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CARTOGRAFIA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL:
PARA LER ALÉM DAS CONVENÇÕES
Tielle Soares Dias/Universidade Federal do Rio Grande do Sul
O ENSINO DE GEOGRAFIA
As indefinições teórico-metodológicas da Geografia põem seus professores,
principalmente os iniciantes, frente à crise da Geografia Escolar (STRAFORINI, 2004).
Em meio às necessidades de se fortalecer uma Geografia Crítica, que utilizasse os
conteúdos geográficos para formação de cidadãos com um posicionamento reflexivo
sobre as desigualdades sociais identificadas na realidade concreta da criança, e a
diversidade de teorias e metodologias pedagógicas, ocasionaram uma série de leituras
equivocadas no ensino de Geografia.
Substituíram-se aulas que eram apenas reprodução de listagem de conteúdos por
aulas que, baseadas nos princípios do Construtivismo e da Geografia Crítica,
trabalhavam com o entorno do aluno, com o conhecido, com notícias, no entanto, a
metodologia continuava sendo meramente informativa, sem a reflexão dos alunos. O
maior desafio nos tempos atuais é justamente trabalhar essa geografia, imensa em seus
conteúdos, de forma que o aluno possa sair da sala de aula com mais dúvidas sobre os
temas trabalhados, sobre a sociedade do que aquelas que tinha no início.
A geografia deve largar seu papel informativo e partir para a formação de
pessoas através da dúvida, dos questionamentos. Para que serve a Geografia
informativa? Para alienar como dizia LACOSTE (1988)? Pois então devemos seguir o
posicionamento do mesmo autor e lembrar que o conhecimento do território é o ponto
fundamental para dominá-lo, organizar-se sobre ele e organizar os que o desconhecem.
O MUNDO DOS MAPAS NO ENSINO DA GEOGRAFIA
O objetivo principal de estudo da Geografia continua sendo o espaço geográfico
(CASTROGIOVANNI, 2000). Espaço entendido como um produto histórico, o reflexo
das ações sociais ao longo do tempo sobre um espaço físico, revelando as práticas
sociais dos diferentes grupos que vivem num determinado lugar, interagindo e
construindo. Para então proporcionar um estudo de qualidade em Geografia devem ser
propostas situações de aprendizagem que interajam o conteúdo formal da disciplina
(necessário para estabelecer relações entre os fenômenos) e os conhecimentos do espaço
vivido dos alunos.
É necessário, segundo Castrogiovanni (2000) que:
“os professores criem condições de trabalho que favoreçam as diferentes
estratégias cognitivas e ritmos de aprendizagem, para que o aluno aprenda de
forma ativa, participativa, evoluindo dos conceitos prévios aos raciocínios mais
complexos e assumindo uma postura ética, de comprometimento coletivo”.
Para isso, deve-se trabalhar os conteúdos próprios da Geografia, visando
abranger aos conceitos fundamentais como: localização, orientação, representação,
paisagem, lugar e território. Neste sentido a cartografia torna-se, segundo
CASTROGIOVANNI (2000), um importante instrumento, para que o aluno possa ser
um leitor e um mapeador ativo, consciente da perspectiva subjetiva na escolha do fato
cartografado, marcado por escolhas e objetivos pessoais de quem o faz.
Para trabalhar cartografia no ensino de Geografia necessita-se trabalhar um dos
temas próprios dos estudos geográficos: a noção de espaço. Esta é, segundo HEIDRICH
(1991), uma habilidade do ser humano, a qual se desenvolve através da relação do
sujeito com o meio. A assimilação dessa noção constitui tendência natural de que sem
relaciona com o meio e com os demais, no entanto isso não significa que este tema não
deva ser trabalhado e desenvolvido na sala de aula. A noção de espaço é composta por
um conjunto de idéias e imagens que se internalizam no indivíduo através da vivência
no espaço, que permite criar representações.
Porque então ensinar cartografia na escola? A escola interage na maneira de
criar as representações instrumentalizando o indivíduo através do trabalho com mapas e
da aprendizagem do mapa e da sua linguagem. O conhecimento das relações que
conduzem à criança a construção da noção de espaço, denominadas topológicas,
projetivas e euclidianas, permitiu criar estratégias para que o ensino da cartografia fosse
realizado visando o melhor aproveitamento desta ferramenta pelos alunos.
