12
CELULAR NO TRABALHO BETO SOARES/ESTÚDIO BOOM JULHO / 2017 40 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHO CR R - Sinduscon-DF · BETO SOARES/ESTÚDIO BOOM JULHO / 2017. JULHO / 2017 REVISTA PROTEÇÃO 41 CR R GERAÇÃO ... pelo Google juntamente com a empresa de pesquisas

Embed Size (px)

Citation preview

JULHO / 201740 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOCELULAR NO TRABALHOB

ETO

SO

AR

ES

/ES

DIO

BO

OM

JULHO / 201740 REVISTA PROTEÇÃO

REVISTA PROTEÇÃO 41JULHO / 2017

CELULAR NO TRABALHO

GERAÇÃOSMARTPHONEConectados quase que 24 horas por dia e aproveitando as facilidades das novas tecnologias, é necessário que usuários e empresas avaliem os riscos que elas oferecem para a saúde física e mental dos colaboradores

A fila do banco, da loja, do restaurante. O rádio, a televisão, o computador, a câmera fotográfica e até mesmo a roda de amigos. Consegue imaginar um único substituto para todos estes objetos e situações tão distintas? Os smartphones comercializados atualmente fazem isso e muito mais. De repente, um mundo de possibilidades está a apenas a um click ou aplicativo de distância. A evolução tecnológica dos celulares impressiona quando comparada com o primeiro aparelho que chegou no Brasil na década de 90. O Motorola PT-550, que ficou mais conhecido como ‘tijolão’, tinha como diferencial uma agenda integrada e o fato de identificar ligações e era item de difícil aquisição devido ao preço alto. Hoje essa realidade mudou e os telefones inteligentes,

Reportagem de Raira Cardoso

em tradução literal, vêm ganhando o mundo e só no Brasil, de acordo com a 28ª Pesquisa de Administração e Uso de Tecnologia da Informação nas Empresas, há 198 milhões de smartphones em circulação. A estimativa do estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo é que esse número cresça e até outubro desse ano a quantidade dos aparelhos deve alcançar o mesmo número de brasileiros: 208 milhões.Agora, toda essa inovação traz novos desafios. Não é difícil encontrar pedestres ocupados demais com o celular para olhar para a rua enquanto a atravessam ou, até mesmo, motoristas que trocam mensagens ou fazem ligações enquanto dirigem. Um agravante é que essas práticas têm sido trazidas para dentro do ambiente laboral.

JULHO / 201742 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHO

ça e Saúde do Sesi de Santo André, Fábio Alexandre Dias, destaca a importância da tecnologia que colabora com a manuten-ção da competitividade da indústria brasi-leira no mundo. “Existem rotinas de traba-lho em que tanto os smartphones quanto os notebooks trazem contribuições vitais para o processo”, avalia.

No entanto, ele constata que, em al-gumas tarefas, a utilização do aparelho é prejudicial, principalmente em atividades que necessitam da atenção e da concen-tração do funcionário. Como exemplo, o higienista cita um trabalhador que utiliza equipamentos semiautomáticos em que uma pequena distração devido a um ‘bip’ do smartphone pode gerar um acidente laboral e até mesmo a perda de mão de obra devido a consequências permanen-tes. Diante disso, Bandini afirma que o aparelho vem testando os limites do que é trabalho e do que é vida social, sendo necessário que os colaboradores deixem de lado a vida pessoal e as redes sociais durante o trabalho para evitar as distra-ções que podem ser fatais.

De acordo com o psicólogo do Traba-lho Mário César Ferreira, pós-doutor em Ergonomia Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho, o que vai definir se o smart-phone e demais tecnologias auxiliam ou prejudicam as atividades dentro do am-biente organizacional é justamente a for-ma de uso. Além do uso do telefone para facilitar a execução das tarefas laborais e da utilização do smartphone pessoal du-rante a realização da atividade de traba-lho de forma concomitante e, dependo da situação, insegura, ele cita também os ca-sos em que as tecnologias são utilizadas

Híbridos do celular e do computador, os smartphones englobam algumas das principais tecnologias de comunicação, além de possuírem aplicativos que au-xiliam o usuário nas tarefas mais inusi-tadas, deixando, muitas vezes, a capaci-dade de realizar e receber chamadas em segundo plano.

Segundo estudo realizado anualmente pelo Google juntamente com a empresa de pesquisas Kantar TNS intitulada Goo-gle Consumer Barometer, o uso crescente dos aparelhos vem afetando o comporta-mento das pessoas. Em 2016, a pesquisa contabilizou que o uso do telefone começa já pela manhã, uma vez que a ferramen-ta serve como despertador para 65% dos usuários. No decorrer do dia, a utilização do aparelho só aumenta, visto que 59% dos brasileiros conectam-se à internet principalmente nos smartphones, para acessar suas redes sociais, escutar músi-cas, fazer compras e transações bancárias, entre outras tarefas. Do total de entre-vistados, 73% afirma que não sai de casa sem o aparelho e, segundo levantamento da Mobile Time com a Opinion Box, que realiza periodicamente pesquisas sobre o mercado de conteúdo e serviços mó-veis no Brasil, o aplicativo de mensagens WhatsApp é o mais utilizando, estando presente em 98% dos celulares.

Ocupando um espaço considerável no dia a dia das pessoas, os smartphones chegaram também ao meio ambiente de trabalho. Mas e a sua contribuição para as atividades desenvolvidas tem sido positiva ou negativa? Será que o seu uso tem afe-tado a saúde e a segurança dos trabalha-dores de alguma forma? O assunto ainda é novo, mas as repercussões já são notá-

veis, tanto para o bem quanto para o mal.

