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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 1 Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira Sergio Margulis BANCO MUNDIAL - Brasil Julho 2003 BANCO MUNDIAL Trabalho em andamento para discussão pública Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized Public Disclosure Authorized

Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira€¦ · Avanço da Fronteira Especulativa e o Processo dos Desmatamentos Determinantes da Ocupação da Amazônia: um Modelo Econométrico

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 1

Causas do Desmatamento daAmazônia Brasileira

Sergio Margulis

BANCO MUNDIAL - BrasilJulho 2003

BANCO MUNDIALTrabalho em andamentopara discussão pública

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira2

© Banco Mundial - Brasília, julho, 2003

As opiniões, interpretações e conclusões aqui apresentadas são dos autores e não devem ser atribuídas,de modo algum, ao Banco Mundial, às suas instituições afiliadas, ao seu Conselho Diretor, ou aos paísespor eles representados. O Banco Mundial não garante a precisão da informação incluída nesta publicação

e não aceitaresponsabilidade alguma por qualquer conseqüência de seu uso.

Exemplares adicionais deste documento podem ser solicitados diretamente ao autorou ao ainda ao Escritório de Brasília.

É permitida a reprodução total ou parcial do texto deste documento, desde que citada a fonte.

Foto da capaDr. Luiz Antonio de Oliveira, Ph.D

Coordenação de Pesquisas em Ciências AgronômicasINPA - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia

RevisãoLilian Santos, Mírian Felicio e Karen Ravanelle

Editoração, fotolitos e impressãoEstação Gráfica - www.estagraf.com

Banco MundialSCN Quadra 2 Lote A

Ed. Corporate Financial Center, cj. 303/30470712-900 - Brasília - DF

Fone: (61) 329 1000www.bancomundial.org.br

Banco Mundial

Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira - 1ª edição -Brasília - 2003

100p.ISBN: 85-88192-10-1

I - Autor: Margulis, Sergio.

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Índice

Siglas e Abreviaturas

Prefácio

Agradecimentos

Resumo

SUMÁRIO EXECUTIVO

1. MOTIVAÇÃO DO ESTUDO

2. DESMATAMENTOS E USO DO SOLO NA AMAZÔNIA: EVIDÊNCIAS SOBRE APECUÁRIA DE GRANDE ESCALATendência Temporal dos DesmatamentosPadrões Espaciais em Nível MunicipalEvolução do Uso do Solo na Amazônia LegalContribuições das Áreas Desmatadas Grandes e Pequenas aos DesmatamentosEvolução do Rebanho BovinoBenefícios Sócio-Econômicos dos Desmatamentos: Evidências Preliminares

3. DIFERENTES FRONTEIRAS E DINÂMICAS ECONÔMICO-SOCIAIS:DETERMINANTES DA OCUPAÇÃO DA AMAZÔNIAAvanço da Fronteira Especulativa e o Processo dos DesmatamentosDeterminantes da Ocupação da Amazônia: um Modelo Econométrico

4. A MICROECONOMIA DA PECUÁRIA DE CORTE NA AMAZÔNIAA Economia da Pecuária de Corte na Amazônia – Breve RetrospectivaA Pesquisa de CampoParâmetros Técnicos AdotadosCustos de Produção – PastagensReceita Líquida por HectareAnálise da RentabilidadeModelagem Matemática

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Algumas SimulaçõesConsiderações Finais e Tendências

5. CUSTOS E BENEFÍCIOS SOCIAIS DOS DESMATAMENTOSIncentivos Governamentais – Subsídios Fundamentais à Pecuária e aos Desmatamentos?Estimativa do Custo Econômico (Social) dos Desmatamentos na AmazôniaAlternativas Sustentáveis: Comparando Custos e Benefícios

6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

REFERÊNCIAS

ANEXO

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Siglas e Abreviaturas

ADAAMCAMLARPACEPEACGIARCSRESALQFAOFEMAFINAMFNOFPEFPMFUNAIGEIPOTIBAMAIBGEICMSIMAZONINCRAINPEIPAMIPEAITERPAMFSMMAMTPAPIBPPG7PROARCO

PROBIO

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Agência de Desenvolvimento da AmazôniaÁreas Mínimas ComparáveisAmazônia LegalProjeto de Áreas Protegidas da Região AmazônicaCentro de Estudos Avançados em EconomiaGrupo Consultivo de Pesquisa Agropecuária InternacionalCentro de Sensoriamento Remoto do IBAMAEscola Superior de Agricultura Luiz de QueirozOrganização das Nações Unidas para a Agricultura e AlimentaçãoFundação Estadual do Meio Ambiente do Mato GrossoFundo de Investimento da AmazôniaFundo Constitucional de Financiamento do NorteFundo de Participação dos EstadosFundo de Participação dos MunicípiosFundação Nacional do ÍndioEmpresa Brasileira de Planejamento de TransportesInstituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais RenováveisInstituto Brasileiro de Geografia e EstatísticaImposto sobre Circulação de Mercadorias e ServiçosInstituto do Homem e Meio Ambiente da AmazôniaInstituto Nacional de Colonização e Reforma AgráriaInstituto Nacional de Pesquisas EspaciaisInstituto de Pesquisa Ambiental da AmazôniaInstituto de Pesquisa Econômica AplicadaInstituto de Terras do ParáManejo Florestal SustentávelMinistério do Meio AmbienteMato GrossoParáProduto Interno BrutoPrograma Piloto Para a Proteção das Florestas Topicais do BrasilPrograma de Prevenção e Controle de Queimadas e Incêndios Florestaisna Amazônia LegalPrograma de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade BiológicaBrasileiraRondônia

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SIDRASPSUDAMTIRUAUFPAUSPUNCTADVPL

Sistema IBGE de Recuperação Automática (Pesquisa Pecuária)São PauloSuperintendência do Desenvolvimento da AmazôniaTaxa Interna de RetornoUnidade AnimalUniversidade Federal do ParáUniversidade Federal de São PauloUnited Nations Conference on Trade and DevelopmentValor Presente Líquido

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Prefácio

s riquezas naturais do Brasil são legendárias. O País tem o maior bioma de floresta úmida do mundo, a Amazônia, que

contém de longe a maior parcela das florestas úmidas remanescentes. A Amazônia Legal cobre cerca de 60% do território brasileiro e abriga 21 milhões de habitantes, 12% da população total, dos quais 70% vivem em cidades e vilarejos. O Brasil também tem o maior manancial de água doce do mundo, e a região amazônica sozinha responde por quase um quinto das reservas mundiais. O uso sustentável dessas enormes riquezas não apenas garantiria os recursos para o futuro, como poderia ser também uma fonte de maior eqüidade e redução de pobreza, uma vez que os recursos naturais representam uma proporção muito maior dos bens dos pobres (cerca de 80%) do que dos ricos. O interesse pela sustentabilidade é aumentado pelas taxas de desmatamento da Amazônia. Da cobertura florestal original, 17% foram desflorestados, embora pelo menos um terço desse total esteja se recuperando. Seu valor global pode ser visto em sua rica biodiversidade e no possível impacto climático decorrente de seu desaparecimento. A crescente ameaça a ecossistemas chave é ilustrada por dados preliminares que indicam um desmatamento de 25.400 km2 em 2002, em comparação com uma média de 17.340 km2 observada na década precedente. O quase desaparecimento da Mata Atlântica brasileira também indica a urgência de ações. Algumas experiências mundiais e no Brasil com o uso sustentável de recursos naturais poderiam servir de base para uma estratégia ambiental com inclusão social. Os fatores por trás do uso não sustentável dos recursos naturais, no entanto, são complexos. É importante compreender estes fatores para se implantar ações efetivas. A região amazônica enfrenta uma grande gama de desafios, incluindo a falta de consenso sobre estratégias de desenvolvimento; falta de serviços sociais, infra-estrutura e transporte adequados; ambigüidades sobre direitos de propriedade e conflitos de uso da terra; rápida urbanização e baixa qualidade de vida nas cidades; dificuldades para controlar desmatamentos e queimadas; o papel das

comunidades indígenas no desenvolvimento e na gestão ambiental; baixa capacidade institucional e governança fraca – e uma expansão não planejada da pecuária e da agricultura. Este estudo é uma contribuição singular, na medida em que sugere que, em contraste com as décadas de 70 e 80, quando a ocupação da Amazônia brasileira era largamente induzida por políticas governamentais e subsídios, grande parte do desmatamento recente parece resultar da pecuária de grande e médio portes, que é crescentemente rentável e dominada por agentes poderosos. O estudo enfatiza que não bastam as boas intenções, mas é essencial compreender os fortes interesses privados que causam o crescente desmatamento, e adotar políticas que levem esses interesses em conta em suas ações. Seria também essencial promover o desenvolvimento de atividades econômicas alternativas e complementares que sejam mais sustentáveis e eqüitativas que as atuais. Controlar o livre acesso no interior, ao mesmo tempo em que se promove o uso sustentável das áreas florestadas, parece chave para evitar danos ainda pouco conhecidos e que podem excluir opções futuras. Ao interligar políticas ambientais e sociais, o Brasil poderia proteger uma parte considerável da floresta amazônica remanescente, melhorar as condições de vida e responder aos anseios da população local. De maneira geral, existe o reconhecimento da necessidade de melhores políticas e instituições mais fortes para fazer a gestão dos recursos naturais. Uma parcela crescente da sociedade brasileira apóia políticas ambientais mais consistentes. Tudo isto poderia ser apoiado por meio de investimentos públicos e privados aos níveis federal, estadual e municipal, bem como por análises de políticas, trocas de conhecimento, criação de consenso e promoção de parcerias. Uma grande oportunidade para guiar as contribuições do Banco Mundial pode ser o programa federal Amazônia Sustentável, com suas ligações com o PPA, e a Estratégia de Assistência ao País (CAS) do Banco.

Vinod Thomas Diretor para o Brasil

Vice Presidente do Banco Mundial

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Prefácio

Este estudo se insere no contexto das discussõessobre as causas e a dinâmica do desmatamentona Amazônia brasileira, iniciada no Ministério

do Meio Ambiente em 2000, e que contou, desde oinício, com o apoio do Banco Mundial. O objetivodestes debates era buscar uma coerência maior entrea compreensão dos fatores associados à expansão dosdesmatamentos e as políticas públicas formuladas paracontê-los.

Duas constatações estavam subjacentes a estainiciativa: a primeira, que as informações agregadassobre as taxas de desmatamento da Amazônia Legal,divulgadas de dois em dois anos pelo InstitutoNacional de Pesquisas Espaciais (INPE), emboracontribuíssem para a compreensão do fenômeno aolongo do tempo, não permitiam a formulação depolíticas visando uma intervenção imediata noprocesso; a segunda, que a interrupção dos subsídiosfiscais e financeiros predominantes na década de 1970,considerados uma das causas determinante para ocrescimento dos desmatamentos, não havia gerado oresultado esperado. Ou seja, mesmo sem esse tipo deestímulo, os desmatamentos continuavam em ascenção.

Estas observações motivaram a Secretaria deCoordenação da Amazônia a reunir especialistas paradebater e estimular novas investigações, orientadaspara subsidiar mudanças nas políticas implementadaspelo Ministério. Era preciso desagregar os dados dodesmatamento por estados e municípios, compreendera dinâmica associada às diferentes atividadeseconômicas em expansão, e investigar as forças sociaise políticas que estavam agindo em contextosespecíficos, especialmente naqueles que exerciam maisinfluência sobre o crescimento das taxas.

A proposta deste trabalho, de estudar “Causas doDesmatamento da Amazônia Brasileira”, surgiu nestecontexto. E a questão central a que ele se propôsinvestigar foi o papel da pecuária, a dinâmicaeconômica e a rentabilidade a ela associadas, naexpansão dos desmatamentos. Se não existemincentivos fiscais, outros fatores estariam tornandoviável essa atividade, razão pela qual ela continua seexpandindo sobre novas áreas de florestas. Pararesponder a esta e a outras questões, o estudo analisao comportamento micro-econômico da pecuáriainserindo esta atividade na dinâmica de expansão dafronteira agropecuária e madeireira, em uma dasfrentes mais importantes de ocupação econômica daregião, a Amazônia Oriental. Além disso, procuracomparar os ganhos econômicos com os custos sociaise ambientais associados e insere na análise a dinâmicasócio-econômica dos atores sociais envolvidos com aexpansão dessa fronteira. Não se pode esquecer que,na Amazônia, a economia agropecuária se beneficiade ganhos indiretos advindos da precária regularizaçãofundiária, da grilagem de terras públicas, da contrataçãoirregular de mão-de-obra e do processo de permanenteabertura de novas áreas de floresta realizado a baixoscustos por posseiros e pequenos agricultores, que vãopreparando o terreno para os investimentos maisrentáveis que os sucedem.

Embora iniciado há dois anos, existe uma grandeatualidade na discussão apresentada neste estudo. Deacordo com a projeção realizada pelo INPE, entre2001 e 2002, o desmatamento na Amazônia passoude 18.166 km2 para 25.476 km2, o segundo maiorincremento desde 1995. Esse fato, por si só, tornarelevante a leitura e a discussão deste trabalho pelascontribuições que traz tanto no diagnóstico quanto

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na proposição de políticas públicas. Esperamos queesta iniciativa estimule o surgimento de outros estudos,de novas pesquisas de campo, de investigaçõespreocupadas com a busca de soluções viáveis que

possam influenciar as decisões não somente da áreaambiental do governo mas, principalmente, dosformuladores das políticas de desenvolvimentoregional.

Mary Helena AllegrettiSecretária de Coordenação da Amazônia

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Agradecimentos

Atentativa de melhor entender a racionalidadeeconômica do desflorestamento da Amazônia brasileira é parte de um processo que se

iniciou há quase duas décadas, em que que o BancoMundial vem buscando ajudar o governo a elaboraralternativas de desenvolvimento sustentável para aregião. Pouco assuntos podem ser tão fascinantes naagenda ambiental global. Talvez por isto, poucostrabalhos do Banco Mundial tenham tido tantascontribuições e uma revisão tão criteriosa. Várioscolegas se engajaram neste processo para garantir aclareza das idéias e dos resultados técnicos aquiapresentados. Neste sentido, agradecimentos pessoaisa Robert Schneider (em particular), Eustáquio Reis,Chris Diewald, Ken Chomitz, Joachim von Amsberg,John Redwood e Luis Gabriel Azevedo.

O trabalho baseou-se em 5 “background papers”desenvolvidos em equipes lideradas por GeraldoSant’Ana de Camargo Bastos e Sergio de Zen(ESALQ), Eustáquio Reis, Ronaldo Seroa da Motta(IPEA), Pablo Pacheco (IPAM/CIFOR) e EdnaCastro (UFPA), a quem devo parabenizar e agradecerpela qualidade dos trabalhos.

Além destas, a lista de pessoas a quem devo agradeceré enorme e não poderia fazer justiça a todasindividualmente, ou às instituiçõs que representam.Da Secretaria de Coordenação da Amazônia/MMA,com quem discuti desde o início as motivaçõesoriginais e a relevância do tema: Mary Allegretti,Vanessa Fleischfresser, Mario Menezes, Katia Costae Brent Milikan.

Colegas do Banco Mundial em condições ecircunstâncias diversas: Adriana Moreira, Dan Biller,

Claudia Sobrevila, Gregor Wolf, Ricardo Tarifa, JoeLeitmann, Daniel Gross, Robert Davis, Teresa Serra,Gunnar Eskeland e Vinod Thomas.

Das visitas de campo à Amazônia: Jonas Veiga, JudsonValentim, Alfredo Homma, Marisa Barbosa(EMPBRAPA), Marky Brito, Paulo Barreto, EugenioArima, Adalberto Veríssimo (IMAZON), LarissaChermont, Ana Cristina Barros, Anne Alencar,Ricardo Melo, Cassio Pereira, Erivelto Lima, JoséBenatti (IPAM), Merle Faminow (IDRC), Jorge Orsi(SPRN-RO), Frederico Muller, Paulo Leite, GinaValmorbida (FEMA-MT), Philip Fearnside (INPA).

Comentários, informações e dados técnicos: DiógenesAlves (INPE), Claudio Ferraz, Marcia Pimentel, AjaxMoreira (IPEA), Nilson Ferreira (IBAMA), DavidKaimowitz, Sven Wunder (CIFOR), Hans Jansen(IFPRI), Dennis Mahar, Nigel Smith (U.of Florida),Jean Tourrand (CIRAD), Fernando Rezende, GordonHughes, Cornelis de Haan (consultores), AlvaroLuchiezi (WWF).

Agradecimento a FAO pelo financiamento de parteda pesquisa, particularmente a Henning Steinfeld quetambém participou de discussões técnicas.

Agradecimentos a Lilian Santos, Mírian Felicio eKaren Ravenelle na ajuda do trabalho de edição eimpressão, e a John Penney, pela tradução.

Gostaria de agradecer ainda aos inúmeros pecuaristas,madeireiros, fazendeiros e administradores queentrevistamos em diversas cidades na pesquisa decampo, os quais seria impossível listar individualmente– com eles aprendi uma nova perspectiva do problema,

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sendo grato também pela cordialidade com quesempre fomos recebidos.

Finalmente, ainda que tenha recebido ajuda ecomentários construtivos de tantos colegas, os

resultados e opiniões aqui apresentados são de inteiraresponsabilidade do autor, não ref letindo,necessariamente, pontos de vista das pessoas acima,das instituições que trabalham ou representam, e emparticular do Banco Mundial.

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Resumo

Apreocupação mundial com os desmatamentosda Amazônia brasileira é em parte motivadapela imagem de um processo destrutivo no

qual os benefícios econômicos e sociais são menoresque as perdas ambientais. Essa percepção é tambémsubjacente aos diagnósticos, formulação e avaliaçãodas políticas públicas propostas pelas organizaçõesgovernamentais e não-governamentais que atuam naregião, incluindo o Banco Mundial. Este trabalhosugere, contudo, que esta percepção é em parteequivocada, principalmente no tocante ao diagnósticodas motivações e aos agentes responsáveis pelosdesmatamentos, na avaliação dos benefícioseconômicos e sociais do processo e, por conseguinte,nas implicações de políticas públicas para a região.

O objetivo desse relatório é mostrar que,diferentemente das décadas de setenta e oitenta,quando a ocupação econômica foi induzida porincentivos e políticas governamentais, osdesmatamentos recentes em várias regiões daAmazônia são impulsionados pela pecuária de médiae grande escalas. Obedecendo à lógica privada, adinâmica do processo de ocupação tornou-seautônoma, como demonstra o crescimentosignificativo dos desmatamentos na década denoventa, apesar da redução substancial dos estímulose incentivos das políticas governamentais. Dentre ascausas dessa transformação destacam-se as mudançase adaptações tecnológicas e gerenciais das atividadespecuárias às condições geo-ecológicas da AmazôniaOriental que permitiram o aumento da produtividadee a redução dos custos.

A viabilidade privada da pecuária não significa queela seja desejável do ponto vista social ou sustentável

do ponto de vista ambiental. Os benefícios privadosdevem ser comparados com os custos ambientais esociais decorrentes da expansão das atividadespecuárias e dos desmatamentos.

Do ponto de vista social, é legítimo argumentar queos benefícios privados da pecuária de larga escala sãodistribuídos de forma excludente, pouco contribuindopara reduzir a desigualdade econômica e social.Aponta-se, contudo, que a diminuição do preço dacarne no mercado nacional e o aumento de exportaçõespropiciados pela expansão da pecuária na AmazôniaOriental poderão significar benefícios sociais queultrapassam as fronteiras setoriais e regionais.

Do ponto de vista ambiental, não obstante asincertezas de mensuração, as parcas evidênciasdisponíveis indicam que os custos dos desmatamentospodem ser significativos, superando inclusive osbenefícios privados da pecuária, sobretudo quandose consideram as incertezas associadas às perdasirreversíveis de um patrimônio genético e ambientalpouco conhecido. Nesse sentido, atividades como omanejo florestal sustentável seriam consideradassuperiores do ponto de vista social e ambiental.Contudo, seja para viabilizar o manejo florestal comoalternativa de exploração privada, seja para internalizaros custos ambientais da pecuária, serão necessáriosinstrumentos de políticas, mecanismos definanciamento e estruturas de fiscalização de difícilimplementação.

As recomendações de políticas do estudo são: i) anecessidade de reconhecer a lógica privada do processoatual de ocupação da Amazônia brasileira; ii) reorientaro foco das políticas para os pecuaristas como agentes

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motores do processo dos desmatamentos,reconhecendo seus interesses e os benefícioseconômicos privados; iii) tendo em conta odesconhecimento dos custos ambientais e as incertezasassociadas à irreversibilidade dos efeitos de decisõespresentes, formular políticas que contenham osdesmatamentos nas áreas de fronteira ainda intocadas

e que estimulem a intensificação da agropecuária nasáreas consolidadas.

Este trabalho pretende suscitar e subsidiar o debatesobre esses temas, principalmente entre o governo eos grandes e médios pecuaristas, aqui identificadoscomo os principais agentes dos desmatamentos.

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Sumário Executivo

OBanco Mundial vem, há décadas, dialogandocom o governo brasileiro sobre projetos,estratégias e a promoção do desenvolvimento

sustentável para a Amazônia. Dentre as questõesfundamentais deste diálogo está o entendimento sobreo processo do desflorestamento da região. Apesardestes esforços, ainda não existe consenso sobrequestões fundamentais como quem são os principaisagentes dos desmatamentos e quais são realmentesuas motivações. Os estudos mais recentes, inclusivedo próprio Banco, sugerem baixas taxas de retornoda pecuária na região, ficando uma lacuna para explicaro contínuo avanço do processo mesmo depois daredução e quase eliminação dos incentivos fiscais paraa atividade na região.

Consoante com esta lacuna de conhecimento, existeuma percepção de que o processo dos desmatamentosda Amazônia brasileira produz perdas ambientaissubstanciais e pífios ganhos econômicos e sociais.Além de existir incerteza sobre a exata dimensão dasperdas e dos custos ambientais dos desmatamentos, apercepção sobre os possíveis ganhos econômicos esociais do processo carece de base empírica e analítica.Isto tem levado a uma gama de perspectivas sobre oreal processo de ocupação e desmatamento. Entreelas incluem-se:n os agentes dos desmatamentos têm horizontes

de planejamento curto e baseiam suas atividadesna mineração de nutrientes da floresta;

n a pecuária na Amazônia é pouco rentável e suapersistência só se explica pelos subsídios oucréditos do governo que sustentam ganhosespeculativos;

n os pequenos produtores são importantes agentesdo processo dos desmatamentos;

n a extração da madeira é uma das principaiscausas dos desmatamentos;

n as estradas são também causas dosdesmatamentos (e não conseqüência do altopotencial da agropecúaria da região);

n a soja vem se expandindo rapidamente nocerrado, pressionando a expansão da fronteiraagrícola para as regiões de florestas;

n os custos ambientais, medidos local, nacional eglobalmente, são tão elevados que tornamirracionais quaisquer atividades causadoras dosdesmatamentos;

n existem inúmeras atividades alternativassustentáveis que poderiam substituir a pecuária,gerando maiores benefícios sociais, econômicose ambientais.

A continuidade e a consistência dos desmatamentosdurante as últimas décadas, quando os estímulos eincentivos governamentais foram substancialmentereduzidos, sugerem que, contrariamente as tesesacima, existe uma racionalidade econômica subjacenteao processo. A busca desta racionalidade constitui oobjetivo primário deste trabalho.

Uma de suas premissas básicas é que, ainda que nãose conheça o potencial econômico da região em suaplenitude, é fundamental que se busquem alternativasde desenvolvimento sustentável para ela. No entanto,há forte suposição que as atividades econômicas quecaracterizam o atual processo de ocupação edesmatamentos - mormente o extrativismo madeireironão sustentável e a pecuária de grande escala - nãofazem um uso socialmente ótimo da rica base derecursos naturais. Além disto, modelos alternativosde usos mais sustentáveis e socialmente desejáveis na

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escala necessária não são amplamente conhecidos.Assim, um grande dilema coloca-se para o governoque não pode deixar de tirar proveito daquele potencialao mesmo tempo em que sequer o conhece em suaplenitude. Este desconhecimento faz com que decisõespresentes sobre usos da floresta envolvam enormesriscos e incertezas.

As principais questões para investigação são:n Quem são os principais agentes motores e qual

a lógica dos desmatamentos na Amazôniabrasileira?

n Qual o potencial agropecuário da Amazôniabrasileira e quais os limites geográficos naturaisà expansão da agropecuária?

n Que políticas implantar diante das incertezas eriscos de perdas irreversíveis em termosecológicos?

n É possível, ou desejável, "fechar" a fronteira,buscando restringir a expansão da agropecuárianas áreas já ocupadas ou consolidades commaior potencial produtivo?

n Como implantar um modelo alternativo baseadono manejo sustentável dos recursos florestais ena exploração da biodiversidade, dado que nãose conhece o funcionamento deste modelo naescala requerida e na medida que o processo"tradicional" de ocupação se dá de formaacelerada?

n O próprio Banco Mundial, que por suasexperiências do passado na Amazônia optou pordedicar-se em larga medida à proteção econservação da floresta, está assim cumprindoseu papel de indutor do desenvolvimentosustentável?

A principal contribuição deste trabalho é ademonstração que a pecuária de corte na AmazôniaOriental, ou na chamada fronteira consolidada, éaltamente rentável do ponto de vista privado,apresentando taxas de retorno superiores às dapecuária nas regiões tradicionais do país. Dentre osfatores explicativos encontram-se, além dadisponibilidade de terra barata, as condições geo-ecológicas particularmente favoráveis à pecuária,principalmente a pluviosidade, a temperatura e a

umidade do ar que garantem a alta produtividade daspastagens. As taxas de retorno da pecuária estrita (i.e.,excluindo a venda da madeira) são consistentementeacima dos 10%. Esses valores são potencialmentealcançados por pecuaristas estabelecidos ecapitalizados na fronteira consolidada da AmazôniaOriental. As condições geo-ecológicas da AmazôniaOcidental - ou, ou seja, nas áreas com predominânciade floresta ombrófila densa com altos índices depluviodidade - tornam a pecuária e a agriculturapraticamente, ou totalmente, inviáveis. Esse resultadocorrobora estudos anteriores do próprio Banco queapontam as condições geo-ecológicas como osprincipais condicionantes da agropecuária nas regiõesda Amazônia.

O trabalho propõe que o motor do processo dosdesmatamentos da Amazônia brasileira é a viabilidadefinanceira dos grandes e médios pecuaristas dafronteira consolidada. O grande número de agentesintermediários, que têm baixos custos de oportunidadee que se antecipam a estes pecuaristas, sãoeventualmente responsáveis de forma direta por boaparte dos desmatamentos. Suas atividades sãoviabilizadas em parte pela garantia de venda futura daterra para a exploração pecuária, permitindo-lhes cobrirseus custos de oportunidade. Não fosse a garantia devenda futura para a exploração pecuária, os agentesintermediários não teriam incentivo para desmatar,ou para desmatar na escala atual. A pecuária maisprofissional e produtiva marca o fim do cicloespeculativo e da "mineração de nutrientes" dosprimeiros agentes e dá início à consolidação dafronteira.

As evidências sobre os desmatamentos e uso do soloda Amazônia, apresentadas no trabalho, demonstramque a pecuária é a principal atividade econômica naregião e que são os médios e grandes pecuaristas osmaiores responsáveis pelos desmatamentos. Ospequenos proprietários atuam como fornecedores demão-de-obra ou agentes intermediários que"esquentam" a posse da terra, mas sua contribuiçãodireta para os desmatamentos é pequena.Independentemente das diferenças de motivações,interesses e estratégias econômicas dos inúmeros

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atores sociais que atuam na fronteira, ao final doprocesso de ocupação tem-se, quase inevitavelmente,a ocupação pecuária, que atualmente responde porcerca de 75% das áreas desmatadas na Amazônia.

A agricultura não compete com a pecuária nas regiõesde floresta. As barreiras geo-ecológicas são em geralmais restritivas à agricultura, destacando-se apluviosidade nas áreas com índices superiores aaproximadamente 2000 mm/ano. Mesmo nas áreascom índices inferiores a este valor, a pluviosidade éum dos fatores mais favoráveis à pecuária e por istoela aí predomina.

O trabalho indica que a alta rentabilidade privada dapecuária, decorrente das condições geo-ecológicasfavoráveis, leva simultaneamente aos desmatamentose à construção de estradas. Enquanto as condiçõesgeo-ecológicas forem favoráveis, haverá pressãoendógena pela abertura de estradas que, na ausênciade governo, serão construídas privadamente pelospróprios pecuaristas. Se a pecuária não fosse lucrativa,a existência de estradas "per se", ou as rodoviasconstruídas com objetivos mais geo-políticos"exógenos", não causariam tantos desmatamentos. Éevidente que estradas construídas com objetivos geo-políticos tornam a pecuária viável e portantoaumentam os desmatamentos.

A viabilidade financeira da pecuária implica que oprocesso dos desmatamentos não gera apenas perdas,como supostamente ocorria nas décadas de setenta eoitenta. Ainda que os ganhos privados sejam menoresque os custos sociais e ambientais, a renda gerada ésignificativa e financeiramente sustentável. Oreconhecimento desse fato é fundamental para aformulação de políticas públicas adequadas para aregião. Os pecuaristas até hoje ocupam papel de poucodestaque nos foros de discussão pública e mesmocomo objeto de políticas de governo. Este trabalhosugere que, nesse sentido, o foco das políticas deve sedeslocar dos madeireiros para os pecuaristas, dadoque a importância destes no processo dosdesmatamentos é muito maior que a dos primeiros.A lucratividade e viabilidade privada da pecuária nãoimplica que as políticas públicas devam apoiá-la. Para

tanto, seria necessário uma análise dos custos ebenefícios sociais e ambientais das atividades pecuáriase dos desmatamentos delas decorrentes. Nesse sentido,existem três alternativas sobre o balanço de custos ebenefícios sociais:(a) Os benefícios privados menores que os custos

sociais implicam que os desmatamentos não sãodefensáveis sob a ótica social. Esta é a alternativacomumente aceita sobre os desmatamentos daAmazônia.

(b) Outra alternativa seria ganhos privados e sociaisda agropecuária maiores que as perdas sociais eambientais dos desmatamentos. Esta alternativaimplicaria dilemas entre atividade econômica eproteção da floresta.

(c) Como no caso anterior, benefícios maiores queos custos sociais, mas benefícios líquidosmenores do que aqueles que ocorreriam com aexploração de outras atividades, como porexemplo, o manejo florestal sustentável. Nestecaso, também, as políticas públicas não deveriamapoiar a pecuária.

Além das dificuldades de mensuração e valoraçãomonetária, as análises custo/benefício envolvem doiscomplicadores adicionais. O primeiro deles refere-seao fato das externalidades envolvidas no processo dosdesmatamentos da Amazônia brasileira teremdimensão global: assim, as análises sociais devem serfeitas do ponto de vista das comunidades locais, doponto de vista da população brasileira como um todoe ainda do ponto de vista da comunidade global que,direta ou indiretamente, se beneficia dos serviços dafloresta amazônica. Os resultados podem ser distintosconforme varie o nível de análise: os desmatamentosseriam aceitáveis se fossem socialmente desejáveis paraas populações locais e não para a população brasileiracomo um todo? ou seriam defensáveis se fosseminteressantes para o Brasil, mas não fossem para oresto do mundo?

A outra questão refere-se ao fato da Amazônia seruma região por demais extensa e diversa, de modoque os resultados encontrados para uma determinadasub-região não necessariamente se aplicam a outras.Em particular, como já mencionado, as altas taxas de

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retorno encontradas neste trabalho são alcançadaspelos pecuaristas mais profissionais na chamadafronteira consolidada da Amazônia Oriental e nãopela média dos pecuaristas de toda a região amazônica.

O trabalho se propôs a dar uma contribuição emtermos de uma avaliação social dos desmatamentosda Amazônia brasileira - de um lado identificando osprincipais agentes do processo, a racionalidadeeconômica de suas atividades e seus possíveis retornoseconômicos (a avaliação privada do processo) - deoutro, buscou fazer uma avaliação monetária doscustos econômicos (sociais) dos desmatamentos etambém algumas comparações com atividadesalternativas, especificamente o manejo florestalsustentado (a análise social). Ainda que não se tenhachegado a uma análise custo/benefício plena, emgrande medida pela falta de maiores informações,vários cenários são apresentados e comparados,permitindo a sugestão de algumas recomendações depolíticas para a região.

