é levar assistência

  • técnica e promover ações de educação, recuperação e regularização ambiental que melhorem e ampliem a base da agricultura agroecológica no Brasil.

    A Chamada Pública de Boas Práticas em Educação Ambiental na Agricultura Familiar reúne, nesta publicação, uma mostra relevante de iniciativas locais inovadoras para a sustentabilidade, com justiça social e ambiental no campo. São práticas que melhoram a qualidade de vida de centenas de famílias e dezenas de comunidades locais de agricultoras e agricultores. São experiências que geram trabalho e renda, agregam valor à produção, com difusão de tecnologias sociais e educação ambiental. Sindicatos, movimentos sociais do campo, conselhos municipais, órgãos públicos federais, estaduais e municipais, empresas, universidades e órgãos de extensão e de pesquisa demonstram a riqueza e a vitalidade do povo brasileiro. Exemplos de inovação e criatividade como esses ampliam o repertório de soluções sustentáveis para o País e consolidam a posição do Brasil entre as demais nações.

    Izabella TeixeiraMinistra do Meio Ambiente

  • Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Apresentação

    O mais importante e bonito do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais,

    mas que elas vão sempre mudando.Guimarães Rosa

    Buscando Inspiração no Campo

    O Programa de Educação Ambiental e Agricultura Familiar (PEAAF), instituído pela Portaria do MMA N° 169, de 23 de maio de 2012, reúne neste livro 25 experiências de produção familiar, em busca de sustentabilidade social e ambiental nos campos e florestas do Brasil. A educação (educare, educere) tem o propósito de “conduzir para fora”, ou seja, levar o indivíduo de um ponto a outro, aproveitando também as suas próprias potencialidades. Nessas experiências, jovens, mulheres e homens se encontram ensinando, aprendendo e realizando iniciativas orientadas por novos e antigos conhecimentos. O sentido é construir uma maneira diferente de uso da terra e de outros recursos associados. Um jeito de conduzir a atividade agrícola por caminhos alternativos ao modelo dominante, contribuindo para reverter o êxodo rural, princi-palmente entre jovens. É como se gritassem aos jovens que tomam o rumo da cidade: “ei, você aí, há uma esperança, uma novidade, a vida aqui pode ser sustentável e interessante!”

    Esse movimento de valorização do campo e de seus lavradores passa pela ideia contemporânea de uma economia rural sustentável e a síntese que pode compreender entre conhecimento tradicional, acadêmico, e tecnologia apropriada e avançada. Muito disso se vê aqui nas experiências de construção participativa com diálogo entre saberes de gestores, extensionistas, pesquisadores, famílias agricultoras e populações locais; nas propostas de agroecologia e produção orgânica; na recuperação das áreas de Pre-servação Permanente; nas estratégias para o licenciamento ambiental de assentamentos; na geração de renda, com inclusão social de jovens e mulheres; nas tecnologias sociais. Tudo isso propicia melhoria das condições de vida, mas, sobretudo, eleva a autoestima das pessoas envolvidas.

    Trata-se de um mosaico de práticas com expressivo potencial de sensibilização, mobilização e transformação, graças também à sinergia observada entre educação ambiental e agricultura familiar. Por meio de estratégias educativas, as vezes educomunicativas, diferentes atores sociais agem sobre o seu ter-ritório, diagnosticando e identificando possibilidades, limitações e soluções. São inúmeras ações, progra-mas e instrumentos de educação e gestão pública criados e implementados com o objetivo de promover sustentabilidade, cidadania, consciência e ética socioambiental.

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    BOAS PRÁTICAS

    A equipe do DEA e integrantes do Grupo de Trabalho do PEAAF procuraram manter, na edição do texto e das imagens, a identidade e a especificidade de cada iniciativa relatada, oferecendo apenas um conceito de organização, diagramação e tratamento de texto que proporcionasse alguma fluência, capaz de minimizar a narrativa técnica dos relatórios. Para quem leu e examinou bem todas as experiências, fica evidente que esse material pode e deve contribuir para acender a luz interior do verdadeiro motor do (des)envolvimento socioambiental: o ser humano. Tenhamos uma boa leitura, uma boa inspiração!

    Nilo Sérgio de Melo DinizDiretor de Educação Ambiental/SAIC

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Índice

    Introdução 11A Metodologia da Chamada Pública 15O Processo de Seleção das Experiências Recebidas 16

    Bioma Amazônia 19Projeto Tarumã Vida: Uma Outra Amazônia é Possível 22Mochila do Educador Ambiental na Floresta Acreana 32Conservação e Uso Sustentável da Sociobiodiversidade 39

    Bioma Caatinga 50Transformações de Olhares e Paisagens do Semiárido Nordestino 53Biodiversidade e Geração de Renda com o Jaborandi 62Produção de Fitoterápicos e Fitocosméticos no Bioma Caatinga 71Educação e Agricultura Sustentável: Valorizando os Saberes do Campo 77Educação e Convivência no Sertão do Pajeú 83

    Bioma Cerrado 91Manejo Integrado do Rio das Pedras 94Agroecologia e Conservação: Frutificando no Assentamento 102Revitalização Ecossocial do Cerrado 111Assentamento Sustentável Recupera Nascentes e Cerrado 119Agroecologia e Gestão Social na Agricultura Familiar 127

    Bioma Marinho 135Mulheres de Corpo e Alga 138

    Bioma Mata Atlântica 146União dos Gêneros: Aprendizados da Boa Convivência 149Educação e Manejo da Terra: Roda de Conversa em Assentamentos de Santa Catarina 158

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    BOAS PRÁTICAS

    Educação para a Agricultura Orgânica em Áreas de Proteção Ambiental de São Paulo 166Briquete, a Lenha que Brota do Lixo 173Universidade e Escolas Rurais: Uma Interação Possível 180Extensão Inovadora e Agroecologia com Pequenos Produtores Rurais 186Macroeducação: Metodologia para a Educação e o Desenvolvimento Sustentável 197Educação, Trabalho e Convivência na Recuperação do Rio Pequeno 206Resolução de Conflito de Uso de Áreas de Preservação Permanente em Pequenas Propriedades 215Saúde Ambiental no Campo e na Floresta 222Viva Ciranda: Turismo Pedagógico no Cotidiano Rural 230

    Referências - Textos Iniciais e dos Biomas 238 Lista de Sigla 241

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Introdução

    Um dos maiores desafios do país em direção à sustentabilidade socioambiental é a mudança do paradigma atual de produção e consumo que pressiona de forma exacerbada os recursos naturais. A di-nâmica do desenvolvimento econômico está fundamentada na pressão sobre os ecossistemas naturais e agroecossistemas, causando degradação de solos, de áreas agrícolas, de microbacias hidrográficas, de Áreas de Preservação Permanente, de florestas, rios e mares, aumentando a pobreza no meio rural e pro-movendo a exclusão social.

    As instituições de ensino, pesquisa e extensão rural têm atribuições centrais para efetivar essa mu-dança de paradigma. Nessa direção, o maior desafio é a construção de um processo de desenvolvimento em bases sustentáveis e a geração de referências concretas sobre estratégias que fortaleçam a organização dos agricultores e agricultoras, a melhoria dos processos de produção e do manejo dos recursos naturais e a viabilização de sua inserção no mercado (XAVIER et al., 2007).

    Nesta busca pelo desenvolvimento sustentável se destacam dois vértices fundamentais de atua-ção: o da tecnologia, quer seja produto da academia ou de práticas sociais, e o da educação. As práticas de preservação e conservação devem integrar o processo educacional e o(a) educador(a) deve proporcionar interações e trocas de saberes com o educando, permitindo a manutenção ou o resgate da sua dignidade, seu empoderamento e seu sentimento de pertencimento que propulsiona as integrações sociais e a busca de soluções para as dificuldades e injustiças existentes no meio rural.

    A agricultura familiar, enquanto segmento produtivo e social, é uma importante aliada na imple-mentação do desenvolvimento rural sustentável. Tem como potencialidade o fato de ser um componente essencial tanto para o abastecimento interno e a segurança alimentar brasileira, como para a ocupação e oferta de trabalho no meio rural, atenuando o êxodo para as cidades. Atualmente o segmento patronal já é superado pelo familiar em produtos importantes como mandioca, feijão, suínos, aves e leite.

    A agricultura familiar representa uma alternativa importante para a manutenção da biodiversida-de e incremento à sustentabilidade. Isso se dá porque o modelo baseado na produção familiar tende a utilizar, de forma mais racional, os insumos produtivos e por isso é o que pode melhor atender às pressões sociais, que têm aumentado no mundo inteiro, no sentido de uma maior preservação e conservação do ambiente (PINHEIRO, 1992).

    No entanto, para que esta potencialidade se transforme de fato em ações que visam à sustentabi-lidade, deve-se buscar e implementar práticas educativas e projetos socioambientais que estimulem não apenas a troca de técnicas de produção, mas a transformação do conjunto de relações sociais e produtivas existentes no campo e na floresta.

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    BOAS PRÁTICAS

    Ao longo da história da humanidade, a agricultura sempre influenciou e foi influenciada por mu-danças políticas, sociais e culturais. Em vista disso, verifica-se a necessidade de governo e sociedade atu-arem em conjunto, seja nas esferas federal, estadual ou municipal, no sentido de responder à grande demanda socioambiental existente, para o desenvolvimento e incentivo a programas, projetos e ações de educação ambiental e agricultura familiar.

