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9 788585 562441 ISBN:978-85-85562-44-1

Catálogo Ocupação CMU 30 Anos

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Catálogo da exposição em comemoração aos 30 anos do Centro de Memória - Unicamp, realizada no Museu da Imagem e do Som de Campinas.

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    ISBN:978-85-85562-44-1

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    OcupaoCMU

    30 anos

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    ReitorJos Tadeu Jorge

    Coordenador Geral da Universidade lvaro Penteado Crsta

    Coordenador da COCEN Jurandir Zullo Junior

    Diretora Maria Elena Bernardes

    Diretor AssociadoJos Ricardo Barbosa Gonalves

    Conselho CientficoMaria Elena Bernardes (presidente) Ana Maria Oda Ana Maria Reis de Ges Monteiro Andr Lus Paulilo Antnio Augusto Ferreira Carlos Alberto Cardovano Carmen Lcia Soares Eliana Moreira - Emlia Pietrafesa de Godoi Fernando Antonio Abraho Iara Lis Franco Schiavinatto Jefferson de Lima Picano Jorge Alves de Lima Jos Ricardo Barbosa Gonalves

    Josianne Francia Cerasoli Juanito Ornelas de Avelar

    FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CMU - UNICAMP

    Ocupao CMU 30 anos: catlogo da exposio / Iara Lis Schiavinatto e MariaOc8 Elena Bernardes (orgs.). - Campinas, SP: UNICAMP/CMU - Publicaes, 2015.

    Catlogo da exposio realizada no Museu da Imagem e do Som - Campinas, de 17 de julho a 22 de agosto de 2015.

    1. Centro de Memria UNICAMP Catlogos de exposio. 2. Centro de Memria UNICAMP Histria. .3. Campinas (SP) Histria. I. Schiavinatto, Iara Lis (org.). II.

    Bernardes, Maria Elena (org.). III. Universidade Estadual de Campinas. Centro de Memria.

    CDD 378

    ISBN:978-85-85562-44-1

    Reviso dos Textos Juliana Oshima Franco

    Projeto, Capa e Arte final Carlos Lamari

    Imagem da Capa Estao Cabras da Companhia Ramal Frreo Campineiro no distrito de Sousas, Campinas, SP, 1915. Documento: APS 1.9.640

    (Coleo V8, Grupo 1: Histria de Campinas, Srie 9: Transporte, Item: 640).

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    CMU - trs dcadas de histria no fomento pesquisa e na produo de conhecimento

    2015, ano 30 do Centro de Memria-Unicamp. Um marco especial, que nos inspira festejos e rememoraes. Festejar trs dcadas de um projeto poltico consolidado, que teve, desde o seu nascedouro, a misso de salvaguardar a mem-ria, sobretudo de Campinas, cidade que abriga a Unicamp, uma das mais renoma-das universidades brasileiras.

    H trinta anos, em 11 de julho de 1985, nascia oficialmente o CMU. Mas a ideia de criar um Centro no qual a universidade pudesse dialogar com a cidade de Campinas e colaborar para preservar sua memria surgiu mais de uma dcada antes, em 1972, quando o professor Zeferino Vaz, ento reitor da Unicamp, dele-gou tal empreitada ao historiador Jos Honrio Rodrigues. No entanto, o projeto s tomou fora seis anos mais tarde, quando o professor e historiador Jos Roberto do Amaral Lapa (1929-2000) foi alertado pelo tambm historiador Robert Slenes sobre um vasto acervo do Tribunal de Justia do Estado de So Paulo, da Comarca de Campinas, prestes a ser incinerado. Lapa, segundo seu relato1, j andava alarmado com a deteriorao da memria da cidade, e a iniciativa do Frum de Campinas de descartar seus arquivos cartoriais foi o motor que estimulou um grupo de pro-fessores, do qual ele fazia parte, a viabilizar o projeto da criao de um Centro de Memria na Unicamp.

    No final dos anos 70 e incio dos anos 80 do sculo XX, no processo de redemocratizao do pas, aps duas longas dcadas de um violento regime militar, a discusso do direito e dever da memria motivou a criao de inmeros projetos institucionais e diversas entidades assumiram responsabilidade pela coleta, organi-zao e preservao de vastos conjuntos documentais, pblicos ou privados, insti-tucionais ou particulares, na tentativa de construir e preservar a memria das lutas, das derrotas e das conquistas de grupos sociais antes expurgados do espao pblico.

    neste contexto que o Centro de Memria-Unicamp foi gestado, como um projeto poltico e intelectual de uma equipe de professores, liderada pelo professor Lapa, primeiro a assumir a direo do CMU. Talvez a escolha do seu nome, dentre o grupo de professores que estiveram na constituio do Centro, se deva ao fato do seu pertencimento a Campinas, cidade em que nasceu, viveu, e que elegeu para os seus estudos e reflexes historiogrficas. A ele, nestas trs dcadas, sucederam-se outros cinco diretores, os professores Olga Rodrigues von Simson, Paulo Miceli, Jos Roberto Zan, Maria Carolina Bovrio Galzerani (1949-2015) e a autora deste texto, Maria Elena Bernardes, que ocupa o cargo desde 2013.