Do ponto de vista social, os potenciais benefíciosassociados aos desmatamentos se dão, de um lado,em termos dos lucros privados dos pecuaristas, e deoutro, em termos de melhorias sócioeconômicas daspopulações locais ou mesmo da população nacionalcomo um todo. Desde 1970 a renda regional aumentousignificativamente. A renda rural per capita, emparticular, triplicou, aumentando, na média, de US$410 em 1970 para US$ 1.417 em 1995. Nos estadosonde observou-se as maiores taxas de desmatamentos,este crescimento foi ainda maior: no mesmo período,a renda rural per capita no Mato Grosso passou deUS$ 424 para US$ 4.311, no Pará de US$ 356 paraUS$ 1.436, e em Rondônia de US$ 712 para US$2.304.

Os indicadores sócioeconômicos regionais - comoníveis de analfabetismo, mortalidade infantil eexpectativa de vida - mostram que de fato tem havidoprogressos significativos, mas insuficientes parareduzir o gap com relação ao restante do país. Alémdisto, a maior parcela da renda regional originou-senos setores urbanos e não rurais, sugerindo que as

melhorias nas condições sociais provavelmente tiverampouco a ver com os desmatamentos. Em resumo, élegítimo argumentar que mesmo que os ganhosprivados da pecuária de média e grande escalas fossemsignificativos, eles foram de qualquer modo largamenteexcludentes, pouco tendo contribuído para aliviar asdesigualdades sociais e econômicas ao nível local.

Mesmo as populações locais não se apropriandodiretamente da renda gerada pela produçãoagropecuária (e indiretamente pelos desmatamentos),no âmbito nacional o preço da carne tem caídocontinuamente nos últimos anos, quando 100% docrescimento do gado de corte deveu-se à expansão daprodução nos principais estados produtores naAmazônia - Pará, Mato Grosso e Rondônia. Asexportações de carne cresceram de 350 mil toneladasem 1999 para aproximadamente 900 mil toneladasem 2002, que representam aportes de cerca de US$ 1bilhão de dólares.

Quanto aos custos econômicos (sociais) dosdesmatamentos, a despeito da mencionada dificuldadede quantificá-los e valorá-los monetariamente, otrabalho buscou fazer uma estimativa para quealgumas comparações pudessem ser feitas com osbenefícios acima descritos. Os custos sociais dosdesmatamentos foram estimados em cerca de US$100/ha/ano. Este valor embute demasiadas incertezas,oriundas das limitações das metodologias de valoraçãoambiental e da limitação de dados, além de omitiruma série de efeitos dos desmatamentos para os quaisnão há informação precisa. De qualquer forma, ovalor é maior que a renda privada potencial da pecuária(cerca de US$ 75/ha/ano), que poderia assim sercompensada.

A despeito deste balanço, não existem mecanismosde transferência para se efetivar esta compensação,que teria que se dar em nível internacional por envolverexternalidades globais. Esta é uma questão de extremaimportância. As experiências existentes não sãoanimadoras, existindo um enorme espaço paraatuação do Banco Mundial e da comunidade doadorainternacional.

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O estudo desenvolveu modelos de simulação dasatividades agropecuárias, mostrando que os produtoressão avessos ao risco e evitam a especilização, adotandocombinações de culturas, pastagens e floresta ondeelas são viáveis. As simulações mostram que osprodutores estariam dispostos a aceitar valoresrelativamente baixos (R$ 45/ha/ano,aproximadamente US$ 15/ha/ano) comocompensação para não expandir a área cultivada emáreas de floresta. Estes valores podem subir até R$200/ha/ano quando se supõe menor aversão ao risco(apesar de que nestes casos os produtoresconverteriam a floresta para agricultura e não parapecuária sob as hipóteses do modelo). As simulaçõesde taxação sobre o desmatamento, ao contrário deuma compensação, sugerem que os produtorestenderiam a mudar o mix de culturas primeiro, aoinvés de diminuir a área desmatada. A diferença entreas duas políticas é basicamente sobre quem recairiamos custos.

Quanto às atividades alternativas, o manejo florestalsustentado mostra-se menos econômico do ponto devista privado que a pecuária. Além disto é uma técnicapouco disseminada e bastante "sofisticada" quandocomparada com o extrativismo madeireiro nãosustentável ou com a pecuária, ambos amplamentepraticados e percebidos como envolvendo baixosriscos. Sob a ótica social, entretanto, o trabalho sugereque o manejo florestal é provavelmente superior doponto de vista econômico. Supostamente, é tambémsuperior do ponto de vista ambiental e social.

Cumpre salientar que as análises feitas no trabalhodevem ser vistas em contexto, principalmente aviabilidade econômica privada da pecuária, que emprincípio é válida apenas nas regiões estudadas e sobas condições especificadas, sendo as principais delas:o grau de profissionalismo dos pecuaristas, sua escalade produção e as condições de pluviosidade. Em outrasregiões da Amazônia, vários resultados podem serdistintos dos apresentados neste trabalho.

Recomendações

O trabalho apresenta as seguintes sugestões de políticapara a região:

Informação e planejamento

n É fundamental reconhecer que a pecuária, emvárias partes da Amazônia, é uma atividadepotencialmente lucrativa para os produtores eque esta lucratividade é o fator básico depropulsão do processo dos desmatamentos naregião. O governo, o Banco Mundial e o PPG7devem, neste sentido, ajustar o foco de suaspolíticas e buscar mudar os incentivospercebidos pelos pecuaristas. A aceitação destatese implica também o reconhecimento daexistência de importantes trade-offs no processodos desmatamentos da Amazônia brasileira.

n As políticas de proteção da floresta devem, talvez,almejar prioritariamente os produtores dafronteira consolidada que são a mola do processoe não os da fronteria especulativa. Isto não querobviamente dizer que não se deva fiscalizar,penalizar e tentar barrar as condições altamenteilegais sob as quais operam os agentes nafronteira avançada.

n A estratégia deve ser trabalhar com os pecuaristase não contra eles. Ainda que uma grande partedestes agentes não esteja preparada, ou sequerdisposta a negociar, há lideranças mais abertas einclusive interessadas em definir termos decompromisso com governo e sociedade paraterem suas atividades integralmente legalizadas.

n As autoridades responsáveis pela proteção dafloresta Amazônica devem reduzir o excessivofoco sobre as madeireiras como agentes dosdesmatamentos. O controle sobre os madeireirosé fundamental não em termos dosdesmatamentos per se, mas talvez porque aextração desordenada, predatória e largamenteilegal hoje praticada elimina a possibilidade deimplantação, presente ou futura, do manejo

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florestal, uma atividade sustentável que do pontode vista social seria econômica, social eambientalmente superior à pecuária.

n O zoneamento deve ser incentivado como umprocesso de negociação entre os agenteseconômicos - incluindo os pecuaristas - e ogoverno, que leve, paulatinamente, acompromissos de ocupação em áreas e regiõesadequadas do ponto de vista social, econômicoe ambiental.

n Como existe muito desconhecimento e muitaincerteza sobre vários fatores associados aoprocesso dos desmatamentos e avanço dafronteira, os riscos envolvidos sugerem a adoçãode estratégias conservadoras. O patrimônioeventualmente em risco na Amazônia nãorecomenda decisões irreversíveis com custossociais, econômicos ou ambientaispotencialmente altos. Neste sentido, as iniciativasde conservação sendo implementadas devem serincentivadas. O Banco Mundial, por sua vez,continuará apoiando-as, principalmente atravésdos Projetos ARPA, PROARCO, PROBIO evários projetos apoiados pelo Programa Piloto.

n Dentre os fatores mais importantes analisadosneste trabalho, e sobre os quais seria importanteaumentar o conhecimento, incluem-se os valorese serviços ambientais e também os possíveisbenefícios sociais a eles associados. É igualmenteimportante analisar, com mais profundidade, osefeitos dos custos de transportes sobre osdesmatamentos.

Instrumentos econômicos

n A introdução de um sistema que flexibilize aalocação de áreas de conservação estrita, comoa criação de mecanismos de troca - os "tradabledevelopment rights" - poderia trazer enormesganhos ecológicos e econômicos. Não há porque não permitir que propriedades em áreasférteis e produtivas se beneficiem de maiores

percentuais de desmatamento, desde quecompensem com áreas de estrita proteção(reservas legais) em áreas ecologicamente maisricas. Estas áreas seriam indicadas pelozoneamento (algumas já o foram).

n Uma das clássicas soluções econômicas doproblema seria taxar os desmatamentos, demodo a forçar os agentes a internalizarem oscustos ambientais. As simulações de taxaçãodeste estudo sugerem que são necessárias taxaselevadas para se diminuir de forma significativaa área desmatada. Uma alternativa à taxação seriacompensar os agentes para que não desmatem.As simulações deste estudo sugerem que adisposição dos produtores a receber para nãodesmatar dependeria do seu grau de aversão aorisco. A escolha do mecanismo dependerá dadecisão sobre quem de fato pode ou deve arcarcom os custos.

n Ao interesse nacional somam-se ainda os dacomunidade internacional, que também sebeneficia dos serviços ambientais da floresta.Ainda que a soma dos benefícios nacionais eglobais fossem maiores que a renda da pecuária,os mecanismos de transferência ainda nãoexistem na prática e enfrentam grandesdificuldades técnicas e políticas para seremimplementados. O Banco Mundial talvez tenhaum papel a desempenhar auxiliando o governobrasileiro a buscar iniciativas e parceirosinternacionais.

n Até o momento, a busca por alternativassustentáveis tem praticamente se limitado aomanejo florestal e à iniciativas pontuais depequena escala - algumas social, econômica eambientalmente superiores à pecuária. Estesesforços devem ser continuados, mas é precisoatentar para o fato que, ainda que superiores,não têm competido em escala com a pecuária.O manejo florestal que envolve técnicascomparativamente muito mais sofisticadas, alémde ter que competir com o extrativismomadeireiro predatório, praticado em toda

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Amazônia, tem se mostrado de difícildisseminação, clamando por apoiogovernamental.

n O Banco Mundial, em particular, deveria revera postura largamente conservadora que temadotado em relação à Amazônia na última décadae apoiar a promoção do desenvolvimentosustentável, financiando atividades produtivascom altos retornos econômicos e sociais e debaixo impacto ambiental (alternativas de grandeinteresse para o desenvolvimento regional). Aaprovação do projeto em apoio ao ProgramaNacional de Florestas, ora em discussão com ogoverno federal, seria um excelente passo nestadireção.

n Os incentivos fiscais, que no passadobeneficiaram os maiores proprietários,diminuíram e tendem a ser melhor aplicados.Programas sociais como o FNO preferencial eos projetos de assentamento do INCRApoderiam proporcionar ganhos ecológicos esociais maiores, particularmente para os menoresprodutores. A conjugação de interesses deproteção ambiental com a defesa das populaçõestradicionais locais são uma das bandeiras dosócio-ambientalismo da nova administração eportanto deverão ser apoiadas.

n Outros instrumentos econômicos, discutidos jáhá algum tempo entre técnicos do MMA, IPEAe Banco Mundial, poderiam incluir: (i) aintrodução do ICMS Ecológico, (ii) a introduçãode critérios ambientais semelhantes aos do ICMSecológico no Fundo de Participação dos Estadose dos Municípios, (iii) reorientação dos critériosde concessão de subsídios fiscais ou creditíciospromovendo atividades sustentáveis, odesenvolvimento de tecnologias sustentáveis ea pesquisa científica; (iv) reforço à introduçãode critérios ambientais na concessão do créditoagrícola na região; (v) revisão e eliminação decréditos subsidiados ainda existentes para apecuária tradicional na Amazônia.

Aplicação da Lei ("enforcement")

n Quaisquer que sejam os incentivos econômicos,eles não irão prescindir de uma muito maiorcapacidade de fiscalização e enforcement. Esta,entretanto, é uma luta em grande medida inglória,devida à imensidão da região e às dificuldadesde trabalhar com os agentes locais. Por maisque haja determinação política, será sempredifícil reverter a tendência inercial que se observahá várias décadas. A experiência recente do MatoGrosso sugere, entretanto, que isto é possível.

n Para lograr uma atuação mais efetiva, éfundamental que haja uma estratégia decooperação institucional. Órgãos como o MMA,IBAMA, ADA, INCRA, FUNAI, Ministériosda Integração Nacional e do Planejamento,Polícia Federal, além dos governos estaduais,têm que trabalhar conjuntamente, acordandometas comuns e definindo as atribuiçõesindividuais.

n A despeito das dificuldades políticas, urge revere auditar o processo de concessão de direitos depropriedade. É difícil identificar, sem um estudocauteloso, a rede de interesses envolvida. O quese conhece são os resultados, freqüentementeimplicando violência e fraudes, que poderiamser revertidos se a atuação dos órgãos fundiáriosfosse mais efetiva, de fato ordenando o uso dosolo, protegendo e apoiando os pequenosprodutores e garantindo a integridade das terraspúblicas e do patrimônio natural e social daregião. Os ganhos especulativos sãopotencialmente enormes e a etapa chave doprocesso é a legalização do direito depropriedade. O governo federal, em parceriacom os estados, deveria atuar energicamentesobre a questão.

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1Motivação do Estudo

AAmazônia brasileira tem um potencialeconômico fundamentalmente baseado nariqueza da sua base de recursos naturais. Um

grande dilema coloca-se para o governo que não podedeixar de tirar proveito deste potencial sem, por outrolado, conhecê-lo em sua plenitude. A Ministra do MeioAmbiente, em seu discurso de posse, expressa partedeste dilema sugerindo que a região é vista “... comoterritório quase natural da expansão tradicional dagrande economia e pouco como o depositário de umaexcepcional biodiversidade e potencialidade dedesenvolver-se a partir dela”. Dentre as principaisperguntas que se colocam incluem-se: quais os limitesnaturais à expansão da fronteira agropecuária? Quemsão os agentes e qual a lógica dos desmatamentos?Dados os riscos e incertezas de se darem passosirreversíveis em termos de degradação ambiental eeliminação de um potencial não plenamenteconhecido, o que fazer? Seria possível, ou desejável,“fechar” a fronteira, buscando consolidar as áreas jáantropizadas, permitindo a expansão da agropecuárianas áreas com maior potencial? Como implantar ummodelo alternativo “a partir da biodiversidade”quando não se conhece plenamente este modelo naescala necessária e enquanto o processo “tradicional”de ocupação se dá de forma acelerada? O próprioBanco Mundial, que por suas experiências do passadona Amazônia optou por dedicar-se largamente àproteção e conservação da floresta nos últimos anos,está assim otimizando seu papel potencial decatalisador do desenvolvimento sustentável da região?

Na busca de um entendimento maior sobre estasquestões, as causas e dinâmica dos desmatamentosda Amazônia brasileira têm sido temas recorrentes depesquisas durante as duas últimas décadas. Dessas

pesquisas resultaram teses amplamente aceitas quedestacam a importância da pecuária como causa doprocesso dos desmatamentos. Essas mesmaspesquisas, no entanto, apontam para a aparenteirracionalidade econômica e ambiental deste processo,afirmando que os desmatamentos decorrem deatividades com baixo retorno econômico, sustentando-se em ganhos especulativos ou em subsídiosgovernamentais. A insatisfação com as bases empíricasdessas teses, sobretudo no contexto econômico atualda Amazônia, foi uma das motivações originais dopresente trabalho.

Ele se motiva também nas recomendações dos doistrabalhos mais recentes do próprio Banco Mundialsobre o tema (Schneider et alli, 2000 e Chomitz eThomas, 2000), bem como de um trabalho mais antigo(World Bank, 1991), que sugerem ser crítica a análiseeconômica da pecuária na Amazônia.

O trabalho foi elaborado em estreita colaboração como MMA. Na verdade ele é mais um produto de umdiálogo de longo prazo mantido entre o BancoMundial e o governo brasileiro em busca daconservação e do desenvolvimento sustentável daregião amazônica. O relatório, contudo, é deresponsabilidade exclusiva do Banco Mundial, e suasconclusões não necessariamente serão endossadas peloMMA.

O paper conceitual (concluído em setembro de 2001 edando origem ao presente estudo) revisou de formacrítica as principais teses convencionalmente aceitassobre as causas e dinâmica dos desmatamentos daAmazônia brasileira, suscintado questões e hipótesesalternativas para serem aprofundadas nas etapas

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posteriores do estudo. O presente relatório, resumindoconclusões e as evidências coletadas em váriosrelatórios de pesquisas anteriores que buscaramresponder a questões específicas suscitadas pelo paperconceitual, constitui a etapa final do estudo.

As teses revisadas em grande medida refletem a “visãocomum” sobre o processo dos desmatamentos naregião. Entre elas incluem-se:

n os agentes dos desmatamentos têm horizontesde planejamento curto e baseiam suas atividadesna mineração de nutrientes da floresta;

n a pecuária é pouco rentável na Amazônia e sópersiste porque se beneficia de subsídios oucréditos do governo ou por causa de ganhosespeculativos;

n os pequenos produtores são importantes agentesdo processo dos desmatamentos;

n a extração da madeira é uma das principaisatividades causadoras dos desmatamentos;

n as estradas são também causas dosdesmatamentos (e não conseqüência do altopotencial da agropecúaria na região);

n a soja vem se expandindo rapidamente nocerrado, pressionando a expansão da fronteiraagrícola para as regiões de florestas;

n os custos ambientais, medidos local, nacional eglobalmente, são tão elevados que tornamirracionais quaisquer atividades causadoras dosdesmatamentos;

n existem inúmeras atividades alternativas quepoderiam substituir a pecuária, gerando de formasustentável maiores benefícios sociais,econômicos e ambientais.

A ser verdadeiro, o conjunto destas teses implica queo processo dos desmatamentos da Amazônia carecede racionalidade econômica. Trata-se de um processoperde-perde que gera destruição ambiental, ganhoseconômicos limitados e pífios ganhos sociais. Acontinuidade e a consistência dos desmatamentosdurante as últimas décadas, e as perspectivas de difícilreversão na ausência de um conjunto muito

coordenado e eficaz de políticas públicas, sugere queexiste uma racionalidade subjacente ao processo. Abusca desta racionalidade, constitui seu objetivoprimário.

O paper conceitual de fato propôs que o processo dosdesmatamentos na Amazônia não consiste em umadevastação de novas fronteiras por atividades quegeram pífios retornos econômicos e sociais mas, aocontrário, é movido por um conjunto de atividadeseconômicas lideradas pela pecuária que, de maneirageral, propicia ganhos econômicos privadossignificativos.

Em nosso entendimento, a análise financeira privada,mostrando altas taxas de retornos para a pecuária sobdiferentes condições da Amazônia, é talvez a grandecontribuição desse trabalho. É óbvio, entretanto, quea viabilidade financeira da pecuária não faz com queas políticas públicas devam apoiá-la: para isto, serianecessário que fosse feita uma análise social doprocesso, de modo que os custos e benefícios sociaisdas atividades associadas aos desmatamentospudessem ser comparados. Seria importante saber: i)se a eventual geração de renda com as atividades quesucedem os desmatamentos (mormente a pecuária) ésignificativa em termos de propiciar melhoria dascondições de vida das populações locais (ganhos debem-estar social); ii) se o processo é sustentável, nosentido de poder manter-se por longos períodos semsubsídios do governo; iii) quais os custos econômicosdos desmatamentos e como se comparam com osbenefícios.

Finalmente, ainda que uma análise custo/benefíciosocial indicasse que os benefícios marginais líquidosdos desmatmentos fossem positivos, justificando suaadoção, seria ainda necessário comparar com outrasatividades alternativas, possivelmente superiores àpecuária, no sentido econômico, social e ecológico,de modo que elas devessem ser adotadas em lugar datradicional pecuária. A pergunta chave seria “existematividades alternativas ecológica, social eeconomicamente superiores à pecuária”? seriam elassubstitutas ou complementares à pecuária? E o mesmoconjunto de perguntas sobre a justificativa econômica

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colocado para a pecuária deveria ser colocado paraestas atividades alternativas – seus custos e benefícios,ganhos sociais e sustentabilidade.

Este trabalho não busca responder a todas estasquestões e em todos os níveis de análise (privada esocial). Vários temas, entretanto, são estudados commaior profundidade. Alguns baseiam-se em trabalhosexistentes, outros em resultados de pesquisasfinanciadas neste estudo. O arcabouço das pesquisasbaseou-se nos comentários e sugestões ouvidas durantea reunião de avaliação do paper conceitual. Lá foisugerido que as seguintes questões deveriam sermelhor analisadas:

n uma revisão abrangente da microeconomia dapecuária em diferentes regiões da Amazônia,considerando diferentes sistemas de produção,diferentes escalas e enfocando em particular osgrandes pecuaristas;

n uma análise detalhada que permitisse melhorentender as ligações entre os ocupantes pioneirose os pecuaristas: existem contratos entre eles, ouserá que eles apenas se beneficiam indiretamenteuns dos outros? estão os pecuaristas realmentepor detrás de tudo? e

n estatísticas sumárias dos desmatamentos emtermos do tamanho dos plots, localização,histórico e tendências, por regiões ou biomas,ou outro padrão regional/geográfico apropriado.

Várias outras questões importantes e pertinentes aotema foram também levantadas na reunião deavaliação mas não foram objeto deste estudo, aindaque sejam referenciadas de alguma maneira. Entreelas estão atividades alternativas (sustentáveis), aaplicação (enforcement) das leis, e a questão daregularização dos direitos de propriedade.

Para verificar e aprofundar algumas das teses propostasno paper conceitual e tentar responder às questõesacima, foram contratados cinco estudos. O primeiro– Economia da Pecuária de Corte e o Processo de Ocupaçãoda Amazônia – Geraldo Sant’Ana de Camargo Barroset alli (2002) – CEPEA/ESALQ-USP, teve comoobjetivo fazer uma avaliação mais detalhada sobre a

(micro)economia da pecuária de corte na Amazônia,enfocando algumas das principais regiões produtoras.O segundo – Deforestation in the Brazilian Amazon: AReview of Estimates at the Municipal Level – Pablo Pacheco(2002a) – CGIAR/IPAM, objetivou, principalmente,fazer uma avaliação e comparação dos dados existentessobre os desmatamentos, analisando, também, suaconsistência e confiabilidade. O terceiro estudo –Atores e Relações Sociais em Novas Fronteiras na Amazônia– Edna Castro et alli (2002) – UFPA, teve comofinalidade básica fazer uma avaliação das relações entreos agentes (grandes e pequenos) nas frentes maisavançadas da fronteira dos desmatamentos, buscandoentender, em particular, as relações entre êles. O quartoestudo – Estimativa do Custo Econômico do Desmatamentona Amazônia – Ronaldo Seroa da Motta (2002) –IPEA/RJ, buscou avaliar os custos dosdesmatamentos na Amazônia, de modo a compará-los com os potenciais benefícios econômicos.Finalmente, o quinto estudo – Ocupação da Terra daAmazônia: Determinantes e Tendências – Eustáquio Reise Ajax Moreira (2002) – (IPEA/RJ), especificou eestimou modelos econométricos que, em nívelmunicipal, buscam identificar relações entre adinâmica do processo dos desmatamentos e o avançoda fronteira agropecuária e suas implicações sócio-econômicas. Os cinco estudos estão disponíveis nosite do Banco Mundial (www.bancomundial.org.br).

No desenvolvimento dos trabalhos, novos fatos foramaprendidos, análises foram refeitas e diversas outrashipóteses emergiram, às vezes contraditórias com asoriginalmente propostas no paper conceitual.

Objetivos do Trabalho

O objetivo básico do trabalho é melhor entender adinâmica e a lógica dos desmatamentos na Amazônia.A tese principal, lançada no paper conceitual, é a deque a pecuária na Amazônia, especificamente nasregiões da fronteira mais consolidada do Arco doDesmatamento, é bastante rentável segundo a óticaprivada, consistindo, assim, em fator chave depropulsão do processo.

O estudo busca também melhor entender como são

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a dinâmica e as relações dos pecuaristas com outrosagentes do processo – incluindo madeireiros,pequenos produtores, poderes públicos locais, etc.,de modo a também entender seus respectivos papéisneste processo.

Confirmada a hipótese básica – a substantivalucratividade privada da pecuária – o trabalho buscaentão analisar, do ponto de vista social, tanto outrospotenciais benefícios quanto, principalmente, os custoseconômicos dos desmatamentos. Isto forneceelementos para uma análise custo/benefício social dosdesmatamentos, o que não é plenamente atingido pelafalta de dados. Os números levantados permitementretanto uma série de insights sobre ordens degrandeza dos custos sociais envolvidos, permitindoarriscar algumas recomendações de política.

Adicionalmente, ainda que não se tenha analisadoatividades alternativas sustentáveis, potencialmentesuperiores à pecuária do ponto de vista social, otrabalho também compara os resultados aqui obtidoscom dados publicados sobre o manejo florestal.

Estrutura do Trabalho

O trabalho é dividido em 5 capítulos além desta breveintrodução. O capítulo 2 apresenta as evidênciaspreliminares que apontam para a importância dapecuária na dinâmica do processo dos desmatamentos.Verificando que a pecuária é majoritariamentepredominante e que continua a se expandir a despeitodos cortes dos subsídios do governo federal, fica posta

a idéia que ela deve ser economicamente viável doponto de vista privado.

O capítulo 3 tenta distingüir os agentes na fronteiraem termos de tamanho econômico (valor dos ativosou extensão de terras) bem como de motivações eestratégias econômicas – especulativas ou produtivas.O capítulo sumaria os resultados de uma das pesquisasde campo que analisou as relações sociais entre osagentes na fronteira “mais avançada”, apresentando,na segunda seção, o modelo econométrico que buscaidentificar relações entre variáveis explicativas dadinâmica do processo dos desmatamentos e o avançoda fronteira agropecuária.

O capítulo 4 analisa a microeconomia da pecuária decorte na Amazônia Legal, sumariando outro dostrabalhos contratados por este estudo. Os resultadosbasicamente apontam para a real viabilidadeeconômica da atividade nas regiões estudadas, queapresentam óbvias vantagens comparativas.

O capítulo 5 busca analisar, sob a ótica social, osefeitos da expansão da economia da região, emparticular a partir da pecuária. O capítulo busca valoraros custos econômicos (sociais) dos desmatamentos.Ao final, procura também comparar alguns dosresultados dos custos e dos benefícios do processo.

O último capítulo sintetiza as principais liçõesaprendidas e apresenta algumas recomendações depolíticas e ações que poderiam ser perseguidas pelogoverno e pelo Banco Mundial.

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 25

2Desmatamentos e Uso do Solo na

Amazônia: Evidências Sobre aPecuária de Grande Escala

2. 1 Tendência temporal dosdesmatamentos1

A análise dos padrões espaciais e das tendências dosdesmatamentos da Amazônia brasileira carecem debase empírica consistente e sistemática. O Brasil temse beneficiado enormemente dos avanços na área desensoriamento remoto e processamento de imagensde satélite na última década, o que tem permitido umconhecimento muito maior sobre os comportamentostemporais e regionais dos desmatamentos daAmazônia. As principias instituições responsáveis pelolevantamento de dados primários sobre desmatamentopor meio de sensoriamento remoto são o INPE, oIBAMA e a FEMA-MT. Estas instituições fazem usosdistintos dos resultados de seu monitoramento o que,aliado às diferenças de interpretação das imagens e dedefinição de diversos parâmetros, gera diferenças àsvezes significativas entre as estimativas.

Estas estimativas de desmatamento apesar deabrangentes, são espacialmente agregadas, raramentepossibilitando a análise em nível municipal ou escalamenor. Avaliações mais detalhadas das mudanças decobertura vegetal nos últimos anos são temporal eregionalmente fragmentadas. Além do sensoriamentoremoto, o IBGE é a única fonte que permite obter

estimativas indiretas do desmatamento por meio doslevantamentos sobre uso da terra feitos nos CensosAgropecuários conduzidos a cada 5 anos, excetuando1990.

As estimativas da própria cobertura florestal discrepamentre si, sendo de 356 milhões de hectares segundo aFAO (1981), 379 milhões segundo o IBGE (1988),409 milhões segundo Skole e Stucker (1993) e 419milhões segundo o INPE (apud Faminow, 1998).Quanto à extensão dos desmatamentos propriamente,para o período 1978-1988, enquanto o INPE estimavaem 1,5 milhões de hectares anuais, a penúltimareferência (Skole e Stucker) estimava em 2,1 milhõesde hectares.

Desde 1988, as estimativas do INPE adquiriram ocaráter de estatísticas oficiais sobre os desmatamentosda Amazônia brasileira em nível nacional e estadual.O INPE considera desmatamento "a conversão deáreas de floresta primária por atividadesantropogênicas para o desenvolvimento de atividadesagropecuárias detetadas por plataformas orbitais"(INPE, 2000). Deste modo, as áreas em processo desucessão secundária são excluídas do cálculo dosdesmatamentos brutos totais e anuais, implicando queuma área uma vez desflorestada assim será consideradapermanentemente2.

1 Esta sub-seção e a seguinte baseiam-se em Pacheco (2002a),um paper financiado por este estudo, disponível no site doBanco Mundial (www.bancomundial.org.br).

2 O INPE processa imagens na escala 1:250.000 que só permitea identificação de mudanças de cobertura maiores que 6,25 ha

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira26

Segundo o INPE, a área total desflorestada naAmazônia brasileira cresceu de 15,2 milhões de haem 1978 para 41,5 milhões em 1990, 58,7 milhões em2000 e 60,3 milhões de ha em 2001, segundo projeçõeslineares baseadas em uma amostra de imagens paraáreas críticas nesse ano3.

A dinâmica espacial é bem conhecida. Desde o iníciodos anos 90, vários estudos indicavam que osdesmatamentos se concentravam em umas poucasregiões, com 76% dos novos desmatamentosocorrendo em apenas 49 imagens do Landsat, a maioriacoincidente com o Arco do Desmatamento (vercapítulo 3). Em 1998, também 76% dosdesmatamentos concentraram-se apenas nos estadosdo Pará, Mato Grosso e Rondônia. Este mesmopercentual subiu para 85% em 2000. Chomitz eThomas (2000) sugerem adicionalmente que 75% dosdesmatamentos situam-se a menos de 25 km dedistância de alguma rodovia municipal, estadual oufederal, e 85% a menos de 50 km de algumas destasestradas.

2.2 Padrões espaciais em nível municipal

Os dados do INPEDuas estimativas do INPE (Alves et alli, 1997 e Alves,2000) sugerem que os desmatamentos ocorrem commais intensidade nos municípios ao sul e sudeste daAmazônia Legal - AML - e também que osdesmatamentos são um processo inercial, no sentidoque áreas mais prováveis de serem desmatadas sãovizinhas de áreas já desmatadas. Baseado nos dadosdo INPE, Menezes (2001) apresenta estimativa emnível municipal para o ano de 19974 onde se mostraque 47 dos 227 municípios responderam por 50%dos desmatamentos no Mato Grosso, Rondônia e Pará.Além disto, 139 municípios, cobrindo uma área de123 milhões de ha, responderam por 90 por centodos desmatamentos nestes três mesmos estados, ou77,4% dos desmatamentos totais da AML.

Os dados do IBAMAO objetivo básico do trabalho do IBAMA é apoiar asoperações de licenciamento e fiscalização. A base de

dados começa em 1996 paraáreas (plots) maiores que 1 ha.Florestas em estágiosavançados de regeneraçãosecundária até o anomencionado são consideradasáreas florestadas. Oitenta porcento dos municípiosmonitorados pelo IBAMAestão no Arco doDesmatamento (perímetroassinalado em verde na Figura1), o restante está espalhado emáreas do Mato Grosso,Rondônia e Acre. A principallimitação dos dados é a falta

de imagens de satélite para determinados municípios,em certo número de anos.(correspondentes a 1 mm

2 na escala). Cada imagem cobre um

quadrado de 184 X 185 km, sendo necessárias 229 imagenspara cobrir toda a AML. No caso da existência de nuvens, oINPE assume que o nível de desmatamento é igual ao daspartes sem nuvens na mesma imagem (Faminow 1998). 3 Cerca de 44 imagens de satélite, ou uns 20% do total de 229que cobrem toda a Amazônia. Estas imagens críticas são usadas

4 A referência baseia-se nos dados do INPE, tendo sobrepostoas imagens com o mapa político do IBGE.

para gerar estimativas parciais dos desmatamentos brutos emtoda a região. Os desmatamentos interpolados para 2000/01são de cerca de 1,7 milhões de hectares (INPE 2002).