CENÁRIOOs dispositivos móveis de comunicação

já fazem parte do ambiente profissional há algum tempo, mas seu uso se intensificou na última década. “Se há 30 anos os pro-fissionais de saúde e de vendas usavam pagers para se comunicar, podemos dizer que a revolução tecnológica veio mesmo com os smartphones que, além de servi-rem para a comunicação direta por telefo-ne, ainda propiciam acesso a emails, redes sociais, aplicativos e internet”, pondera a médica do Trabalho Márcia Bandini, que é também presidente da Associação Nacio-nal de Medicina do Trabalho. Segundo ela, o aparelho pode ser uma boa ferramen-ta de trabalho, facilitando o acompanha-mento de projetos, trabalhos e eventos.

Dentro do ambiente industrial, o higie-nista Ocupacional da Unidade de Seguran-

FR

EE

PIK

Prós e contras do uso do celular no trabalho devem ser avaliados

VA

LDIR

LO

PE

S

Márcia: revolução

AR

QU

IVO

PE

SS

OA

L

Ferreira: forma de uso

JULHO / 201744 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOno sentido de intensificação do trabalho, o que também pode acarretar consequên-cias negativas para a saúde e segurança dos colaboradores.

DIREÇÃO VEICULARUma das atividades em que a falta de

atenção devido ao uso do smartphone ou eletrônicos similares pode e tem gerado graves acidentes no cotidiano das pessoas é a direção veicular e, segundo o diretor do Departamento de Medicina de Tráfego da Abramet (Associação Brasileira de Me-dicina de Tráfego), Dirceu Alves Junior, essa realidade também pode ser observa-da no contexto do motorista profissional.

Conforme explica o especialista em Me-dicina do Trabalho e Medicina de Tráfe-go, três funções essenciais para a prática segura da direção veicular são compro-metidas pela distração produzida, não só pelos smartphones, mas também pelos aparelhos GPS, televisões e rádios co-municadores, muito comuns em carros e transportes públicos. A primeira é a fun-ção cognitiva, que engloba a atenção, con-centração, raciocínio, vigília e percepção. Em seguida, ele cita a função motora, res-ponsável por enviar informações do Sis-tema Nervoso Central para os músculos e glândulas, fazendo-os funcionar de acordo com o que foi visto ou ouvido. Por último, há a função sensório-perceptiva, encarre-gada pela sensibilidade do tato, da visão e da audição.

“Quando recebemos uma mensagem

ela vai para um local do cérebro chama-do hipotálamo, depois para o lobo frontal, que filtra essa informação e manda para o córtex cerebral o que importa. Ou seja, no momento em que se voltou para o ce-lular, o trabalhador se desliga do ambiente laboral. Ele vai ler ou escutar o que rece-beu, pensar para dar uma resposta, tudo isso desconectado da atividade que está desenvolvendo. O trabalhador vai mexer no maquinário de maneira imprudente e depois que desligar o smartphone não sa-berá te informar o que aconteceu porque o cérebro dele não armazenou tal infor-mação, ele estava ausente do que estava fazendo primariamente”, explica.

Além disso, o operador e/ou motorista

perde a perspectiva do todo, ficando com uma visão tubular, ou seja, sem uma per-cepção periférica. Levando pelo menos de três a quatro segundos para pegar o te-lefone que toca e com sua atenção volta-da para a tela do aparelho, um motorista que está a 100 km/h terá se movido cer-ca de 110 metros sem olhar para frente, dirigindo no ‘piloto automático’, uma vez que seus movimentos não estavam sendo comandados pelo córtex cerebral. “Ape-nas 2% da população é capaz de executar duas ou mais atividades simultaneamente. Para o restante, as tarefas feitas não serão bem-feitas e a possibilidade de acidente é muito maior”, avalia.

PERIGOSNa construção civil, a execução de ta-

refas também exige cautela e atenção e o uso de aparelhos eletrônicos pode ser danoso e até fatal. “O uso do smartphone no canteiro de obras é um fator que traz muita insegurança ao trabalhador, que pode cair em um buraco, não perceber que a laje acabou e sofrer a queda de um prédio em construção ou não perceber um caminhão que está dando a ré, por exemplo”, pontua o presidente do Sin-dicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário de Brasí-lia/DF, Raimundo Salvador. Percebendo esses riscos, a STICMB, juntamente com o Sinduscon-DF (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Distrito Federal) fecharam acordo pioneiro e incluíram

A tecnologia hoje está ligada a quase tu-do e não é incomum as pessoas acessarem seus telefones diversas vezes por dia para checarem seus e-mails, redes sociais, tro-car mensagens em aplicativos de conver-sas, tirarem fotos, fazerem leituras, com-pras, entre tantas outras coisas. Conforme a médica do Trabalho e presidente da Anamt, Márcia Bandini, é exatamente por oferece-rem muito mais serviços do que simples-mente uma ferramenta de comunicação que os smartphones criaram a necessidade de os usuários viverem 'conectados', sempre em rede, interagindo com outras pessoas. “Atualmente não é difícil vermos as pesso-as digitando enquanto andam ou dirigem, o que demonstra que para ser manter co-nectadas elas acabam assumindo compor-tamentos de risco. Obviamente, isso não é bom”, constata.

Essa prática de estar quase que o dia to-

A ERA DOS HIPERCONECTADOSmofobia. A expressão adveio do termo inglês “no-mobile fobia”, e se refere ao mal-estar apresentado quando os usuá rios não estão com os seus celulares disponíveis para uso. “Então ela vai começar a ter sintomas emo-cionais de ansiedade, alterações do sono, irritabilidade, podendo até gerar sintomas de depressão e isolamento social. Isto tam-bém vai refletir no ambiente de trabalho em que a pessoa poderá ficar desatenta, terá dificuldade para se relacionar, perderá pro-dutividade”, aponta o especialista.