    Professor Lapa atuou na direo do Centro por dez anos e como pesquisa-

    1 LAPA, J.R.A. Depoimento ao Museu da Imagem e do Som (Campinas) em 20/08/1985. In: SIMSON, O. R. V. (Org.). O Garimpeiro dos Cantos e Antros de Campinas, Campinas: CMU/Unicamp, 2000, p.49.

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    dor at o final de seus dias. Sua produo acadmica est vinculada ao CMU, onde atuou na organizao de grupos de estudos e pesquisas e, sobretudo, na captao de acervos documentais. Um cidado campineiro que garimpou, incansavelmente, junto a possveis doadores e colecionadores, documentos de variadas tipologias que, aos poucos, foram compondo o valioso e maior acervo documental sobre a cidade. Sua obra compreende quatorze livros publicados2, alm da organizao de outros dois e dos inmeros artigos escritos para revistas especializadas e para imprensa campineira e paulista. Entre os temas predominantes em sua produo esto a ci-dade de Campinas, o desenvolvimento do interior paulista, as economias colonial e cafeeira e a escravido. Sua ltima obra, Os excludos: contribuio histria da pobreza no Brasil: 1850-1930, foi publicada postumamente em 2008.

    Professora Olga iniciou suas atividades no CMU, a convite do professor Lapa, para integrar o Grupo de Pesquisa relativo aos Bairros Campineiros e atuar como diretora associada. Sua principal tarefa inicial foi a reorganizao e revitalizao do Laboratrio de Histria Oral, criado em 1986. Foi ela quem ficou na direo do CMU por mais tempo, incluindo o perodo em que atuou como diretora associada durante as gestes dos professores Lapa e Miceli. Diretora do Centro nos perodos de 1996-1998, 1998-2000 e 2002-2008, at hoje atua como pesquisadora asso-ciada. Assim como Lapa, Olga tem sua produo acadmica vinculada ao CMU: liderou uma equipe que organizou grupo de pesquisa e seminrios acadmicos e foi incansvel na divulgao do Centro. J Paulo Miceli, numa passagem rpida por pouco mais de um ano, no perodo de dezembro de 2000 a abril de 2002, contri-buiu para a importante manuteno do vnculo entre o CMU e o Instituto de Filosofia e Cincias Humanas da Unicamp (IFCH).

    Professor Zan foi o sucessor da professora Olga, responsvel pela direo de 2008 a 2010. Atento aos novos tempos vividos na universidade, iniciou a orga-nizao de tudo aquilo que precisava ser devidamente normatizado do ponto vista institucional. Neste sentido, cumpriu um papel importantssimo para a continuidade e o fortalecimento do Centro de Memria.

    Em seguida, a professora Maria Carolina assumiu a direo do CMU, onde iniciou e terminou sua produo intelectual. Foi uma das integrantes do Grupo de Es-tudos de Histria Regional (GER), nos anos oitenta, enquanto doutoranda e orientanda do professor Lapa, tendo assumido ali, a partir de 1993, a funo de coordenadora associada. Sua gesto na direo do CMU, entre 2010 e 2013, foi marcada pela sensibilidade com que conduzia as relaes interpessoais. Nos deixou como legado o Grupo de Pesquisa Kairs: educao das sensibilidades, histria e memria. O conceito de sensibilidades que vinha marcando sua produo est ancorado numa perspectiva histrica e cultural que se articula com a ideia de vises de mundo situadas historica-mente e atravessadas por dimenses tanto racionais quanto sensveis.

    Ao lado dos diretores, atuaram no CMU os diretores associados, os mem-bros do Conselho Cientfico, professores vinculados pesquisa, pesquisadores da carreira Pq, pesquisadores colaboradores, tcnicos, funcionrios administrativos e

    2 A bibliografia completa do professor Jos Roberto do Amaral Lapa pode ser conferida na pgina 17 deste catlogo.

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    estagirios das diferentes reas, sobretudo das Cincias Humanas, sendo impossvel nomear todos aqui.