    O Programa de Educação Ambiental e Agricultura Familiar (PEAAF), instituído pela Portaria MMA nº 169, de 23 de maio de 2012 (MMA, 2012a), foi elaborado especificamente para o público envolvido neste segmento da atividade agrícola. Por meio do desenvolvimento de ações educativas, busca-se a construção coletiva de estratégias para o enfrentamento da problemática rural. Sua implementação ocorre por meio do conjunto de instituições governamentais e não governamentais, com vistas à adoção de práticas sustentáveis na agricultura familiar e no manejo dos territórios rurais tradicionais, visando o Desenvolvimento Rural Sustentável (MMA, 2012b).

    O PEAAF, por meio da Chamada Pública para Seleção de Boas Práticas em Educação Ambiental na Agricultura Familiar (MMA, 2012c), se incumbiu da missão de reunir informações de experiências brasilei-ras na temática. Os resultados desta chamada têm como objetivo iniciar um banco de dados de experi-ências que possam inspirar a produção e aperfeiçoamento de ações semelhantes, que apoiem a reflexão sobre métodos, temáticas e conteúdos para oficinas, publicações, cursos presenciais e à distância, procu-rando atender às demandas e as tendências observadas nessas iniciativas locais.

    Essas experiências de Educação Ambiental na Agricultura Familiar advindas de todo o Brasil co-laboram, desta forma, para a construção de Políticas Públicas mais democráticas. A educação ambiental assume um importante papel político ao impulsionar as mudanças de compreensão e de comportamento necessárias à sociedade, motivando a reflexão sobre as atitudes dos indivíduos e dos grupos sociais em relação ao ambiente e à sociedade.

    O Brasil, como um país diverso, apresenta em toda a sua extensão culturas e ecossistemas muito distintos uns dos outros. As idiossincrasias dos povos de cada região agregam a esta publicação uma ri-queza de saberes e conteúdos originados em experiências locais, focadas na educação ambiental (EA).

    Não obstante as diversidades dos biomas serem tão explícitas, as cinquenta e sete experiências enviadas por empresas, universidades, órgãos de ATER, centros de pesquisa, ONGs, escolas, Secretarias de Meio Ambiente, fundações, entre outros, compartilham a mesma necessidade: de equacionar os proble-mas socioambientais.

    Elas relatam diferentes tipos de impactos sobre o ambiente,como por exemplo, assoreamento e poluição de recursos hídricos no Piauí; problemas na destinação de resíduos sólidos em Pernambuco; desmatamento no Ceará; extrativismo predatório no Amazonas; forte antropização no cerrado de Minas

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Gerais. Todos estes e outros impactos estão interligados, são sinérgicos e relacionados a problemas socio-econômicos. Dificuldade de comercialização, falta de pesquisas, de materiais didáticos, de capacitação, de segurança alimentar, entre outros, também impulsionam a implementação desses projetos de EA com agricultores e agricultoras.

    As experiências buscaram diagnosticar a problemática socioambiental local e aproveitar as poten-cialidades de cada região, como a rica biodiversidade com potencial de exploração sustentável, a possibi-lidade de implementação de turismo ecológico, de práticas artesanais e agroindustriais.

    Os aspectos que se repetem em todas as experiências e que podem levar a uma generalização do método são: a presença de um diagnóstico inicial; a utilização de metodologia participativa; processos de sensibilização e mobilização; envolvimento comunitário; formação de parcerias; reflexão a partir da reali-dade socioambiental vivenciada; uso de tecnologias acessíveis e presença de soluções adaptáveis.

    Buscando mapear as boas experiências do país, o edital contemplou diversos temas e categorias. Estas se referem aos sete biomas1 brasileiros: Caatinga, Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado, Pampa, Pan-tanal e Bioma Marinho. Neste edital foram sugeridos dezessete temas com possibilidade de criação de outros afins. Nas experiências recebidas, foram contemplados os temas apresentados na tabela a seguir.

    1 Classificação empregada pelo ICMBio.

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    BOAS PRÁTICAS

    Tabela 1. Temas contemplados na Seleção de Boas Práticas em EA na Agricultura Familiar

    EA nas Escolas Rurais

    EA na Prevenção e Controle de Incêndio ou no uso indevido de fogo na produção agrícola

    EA para a Geração de Renda, Produção Sustentável ou Uso de Tecnologias Sociais

    EA em Comunidades Extrativistas

    EA no Manejo de Resíduos Sólidos

    EA na Recuperação ou Preservação de APP ou Reserva Legal e no Manejo dos Recursos Hídricos

    EA com foco em Gênero

    EA na Prevenção e na Resolução de Conflitos Socioambientais

    EA na Reforma Agrária

    EA para a Manutenção da Biodiversidade e Apoio às Unidades de Conservação, Patrimônio Histórico e Cultural

    EA para o Comércio Justo e Solidário

    EA e Agricultura nas Escolas Urbanas e Reciclagem

    EA no Bioma Mata Atlântica

    Saúde Ambiental para Populações do Campo

    Entre todas as experiências encaminhadas a esta seleção, não houve projetos referentes ao bioma Pantanal. Apenas um projeto fazia referência ao Bioma Pampa, que não foi selecionado por meio dos cri-térios utilizados. Desta forma, as experiências selecionadas, para esta publicação, abrangem cinco biomas: Amazônia, Caatinga, Cerrado, Marinho e Mata Atlântica.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    A Metodologia da Chamada Pública

    Observar a aprendizagem contida em projetos participativos de educação popular e intervenção social é fundamental para a formulação e o aperfeiçoamento das políticas públicas. Para tanto, é neces-sário valorizar e registrar essas ações educativas, que podem resultar em subsídios valiosos para futuras intervenções.

    Neste caso, quando se fala de sistematização de experiências, refere-se a casos concretos, com uma riqueza de elementos, valores e crenças acumulados. Esses casos representam processos inéditos e que não podem se repetir em todas as suas condicionantes, por isso precisam ser compreendidos na sua essência para extrair seus ensinamentos. A sistematização se faz pela reconstrução e análise dos fatos vividos, transformando-os em objeto de estudo. (HOLLIDAY, 2006; ECKERT, 2009; SIMON, 2012).

    Sistematizar possibilita uma compreensão aprofundada da vivência, com o objetivo de melhorar a própria prática. Visa superar o agir sem pensar, a perda do significado da ação, constituindo-se em um bom instrumento para melhorar as formas de intervenção. O processo de sistematização permite pen-sar sobre o que se faz e agir de forma pensada (HOLLIDAY, 2006; ECKERT, 2009; SIMON, 2012).

    Para sistematizar é preciso definir sobre qual aprendizado se quer obter. Deve haver registros como fotos e material que comprove a memória dos acontecimentos. É importante reunir informações de diferentes fases que definam a situação inicial da experiência (o problema), a evolução do processo (como se concretizou) e a situação final a que se chegou, e analisar esses marcos temporais, verificando o que colaborou e o que dificultou o desenvolvimento de cada etapa. Extrair os principais aprendizados e concluir sobre o que aumenta a qualidade das ações (HOLLIDAY, 2006; ECKERT, 2009).

    Tornar a experiência pública e compartilhar seus resultados faz parte do método. Sistematizar requer um esforço que deve ser compensador e merece ser socializado porque promove uma troca de saberes muito relevante, com valor vivencial. Os resultados divergentes contribuem tanto quanto os que se assemelham. A linguagem deve ser simples e objetiva, com textos rápidos e se possível ilustra-dos. Um conjunto de experiências sistematizadas pode gerar reflexões para outro nível de atuação e apontar caminhos para ações estruturantes a partir das práticas locais (HOLLIDAY, 2006; ECKERT, 2009).

    Esta Chamada Pública busca refletir sobre os processos educacionais, com vistas a postular uma nova forma de fazer e aplicar políticas públicas participativas.

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    BOAS PRÁTICAS

    O Processo de Seleção das Experiências Recebidas

    O processo de seleção das melhores experiências envolveu uma Comissão de Seleção Intersetorial do Ministério do Meio Ambiente indicada pelo Grupo de Trabalho do PEAAF (GT PEAAF), instituído pela Portaria MMA no 169, de 23 de maio de 2012 (MMA, 2012a). Esta Comissão incluiu especialistas e analistas ambientais da Secretaria de Articulação Institucional e Cidadania Ambiental (SAIC), da Secretaria de Extra-tivismo e Desenvolvimento Rural Sustentável (SEDR), da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urba-no (SRHU) e da Secretaria de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental (SMCQ), formando uma equipe multidisciplinar2. Esse processo culminou na aprovação para publicação de vinte e cinco experiências, sendo que sete entre estas, as primeiras a serem apresentadas em cada capítulo deste livro, se destacaram como referências dos biomas.

    Como critérios eliminatórios estavam a obrigatoriedade de apresentar a documentação necessá-ria em data prevista; um diálogo coerente entre o conteúdo e a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA)3; a efetiva implementação da experiência com demonstração quantitativa e/ou qualitativa dos re-sultados; o uso de práticas pedagógicas participativas e a continuidade dos processos educativos vincu-lados à agricultura familiar.

    Para a etapa de classificação analisou-se a qualidade dos projetos, pontuando com zero, meio ou um ponto os seguintes critérios: demonstração de resultados (quantitativo ou qualitativo); participação ativa dos sujeitos dentro do processo; participação dos sujeitos nas diferentes etapas do processo e em diversos momentos da aprendizagem; presença de soluções criativas para os problemas identificados; me-todologia de fácil assimilação e aplicação; acesso aos recursos para a implementação do projeto, com dis-ponibilidade local/regional; adaptabilidade a diferentes realidades; abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais; vinculação do conteúdo à ética, à educação, ao trabalho e às práticas sociais; promoção de um processo educativo crítico, politizante e reflexivo; presença de ações de continuidade do projeto; publicação dos resultados; articulação com políticas públicas; qualidade do texto; organização do documento e comprovação de materiais e ações produzidas.