Para evitar o adoecimento, ele aponta a necessidade de acompanhamento constante da Medicina do Trabalho e o desenvolvimen-to de programas que atendam às questões de saúde mental. “Essas pessoas precisam ser orientadas, entender os riscos que esse uso abusivo oferece e entender como essa ferramenta pode ser usada de uma maneira adequada e saudável”, completa.

do em função do celular, segundo o psiquiatra do Trabalho Duílio Antero de Camargo, po-de afetar de maneira grave a saúde mental do trabalhador tanto na empresa quanto em sua vida pessoal, podendo vir a gerar uma dependência. “Podemos pensar em uma pes-soa que é dependente de álcool ou drogas, por exemplo, onde tudo na vida dela passa a estar ligado ao objeto do seu vício. O mesmo pode ocorrer em relação aos smartphones, quando o usuário tem toda a sua rotina cen-trada no aparelho. De repente suas ativida-des passam a ser feitas pela metade, não há muita interação fora do aparelho, suas fun-ções mais básicas são afetadas. Ele perde a liberdade”, explica.

Diante disso, na ausência do objeto, seja porque o smartphone ficou sem bateria, que-brou, etc., Camargo ressalta que a pessoa acaba entrando em um estado de abstinência. O fenômeno já ganhou até nome próprio: no-

DIV

ULG

ÃO

AB

RA

ME

T

Alves Jr: funções comprometidas

JULHO / 201746 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHO

No ano de 2011 a OMS (Organização Mundial da Saúde) e a IARC (Agência In-ternacional para Pesquisa em Câncer) divul-garam a possibilidade de o uso de celulares causar câncer cerebral. Desde então, diver-gências sobre o assunto crescem entre os cientistas e ainda não há um veredicto final sobre o assunto.

O NTP (National Toxicology Program), do governo dos Estados Unidos, chegou a di-vulgar no ano passado um estudo em que, após exporem camundongos à radiação pro-duzida pelos celulares, desde a gestação até a vida adulta, foi observado um leve aumento na incidência de dois tipos de tumores nos animais do sexo masculino. A descoberta identificou nos camundongos as mesmas doenças detectadas pela pesquisa de 2011 nos usuários mais frequentes dos aparelhos: o glioma (tumor cerebral que atinge células que protegem os neurônios) e schwanno-mas do coração (tumores que afetam os nervos periféricos). Em contrapartida, uma pesquisa australiana divulgada também em 2016 constatou o oposto: o grupo de cientis-tas da Universidade de Sidney cruzou dados da incidência de câncer cerebral entre 1982 e 2013, avaliando o quadro clínico de qua-se 20 mil homens e mais de 14 mil mulhe-res, concluindo que não houve aumento da incidência de tumores cerebrais em virtude do uso do celular.

Entendendo que são muito comuns essas divergências no meio científico, o engenhei-ro em Segurança do Trabalho e mestre em Química e Ecotoxicologia Ambiental, Antonio Carlos Vendrame, acredita que os celulares não oferecem tal risco aos seus usuários. “Os baixos níveis de energia de radiofre-quên cia emitidos pelos aparelhos em uso estão na faixa de microondas. Considerando que níveis elevados de RF podem produzir os efeitos para a saúde (por aquecimento do tecido), a exposição a RF de baixo nível não causa efeitos adversos conhecidos so-bre a saúde”, afirma.

USAR CELULAR PODE CAUSAR CÂNCER?

Pesquisas não são conclusivas

FR

EE

PIK

uma cláusula na convenção de trabalho que trata da questão. Saiba mais a partir da página 53.

Trabalhos desenvolvidos em indústrias químicas também podem ser afetados de maneira negativa em consequência do uso do smartphone. Segundo a química Yáska-ra Barrilli, assessora técnica da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Quí-mica), na execução das atividades consi-deradas críticas, tais como trabalhos em altura, entradas em espaços confinados, serviços à quente, que exigem um grau de atenção maior, os aparelhos podem ser um fator de distração e contribuir para a ocorrência de acidentes. Ainda mais do que isso, o uso de celulares oferece risco maior nas áreas industriais cuja classifica-ção se enquadra como explosiva.

As chamadas áreas classificadas, se-gundo ela, são aquelas em que há produ-tos inflamáveis que podem gerar riscos de fogo ou explosão, como tanques ou equipamentos que armazenam ou geram produtos inflamáveis. “Em processos in-dustriais, especialmente em petroquími-cas e indústrias químicas, a presença de produtos inflamáveis pode favorecer a formação de mistura de gases, vapores ou poeiras com o ar que, em determinadas concentrações, formam uma atmosfera potencialmente explosiva. Nessas áreas são permitidos apenas equipamentos e instrumentos intrinsicamente seguros, o que não se aplica ao celular”, explica. Isso porque o celular pode ser uma potencial fonte de ignição com energia suficiente para causar a combustão dessa atmosfe-ra. “O princípio é o mesmo no caso do uso dos smartphones nos postos de combus-tíveis, por exemplo, uma vez que o local de abastecimento pode ter uma atmosfera explosiva quando da operação de recebi-mento e descarregamento de combustí-veis e até mesmo ao encher o tanque do carro”, complementa a química.

SAÚDEAlém do risco de acidentes de trabalho,

dependendo da atividade em questão e o local em que ela está sendo desenvolvida, o uso de smartphones pode afetar a saú-de de seus usuários. Um dos agravantes é a postura adotada durante a utilização dos aparelhos. A curvatura excessiva e prolongada do pescoço pode causar do-res e problemas musculoesqueléticos. O médico do Trabalho Hudson de Araújo Couto também chama a atenção para a

má postura exigida no uso do tablet, que não possui um suporte para ser segura-do, exigindo esforços estáticos das mãos, com a ocorrência de dor se usado duran-te muito tempo. “Esse desconforto ocorre devido ao acúmulo de uma substância, o ácido láctico, decorrente do metabolismo anaeróbico. O ácido é um potente irritante das terminações nervosas”, conta.