    Ao longo desses 30 anos, o CMU consolidou-se como um centro de pesquisa e documentao. Reuniu um significativo acervo bibliogrfico e de arquivos institu-cionais e de pessoas composto por documentos textuais, fotogrficos, cartogrficos, sonoros e filmogrficos, datados entre o final do sculo XVIII e incio do sculo XXI. So documentos de interesse histrico, que possibilitam retraar as transformaes ocorridas na regio de Campinas desde os ciclos da cana-de acar e do caf, at a industrializao, constituindo uma matriz de informaes para estudos e pesquisas multidisciplinares relativas questo da memria e da histria. O atendimento ao pblico e o suporte de nossos acervos a pesquisas em variados nveis acadmicos, assim como a qualidade das aes formativas de estagirios e bolsistas e das aes de nossos tcnicos (seja nas visitas tcnicas para avaliao de acervos, ou na rea-lizao de oficinas), so exemplos do potencial que emerge a partir da experincia cotidiana dos trabalhos aqui realizados.

    Todo o acervo do Centro de Memria est processado e adequadamente acon-dicionado ou em fase de processamento tcnico. Em 2012, com a compra de um moder-no scanner planetrio, iniciamos a digitalizao e, em breve, ser possvel disponibiliz-lo online. Dentre os 1.300 metros lineares de variados documentos, destacamos as 80.700 imagens fotogrficas, quase todas digitalizadas e processadas; os mais de 80 mil pro-cessos, 3 mil livros manuscritos, dois mil rolos de microfilmes e 100 mil documentos avulsos, entre correspondncias, relatrios, documentos pessoais, recortes de jornais e plantas, distribudos em aproximadamente 150 conjuntos documentais; alm de um acervo oral de aproximadamente 850 horas de udio digitalizadas.

    Vale destacar tambm o acervo da Biblioteca do CMU, voltado para rea de Cincias Humanas, e especializado em histria regional, com foco na histria da ci-dade de Campinas. Nele podem ser encontrados livros publicados a partir de 1780, peridicos que integram colees de jornais e revistas, datados desde a segunda metade do sculo XIX at os dias atuais, e uma hemeroteca com cerca de 65.000 recortes de jornais diversos que esto disponibilizados para pesquisa.

    Provenientes de distintas reas do conhecimento, o CMU recebe anualmente cerca de 300 pesquisadores de diferentes nveis acadmicos, e so consultados em nossa Biblioteca, em mdia, 7.345 livros por ano. Alm disso, o Centro tambm atua na formao de recursos humanos nas reas da Arquivologia, Bibliotecono-mia, Conservao, Preservao e Restauro, por meio de um programa de estgios financiado pela Unicamp, e do encaminhamento de alunos pelo Departamento de Histria do IFCH, para cumprimento de estgio curricular.

    Desta maneira, o Centro de Memria - Unicamp vem sendo construdo coti-dianamente na formao de pessoas; na captao de acervos; na organizao e no processamento tcnico; no restauro e na preservao; na disponibilizao documen-tal; na organizao de eventos cientficos e exposies; na publicao de livros e pe-ridicos como a Resgate Revista Interdisciplinar de Pesquisa; bem como no fomento pesquisa e produo de conhecimentos, em que a relao entre as camadas

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    de tempo da cidade, amalgamadas a outras espacialidades e temporalidades, tem como eixo catalisador as questes relativas memria, com toda a polissemia que o termo envolve, sobretudo ao considerar-se sua dimenso multidisciplinar. Portanto, o CMU situa-se como um arquivo produtor de conhecimento e no um repositrio fechado de informaes sobre o passado.

    Na concepo do seu idealizador, o CMU foi organizado por reas de acor-do com o gnero documental. Aps uma importante reformulao em sua estru-tura, com o intuito de estabelecer uma unidade dos conjuntos documentais e uma comunicao dinmica com o usurio, o Centro de Memria passou a ser concebido como um centro de documentao e pesquisa com um nico acervo composto por diferentes tipologias documentais, mudana que deve ser consolidada ao longo dos prximos meses.

    Com muita satisfao por tudo que j foi realizado, comemoramos o ano 30 do CMU. Parabns a todos que construram o Centro ao longo destas trs dcadas, especialmente aos tcnicos, pesquisadores, funcionrios administrativos e estagi-rios que atuaram e atuam com seus saberes na constituio de to significativos processos de enraizamentos culturais.

    Atentos ao porvir, neste momento de rememorao enfrentamos o desafio de repensar, remexer e reinventar as nossas prticas cotidianas. Rememorar um ato poltico, nos ensina Walter Benjamin, com potencialidades de produzir um des-pertar dos sonhos, para a construo de utopias. Despertar que possibilita trazer imagens do passado vivido, como uma busca atenta aos rumos a serem construdos, sobretudo, no presente.3

    Maria Elena BernardesDiretora do Centro de Memria - Unicamp

    3 GALZERANI, M. C. B. A produo de saberes Histricos Escolares: o lugar das memrias. In: FERREIRA, A.C; BEZERRA, H.G., DE LUCA, T.R. (Orgs.). O Historiador e seu Tempo. SP: Unesp-ANPUH, 2008, p.230.