    Esses critérios permitiram à comissão identificar se houve participação do agricultor familiar em diferentes etapas dos projetos, quais sejam, na construção do projeto educativo, na sua execução ou im-

    2 Composta por profissionais das áreas de geografia, biologia, agronomia, ciências sociais e oceanografia; licenciados; pós-graduados em desenvolvimento rural sustentável, agroecologia, educação e educação ambiental, botânica, gestão pública e ambiental; com vasta experiência em extensão rural, agricultura orgânica, educação ambiental, articulação, mobilização e organização socioambiental, regularização fundiária, revitalização de microbacias hidrográficas, capacitação e qualificação profissional, energias renováveis, licenciamento ambiental e vivência nas regiões Centro-oeste, Nordeste, Norte e Sudeste.3 Lei nº 9.795 de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências (BRASIL, 1999).

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    plementação e na continuidade ou desdobramentos do mesmo; verificar se houve inovação na busca por soluções para os desafios apresentados e finalmente, se as condições de replicabilidade da experiência eram facilitadas por metodologias e recursos adaptáveis à realidade dos agricultores familiares de diferen-tes localidades.

    A consonância dos projetos com a PNEA foi determinante para a classificação das experiências. Avaliou-se o diálogo entre os conteúdos e a política, verificando-se a amplitude da abordagem das ques-tões ambientais e sua articulação e impactos em níveis micro e macro regionais. Discutiu-se o potencial de fortalecimento da consciência crítica dos indivíduos e da compreensão holística do ambiente, o qual, segundo a PNEA, envolve aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, cien-tíficos, culturais e éticos. As experiências em maior conformidade com os princípios básicos e objetivos fundamentais da PNEA receberam destaque e apresentaram estrutura metodológica imbuída de pesquisa participativa e desenvolvimento de ações sustentáveis, colaborativas com o meio rural.

    A sustentabilidade do projeto também foi analisada com observância de ações de continuidade e desdobramentos, divulgação de resultados e articulação com políticas públicas que incorporem a dimen-são ambiental. Além da pontuação da tabela classificatória, observações sobre aspectos relevantes e inte-ressantes dos projetos foram realizadas por cada avaliador, para fins de desempate. Ao final, foi realizada uma editoração técnica dos textos com a finalidade de harmonizá-los para a publicação.

    Cinquenta e sete experiências provenientes das cinco regiões4 brasileiras foram avaliadas e pôde--se perceber o comprometimento de empresas, institutos e secretarias de governo, fundações, associa-ções, centros de desenvolvimento e ONGs com a educação ambiental. O empenho dos agentes de insti-tuições governamentais e não governamentais é essencial no sentido de responder à grande demanda socioambiental existente, buscando fortalecer o papel do agricultor familiar como agente estratégico de desenvolvimento.

    O objetivo da publicação das experiências é difundir as boas práticas em educação ambiental na agricultura familiar. A disseminação dessas informações colabora para dar visibilidade e valorização aos conhecimentos e princípios que convergem para uma agricultura familiar socialmente justa, economica-mente viável, ecologicamente sustentável e que agrega saberes populares e tradicionais.

    Além de trazer esses conhecimentos, a publicação estabelece parcerias entre os responsáveis pe-los projetos e o Governo Federal, que promoverá a divulgação para fins educacionais. Estas parcerias tam-bém promovem um estreitamento das relações entre Governo, agricultor familiar, centros de pesquisa, ensino e extensão. Tais relações auxiliam o despertar do educador ambiental no próprio agricultor.

    4 Norte, Nordeste, Centro-oeste, Sudeste e Sul.

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    BOAS PRÁTICAS

    Para a educação ambiental, a difusão dessas boas práticas segue os caminhos da transição do mode-lo convencional de produção para um outro sustentável. Projetos voltados para o atendimento às deman-das do meio rural utilizam e resultam em tecnologias de produção e organização social, já implantadas em diversas regiões e favorecem a sustentabilidade.

    Os resultados das experiências são palpáveis, explicitam o empoderamento da população, ge-ração de trabalho e melhoria na renda das famílias com o beneficiamento da produção e potenciali-zação de recursos locais. Nos projetos foram demonstradas práticas de recuperação de áreas intensa-mente exploradas; capacitação de agricultores com técnicas de manejo sustentável; uso racional de recursos naturais; esclarecimento de aspectos relativos à legislação ambiental; integração da pesqui-sa com o ensino e a extensão; articulação entre diferentes políticas públicas; criação de programas; desenvolvimento de metodologias, currículos e materiais didáticos; valorização e fortalecimentos de redes sociais; desenvolvimento de tecnologias; geração de renda; valorização e resgate de conheci-mentos; fortalecimento da autoestima; promoção da segurança alimentar; colaborações para a dimi-nuição do êxodo rural entre outros resultados obtidos.

    Dentre as reivindicações dos movimentos de agricultores familiares ao Governo Federal estão a demanda por escolas de qualidade e o apoio para a produção de alimentos saudáveis. Tais aspectos são condicionantes para a permanência do agricultor no campo e manutenção de parcela significativa de pro-dutos na mesa do brasileiro. A educação ambiental permeia estas demandas assumindo um papel de alia-da e instrumento. A publicação das experiências mostra diferentes maneiras de fazer educação ambiental com os agricultores familiares.

    Programas como o PEAAF de apoio à agricultura familiar e ao sistema produtivo camponês esti-mulam os agricultores(as) a caminhar por um processo de educação emancipatória. Desta forma, pode-se fomentar o pensamento crítico já existente entre esses trabalhadores, contribuindo com a identificação de seus obstáculos e a busca de soluções próprias, referenciadas na agroecologia e nas práticas produtivas sustentáveis, considerando a interdependência dos meios natural, socioeconômico e cultural, conforme a PNEA. Munidos destas ferramentas e da disseminação de experiências como essas, alvo do “Edital de Boas Práticas de EA na Agricultura Familiar”, cada vez mais os agricultores podem produzir alimentos saudáveis em escala, para o bem estar de todo o povo brasileiro.

    Equipe Técnica do PEAAF

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Bioma Amazônia“

    “Quebrar a política assistencialista é um dos grandes desafios, fundamental para o sucesso de um projeto de intervenção”.

    (Conservação e Uso Sustentável da Sociobiodiversidade)

    Implantação de área de SAF. Propriedade de José A. C. Filho.Comunidade Pagodão, 2012. Foto: Mariana Semeghini

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    BOAS PRÁTICAS

    Bioma Amazônia

    A Região Amazônica compreende 4.196.943 quilômetros quadrados, equivalentes a 49,29% do terri-tório brasileiro. Abriga a maior biodiversidade do planeta e pelo menos 20% de toda a água doce da super-fície terrestre. A Amazônia Legal integra nove estados: Amazonas, Acre, Amapá, Pará, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Maranhão e Tocantins. A grandeza do bioma pode ser percebida por sua vasta biodiversi-dade, com inúmeras espécies da fauna e da flora, milhares delas ainda não identificadas. Essa diversidade biológica soma mais de 40 mil espécies de plantas, 300 espécies de mamíferos, 1,3 mil espécies de aves e de 3 mil a 9 mil espécies de peixes (ICMBIO, 2012a).

    Por sua grandiosidade e diversidade de ecossistemas, desde florestas fechadas de terra firme a vár-zeas ribeirinhas, campos e igarapés, o bioma tem sido palco de disputas de terras entre grileiros, fazendei-ros, nativos, governos, indústrias nacionais e internacionais. Espécies arbóreas de madeiras nobres como o mogno e o pau-brasil tornaram-se foco da cobiça de setores da indústria madeireira que promovem seu extrativismo de forma predatória (ENVOLVERDE, 2011). Além disso, o modelo tradicional de ocupação da Amazônia tem levado ao aumento do desmatamento na região, sendo este um fenômeno bastante complexo, que não pode ser atribuído a um único fator (ALENCAR et al., 2004).

    Apesar da importante queda dos índices de desmatamento, desde 2005 (INPE, 2012), a especula-ção de terras ao longo das estradas, o crescimento das cidades, os incentivos fiscais para implantação de grandes áreas de pecuária, a exploração madeireira e mais recentemente a agricultura mecanizada são questões que necessitam ser tratadas urgentemente em termos de conservação e uso de recursos naturais (FEARNSIDE, 2003, ALENCAR et al., 2004 e LAURANCE et al., 2004).

    Na contramão da pressão exercida sobre esses recursos, há um esforço imensurável de ONGs am-bientalistas, instituições de pesquisas, organizações de trabalhadores, governos e até mesmo de entida-des religiosas, buscando construir alternativas, através de experiências que valorizem as práticas culturais tradicionais, transmitidas secularmente por gerações, que demonstram formas mais sustentáveis de in-teração com a natureza, em diálogo com novos métodos e técnicas apropriadas, como ocorre em muitas práticas da agricultura familiar.

    Na elaboração desta publicação, ao selecionar experiências exitosas em relação mais equilibrada com o meio ambiente, três se destacaram entre as Boas Práticas em Educação Ambiental na Agricultura Familiar do bioma Amazônico. Por meio desses projetos foi possível observar inúmeras formas e metodo-logias de educação ambiental, bem como identificar diversas categorias sociais que se envolveram num esforço ímpar de não apenas manter a floresta em pé, como também de vislumbrar formas de utilizá-la sem destruí-la, potencializando o que há de inovador e encontrando meios de melhorar a participação, a renda e a qualidade de vida das populações.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Um dos projetos desenvolveu ações num assentamento rural no Amazonas, que além de proporcio-nar um resultado mais imediato e compensador com a substituição da produção de carvão vegetal por práticas sustentáveis do cultivo de hortaliças, trabalhou a recuperação de áreas degradadas (Reserva Legal e APP) e a preservação de recursos naturais.