FIGURA 1. Desmatamento municipal acumulado até 2000

0% a 1%1% a 3%3% a 5%5% a 25%25% a 50%Maior que 50%Arco doDesmatamento

LEGENDA

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FONTE: Pacheco (2002a) baseado em IBAMA/CRS

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 27

Estimativas do IBGE baseados em dadoscensitáriosAs estimativas de mudança de cobertura vegetalobtidas dos dados do IBGE baseiam-se emlevantamentos censitários dos estabelecimentosagropecuários realizados qüinqüenalmente desde 1970(exceto para 1990, quando os censos econômicos nãoforam realizados e o censo demográfico foi postergadopara 1991). O Censo Agropecuário de 1995/96 é oúltimo com dados já disponibilizados.5 A vantagemdas informações censitárias doIBGE é permitir estimativas sobreáreas desmatadas em todos osmunicípios da AML para umperíodo histórico longo (Figura 2).6A desvantagem é a imprecisão dasestimativas de desmatamento quenão são declaradas diretamentepelos produtores, mas obtidas deforma indireta a partir dasdeclarações sobre usos da terra nosestabelecimentos agropecuários.Nas análises que se seguem, asáreas desmatadas são definidascomo a soma das áreas de culturasanuais e perenes, pastagens

plantadas7, florestas plantadas, áreas em descanso eterras produtivas inutilizadas. O Censo abrange, emprincípio, todo e qualquer estabelecimentoagropecuário na AML, mas não fornece qualquerinformação sobre terras públicas ou devolutas. Asestimativas dos desmatamentos requerem hipótesessobre a cobertura vegetal das terras públicas oudevolutas, bem como sobre a cobertura vegetalpreexistente nos estabelecimentos privados.

SumárioRevendo as estimativas existentes entre as principaisfontes de dados sobre os desmatamentos, o INPEparece superestimar os desmatamentos líquidos e,possivelmente, mesmo os desmatamentos brutos,como sugerido pelas estimativas do IBAMA. Avantagem dos dados do INPE é sua consistência

5 Nesse Censo realizado em 1996, para evitar que asinformações de plantio e colheita se referissem a períodosdiferentes, o IBGE mudou o período de referência do anocivil (janeiro-dezembro) para o ano agrícola (agosto-julho). Maisimportante, a coleta de dados que era feita de janeiro a março(antes do período da colheita) do ano subseqüente ao Censodesde 1970, foram colhidos de agosto a dezembro (no períodopós-colheita) de 1996 para o Censo de 1995/96. Istoprovavelmente produziu uma subestimação do número e áreados estabelecimentos agropecuários, bem como do número detrabalhadores rurais no censo de 1996 em relação aos censosanteriores) devido à subenumeração dos estabelecimentosagropecuários de caráter temporário que ocorre sobretudo nocaso de posseiros, parceiros e arrendatários (Eustáquio Reis,comunicação pessoal). 6 O mapa distorce parcialmente a intensidade do desmatamentoocorrido na região ao utilizar a área dos estabelecimentos nodenominador para normalizar a medida de desmatamento: istoé um tanto inadequado pois os municípios apresentam grandesdiferenças na parcela da área geográfica que encontra-seapropriada ou em uso nos estabelecimentos agropecuários.

7 A inclusão ou não de pastagens naturais é uma questão deresposta difícil. Por um lado, pode-se supor que fossemoriginalmente cerrados e, portanto, não configuramdesflorestamento ou desmatamento strictu sensu. Por outro lado,há que se ter em conta que as estimativas do INPE, por exemplo,definem florestas pelas características fisionômicas nas imagensde satélite e, devido a isso, podem considerar comodesflorestamento os desmatamentos que ocorrem em área desavana. Nesse sentido, a inclusão de pastagens naturais nasestimativas do IBGE permitem melhor comparação com asestimativas do INPE.

FONTE: Pacheco 2002a, baseado no CensoAgropecuário do IBGE, 1995/96

FIGURA 2. Área desmatada dentro dos estabelecimentos

0% a 10%10% a 20%20% a 30%30% a 40%40% a 50%51% A 75%75% A 100%Arco doDesmatamento

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metodológica sobre um período de tempo bastantelongo.

Os dados do IBAMA, por sua vez, são baseados eminterpretação visual mais detalhada de imagens, o quelhes assegura uma maior confiabilidade. O IBAMAnão trabalha com toda a AML e suas estimativaspodem ser inferiores aos desmatamentos efetivos emalguns municípios pela definição de floresta utilizadapara medir os desmatamentos acumulados no seuperíodo base, que considera estágios intermediários eavançados de floresta secundária como floresta.

As estimativas indiretas, a partir dos dados censitáriosdo IBGE, constituem ótima fonte de informaçãosobre desmatamentos para usos agropecuários, apesarde não ser possível diferenciá-los de desmatamentosde outros tipos de cobertura vegetal. Análises a partirdos dados do IBGE levam a valores de desmatamentoainda menores que os de sensoriamento remoto, emfunção das análises de resolução, da subestimativa donúmero de estabelecimentos agropecuários, além deexistirem desmatamentos fora das áreas ocupadas,também não capturadas pelos censos.

Os dados em geral sugerem que os desmatamentosnão têm seguido uma tendência linear, tendoaumentado sistematicamente a partir de 1996. Deacordo com a FEMA, no estado de Mato Grossohouve um "animador" arrefecimento nosdesmatamentos em 2000/01 relativamente a 1998/99 - cerca de 32% - possivelmente decorrente dapolítica bastante agressiva de monitoramento,licenciamento e fiscalização adotados pelo estado nesteperíodo (Fearnside, 2002). Os dados do INPE sugeremque os desmatamentos no mesmo estado de MatoGrosso diminuíram em apenas 9% de 1999 a 2000,

enquanto nos dois outros principais estados (Pará eRondônia) houve uma tendência de ligeiro aumento.

Fearnside (1993) sugere que muito da controvérsiasobre os números dos desmatamentos decorre dotratamento do cerrado, ou de como as estimativas odiferenciam de florestas. Enquanto o INPE e oIBAMA trabalham exclusivamente com tipos decobertura florestal, a FEMA não diferencia tipos decobertura nos seus dados municipais, apenas no nívelde estado. Quanto aos levantamentos censitários doIBGE, estes não diferenciam áreas desmatadas nemem áreas de cerrado nem de florestas (Andersen etalli,. 2002).

2.3 Evolução do uso do solo naAmazônia Legal

A estatística mais elementar para analisar a dinâmicados desmatamentos na Amazônia é a evolução douso do solo na região, fornecida pelos CensosAgropecuários. A Tabela 1 mostra que até 1970 asáreas desmatadas na Amazônia com fins agropecuáriosnão chegavam a 3% da área total da região e hojerepresentam mais de 10%. É importante notar que oquociente é a área total da Amazônia Legal (5,075milhões km2) e não a sua área originalmente florestada,estimada entre 3,560 milhões de km2 (FAO 1981) e4,190 milhões km2 (INPE). A principal mudança nouso do solo é, indubitavelmente, a enorme expansãoda área ocupada pelas pastagens (plantadas), ocupandocerca de 70% das áreas desmatadas em 1995. Supondo(um pouco exageradamente) que as áreas em descansosejam fundamentalmente também rotaçõestemporárias da própria pecuária, esta poderia estarocupando até 88% das áreas desmatadas. Em relaçãoa 1970, 91% do incremento da área desmatada estavaconvertido em pecuária.

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TABELA 1. Evolução do uso da terra na Amazônia Legal, anos censitários (%)

(a) – As áreas de florestas plantadas são 2 ou 3 ordens de grandeza menores que as das naturais.Fonte: IPEA/DIMAC baseado nos Censos Agropecuários do IBGE.

Análises mais detalhadas seriam necessárias paraeventualmente inferir as mudanças de uso do solo aolongo do tempo, a precedência de determinados usossobre outros, e/ou a eventual estabilização dedeterminados usos. Estas análises não foram aquielaboradas, mas diversos estudos econométricos têmeste objetivo (Reis e Margulis, 1991; Pfaff, 1997;Andersen e Reis, 1997; Ferraz, 2000; Andersen et alli,2002; veja também Kaimowitz e Angelsen (1998) parauma revisão abrangente). Para nosso propósito maislimitado, os dados sugerem fortemente que, em termosda extensão dos desmatamentos, a pecuária é aatividade mais importante e que a agricultura tem umefeito em princípio muito pequeno sobre eles.

Esta última observação coloca em questão também opossível papel da expansão da soja como causa dosdesmatamentos na Amazônia (Costa, 2000; Becker,1999; Fearnside, 2001). De fato, a maior parte das

terras convertidas no cerrado foi para a pecuária enão para a soja. Esta na verdade ocupa apenas umaparcela muito pequena do cerrado já antropizado e asperspectivas de expansão nas áreas de florestas sãomuito reduzidas (Costa 2000, veja também o capítulo4). Conforme sugere a Tabela 2, entre 1975 e 1995 aárea de pastagens plantadas triplicou, enquanto a áreade lavouras aumentou somente 19%. A soja, que é acultura com maior extensão de área, ocupava 6,3milhões de hectares em 2000 – mas representavamapenas 10% da área antropizada e 5% da área emestabelecimentos. A soja de fato vem se estabelecendoem regiões mais secas (no Mato Grosso, por exemplo),ou em pastagens abandonadas. Independentementedo possível papel da soja, pode-se inferir que apecuária deve ser uma atividade suficientementerentável e sustentável do ponto de vista privado paraseguir com o ímpeto sugerido por estes primeirosindicadores de ocupação da terra.

1970 1975 1980 1985 1995 Áreas Desmatadas 3,0 4,0 6,2 7,7 9,5 Lavouras Totais 0,3 0,6 1,0 1,2 1,1 Pastos Plantados 0,7 1,4 2,6 3,8 6,6 Inutilizadas + Descanso 2,0 2,0 2,6 2,7 1,8 Áreas Não Desmatadas 97,0 96,0 93,8 92,3 90,5 Reservas/Áreas Públicas 87,9 84,5 79,6 77,3 76,3 Pastos Naturais 4,0 4,5 5,1 4,7 3,6 Florestas Privadas (a) 5,1 7,0 9,1 10,3 10,6

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TABELA 2. Evolução do uso do solo no cerrado (a)

Área em estabelecimentos agropecuários, por tipo de uso

1975 (1000 ha)

1996 (1000 ha)

Taxa média anual de crescimento (%)

Área em estabelecimentos 110.798 124.314 0,5 Área antropizada (b) 34.695 64.487 3,0 Área em lavouras 6.889 8.208 0,8 Área em pastagens plantadas 16.053 49.207 5,3 Área em matas plantadas 586 757 1,2 Área em descanso 356 1.671 7,4 Terras produtivas mas não usadas 10.815 4.643 -3,9 % da área em estabelecimentos 57,4 64,4 - % da área dos estabelecimentos antropizada 31,3 51,9 - % da área geográfica antropizada 18,0 33,4 -

(a) Trabalhou-se com dados de microrregiões homogêneas para 1975 e microrregiões geográficas para 1995/96, procurando comporde forma aproximada, informações em relação ao núcleo central do cerrado. Note que não é restrito à Amazônia Legal.(b) Área antropizada = soma da área em lavouras, em pastagens plantadas, em matas plantadas, terras em descanso e produtivas,mas não usadas.Fonte: Charles Mueller (2002), baseado nos Censos Agropecuários do IBGE de 1975 e 1995/96.

Com relação à evolução do uso do solo e do tipo depropriedades na Amazônia, a Tabela 3 mostra quehouve uma acentuada consolidação dos direitos depropriedade nas áreas declaradas com finsagropecuários nos censos do IBGE (aumentando de70% para 95% a percentagem declarada porproprietários), com paralela diminuição dapercentagem dos ocupantes – arrendatários, parceiros

e ocupantes – (queda de 22% para menos de 4% nomesmo período). Como no resto do país, observa-setambém uma violenta concentração da posse da terra(Tabela 4). Ambos indicadores são agregados paratoda a Amazônia, o que mascara diferenças regionais.Grosso modo, nem no tempo nem entre regiões asdiferenças são muito significativas.

TABELA 3. Direitos de Propriedade na AML em anos censitários(% da área geográfica)

1970 1975 1980 1985 1995

Proprietário 9,0 12,7 17,3 19,9 22,5 Arrendatário 0,8 0,5 0,8 0,5 0,2 Parceiro 0,1 0,0 0,1 0,2 0,1 Ocupante 2,8 3,0 3,4 2,1 0,9 Total 12,7 16,2 21,6 22,7 23,7

FONTE: IBGE, elaboração IPEA.

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TABELA 4. Distribuição do número e da área ocupada pelas propriedades na AMLsegundo seu tamanho, média 1970-95

Tamanho (ha) % do Número % da Área Ocupada < 2 31,9 0,3 2-10 23,6 0,9 10-100 29,9 9,8 100-1.000 13,0 27,9 1.000-10.000 1,5 31,4 > 10.000 0,1 29,6

FONTE: IBGE, elaboração IPEA.

2.4 Contribuição das áreas desmatadasgrandes e pequenas aosdesmatamentos

Os dados do monitoramento por satélite dãoinformação sobre o tamanho de cada “plot”desmatado, mas não se cada “plot” corresponde auma única propriedade ou unidade fundiária. Ou seja,é possível ver na imagem o tamanho de toda umaárea desmatada, não podendo se afirmar,categoricamente, se aquela área específica foidesmatada por um único ou por vários agentessimultaneamente. O INPE vem fornecendoestatísticas sobre os “plots” desmatados desde 1995.No entanto, a resolução das imagens não permitedistingüir desmatamentos menores que 6,5 hectares.Isto limita enormemente a precisão sobre aparticipação relativa dos menores agentes na dinâmicado processo. Por exemplo, os desmatamentos dosprojetos de colonização podem se dar em plotsadjacentes e parecerem maiores, superestimando acontribuição dos grandes agentes; por outro lado,grandes e médios fazendeiros podem desmatar plotsisolados numa mesma propriedade, superestimando

a participação dos pequenos.

Diversos estudos atribuem parcelas distintas a grandese pequenos agentes, existindo um certo consenso sobrea participação significativamente maior dos grandesagentes no cômputo geral da Amazônia (Cattaneo,2000; Faminow, 1998; Walker et alli, 2000). Fearnside(1993), em particular, sugere que 70% dosdesmatamentos são causados por grandes pecuaristas,enquanto que Homma et alli (1995) sugerem que 50%dos desmatamentos são causados pela agricultura desubsistência. Chomitz e Thomas (2000) sugerem queos estabelecimentos maiores que 2000 hectaresocupam mais que 50% das áreas convertidas para aagropecuária. De qualquer modo, como indicado porWalker et alli (2000), existe muita variação regional eas causas e dinâmicas são muito distintas entrediferentes localidades, de modo que não se podegeneralizar demasiadamente de uma região a outra.Ainda assim, no âmbito da AML é possível inferirque os grandes e médios agentes têm uma parcelasignificativamente maior de responsabilidade pelosdesmatamentos conforme sugerem os dados da Tabela5.

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TABELA 5. Percentuais dos tamanhos médios dos plots desmatados, 1996-99

A Tabela sugere que não tem havido grandes variaçõesnas participações relativas de cada classe de tamanho,exceto talvez a queda na dos menores agentes (<15ha). É marcante a discrepância entre os dados do INPEe do IBAMA no que toca a parcela de cada grupo. Osdados do INPE mostram que em 1999 cerca de umsexto dos desmatamentos totais se deu em plotsmenores que 15 ha. Os dados do IBAMA revelamuma história diferente pois são capazes de identificaros desmatamentos (plots) de até 1 ha. Segundo oIBAMA, a contribuição dos plots entre 1 e 3 ha foi deapenas cerca de 1% dos desmatamentos totais medidosnos 179 municípios com maiores taxas dedesmatamento na AML. Em 1999, os plots menoresque 50 hectares representaram cerca de 40% do totalsegundo o INPE, enquanto que para o IBAMA apenas25%. Em contrapartida, os plots maiores que 200 harepresentam 33% para o INPE e 50% para o IBAMA.

É interessante também apresentar os resultados doIBGE. A contribuição dos desmatamentos empropriedades menores que 10 ha para o total dosdesmatamentos foi de 1,4% em 1995 e o daspropriedades menores que 50 ha foi de 7%. Por outrolado, a contribuição das propriedades maiores que1000 hectares foi de 57,6%. Estas estatísticas são

distintas das do INPE e IBAMA e em verdade indicammelhor quem são os agentes: os plots desmatadosmuito grandes podem não ter maior contribuiçãoporque simplesmente resultam da soma de plotsmenores feitos seqüencialmente. É mais importanteobservar que os desmatamentos nas propriedadesmaiores que 1000 ha respondem pela maior parcelados desmatamentos da Amazônia: os tamanhos dosplots desmatados dentro destas propriedades podemser menores.

Olhando os dados num nível mais agregado, observa-se padrões sub-regionais distintos. A proporção dosdesmatamentos causados pelos menores agentes(medidos pelos tamanhos dos plots desmatados) émaior em estados como Rondônia e Acre, emoposição ao Mato Grosso, por exemplo, que tem aposse da terra muito mais concentrada (Tabela 6). Osdados sugerem que mesmo em Rondônia, conhecidapela ocupação por pequenos agentes, osdesmatamentos menores que 15 hectares respondempor apenas 16 por cento dos desmatamentos noestado. Confirmando estas tendências, Fearnside (2002)baseado nos dados da FEMA – MT, sugere que apenas2% das áreas desmatadas no Mato Grosso, entre 2000e 2001, eram menores que 6,5 ha.

1997 1998 1999 Tamanho dos plots (ha) Inpe (a) Ibama (b) Inpe Ibama Inpe Ibama

< 15 10,1(c) 7,5 10,9 10,5 14,8 9,8 15 – 50 23,1(d) 14,9 24,2 16,0 25,1 15,6 50 – 100 14,1 14,3 14,9 11,9 14,4 12,5 100 – 200 13,9 16,2 12,7 15,2 12,4 13,7 200 – 500 15,1 19,0 14,3 18,4 14,0 18,7 500 – 1000 9,4 14,3 9,5 12,7 8,4 12,4 > 1000 14,3 13,9 13,6 15,6 10,9 17,3 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

(a) Toda a AML; (b) 170 municípios para os quais existem dados relativos a todos os anos; (c) menores que 10 ha; (d) entre 10 e 50 ha.Fonte: Adaptado de Pacheco (2002a), baseado em INPE (2000), site do IBAMA/CSR e IBGE.

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 33

TABELA 6. Percentuais dos tamanhos dos plots desmatados por Estado,média 1997-99

(a) inclui os estados do Acre, Amazonas, Tocantins e Maranhão.Fonte: Pacheco (2002a), baseado em INPE (2000) e IBAMA/CSR (http://www2.ibama.gov.br)

2.5 Evolução do rebanho bovino

Além do uso do solo, as evidências sobre a evoluçãodo rebanho bovino na Amazônia também corroborama hipótese da rentabilidade da pecuária em partes daAmazônia. Como mostram os dados da Tabela 7, ocrescimento do rebanho bovino na Amazôniarespondeu pela maior parte do crescimento dorebanho bovino do país, sugerindo uma expansão dafronteira pecuária em direção ao norte. No período

1995-2000, por exemplo, 100% do crescimento dorebanho nacional ocorreu nos três principais estadosprodutores da região – Pará, Mato Grosso e Rondônia– (nos outros estados houve compensação, comalguns apresentando crescimento e outros reduçãode seus rebanhos). As taxas médias de crescimentodo rebanho bovino nos 3 estados entre 1995 e 2000,por exemplo, foram de 6,0% (MT), 5,0% (PA) e 7,6%(RO), enquanto foi de apenas 1,1% no plano nacional.

TABELA 7. Evolução do rebanho bovino (1990-2000), em mil animais

Fonte: IBGE (2000).

O crescimento do rebanho bovino se deu em parte àscustas de desmatamentos e em parte pelo processode intensificação. Por meio de regressões, analisou-sea relação entre expansão da área desmatada e ocrescimento do rebanho bovino (em unidades deanimal). Essas regressões foram feitas em termos de

variações nas densidades8. Os resultados mostram quepara o período 1970/95, o aumento de uma unidadede animal por hectare significou um aumento médio

8 Com o intuito de eliminar efeitos de correlações espúriasque poderiam resultar das diferenças nos tamanhos dosmunicípios que provavelmente tenderiam a viezar para 1(unidade) os coeficientes angulares da regressão.

Hectares Rondônia Pará Mato Grosso Outros (a) Total < 15 16,1 10,5 5,1 15,3 9,5 15 – 50 25,4 8,9 10,9 18,7 14,0 50 – 100 17,6 13,1 11,0 13,7 13,1 100 – 200 15,7 15,0 14,9 16,1 15,2 200 – 500 14,3 19,9 21,1 16,1 19,0 500 – 1000 6,6 11,7 17,8 8,7 13,3 > 1000 4,3 20,9 19,2 11,4 15,9 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Nº de municípios 52 46 39 42 179

1990 1995 1998 2000 Brasil 147.102 161.227 163.154 169.875 Mato Grosso 9.041 14.153 16.751 18.924 Pará 6.182 8.058 8.337 10.271 Rondônia 1.718 3.928 5.104 5.664

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira34

de 1,2 pontos percentuais na taxa de desmatamentoem relação à área do município9. O resultadointeressante é a comparação dos valores entre 1985/95 e 1970/85: o coeficiente reduziu-se à menos dametade entre os dois períodos (de 1,26 para 0,53),sugerindo um forte processo de intensificação. Paracada UA (unidade animal) por hectare, foram

reduzidos os percentuais de desmatamento nomunicípio necessários para comportá-lo (de 1,24%para 0,53%). A intensificação pode também servisualmente observada comparando-se os dois mapasabaixo (Figura 3), que mostram a densidade geográficado rebanho bovino nos anos censitários de 1970 e1996.

9 Observe que não se trata da variação percentual da taxa dedesmatamento, mas a variação em pontos percentuais daquelataxa (i.e., a taxa varia de, por exemplo, 8% para 9%, ao invés decrescer 1%).

FIGURA 3. Densidades do gado (cabeças km2) em 1970 e 1996

1970 1996

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

2.6 Benefícios sócio-econômicosdos desmatamentos: evidênciaspreliminares

Os dados até aqui apresentados demonstram odinamismo da economia rural na Amazônia nasúltimas décadas. Seria crítico, no entanto, analisar seas atividades que levam aos desmatamentos na regiãogeram maiores ganhos de bem-estar do que os custossociais, ambientais e econômicos envolvidos, etambém se estes ganhos beneficiam as populaçõesmais pobres em alguma medida significativa.

O Anexo a este relatório sumaria estatísticas que foramdesenvolvidas como parte deste estudo com o objetivoespecífico de analisar a evolução de indicadores sócio-econômicos na Amazônia. O objetivo original eraavaliar os possíveis ganhos sociais associados aoprocesso de ocupação da terra e dos desmatamentosda região. No entanto, a maioria dos indicadores sócio-econômicos disponíveis não distingüe entre gruposurbanos e rurais, tornando quase impossível se atribuirmelhorias naqueles indicadores especificamente àsatividades rurais e indiretamente aos desmatamentos.Enquanto a causalidade não é clara, os indicadoresapresentados no Anexo demonstram, de maneira geral,que tem havido melhorias significativas nas condiçõessócio-econômicas da região, apesar dessas melhoriasterem permitido, basicamente, apenas acompanhar oresto do país, de modo que o gap em relação a ele nãodiminuiu.

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 35

Apesar dessas limitações, alguns indicadores estãodisponíveis para grupos rurais específicos e podem,portanto, ser mais facilmente associados ao processodos desmatamentos e às atividades econômicassubseqüentes. Dois desses indicadores são aquiapresentados. O primeiro tem a ver com a renda rural.A Tabela 8 mostra o acentuado crescimento do PIBrural per capita em quase todos os estados da AML.Observa-se que além do Amapá, que no entanto sai

TABELA 8. Evolução da renda rural per capita nos estados da AML, 1970-95 (a)

de uma base muito baixa, os carros-chefes docrescimento são justamente os três estados commaiores taxas de desmatamentos – Pará, Mato Grossoe Rondônia. Entre 1985 e 95, o altíssimo crescimentoem Mato Grosso pode ser atribuído principalmente àexpansão da soja na região de cerrado do Estado.Cumpre lembrar, é claro, que o PIB per capita nãoinforma sobre a efetiva apropriação da renda pelaspopulações locais ou mais pobres.

(a) – exceto TocantinsFONTE: IBGE, elaboração IPEA.

O segundo representa benefícios sociais para apopulação brasileira como um todo. A expansão dapecuária na Amazônia tem gerado ganhos sociais quebeneficiam a população brasileira como um todo, umavez que tem sido em grande medida responsável pelaqueda nos preços reais da carne no período (comoindicado na Tabela 7, ela representou cerca de 100%

TABELA 9. Evolução das exportações e do consumo de carne no Brasil (1995-2000)

do crescimento do rebanho nacional desde 1995). Elatambém permitiu uma expansão significativa dasexportações de carne. Este trabalho não fez umaavaliação detalhada destes benefícios, mas a Tabela 9ilustra a evolução recente das exportações de carne edo consumo anual per capita de carne no país.

FONTE: Cepea/Esalq/USP (2003).

Estado 1970 1975 1980 1985 1995 Acre 547 492 760 894 1.089 Amapá 294 404 673 817 2.467 Amazonas 488 554 726 1.145 1.280 Maranhão 270 376 434 404 509 Mato Grosso 424 629 1.307 1.202 4.311 Pará 356 473 784 909 1.436 Rondônia 712 755 832 1.139 2.304 Roraima 785 1.126 1.121 1.102 202

1995 1996 1997 1998 1999 2000 Exportações (1000 t.eq. carcaça) 277,9 274,8 300,6 381,1 560,0 586,8 Consumo anual per capita (kg/ano) 35,6 38,4 36,0 34,4 34,7 35,7

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Em termos monetários, as exportações cresceram demenos de US$ 500 milhões em 1995 para mais deUS$ 1 bilhão em 2000. O consumo per capita, poroutro lado, não aumentou. Isto não necessariamentesignifica que todo o aumento da produção tenha sidoexportado, uma vez que os tipos de carne exportadae consumida domesticamente são diferentes. Osanalistas sugerem ainda que o Brasil apresenta um

enorme potencial para expandir sua participação nomercado global de carne. Ainda que essa capacidadede expansão e as exportações representem importantesganhos de divisas, a questão, evidentemente, é saberse estes e outros benefícios justificam os custos sociaise ambientais dos desmatamentos. Estes são tratadosno capítulo 5.

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3Diferentes Fronteiras e Dinâmicas

Econômico-Sociais: Determinantesda Ocupação da Amazônia

Segundo a perspectiva econômica, a Amazôniabrasileira caracteriza-se pela abundância derecursos naturais – terras agricultáveis, depósitos

minerais, florestas naturais, etc. – que permanecemsem exploração ou apropriação privada. Presume-seque parte significativa desses recursos naturais sequerfoi ainda dimensionada. A existência de recursosnaturais abundantes sem apropriação privada explica-se em grande medida pelos elevados custos detransporte e de exploração econômica impostos pelacondições geo-ecológicas únicas da região que, comas tecnologias disponíveis, implicam baixalucratividade e reduzida capacidade de sustentaçãopara as atividades agropecuárias.

Devido a esta combinação de fatores, durante séculosa Amazônia brasileira permaneceu como fronteira

econômica, demográfica e geopolítica do país. A partirde meados da década de sessenta do século passado,a dinâmica da ocupação assumiu característicasdistintas em termos da velocidade e fundamentos doprocesso. A redução dos custos de transportespropiciada pelos investimentos governamentais nosgrandes eixos rodoviários, os subsídios fiscais ecreditícios aos investimentos privados e a emergênciade mercados consumidores urbanos mais próximos(e.g. Brasília, Belém e Manaus) tornaram lucrativa aimplantação de atividades agropecuárias, antesinviáveis na região. O processo de ocupação intensificou-se de forma drástica nas três últimas décadas.

Entre 1970 e 2000, por exemplo, a malha rodoviáriada região foi duplicada, com a construção de mais de80 mil quilômetros de estradas10. Ilustrando o impacto

10 Excluindo os estados do Maranhão e de Tocantins, GEIPOT(2002).

(a) – Custo da tonelada transportada até a cidade de São Paulo,em Reais de 1995.FONTE: Baseado em Castro (2000), elaboração IPEA.

FIGURA 4. Evolução dos custos de transporte, 1980 e 1995(a)

Custo de transporte para São Paulo

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das estradas, os mapas abaixo mostram a evoluçãodo custo total por tonelada transportada de cadamunicípio da Amazônia até a cidade de São Paulo(proxy para os mercados do Centro-Sul do país) nosanos de 1980 e 1995.

Os censos demográficos e econômicos de 1970 a 2000apresentam evidências adicionais das característicasde fronteira da Amazônia brasileira e a dinâmica desua ocupação ao longo deste período. Em 1970, aAmazônia brasileira era um vazio demográfico comdensidade geográfica média de apenas cerca de 1,5habitantes/km2, com menos de 1 habitante/km2 nasáreas rurais. Apenas 12% do território da regiãoencontrava-se em propriedades privadas, sendo quemais de 80% dessas propriedades não eramdesmatadas.

Nas décadas que se seguem, a dinâmica de ocupaçãoda fronteira foi avassaladora. O crescimentopopulacional, em grande parte devido aos fluxosimigratórios das demais regiões do país, foi de 3,5%ao ano, quase o dobro da taxa média nacional nomesmo período. Apesar disso, a densidadedemográfica permanece ainda em níveis típicos defronteira, com valores médios em 2000 que atingiram4,1 e 1,3 habitantes/km2 para a população total e rural,respectivamente.

Em termos econômicos, a dinâmica da ocupaçãosignificou dobrar a área em propriedades privadas econverter para uso agropecuário cerca de 12% doterritório amazônico, ou seja, 600 mil quilômetrosquadrados de florestas.

Os processos de ocupação econômica e demográficada fronteira amazônica foram articulados edependentes dos impulsos econômicos oriundos doCentro-Sul do país bem como de políticas públicas.A reduzida densidade populacional e a ausência deinfraestrutura econômica na região implicam preçosde terra menores que no restante do país, gerandoestímulos para a integração da economia da Amazôniaa do resto do país. Esta integração se dá pelaapropriação privada das terras, com a consolidaçãodos direitos de propriedade freqüentemente se dando

de forma ilegal, seguida da utilização em atividadesagropecuárias. Estas vantagens comparativas seoriundam da abundância relativa de terrasagricultáveis e das favoráveis condições climáticas.

A introdução e expansão da atividade agropecuária (ede outras atividades econômicas) por sua vez demandae estimula as migrações e a maior presença do governo,com o estabelecimento dos serviços básicos e dainfraestrutura, incluindo a de transportes, que por suavez também implica o aumento da lucratividade daagropecuária, reforçando a competitividade da região.

No longo prazo, contudo, o fator fundamental para asustentação econômica das atividades agropecuáriasfoi, e deverá ser, a adaptação de tecnologias para ascondições geo-ecológicas específicas da região, emboa medida financiada pelo governo. Esse processotem ocorrido sobretudo no cultivo da soja e naexploração pecuária ao longo das duas últimas décadas.

Os objetivos geopolíticos de soberania do território econtrole do potencial econômico dos recursos naturaisda região complementaram os objetivos econômicosestritamente privados da ocupação e desmatamentoda região. Além da busca pelo acesso aos mercadosdos países vizinhos e pelo acesso rodoviário ao oceanoPacífico, os interesses geopolíticos são legitimados pelaextensa fronteira política com 8 países sul americanos,gerando portanto a necessidade de monitoramento eproteção militar, sobretudo tendo-se em conta quealguns desses países são elos cruciais na rota do tráficointernacional de drogas.

A despeito da importância dos fatores geopolíticosno avanço da fronteira, uma vez findo o ciclo daspolíticas governamentais que construíram osprincipais eixos rodoviários de penetração, atraíraminvestimentos maciços e estimularam as grandesmigrações, a dinâmica do processo de ocupaçãotornou-se crescentemente endógena, ou seja, “criouvida própria”. As atividades econômicas queestimulam a incorporação de novas áreas para aexpansão da produção agropecuária e o desmatamentonão dependem de subsídios ou transferênciasgovernamentais do restante do país, muito embora a

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região mantenha-se dele dependente em termos demercados e de financiamentos.

A dinâmica de ocupação não foi homogênea. Adiversidade de condições geo-ecológicas e dedistâncias aos grandes mercados consumidores, queimplicam diferenças significativas nos custos detransportes e de exploração econômica, causaramdinâmicas de ocupação distintas em termosgeográficos, econômicos e sociais. Diversos outrosfatores, não econômicos, levaram também a históricosde ocupação diferenciados regionalmente.