As primeiras relações que a criança constrói e utiliza são elementares chamadas
topológicas tais como: vizinhança, separação, ordem, envolvimento e continuidade.
Essas relações permitem que a criança distinga figuras abertas e fechadas, mas não
permitem que ela faça distinção entre um círculo e um quadrado.
As relações que permitem a coordenação dos objetos entre si a partir de um
ponto de vista são as projetivas. Mas inicialmente estas não conservam as distâncias e
as dimensões como um sistema de coordenadas, já que consideram seu ponto de vista
como único. Citamos como exemplo, uma criança que não consegue reproduzir em
desenhos vários brinquedos existentes no interior de uma caixa, pois ela, do seu ponto
de vista só enxerga a tampa aberta e a frente da mesma, (comprimento e altura), estando
perpendicular ao objeto. Quando possuir a coordenação dos pontos de vista passará a
enxergar nos objetos, os elementos não acessíveis à visão, mas que permitem à criança
concluir que se trata do mesmo objeto em diferentes posições.
As relações euclidianas são simultâneas às projetivas e nelas se apóiam.
Apreendem os deslocamentos, as relações métricas e a colocação dos objetos
coordenados entre si num sistema de coordenadas (Scortegagna, 2004). Na
fundamentação e na organização da prática pedagógica o professor deve ter em mente
as etapas da construção do espaço para o aluno bem como seus objetivos ao ensinar
cartografia.
O QUE É CARTOGRAFIA?
Cartografia é o conjunto de estudos e operações lógico-matemáticas, técnicas e
artes que constrói mapas, carta, plantas e outras formas de representação, através de
observações diretas, investigações de documentos e levantamento de dados. Sendo
assim a cartografia é considerada uma ciência, pela representação precisa e utilização
dos seus produtos como documentos sobre o espaço representado; uma técnica, por
combinar metodologias e ferramentas para elaboração das representações e; uma arte
por utilizar diferentes formas de desenho e manifestações gráficas.
A representação cartográfica é utilizada no cotidiano através de guias turísticos,
material de divulgação de empreendimentos imobiliários, ilustração de locais de
notícias em mídia impressa, ou seja, os mapas estão abrangendo um grande público. No
uso científico o mapa é um instrumento de síntese, que algumas ciências (não só a
Geografia) utilizam para a compreensão espacial do fenômeno. Embora pareçam
atuações distintas o mapa como uso cotidiano e como uso científico tem o objetivo
semelhante de conhecer, controlar e dominar o espaço representado.
A construção de um mapa envolve características técnicas, conhecimento sobre a
área, e fundamentalmente, decisão. O mapa não exprime o que se observa no local, mas
sim, elege pontos de maior relevância que serão demonstrados. A escolha desses pontos
torna o mapa vulnerável, uma vez que é realizada em função dos objetivos que quem o
fez. Um dos exemplos mais claros são os mapas relacionados a empreendimentos
imobiliários, nos quais os acessos a equipamentos urbanos são ponto importante para
venda e que nas representações gráficas aparecem normalmente mais próximos do que
realmente o são, um artifício que se justifica pela constante ausência de escala nessas
ilustrações.
Dessa forma, possibilitar ao aluno o entendimento do mapa como instrumento,
fundamental para o estudo da Geografia, deve passar pela construção teórica dos seus
objetivos enquanto representação do espaço. Trabalhar com cartografia na escola não
inclui apenas contornar e delimitar, reconhecer projeções e calcular escala, trabalhar
com mapas exige a compreensão dos símbolos e das suas escolhas, exige reconhecer
projeções e saber por qual motivo uma é mais utilizada que outra e principalmente,
exige saber que o mapa não é uma fotografia do recorte espacial em questão e sim uma
escolha de quem o fez baseado em um conjunto de convenções previamente
estabelecidas.
ALFABETIZAÇÃO CARTOGRÁFICA
Alfabetizar não é apenas repetir, copiar, escrever, alfabetizado é aquele que se
apropria do símbolo e o utiliza para fazer as suas criações, a sua cultura. Estar
alfabetizado na geografia é, segundo CASTROGIOVANNI (1998), relacionar espaço
com natureza, natureza com sociedade, é perceber a interação entre os aspectos sociais,
econômicos, políticos, culturais. É saber situar-se e posicionar-se frente às questões do
mundo, é perceber que o espaço é disputa de poder e ter um posicionamento com
relação às desigualdades sociais-espaciais.