    No Acre, foram elaborados e reunidos materiais didáticos na Mochila do Educador, cujo objetivo é capacitar professores de escolas rurais com métodos participativos e construtivistas que estimulam a cria-tividade e a participação do educando.

    A substituição da extração predatória de madeira por alternativas como os sistemas agroflorestais foi outra experiência destacada na região, que promoveu a geração de renda agregando valor aos produ-tos e subprodutos agrícolas e florestais por meio de seu beneficiamento.

    As três experiências abrem essa publicação com o detalhamento de tecnologias sociais e metodo-logias de ensino-aprendizagem que confirmam a Educação Ambiental como um instrumento essencial à transição do sistema dominante de produção atual para um modelo produtivo mais sustentável, voltado ao bem estar das gerações contemporâneas e futuras.

    Comissão de Seleção

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    BOAS PRÁTICAS

    Projeto Tarumã Vida: Uma Outra Amazônia é Possível

    Educação Ambiental, Geração de Renda,Produção Sustentável e Tecnologia Social

    OrganizadoresJoanne Régis da Costa

    José Edison Carvalho Soares Adriana M. da Silva

    Reunião no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, 2009Foto: Jeziane Aquino

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Contexto

    Conversão Produtiva por Salubridade, Legalidade e Sustentabilidade

    A dinâmica de expansão das relações de capital e as particularidades geopolíticas na região Amazô-nica impõem aos agricultores familiares um conjunto de difi culdades para o exercício de suas atividades produtivas e para o manejo dos recursos locais. O perfi l da população rural local normalmente se caracteri-za por baixos níveis de renda e produção, e exploração extrativista predatória dos recursos naturais, o que afeta a fl oresta, a sua biodiversidade, o clima local e global, e os recursos hídricos.

    Nessa direção, o maior desafi o para as instituições de pesquisa e extensão rural é a construção de um processo de desenvolvimento em bases sustentáveis e a geração de referências concretas sobre estra-tégias que fortaleçam a organização dos agricultores, a melhoria dos processos de produção e do manejo dos recursos naturais e a viabilização de sua inserção no mercado (XAVIER et al., 2007).

    A Educação Ambiental (EA) representa uma ferramenta importante para a mudança de mentalidades e de atitudes na relação homem-ambiente (PELICIONI, 2002). Deve ser um ato político voltado para a transfor-mação social e a busca de uma perspectiva holística de ação, que relaciona o homem, a natureza e o universo, tendo em conta que os recursos naturais se esgotam e que o principal responsável pela sua degradação é o ser

    Antigo forno de carvão de Guiomar Batista. Comunidade Buriti, 2011. Fotos: Joanne Régis

    Área de hortaliças de Antonivaldo de Sousa, ex-carvoeiro, líder da ASSAGRIR, em 2011. Fotos: Joanne Régis

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    BOAS PRÁTICAS

    humano (JACOBI, 2003). De acordo com Reigota (1998), a EA aponta para propostas pedagógicas centradas na conscientização, mudança de comportamento, desenvolvimento de competências, capacidade de avaliação e participação dos educandos.

    A experiência apresentada é um trabalho vinculado aos princípios da EA, que busca a dignidade, a participação, a corresponsabilidade, a solidariedade, a equidade, a mudança de valores e o aperfeiçoamento de habilidades - conforme Pádua e Tabanez (1998) - condições básicas para estimular maior integração e har-monia dos indivíduos com o meio ambiente. Este projeto foi desenvolvido no Assentamento Tarumã-Mirim, em parceria com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (Ifam, Zona Leste) que atua com pes-quisa participativa e desenvolvimento, a fim de gerar conhecimentos e construir ações sustentáveis de forma colaborativa na zona rural de Manaus, com alta relevância ecológica e forte pressão antrópica. O objetivo é promover a conservação dos recursos naturais em Unidades de Produção Familiar, por meio da Educação Am-biental, do planejamento e do manejo agroflorestal integrado. A base do projeto está na Política Nacional de Educação Ambiental5, sendo a EA o que sustenta e orienta suas ações.

    O Assentamento Tarumã-Mirim possui 840 famílias, distribuídas em 17 comunidades, com 2.563 pes-soas, em 1.050 lotes. Dessa população, 65% é oriunda do interior do Amazonas, 22% de estados da Ama-zônia e 13% provêm de outros estados da Federação. No local há uma grande área protegida, composta por 05 áreas de Reservas Florestais. Duas Unidades de Conservação (UCs) estão inseridas no Corredor Ecológico Central da Amazônia, maior área de proteção ambiental contínua do mundo, de alta relevância ecológica e ecossistemas como as Florestas Tropical Densa, Tropical Aberta, Aluvial periodicamente inun-dada (igapó), Campinas e Campinaranas, e está inserida na microbacia do rio Negro.

    A migração para a área rural foi a alternativa encontrada pelos assentados para vencer as restrições do mercado de trabalho urbano de Manaus, com baixa remuneração de mão de obra desqualificada e um crescente custo de vida. A retirada da cobertura vegetal está relacionada à produção de carvão vegetal e lenha, exploração de madeira e prática da agropecuária. Resultados divulgados pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM) revelaram uma intensificação do desflorestamento na área de estudo, entre 1990 e 2009. A Área de Proteção Ambiental (APA) apresentava taxa de antropização de 5,51% em 1990. Em 2009 registrou uma perda de 12,91% de sua cobertura vegetal, equivalente a 6.727,14 ha. Foi identificado que o Assentamento Tarumã-Mirim ocupa 83% da área da APA, sendo responsável por 78% de todo o desflores-tamento ocorrido na Unidade de Conservação, até 2009 (NASCIMENTO; SILVA, 2010).

    O carvão produzido abastece o mercado ilegal de Manaus. Pelo menos 2 toneladas ilegais são reti-radas por semana. Crianças trabalham na atividade. O carvão é vendido para atravessadores a preços até 400% mais baixos do que em Manaus. Os trabalhadores apresentam constantes problemas de saúde. A ex-

    5 Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, que dispõe sobre a EA e institui a Política Nacional de EA no Brasil (BRASIL, 1999).

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    ploração da madeira é realizada para o consumo interno e para madeireiras, feita geralmente, sem licença ambiental. O produto tem mercado garantido, com baixa rentabilidade. Empobrece os recursos florestais e danifica as vicinais com o trânsito dos caminhões que compram as toras nas propriedades.

    As propriedades agrícolas têm baixo nível de capitalização, a produção agrícola é pequena e atende, quando muito, às necessidades da família. É comum encontrar áreas desmatadas com baixa produtividade ou abandonadas, o que leva à abertura de novas áreas de floresta primária. Perde-se a floresta, a produção agropecuária não permanece muito tempo, novas áreas são derrubadas e queimadas, não se mantém as espécies nem os serviços ambientais. Uma unidade de Produção Rural sem uma área mínima de cobertura vegetal nativa ou sem ter os recursos hídricos preservados, não pode ser considerada sustentável. Dessa forma, verificou-se a necessidade da conversão produtiva devido à insalubridade da produção de carvão vegetal, a necessidade de alimentação para autoconsumo; a possibilidade de geração de renda por meio da venda direta em feiras na capital e a necessidade do atendimento da legislação ambiental vigente.

    Desenvolvimento das Ações

    Construindo uma História de Conservação e Uso Racional

    O projeto foi iniciado em 2005, tendo como metodologia a pesquisa-ação (THIOLLENT, 1997). A equi-pe realizou reuniões, conversas, diagnósticos e cursos de capacitação com os comunitários da Comuni-dade Pau Rosa. O Diagnóstico Rural Participativo (DRP) (BUARQUE, 2002), o Diagnóstico Agroflorestal do Núcleo Agroflorestal do INPA (Leeuwen, não publicado) e o Diagnóstico & Desenho (D&D) do ICRAF foram usados para entender o funcionamento da comunidade e das áreas agrícolas, o uso do solo, limitações e potencialidades, os serviços ambientais, o manejo, a mão-de-obra, insumos, etc.

    Partiu-se da problematização e análise da realidade para chegar a propostas de alternativas. A par-ticipação dos agricultores foi estimulada em todas as fases do projeto como diagnóstico, desenho, exe-cução, monitoramento e avaliação das ações. Foram enfatizados a participação; a valorização do saber local; a elevação da autoestima; a ampliação dos conhecimentos ambientais e sua interface com a saúde. A metodologia com enfoque construtivista visou à formação de competências, mudanças de atitudes e procedimentos para a melhoria da qualidade de vida e busca pelo desenvolvimento rural sustentável.

    Na abordagem construtivista admite-se que as pessoas têm sua visão de mundo e que cada uma constrói sua história. São consideradas as relações de cooperação, aceitação mútua, valores éticos, am-bientais e humanos como base para a coexistência entre pessoas. Numa relação participativa e no exercí-

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    BOAS PRÁTICAS

    cio da cidadania, a divisão de poder e responsabilidades não ocorre de forma “induzida” e “controlada”, mas pode e deve ser construída de baixo para cima, conforme Pinheiro (1995).