Em termos sociais, os atores do processo de ocupaçãoda fronteira distinguem-se por sua motivação erecursos. O arcabouço analítico de Schneider (1995)sugere que as áreas mais distantes atraem apenas osagentes pioneiros com menores custos deoportunidade; na “fronteira consolidada” encontra-se uma maior presença dos agentes mais capitalizados.Esses dois tipos de agentes possuem estratégias deatuação significativamente distintas.

Os pioneiros têm, fundamentalmente, uma estratégiaespeculativa, sendo sua atuação econômica derivadaem larga medida da mineração de nutrientes (nutrientmining). Caracterizados pela itinerância, as atividadespredominantes tendem a ser a extração mineral, aexploração madeireira, a pequena agricultura e apecuária de baixa intensidade, que basicamenteconsolida direitos de propriedade primitivos. Asestratégias desses agentes variam também de acordocom sua percepção sobre o avanço e a futuraconsolidação da fronteira, da futura disponibilidadedaqueles agentes a pagar por novas terras(rentabilidade da terra) e da possível construção deinfraestrutura.

As políticas governamentais são pouco efetivas parao controle da atuação dos agentes pioneiros. As razõessão, por um lado, a menor presença e capacidade deatuação do governo nas áreas de fronteiras e, poroutro, a menor aversão ao risco dos agentes pioneirosque, em termos simples, estão dispostos a tudo. Juntocom estes agentes e as vezes até mesmo antecipando-se a eles, existem também os pequenos colonos,

migrantes, trabalhadores rurais despossuídos, quetambém coexistem nessas regiões. Mas seus motivossão distintos: eles simplesmente logram alcançar seuscustos de oportunidade com a pequena produçãoagrícola de subsistência ou ofertando sua mão-de-obra para os maiores empreendimentos. Porconveniência denominamos de fronteiraespeculativa a região caracterizada por estes agentese processos, salientando que o nome não é plenamentesatisfatório: mesmo aí o processo é econômicamentelógico e a motivação especulativa strictu sensu parecenão significativa.

Os agentes nas áreas consolidadas, diferentemente,são muito mais voltados à produção agropecuáriacomercial e à pecuária em particular. A produção típicaé de grande escala, com tendência acelerada detecnificação e manejo de pastos e de animais. Nestasáreas localiza-se hoje a maior parte dos desmatamentosda Amazônia. Os desmatamentos causados pelosgrandes proprietários nestas áreas consolidadasobedecem menos a uma lógica de ocupação defronteira e mais àquela de capitalistas que decideminvestir na expansão de suas atividades. Os ganhoseconômicos decorrem dos altos índices deprodutividade. Incentivos fiscais, subsídios eespeculação com a terra não desempenham papelprioritário. Para estes agentes, também, os madeireirostêm um papel limitado tanto para financiar a expansãoda produção como para abrir frentes de penetração.Também por conveniência, denominamos defronteira consolidada a região caracterizada por estesagentes e processos11.

11 Estas denominações são práticas apenas. Toda fronteira éem princípio especulativa e deixa de ser fronteira quando oprocesso deixa de ter esta característica. Ao mesmo tempo, afronteira consolidada em verdade não configura uma fronteirastrictu sensu. Mas na medida em que a prática dos agentes aílocalizados é expansionista e, no caso específico da Amazônia,tira proveito da conversão de florestas em terras agropecuárias,eles situam-se no limite da fronteira e o termo ‘consolidada’simplesmente diferencia dos agentes com estratégias maisespeculativas. Desnecessário lembrar que “ambas fronteiras”e todos os processos são demasiadamente dinâmicos, existindoum gradiente contínuo de agentes e estratégias entre ambosextremos – especulativa e consolidada – onde os interessessão congruentes e interdependentes.

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira40

Baseado na necessidade de distinguir entre “faixas”de fronteira, este estudo financiou três pesquisas paraanalisar a dinâmica do processo. A primeira analisatendências da economia da pecuária nas regiões dachamada fronteira consolidada, ou seja, as estratégiase motivações econômicas dos pecuaristas para ocupare desmatar a floresta e o potencial de lucros que podemauferir na região. O capítulo IV sumaria os resultadosprincipais desta pesquisa.

A segunda busca explicitar a lógica e atuação dosagentes na fronteira especulativa, identificando osatores principais, caracterizando as relações sociaisentre eles nestas regiões mais distantes e suas eventuaisrelações com os agentes da fronteira consolidada. Apróxima seção baseia-se, em larga medida, nas liçõesapreendidas com esta pesquisa de campo.

A terceira pesquisa consistiu no desenvolvimento deum modelo econométrico que busca analisar aocupação econômica da Amazônia como umprocesso sistêmico. O modelo analisa algumasrelações entre as principais atividades econômicas –agricultura, pecuária e madeira – tanto no seu sentidotemporal quanto espacial. Seus resultados principaissão sumariados na última seção do capítulo.

3.1 Avanço da fronteira especulativa e oprocesso dos desmatamentos

Esta parte do trabalho baseia-se em parte na pesquisade campo realizada entre fevereiro e maio de 200212.O objetivo central da pesquisa de campo foi entenderas motivações e as estratégias sociais dos atores queestão presentes na fronteira especulativa, em especialas estratégias de apropriação de recursos naturais e asucessão de atores na ocupação da terra. A pesquisaprocurou analisar como os atores principais – grandese médios empresários da madeira e da pecuária e ospequenos produtores rurais – estabelecem aliançasentre si, o que pensam sobre a floresta e seus recursos

e quais os padrões mais correntes de apropriação daterra.

As duas áreas estudadas foram: i) Novo Progresso eCastelo de Sonhos na Rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém), municípios de Novo Progresso e Altamira(Pará), respectivamente, e ii) São Félix do Xingu,especialmente as áreas de fronteira em direção ao rioIriri e à Terra do Meio13, também no estado do Pará.A expansão da fronteira em São Félix é resultante daocupação maciça verificada nos anos 70 em Marabá,que se expandiu em direção ao sul e sudeste do Pará,onde hoje se encontram municípios como Xinguarae Redenção. Na BR-163 há um encontro de duasfrentes, uma descendo de Altamira em direção ao sule outra partindo da fronteira com o Mato Grosso emdireção ao norte.

Os agentes e suas interações

O processo do avanço e da consolidação da fronteirana Amazônia definitivamente não é uniforme. Doisesquemas gerais, não excludentes, podem seridentificados: os que principiam com os pequenosagentes e os que se dão diretamente pelos grandes.No passado, principalmente, a apropriação das terraspúblicas se deu em grande parte pelos pequenosagentes, seja através dos projetos de colonização sejapela ocupação “expontânea”. A capitalização daagricultura no sul do país permitiu aos pequenos emédios colonos venderem suas terras e comprarempropriedades até 15 vezes maiores na Amazônia. Como passar do tempo, por diversos motivos, estespequenos agentes terminaram por vender seus lotes epequenas propriedades para agentes maiscapitalizados. Neste primeiro esquema, portanto, ospequenos agentes antecedem aos grandes.

No segundo caso, os desmatamentos e a penetraçãose dão diretamente pelos maiores agentes capitalizados– madeireiros, empresas de mineração, de energia,grandes pecuaristas, etc. Isto não quer dizer que

12 O Relatório completo – Atores e Relações Sociais em NovasFronteiras na Amazônia (Castro et alli, 2002) está disponívelno Site do Banco Mundial (www.bancomundial.org.br).

13 Região compreendida entre o rio Xingu a leste, estado doMato Grosso ao sul, Br-163 a oeste e a Br-130 ao norte.

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prescindam dos pequenos agentes, apenas que estesentram aí como simples mão-de-obra. Como sugeridono capítulo precedente, o grosso dos desmatamentose do avanço sobre regiões pioneiras pertence a estesegundo grupo.

Neste segundo modelo, os pequenos se fazempresentes nas áreas pioneiras muito mais associadosao avanço das frentes abertas pelas madeireiras e outrosgrandes empreendimentos. O casamento de interessesentre os madeireiros, os trabalhadores rurais eagricultores despossuídos é que permite a aberturade novas frentes. Os madeireiros necessitam da escassamão-de-obra nas regiões distantes onde a madeira éabundante, as terras não tem dono e a fiscalização (detodo tipo) é inexistente. Suas estradas viabilizam aexploração da madeira e permitem o acesso para ospequenos agentes. São essas grandes empresas quetransportam doentes nas emergências e permitem omínimo de circulação monetária. Os trabalhadorespor sua vez são atraídos, às vezes, com a promessa defuturos assentamentos privados, e em algumasocasiões se incorporam ao pequeno contingente detrabalhadores do setor, ou simplesmente se instalamnessas distantes fronteiras, iniciando uma prática deagricultura de subsistência baseada na “mineração denutrientes” da floresta. Dependendo do grau deconsolidação da fronteira e da localização dosempreendimentos, as madeireiras são substituídas porgrandes pecuaristas, que desempenham o mesmopapel. Esquemas semelhantes funcionam no caso deempresas de mineração.

No caso específico das duas frentes estudadas,percebe-se uma diferença marcante. Osdesmatamentos e a velocidade de construção de viasde penetração são muito menores no caso da BR-163. Lá o processo é atualmente dominado pelasmadeireiras e pequenos agricultores, com algunspecuaristas investindo na compra de terras com finsde produção futura, esquentando seus direitos depropriedade, apostando no avanço da fronteira (leia-se asfaltamento da estrada) e investindo seu capitalem mais terras para futura produção. A chegada dasserrarias sinaliza um grande movimento que severificou no padrão de apropriação de terras no Paraná

e no Mato Grosso, que é seguido da pecuária e daplantação de grãos. Algumas experiências jácomeçaram com a plantação de arroz e milho e amontagem de secadoras de grãos e silos dearmazenagem nas sedes de alguns municípios.

No caso de São Félix, os agentes dos desmatamentossão principalmente os pecuaristas maiores14. Dada aproximidade com as cidades do Sul do Pará (Xinguarae Redenção) e, assim, com os frigoríficos destascidades, bem como a extensa rede de estradas,construídas e mantidas por combinações depecuaristas, madeireiros e a própria prefeitura, adistância física e temporal que separa as fronteirasespeculativa e consolidada é muito menor. Convivemaí, os especuladores de terra (agentes especializadosno esquentamento dos títulos e na comercializaçãodas terras), os pequenos produtores rurais, osmadeireiros (cada vez mais distantes, sempre seadiantando ao avanço da fronteira) e os agentes maisvoltados à produção, especificamente os pecuaristasmais capitalizados. Além da madeira, a mineração(cassiterita e ouro) e a extração do jaborandi tambémtiveram importância no aquecimento inicial daeconomia local.

O mercado de terras

A evolução do mercado de terras na Amazônia refletediretamente o próprio processo dos desmatamentosna região. A possibilidade de ganhos de capital com acompra e venda de terras promove, potencialmente,uma corrida pela posse e o desmatamento é a principalforma de se garantir direitos de propriedade. Do pontode vista econômico, este processo decorre dacaracterística de livre acesso das terras originalmentedesocupadas (devolutas ou não) – (Alemida e Campari1993, Young 1998).

14 No caso do Xingu, é voz comum a afirmação de que são osfazendeiros que mais “derrubam”. Segundo uma liderança local“os fazendeiros derrubam de forma escandalosa. O IBAMA só se preocupacom os madeireiros, mas estes têm um papel diferente no processo dedesmatamento, com a abertura de estradas. É um escândalo o que fazemos fazendeiros, pois não fica nada sobre a terra, nem árvores e nem bichos.Os fazendeiros derrubam sem pena e ninguém se preocupa em barrar esseprocesso”.

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Historicamente, o aumento do preço das terras dosul em relação às do norte foi uma força de expulsãode migrantes. Como já mencionado, um pequenofazendeiro no sul poderia dobrar sua propriedademigrando do sul para o norte em 1970: em meadosdos anos 80, ele poderia quase multiplicar por 15.Isto vai tornando estas terras crescentementeinacessíveis para os agricultores pobres e sem terra ealém disto desloca usos menos intensivos, como apecuária, para regiões onde o preço da terra é menor,pressionando a expansão da fronteira, ou seja,aumentando os desmatamentos.

No caso de São Félix do Xingu, por exemplo, o preçoda terra é menos da metade do que em Goiás, deonde vem muita gente para a região. No final doprocesso, a terra que começa a um preço de US$ 3/ha sobe até o preço de equilíbrio com os mercadosvizinhos, que é de cerca US$ 300/ha. Isto sugere queos primeiros ocupantes auferem lucros significativoscom a ocupação, desmatamentos, limpeza, plantio depastagens, eventual legalização da posse e (re)vendada terra. Entretanto, os compradores “finais”, quesão tipicamente os fazendeiros médios e grandes, jápagam um preço de equilíbrio com os dos mercadosvizinhos. Estes preços devem portanto se aproximardos preços de arrendamento destas mesmas terras,uma vez que refletem melhor as reais possibilidadesde produção das terras.

Este é um fato importante. Freqüentemente imputa-se os desmatamentos à especulação da terra (ou seja,com o seu preço). Para os fazendeiros e pecuaristasque estão no final do processo, comprando as terrasjá legalizadas e preparadas para a produção, o preçoque estarão dispostos a pagar por um hectare deveráser igual ou menor ao valor presente líquido daatividade que pretendem implantar naquele hectare.Para os grileiros e especuladores que invadem umaterra devoluta, (primeiramente “domesticando-a” edepois revendendo-a), o preço que aceitarão pelavenda deverá ser maior ou igual aos custos marginaisde suas atividades medidos por hectare. Mesmo paraestes agentes (os da fronteira especulativa), a decisãode desmatar e preparar o terreno depende da certeza

que têm de que seus custos serão sempre menoresque a disposição a pagar dos pecuaristas compradores.Ou seja, que a produtividade da terra será sempremaior que os custos de suas atividades.

O casamento de interesses é evidente, mas aviabilidade do processo depende, fundamentalmente,da disposição a pagar dos pecuaristas em algummomento. É a lucratividade da pecuária quesinaliza, tanto para os agentes iniciais quantopara os próprios pecuaristas, que o desmatamentoe a conversão das florestas em pastagens érentável. Só assim que o processo se sustenta. Senão existissem estes lucros, não haveria interesse pelacompra das terras convertidas e os desmatamentoscertamente diminuiriam. O risco dos agentes pioneirosda fronteira especulativa é maior por eventualmenteterem suas ações (ilegais) processadas de algumamaneira pelo Poder Público (o que na prática,atualmente, é um risco mínimo) do que pela incertezade venda futura das terras que ocuparam e desmataram– quase sempre de forma ilegal. Se para os agentes dafronteria especulativa o risco de terem suas terrasconfiscadas é mínimo, para os agentes da fronteiraconsolidada este risco simplesmente não existe.

Apesar da deficiência de dados, a tendência dos preçosda terra na região corrobora estas hipóteses, já que éinequivocamente decrescente (excetuando um picoem 1986), bem como a razão arrendamento/preçoda terra é crescente (Ferraz 2000). Ambos indicadoresenfraquecem a hipótese de que os desmatamentossão impulsionados por um processo especulativo. Aocontrário, a terra é transacionada muito mais comobjetivos produtivos e seu preço reflete isto. A compradas terras convertidas tenderá, cada vez mais, a serfeita por agentes capitalizados, cujo objetivo primárioé a produção. Nas entrevistas de campo do paperconceitual, foi esta precisamente a perspectiva dosprodutores entrevistados, onde a questão daespeculação foi em larga medida descartada como demenor importância. De acordo com Wunder (2000,p.80), “... a especulação pode ser um canal de ajustede curto prazo, mas não é per se uma causa dosdesmatamentos”.

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Grilagem e consolidação dos direitos depropriedade

O processo que se desenvolve na fronteiraespeculativa é importante pois é aí que começa atransformação da floresta nativa (terras devolutas) emterras tituladas e legalizadas (direitos de propriedadeassegurados) para a produção agropecuária. Em todasas etapas deste processo, os direitos de propriedadesó são assegurados com a ocupação física da terra, oque nos momentos iniciais é muito mais importantedo que qualquer documento de posse. Esta ocupaçãofísica induz a existência de exércitos de grileiros eposseiros, agentes especializados em ocupar terras egarantir sua posse até uma eventual legalização, muitasvezes financiados por grandes madeireiros elatifundiários. Cria-se, assim, uma “legalidadeparticular”, para preencher o vazio da legalidade oficial(ou a presença do Estado).

A grilagem é um processo fundamental no processode conversão das florestas em pastagens. Deve-seatentar para o fato de que a alta rentabilidade dapecuária (a ser tratada no capítulo seguinte) deve-seem parte a uma apropriação de terras que éoriginalmente ilícita (o que é mascarado nas análisesfinanceiras que descartam este processo). A grilagemnão é um processo novo, mas reatualizado em cadanova fronteira aberta à pecuária na Amazônia15. Háinúmeras referências e denúncias no MinistérioPúblico, na Polícia Federal e no IBAMA, confirmandoa grilagem em todas as regiões estudadas (Treccani,2001). Há uma especialização de pessoas que só vivemdo comércio de terras – agentes que poderiam serchamados de especuladores strictu sensu – mas de certaforma muitos atores sociais estão envolvidos na“tiragem” da terra e em todos os procedimentos queenvolvem a sua comercialização. Nessa economia, osagentes que auferem os maiores lucros são os quegrilam e vendem a terra, e os que as compram e

comercializam os lotes em regiões mais capitalizadas.Os fazendeiros entrevistados, supreendentemente,indicaram não perceber o risco potencial da terra serretomada pela União: na verdade, as pessoas queconseguem as terras por este meio permanecem econstroem suas benfeitorias nelas, tornando-se, emmuitos casos, bem sucedidos e participantes dasestruturas de poder local e mesmo regional. Com novastécnicas de desmatamento, burla-se também omonitoramento via satélite16.

Cabe destacar também o papel do INCRA noprocesso de grilagem de terras. Existem inúmerasdenúncias e processos contra seus funcionários,levando a uma dupla leitura que combina expectativade mediação e solução dos conflitos com a decepçãopelo fato de que o órgão não funciona em seusobjetivos de ordenamento agrário. Independente dasdenúncias terem ou não fundamento, uma leiturahistórica, dando relevância às decisões sobre o destinodas terras dessa região nos últimos vinte anos poderiaconcluir, de forma bastante plausível, que há umapolítica articulada de privatização de terras emanipulação da pequena produção como força detrabalho para essa economia.

Esta política é também clara no caso dos projetos deassentamento do INCRA. A instalação dosassentamentos em regiões distantes e desprovidas de

15 Há um modus operandi no sistema de grilagem: i) o pistoleiroocupa e vigia as áreas pretendidas pelos pecuaristas; ii) ospretendentes adquirem documentos frios; iii) depois legitimama posse junto ao ITERPA que tem doado terras do estadonessas áreas de expansão, inclusive as terras da União repassadaspelo INCRA.

16 O desmatamento está sendo feito sem que possa ser detectadopelo sensoriamento remoto. No primeiro ano é feita a derrubadadas árvores de menor porte e o capim é plantado ao mesmotempo em que se desmata – um trabalhador fica junto ao trator,jogando as sementes, enquanto este faz o trabalho de “limpeza”.Um ano após o plantio do pasto por debaixo das árvores, ogado é introduzido na área. A pecuária entra na floresta, semque esta tenha desaparecido para o Estado. O capim é queimadono segundo ano, provocando uma segunda “limpeza” na floresta.As árvores de médio porte são destruídas nesse momento,sobrando apenas as de grande porte. Por não perder as suasraízes no fogo, o capim brota novamente, permitindo mais umavez que o gado seja colocado na área assim degradada. Apenasno terceiro ano é feita a queimada que destrói, de vez, o querestou da floresta inicial, permitindo a detecção pelo satélite.Com este modelo, qualquer ação por parte do Estado seráincapaz de reverter a destruição já consumada ou impedir queo resto das terras com cobertura florestal seja devastado.

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qualquer serviço público funciona estruturalmentecomo mecanismo de desestímulo para os assentados,pois sem escola, sem assistência à saúde e sem meiospara escoar a produção, a tendência é abandonar ouvender os lotes. Nas palavras de um colono próximoa Central “.... esta é uma terra sem lei, de humilhação emuito pistoleiro. A vida não vale nada. Mata-se com a maiorfacilidade... Ainda não colocaram uma justiça lá dentro”.Em todos os assentamentos, os pretendentes das terrasjá estão ocupando as bordas. Com a venda, osassentados retornam às vilas e cidades, onde adquiremlotes urbanos e passam a engrossar a reserva de mão-de-obra para as poucas atividades econômicas daregião, ou seguem outras rotas de migração. Aperspectiva é de agudização da pobreza e dosconflitos17.

Finalmente, além da grilagem propriamente, aconversão de florestas em propriedades particularestituladas não seria possível sem a “generosa”concessão fraudulenta de títulos de propriedadee a corrupção generalizada no mercado de terras.Este assunto foi discutido pessoalmente comprocuradores de alguns Ministérios Públicos Estaduaisda região que reconheceram ser este não apenas umdos pontos cruciais em todo o processo de ocupaçãode terras na Amazônia, mas também ser o maiscomplexo problema de se reverter. Os próprios MPssentem-se incapacitados de deslanchar operações quepossam ameaçar as práticas estabelecidas. O fato éque inúmeras terras hoje tituladas poderiam serlegalmente contestadas, pois a transformação de terrasdevolutas em terras privadas, com títulos reconhecidosem cartórios, depende da prévia revisão do históricode titularidade da terra, o que simplesmente não éfeito pelos cartórios na esmagadora maioria das vezes.

3.2 Determinantes da ocupação daAmazônia: um modelo econométrico18

Este estudo financiou o desenvolvimento de ummodelo econométrico que analisa a ocupaçãoeconômica da Amazônia como um processo sistêmico.Seu objetivo foi fazer uma análise complementar àspreviamente elaboradas em nível micro, sobre asdecisões de alocação de recursos econômicos e dasrelações entre os atores sociais apresentadas na seçãoprecedente e no próximo capítulo.

O modelo analisa com perspectiva sistêmica e emescala regional a tendência temporal e os padrõesgeográficos do processo de ocupação da Amazôniabrasileira, quantificando as relações de interação notempo e no espaço entre as principais atividadesagropecuárias – extração de madeira, pecuária elavouras – e seus efeitos sobre o processo dosdesmatamentos da região, bem como os condicionantesecológicos e econômicos dessas relações.

Esses modelos foram trabalhados em nível municipal,com base em dados dos censos demográficos eeconômicos de 1970 a 1996, complementados porinformações geo-ecológicas e sobre custos detransporte no mesmo nível de agregação geográfica.Com o objetivo de avaliar a importância doscondicionantes geo-ecológicos do processo deocupação, os municípios da AML foram agregadosem classes distintas, segundo a precipitação, vegetaçãoou relevo.

As avaliações foram feitas utilizando painéis de dadosque cobriam todo o período de 1970 a 1996. Comonesse período o número, a área e os limites geográficosdos municípios da Amazônia brasileira sofreramalterações significativas, os dados dos 508 municípios(em 1997) foram agregados em 256 áreas mínimascomparáveis (AMC), para possibilitar painéis e análisesintertemporais consistentes.

17 Segundo lideranças dos assentados em Tucumã e Ourilândiado Norte “...se não tiver incentivo vai acontecer sempre a mesma história.Aqui deu para agüentar 10 a 15 anos. Mas para fixar o produtor tem dehaver um projeto respeitoso do meio ambiente, que possa ser auto-sustentável.Precisa-se aqui de técnicas e de financiamentos para que possamos fazeruma produção consorciada .... Para nós não tem outra saída a não seressa de fazer a junção com a questão do meio ambiente, com oreflorestamento, porque qualquer solução que tentemos encontrar terá deser obrigatoriamente auto-sustentável, para que o abandono de terras nãoseja algo que se repita constantemente”.

18 Esta seção resume os resultados de um dos trabalhoscontratados por esta pesquisa – Moreira e Reis (2002). O textointegral está disponível no site do Banco Mundial(www.bancomundial.org.br).

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A mensuração das atividades foi feita,alternativamente, pela densidade geográfica doproduto (relação entre produto e área do município)ou pelo percentual da área do município empregadana atividade. As condições de acesso e custos detransporte são especificados como variáveis exógenas(pré-determinadas) do processo de ocupação. Asmedidas utilizadas foram as estimativas do custo totalpor tonelada transportada de cada município daAmazônia até a cidade de São Paulo nos anos de1968, 1980 e 1995 (Castro, 2000).

O processo de interação espacial das atividadeseconômicas foi especificado em termos dinâmicos eestáticos. Nos modelos dinâmicos todos os regressoressão pré-determinados, o que permite a sua estimaçãopelo método dos mínimos quadrados ordinários,obtendo resultados mais confiáveis. Os modelosestáticos supõem que a interação espacial entre osmunicípios é simultânea, ou seja, alterações nasatividades agropecuárias em um município podemafetar os demais no mesmo período.

A complexidade do problema de se estimar interaçõesespaciais e temporais impõe restrições sobre o númerode variáveis que podem ser consideradasconjuntamente. Por isso, três modelos foramestimados: (i) o primeiro analisa as interações espaciaise temporais das densidades de produtos nas trêsatividades; (ii) o segundo faz o mesmo para opercentual da área dos município empregado em cadauma das atividades; e (iii) por fim, um modelo mistoanalisa as interações espaço-temporais entre densidadede produto nas atividades pecuária e lavoura com ouso da terra para todas as finalidades agropecuárias(lavoura, pastagem e terras em pousio).

Resultados

O modelo representa um esforço original pelotratamento sistemático de dados do IBGE em nívelmunicipal e pela abordagem sistêmica do processo,analisando a tendência temporal e os padrõesgeográficos do processo, tratando conjuntamente asatividades madeireira, pecuária e agrícola. Isto é crucial

para o entendimento da dinâmica do processo epoucos estudos, até hoje, lograram alcançar este feitono caso da Amazônia (Angelesen 2002). De qualquermodo, apesar do reconhecimento de que os dados doIBGE são a única fonte confiável de informaçõespara os objetivos propostos, estes mesmos dadosapresentam grandes limitações que colocam em xequeos resultados empíricos do modelo. Os dadosapresentam várias deficiências, notadamente no quetoca a produção madeireira (medida unicamente apartir dos estabelecimentos agropecuários). O nívelde agregação (municipal, ou mais ainda no caso dasAMC) tornam também imprecisas várias medidas.Adicionalmente, dão muito maior representação aosmunicípios da Amazônia Oriental (Maranhão eTocantins) do que às regiões central e ocidental daAmazônia, justamente onde os processos dosdesmatamentos recentes são mais intensos. E osperíodos de tempo entre as observações censitárias (5e até 10 anos) podem também gerar perda deimportante informação temporal.

Ao mesmo tempo, é imperioso reconhecer que: i)estes continuam sendo os melhores dados disponíveise ii) poucos modelos alternativos são capazes de fazermelhor representação do processo espaço-temporaldos desmatamentos na Amazônia. O fato dos dadosnão estarem disponíveis em melhor formato implicareconhecer que análises alternativas feitas no mesmonível de agregação padecem do mesmo tipo dedeficiência. A falta de dados em nível de setorcensitário para anos anteriores impede que se façamanálises de painel neste nível de agregação, o que seriacrítico para cobrir as dimensões espacial e temporalque o modelo almeja. Em resumo, o modelo seriauma grande contribuição caso uma melhor base dedados estivesse disponível: na sua ausência, osresultados do modelo perdem credibilidade e devemser interpretados com extrema cautela. Este relatóriorecomenda o financiamento de um estudo que permitaa reavaliação do modelo através do uso de uma basede dados consistente e apropriada, especificamentedados em nível de setor censitário para diferente anos.

A despeito destas deficiências, julga-se importanteapresentar alguns dos resultados do modelo. O

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objetivo não é só analisar os resultados per se, quereconhecidamente apresentam limitações, mas o dediscutir as principais questões levantadas pelo modelo,particularmente a seqüência das atividades e aimportância dos custos de transportes.

Os resultados principais e mais interessantes sugeridospelo modelo incluem:

n O resultado intuitivo que as interações doprocesso de ocupação de Amazônia brasileira,tanto temporais como espaciais, sãosignificativas, confirmando os resultados devários estudos (por exemplo, Alves 2001,Chomitz e Thomas 2000, Fearnside 1993,Andersen et alli 2002, Andersen e Reis 1997);

n em termos de precedência e causalidade, oresultado mais importante talvez tenha sido quequando o processo de ocupação econômica écaracterizado pela densidade de produto, aextração de madeira não é precedida nemprecede nenhum dos outros indicadores deprodução. Isto sugere que, sob uma perspectivaampla e de longo prazo, a extração da madeiracaracteriza-se como um processo autônomoem relação aos demais. Mertens et alli (2002)encontram o mesmo resultado.

Apesar deste resultado provavelmente ter seoriginado da especificação da madeira comoum recurso renovável e não exaurível, éinteressante discuti-lo adicionalmente. Esteestudo não encontrou outros que formalmentepudessem demonstrar a dependência entre aextração madeireira e a pecuária, apesar daprimeira evidentemente anteceder a segundanos locais onde ambas ocorrem. É importantelembrar que, tipicamente, existe um grande gaptemporal entre entre as fronteiras pecuária emadeireira. Isto pode alcançar 10 ou mais anos.Nenhuma estrada pode resistir tantos anos emáreas de floresta sem uma manutençãointensiva. Os pecuaristas podem de fato seguiráreas previamente exploradas e podem mesmodiminuir o gap temporal com a fronteira

madeireira: mas eles não dependem dasaberturas ou de estradas pioneiras. SegundoWestoby (apud Wunder, 2000, p.78), “... aceitara extração madeireira como a principal causados desmatamentos no Brasil é um mito,fomentado por aqueles que gostariam deidentificar facilmente um vilão do processo”.Como este não é um ponto crucial de análisedeste estudo, não se julga importante chegaraqui a um consenso absoluto sobre esta difícilquestão. É suficiente reconhecer que, enquantoa abertura de estradas pelos madeireiros podetornar a pecuária ainda mais rentável,alimentando ainda mais os desmatamentos, aextração madeireira per se não implica maioresperdas de floresta. Como sugerido na sessãoconclusiva, a verdade é que uma atençãodesproporcional vem sendo dada aosmadeireiros em relação aos pecuaristas: aindaque suas atividades devam ser fiscalizadas porserem não sustentáveis e em grande medidailegais, eles não são tão importantes agentesdos desmatamentos como os pecuaristas, sobreos quais deveria ser dada maior atenção.

n a pluviosidade é relevante para todos osmodelos estimados e, nessa medida, parece sero condicionante geo-ecológico do processo deocupação. Esse resultado é amplamente aceitona literatura, sendo corroborado por trabalhosrecentes do próprio Banco Mundial – Schneideret alli (2000), Chomitz e Thomas (2000). Osresultados das estimações sugerem também queo tipo de cobertura vegetal e o relevo não sãotão fortes determinantes geográficos doprocesso de ocupação;

n os impactos da redução dos custos detransporte nos dois modelos sugere que paraas três atividades – rebanho bovino, lavouras eextração madeireira – há uma indução nosentido da intensificação e ganhos deprodutividade no uso da terra. Este aumentode produtividade, por sua vez, pode levar aum aumento ou dimunição dosdesmatamentos, dependendo da elasticidade da

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demanda a preços. O único trabalho conhecidoque tenta formalmente estimar esta elasticidadeno caso da Amazônia (Santana 2000) mostra oresultado talvez contra-intuitivo para a carneno Pará: a demanda é inelástica a preços (umresultado que pode ser talvez explicado pelaincidência da febre aftosa na região). Esteresultado leva a uma situação paradoxal emque uma diminuição nos custos de transportesinduziria uma diminuição dos desmatamentos.

Este resultado é contrário ao unanimemente aceitona literatura, que sustenta que enquanto as estradaspromovem a intensificação e aumento de lucros, elas

aumentam os desmatamentos, implicitamenteassumindo que a demanda é elástica a preços (Angelsene Kaimowitz, 2001; Cattaneo, 2001; Pfaff, 1997;Cropper et alli; 1997, Andersen e Reis, 1997; Lauranceet alli, 2001; Nepstad et alli, 2000). O trabalho maisrecente de Andersen et alli (2002) também contradizo resultado usualmente aceito. A questão, ainda quecontroversa, não deixa espaço para a idéia queestradas de penetração em áreas de florestasvirgens possam não induzir enormes impactosem termos de desmatamentos. Quanto a seuspossíveis efeitos sobre as áreas mais densamenteocupadas e consolidadas, este trabalho se mantémagnóstico.