Quando se fala em alfabetizar entende-se a interpretação e domínio de símbolos
que possam ser utilizados em outras dimensões. A alfabetização cartográfica refere-se
ao processo de domínio e aprendizagem de uma linguagem constituída de símbolos, de
uma linguagem gráfica (a cartografia possui códigos e símbolos definidos - convenções
cartográficas). No entanto, não basta à criança desvendar o universo simbólico dos
mapas; é necessário criar condições para que o aluno seja leitor crítico de mapas ou um
mapeador consciente. O processo de alfabetização cartográfica compõe essa apropriação
e interpretação dos símbolos cartográficos, que podem oportunizar ao aluno a
aplicabilidade posterior em leituras de mapas e contextos espaços-temporais.
UMA ALTERNATIVA POSSÍVEL...
As práticas realizadas nesta temática referem-se à experiência docente realizada
durante a disciplina de Estágio em Docência em Geografia I: Ensino Fundamental,
realizada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob orientação do Professor
Dr. Nestor André Kaercher. A prática foi realizada durante dez semanas em uma escola
da rede Estadual de ensino, tendo como público uma quinta série do Ensino
Fundamental.
A cartografia na quinta série do Ensino Fundamental corresponde aos primeiros
conteúdos programáticos para o ano letivo, segundos a maioria dos livros didáticos. Os
conteúdos programados para essa série correspondem aproximadamente a toda
Geografia Física, o que gera a reflexão de que alguns não podem ser trabalhados
exatamente como consta no livro. A própria cartografia, tratada através de cálculos e de
cópias de mapas tornar-se um tema vazio de significado. Exatamente para justificar a
importância do estudo da cartografia na escola é que o trabalho com esse tema foi
realizado de forma diferencial, buscando atividades alternativas para que os alunos
refletissem sobre o que lhes estava sendo apresentado.
Os conteúdos foram divididos em etapas sendo elas: a representação do Espaço,
a orientação no Espaço e a localização no Espaço. Os desdobramentos dessas etapas nos
assuntos trabalhados em aula foram os seguintes: A representação do Espaço (Escala,
Localização espacial, Tamanho real e tamanho gráfico, Perspectivas de representação,
Tipos de mapas e Localização em mapas); A orientação no Espaço (Pontos cardeais,
Orientação através de pontos cardeais, Convenções cartográficas) e A localização no
Espaço (Coordenadas geográficas, Fuso horário).
Com um conteúdo de extrema abstração que é a interpretação de mapas, foram
utilizados recursos didáticos que permitissem a manipulação concreta desses conteúdos,
portanto a primeira parte “a representação do espaço’’ foi trabalhada de forma mais
minuciosa, levando mais tempo para sua conclusão, de forma que os alunos através de
desenhos partindo de si mesmos até o caminho que fazem para chegar a escola
pudessem compreender o que é um mapa. Nesta etapa foram utilizadas muitas
representações feitas pelos alunos, o livro didático como um auxiliar nas ilustrações,
nos mapas e na fixação de alguns conceitos.
A representação do Espaço foi trabalhada individualmente durante as duas
primeiras semanas, mas seus assuntos seguiram por todo o período, já que os conceitos
de escala e a localização espacial, principalmente, eram freqüentemente necessários
para os demais assuntos. As atividades desenvolvidas incluíram: desenhos; análise de
mapas; localização em mapas (planta de Porto Alegre, mapa do Rio Grande do Sul e do
Brasil) nestas atividades os alunos utilizaram tanto mapas de parede como guias
telefônicos, priorizando localizar locais conhecidos como o endereço, a escola, e os
arredores da escola; manuseio de imagens de satélite e interpretação de informações dos
mapas.
Um dos pontos mais significativos dessa parte inicial foi a compreensão do
conceito de escala. Inicialmente foi proposto aos alunos que se desenhassem em
quadrados predeterminados, em um com o corpo todo, em outro só a cabeça (Figura 1).