    A abordagem educativa deste projeto baseou-se na Política Nacional de Meio Ambiente, que con-sidera primordial o compromisso e a responsabilidade de todos e de cada um. As comunidades optaram pela produção de hortaliças cuja demanda é alta e crescente e com preços compensadores em Manaus. A equipe em conjunto com agricultores têm realizado plantios em diferentes áreas para recuperar a Re-serva Legal, as APP e áreas alteradas para restaurar suas funções agrobiológicas. Procurou-se reverter a degradação dos recursos produtivos e aumentar a disponibilidade de madeira, de alimentos, de serviços ambientais. Buscou-se evitar a erosão e degradação dos solos, e conservar os remanescentes florestais, as espécies arbóreas de valor ecológico (proteção e alimentação à fauna), as nascentes e cursos d’água. Foram identificadas as áreas mais frágeis e passíveis de degradação, os remanescentes de matas, as áreas em conflito com a legislação ambiental, as áreas com manejos inadequados, para as quais são indicadas a substituição das atividades praticadas ou a adoção de práticas conservacionistas.

    Sessenta famílias estão diretamente envolvidas na produção de hortaliças. Estima-se que o des-matamento evitado é de, pelo menos, 90 ha de floresta/capoeira por ano, que equivale às áreas que não foram mais desmatadas. Verificou-se o abandono da produção de carvão e um aumento de 54,26% na renda dos associados da Assagrir e 28% dos associados da Comunidade Buriti com a venda de hortaliças.

    O planejamento participativo considerou o manejo agrícola, os aspectos socioeconômicos, os inte-resses das famílias, o que levou a diferentes objetivos, áreas, arranjos e manejo como: sistemas agroflo-restais em áreas ciliares, roçados de mandioca, enriquecimento de capoeiras, implantação e ampliação de pomares caseiros, monocultivos de árvores e produção de hortaliças. As espécies frutíferas e florestais cultivadas são: castanha-do-brasil, andiroba, rambotã, cupuaçu, tucumã, pupunha, café, laranja, guaraná, banana, pau rosa e ingá. A maior parte das espécies escolhidas tem importância na dieta das famílias e têm outros usos, como o medicinal, ração animal, madeira, etc. A tecnologia dispensa o emprego de agrotóxicos, de queimadas e desmatamentos. Preserva o solo, a água, reabilita áreas alteradas e permite colheitas a curto, médio e longo prazos. Promove a inclusão social e estimula a luta pelo interesse comum. As crianças, antes meninos carvoeiros, participam da execução dessas tecnologias.

    Mais de 200 agricultores de 3 comunidades participaram das rodas de conversa, cursos, seminários, visitas técnicas, dias de campo, com temas como: Educação Ambiental; Produção de Hortaliças; Associa-tivismo; Compostagem; Sistemas Agroflorestais; Serviços Ambientais; Viveiro e Produção de Sementes e Mudas; Conservação do Solo; Administração Rural; Pragas e Doenças em Hortaliças entre outros. Todos os temas foram permeados pela Educação Ambiental.

    Verificou-se que 40% dos associados da Assagrir e 47% dos associados da Comunidade Buriti pos-

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    suem mais de 50 anos. Na Comunidade Pau Rosa são 2,33 pessoas em média na atividade de hortaliças e 1,65 na Comunidade Buriti. Isto contribui para reduzir a migração para a cidade.

    A formalização jurídica da Assagrir representou maior representatividade social e tornou possível a articulação junto ao governo estadual e outros, a fim de melhorar a qualidade de vida das famílias. A participação feminina têm tido um papel fundamental no decorrer de todo o projeto e do trabalho da associação, na tomada de decisões e implementação das atividades. Elas têm estabelecido relações de solidariedade mútua, participando de mutirões, reuniões e da associação. A mulher dá importância à or-ganização coletiva que decide sobre a melhoria da qualidade de vida da família.

    A realização da I Feira de Produtos da Agricultura Familiar, organizada pela Assagrir, em setembro de 2009 foi um evento histórico no Assentamento. Em 2010 e 2011 foram realizadas novas edições. Mais de 2.000 pessoas visitaram as feiras. Em 4 anos a Assagrir recebeu mais de 400 alunos de “Associativismo” dos cursos “Técnico em Agropecuária” e “Pós-médio Florestal” do IFAM (zona leste) e técnicos de outras instituições.

    Foram ministradas palestras nas escolas do assentamento e adquiriu-se uma minibiblioteca para a principal escola local, com 300 alunos. A minibiblioteca contém informações geradas pela Embrapa e parceiros e orientações para a produção agropecuária e de alimentos com qualidade. São 120 publicações impressas, 40 programas de rádio da Embrapa ‘Prosa Rural’ e 37 vídeos do programa ‘Dia de Campo na TV’ com temas sobre: Preservação e Educação Ambiental; Cidadania; Cultivo de Hortas e Quintais; Produção de Alimentos de Qualidade; Manejo do Solo e da Água, entre outros. A escola deve realizar capacitações com os professores, aulas interativas e ações de mobilização com alunos e comunidade.

    O grupo participante do projeto se empoderou tomando posse de suas vidas pela interação com os outros, gerando pensamento crítico em relação à realidade, favorecendo a construção da capacidade pessoal e social e possibilitando a transformação de relações sociais de poder (BAQUERO, 2005). O grupo atingiu os quatro aspectos do empoderamento: 1. Cognitivo – a conscientização sobre a realidade; 2. Psi-cológico – desenvolvimento de sentimentos de autoestima e autoconfiança para a tomada de decisões; 3. Econômico – execução de atividades para gerar renda e independência econômica e 4. Político – habilida-de para analisar e mobilizar o meio social para produzir mudanças.

    O projeto realizou avaliações e atualizações para manter ou redirecionar ações. A avaliação e medi-ção de resultados por meio de indicadores levam os participantes a compreenderem o processo e a impor-tância das ações. As ações foram consolidadas e ampliadas para outras propriedades e para a Comunidade Buriti. Investiu-se na EA por ela ser um instrumento de desalienação política apoiada por uma leitura críti-ca da realidade, facilitando a compreensão da realidade e contribuindo para a transição agroecológica. A incorporação da comunidade favoreceu o sucesso do projeto. Os agricultores tornaram-se os agentes das

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    BOAS PRÁTICAS

    atividades, incluindo seus saberes e percepções. O desenvolvimento sustentável está associado à partici-pação dos atores sociais locais na elaboração, execução e avaliação de ações que buscam aliar a equidade social, à preservação do meio ambiente e a utilização racional dos recursos naturais.

    A equipe entende que as ações devem ser baseadas no contexto econômico, social e ambiental locais, buscando uma compreensão integrada entre os diferentes aspectos que norteiam a comunidade. Dessa forma, contemplou-se a geração de trabalho e renda, ações ambientais preventivas e corretivas e a organização social. O projeto partiu da realidade local e dos interesses e planos das famílias, direcionando o trabalho para ações diversificadas e abrangentes. Estimulou-se a reflexão individual, a organização co-letiva e a articulação com o poder público para a busca de soluções para os problemas das comunidades, consolidando-os como responsáveis pela construção de sua própria história.

    A metodologia usada, a pesquisa-ação, com ênfase na reflexão crítica, ciclos de aprendizado experiencial e posse democrática dos processos de mudanças, mostrou-se adequada ao projeto. A construção de tecnolo-gias de baixo custo com o uso da mão de obra disponível e dos insumos locais tem uma alta probabilidade de sustentabilidade. O projeto teve importantes estratégias de multiplicação e reedição, sensibilizando os envol-vidos para trabalhar com os elementos naturais (água, ar, solo, flora, fauna e ser humano) de forma integrada, valorizando o potencial humano no contexto da preservação e reabilitação ambiental, resgatando-os como parte do meio ambiente e incentivando-os a uma mudança de pensamentos e atitudes. O lúdico e a comuni-cação emocional foram ferramentas pedagógicas, o que resultou em comunidades motivadas e envolvidas, fortalecendo a comunicação entre técnicos e agricultores. O caráter interdisciplinar e interinstitucional somou as competências necessárias ao desenvolvimento rural sustentável nas áreas de reforma agrária.

    Esse projeto apresenta alta replicabilidade, pois não são necessários grandes aportes de recursos finan-ceiros e infraestrutura. Mas é necessário que a equipe esteja capacitada em metodologias participativas e esco-lha diferentes formas de comunicação para sensibilização e implementação das ações.

    A tecnologia é um produto social e seu uso pode contribuir para manter ou mudar as relações de produção. Não são apenas os meios de produção que se encontram em mudança contínua. As relações humanas com os meios de produção também podem ser mudadas, constituindo um processo de ensino e aprendizagem. Três valores para uma educação tecnológica devem ser desenvolvidos e cultivados: a responsabilidade, a liberdade e a autonomia. A incorporação destes valores leva à formação de cidadãos responsáveis, autônomos e críticos. A filosofia educar para sustentar permeou o projeto.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Aprendizados Obtidos

    Conhecimento Ambivalente e Educação Sistêmica

    A baixa escolaridade dos agricultores aponta para a necessidade de trabalho com diferentes formas de comunicação, para sensibilizar e obter a efetiva participação nas ações. Utilizar diferentes ferramentas comunicacionais facilitou o trabalho, pois possibilitou diferentes estilos de conversação (interação mais pessoal ou coletiva, por exemplo), potencializando a construção coletiva de conhecimento.

    O ideal é que a equipe esteja preparada para as diferentes etapas do projeto para garantir a parti-cipação dos agricultores. É necessário que os técnicos estejam familiarizados com o conteúdo (métodos participativos, formas de abordagem, a aplicação prática), para garantir domínio das ações. A ideia é po-tencializar a troca entre técnico e agricultor ao invés de manipular as ações como se o agricultor fosse um mero executor das mesmas, favorecendo a construção de um projeto coletivo e holístico.