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    OCUPAO CMU no MIS1

    A OCUPAO CMU2, interessada em pensar o tema do arquivo, seu jogo de relaes, seus pontos cegos, aborda o CMU, sem se prender a um modelo de apresentao ou de reproduo de seus highlights. Nem por isso, em certa medida, as relaes passveis de serem travadas nesse arquivo, atra-vs da documentao ali salvaguardada, deixam de ser assinaladas em sua riqueza e potencialidade. H, nessa instituio, conjuntos documentais de dife-rentes abrangncias: falam de Campinas, tm alcance regional e/ou nacional e, mesmo tudo junto, misturado ou no, podem, de acordo com as indagaes do pesquisador, adquirir relevncias em escalas distintas como tem mostrado h tempos a microhistria.

    O CMU recebe, desde seu incio em 1985, a documentao de suportes diferentes e atravs de mltiplos canais de entrada podendo ser uma doao, compra ou aquisio por custdia. Em seguida, a documentao passa, via de regra, por algumas etapas de tratamento at ficar disposio do consulente.

    Ao passar a pertencer a um arquivo, compondo ou no um conjunto documental, o objeto documento ganha uma fora enorme de permanncia e uso. O arquivo potencializa a capacidade do documento ser reinvestido conti-nuamente de significado, de ser assim reatualizado. Nesse sentido, o arquivo funciona como uma instncia de autoridade com um discurso enunciativo que tem seus protocolos de verdade a respeito do real.

    Essa OCUPAO mais um modo de dar visibilidade e, assim, cele-brar os 30 anos dessa instituio. A visibilidade no neutra. Pelo contrrio, resulta de um processo intelectual e sensvel de escolhas, recortes, temas, dis-positivos narrativos, metodologias, intencionalidades levados a cabo por uma equipe especializada e, em parte, formada tambm no CMU. A curadoria po-deria falar apenas dos lbuns fotogrficos da Secretaria da Agricultura3, para mencionar um notvel conjunto documental do CMU. Todavia, em funo do MIS como lugar expositivo e, buscando um vnculo a mais com a experincia urbana de Campinas, tal qual tantas vezes o idealizador do CMU, o historiador Jos Roberto do Amaral Lapa ensejou, atentamos memria visual da cidade latente no CMU.

    O fato da OCUPAO poder ser vista como uma celebrao no um feito ideolgico que rasga elogios, que privilegia o heroico ou a procura do convencimento do outro atravs do impacto visual e esttico das boas qua-lidades das peas que podem ser expostas. A celebrao, nesse caso, busca

    1 Agradeo leitura amiga de Jos Alves Freitas Neto e Paula Senatore, alm das conversas com Silvana Rubino sobre OCUPAO.

    2 Arquivo e memria no se confundem aqui. No tempo presente, o arquivo parece ser cada vez mais chave operacional desse hiperinvestimento na memria e instncia de autoridade da verdade.

    3 SO PAULO (Estado). Secretaria da Agricultura, Comrcio e Obras Pblicas do Estado de So Paulo. Recenseamento Federal, 1920-1921. v. 1-15.

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    evidenciar a riqueza do acervo, o trabalho acumulado e cotidiano realizado por tcnicos, a constante preocupao em criar e sustentar o processo de aquisio de conjuntos documentais das mais variadas procedncias de roupas a textos , e o trabalho, enfim, com afinco para sua preservao, cata-logao, restaurao, publicizao, o que motiva e pauta seu uso qualificado em pesquisas.

    Essa instituio nasceu da ao do historiador e docente da Unicamp Jos Roberto do Amaral Lapa (1929-2000) e, sob a batuta de sucessivas dire-es, manteve seu projeto de montagem de um arquivo de pesquisa na Uni-camp. O primeiro ncleo da OCUPAO dedicado memria do projeto de Jos Roberto do Amaral Lapa e evidencia seu cotidiano de gabinete, tanto quanto seu afinco no interior dos acervos. Pesquisador traquejado em arquivos, ele soube propor um esquema institucional de acervo dentro da Unicamp que prima por outros acervos de porte. importante que se lembre que o CMU reconhece o trabalho de geraes de tcnicos e funcionrios que garantem a sustentao rotineira da instituio. Isso indica que, entre o projeto intelectual e as formas de operacionalizao e de renovao de seus projetos, h um intenso e perseverante cotidiano de trabalho arquivstico. Desta forma, a OCU-PAO celebra o mundo do trabalho a inserido e, em paralelo, relembra que o trabalho realizado no arquivo, na maior parte do tempo mido e silencioso, garante o acesso documentao e faz entrever outras e novas dinmicas de nossa experincia coletiva por meio dessa documentao recolhida.