Após as reflexões sobre a identidade, foi
pedido que os alunos observassem a sua
criação e pensassem em quais dois havia
mais detalhe? E em qual deles havia mais
informações representadas. Algumas
dificuldades como desenhos que na área
reservada para todo o corpo a cabeça não
estava, já que na compreensão do aluno ela
já havia sido representada, demonstravam
as diferentes fazes de desenvolvimento de cada um, porém no geral a atividade foi bem
aceita e compreendida.
O globo serviu de auxílio nesta hora, questionando também o que é o globo e o
Figura 1: representação realizada por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental
Figura 2: representação do seu quarto realizada por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental
que ele objetiva (representar o nosso planeta, responderam alguns), mas nele dá para
perceber a rua da casa onde tu moras? (não responderam alguns: não porque o globo
não é de verdade; outros: não porque não caberiam todas as ruas do mundo aí,
professora).
Partir dessa idéia inicial de escala e representar o próprio quarto foi algo ótimo,
o conhecimento do espaço a ser representado permitia um domínio do seu mapa, que
pode ser usado para discutir as preferências: o que representar? Por que representar isso
e não aquilo? A visão inicial para o desenho do quarto do aluno foi a horizontal,
partindo de uma situação hipotética: imagina-te agora sentado na tua cama, o que vês.
Agora imagina-te pendurado no teto! (Figura 2)
A preparação para essa atividade foi feita através do desenho de diferente
objetos conhecidos, como caneta, borracha. A caneta foi onde a visão vertical foi
compreendida pela maioria: “ah, sora não dá pra desenhar a caneta vista de cima! [...]
vista de cima ela é só uma bolinha!” Perfeito, a partir daí a discussão sobre as diferentes
formas de ver um objeto começaram para tudo o que se via. Desenhar o quarto como se
estivessem pendurado no teto foi uma pesquisa para imaginar que forma os objetos tão
conhecidos, daquele espaço tão próximo, teriam.
Alguns alunos apresentaram
muitas dificuldades, desde não
conseguir representar todas as
informações que gostaria, ter que
apagar várias vezes para melhor
utilizar o espaço destinado, até mesmo
não conseguir formalizar a idéia da
visão vertical, fazendo uma mistura
das duas formas de representação:
vertical e horizontal. Geralmente a
visão horizontal permanecia em objetos
como cadeiras (Figura 3), nos quais os
alunos tentavam desenhar as pernas,
ignorando que vistas de cima essas não
apareceriam, no entanto na concepção de
Figura 3: representação realizada por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental
Figura 4: representação realizada por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental
alguns, as cadeiras não seria entendidas como cadeiras se estivessem se as pernas.
Questão que originou a discussão sobre as legendas.
Voltando à escala, a mesma perspectiva sugerida para o desenho do quarto foi
solicitado para se desenhar o percurso casa-escola, com um detalhe de ser no mesmo
tamanho de papel. A representação feita por eles, ora do quarto visto verticalmente, ora
do percurso também na vertical (Figura 4), fez com que alguns parassem para refletir
que eles tinham feito “caber” no mesmo espaço lugares que na realidade tem tamanhos
muito diferentes. A discussão da escolha, do detalhe e finalmente do conceito de escala,
veio à tona. Neste momento os mapas do Brasil, Rio Grande do Sul, a planta de Porto
Alegre, o guia telefônico, o planisfério, e qualquer outra representação, trazida pela
professora ou pelos alunos, passaram a ser analisadas sob essa ótica.
Alunos que na representação do quarto não tinham encontrado dificuldades, na
representação do percurso apresentaram conflitos entre a visão vertical e horizontal
(Figura 5). Um ponto interessante é que alunos mais jovens apresentavam muito mais
dificuldades, do que os alunos de maior idade (muitos deles repetentes, o fato de
desenvolverem bem as atividades, e
auxiliarem os colegas com maior
dificuldade, os trazia para a aula,
aumentando o interesse).
O tema da orientação no Espaço
foi trabalhado durante praticamente duas
semanas, foram realizadas nesse período
muitas atividades práticas já que esse
assunto propunha uma ação: orientar-se.
Foram propostas várias situações nas
quais os alunos deveriam utilizar os recursos geográficos para se localizar na sala de
aula, em um mapa do livro didático, em um mapa dado pela professora ou nas plantas
de Porto Alegre. Nesta etapa os alunos tiveram contato com uma bússola e diversas
vezes orientaram a sala de aula de acordo com o Sol.