O ato de digitar nos smartphones tam-bém é apontado por ele como uma possí-vel causa de lesões quando se digita com os polegares segurando o aparelho com os demais dedos das mãos. “Nessa situação, os dois tendões existentes na base dos polegares, que passam juntos por meio de um sulco na cabeça do osso rádio, irão se atritar, podendo desenvolver inflama-ção local muito dolorosa conhecida como tendinite de De Quervain”, revela Couto.

A luminosidade da tela dos smartpho-nes também pode afetar a visão dos usuá-rios, causando problemas oftalmológicos, assim como forçar os olhos para fazer a leitura nos celulares, causando fadiga vi-sual. Alves Junior lembra ainda dos pro-blemas que podem ser desenvolvidos nos colaboradores que laboram escutando música nos fones de ouvido em volume muito alto. “Essa prática pode produzir o que nós chamamos de tinnitus, ou zum-bido. Levando em consideração o tempo de exposição e o estado do aparelho au-ditivo do indivíduo, esse zumbido poderá evoluir para uma redução da audição e até mesmo para uma perda auditiva to-tal”, afirma o especialista em Medicina do Trabalho da Abramet.

Além das consequências físicas, Mário César ressalta os riscos psicossociais do excesso de uso dos smartphones e asse-melhados que pode comprometer a saúde mental dos colaboradores. “Algumas pes-quisas já estão falando de trabalhadores que não conseguem se desligar desses aparelhos. Com isso há um crescimento nos quadros de ansiedade, depressão, sín-drome de burn out, esgotamento físico e mental”. Outra recente doença desenca-deada pelo celular é a chamada nomofo-bia. Saiba mais no quadro da página ante-rior, A era dos hiperconectados.

Tudo dependerá do tempo que o traba-lhador emprega no uso dessas tecnologias e dos momentos que ele escolhe para isso. O uso concomitante com atividades que exigem atenção e de maneira excessiva oferecem riscos para saúde física e men-tal dos colaboradores.

REVISTA PROTEÇÃO 47JULHO / 2017

CELULAR NO TRABALHO

Toda atividade laboral oferece algum risco ao trabalhador, seja ele físico ou mental, moderado ou grave e iminente. E é justamente para controlar esses ris-cos e proporcionar um ambiente de tra-balho seguro e saudável que a Portaria nº 3.214/78 aprovou as 28 Normas Re-gulamentadoras, que atualmente já são 36. Desde então elas são alteradas sem-pre que os integrantes das comissões tri-partites julgam necessário. Mas confor-me informa o procurador do Trabalho da 6ª Região (PE), Leonardo Osório, que é coordenador nacional da Coordenadoria de Defesa do Meio Ambiente de Traba-lho, não foi feita nenhuma atualização nas NRs vigentes ou qualquer outra le-gislação que aborde especificamente so-bre a questão do uso de smartphones e similares em ambientes de trabalho em nível nacional.

O que existe são iniciativas isoladas, como a Lei nº 13.440/2002, vigente na cidade de São Paulo/SP, que proíbe o uso de aparelhos de telefonia celular nos

Possibilidade de escolhaCabe à empresa definir se as tecnologias podem ser utilizadas no trabalho

postos de gasolina. Conforme explica a química Yáskara Barrilli, assessora téc-nica da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), grande parte das indústrias químicas e petroquímicas tam-bém acaba adotando a proibição do uso de celulares nas áreas industriais, por meio de regimento interno, entendendo que há risco em locais cuja classificação de áreas se enquadra como explosiva. Embora não seja explícita, a NR 20 (Se-gurança e Saúde no Trabalho com Infla-máveis e Combustíveis), no item 13, tra-ta das fontes de ignição, entre as quais o celular se enquadra, definindo que “o empregador deve sinalizar a proibição do uso de fontes de ignição nas áreas sujeitas à existência de atmosferas ex-plosivas”.

No caso da direção veicular dos opera-dores de máquinas, o diretor do Departa-mento de Medicina de Tráfego da Abra-met (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego), Dirceu Alves Junior, afirma que não há condições de se adotar o uso

do smartphone dentro do pátio da em-presa e que cabe à equipe do SESMT e do Departamento de Medicina de Tráfe-go fazer essa fiscalização. Embora haja a restrição no Código de Trânsito Brasilei-ro, Artigo nº 252, proibindo a utilização do celular ao volante, ele considera que a fiscalização fica mais difícil no caso dos motoristas profissionais. Além disso, ele ressalta que até mesmo as tecnologias que fazem parte do veículo de transpor-te acabam provocando uma direção in-segura. “Interessante que os ônibus de viagem, por exemplo, possuem compu-tador de bordo, comunicação via rádio. Muitas vezes, a central da empresa ainda acaba fazendo contato enquanto o moto-rista está dirigindo para passar rota ou outra informação, o que acaba tirando a atenção do trabalhador”, critica.

POSICIONAMENTOA falta de uma orientação geral sobre

o uso de smartphones e afins no trabalho deixa a questão em aberto. Segundo de-fende Osório, o ideal mesmo é que cada empresa avalie os riscos das atividades desenvolvidas em sua planta e use o seu poder diretivo para restringir ou não o uso dessas tecnologias. “Me parece que

JULHO / 201748 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOA

SC

OM

/PG

T

Osório: avaliar os riscos

MA

NTO

VA

NI F

ER

NA

ND

ES

Nicoli: proibição para evitar problemas

não seria adequado em uma atividade sem risco você simplesmente proibir o uso do celular. Mas, ao mesmo tempo, a gente tem que lembrar que o colabora-dor, durante a sua jornada laboral, coloca a sua força de trabalho à disposição da empresa e ao dedicar parte desse tem-po para o Facebook ou WhatsApp, por exemplo, não conseguirá produzir aquilo que é esperado dele”, pondera. Além do baixo rendimento na execução de suas tarefas, a engenheira de Segurança do Trabalho da FIEP (Federação das Indús-trias do Estado do Paraná) Alessandra Rolim Pescosolido cita ainda a neces-sidade de retrabalho em alguns casos e uma questão que foge da área de Saúde e Segurança no Trabalho. “O maior pro-blema que as empresas têm relatado é o uso de celulares que possuem câmeras de alta tecnologia e filmadoras pelos em-pregados, visto que elas acabam ficando vulneráveis quanto às questões de segre-dos industriais”.