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4A Microeconomia da Pecuária

de Corte na Amazônia

Conforme mencionado na introdução, aconstatação de que a pecuária ocupa quase80% das terras convertidas na Amazônia e ao

mesmo tempo parece apresentar baixas taxas deretorno, constitui a principal motivação deste estudo.O presente capítulo, talvez o mais importante dotrabalho, enfoca os pecuaristas localizados na fronteiraconsolidada e em particular aqueles mais“profissionais” e capitalizados. O objetivo é analisara tendência da pecuária na região: sua viabilidadetécnica e econômica e a sustentabilidade do ponto devista dos produtores privados. A idéia é que são osprodutores da fronteira consolidada que ditam astendências de ocupação da região: na medida em quesua pecuária se mostra competitiva e econômica, elesestão dispostos a comprar as terras dos primeirosocupantes da fronteira especulativa.Independentemente do processo intermediário ondeestes agentes conseguem auferir algum lucro noprocesso de ocupação, conversão e titulação da terra,o que realmente importa é que ao final deste cicloexiste uma atividade capaz de pagar estas outras parafinalmente instalar-se. Torna-se assim fundamentalestudar a microeconomia da pecuária na região.

É importante salientar que o objetivo não é analisar aeconomia “média” da pecuária na região amazônica,nem tampouco fazer uma análise social do processo,o que é feito no capítulo seguinte. Saliente-se tambémque a fronteira consolidada coincide em larga medida,ou quase integralmente, com as regiões com índicespluviométricos intermediários (Chomitz e Thomas,2000; Schneider et alli, 2002) – entre 1800 e 2200mm/ano. Estas são condições “ótimas” para a

produção pecuária na Amazônia, conforme levantadopor esta pesquisa. Isto implica haver um casamentonão casual entre consolidação da fronteira e condiçõesadequadas de produção pecuária. Isto reforça ointeresse da pesquisa de enfocar precisamente asregiões consolidadas. Assim, o futuro avanço dafronteira pecuária, conforme aqui previsto, baseadono estudo de viabilidade econômica da atividade, ficarestrito às regiões que apresentam condições climáticassemelhantes, reforçando as teses das referênciassupracitadas acerca dos limitantes geo-ecológicos àexpansão dos desmatamentos na Amazônia brasileira.

4.1 A economia da pecuária de cortena Amazônia – breve retrospectiva

Desde o início da década de 70, a atividade pecuáriana região era apontada como predatória e causaprincipal da intensificação do processo dedesertificação. Ela só se tornava lucrativaeventualmente por causa do baixo preço de aquisiçãoda terra, subsidiada pela SUDAM. Além disso, a vendada madeira extraída na própria área produzia recursossuficientes para pagar o custo da terra, odesmatamento, a queimada, a plantação da pastageme ainda a aquisição de todo o gado necessário parainiciar o rebanho. O proprietário usufruía da fertilidadeproveniente das cinzas da queimada por alguns poucosanos e depois abandonava a terra (Tamer, 1970).Schneider et alli (2000) também apontam que atémeados da década de 80 a pecuária não tinhadesempenho financeiro satisfatório com o uso detecnologia tradicional. Ela só seria positiva sehouvessem incentivos fiscais, ganhos especulativos

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com a terra, ou uma favorável relação preço do gado/insumos (World Bank, 1991). Hecht et alli (1988),defendendo a mesma tese, apontavam ainda osobrepastejo e juros baixos como fatores explicativosadicionais. Algumas de suas simulações indicavamque a pecuária “moderna” seria viável somente emcondições muito especiais. A postulação era que osgrandes fazendeiros buscavam não incentivos para ogado, mas para outros objetivos: a pecuária erapraticamente isenta de imposto de renda, o gado erauma garantia de posse sobre a terra, a floresta em péera considerada improdutiva e existiam incentivos ecréditos subsidiados para a pecuária.

Mesmo nos trabalhos mais recentes, Scheneider(op.cit.) relata baixas taxas de retorno da atividade,não conseguindo apresentar uma justificativaeconômico/financeira para o aumento do rebanhobovino. Arima & Uhl (1996) encontraram taxasinternas de retorno baixas e até negativas para aatividade da pecuária de corte. Porém, os resultadostambém evidenciavam taxas acima de 20% para amesma atividade quando se utilizava a técnica dereforma de pastagens, resultados já indicados porMueller (1977).

Num dos livros provavelmente mais abrangentes arespeito, Faminow (1998) argumenta que muitos dosestudos são inconsistentes com a prática observada:os modelos econômicos em geral admitem tecnologiasfixas, o que é muito inadequado para a Amazônia;quase nunca incorporam as óbvias diferenças nossistemas de produção – leiteira, corte, e múltiplo –que implicam estruturas do gado, processamento ecomercialização, investimentos, custos e receitas,enfim, economias completamente distintas. Alémdisto, uma série de fatores não diretamenteeconômicos, ou não diretamente ligados àmicroeconomia da produção pecuária, não eramcaptados nos modelos que tentavam estimar taxas deretorno “teóricas” da atividade, muitos dos quaisforam de fato corroborados pela breve pesquisa decampo ainda do paper conceitual, bem como napesquisa de campo na fronteira especulativa19 (vejatambém Veiga et alli, 2001):

n ainda que conhecida, o gado é uma óbvia formade garantir a posse da terra, o que é umaprioridade absoluta na fronteira como já visto;

n em relação à agricultura, principalmente àsculturas temporárias, o risco da atividade ébaixíssimo em termos de mercados, decomercialização, de preços dos produtos (adespeito da leve tendência de queda, o preçoda carne tem crescido em relação ao dasprincipais culturas agrícolas), das condiçõesclimáticas e de pragas;

n também em relação à agricultura, a pecuáriademanda menores investimentos iniciais eapresenta retornos num período muito menor;

n o gado é uma forma de capital líquido,facilmente transacionável;

n o transporte é relativamente fácil;

n a atividade tem baixíssima demanda por mão-de-obra;

n a pecuária é ótima para tapear todo tipo defiscalização (ao contrário da terra plantada);

n no caso dos pequenos produtores, há benefíciosindiretos, como outros produtos animais, atração, a adubação, além da venda da madeira,que vale também para os grandes;

n no caso dos grandes proprietários, existe opoder político e cultural de ser um grandelatifundiário/fazendeiro.

19 Ficou claro durante a pesquisa de campo na fronteiraespeculativa que a criação de gado é vista pela totalidade dosatores locais como um investimento seguro, rentável e quedemanda pouco trabalho. O Sr. Alexandre Manoel Trevisan, oManeca, pecuarista estabelecido em Castelo de Sonhos,manifesta-se favoravelmente à pecuária como a atividade de“vocação” da região: “Ela faz menos giro de dinheiro (comparativamentecom a atividade madeireira), só que é mais seguro. Você sabe aquilo quevocê tem. Eu, por exemplo, ando com os pés no chão, eu sei o que voufazer e aquilo que eu posso fazer. A madeira é diferente. Se trancar láfora (referindo-se a problemas relacionados ao movimento ambientalista eao MMA e Ibama), ou não conseguir um documento para tirar madeira,vai parando tudo. E mexer com gado não, você vê uma carga de boi, vocêsabe se dá 10 mil real, ou se dá mais, você sabe que deve três mil nocomércio, mil de combustível, dois contos para pagar os funcionários e o

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No mesmo ano e em outro artigo, Young e Fausto(1998) fazem as mesmas críticas aos modelos anteriorese começam a apontar para a viabilidade financeira dapecuária em partes da Amazônia. Outros estudostambém indicavam a viabilidade da pequena pecuárialeiteira (com taxas de retorno de 12%) e da pecuáriade corte em pastagens reformadas (taxas de 12-21%).

Parte da crítica às baixas taxas de retorno encontradasna literatura mais antiga talvez possa advir do fatoque, mesmo hoje, as técnicas de manejo e de produçãovêm ainda sendo testadas e disseminadas e os trabalhosnão capturavam as novas práticas e tendências. Alémdisto, uma hipótese não excludente, os dados de campopodem ter sido buscados em regiões de fronteiraespeculativa, ou junto a produtores menores e/oumenos capitalizados na fronteira consolidada, levandoa subestimativas sobre o potencial de produção. Osresultados se antagonizam com a contínua expansãoda pecuária na Amazônia e tornam-se mais limitadosainda quando se tenta generalizar estudos locais paratodo o contexto amazônico20.

Em resumo, as análises econômicas que sugeremuma baixa rentabilidade da pecuária naAmazônia, ou que sugerem sua viabilidadeapenas quando baseada em subsídios ou ganhosespeculativos, vão claramente contra a tendênciainexorável tanto da contínua expansão dosdesmatamentos e da área dedicada à pecuáriana região, como contra a também inquestionável

redução, ou eliminação, dos subsídios e créditosdo governo para a atividade na Amazônia (verpróximo capítulo).

Como sugerem Schneider et.al (op.cit), há umreconhecimento de que “... o aumento do rebanho bovinoe da pecuária, tanto extensiva de grande porte como de pequenos,continua sem uma boa explicação econômico-financeira empírica.Várias hipóteses, como ganhos de capital com valorização daterra, necessitam de verificação empírica”.

4.2 A pesquisa de campo21

De modo a melhor compreender a microeconomiada pecuária de corte na Amazônia, foi feita umapesquisa de campo utilizando-se uma metodologiaconsagrada na ESALQ, responsável pelo trabalho. Ametodologia consistiu essencialmente de umlevantamento incial de dados junto a fontesgovernamentais e regionais, a construção das planilhasde custo, a determinação das áreas de estudo, arealização dos painéis (pesquisa de campopropriamente), seguidas então da construção dosfluxos de caixa, cálculo dos indicadores dos painéis e,finalmente, a modelagem matemática.

Os dados, além daqueles obtidos nas entrevistas comos pecuaristas, foram inicialmente coletados junto aoSIDRA – Pesquisa Pecuária Municipal do IBGE –que acoplados aos mapas das áreas florestais dosistema PROARCO permitiu inferir e determinar osmunicípios que seriam potencialmente interessantespara este estudo. Os coeficientes técnicos de produçãoforam obtidos na Embrapa, Sindicatos Rurais,empresas de consultoria e lojas de comercialização evenda de produtos agropecuários, INCRA, prefeiturase outras instituições de governo.

As planilhas de custo de produção foram construídaspara os diferentes tipos de sistemas de cada região.Seus objetivos foram:

resto você administra. Eu acho que tem mais segurança”. Quanto àrentabilidade da pecuária extensiva nestas fronteiras, osrepresentantes dos pecuaristas indicam ser pequena, nãoatingindo 5%. Ainda assim consideram a atividade atrativaporque é segura. O referencial de segurança são os riscos dasaplicações no sistema financeiro e a insegurança em relação apolítica econômica do governo. Todos temem confiscos e ogado é uma poupança sobre a qual eles têm controle . 20 Segundo Homma (1993), a expansão da fronteira agropecuáriana região amazônica não pode ser explicada pelos lucros obtidoscom especulação da terra, pois o risco decorrente da invasãode posseiros, a distância aos principais centros urbanos e ainexistência de preços especiais de produtos agrícolasproduzidos na região interferem no preço da terra. Cabe notarque o preço da arroba bovina na Amazônia é cerca de 20%menor que no Sul-Sudeste.

21 Esta seção e as seguintes sumariam os resultados do trabalhorealizado pela ESALQ/USP contratado com o propósito deestudar a economia da pecuária de corte na Amazônia. A versãocompleta do relatório está no website do Banco Mundial(www.bancomundial.org.br).

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira52

n obter informações pertinentes aos custos deprodução e as taxas de produtividade dorebanho para formulação da receita bruta elíquida;

n a captação e o armazenamento das informaçõesnuméricas e daquelas referentes à freqüênciade utilização dos insumos para formar umbanco de dados;

n a obtenção instantânea do fluxo de caixa mensalno período de 20 anos;

n a obtenção instantânea dos índices utilizadosna avaliação de projetos (TIR – taxa interna deretorno e VPL – valor presente líquido).

Os dados primários foram obtidos a partir da pesquisade campo utilizando a metodologia de painéis, ondereuniões diretas são realizadas com os produtoreslocais. Os números resultantes tendem a ser bastantepróximos aos da realidade regional, pois são obtidosatravés do consenso do grupo entrevistado. Alémdisso, a metodologia utilizada em todos os painéis foia mesma e com os mesmos pesquisadores,minimizando vícios de padronização de coleta dedados.

Devido à existência de diversos tipos de propriedadesque variam em área física, tamanho do rebanho,sistema de produção, tecnificação e forma degerenciamento, não é possível extrair as informaçõesde cada propriedade individualmente em uma únicareunião. Para que isso fosse possível, seria necessáriorealizar questionários individualizados e tratar osresultados com métodos estatísticos. Por isso optou-se por orientar o grupo para que fosse definida umapropriedade que melhor representasse as demaisexistentes na localidade. Em geral as propriedadesdefinidas pelos produtores possuem tamanhos médiose sistemas de produção não muito tecnificados e nemarcaicos, ou seja, situam-se em padrões intermediários.

Definida a propriedade representativa, os produtoresforam questionados quanto aos índices deprodutividade, custos de implantação, custos fixos ecustos variáveis da atividade pecuária22. Todos os

parâmetros foram debatidos pelos produtores até queos números fossem definidos de forma consensual.Como indicado adiante, após a realização da pesquisade campo, diversos parâmetros utilizados nos painéisforam confrontados com os dados da pesquisaagropecuária do IBGE, tendo-se mostrado confiáveise dentro dos intervalos observados na prática.

Determinação dos municípios envolvidosno estudo e os painéis

Dados os objetivos da pesquisa, os levantamentos decampo enfocaram regiões mais consolidadas dafronteira para as quais há menos informação. A idéiaé mostrar o potencial da pecuária na região, o que jávem ocorrendo em áreas com maior experiência,indicando a tendência futura (no sentido que estasmelhores práticas devem ser generalizadas na regiãopor uma óbvia questão de competição de mercado).Salienta-se que os resultados do trabalho não refletemas práticas hoje adotadas em toda a Amazônia. Atravésda junção dos dados sobre potencial de crescimentoda pecuária das principais microrregiões com os mapasrelativos às áreas florestais dos três principais estados(Pará, Mato Grosso e Rondônia), escolheu-se osmunicípios de Redenção, Santana do Araguaia eParagominas (PA), Alta Floresta (MT) e Ji-Paraná (RO)para o levantamento de campo.

Ao todo foram realizados 8 painéis que contaramcom a participação de 43 produtores rurais: 4 painéisforam desenvolvidos no estado do Pará (Paragominas– 2, Redenção – 1, Santana do Araguaia – 1), 1 painelem Rondônia (Ji-Paraná) e outro em Mato Grosso(Alta Floresta). Os outros 2 painéis foram realizadosna cidade de Tupã, no estado de São Paulo, região deprodução pecuária das mais importantes do país, como intuito de prover resultados comparativos, tendo-seutilizado a mesma metodologia e o mesmo corpotécnico nos painéis realizados na região amazônica.

22 Os índices e custos declarados pelos participantes não eramrelacionados com as suas respectivas propriedades, mas simcom aquela declarada como representativa e definidaanteriormente.

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 53

4.3 Parâmetros técnicos adotados

Nesta subseção e nas próximas tenta-se sumariar osprincipais parâmetros técnicos e econômicos adotadosnos painéis, apresentando-se uma breve explicação

de alguns parâmetros mais interessantes e/oucontroversos. A Tabela 10 resume o tamanho dapropriedade padrão e os usos do solo adotados nosseis municípios.

TABELA 10. Tamanho das propriedades e uso do solo adotados nos painéis

a – PF – Preço do hectare de áreas que contém apenas a floresta.PI – Preço do hectare de áreas que possuem uma fazenda instalada com infra-estrutura para a atividade pecuária.PN – Preço do hectare de áreas desmatadas e sem infra-estrutura para pecuária (preço levantado só no estado de SP, pornão possuir áreas que contém apenas a floresta).

NOTA: O preço da terra é muito variável sendo influenciado pela distância da cidade, tipo de solo, relevo, uso a que se dispõe,quantidade de área averbada, etc. Os preços da tabela acima são valores aproximados respectivos às propriedades típicas no raio de30 a 40 Km das cidades mais próximas.

Observa-se que em Paragominas as propriedades sãoem geral de grande porte, com as áreas de reservalegal melhor preservadas. A maioria destas reservasnão está intacta, pois as árvores cujas madeiras têmalto valor comercial já foram extraídas. Como aocupação é mais antiga e a posse da terra maisconsolidada, nota-se que a agricultura mecanizadacomeça a despontar, principalmente nos últimos 3anos. A maior parte das pastagens foi formada háduas décadas e os grandes troncos remanescentes do

processo de desmatamento já foram queimados váriasvezes ou degradaram com a ação da alta temperaturae umidade; com isto, o custo do enleivamento émenor, facilitando a implantação da agricultura emlarga escala. Além disso, os pastos degradaram devidoao seu manejo incorreto, à superlotação, à baixafertilidade do solo da região, levando à compactaçãoda terra, redução da rebrota e, por conseqüência, àqueda da produtividade das gramíneas. Este fator,aliado ao relevo plano e ao clima, tem propiciado o

Município Tamanho das propriedades Uso do solo Preço da terra

(Reais/ha)a Painel –1 12.000 hectares

50% – Reserva 50% – Pastagem

Paragominas –PA Painel –2 15.000 hectares

60% – Reserva 36% – Pastagem 4% – Agricultura

PF – R$ 300 PI – R$ 1.250

Redenção – PA Painel – 3 4.800 hectares

50% – Reserva 50% – Pastagem

PF – R$ 300 PI – R$ 1.300

Santana do Araguaia – PA Painel – 4 3.200 hectares 100% – Pastagem PF – R$ 250

PI – R$ 2.000

Alta floresta – MT Painel – 5 1.200 hectares

50% – Reserva 50% – Pastagem

PF – R$ 250 PI – R$ 1.200

Ji-Paraná – RO Painel – 6 1.700 hectares

50% – Reserva 50% – Pastagem

PF – R$ 200 PI – R$ 1.250

Painel – 7 300 hectares

20% – Reserva 70% – Pastagem 10% – Agricultura Tupã – SP

Painel – 8 300 hectares

20% – Reserva 70% – Pastagem 10% – Agricultura

PN – R$ 2.500 PI – R$ 3.300

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avanço da agricultura, especialmente os cultivos dearroz, milho e feijão (a soja ainda encontra dificuldadesdevido à alta pluviosidade, que gera problemas tantono plantio como na colheita).

No caso de Santana do Araguaia, a área destinada àreserva florestal é nula e a declarada em Redençãoequivale a 50%. Através da visualização da região,parece que apenas as grandes propriedades ainda têmtaxas de 50% de reserva, enquanto as propriedadesmenores praticamente não as possuem. Como emParagominas, a produtividade das gramíneas é tambémbaixa, mas ao contrário da primeira, o relevo irregulare o solo pedregoso não têm estimulado o progressoda agricultura na região.

O processo de colonização de Alta Floresta tem pouco

mais de vinte anos. A ação do governo facilitou oacesso à terra, levando o tamanho médio daspropriedades a ser menor que o observado no Pará.As taxas de preservação nas propriedades situam-seao redor de 50%, em respeito ao Código Florestal.

Finalmente, no município de Ji-Paraná as propriedadestêm menor porte médio devido ao histórico doprocesso de colonização. A distribuição dos lotes aolongo da BR-364 foi realizada de forma organizadaporém não racional, desrespeitando as limitaçõesimpostas pelas adversidades do relevo e da infertilidadedo solo. Isto levou muitas das áreas desflorestadas aterem baixo aproveitamento, com algumas tendo sidoabandonadas. A Tabela 11 apresenta os principaisíndices de produção animal conforme indicados emcada um dos painéis.

TABELA 11. Principais índices de produção animal determinados nos painéis

Pará M. Grosso Rondônia S. Paulo Índices Paragominas S.Araguaia Redenção Alta

Floresta Ji-Paraná Tupã

Tipo de sistema (a) CRE E RE CRE CRE CRE CRE E U.A. por hectare (b) 0,71 1,53 0,86 0,83 1,18 0,91 1,14 1,08 Taxa de Mortalidade (animais jovens) 4% - - 4% 3% 3% 2% -

Taxa de Mortalidade (animais adultos) 2% 2% 2% 2% 1% 2% 1% 1%

IEP – (Intervalo entre partos, meses) 15 - - 16 14 14 17 -

Taxa de Prenhez 75% - - 87% 88% 85% 75% - Ganho diário de peso em Kg (média anual) 0,47 0,50 0,42 0,42 0,43 0,45 0,37 0,33

(a) – Tipos de sistema declarado nos painéis:CRE – Cria, recria e engorda, ou seja, a propriedade possui matrizes para gerar seus próprios bezerros e áreas destinadas aocrescimento e a terminação de bovinosRE – Propriedade executando as etapas de recria e engorda, necessitando comprar bezerrosE – Propriedade executando apenas a engorda, necessitando comprar bezerros ou bois magros

(b) – Unidade animalFONTE: Dados da pesquisa de campo.

Comparando os índices, observa-se que o melhordesempenho foi obtido no painel de Alta Floresta –para os painéis de cria, recria e engorda – e deParagominas – para os painéis de recria e engorda.

Na região de Paragominas, observou-se um empenhomaior para desenvolver e aprimorar as tecnologiasreferentes ao manejo e a recuperação de pastagens. Aregião de Alta Floresta caracteriza-se por ser uma área

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de colonização muito nova que possui áreasprivilegiadas. Existem grupos de pecuaristas bemorganizados que buscam tecnologias de manejo depasto.

Como mencionado anteriormente, os parâmetrostécnicos obtidos a partir dos painéis foramconfrontados com os mesmos parâmetros constantesdos censos agropecuários do IBGE. Os parâmetroscomparáveis e seus valores estão sumariados na Tabela12.

TABELA 12. Comparação dos parâmetros dos painéis com os dados do IBGE,município de Paragominas – PA

Painel IBGE

Tamanho da Propriedade 12.000 7.352 Mortalidade animais jovens 4% 10,2% Mortalidade animais adultos 2% 0,7% Taxa de Prenhez 75% 82,8% UA por hectare 0,7 3,0

Com relação ao tamanho da propriedade, não seriapossível ajustar a planilha para outros valores poisnão haveria como reavaliar as benfeitorias emaquinários de uma propriedade de tamanhodiferente do mencionado na pesquisa de campo.Qualquer redução proporcional não afetaria a receitapor hectare. Com relação às taxas de mortalidade, éimportante notar que os dados do IBGE referem-seao Censo Agropecuário de 1996, de modo que osdados devem ter sido coletados por volta de 1994-95.Esta diferença de 7-8 anos em relação aos dadoscoletados no presente estudo é vital: a taxa demortalidade é um dos parâmetros chaves para ospecuaristas, sendo portanto onde muitos dos ganhosde produtividade recentes ocorreram, com adisseminação de técnicas como a inseminação artificial.Quanto à taxa de UA, os dados dos painéis dos quatrooutros municípios são quase integralmentecoincidentes com os do IBGE. No caso deParagominas parece haver um erro de medição nosdados do IBGE, superestimando o número deanimais por hectare. Caso se alterasse este parâmetro,a rentabilidade subiria drasticamente e não pareceriarealista, tendo-se optado pela manutenção doparâmetro da pesquisa de campo.

Clima

Dentre os fatores ambientais que mais afetam aatividade da pecuária extensiva estão a freqüência e aextensão do período de seca e a luminosidade. Elespodem ser considerados os principais elementos quedeterminam o crescimento das pastagens e,conseqüentemente, o melhor desempenho daprodutividade.

Observa-se que o período de seca é muito mais longona região sudeste, enquanto as áreas próximas à florestaamazônica, além de apresentarem períodos de secamais curtos, possuem elevados índices pluviométricos,alta temperatura e elevada umidade relativa do ar,fatores que promovem a redução dos custos na épocada seca. Este parece ser o ponto mais favorável àprodução pecuária na região, embora sejaimportante destacar que as variedades de capimutilizadas na região são as mesmas das utilizadasem outras regiões do Brasil. O desenvolvimentode variedades mais adaptadas a esta regiãopoderia elevar ainda mais a produtividade eprevenir contra pragas e plantas invasoras.

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4.4 Custos de produção – pastagens

Inicia-se pelo caso do sistema cria-recria-engorda. Parapossibilitar a rápida visualização gráfica em um espaçorestrito, o fluxo de caixa de 240 meses foi divididoem cinco partes, onde cada uma apresenta a soma de

48 meses, ou seja, 4 anos. Além disso, as colunasforam divididas em 7 ítens principais. Observa-se quea proporcionalidade entre os ítens não é muitodiferente nos quatro municípios da região amazônicae portanto apresenta-se apenas o gráfico específicode Redenção (PA) – Gráfico 1.

GRÁFICO 1. Custos de produção – painéis de cria-recria-engorda

Os gastos com a aquisição do rebanho são elevadosapenas na fase de implantação da fazenda devido àcompra de novilhas e vacas solteiras; os custosdestinados às máquinas e implementos são relevantestambém apenas em Paragominas, uma vez quealgumas propriedades consorciam a pecuária comatividades agrícolas; quanto aos custos destinados àcriação animal, a grande maioria dos gastos (cerca de75%) é dirigida à compra de sais minerais. O altopreço está vinculado aos custos do frete rodoviário.

Outros sistemas

No sistema de recria-engorda os custos com aaquisição de animais – compra de bezerros – são osmais expressivos. No sistema de engorda estes custossão ainda maiores, pois há a necessidade de comprade animais mais pesados destinados apenas àterminação. Quanto à proporcionalidade dos outroscustos, os custos da pastagem novamente variam e os

demais ítens são relativamente semelhantes (ver Barroset alli (2002) para maiores detalhes).

4.5 Receita líquida por hectare

A renda líquida por hectare é muito importante napercepção do produtor rural, sendo o principal pontoanalisado no momento da tomada de decisão sobreas atividades e os investimentos a seremimplementados. A pesquisa mostrou númerossurpreendentes em termos de produtividade porhectare para praticamente todas as atividadesestudadas na região amazônica. Para a cultura dasoja, que está em fase de implantação, o valor éexpressivo, embora a região ainda não tenhaestruturado os canais de comercialização. No casoda pecuária, o retorno por hectare é bastanteelevado em decorrência dos grandes níveis deprodutividade alcançados. O período de seca naregião dura aproximadamente dois meses e com um

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grau de “stress hídrico” da planta menor que osverificados em outras regiões do Brasil. Dessa forma,enquanto na região de cerrado ou na região sudesteos animais de pasto perdem peso durante 4 meses, naAmazônia estudada não se verifica isso.

No Mato Grosso, região de cerrado onde a atividadepecuária é extensiva, a produtividade é muito baixa eo retorno obtido com a atividade não é um atrativopara os produtores. Na realidade, a pecuária nessaregião tem a finalidade de ocupar áreas onde osproprietários acreditam que a agricultura pode serviável, representando uma reserva de caixa da empresacujo principal foco de negócio é a agricultura.

No Pará, e na região amazônica de forma geral, existepouca disponibilidade de informações históricas e depesquisas em relação ao potencial produtivo da soja.No levantamento de campo, ficou evidente que noMato Grosso a atividade agrícola termina em Sinop.Na região de Alta Floresta, com a mudança dapaisagem (aumento da declividade), a atividadeagrícola praticamente desaparece.

Na Tabela 13 são apresentados os rendimentos médiosobservados para a atividade pecuária considerandoprojetos com 20 anos de duração. Verifica-se que areceita líquida por hectare nas diferentes regiões daAmazônia é maior, em todos os casos, do que aencontrada em Tupã/SP, uma região típica deprodução pecuária no Centro-Sul do Brasil quefunciona como o “termômetro” para a pecuária noBrasil.

Para as localidades analisadas da região amazônica,os resultados podem ser considerados de bons asuperiores. A diferença dos preços entre a região deestudo e as demais regiões do Brasil é notável. Issoocorre pelo fato das regiões estudadas da Amazônia,com exceção de Alta Floresta, estarem na zona demédio risco da febre aftosa, significando que a carneali desossada pode chegar a São Paulo, mas não podeser exportada. No estado do Pará, o preço do animalvivo é 15 a 20% menor que o preço praticado em SãoPaulo; em Rondônia essa diferença pode chegar até25%, mas as circunstâncias edáficas atuais desta regiãotraduzem-se em maior lucratividade da atividade quedispensa a recuperação das pastagens, o mesmoocorrendo em Alta Floresta.

4.6 Análise da rentabilidade

Comparando-se os dados de custos e de receitascoletados nos painéis, foram construídos os fluxosde caixa mensais de cada região estudada, o quepermitiu a determinação da Taxa Interna de Retorno(TIR). Para calculá-la manteve-se todos os preços dosinsumos e da arroba bovina constantes. O preço daarroba utilizada refere-se ao preço pago à vista peloscompradores locais no dia da construção de cadapainel.

Com relação ao preço da terra, cujos valores foramcoletados na pesquisa de campo, há de se fazer umaobservação. Caso ele seja adicionado aos custos deinvestimento, o valor total da propriedade após vinteanos também deverá ser adicionado e lançado na

receita bruta do último ano, quando realizadaa liquidação do projeto. A estimativa do preçofuturo da terra de cada região pode não serprecisa devido aos inúmeros fatores exógenosque interferem na sua formação. A prática,entretanto, sugere que independentemente dasua produtividade, o preço da terra 20 anosdepois será sempre maior que o de uma áreavirgem/florestada. A implicação é que ainclusão do preço da terrra leva a umaumento da rentabilidade da atividade.Assim, optou-se por utilizar duas alternativas,uma em que o preço da terra simplesmente

TABELA 13. Receita líquida por hectare dapecuária (R$/ano)

Alta Floresta / MT (região Amazônica) 138,91 Ji-Paraná / RO 132,87 Paragominas / PA – Ciclo completo 95,39 Paragominas / PA 102,98 Redenção / PA 65,83 Santana do Araguaia / PA 95,80 Tupã / SP 65,32

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não entra nem no investimento inicial nem nomomento da conclusão do projeto, e outra em queele entra em ambos. O caso sem o preço da terrapermite que seja comparada a rentabilidade apenasda atividade de pecuária de corte nas diferentes regiões,

excluindo as diferenças possivelmente ocasionadas pelavalorização ou desvalorização da terra. Em todas asanálises posteriores o cenário com o preço daterra é desconsiderado. Os resultados obtidos sãoresumidos nas tabelas abaixo.

TABELA 14. Taxas internas de retorno referentes aos sistemas cria-recria e engorda

NOTAS: Preços da terra na Amazônia: para abertura – R$ 300/ha; formada – R$ 1.500/ha. Preços das terras em Tupã/SP: terra para abertura e formada – R$ 6.000/há

TABELA 15. Taxas internas de retorno referentes aos sistemas recria e engorda

(a) – Apenas engordaNOTA: Mesmos valores da terra que na Tabela 14

Devido às variações do preço da carne bovina, astaxas internas de retorno foram recalculadasutilizando-se as médias mensais das séries históricasdos preços nos quatro estados envolvidos nestaanálise23. Deste exercício pode-se concluir que osinvestimentos realizados na região da florestaamazônica são maiores, mas geram taxas derentabilidade expressivamente superiores àspropiciadas por investimentos feitos no mesmotipo de atividade no interior de São Paulo.

Cabe ressaltar também que os preços recebidos pelosprodutores da região amazônica pela arroba de boigordo apresentam um diferencial negativo de cercade 20% por causa da febre aftosa. A expectativa éque, na medida que o controle da doença avance, sejapossível que os preços pagos aos produtores elevem-se, aumentando ainda mais a rentabilidade da atividadena região.

Finalmente, no caso em que o preço da terra éincorporado, o valor considerado foi o de mercadoinformado pelos produtores locais. Estes preçosembutem um processo de ocupação e posse da terralargamente ilegais, como discutido no capítuloprecedente. Assim, eles não seriam adequados numaavaliação social da pecuária.

23 As séries de preço foram obtidas do banco de dados doCEPEA/Esalq – USP. Para cada um dos preços existentes nasérie obteve-se uma nova TIR. O conjunto formado pelas TIRsrespectivas a cada valor médio mensal da arroba de cada regiãofoi distribuído em histogramas de freqüência.