A criação de mapas da sala de aula com a orientação correta em relação ao Sol e
com a verificação na bússola permitiu aos alunos construírem a idéia de que a
orientação dependerá do ponto onde tu observas (Figura 6), isso foi possível perceber
através da desconstrução do Norte para frente, como é habitual, assim como do Norte
para cima, uma vez que os alunos tiveram que em vários momentos orientarem as
Figura 5: representação realizada por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental com aparentes confusões.
plantas de Porto Alegre e o mapa do Rio Grande do Sul não com o título para cima, mas
segundo a rosa dos ventos localizada nos mapas.
Assim todos os mapas trabalhados foram vistos na posição horizontal,
reforçando que o norte não é para cima, mas sim uma direção. Reforçando também que
uma vez o mapa orientado é possível indicar para que lado fica cada objeto nele
representado, com a Planta de Porto Alegre foi interessante que, como muitos alunos
iam caminhando para a escola eles
conheciam o caminho e com o mapa
orientado eles localizavam a posição da
escola e confirmavam ou discordavam (o
que gerava grande discussão) se o que
estava sendo representado ficava realmente
para aquele lado.
A localização no Espaço foi um dos
temas mais trabalhados chegando quase há
quatro semanas, pois encerrava e revisava os
assuntos anteriormente trabalhados além de acrescentar alguns tópicos novos como fuso
horário e coordenadas geográficas que exigem um trabalho mais prático para sua
compreensão.
Foram revisadas as atividades
que permitiam ao aluno compreender
que as coordenadas geográficas e o
fuso horário são convenções e que por
isso precisam ser compreendidas como
uma atitude humana para se localizar
no Espaço, por isso muitas das
atividades partiram da sala de aula:
criar uma rede de coordenadas que
permitiria ao aluno encontrar o
posicionamento dos colegas na sala (Figura 7); criar um registro de rotina individual, o
que fazem em cada horário do dia, possibilitando a visualização de que quando estamos
sob um mesmo horário tendemos a fazer as nossas atividades de forma sincronizada
(Figura 8). Nesta etapa foram utilizados muitos recursos escritos também, como o livro
Figura 7: Trabalho com Coordenadas Geográficas, realizado por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental
Figura 6: representação da sala de aula, devidamente orientada, realizada por um aluno da quinta série do Ensino Fundamental
didático, textos que se referiam a mapas, mapas, além do globo que foi utilizado em
muitas aulas.
Os pontos mais marcantes dessas construções com os alunos foram algumas
atividades nas quais se aplicavam esses conhecimentos de maneira prática. Uma das
atividades mais significativas foi a localização das casas dos alunos na planta de Porto
Alegre, separados por bairros, os alunos tinham que colocar etiquetas com seu nome no
local do mapa onde estaria sua casa. Além da localização das suas casas os alunos
podiam observar o agrupamento formado pela maioria nos arredores da escola,
interessante observar que muitos não sabiam que moravam tão próximos uns dos outros.
Figura 8: Trabalho de registro de rotina, permitindo perceber a semelhança entre horários e atividades na vida de diferentes alunos da quinta série do Ensino Fundamental.
Outra atividade muito bem aproveitada foi uma avaliação, na qual os alunos
deveriam buscar em revistas e jornais um mapa qualquer, de livre escolha, e a partir
dele responder questões gerais propostas pela professora.
Ao procurar o mapa os alunos observaram a aplicabilidade dos símbolos e sua
importância para o reconhecimento do que estava sendo representado, juntamente com a
reportagem eles deveriam interpretar qual a função dos mapas naquela notícia (Figura
9). Algumas dificuldades ficaram ainda na confusão entre diferentes formas de
representações, muitos alunos escolheram imagens de satélite e denominaram como
mapas, outros selecionaram blocos esquemáticos, vistos em perspectiva, como se
fossem mapas, resquícios das confusões causadas pela diferenciação do ponto de vista.
Figura 9: Análise de reportagens de jornais feita pelos alunos da quinta série do Ensino Fundamental
REFLETINDO A PRÁTICA
Cartografar é uma atividade comum para o indivíduo na sociedade, ao longo da
nossa existência vamos desenvolvendo as representações sobre o espaço habitado e
mais tarde as relações sobre locais distantes. Todos precisam se localizar, conhecer,
descobrir e viver o espaço, seja para atividades cotidianas, viagens ou pelo sentido
existencial de pertencimento.