Mais do que avaliar as chances de ocor-rência de acidente de trabalho ou ado-ecimento para averiguar se a utilização do smartphone concomitante à atividade laboral deve ser permitida, o advogado Luís Gustavo Nicoli, especialista em Di-reito Trabalhista, destaca que o empre-gador precisa se fazer a seguinte pergun-ta: ‘essa ferramenta é necessária para a execução do trabalho? ’.

Como exemplo ele cita o caso de uma empresa para quem presta consultoria em que uma funcionária que trabalha executando vendas via WhatsApp, por meio do celular corporativo da empre-sa, passou a dedicar muito tempo ao seu

telefone pessoal durante o expediente. “Nesse caso nós tivemos que chamar es-sa funcionária para conversar e estabe-lecemos a regra de que ela não poderia, enquanto estivesse vendendo eletronica-mente, acessar seu aparelho particular, para não desviar sua atenção do traba-lho”, relata.

Mas de maneira geral, sem levar em consideração as atividades que adotam os smartphones como ferramentas de trabalho, o advogado trabalhista orienta

que as empresas proíbam o uso do celu-lar. “Nas repartições públicas, por exem-plo, é muito comum você encontrar os funcionários da limpeza escutando músi-ca com os fones nos ouvidos. Que neces-sidade eles têm de fazer isso? Nenhuma. Inclusive, eles ficam desatentos, não per-cebem as pessoas a sua volta e se alguém escorregar no chão molhado eles sequer irão ouvir”, argumenta.

Mesmo nas indústrias em que há seto-res que oferecem realidades diferentes, como escritórios e linhas de produção, ele recomenda que a orientação seja a mesma, a de proibição, para evitar pro-blemas futuros. Nesses casos, ele des-taca que é importante que o emprega-dor forneça um outro telefone em que o funcionário possa fazer ou receber cha-madas em situações emergenciais. “Até nas atividades em que os aparelhos são utilizados, o ideal é que a empresa ofe-reça um telefone corporativo e restrinja o acesso a redes sociais, entre outros. A funcionária que faz vendas pelo Whats-App, por exemplo, não possui acesso ao Facebook”, complementa.

JUSTIÇA DO TRABALHOAinda não são muitos os processos na

Justiça sobre o tema e a questão da cul-pabilidade em caso de acidentes de tra-balho ocasionados pelo uso do smartpho-ne também é um pouco nebulosa. O pro-curador do Trabalho da 5ª Região (BA), Pedro Lino, cita uma ocorrência recente em que o Tribunal Superior do Trabalho julgou uma empregada de empresa de ge-renciamento de resíduos industriais que teve sua mão prensada em uma máquina no momento em que utilizava seu celu-lar e esse tombou por cima da máquina. “Ela tentou recuperar o aparelho e o aci-dente ocorreu. Havia na empresa regra proibitiva quanto ao uso de aparelhos ce-lulares e a empregada ignorou-a”, relata. Na ocasião, o pedido de indenização da trabalhadora foi julgado improcedente, pois o Judiciário reconheceu sua culpa exclusiva pelo evento danoso.

A falta de atenção também foi o argu-mento que isentou a responsabilidade de uma empresa em um acidente de traba-lho que decepou três dedos da mão de um colaborador. Nesse caso, segundo Ni-coli, ficou comprovado que o trabalhador foi atender o seu celular enquanto con-tinuava suas funções na máquina. “Ain-da que o empregado trabalhasse em um

JULHO / 201750 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOmaquinário que oferecia riscos, ele era um profissional gabaritado e já estava há oito anos na empresa. Às vezes é até isso que acaba causando o acidente, o exces-so de confiança”, avalia.

Para o coordenador nacional da Code-mat, entretanto, essa discussão é mais profunda visto que são raras às ocorrên-cias em que a culpa é exclusiva do cola-borador. “Me parece que se o trabalha-dor, mesmo usando o smartphone, sofre um acidente em uma máquina porque ela não tinha, por exemplo, um sistema de intertravamento, há um caso de violação da NR 12 e o celular se torna um agra-vante. Então, a empresa teria a obriga-ção de indenizar o colaborador”, pondera Osório. Nesses casos, ele ressalta que é sempre necessário se analisar o conjunto

de fatores que levou ao acidente laboral.

CONSEQUÊNCIASFato é que, havendo um regimento

in terno ou cláusula de trabalho que res-trinja ou proíba o uso de smartphone no ambiente laboral, a empresa tem todo o direito de cobrar o cumprimento dessas orientações por parte dos colaboradores e o descumprimento pode, sim, gerar de-missão por justa causa. Entretanto, Lino ressalta que a dispensa por justa causa é a última alternativa a ser adotada. “Mes-mo porque a aplicação de penalidade dis-ciplinar dessa magnitude há de ser pro-porcional à gravidade da conduta”, avalia o procurador do Trabalho.

Fazendo analogia a um pai educando o seu filho, Nicoli afirma que primeiro se

coloca de castigo e retira o brinquedo pa-ra depois se tomar medidas mais drásti-cas. “Primeiro você adverte verbalmen-te, explicando o porquê da proibição. Não surtiu efeito? Dá uma advertência por escrito. Voltou a cometer a infração? Faça uma segunda advertência. Se nova-mente houver reincidência, suspenda o funcionário por um ou dois dias. Se nada disso resolveu, demita por justa causa. Dificilmente essa rescisão de contrato será revertida na Justiça”, aponta o ad-vogado trabalhista.