    A OCUPAO pontua o projeto do historiador Jos Roberto do Amaral Lapa no tempo de sua fundao e a realidade do CMU no presente, agencian-do o projeto intelectual desse historiador com suas formas de operacionaliza-o e o processo de montagem e constante reelaborao do prprio acervo que , ao contrrio do que pode o senso comum presumir, um fenmeno vivo e, em si, um fato cultural e, nesse caso, acadmico.

    Nesse sentido, a celebrao uma reflexo que congrega o coletivo e escolhe a OCUPAO enquanto uma maneira de dar a ver e narrar o prprio acervo, procurando estabelecer um dilogo com a cidade na qual se inscreve e que, desde a primeira hora, foi um tema multifacetado dentro do CMU e da obra do prprio Amaral Lapa.

    A OCUPAO envolve ainda um time de tcnicos, estagirios, docentes da Unicamp que, nesses 30 anos, amide trabalharam e contriburam de formas distintas com eficcias de natureza e de variados graus para a consolidao e funcionamento do CMU. Acrescente-se a isso um conjunto de pesquisadores que estudou, consultou, escreveu no CMU, fazendo uso do acervo. Por seu turno, o acervo s adquire relevncia e significados sociais e intelectuais se for posto em uso, manipulado, revirado pelas questes do conhecimento, pelos interesses em ampliar o campo de visibilidade e compreenso sobre determinados saberes que passam a ser publicamente partilhados em sociedade por meio dessas mesmas pesquisas que, assim, retroalimentam a existncia do arquivo.

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    Nessa perspectiva, essa OCUPAO tenta aludir vida acadmica, documentao referente cidade de Campinas, produo intelectual e ao mbito da cultura visual que aqui se entrelaam. Indica, enfim, certo passado visvel nos arquivos pela documentao legada e certo presente de nosso coletivo, no qual nosso cotidiano se inscreve e tambm adquire senti-dos compartilhados. A OCUPAO privilegia, para estabelecer esse dilogo entre temporalidades (passados longnquos, passados recentes, o anterior, o agora, online, e outros mais), marcar uma dimenso visual da cidade. Tal dimenso hoje se encontra em parte desaparecida por tantas razes: porque foi posta abaixo; porque foi depredada; porque o tempo passou e envelhe-ceu, perdendo a graa; porque no dia a dia a poluio sonora, o trnsito pesado, o frenesi da cidade tambm dificultam ver e apreci-la; porque o transeunte est de passagem absorto em seus celulares, na prxima tarefa, na paixo da hora.

    Ento, a OCUPAO tambm celebra o ato de ver a e estar na cida-de, tal qual aparece fortemente no ltimo ncleo. Certamente, no so evo-cados saudosamente tempos melhores, mais felizes, da vida urbana. Longe disso, expe-se um conjunto de fotografias de momentos variados ao longo do sculo XX que mostram reas em runa, em construo, embelezadas, em franco processo de mudana, no intuito de dizer que todas so dinmicas de Campinas ao longo do sculo XX. A sequncia fotogrfica desse ncleo expli-cita que o acervo do CMU possibilita ver dimenses histricas da cidade que o simples estar nela, morar a, no viabiliza necessariamente. Percebe-se, assim, que um acervo ajuda a argamassar uma configurao identitria da cidade e expe algo que no se v mais ou muito. Permite o acesso a outras experincias temporais e alteridades que nos dizem respeito e ainda nos (in)for-mam em certa medida.

    O terceiro ncleo da OCUPAO alude aos procedimentos, nem sempre visveis e enunciados, das prticas de pesquisa nos arquivos. O mapa do Brasil apresenta a localizao de profissionais, hoje na maioria profes-sores universitrios, que fizeram suas dissertaes e teses pesquisando no CMU. Depois, muitas dessas pesquisas se desdobraram em livros. O mapa retrata a capacidade de formao de quadros universitrios qualificados pela Unicamp, aliando o CMU e seu sistema de ps-graduao, e a disseminao desses quadros por vrias partes do pas. Da, a escolha de mostrar o mapa desses profissionais ao lado dos estgios da pesquisa e da escrita que vo do documento tese e ao livro, considerando que entre eles h uma interlocuo continuada. Alm disso, as pesquisas realizadas e publicadas suscitam, de preferncia, outras obras acadmicas ou no que, por sua vez, podem voltar a consultar a documentao do CMU. Essa interlocuo entre obras, teses, dissertaes, documentao renova os sentidos do prprio CMU, basculan-do-os. Tais prticas esvaziam a noo do arquivo como algo mumificado, empoeirado, menor. Pelo contrrio, os mesmos e novos leitores, pesquisa-

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    dores, consulentes podem redimensionar os sentidos do acervo e respondem ao presente ao reformular os regimes de verdade da documentao. De todo modo, dentro da tese e do livro, mora a documentao compulsada; por de-corrncia, o arquivo.