Local TIR s/ terra (%) TIR c/ terra (%) Data do Painel Paragominas – PA 11,0 16,7 22/03/2002 Redenção – PA 9,1 14,6 25/03/2002 Alta Floresta – MT 14,5 15,2 21/05/2002 Ji-Paraná – RO 11,5 N.D. 15/05/2002 Tupã – SP 6,4 6,4 26/04/2002

Local TIR s/ terra (%) TIR c/ terra (%) Data do Painel Paragominas – PA(a) 14,5 17,9 21/03/2002 S. do Araguaia – PA 14,7 16,9 26/03/2002 Tupã – SP 3,8 3,8 26/04/2002

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4.7 Modelagem matemática

As análises dos resultados dos painéis dão informaçõesclaras sobre a rentabilidade da pecuária na Amazônia,e dela em relação ao caso de São Paulo. No entanto,a pecuária numa determinada região da Amazônianão compete com outras regiões do país (apenas),mas principalmente com outras atividades possíveisde serem implantadas na mesma propriedade. Ou seja,o produtor deve decidir entre implantar a pecuária,implantar outras atividades agrícolas e/ou deixar apropriedade florestada, jogando-se para um momentofuturo a decisão de eventualmente desmatar e iniciaralguma atividade agropecuária. Além darentabilidade, o principal fator de decisão dosprodutores na prática é a sua percepção do risco.

Os modelos de programação matemática permitemobter a composição ótima das atividades econômicasdentro das propriedades agrícolas, considerando ounão as condições de risco, e ainda observar ocomportamento tendencial dessas atividades,considerando diferentes cenários.

Resultados do modelo sem risco

Neste modelo verifica-se a combinação de atividadesque maximiza o lucro, admitindo-se implicitamenteque o agricultor é indiferente ao risco, ou seja, oobjetivo do produtor é maximizar as receitas dapropriedade, independentemente das possibilidadesde frustrações de produção e preços, ou de ambos.

O modelo foi desenvolvido para a região deParagominas/PA porque foi a única região do Arcodo Desmatamento em que foram encontradasestruturas de produção agrícola em desenvolvimento.Nas demais regiões, a pecuária predomina. Em AltaFloresta/MT, onde se encontra uma área de transiçãoentre o cerrado e a floresta, as características de soloondulado e pedregoso não favorecem a atividadeagrícola e os índices pluviométricos mais elevadosque na região de cerrado permitem uma produtividaderelativa ainda maior da pecuária.

O tamanho representativo da propriedade é de 15.000hectares, dos quais apenas 4.500 abertos; as máquinastêm financiamento com 3 anos de carência e taxa dejuros de 8,75% junto ao Banco da Amazônia; o capitaldisponível na propriedade é de R$ 1,7 milhões; asreceitas líquidas das atividades nesta propriedade,baseados nos dados da pesquisa de campo emParagominas, estão apresentadas na Tabela 16.

TABELA 16. Receitas líquidas dasatividades – R$/ha

O rendimento líquido dessas atividades é elevadocomparando-se ao de outras regiões do Brasil. Essedesempenho eficiente está ligado ao sistema deprodução adotado, no qual somente pequenasquantidades de insumos são adicionadas às lavourasque já contam com elevada produtividade. O valorda soja, em particular, é bastante superior ao propostopor Costa (2000).

Os resultados do modelo indicam que os produtorestenderiam a utilizar a maior parte do capital com aatividade mais rentável, considerando as condiçõesde fluxo de caixa. Os resultados obtidos recomendamaproximadamente 1.600 ha de soja e o restante daárea devendo ser ocupado com mata24. Essesresultados não correspondem aos valoresobservados no levantamento de campo, sugerindoque os produtores não são indiferentes ao risco:eles procuram alternativas para o seu gerenciamentoatravés de fontes adicionais de renda, trocando parteda receita possível por taxas de risco menores,diversificando as atividades na propriedade.

24 As restrições do fluxo de caixa impedem que a área sejatoda ocupada pelo arroz, em princípio a atividade com maiorreceita por hectare.

Arroz 582,00 Gado de Corte 95,39 Soja 517,21

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira60

Resultados do modelo com risco

Para a inclusão de risco no modelo são utilizados osdesvios da receita bruta das propriedades em relaçãoa uma tendência linear, que representa as expectativasdos produtores rurais. No modelo proposto, os desviossão obtidos através de uma regressão linear simplesonde a variável dependente é a receita bruta e a variávelexplicativa é o tempo. Os desvios para cada uma dasculturas ao longo das últimas 10 safras são

apresentados na Tabela 17. Os valores da tabela sãoconsiderados no modelo que é utilizado agora com afinalidade de minimizar os riscos, dada umadeterminada receita esperada. À medida que a receitaesperada vai reduzindo-se, os desvios também vão e,dessa forma, obtém-se a fronteira eficiente querepresenta o conjunto de pontos que podem seratingidos para diferentes combinações de receita erisco, dados os fatores de produção disponíveis.

TABELA 17. Desvios absolutos das culturas nas últimas 10 safras (R$ de jan. de 2002/ha)

No Gráfico 2 podem ser observados os resultados paraa propriedade de Paragominas, onde as atividadesagrícolas já estão implantadas e ocorre um processodinâmico de substituição da pecuária por culturasanuais. A propriedade estudada em Paragominas estásituada num ponto próximo àquele que apresenta umarenda anual de R$ 900 mil, com a seguinte composiçãode atividade: 238 ha de arroz, 173 ha de milho, 400 hade soja, 4.924 ha de pastagens e 9.262 ha de mata. Aalocação da área para as diversas atividades agrícolasalternativas, conforme os resultados do modelo, é muito

semelhante àquela de fato implementada no campo.O modelo mostrou-se sensível com relação à expansãode área quando ocorrem choques de preços. Mediantea elevação do preço de um dos produtos ocorreprimeiro uma redistribuição da área dentro da parceladesmatada e, somente num segundo momento, podeocorrer o desmatamento. Isso pode ser explicado pelofato de que um aumento de área é condicionado aum investimento grande em derrubada de mata, oqual poucas vezes pode ser pago com o retorno dapropriedade.

Arroz Milho Soja Boi gordo

54,4 108,6 -177,5 1,2 50,4 125,9 139,3 -0,9

-25,1 16,5 241,5 -4,0 -45,0 -104,5 -15,8 2,7 -23,9 -111,5 55,4 6,9 -9,6 -65,7 -229,2 1,7 -45,4 -77,0 -97,9 -6,8 -146,0 -144,7 115,9 -4,0 140,9 33,6 -79,4 -1,6

42,9 53,4 47,3 1,8 5,9 165,6 47,0 3,0

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 61

GRÁFICO 2. Fronteira eficiente – combinações de receita e risco – Paragominas

No ponto onde a curva de utilidade do produtor (linhavermelha) tangencia a fronteira eficiente, tem-se oponto de equilíbrio para a propriedade amazônica.Nesse ponto, os recursos dos produtores são utilizadosem 528 ha de arroz, 547 ha de milho, 1.124 ha depecuária e 1.185ha de soja. O restante da área continuasendo ocupado por mata, ou seja, dos 15.000 ha restam11.613 ha intocados. Estes valores foram obtidos nasentrevistas dos painéis – de que forma os produtoresalocariam a terra entre agricultura, pastagens e florestasem termos percentuais sob as condições sendoanalizadas.

A semelhança entre os resultados obtidos no modeloe os observados na prática indica que os produtoresrurais não são indiferentes ao risco. O produtor ligadoà pecuária ou à agricultura não tem condições de abrirgrandes áreas com o rendimento das atividadesimplantadas, uma vez que as receitas e os fluxos decaixa da propriedade não permitem grandesinvestimentos no curto prazo. Isso sugere que o capitalpara a expansão de área deve vir de outras regiões e/ou de outras atividades.

Comparando-se os resultados obtidos com o modeloe os dados de campo, apenas a área de soja apresentadiferença relativamente significativa. No entanto, éimportante lembrar que a soja está em um processode expansão e que os dados históricos de preço eprodução para o estado só estão disponíveis para operíodo pós-1997.

4.8 Algumas simulações

O modelo matemático permite que se façamsimulações para analisar o provável impacto devariações de determinados parâmetros sobre o sistemaprodutivo. Estas simulações podem auxiliar na análiseprospectiva de políticas que busquem otimizar estesistema do ponto de vista social, bem como ajudar amelhor entender o próprio comportamento dospecuaristas. Cumpre salientar, entretanto, que dado oobjetivo do trabalho, apenas algumas simulações sãoaqui discutidas. O modelo pode de qualquer modoauxiliar na análise de políticas públicas, e está disponívelpara isto. As análises são feitas tomando-se comobase a propriedade típica discutida na seção anterior.

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A primeira simulação analisou o impacto de umaumento de 10% na receita líquida da pecuária, quepoderia advir tipicamente de uma elevação no preçodo produto. Neste caso, a área de pastagem cresceriacerca de 22%, passando de 1.124 ha para 1.376 ha. Ocrescimento absoluto é de cerca de 252 ha, dos quais176 ha ocorrem sobre a área de mata e o restantesobre a área de agricultura, com um deslocamentomais significativo sobre a área de soja (59 ha, cerca de5% da área original da cultura). Um acréscimo de20% na receita da pecuária (ao invés de 10%) deslocaa área agrícola e não altera a área de reserva, poisnesse caso é mais interessante reduzir a área agrícoladado o elevado investimento inicial necessário aodesmatamento.

Com o objetivo de avaliar qual deveria ser aremuneração para a atividade “mata” que tornariaessa atividade atrativa comparativamente às demais,fez-se simulações considerando diversos níveis dereceita líquida anual para a área de mata, iniciando-secom R$ 10,00 por hectare. Duas situações foramtestadas nessa simulação:

n primeiramente considerou-se que o produtorleva em conta não só a rentabilidade dasatividades mas também o risco envolvido emcada uma. Reproduziram-se assim as condiçõesreais da propriedade de Paragominas, comrenda anual próxima a R$ 900 mil (ponto emque a curva de utilidade tangencia a fronteiraeficiente). Nesse caso os resultados indicamque a partir de R$ 45,00 por hectare passa serinteressante aos produtores a manutenção da

área de mata em detrimento das outrasatividades agropecuárias consideradas noestudo;

n no segundo caso, toma-se como pressupostoque o produtor é indiferente ao risco,escolhendo as atividades a serem conduzidasna propriedade apenas em função da suarentabilidade. Neste caso, uma receita líquidapróxima a R$ 200,00 seria necessária para quea atividade “mata” fosse priorizada relativamenteàs demais consideradas no estudo.

Estes dois resultados indicam efetivamente os custosde oportunidade de se manter uma reserva florestalnuma propriedade privada, considerando-se ou nãoo risco. Surpreende o baixo valor do caso com risco.Ele sugere que os produtores estariam dispostos areceber uma quantia relativamente baixa para“imobilizar” parte de suas propriedades em florestasnativas. Isto dá uma idéia da dimensão dacompensação eventualmente requerida por eles e,assim, dos custos de implementação deste tipo depolítica na região (assunto que retornamos no capítuloseguinte).

Foram finalmente feitas simulações sobre o efeito dese introduzir uma taxa sobre os desmatamentos, umamedida de forçar os pecuaristas a internalizarem aomenos parte dos custos sociais dos desmatamentos.Duas taxas foram consideradas: uma de US$15/ha eoutra de US$20/ha (ambas utilizando o câmbio deR$3,55/Dolar). A Tabela 18 apresenta resultados desimulações da aplicação desta hipotética taxa numafazenda típica de Paragominas.

TABELA 18. Resultados das simulações de cobrança de taxa sobre os desmatamentos

(a) - distribuição das atividades do modelo partindo de uma receita líquida anual de R$ 900 mil.

Atividade Áreas originais do modelo (ha)(a)

Novas áreas (ha) com taxa de US$20/ha

Novas áreas (ha) com taxa de US$15/ha

Arroz 239 1.055 729 Milho 173 176 267 Soja 401 476 439 Boi Gordo 4.925 2.666 3.329 Mata 9.262 10.627 10.236

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A primeira coluna reporta as atividades consideradas.A segunda oferece a área ocupada com cada umadelas na solução original, que representa uma fazendade 15mil ha, capital de R$1,7 milhão, com renda deR$900 mil otimizada com respeito ao retorno e aorisco. As terceira e quarta colunas apontam os novosvalores ótimos após aplicação das taxas sobre odesmatamento, as quais reduzem a rentabilidade decada atividade.

Observando-se a Tabela, nota-se que o imposto surteefeito ampliando a área com mata em cerca de 1.365ha (taxa de US$20) e 974 ha (taxa de US$15).Analisando o segundo caso, além da redução dasatividades agropecuárias decorrentes do menordesmatamento, percebe-se uma redução da área compastagem de 1.596 ha, cerca de 63% do acréscimo deárea preservada. Deduzindo da área disponibilizadapela redução da pecuária aquela ocupada peloacréscimo de mata, restam 622 ha (1.596 – 974), queforam usadas aproximadamente da seguinte maneira:490 ha para arroz, 94 ha para milho e 38 ha para soja.Ou seja, o imposto além de induzir a preservação damata levou a uma substituição da pecuária por milho,soja e arroz, principalmente este. Isto quer dizer queos proprietários tenderiam a intensificar o uso da terra,algo esperado ao se defrontarem com maiorespreços25.

Como indicado anteriormente, várias simulaçõesadicionais poderiam ser feitas com base no modeloaqui proposto, mas elas iriam além dos objetivos destetrabalho26. O leitor interessado deve se referir aotrabalho de Barros et alli (2002).

4.9 Considerações finais e tendências

Até o momento, a experiência vem apontando asenormes dificuldades de se manejar o gado na região,mas ao mesmo tempo também o enorme aprendizado,com mudanças de técnicas de manejo de gado, depastagens e de tecnologias. A intensificação e aespecialização podem trazer altos retornos, masdemandam longos períodos de tempo. Os agentesprovavelmente estão ainda numa fase inicial da curvade aprendizado, com os números atuais não refletindomais do que uma pequena tendência. Os pecuaristasvêm se profissionalizando rapidamente por força dospróprios mercados cada vez mais competitivos,havendo uma inexorável tendência de intensificaçãodos sistemas e aumento da eficiência produtiva. Aexperiência do oeste americano aponta no sentidosemelhante ao que aqui se delineia, qual seja: ofracasso econômico inicial não estanca aexpansão da fronteira, mas acelera a adaptaçãotécnica e gerencial.

Esta percepção crescente pelos pecuaristas locais dospotenciais retornos econômicos da produção de gadona Amazônia tem às vezes envolvido carosinvestimentos em melhoria de pastos em terrasrecuperadas: mais de 600.000 hectares abandonadosforam recuperados com variedades melhoradas depasto, a custos aproximados de US$ 260/ha,permitindo densidades de 1-1,5 cabeças/ha e gerandoretornos destes investimentos de 13%-14%. Esta será

25 É interessante comparar a quantidade de dinheiro requeridapelos produtores como compensação para não desmatarem umhectare marginal de floresta (R$ 45 sem risco e R$ 200 comrisco) – um subsídio – com o valor da taxa que faria osprodutores reduzirem a área desmatada como apresentado naúltima simulação. No primeiro caso o valor reflete o custo deoportunidade de se manter a floresta em propriedade privada(obtida calculando-se o valor da floresta que faria os produtoresindiferentes entre esta atividade e a agricultura ou a pecuária).O segundo caso foi calculado aplicando a taxa em toda a área(já) desmatada (um aumento ad hoc nos custos foram aplicadosa cada hectare desmatado). Ambas simulações sugerem quetanto uma taxa quanto um subsídio de R$ 45/ha(aproximadamente US$ 15 dólares/ha) fariam um produtor típicoreduzir a área desmatada em cerca de 1000 ha na propriedadeanalisada, correspondendo a cerca de 17% da área desmatada.Evidentemente a diferença fundamental entre as duas políticasé sobre quem recaem os custos.

26 Uma destas simulações poderia analisar alterações no custode oportunidade do capital. O valor adotado no caso básico domodelo (8,75%) é típico da agricultura mais capitalizada noBrasil, segundo a CEPEA/ESALQ. Mas a pecuária de corteno Brasil sabidamente é uma atividade que não tem tradição deoperar com crédito, de modo que mesmo o valor adotado podeser uma superestimativa irrealista do custo de capital dospecuaristas.

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provavelmente uma experiência a ser generalizada naregião de Paragominas (PA) e em outras onde aprodutividade comece a declinar.

De maneira geral, o alto desempenho das pastagens éque gera os altos retornos econômicos da pecuária naregião. Os principais fatores que levam a estedesempenho são a pluviosidade (intensidade efreqüência), as temperaturas médias, a umidade relativado ar e o tipo de pastagens. Isto sugere que a expansãoda pecuária para regiões sem estas mesmas condiçõesnão deverá alcançar o mesmo desempenho – como éo caso já mencionado das áreas de maior pluviosidade.

Olhando prospectivamente, existem fatores quepodem promover ainda mais ou, contrariamente, afetarde forma negativa a lucratividade e a expansão dapecuária na região (Veiga e Tourrand, 2001).

Fatores que podem reduzir odesempenho da atividade pecuária

Problemas associados à expansão das pastagens.

n o uso em grande escala da B. Brizanta emsubstituição às antigas pastagens de colonião,ocasionado pela sua excelente adaptação ao soloe ao clima da região, pode gerar o aparecimentode campos contínuos de monocultura,facilitando o desenvolvimento de doenças epragas que reduzem significativamente aprodução de massa verde e elevam os custosde manutenção;

n a formação de grandes corredores de ar, devidoà inexistência de barreiras, antes formadas pelasflorestas de grande porte, aumenta o grau dedesidratação das pastagens diminuindo o seupoder de rebrota na época da seca, pois a altaumidade relativa do ar não é conservada;

n o aumento das áreas abandonadas e o manejoincorreto da pastagem favorecem a dispersãode plantas invasoras que competem diretamentecom as variedades de pastos cultivados. Oproblema é particularmente grave nas regiõesde Redenção e Santana do Araguaia. A

utilização de herbicidas é problemática pois osprincípios ativos que combatem estes tipos deplantas invasoras também atuamnegativamente nas variedades de pastocultivado.

Problemas associados à expansão dorebanho bovino

Atualmente os custos associados ao combate dedoenças e agentes parasitários não são muitorepresentativos. Com a expansão das áreas de pastejoe a união dos limites das propriedades facilitando ocontato direto entre rebanhos de propriedades vizinhas,a capacidade de disseminação de doenças e agentesparasitários será maior e isto pode efetivamenteaumentar os custos de produção.

A fiscalização

A grande maioria dos produtores consultados napesquisa de campo conhecia a necessidade de manter80% da cobertura vegetal original previstos na MedidaProvisória 2166 e os riscos associados aosdesmatamentos. A corrupção foi citada diversas vezescomo fator chave para se seguir desrespeitando a lei.De qualquer modo, é inegável que a Medida Provisóriae o receio de infrações inibem um avanço ainda maiordos desmatamentos.

Fatores que podem aumentar odesempenho da atividade pecuária

O aumento do rebanho e o desenvolvimento localpromovem a formação de entidades para a defesados interesses locais e possibilitam que os ganhos deescala sejam incorporados à produção. Em todas asregiões estudadas foi notada a presença de sindicatosmunicipais e organismos estaduais atuantesobjetivando o controle da febre aftosa, a realizaçãode feiras e eventos destinados a aumentar as relaçõescomerciais e a realização de cursos e palestras paraintroduzir e aperfeiçoar novas técnicas27.

27 Em Alta Floresta, por exemplo, os altos custos relativos à

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À medida que as regiões se desenvolvam e a barreirasanitária da febre aftosa seja contornada, é provávelque outros investidores sejam atraídos e os pátiosindustriais de frigoríficos das regiões sul e sudestesejam deslocados para a região. Isto certamenteinduzirá a elevação do preço da arroba e ampliarámercados.

Finalmente, um dos fatores potencialmente maisfavoráveis à expansão da pecuária na Amazônia sãoas perspectivas dos mercados interno e externo.Segundo Santana (2000), estas condições são favoráveisao desenvolvimento da pecuária de corte, desde quehaja uma maior preocupação com a qualidade doproduto final. A evolução da exportação, no entanto,está atrelada não só a demanda internacional, mastambém às tarifas internacionais, às questões sanitáriase àquelas que visam à proteção da economia dos paísesimportadores (Haan et alli, 2001).

Assim como houve a ligeira mobilização de entidadesformadas por produtores rurais para o controle dafebre aftosa, é provável que a adoção de mecanismosvisando a rastreabilidade e a obtenção de animais maisprecoces, sem o uso do confinamento e de produtoshormonais, possam ser rapidamente absorvidos pelasprincipais fazendas destas regiões.

Olhando prospectivamente, a economia da pecuáriadependerá em grande medida dos custos de transportee da incorporação e consolidação de tecnologiasadequadas à região. Vai naturalmente tambémdepender da conjugação com a produção agrícola eextração madeireira, das transformações dosmercados, em particular do crescimento urbano naAmazônia, e dos custos de oportunidade de se abrirnovas terras (em relação à opção de intensificação).Destes todos, os dois primeiros são os maiscontundentes. As novas tecnologias de produção

certamente irão resultar de misturas de iniciativas depecuaristas inovadores com resultados de pesquisada EMBRAPA e de outras agências; e os custos detransporte dependerão do fôlego do governo deinvestir na provisão de infra-estrutura, em particularde estradas, conforme contemplado principalmentepelo Programa Avança Brasil. O efeito da crescenteurbanização da Amazônia sobre a pecuária permanecelargamente desconhecido e faltam análises.

Para concluir, cabe a pergunta crucial se mesmo como aumento da densidade (intensificação), novas áreasprecisarão ainda ser incorporadas. Nossa percepçãoé a de que vai se manter a tendência de aceleraçãodo crescimento do gado e da área de pastagens.A pressão pela crescente expansão da fronteirapecuária decorrerá não só da dinâmica da própriapecuária, que fica cada vez mais rentável e consolidada,conquistando além dos mercados locais os mercadosdo Sul e externos, mas também da pressão da fronteiraagrícola. Os últimos trabalhos do Banco em parceriacom o IMAZON sugerem que há barreiras naturaisà expansão da pecuária e da fronteira agrícola maisgeral. Esta fronteira é definida principalmente pelosaltíssimos índices pluviométricos nas áreascoincidentes e ao redor do “coração” da floresta densa,índices que estão cada vez mais próximos. Aexperiência da região bragantina paraense ofereceevidência irrefutável de que muito poucas atividadeseconômicas são viáveis nestas regiões e quepraticamente apenas a atividade madeireira pode fazersentido. A dúvida é saber se as lições foram aprendidase disseminadas, ou se ocorrerão ainda muitosdesmatamentos e conversão do uso do solo até quese atente para a inviabilidade da agropecuária nestasregiões. Isto evidentemente clama pela realização eimplementação efetiva de zoneamentos quedirecionem os usos do solo, questão a que retomamosno último capítulo.

compra de sal mineral induziram os produtores a formar umaempresa com o objetivo de fabricar este insumo no própriomunicípio para reduzir os gastos. Hoje a fábrica também investeem pesquisa para melhorar os produtos destinados àsuplementação alimentar.

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5Custos e Benefícios Sociais

dos Desmatamentos

No capítulo precedente discutiu-se aviabilidade econômica da pecuária naAmazônia com base em estudos de caso

em áreas representativas da fronteria consolidada. Osresultados sugerem que em algumas áreas é possívelse obter taxas de retorno relativamente altas, emboraisso não ocorra na região como um todo. O objetivofoi mostrar que existe uma tendência de tecnificaçãoe profissionalização da produção pecuária que é crucialpara explicar a dinâmica dos desmatamentos naAmazônia. São perspectivas reais de produção e delucro que motivam e impulsionam as decisões dacadeia de agentes que inclui desde os primeirosespeculadores do início do processo até os empresárioscapitalizados e profissionais da fronteira consolidada,bem como todo o leque de agentes intermediários.

O fato do lucro privado ser positivo evidentementenão garante o interesse social da atividade. É precisoobservar suas implicações sociais e ambientais,entendidas da maneira mais ampla possível, para sereavaliar sua atratividade. Do ponto de vista social, aidéia seria primeiro expandir a avaliação da economiaprivada da pecuária de modo a incorporar todos ospotenciais benefícios sociais a ela associados, sejameles locais – como geração de empregos, aumento derenda, melhoria das condições gerais de vida dapopulação local, acesso a serviços, etc. – sejam elesnacionais – como menores preços da carne e maiorconsumo proteico pela população (mais pobre). Estesbenefícios sociais seriam adicionados aos benefíciosprivados dando uma noção dos potenciais ganhossociais totais associados aos desmatamentos e àprodução pecuária.

Por outro lado, dever-se-ia mensurar todos os impactosnegativos associados a estes mesmos processos – sejameles ambientais, sociais, culturais, ou outros de qualquernatureza que cunharemos, simplificadamente, deimpactos sociais. Estes deveriam então ser comparadoscom os ganhos sociais acima, ou seja, uma avaliaçãocusto/benefício social da pecuária e dosdesmatamentos a ela associados.

A avaliação social deve ter em conta os custos deoportunidade da pecuária, ou seja, ainda que ocorramganhos privados maiores que os respectivos custos,seria necessário também considerar a existência deatividades alternativas melhores que a pecuária ecapazes de competir em escala com ela – o que éde se esperar de atividades como o manejo florestal,por exemplo. Ou seja, seria necessário comparar osbenefícios sociais líquidos das duas atividades e nãoadmitir a pecuária pelo simples fato de ser viáveldo ponto de vista privado.

Além disto, existem pelo menos três perspectivas parase fazer uma avaliação dos custos sociais dosdesmatamentos – a da sociedade local (i.e., dosmoradores da região), a nacional, e a global. Cadauma delas pode produzir resultados distintos sobre,por exemplo, a extensão admissível dosdesmatamentos, sua localização, etc.

Vale ressaltar ainda que este arcabouço simplificadopressupõe tomadas de decisão não sujeitas a incertezase risco, o que é inadmissível no mundo real. Assim,qualquer avaliação sobre os custos sociais dosdesmatamentos envolverá sempre um enorme grau

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de incerteza, e mesmo que as análises apontem paraum benefício social líquido positivo, pode-seargumentar que o grau de incerteza das avaliações(por exemplo, o valor intrínseco da irreversibilidadeda perda de determinadas espécies vegetais ou animais,ou os possíveis efeitos dos desmatamentos sobre omicroclima e regime de chuvas) força uma ampliaçãodo critério custo/benefício econômico estrito.

Evidentemente, este trabalho não pretende respondera todas estas questões e em todos os possíveis níveisde análise. O capítulo faz algumas avaliaçõesindicativas sobre os custos e benefícios sociaisassociados à expansão da pecuária. A próxima seçãoanalisa sumariamente o papel dos incentivos fiscaisna expansão dos desmatamentos e expansão dapecuária, discutindo a hipótese de que esta só érentável por causa dos incentivos governamentais. Aseção 2 apresenta estimativas feitas para este trabalhosobre os custos econômicos (ambientais) dosdesmatamentos. A seção 3 apresenta algunsindicadores econômicos de atividades alternativas,sumariando as diversas estimativas que podem servircomo uma base preliminar de uma análise custo/benefício social dos desmatamentos.

Como mencionado no capítulo 2, o Anexo a esterelatório apresenta a evolução de alguns indicadoressócioeconômicos na Amazônia. Eles não são incluídosneste capítulo porque não é possível atribuirdiretamente os ganhos observados aosdesmatamentos. O relatório adota uma posturaconservadora quanto à possível extensão daquelesbenefícios locais, não os considerando como efeitosdiretos dos desmatamentos.

5.1 Incentivos governamentais:subsídios fundamentais à pecuária eaos desmatamentos?28

A contribuição dos créditos e incentivos fiscais paraos desmatamentos ainda é uma questão polêmica.Até os anos 80, a visão comumente aceita era que a

pecuária e o gado basicamente serviam comomecanismos de se assegurar a posse da terra,beneficiar de subsídios e créditos do governo e obterganhos especulativos (Hecht, 1993; Tardin et alli,1982). Nesse sentido, os incentivos fiscais tinham papeldecisivo para explicar a expansão do gado naAmazônia nos anos 70 e 80 pelo simples fato dapecuária em larga escala não ser economicamenteviável sem inventivos fiscais (Hecht, 1985; Hecht etalli, 1988; Browder, 1988). Portanto, os incentivos eramessenciais para explicar os desmatamentos na região(Binswanger, 1989; Mahar, 1989).

Schneider (1995) estima que o setor agrícola daAmazônia recebeu incentivos na ordem de US$ 3,172milhões (Dólares de 1990) entre 1971 e 1987, ou umamédia de US$ 300 milhões por ano. Num artigoclássico sobre o papel dos incentivos fiscais naAmazônia, Yokomizo (1989) mostrou que os projetosagropecuários representaram 58% do número totalde projetos aprovados pela SUDAM em 1989, amaioria no Pará e no Mato Grosso (39% e 25% dototal dos projetos agrícolas). A maioria dos projetosagropecuários era do setor pecuário. Contrastandocom os dados dos desmatamentos naqueles doisestados no mesmo ano, estimou-se que os projetosapoiados pelo FINAM representaramaproximadamente 16% do desmatamento depois de1970 (21% no Mato Grosso e 7,5% no Pará). Estasestimativas supõem que a área total dos projetos foiconvertida à pecuária, coisa que na esmagadora maioriados casos não aconteceu (Hecht, 1982).

Os projetos pecuários eram de longa duração, geravampouquíssimos empregos (36 por projeto em média) etinham as mais baixas taxas de retorno em relaçãoaos outros setores beneficiados. Pela falta deinformações, não é possível determinar precisamentea área realmente convertida em pastos por cada projetoe se esta conversão se deu de acordo com os planosoriginais (SUDAM 1995).

Nos anos 90, o crédito subsidiado que aparentementepromovia a expansão da pecuária (ou osdesmatamentos) foi removido e os incentivos fiscaise creditícios da SUDAM foram reduzidos por alguns 28 Esta seção baseia-se em grande medida em Pacheco (2002b).

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anos e sua aplicação melhor fiscalizada. No entanto,as taxas de desmatamento não diminuíram no mesmoperíodo: áreas com propriedades de tamanho médio,com poucos incentivos da SUDAM, apareciam comaltas taxas de desmatamento. Como apontado poralguns estudos econômicos, outros fatores, além dosincentivos fiscais, deveriam estar por trás desteprocesso (Faminow, 1988; Schneider, 1995). Aexplicação é que a pecuária se expande na Amazôniapela simples razão de ser de baixo-risco, ser lucrativapara os pecuaristas (i.e., do ponto de vista privado) eporque os pecuaristas estão mais próximos decapitalistas que decidem continuamente expandir suas

atividades para aumentar seus lucros do que seaproveitar de benefícios diretos ou indiretos dogoverno ou de oportunidades especulativas (Margulis,2001).

A Tabela 19 mostra que de 1991 a 1999, apesar damaior parte dos projetos aprovados ter sido do setoragropecuário, o setor recebeu apenas 16% do total derecursos do FINAM (US$ 580 milhões, ou US$ 64,4milhões por ano). Desde 1996, os incentivos têm sidoprioritariamente alocados ao setor industrial (Arima,2000).

TABELA 19. Incentivos fiscais do FINAM por setor (em milhões de Dólares de 2000)

FONTE: SUDAM apud. Arima (2000) e adaptado por Pacheco (2002b).

Schneider (1995) estima os prováveis efeitos dosincentivos fiscais para a expansão da pecuária naAmazônia nos anos 1980 e 1985 (anos de censosagrícolas) supondo que estes incentivos foram todoscapturados pelos maiores pecuaristas. Ele conclui queos incentivos do FINAM cobriram cerca de 17% dogado em 1980 e 25% em 1985 (em 0,2% e 0,4% daspropriedades, respectivamente). O autor também

propõe que desde os anos 80 o segmento maisdinâmico da indústria pecuária está em propriedadescom menos de 100 animais, portanto não sebeneficiando dos incentivos. Usando a mesmametodologia, Pacheco (2002b) estima que em 1996os projetos agropecuários financiados pelo FINAMbeneficiaram 0,1% das propriedades e cerca de 7,5%do gado – Tabela 20.