No caso de uma justa causa aplicada a um serralheiro que, mesmo advertido várias vezes, não acatou regra de segu-rança da empresa que proibia a utilização do telefone celular durante o horário de expediente, o Tribunal Regional do Tra-balho da 9ª Região manteve a decisão da empregadora, entendendo que “a inter-ferência na concentração gera, não ape-nas uma interrupção dos serviços, mas também pode provocar acidente de tra-balho, pondo em risco a integridade física dos trabalhadores envolvidos na tarefa”. Entre as atividades prestadas pelo traba-lhador constavam a manipulação de má-quinas de corte, de polimento e soldas, além de produtos químicos com algum grau de toxicidade.

DESCONEXÃONos tribunais, as discussões envolven-

do o uso dos smartphones, segundo Lino, estão mais focadas nos casos em que o trabalhador porta o celular e se coloca à serviço da empresa fora do ambiente la-boral e de sua jornada de trabalho habi-tual, quase sempre em relação à valida-de ou não do pagamento de horas extras. Para o procurador do Trabalho Leonar-do Osório, a situação fere o direito do colaborador a se desconectar do traba-lho. “Essa situação pode sim gerar inde-nizações por dano moral e pagamentos de horas extras. A empresa precisa res-peitar a carga horária da jornada do seu funcionário”, afirma.

Abordando essa situação, estudos rea-lizados na França revelaram que 12% dos trabalhadores do país sofrem de esgota-mento no trabalho, muito conhecido co-mo síndrome de burn out. Os casos mais registrados durante a pesquisa foram de colaboradores que reclamavam de serem importunados com e-mails excessivos, telefonemas e mensagens nos finais de semana. Para combater o problema e pre-

JULHO / 201752 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOvenir adoecimentos, entrou em vigor em janeiro desse ano uma lei que assegura no país o direito à desconexão. Nela está previsto que toda empresa com mais de 50 funcionários deve abrir negociações entre as partes para chegar a um acordo para conter eventuais abusos.

“No caso do Brasil, a própria Consti-tuição Federal de 1988 oferece subsí-dios à vedação desses excessos, como o próprio direito de lazer assegurado no rol dos direitos fundamentais. Mesmo porque, além da sua violação, a conduta do empregador que não respeita tais li-mites pode significar agressões à esfera íntima e personalíssima do empregado, capaz de agredir direitos de sua perso-nalidade”, pontua Osório.

A médica do Trabalho Márcia Bandini observa que em muitos países desenvol-vidos não há essa lei de restrição do uso fora do ambiente de trabalho pelo sim-ples motivo de que, culturalmente, as pessoas se ‘desconectam’ a partir de um determinado horário e respeitam o pe-ríodo de descanso um do outro. Existe um entendimento de que um trabalhador produtivo é aquele que descansa, se di-verte e faz outras atividades para além do trabalho. “No Brasil, nossa cultura permite invasões que não seriam tole-

Em geral é proibido celular nas áreas industriais

DIV

ULG

ÃO

/PE

TR

OB

RA

S

radas em outros países. Por isso, quan-do vejo uma lei que confere o direito de não responder e-mails fora do horário de trabalho, meu sentimento é conflituoso. Por um lado, parece-me justo que este direito seja preservado por lei; de outro, é triste perceber que ainda dependemos de leis para que o bom senso prevaleça”, avalia a presidente da Anamt (Associa-ção Nacional de Medicina do Trabalho).

As inovações tecnológicas acontecem hoje de uma maneira muito rápida. To-dos os dias são lançados novos modelos de smartphones, tablets, notebooks, com cada vez mais funcionalidades, e fica difí-cil acompanhar. Mais complicado ainda é fazer com que a prevenção acompanhe es-se desenvolvimento e as empresas possam manter seus colaboradores seguros de to-dos os possíveis riscos a que eles possam se expor ao utilizarem estes aparelhos.

Para o psicólogo do Trabalho Mário Cé-sar Ferreira, pós-doutor em Ergonomia Aplicada à Qualidade de Vida no Traba-lho, o primeiro passo a ser tomado pelos empregadores é fazer o diagnóstico. Ve-rificar se o uso dos celulares particulares pelos funcionários tem sido um problema para a produtividade da empresa e se re-presenta risco para a sua saúde e segu-rança. Sem esquecer do caso contrário, avaliando se a demanda da empresa em

Uso conscienteO equilíbrio saudável pode ser alcançado com diálogo e capacitação

ter um ‘funcionário conectado’ não está interferindo em sua qualidade de vida. “Com base nesse diagnóstico é que serão promovidos ações e projetos que devem ser implantados em função daquele con-texto”, aponta.

A médica do Trabalho Márcia Bandini também percebe a necessidade de cada empresa avaliar suas particularidades, ressaltando a necessidade de um diálogo aberto com os trabalhadores, para que, juntos, encontrem um equilíbrio saudável. “Restrições ao uso e limitações de horá-rios podem tranquilamente ser acordados entre todos para um bom convívio. Todos precisamos de trabalho e de diversão – um não deveria eliminar, nem atrapalhar o outro. Precisamos estimular o uso cons-ciente”, afirma.

COMUNICAÇÃODefinido se haverá ou não restrição no

REVISTA PROTEÇÃO 53JULHO / 2017

CELULAR NO TRABALHOuso do smartphone e similares em deter-minado cargo ou função, se será estabe-lecido um momento específico para o uso, entre outras combinações, a próxima eta-pa é passar essa informação para os cola-boradores. “O diálogo e a conscientização se constituem na melhor ‘arma’ para con-ter abusos e excessos. Para tanto, é fun-damental que sejam realizados palestras e cursos com esse propósito, nos quais será possível orientar os empregados quanto à adequada utilização desses instrumentos tecnológicos”, observa o procurador do Trabalho da 5ª Região (BA), Pedro Lino.