    O espectador da OCUPAO, por vezes leitor desse catlogo, pode se indagar sobre a presena do lambe-lambe em meio OCUPAO. Primeiro, ele ocupa um lugar expositivo estratgico no amplo espao do MIS, tecendo um comentrio visual ao CMU. Porque o lambe-lambe manipula imageticamente, atravs da gravura, as imagens do prprio acervo do CMU. O lambe-lambe simula a ao de quem consulta, mexe, cita, reescreve a documentao. Ele faz as vezes do livro, da dissertao, da tese, que estabelece uma fala entremeada documentao, recuperando-a, reatualizando-a, sem obrigatoriamente ser sua cpia mais fiel e obediente.

    O lambe-lambe alude tambm a essa massa documental, predominan-temente em papel, do CMU, sinalizando uma forte cultura do papel impresso, manuscrito, fotogrfico, avulso, encadernado etc. em sua materialidade e, at, suas condies de permanncia. Em si, o arquivo funda-se e mantm-se sob esse signo da repetio seja da simples cpia que o pesquisador faz do docu-mento ou ao entretec-lo a seu texto , da reproduo e/ou da (re)impresso.

    Se o acervo d a ver uma cidade por sua vez, um objeto de estudo em parte subsumida, esmaecida e at desaparecida em nossos cotidianos e se ele, em si, uma fase importante do trabalho acadmico realizado que se espraia pelo pas, nele ainda residem experincias e vnculos que podem ser re-articulados. Nessa direo, a OCUPAO expe uma produo cinematogr-fica realizada em Campinas na altura de 1957 e as diversas sries documentais de suportes vrios que permitem rastre-la e conhec-la: o cartaz do filme Ferno Dias, o filme exibido, a entrada do cinema, as notcias de jornal sobre a pelcula, a contabilidade do filme e as fotografias da obra. O visitante nota as vrias sries documentais, previamente selecionadas dentro do CMU, aqui expostas que tratam dessa experincia cinematogrfica, desde sua produo sua divulgao, passando por manuscritos. Ora, o visitante pode entretecer, tal qual faria no arquivo, as relaes entre esses documentos que permitem saber mais sobre tal filmografia e, desta maneira, percebe que, dentro do arquivo, muitas vezes, as sries documentais entretecem tramas histricas entre si. Sob sua perspectiva, o visitante nota que a inteligibilidade de algo, no caso o filme Ferno Dias, entremeia-se sua reflexo intelectual, sensvel e passvel de ser conjugada a uma fruio esttica. Logo, o acervo tambm fala de nossas ca-pacidades cognitivas e dos modos de conhecer, como uma experincia em si, datada, e relevante no meio da cidade. Mais ainda, o visitante percebe que o arquivo implica, principalmente, a constituio de um lugar de autoridade sobre a experincia vivida, e o visitante protagonista desse processo.

    Iara Lis Schiavinatto Instituto de Arte - Unicamp

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    Funcionrios e estagirios no ano de comemorao dos 30 anos do Centro de Memria-Unicamp, Campinas, SP, 2015.Fotografias de Antnio Augusto Ferreira.

    O Centro de Memria - Unicamp comemora seus 30 anos com uma OCUPAO. Ela permite mostrar e narrar com gestos, palavras e imagens alguns aspectos fundamentais sobre o fun-cionamento desse arquivo, formado por diversos conjuntos documentais: textos impressos e manuscritos, imagens em vrios suportes, documentos sonoros e objetos. Um acervo que, a partir das inquietaes dos que a ele recorrem, passa a adquirir novos sentidos e nuances, ressignifi-cando o passado e o presente.

    OCUPAO CMU - 30 anos 1985-2015

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    CMU - UM PROJETO INTELECTUAL

    No primeiro ncleo da OCUPAO, somos convidados a revi-sitar o projeto intelectual que deu origem ao CMU e que est entrelaado ao trabalho de seu fundador, Jos Roberto do Amaral Lapa. Responsvel pela concepo de um esque-ma institucional para o acervo, ele contou com a dedicao dos profissionais que fizeram e fazem parte da equipe do Centro, cuja atuao tem sido fundamental para a realizao e constante renovao das ini-ciativas e projetos que fazem parte desta trajetria.

    Professor Jos Roberto do Amaral Lapa e equipe de arquivistas nos primrdios do Centro de Memria-Unicamp, Campinas, SP, 1985. Fundo Centro de Memria-Unicamp.