Ano Agroindústria Agricultura Indústria Serviços Total

1991 57 41 317 100 514 1992 38 100 249 64 452 1993 4 73 27 6 110 1994 52 12 31 117 213 1995 8 17 44 25 93 1996 47 26 47 56 176 1997 84 92 181 26 384 1998 121 158 443 39 761 1999 146 61 600 6 813 Total 555 580 1,940 439 3,515

Nº de Projetos 125 319 235 54 733

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TABELA 20. Número máximo do rebanho beneficiado pelos incentivos do FINAM (a)

(a) – Inclui os estados do Norte (Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima).FONTE: 1980 e 1985 baseado em Schneider (1995), 1996 Pacheco (2002b) baseado no CensoAgrícola do IBGE 1995/96 e dados da SUDAM. Ver Schneider (1995) para metodologia.

Outros estudos apontam para o fato que a grandemaioria dos pecuaristas, particularmente os pequenose médios, não se beneficiam ou se beneficiaram dosincentivos fiscais (Browder, 1988; Arima and Uhl,1997). A última referência sugere que apenas 4 de 47entrevistados receberam qualquer incentivo fiscal eque nenhum declarou estar na região amazônica comperspectivas de se beneficiar dos incentivos.

Além dos incentivos do FINAM, dois outrosinstrumentos são importantes no financiamento daprodução agropecuária da Amazônia: o crédito rurale os recursos do FNO. A Tabela 21 mostra que ocrédito rural alocado para os estados da região nortena AML vem crescendo, ainda que represente apenascerca de 2%-3% do crédito rural total do país(Gasques, 2001). Uma parcela significativa destecrédito é direcionada principalmente aos pequenosprodutores através do FNO. A parcela do FNO tem

TABELA 21. Crédito rural na Região Norte, 1998-2001 (em Dólares de 2000)

(a) – Crédito para os Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima.FONTE: Adaptado de BCB, Anuários Estatísticos de Crédito Rural 1998-2002.

variado entre 35% e 70% do total do crédito rural e aproporção do FNO indo para o setor pecuário temsido significativa, crescendo de 43% em 1998 para68% em 2001.

Apesar de ser difícil medir diretamente as implicaçõesdo FNO na dinâmica da expansão do gado naAmazônia, é razoável afirmar que contribuiumodestamente em termos da região como um todo,mas foi importante para aumentar o rebanho dospequenos produtores com poucas opções de acessoao crédito de investimento. O gado comprado comempréstimos do FNO (1 milhão de cabeças)representou um incremento de 9% do incrementototal de gado entre 1990 e 2001: 35% do crédito ruraldo FNO foram alocados em operações de pecuáriadurante todo o período, apesar desta participação vircrescendo recentemente.

Estabelecimentos Rebanho

1000 Unidades, 1980 54,8 3.989,1 1000 Unidades, 1985 90,2 5.358,7 1000 Unidades, 1995/96 148,9 12.058,5 % com Incentivos FINAM, 1980 0,2 16,5 Idem, 1985 0,4 25,4 Idem, 1995/96 0,1 7,5

1998 1999 2000 2001

FINAM pecuária 158 61 57 47 Crédito rural total (a) 114 195 284 327 Total do FNO rural 67 137 197 115 Total pecuária 50 83 167 168 FNO pecuária 29 62 114 79 FNO rural/total rural (%) 58.4 70.3 69.4 35.2 % FNO pecuária/total pecuária 58.0 74.1 68.4 47.2 FNO pecuária/FNO rural (%) 43.1 45.0 57.9 68.7

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Os resultados sociais do FNO foram mistos. O créditopreferencial do FNO teve influência decisiva naexpansão do gado de pequenos e micro proprietários,ainda que os objetivos de diversificação produtiva ede sustento familiar não tenham sido plenamenteatingidos. Muitos pequenos proprietários tiveramdificuldades em fazer da produção leiteira sua principalatividade, em parte por causa de deficiências no próprioprocesso de transferências do FNO (Andrae e Pingel,2001), especialmente o desenvolvimento de algumainfraestrutura de processamento do leite e cadeias demercado, facilitando a articulação dos produtores comos mercados emergentes de produtos laticínios (Veigaet alli, 2002). Mas os produtores com maior experiênciacom manejo de gado conseguiram se beneficiarsignificativamente do programa.

Resumindo, pode-se dizer que os incentivos fiscaisno passado tiveram um papel importante paraindiretamente construir a infraestrutura e a baseindustrial associadas à produção pecuária. Também,devido ao desconhecimento de técnicas de produçãopecuária na Amazônia, os incentivos fiscais podemter viabilizado as primeiras tentativas e experiênciasprodutivas, o que não devia ser trivial nos anos 70.Mesmo assim, uma grande parcela dos recursos nuncafoi efetivamente gasta em produção. Com o passardo tempo, as técnicas modernas foram sendodisseminadas, a produção passou a ser competitiva, eos recursos do FINAM para a pecuária declinaramdrasticamente. Hoje em dia, com um controle maiorsobre a alocação dos recursos, pode-se dizer que osincentivos fiscais não tem papel relevante na lista defatores que explicam a lucratividade da produção hojeobservada e, assim, os desmatamentos na Amazônia.

5.2 Estimativa do custo econômico(social) dos desmatamentos naAmazônia29

Com o objetivo de estimar monetariamente os custoseconômicos dos desmatamentos na Amazônia,permitindo algum tipo de comparação quantificada

com os benefícios, foi feito um limitado exercício devaloração ambiental. No caso dos desmatamentos,isto significa identificar valores resultantes do estoquefuturo de floresta que, em última instância, determinaa escassez futura dos recursos ambientais perdidos e,assim, seu valor futuro.

Teoricamente seria necessário incluir parâmetrosdinâmicos para determinar a curva de custo econômicodo desmatamento no tempo e não um valor destecusto em um determinado momento. Mas aidentificação desta curva seria repleta de incertezas eos valores futuros teriam de ser descontados no tempo,isto é, calculados nos seus valores presentes, havendoa necessidade de se utilizar uma taxa de descontosocial. Como a determinação desta taxa não é trivial,pois implica estimar a taxa pela qual o consumopresente deve ser trocado por consumo futuro sem apossibilidade de consultar as gerações futuras, foramadotados cenários para esses valores econômicosfuturos e com distintas taxas de desconto, de modo aavaliar a sensibilidade dessas indeterminações. Oexercício de valoração desenvolvido é uma tentativade mensuração do valor econômico total associadoao desmatamento da Amazônia, referenciada ao anode 2000.

Metodologia e estimativas

As estimativas restringiram-se a algumas parcelas devalor para as quais o conhecimento ecológico àdisposição permitiu uma inferência dos danosambientais e, conseqüentemente, uma estimaçãomonetária. Dessa forma, usos indiretos comomanutenção do clima local, controle de erosão dosolo, de cheias e de reciclagem da água não foramestimados, bem como a proteção contra o fogo30. Asparcelas estimadas foram relativas aos:

29 Esta seção resume os resultados um trabalho contratadopor esta pesquisa com o mesmo título – Seroa da Motta (2002).

A íntegra do estudo pode ser encontrada na Web Site do BancoMundial (www.bancomundial.org.br). 30 O fogo utilizado para abertura de áreas de agropecuária,além de desmatar uma área, permite o avanço do fogo rasteirona floresta aumentando o risco do fogo natural, que pode seespalhar por grandes áreas. Entretanto, a magnitude do usodo fogo nas pastagens pode causar acidentalmente danos às

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n valores de uso associados ao extrativismomadeireiro, não-madeireiro e ao eco-turismo;

n valores de uso indireto associados à estocagemde carbono;

n valores de opção relativos à bioprospecção;

n valores de existência associados à preservaçãoda biodiversidade.

Cumpre ressaltar que o exercício foi feito em termosde valores médios e não marginais como se deveria.Em função da deficiência de informações, este foi oresultado possível. Nas estimativas de produção nãorealizada (forgone output) optou-se por adotar valoresmédios muito conservadores, ou estimados apenaspara determinadas áreas mas divididos pela área totalda AML (ecoturismo). Nos casos dos valores de opçãoe existência, utilizou-se parâmetros da literatura quepossivelmente lidam com a valoração marginal.

Extrativismo madeireiro

O único estudo disponível que analisa o fluxo decaixa do manejo florestal, que é o modo de exploraçãoem que outros serviços ambientais da floresta semantêm, é o realizado com experimentos na regiãode Paragominas – Almeida e Uhl (1995). Os autoresestimam que seria possível gerar uma receita líquidade US$ 28/ha/ano com essas práticas. Como se tratade um valor estimado para o ano de 1994, ele foiatualizado para 2000, passando para US$ 28,5/ha/ano. É plausível admitir que esta é uma subestimativapara projeções de valores futuros porque existe umatendência de esgotamento dos atuais mercadosexportadores de madeira do sudeste asiático que,assim, permitem uma apreciação da madeiraamazônica, inclusive com introdução de espécies hojepouco comercializadas. Este valor está dentro doslimites apresentados na revisão bibliográfica deSchneider et alli (2000).

Extrativismo não-madeireiro

Admitindo que as atividades de extrativismo não-madeireiro já são praticadas de forma sustentável naregião, o desmatamento para conversão agropecuáriaocasionará uma perda de produção que, dividida pelaárea total, resultará valores reconhecidamente muitopequenos se comparados com atividades associadas.Foram utilizados os dados de valor municipal dapesquisa da produção extrativa vegetal municipal doIBGE. A receita líquida foi calculada igual à receitabruta, considerando serem essas atividades de baixaintensidade de capital. Dividindo o agregado da regiãopela sua área total, convertido pela taxa de câmbiomédio de 2000, resultou o valor de apenas US$ 0,20/ha/ano31. Ao contrário da madeira, o mercado futurode extrativismo não-madeireiro é menos promissor,principalmente considerando uma produção na escalaterritorial da região. Dessa forma, não seria razoáveladmitir que essa magnitude de benefícios por hectareseria sensivelmente crescente no futuro.

Ecoturismo

Não existem ainda informações sistematizadas daatividade de ecoturismo na Amazônia, até porque estaainda é incipiente na região. Dada a dimensão da atualárea ainda preservada da Amazônia, é plausível suporque o potencial da atividade possa ser asseguradomesmo com um estoque menor de floresta que oatualmente existente. As estimativas optaram porconsiderar que o potencial da atividade na Amazôniaseria no máximo equivalente ao atual potencial daregião do Pantanal, posto que nesta região já existeum setor de ecoturismo consolidado em um biomaquase que integralmente preservado, além de tertambém uma riqueza de biodiversidade e intensidadehídrica atrativas para a atividade. Admitiu-se aindaque a demanda crescente por esse tipo de turismopermitiria que ambos biomas alcançassem a mesmadimensão sem se afetarem mutuamente. Utilizando omaior potencial dos dados municipais do Mato Grossodo Sul, chegou-se a um valor de US$ 9,00/ha/anocomo a receita líquida a ser sacrificada em ecoturismo.benfeitorias, mas esses prejuízos são externalidades da atividade

pecuária e não do desmatamento. Para uma estimativa de danosde fogo acidental, ver Seroa da Motta et alii (2001). 31 Valor ainda elevado se comparado ao apresentado por

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Estocagem de Carbono

O estoque de carbono de florestas é de difícilquantificação, principalmente na floresta amazônicaonde existem diversas paisagens. Estudos divergem eas estimativas de densidade variam de 70 a 120toneladas de Carbono por hectare (t de C/ha) – Rovere,2000. Adotou-se aqui uma densidade de 100 t de C/ha, abaixo dos utilizados por Fernside (1997) de 191t de C/ha e Andersen et alii (2001) de 150 t de C/ha,podendo melhor representar a densidade média daregião se considerarmos que é nas áreas de transição,de menor biomassa, onde os desmatamentos são maisintensos.

Quanto ao valor da tonelada de carbono, temaigualmente polêmico, adotou-se também a menorestimativa de US$ 3/t de C da UNCTAD (2001), queapresenta os modelos mais atuais que estimam o preçode equilíbrio do comércio de carbono, utilizando osinstrumentos do Protocolo de Kioto. As curvas decusto de controle de cada país apontam para umintervalo de preço entre US$ 3 e 10/t de carbono.

Considerando a densidade média de 100 t de C/ha eo preço de US$ 3,00 t de C, o valor associado aocarbono seria de US$ 300/ha. Como este é um valorpresente, na medida em que o custo de oportunidadedo carbono seria um pagamento pela sua imobilizaçãoperpétua, utilizou-se uma taxa de desconto de 6%a.a. para anualizá-lo, chegando a um valor anual deUS$ 18,00/ha, uma estimativa certamenteconservadora32.

Bioprospecção

A possibilidade de que a biodiversidade da florestapermita a descoberta de fármacos e seus princípiosativos para o avanço da medicina tem sido consideradacomo uma das principais motivações para aconservação da Amazônia. Entretanto, a estimaçãodesse potencial é difícil, posto que requer não só oconhecimento dessa biodiversidade como também daatividade econômica de bioprospecção. Os poucosestudos a respeito diferem enormemente em suasestimativas – por exemplo, de US$ 0,01 a US$ 21,00por hectare/ano (Pearce, 1993). Não vamos aquiapresentar as diversas metodologias e resultados. Esteestudo adota o valor superior de Pearce (1993) — deUS$ 21,00/ha ano — visto que a medida do excedentedo consumidor, neste caso, parece mais se aproximardo ganho de bem-estar das populações beneficiadas.Estes valores não são ajustados para o ano de 2000.

Valor de Existência

As estimativas relativas ao valor de existência (ou não-uso) associadas à preservação das florestas tropicaistambém apresentam valores bastante díspares naliteratura. Os estudos tendem a se basear em valoraçãocontingente em países ricos onde se identifica adisposição a pagar pela preservação de espécies e sítiosnaturais. O estudo mais recente e teoricamente corretoque mede diretamente esta disposição a pagar éHorton et. alli (2002). A valoração contingente éaplicada para o caso específico da manutenção deunidades de conservação na Amazônia em umaamostra de residentes do Reino Unido e da Itália.Para tal, apresentam dois cenários possíveis deconservação – 5% e 20%. O estudo identifica umvalor anual na forma de uma taxação adicional noseu país e não um valor fixo único para um fundointernacional. O valor médio estimado, combinandoas amostras dos dois países, foi de US$ 50/ha/anopara 5% da área da Amazônia e US$ 67/ha/ano para20%, quando perguntado primeiro 5 depois 20% deconservação. Invertendo a ordem dos percentuais noquestionamento, as estimativas médias passam a,respectivamente, US$ 36/ha/ano e US$ 50/ha/ano.Neste estudo trabalha-se com o limite inferior de

Wunder (2001) de US$ 0,7/ha/ano praticados em apenas 2-3milhões de hectares da Amazônia. 32 Essa estimativa é bastante inferior às adotadas por Andersenet alii (2002) de US$ 45,00/ha/ano e Fearnside (1997) de US$70,00/ha/ano, pois ambos adotam valores superiores para adensidade e para o custo de oportunidade da tonelada de C,valores que prevaleciam na época desses estudos. As estimativasapresentadas estão mais próximas de uma magnitude da receitalíquida sacrificada com o comércio de carbono e, portanto,passíveis de serem internalizadas na economia local, caso talmercado venha a surgir.

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US$ 36/ha/ano para 5% de conservação e US$ 50/ha/ano para 20%33.

O próprio estudo sugere, entretanto, que o valorestimado engloba usos indiretos e o de existência.Além disto, apenas uma parcela da área de floresta évalorada e, portanto, o valor medido não pode seraplicado ao desmatamento de um hectare. Assim,foram feitos ajustes a estes valores: (i) estimando seusequivalentes para o restante da população mundial;(ii) isolando o valor de não-uso; (iii) projetando-ospara o estoque total de floresta; e (iv) agregando-os àpopulação mundial. O resultado final fornece um valorde US$ 31,2/ha/ano.

Resumo das Estimativas e Conclusões

A Tabela 22 resume as estimativas do custoeconômico do desmatamento na Amazônia tanto emvalores por hectare/ano como seus respectivos valorespresentes descontados às taxas de 10%, 6% e 2% a.a.em perpetuidade. As estimativas do valor total foramde US$ 108/ha/ano. Este é um valor que, seinternalizado pelo proprietário da terra, poderiaviabilizar um uso sustentável de grande parte da regiãoamazônica. O valor é ligeiramente superior aoencontrado nas principais referências que se propõemao mesmo tipo de avaliação (Fearnside 1997, Torras2000 e Andersen et alii 2001).

33 Estas diferenças por conta da ordenação (“ ordering effects”)não podem ser analisadas observando somente médias, mastambém variâncias. De qualquer forma, para uma estimativa devalor de existência, a utilização de uma valoração com escopodecrescente é a mais conservadora.

TABELA 22. Resumo das estimativas das parcelas dos custos dos desmatamentos

5.3 Alternativas sustentáveis –comparando custos e benefícios

Esta última seção faz algumas comparações entre osresultados do capítulo anterior e do presente. Oexercício não consiste em uma análise custo/benefícioplena, dada a enorme incerteza dos valores produzidos,bem como o fato da maioria das estimativas terem

sido feitas em termos de valores médios e nãomarginais; no entanto, algumas comparações sãopossíveis e interessantes, dando indícios sobre ordensde grandeza envolvidas e subsídios à proposição dealgumas recomendações de política. Ademais, comodiscutido na introdução do trabalho, tão ou maisimportante que comparar os custos e benefíciosmarginais líquidos da pecuária, é interessantecompará-los com o de outras atividades,eventualmente mais competitivas do ponto de vistasocial (isto é, quando se incorporam os diversos custossociais de ambas atividades). Ainda que o estudo nãotenha analisado atividades alternativas, é possível fazer

~(~)

Valor anual Valor presente US$/ha Taxa de desconto US$/ha/ano 10% a.a. 6% a.a. 2% a.a.

Valor de uso direto 37,7 377 628 1.884 Produtos madeireiros 28,5 285 475 1.425 Produtos não-madeireiros 0,2 2 3 9 Ecoturismo 9,0 90 150 450 Valor de uso indireto 18,0 180 300 900 Estocagem de carbono 18,0 180 300 900 Valor de opção 21,0 210 350 1.050 Bioprospecção 21,0 210 350 1.050 Valor de existência 31,2 312 520 1.560

Total 108 1.080 1.800 5.400

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 75

comparações com resultados apresentados em outrostrabalhos, ao menos no caso específico do manejoflorestal sustentado34.

Arrendamento

Inicialmente, a partir das estimativas apresentadas doscustos econômicos dos desmatamentos, observa-seque os valores de uso direto – que são os percebidosdiretamente pela população local – são de US$ 37,7/ha/ano, ou 35% do valor total. Destes, apenas US$28,7/ha/ano provêm de atividades extrativas. Umaprimeira comparação a fazer seria destes custos como valor de arrendamento da terra para pastagens35.Estes valores representam quanto de renda o produtorlocal abriria mão pela simples cessão das suas terras

para fins pecuários, uma vez removida a floresta econstituído o pasto.

Conforme mostra a Tabela 23, os valores dearrendamento para o ano de 2000 variaram entre US$32,6 e US$ 49,5/ha/ano, isto é, valores quase sempresuperiores aos estimados para os valores de uso diretode US$ 28,7 a US$ 37,7 /ha/ano. Dessa forma,considerando as incertezas e os custos de transaçãode adoção de práticas novas de exploração florestal,as atividades sustentáveis aqui consideradas nãoseriam suficientes para criar um incentivo para que osprodutores locais as adotassem. Este resultado deveser interpretado com cautela: dadas as incertezas dasdiversas estimativas, a diferença entre os valores doarrendamento e os de uso direto não é interpretadaaqui como sendo muito significativa.

34 Uma vez que uma análise custo/benefício plena não foialcançada, poderia ser desejável pré-estabelecer um nívelaceitável ou tolerável de desmatamento e estimar os custosenvolvidos – uma análise de custo-efetividade – um exercícionão muito mais simples que o aqui desenvolvido. 35 Observe que não caberia aqui fazer comparações de preçosda terra na região com as as estimativas de valor presente docusto econômico do desmatamento, pois esses preços da terraalém de carregarem incertezas no mercado de ativos reais daeconomia, refletem uma taxa de desconto privadaconceitualmente distinta das taxas sociais adotadas nasestimativas aqui apresentadas. Entretanto, desde que odesmatamento seja financiado pela madeira extraída, a terradesmatada pode ser usada para pasto.

TABELA 23. Valor do arrendamento da terra para a exploração de animais na AML –1998-2001 (US$/ha/ano)36

Rondônia Acre Amazonas Pará Tocantins Maranhão Mato Grosso

Jun./1998 43,2 – 77,6 84,2 30,6 44,3 49,0 Jun./1999 31,1 50,8 50,6 37,6 28,3 33,8 30,8 Jun./2000 40,1 49,5 – 41,0 33,4 34,0 32,6

NOTA: Valores convertidos à taxa de câmbio comercial do mês.FONTE: Fundação Getúlio Vargas

A comparação anterior restringe-se aos valores de usodireto. Caso se considerassem adicionalmente osvalores de uso indireto – no caso somente a estocagemde carbono – seria possível agregar mais US$ 18/ha/

ano à renda do produtor local, viabilizando, assim, ouso sustentável da floresta. Entretanto, essespagamentos pelos usos indiretos ainda não estãoincorporados aos mercados que beneficiam osprodutores locais, como é bem sabido, e a questãotorna-se mais da política econômica da criação destesmecanismos (e seus custos transacionais) do quepropriamente dos valores envolvidos.

Cumpre notar também que os valores das estimativasdos custos de usos diretos e indiretos consideraram

36 Note que os valores em Dólares da tabela decrescem de1998 para 2000. Essa redução se deve unicamente àdesvalorização cambial de janeiro de 1999. Os valores em Reaisna verdade crescem na maioria dos estados durante o períodoanalisado na tabela. Todavia, como a taxa de câmbio de 2000 seaproximava bastante da taxa de câmbio real, os valores de 2000não carregam um viés cambial.

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os preços relativos e o estoque de floresta atuais.Conforme salientado ao longo das seções anteriores,é plausível supor que tanto o valor da madeira, o deecoturismo e o de carbono se apreciem no tempo, nomomento que fontes de geração desses bens e serviçosforem mais escassas. Caso as políticas dedesenvolvimento para a região se orientem cominstrumentos que permitam capacitação tecnológica,preços relativos favoráveis e expansão dos mercadosde serviços ambientais, a internalização desses valoresno processo produtivo local, tanto por iniciativasnacionais como internacionais, poderia gerar umareceita líquida anual de quase US$56 por hectare dedesmatamento evitado e assim viabilizar as atividadesprodutivas sustentáveis na região.

Os incentivos ao uso sustentável da floresta seriamainda maiores caso se incorporassem os valores deopção e de existência. Se os valores estimados(respectivamente US$ 21,0 e US$ 31,2/ha/ano) foremrealistas e se instrumentos de compensaçãointernacional voltados unicamente para objetivos depreservação da floresta amazônica forem criados(como por exemplo, por meio da imobilização deáreas), então estar-se-á gerando incentivos monetáriossignificativos para o controle do processo dosdesmatamentos. Como no caso dos custos indiretos,a dificuldade volta a ser a criação prática de taismecanismos de transferência.

Resumindo, as estimativas apresentadas do valoreconômico do custo do desmatamento na Amazôniabrasileira parecem confirmar que existem importantestrade-offs entre o uso atual e o uso sustentável dafloresta. Entretanto, para que as perdas desse balançonão sejam totalmente assimiladas pela comunidadelocal e possam estimular uma mudança de padrão deuso, será necessária a criação de mecanismos demercado ou de compensações internacionais quevalorizem os serviços ambientais da floresta que sãocapturados pela população mundial como um todo.

A Pecuária

Com relação aos resultados da pecuária praticada naregião, o capítulo 4 apresentou um modelo de

programação linear de minimização de risco com baseem estimativas de campo dos rendimentos líquidosda produção de soja, milho, arroz e da pecuária decorte. Num estabelecimento agropecuáriorepresentativo da região de 15.000 ha com 30% deárea aberta, o modelo identifica que, internalizando orisco das atividades agropecuárias, a partir de umpagamento de R$ 45/ha/ano passa ser interessantepara o produtor a manutenção da área de mata emdetrimento de todas as atividades agrícolas possíveis(a partir da distribuição ótima da terra hoje verificada).Ou seja, nenhuma destas atividades geraria um valoresperado de rentabilidade acima de R$ 45/ha/ano.No caso sem risco, o custo de oportunidade da matapara os pecuaristas sobe a R$ 200/ha/ano, apesar de,neste caso extremo, a terra ser alocada totalmente àsoja e à mata, e não às pastagens.

Estes números devem ser comparados com os custoseconômicos excluindo os diretos (para avaliarcompensações requeridas de uma fonte externa e nãoda renda de usos alternativos, o que já foi analisado).No caso, estes valores foram aqui estimados em R$128/ha/ano36 e representam serviços da florestaauferidos globalmente e, portanto, poderiam sercapturados através de mecanismos de compensaçãointernacional37. Estes valores são médios edeterminísticos, e portanto deveriam ser comparadoscom o custo de oportunidade da mata no caso semrisco, ou seja, de R$ 200/ha/ano. No entanto, comoindicado acima, neste caso extremo os produtoresconverteriam toda a área para soja e não para pecuária,dificultando a comparação. O resultado sugere que

36 Os R$ 128,00 correspondem aos US$ 70.2 apresentados naseção precendente convertidos a Reais pela taxa de câmbiomédia de 1,83 do ano de 2000. A conversão para Reais teriaque considerar o risco cambial, embora as estimativas sejampara o ano 2000, no qual prevaleceu uma taxa de câmbioligeiramente supervalorizada. Dos R$ 128,00, R$ 33,00 são daestocagem de carbono, R$ 38,00 dos fármacos e R$ 57,00 daprópria existência da floresta. 37 Pagamentos a serviços privados de conservação para evitardesmatamento não foram muito exitosos numa experiência naCosta Rica, quando o valor das compensações não acompanhouos custos de oportunidade da agropecuária, ver Segura–Bonilla(2000).

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a soma total dos custos econômicos dosdesmatamentos poderá ou não cobrir os custosde oportunidade dos pecuaristas dependendo doseu grau de aversão ao risco. Na prática este graude risco deve depender da localização da propriedadee do tipo de atividade que se deseja implantar. Nasáreas mais consolidadas, com maior penetração daagricultura (menor risco produtivo), o resultado nãoseria animador do ponto de vista da conservaçãoambiental. Seria necessária uma elevação de cerca de50% nos valores aqui apresentados, ou a inclusão deoutros serviços ambientais que não foram valorados(usos indiretos), para que houvessem suficientesbenefícios sociais (globais) a fim de compensar a perdados produtores (observe novamente que este é umfazendeiro maximizando lucro escolhendo entrepecuária, floresta e agricultura). Nas áreas onde hámaior incidência da pecuária, o potencial decompensações baseado nos valores de uso indireto émais que suficiente para cobrir os custos deoportunidade dos produtores. Os númerosapresentados devem ser interpretados como ordensde grandeza e a leitura cautelosa sugere que os valoresapresentados da pecuária e dos desmatamentos sãobastante próximos. Mais análises principalmente doscustos ambientais são requeridas para que se possaser mais conclusivo.

Manejo Florestal

Ao invés da conservação, o proprietário poderia optarpelo extrativismo. Uma possibilidade de atividadesustentável na Amazônia é a exploração de madeiracom práticas de rotação das áreas de corte e manejode baixo impacto. Barreto (2002) estimou o valorpresente líquido da exploração de madeira sustentávelpara o ano de 1998 e encontrou um valor de US$203/ha. Ele pode ser comparado com a receita líquidaidentificada para a pecuária no capítulo precedente,que foi em torno de R$ 100/ha/ano, medidos em2002. Utilizando a mesma taxa de desconto de 8%que no caso da madeira e adotando uma taxa decâmbio aproximada de R$ 2,50 por dólar, teríamosum valor presente líquido da pecuária de US$ 500/ha. O valor é quase idêntico ao apresentado por

Barreto para a pecuária, ou seja, o dobro do resultadodo manejo florestal. Cabe ressaltar que a referênciaindica ainda que os valores presentes líquidos daatividade florestal sem manejo são praticamente iguaisaos com manejo. De qualquer forma, o manejo nãoé mais atrativo financeiramente do que a pecuária.

Este resultado talvez reflita simplesmente o que vemse observando na prática: a pecuária na Amazônia émuito rentável e alternativas sustentáveis como omanejo florestal simplesmente não são capazes decompetir, sob o ponto de vista privado do produtor.Além da economia não ser competitiva, o fator riscoe a questão institucional não podem ser minimizados.

Do ponto de vista social, entretanto, como o manejoflorestal deixa praticamente inalterado o sistemaflorestal, os benefícios sociais dos seus serviços,também não se alteram em sua essência. Assim, comono caso da comparação com a pecuária acima, aovalor presente líquido apresentado de US$ 203/hadevem-se somar os valores de uso indireto, de opçãoe de existência – US$ 70,4/ha/ano – que, adotando-se a mesma taxa de desconto de 8%, dão um valorpresente de US$ 875/ha. Somando-se ao valor deuso direto de US$ 203 obtem-se um valor aproximadode US$ 1.100/ha, portanto o dobro da pecuária. Istoindica que, embora do ponto de vista privado apecuária seja economicamente superior aomanejo florestal sustentado, do ponto de vistasocial o manejo florestal é bastante superior àpecuária. Este resultado é muito importante para asrecomendações de política feitas no capítuloconclusivo a seguir.

Uma observação adicional deve ser feita com relaçãoà competição e às divergências entre os custos ebenefícios privados e sociais da pecuária, manejoflorestal sustentado (MFS) e extrativismo madeireironão sustentável. Mesmo que o MFS produza umresultado socialmente superior à pecuária ou aoextrativismo madeireiro individualmente, este estudosugere que do ponto de vista privado ele não competecom a pecuária, enquanto que vários estudos sugeremque ele produz aproximadamente as mesmas taxasde retorno que o extrativismo madeireiro. No entanto,

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enquanto é possível (e comum) que o extrativismomadeireiro seja seguido da pecuária, o MFS é umaatividade exclusiva. A implicação prática é que oMFS, em realidade, compete com a soma dasduas outras atividades, de modo que o gap entreos retornos privado e social tornam quaseimpossível a atividade socialmente desejável serimplementada sem algum tipo de intervençãogovernamental.

Cumpre destacar, finalmente, que todas as análisesdevem ser vistas levando-se em conta as limitaçõesdas condições sob as quais são feitas. A afirmaçãoque o manejo é superior à pecuária não quer

necessariamente dizer que todas as regiões de floresta,fora das áreas de conservação, devam ser alocadas aomanejo florestal, porque em determinadas regiões defloresta a ausência de espécies nobres ou a distânciaaos mercados podem implicar baixos retornos domanejo. Por outro lado, em outras regiões as condiçõesgeo-ecológicas podem ser desfavoráveis à pecuária epropícias ao manejo florestal, de modo que, mesmodo ponto de vista privado, o manejo seja maiseconômico que a pecuária. Além das condições geo-ecológicas, a escala e o tipo de pecuária a que se referesão também críticas. Outros sistemas de produçãopecuária e em menor escala podem produzir resultadosdistintos (Carpentier et alli, 1999).

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Esta seção sumaria os principais resultadosapresentados no trabalho e sintetizaconclusões visando algumas sugestões de

política.