    A cultura de transmissão do conhecimento do técnico para o agricultor, de forma unilateral, é um obstáculo para as propostas educativas que visam uma postura ativa e autônoma dos agricultores. Geralmente, estes são passivos e esperam que o técnico dite o conhecimento. Transformamos essa visão, estimulando-os a participar nas diferentes etapas e em cursos, palestras, dias de campo e visitas técnicas.

    O estabelecimento de parcerias e a forte integração, principalmente com o IFAM (Zona Leste) e outras instituições foram instrumentos imprescindíveis, permitindo melhorar a utilização dos recursos financeiros e humanos, possibilitando a obter e multiplicar os resultados a curto, médio e longo prazos.

    A Educação Ambiental realmente incorpora o enfoque sistêmico de forma a facilitar a compreensão dos múltiplos aspectos em que se atua, inter-relacionando as questões ambientais, sociais e econômicas.

    O trabalho com a comunidade, fortaleceu sua organização social, favoreceu a sustentabilidade das ações implementadas, incentivou os agricultores como protagonistas no acompanhamento e controle das políticas públicas. A clara e contínua divulgação dos resultados (parciais e finais) deve ser observada junto aos agricultores participantes do projeto e outrem. O treinamento contínuo da equipe envolvida no projeto visando adequá-la à dinâmica integradora requerida pelo projeto auxiliou a efetivação das ações.

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    BOAS PRÁTICAS

    Ficha Técnica

    Instituição: Embrapa Amazônia OcidentalRepresentante Legal: Luiz Marcelo RossiTítulo Original da Experiência: Projeto Tarumã Vida: Educação Ambiental para a geração e consolidação de tecnologias sociais.

    Organizadores da Experiência: Joanne R. da Costa; José E. C. Soares; Adriana M. da SilvaEquipe Participante: José E. C. Soares (Prof. do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ama-zonas, Ifam, Zona Leste); Joanne R. da Costa (Pesq. da Embrapa Amazônia Ocidental); Antonivaldo de Sou-sa (Líder da Associação Agrícola do Ramal Pau Rosa, Assagrir, Comunidade Pau Rosa); Raimundo G. Batista (Líder da Associação Agrícola Tarumã-Açu , Comunidade Buriti); Adriana M. da Silva (Gestão Ambiental, Profissional Liberal); Adelaide M. da Mota (Eng. Agrônoma, Funai); Gilvan C. Martins (Pesq. da Embrapa Amazônia Ocidental); Sebastião de S. Lopes (Téc. da Embrapa Amazônia Ocidental); José M. Feitoza (Prof. e ex-diretor do Ifam, Zona Leste); Indramara Lobo (Analista da Embrapa Amazônia Ocidental); Sandra C. Coral (Pesq. do Inpa); Tatiane T. S. Barros (Bolsista da Embrapa Amazônia Ocidental); Cristiaini Kano (Pesq. da Embrapa Amazônia Ocidental); Marinice Cardoso (Pesq. da Embrapa Amazônia Ocidental); Firmino J. do N. Filho (Pesq. da Embrapa Amazônia Ocidental); Ana Luiza Vergueiro (Gerente do Instituto Excelsa); Jom-ber Chota (Téc. do Centro de Projetos e Estudos Ambientais do Amazonas, Cepeam); Hilma A. R. do Couto (Analista da Embrapa Amazônia Oriental); Akira Tanaka (Gerente do Cepeam)

    Palavras-chave: Educação Ambiental, Desenvolvimento Local, Recuperação de Áreas Alteradas, Reflores-tamento.

    Local: Manaus/AM

    Referências

    BAQUERO, R. Empoderamento: questões conceituais e metodológicas. In: Revista Debates. NUPESAL / UFRGS. n. 1, Poa: UFRGS / Escritos, v.1. p. 69-84, 2005.

    BRASIL, Ministério do Meio Ambiente. Lei nº9795/99, Política Nacional de Educação Ambiental, de 27 de abril de 1999. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 28 abr. de 1999.

    BUARQUE, S. Construindo o desenvolvimento local sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.

    JACOBI, P. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, n. 118, p. 189-205, 2003.

    NASCIMENTO, J. L. A. do, SILVA, N.M. Uso de geoteconologias no monitoramento de Unidades de Conser-

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    vação: ocupações peri-urbanas na APA margem esquerda do rio Negro – Manaus. Anais do I Seminário Internacional de Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia. Manaus: EDUA. 2010.

    PÁDUA, S.; TABANEZ, M. (orgs.). Educação ambiental: caminhos trilhados no Brasil. São Paulo: Ipê, 1998.

    PELICIONI, A. F. Educação ambiental: limites e possibilidades de uma ação transformadora. 2002. Tese (Dou-torado em Saúde Pública) – Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.

    PINHEIRO, S. L. G. (1995): O enfoque sistêmico na pesquisa e extensão rural (FSR/E): novos rumos para a agri-cultura familiar ou apenas a reformulação de velhos paradigmas de desenvolvimento? In: II Encontro da So-ciedade Brasileira de Sistemas de Produção, Anais p.22-52.

    REIGOTA, M. Desafios à educação ambiental escolar. In: JACOBI, P. et al. (orgs.). Educação, meio ambiente e cidadania: reflexões e experiências. São Paulo: SMA, 1998. p.43-50.

    THIOLLENT, M. Pesquisa-ação nas organizações. São Paulo: Atlas, 1997.

    XAVIER, J. H. V. et al. Adaptação e utilização de dispositivo metodológico participativo visando o desenvolvi-mento sustentável de assentamentos de reforma agrária. In: Congresso Brasileiro de Sistemas de produção, 7, 2007, Fortaleza. Anais... Fortaleza: Embrapa Agroindústria Tropical, 2007.

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    BOAS PRÁTICAS

    Mochila do Educador Ambiental na Floresta Acreana

    Educação Ambiental na Escola Rural

    OrganizadorAdriano Alex Santos e Rosário

    Flanelógrafo do ativo ambiental. Formação de professores rurais em Rio Branco/ACFoto: Adriano Alex Santos e Rosário

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Contexto

    Zoneamento Orienta a Educação Ambiental no Acre

    Professores rurais utilizando os materiais da mochila. Rio Branco e Acrelândia/ACFoto: Adriano Alex Santos e Rosário

    Formação de professores rurais. Município de Tarauacá/AC. Foto: Adriano Alex Santos e Rosário

    O Estado do Acre, localizado no extremo ocidental do Brasil, com área de 16,5 milhões de hectares e população estimada em 656.000 habitantes, possui cinco regiões estratégicas para o desenvolvimento do Estado6 e para a integração internacional7, totalizando 22 municípios e 04 zonas de desenvolvimento (ACRE, 2006). Sua ocupação está historicamente associada ao aproveitamento dos produtos da fl oresta, permitindo a preservação do seu patrimônio natural no processo de desenvolvimento econômico. Mais de 88% da área do Acre é composta por cobertura fl orestal original (ACRE, 2006).

    O Acre vem construindo sua política de meio ambiente de forma democrática, participativa e cidadã. Neste processo de institucionalização, adotou instrumentos para estimular a preservação, conservação e a exploração sustentada de seu rico patrimônio fl orestal. Entre estes instrumentos, destaca-se o Programa Estadual de Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE/AC), iniciado como programa em 1999, e instituído como instrumento de gestão territorial e ambiental por meio da lei n° 1.904/2007.

    Diversas são as políticas públicas formuladas e articuladas a partir do ZEE. Uma delas é a Política de Valorização do Ativo Ambiental Florestal, implementada em conjunto por secretarias e autarquias estadu-

    6 Suas regiões são: do Alto Acre, do Baixo Acre, do Purus, do Tarauacá-Envira e do Juru.7 A rodovia BR-317, atravessando território peruano, liga o Brasil aos portos do pacífi co.

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    BOAS PRÁTICAS

    ais. Suas atividades visam consolidar as áreas desmatadas e recuperá-las por meio de sistemas agroecoló-gicos, bem como regularizar e licenciar as propriedades rurais com passivo ambiental florestal, possibili-tando a sua certificação.

    A Mochila do Educador Ambiental surgiu da necessidade dos educadores rurais acessarem materiais didáticos para suas atividades educativas, adaptados à realidade regional, e que seguissem um modelo de desenvolvimento sustentável no âmbito da agricultura familiar, preconizado pelo ZEE-AC. Este material di-dático foi elaborado com base em diversos estudos do ZEE-AC, buscando uma aliança entre a conservação ambiental e a produção de alimentos. Os materiais abordam as etapas de sensibilização, a conscientização e o debate entorno das principais questões ambientais e territoriais.

    O Projeto Mochila do Educador Ambiental visa capacitar educadores e agricultores familiares, para que os mesmos possam difundir e adotar sistemas de produção sustentáveis. É um processo educacional continuado, crítico e transformador capaz de promover reflexões e questionamentos sobre a realidade ambiental, considerando os aspectos políticos, econômicos e sociais; leva os educadores e agricultores a assumir uma nova postura ecológica, pautada no respeito mútuo ao meio ambiente, contribuindo na formação de cidadãos(ãs) mais conscientes, capazes e organizados; alia o conhecimento técnico com a gestão territorial e a agroecologia, com fortes alicerces na educação ambiental; associa metodologias que priorizam métodos participativos e construtivistas, além de técnicas para uma agricultura sem o uso do fogo, a introdução de hortas orgânicas, sistemas agroflorestais e o manejo florestal não madeireiro; e, busca fortalecer a educação rural, a conservação da biodiversidade e a valorização permanente do conhe-cimento tradicional das comunidades, para a garantia de qualidade de vida no meio rural.

    A inserção, no planejamento estratégico estadual, do fortalecimento e difusão da educação ambien-tal e práticas sustentáveis de produção em escolas e comunidade rurais permitiu a realização de formação de educadores(as) em 10 municípios do estado.