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  • 16Professor Jos Roberto do Amaral Lapa na Bibioteca do Centro de Memria-Unicamp, Campinas, SP, cerca 1985. Fundo Centro de Memria-Unicamp

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    BibliografiaBibliografiaJos Roberto do Amaral Lapa (1929-2000)Os excludos: contribuio histria da pobreza no Brasil: 1850-1930. Campinas: Editora da UNICAMP; EDUSP, 2008. 245 p.

    A cidade: os cantos e os antros: Campinas 1850-1900. So Paulo: USP, 1996. 361 p.

    O sistema colonial. So Paulo: tica, 1991. 112p. (Srie Princpios, 209).

    (O) mercado urbano de escravos (Campinas - segunda metade do sculo XIX). Campinas: UNICAMP/IFCH, 1991. 50p. (Primeira verso; n.37)

    Histria e historiografia: Brasil ps-64. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. 110p. (Coleo Estudos brasileiros, v.87).

    A economia cafeeira. So Paulo: Brasiliense, 1983. 120p. (Coleo Tudo e histria, 72).

    O antigo sistema colonial. So Paulo: Brasiliense, 1982. 110p. (Primeiros voos, 8).

    Livro da Visitao do Santo Ofcio da Inquisio ao Estado do Gro-Par (1763-1769). Petrpolis: Vozes, 1978. 278p. (Histria brasileira, 1).

    (O) Brasil e a navegao portuguesa para a sia: sculos XVI, XVII e XVIII.Marilia: USP/FFCL, 1968. 173 p. (Estudos histricos; v.7).

    A histria em questo: historiografia brasileira contempornea. Petrpolis: Vozes, 1976. 204 p.

    Economia colonial. So Paulo: Editora Perspectiva, 1973. 299 p. (Coleo Debates).

    A Bahia e a carreira da ndia. So Paulo: Comp. Ed. Nacional, 1968. 382 p. (Brasiliana, 338).

    Misso do Sangradouro. So Paulo: Saraiva, 1963. 145 p. (Coleo Saraiva, 185);

    De vria leitura. Campinas: ACL, 1959. 76 p. (Publicaes da Academia Campinense de Letras, 8).

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    A TRAMA dOS CONJUNTOS dOCUMENTAIS E UMA ExPERINCIA CINEMATOgRFICA EM CAMPINAS

    Ferno Dias (1957) foi uma produo cinematogrfica rodada em Campinas, com direo de Alfredo Roberto Alves, fundador da Cine Produtora Campi-neira (CPC) empresa que, apesar do curto perodo de existncia, marcou a stima arte realizada no interior paulista.

    No conjunto documental da

    produtora, doado ao CMU em

    1991, possvel adentrar ao uni-

    verso do filme a partir de diferen-

    tes tipos de documentos. Fotogra-

    fias das gravaes, anncios vei-

    culados na imprensa, contratos e

    contabilidade da obra, ingressos

    e cartazes das exibies e, logica-

    mente, o prprio filme, compem

    este ncleo da OCUPAO, e

    exemplificam a riqueza das dimen-

    ses evocadas, no somente por

    cada um desses tipos documentais,

    mas, sobretudo, pelo dinmico di-

    logo entre eles.

    Cartaz de divulgao do filme Ferno Dias. Coleo Cine Produtora Campineira.

  • 19

    Contrato de locao de indumentria e outros bens utilizados na produo do filme Ferno Dias, Campinas, SP, 5 de maio de 1954. Coleo Cine Produtora Campineira.

    Ingresso para o filme Ferno Dias no Cine Ouro Verde, Campinas, SP, cerca de 1957. Coleo Cine Produtora Campineira.

    Convocatria de teste para atuar no filme Ferno Dias. Correio Popular, Campinas, 17 de janeiro de 1954. Coleo Cine Produtora Campineira.

    A atriz Mara Mesquita em cena do filme Ferno Dias. Coleo Cine Produtora Campineira, 1956.

    Cena do filme Ferno Dias. Coleo Cine Produtora Campineira, 1956.

  • 20

    Galeria de Demonstrao de Mquinas da Diretoria de Indstria e Comrcio, So Paulo, SP, cerca de 1907. Coleo Secretaria da Agricultura, Comrcio e Obras Pblicas do Estado de So Paulo.

  • 21

    No mapa do Brasil, esto assinalados os lugares onde atuam docentes que, em vrios momentos de suas carreiras, pesquisaram ou pesquisam no CMU. Ele mostra a capacidade de irradiao de profissionais pelo pas a partir da Unicamp.