Entre as medidas que podem ser adota-das pela empresa ele cita, se for o caso, a possibilidade de bloqueio a determinados sítios, canais de relacionamentos, redes sociais, e mesmo a hipótese de monito-ramento do e-mail corporativo, como me-canismo de inibição a eventuais desvios funcionais. Mas, para tanto, ele enfatiza que é essencial que estas diretivas cons-tem no regulamento da empresa ou ma-nual de conduta, ou até mesmo enquanto cláusula do contrato de trabalho. “Os em-pregadores devem, de maneira objetiva, transparente e com ampla publicidade, informar aos empregados, quando da sua admissão, preferentemente, acerca dos

procedimentos para o uso das referidas tecnologias”, pontua Lino.

Junto com as orientações, é importan-te que o empregador explique para os colaboradores o porquê da sua determi-nação, informando os riscos a que o uso irrestrito dessas tecnologias os expõem. O médico e psiquiatra do Trabalho Duílio Antero de Camargo complementa que as campanhas informativas também devem abordar a questão do uso correto dos apa-relhos, tanto para evitar algum problema físico, postural, oftalmológico, quanto o aspecto emocional disso. “É importante que o trabalhador saiba dividir o espa-ço de trabalho e, no caso de ele utilizar o smartphone para desenvolver sua ativi-dade laboral, saber separar as questões sociais da questão do próprio trabalho”.

INICIATIVAAlgumas empresas e entidades já de-

senvolvem formas de gestão para o uso de smartphones e similares dentro do ambiente de trabalho. Dentre eles, um acordo entre o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Distrito Federal e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indús-trias da Construção e do Mobiliário de Brasília restringiu o uso de telefone ce-

lular, smartphone, tablet e dispositivos similares em todos os canteiros de obras do estado. Conforme relembra o presi-dente da STICMB, Raimundo Salvador, essa discussão teve início em 2012, de-pois de terem acontecido alguns aciden-tes de trabalho devido à desatenção dos operários. “Percebíamos a necessidade de restrições quanto ao uso dos eletrônicos nas obras. Inicialmente entendíamos que cabia a cada empresa produzir o seu pró-prio regimento interno, mas o Sinduscon argumentava que na convenção as regras teriam uma força maior. Então, junto ao sindicato patronal, criamos algumas nor-mas mínimas”, relembra o sindicalista.

Instituído por meio de cláusula incluí-da na Convenção Coletiva de Trabalho de 2014, o acordo proíbe o uso dos aparelhos durante o horário de trabalho, seja para acesso à internet, redes sociais, aplicati-vos de mensagens, músicas ou qualquer outro uso que não seja ligação de voz. E mesmo no caso de o trabalhador precisar atender ou realizar uma ligação ele deve interromper o que está fazendo e se dirigir para uma área segura, que deve ser deli-mitada pelo empregador, para a utilização do dispositivo. O uso é liberado nos inter-valos de descanso. A partir dessas regras,

JULHO / 201756 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOas empresas podem criar outras orienta-ções, conforme entendam ser necessário.

Desde que a restrição entrou em vi-gor, o diretor de Política e Relações Tra-balhistas do Sinduscon/DF, Izídio Santos observou que há maior conscientização nos canteiros. “Somos muito procurados pelas empresas que querem entender como os procedimentos devem ser ado-tados, pedindo indicações de locais que podem ser definidos como 'área segura' dentro do canteiro”, comenta. Em 2015 mais duas cláusulas foram adicionadas na CCT, tornando obrigatória a realização de campanhas educativas periódicas nos canteiros tratando sobre o uso responsá-vel do celular, além da fixação de avisos referentes à proibição em locais visíveis da obra, juntamente com a informação dos horários e locais em que o acesso aos aparelhos é permitido.

CANTINHO DO CELULARNo mercado desde 2003, a Supera En-

genharia atua no ramo da construção civil do Distrito Federal e não possuía regimen-to interno que regulasse o uso de smart-phones nos canteiros. De acordo com o engenheiro de Segurança do Trabalho da empresa, Rogério Furtado de Oliveira, o assunto costumava ser abordado durante os Diálogos Diários de Segurança antes do início das atividades na obra, quando era orientado que os operários não utilizas-sem aparelhos eletrônicos durante certas atividades que exigiam um grau maior de atenção, como nos trabalhos realizados em altura, em espaços confinados e no transporte de materiais e pessoas.

“Encaramos a notícia da inserção da cláusula na CCT de forma positiva e pas-samos, então, a adotar um local específi-co para o uso dos aparelhos dentro das obras. Hoje, para atender ou realizar uma ligação em caráter emergencial durante o expediente, o trabalhador precisa parar o que está fazendo e ir para o que apelida-mos de ‘Cantinho do Celular’. Entende-mos que o uso do smartphone é unânime na sociedade moderna, mas a construção civil possui um cotidiano atípico, que pede esse cuidado”, avalia. A empresa também adota o recurso da sinalização e as capa-citações aos colaboradores. Para o enge-nheiro de segurança, a medida aumentou a segurança nos canteiros e o índice de produtividade dos trabalhadores.

Na Cabot Corporation, indústria quími-ca multinacional que possui uma fábrica

de negro de fumo (material produzido pela combustão incompleta de deriva-dos de petróleo) no Polo Petroquímico de Capuava, em Mauá/SP, os riscos que os aparelhos eletrônicos oferecem são diferentes e, segundo o gerente de Saú-de, Segurança e Meio Ambiente para a América do Sul Carlos Barbeiro essas particularidades são levadas em consi-deração para elaborar um regulamento que atenda a todos. “Quando o trabalha-dor está caminhando pela área industrial sua atenção deve estar focada nos peri-gos inerentes de cada área como desní-veis de pisos, manutenções que estejam ocorrendo ao redor, entre outros. Um perigo muito específico, mas de grande impacto, caso ocorra um acidente, é o princípio de incêndio que pode ser pro-vocado pelo uso de equipamentos elétri-cos não adequados às áreas classificadas. Os aparelhos celulares não foram proje-tados especialmente para o uso nesses locais. Portanto, não temos garantias de que não são fontes de ignição”, explica. Diante disso, a empresa opta por per-mitir o uso dos smartphones e simila-res somente nas áreas administrativas. Os trabalhadores que possuem celular da empresa também estão proibidos de utilizá-los enquanto dirigem, seja veícu-lo próprio ou da Cabot. “Todas as infor-mações são difundidas e passadas aos funcionários e terceiros em integração de segurança e treinamentos rotineiros”.