    O Projeto Mochila do Educador Ambiental possibilita aos educadores meios para a difusão dos princípios da agroecologia, além de alternativas para as demandas colocadas pela sociedade, como a permanência do(a) agricultor(a) familiar no campo, com dignidade e respeito à natureza, produzindo alimentos saudáveis e garantindo o acesso aos recursos naturais para a geração atual e as futuras.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Desenvolvimento das Ações

    Pedagogia Interativa com Educandos e Educadores Rurais

    A Mochila do Educador Ambiental é composta por um conjunto de materiais didáticos utilizados na formação e instrumentalização de educadores rurais do ensino formal, técnicos e agricultores familiares para atuar como agentes ambientais em escolas e comunidades rurais do estado do Acre8. Tem como ob-jetivo promover a sensibilização, conscientização e debate com diversos atores sociais, a fim de incentivar a adoção de práticas produtivas compatíveis com a proteção ambiental e dos recursos naturais.

    O projeto inicia-se com a articulação política junto aos gestores municipais (prefeitos e secretários municipais), para a realização da mobilização dos educadores rurais para a oficina de formação. Em segui-da, são realizadas reuniões de planejamento entre os parceiros para a definição de atividades e responsa-bilidades. As prefeituras apoiam na mobilização, transporte e alimentação e a SEMA com equipamentos e matérias didáticos (mochilas).

    Os processos de formação fundamentam-se na participação ativa dos educandos, caracterizando um processo pedagógico dinâmico e interativo. Os princípios pedagógicos trabalhados na sensibiliza-ção são o diálogo, o construtivismo, a realidade e diversidade de saberes como base da produção do conhecimento, assim como a relação prática-teoria-prática. O diálogo e a problematização são atividades pedagógicas fundamentais. Segundo Freire (1983), estas permitem o desenvolvimento de uma postura crítica e a interação entre saberes de todos envolvidos no processo. O diálogo representa uma maneira da comunidade participar do seu processo de desenvolvimento (BUNCH, 1995).

    A partir deste referencial, baseado no construtivismo sociointeracionista, as atividades das oficinas de formação de educadores rurais têm as perguntas de estímulo como ferramenta pedagógica essencial, no intuito de estimular o pensamento crítico e dedutivo dos participantes. O instrumental metodológico é composto de dinâmicas interativas, práticas de estimulação dedutiva e atividades práticas, descritas nas fichas de aprendizagem do caderno do educador ambiental.

    Nos cursos de formação os educadores são habilitados a usar os materiais didáticos da mochila na praxi, visualizando seu funcionamento, as implicações e os impactos que resultam da sua utilização, tendo sempre em mente que as tecnologias não são “pacotes” e sim “pistas”, que devem ser adaptadas a cada realidade. Um ponto inovador da experiência é o uso da mochila nas salas de aula, onde os conteúdos

    8 No ano de 2011 foram realizadas 12 oficinas de formação de educadores ambientais rurais e palestras na semana de meio ambiente. Até o momento foram formados 214 educadores rurais do ensino público em 10 municípios do Estado do Acre: Acrelândia (30), Capixaba (22), Cruzeiro do Sul (05), Epitaciolândia (30), Mâncio Lima (06), Porto Acre (30), Rio Branco (62), Rodrigues Alves (02), Tarauacá (22), Xapuri (04) e Guajará/AM (01).

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    BOAS PRÁTICAS

    escolares das diferentes disciplinas são adaptados aos materiais didáticos da mochila, proporcionando aulas interativas e um processo de vivência com a natureza, além de discutir temáticas como a importân-cia da biodiversidade, a conservação da água e do solo, mudanças climáticas, a ciclagem de nutrientes, os roçados sem fogo, a implantação de hortas orgânicas nas escolas, o uso de alimentos oriundos da floresta e sua inserção na merenda escolar9.

    A metodologia investigativa mostra-se adequada para estudos socioambientais, permitindo proble-matizar o processo histórico de uso e ocupação da terra e suas implicações nas atuais políticas públicas estaduais de educação, gestão ambiental e territorial, gerando subsídios para o desenvolvimento de for-mas alternativas de uso da terra e manejo dos recursos naturais.

    A mochila do educador ambiental é formada pelos seguintes materiais: caderno do educador am-biental – é o guia da mochila, onde estão inseridas 25 fichas de aprendizagem divididas em 03 capítulos: gestão ambiental e territorial, sistemas de produção sustentáveis, legislação ambiental; flanelógrafo do ativo ambiental florestal – para estudos do ciclo da água e dos nutrientes, biodiversidade vegetal e animal, sucessão ecológica e serviços ambientais; flanelógrafo do lixo – para trabalhar a gestão adequada dos resíduos sólidos no ambiente rural (coleta seletiva e reciclagem); maquete agroambiental – utilizada para o planejamento e recuperação de áreas degradadas e áreas de preservação permanente com o uso de 25 mini-árvores; o quebra-cabeça do zoneamento ecológico econômico – para o estudo da geografia do estado e sua estrutura político-administrativa, as zonas de desenvolvimentos definidas pelo ZEE; carta da terra para crianças – esse material ilustra a realidade amazônica para a conservação dos recursos naturais; fichas de aprendizagem das espécies agroflorestais – contém informações agronômicas sobre as princi-pais espécies agroflorestais do Acre; mini-banners – sobre mudanças climáticas, conservação da água e do solo, roçados sem fogo e agroflorestas; jogos ambientais do Acre – perguntas e respostas, enigma das águas, alerta vermelho, falando acreano, extrativismo, ocupação do solo, dominó dos animais e o jogo da memória; vídeos ambientais – sabendo aprender com a floresta e nas trilhas da sustentabilidade.

    Na entrega oficial da mochila são apresentados os critérios e o contrato em termos de comodato de uso dos materiais, visando assegurar a utilização da mochila do educador ambiental pelos educadores rurais. Os gestores locais se responsabilizam por elaborar relatórios de atividades a cada dois meses, inclu-sive com registro fotográfico das atividades desenvolvidas.

    No intuito de garantir uma maior representatividade, controle social e gestão participativa foi criado um Comitê Gestor do Projeto que se reúne a cada três meses para avaliação da replicabilidade e difusão dos materiais da mochila e monitoramento das atividades desenvolvidas pelas instituições parceiras. Este Comitê é formado por representantes da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA); Secretaria de

    9 O açaí (Euterpe sp.) rico em antioxidantes, a castanha (Bertholletia excelsa) rica em proteínas e selênio, o ingá (Inga sp.) rico em fibras são exemplos de alimentos que podem ser inseridos na merenda escolar.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (SEAPROF); Secretaria de Estado de Educação (SEE); Secretarias Municipais de Meio Ambiente; Instituto de Meio Ambiente do Acre (IMAC) e Instituto Nacional de Coloni-zação e Reforma Agrária (INCRA).

    Em 2012 existe a perspectiva de ampliação do projeto para 12 municípios e inserção em 12 pro-jetos de assentamentos. Por meio de convênio firmado entre a Secretaria de Estado de Meio Ambiente/Departamento de Educação Ambiental e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA/INCRA) serão confeccionadas 250 mochilas do educador ambiental. Outro convênio firmado foi com a Organização Não Governamental WWF-Brasil e Sky/Inglaterra, para a confecção de 40 mochilas destinadas a formação de professores rurais e agricultores familiares do programa de certificação de propriedades rurais.

    Outro importante ponto a ser mencionado é a iniciativa das Prefeituras dos Municípios de Porto Acre, Acrelândia e Tarauacá, que irão utilizar os repasses do ICMS Ecológico para a confecção de Mochilas do Educador Ambiental para a Rede Municipal de Ensino. Todas as instituições que solicitaram o processo de formação junto a SEMA estão autorizadas a multiplicar os materiais da mochila.

    Aprendizados Obtidos

    Criatividade e Participação Enriquecem a Mochila

    Um dos mais importantes “ingredientes” para se fazer Educação Ambiental é a criatividade do edu-cador. A mochila estimulou os educandos a criar, desenvolver e avaliar situações de aprendizagem diver-sas, baseadas em metodologias ativas e no estímulo à participação equitativa.

    Configurou-se como uma metodologia em permanentemente validação, incorporando todo o co-nhecimento adquirido durante as oficinas de formação.

    A vivência e o aprendizado com os diretores, coordenadores de ensino e educadores contribuiram para construção de novos materiais didáticos como o DVD interativo do ciclo da água; a criação do mini--experimento de proteção da terra, a mata e o roçado; a implantação dos quintais agroflorestais e como eles podem suprir a merenda escolar; a elaboração das fichas de aprendizagem das espécies agroflorestais entre outras.

    E finalmente, as dificuldades encontradas no ano de 2011 foram superadas com um melhor planeja-mento operacional, permitindo que o projeto se expandisse para outros municípios.

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    BOAS PRÁTICAS

    Ficha Técnica

    Instituição: Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMATítulo Original da Experiência: Mochila do Educador Ambiental: uma Importante Ferramenta na Forma-ção de Educadores Rurais.

    Representante Legal: Carlos Edegard de DeusOganizador da Experiência: Adriano Alex Santos e RosárioEquipe Participante: Adriano Alex Santos e Rosário (Coordenador de Formação); Maria de Fátima Ferreira da Silva (Coordenação Geral); Teófilo Maia Guimarães (Facilitador); Carlos Gomes Júnior (Facilitador); Dé-borah Verçoza da Silva (Facilitadora)

    Palavras Chave: Mochila, Formação, Ativo AmbientalLocal: Rio Branco/AC

    Referências

    ACRE. Governo do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Acre, Fase II: documento síntese – escala 1:250.000. Rio Branco: SEMA, 2006.