    Capa do livro Arquitetura do Caf, de Andr M. Argollo Ferro, publicado em 2004 pela Editora da Unicamp e Imprensa Oficial do Estado.

    dOS CONJUNTOS dOCUMENTAIS AOS LIVROS: UMA HISTRIA dE PROdUO INTELECTUAL

    Desde sua criao, o acervo do Centro de Mem-ria Unicamp foi constitudo a partir da doao, compra ou aquisio por custdia de documen-tos. Para que seja disponibilizada para pesquisa, no entanto, toda documentao passa por um cuidadoso processo de tratamento, de modo a garantir sua per-manncia e uso.

    Ao fazerem parte de um arquivo, os documen-tos ganham fora, e se abrem aos sentidos e interpretaes que cada pesquisador lhes atribui. Assim, no terceiro n-cleo da OCUPAO, a inten-o compartilhar os desdo-bramentos possveis a partir de um mesmo documento, enfati-zando os mltiplos significados que emergem cada vez que ele utilizado como fonte de pes-quisa, resultando numa tese e, depois, num livro.

  • 22

    O ltimo ncleo da OCUPAO apresenta um conjunto de fotografias que mostram Campinas em runas, em construo, embelezada, ou em franco processo de mudana, enfatizando que todas essas so dinmicas da cidade ao longo do sculo XX. A sequncia fotogrfica explicita que o acervo do CMU possibilita ver dimenses histricas da cidade por vezes escamoteadas ou esquecidas.

    A CIdAdE QUE O ARQUIVO POdE dAR A VER

  • 23

    Palcio dos Azulejos, Campinas, SP, dcada de 1970. documento: JCM 473 (Coleo Joo Caetano Monteiro Filho, Item 473).

  • 24

    Cine Voga, Campinas, SP, dcada de 1940. documento: APS 1.11. 876 (Coleo V8, grupo 1: Histria de Campinas, Srie 11: Avulsas-Campinas, Item: 876).

    Dia do padeiro rua Antnio Cezarino, Campinas, SP, 1892. documento: APS 1.2.358 (Coleo V8, grupo 1: Histria de Campinas, Srie 2: Campinas-Histria, Item: 358).

  • 25

    Despedida dos bondes, Campinas, SP, 1968, foto V8. documento: APS 1.9.449 (Coleo V8, grupo 1: Histria de Campinas, Srie 9: Transporte, Item: 449).

    Pombos no Largo do Rosrio, Campinas, SP, entre 1954 e 1960, foto V8. documento: APS 1.1.184 (Coleo V8, grupo 1: Histria de Campinas, Srie 1: Campinas Antiga, Item: 184).

  • 26

  • 27

    A questo do arquivo no uma

    questo do passado. No se trata de um

    passado que estaria nossa disposio.

    uma questo do futuro, uma

    questo do futuro em si, a questo da recepo, da

    promessa e da responsabilidade

    pelo futuro.

    Jacques Derrida

    Praa Carlos Gomes, Campinas, SP, 1920, Estdio Forster. documento SACOP 183 (Coleo Secretaria da Agricultura, Comrcio e Obras Pblicas do Estado de So Paulo, Item 183).

    Visite o site: www.cmu.unicamp.br

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  • 28

    Coordenao Geral

    Curadoria

    Consultoria Tcnica

    Coordenao Executiva

    Comisso OrganizadoraAnA CludiA CermAriA

    CssiA denise GonAlvesemA elisAbete CAmiloFernAndo AbrAhoJoo PAulo bertomirdzA siChmAnnriCArdo oliveirA

    rosAelenA sCArPelineAntnio AuGusto FerreirA (edio de imAGens)

    mAriA elenA bernArdes

    iArA lis sChiAvinAtto

    AnA mAriA Goes monteiro e lyGiA eluF

    mArli mArCondes

    AgradecimentosKlber mourA F e sniA FArdin (mis CAmPinAs)

    dAnilo Perillo (lAborAtrio de GrAvurA iA/uniCAmP) luCilA vieirA (QuAdrAnte GAleriA)

    Local

    museu dA imAGem e do som de CAmPinAs - misruA reGente FeiJ, 859 | Centro - CAmPinAs, sP | (19) 3733-8800

    Perodo

    de 17 de Julho A 22 de AGosto de 2015terA A sextA, dAs 10h s 18h

    sbAdos, dAs 10h s 16hentrAdA GrAtuitA

    PatrocnioFAePex - Fundo de APoio Ao ensino, PesQuisA e extenso / GAbinete do reitor - uniCAmP / GGbs - uniCAmP

    ApoioPreFeiturA muniCiPAl de CAmPinAs museu dA imAGem e do som de CAmPinAs (mis)

    We Print! Fine Art

    RealizaouniversidAde estAduAl de CAmPinAs - uniCAmP

    CoordenAdoriA dos Centros e nCleos interdisCiPlinAres de PesQuisA dA uniCAmP - CoCenCentro de memriA - uniCAmP

    Ocupao CMU - 30 anos