ATITUDE SEGURAAlém de terem se tornado facilitadores

Na Supera há local específico para uso do celular

DIV

ULG

ÃO

/SU

PE

RA

EN

GE

NH

AR

IA

JULHO / 201758 REVISTA PROTEÇÃO

CELULAR NO TRABALHOno dia a dia de seus usuários, os smart-phones também são aproveitados nos am-bientes de trabalho, seja agilizando a co-municação ou por meio de algum aplicati-vo específico. Para muitos profissionais as novas tecnologias se tornam ferramentas de trabalho essenciais e isso torna ainda mais necessária uma gestão adequada que mantenha os colaboradores seguros e saudáveis. Nos escritórios da Johnson & Johnson em São Paulo/SP, por exem-plo, os computadores dos funcionários foram trocados por notebooks, que eles carregam com liberdade, levando-os para as reuniões de equipe. “Há mais de cinco anos nós trabalhamos em um programa chamado Escorregões, Tropeções e Que-das no qual abordamos desde a questão do uso do celular ao do salto alto e tínha-mos conquistado uma cultura forte de prevenção entre os funcionários. Mas re-centemente mudamos de prédio e é co-mum encontrarmos pessoas caminhando e respondendo e-mails, digitando enquan-to descem as escadas, sem prestar aten-ção, voltadas totalmente para seus smart-phones”, conta a técnica de Segurança de Trabalho Solange Barros.

No local não há a proibição do uso dos eletrônicos, segundo ela, mas é exigido de

todos os funcionários uma atitude segura. Por isso, além de relembrar as medidas preventivas a cada seis meses por meio de campanhas e treinamentos online, a empresa instrui os integrantes da CIPA a alertarem os colaboradores que encontra-rem nos corredores utilizando os eletrôni-cos enquanto caminham ou descem esca-das, explicando sobre os perigos de suas ações. “Antes de começar qualquer reu-nião também fazemos o Minuto da Segu-rança, em que passamos um vídeo sobre como a distração pode gerar acidentes. E, recentemente, alguns diretores implanta-ram algumas regras durante as reuniões para que as pessoas não acessem o celu-lar durante os encontros. Uma delas é que quem fizer isso durante a reunião pagará o café para todos no próximo encontro. Não podemos proibir, até porque usamos o WhatsApp para fins profissionais, mas acabamos nos policiando mais”, pondera.

A realidade já é um pouco diferente na fábrica da companhia. “Devido aos riscos de prensamentos e amputações, entre ou-tros, o uso dos smartphones, celulares e fones de ouvido não é permitido na linha de produção nem na operação de máqui-nas e equipamentos no pátio e entorno”, informa a TST. A proibição já é adotada há cerca de três anos e é transmitida pa-ra os funcionários por meio de treinamen-tos anuais.

ADAPTAÇÃOEmbora a discussão sobre benefícios e

prejuízos que o uso de smartphones e si-

milares oferece para o ambiente laboral esteja apenas começando, é perceptível para a maioria que a tecnologia ganha, a cada dia, mais espaço e sentido na vida das pessoas. Para o higienista ocupacio-nal da Unidade de Segurança do Sesi de Santo André/SP, Fábio Alexandre Dias, criar espaços que possibilitem o acesso a essas tecnologias, disponibilizando rede Wifi em locais que não ofereçam riscos para os funcionários pode, inclusive, re-duzir os índices de absenteísmo, ao favo-recer as rotinas cotidianas do trabalhador.

Alessandra Rolim Pescosolido, enge-nheira de Segurança do Trabalho da FIEP (Federação das Indústrias do Estado do Paraná) pondera que uma lei que regu-lamentasse o assunto tornaria o contro-le dentro das empresas muito mais fácil. O procurador do Trabalho da 5ª Região (BA), Pedro Lino, coordenador Regional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, perce-be a seriedade da questão em seu cunho social, em que o abuso da utilização dos smartphones e a dependência gerada che-ga a ser uma questão de saúde pública.

No trânsito, Dirceu Alves Junior, re-conhece que já existe uma doença epi-dêmica e fatal. “No ano passado foram contabilizadas 3,6 milhões de pessoas com dengue, mas morreram 583 porque o Ministério da Saúde realizou uma gran-de campanha preventiva. Nesse mesmo período o trânsito matou 43 mil pessoas. Precisamos combater o uso do celular no volante, assim como o uso de psicotrópi-cos e o excesso de velocidade. Só assim vamos diminuir o número de mortos e se-quelados”, conclui.

Passamos agora por um momento de grande adaptação. O que não significa que todas atividades devam incorporar essas novas tecnologias ou mesmo que os empregadores devam permitir o seu uso sem estabelecer alguma forma de contro-le. O essencial neste momento é que as empresas e os profissionais de SST pri-meiro se informem, façam uma avaliação ambiental quanto aos riscos oferecidos e tracem planos de ação visando promover o uso seguro e saudável dos smartphones e afins, aproveitando todos os seus benefí-cios e evitando adoecimentos e acidentes no trabalho. Também se faz importante que os colaboradores avaliem seus hábi-tos e definam limites, abandonando prá-ticas que possam interferir em sua saúde física e mental.

Johnson & Johnson estimula uso seguro

DIV

ULG

ÃO

/JO

HN

SO

N&

JOH

NS

ON