    BUNCH, R. Duas espigas de milho: uma proposta de desenvolvimento agrícola participativo. Rio de Janeiro/RJ: AS-PTA,1995.FREIRE, P. Extensão ou comunicação? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Conservação e Uso Sustentável da Sociobiodiversidade

    Educação Ambiental, Geração de Renda,Produção Sustentável e Tecnologia Social

    OrganizadoresMariana Gama SemeghiniLeonardo Pereira Kurihara

    Márcio Menezes

    Visita ao SAF de José A. C. Filho. Ofi cina de Formação em Agrofl oresta. Comunidade São João do Tupé, 2012.Foto: Sérgia Betti

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    BOAS PRÁTICAS

    Contexto

    Fortalecendo as Cadeias da Sociobiodiversidade

    Grupo de mulheres no Clube de Mães. Relatório do IPÊ, 2011. Foto: Paula Piccin

    Implantação de SAF. Comunidade São Sebastião, 2012. Foto: Mariana Semeghini

    Oficina de artesanato com fibras vegetais. Comunidade Nova Esperança, 2010.Foto: Mariana Semeghini

    Estima-se que há dois milhões de anos as florestas tropicais ocupavam 12% da superfície do planeta (16 milhões de km²). Na década anterior, esse montante não passava de 70% da área original, correspon-dendo a 11,2 milhões de km². (MEIRELLES, 2006). As causas mais frequentes dessa mudança, principalmen-te nos trópicos, relacionam-se à transformação das áreas de floresta por meio da expansão agrícola, da pecuária, da mineração, da infraestrutura (represas, hidrelétricas, estradas), do processo de urbanização e da exploração madeireira (GEIST e LAMBIN, 2001; MORAN e OSTROM, 2009).

    A Amazônia brasileira possui cerca de 40% da floresta tropical do mundo (LAURANCE, et al, 2001). Representa 49% do território brasileiro, cerca de 5 milhões de km², em 771 municípios, onde vivem pouco mais de 23 milhões de pessoas (IBGE, 2009). A agropecuária, a mineração e a exploração madeira são as principais atividades econômicas da região Amazônica (LENTINI, VERÍSSIMO e PEREIRA, 2005).

    Manaus, capital do Amazonas, concentra mais de 50% da população do Estado, que representa 1% da população brasileira, 1,6% do PIB10 nacional e 83% do PIB do Estado (IBGE, 2010). Segundo dados do INPE11 (2009), 97,6% de sua cobertura vegetal permanece intacta. Apesar do alto índice de conservação do estado, Manaus exerce pressão na região do Baixo Rio Negro, onde a proximidade e facilidade de acesso por via fluvial contribuem para a crescente demanda de recursos naturais, principalmente madeira.

    10 PIB: Produto Interno Bruto11 INPE: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Segundo Veríssimo et al. (2002), o modelo de exploração madeireira implantado na região é de gran-de crescimento econômico inicial, seguido de um rápido colapso e uma constante tendência de migração para novas fronteiras. Cerca de 70% da madeira não tem origem definida (OBSERVATÓRIO SOCIAL, 2009). A extração tem sido realizada de forma ilegal e insustentável, gerando grandes danos ecológicos na floresta.

    A especialização da atividade ocupa o espaço das atividades tradicionais, gerando um forte impacto sociocultural. Diferente da lógica ocidental, as estratégias das populações tradicionais da Amazônia visam a diversidade para garantir a subsistência e minimizar os riscos. São práticas de manejo adaptativo e envol-vem múltiplos usos das espécies, rotação de recursos, manejo de paisagens e sucessional (BERKES, COL-DING e FOLKE, 2000). Quanto maior a diversidade de estratégias, maior é a resiliência do sistema para se recuperar de eventuais perturbações (NODA et al., 1997; BERKES, COLDING e FOLKE, 2000). Essa caracterís-tica proporcionou o desenvolvimento de grande variedade de produtos e serviços da sociobiodiversidade.

    O grande desafio é desenvolver e consolidar os diferentes produtos e serviços da sociobiodiversi-dade. As estatísticas oficiais registram que a produção extrativista não-madeireira representa aproxima-damente 0,48% da produção primária nacional. Isto indica o pequeno espaço ocupado pelos produtos da sociobiodiversidade na economia formal. Iniciativas e projetos governamentais e da sociedade civil sinalizam o potencial de mercado dos produtos da cadeia da sociobiodiversidade e sua contribuição para o desenvolvimento sustentável. (BRASIL12, 2009).

    A região do Baixo Rio Negro tem relevante diversidade biológica, que lhe confere a classe de área de extrema importância para conservação, segundo o Relatório “Biodiversidade Brasileira” (BRASIL13, 2002). Sua população é composta, majoritariamente, por indígenas e caboclos ribeirinhos. Estes habitam as mar-gens dos rios e a terra firme, onde desenvolveram um saber-fazer na convivência com os rios e com a flo-resta, sendo a pesca, a caça, a agricultura e o extrativismo as principais atividades produtivas. Os critérios que cada família utiliza na tomada de decisão do uso dos recursos está ligada a sua trajetória agroextrati-vista, a mão de obra disponível, acesso a territórios e objetivos econômicos (CARDOSO, 2008).

    Apesar de toda riqueza e potencialidade, os produtos da sociobiodiversidade (frutas, doces, farinha de mandioca, tapioca, etc), vêm perdendo espaço por não promoverem melhoria na renda e na qualidade de vida das pessoas, devido à dificuldade de escoamento e inserção destes produtos no mercado.

    A principal atividade econômica da região é a exploração madeireira, para extração de varas e ma-deira serrada (pranchas, tábuas, compensados), e espetos para churrasco, realizada de forma ilegal, insus-tentável e sob precárias condições sociais (IPÊ, 2007).

    12 Documento produzido pelos Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).13 Documento produzido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA).

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    BOAS PRÁTICAS

    Persiste na região uma forte relação de competição entre o extrativismo e a agricultura, principal-mente na alocação de força de trabalho familiar (EMPERAIRE, 2000; KURIHARA e CARDOSO, 2009). A roça é o principal espaço cultivado, integrado à floresta, aos quintais e capoeiras. Nela, cultiva-se inúmeras plan-tas, com destaque para 70 variedades de mandioca (5 mansas e 65 bravas), cará, banana e abacaxi. Nos quintais predominam frutíferas, ornamentais, condimentares e medicinais (CARDOSO, 2008).

    O Diagnóstico Rápido Participativo - DRP realizado pelo IPÊ em 10 comunidades, em 2007, mostrou que 40% das famílias têm roça, mas apenas 15% comercializa o excedente da farinha. Dentre as principais atividades econômicas, a extração madeireira representa 35% e a produção de espeto 20%. O turismo e o artesanato são atividades econômicas significativas para um quarto das famílias (IPÊ, 2010). Sabe-se que as florestas tropicais e sua rica sociobiodiversidade estão ameaçadas, em maior grau, pelo estabelecimen-to de políticas econômicas de desenvolvimento que não levam em conta os sistemas ecológicos (PRIMACK e RODRIGUES, 2001) e culturais da região. A especialização da atividade madeireira, principalmente para atender as demandas do mercado pode ser uma ameaça à dinâmica cultural e ao modo de vida local, o que contribui para a insegurança alimentar e para a erosão da agrobiodiversidade.

    Neste cenário, o fortalecimento das cadeias de produtos da sociobiodiversidade, como: os produtos in natura (cultivados e coletados), o artesanato com sementes, as fibras vegetais, o reaproveitamento de madeira e a culinária local, com a farinha, tapioca e doces de frutas regionais, apresenta-se como uma alternativa interessante na tentativa de valorizar a biodiversidade local e o saber-fazer desenvolvido pelas populações locais, promovendo a melhoria da qualidade de vida na região.

    Desenvolvimento das Ações

    Sem queimar a planta cresce mais

    No final de 2005, o IPÊ inicia diálogos com as comunidades da região do rio Cuieiras, no intuito de iniciar ações de conservação e uso sustentável da biodiversidade. Em reuniões e oficinas realizadas com a comunidade, definiu-se as prioridades de intervenção, onde a renda e agricultura se destacaram. Com apoio do FNMA, desenvolveu-se o projeto “Etnobotânica e Manejo Agroflorestal no entorno de Anavilha-nas”, em 2006, que iniciou com um DRP e estudos etnobotânicos focados nos quintais e nas roças (CARDO-SO e SEMEGHINI, 2009).

    A primeira ação levantou informações sobre a dinâmica demográfica e histórica em associação com as formas de uso locais dos recursos naturais, além de compreender os elementos da territorialidade das comunidades da região diante do ordenamento público do território e os conflitos decorrentes.

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    Educação Ambiental na Agricultura Familiar

    Foram realizadas pesquisas com objetivo de entender o uso e os processos de gestão dos principais sistemas produtivos desenvolvidos pelas populações ribeirinhas locais. A metodologia adotou aborda-gens e técnicas da pesquisa participativa e ferramentas da etnoecologia. Os estudos buscaram compre-ender as formas de representação e classificação da agrobiodiversidade; o conhecimento sobre a fauna e ictiofauna exploradas nas atividades de caça e pesca, e, por fim, caracterizar, avaliar e quantificar a produ-ção e o esforço de trabalho dos sistemas agrícolas e de extração madeireira.

    Após o diagnóstico, o projeto focou suas ações no fortalecimento dos produtos da sociobiodiver-sidade com “valor” sociocultural e potencial econômico. A avaliação tanto do DRP quanto das pesquisas iniciais, sinalizaram a importância lo