Principais Resultados – Conclusões

n O resultado básico do trabalho é que osdesmatamentos na Amazônia não constituemum processo clássico de perde-perde (“lose-lose”), caracterizado apenas por perdaseconômicas e ambientais. Ao contrário, oprocesso apresenta trade-offs com ganhoseconômicos privados evidentes.

n Os dados de uso do solo na Amazônia mostrama pecuária como a principal atividade na regiãocomo fonte dos desmatamentos. Sua expansão,desde o início da década de 70, tem sido umprocesso contínuo e de caráter inercial.

n Os dados do sensoriamento remoto,juntamente com os do IBGE, sugerem quesão os médios e grandes agentes os principaisresponsáveis pelos desmatamentos. Ospequenos agentes lhes servem como mão-de-obra ou ainda para “esquentar” a posse daterra, mas sua contribuição direta para osdesmatamentos é mínima. Além disto, osdesmatamentos dos pequenos agentes sãosocialmente muito mais aceitáveis porque, aocontrário da grande pecuária, supõe-se quelevem diretamente à melhorias das condiçõesde vida das populações locais mais pobres.

n Os atores sociais que atuam na fronteira sãodiversos e interdependentes, apesar das

6Conclusões e Recomendações

diferenças de motivações, interesses eestratégias econômicas. Assim, os lucros dosagentes especulativos nas fronteiras maisavançadas em última instância dependem dospecuaristas mais capitalizados e profissionaisda fronteira consolidada que, produtivamente,exploram e investem na expansão de suasatividades.

n O final do processo de ocupação, não importaquais sejam os agentes originais, é quaseinevitavelmente a pecuária. Caso ela não fossefinanceiramente viável, os processos de extraçãode madeira e de abertura de estradas nãoresultariam em conversão de florestas oudesmatamentos na escala em que ocorrem,porque os agentes iniciais sequer cobririam seuscustos de ocupação, desmatamentos e preparodo solo.

n Na fronteira especulativa, onde a presença doEstado é reduzida, o poder público é dominadopelos interesses especulativos das elites locais,atuando basicamente no sentido de incentivara abertura de novas áreas e a expansão daagropecuária.

n Os pequenos atores locais nestas regiõestampouco demonstram interesse maior emproteger a floresta: o que lhes interessa éprincipalmente assegurar a posse da terra, seproteger da violência do campo e enfrentar ascondições monopsônicas a que estãosubmetidos na venda de sua produção.

n A economia dos agentes na fronteiraespeculativa é mais baseada na comercializaçãode terras do que em retornos produtivos da

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pecuária. Nestas áreas o papel da pecuária éassegurar direitos de propriedade e sua taxa deretorno econômico, segundo uma daspesquisas de campo, situa-se abaixo dos 5%.

n A combinação da alta rentabilidade privada dapecuária com custos de transportes viáveis, istoé, existência de estradas, é que levam aosdesmatamentos. Enquanto as condições geo-ecológicas forem favoráveis, haverá semprepressão pela abertura de estradas – aendogeneidade – compelindo os própriospecuaristas a construir a rede de estradas. Se apecuária não fosse rentável (do ponto de vistaprivado), a existência de estradas “per se”, ou asrodovias construídas com objetivos mais geo-políticos – as estradas “exógenas” – nãolevariam a tantos desmatamentos e conversãode florestas. Evidentemente, no entanto,estradas de penetração em áreas com baixaocupação antrópica implicam aumento dedesmatamentos.

n As condições de produção pecuária naAmazônia são surpreendentemente favoráveis,principalmente nas regiões já antropizadas, emfunção da pluviosidade, temperatura, umidadedo ar e tipos de pastagens.

n As taxas de retorno da pecuária estrita (i.e.,excluindo a venda da madeira, por exemplo)calculadas para distintos pontos do Arco doDesmatamento são consistentemente acima dos10%, bastante superiores às encontradas norestante do país. Os valores não são médios daregião e sim os potencialmente alcançados porpecuaristas mais profissionais e capitalizados.

n O grau de profissionalização dos produtoresda fronteira consolidada não deixa dúvidasquanto à sua preocupação com a necessidadeconstante de modernizar, expandir mercados,profissionalizar a produção, implantar técnicasde manejo de pastos e de animais, enfim,competir buscando eficiência.

n A sustentabilidade da produção (entendidaunicamente no sentido da possibilidade de suareprodução por longos períodos) é de certa

forma inquestionável. No entanto, devido aocurto período de experiências não se pode sertão otimista. O trabalho indicou uma série defatores que podem impactar positiva enegativamente a produtividade no longo prazo.Apesar das incertezas, parece razoável suporque a produção pecuária deverá sercrescentemente sustentável na região.

n No curto prazo não parece existir qualquertendência de reversão do avanço da fronteiraagropecuária sobre regiões de floresta nativa,ao menos nas áreas com condições de produçãosemelhantes às analisadas no trabalho. Mesmosem os subsídios do governo, a lucratividadeda pecuária é o fator de propulsão que mantema inércia do processo.

n A agricultura não compete com a pecuária nasregiões de floresta. As barreiras geo-ecológicassão em geral mais restritivas no caso daagricultura, destacando-se a pluviosidade nasáreas com índices superiores aaproximadamente 2000 mm/ano. Nas áreascom índices inferiores a este valor, por outrolado, a pluviosidade é um dos fatores maisfavoráveis à pecuária e por isto ela aí predomina.

n Para estabelecimentos representativos nafronteira consolidada, esse estudo levantouinformações econômico/financeiras edesenvolveu modelos de simulação dasatividades agropecuárias, mostrando que osprodutores são avessos ao risco e evitam aespecilização, adotando combinações deculturas, pastagens e floresta.

n As simulações mostram que os produtoresestabelecidos estariam dispostos a aceitarvalores relativamente baixos (R$ 45/ha/ano)como compensação para não expandir a áreacultivada em áreas de floresta. Estes valorespodem subir até R$ 200/ha/ano quando sesupõe menor aversão ao risco (em cujo casoos produtores converteriam a floresta emprodução agrícola e não pecuária, sob ashipóteses do modelo).

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n As simulações de taxação sobre odesmatamento mostram que uma taxa de US$15-20/ha/ano não reduziria de formasignificativa a área desmatada: os produtorestenderiam antes a mudar o mix de culturas,diminuindo moderadamente a área desmatada.As duas políticas são equivalentes, diferindoquanto a quem arca com os custos.

n Os subsídios e créditos de governo para aagropecuária diminuíram significativamente nadécada de 90, mas com efeitos quaseimperceptíveis sobre os desmatamentos. Hojeem dia não podem ser considerados comofatores relevantes para explicar o processo dosdesmatamentos na Amazônia. O FNOpreferencial permanece como um programasocial que, a despeito das dificuldades, tempermitido melhorias para alguns segmentos deprodutores pequenos.

n Desde 1970 a renda regional aumentousignificativamente. A renda rural per capita,em particular, triplicou, aumentando, na média,de US$ 410 em 1970 para US$ 1.417 em 1995.Nos estados onde ocorreram as maiores taxasde desmatamentos, este crescimento foi aindamaior.

n Os aumentos da renda rural per capita nãonecessariamente se traduzem em ganhos debem estar da população local mais pobre. Osganhos sociais observados nas últimas trêsdécadas na região são de difícil interpretaçãocom os dados disponíveis. Os indicadoressócioeconômicos mostram avançossignificativos, mas insuficientes para diminuiro gap com relação ao restante do país (verAnexo).

n Além disto, a maior parcela da renda regionalfoi proveniente dos setores urbanos e não rurais,sugerindo que as melhorias de bem-estar socialalcançadas provavelmente não tiveram relaçãodireta com os desmatamentos. Talvez sejalegítimo argumentar que os benefícios privadosda pecuária em larga escala são excludentes,tendo contribuído pouco para diminuir as

disparidades econômicas e sociais. Os dadosnão permitem que se seja mais conclusivo,evidenciando a necessidade de pesquisasespecíficas adicionais.

n O estudo sugere, no entanto, que tem havidoganhos sociais que ultrapassam as fronteirassetorial ou regional. Em âmbito nacional, apecuária na Amazônia permitiu a quedaconsistente dos preços da carne nos últimocinco anos, quando 100% do crescimento dorebanho nacional se deu no Pará, Mato Grossoe Rondônia – os 3 estados com maiorespercentuais de desmatamentos na Amazônia.Ao mesmo tempo, as exportações de carnecresceram de 350 mil toneladas em 1999 para900 mil toneladas em 2002, reprentando US$1 bilhão em divisas.

n Os custos sociais dos desmatamentos foramestimados em cerca de US$ 100/ha/ano. Estevalor embute demasiadas incertezas, oriundasdas limitações das metodolgias de valoraçãoambiental e da limitação de dados. De qualquerforma, o valor é maior que a renda potencialda pecuária, que poderia assim ser compensada.Como não existem mecanismos detransferência para se efetivar essa compensação,o que interessa são os lucros privados dapecuária – que são positivos e que o trabalhosugere constituir o fator chave para explicar oprocesso dos desmatamentos da Amazôniabrasileira.

n Com relação ao manejo florestal sustentado(MFS), a pecuária mostra-se maiseconômica do ponto de vista privado,apesar dos resultados forçarem cautelaquanto a uma conclusão definitiva. Aatividade é também percebida de baixo riscode acordo com a esmagadora evidência dasentrevistas de campo. O MFS, por outro lado,é uma técnica pouco disseminada erelativamente “sofisticada” que tem quecompetir tanto com a pecuária quanto com oextrativismo madeireiro não sustentável (comoa pecuária tipicamente sucede o extrativismomadeireiro, o retorno total da terra é a soma

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dos retornos de ambas atividades). O MFSexclui outros usos do solo ficando mais difícilcompetir com as atividades tradicionais.

n Do ponto de vista social, entretanto, otrabalho sugere que o manejo florestal ésuperior economicamente. Supostamente, étambém superior do ponto de vista ambientale social (a despeito de algum ceticismo quantoao segundo, ver Wunder, 2001). Arranjosinstitucionais capazes de mudar este cenáriosão hoje ainda inexistentes.

n Finalmente, as análises feitas no trabalho devemser vistas em contexto, principalmente aviabilidade econômica privada da pecuária, queem princípo é válida apenas nas regiõesestudadas e sob as condições especificadas. Asprincipais destas condições são o padrão eintensidade das chuvas, o grau deprofissionalismo dos pecuaristas e sua escalade produção (tamanho das propriedades). Esteúltimo é um fator crítico subjacente àviabilidade e portanto à expansão da pecuáriana Amazônia. Em nível local, vários resultadospodem ser distintos dos apresentados notrabalho.

Recomendações

As recomendações que se seguem baseiam-se nosresultados do trabalho e têm como objetivo subsidiarpolíticas de desenvolvimento sustentável para a região.Dados seus objetivos congruente, a menos queespecificado, ou que seja evidente pelo contexto, elasaplicam-se indistintamente ao governo e ao BancoMundial.

Informação e planejamento

A elaboração e acordo de estratégias dedesenvolvimento sustentável pressupõem aidentificação dos principais agentes e atores sociais,seus múltiplos e conflitantes interesses e motivações.O trabalho sugere que um passo fundamental nestadireção seria a aceitação da tese que a pecuária na

Amazônia é uma atividade potencialmentelucrativa para os produtores e que é estalucratividade o fator básico de propulsão doprocesso dos desmatamentos na região. Estaaceitação implica também o reconhecimento queexistem claros trade-of fs no processo dosdesmatamentos da Amazônia brasileira.

As políticas de proteção da floresta devam talvezalmejar prioritariamente os produtores dafronteira consolidada que são a mola do processoe não meramente os da fronteria especulativa. Istonão quer obviamente dizer que não se deva fiscalizar,penalizar e tentar barrar as condições ilegais sob asquais operam os agentes na fronteira avançada. Masa debilidade da presença do próprio poder público,associada à baixa aversão ao risco destes agentes,sugerem que o foco das políticas deva ser ser osagentes mais profissionais da fronteira consolidada.

A estratégia deve ser trabalhar com ospecuaristas e não contra eles. Ainda que umagrande parte destes agentes ainda não esteja preparadapara negociar, há lideranças mais abertas e interessadasem definir termos de compromisso com governo esociedade para terem suas atividades integralmentelegalizadas. Como estão muito associados aosgovernos municipais, estes talvez pudessemrepresentá-los ou, no mínimo, participar do processode negociação. Esta talvez seja uma oportunidade paraa nova Administração Federal e, possivelmente,também para os Estados.

As autoridades responsáveis pela proteção dafloresta Amazônica deveriam reduzir o excessivofoco sobre os madeireiros como agentes dosdesmatamentos. Proporcionalmente muito poucaatenção é dispensada aos pecuaristas em comparaçãoaos madeireiros. O controle sobre os madeireiros éfundamental não em termos dos desmatamentos perse, mas talvez porque o manejo florestal sustentadorepresente a principal atividade alternativa à pecuáriana Amazônia e capaz de competir em escala com ela.A extração desordenada, predatória e largamente ilegalhoje praticada deve ser combatida não apenas pelailegalidade mas também porque elimina a possibilidade

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de implantação, presente ou futura, de uma práticasustentável econômica, social e ambientalmentesuperior à pecuária.

Os zoneamentos participativos poderiam serusados como instrumentos de negociação entreos agentes econômicos (incluindo os pecuaristas)e o governo, que paulatinamente levassem acompromissos de ocupação em áreas e regiõesadequadas do ponto de vista social, econômico eambiental. O Banco Mundial vem apoiando há váriosanos iniciativas de zoneamento em toda a região edeveria continuar a apoiar, enfocando sua aplicaçãoprática, a contínua atualização e revisão, eprincipalmente o processo de negociação entre osatores que dele participam. Cumpre salientar que ospequenos agentes, aqui identificados como de menorimportância para explicar os desmatamentos naAmazônia, não devem por este motivo ser alijadosdo processo. Ao contrário, por serem objetoprincipal do desenvolvimento sustentável,deveriam também ser participantes do processode determinação das estratégias dodesenvolvimento regional.

Como existe muito desconhecimento e muita incertezasobre vários fatores e efeitos associados ao processodos desmatamentos e avanço da fronteira, os riscosenvolvidos sugerem a adoção de estratégiasconservadoras. O patrimônio eventualmente emrisco na Amazônia não deveria ser ameaçado pordecisões irreversíveis com altos custos sociais,econômicos ou ambientais. Neste sentido, as iniciativasde conservação sendo implementadas deveriam serincentivadas e o Banco Mundial continuará apoiando-as, principalmente através dos Projetos ARPA,PROARCO, PROBIO e vários projetos apoiados peloPrograma Piloto (Redwood, 2002).

Dentre os fatores mais importantes analisados nestetrabalho, e sobre os quais seria importante aumentarnosso conhecimento, incluem-se os valores eserviços ambientais da floresta – i.e., os custossociais dos desmatamentos, limitados tanto pela faltade informações técnicas sobre os complexos efeitosecológicos como pelas dificuldades de valoração

ambiental. Isto deveria incluir estudos sobre ospossíveis benefícios sociais a eles associados –i.e., até que ponto as melhorias das condiçõessócioeconômicas da região nas últimas décadas podemser atribuídas direta ou indiretamente aodesmatamentos.

Igualmente importante, talvez, seja também analisarcom mais profundidade os efeitos dos custos detransporte sobre os desmatamentos. Isto éimportante para se avaliar, por exemplo, os possíveisefeitos do Programa Avança Brasil sobre osdesmatamentos, bem como o de estradas vicinais,particularmente nas regiões de fronteira consolidada.Estas estradas promovem a intensificação daagropecuária, mas o efeito em termos dosdesmatamentos é menos claro. O trabalho tambémsugeriu que as estradas deveriam ser entendidas comoendógenas ao processo dos desmatamentos e nãocomo algo decidido exogenamente aos agentes locais.

Instrumentos econômicos

Criação de mecanismos de troca – os “tradabledevelopment rights”. A introdução de um sistemaque flexibilize as áreas de conservação estrita poderiatrazer enormes ganhos, tanto ecológicos comoeconômicos. Não há por que não permitir quedeterminadas áreas – tipicamente as mais férteis eprodutivas – se beneficiem de maiores percentuais dedesmatamento, desde que compensem com áreas dereservas legais em áreas ecologicamente mais ricas.Estas áreas seriam indicadas pelo zoneamento e emprincípio deveria haver suficiente flexibilidade paraque as “trocas” pudessem ser feitas em outrosecossistemas e bacias hidrográficas, desde que tambémse respeitassem certas regras de endemismo ecológicoe outros parâmetros técnicos que poderiam ser bemexplícitos e amarrados. O cumprimento estrito da leiatual será muito difícil e envolverá enormes custoscom benefícios ambientais dúbios: seria irrealistaesperar que as propriedades no cerrado do sul doMato Grosso, por exemplo, possam voltar a cumpririntegralmente com suas obrigações relativas às reservaslegais. Como alternativa, talvez fosse mais interessanteexigir dos produtores locais, possivelmente

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consorciados, compensar com áreas até maiores emoutros ecossistemas no próprio cerrado. Existeexperiência piloto no Paraná e o exemplo poderia seraplicado na Amazônia: seria questão de aprimorar omecanismo no bojo do Código Florestal.

Uma das soluções econômicas clássicas doproblema seria taxar os desmatamentos, demodo a forçar os agentes a internalizarem oscustos ambientais. As simulações de taxação desteestudo sugerem que são necessárias taxas elevadaspara se diminuir de forma significativa a áreadesmatada, porém mais estudos deveriam ser feitospara melhor avaliar o instrumento sob condiçõesdiferentes das aqui analisadas. A introdução de umataxa poderia vir no bojo da proposta de criação dafigura da contribuição ambiental, incluída na últimaproposta de Reforma Tributária enviada pelo governofederal ao Congressso Nacional.

Uma alternativa teoricamente equivalente àtaxação seria compensar os agentes para que nãodesmatem (apesar das implicações políticas de quempaga serem drasticamente distintas). As simulaçõesdeste estudo sugerem que os pecuaristas estariamdispostos a receber valores relativamente pequenospara não desmatar (mais), dependendo do seu graude aversão ao risco. Do ponto de vista nacional,precedentes legais existem na legislação brasileira queconcede royalties no caso da extração de petróleo e noalagamento de barragens para geração de energiahidrelétrica. Os valores pagos não são baseados emrigorosas avaliações monetárias dos custos ambientais,e não haveria por que não fazer o mesmo como formade compensação pela perda da biodiversidade e deinúmeros serviços ambientais da floresta.

Ao interesse nacional somam-se ainda os dacomunidade internacional que se beneficia tambémdos serviços ambientais da floresta. O estudo mostrouque a soma dos benefícios nacionais e internacionaissão potencialmente bem maiores que a renda dapecuária. No entanto, os mecanismos detransferência ainda não existem na prática eenfrentam sérias dificuldades técnicas e políticas paraserem implementados. As poucas experiências em

outros países não são particularmente animadoras. Adespeito destas dificuldades, o Banco Mundial talveztivesse um papel a desempenhar auxiliando o governobrasileiro a buscar iniciativas e parceiros internacionaisque ajudem a desenhar os mecanismos detransferência aqui mencionados. Este também seriaum papel relevante para a comunidade doadorainternacional preocupada com os desmatamentos naregião.

A busca por alternativas sustentáveis tem-selimitado ao manejo f lorestal e iniciativaspontuais de pequena escala, algumas social,econômica e ambientalmente superiores à pecuária.Estes esforços devem ser continuados, mas é precisoatentar para o fato que, ainda que superiores, não têmcompetido em escala com a pecuária, ficando nasescalas piloto. Os recursos disponíveis em ciência etecnologia aplicados à região têm sido insuficientespara lograr maior conhecimento e disseminar asexperiências existentes. O governo federal e o BancoMundial, através do Programa Piloto das FlorestasTropicais, poderiam atuar mais como catalisadoresna disseminação de informações.

O Banco Mundial, em particular, deveria rever apostura conservadora que tem adotado emrelação à Amazônia na última década e apoiar apromoção do desenvolvimento sustentável. Istonão significa abandonar o apoio à conservação, massim fazer ambas abordagens complementares. Ofinanciamento de atividades produtivas, com altíssimosbenefícios sociais e econômicos e baixos impactosambientais – ou mesmo nenhum – poderia viabilizaralternativas interessantes para o desenvolvimento daregião. A aprovação do projeto de apoio ao ProgramaNacional de Florestas, ora em discussão com ogoverno federal, seria um excelente passo nesta direção.

Os incentivos fiscais que beneficiaram os maioresproprietários diminuíram e tendem a ser melhoraplicados. Programas sociais como o FNOpreferencial e os projetos de assentamento doINCRA poderiam proporcionar ganhosecológicos e sociais maiores, particularmentepara os proprietários mais pobres e menos

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capacitados. Esta conjugação de interesses deproteção ambiental com a defesa das populaçõestradicionais locais são uma das bandeiras do sócio-ambientalismo da nova administração federal eportanto deverão ser apoiadas.

Outros instrumentos econômicos, discutidos já háalgum tempo entre técnicos do MMA, IPEA e doBanco Mundial, poderiam incluir (ver Seroa da Mottaet alli, 2000; Haddad e Rezende, 2001): (i) a introduçãodo ICMS Ecológico, seguindo experiências jáimplantadas em outros estados do país e já em vias deimplantação em Rondônia e Mato Grosso. A proteçãode áreas de floresta nativa poderia ser um dos critériosde compensação aos municípios no cálculo do valoradicionado municipal; (ii) introdução de critériosambientais semelhantes aos do ICMS ecológico noFundo de Participação dos Estados e dos Municípios(FPE e FPM); (iii) reorientação dos critérios deconcessão de subsídios fiscais ou creditíciospromovendo atividades sustentáveis, odesenvolvimento de tecnologias sustentáveis e apesquisa científica; (iv) reforçar a introdução decritérios ambientais na concessão do crédito agrícolana região; (v) rever e eliminar créditos subsidiadosainda existentes para a pecuária tradicional naAmazônia.

Aplicação da Lei (“enforcement”)

Quaisquer que sejam os incentivos econômicos,eles não irão prescindir de uma muito maiorcapacidade de fiscalização e enforcement. Esta,entretanto, é uma luta em grande medidainglória, devida à imensidão da região e àsdificuldades de trabalhar com os agentes locais. Pormais que haja determinação política, será sempredifícil reverter a tendência inercial que vem sendoobservada há décadas. O balanço entre os fatores que

podem futuramente favorecer ainda mais a pecuáriana Amazônia com os que podem dificultá-la,provavelmente tende aos primeiros. Portanto, acombinação de mecanismos de mercado e decomando e controle deverá ser ainda insuficiente parareverter, no curto prazo, o processo que vem seobservando há tantos anos. Isto reforça ainda mais anecessidade de soluções negociadas que incluam ospecuaristas.

Para uma atuação mais efetiva é fundamentalque haja uma estratégia de cooperaçãoinstitucional. Órgãos como o MMA, IBAMA, ADA,Ministério da Integração Nacional, Ministério doPlanejamento, INCRA, FUNAI, Polícia Federal, paranão falar dos governos estaduais, têm que trabalharconjuntamente, acordando metas comuns e definindoatribuições individuais. A identificação clara etransparente dos objetivos e atribuições é fundamentalpara que cada instituição tenha incentivos e possa serresponsabilizada (“accountable”) por sua atuação.

Finalmente, a despeito das dificuldades políticas,seria urgente rever e auditar seriamente oprocesso de concessão de direitos de propriedade.Na miríade de instituições oficiais e privadasenvolvidas, é difícil identificar, sem um estudocauteloso, a rede de interesses envolvida. O que seconhece são os resultados, freqüentemente associadosà violência e fraudes, que poderiam ser revertidos sea atuação dos órgãos fundiários fosse mais efetiva, defato ordenando o uso do solo, protegendo e apoiandoos pequenos produtores e garantindo a integralidadedas terras públicas e do patrimônio natural e social daregião. Os ganhos especulativos são gigantescos e aetapa chave do processo é a legalização do direito depropriedade. Não há por que o governo federal, emparceria com os estados, não atuar energicamentesobre a questão.

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Este anexo apresenta a evolução de indicadoressociais selecionados para a Amazônia brasileirana tentativa de avaliar possíveis ganhos sociais

associados ao processo de ocupação e desmatamentoe ao processo mais geral de desenvolvimentoeconômico da região. A maioria destas mudançasresulta de uma combinação de fatores, alguns quepodem ser direta ou indiretamente ligados aosdesmatamentos e às atividades agropecuárias que seseguem; outras não são a eles ligadas. Como é muitodifícil estabelecer causalidades de forma definitiva,optou-se por apresentar estes indicadoresindependentemente e não como benefíciosdecorrentes dos desmatamentos.

Para fins desta avaliação, foram feitas análisesestatísticas em nível municipal com base nos dadoscensitários do IBGE. As análises em nível municipalsão muito agregadas para que se possa inferirprecisamente sobre padrões de bem estar social daspopulações locais e para comparar as modificaçõesocorridas nesses padrões dentro dos municípios eentre os municípios ao longo do tempo. De qualquerforma, dados municipais do IBGE forneceminformações fundamentais para melhor entender aevolução das condições sócio-econômicas dapopulação local.

O Gráfico A1 apresenta a evolução da distribuiçãopercentual da população da AML segundo a renda(PIB) per capita municipal nos anos censitários de1970 a 1995, comparando-a com a renda per capitabrasileira nos mesmo anos. O gráfico mostra uma

melhora significativa nos níveis de renda per capitada população da Amazônia nas últimas três décadas.Em 1970, cerca de 75% da população da Amazôniatinha renda per capita inferior a US$ 1.000, percentualeste que se reduz continuamente nas décadasseguintes, atingindo 30% em 1995. Comparando como Brasil, em 1970, 100% da população da Amazôniavivia em municípios com renda per capita inferior àmédia nacional: essa percentagem se reduz para 90%em 1980 e para 80% em 1995, melhorias nãodesprezíveis37.

Da perspectiva temporal, o gráfico mostra melhoriainequívoca nos níveis de renda per capita entre 1970e 1980, quando o crescimento da economia brasileirafoi acelerado. A partir de 1980, com sua estagnação, amelhoria nos níveis de renda per capita da Amazôniaé menos acentuada, apresentando inclusive um ligeiroretrocesso nos municípios mais pobres. Note,contudo, que para 80% da população houve, mesmoneste período, melhorias significativas de renda percapita, sobretudo quando comparada com a melhoriaimpercetível da média nacional.

37 O gráfico implicitamente mostra que 15 municípios em 1995tinham renda superior à média nacional. Na verdade não sãomunicípios, e sim “áreas mínimas comparáveis” – AMC –introduzidas no capítulo 3. Alguns municípios têm pesomuitíssimo maior que outros numa mesma AMC. As 15 AMCcom renda per capita superior à média nacional incluem 5capitais – Belém, Manaus, São Luís, Cuiabá e Rio Branco, 5 dosul do Mato Grosso e Tocantins (General Carneiro, Alto Garças,Itiquira, Alto Araguaia, São Miguel do Araguaia), além deParagominas, Santa Isabel, Afuá e Almerim (PA) e Bacarena(MA).

AnexoDesenvolvimento Sócio-Econômico

na Amazônia Brasileira

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GRÁFICO A1. Distribuição acumulada da população municipal na AML de acordocom o PIB per capita, 1970-95, em Dólares constantes de 1995

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

O Gráfico A2 apresenta a evolução da incidência depobreza entre as populações da Amazônia. Ele sugereque há uma sensível melhora também com relaçãoaos índices de pobreza entre as décadas de 70 e 80.Como no caso da renda per capita, também adistribuição da população sem renda suficientedeteriora na década de 80. Isto pode se dever emparte ao fato de 1980 ter sido de crescimento acelerado

– juros reais negativos, boom de construção civil – e oano de 1991 de estagnação – afetado pela queda nonível de atividade em decorrência do seqüestro deativos do Plano Collor. Não havendo dados maisrecentes, fica difícil concluir, de forma mais definitiva,a tendência de diminuição da pobreza na região. Asmelhorias observadas na AML seguem bastante deperto o que se passou no país como um todo.

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GRÁFICO A2. Distribuição acumulada da população municipal da AML deacordo com a população sem renda suficiente, 1970-91

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

Além da renda, buscou-se trabalhar a evolução deoutros indicadores sócioeconômicos. Os Gráficos A3,A4 e A5 sumariam a evolução de três indicadoresclássicos – expectativa de vida, mortalidade infantil etaxas de analfabetismo. Os três gráficos têm o mesmoformato e interpretações bastante parecidas. Oprimeiro, por exemplo, sugere que em 1970, sessentapor cento da população local vivia em municípioscuja expectativa média de vida era de 52 anos. Mas

em 1991, estes mesmos 60% da população vivia emmunicípios onde aquela expectativa era de 63 anos. Ográfico mostra também que a região teve evoluçãorelativamente pior que a média nacional: enquanto60% dos municípios da Amazônia tinham umaexpectativa média de vida menor que a média nacional,nos anos 1970 e 1980, este percentual aumentou paracerca de 75% em 199138.

38 Uma possível explicação para esta tendência é o fato deque a proporção da população rural na AML é maior que amédia nacional e além disto muito vulnerável a doençastropicais.

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GRÁFICO A3. Expectativa de vida média nos municípios da AML, 1970-91

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

GRÁFICO A4. Mortalidade infantil (mortos/1000 nascidos vivos), municípios da AML, 1970-91

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

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Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira 99

A mortalidade infantil – Gráfico A4 – teve reduçãosignificativa no período analisado: em 1970, cinqüentapor cento da população local vivia em municípioscuja taxa de mortalidade infantil era de 120 por 1000nascidos vivos. Em 1991, o mesmo percentual viviaem muncípios onde aquela taxa era de “apenas” 50por 1000 nascidos vivos. Neste indicador, a regiãomostra evolução melhor que a média nacional nosanos 70, mas retrocede em 1991: em 1970, 55% dapopulação vivia em municípios da região com taxasde mortalidade infantil menores que a média nacional,percentual que subiu para 65% em 1980, caindo parapouco menos de 50% em 1991.

O conjunto de dados sumariados pelos gráficos A1-A5 sugerem melhoria das condições sócioeconômicasdas populações locais, mas com algumas qualificações.Os gráficos sugerem também que, grosso modo, estasmelhorias tipicamente apenas acompanharam asobservadas no restante do país, não tendo sidosuficientes para diminuir, de maneira mais significativa,o gap em relação ao restante do país.

Finalmente, o Gráfico A5 mostra que a evolução dastaxas de analfabetismo foi praticamente idêntica àobservada no país como um todo. Em todos osperíodos, apenas cerca de 35% da população vivia emmunicípios da Amazônia que tinham taxas deanalfabetismo menores que a média nacional. Noentanto, enquanto em 1970 cinqüenta por cento dapopulação vivia em municípios com taxas deanalfabetismo superiores a 45%, em 1991 o mesmopercentual da população vivia em municípios ondeaqueles índices eram menores que 25%.

GRÁFICO A5. Distribuição acumulada da população municipal da AML segundo taxas deanalfabetismo, 1970-71

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

Quanto à origem da renda, os dados podem esconderuma eventual contribuição maior das parcelas urbanas.De fato, o PIB da AML tem contribuiçãosignificativamente maior das áreas urbanas, enquantosuas populações só ultrapassam as rurais a partir de1985 – Tabela A1. Estes dados sugerem que asmelhorias sociais sugeridas pelos gráficos anteriorespossivelmente são “dissociadas” dos desmatamentos.

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Page 101: Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira€¦ · Avanço da Fronteira Especulativa e o Processo dos Desmatamentos Determinantes da Ocupação da Amazônia: um Modelo Econométrico

Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira100

População (1000 hab.) PIB (US$ milhões de 1995) PIB per capita (US$ de 1995) Rural Urbana Rural Urbano Rural Urbano

1970 4.589 2.674 1.606 4.243 349 1.586 1975 5.263 3.631 2.460 7.535 467 2.075 1980 6.092 5.112 4.192 16.561 688 3.239 1985 6.638 6.531 5.215 23.710 785 3.630 1990 ND ND ND ND ND ND 1995 7.000 10.692 9.882 33.948 1.411 3.175

TABELA A1. Evolução da população, PIB e PIB per capita na AML, 1970-95

FONTE: IBGE, elaboração IPEA

A tabela sugere que talvez a maior parte das recentesmelhorias nas condições sócioeconômicas da regiãotenha sido proporcionada pelos setores urbanos e nãopela agropecuária. A partir da base de dados utilizada,não é possível afirmar categoricamente esta ligação eser mais conclusivo39. É plausível evidentemente suporque boa parte das melhorias também tenha advindodas atividades agropecuárias. Andersen et alli (2002)sugerem mesmo que a própria urbanização da regiãotem origem na expansão do setor agropecuário. Nocaso deste, caberia também distingüir entre a rendagerada pelos grandes e pequenos agentes, queseguramente dão destinações distintas a ela: no casodos pequenos, ela supostamente reverte de forma

39 Cumpre observar que a despeito da definição precisa doIBGE, o conceito de “urbano” na Amazônia deve ser analisadocom cautela: como o tamanho mínimo das cidades é o mesmoque no restante do país, as “cidades” na Amazônia têm umaligação com o meio rural e com as atividades agropecuáriasmuito maior que nas regiões do Centro-Sul do país. Nestesentido, o que é eventualmente medido como população ourenda urbana pode, de fato, ser rural.

integral em melhoria das suas próprias condições devida – em outras palavras, oportunidades demobilidade social.

Os dados sugerem também que as melhorias sócio-econômicas foram suficientes apenas para fazer aregião acompanhar a evolução observada no restantedo país. Considerando o nível de pobreza relativo daregião em relação ao sul do país, isto já representa umcerto avanço, na medida em que o gap inter-regionalnão aumenta. Mas tampouco existem motivos paracelebração, já que a região continua bastante atrás damédia nacional em termos de suas condiçõessócioeconômicas médias.

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