Ensinar cartografia é, portanto fornecer ferramentas para que a construção que
faz parte do convívio social não seja lembrada como cópia de mapas com alguma
informação, para não associar o uso de escala com aula de matemática, para que os
mapas não sejam apenas figuras desconexas trabalhadas na aula de Geografia.
Alfabetizar um aluno na leitura desse tipo de forma de comunicação é um trabalho
social, é possibilitar a ele a compreensão de um instrumento de síntese do espaço. É
instrumentalizar para a leitura de algo que visa representar um recorte espacial e que,
muitas vezes, é mais forte em seus estereótipos, na segregação, na reafirmação das
desigualdades sociais-espaciais do que textos com palavras.
Os mapas podem generalizar situações, marcar domínios e por sua face técnica e
científica pode ser tomado de credibilidade, sem ser submetido às críticas habituais de
um texto. As atividades práticas aqui pensadas visam atribuir significado à utilização de
mapas, visa manifestar-se favorável ao desenvolvimento de habilidades necessárias à
leitura desses, sem afastar-se do objetivo primordial que é fazer a leitura e apropriar-se
desse meio como forma de expressão e de crítica.
Para isso foram pensadas as vivências, aprender a partir da percepção e análise
do seu entorno. Partir do conhecido, das relações imediatas, do espanto por verificar que
o colega mora praticamente do lado da sua casa, para então relacionar lugares nos
mapas, para então apropriar-se dessa forma de representação. De acordo com
Castrogiovanni (2006):
“[...]não é possível aprendermos sobre o espaço somente com figuras penduradas em
sala de aula e com livros didáticos que apresentam conotações de locais específicos.
A análise da realidade social através da escola só é possível quando respeitamos o
imaginário, a fantasia, a identidade, a origem, as particularidades, inclusive as
subjetividades de quem aprende”.
Assim, o estudo da cartografia para ler o mundo que nos cerca, está fundamenta
na apropriação dos símbolos cartográficos, mas para a leitura além deles, além da mera
decodificação é necessário criar, recriar, brincar e explorar os mapas, os mapas prontos,
os mapas realizados pelos próprios alunos. A noção de espaço começa a ser construída
pelas relações mais próximas, quando estas estão aprendidas e bem fundamentadas,
passa-se com mais tranquilidade às mais complexas. Um aluno bem alfabetizado
cartograficamente é como um aluno bem alfabetizado na linguagem escrita: apropria-se
dela e interpreta qualquer forma de texto. Uma alfabetização cartográfica bem feita
fornece ao aluno instrumento para uma sua vida social enquanto indivíduo que interage
no espaço.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASTROGIOVANNI, A. C. Revisitando a alfabetização para trabalhar a geografia no ensino
fundamental. In: SHÄFFER, N. O (org). Ensinar e aprender Geografia. Porto Alegre: Associação dos
Geógrafos Brasileiros – Seção Porto Alegre, 1998.
CASTROGIOVANNI, A. C. (org). Ensino de Geografia: práticas e textualizações no cotidiano. Porto
Alegre: Mediação, 2000
CASTROGIOVANNI, A. C. & COSTELLA, R. Z. Brincar e cartografar com os diferentes mundos
geográficos: a alfabetização espacial. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006. 126P.
HEIDRICH, A. L. Cartografia no ensino de 1º Grau. In: CALLAI, H. C. (org). O ensino em estudos
sociais. Ijuí: UNIJUÌ Ed., 1991
KAERCHER, N. A. Ler e escrever a geografia para dizer a sua palavra e construir o seu espaço. In:
SHÄFFER, N. O (org). Ensinar e aprender Geografia. Porto Alegre: Associação dos Geógrafos
Brasileiros – Seção Porto Alegre, 1998.
LACOSTE, Y. A geografia, isso serve em primeiro lugar para fazer a guerra. Campinas: Ed. Papirus,
1988
SCORTEGAGNA, G. M. & BRANDT, C. F. O professor e seu papel na construção do espaço pela
criança. Disponível em: < > Acessado em 08/06/2009
STRAFORINI, R. Ensinar geografia: o desafio da totalidade-mundo nas séries iniciais. São Paulo:
Annablume, 2004